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Fundamentos Teóricos
Os Textos Merkabah
O desenvolvimento posterior da doutrina secreta do filho no período pós-bíblico
ocorre em trabalhos merkabah (carruagem), tais como 3 Enoch e o Shi'ur Komah,
geralmente datados entre os séculos II e IV d.C., apesar de a origem dessa
tradição literária ser um assunto muito contestado.
Como Joseph Dan resumiu recentemente essa controvérsia, a posição-padrão é a
de Gershom Scholem e Saul Lieberman, que defendem a idéia de que "as tradições
esotéricas da Hechalot e Merkavah são um extrato de misticismo no coração do
mundo religioso talmúdico-midráshico, como se essas idéias (...) sempre
estivessem lá, coexistindo com fontes infinitas de literatura rabínica".
Ephrayim E. Urbach é citado como uma "voz solitária de dissidência desse
consenso'' ante a afirmação de Dan de que essa literatura representa "o princípio"
que é "sem precedente em sua natureza radical no Judaísmo rabínico", bem como
sendo "um afastamento drástico de qualquer coisa encontrada no antigo Judaísmo"
Parece-nos que é uma escolha entre acreditar que essa literatura mística é uma
tradição íntima talmúdica derivada exclusivamente de fontes tradicionais da cultura
rabínica ou, por outro lado, derivada de nenhuma fonte.
Mas Rachel Elior ofereceu uma possibilidade mais sugestiva, demonstrando a
importância central que esses textos dão às alusões ligadas ao sacerdócio do
Templo e suas práticas:
Não há dúvida de que a literatura Hekhalot está repleta de alusões diretas e
indiretas ao mundo dos sacerdotes e levitas no Templo (...) Assim, apesar de que
se possa discutir a relação entre as circunstâncias históricas (a destruição do
Templo e o cessar do serviço sacerdotal) e sua expressão literária indireta (a
tradição do Hekhalot e da Merkabah), não se pode ignorar a posição focal do ritual
e da herança litúrgica do templo na literatura Hekhalot (...) e os segredos de sua
herança ritual sacerdotal.
Entretanto, Elior não vai além de sua análise de que o uso do imaginário do
Templo, transferido para a devoção espiritual, foi uma resposta particular da parte
dos místicos mais recentes à perda do Templo terreno.
Ela não entra na discussão a respeito da "relação atual" entre as "circunstâncias
históricas" e a "expressão literária" para sugerir, como faço eu, que esses
"segredos" sacerdotais eram verdadeiramente aqueles disseminados pelos
membros de uma classe sacerdotal pós-templo a uma elite mística e a gerações
sucessivas de seus alunos.
Apesar da introdução de novos elementos nos ensinamentos sacerdotais originais,
como os dos essênios, o que é mais revelador é a continuidade da doutrina
sacerdotal secreta do filho nesses trabalhos.
Como veremos agora, a principal diferença de 3 Enoch e do Shi'ur Komah para
Daniel e 1 Enoch é o nome Metatron dado para a figura antes identificada como o
filho do homem.
Se foi a adoção desse termo pelos cristãos que precipitou a necessidade para um
novo nome nos escritos místicos judaicos, ou se foi a necessidade de tomar mais
explícito e qualificado o significado dessa figura, não sabemos; entretanto, o novo
nome Metatron passou a ter uso generalizado nos escritos e no Talmude.
O significado desse nome ainda não está esclarecido, mas acredito que o
entendimento mais persuasivo é o apresentado por Hugo Odeberg, o tradutor e
editor inglês do 3 Enoch que deu esse nome ao antes conhecido como "Livro
Hebreu de Enoch".
A etimologia finalmente adotada por Odeberg admite que Metatron representa a
combinação de duas palavras gregas, meta e thronos, como já tinha sido aventado
por J. H. Maius em 1698.
Tal palavra cunhada por judeus de língua grega teria o significado de "o trono de,
ou próximo de" outro trono primordial ou mais elevado.
Para Odeberg, esse significado
... combina melhor com a característica essencial associada a Metatron em suas
representações mais antigas (..) do que qualquer outra (...) no terreno em que a
idéia do ''trono" tem papel importante na concepção de Metatron.
Por isso, pode ser sugerido que a exata interpretação da palavra Metatron seja:
O ser celestial que ocupa o trono próximo ao trono de Glória (o trono Divino) ou,
simplesmente usando a terminologia mais atual, o trono próximo ao trono de
Glória, em que trono equivale ao ocupante do trono, ou trono menor
Em 3 Enoch, Metatron explica: Todas essas coisas o Sagrado Um, abençoado seja
Ele, fez para mim: Ele fez-me um trono, similar ao trono de Glória (...) e Ele
colocou-me à porta da Sétima Mansão e ali me sentou (...) e Ele chamou-me O
YHWH MENOR na presença de todas as suas criaturas celestiais; como está escrito
(Ex 23,21):
"Pois Meu nome está nele".
