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Esferas da insurreição

Sugestões para o combate à cafetinagem da vida

UFBA – Pró-reitoria de extensão – Pontos críticos da extensão


Campus de Olinda, Salvador, 15 de setembro de 2017
O esgotamento dos recursos naturais provavelmente está muito menos avançado
do que o esgotamento dos recursos subjetivos, dos recursos vitais que atinge
nossos contemporâneos. Se nos satisfazemos tanto em detalhar a devastação do
ambiente, é também para cobrir a assustadora ruína das subjetividades. Cada
maré negra, cada planície estéril, cada extinção de espécies é uma imagem das
almas em farrapos, um reflexo de nossa ausência de mundo, de nossa impotência
íntima para habitá-lo.
(Comitê Invisível, 2016)

Trata-se sempre de liberar a vida lá onde ela é prisioneira, ou de tentar fazê-lo


num combate incerto.
(Gilles Deleuze and Félix Guattari, 1991)

Dirigimo-nos aos inconscientes que protestam.


(Gilles Deleuze and Félix Guattari, 1972)
O mundo está em convulsão, e nós com ele.

Somos tomados por um traumático mal-estar, composto de um mix de sensações:

Um pavor diante da paisagem sinistra instaurada pela ascensão de forças reativas por toda
parte

Uma perplexidade diante da tomada de poder mundial pelo regime capitalista em sua nova
dobra – financeirizada e neoliberal –, que leva seu projeto colonial às últimas consequências,
sua realização globalitária

Uma profunda frustração com a recente dissolução em cascata de vários governos de esquerda
pelo mundo, especialmente na América Latina

Uma decepção com a impotência das esquerdas frente ao atual estão de coisas
Diante deste trauma ou sucumbimos ou amplia-se nosso horizonte de decifração da
violencia em suas novas e antigas modalidades

É então que vislumbramos um limite intransponível contra o qual esbarram


os projetos das esquerdas: seu horizonte só nos permite alcançar a esfera
macropolítica

Se a luta nesta esfera é, sem dúvida, indispensável e tem um inegável valor, o


problema é que deixa de fora a luta na esfera micropolítica
A fita de Moebius

Uma superfície topológica na qual o extremo de um dos lados continua


5 no avesso do outro, o que os torna indiscerníveis e a superfície, uniface.
Um exercício de fabulação: projete uma fita de Moebius sobre a superfície do mundo

Uma superfície topológico-relacional, em processo contínuo de


composição, feita de toda espécie de corpos (humanos e não humanos)
em conexões variadas e variáveis

6 Suas duas faces indissociáveis: formas e forças


As duas faces indissociáveis de um mundo
implicam distintas experiências da
subjetividade, com distintas funções

O Sujeito e as formas:
o Familiar

O Fora-do-sujeito e as forças:
o Estranho
Em sua experiência enquanto sujeito, a subjetividade apreende as formas
de um mundo em seu estado atual: modos de existência, suas funções,
seus códigos, suas representações, seus sentidos

Modo de apreensão: cognitivo (via percepção, associação, classificação e


reconhecimento)

Lugar do outro: um corpo externo, separado do sujeito, sobre o qual


projeta-se uma representação

Modo de relação com outro: comunicação

Função: existir socialmente

Em sua experiência enquanto fora-do-sujeito, a


subjetividade apreende as forças de um mundo, cujas
emanações geram outros mundos em estado virtual

São germes de mundos que pulsam em todos os


corpos, engendrados pelas ressonâncias singulares
das forças em cada um deles

Modo de apreensão: extracognitivo (via afeto: intuição,


saber-do-corpo, saber-do-vivo, saber eto-ecológico)

Lugar do outro: um corpo vivo cujos efeitos habitam


nosso corpo e o compõem
Modo de relação com o outro: empatia, ressonância,
reverberação

Função: habitar nossa condição de viventes


Uma experiência pessoal /sensorial /
sentimental (emoção psicológica),
formatada pelo imaginário de nossa
condição sociocultural

O Familiar

Uma experiência extrapessoal /


extrassensorial /extrapsicológica /
extrasentimental (emoção vital),
resultante do fluxo vital que atravessa
todos os corpos, neles ganha forma e os
trasfigura

O Estranho
O Estranho-Familiar
O incontornável paradoxo entre as duas experiências de um mundo, díspares e indissociáveis,
coloca uma interrogação para a subjetividade
Experiência das Forças / Experiência das Formas

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A pulsação deste novo problema convoca o desejo a agir para recobrar um equilíbrio
É aqui que se distinguem as micropolíticas, segundo a perspectiva que orienta as ações
pensantes do desejo

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Os dois extremos da ampla gama de políticas do desejo em suas
ações pensantes

Micropolítica reativa Micropolítica ativa


Reproduzindo o Inconsciente Colonial-Capitalístico Driblando o Inconsciente Colonial-Capitalístico
Esferas da insurreição
[pistas para distinguir macro e micropolítica]
I - Insurreição macropolítica: um protesto programático das consciências

Foco (visível e audível): a assimetria de direitos nas formas de relação social estabelecidas pelo
regime colonial-capitalístico. Relações de poder no âmbito das classes sociais, raças, gêneros,
sexualidades, religiões, etnicidade, colonialidade...

