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17/09/2018 A obscura noção de substância em Locke

A obscura noção de substância em Locke


Por Elan Marinho - maio 29, 2018 0

Introdução

Em seu Ensaio sobre o entendimento humano, o filósofo John


Locke explora, dentre outros temas, a sua concepção da noção de
substância. Embora essa seja uma noção extremamente obscura
na obra do autor, ela parece possuir uma função na sua
perspectiva quanto a realidade e o conhecimento. Para
compreender qual é a relevância dessa noção na filosofia
lockeana e a razão pela qual ela pode ser entendida como uma
das mais obscuras, é necessário que sejam esclarecidos alguns
conceitos que a orbitam. Farei, pois, um apanhado geral desses
conceitos antes de nos debruçarmos sobre pontos importantes
d l t d it d
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que devem ser levantados a respeito da obscuridade e do papel
da noção de substância na obra do filósofo.

Das ideias simples às complexas

Do ponto de vista de Locke, as coisas no mundo afetam os


nossos sentidos de modo a produzir em nossa mente ideias
correspondentes a elas. Em linhas gerais, podemos exemplificar o
branco como uma ideia simples que afeta o nosso corpo de modo
a produzir em nossa mente a ideia de branco que lhe é
correspondente. As ideias simples se caracterizam sobretudo por
não serem compostas: elas não podem ser divididas em mais
ideias. A mente não pode nem criar ideias simples e nem destruí-
las. Uma ideia simples, assim, é obtida de maneira passiva: na
medida em que o mundo nos afeta, elas são produzidas. (cf. 2. 2.
1-2)

Além dessas ideias simples, existem as ideias complexas. As


ideias simples são a matéria-prima – “materiais e alicerces” (2.
12. 1.) – da composição de todas as ideias complexas. É
repetindo, comparando e unindo ideias uma a outra que
conseguimos gerar as complexas. Nesse sentido, as ideias
complexas, diferentemente das ideias simples, não são obtidas de
maneira passiva. Primeiro, nós adquirimos – passivamente –
ideias simples para, depois, as compormos – ativamente – em
ideias complexas (cf. 2. 12. 1.).

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É necessário que realizemos atividades mentais para gerar tais


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ideias complexas. Essas atividades podem consistir de três


operações: I) combinação (ou composição), que é quando
criamos uma ideia complexa a partir da combinação (ou
composição) de ideias simples; II) comparação, que consiste em
agrupar ideias de um modo que ainda seja possível encará-las
como distintas – algo como colocar lado a lado –; e
III) abstração, que consiste na operação de abstrair a ideia de
sua existência singular tornando-a uma ideia geral (cf. 2. 12. 1.).

Da ideia do tipo modo à ideia do tipo substância

O autor divide as ideias complexas em três tipos: modos,


substâncias e relações (cf. 2. 12. 3). Falarei aqui apenas sobre os
dois primeiros tipos, já que são os mais importantes para a
compreensão de como a noção de substância se apresenta na
filosofia de Locke. Para explicá-los, utilizarei uma maneira de
conceituar que é divergente da de Locke, porque quero deixar
bastante destacada a diferença entre substância enquanto ideia e
substância enquanto tipo de ideia.

As ideias complexas do tipo modo são aquelas que não possuem


uma substância própria, que são dependentes de substâncias (cf.
2. 12. 4) – deixarei mais claro depois em que consiste essa
“dependência”. Elas se dividem em dois subtipos: simples, em
que apenas uma ideia simples é repetida e somada para gerar a
ideia complexa – como a ideia de dúzia, que é a repetição da
ideia de unidade –; e mistas, em que se combina ideias
diferentes entre si – a ideia de beleza é mista, já que Locke a
define como “uma certa composição de cor e figura, que deleita o
expectador” considerando que cor, figura, deleite, expectador etc.
são ideias distintas entre si (cf. 2. 12. 5.).

