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O documentário conta com os comentários de uma ampla gama de especialistas, o

que inclui Jelani Cobb, da The New Yorker, a ativista dos direitos civis Angela Davis, o ex-
Presidente da Câmara dos Representantes Newt Gingrich, Henry Louis Gates, professor
da Harvard University, o Representante da Câmara Charles B. Rangel, do distrito de Nova
York, Van Jones, ex-oficial da administração Obama, e Grover Norquist, político
conservador e defensor da reforma tributária.
DuVernay disse que a Netflix entrou em contato sobre a possibilidade do projeto
depois que ela terminou seu drama histórico aclamado pela crítica, “Selma: uma luta pela
igualdade”. Os efeitos da prisão há muito são um assunto de interesse para a diretora e
um tema recorrente em sua obra. “Middle of Nowhere”, o segundo longa-metragem de
DuVernay, que rendeu-lhe o prêmio de Melhor Direção no Festival de Cinema de
Sundance, acompanha uma mulher que se vê obrigada a lidar com o fato de seu marido
ter sido condenado a oito anos de prisão.
Um dos personagens principais da série de drama de televisão de DuVernay,
“Queen Sugar”, que estreou no mês passado no canal OWN, é um ex-presidiário cujo
passado é um obstáculo imenso para que ele arranje um emprego e que coloca uma
pressão constante em sua relação com sua família. Sua irmã jornalista, Nova, dedica seu
trabalho a expor o preconceito racial do sistema de justiça do estado de Louisiana.

Explosão carcerária
Mas há um sentimento de urgência em “A 13ª Emenda”, que começa com a voz do
presidente Barack Obama, lamentando – num discurso à 106ª Convenção Nacional da
Associação Nacional para o Progresso de Pessoas de Cor (NAACP, na sigla em inglês) –
que “os Estados Unidos são lar de 5% da população mundial, mas 25% de toda a
população carcerária do mundo”.
DuVernay logo estabelece uma relação entre essa estatística atordoante e a era
pós-Guerra Civil: A breve cláusula que compõe a 13ª emenda permitiu ao sul reconstruir
sua economia através da mão de obra de prisioneiros. Grandes números de afro-
americanos foram presos – muitas vezes por crimes pequenos. “Foi a primeira explosão
da população carcerária da nossa nação.”
“A 13ª Emenda” dá a D. W. Griffith e seu filme “O Nascimento de uma Nação”, de
1915, os créditos pela criação de uma imagem falsa, mas duradoura, de que negros são
criminosos. O documentário acompanha as décadas de linchamentos, violência racial e
leis de Jim Crow que levaram a uma reação na forma do movimento dos direitos civis (“O
Nascimento de uma Nação”, de Nate Parker, que conta a história de uma rebelião de
escravos liderada por Nat Turner e cujo título foi apropriado do filme de Griffith, também
foi lançado nesta sexta-feira).
Conforme o documentário mapeia o número crescente da população carcerária nos
EUA (de 357.292 in 1970 para 2.306.200 em 2014), DuVernay examina a retórica de “lei e
ordem” popularizada por Richard Nixon e Ronald Reagan no final da década de 1960, o
medo equivocado utilizado para justificar a violência cometida contra os ativistas do
partido dos Panteras Negras (incluindo o líder de Chicago, Fred Hampton, morto pela
polícia em 1969) e as disparidades raciais nas sentenças de traficantes negros durante a
epidemia de
crack dos anos 80.

Retórica eleitoral
“A 13ª Emenda” conta com imagens do candidato à presidência pelo Partido
Republicano, Donald Trump, falando sobre o caso infame da corredora do Central Park,
de 1989. Cinco adolescentes negros e latinos foram condenados pelo espancamento e
estupro brutal da vítima, mas provas posteriores provenientes do resultado da análise de
DNA acabaram inocentando-os. O caso levou Trump a publicar um anúncio que ocupava
uma página inteira do New York Daily News pedindo para que o estado “trouxesse de
volta a pena de morte”.
“A 13ª Emenda” justapõe a retórica polêmica da campanha do candidato
republicano com imagens de afro-americanos sendo atacados com mangueiras de água
de alta pressão e cães policiais nos protestos do movimento dos direitos civis. Mas a rival
de Trump do Partido Democrata também não sai ilesa no documentário, que destaca os
comentários polêmicos de Hillary Clinton sobre os tais “superpredadores”, feitos em 1996,
enquanto ela apoiava a lei anticrime de Bill Clinton de 1994.
O filme também lança luz sobre o Conselho Americano de Intercâmbio Legislativo
(ALEC, na sigla em inglês), um grupo de políticas, de tendência conservadora, que
fornece modelos de legislação para legisladores do estado, o que inclui leis que
potencialmente beneficiam prisões privadas. DuVernay afirma que os momentos mais
iluminadores para ela se deram ao fazer esta seção do documentário. “O fato de que
muitas de nossas leis não são feitas pelos nossos próprios legisladores... foi assustador
para mim”, disse DuVernay.

