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11 il (zweckrational Handelnder), interessado exclusivamente no


· , d, Hua ação, deve dispor de meios graças aos quais pode forçar
, 11j1 110 com capacidade decisória, seja pela ameaça de sanções, seja
l 111 1 ~11 asão, seja por uma manipulação hábil das alternativas de ação:
I '' 11 h-r significa aquela probabilidade de realizar a própria vontade,
111111 dti uma relação social, mesmo em face de resistência" 1. A única
li , 111111va à compulsão é o entendimento voluntário dos participantes
~, O modelo teleológico da ação, entretanto, apenas considera
orientados para o próprio sucesso e não para o entendimento
, -11111 Somente admite processos de entendimento mútuo na medida
, q111• os participantes os vêem como funcionalmente necessários ao
I'' 111 sucesso. Mas tal· entendimento, buscado de forma unilateral
2. O CONCEITO DE PODER DE HANNAH AREND'I' 1, 1 reserva da instrumentalização para o próprio êxito, não pode ser
11 lo n sério: não preenche as condições de um consenso alcançado

1, 11111a não-coercitiva.
11. Arendt parte de outro modelo de ação - o comunicativo:
Max Weber definiu O poder . .. 1 1 poder resulta da capacidade humana, não somente de agir ou de
própria vontade como a poss1b1hdade de impoi " r, , 1 ulgo, como de unir-se a outros e atuar em concordância com eles" 2•
, ao comportamento alheio H h A d
trário, concebe o pode f . . anna ren t, ao con , 1 1, uômeno fundamental do poder não consiste na instrumentalização
, r como a aculdade de alca d
a ação comum no context d . - . nçar um acor o quanto 1, 11111:1 vontade alheia para os próprios fins, mas na formação de uma
vêem no pode; um p t ? l a comumcaçao livre de violência. Ambn
se ba . o encia que se atualiza em ações, mas cada 11111 ,111o1dc comum, numa comunicação orientada para o entendimento
sera num modelo de ação distinto. , 1p1oco.
Naturalmente, esta tese poderia ser interpretada como se o "poder"
, "violência" constituíssem dois aspectos distintos do exercício da
O "poder" em M. Weber, T. Parsons e H. Arendt
111 11ia dominação política. O "poder" significaria, então, o assentimento

Max Weber parte do modelo t I l, . 111 participantes mobilizados para fins coletivos e, portanto, sua dispo-
individual (ou um grupo que od e eo ?g1co da ação: um su1c111, !, 111, de apoiar a liderança política; enquanto a "violência" significaria
se propõe um objetivo ~ escofhe e ser c?ns1derado_ como um indivíduo) , l uruldade de dispor sobre os recursos e meios de coação, graças aos
O sucesso da ação consiste em pr os meios apropriados para realizá-lo.
ovocar no mundo um t d d . q1111is uma liderança política toma decisões obrigatórias e as executa, a
que corresponda ao objetivo proposto N d' es a o e corsu-, 11111 de realizar objetivos coletivos. Tal concepção inspirou, de fato, o
depende do comportamento de outro ~ .. : ~ ida em que tal sucesso
posição meios que induzam no outro ujei o, eve o ator ter à sua dis , «uccito sistêmico de poder. Talcott Parsons concebe como poder a
essa capacidade de disposição sobre me:s cor;;:ortam~nto _desejado. fl
vontade de outrem que Max Weber cha dq permitem mfluenciar a 1 Wl'lllli_t, Max. Wirtschajt und Gesellschait [Economia e sociedade]. v. 1, cap. I,
Para t a I caso o conceito de violência pma e poder. . . H . A rend t reserva 1 ,, e v. 2, cap. IX, § 1. T. Parsons diferencia quatro formas de exercício do

. orque o SUJe1to de ações instru p11ilt·r: persuasion [persuasão], activation of commitments [ativação de compromissos],
uulurement [incentivo], coercion [coação]. Cf. On the concept of power [Sobre o
* Reproduzido de HAB J H 1 uuceito de poder]. ln: PARS0NS, T. Sociological theory and modem society [Teoria
dez. 1976, p. 946-60. ERMAS, . annah Arendts .Begriff der Macht. Merkur, n. 37 l, ,1doJ6gica e sociedade moderna]. New York, 1967. p. 310-1.
A11ENDT, H. Macht und Gewalt [Poder e violência]. Munique, 1970. p. 45.

l=ACULD t)~ oe: e'.DUCAÇÃO-- u SP-


I B
____..;B;;.,;.;::.,:;l;.,:1.;0~T
~E~C~A----1:
102 103

capacidade geral de um sistema "to get things done in the interest ur 11• 11·çao depende da consciência de que essas exigências de validade são
collective goals" 3 *. , nuhccidas racionalmente, ou seja, são motivadas. As convicções são
, uupuladas, mas não a exigência de racionalidade da qual elas derivam
.. A mobilização do consentimento produz o poder, que através d11
utilização dos recursos sociais transforma-se em decisões obrigatóriux 1111 força subjetiva.
Parsons pode reunir num conceito unitário de poder os dois fenômeno 1~m suma: o poder ( comunicativamente produzido) das convicções
que Hannah Arendt contrastava sob as formas do poder de violêncin, ,1111111,s origina-se do fato de que os participantes orientam-se para o
porque concebe o poder como a propriedade de um sistema que se co111 1111 urlirnento recíproco e não para o seu próprio sucesso. Não utilizam
porta com relação às próprias partes integrantes, segundo o mes11111 li11puagem "perlocutoriarnente", isto é, visando instigar outros sujeitos
esquema que o sujeito da ação instrumental com relação ao mundo 1 11" um comportamento desejado, mas "ilocutoriamente", isto é, com
exte~ior: "I have defined power as the capacity of a social system 111 1 111\ ao estabelecimento não-coercitivo de relações intersubjetivas. H.
mobilize ressources to attain collective goals" **. Repete, assim, ao nív, 1 11 1Hlt desprende o conceito de poder do modelo teleológico da ação;
do conceituai_ sistêmico, a mesma concepção teleológica do poder (podei , pndcr se constitui na ação comunicativa, é um efeito coletivo da fala,
como potencial para a realização de fins} que Max Weber utilizara 1111 111 qual o entendimento mútuo é um fim em si para todos os partici-
nível da teoria da ação. Em ambos os casos, perde-se a diferenciaçuu 1, 111ll'~. Se, porém, o poder não é mais concebido como um potencial
es~e_cífica que distingue entre o poder inerente à comunicação lingiiísticu 11 1111 a realização de fins, e se não mais se atualiza em ações instrumentais
unificadora e n violência exercida instrumentalmente. A capacidade d, corno se manifesta ele e para que serve?
