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Livro das Horas

Para prática diária e sazonal

Clann Bhride
Filhos de Brighid
Acendei-me como Vossa chama.
Tocai-me como Vossa harpa.
Mantende-me em Vosso manto.
Guiai-me à Vossa lareira.
Para saber mais sobre o Clann Bhride, acesse
https://clannbhride.wordpress.com/ e
https://www.facebook.com/groups/clannbh
ride/

Copyright ©2013 Aster Breo, Finn, Gilbride, Sage

Todo o material criado pelos membros do Clann


Bhride, exceto onde indicado em contrário.

Traduzido por Marcelo Paschoalin, com a


colaboração de Rowena A. Seneween
Índice
SOBRE O CLANN BHRIDE ..................................................... 5
OS NOVE ELEMENTOS DO CLANN BHRIDE ......................... 11
DEDICAÇÃO ....................................................................... 29
PRÁTICAS DIÁRIAS ............................................................ 35
PRIMEIRA HORA: ORAÇÕES DE AMANHECER .............................. 38
1. Oração das Três Irmãs ............................................. 38
2. Oração do Acendimento da Chama ......................... 38
3. Oração do Amanhecer ............................................. 39
SEGUNDA HORA: ORAÇÕES DE GRATIDÃO ................................. 41
1. Graça ....................................................................... 41
2. Oferendas ................................................................ 41
3. Oração do Dia .......................................................... 43
TERCEIRA HORA: ORAÇÕES DE ANTES DE DORMIR ...................... 45
1. Oração dos Sete Elementos ..................................... 45
2. Oração do Acendimento da Chama ......................... 46
3. Oração Noturna ....................................................... 48
PRÁTICAS OCASIONAIS ..................................................... 51
CONTAS DE ORAÇÃO .............................................................. 53
GUARDA DO POÇO ................................................................ 56
SAIN................................................................................... 58
CURA ................................................................................. 60
SLOINNTIREACHD BRIDE ......................................................... 62
FESTIVAIS DO FOGO .......................................................... 67
BRIGHID E OS TEMAS DOS FESTIVAIS ......................................... 69
VISÃO GERAL DOS RITUAIS ...................................................... 69
IMBOLC............................................................................... 71
Latha an Caillich .......................................................... 73
BELTANE ............................................................................. 74
Solstício de Verão ........................................................ 75
LUGHNASADH ...................................................................... 76
Cailleach an Dudain ..................................................... 77
SAMHAIN ............................................................................ 78
Solstício de Inverno ...................................................... 79
RITOS DE PASSAGEM ........................................................ 81
BENÇÃO DE NASCIMENTO ....................................................... 83
BENÇÃO AO JOVEM ADULTO ................................................... 85
BÊNÇÃO DO LAR.................................................................... 89
BÊNÇÃO AOS MORTOS ........................................................... 91
ENSAIOS E INFORMAÇÕES ................................................ 93
BRIGHID: SENHORA DAS NOSSAS LAREIRAS, SENHORA DOS NOSSOS
CORAÇÕES............................................................................ 95
O QUE É O PAGANISMO BRIGIDINO? ....................................... 141
A BRIG: ENERGIA DIVINA DA CRIAÇÃO .................................... 148
SANTA E AVATAR................................................................. 154
PREPARANDO UM ALTAR ...................................................... 158
PREPARANDO UMA CRUZ DE BRIGHID ..................................... 160
O RITUAL DO CALDEIRÃO ...................................................... 166
Uma prática bárdica mística ...................................... 166
Sobre o Clann Bhride

5
O Clann Bhride, ou os Filhos de Bri-
ghid, é um pequeno grupo de pessoas
que, juntas, construíram uma estrutura
e uma prática religiosa devotada à deu-
sa celta Brighid e aos Seus Mistérios.
O Clann Bhride tem uma base sólida
na história, no folclore, na tradição e no
mito. Porém, essa base é apenas o co-
meço: os antigos celtas dependiam da
história e do conhecimento, mas davam
ainda mais ênfase e reverência ao Im-
bas, à inspiração e à adaptação.
Como membros de uma sociedade
ocidental moderna, buscamos inspira-
ção e criação contemporânea, usando
várias ferramentas de estudo para in-
terpretação dos textos, dos trabalhos
criativos, e da síntese com outras inspi-
rações religiosas para agregar à
fundação histórica. Apesar de não nos
considerarmos Reconstrucionistas Cel-
tas, nosso objetivo é criar um caminho
espiritual focado especificamente em
Brighid e em Seus Mistérios, baseado na
história e moldado pela inspiração. As-
sim, por meio do Clann Bridhe,
esperamos compartilhar nosso entender
acerca de Brighid e nosso meio de hon-

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rá-La cultivando uma prática que é re-
levante às nossas vidas hoje, e que seria
também reconhecida como autêntica
por qualquer devoto de Brighid dos
tempos antigos.
Portanto, o trabalho de pesquisa e
análise das evidências é um dos guias
de nossa prática, mas é algo que não faz
do Clann Bhride um caminho de estu-
do, mas de devoção. Não sentimos que
precisamos provar algo, nem conside-
ramos nossas teorias como hipóteses
que precisem ser testadas e comprova-
das ou não. Ao invés disso, estamos
interessados em usar tais perguntas
para explorar completamente essas e
outras ideias acerca de Brighid, Suas
origens, Sua natureza, Sua obra, e nossa
relação com Ela.
Foi ao empreender o esforço de cons-
truir um caminho estruturado e
pesquisar as culturas celtas mais a fun-
do que descobrimos como A adorar e
como Dela nos aproximar. Pesquisa e
aprendizado são atos devocionais para
nós, mas não são o produto final de
nossos esforços: nossa pesquisa é uma
ferramenta no desenvolvimento de uma

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prática viva, e a usamos para construir
a estrutura e a substância de um cami-
nho espiritual contemporâneo que tem
relevância no mundo real e funciona de
verdade para pessoas reais, pessoas
como a gente.
O cerne desse caminho é tentar com-
preendê-La, e à Sua obra, e ao Chamado
que Ela nos faz: o Chamado para reali-
zar Sua obra. Brighid tem muito a fazer,
e Ela nos quer, pois precisa de nós para
ajudá-La a fazê-lo.
A pergunta que devemos nos fazer é
esta: O que devo fazer por Brighid? Ou O
que Brighid tenta fazer através de mim? Ou
ainda, Como eu melhor posso servi-La?
Enquanto continuamos a estruturar
nossa prática, traremos nossos pensa-
mentos e nossas teorias pessoais à vida,
assim como Brighid traz o fogo da ins-
piração em palavras, em obras de arte,
em nas histórias que temos como nos-
sas.
—Aster Breo e Finn

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Os Nove Elementos do
Clann Bhride

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1. O Clann Bhride, ou os Filhos de Bri-
ghid, é uma ordem religiosa para devotos da
deusa Brighid que ouviram o chamado para
um estilo de vida de oração e prática espiri-
tual diária.
O Filhos de Brighid procuram levar
vidas de foco e devoção extraordinários,
realizando a obra de Brighid neste
mundo por quaisquer meios possíveis
sob Sua orientação.
É claro que o melhor meio de desco-
brir o que Brighid deseja de você é
simplesmente perguntar a Ela, mas po-
de ser de grande ajuda pensar sobre os
diferentes aspectos de Brighid como
caminhos de serviço:
 Poesia – não se refere somente à
poesia, mas também música, sa-
bedoria, literatura, aprendizado e
prática mística. Todos esses con-
ceitos eram parte do caminho da
poesia entre os antigos irlandeses
e outros povos celtas.
 Forja – também se refere a qualquer
forma de artesanato, escultura, ou
trabalho criativo manual.

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 Cura – também tem relação com
qualquer tipo de cura – mental, fí-
sica ou espiritual.
 Justiça – pode se referir à defesa
daqueles que se veem privados de
seus direitos, como no conto de
Brig Ambue; à hospitalidade e à
provisão de comida e bebida gra-
tuita a quem precisar, como no
conto de Brig Briugu; ou mudar o
curso da guerra, trabalhando pela
paz, como era dito que a Abades-
sa de Kildare o fazia.
Apesar de cada um dos Filhos de Bri-
ghid ser chamado principalmente para
atuar como poetas, artesãos ou curan-
deiros, o aspecto da justiça de Brighid é
importante para o Clann Bhride: os
Filhos de Brighid trabalham pela justiça
social e pela paz usando todos os meios
possíveis.

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2. Os Filhos de Brighid vivem como sacer-
dotisas e sacerdotes da deusa Brighid em
todas as Suas formas e por todos os Seus
nomes, incluindo as três irmãs Brighid a
Poetisa, Brighid da Forja, e Brighid a Curan-
deira, filhas de Dagda nos mitos gaélicos.
Nesse contexto, a palavra sacerdotisa
ou sacerdote não se refere (somente) ao
serviço ministerial em nome de uma
congregação, mas à prática devocional
da deusa para e por Ela. Uma sacerdoti-
sa do Clann Bhride pode ou não estar
envolvida em uma comunidade maior
para a prática espiritual, e pode ou não
também cumprir um papel ministerial
nessa comunidade de acordo com as
circunstâncias envolvidas: ser uma sa-
cerdotisa do Clann Bhride é atuar como
uma sacerdotisa de um templo nos
tempos antigos, cujo dever principal era
a de louvar a divindade diariamente.

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3. Os Filhos de Brighid A honram como
divindade criadora primal, que forjou o
universo (como uma artesã) ou acompanhou
seu nascimento (como uma parteira) ou
entoou uma canção que o formou (como
uma poetisa).
Na lógica polivalente da religião poli-
teísta, a crença de que Brighid criou o
universo não contradiz nenhuma lenda
ou crença de que outra divindade o fez.

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4. Os Filhos de Brighid reconhecem Santa
Brígida de Kildare como um avatar da deusa
antiga, e consideram que as histórias relati-
vas à santa se relacionam igualmente com
as da deusa.
Uma teoria acerca de Santa Brígida e
suas dezenove freiras é que formavam
originalmente uma ordem de sacerdoti-
sas ou druidesas que guardavam a
chama eterna da deusa Brighid em Kil-
dare, sendo sua grande sacerdotisa
vista como a encarnação terrena de Bri-
ghid. Se essa sacerdotisa teve de se
converter ao Cristianismo para preser-
var a chama de Brighid, pode ser essa a
origem das lendas da santa. E na nossa
época, Brighid começa a Se revelar co-
mo uma deusa novamente depois de
tantos séculos.

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5. Inspirados pelos exemplos de Santa
Brígida de Kildare, assim como outras ma-
nifestações da deusa Brighid como Brig
Ambue e Brig Bretach, os Filhos de Brighid
estão comprometidos com o trabalho pela
justiça social e pelo avanço da causa da paz.
Entre os povos da Idade do Ferro que
primeiro clamaram por nossa deusa
Brighid, a guerra era um fato pratica-
mente constante em suas vidas. Seus
mitos e lendas têm muito a ver com as
ações dos heróis guerreiros e as bata-
lhas dos reis e dos deuses.
Apesar disso, Brighid se destaca das
demais divindades por Sua obra ao
mudar os rumos da guerra, assim como
representantes da abadessa de Kildare
também o faziam. Antes dos deuses das
Tuatha de Danann lutarem contra os
gigantes Fomores na mitologia irlande-
sa, Brighid se casou com o rei Bres, um
meio-Fomor, e com ele teve um filho
chamado Ruadan, numa forma de bus-
car a reconciliação entre os dois lados.
Quando Ruadan foi morto por Goibniu
na Segunda Batalha de Moytura, Brighid
inventou o costume das carpideiras en-
quanto lamentava e chorava por Seu

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filho morto. Dizia-se que Seus animais
sagrados – Fe, Men e Torc Triath – tam-
bém pranteavam ao fim dos ataques e
batalhas. Em Sua manifestação como
Brig Ambue, Ela defendeu os forastei-
ros Ambue (aqueles que não tinham vacas)
e purificou os piratas de rio que tinham
agido como bandidos para dar sustento
às suas famílias. Em Sua manifestação
como Brig Bretach, Ela julgou a favor
dos direitos das mulheres. Em Sua ma-
nifestação como Brig Briugu, Ela deu
hospitalidade sem fim na forma de co-
mida, bebida e teto sem nada cobrar.
Em Sua manifestação como Santa Brígida
de Kildare, Ela era a campeã inabalável
dos pobres e impotentes, e Sua generosi-
dade era lendária.
Apesar de Brighid ter uma aspecto de
deusa da batalha (no papel de Santa
Brígida como soberana de Leinster e em
Seu epíteto como Bride nam Buadh, ou
Noiva das Vitórias), Ela se manifesta na
forma guerreira apenas para defender
contra agressão desvelada.

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6. Os Filhos de Brighid A honram e A re-
verenciam como uma deusa de origem
gaélica, mas também A consideram como
uma divindade mais antiga e mais vasta,
conhecida por diferentes nomes e por dife-
rentes povos. Entre os povos celtas, todas as
deusas do tipo Minerva Celta podem ser
honradas como parte de nossa prática. Al-
guns de nós acreditam que algumas ou
todas são a mesma deusa, mas isso não é
uma doutrina necessária.
As deusas celtas desse tipo incluem:
 As Deusas Brigidinas
 Brighid (também conhecida como
Brigid, Brigit, Brighde, Brid, Brig e
Bride) – deusa gaélica da poesia,
da forja e da cura, algumas vezes
representada como três irmãs.
Filha do Dagda, ex-esposa de Tui-
renn e Bres, mãe de Ruadan,
guardiã da vaca sagrada, do Torc
Triath, dos bois Fe e Men. Inven-
tora do lamento pelos mortos.
Associada ao sol, à lua, às estrelas,
ao fogo e à água, ao amanhecer, à
cobra, à primavera e a todos os es-
tados limítrofes do ser. A Exaltada.

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 Sulis – deusa bretã da cura, dos
poços e águas curativas, da mal-
dição e da justiça. Representada
na iconografia romano-bretã co-
mo uma mulher à margem da
água com uma face radiante e ca-
belos curtos. A Que Tudo Vê.
 Sirona – deusa gaulesa do céu no-
turno, da cura, das fontes termais
e das fontes. Representada na ico-
nografia romano-gaulesa como
uma mulher segurando uma co-
bra numa mão e uma cesta de
ovos na outra. A Estrelada.
 Belisama – deusa gaulesa da luz, do
fogo, da cura, das artes, da água e
dos rios. Representada na icono-
grafia romano-gaulesa como uma
mulher radiante, sem blusa mas
trajando uma longa saia, que segu-
rava uma cobra. Verão Brilhante.
 Matres Brigaecae – deusa tríplice
gaulesa da fertilidade, da prospe-
ridade, da maternidade e do
cuidado. Representada na icono-
grafia romano-gaulesa como três
mulheres sentadas segurando fru-

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tas, pães ou bebês. As Mães Exal-
tadas.
 Briganti – deusa bretã da cultura,
da fertilidade, da cura, da vitória
e da proteção, conhecida como Bri-
gântia no período romano-bretão.
Representada na iconografia ro-
mano-bretã como uma mulher
segurando uma lança na mão di-
reita e um globo da vitória na
esquerda. A Exaltada.
 Brigindona – deusa gaulesa. A
Exaltada.
 Brig Ambue – Brighid dos Sem Gado
ou Brighid dos Destituídos. Proteto-
ra e purificadora dos guerreiros
renegados que viviam fora da es-
trutura tribal. Brig Ambue era
invocada para reintegrar esses
guerreiros na comunidade e puri-
ficá-los de suas ações em batalha.
 Brig Brethach – Brighid dos Julgamen-
tos. Juíza, legisladora e defensora
dos direitos das mulheres.
 Brig Briugu – Brighid da Hospitali-
dade. Uma briugu ou hospitalária
era uma pessoa que mantinha as
portas de sua casa sempre abertas,

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oferecendo hospitalidade gratuita
a quem passasse.
 Brig Euit – Brighid da Piedade. San-
ta Brígida de Kildare.
 Grande Brid dos Cavalos – um
aspecto sombrio de Brighid, asso-
ciado ao comportamento elitista
dos bardos com suas práticas di-
vinatórias. Na história da Grande
Brid dos Cavalos, ela pede a um
rei três presentes impossíveis em
nome dos poetas: amoras em ja-
neiro, seu quinhão de lombo de
um porco que nunca nasceu, e ca-
valgar uma égua branca de orelhas
vermelhas até que se cansasse.
 Cerridwen – também conhecida
como Ceridwen ou Kerridwen, é
musa dos bardos galeses, guardiã
do caldeirão da sabedoria e mãe
divina do bardo Taliesin.
 A Cailleach – criadora primal, deu-
sa do inverno e da natureza
selvagem. No Samhain, a Cail-
leach ou Beira, mãe de gigantes,
atinge o solo com seu martelo e o
congela por todo o inverno. De
acordo com um conto escocês, a

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Cailleach aprisiona Bride, Rainha
do Verão, na montanha de Ben
Nevis, do Samhain até a primave-
ra. Bride é salva de sua prisão
invernal pelo jovem deus Aengus,
que se apaixona por ela. Juntos
eles combatem a mãe de Aengus,
a Cailleach, que procura impedir
a primavera. Nas histórias irlan-
desas, Aengus e Brighid são
irmãos e Aengus é o filho de Bo-
ann e do Dagda. De acordo com
outra versão da mesma história, a
Cailleach e Bride são a mesma en-
tidade, e a Cailleach se transforma
em Bride toda primavera.

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7. Os Filhos de Brighid reconhecem e hon-
ram Sua história na cultura gaélica, mas não
A consideram apenas uma deusa gaélica.
Na era medieval, Santa Brígida rece-
bia grande honra e reverência em áreas
não-gaélicas como nas terras baixas
escocesas, na Inglaterra e em outros
locais. De uma forma ou de outra, Ela
foi honrada fora da cultura gaélica por
muitos séculos. Assim, não identifica-
mos nossa prática como um Reconstru-
cionismo Celta.
Porém, um aspecto da justiça social é
a sobrevivência cultural e a autonomia
dos povos nativos. Dessa maneira, o
conflito pela sobrevivência das línguas
e culturas celtas (irlandesa, manesa,
gaélico-escocesa, galesa, córnica e bretã)
é particularmente relevante para os
devotos de Brighid, considerando Sua
longa história nessas culturas.
Consequentemente, apesar de não
considerarmos Brighid uma divindade
exclusivamente gaélica ou celta, nós
honramos Sua importância na cultura
gaélica e apoiamos a luta dos povos que
falam esse idioma para manter sua lín-
gua e sua identidade.