Mortes e linchamentos
Um dos segmentos mais comoventes do filme apresenta vídeos de mulheres e
homens negros e desarmados sendo mortos pela polícia. “A 13ª Emenda” traça um
vínculo entre esses vídeos e as imagens que os antecedem – fotos de linchamentos
horrendos, o caixão aberto de Emmett Till e cenas de afro-americanos sendo brutalizados
durante o movimento dos direitos civis.
Apesar do fato de que muitos vídeos de assassinatos cometidos pela polícia estão em
domínio público ou são propriedade dos transeuntes que os filmaram, DuVernay e sua
irmã Tera pediram e conseguiram a permissão das famílias das vítimas para que os
vídeos pudessem ser usados. “Seria lamentável para mim alguém usar os últimos
momentos da vida de outra pessoa sem permissão”, disse DuVernay.
DuVernay diz ter esperança de que o documentário possa inspirar as pessoas “a
refletirem de verdade sobre o que elas pensam e sentem” a respeito do modo como
podem elas mesmas serem cúmplices na instituição do sistema penitenciário. DuVernay
se declara especialmente orgulhosa de o seu filme ter estreado na Netflix, o que faz com
que ele seja acessível para mais pessoas.
“A ideia de que as pessoas podem vê-lo a qualquer hora, em qualquer lugar, é
poderosa”, ela afirmou.

A “13ª Emenda” brasileira


o
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O documentário “A 13ª Emenda” (Ava DuVernay, EUA, 2016), recentemente
disponibilizado no Netflix, trata da seletividade do sistema de justiça criminal norte-
americano, que vem empreendendo o encarceramento em massa de pessoas em sua
maioria negras. Confira o trailer:
A diretora escolhe o ordenamento jurídico como ponto de partida de sua narrativa,
e constrói a história a partir da 13ª Emenda à Constituição Norte-Americana, que abole a
escravidão no território dos EUA, mas permite a restrição à liberdade de criminosos.
Embora tenha gostado do filme de uma maneira geral, tenho algumas ressalvas
quanto a alguns “buracos”: senti falta de um aprofundamento no tema da ressignificação
do uso da prisão pelos movimentos dos direitos civis dos negros nos anos 1960, e,
principalmente, de um debate maior sobre o processo histórico de construção do
estereótipo do “negro criminoso”. Sobre isso, aproveito a digressão para sugerir o
documentário-reportagem do New York Times “Superpredator Scare”, (infelizmente não
há versão legendada), sobre como se construiu a onda de temor dos “jovens super
predadores” em meados da década de 1990.
Mas, críticas à parte, vale parar pelos 100 minutos de duração do documentário
para ao menos ter um primeiro contato com o tema da seletividade penal, e,
principalmente, constatar várias semelhanças com o caso brasileiro.Evidentemente, as
trajetórias históricas do Brasil e dos Estados Unidos são distintas e há diferenças
importantes entre uma e outra, mas há também aproximações no que diz respeito ao uso
de mão-de-obra escrava de negros trazidos à força da África, aos efeitos deletérios das
doutrinas racialistas e do racismo científico na gênese enviesada da cidadania dos dois
países e, mais recentemente, na explosão demográfica carcerária marcada por uma
seletividade penal intensamente racializada.

Mas o que é, afinal, essa tal “seletividade penal”?