Se, então, o significado do nome Metatron indica que, nesses trabalhos Merkabah
mais recentes, Metatron não está sentado no trono de Glória, mas, na melhor das
hipóteses, próximo a ele, isso representaria uma diminuição à sua figura.
Em Ezequiel, o homem entronizado era identificado diretamente com a Glória
(Ez 1:28, 3:23) e, em 1 Enoch, é no trono de Glória que o "filho do homem" se
senta: "E ele se sentou no trono de sua glória, e todo o julgamento foi dado ao
Filho do Homem" (69:27).
Entretanto, no Shi'ur Komah, a posição de Metatron está "abaixo do Trono de
Glória" (Jx9, 11), enquanto, como acabamos de mostrar, em 3 Enoch, Metatron
está sentado em um trono apenas "similar ao trono de Glória" e colocado "à porta
da Sétima Mansão".
Porém, em ambos os trabalhos, o antigo significado está sugerido pela identificação
de Metatron com o anjo que deve estar com os israelitas para liderá-los à Terra
Prometida e sobre o qual Deus disse: "Meu nome está nele" (Ex 23:21).
Esse anjo parece estar associado às referências à morada da Presença, a Shekinah,
em Ex 29:45-46, e à Face geralmente traduzida como "presença", em Ex 33:14-15,
que deve liderá-los. [Em Ex 29:45-46, a raiz da palavra traduzida com o significado
"habita" é a mesma daquela para a Shekinah, já que em Ex 33:14-15 a palavra
traduzida como "presença”- panai, significa claramente "Minha Face".
Apesar de Onkelo apresentá-la como a Shekinah parece ter sido adotada pelo
tradutor da versão do rei James, isso envolve uma interpretação de suas
implicações.
Tal interpretação pode ser suportada contextualmente, como sugerimos, mas o uso
do termo para "face" também é significativo.
Isso é especialmente verdade porque é cercada imediatamente por referências
diretas à Face de Deus (Ex 33:11. 20), que pode ou não ser visto na visão mística
de Moisés.
Como vimos, a manutenção de uma face no trono é um aspecto central da tradição
Merkabah, e o conceito de faces superior e inferior será encontrado novamente no
Zohar e na tradição luriânica dele derivada.]
Entretanto, como Metatron é chamado “na'ar”, isso implica que tal "filho do mundo
vindouro" seja identificado com a figura de filho de Metatron, também chamado de
"príncipe da presença" (J,16); se isso significa apenas que ele serve a Shekinah ou
se é verdadeiramente a Presença entronizada são questões que permanecem
ambíguas.
O problema parece ter sido a existência original de apenas um trono de Glória, no
qual se sentava o homem superno ou duas figuras supernas, uma velha e outra
jovem.
Assim, quando se julgava apropriado indicar o trono para o ancião, agora chamado
o Sagrado Um, abençoado seja Ele, o jovem tinha de ser conduzido ao trono
menor, o que resultou na necessidade de renomeá-lo como Metatron.
Mas como o entendimento ainda era de que ele poderia ser a figura do príncipe ou
filho que representava "a glória do Senhor" (Ez.1:28) e que, portanto, poderia estar
sentado no trono de Glória, foram usados vários meios sub-reptícios para igualar
Metatron com a Shekinah, uma figura mais apropriada para sentar-se nesse trono,
e verdadeiramente ocupando esse lugar no Shi'ur Komah.
O problema dos dois tronos foi abordado mais diretamente no Kedushah, um canto
antifônico derivado dessa tradição Merkabah que aparece três vezes no serviço
religioso matutino diário — na primeira bênção antes do Shemah, dentro da prece
Amidah e antes da prece final Aleinu.
A natureza antifônica desse canto tenta aparentemente reconciliar as diferentes
visões do trono de Isaías e Ezequiel.
Isaias vê "o Senhor sentado sobre um trono" (6:1) e ouve "serafins" (6:2) falando
uns com os outros: Santo, santo, santo é o Senhor das Hostes: toda a Terra está
cheia de Sua Glória" (6:3).
Ezequiel vê sobre o trono "a semelhança da aparência de um homem (...) essa era
a aparência da semelhança da glória do Senhor" (1:26, 25), e ele ouviu querubins
dizendo: "Abençoada seja a Glória do Senhor de “seu lugar" (3:12).