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8. Todas as deusas associadas com o sol, a
lua, as estrelas, o fogo, a água fresca, a ferti-
lidade e a abundância, a cura, o
conhecimento e as artes necessárias para a
convivência em sociedade podem ser honra-
das como parte dessa prática.
Não há uma doutrina requerida pelo
Clann Bhride relativa ao relacionamen-
to exato dessas deusas com Brighid.
Alguns de nós acreditam que sejam
manifestações de um mesmo poder sob
diferentes contextos culturais.
Deusas com essas associações inclu-
em Vesta, Minerva, Saule, Hina e
Sarasvati, mas essa não é uma lista res-
tritiva.
Porém, apesar dos Filhos de Brighid
poderem estudar e reverenciar tais deu-
sas como parte de sua prática, é
importante lembrar que cada deusa tem
um contexto cultural e religioso pró-
prio, e mesmo se essas deusas
manifestarem os mesmos poderes e
aspectos da deusa Brighid, elas não são
simplesmente as mesmas: cada uma
deve ser estudada e honrada dentro do
contexto e da história da cultura de Sua
origem.

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9. Os Filhos de Brighid adoram nossa
deusa como uma entidade real, e não como
uma metáfora ou um arquétipo.
Ela ouve nossas orações, aprecia nos-
sas oferendas e se comunica com os
seres humanos por meio da inspiração,
dos sonhos e de outras maneiras. Tão
importante quanto é estudar Seu saber e
Sua história é estabelecer uma relação
pessoal com Ela, pois Ela ainda está no
processo de se revelar.
—Gilbride, Aster Breo e Sage

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Dedicação

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Este ritual é usado para autodedicação
como Filho de Brighid, e é baseado na
bênção do nascimento.

1
Acenda uma vela com a oração de acendi-
mento da chama:
Acendo minha vela como Brighid o
faz; Sua vela é o sol e Seu altar é a terra.
E, assim como esta pequena vela ilumi-
na este aposento, que Sua grande vela
ilumine o universo.
Salve, oh madrinha! Vosso amor é
uma chama. Dai-me a força para carre-
gar Vossa ternura; dai-me o poder para
portar Vossa luz. Permiti que meu cora-
ção se torne um fogo perpétuo aceso
pela sacerdotisa de todos os meus pen-
samentos.
Salve, oh camarada! Salve, oh amiga
fiel! Eu Vos confidenciarei meus segre-
dos hoje pois sei que ireis me confortar;
acenderei meu coração com Vossa luz
até que eu brilhe como ouro.

31
2
Faça com que a luz da vela brilhe sobre a
água para abençoá-la.
Uma vez que a água tenha sido abençoa-
da, pegue três, e depois nove, gotas ou
conchas de água e abençoe a si mesmo com
estas palavras:
Uma gotícula de água do rio de Bri-
ghid, uma gotícula de água do poço de
Brighid, uma gotícula de água das mãos
de Brighid, sobre minha cabeça e meu
coração como Filho de Brighid.
Para me ajudar, para me guardar, pa-
ra me proteger, para me envolver, para
me purificar e para me ungir com a
graça da deusa.
Uma gotícula para a saúde, uma gotí-
cula para a força, uma gotícula para a
beleza, uma gotícula para a arte, uma
gotícula para a prosperidade, uma gotí-
cula para a paz, uma gotícula para a
coragem, uma gotícula para o caráter,
uma gotícula para a alegria de Brighid,
para que Sua proteção me envolva.

32
3
Brighid da Terra, abençoai-me com
prosperidade, abençoai aqueles que
amo com prosperidade, abençoai todo o
mundo. Dedico meu corpo à deusa Bri-
ghid.
Brighid das Águas, abençoai-me com
saúde, abençoai aqueles que amo com
saúde, abençoai todo o mundo. Dedico
meu sangue à deusa Brighid.
Brighid do Sol, abençoai-me com be-
leza, abençoai aqueles que amo com
beleza, abençoai todo o mundo. Dedico
minha visão à deusa Brighid.
Brighid das Nuvens, abençoai-me
com sabedoria, abençoai aqueles que
amo com sabedoria, abençoai todo o
mundo. Dedico meus pensamentos à
deusa Brighid.
Brighid dos Ventos, abençoai-me com
vitalidade, abençoai aqueles que amo
com vitalidade, abençoai todo o mundo.
Dedico minha respiração à deusa Bri-
ghid.
Brighid das Pedras, abençoai-me com
força, abençoai aqueles que amo com
força, abençoai todo o mundo. Dedico
meus ossos à deusa Brighid.

33
Brighid do Espírito, abençoai-me com
iluminação, abençoai aqueles que amo
com iluminação, abençoai todo o mun-
do. Dedico meu espírito à deusa
Brighid.

34
Práticas diárias

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Os Filhos de Brighid fazem três conjun-
tos de orações diariamente: orações de
amanhecer, orações de gratidão, e ora-
ções de antes de dormir. Porém, de
acordo com as necessidades individu-
ais, os elementos da prática podem
variar: por exemplo, oferendas podem
ser feitas em quaisquer dessas três ho-
ras, os praticantes podem mudar a
ordem de suas orações de acordo com
sua rotina, e aqueles sem tempo sufici-
ente para recitar todas as orações
podem fazer apenas algumas delas.

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Primeira Hora: Orações de
Amanhecer
Opcional: Gabhaim Molta Bride, Sloinnti-
reachd Bride

1. Oração das Três Irmãs


Brighid da poesia, abençoai meu cora-
ção com poesia, e permiti enxergar
Vossa poesia em todas as coisas deste
mundo.
Brighid da cura, abençoai meu cora-
ção com cura, e permiti levar Vossa
cura a todos os seres deste mundo.
Brighid da forja, forjai meu coração
com Vosso martelo, e permiti criar neste
dia como Vós o fazeis todos os dias.

2. Oração do Acendimento da
Chama
Acendo minha vela como Brighid o faz;
Sua vela é o sol e Seu altar é a terra. E,
assim como esta pequena vela ilumina
este aposento, que Sua grande vela ilu-
mine o universo.

38
Salve, oh madrinha! Vosso amor é
uma chama. Dai-me a força para carre-
gar Vossa ternura; dai-me o poder para
portar Vossa luz. Permiti que meu cora-
ção se torne um fogo perpétuo aceso
pela sacerdotisa de todos os meus pen-
samentos.
Salve, oh camarada! Salve, oh amiga
fiel! Eu Vos confidenciarei meus segre-
dos hoje pois sei que ireis me confortar;
acenderei meu coração com Vossa luz
até que eu brilhe como ouro.

3. Oração do Amanhecer
Sol da manhã e rainha do dia, donzela
das flores e esperança do entardecer!
Que eu seja abençoado com a luz do sol
e com todas as graças frutíferas; que eu
seja abençoado com amor como o calor
da Vossa chama.
Oh, sol da manhã, Vosso sorriso é be-
lo e os relances de Vossos olhos são os
raios de sol; quando levantardes da
cama do oceano toda a terra sorrirá em
gratidão; quando andardes sobre os
campos dos céus toda a terra suspirará
com alegria.

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Trouxestes-me da noite, oh Brighid, e
me guiastes até a manhã. Que Vós me
protejais por todo o dia e me guieis de
novo até a noite.
Oh, Brighid do nascente, Vosso rosto
é belo, Vossos olhos são como o fogo
dos céus e Vosso beijo é como hidromel;
que neste, e em todos os dias, Vós nos
abençoeis com poesia; que neste, e em
todos os dias, Vós nos abençoeis com
amor.
Curvo minha cabeça em oração sob o
olho de Brighid, o sol nascente entre o
branco das nuvens, a glória sorridente
do dia. Derramai Vossa poesia como
leite com mel no cálice da manhã; e
permiti que eu prove de Vosso leite em
cada momento.

40
Segunda Hora: Orações de
Gratidão
1. Graça
Oh, amada Brighid, por meu alimento
eu Vos agradeço. Oh, amada Brighid,
por minha bebida eu Vos agradeço. Oh,
amada Brighid, por minha respiração
eu Vos agradeço, e por tudo aquilo que
o dia colocar em meu caminho.

2. Oferendas
As oferendas podem variar dependendo da
estação. Elas se baseiam numa lista de ali-
mentos tradicionalmente consumidos nos
quatro festivais do fogo, assim como descrito
em Goddesses in Celtic Religion, de No-
emie Beck:
De Imbolc a Beltane – limpeza ritual das
mãos, cabeça e pés com oferta de qual-
quer alimento.
De Beltane a Lughnasadh – oferta de cer-
veja ou de queijo cottage.
De Lughnasadh a Samhain – oferta de
quaisquer frutas ou ervas.

41
De Samhain a Imbolc – oferta de quais-
quer nozes, carne, cerveja, soro de leite
coalhado ou manteiga.
Praticantes que não estiverem em condi-
ções de ofertar alimentos podem acender
uma vela ou derramar água límpida no
lugar, ou visualizar a oferta apropriada.
Cada pensamento de minha mente a
Vós, cada palavra de minha boca a Vós,
cada ato de minha mão a Vós, oh Bri-
ghid das bênçãos.
Que eu pronuncie cada palavra com a
justiça de Brighid; que eu pronuncie
cada palavra com a sabedoria de Bri-
ghid; que eu pronuncie cada palavra
com a bondade de Brighid, deste dia até
o fim dos meus dias.
Em cada planta da terra desabrochan-
te, em cada fera da floresta, e em cada
peixe do oceano verde-azulado, que eu
sinta Vossa presença. Em cada raio do
sol que dá a vida, em cada respirar do
vento, e em cada movimento da minha
mente interior, que eu sinta Vossa pre-
sença.
Rainha-donzela do fogo e da água,
rainha-donzela da gentileza, rainha-
donzela do javali e do gado, rainha-

42
donzela das lágrimas! Deusa brilhante
do poço da sabedoria, deusa brilhante
da cura, deusa brilhante da vaca das
bênçãos e da harpa dos bardos!
Sois um bosque de macieiras e um
tronco de paz; Sois uma xícara de bon-
dade e um gole de júbilo; Sois um raio
do poder de Imbas sobre as águas do
Boyne.

3. Oração do Dia
Oh, gentil Brighid do cabelo dourado,
sede como uma chama brilhante diante
do caminho que eu trilhar. Protegei-me
dos tropeços e imbuí meu ser com amor
para que eu brilhe com Vossa luz ao
ajudar os outros.
Curvo minha cabeça em oração sob o
olho do sol, sob a graça de Brighid, em
amor e gratidão. Levai-nos ao amor
quando passarmos pela ira; levai-nos à
beleza quando andarmos pela feiura
através de cada sombra e cada luz,
através de cada dia e cada noite.
Oh, Brighid, que Vossa luz me toque,
que Vossa luz brilhe por mim, do topo
da minha cabeça até a sola dos meus

43
pés. Oh, Brighid, que Vossa luz se ma-
nifeste em mim, e que Vossa luz se
renove em mim, da sola dos meus pés
até o topo da minha cabeça.

44
Terceira Hora: Orações de
Antes de Dormir
Opcional: Gabhaim Molta Bride, Sloinnti-
reachd Bride

1. Oração dos Sete Elementos


Brighid da Terra, abençoai-me com pros-
peridade, abençoai aqueles que amo com
prosperidade, abençoai todo o mundo.
Dedico meu corpo à deusa Brighid.
Brighid das Águas, abençoai-me com
saúde, abençoai aqueles que amo com
saúde, abençoai todo o mundo. Dedico
meu sangue à deusa Brighid.
Brighid do Sol, abençoai-me com be-
leza, abençoai aqueles que amo com
beleza, abençoai todo o mundo. Dedico
minha visão à deusa Brighid.
Brighid das Nuvens, abençoai-me
com sabedoria, abençoai aqueles que
amo com sabedoria, abençoai todo o
mundo. Dedico meus pensamentos à
deusa Brighid.
Brighid dos Ventos, abençoai-me com
vitalidade, abençoai aqueles que amo
com vitalidade, abençoai todo o mundo.

45
Dedico minha respiração à deusa Bri-
ghid.
Brighid das Pedras, abençoai-me com
força, abençoai aqueles que amo com
força, abençoai todo o mundo. Dedico
meus ossos à deusa Brighid.
Brighid do Espírito, abençoai-me com
iluminação, abençoai aqueles que amo
com iluminação, abençoai todo o mun-
do. Dedico meu espírito à deusa
Brighid.

2. Oração do Acendimento da
Chama
Guardar a chama de Brighid é uma maneira
popular de honrar Brighid e dedicar seu
tempo para desenvolver um relacionamento
com Ela. Alguns guardiões da chama per-
tencem a celas, grupos de 19 pessoas que se
revezam em manter acesa uma chama por
um ciclo de 20 dias para que ela se mante-
nha queimando sem interrupção. Cada
guardião da chama é responsável pelo fogo
do nascer ao por do sol. O 20º dia é conside-
rado o Dia de Brighid, e Ela toma conta da
própria chama naquele dia.

46
Porém, não é necessário pertencer a uma
célula, e muitos guardiões da chama man-
têm essa prática sozinhos. Contudo, uma
vez que não é seguro manter uma chama
acesa 24 horas em nosso estilo de vida mo-
derno, muitos guardiões da chama têm
adotado meios de cuidar desse fogo metafori-
camente, usando velas de LED, joias
especiais, aplicativos de celular etc. para
representar a chama quando houver risco de
manter uma chama real acesa ou for impra-
ticável fazê-lo, ajudando o guardião da
chama a se manter atento ao seu comprome-
timento com Brighid.
Acendo minha vela como Brighid o
faz; Sua vela é o sol e Seu altar é a terra.
E, assim como esta pequena vela ilumi-
na este aposento, que Sua grande vela
ilumine o universo.
Salve, oh madrinha! Vosso amor é
uma chama. Dai-me a força para carre-
gar Vossa ternura; dai-me o poder para
portar Vossa luz. Permiti que meu cora-
ção se torne um fogo perpétuo aceso
pela sacerdotisa de todos os meus pen-
samentos.
Salve, oh camarada! Salve, oh amiga
fiel! Eu Vos confidenciarei meus segre-

47
dos hoje pois sei que ireis me confortar;
acenderei meu coração com Vossa luz
até que eu brilhe como ouro.

3. Oração Noturna
Saudações a Vós, oh, mãe brilhante,
mãe radiante das estrelas e dos mun-
dos. Saudações a Vós, oh, brilhante
artesã de estrelas, radiante artífice de
mundos e sóis. Saudações a Vós, oh,
oceano brilhante, oh, rio de leite e luz,
oh, rainha do tempo.
Oh, Brighid do sol poente, Vós dor-
mis no oceano como em uma cama de
flores; o rio dos céus é o leite de Vossa
vaca e as raízes da Árvore da Vida são
como um travesseiro para Vossa cabeça.
Sol do fim de tarde, Vossos passos
são orgulhosos; as nuvens dos céus são
os campos de Vosso vaguear. As estre-
las dos céus são Vossas irmãs e filhas; o
oceano é Vossa cama e o mundo é Vos-
so jardim.
Oh, Brighid da luz das estrelas, que
minhas orações cheguem a Vós, que
elas se ergam como fumaça até Vós,
ofertadas por meu coração. Oh, Brighid

48
da luz das estrelas, estai sempre próxi-
ma a mim, tão próxima a ponto de eu
não poder ver onde se encontra Vosso
fim e meu começo.
Guiai-me, oh Brighid, para além do
oceano da noite, como uma estrela so-
bre as profundas águas ruidosas. Como
uma vez forjastes meu corpo no coração
de Vossa estrela, que essa mesma es-
trela agora me guie pelas trevas.

49
Práticas Ocasionais

51
Contas de oração
Contas de oração podem ser feitas de prati-
camente quaisquer materiais, e os estilos
possíveis são limitados apenas pela criativi-
dade de seu criador, sendo usadas nos
turnos de guarda de chama ou outras ocasi-
ões especiais. Podem ser tanto um simples
conjunto de contas de plástico de brinquedo
unidas por um cordão, ou uma combinação
detalhada de pedras preciosas, podendo ser
feitas de modo a serem usadas como um
bracelete ou colar, carregadas no bolso, ou
até mesmo mantidas num altar. As contas
de oração do Clann Bhride são formadas por
nove contas focais, divididas por pequenas
contas separadoras. As contas focais são
escolhidas para representar:
 Brighid como deusa da poesia;
 Brighid como deusa da cura;
 Brighid como deusa da forja;
 Brighid como deusa da justiça;
 a associação de Brighid com o fogo;
 a associação de Brighid com a água;
 o conceito de fogo-na-água (geralmen-
te relacionado à inspiração);
 Brighid como Senhora das Estrelas;

53
 uma associação ou símbolo de Brighid
que tenha relevância pessoal para o
dedicante.
Além dessas contas focais, um conjunto
de contas de oração pode incluir amuletos
ou outros símbolos importantes para o dedi-
cante, que podem estar presentes num fio
preso a ele.
Brighid da poesia, abençoai meu co-
ração com poesia, e permiti enxergar
Vossa poesia em todas as coisas deste
mundo.
Brighid da cura, abençoai meu cora-
ção com cura, e permiti levar Vossa
cura a todos os seres deste mundo.
Brighid da forja, forjai meu coração
com Vosso martelo, e permiti criar neste
dia como Vós o fazeis todos os dias.
Brighid da justiça, preenchei meu co-
ração com justiça, e dai-me força para
agir por Vossa justiça em todos os meus
atos neste mundo.
Brighid do fogo, acendei meu coração
com Vossa chama, e dai-me paixão para
incandescer como Vosso fogo em todos
os meus atos neste mundo.
Brighid da água, refrescai minha
mente com Vossa água, e dai-me calma

54
para fluir como Vossa água em todos os
meus atos neste mundo.
Oh, Brighid do fogo na água, refleti
em mim como Vós o fazeis em Vosso
poço, assim como o fogo de Vosso raio
de sol se torna uno com Vossas águas, e
dai-me a graça que preciso para me
tornar uno convosco.
Oh, Brighid das estrelas brilhantes,
forjastes meu corpo em luz das estrelas,
forjastes os planetas e os cometas bri-
lhantes, forjastes os deuses e os
elementos.
Oh, Brighid dos meus desejos mais
profundos! Oh, Brighid do meu cora-
ção, bondosa criadora das esperanças
que nutro e de tudo o que me traz ale-
gria.