“Seletividade penal” é o termo que designa a hipercriminalização de condutas e
segmentos sociais em contraponto à cifra negra de outras condutas e grupos de pessoas.
A expressão foi cunhada no decorrer do desenvolvimento da Criminologia Crítica, a partir
dos anos 1970, área do conhecimento que irá explorar as bases empíricas não apenas da
prática dos crimes mas de como esses fenômenos são categorizados pelo sistema de
justiça. São as correntes criminológicas alinhadas a essa vertente que passarão a
analisar e procurar explicar o fenômeno criminal por perspectivas que levam em conta
aspectos históricos, sociais e culturais para tentar entender por que a criminalização de
condutas varia ao longo da História, e por que determinados grupos sociais são mais
sujeitos a ingressar no sistema de justiça criminal do que outros.
O filme “A 13ª Emenda” procura trabalhar exatamente com essa ideia, propondo a
pergunta: o que explica a “seleção preferencial” dos negros para o sistema de justiça
criminal e penitenciário norte-americano?
Essa mesma pergunta pode ser trazida para a realidade brasileira: por que a
população negra é tão sobre-representada no sistema de justiça e prisional (e, vale
lembrar, tão sub-representada em lugares de poder)?
Se o caso norte-americano encontra pistas para sua explicação na formulação da
Emenda Constitucional que abole a escravidão, no Brasil é possível identificar toda uma
tendência legislativa iniciada há dois séculos direcionada especificamente para a
população africana e afro-brasileira escravizada.
O Brasil tem status político e jurídico de colônia até o ano de 1822, quando a
independência é declarada pelo príncipe de Portugal, que viria a ser o imperador do
Brasil, Dom Pedro I (e não perco jamais a piada para dizer que o Brasil foi o único país da
América Latina a se declarar independente e entregar seu governo pro filho do dono). Não
obstante a outorga da 1ª constituição brasileira em 1824, isso não implicou em absoluto
uma construção de cidadania, haja vista a ausência de previsão de igualdade formal, e o
grande contingente de negros escravizados, o que significa dizer que parcela expressiva
da população brasileira não era sequer proprietária do próprio corpo.
A abolição da escravatura só viria em 1888. Mas mesmo antes disso, já se
editavam normas jurídicas prevendo punições exclusivas para negros, a exemplo desta lei
do período regencial:

Lei nº 4 de junho de 1835


A Regencia Permanente em Nome do Imperador o Senhor D. Pedro Segundo Faz saber a
todos os subditos do Imperio que a Assembléa Geral Legislativa Decretou, e Ella
Sanccionou a Lei seguinte:
Art. 1º Serão punidos com a pena de morte os escravos ou escravas, que matarem por
qualquer maneira que seja, propinarem veneno, ferirem gravemente ou fizerem outra
qualquer grave offensa physica a seu senhor, a sua mulher, a descendentes ou
ascendentes, que em sua companhia morarem, a administrador, feitor e ás suas
mulheres, que com elles viverem.
Se o ferimento, ou offensa physica forem leves, a pena será de açoutes a proporção das
circunstancias mais ou menos agravantes.

A pena de morte seria abolida para os crimes comuns (vamos lembrar que ainda
há previsão legal e constitucional para a sanção para determinados crimes militares em
tempo de guerra) na Constituição da República de 1889, mas a Lei nº4 de 1835 tratou de
criar um delito especificamente imputável às pessoas escravizadas – e negras, portanto.
Mas, como já mencionei, a abolição da escravatura ocorre um ano antes do golpe
militar que instaura o regime republicano no Brasil, fazendo emergir como grave questão
social o expressivo contigente de negros libertados da escravidão sem qualquer política
pública de readequação dessas pessoas à nova realidade. Nasce aqui a duradoura
intersecção das vulnerabilidades de raça e classe, com todo o agravamento acarretado
pelo intenso uso do Direito Penal com foco na punição da população negra recém-
libertada. O Código Criminal da República (1890) contará com outras condutas
especialmente tipificadas para atingir a essa população. Um exemplo disso está no artigo
157 desse Código, que criminalizava a prática do “espiritismo, magia e seus sortilégios”,
criminalizando práticas que eram então facilmente associáveis às religiões de matriz
africana:

CAPITULO III
DOS CRIMES CONTRA A SAUDE PUBLICA
Art. 157. Praticar o espiritismo, a magia e seus sortilegios, usar de talismans e
cartomancias para despertar sentimentos de odio ou amor, inculcar cura de molestias
curaveis ou incuraveis, emfim, para fascinar e subjugar a credulidade publica:
Penas de prisão celular por um a seis meses e multa de 100$ a 500$000.
Já a capoeira, tradição da cultura dos negros escravizados, era expressamente
criminalizada no artigo 402 (cuja redação, aliás, sempre me remete às descrições
midiáticas dos efêmeros “rolezinhos”, fenômeno que esteve em moda entre 2013 e
2014, rapidamente reprimido por todo tipo de autoridade)
CAPITULO XIII – DOS VADIOS E CAPOEIRAS
Art. 402. Fazer nas ruas e praças publicas exercícios de agilidade e destreza corporal
conhecidos pela denominação capoeiragem; andar em correrias, com armas ou
instrumentos capazes de produzir uma lesão corporal, provocando tumultos ou
desordens, ameaçando pessoa certa ou incerta, ou incutindo temor de algum mal:
Pena de prisão cellular por dous a seis mezes.
Aliás, vale a pena atentar para a rubrica do Capítulo XIII, que além dos já mencionados
capoeiras trazia a figura do vadio, cuja conduta típica era assim descrita:
Art. 399. Deixar de exercitar profissão, officio, ou qualquer mister em que ganhe a vida,
não possuindo meios de subsistencia e domicilio certo em que habite; prover a
subsistencia por meio de occupação prohibida por lei, ou manifestamente offensiva da
moral e dos bons costumes:
Pena – de prisão celular por quinze a trinta dias.
1º Pela mesma sentença que condenar o infractor como vadio, ou vagabundo, será elle
obrigado a assignar termo de tomar ocupação dentro de 15 dias, contados do
cumprimento da pena.
2º Os maiores de 14 annos serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriaes,
onde poderão ser conservados até á idade de 21 anos.

Lembremo-nos, como já comentado acima, que havia então um imenso


contingente de pessoas recém-libertadas da escravidão, sem qualquer acesso ao
aprendizado de uma profissão ou ofício, muitos saídos sem destino – e, portanto, sem
domicílio certo – das fazendas onde eram obrigados a trabalhar.
Esta não é uma realidade que se transforme da noite para o dia. Embora os 128 anos que
separam 2016 do ano de abolição da escravidão possam parecer muito tempo, é um
lapso curto em termos históricos, especialmente quando se pensa em um país como o
Brasil, cuja construção da cidadania e democracia vem encontrando tantos percalços,
sendo até hoje raras e pontuais políticas públicas para que ao menos reconheçam nossa
estrutura tão racista.
Tanto é assim que, no ano de 2011, em cada grupo de 100 mil negros 1,4 foi vítima
de ação letal da polícia; enquanto que num grupo de 100 mil brancos a taxa de letalidade
por ação da polícia é 0,5. Em 2012, dos presos em flagrante segundo cor/raça, em taxa
de 100 mil habitantes em São Paulo, 35/100mil eram negros e 14/100mil eram branco [1].
Em relação à taxa de encarceramento por 100 mil habitantes, tínhamos em 2005 a
proporção de 69 brancos para cada 100 mil presos, e 107 negros para cada 100 mil
presos. Em 2012, o índice passou para 107/100 mil em relação aos brancos e 292/100 mil
em relação aos negros [2].
Mas o que significa tudo isso, então? Que há um “projeto” de “brancos malvados”
contra “negros vítimas”? Nada é tão simples ou evidente, pois a prática discriminatória
(seja por raça, por gênero, por orientação sexual ou qualquer outra) dificilmente se
manifestará em um processo consciente. Porém, a legislação histórica aqui citada,
principalmente quando cotejada com os números atuais do sistema de justiça e carcerário
trazem indicativos importantes de que o controle penal e a vigilância têm destinatários
preferenciais. É importante compreender a formação dessa mentalidade para
começarmos um urgente processo de desconstrução dessa maneira de pensar,
especialmente entre os operadores do Direito. E mais, lançar um olhar crítico à forma
como empregamos a prisão e o sistema de justiça criminal. Afirmar que combate à
discriminação é vitimismo é desconhecer a História.

Maíra Zapater é graduada em Direito pela PUC-SP e Ciências Sociais pela FFLCH-USP.
É especialista em Direito Penal e Processual Penal pela Escola Superior do Ministério
Público de São Paulo e doutoranda em Direitos Humanos pela FADUSP. Professora e
pesquisadora, é autora do blog deunatv.
O longa examina os estágios da construção histórica do preconceito e aponta como
a formulação racista contribuiu para associar os negros ao mundo do crime e, por
consequência, chancelar o aprisionamento deles nas cadeias cada vez em maior
quantidade através de um processo de encarceramento em massa. A tese de engorda
dos presídios embasa a referência, no título do filme, à 13ª emenda da Constituição norte-
americana, por meio da qual ninguém pode ser submetido à escravidão ou ao trabalho
forçado, “salvo como punição de um crime”. Instituída no apagar das luzes do século 19,
após o sangrento conflito pelo fim do regime escravocrata, a medida teria sido manipulada
para transformar o povo escravizado em trabalhadores servis a partir do enquadramento
criminal — condição pela qual têm negada a plena cidadania.