O ser entronizado de Isaías é o Senhor e está sentado acima da Terra cheia de
glória; o de Ezequiel é essa Glória, e seu "lugar", comparativamente, pode ser
entendido abaixo daquele do Senhor.
Os cantores angélicos também estão distinguidos, os serafins sendo de uma ordem
mais elevada do que os querubins, o que é indicado também pelo número de asas
que têm, seis os serafins e quatro os querubins.
No Kedushah, ambos os grupos angélicos cantam os refrões uns para os outros, os
serafins louvando a transcendência divina e os querubins, a divina imanência.
O canto do Kedushah também é a principal atividade das hostes angélicas nas
visões Merkabah do trono.
Como Odeberg tinha antes declarado, "o significado do Kedushah celestial é
indicado pela dedicação impressa em sua performance (...) é o símbolo e, ao
mesmo tempo, a confirmação do Reino dos Céus nas esferas celestiais".
O editor mais recente do Shi'ur Komah, Martin Samuel Cohen, concorda com uma
declaração similar anterior: "Alexander Altman, em um artigo sobre o uso de hinos
na literatura hekhalot, escreveu que não haverá visão do trono-carruagem sem os
cânticos. Essa afirmação é abundantemente repetida em, praticamente, todas as
páginas da antiga literatura mística (...)".
Aqui, novamente, temos uma divisão entre figuras supernas superior e inferior,
uma identificação entre um mestre espiritual em ascensão, Moisés, e uma figura
superna inferior que tem a "mesma face" daquele primeiro humano.
É nessa identificação do místico com o objeto superno de sua visão que reside o
conceito duplo da filiação divina, e o texto revela que aquele que entende esse
mistério é certamente "um filho do Mundo Vindouro", usando as mesmas palavras
que aparecem no Shi‟ur Komah:
Além disso, é dito no livro do "Grande Mistério" que qualquer um que conheça esse
mistério, que procede do Trishagion (Is 6:3) e (Ez 3:12, que o segue na liturgia do
kedushah): "Abençoada é a Presença do Senhor neste lugar" possa ser assegurada
a vida do mundo futuro, e esse é o nome do Sagrado Um, abençoado seja Ele."
[Scholem coloca nessa referência: "a formulação: todo homem que conhece esse
mistério pode estar assegurado da bem-aventurança, é exatamente a mesma que
aquela dada no começo de nosso fragmento do Shi’ur Komah" (p.110).]
Assim, vemos que havia uma tradição aparentemente voltando ao Shi‟ur Komah,
que relacionava um conhecimento esotérico particular a uma fórmula lingüística
assegurando a vida eterna com uma frase tão familiar que poderia ser reconhecida
por simples alusão: "filho do Mundo Vindouro", Ben Olam ha-Ba.
Mas, além de aparecer no Shi'ur Komah, no Reza Rabbah e nos escritos do Rabad,
ainda há outro lugar onde surge a frase Ben Olam ha-Ba.
É no Talmad Megillah 28b, uma passagem no serviço do Sabbath Musaf:
"Foi ensinado na escola de Elias: Quem estudar as leis tradicionais todo dia tem
assegurada a vida no mundo vindouro, pois está escrito: 'Seus caminhos são
eternos' (entenda caminhos como Leis tradicionais)."
Philip Birnbaum observou as referências não diretamente do profeta, mas de um
trabalho posterior que o cita, o Seder Ellyyahu.
Esse trabalho, uma coleção midráshica de autoria misteriosa, consiste em duas
partes: Seder Eliyyahu Rabba (31 capítulos) e Seder Eliyyahu Zuta (25 capítulos).
De acordo com o Talmude (Kethuboth 106a), Elias visitava freqüentemente Rabba
Anan (século III) e ensinava-lhe o Seder Ellyyahu.
Esse trabalho, que foi chamado "a jóia da literatura agádica", enfatizava a
importância da constância no estudo da Torah."
A referência citada em Megillah 28b está no capítulo 2 do Seder Eliyyahu Zuta, que
deve, portanto, ser pré-talmúdica, como a referência no Siddur, o livro de preces,
deve ser pós-talmúdica.
A questão que nos chega agora é com referência à relação cronológica da fórmula
lingüística do Shi 'ur Komah ligada ao conhecimento esotérico e à formula
talmúdica ligada ao conhecimento exotérico, este da Torah.
O Shi'ur Komah torna-se a fonte de toda essa tradição, se aceitarmos a data de
Gershom Scholem: "A idade desse Shi'ur Komah pode ser fixada com certeza.