55
Guarda do Poço
Assim como a guarda da chama, a guarda
do poço é uma prática direcionada à honra
de Brighid e ao aprofundamento da relação
com Ela. Guardar um poço é uma oferenda à
Brighid na forma de tempo ou dinheiro
investido no cuidado de um corpo d’água
local.
Guardiões de poço podem, por exemplo,
passar seu tempo recolhendo o lixo ao longo
de uma praia ou das margens de um riacho,
ou se voluntariar com um grupo para res-
taurar um lago, ou mesmo fazer doações em
dinheiro para organizações ambientais que
lutem pela melhoria da proteção de manan-
ciais.
Afundo minha caneca em Vossa lím-
pida água fria e a ergo aos meus lábios
em solene oração: curai toda a doença
em mim até que eu fique tão límpido
como sois, até que eu brilhe como Vós,
até que seja abençoado por Vossas
águas.
Deusa da lua e deusa do sol, deusa da
terra e deusa das estrelas, deusa do
Mar, da Terra, e do Céu!

56
Oh, rainha do poço da sabedoria, Vós
conheceis nossas necessidades; Vós
sabeis os desejos secretos do coração
oculto. Estai conosco no fim da tarde e
nas horas noturnas; estai conosco em
nossas esperanças e em nossos anseios.

57
Sain
Uma sain, ou proteção, é feita com água
abençoada pelo fogo. Um método tradicional
de se proteger é ficar em pé, estender seu
braço e girar no eixo no sentido da marcha
do sol (anti-horário no Hemisfério Sul)
enquanto invoca a espada flamejante de
Brighid para protegê-lo. Chama-se a isso
caim, que significa circular, rodear ou dar a
volta, também pode ser feito em outra pes-
soa. Além disso, você pode proteger uma
área ou espaço sagrado rezando no leste, no
sul, no oeste e no norte, seguido de uma
oração direcionada ao céu sobre você e à
terra sob seus pés. A posição tradicional
para este tipo de oração é orans – braços
erguidos na altura dos ombros, cotovelos em
ângulos retos e mãos espalmadas.
Abençoai toda visão que colocardes
diante de mim; abençoai cada som e
cada sabor; abençoai cada aroma que
colocardes diante de mim, e abençoai
com Vossa própria bênção aquilo que
eu tocar.
Que Brighid me envolva em Seu
manto e me cerque com Sua chama; que
Ela erga a caneca de Seu Imbas aos

58
meus lábios para que em minhas veias
corra o fogo.
Oh, Brighid da poesia, preenchei meu
dia com beleza. Sede como o sol no céu
para iluminar o caminho diante de
mim, e abençoai tudo o que eu vir.
Coloco minha mente e meu corpo em
Vossas mãos, oh, Brighid, do topo da
minha cabeça até a sola dos meus pés.
Acendei minha mente e meus pensa-
mentos com a fagulha de Sua poesia;
iluminai meu corpo, da cabeça ao de-
dão, com Sua chama eterna.
Madrinha das profundezas do meu
coração, sede como o nascer do sol na
minha noite interior. Lançai um raio de
sol rosa e dourado sobre a superfície de
meu oceano; erguei-Vos das profunde-
zas das águas quando o mundo se unir
em canção.
Contemple a madrinha no céu da
manhã e A reverencie com as cordas
das harpas enquanto Ela cuida da terra:
Seu sorriso é leve e gentil e Seus olhos
são meigos! Que o dia seja uma canção
a Ela, e assim também cada dia do
mundo.

59
Cura
Sua pele é leve, Seu cabelo é leve, Seus
olhos são leves, Seu sorriso é leve; Suas
mãos são gentis e Sua voz é doce; Ela
abençoa o poço e Ela cura o doente. Que
Brighid esteja comigo nas horas do dia e
que Brighid esteja comigo ao cami-
nharmos em direção à noite.
Ela é como Ela sempre foi; Ela é como
Ela é; Ela é como Ela sempre será, no
eterno fluxo e refluxo. Que Brighid este-
ja comigo na maré alta, e que Brighid
esteja comigo quando as ondas segui-
rem para além das margens.
Que Brighid me proteja e que Brighid
me envolva como o calor de um manto
num dia de chuva fina. Que Brighid me
proteja, que Brighid me guarde, que a
brilhante Brighid me cure e me leve até
Ela.
A irmã da cura está acima e abaixo de
mim; a irmã da cura está ao meu redor
e próximo a mim; a irmã da cura está no
grande mar ruidoso; a irmã da cura está
na verde terra fértil; a irmã da cura está
no límpido céu azul.

60
Brighid é minha amiga e minha com-
panheira; Ela compôs uma música para
mim; Ela me ajudou e me curou todos
os dias, e é Ela que eu amo.
Vós sois como um caminho macio sob
meus pés, oh, Brighid; Sois o sol no céu;
Sois a estrela guia na escuridão da noi-
te, um bálsamo de cura para meu
coração.
Oh, Brighid da terra, curai este corpo.
Oh, Brighid do mar, curai este sangue.
Oh, Brighid do sol, curai este rosto. Oh,
Brighid das nuvens, curai esta mente.
Oh, Brighid do vento, curai esta respi-
ração. Oh, Brighid das pedras, curai
estes ossos. Oh, Brighid do espírito,
curai este espírito.

61
Sloinntireachd Bride
Um meio de honrar a história gaélica de
Brighid é aprender a Sloinntireachd Bride,
ou Genealogia de Brighid em sua forma
original. Essa oração tradicional foi regis-
trada na Carmina Gadelica de Alexander
Carmichael e era considerada um amuleto
de extremo poder de proteção. Mas é claro
que é mais fácil recitar o texto em gaélico se
você estudar o idioma, mesmo que num
nível introdutório.
O gaélico não é tão difícil de pronunciar
quanto se acredita, mas as regras de pro-
núncia são bem diferentes das que estamos
acostumados. Ao aprender gaélico usando
um livro ou curso online, uma das formas
de pronunciar corretamente as palavras é
cantar junto com gravações de músicas
tradicionais gaélicas. Em geral, muitas das
notações musicais incluem a letra tanto em
gaélico como em outro idioma, como inglês.
Depois de cantar algumas dessas canções
por alguns meses, você não só descobrirá
que o gaélico é mais fácil de pronunciar,
como também provavelmente terá aprendido
algumas músicas novas.

62
Ao estudar o idioma gaélico e aprender
como cantar músicas tradicionais, você
contribuirá para a sobrevivência da língua e
da cultura – outro meio de realizar a obra de
Brighid no mundo.
A música Gabhaim Molta Bride é ir-
landesa, e não gaélica, então a pronúncia e o
vocabulário são um tanto diferentes. Porém,
aprender a cantar essa música popular de
devoção Brigidina é outro bom meio de ado-
rar Brighid enquanto honra a cultura.
Muitas gravações dessa canção estão dispo-
níveis tanto online como em outros lugares.
Formas paganizadas de versões da
Sloinntireachd também são encontradas em
outros locais também, mas escolhemos não
usá-las. Fazemos isso porque, ao invés de
alterarmos quaisquer orações tradicionais
gaélicas para torná-las mais pagãs, preferi-
mos compor nossas próprias orações para
este Livro das Horas – as orações na Carmi-
na Gadelica, tesouros da cultura gaélica,
não são nossas para que as alteremos.
Pela mesma razão, apesar de adorarmos
Brighid como uma deusa, preferimos apre-
sentar a Sloinntireachd sem alterações,
incluindo sua mistura tradicional de ele-
mentos cristãos e pré-cristãos.

63
SLOINNEADH na Ban-naomh Bride,
Lasair dhealrach oir, muime chorr
Chriosda.
Bride nighinn Dughaill duinn,
Mhic Aoidh, mhic Airt, nitric Cuinn,
Mhic Crearair, mhic Cis, mhic Carmaig,
mhic Carruinn.

Gach la agus gach oidhche


Ni mi sloinntireachd air Bride,
Cha mharbhar mi, cha spuillear mi,
Cha charcar mi, cha chiurar mi,
Cha mhu dh’ fhagas Criosd an dearmad
mi.

Cha loisg teine, grian, no gealach mi,


Cha bhath luin, li, no sala mi,
Cha reub saighid sithich, no sibhich mi,
Is mi fo chomaraig mo Naomh Muire
Is i mo chaomh mhuime Bride.

E, em bom português1, isso se verte


para...

1
Em tradução de Bellouesus, encontrada em
https://bellodunon.com/2013/03/21/sloinntireachd-bhride-
a-genealogia-de-bride/ [acessado em 26-abr-2017]

64
A genealogia da santa donzela Bride,
Radiante chama de ouro, mãe adotiva
de Cristo,
Bride, filha de Dugall, o escuro,
Filho de Aodh, filho de Art, filho de
Conn,
Filho de Crearar, filho de Cis, filho de
Carmag, filho de Carrun.

A cada dia e a cada noite


Em que a genealogia de Bride eu disser
Morto não serei, não sofrerei vexação,
Aprisionado não serei, não serei ferido,
Tampouco deixar-me-á Cristo no es-
quecimento.

Não me queimarão o fogo nem o sol


nem a lua,
Lago algum afogar-me-á, nem água
nem mar,
Nem flecha de fada nem dardo de du-
ende me hão de ferir
Estarei sob a proteção de minha Santa
Maria
E minha bondosa mãe adotiva é minha
amada Bride.

65
Festivais do Fogo

67
Brighid e os Temas dos Fes-
tivais
As celebrações dos festivais são tradici-
onalmente realizadas na noite anterior à
data real.
 Imbolc: Brighid e Sua vaca visitan-
do os lares do mundo, a infante
Brighid ou Brideog.
 Beltane: Brighid e Aengus, ou Bri-
ghid como Pastora.
 Lughnasadh: Brighid como a Don-
zela da Colheita.
 Samhain: a Cailleach, ou Brighid
como a mãe enlutada.

Visão geral dos rituais


1. Passe o dia realizando as ativida-
des apropriadas até o pôr do sol.
2. Abençoe a água com fogo, abra o
círculo no espaço ritual e sain os qua-
drantes e todos os participantes.
3. Leia ou entoe orações.
4. Faça um banquete, com um lugar à
mesa para Brighid. Deixe também um
pouco da comida separada como ofe-

69
renda à Brighid, aos Sidhe, e a quais-
quer outros poderes apropriados.
5. Leia ou conte histórias tradicionais.
6. Deixa a comida ofertada do lado de
fora ou no altar. Libações, como leite,
também podem ser derramadas no chão
ou em limiares.
7. Celebre com música e dança.

70
Imbolc
1º de agosto
Em áreas que falam gaélico, este fes-
tival é conhecido como La Feile Bride, ou
Dia do Festival de Bride. É o festival mais
importante de Brighid e o começo do ano
ritualístico para os Filhos de Brighid.

Atividades sugeridas
1. Faça uma boneca de Brideog, ou
dealbh Bride, decorada com conchas,
cristais, fitas, flores e uma concha ou
cristal especial sobre o coração da bone-
ca (reul-iuil-Bride ou estrela guia de Bride).
Coloque a boneca numa leaba Bride ou
cama de Bride com um bastão branco ou
slachdan Bride representando aquele que
Ela carrega na primavera. Leve a bone-
ca para a porta de casa, dê as boas
vindas à Brighid, e A traga para dentro,
colocando-a num local de honra.
2. Faça cruzes de Brighid. Pendure
algumas e decore a cama de Bride com
outras.
3. Prepare o alimento para Feis Bride,
incluindo pães, mingau de aveia, bata-
tas, cebolas e bacon. Faça uma pilha de

71
pães de manteiga, queijo e outros ali-
mentos apropriados ao redor da boneca
de Bride.
4. Pendure o brat Bríde numa árvore
fora de casa para ser recolhido pela
manhã como uma parte sagrada do
manto de Brighid com poderes curati-
vos. Brats tradicionais são crochetados,
tecidos à mão, tricotados com lã, ou
mesmo roupas já prontas, fitas etc. Al-
guns dedicantes preferem ampliar a
definição e incluem joias, cobertores,
chaveiros, e outros itens que podem ser
carregados na pessoa ou usados para
conforto.
5. Observe a proibição tradicional
acerca de todas as atividades que en-
volvem girar rodas (como todas as
outras sugestões, esta é opcional).

72
Latha an Caillich
Este feriado gaélico escocês menor indi-
ca, supostamente, a vitória final de Bride
e Aengus (representando a primavera)
sobre a Cailleach (representando o in-
verno), ou o dia no qual a Cailleach se
banha nas águas do Poço da Juventude e
se transforma em Bride para o verão.
Esse dia não era fixo, originalmente,
pois se referia ao último dia de tempo
invernal antes da verdadeira primavera
começar. Com o tempo, no Hemisfério
Norte, decidiu-se pela data de 25 de
Março, pois ocorre próximo ao equinó-
cio de primavera. Você pode celebrar
esse dia como o festival do equinócio de
primavera, ou pode celebrá-lo em con-
junto com Ostara, ou como uma simples
festa primaveril. Esse seria um bom dia
para guardar um poço ou mesmo um
rio.

73
Beltane
31 de outubro

Atividades sugeridas
1. Faça arranjos florais, buquês e guir-
landas. Decore a casa por dentro e por
fora.
2. Saia e colete um ramo de árvore
(espinheiro é uma boa opção). Decore-o
com flores, fitas e outras coisas. Pendu-
re-o do lado de fora de casa e o queime
ao fim do dia.
3. Prepare o alimento para o banque-
te, incluindo pães, mingau de aveia,
queijo e cordeiro.
4. Visite um poço sagrado se estiver
perto de um, ou um riacho ou rio. Co-
loque nove pedras brancas na água
como uma oferenda a Brighid (esse é
um costume tradicional das regiões
fronteiriças escocesas).

74
Solstício de Verão
Tradicionalmente o festival de Aine de
Munster, uma deusa associada às ervas
curativas, à inspiração poética e à sexu-
alidade, caía no dia 24 de junho no
Hemisfério Norte (e foi transformado
no Dia de São João pela Igreja Católica).
Isso acontece próximo ao solstício de
verão, mas não é diretamente associado
a ele. Desejando celebrar o solstício, este
é um bom momento para honrar Bri-
ghid como as Três Irmãs: Brighid a
poetisa (cujos raios de sol atingem as
plantas ao longo do rio Boyne uma vez
a cada sete anos nessa data, criando o
Imbas), Brighid a curandeira (uma vez
que dizem que ervas colhidas nessa
data são as mais poderosas), e Brighid a
ferreira (uma vez que o fogo da forja é
reminiscente das fogueiras que se acen-
dem nesse dia).

75
Lughnasadh
2 de fevereiro

Atividades sugeridas
1. Pratique esportes e dispute jogos
de quaisquer tipos.
2. Saia e enterre flores num buraco,
num monte se for possível, pois essa é
uma oferenda tradicional pela farta
colheita.
3. Colete amoras e outros frutos simi-
lares.
4. Prepare o alimento para o banque-
te, incluindo pães, mingau de aveia,
queijo e batatas com manteiga, leite e
alho. Esse banquete deve incluir muitas
frutas frescas.
5. Faça uma boneca que simbolize a
donzela da colheita.

76
Cailleach an Dudain
O festival gaélico-escocês de Michael-
mas ocorre dia 29 de setembro (próximo
do equinócio de outono no Hemisfério
Norte) e era associado com cenouras
como símbolos de fertilidade e namoro.
Mulheres pegavam cenouras selvagens
e as mais jovens as davam de presente
aos homens esperando que as cortejas-
sem. Uma grande dança ocorria nesse
dia na qual um homem com um bastão
druídico matava a Cailleach, lamentava
por ela, e então a revivia com seu bas-
tão. Isso representava o retorno da
Cailleach no fim do verão (e, simboli-
camente, o último feixe da colheita
também era chamado de Cailleach),
sendo considerado tradicionalmente
aceitável roubar cavalos nesse dia. Se
quiser celebrar o equinócio de outono,
poderá fazer uma refeição com cenou-
ras ou preparar uma versão da dança de
Cailleach an Dudain.

77
Samhain
1º de maio

Atividades sugeridas
1. Esculpa abóboras ou nabos.
2. Prepare o alimento para o banque-
te, incluindo pães, bolos, maçãs e
biscoitos de gengibre.
3. Pratique adivinhação.
4. Prepare uma refeição silenciosa, na
qual não é permitido falar, com um
prato extra para os mortos ali honrados.

78
Solstício de Inverno
Atividades sugeridas
Fique acordado a noite toda com uma
vela acesa no formato de uma velha,
representando a Cailleach.

79
Ritos de Passagem

81
Benção de Nascimento
1
Acenda uma vela com a oração de acendi-
mento da chama:
Acendo minha vela como Brighid o
faz; Sua vela é o sol e Seu altar é a terra.
E, assim como esta pequena vela ilumi-
na este aposento, que Sua grande vela
ilumine o universo.
Salve, oh madrinha! Vosso amor é
uma chama. Dai-me a força para carre-
gar Vossa ternura; dai-me o poder para
portar Vossa luz. Permiti que meu cora-
ção se torne um fogo perpétuo aceso
pela sacerdotisa de todos os meus pen-
samentos.
Salve, oh camarada! Salve, oh amiga
fiel! Eu Vos confidenciarei meus segre-
dos hoje pois sei que ireis me confortar;
acenderei meu coração com Vossa luz
até que eu brilhe como ouro.

83
2
Faça com que a luz da vela brilhe sobre a
água para abençoá-la.
Uma vez que a água tenha sido abençoa-
da, pegue três, e depois nove, gotas ou
conchas de água e abençoe a criança com
estas palavras:
Uma gotícula de água do rio de Bri-
ghid, uma gotícula de água do poço de
Brighid, uma gotícula de água das mãos
de Brighid, sobre sua cabeça e seu cora-
ção, amada criança.
Para ajudá-lo, para guardá-lo, para
protegê-lo, para envolvê-lo, para purifi-
cá-lo e para abençoá-lo com a graça da
deusa.
Uma gotícula para a saúde, uma gotí-
cula para a força, uma gotícula para a
beleza, uma gotícula para a arte, uma
gotícula para a prosperidade, uma gotí-
cula para a paz, uma gotícula para a
coragem, uma gotícula para o caráter,
uma gotícula para a alegria de Brighid,
para que Sua proteção o envolva.