gerar consenso de uma comunicação voltada para o entendimento mútuo
contrapõe-se a essa violência, porque um acordo genuíno constitui 11111 1-1. Arendt considera o poder um fim em si mesmo. O poder serve
fim em si mesmo, não podendo ser instrumentalizado para outros fins 1111111 preservar a práxis, da qual se originou. Consolida-se em poder
p,tl1tico, através de instituições que asseguram formas de vida baseadas
O entendimento recíproco daqueles que deliberam entre si com
1111 fala recíproca. O poder manifesta-se em: a) ordenamentos que
vistas a uma . ação comum - "a opinião em torno da qual muitos :-r
1•111 untem a liberdade política; b) na resistência contra as forças que
puseram publicamente de acordo" 4 :__ significa o poder, na medida cm
uueaçam a liberdade política, tanto exterior como interiormente; e) na-
que este repousa sobre a persuasão e, portanto, naquela imposição sin
q11l·lcs atos revolucionários que fundam as novas instituições da liberdade:
gularrnenre não-impositiva através da qual as intuições (Einsichten) se
concretizam. Elucidemos essa idéia. A efetividade de um consenso "O que investe de poder as instituições e as leis de um país, é o apoio
o~tido . numa comunicação livre de violência não se avalia pelo êxito, do povo, que por sua vez é a continuação daquele consenso original
seja este qual for, mas na aspiração à validade razoável, imanente à fala. que-produziu as instituições e as leis. . . Todas as instituições políticas
Sem dúvida, também uma convicção publicamente produzida através da são manifestações e materializações do poder; elas se petrificam e desa-
fala e da contrafala pode ser manipulada: mas mesmo a manipulação gregam no momento em que a força viva do povo deixa de apoiá-las.
bem sucedida deve levar em conta as exigências da racionalidade. Somos t o que Madison quis dizer quando afirmou que todos os governos
se fundam, em última instância, na 'opiniâo'<":'.
convencidos pela verdade de uma proposição, pela adequacidade de uma
norma e pela veracidade de um enunciado; a autenticidade de nossa
Aqui se torna claro que o conceito comunicativo do poder comporta
uunbérn um conteúdo normativo. É tal conceito cientificamente útil e é
3_ Authority,legitimation and political action [Autoridade, legitimidade e ação poli npropriado para fins descritivos? Tentarei responder a essa pergunta de
tica], ln: PARSONS,T. Structure and process in modem societies [Estrutura e pro
cesso nas sociedades modernas]. New York, 1960. p. 181. lurrna gradativa. Mostrarei primeiro como H. Arendt introduz e funda-
* "fazer com que se realize o necessário, no interesse dos objetivos coletivos". menta o conceito. Em seguida. recordarei como ela o aplica. Enfim,
(N. do Org.) npontarei alguns dos seus pontos vulneráveis, os quais em minha opinião
"* "Defino o poder como a capacidade que tem um sistema social de mobilizai
recursos para atingir objetivos coletivos." (N. do Org.)
4 ARENDT, H. Ueber die Revolution [Sobre a revolução]. Munique, 1965. p. 96. ·' i\RENDT, H. Macht und Gewalt. p. 42,
,

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não se localizam tanto em seu estatuto normativo, como no fato d, 1111 11 i ns condições de normalidade da existência humana e digna.
H. Arendt permanece vinculada à constelação histórica e conccitu«l ,1
pensamento aristotélico.
,111 11 . d , . ,
1i111 11 seu potencial inovador, a esfera a praxis e, em
grande parte
. b
i \11 1 e necessitada de proteção. Nas sociedades orJam~adas so
t 111 i i•statal, essa tarefa compete às instituições. E~tas sao. a~n:1enta~as
1 , poder que emana das estruturas intatas da intersubjetividade;
b· · t e
As estruturas de intersubjetividade intata 1 • 111, por sua vez, proteger as frágeis estruturas _intersu Jet:vas con ra
, 1111 ninções, se não quiserem elas próprias atrofiar-se. Dai resul:~ a
A obra filosófica principal de H. Arendt (The human co111/111,,,1 Arendt repete infatigavelmente: nenhuma
1 , 111 ~t· cen tr al que H · · l' · . I e-'
1958) propõe-se a renovação sistemática do conceito aristotélico ,1 ,11, 1 política pode substituir impunemente o poder pela v1? enc!a, e - so
práxis. A autora não se limita à exegese de textos clássicos, e eslu ·~ ,1, obter o poder através de um espaço públic~ ( Oeitentlichkeit) nao-
uma antropologia da ação lingüística, como contrapartida da an1111p11
1 , 1 111111ado . H . Arendt não é a única que considera
. .
esse espaço como
- d d . mas
logia da ação instrumental (zwecktaetigen Handeln) de Arnold Gd,1 11
,1111 t I unte senão do poder, pelo menos da legitímação o po er', . '
(Der Menscn [O homem], - 1940-1950). Enquanto Gehlen inw~lt1111
o circuito da ação instrumental como o mais importante mecanismo ,1 11 \ 1 l·ud/ insiste em que essa esfera só pode en?end!ar ~od~r /er~~:~:
11q111111to exprimir as estruturas de uma comumcaçao nao- e o .
reprodução da espécie, H. Arendt analisa a forma de intersubjetividmt
gerada na práxis lingüística como a característica fundamental da v11t11 "O que preserva um agrupamento politi i tco e, o seu , potencial
. , de poder,
d de
culturalmente reproduzida. A ação comunicativa é o meio em que l' o que provoca a extinção das comunidades políticas ~ a. ~e_r a
forma um mundo vital (Lebenswelt) intersubjetivamente partilhtulu . . t' . processo como tal e dificilmente
poder e fmalmente a unpo encra. 0 t , . dos meios da
Esse é o "espaço de manifestação" (Erscheinungsraum) em que os ato,r, . , 1 O potencial de poder ao con rano
cuncretízàve , porque d ' em mobilizados, intatos,
aparecem, se encontram, são vistos e ouvidos. A dimensão espacial d11
mundo da vida é determinada pelo "fato da pluralidade humana": c111 h,
interação unificá a multiplicidade das perspectivas de percepção e açnu
violência que podem ser armazena os para ser .
cm casos de emergência, somente existe na medida em que se rea
Onde o poder não se realiza, mas é tratado como algo a J~~,
r
~z:~
:~a pestá
dos presentes, que assumem como indivíduos um ponto de vista incon recorrer em momentos de necessidade, ele sucumbe, . e a d o mundo
fundível. A dimensão temporal do mundo da vida é determinada 1wl11 cheia de exemplos que d emon stram que nenhumad nqueza d o
oder" ( Vita'
materialmente tangível, pode compensar essa per a e p
"fato da natalidade humana". O nascimento de cada indivíduo significn
Activa. Stuttgart, 1960. p. 193).