As ideias complexas do tipo substância são famosas por


representarem coisas particulares subsistentes por si mesmas.
Em todas as ideias desse grupo, a ideia de substância é a
principal e a primeira, mas também a mais obscura e confusa de
todas. A ideia de chumbo, por exemplo, é aquela em que se une,
à ideia de substância, as ideias de “uma certa cor esbranquiçada
esbatida, com certos graus de peso, dureza, ductibilidade e
fusibilidade” (2. 12. 6). Logo, as ideias complexas desse tipo são
obtidas pela união da ideia de substância às demais ideias (cf 2
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obtidas pela união da ideia de substância às demais ideias. (cf. 2.
12. 6)

Um ponto importante a ser enfrentado aqui é o da diferença entre


as ideias complexas do tipo substância em relação às do tipo
modo. Locke coloca que as segundas “dependem” das primeiras.
Em que consiste essa dependência?

Ao longo da história da filosofia, foi defendido que qualidades não


poderiam existir dissociadas de um objeto. O branco, por
exemplo, sempre estaria associado a algum objeto, porque ele
não conseguiria existir no mundo independentemente de objetos:
branco seria sempre branco de alguma coisa. Um tal objeto em
que o branco ocorreria seria o substrato, o suporte ou – como
disseram muitos – a substância por meio da qual essa qualidade
se manifestaria. Assim, as qualidades seriam dependentes das
coisas para se manifestarem na realidade.

Em contrapartida, a noção de dependência aqui pode ser


entendida como diferente dessa noção clássica. Primeiro, que
existe uma diferença entre substância enquanto ideia e
substância enquanto tipo de ideia. As ideias do tipo modo
dependem diretamente das ideias do tipo substância, e não da
própria ideia de substância. Além disso, as ideias do tipo modo
não correspondem às qualidades acidentais que um objeto pode
ter. Ideias desse tipo – como a de triângulo, gratidão e de
assassinato – dependem das ideias de tipo substância para existir
por outra razão.

Nas palavras de Woolhouse,

Para que existam a gratidão e o assassinato, é


necessário que existam homens gratos e seus
atos, assassinos e suas vítimas. Similarmente, os
triângulos que encontramos no mundo precisam
ser feitos de chumbo ou de outro material.¹

Creio que o caso do assassinato como ideia de tipo modo seja o


que deixa mais clara essa diferença, já que não conseguimos
imaginar como assassinato poderia ser uma propriedade que
subsiste em um objeto da mesma forma que subsistiria, por
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subs ste e u objeto da es a o a que subs st a, po
exemplo, o branco. De qualquer forma, fica clara essa distinção
quanto ao tipo de dependência que as ideias do tipo modo
possuem em relação às ideias do tipo substância.

A obscura ideia de substância

Pensemos agora um pouco mais a substância, não enquanto tipo


de ideia complexa, mas enquanto uma ideia. Se questionassem a
Locke o que é a substância, ele poderia parecer

o indiano (…) que referia que o mundo era


suportado por um grande elefante, e ao
perguntarem-lhe em que é que o elefante
descansava, ele respondeu: sobre uma grande
tartaruga. Mas ao ser mais uma vez mais
pressionado para se saber o que sustentava a
tartaruga com tão grande carapaça, ele
respondeu que era qualquer coisa, não sabia o
quê. (2. 23. 2.)

Essa é a mesma situação na qual se encontra aquele que é


pressionado a responder o que é a substância. Ele não consegue
se livrar da ideia, mas ao mesmo tempo não consegue defini-la,
já que

Em si mesmo, ao que parece, o substratum deve


ser totalmente “descaracterizado” – pois se ele
tiver qualidades em si próprio, então elas, pela
mesma linha de raciocínio, requiririam alguma
“coisa” ainda mais básica para as “suportar”.²

A substância, pois, deve ser o último nível. Se ela for um


conjunto de qualidades, então esse conjunto de qualidades
precisará ter como substrato outra – verdadeira – substância.

Um gato, por exemplo, é composto por maciez e negritude, mas


também por substância. A substância (ou substratum) do gato
não é o copilado de propriedades do gato, e sim algo que se
soma àquelas propriedades para que o gato possa existir. Assim,
a ideia de gato imita o gato real, uma vez que ela é a ideia de
b â d à d d d
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substância somada às ideias de negritude, maciez e outras mais.