84
Benção ao Jovem Adulto
1
Faça o caim em todos os participantes e
proteja o espaço sagrado rezando no leste,
no sul, no oeste e no norte, seguido de uma
oração direcionada ao céu sobre você e à
terra sob seus pés. A posição tradicional
para este tipo de oração é orans – braços
erguidos na altura dos ombros, cotovelos em
ângulos retos e mãos espalmadas.
Abençoai toda visão que colocardes
diante de mim; abençoai cada som e cada
sabor; abençoai cada aroma que colocar-
des diante de mim, e abençoai com Vossa
própria bênção aquilo que eu tocar.
Que Brighid me envolva em Seu
manto e me cerque com Sua chama; que
Ela erga a caneca de Seu Imbas aos
meus lábios para que em minhas veias
corra o fogo.
Oh, Brighid da poesia, preenchei meu
dia com beleza. Sede como o sol no céu
para iluminar o caminho diante de
mim, e abençoai tudo o que eu vir.
Coloco minha mente e meu corpo em
Vossas mãos, oh, Brighid, do topo da

85
minha cabeça até a sola dos meus pés.
Acendei minha mente e meus pensa-
mentos com a fagulha de Sua poesia;
iluminai meu corpo, da cabeça ao de-
dão, com Sua chama eterna.
Madrinha das profundezas do meu
coração, sede como o nascer do sol na
minha noite interior. Lançai um raio de
sol rosa e dourado sobre a superfície de
meu oceano; erguei-Vos das profunde-
zas das águas quando o mundo se unir
em canção.
Contemple a madrinha no céu da ma-
nhã e A reverencie com as cordas das
harpas enquanto Ela cuida da terra: Seu
sorriso é leve e gentil e Seus olhos são
meigos! Que o dia seja uma canção a Ela,
e assim também cada dia do mundo.

2
Prepare uma bebida com leite e mel e, depois
de ungir as palmas das mãos e a face do
jovem adulto, dê-lhe um pouco para que
tome e diga:
Eu banho suas palmas no leite de
Brighid, no mel de Brighid, na bênção
de Brighid, e eu coloco os nove poderes
de Brighid em sua mente e em seu cora-

86
ção: o poder do encantamento, o poder
da virtude, o poder da fé, o poder dos
grandes atos, o poder da elegância, o
poder do caráter, o poder da coragem, e
o poder do fascínio.

3
O jovem adulto então recita estas palavras:
Brighid da Terra, abençoai-me com
prosperidade, abençoai aqueles que
amo com prosperidade, abençoai todo o
mundo. Dedico meu corpo à deusa Bri-
ghid.
Brighid das Águas, abençoai-me com
saúde, abençoai aqueles que amo com
saúde, abençoai todo o mundo. Dedico
meu sangue à deusa Brighid.
Brighid do Sol, abençoai-me com be-
leza, abençoai aqueles que amo com
beleza, abençoai todo o mundo. Dedico
minha visão à deusa Brighid.
Brighid das Nuvens, abençoai-me
com sabedoria, abençoai aqueles que
amo com sabedoria, abençoai todo o
mundo. Dedico meus pensamentos à
deusa Brighid.
Brighid dos Ventos, abençoai-me com
vitalidade, abençoai aqueles que amo

87
com vitalidade, abençoai todo o mundo.
Dedico minha respiração à deusa Bri-
ghid.
Brighid das Pedras, abençoai-me com
força, abençoai aqueles que amo com
força, abençoai todo o mundo. Dedico
meus ossos à deusa Brighid.
Brighid do Espírito, abençoai-me com
iluminação, abençoai aqueles que amo
com iluminação, abençoai todo o mundo.
Dedico meu espírito à deusa Brighid.

88
Bênção do Lar
Faça o caim em todos os participantes e
proteja o lar rezando no leste, no sul, no
oeste e no norte, seguido de uma oração
direcionada ao céu sobre você e à terra sob
seus pés. A posição tradicional para este tipo
de oração é orans – braços erguidos na altu-
ra dos ombros, cotovelos em ângulos retos e
mãos espalmadas. – Esta bênção pode ser
usada para abençoar qualquer lar, casamen-
to ou arranjo doméstico.
Paz entre os povos, paz entre os se-
melhantes, paz entre os vizinhos, e paz
nesta casa. No amor da rainha da vida e
do fogo da sabedoria.
Abençoe esta casa em nome de Bri-
ghid, do teto à fundação, da fundação
ao teto.
Que aqui sempre haja alimento, que
aqui sempre haja bebida, que aqui sem-
pre haja conforto, que aqui sempre haja
alegria.
Que aqui sempre haja riso, que aqui
sempre haja segurança, que sempre haja
acolhimento, que sempre haja amor.

89
E que o ouro da beleza brilhante de
Brighid aqui esteja para sempre no co-
ração de sua lareira.

90
Bênção aos Mortos
Nesta noite você irá para casa, para os
braços de Brighid, para ser amparado
por Brighid, para ser consolado por
Brighid; você irá para casa nesta noite
sob os cuidados de Brighid, para dormir
na cama da terra e no lar das estações.
No lar do inverno e no lar do outono,
no lar da primavera e no lar do verão.
No lar de Brighid das Estações enquan-
to Ela Mesma o beija.
Que a tristeza vá embora, pois é hora
de dormir. Que a tristeza vá embora,
pois é hora de dormir. Que a tristeza vá
embora, pois é hora de dormir, envolto
bem firme no manto da deusa Brighid.

91
Ensaios e informações

93
Brighid: Senhora das nossas
lareiras, Senhora dos nossos
corações
por Gilbride, Sage, Finn e Aster Breo2
Brighid3 é uma das figuras mais po-
pulares e mais adoradas em todo o
mundo, tanto como santa cristã como
deusa pagã. Como Santa Brígida, Seu
monastério em Kildare guardava Sua
chama eterna até que foi extinta, prova-
velmente durante a supressão dos mo-
nastérios ocorrida no século XVI. Em
1993, a ordem Católica das Irmãs Brigi-
dinas reacendeu a chama e a manteve
queimando desde então. Grupos e tem-
plos dedicados tanto à deusa Brighid
como à Santa Brígida A honram no Im-
bolc e muitas comunidades criaram
células que guardam Sua chama de
maneira pessoal, praticamente do mes-
mo modo como é feito em Kildare.
2
Este ensaio também aparece no Cauldron Cill Brighid
Devotional.
3
Há muitas formas diferentes de grafar no nome de Brighid.
Para clareza neste ensaio, escolhemos Brighid para indicar a
deusa e Brígida para nos referirmos à santa.

95
Rastrear Brighid através do mito e do
folclore celta pode ser extremamente
difícil, e ainda assim há fagulhas bri-
lhantes a nos guiar. O Glossário de
Cormac, por exemplo, descreve Brighid
como um trio de irmãs de nome idêntico
que descendiam do Dagda, nomeando-
as como A Senhora da Poesia, A Senhora
da Medicina e A Senhora da Ferraria. Nós,
devotos modernos, podemos então infe-
rir que Brighid é uma deusa de cura,
poesia e da arte da forja. Outras fontes
relativamente obscuras referem-se a
outras figuras femininas de nome simi-
lar, como a jurista Brig Ambue (Brighid
dos que não possuem gado), cujos julga-
mentos Lhe deram distinção como
legisladora associada com todas as clas-
ses, até mesmo com os forasteiros
destituídos. Interpretamos essa evidên-
cia como uma forma de apoiar a ideia
de que Brighid é também uma deusa de
justiça, em especial a justiça social.
Essa interpretação encontra base
também nos contos hagiográficos de
Santa Brígida da Irlanda, Escócia, Gales,
Bretanha, e outros locais do mundo
celta. Se aceitarmos a premissa de que o

96
caráter e as histórias da santa se basei-
am em lendas da deusa celta original –
uma premissa que não é tida indiscutí-
vel por estudiosos dos celtas mas que,
ainda assim, ressoa com muitos dos
devotos de Brighid – poderemos encon-
trar pistas adicionais sobre a natureza
de Brighid. Fica claro com essas histó-
rias, tanto pagãs como cristãs, que
Brighid é extremamente generosa, cheia
de compaixão, e preocupada com a vida
na comunidade e a vida na terra.
Alguns pagãos modernos veem Bri-
ghid como mais do que uma deusa e
uma santa das Ilhas Britânicas, imagi-
nando-A como uma divindade do pan-
celtismo cuja influência existia muito
antes dos celtas chegarem à Irlanda e a
outras partes da Europa. Seu culto pode
ser ainda mais amplo sob nomes de
deusas como Sulis-Minerva, lidando
não apenas com as associações tradicio-
nais de poesia, forja e cura, mas
também com as energias do fogo, da luz
e da criação. Assim, Seus reinos então
se estenderiam do Outro Mundo aos
céus, do espaço sideral ao mar, e ao
submundo da própria morte. Em resu-

97
mo, Seu reino é toda a criação, pois é
Ela que o forjou.
Porém, muitas dessas conexões que
Brighid compartilha com deusas de
outras áreas incitam a algumas questões
interessantes. As práticas de guarda da
chama dos seguidores de Brighid e das
sacerdotisas de Vesta na antiga Roma,
por exemplo, ou as grandes semelhan-
ças entre Brighid e a Minerva grega, ou
Brighid e a britânica Sulis, acabam por
levantar a questão acerca do fato de que
Brighid possa ser uma divindade ainda
mais primal, vasta e misteriosa do que
qualquer um tenha até então imagina-
do. Isso, consequentemente, nos leva à
religião proto-indo-europeia e aos exem-
plos extremamente interessantes de
suas deusas4 cujas funções principais e
áreas de atuação coincidem com as de
Brighid, incluindo nisso a deusa da
lareira Westya, a deusa vaca Gwou-
winda, e a deusa do amanhecer Xausos.
É bem possível que Brighid como A
conhecemos hoje tenha raízes nessas

4
Serith, Ceisiwr. Deep ancestors: practicing the religion of
the proto-indo-europeans. Tucson: ADF Publishing, 2007.

98
deusas e, talvez, até numa ainda mais
antiga, única, cuja função e atuação
englobe todas as mencionadas acima.
Se, como cremos, Brighid tem sido
cultuada por séculos anteriores à Era
Celta, essas deusas proto-indo-europeias
podem nos fornecer a figura mais anti-
ga e primal de quem Ela é. Explorar
essas raízes é extremamente importante
para nós, e a evidência disponível, as-
sim como outras inspirações, acaba por
nos convencer de que há algo especial e
único acerca de como os celtas pré-
cristãos lidavam com Brighid. E, como
muito do nosso conhecimento acerca da
deusa, apesar de incompleto, vem das
culturas celtas, especialmente aquelas
da Irlanda, por meio de uma compreen-
são mais profunda da experiência dos
celtas com Ela, poderemos mais Dela
nos aproximar.
Contudo, ao contrário da maioria das
divindades irlandesas mais bem conhe-
cidas, há pouco na verdade para se
saber acerca de Brighid nos mitos irlan-
deses que chegaram até nós – e o que
podemos encontrar reside em pequenos
trechos que são parte de histórias maio-

99
res. Este ensaio, compilado e composto
por quatro devotos de Brighid, é nossa
tentativa de coletar todo o conhecimen-
to antigo irlandês sobre a deusa e
interpretá-lo como um mito único. Mas
apresentamos isto puramente como
uma peça de oferta devocional, e não
como um artigo acadêmico.

O saber dos irlandeses


Considerando o papel central de Bri-
ghid na tradição cultural irlandesa, é de
se surpreender o quão pouco material
sobre Ela existe na antiga literatura pa-
gã. Uma possível explicação para isso –
mas não a única – é que o culto de Bri-
ghid se desenvolveu tardiamente no
período pré-cristão, nos anos 70 da Era
Atual, quando refugiados da tribo Bri-
gante do norte da Bretanha trouxeram a
adoração de sua deusa tribal Briganti a
Leinster5. De acordo com essa teoria,
por volta de um século depois dos Bri-
gantes chegarem à Irlanda, os homens
de Leinster conhecidos como os Laighin

5
Wright, Brian. Brighid: goddess, druidess and saint. Glou-
cestershire: The History Press, 2009. pgs. 23-26.

100
se tornaram os senhores de boa parte do
país por algum tempo – nesse período,
sua deusa tutelar Briganti pode ter se
tornado demasiadamente popular e se
transformado na deusa irlandesa Bri-
ghid. – Isso teria ocorrido tardiamente
ao ponto de Ela não ter sido totalmente
absorvida pela mitologia narrativa local
quando a cristianização da Irlanda esta-
va a todo vapor. Portanto, Sua mitologia
pode ter se desenvolvido mais comple-
tamente no cristianismo com a figura de
Santa Brígida do que o foi no período
da religião pré-cristã.
Porém, essa é apenas uma das expli-
cações possíveis para a ausência notável
de Brighid na literatura irlandesa. Outra
possibilidade é que os monges e poetas
que escreveram as sagas preservaram
mais das histórias completas acerca de
Morrighan e Lugh, pois poucos, se é
que existiam, acreditavam Neles, e es-
sas histórias não encorajariam Seus
cultos. Uma vez que Brighid tinha sido
adotada entusiasticamente como uma
santa, a preservação de Suas lendas pré-
cristãs teriam maior possibilidade de
encorajar tendências pagãs latentes, e

101
isso seria ainda mais perigoso do que as
histórias dos esquecidos Morrighan e
Lugh, o que fez com que tradutores
daquela era deixassem Brighid fora da
história.
Qualquer que seja a razão, a evidên-
cia literária acerca de Brighid nos
tempos antigos se limita a poucas pas-
sagens curtas. Uma está no Cath Magh
Tuired, ou Segunda Batalha de Moytu-
ra, e enfatiza Seu papel como a esposa
do indigno rei Bres, como mãe enlutada
de Ruadan – que foi morto na batalha
entre os deuses de Danann e os gigantes
Fomores –, e como a inventora da práti-
ca do lamento pelos mortos. Outra
passagem vem do Livro das Invasões e
A associa com dois tipos opostos de
criaturas: os bois míticos civilizados Fe
e Men, e o monstruoso Orc Triath6, rei
dos javalis. Como dito anteriormente, o
Glossário de Cormac enfatiza Sua posi-
ção como filha do Dagda e como um
poderoso e popular trio de deusas ir-
mãs responsáveis pela poesia, cura e
6
Orc Triath também aparece sem Brighid no relato galês
Arthuriano como Twrch Trwyth, sendo ali uma força da
natureza muito destrutiva.

102
forja. Por fim, algumas passagens curtas
nos antigos códigos legais irlandeses e
outros fontes se referem a várias mulhe-
res cujos nomes começam com o prefixo
Brig, ou Poder, como a já mencionada
Brig Ambue, que parece ter sido res-
ponsável por vários deveres associados
com a própria deusa. Muito da imagéti-
ca associada com a divindade por
devotos modernos deriva, na verdade,
do conhecimento e das práticas popula-
res associadas com a santa que viria
depois – apesar de isso ocorrer por uma
razão, como discutiremos depois.

Quem é Brighid?
Brighid é geralmente apresentada como
sendo virginal ou como não possuindo
um consorte masculino. Esse conceito
de Brighid como uma virgem não se
baseia somente no Seu status como san-
ta cristã, pois é uma antiga característica
indo-europeia das deusas da lareira,
das deusas da cultura e de suas sacer-
dotisas. Por exemplo, a deusa romana
da cultura Minerva (que se reflete nas
deusas bretã e galesa Briganti e Sulis,
respectivamente, também associadas à

103
Brighid) era uma virgem, assim como a
deusa romana da lareira Vesta. As sa-
cerdotisas de Vesta, as Virgens Vestais,
guardavam uma chama perene muito
similar à eterna chama de Brighid em
Kildare. Assim, o conceito de Brighid
tanto como uma virgem como uma mu-
lher descompromissada é provavelmente
de origem pré-cristã.
Contudo, a mitologia não tende a ser
perfeitamente consistente, e as fontes
irlandesas dizem que Ela se casou duas
vezes: uma com Bres, numa tentativa
falha de reconciliar os deuses e os gi-
gantes, e outra com o deus do trovão
Tuirenn, cujos filhos Brian, Iuchar e
Iucharba (os Três Deuses de Danu, que
deram origem aos nomes de todos os
deuses irlandeses) tinham uma conten-
da com a família de Lugh7.

7
Isso pode se referir ao conflito histórico entre os seguidores
do antigo deus celta do trovão Tuirenn ou Taranis e o novo
deus do relâmpago Lugh ou Lugus, cujo culto substituiu o do
antigo deus. Os Filhos de Tuirenn mataram o pai de Lugh, e
Lugh os forçou a cumprir uma tarefa impossível que os levou
à morte.

104
Há alguma confusão acerca das iden-
tidades dos dois maridos de Brighid. De
acordo com o Livro das Invasões:
Aqueles eram as Tuatha De –
deuses eram seus homens das ar-
tes, não-deuses seus lavradores.
Eles conheciam as encantações dos
druidas, e seus cocheiros, e amar-
radores de laços, e seus copeiros.
(...) Estes eram os três Deuses de
Danu, de quem foi nomeada a
Montanha dos Três Deuses. (...) e
para testemunhar os três filhos de
Bres, filho de Elatha, ou os três fi-
lhos de Tuirell Biccreo, Brian,
Iuchar, Iucharba8.
Tuirell Biccreo é outro nome para Tu-
irenn, assim esse trecho diz que os três
deuses de Danu eram os filhos ou de Tui-
renn ou Bres. Uma vez que Tuirenn e
Bres são os dois maridos de Brighid,
isso levanta a possibilidade de que Bri-
ghid seja identificada com a deusa-mãe
Danu. Essa possibilidade é reforçada

8
Brigit, em http://www.maryjones.us/jce/brigit.html [aces-
sado em 27-abr-2017].

105
pelo fato de que o Livro de Leinster
nomeia Brighid como mãe deles9.
A situação se torna ainda mais com-
plexa quando lembramos que Tuirenn
também era supostamente casado com
Ernmas. As três filhas de Ernmas eram
as três Morrighans, algumas vezes no-
meadas como Anu, Badb e Macha. Anu
ou Arnand é possivelmente o mesmo
que Danu, e algumas transcrições do
Livro das Invasões nomeiam Morrighan
ou Anu como a mãe dos três deuses de
Danu10.
Genealogias divinas são sempre con-
fusas, mas se Anu é Danu e Anu é uma
das três Morrighans e tanto Anu e Bri-
ghid são as mães dos três deuses, então é
Brighid de alguma maneira idêntica à
Morrighan apesar de suas personalida-
des drasticamente diferentes?
Isso é possível dada a fluidez pela
qual as divindades celtas são notórias.
Outra possibilidade é que os antigos
irlandeses viam o status de mãe dos três
deuses como uma marca definitiva de
9
op.Cit.
10
Anu/Anann, em http://www.maryjones.us/jce/anu.html
[acessado em 27-abr-2017].