a possibilidade de um novo começo; agir significa poder tomar u11111
iniciativa e fazer algo de imprevisto. De resto, o mundo da vida ~
determinado pela tarefa de assegurar a identidade dos indivíduos r
grupos no espaço social e no tempo histórico. Na ação comunicativa \lgumas aplicações do conceito comunicativo de poder
os indivíduos aparecem ativamente como seres únicos, revelando-se cm
sua subjetividade. Ao mesmo tempo, devem reconhecer-se reciprocn H Arendt não tentou verificar sua hipótese através _do exemplo fda
mente como seres responsáveis, isto é, capazes de entendimento inter · · ,· s
qt1l·tla dos grandes impenos. uas pes
quisas históricas giram, de pre e-
. . ·1 t da liberdade
subjetivo - a exigência de racionalidade imanente à fala funda un111 li ncia em torno de dois casos extremos: o aniqui ameno . , .
igualdade radical. Finalmente, o próprio mundo da vida é preenchido, pnlíti~'a em regimes totalitários e a fundamentação revoluc10:a~~~at:
por assim dizer, pela práxis, pela "teia das relações humanas" (Bezugs llhl'rdade política. Seus dois trabalhos Elemente. un~ Ursp;r:nteber die
gewebe menschlicher Angelegenheiten); trata-se das histórias em que ON It orrschai t ( 195 5) [Elementos e origens da d?mmaçao tota. nica-
atores se envolvem na atividade e no sofrimento. Rcvoiuüon (1960) [Sobre a revolução] aphcam_ o conceito com~ de
Pode-se considerar insuficiente o método fenomenológico com o livo do oder permitindo assim que as deformaçoes das de?1ocracias
11111ssa dop Ocidente
'. .
sejam foca l'iza d as a partir de perspectivas opostas.
. ,
qual essa filosofia prática-é elaborada. Mas, a intenção é clara: pretendo
deduzir das propriedades formais da ação ou da práxis comunicativa as Toda ordem estatal degenera numa ommaçao d · - baseada
. na violên-
. . d
estruturas gerais de uma intersubjetividade não-mutilada. Tais estruturas • 111, quando isola, por desconfiança, os cidadãos entre s1, proibin o o
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intercâmbio público de opi ·- E "suspeitava que poderia ser perigoso limitar ao processo eleitoral a par-
nicativas as únicas ias m_10es. dssa ordem destrói as estruturas co11111
em terr;r força c;da quais of p~ er pode su_rgir. O medo, radicalizado ticipação do povo na vida política, restringindo suas possibilidades de
outros· anula. um a ec ar-se em s1 mesmo, contra todos i1 exercer influência nos temas públicos ao anonimato do voto. O que
-lh ' f ' ao 1:1~s1?º. tempo, as distâncias entre os indivíduos. Ti, 1 ele percebeu como perigo mortal para a república foi que a constituição
es a orça de iniciativa e r' d . ~ ' outorgara todo poder aos cidadãos, sem lhes outorgar a oportunidade
capacidade de unif'ca p rva to as as mteraçoes lingüísticas dn
i r espontaneamente o que está separado. "Aglo . de serem e de agirem como cidadãos. Em outras palavras, o perigo
rand o-se com todos · nu estava no fato de que todo poder fora dado ao povo como entidade priva-
demais" n_ Naturalme:t ou~ros,_ ca~z um se, i_sola completamente d1"
tiga t d e a ommaç~o totalitária que H. Arendt invc-, da, sem que fosse criado um espaço em que os indivíduos pudessem atuar
' oman o como exemplo o regime nazista e o stalinismo não como cidadãos" ( U eber die Revolution. p. 324).
apen~s ~ma for~a moderna da tirania. Se assim fosse, limitar'-se-ia ~1
~aiahsar ~ _mov1me~to comunicativo do espaço político. Sua caractcn-, Aqui se manifesta o tema que inspirou Hannah Arendt em suas
tica especifica consiste exatamente na mobili - d l11vcsligações sobre as revoluções burguesas do século XVIII, a insurrei-
litizadas. O Estado total i izaçao as massas despo
~11t1 húngara de 1956, a desobediência civil e o movimento de protesto
1 ~t 11dantil dõs anos 60. O que lhe interessa nos movimentos emancipa-
"dest ,. por.
.· t roid · ·um J ado, todas as relações intersubjetivas que ainda sub
i! 1 dos é o poder da convicção comum: a desobediência com relação a
sis em epois do desaparecimento da esfera político-pública e ob .·
li1Ntiluições que perderam sua força legitimatória; a confrontação do
~~~ oultro lado, os indivíduos completamente isolados e abandon:~~..·~
s_ pe ~s outros ,ª executarem novamente ações políticas ( embora, i· poder, gerado pela livre união dos indivíduos, com os instrumentos coer-
claro, nao a genuma ação política ... " (lbid., p. 749). 1 ltivos de um aparelho estatal violento mas impotente; o surgimento de

11w\ nova ordem política e a tentativa de estabilizar o novo começo, a


. . . Some~te por razões tipológicas pode a dominação totalitária do Niluação revolucionária original, e de perpetuar institucionalmente a
~:gim~ nazista ser concebida como uma forma radicalizada de tirania; l'l'Stação comunicativa do poder. É fascinante observar como H. Arendt
c;;~~:sct':.me.nte: dela bH
rotou no solo de uma democracia de massas. Tal
· ancia
, m . uz · Arendt . a uma cn't'ica veemente do privatismo
merente, _as soc1e~ades modernas. Enquanto os teóricos do elitismo 1mra a elite nazista tem sido freqüentemente apontada. Não é nem um boêmio
democrat1c? (segumdo Schumpeter) valorizam o governo e os artid l'omo Goebbels, nem um criminoso sexual como Streicher, nem um fanático per-
vertido como Hitler, nem um aventureiro como Goring. Ele é um pequeno-burguês,
;~pr~entat1vos, por ~analizarem de forma restritiva a participaçio ~o~~~
1·om todas as aparências da respeitabilidade, com todos os hábitos de bom pai de
i~a e uma P?P~laç~o despolitizada, H. Arendt vê o perigo exatamente ínmília, que não engana a sua mulher e deseja assegurar para os seus filhos um
ms~?d A medi~tiz:-çao da população através de administrações públicas rutura decente. Construiu conscientemente sua organização terrorista, englobando
par I os,_ associaçoes e par~amen~os, altamente burocratizados, com le;,; o país inteiro, no pressuposto de que a maior parte dos homens não são nem boê-