Agentes (apenas os humanos): todos aqueles que ocupam posições subalternas nas relações de
poder em todos os domínios da vida social.

O que move seus agentes: o impulso de ‘denunciar’ as injustiças do mundo em suas formas vigentes
para mobilizar as consciências.

Intenção (empoderar-se): sair da invisibilidade e da inaudibilidade, para ocupar afirmativamente um


lugar de fala e de direito de existência digna.
Desmantelar a assimetria nas relações de poder, promovendo uma redistribuição dos lugares que
seja mais igualitária – não só no campo político, mas também nos campos social e econômico.

Critério moral de avaliação das situações: sistema de valores estabelecidos – bússola moral que
orienta nossas escolhas e ações na esfera macropolítica.

Modo de operação (por oposição ao opressor para destituí-lo de seu lugar de poder): estratégias
de luta contra o opressor e as leis que sustentam seu poder em todas suas manifestações na vida
individual e coletiva.

Modo de cooperação (construção de movimentos organizados, via recognição identitária): em


torno de uma mesma reivindicação (concreta) e em função de uma mesma posição (subalterna)
num determinado segmento da vida social. Nesta posição, que pertence à esfera da ‘pessoa’
na experiência subjetiva, desenha-se um suposto contorno identitário, que facilita a necessária
agrupação; o problema é quando a subjetividade confina-se neste contorno e a ele se reduz.
Um modo de cooperação que gera força de pressão para viabilizar uma reversão efetiva nas relações
de poder no plano institucional.

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II- Insurreição micropolítica: um protesto pulsional dos inconscientes

Foco (invisível e inaudível): o abuso perverso da força vital da natureza, em todos seus elementos,
o que inclui o humano. Esta é a matriz micropolítica do regime colonial-capitalístico: uma patologia
altamente agressiva com graves sequelas para o destino do planeta.

Agentes (humanos e não-humanos): todos os elementos da biosfera que se insurgem contra


a violência exercida sobre a vida. Os elementos não-humanos reconhecem instintivamente a
despotencialização da vida resultante de seu abuso, produzindo transmutações que lhe permitem
retomar seu curso. No elemento humano, sob o regime colonial-capitalístico, a redução da
subjetividade à sua experiência como sujeito, leva o desejo a agarrar-se ao status quo, e a agir contra
a perpetuação da vida.
Os agentes humanos da insurreição micropolítica são todos aqueles e aquelas que buscam resistir
ao estupro de sua pulsão vital para retomar o poder de decidir o destino da mesma. O combate nesta
direção atravessa toda a sociedade, estejamos na posição de subalternidade ou de soberania nas
relações de poder.

O que move seus agentes: o impulso de perseveração da vida que, nos humanos, manifesta-se como
impulso de ‘anunciar’ mundos por vir para mobilizar os inconscientes.

Intenção (potencializar-se): reapropriar-se da força vital e sua potência de criação, o que no


humano depende de reapropriar-se igualmente da linguagem para que a pulsão encontre seu dizer,
de maneira a tornar sensíveis os mundos que se anunciam ao saber-do-corpo. Esta é a condição
para que o movimento pulsional se complete em seu destino ético, produzindo um acontecimento.
A insurreição micropolítica é, nela mesma, uma ressurreição da força vital. A intenção aqui é
produzir ‘potencialização’, o que é distinto de ‘empoderamento’.

Critério pulsional de avaliação das situações: o que a vida pede - bússola ética que orienta nossas
escolhas e ações na esfera micropolítica.

Modo de operação (por afirmação da vida em sua essência germinativa, para desertar as relações
de poder): não ceder ao abuso da pulsão, o que depende de fazer a travessia do trauma que tal
abuso provoca e que prepara o terreno para o sequestro de sua potência. É este trauma o que nos
faz permanecer enredados na cena das relações de poder, seja na posição de subalternidade ou de
soberania (mesmo que nos insurjamos contra elas macropoliticamente).
Há que desertar seu papel, transfigurando seu personagem ou simplesmente abandonando a cena
que, com isso, não tem mais como se sustentar. Construir para si um outro corpo, abandonando a
carapaça de um corpo estruturado na dinâmica do abuso.
A resistência micropolítica é também e indissociavelmente uma resistência clínica: curar a vida de
sua impotência, sequela de seu cativeiro na trama relacional do abuso.