106
supremacia ou de deusa de maior im-
portância no panteão. Se esse era o caso,
os partidários de Morrighan poderiam
ter insistido que sua deusa preferida era
também Danu, a mãe dos deuses; e par-
tidários de Brighid podem ter clamado
o mesmo para Ela, resultando em len-
das contraditórias.

Brighid e a Liminaridade
A experiência de Brighid com casamen-
to e maternidade é trágica nesses mitos,
mas Seu papel como esposa de Bres
ilustra uma de Suas mais importantes
características: a tendência em cruzar os
limites entre grupos normalmente vis-
tos como hostis um ao outro.
Em todas as mitologias indo-
europeias, o conflito mítico mais primal
é entre uma tribo de deuses e uma tribo
de antideuses. Na Grécia, a batalha é
entre deuses e titans; na Noruega, é
entre os Aesir e os Jotuns; na Índia, en-
tre devas e asuras; na Irlanda, Tuatha
de Danann e Fomores. E, com isso, Bri-
ghid, membro das Tuatha de Danann,
cruza o limite e se casa com um Fomor,

107
possivelmente numa tentativa de fazer
as pazes.
O mesmo padrão se repete através da
história do culto a Brighid. Além de
cruzar o limite entre deus e gigante, Ela
também cruza outros, incluindo:
 pagão e cristão (tornando-se santa);
 celta e romano (divindades com
conexões com Brighid, como Bri-
ganti e Sulis, foram depois
cultuadas tanto por romanos co-
mo romano-bretões);
 bretão e irlandês (assumindo que
seja verdade que os Brigantes te-
nham trazido sua divindade
Briganti para a Irlanda);
 gaélico e inglês (a veneração de
Santa Brígida se espalhou pela In-
glaterra no século XVIII);
 terras altas e baixas (Santa Bride
era a padroeira dos Border Dougla-
ses e também a santa mais popular
nas Highlands);
 europeu e africano (Santa Brígida
foi incorporada na religião Voudu
afrocaribenha como Mama Brigit-
te, apesar de sua personalidade

108
ter sido totalmente alterada no
processo); e
 cristão e pagão (em Seu reviva-
lismo como deusa pagã, algo
respeitado por cristãos progressis-
tas).
O casamento de Brighid com Bres nos
dá o arquétipo de todas essas transi-
ções, assim, mesmo que só mencionado
em passant na tradição, é algo extrema-
mente importante para compreender
Seu papel. Quando outros são pegos em
conflitos arquetípicos aparentemente
inevitáveis, Brighid transcende as cate-
gorias binárias e chega para abençoar o
outro lado. Por que Ela tem o poder de
fazer isso quando outros não? Prova-
velmente por conta de seu status como
uma deusa do limiar: nem isso nem
aquilo, sem ficar presa em binários.
Brighid é capaz de cruzar os limites
porque Sua natureza é liminar.
Na história de guerra épica entre os
deuses e os gigantes, a tentativa de Bri-
ghid de apaziguar os lados não é bem
sucedida: Seu filho Ruadan marcha em
combate pelos Fomores com resultados

109
trágicos. De acordo com a Segunda Ba-
talha de Moytura:
Mas depois que a lança foi dada a
ele, Ruadan virou-se e feriu Goib-
niu. Ele puxou a lança de volta e
atirou-a em Ruadan de modo que
ela atravessou-o; e ele morreu na
presença do seu pai na reunião dos
Fomorians. Brig veio e lamentou
por seu filho. A princípio ela gritou
agudamente, mas no fim ela cho-
rou. E o choro e o grito foram
ouvidos por toda a Irlanda11.
A invenção do lamento por Brighid
introduz dois papeis adicionais. As
lendas da banshee que vieram depois
geralmente têm relação com a deusa
guerreira conhecida como Badba Catha,
ou Corvo das Batalhas, uma das três for-
mas da Morrighan. Contudo, o compor-
tamento característico da banshee –
lamentar pelos mortos – é atribuído a
Brighid, não a Morrighan. Essa é uma
das várias conexões ambíguas entre as
duas divindades, cujas naturezas e fun-
11
Ayres, Laise. A Segunda Batalha de Moytura, em
https://tesourosdairlanda.wordpress.com/2013/12/13/segu
nda-batalha-de-moytura/ [acessado em 27-abr-2017].

110
ções são quase completamente opostas
em muitos aspectos.
O segundo ponto de importância so-
bre essa passagem é que Brighid
lamenta a violência e o sofrimento da
guerra. A sociedade antiga dos celtas
não era nem um pouco pacífica, e con-
ceitos modernos de não-violência
seriam bem estranhos para os antigos
celtas. Ainda assim, Brighid é represen-
tada como uma deusa que lamenta a
morte e a destruição da vida do guerrei-
ro. De acordo com o Livro das Invasões:
Brigit a poetisa, filha do Dagda, ti-
nha Fe e Men, dois bois reais, de
onde Femen é nomeada. Ela tinha
Triath, rei de seus javalis, de onde
Treithirne é nomeado. Com eles es-
tavam, e ouvimos, os três gritos
demoníacos depois da rapinagem
na Irlanda, sibilo, choro e lamenta-
ção12.
A referência ao sibilo nessa passagem
ecoa na Segunda Batalha de Moytura,

12
Moura, Leonni (Angus mac Oisín). Brigit, Deusa das Tuatha
dé Danann, em tradução de trecho do Livro das Invasões, em
http://tirtairnge.blogspot.com.br/2012/01/brigit-deusa-dos-
tuatha-de-danann.html [acessado em 27-abr-2017].

111
onde diz E foi Brig quem inventou o apito
que sinaliza à noite. Apesar do significa-
do dessa passagem não estar claro,
ambas se referem ao papel de Brighid
ao lamentar os resultados do conflito
tribal. Seja pelo lamento pelo Seu filho
caído ou pelo sibilo, choro e lamentação
depois de um ataque, Brighid pranteia
pelos resultados da guerra. Contudo,
Ela não é completamente pacífica, pois
detém poderes capazes de destruir a
civilização se forem liberados.
Como dona dos bois sagrados, Brighid
é associada à influência civilizatória dos
campos arados e da terra cultivada. Mas
como dona de Triath, rei dos javalis, Ela
é associada à natureza selvagem e com
o potencial para a fúria destrutiva:
Triath aparece nas crônicas galesas Ar-
thurianas como Twrch Trwyth, o javali
selvagem que devasta Gales na história
de Culhwch e Olwen no Mabinogion.
O nome completo de Triath é Orc
Triath, ou Torc Triath, que é o mesmo
que o galês Twrch Trwyth. Assim, o
javali monstruoso do Mabinogion não é
ninguém mais do que o animal de esti-
mação de Brighid! Esse é outro exemplo

112
da liminaridade de Brighid – bois do-
mesticados e javali selvagem, campos
bem cuidados e natureza perigosa. – E
mesmo assim tanto Seus bois como Seu
javali se unem a Ela no choro e lamenta-
ção depois de um ataque.

Associações primárias
A passagem mais famosa acerca de Bri-
ghid como deusa está no Glossário de
Cormac:
Brigit, isto é, uma poetisa, filha
do Dagda. Brigit é a sábia, ou mu-
lher da sabedoria, isto é, Brigit a
deusa que os poetas adoram, pois
muito grande e muito famosa é sua
proteção. É por isso que eles a
chamam de deusa dos poetas, pelo
seu nome. Suas irmãs eram Brigit, a
médica (mulher das artes médicas),
Brigit a ferreira (mulher do traba-
lho de ferraria), desses nomes com
todos os irlandeses, uma deusa é
chamada de Brigit13.

13
op.Cit.

113
Padre Seán Ó Duinn14 os estudiosos
celtas Dáithí Ó hÓgáin15 e Proinsias
MacCana16 interpretaram essa passa-
gem dizendo que os antigos irlandeses
usavam o nome de Brighid como um
título universal para qualquer deusa.
Essa interpretação tem sido contestada
por outros que dizem que o latim origi-
nal poderia ser interpretado de maneira
a significar simplesmente que uma deu-
sa chamada Brighid era conhecida por
todos os irlandeses.
Isso é definitivamente possível, mas
há algumas pistas que indicam qual
interpretação é a correta. Uma é a exis-
tência de referências à Brighid como
mãe dos três deuses que dão nome a
toda tribo das Tuatha de Danann. Se
Brighid é Danu, a mãe dos deuses, en-
tão Seu status como deusa universal ou
suprema parece adequado. Outra pista
é a existência de muitas mulheres cha-
14
Ó Duinn, Seán. The Rites of Brigid: Goddess and Saint.
Dublin: The Columba Press, 2004. pg. 60.
15
Ó hÓgáin, Dáithí. Myth, Legend & Romance: An Encyclopa-
edia of the Irish Folk Tradition. New York: Prentice Hall Press,
1991. pg. 60.
16
MacCana, Proinsias. Celtic Mythology. New York: Peter
Bedrick Books, 1983. pg 34.

114
madas Brig na cultura irlandesa antiga.
Como Brig significa Poder, esses pare-
cem ser mais títulos do que nome. Isso
daria respaldo à interpretação de que o
nome de Brighid é usado como título
para muitas deusas.
De qualquer maneira, o aspecto trí-
plice descrito no Glossário de Cormac –
tanto como deusas individuais ou como
três irmãs divinas – está entre uma de
Suas mais populares e mais conhecidas
manifestações. Desses três aspectos, a
Brighid da cura parece receber a maior
atenção no imaginário irlandês. As ra-
zões para isso são complicadas. Na
cultura gaélica os costumes populares
sobreviveram entre os camponeses por
muito tempo após declínio do velho
sistema aristocrático irlandês e suas
instituições, como as ordens profissio-
nais de bardos. Quando os folcloristas
começaram a coletar o conhecimento da
tradição oral, não havia mais fili para
dizer a eles como a Brighid da Poesia
era venerada ou percebida, mas havia
muita gente de origem camponesa que
poderia lhes dizer sobre o poder de
Brighid na cura de animais doentes ou

115
na ajuda às parteiras na hora de dar a
luz.
Por essa razão, muito do que hoje as-
sociamos à Brighid é uma mistura de
elementos oriundos do conhecimento
da santa e do folclore rural sobre a Bri-
ghid da Cura. Brighid, algumas vezes
sob o nome de Bride, é invocada em
várias orações tradicionais para curar
pessoas ou animais. Itens sagrados im-
buídos com Seu poder, como o brat
Bride, ou manto de Brighid, são usados
principalmente para cura. Por fim,
inúmeros poços de cura são dedicados a
Brighid na Irlanda, na Escócia, na Ingla-
terra e no País de Gales.
Por conta da associação entre a santa
e o aspecto de cura da deusa, a imagem
mais popular de Brighid hoje parece ser
a da jovem mulher parteira, curandeira
ou pastora, com um comportamento
calmo, gentil e amável. Essa imagem
inspirou uma versão da teologia Brigi-
dina baseada na ideia de que Brighid
deseja apenas misericórdia de seus se-

116
guidores, e nunca sacrifício17. Mas en-
quanto há muito a recomendar dessa
teologia, ela não é respaldada pelo fol-
clore acerca de Brighid. Ela é
definitivamente representada como
uma deusa calma, gentil e cheia de
compaixão, mas Ela também é uma
deusa que pode se tornar irascível com
Seus próprios devotos e exigir deles
sacrifícios ctônicos.
Esse aspecto de mundo subterrâneo
da deusa também pode ser visto no
folclore sobre Brighid e a ordem bárdi-
ca. Os fili medievais tinham uma
ideologia de inspiração poética comple-
xa que incluía a prática de compor na
escuridão total, numa cabana fechada,
como se estivessem no útero da deusa.
Um conto do Cabo Bretão sobre a espo-
sa do rei poeta Senchan, Brighid, A
descreve como a Grande Brid dos Cavalos
e A associa a sangrentos sacrifícios de
animais assim como ao simbolismo
ctônico. Dessa maneira, enquanto a
imagem popular da amável e gentil
17
Condren, Mary. Brigit, Matron of Poetry, Healing,
Smithwork and Mercy, Journal of the European Society of
Women in Theological Research, 2010.

117
Brighid é válida e histórica, é apenas
um dos aspectos da deusa pré-cristã,
que também possui um lado negro as-
sociado com o mundo subterrâneo.

A Brighid Negra
O aspecto de cura de Brighid era um
que poderia facilmente migrar entre as
visões de mundo pré-cristãs e cristãs.
Mas não haveria meio de dizer que o
aspecto de Brighid invocado pelos fili
durante os ritos de transe visionários
era o mesmo da Santa Brígida de Kilda-
re, pois era muito mais fácil interpretar
o tanto que se sabia da deusa da cura
pré-cristã com relação à santa.
Isso tem, claro, uma influência disso-
nante nas percepções pagãs modernas
da deusa Brighid, que quase sempre
enfatizam Seu papel como uma curan-
deira calma, gentil e cheia de compaixão,
doadora de um amor incondicional. Es-
ses atributos pertencem genuinamente a
Ela em alguns de seus aspectos que
sobreviveram mais claramente na tradi-
ção oral por conta daquilo que geral-
mente se atribui à santa.

118
Porém, a deusa também tem outros
aspectos, ctônicos, e em alguns casos,
certos traços bem sombrios que foram
registrados apenas em trechos espalha-
dos do que chegou até nós. Isso não é
de todo surpreendente ao falarmos de
uma deusa celta ou qualquer divindade
pagã, mas pode ser uma surpresa incô-
moda para alguns.
Por exemplo, é dito que famílias das
Hébridas que acreditavam ter ofendido
Brighid buscavam aplacar Sua fúria
enterrando um galo vivo no lugar onde
três riachos se encontram. Essa prática
foi encoberta por muitos escritores,
provavelmente devido à óbvia cruelda-
de, mas seu simbolismo é bem claro.
Na visão de mundo dos antigos celtas,
como em muitas outras culturas, há três
reinos: Céu, Terra e Mar, ou céus, terra e o
mundo subterrâneo, e os templos dos
celtas tinham buracos profundos ou po-
ços nos quais oferendas poderiam ser
feitas aos poderes do submundo. Brighid
é normalmente uma divindade celestial,
associada ao sol no céu, e nunca conside-
rada como parte dos Sidhe ou do reino
do submundo. Isso se contrasta clara-

119
mente com divindades como a Morri-
ghan, que geralmente é dita como sendo
dos montes dos Sidhe.
Contudo, se Brighid ficasse ofendida,
Ela só poderia ser aplacada com um
sacrifício ctônico. Isso implica na exis-
tência de um aspecto de Brighid que é
irascível, pertencente ao mundo subter-
râneo. A existência de tal aspecto é
confirmada pelo conto Grande Brid dos
Cavalos, do Cabo Bretão, na qual uma
assembleia bárdica é liderada por uma
mulher com aquele nome. Como os
bardos ali são chamados de Cliar Shen-
chain, ou Bando de Senchan, a Grande
Brid dos Cavalos poderia ser relaciona-
da com a mulher do grande bardo
Senchan Torpeist, Brighid.
Na história, a Grande Brid dos Cava-
los exige seu quinhão de carne de um
porco que jamais nasceu, assim como
cavalgar numa égua branca de orelhas
vermelhas. Animais brancos de orelhas
vermelhas eram tradicionalmente vistos
como criaturas dos Sidhe, e porcos eram
historicamente usados como sacrifícios
aos poderes ctônicos. O rei em questão
mata um porco nascido de cesárea e usa

120
seu sangue para pintar as orelhas de
uma égua branca de vermelho. Essa
história, como a do sacrifício do galo
nas Hébridas, envolve um aspecto de
submundo em Brighid que demonstra
que Ela foi uma vez cultuada por meio
de sacrifícios de animais. Enquanto
pagãos modernos em geral não têm
interesse em reviver tais práticas, de-
vemos ter ciência das chances de que
nosso conceito de Brighid tenha sido
substancialmente cristianizado, e que a
antiga deusa pagã provavelmente tinha
aspectos sombrios e até sangrentos em
certas circunstâncias.