~ consoi~~~ as form~s de vida privatistas, que possibilitam a mobiliz~ção mios, nem fanáticos, nem aventureiros, nem criminosos sexuais, nem sádicos mas,
d O ~po i_:ico, 0~ _s:Jª:. que fornece as condições sócio-psicológicas da untes de mais nada, 'jobholders' e bons pais de família. Creio que foi Péguy quem
om1?a~a~ totalitária , . Jefferson, o radical-democrata entre os pais da chamou o pai de família o 'grand aventurier du 20• siecle'; mas morreu cedo demais
constituição americana, já ' para perceber que ele era também o grande criminoso do século. De tal maneira
nos habituamos a admirar ou observar com um sorriso no pai de família sua solici-
tude benevolente, sua preocupação com o bem-estar da família e sua solene resolu-
1
~:;:~;~ ~~ta~{.en;.~~~k~~ r~, ~~s~:~~nge totaler Herrschajt [Elementos e origens da ção de dedicar sua vida à mulher e aos filhos, que mal percebemos como o pai de
íamília providente, obcecado primordialmente pela segurança, transformou-se, sob
' ia ª t ese d a .. Banalitaet
7 :É nessa idéia que se base· . des Boesen" [B rd d d it pressão das circunstâncias econômicas caóticas do nosso tempo, num aventureiro
que H. Arendt exemplificou c E' h . . ana 1 a e o mal 1. involuntário que, apesar de todas as suas preocupações, nunca podia ter certeza do
1964) Ela ., om ~c mann iEichmann in Ierusalem. Muenchen
. ja se encontra num ensaio escrit 1 0 1944 . ' dia seguinte. Sua docilidade comprovou-se desde as homogeneizações (Gleichschal-
depois da guerra em Wandl - em e publicado imediatamente
nizada]: "He1· . h H' l ung_ [Mudança] sobre "Organisierte Schuld" [Culpa orga- tungen) do início do regime. Ficara evidente que ele estava totalmente disposto a
sombria. terra-de-nin
nnc 1mm
- er nao perten ' J intelectuais
. A ce_ aqueAes_ · · que se originam da
' abrir mão de sua convicção, de sua honra, de sua dignidade humana, para garantir
guem entre a existencia boemia e a lumpen, cuja significação a aposentadoria, o seguro de vida e a existência da mulher e dos filhos" (Die ver-
108 109

percebe em diferentes ocasioes o mesmo fenômeno. Quando os revi 1111 1 Imites da teoria clássica
cionários se apropriam do poder que está nas ruas; quando a populm, 11
que optou pela resistência passiva enfrenta tanques estrangeiros, rn111 Já houve tentativas de institucionalizar a democracia . imediata: ~s
mãos desarmadas; quando minorias convictas disputam a legitimidnd , hall meetings americanos em 1 776 , as socie · 't'es populaires em Paris
.
das leis existentes e organizam a resistência civil; quando, no movimcutn •1t" 1 789 e 1793 as sessões da Comuna p ansiense
· · em 1871 , os sovietes
de protesto dos estudantes, "o puro desejo de ação" se manifesta - rm i1t ',;, . 1905 e 1917 e os conselhos revolucionários na Alemanha
1 1 cussia em ' . d' t H Arendt
todos esses momentos parece confirmar-se a tese de que "ninguém possui 1 1918. Nessas diferentes formas de democracia ire a ~e~ . . ,
verdadeiramente o poder; ele surge entre os homens que atuam em tora
junto, e desaparece quando eles novamente se dispersam" (Vita ActÍ1'11
unicas tentativas de constituição da liberdade nas condições
1 ulc moderna de massas. Seu fracasso nos séc,u~os XIX ~ X, . e a n-
!ª ,so~i~-

p. 194). Esse conceito enfático da práxis é mais marxista que aristot, 1,111c10 às derrotas políticas do movimento o~erano revo~uc10~ano e ao
lico; Marx o denominava "atividade crítico-revolucionária". 111 esso econômico dos sindicatos e dos partidos trabalhistas.

"Pois hoje em dia, numa época em que uma renda anual garantida
horgene Tradition [A tradição oculta]. Frankfurt, 1976. p. 40-1). Foi essa pr1 ocupará- em breve O lugar do salário diário ou semanal, os tr~balh_adores
cepção que transformou H. Arendt, assim como seu mestre Karl Jaspers apesar do não se acham mais fora da sociedade; são não somente c1dadao~ de
sua inequívoca mentalidade elitista, em corajosos radical-democratas.
pleno direito, mas estão a caminho de transformar-se e~ membr~s inte-
H. Arendt exprime na seguinte passagem a forma pela qual concebe o nexo
sui generis entre a democracia participativa e as estruturas elitistas que ela cou grais da sociedade e jobholders como todos os dema1~. -~om _ isso, ~
sidera necessárias: "Quem pensa, com Kant, que é 'agradável imaginar constitui movimento operário esvazia-se necessariamente de sua significação p~h-
ções políticas' não resistirá à tentação de seguir esboçando tais formas de estado tica e converte-se num dos grupos de pressão que regulam essa socie-
(H. Arendt refere-se aqui aos conselhos operários), que somente conhecemos in s1a111 dade" (lbid., p. 213).
nascendi. Mas, seria mais prudente dizer aqui o que Jefferson diz com relação 118
repúblicas elementares: 'Deve dar-se início a elas, não importa para que fim; logo Essa tese, no contexto em que é formulada, é demasiad~me?te !~cil;
ficará claro para que outros fins elas são úteis'. Entre esses fins, se incluiria, hoje 11110 decorre de pesquisas equilibradas, mas de uma construçao fi~sofica.
em dia, por exemplo, a liquidação da sociedade de massas e da perigosa tendência, 1 porque Arendt estiliza a imagem da polis grega, t_ran~for1!1~n o-a ;a
que lhe é imanente, de gerar movimentos da massa pseudopolíticos, juntamente com ,,. · do político que constrói dicotomias conceituais rígidas en ~e
as formações elitistas que lhes correspondem, que ninguém elegeu e que não se , "1s1.;nc1a
'iblico" e "privado" , Estado e economia, . lib
1 er d ade e b em- estar'. ativi-
constituíram por si sós. A liberdade pública e a responsabilidade por assuntos
públicos caberiam àqueles poucos, que podem ser encontrados em todas as camadas d~:::e político-prática ~ produção, nã?-aplicáveis à modem; /º~ed~~:
hur uesa e ao Estado moderno. Assim, para ela, o mero_ a o e .