Crise inflamada

Baseado em censos sociais, entrevistas com ativistas, políticos, estudiosos e


embalado por letras de músicos críticos à discriminação, como Nina Simone e Public
Enemy, o documentário confronta a alcunha de terra da liberdade assumida pelos EUA ao
constatar, no país, a existência da maior população carcerária do mundo — formada
majoritariamente por afrodescendentes. A mensagem contundente desembarca em uma
nação assolada por uma crise racial inflamada, recentemente, por assassinatos de jovens
negros por policiais brancos, reação virulenta de movimentos ativistas, discriminação
artística e, de quebra, fragilidade no discurso de proteção às diferenças proveniente dos
principais postulantes à Casa Branca.

Militante

A diretora do filme e ativista da causa negra na arte, Ava DuVernay, experimentou


ela própria a atmosfera de discriminação quando o longa anterior, Selma: Uma luta pela
igualdade, reconstituição da célebre marcha liderada pelo militante negro Martin Luther
King Jr., não lhe rendeu uma cogitada indicação ao Oscar de Melhor Diretor em 2015. A
Academia conseguiu a proeza de só escolher brancos entre os 25 concorrentes aos
postos de atuação e direção — razão pela qual as redes sociais, sob indignação, fizeram
eclodir a hashtag #oscarsowhite (“Oscar tão branco”) e reforçaram o coro capaz de
sensibilizar os organizadores a ampliar o número de negros, mulheres e latinos entre os
jurados.

A atuação dos canais de massa para o agravamento do racismo ocupa papel de


destaque no documentário e ilustra como a propagação do discurso preconceituoso
alicerça a narrativa para desqualificar a cidadania afrodescendente. A cineasta traça um
paralelo cruel entre o conteúdo do filme O nascimento de uma nação (1915) — cujo
enredo glorifica a condenação à morte de um “estuprador negro” pela organização de
supremacia branca Ku Klux Klan (KKK) — e noticiário contemporâneo no qual o retrato-
falado de um criminoso sexual possui, justamente, as características físicas de um
negro. A 13ª emenda mostra como, após O nascimento…, o movimento extremista se
revigorou e até passou a usar a cruz em chamas, inspirado na obra.

Trama da opressão

O filme também escancara como a promiscuidade entre interesses público e


privado patrocinada pelo consórcio de políticos e corporações manobrou a legislação para
manter os negros como cidadãos de segunda classe mesmo após a igualdade garantida
pela Lei dos Direitos Civis (1964). À opressão da segregação, se seguiu a associação
paulatina à conduta criminosa, em especial ao tráfico de drogas, transformado por
sucessivos presidentes (de Nixon a Clinton) em arqui-inimigo da nação.
As medidas adotadas por eles para “garantir a lei e a ordem” (muitas formuladas
pelo Conselho de Intercâmbio Legislativo, Alec, entidade integrada por políticos e
empresas) endureceram de forma exagerada a punição aos crimes e trancafiaram
milhares de negros em presídios para os quais instituições da Alec prestam serviço
remunerado — e onde os detentos trabalham em regime de servidão em projetos de
multinacionais.

Resistência

Com sensibilidade, Ava DuVernay capta o efeito do sistema sobre os negros,


dentro e fora das celas. Aprisionadas, várias gerações de jovens têm as oportunidades (e
as vidas) ceifadas — como Kalief Browder, levado ao suicídio, quando libertado, após
ficar detido três anos sem julgamento. Nas ruas, cresce a resistência de movimentos
como o Black Lives Matter (Vidas Negras Importam), nascido e consolidado como
resposta aos assassinatos de negros por policiais — apesar do extermínio de líderes de
outrora, como Luther King e Panteras Negras.
O documentário é candidato forte ao Oscar por mostrar o quão profundas são as
feridas raciais dos EUA, permitir a comparação com mecanismos de opressão em outros
países — como o Brasil — e explicitar como cada organismo age de forma sistêmica para
vilipendiar a dignidade negra. É um petardo contra a desfaçatez política, o desequilíbrio
capitalista, a manipulação midiática, a distorção artística, a miséria humana e a hipnose
social.

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