Modo de cooperação (construção do comum, via empatia): tecer múltiplas redes de conexões a
partir de situações, experiências e linguagens distintas, cujo traço de união é uma perspectiva ética:
a afirmação da vida em sua essência transfiguradora e transvaloradora.
Criam-se territórios relacionais temporários, variados e variáveis, nos quais se produzem sinergias
coletivas, provedoras de um acolhimento recíproco que favorece a travessia do trauma do abuso
colonial-capitalistico. Tende a compor-se assim um corpo individual e coletivo resistente à
cafetinagem da vida, capaz de a repelir.
De tais reapropriações coletivas da pulsão depende a possibilidade de constituição de campos
de emergência de acontecimentos, nos quais configuram-se outros modos de existência e suas
respectivas cartografias.

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Dez sugestões para descolonizar o inconsciente
1. Desanestesiar a vulnerabilidade às forças em seus diagramas variáveis, potência da subjetividade
em sua experiência fora-do-sujeito;

2. Ativar o saber-do-corpo: a experiência do mundo em sua condição de vivo, cujas forças


produzem efeitos em nossa condição de vivente;

3. Desobstruir o acesso à tensa experiência do estranho-familiar;

4. Não denegar a fragilidade resultante da desterritorialização desestabilizadora que o estado


estranho-familiar promove inevitavelmente;

5. Não interpretar a fragilidade e seu desconforto como ‘coisa ruim’, nem projetar sobre eles
leituras fantasmáticas (ejaculações precoces do ego, provocadas por seu medo de desamparo
e falência e suas consequências imaginárias: o repúdio, a rejeição, a exclusão social e a
humilhação);
6. Não ceder à vontade de conservação das formas e à pressão que esta exerce contra a vontade de
potência da vida em seu impulso de produção de diferença. Sustentar-se no fio tênue deste estado
instável até que a imaginação criadora construa um lugar de corpo-e-fala que, por ser portador da
pulsação do estranho-familiar, seja capaz de atualizar o mundo virtual que esta experiência anuncia,
permitindo assim que as formas agonizantes acabem de morrer;

7. Não atropelar o tempo próprio da imaginação criadora, para evitar o risco de interromper a
germinação de um mundo e, com isso, tornar a imaginação vulnerável a deixar-se desviar pelo regime
colonial-cafetinístico. Tal desvio transforma a imaginação criadora em mera ‘criatividade’ a serviço
da reprodução do status quo que, mascarado de ‘novidade’, torna-se sedutor e mobiliza o desejo de
consumo;

8. Não abrir mão do desejo em sua ética de afirmação da vida, o que implica em mantê-la fecunda,
fluindo em seu processo ilimitado de diferenciação;

9. Não negociar o inegociável: tudo aquilo que impediria a afirmação da vida, em sua essência de
potência de criação. Aprender a distinguí-lo do negociável: tudo aquilo que se poderia reajustar porque
não obstaculiza a manifestação da força vital instituinte mas, ao contrário, gera as condições objetivas
para que ela se realize em seu destino de produção de acontecimento;

10. Praticar o pensamento em sua plena função: indissociavelmente ética, estética, política, crítica e
clínica. Isto é, reimaginar o mundo em cada gesto, palavra, relação, modo de existir – toda vez que a
vida assim o exigir;
Vale lembrar que este trabalho de artesania de si, do qual depende a
descolonização na esfera micropolítica, implica um esforço constante que
jamais atinge sua plena e definitiva realização. Ao longo de nossa existência,
oscilamos entre políticas do desejo que variam entre seus dois extremos.

De um lado, a submissão ao poder dos fantasmas que nos trazem de volta


para nosso personagem habitual na cena colonial-capitalística, com o qual
participamos das relações de abuso (o que inclui o personagem da vítima).

De outro, um trabalho sem fim para desmanchar este personagem, nos


reapropriarmos da pulsão e, por ela guiados, criarmos um outro persoagem,
que esteja à altura da vida, encarnando sua potencia de transfiguração.

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É neste horizonte que situam-se as pistas e sugestões aqui indicadas; elas
trazem as marcas dos limites atuais de meu trabalho nesta direção.

Sendo este um trabalho infinito de cada um e de muitos, tais pistas e sugestões


estão aqui para serem revistas, reajustadas, ampliadas, transformadas,
multiplicadas ou até mesmo abandonadas em favor de outras, mais precisas e
fecundas.

É isto o que espero com a apresentação destas ideias.

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Esta apresentação é, portanto, dedicada a todos aqueles cujos
gestos instauram um território relacional onde os inconscientes
encontram ressonâncias para sua insurreição: uma rede para
aninhar os germes de futuros.

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