sociais e ocupacionais, e que se comprazem nessas questões. Eles constituem, de
qualquer forma, a elite política de um país, e nenhum estado pode afirmar que , 011~ 0 modo de produção capitalista produz-sé uma relaçao _car~cte_ns-
realiza sua missão, ou aspirar a ser uma verdadeira república se não utiliza tais lh arnente nova e complementar entre o Estado e a economt, _e v~sto
elites, pondo à sua disposição o espaço público que lhes corresponde. J;: possível ' 'uno um sintoma patológico e como o indício de uma con rnediíícil
que tal forma de estado - no sentido mais autêntico da palavra, uma aristocracia t, utiva: "Essa funciona . - d a política
1·izaçao i faz com , . qued se torne I rei
. l" (lbid
- não mais recorresse ao instrumento das eleições gerais, pois somente os membros uté mesmo perceber a distância que separa o político o socra .,
voluntários de urna 'república elementar' teriam provado que estão preocupados
com algo que vá além de seu bem-estar privado e dos seus interesses privados legí- I'• '34-5). , A •

timos. Somente quem está realmente interessado no mundo, tem direito de participar H Arendt insiste com razão em que a superação tecmco-e~onomi~a
no andamento do mundo. Ser excluído da política não significa, de forma alguma, rlu pob~eza não significa de forma alguma que a liberdade p~~hca desteJa
algo de vergonhoso, como é o caso hoje com a cassação dos direitos civis; se aqueles n~se rada em termos prático-políticos. Mas, ela torna-se vitima e_ um
que participam se. escolheram a si mesmos, aqueles que estão excluídos também
1•1;11~to d~ política inaplicável às condições modernas quando afirma
se excluíram a si mesmos. Esse afastamento institucionalizado da esfera pública
daria substância e realidade a uma das liberdades negativas essenciais, ou seja, a que
liberdade com relação à política, que conhecemos desde o fim da Antigüidade, que
era desconhecida em Roma e Atenas, e que talvez constitua a parte política mais • ·
"a intrusão de questões sociais e econormcas na es fera pública
. _, a trans-
significativa de nosso patrimônio cristão" (Ueher die Revolution. p. 359-60). . .
formação do governo em administração, - na qual a dommaçao pessoa1
110 111

é substituída por medidas burocráticas e anônimas, e as leis são substi- , 111; b). de isolar a política dos contextos econômicos e sociais em que
tuídas por regulamentos" (Ueber die Revolution. p. 115-6),
1 ~111 embutida através do sistema administrativo; e) de não poder com-
Jlll"ender as manifestações da violência estrutural.
frustram necessariamente qualquer tentativa de fundar um espaço político
ativo e uma democracia radical. f: nessa perspectiva sombria que viu
também a Revolução Francesa, enquanto acredita que na América a fun-
( 'ompetição estratégica e poder político
dação da liberdade foi inicialmente bem sucedida, porque "não havia o
obstáculo de uma questão social, politicamente insolúvel" (lbid., p. 85).
Não posso aprofundar aqui essa interpretação 8; desejo somente recordar A condução da guerra é o modelo clássico da ação estratégica.
I'ura os gregos, a guerra era algo que acontecia fora dos muros da
a perspectiva sui generis adotada por H. Arendt: um Estado, exonerado
ridade. Também para H. Arendt, a ação estratégica é essencialmente
da elaboração administrativa de matérias sociais; uma política, depurada
das questões relativas à política social; uma institucionalização da liber- npolítica, um tema para os especialistas. Esse exemplo é apro~riado
dade pública, que independe da. organização do bem-estar; um processo para demonstrar o contraste entre o poder político e a violência .. A
radical de formação democrática da vontade, que se abstém em face da atividade bélica envolve manifestamente a utilização calculada de meios
repressão social - este não é um caminho viável para nenhuma socie- de violência; seja com fins de ameaça, seja para derrotar fisicamente o
dade moderna. udversário. Mas, a acumulação de meios de aniquilamento não torna as
superpotências mais poderosas - a força militar é freqüentemente (como
Confrontamo-nos, assim, com um dilema. Por um lado, o conceito demonstrou a Guerra do Vietnã) a contrapartida da impotência interna.
comunicativo do poder desvenda certos fenômenos-limite do mundo Além disso, o exemplo da estratégia é adequado para englobar a ação
moderno, para os quais a ciência política se tornou em grande parte estratégica na categoria. da ação instrumental. Na Vita Activa, somente
insensível; por outro lado, tal conceito define uma concepção do político as atividades essencialmente não-sociais da produção e do trabalho são
que leva a contra-sensos, quando aplicada a sociedades modernas. Vol- previstas, além da ação comunicativa. E como a utilização i~st~~ental
temos, por isso, à análise do conceito do poder. de meios militares parece ter a mesma estrutura que a mampuiaçao de
O conceito do poder comunicativamente produzido, de H. Arendt, instrumentos para a produção de objetos ou a transformação da natureza,
só pode transformar-se num instrumento válido se o desvincularmos de H. Arendt equipara pura e simplesmente a ação estratégica à instru-
uma teoria da ação inspirada em Aristóteles. H. Arendt faz remontar o mental. Graças ao exemplo eia guerra, ela demonstra que a ação est_ra-
poder político exclusivamente à práxis, à fala recíproca e à ação con- tégica é, ao mesmo tempo, violenta e instrumental; uma ação deste tipo
junta dos indivíduos, porque delimita a práxis, por um lado com relação situa-se fora da esfera do político.
às atividades apolíticas da produção e do trabalho e, por outro lado, com A situação apresenta-se de forma distinta se confrontarmos com a
relação ao pensamento. Face à produção de objetos e ao conhecimento ação comunicativa a ação estratégica entre protagonistas que competem
teórico, a ação comunicativa aparece como a única categoria política. entre si, participando de uma forma de interação social orientada não
Essa limitação conceituai do político ao prático permite, por um efeito para o entendimento mútuo, mas para o êxito; e se a contrastarmos com
de contraste, ilustrar a situação contemporânea, caracterizada pela eli- a ação instrumental, realizável, como uma ação não-social, por um
minação de conteúdos essencialmente práticos do processo político. Com sujeito isolado. Torna-se claro, assim, que a ação estratégica também
isso, entretanto, H. Arendt tem que pagar o preço de: a) excluir da se realiza dentro dos muros .da cidade; ela se manifesta nas lutas pelo
esfera política todos os elementos estratégicos, definindo-os como violên- poder, na concorrência por posições vinculadas ao exercício do poder
legítimo. Devemos distinguir a dominação, ou seja, o exercício do poder
8 político, tanto da aquisição e preservação desse po~er, com~ _da sua
Cf. minha recensão: "Díe Geschichte von den zwei Revolutionen" [A história das
duas revoluções]. ln: HABERMAS, J. Kultur und Kritik [Cultura e crítica]. Frankfurt, gestação. Nesse último caso, e somente nele, o conceito de práxis pode
1973. p. 365-70. auxiliar-nos. Nenhum detentor de posições de dominação pode exercer
112
113

o poder, e ninguém poderá disputá-lo, se tais posrçoes não estivrn,,


ancoradas nas leis e instituições políticas, cuja sobrevivência rcpou 11 pli, n,·íio do poder no sistema político
em última instância, sobre as convicções comuns, sobre a opinião "r111
. . d oder e a competição estratégica em
torno da qual muitos se puseram publicamente de acordo". \ gestação comunicativa o p ndidas em termos da teoria
d lítico podem ser compree -
i 1111 do po er po 1 , . d de legítimo as estruturas de açao
Sem dúvida, os elementos da ação estratégica ganharam em vol11111 ara o exercicio o po r ·
e em amplitude nas sociedades modernas. Esse tipo de ação, que nn I, 1~110;. mas, P re nao _ sao_ essenciais.