Contrariamente à opinião que prevalecia, ele pode ser datado do século II, e
certamente não é mais recente".
Que a recompensa eterna pelo estudo esotérico deve ter sido transferida pelos
rabis para o estudo da Torah parece ser a direção assumida.
Podemos observar como a frase com a qual estamos envolvidos, Ben Olam ha-Ba,
pode ter sido atribuída por eles a uma transmissão mística do profeta Elias, cuja
ascensão aos céus em uma carruagem de fogo demonstraria a recompensa
"assegurada" a um "filho do mundo vindouro".
Porém, a fonte é outra se aceitarmos a última datação feita pelo mais recente
editor do Shi'ur Komah, Martin Samuel Cohen, que aponta "uma data anterior para
a composição do Shi'ur Komah, suficientemente tardia para pós-datar a redação do
Talmude babilônico"
[Apesar de ele dar uma razão para sua datação "o fato de o Shi 'ur Komah ecoar
algumas passagens do Talmude babilônico" (p.66), e citar algumas passagens
similares observadas por estudiosos anteriores, ambos, ele e eles, falharam na
observação da passagem Megillah 28b e do Siddur que é muito paralela da fórmula
lingüística do Shi 'ur Komah na eterna recompensa pelo estudo diário de um
assunto particular do conhecimento.]
Entretanto, Joseph Dan observa que a data de Cohen é a única exceção à proposta
de Gershom Scholem, "agora quase universalmente aceita", e acha sua
argumentação "incompleta e inconvincente".
Mas, independentemente de a origem dessa frase ser o Shi 'ur Komah, o Seder
Eliyyahu Zuta ou uma fonte comum a ambos, ela está amplamente disseminada
nas tradições exotérica e esotérica do Judaísmo pós-Templo.
Apesar de quase todos os tradutores desses textos terem perdido a chave de seu
significado esotérico, a obscura referência a "filho" em suas versões tornou-se a
frase completa que contém o significado central da doutrina secreta do filho,
assegurando que por meio de práticas místicas diárias ou estudo herdaremos a vida
eterna.
Podemos ver que essa doutrina secreta deriva do sacerdócio do Templo
observando o momento interessante em que essa frase surge na passagem do
Siddur, logo depois da descrição do incenso usado no Templo e da lista dos salmos
que eram recitados pelos levitas no Templo.
[Apesar de Scholem não sugerir tal fonte sacerdotal, ele apoiou a visão, em seu
importante trabalho traduzido recentemente, Origins of lhe Kabbalah, de que houve
antigas fontes judaicas de doutrinas esotéricas medievais:
"A linguagem e conceitos são os mesmos, e olhamos em vão por uma resposta à
questão de como essa terminologia pode ter sido criada de novo no século XII, a
menos que houvesse alguma filiação a fontes ocultas que de alguma forma
estavam relacionadas à velha tradição gnóstica" (p.69).
Apesar de ser lamentável que Scholem tomasse tais dores para atribuir conceitos
centrais kabbalísticos tanto ao neoplatonismo cristão ou ao gnosticismo não-
judaico, ele freqüentemente considera a possibilidade de fontes judaicas ocultas,
indo tão longe que sugere que "talvez, tenha havido sistemas completos de caráter
judaico em paralelo com o sistema clássico gnóstico" (pp.90- 91).
Neste trabalho, sugeri que a origem da tradição esotérica judaica por inteiro, como
do gnosticismo não-judaico, está na tradição interior do sacerdócio do Templo; e
parece estranho que, à parte do crescente consenso entre estudiosos para tal
origem do culto essênio, a existência de um grande corpo de sacerdotes
desprofissionalizados em Jerusalém depois da destruição do Segundo Templo possa
ser ignorada por estudiosos contemporâneos em suas buscas pelas origens das
doutrinas esotéricas judaicas.
Doutrinas que vimos retrocedem à histórica lenda de Elias e da visão do trono do
profeta-sacerdote Ezequiel e que formam a liturgia sacerdotal para os serviços de
prece mantidos no Templo, como atesta a Mishnah Tamid 5:1. Para uma análise
mais profunda a respeito do significado esotérico do cerne da liturgia e suas origens
sacerdotais, veja o capítulo 4 de Renewing lhe Covenant.]
O frequente uso da palavra filho (ben) identificando Ben Adam e Ben Olam ha-Ba
na tradição mística judaica pré-zohárica parece revelar a essência da doutrina
secreta sacerdotal de que o propósito do filho do homem é tomar-se um filho do
mundo vindouro.
Continua