Então um substratum, falando de modo coloquial,


não tem propriedades que pertencem a ele como
as que podem pertencer a um gato. Antes, ele
assuporta e elas estão inerentes a ele. Nós somos
capazes, em um primeiro momento, de pensar
em um gato tendo propriedades, como sendo
uma substância individual, porque a ideia de gato
é uma ideia de substância e por isso,
então nos conta Locke, contém a ideia de
um substratumcomo uma de suas partes. ³

Se refletirmos sobre os nossos pensamentos, veremos que o Sol


nada mais é do que um conjunto de qualidades associadas a ele
somado a algo que atua como suporte de tais qualidades (cf. 2.
23. 6). Se pensarmos mais um pouco, veremos que muitas
dessas propriedades na verdade são poderes: o Sol tem o poder
de provocar nas pessoas as ideias que associam a ele como de
ter certa cor e de provocar calor. Esses poderes, todavia, não são
a ideia de substância: os poderes e as substâncias são ideias
distintas entre si (cf. 2. 23. 7).

Nesse sentido, também não podemos confundir a substância com


qualidades primárias como “o volume, a forma, o número, a
situação e o movimento dos corpos” (2. 23. 9). Essas qualidades
primárias têm toda uma aparência de substâncias, já que elas
geram qualidades secundárias como cores, sons e sabores. Nesse
sentido, as qualidades primárias parecem ser uma “estrutura
interna” ao próprio objeto ou mesmo um suporte das qualidades
secundárias. Entretanto, elas também não se equivalem à
substância, porque o volume, a forma e o movimento de um
corpo, tudo isso precisa de um suporte. Logo, a substância
pressupõe sempre um não sei o quê para além dessas
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pressupõe sempre um não sei o quê para além dessas
qualidades, por mais primordiais que sejam.

Além disso, Locke também tenta mostrar (2. 23. 23-27) que a
substância possui um lugar diferente de hipóteses quanto a como
as coisas se juntam que derivavam da física de sua época. Ele
coloca que a questão é metafísica, e não física – é um problema
de como metafisicamente (e não fisicamente) as partes se
associam ao todo. Não poderíamos, pois, apelar para
microestruturas, partículas e explicações desse gênero: elas
também pressuporiam, de algum modo, a substância como o
substrato que condiciona suas existências.

As ideias que compõe, junto com a substância, a ideia complexa


em nada nos ajudam a entender o que é a substância dos objetos
(cf. 2. 23. 16.). Por isso, o máximo que Locke pode fazer para
“definir” a substância é citar exemplos de ideias complexas em
que uma das ideias que as compõe é a ideia de substância, como
as ideias de homem, cavalo, ouro e água (cf. 2. 23. 3.). Dar
exemplos, todavia, não parece ser estabelecer realmente uma
boa definição – e Locke está ciente disso.

Poderíamos nos questionar, então, se não seria mais justo


simplesmente desprezarmos a ideia de substância enquanto uma
noção simplesmente sem sentido. No entanto, Locke explica (cf.
2. 23. 4) que a ideia de substância tem um papel importante na
medida em que não temos a capacidade de conceber as
qualidades de um objeto sem pressupor também a substância
como aquilo que promove o elo entre as qualidades. De acordo
com o filósofo, ela é a condição de possibilidade da ligação entre
as propriedades, embora não saibamos com clareza o que ela é.
É apenas na mente que ideias como vermelho e doce poderiam
“subsistir” sem uma substância. No mundo, elas estão
intrinsecamente dependentes dela.