. . 0 poder legítimo autonza
. os
11 1
q11111s e e ocor . _ tomarem decisões vincu1 antes.
sociedades pré-modernas predominaram sobretudo nas relações extci 111 d sições de dominação a . . , .
1 ,, utnrcs as po , . . t esse numa perspectiva sistémica
res, é admitido como o caso normal, também no interior, com o desrn ·1· - do poder e de maior m er . 'd d
1 11 1111 rzaçao . . d _ Questões como as ativi a es
volvimento do modo de produção capitalista. O direito privado modci 1111 I"' do ponto de vista da teona f a 1:_çao. ue elas exercem com relação
concede a todos os proprietários de mercadorias esferas de ação cst 111 li uulzacionais do Estado e ~s unçoesl't\o podem ser formuladas e
tégica formalmente iguais. No Estado moderno, que completa essa socle .( · " bientes" do sistema po 11 , . H
,1 vunos am 1 d O de referência parsomano. ·
dade econômica, a luta pelo poder político é normalizada, além disso, 111 '~ligadas adequadamente n~~d~uadr abandonar o quadro conceitual
pela institucionalização da ação estratégica ( admitindo uma oposíçao, , ' ndt resiste, nat~ralment_e, a l .le e álise funcionalista. A esfera
a concorrência de partidos e associações, a legalização de lutas operá · d - ntroduzmdo ne e uma an · , ·
li, rcona a aç_ao, i - ode ser reificada à base dos cntenos
rias, etc.). Esses fenômenos da aquisição e da preservação de podei . 1 •• preocupaçoes -~u~anas ~ª? p or ue os conhecimentos obtidos se-
induziram teóricos políticos, de Hobbes a Schumpeter, ao erro de con 11l q,,tivantes das ciencias m refluí p q a práxis dos interessados. Nesse
óti a não podem re urr para ·
fundir o poder com um potencial para a ação estratégica bem sucedida. r1111do essa 1c . . . . t Hegel e Parsons: ambos inves-
Contra essa tradição, em que também se inscreve Max Weber, pode li. 1 ntido, H. Arendt não d1stmguir~a- en rue se desenrolam sem a partici-
h' , · e sociais qu
Arendt fazer valer' com razão o argumento de que as confrontações flpum processos 1stonc~~b d' Koepfe der Beteiligten hinweg i?", Ela
1 u,i;110 dos interessados ( u er te essual da vida social no
estratégicas em torno do poder político nem produziram nem preservam
propria tenta reintroduzir es:e asd~fecto ~ro~~ na ação instrumental,
as instituições nas quais esse poder está enraizado. As instituições polí- d t oria da açao I erencian , -
11111rco e uma e ~ b lho distingue-se da produção, nao
ticas não vivem da violência, mas do reconhecimento.
Não obstante, não podemos excluir do conceito do político o ele-
rufre produção e tra~alho. O
uns estruturas da açao, .1:1ªs p
e;: ~ircunstância de que o conceito de
dutiva como um dispêndio de força
mento da ação estratégica. Definiremos a violência exercida por meio "trabalho" concebe ª, atlv~dade prdo . no contexto funcional da
do trabalho reproduzível, mteg~an o-o, assim,
da ação estratégica como a capacidade de impedir outros indivíduos ou
grupos de defender os seus próprios interesses O• produção, consumo e reproduçao. m seu a arelho conceitua! restrito à
Nesse sentido, a violência sempre foi parte integrante dos meios Com todas essas reservas, e co . 1:, inutilmente desvantajosa
- l coloca em uma posiçao 1
para a aquisição e preservação do poder. Essa luta pelo poder político teoria da aça~, e a ,s~ . , . habituais hoje em dia. Por outro
com relação as ª?ahses s1stem1ca~, tif da na medida em que, por
foi mesmo institucionalizada no Estado moderno, tornando-se, portanto, lado, sua desconfiança revela-se JUS i_ rca m ' relação à teoria da ação.
um elemento normal do sistema político. Por outro lado, não é de forma . · t' ica se autonomiza co .
sua vez, a teona sis emi d 1 polemiza contra o conceito
alguma evidente que alguém possa ter condições de gerar poder legítimo, Isto fica evidente em Parson~, qua? ºo ed: soma-zero, de C. W. Mills.
somente por estar habilitado a impedir outros de realizarem os seus de poder, baseado na categoria do lh Jog d crédito ou da capacidade
b poder à seme ança o d
interesses. O poder legítimo só se origina entre aqueles que formam Parsons conce e o , l . r , l Quando uma parte ganha po er
convicções comuns num processo de comunicação não-coercitiva. aquisitiva, como u~ bem ~u típ ~:~t ·
Só ocorre um jogo de soma-zero
político, a outra nao pr~c1sa J.er ;a~· a aquisição de posições existentes,
~ Cf. sobre esse conceito minhas observações em: HABERMAS, J. e LUHMANN, N.
quando vários protagonistas isp~ t da desagregação do poder das
mas não quando se trata do surgimen o e
Theorie der Gesellschaft oder Sozia/technologie [Teoria da sociedade ou tecnologia
social]. Frankfurt, 1971. p. 250-7.
10 ARENDT, H. Ueber die Revolution. p. 63 et seqs.
114 115

i~stituições políticas. Nisso coincidem Parsons e H. Arendt. Mas, ambos t ,, lu\·iío comunicativa do poder - uma variante
tem concepções extremamente divergentes do processo de ampliação do
pode~ ( en~a.nce'::'ent of, power). . ~arsons considera esse processo como Rt'sumamos nossas reflexões. O conceito do político deve esten-
u~a ,:ntens1_ficaçao do ?1~el d~ atividade, o que significa que O "raio <lo lt I Nr para abranger também a competição estratégica em torno do
açao _d? sistema administrativo deve ser ampliado, para que O output 1 .. 1111 1 político e a aplicação do poder ao sistema político. A política
das at1~1dade~ _organizacionais do Estado possa crescer. Isto, por sua 11 ,, , pode ser idêntica, como supõe H. Arendt, à práxis daqueles que
vez, exige um z~put crescente de respaldos inespecíficos, isto é, lealdada 1111vNsam entre si, a fim de agirem em comum. Inversamente, a teoria
de ~assa. Por isso, o processo de ampliação do poder inicia-se do lado ,l,1111111ante restringe esse conceito aos fenômenos da concorrência em
do m~ut. Os líderes políticos devem suscitar em seus eleitores nova. 1111110 do poder e da alocação do poder, sem fazer justiça ao fenômeno
ne~essidades: para q~e. surjam necessidades crescentes, somente gratificá , p1•cífico da gestação do poder. Aqui a diferença entre poder e vio-
veis por meio de atividades estatais crescentes 11. lr iu'in torna-se nítida. Ela toma visível o fato de que o sistema político
Numa perspectiva sistêmica, a gestação do poder apresenta-se como 11111 pode dispor arbitrariamente sobre o poder. O poder é um bem

um, problema que pode ser solucionado na medida em que a liderança ill~putado pelos grupos políticos e graças ao qual uma liderança política
política exerce maior influ~ncia sobre a vontade da população. Mas, se ulministra; mas, nos dois casos, este poder preexiste, e não é produzido
isto ~c~rresse graças a meios de coação psíquica e à manipulação das por tais grupos e lideranças. Esta é a impotência dos poderosos - eles
convicçoes, tratar-se-ia, segundo H. Arendt, de um aumento de violência l'"'cisam derivar seu poder dos produtores do poder. Eis o credo de
mas não de u~ ~rescimento do poder do sistema político. Porque: 1 r. Arendt.