Deusas cognatas
Estudiosos modernos não concordam
plenamente acerca de quão extenso era
o culto a Brighid no antigo mundo celta.
Nomes divinos similares a Brighid
apareceram de várias maneiras diferen-
tes em todos os territórios celtas, mas
não se tem certeza de que todas se refe-
rem à mesma entidade.
Brigindo / Brigindona
Da parte oriental da Gália temos Brigin-
do, uma deusa sobre a qual quase nada

121
se sabe, exceto que era associada à cura, à
fertilidade e às artes. Uma dedicatória à
Brigindona foi encontrada numa área
uma vez regida pela tribo Aedui.
Matres Brigaecae
As Matres Brigaecae ou Mães Exaltadas
eram cultuadas na Espanha celta. Di-
vindades celtas e germânicas descritas
como as Matres, ou As Mães, são sem-
pre representadas em forma tríplice,
assim podendo torná-las equivalentes
às três Brighids descritas por Cormac18.
Brigantia
Da Bretanha temos Briganti, uma deusa
da tribo dos Brigantes que depois foi
equiparada à deusa romana Minerva.
Na época romana, Briganti era chamada
de Brigantia, o nome pela qual é mais
conhecida hoje.
De acordo com Beck, todos esses no-
mes são etimologicamente equivalentes
a Brighid. Porém, muitos estudiosos
têm mostrado ceticismo em acreditar

18
Goddesses in Celtic Religion — Cult and Mythology: A
Comparative Study of Ancient Ireland, Britain and Gaul, em
http://theses.univ-
lyon2.fr/documents/lyon2/2009/beck_n#p=87&q=Brigantia
&a=p [acessado em 27-abr-2017]

122
que Brighid e Brigantia compartilhem
qualquer coisa além da base etimológi-
ca. Um exame mais detalhado de sete
registros dedicados à Brigantia pode
ajudar a esclarecer o assunto:
 O registro de Brampton A descre-
ve como A ninfa Brigantia. Isso nos
diz que Brigantia era associada
com águas curativas, assim como
Brighid.
 O registro em South Shields A
descreve como Brigantia Caelestis,
ou Brigantia celestial. Back nos diz
que Caelestis, na interpretatio Ro-
mana, era um aspecto de Juno
considerado equivalente à deusa
cartaginesa Ishtar. Então, o uso da
frase Brigantia Caelestis nos diz
que Brigantia era associada com o
reino superior, ou dos céus, e que
ela era uma deusa mãe, uma di-
vindade toda poderosa como
Ishtar. Essas associações todas
combinam com o que sabemos
sobre Brighid.
 Os registros em Birrens, Castle-
ford e Greetland todos equiparam
Brigantia à deusa romana Miner-

123
va que, por sua vez, era o equiva-
lente da grega Athena. Isso nos
diz que Brigantia era uma divin-
dade do tipo Minerva celta,
descrita por Júlio César como a
principal deusa dos Gauleses. A
equiparação com Minerva tam-
bém nos revela que Brigantia era
vista como padroeira das artes e
da cultura, assim como Brighid, e
que era algumas vezes represen-
tada como uma divindade
virginal, novamente como Bri-
ghid. Essas inscrições enfatizam o
aspecto marcial de Minerva – o de
Birrens A mostra segurando uma
lança e um globo, envergando a
cabeça cortada da Górgona como
um colar – e também A identifi-
cam com Victoria, ou vitória.
 O registro de Adel foi feito por
uma mulher chamada Cingetissa.
Esse nome significa a guerreira ou
a atacante. Ele é acompanhado da
inscrição de uma cobra, que com-
bina com as associações de
Brighid com as cobras no Imbolc
nas Highlands. O registro de

124
South Shields também mostra
símbolos de pássaros e de emble-
mas de deusa da fertilidade, como
a pátera e o jarro.
Brigantia era então uma divindade
associada com a água, a cura, o reino
dos céus, a maternidade, as artes, a cul-
tura, a virgindade, a fertilidade, os
pássaros e as cobras19. Todas essas asso-
ciações se aplicam igualmente a
Brighid.
Porém, Brigantia era quase sempre
representada como uma divindade
marcial e Brighid é raramente assim
vista. Essa é uma diferença significativa,
mas deve-se notar que o epíteto Bride
nam buadh encontrado nas orações das
Highlands significa literalmente Bighid
vitoriosa e se traduz diretamente na fra-
se Brigantia Victoria. Todavia, o único
cenário no qual a Brighid irlandesa é
representada como uma deusa guerrei-
ra territorial é na defesa de Leinster,
província para a qual muitos Brigantes
emigraram. A natureza guerreira de
Brigantia é então diretamente relacio-

19
op.Cit.

125
nada ao seu status como deusa tribal
dos Brigantes, e não necessariamente se
traduz em Seu culto em outros territó-
rios por outros povos. Mas além dessa
diferença realmente significativa, Brigan-
tia e Brighid compartilham de várias
funções e aspectos, e apesar de não pode-
rem ser consideradas exatamente a
mesma divindade, também podem não
ser completamente diferentes.
Sulis / Sulis Minerva
Sulis era outra deusa bretã equiparada à
Minerva, e Seu nome implica numa
conexão solar similar à de Brighid.
As características da Minerva celta in-
cluem a associação com a luz, o fogo, o
sol, as águas curativas como fontes ter-
mais e poços sagrados, além de
manifestações culturais como artes e
artesanato.
É importante notar que o Glossário
de Cormac nos dá uma falsa etimologia
para o nome Brighid, dizendo que deri-
va de uma frase que significa flecha
flamejante. Mas, apesar da etimologia ser
incorreta, a associação do fogo à Miner-
va celta tem sido claramente imposta
também à Brighid.

126
As Brigs
Compêndios legais, lendas e outras lite-
raturas antigas dos gaélicos descrevem
várias mulheres famosas que podem ser
consideradas como avatares ou manifes-
tações de Brighid responsáveis por áreas
específicas da vida. Esses nomes geral-
mente começam com o prefixo Brig,
significando Poder de, e incluem:
 Brig Ambue: Brighid dos sem Gado
ou Brighid dos Destituídos. No
Imbolc, bandidos ou guerreiros
Fianna sem lugar na sociedade
atacavam para obter o sustento
para suas famílias durante a difí-
cil época do fim do inverno. Essa
atividade era também conhecida
como werewolfing. Rituais de puri-
ficação aconteciam em nome de
Brig Ambue para reintegrar esses
lobos de volta na comunidade tri-
bal. O prólogo do Senchus Mor a
chama de a mulher com conheci-
mento acerca dos homens da Irlanda
em sabedoria e em prudência.
 Brig Euit: Brig Euit é mencionada
num poema de Moccu Mugairne
que possui conexão com as histó-

127
rias originárias da tribo Fothairt.
Nele, Ela é descrita como o poder
do zelo, verdadeiramente divino. Do
contexto do poema, é claro que ele
se refere à Santa Brígida, o que é
interessante, pois indica que ela
era vista como uma das figuras
Brig. Brig Euit é a Brig ou o Poder
do zelo religioso.
 Brig Briugu: Uma briugu, ou hospi-
talária, era uma pessoa que manti-
nha sua casa aberta de maneira
ampla, oferecendo hospitalidade a
todos os que passavam. Pouco é
sabido acerca dela, mas há refe-
rências a uma Brig Briugu. As
lendas de Santa Brígida milagro-
samente preparando enormes
quantidades de cerveja prova-
velmente se relacionam a esse
aspecto de Brighid.
 Brig Brethach: Brig Brethach é a
forma mais incomum de Brighid,
uma espécie de femme fatale. Essa
Brig era a esposa de um guerreiro
de Ulster muito violento chamado
Celtchar MacUthechair. Ela sedu-
ziu Blai Briugu ficando em sua

128
hospedaria quando sabia que era
seu geis, ou obrigação, dormir
com qualquer convidada. Como
resultado, Blai foi morto por
Celtchar, que então foi morto ten-
tando pagar o preço de honra de
Blai ao realizar várias tarefas na
história A morte trágica de Celtchar
MacUthechair. Brig era a filha do
juiz, poeta e pacificador de Ulster
Sencha mac Ailella, que ensinou
eloquência a Cuchulain. Quando
ele deu um julgamento desfavo-
rável às mulheres, três bolhas
apareceram em seu rosto, mas fo-
ram embora quando sua filha Brig
corrigiu a sentença.
 Grande Brid dos Cavalos: Essa pou-
co conhecida versão de Brighid
era associada com a Grande Insti-
tuição Bárdica, também conhecida
como a Grande Assembleia Bárdi-
ca, que era um bando de poetas
que viajavam de um lugar para o
outro fazendo pedidos exorbitan-
tes para os reis tribais. Seu líder
era o poeta Senchan Torpeist, que

129
partiu numa missão para recupe-
rar o épico perdido de Tain.
Santa Brígida
Não há meio de se provar definitiva-
mente se Santa Brígida era uma figura
real e histórica ou um mito. É possível
que uma mulher santa chamada Brígi-
da, filha de um druida e uma escrava,
realmente tenha vivido na Irlanda por
volta do ano 400 da Era Atual, tenha
fundado uma comunidade cristã em
Kildare e se tornado o tema de muitas
histórias relacionadas à Santa Brígida. É
também possível (e, em nossa opinião,
bem mais provável) que as histórias de
Santa Brígida sejam a evolução das his-
tórias contadas aceca da Deusa Brighid,
e que uma mulher bem inteligente e
politicamente inclinada – ou uma série
delas – tenha adotado o nome Brighid
(ou Brígida etc.) para levar vantagem
usando o poder do nome. Qualquer que
seja a realidade, é fácil ver a Deusa na
Santa: as várias Vidas de Brígida listam
muitos milagres, alguns com associações
evidentes com deusas do amanhecer, do
sol, do fogo, da cura, da fertilidade, e da
soberania pré-cristãs. Apesar de pode-

130
rem ou não ter conexão direta com a
Deusa Brighid, essas histórias certamen-
te oferecem inspiração sobre Ela.

Associações com o Amanhecer,


com o Sol, e com o Fogo
 Um pilar flamejante foi visto er-
guendo-se do lugar onde sua mãe
estava.
 Ela nasce com os primeiros raios
de sol enquanto sua mãe tem um
pé dentro e outro fora, e se banha
no leite que sua mãe carrega. A
então criança Brighid sopra sobre
o filho natimorto da rainha e ele
volta à vida.
 A casa onde dorme é vista em
chamas, com o fogo se erguendo
da terra ao céu. Eles tentam apa-
gar o fogo, mas ele desaparece,
revelando que Ela não está ferida,
e sim cheia de poder espiritual.

131
Associações com a Cura
 Sua cuidadora fica doente, e ela
transforma a água do poço em
cerveja para curá-la.
 Quando seu pai tenta forçá-la a se
casar, ela arranca um de seus
próprios olhos. Quando ele se
compadece, ela se cura.
 Quando um leproso lhe pede uma
vaca, ao invés de dá-la ela o cura
da lepra.
 Ela transforma água em leite, que
cura os doentes.
 Ela tem uma doença nos olhos,
bate a cabeça numa pedra num
acidente de carruagem e o sangue
que jorra cura duas mulheres
mudas. Depois, ela se cura.
 Quando um servo derruba o vaso
do rei e o quebra, ela o salva so-
prando sobre o objeto para
consertá-lo.
 Quando dois leprosos estão pres-
tes a lutar perto dela, a mão de
um definha e a mão de outro en-
colhe. Ela então cura a lepra de
ambos.
 Ela cura um garoto mudo.

132
 Ela faz com que a língua de uma
mentirosa inche na Lunasa Tel-
town Fair para que ela não fale.
Depois consegue saber a verdade
acerca da identidade do pai do fi-
lho da mulher.
 Sua sombra cura uma mulher de
tuberculose.
 Seu cinto cura todas as doenças, e
ela o dá a uma mulher pobre para
que ela viva como curandeira.
 Ela abençoa uma tina de água.
Quando cai, a tina rola porta afora
até o Loch Laphain sem quebrar
ou derramar. A água curaria
quaisquer doenças.
 Sua presença faz com que o temí-
vel louco de Sliab Fuait reze e a
louve.
 Ela faz com que um leproso lave
outro, e isso o cura. Este se recusa
a lavar o primeiro, mas ela então o
lava, curando-o. O outro, porém,
sente fagulhas de fogo romper sua
pele e é coberto por lepra do alto
da cabeça à sola dos pés.

133
Associações com Fertilidade
 Tudo o que toca aumenta. Ela
cuida de ovelhas, alimenta pássa-
ros e alimenta os pobres.
 Ladrões roubam dois dos suínos
que ela pastoreia, mas quando ela
conta as cabeças, não falta ne-
nhum.
 Ela dá todo o bacon que deveria
ser entregue a um hóspede para
um cão, mas ainda restam cinco
pedaços, assim como antes.
 Ao fazer manteiga, dá a maior
parte para os pobres, mas por mi-
lagre não falta nada.
 Ela milagrosamente produz um
grande suprimento de cerveja
com uma única medida de malte.
 Ela recebe maçãs, e redistribui tu-
do aos leprosos. Quando quem
lhe deu reclama, ela amaldiçoa
suas três macieiras e elas ficaram
estéreis.
 Ela multiplica ovelhas e pães e lei-
te para alimentar uma multidão.
 Ela abençoa a água para fazer com
que uma esposa deseje o marido
de novo.

134
 Ela dá uma corrente de prata com
uma forma humana numa ponta e
uma maçã na outra. Quando seus
seguidores reclamam, tudo volta
como antes.
 Ela faz com que vacas que já de-
ram leite duas vezes sejam
ordenhadas uma terceira vez e
deem mais leite do que antes para
um convidado.
 Ela mantém suas ceifeiras secas
durante uma tempestade.
 Ela traz de volta um bezerro que
uma viúva matou para si e con-
serta seu tear.
 Quando um ladrão rouba algumas
das ovelhas que ela observava, ne-
nhuma aparece faltando.
 Quando um homem da sua casa
faz hidromel para o Rei de Leins-
ter e todos ficam bêbados antes da
chegada do rei, ela abençoa os to-
neis e os restaura.
 Quando ela precisa de mais leite
para seus hóspedes, suas vacas
lhe dão tanto a ponto de criar um
lago de leite.

135
Associações com a Soberania
 Ela dá toda a riqueza de seu pai
para os pobres, e ele então tenta
vendê-la ao Rei de Leinster. En-
quanto ela espera na carruagem,
do lado de fora, ela dá sua espada
a um leproso. O Rei de Leinster a
liberta.
 Ela faz com que as águas do Liffey
subam contra ladrões de gado. Eles
colocam suas roupas nos chifres
dos bois e os mandam de volta.
 Ela milagrosamente liberta um ca-
tivo preso pelo rei.
 Seu pai a envia a Ailill, Rei de
Leinster, para perguntar acerca de
uma espada emprestada. O escra-
vo do rei pede por sua ajuda. Ela
pede ao rei tanto a espada como
também a liberdade do escravo.
Ele pergunta o que ela pode lhe
dar, e ela oferece excelentes filhos,
reinado para seus filhos, e o céu.
Ele diz que só quer uma vida lon-
ga e vitória na batalha contra o
norte. Ela assim o faz, e ele vence
39 batalhas. Depois de sua morte,

136
mesmo a presença de seu corpo
garante a vitória.
 Rei Ailill recusa seu pedido de
madeira para o santuário que es-
tava a construir, e ela faz com que
seus cavalos não saiam do lugar.
Quando ele lhe dá cem carroças
cheias de madeira e os artesãos
necessários para construir o san-
tuário, ela confere aos
descendentes do rei a soberania
sobre Leinster.
 Ela faz com que as águas do rio
Barrow subam contra um leproso
que foi ingrato ao receber dela
uma vaca, mas protege outro que
lhe foi grato.
 Um leproso faz greve de fome até
receber a armadura e as armas do
Rei de Leinster. Ela faz com que o
rei vague sem destino até que dê
essas coisas ao leproso.

137
Associações gerais com a Magia e
com o Outro Mundo
 Seu nascimento é anunciado por
um druida.
 Ela não pode comer a comida deste
mundo, apenas o leite de uma vaca
branca de orelhas vermelhas. Ela
vomita qualquer outra comida.
 Ela força um espírito maligno a se
revelar e então partir.
 Ela transforma sal em pedras para
expor um mentiroso (que não
admite carregar sal precioso), en-
tão faz com que volte de novo a
ser sal quando ele diz a verdade.
 Ela vê a cabeça de um bode num
cálice depois que um garoto rouba
o animal. Quando ele se arrepen-
de a visão desaparece.
 Ela manda um homem pescar e
ele acaba sendo levado e abando-
nado por uma foca. No mesmo
dia ele é resgatado, encontra a fo-
ca morta na praia ao voltar para a
Irlanda e a traz para seus hóspe-
des para que se alimentem dela na
hora da janta.

138
 Ela transforma rochas em sal para
uma mulher que queria sal.
 Quando um plebeu mata por aci-
dente ao cortar lenha a raposa do
Rei de Leinster, um animal que
fazia truques, ela faz com que
uma raposa comum passe a reali-
zar os mesmos truques para que o
Rei não mate o lenhador.
 Ela vê uma batalha ao longe e faz
com que outros a vejam.
 Ela subjuga tempestades no mar.

Conclusão
Brighid é uma divindade complicada e
multifacetada, seja sob o viés de deusa
celta ou como santa cristã, seja sob o
viés dos estudos antigos ou da revela-
ção moderna. Este ensaio só oferece um
relance do mundo no qual Ela habita,
um mundo que pode parecer enorme-
mente complexo à primeira vista. Assim
como muitas divindades, as caracterís-
ticas de Brighid e sua identidade são
muito fluidas em comparação com os
humanos e, enquanto pode ser de al-
guma ajuda no começo de uma jornada
espiritual categorizar o que Brighid É e

139
o que Brighid Não É, essa classificação
precisa ser plexível. Nossa Senhora tem
mostrado várias e várias vezes o quão
pronta está pra cruzar limites e desafiar
as expectativas: literatura, histórias e
estudo são só os passos iniciais de uma
aventura muito maior.
Este ensaio procura apenas compilar
o conhecimento relevante, assim como
algumas pesquisas e teorias importan-
tes de uma maneira fácil de se
compreender. Uma obra verdadeira-
mente completa acerca da história e
teologia Brigidina demandaria múlti-
plos volumes – sem mencionar as
muitas vidas necessárias para coletar,
analisar e comentar toda essa informa-
ção! – Enquanto essa abordagem possa
ser com certeza um objetivo nobre para
alguns devotos, este ensaio se apresenta
com a simples esperança de inspirar
uma exploração futura. Onde essa ex-
ploração o levará é entre você e Brighid.
Que Brighid o abençoe e a sua jorna-
da espiritual!

140
O que é o Paganismo Brigi-
dino?
por Gilbride20
Brighid é uma das mais amadas e
amplamente veneradas divindades no
mundo inteiro, e seu culto ou adoração
em uma de Suas muitas formas parece
cruzar todos os limites da cultura, do
idioma, e da tradição religiosa. Deusa
da poesia, da forja e da cura na antiga
Irlanda, Brighid é adorada menos por
Suas específicas características do que
pela energia de uma compaixão sem
fim, pela gentileza e pela criatividade
com as quais sempre esteve associada.
De acordo com o antigo texto irlandês
chamado Glossário de Cormac, Seu culto
era tão popular na era pagã que Seu
nome poderia ser usado para represen-
tar qualquer deusa.
Nem sempre se considera as implica-
ções disso, mas, para mim, revela que
Brighid era vista como muito mais do
que apenas uma deusa da poesia ou uma

20
Publicado originalmente no Patheos Agora como Loop of
Brighid.

141
deusa da cura ou ainda uma deusa irlan-
desa. Acho que Ela era vista como todas
essas coisas, mas também como algo
muito mais vasto e mais agregador,
como um conceito de sagrado feminino
em seu sentido mais amplo.
Nem todos escolheriam interpretá-La
desse jeito, mas é fato que Brighid ins-
pira intensa devoção mesmo hoje,
apesar de Seu culto muitas vezes ser
incorporado por outras tradições religi-
osas ao invés de ser organizado como
uma tradição distinta própria. A forma
mais popular de devoção Brigidina hoje
é provavelmente a guarda da chama, na
qual devotos se alternam cuidando de
uma vela dedicada a Brighid num ciclo
de vinte e um dias. A maior organiza-
ção de guarda da chama é a Ord
Brighideach, que aceita tanto cristãos
como pagãos, homens e mulheres. Gru-
pos de guarda menores, ou células,
podem restringir seu quadro de mem-
bros apenas a mulheres, ou apenas a
pagãos. Até onde sei, não há nenhuma
organização restrita apenas a cristãos
ou apenas a homens.