Em contrapartida, não podemos também encarar a substância


como um mero estado mental ou um produto psicológico da
nossa interação com o mundo. De fato, Locke acreditava que a
substância existia no mundo enquanto realidade, e não somente
enquanto uma ideia. Segundo Lowe,

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ele não está apontando (embora ele de fato


concordaria com isso também) que estados
mentais devem ser estados de uma substância de
algum tipo (provavelmente de um “espírito” ou
“alma”), mas antes que as qualidades de objetos
físicos as quais causam essas ideias em nós
requerem ser suportadas por algum “substratum”
externo, material. 4

É claro que a substância existe na mente enquanto uma ideia – a


ideia de substância –, e uma ideia pode ser entendida como um
“estado mental”. Entretanto, a ideia de substância possui
correspondência na realidade, pois substâncias existem na
realidade. Nesse sentido, não é um mero estado mental,
mas também um estado mental. Esse mesmo raciocínio valeria
para quem encara a substância como uma característica da
linguagem: ela não é uma mera característica da linguagem,
mas tambémuma característica da linguagem.

Apesar de sabermos muito sobre o que a substância não é, ainda


parece haver uma obscuridade enorme quanto ao que ela é.
Ainda assim, como já foi demonstrado, não poderíamos
simplesmente nos livrar dessa noção, porque ficaríamos sem uma
explicação quanto àquilo que promove a ligação entre as
qualidades. Podemos nos questionar, porém, quanto ao porquê
dessa noção ser tão obscura para nós.

Ao ver de Locke (cf. 2. 23. 32), não temos conhecimento claro da


ideia de substância por uma limitação das nossas capacidades
epistemológicas. Isso quer dizer que, se fôssemos mais capazes,
talvez entendêssemos o que é a substância tal como entendemos
claramente o que são as cores. Locke define (cf. 2. 23. 6) a
natureza da substância como “secreta”, o que nos indica que –
como qualquer segredo – pode ser desvelado desde que hajam os
meios necessários para isso.

Considerações finais

Depreendo, à luz dessas considerações, que a noção de


substância de Locke em seu Ensaio parece ser a mais obscura.
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Em contrapartida, ela evidentemente possui um papel


importante, que é o de ser o suporte das qualidades dos objetos,
sem o qual elas não existiriam. Enquanto ideia, ela nos é
acessível pela simples formação de certas ideias complexas em
nossa mente. Enquanto tipo, ela é o conjunto de todas as ideias
complexas que são compostas – dentre outras ideias – pela ideia
de substância. Enquanto realidade no mundo, ela nos mostra que
está para além de um estado mental, que não pode ser
confundida com o poder de um objeto, com uma qualidade
primária, secundária ou, sequer, com uma microestrutura. Um
dia, quem sabe, nossas ferramentas epistemológicas atinjam uma
tal capacidade que faça a substância se revelar para nós de
maneira clara e distinta.

Notas

[1] Em uma tradução livre de: “For there to be gratitude and


murder there need to be grateful men and their acts, murderers
and their victims. Similarly the triangles we meet with in the
world need to be made from lead or some other material” (1984,
p. 98).

[2] Em uma tradução livre de: “In itself, it seems, the substratum
must be utterly featureless – for if it had qualities of its own, then
these would, by the same train of reasoning, require some yet
more basic ‘stuff’ to ‘support’ them” (1995, p. 75).

[3] Em uma tradução livre de: “So a substratum does not, in the
ordinary way, have properties which belong to it as they might
belong to a cat. Rather it supports them and they inhere in it. We
were able in the first place to think of the cat as having
properties, as being an individual substance, because the idea of
a cat is a substance-idea and hence, so Locke tell us, contains the
idea of a substratum as one of its parts” (1984, p. 116).

[4] Em uma tradução livre de: “he is not pointing out (though he
would in fact agree with this also) that mental states must be
states of a substance of some kind (probably of a ‘spirit’ or
‘soul’), but rather that the qualities of physical objects which
cause these ideas in us require suport by some
‘external’ material ‘substratum'” (1995 p 74)
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external , material substratum (1995, p. 74).

Bibliografia

LOCKE, John. Ensaio sobre o entendimento humano. Lisboa:


Fundação Calouste Gulbenkian, 1999.

LOWE, E. J. Locke on human understanding. London; New


York: Routledge, 1995.

WOOLHOUSE, R. S. Locke. Minneapolis: University of Minnesota


Press, 1984.

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