s:gundo a sua hipótese, o poder só pode surgir nas estruturas da comu- A objeção é óbvia. Se nas democracias modernas a liderança é
mcaç~o não-c~er,citiva; não pode ser "gerado de cima". Parsons con- uhrigada a legitimar-se periodicamente, a História oferece provas esma-
testaria e~sa_ hipótese; dados certos valores culturais, não podem surgir n11doras de que a dominação política deve ter funcionado diferentemente
p~r~ ele limites estruturais à gestação do poder. Por outro )ado, Parsons do que é afirmado por H. Arendt, e que, de fato, funciona diferentemente.
distingue, c?~
relação a casos concretos de inflação e deflação de poder, A favor de sua tese, há o argumento de que a dominação política só é
duradoura quando é reconhecida como legítima; contra ela testemunha
entre os créditos de poder (Marktkredite) sérios e não-sérios:
11 experiência de que as relações sociais estabilizadas através da domi-
"There- i_s a fi~e li?e between solid, responsible and constructive political nação política somente em casos muito raros fundam-se numa opinião
lead~rsh1p which m ~act commits the collectivity beyond its capacities "cm torno da qual muitos se puseram publicamente de acordo". Pelo
for msta~taneous fulfillrnent of ali obligations, and reckless overextend- menos se concordarmos com o conceito ambicioso que H. Arendt tem
edness, just as there is a fine line between responsible banking and do espaço público. Os dois fatos só se deixam reduzir a um denominador
'wildcatting' " * (Ibid., p. 342). comum, quando se pressupõe que a violência estrutural está embutida
nas instituições políticas ( e não somente nelas). A violência estrutural
Somente ~ difí~il Ai°1:aginar como tal diferença possa exprimir-se por meio não se manifesta como violência; ela bloqueia, imperceptivelmente,
de conceito~ sistêmicos. H. Arendt oferece uma solução para esse pro- aqueles processos comunicativos nos quais se formam e se reproduzem
?lema preciso: _Ela tenta derivar das estruturas da intersubjetividade as convicções dotadas de eficácia legitimadora. Tal hipótese sobre os
mtata as condições que o espaço político precisa preencher para que 0 bloqueios, inobservados mas eficazes, do processo comunicativo, pode
poder possa ser comunicativamente gerado ou ampliado. explicar a formação da ideologia; pode esclarecer como se formam as
convicções graças às quais os sujeitos se iludem sobre si mesmos e sobre
:
1
.~f._ PARSONS, !·
On the concept of power [Sobre o conceito de poder]. p. 340. a sua situação. O que chamamos ideologias são exatamente as ilusões
~xiste uma diferença importante entre uma liderança sólida, responsável e cons- dotadas do poder das convicções comuns.
trutiva que comprome~e a co_letiv!dade além ~a sua capacidade de cumprir instan-
ta~eamente t?<las as ~uas obrigações, e uma liberalidade extravagante, assim como
Essa proposta procura dar uma versão realista da idéia da gestação
~xiste un:a ~iferença importante entre atividades bancárias judiciosas e especulações comunicativa do poder. Em processos comunicativos sistematicamente
rrresponsáveís." (N. do Org.) limitados, os participantes formam convicções subjetivamente não-coerci-
116
117
tivas, mas ilusórias; com isso, geram comunicativamente um poder que
po~e s~r ~sado_ contra esses mesmos participantes, no momento em que 11111 investiga a capacidade de generalização de pontos de vista práticos,
111 seja, a justeza (Richtigkeit) de normas, não é separado da argumen-
s~ mst1tuc10nahz~ .. Para podermos aceitar essa proposta, entretanto Ir
namos ~ue_ esp~c1fi_c~r um critério crítico que nos permita distinguir :ntio 1 11,110, como por um abismo, pode-se reivindicar um fundamento cogni-
as convicçoes ilusonas e as não-ilusórias. 11vu também para o poder das convicções comuns. Nesse caso, o poder
, 111ria radicado no reconhecimento fatual de expectativas de validade,
, f. ~x~ta~ente, es_sa possibilidade que H. Arendt contesta. Ela mau
, 1111cretizáveis de forma discursiva, fundamentalmente criticáveis.
te~ -~ distinção _c1a:s1c~ entre a t~oria e a prática - esta se baseia cm
opm10es. e con:1cçoes msuscetivers, stricto sensu, de serem verdadeiras No entanto, H. Arendt vê entre o conhecimento e a opinião um
( wahrheitsjaehzg) : 1hlsmo que não pode ser preenchido por meio de argumentos. Ela
1'1\lCura outro fundamento para o poder da opinião - e o encontra
"No opinion is self-evident, Jn matters of opinion but not in matter
of truth, our thinking is truly discursiva, runnin~ as it were fro:i:
P!ace to plac~, :rom. one part of the world to the other thro~gh ali , 11mpany or am completely isolated while forming an opm1on, I am not simply
kmds_ ?f confhctm~ v1ew~, until it finally ascends from ali these parti 11111llther only with myself in the solitude of philosophic thought; I remain in this
cularities to some impartial generality" 12 *. wol'ld of mutual interdependence where I can make myself the representative of
1 Vllrybody else. To be sure, I can refuse to do this and form an opinion that takes

UI? /º?ceit? _hoje ~ltrapassado de conhecimento teórico, baseado nas 1111ly my own interest, or the interests of the group to which I belong, into account;
11othing indeed is more common, even among highly sophisticated people, than this
ev1de~cias ~l~1mas, impede H. Arendt de compreender O acordo sobre
hlind obstinacy which becomes manifest in lack of imagination and failure to judge.
tquestoes
, · " praticas como uma formação racional da vontade . e, ao con- s llttt the very quality of an opinion as of a judgement depends upon its degree of
rano, o pensamento representativo" (segundo a sua concepção), 1a l111partiality" (Ibid., p. 115).