142
Aqui estão alguns dos tipos de vene-
ração Brigidina:
 Celta Cristã: A veneração de Santa
Brígida de Kildare dentro da fé ca-
tólica, ortodoxa e, algumas vezes,
até protestante. Muitos estudiosos
celtas acreditam que a ordem de
freiras que guardava a chama
eterna em Kildare na época medi-
eval derivou de uma ordem mais
antiga de sacerdotisas devotas da
deusa. Alguns brigidinos cristãos,
com as freiras que guardam a
chama reacesa em Kidlare, têm
sido amistosos e abertos àqueles
que A veem como uma deusa.
Outros insistem uma clara separa-
ção entre deusa e santa.
 Espiritualidade Celta: Algumas pes-
soas abraçam tanto a herança
mitológica pré-cristã da cultura
celta e uma interpretação new age
mais ampla da cristandade celta,
sem se identificar especificamente
como pagãs ou cristãs. Essas pes-
soas geralmente veem a lenda de
Santa Brígida como derivada das

143
histórias antigas acerca da deusa
Brighid.
 Movimento da Deusa: Devotos de
Brighid que se identificam com a
espiritualidade feminista ou o
Movimento da Deusa. Seguidores
desse movimento cultuam uma
Deusa mais ou menos monoteísta
com muitos nomes e aspectos, in-
cluindo Brighid.
 Wiccana: Alguns wiccanos identi-
ficam Brighid como a Deusa
wiccana, geralmente em Sua for-
ma de donzela. Aqueles que se
consideram wiccanos celtas podem
ser muito focados em Brighid,
mas outros podem vê-la só como
uma das muitas formas da Deusa.
 Reconstrucionista: Reconstrucionis-
tas celtas tentam reconstruir
precisamente a religião dos celtas
da Idade do Ferro. A devoção
Brigidina dentro do reconstrucio-
nismo celta coloca uma prioridade
alta na exatidão das práticas atuais.
 Tradicionalista: Grupos que tentam
praticar as tradições do povo gaé-
lico num contexto cultural e

144
religioso, incluindo a veneração
de Brighid como uma santa ou
deusa. Alguns grupos com raízes
tradicionalistas agora se referem à
sua prática como um politeísmo
tribal, ou sinnsireachd, uma palavra
que significa caminhos ancestrais.
 Neodruídica: Grupos praticantes
do druidismo podem variar desde
aqueles que são virtualmente re-
construcionistas até aqueles que
são virtualmente new age, e há
também muitas ordens britânicas
antigas baseadas nos escritos do
galês Iolo Morganwg do século
XVIII. Algumas organizações ne-
odruídicas incluem tanto devotos
individuais brigidinos como tam-
bém templos, bosques, ou grupos
de guarda da chama devotados à
Brighid.
 Paganismo Brigidino: Este é meu
próprio termo para uma prática
pagã focada principalmente em
Brighid, queira ou não o devoto
também se identificar com o re-
construcionismo celta, druidismo
ou qualquer outro caminho. Al-

145
guns pagãos brigidinos também
cultuam outros deuses e deusas
celtas, e até divindades não-celtas,
enquanto outros cultuam Brighid
apenas. Alguns consideram Bri-
ghid não necessariamente como a
criadora do universo ou do mun-
do, enquanto outras A veem
simplesmente como uma deusa
celta que é objeto pessoal de sua
devoção. Uns pensam que Santa
Brígida é um avatar da deusa, ou-
tros não. Alguns consideram outras
deusas, como Brigantia, como ma-
nifestações de Brighid, outros não.
A característica que define o paga-
nismo brigidino é simplesmente a
devoção à Brighid como cerne de uma
vida religiosa e espiritual. Baseado no
número de pagãos que se identificam
principalmente como devotos de Bri-
ghid em fóruns de discussão na internet
e em outros contextos, esse parece ser o
maior tipo de devoção pagã, mas não é
fácil delimitá-la e categorizá-la. O pa-
ganismo brigidino varia bastante de um
devoto para o outro, e não tem uma
teologia estritamente definida além da

146
ênfase Nela, e é talvez melhor compre-
endido por meio da energia da própria
deusa – uma energia de luz e fogo, de
amor e cura, de inspiração artística e de
paz e justiça.
Pagãos brigidinos geralmente veem a
tendência de Brighid em cruzar os limi-
tes como uma parte característica de
Sua natureza, e assim colocam muito
menos ênfase numa estrita reconstrução
histórica em sua devoção pessoal. Eles
também tendem a serem abertos para o
lado cristão da tradição brigidina mes-
mo se não se identificam com o
cristianismo.

147
A Brig: Energia Divina da
Criação
por Gilbride21
Na Segunda Batalha de Moytura, Bri-
ghid é apresentada simplesmente como
Bríg. Essa palavra significa poder ou
altura, e pode se referir tanto a lugares
altos, como topos de colinas, como a
estados de consciência e de inspiração
artística mais profundos. Nomes com o
som de brig podem ser traduzidos como
O Maior ou O Exaltado.
Durante a Idade do Ferro dos celtas,
os chefes tribais geralmente governa-
vam de fortes em montes ou colinas,
que se tornaram vilas e até pequenas
cidades em alguns casos. Ferreiros e
outros artesãos tinham oficinas dentro
das muralhas desses fortes, e ali tam-
bém ficava o santuário religioso da
tribo. O santuário, ou nemeton, geral-
mente se localizava no ponto mais alto,
bem no centro da fortificação. Isso pode
ter levado a uma associação entre o

21
Publicado originalmente no Patheos Agora como Loop of
Brighid.

148
topo da colina, o conceito de poder sa-
grado, e a deusa que personificava a
cultura humana e suas manifestações,
como a forjaria.
A história gaélica inclui muitas figu-
ras descritas como mulheres humanas
cujos nomes começam com Brig. Brig
nesse contexto significa Poder, e esses
nomes sempre indicam que a mulher
em questão possui poder sobre algo.
Não está claro se esses nomes-brig eram
originalmente apenas epítetos da deusa
Brighid ou se as mulheres que traziam
esses nomes eram tidas como avatares
ou encarnações de algum aspecto da
deusa.
Porém, se pensarmos em Brig como
uma palavra para Poder, vemos aí o
potencial para uma teologia similar ao
shaktismo, o ramo do hinduísmo cen-
trado na deusa. No shaktismo, todo
poder, em qualquer forma, é uma mani-
festação de Shakti, a energia divina da
criação. Shakti não é feminina em um
sentido absoluto, mas pode ser conce-
bida como uma energia feminina dentro
de nossa perspectiva finita.

149
Se quisermos nos restringir ao que po-
demos provar sobre o passado, seríamos
limitados a apontar as similaridades, as
conexões e as possibilidades – mas a
teologia não é necessariamente presa à
história. – Podemos tomar os fatos dis-
poníveis como sementes e ver então
como eles crescem.
Pessoalmente, vejo a realidade divina
última como um poder além de todas as
qualidades, de todos os atributos ou de
toda a compreensão, um poder que
espontaneamente gera ou emana uni-
versos e realidade de si mesmo. Esse
processo ou energia de geração criativa
espontânea pode ser compreendido
como Brig, ou o poder da criação.
Brig está além de todas as categorias
como sexo, mas pode ser vista como
uma energia divina feminina devido à
sua qualidade de dar a luz às coisas.
Brig pode também se manifestar como
deusas específicas com personalidades,
características e poderes.
Como Brig é a energia criativa primal
do universo, Brig é inerente a todos os
fenômenos de quaisquer tipos. Porém, a
deusa específica que mais diretamente

150
manifesta a qualidade de Brig é Brighid
em Sua concepção mais ampla e univer-
sal. Brighid é a deusa de Brig.
Essa Brighid Universal se manifesta na
Terra de múltiplas formas diferentes,
algumas das quais têm brig em seus
nomes, enquanto outras não. As deusas
do tipo Minerva celta poderiam ser vis-
tas como da família Brighid de deusas
celtas, mas falando de maneira mais
ampla, a Brig é o Sagrado Feminino em
si, e todas as deusas são manifestações
dela.
Para aqueles que são atraídos pela
deusa Brighid, essa teologia nos permi-
te chegar a ela em mais de um nível de
cada vez, se assim o quisermos. Pode-
mos vê-La como uma deusa irlandesa
específica, ou como uma família pan-
celta de deusas com aspectos que se
sobrepõem, no conceito de Deusa ainda
mais amplo, e como a realidade divina
última em sua forma personalizada.
Esses níveis não são mutualmente ex-
clusivos – não há necessidade de
distinguir entre uma interpretação pu-
ramente politeísta ou mais ou menos
politeísta. Ao mentalmente alterarmos

151
entre os diferentes níveis dependendo
do contexto, podemos nos relacionar
com Brighid como um ser divino espe-
cífico com quem podemos ter uma
relação pessoal – ou como um modo de
se aproximar da divindade suprema.
É claro que isso não significa que essa
forma particular de se aproximar do
divino é mais verdadeira do que outra –
você não pode construir uma cerca ao
redor do infinito. – Só porque Brig pode
ser considerada o poder primordial
criativo do universo, isso não significa
que não existam inúmeras outras for-
mas válidas de pensar acerca disso.
Porém, pagãos modernos têm sido
tão avessos a quaisquer coisas que se
assemelhem a dogmas que alguns de
nós tendem a evitar o pensamento teo-
lógico completamente. Não precisamos
realmente desse limite. Geralmente
ouvimos pagãos dizer que nossas reli-
giões são definidas mais pela prática do
que pelas ideias, mas há algumas práti-
cas que não podemos nem acessar sem
encarar as ideias que as tornam possí-
veis. Se nos recusarmos a lidar com a
teologia, também limitaremos nossa

152
prática. Assim, para os seguidores de
Brighid, esse conceito de Brig como um
poder criativo universal é um meio de
começar a pensar em ver Brighid em
tudo – uma forma de ver tudo no uni-
verso como Seu fogo divino.

153
Santa e Avatar
por Gilbride
Entre os acadêmicos no campo de es-
tudos celtas tem havido muito debate
sobre o quanto Santa Brígida de Kildare
se conecta com a antiga deusa de mes-
mo nome. Há uma gama de evidência
circunstancial, mas nenhuma prova, e
nunca haverá provas disso porque os
gaélicos pré-cristãos não tinham uma
cultura literária. Eles usavam o Ogham,
sua própria escrita nativa, quase exclu-
sivamente para lápides e marcações de
limites de terra – não tratados de teolo-
gia.
Se encararmos o assunto como um
acadêmico o faria, nunca iríamos além
da afirmação que alguns aspectos da
história de Santa Brígida podem ter
algo a ver com a deusa Brighid. Se ape-
nas encararmos os aspectos da história
da deusa que são provavelmente de
origem pré-cristã, teríamos muito pouco
com o que trabalhar.
Porém, não temos que ver isso como
um acadêmico o faria, pois a crença e a
devoção em divindades não é parte do

154
estudo acadêmico. Mesmo se um aca-
dêmico em particular cultuasse Brighid
em sua vida privada, teria de ter cuida-
do em sua escrita acadêmica, limitando
seus comentários ao pouco que pode ser
provado ou àquilo que tivesse grande
apoio das evidências.
Como devotos, e não como historia-
dores, podemos partir de um conjunto
diferente de considerações e chagar a
um conjunto diferente de conclusões. A
deusa que cultuamos é uma entidade
real de poder imenso. Ela toma decisões
e age quando a ação é necessária. Ela
opera no mundo e isso tem seus efeitos.
Durante o conflito entre as Tuatha de
Danann e os gigantes Fomores, Brighid
se casou com Bres – um rei meio-Fomor.
Ao fazê-lo, Ela cruzou um limite. –,
assim como Santa Brígida quando nas-
ceu ao amanhecer na entrada de casa. A
santa depois cruzou muitos outros limi-
tes. Durante os séculos de guerra entre
os ingleses e os gaélicos, Santa Brígida
foi honrada por ambos os povos e em
ambas as línguas. Seu equivalente esco-
cês, Santa Bride, for honrada tanto pelos
Highlanders que falavam gaélico como

155
pelos homens das Terras Baixas que
falavam escocês.
Cruzar limiares está na natureza de
Brighid, e ao fazê-lo Ela nos mostra que
podemos fazer o mesmo.
Quando o antigo mundo pagão estava
desaparecendo enquanto o cristianismo
se espalhava, a deusa que cultuamos
não escolheu dar lugar a outro e desva-
necer da consciência humana. Ela
decidiu cruzar o limiar emergente entre
o velho mundo pagão e o novo mundo
cristão, e se manifestar numa nova for-
ma para atingir as necessidades de um
novo tempo. Sua transição para a santi-
ficação não foi algo imposto a Ela por
uma religião estranha – foi algo que Ela
escolheu. – Santa Brígida de Kildare era
um avatar da deusa, e Ela manteve a
chama divina acesa durante todos os
séculos em que o cristianismo se colo-
cava como principal religião do mundo
ocidental.
Nosso próprio tempo é também um
de mudanças. O cristianismo não mais
tem o domínio cultural que tinha, e
muitas pessoas têm descoberto que ele
não responde às suas necessidades espi-

156
rituais. Nesse mundo de mudanças, há
uma vez mais um limiar emergente,
entre a herança da tradição espiritual
definida pelo cristianismo e os inúme-
ros novos movimentos religiosos que se
identificam como pagãos.
Ainda assim, Brighid cruza esse limi-
ar tão facilmente como qualquer outro,
transitando de santa à divindade como
uma vez transitou de divindade à santa.
Dessa perspectiva, a longa história de
Brighid como santa não pode ser com-
pletamente compreendida dissecando-a
historicamente, pois isso também pode
ser visto como um processo de revela-
ção.

157
Preparando um Altar
por Aster Breo
Um altar do Clann Bhride é um espa-
ço dedicado para a guarda das
ferramentas do praticante que cultua
Brighid. Pode ser uma mesa, uma prate-
leira, ou outra superfície aberta, ou
pode ser uma gaveta ou uma caixa que
se fecha para proteger os itens ali guar-
dados. O estilo e a disposição das coisas
no altar varia de praticante a praticante,
mas precisa incluir certos itens específi-
cos que representam Brighid e Suas
associações fundamentais. As formas
dessas representações cabem à escolha
individual.
Um altar do Clann Bhride inclui:
 representação de Brighid – pode
ser uma estátua, uma imagem, ou
uma representação abstrata de
qualquer estilo, ou pode ser uma
cruz de Brighid (símbolo tradicio-
nal associado à Brighid);
 chama de Brighid – uma vela ou
lâmpada dedicada à Brighid;

158
 água de Brighid – um copo, taça
ou outro vasilhame com água
límpida trocada diariamente; e
 uma vasilha ou prato para ofe-
rendas.
De acordo com o praticante, outros
itens podem ser incluídos no altar, como:
 cruz de Brighid;
 Brat;
 velas/lâmpadas para guarda da
chama (uma chama separada para
cada célula) e/ou para outros
propósitos específicos;
 contas de oração;
 joia usada para a guarda da cha-
ma ou dedicada a Brighid por
qualquer outra razão;
 representações das associações de
Brighid (cura, poesia e aprendi-
zado, forja, justiça social);
 representação do sol;
 representação das estrelas;
 representação da lua;
 representação dos reinos da terra,
do mar, e do céu;
 símbolos de importância pessoal;
 ferramentas divinatórias; e
 caixa/sacola/vasilha de orações.

159
Preparando uma Cruz de
Brighid
Cruzes de Brighid podem ser feitas
usando vários tipos de materiais dife-
rentes, incluindo juncos recém-cortados,
palha, grama, palha de milho, ráfia, fio,
canudinhos, tiras de papel, e até limpa-
dores de canos. Há vários estilos de
cruzes de Brighid, mas a mais conheci-
da é a cruz de quatro braços iguais, que
provavelmente evoluiu da suástica e
representava uma roda solar. Cruzes de
três braços são feitas da mesma manei-
ra, simplesmente omitindo um dos
braços.
Materiais necessários para uma cruz
de quatro braços:
 10 fios de tamanho iguais, 9 dos
quais deverão ser dobrados no
meio antes de começarmos; e
 4 peças menores (cerca de metade
do tamanho das peças mais lon-
gas) ou 4 elásticos pequenos.
A cruz aqui apresentada é feita com
fios com de aproximadamente 15 cen-
tímetros.

160
Passo 1. Comece com o fio não do-
brado como peça central. Passe um
pedaço dobrado sobre o ponto central
em ângulo reto para criar o começo do
primeiro braço.

Passo 1

Passo 2. Passe uma segunda peça do-


brada sobre ambas as metades da
primeira, paralela à peça central, para
começar o segundo braço. Deslize essa
peça até ficar bem próxima à peça cen-
tral.

161
Passo 2

Passos 3 e 4. Adicione peças para


começar o terceiro e quarto braços.

Passo 3 Passo 4

Passos 5 a 8. Continue adicionando as


peças dobradas trabalhando num pa-
drão espiral ao redor das que já estão
ali, até que os braços da cruz cheguem
ao tamanho desejado.

162
Passo 5 Passo 7

Passo 6 Passo 8

Passo 9. Afrouxe a peça mais externa


do segundo braço (a peça mais externa
dobrada sobre o primeiro braço).

163
Passo 9

Passo 10. Coloque a última peça do-


brada sobre a peça central para
completar o primeiro braço. Desta vez,
porém, deslize-a sob a peça frouxa do
passo anterior.

Passo 10

Passo 11. Aperte a peça frouxa para


segurar a última peça firme no lugar.

164
Aperte e arrume todas as peças para
que os braços fiquem firmes e iguais.

Passo 11

Passos 12 e 13. Use uma peça menor


(ou um elástico) na ponta de cada um
dos braços da cruz para finalizar os
braços.

Passo 12 Passo 13

165
O Ritual do Caldeirão
por Gilbride

Uma prática bárdica mística


O ritual do Caldeirão é uma forma de
Imbas Forosnai, ou prática bárdica mís-
tica, usando a estrutura dos Três
Caldeirões do texto Cauldron of Poesy:
O Caldeirão da Incubação está
na posição normal no momento em
que é gerado. Ele concede sabedo-
ria às pessoas enquanto estudam
na juventude.
O Caldeirão do Movimento, po-
rém, exalta uma pessoa depois que
for colocado na posição normal. Ele
está de lado quando gerado.
O Caldeirão da Sabedoria está de
ponta cabeça quando gerado. Se es-
se caldeirão puder ser virado,
concederá a sabedoria de toda arte
que existe.
Algumas pensam que os Três Caldei-
rões estão localizados em três áreas
diferentes do corpo: o Caldeirão da
Incubação na barriga, o Caldeirão do
Movimento no peito, e o Caldeirão da

166
Sabedoria na cabeça. Mas prefiro pensar
que os Três Caldeirões são na verdade
um único Caldeirão com três estados
diferentes de existência e três nomes
diferentes. Nos três aspectos, esse Cal-
deirão está localizado no broinn, na
barriga ou no útero.
Qualquer que seja sua abordagem
quanto a isso, o Caldeirão da Incubação
cozinhará as habilidades e técnicas bási-
cas da arte que você pratica. Uma vez
que tenha atingido um nível básico de
técnica na sua arte escolhida, o Caldei-
rão da Incubação terá feito seu trabalho.
De acordo com o texto do Caldeirão,
todos podem gerar e fazer uso do Cal-
deirão da Incubação, mas apenas
metade da raça humana é capaz de usar
o Caldeirão do Movimento. Esse caldei-
rão está de ponta cabeça naqueles em
que falta o temperamento artístico ou o
insight para ativá-lo, e de lado naqueles
que têm algum grau de habilidade artís-
tica. O Caldeirão do Movimento pode
ser virado para a posição normal e to-
talmente ativado por qualquer emoção
poderosa, especialmente as nove lista-
das no texto do Caldeirão:

167
 Tristezas humanas: saudade, má-
goa, coração partido.
 Tristeza divina: práticas das religi-
ões ascetas, como solidão, jejum e
coisas assim.
 Alegrias humanas: desejo erótico,
saúde e prosperidade, realização
artística, Imbas (êxtase poético).
 Alegria divina: sabedoria espiritu-
al.
Se o Caldeirão do Movimento for to-
talmente ativado por alegria divina,
poderá também ativar o Caldeirão da
Sabedoria, concedendo uma gama de
poderes milagrosos e um profundo
insight espiritual. A ativação completa
do Caldeirão da Sabedoria é como um
estado divino, como aquele em que se
encontravam os bardos arquetípicos
Amergin e Taliesin ou os santos mila-
grosos da igreja celta primitiva. Mas a
ativação momentânea do Caldeirão da
Sabedoria é muito mais comum, e ainda
assim capaz de mudar a vida de uma
pessoa.
O objetivo do ritual do Caldeirão é
virar o Caldeirão do Movimento para a
posição normal, ativando seu poder por

168
meio do uso da Imbas Forosnai, a anti-
ga versão irlandesa de uma velha
prática conhecida como incubação oracu-
lar. Essa é a prática de entrar em transe
ou dormir na escuridão e no silêncio
total para receber um sonho ou visão
(um aisling, como é geralmente chama-
do na tradição irlandesa).
Em minha interpretação, a prática da
incubação no quarto escuro é equivalente
a estar no útero da deusa Brighid, que
também equivale às trevas do mundo
subterrâneo, às profundezas do Mar, à
imensidão do inconsciente e ao reino da
morte. Ao mesmo tempo, o praticante
se visualiza como estando grávido de
poesia, incubando sua arte em seu broinn
(homens fazem o mesmo que as mulhe-
res nesse sentido).
Os antigos fili, ou bardos, usavam o
Imbas Forosnai para responder a qual-
quer pergunta que quisessem, mas
também usavam métodos muito simila-
res de incubação para compor toda sua
poesia. Ambos os conceitos se combi-
nam neste ritual do Caldeirão, que usa
tristezas e alegrias para virar o Caldei-
rão, receber Imbas ou êxtase poético, e

169
compor um poema (ou criar qualquer
outro tipo de arte).
O Caldeirão do Movimento permane-
ce na posição normal apenas durante o
fluxo de Imbas – depois disso, ele vira
de lado até ser ativado de novo. – Com
a prática repetida, você pode ter sucesso
em ativar o Caldeirão da Sabedoria
mesmo que por apenas alguns momen-
tos, um estado espiritual equivalente
àquilo que outras tradições descreveri-
am como uma experiência iluminadora.
Já a ativação completa do Caldeirão da
Sabedoria seria capaz de conceder
onicompetência, a habilidade de criar
qualquer arte ou ter qualquer perícia.

O Ritual do Caldeirão
1. Preparação
1.1. Prepare uma bebida para repre-
sentar o Imbas sagrado oferecido aos
poetas pela deusa Brighid. Essa bebida
pode ser leite com mel, cerveja com mel,
hidromel, vinho de frutas, hidromel
misturado com leite, cerveja com mel e
leite, ou vinho de frutas com leite.
1.2. Prepare a oferenda de alimento.
Pode ser tanto uma cesta de amoras

170
como uma mistura contendo coalhada
de queijo, alho, abrunho, alho poró,
cebola, maçã verde e amoras.
1.3. Prepare o espaço sagrado do altar
na área onde realizará o ritual. O altar
pode incluir representações simbólicas
de quaisquer divindades que pretender
invocar.
1.4. Prepare o local onde se deitará, e
algo para cobrir seu rosto se achar que
poderá ajudar. Colocar um peso sobre a
barriga é opcional.
É aceitável visualizar mentalmente
tanto as oferendas e o altar, se preferir.
Na visualização mental, carne de porco
crua pode ser usada como oferenda de
alimento – mas não use isso fora da
visualização por não ser seguro.
2. O banquete do Outro Mundo
2.1. Beba um pouco da bebida sagra-
da. Se escolher uma bebida alcoólica,
tome apenas o bastante para relaxá-lo.
2.2. Mastigue a comida ofertada, mas
não a engula. Visualize que está masti-
gando a comida do banquete do Outro
Mundo para abrir as portas da sua men-
te.

171
3. A oferenda
3.1. Coloque a comida mastigada da
oferenda numa vasilha em seu altar,
junto com o restante da bebida sagrada
do Imbas.
3.2. Ajoelhe-se ou fique em pé diante
do altar, erga seus braços na posição de
oração de orans (com as palmas volta-
das para fora) e diga:
am gaeth i mmuir
am tond trethan
am fuaim mara
A primeira linha, Eu sou o vento no
mar, dá a sensação de mergulhar nas
profundas águas escuras. A segunda
linha, Eu sou uma onda das profundezas,
dá uma sensação de ganho de peso. A
terceira linha, Eu sou o som do mar, dá o
sentimento de horror enquanto você
entra em transe. Esse sentimento de
horror não é negativo ou maligno – é a
sensação de maravilha numinosa na
qual sua mente mergulha ao seguir em
direção ao inconsciente e entrar em
contato com as vastas e primais forças
divinas.
Você pode se visualizar sendo guiado
até o mundo subterrâneo pela Grande

172
Bríd dos Cavalos, que cavalga uma
égua branca de orelhas vermelhas, ou
pela Cailleach em seu papel de deusa
mãe dos Fomores. Como alternativa,
você pode simplesmente se ver descen-
do nas trevas e no silêncio sem imagens
visuais.
De qualquer maneira, você deve con-
tinuar a repetir esse cântico até estar
profundamente em transe.
4. A invocação
4.1. Olhe firme em suas palmas aber-
tas e recite uma invocação. A invocação
que escolherá depende de você, mas
aqui estão algumas opções da Canção de
Amergin:
 Para invocar Brighid em sua for-
ma de deusa de infinita
compaixão e amor, entoe am dér
gréne, ou Eu sou a lágrima do sol.
 Para invocar Brighid em sua for-
ma de deusa da profecia, do
poder e do mundo subterrâneo,
entoe am bri danae, ou Eu sou uma
colina de Poesia.
Esses dois cânticos podem ser usados
independentemente da emoção com a

173
qual estiver trabalhando, mas você po-
de usar estas alternativas, se preferir:
 Para agilidade emocional ao tra-
balhar com Saudade sem ser
aprisionado por ela, entoe am séig
i n-aill, ou Eu sou um falcão num
penhasco.
 Para força ao lidar com a Mágoa,
entoe am dam secht ndirend, ou Eu
sou um cervo da galhada sétupla.
 Para a perspectiva mais ampla ne-
cessária para transcender um
Coração Partido, entoe am loch i
mmaig, ou Eu sou um lago na planí-
cie.
 Para a coragem ao explorar as
práticas ascetas da Tristeza Divi-
na, entoe am torc ar gail, ou Eu sou
um javali de bravura.
 Para a beleza e alegria do Desejo
Erótico, entoe am cain lubai, ou Eu
sou a mais bela das flores.
 Para a vitória nos conflitos diários
que levam à alegria da Saúde e da
Prosperidade, entoe am gai ifodb
feras feochtu, ou Eu sou a lança da
batalha.

174
 Para a alegria da Realização Artís-
tica, entoe am he i llind, ou Eu sou
um salmão numa lagoa.
 Para invocar e explorar a alegria
do êxtase poético ou do Imbas,
entoe am bri danae, ou Eu sou uma
colina de Poesia.
 Para invocar e explorar a Alegria
Divina, entoe am dér gréne, ou Eu
sou uma lágrima do sol.
4.2. Continue entoando até que se sin-
ta pronto para entrar em incubação.
5. A Incubação
5.1. Deite-se no lugar preparado, cu-
bra ou feche seus olhos, coloque um
peso sobre sua barriga para encorajar
uma respiração mais pesada (se dese-
jar), e medite no tópico que escolheu
para seu ritual. Por exemplo, se estiver
explorando a tristeza da mágoa, poderá
visualizar Brighid lamentando pela
morte de seu filho Ruadan depois da
Segunda Batalha de Moytura; se estiver
explorando a alegria divina, poderá
visualizar Brighid como uma gloriosa e
radiante deusa solar que emana felici-
dade e êxtase por todo o universo. A
escolha da visualização é sua.

175
5.2. Continue em seu quarto escuro até
que seu Caldeirão do Movimento se
vire e você receba o Imbas de alguma
maneira. Isso pode significar coisas
completamente diferentes. Você pode
ouvir um trecho com o qual poderá criar
um poema ou uma canção. Pode ver
uma imagem para uma pintura ou escul-
tura. Pode receber um insight espiritual,
ou a resposta a uma questão. Pode travar
contato com o êxtase místico de muitas
maneiras, sejam elas iluminadas ou
sombrias, calmas ou selvagens.
5.3. Quando acabar, registre o que re-
cebeu num diário ou bloco de notas.
Quando tiver tempo, complete o poema
ou a arte inspirada por suas experiên-
cias no ritual.

Conclusões
O ponto principal aqui é seu desejo de
ir além de seus próprios pensamentos,
vontades ou sentimentos para receber o
Imbas do Outro Mundo. E isso tem que
ser algo que acontece com você, não
apenas algo que você imagina.
Como você pode fazer disso uma rea-
lidade e como você pode dizer que deu

176
certo? Não é tão difícil, na verdade.
Você usa a visualização para começar a
Incubação e tenta torná-la tão vívida e
real quanto possível – imagine as cores,
as texturas, os sons, os cheiros. – Mas
visualização é apenas sua própria ima-
ginação. É algo que você cria sozinho.
Depois de certo ponto em sua Incu-
bação, você entrará num estado de
meio-sono chamado de transe hipnagó-
gico ou hipnagogia. Ao invés de tentar
refocar e acordar completamente como
você o faria em muitas das formas tra-
dicionais de meditação, você quer que
isso aconteça, pois na hipnagogia seu
ego não estará mais no controle daquilo
que vê e escuta. Imagens – algumas
vezes bem vívidas – subitamente apare-
cerão diante dos seus olhos. Vozes dirão
coisas a você. Isso não é psicose, mas
um estado cerebral entre o sono e o
despertar, um estado de sonho de re-
cordação mais fácil do que a de muitos
sonhos.
Em minha interpretação do sistema
do Caldeirão, esse fluxo livre do rio da
consciência é o equivalente ao Boyne.
As coisas que você vê e ouve nesse es-

177
tado são consideradas as bolhas de Imbas
que se erguem quando o Fogo do Co-
nhecimento de Brighid atinge as águas
do Boyne.
São comunicações diretas e proféticas
que contêm a sabedoria do mundo sub-
terrâneo. Muitas delas não farão
nenhum sentido aparente. Algumas
parecerão ter relação com o tópico da
sua meditação. Outras podem ser até
mesmo revelações espirituais que mu-
darão sua vida.
Toda vez que completar uma medita-
ção, escreva tudo o que tiver visto ou
ouvido nesse estado num diário. Tam-
bém registre quaisquer sonhos que tiver
durante esse período, principalmente
aqueles com temas ou imagética místi-
cos. Em alguns casos, você saberá
imediatamente o que as frases ou as
imagens significam a você. Em outros,
você perceberá isso subitamente num
relance de intuição meses depois ao
reler seu diário.
Algumas vezes, você se verá entran-
do num estado de êxtase ao invés de
um estado hipnagógico. Isso pode se
manifestar como uma risada espontâ-

178
nea, uma sensação de energia fluindo
por você, uma sensação de presença
divina, um sentimento de alegria muito
mais intensa do que tudo o que você
normalmente sente em sua vida, ou
mesmo uma visão. O êxtase é a alegria
divina que preenche seu Caldeirão do
Movimento e o vira completamente
para a posição normal, um requisito
importante para gerar o Caldeirão da
Sabedoria. Você pode não receber uma
informação oracular específica nesse
estado de êxtase, mas isso não importa
– se realmente precisar de uma respos-
ta, poderá perguntar de novo, mas o
êxtase é importante por si só.
O ponto mais importante aqui é que
as coisas que imaginar na sua visualiza-
ção não são realmente essenciais. A
visualização é apenas uma ferramenta.
Os meios-sonhos, as vozes oníricas, os
êxtases e os sonhos míticos são o que
você realmente deve prestar atenção –
esses são os Imbas.
Quando usar o Imbas Forosnai como
um oráculo para responder a uma ques-
tão da sua vida, precisará tanto
continuar ou repetir o processo até que

179
receba Imbas com uma resposta clara ao
seu problema. O Imbas por si só não
tem de ser claro – profecias raramente o
são. – É provável que seja uma imagem
estranha que terá de reinterpretar. O
que você precisa é de uma interpretação
clara o bastante para lhe dar um rumo.
Você pode também trabalhar com es-
te método sempre que a vida lhe
trouxer poderosas emoções, como as
quatro tristezas e as cinco alegrias: sau-
dade, mágoa, coração partido,
asceticismo, desejo erótico, saúde e
prosperidade, realização artística, o
Imbas, e a alegria divina. Por exemplo,
se partirem seu coração, você pode se
fechar na Incubação e meditar com essa
emoção até que receba a inspiração para
transformar sua emoção em arte. Ou
você pode entrar em jejum ou celibato
até que receba inspiração artística por
meio do asceticismo.
Quando estiver praticando o Imbas
Forosnai para processar as alegrias e as
tristezas em seu caldeirão interno, o
objetivo será receber Imbas relativo à
emoção que quer processar. Isso pode
requerer muitas repetições da visualiza-

180
ção em alguns casos, provavelmente
fazendo com que obtenha resultados
mais rápidos em alguns casos e fique
preso por semanas em outros. Apenas
seja paciente e continue trabalhando
nisso, pois o Imbas virá.
Espiritualmente falando, o objetivo
final é virar seu Caldeirão da Sabedoria
para a posição normal ao menos uma
vez. Isso será um estado místico de alto
nível bem além da experiência normal
do Imbas. Mas uma orientação geral é
esta: se não mudar sua vida, não é ainda o
Caldeirão da Sabedoria.
Se escrever as coisas estranhas que
visualizar e ouvir quando receber o
Imbas e tentar organizá-las de maneira
ordenada, produzirá sua própria versão
avant-garde de uma roscanna moderna,
ao menos tão obscura quanto qualquer
coisa que um antigo fili poderia ter cri-
ado. Tente. É divertido!

Resumo
Aqui está uma versão breve do ritual do
Caldeirão para facilidade de uso:
1. Preparação: prepare uma bebida
sagrada, uma oferta de comida, um

181
altar e um local para se deitar. Todos
esses elementos podem ser visualizados
se preferir, exceto o lugar para se deitar.
2. O Banquete do Outro Mundo: tome
um pouco da bebida sagrada e masti-
gue a comida ofertada sem engoli-la.
3. A Oferenda: deixo o resto da bebi-
da e da comida mastigada no altar.
Entoe ou diga as palavras am gaeth i
mmuir, am tond trethan, am fuaim mara,
ou Eu sou o vento no mar, Eu sou uma
onda das profundezas, Eu sou o som do
mar, até que se sinta entrando em tran-
se.
4. A Invocação: olhe profundamente
nas suas palmas abertas e entoe am dér
gréne ou Eu sou uma lágrima do sol, ou am
bri danae ou Eu sou uma colina de Poesia.
5. A Incubação: deite-se na escuridão
e no silêncio meditando no tema do seu
ritual até que receba Imbas.

Versão curta
Você também pode abreviar todo o
ritual do Caldeirão simplesmente se
deitando, fechando seus olhos e ento-
ando um dos mantras listados aqui
(tanto em voz alta como em sua mente)

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até que receba o Imbas. Esse método
pode ser tão ou mais efetivo que a ver-
são mais longa uma vez que estiver
acostumado com ele, mas funcionará
melhor se praticar o ritual completo de
tempos em tempos.

Para saber mais


Você poderá descobrir mais sobre a
prática dos Três Caldeirões no livro A
God Who Makes Fire: Bardic Mysticism or
Amergin, de Christopher Scott Thomp-
son.

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