"O pensamento político é representativo. Formo uma opinião quando consi-
12 dero uma questão de vários pontos de vista, fazendo presentes as opiniões dos
ARENDT, H. Truth and Politics [Verdade e política] ln· LASLETI p e RuN
W. G. Philosophy ; politics and society III [Filosofia· poiítica e so~iedadeJ ~tNd, 1111sentes, isto é, representando-os. Esse processo de representação não adota cega-
1969. p. 115-6. ' · or , 111cnte as opiniões efetivas dos que estão em outro lugar e que olham, portanto, o
111undo a partir de uma perspectiva diferente; não se trata de empatia, como se eu
",''Nenht~ma ?pinião é evidente por si mesma. Em questões de opimao, mas não lentasse ser ou sentir como outros, nem de somar-me a uma maioria, mas de ser
~as relativas ~ ver~ade, nosso pensamento é verdadeiramente discursivo, deslocan- r pensar com minha própria identidade, onde de fato não estou. Quanto mais
o-se, por assim dizer, de um ponto para o outro, de uma parte do mundo para numerosos os pontos de vista que tenho presentes em meu espírito, no momento
outra, passando por todos os pontos de vista antagônicos, até ascender, finalmente ,·m que pondero uma questão, e quanto melhor posso imaginar de que forma eu
1::~;es _p~ruculares a ~ma generalidade imparcial." (N. do Org.) ' NCntiria e pensaria se estivesse no lugar desses outros, tanto mais forte será minha
. Political ~hought 1~ representatlve, I form an opinion by considering a given cnpacidade de pensamento representativo e taqto mais válidas minhas conclusões
tos~r~~
those frorn different viewpoints, by making present to my mind the standpoints of
are absent, that is, 1 represent them. This process of representation does
not m Y adopt the actual views of those who stand somewhere else and hence
finais - minha opinião. (8 essa capacidade d:~ dispor de uma 'mentalidade mais
nmpla' que permite aos homens o julgamento;· como tal, ela foi descoberta por Kant,
na primeira parte de sua Crítica do Juízo, mas este não rei:c,Úl.eceu as implicações
look ~pon the world f~om a different perspective; this is a question neither of políticas e morais de sua descoberta.) O próprio processo de formação da opinião
e7~t. Y: as though I tried to be_ or feel like somebody else, nor of counting noses é determinado por aqueles em cujo lugar alguém pensa e usa a sua própria mente,
;n jorrung a majority, but of being and thinking in my own identity where actually e a única condição para esse exercício de imaginação é o desinteresse, a libertação
arn not: The more people's standpoints I have present in my mind while pondering com relação a nossos interesses privados. Portanto, mesmo se evito toda companhia
: give_n issue and the better ! can imagine how I would feel and think if I were ou se permaneço completamente isolada ao formar uma opinião, não estou, sim-
their f1ace, th_e stronger will be my capacity for representative thinking and the plesmente, junto a mim mesma na solidão do pensamento filosófico; permaneço
more ~a ~ my fmal conclusion~, my opinion. (lt is this capacity for an 'enlarged nesse mundo de interdependência mútua, no qual posso tornar-me a representante
~entahty that . enables men to Judge as such, it was discovered by Kant _ in the de todos os demais. Sem dúvida, posso me recusar a fazê-lo, formando uma opinião
oz
irs~. part of h1s Cri!iqu~ Judgement - who. however, did not reco ize the que só leve em cohta os meus próprios interesses, ou os interesses do grupo ao qual
pohucal and moral 1mphcat1ons of his discovery ) The very pro & gn · ·
for f10 · d · d b · cess o. op1mon- pertenço; na verdade, nada é mais comum, mesmo entre pessoas altamente refina-
ma _ n is etermme Y th?se in whose places somebody thinks and used his
own m~nd, _and t_he only cond1t1on for this exertion of imagination is disinterested- das, do que essa obstinação cega que se torna manifesta na falta de imaginação e
ness, t e hberatlon from one's own private interests. Hence, even if I shun all na incapacidade de julgar. Mas a própria qualidade da opinião e do julgamento
dependem do seu grau de imparcialidade." (N. do Org.}
118

na faculdade que têm os sujeitos, capazes de linguagem e de ação,


fazerem promessas e as cumprirem: dt

"J~ mencionamos que o poder se origina sempre que os homens "'


reunem
A fo e agem em , co ~um, e d esaparece quando eles se dispersam ·
d rça que mantern
, unidos esses indivíduos · · · e
' a f . l
orça vmcu anl~
ast ~ro(m V~ssaAs ~utuas que, em última análise, manifestam-se no cc111
t ra o ita cliva. p. 240).

Na base do poder está o contrato concluído entre sujeitos livres e iguais


graças
' 1 ao qual as· partes se obrigam mutuamente · A f'1m d e assegun11 .,
~ ~uc eo normativo de uma equivalência original entre o poder e a libcr 3. A TORA CAMUFLADA - CONFER'tNCIA
a e, ela prefere rec?rr~r, em última análise, à figura venerável do con
COMEMORATIVA DO 80.0 ANIVERSÁRIO
trato. que ao seu propno conceito de práxis comunicativa.
DE GERSHOM SCHOLEM ,:,
Retrocede, assim, até a tradição do d.ireito natural.

!J11erido e venerável Senhor Scholem:

A convite da Embaixada Alemã, viemos a Israel, nós, cidadãos da


llepública Federal, para festejá-lo. Mesmo contando com a compreensão
.unistosa do homenageado, não podemos contornar a questão delicada
de debater o que nos autoriza a dar esse passo. A quem ocorreria enviar
uma delegação semelhante a Paris, para celebrar, digamos, o 80.° ani-
versário de Jean-Paul Sartre? Se no caso de Scholern podemos arrogar-
-nos o direito, sem qualquer presunção, de felicitá-lo dessa maneira espe-
cial, isto só pode fundar-se num simples fato. HL1je possuímos, e não
hesito em usar essa formulação possessiva, nove livros escritos por
Scholem em idioma alemão; o caráter magistral de sua impecável prosa
científica demonstra que o seu autor esteve intimamente vinculado a
essa língua desde o seu nascimento.
Este fato, contudo, somente seria simples se a língua que nos é
comum significasse que partilhamos a mesma cultura, as mesmas tradições
e as mesmas experiências históricas. Sem dúvida, os judeus e os alemães
viveram em comum um fragmento da História. Mas os riscos, o sofri-
mento e o sacrifício não foram co-partilhados e sim repartidos, e repar-
tidos de forma extremamente desigual, mesmo antes que a violência

* Reproduzido de HABERMAS, J. Die verkleidete Tora. Rede Zum 80. Geburtstas


von Gershom Scholern. Merkur, jan. 1978,- p. 96-104.
DEDALUS - Acervo - FE V
11/IIIIIIIU/llmlll11111/illlllllllllmllllllllllllIli/li
2osooooga33

Organizadores: B. Freitag e S.P. Rouanet

SOCIOLOGIA
3.• edição

Biblioteca/ FEUSP
.J. 333~9

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