Sei sulla pagina 1di 22

1

Análises funcionais moleculares e


molares: um passo a passo
Lorena Bezerra Nery | Flávia Nunes Fonseca

Existem diferentes modelos de causalidade na lecidos por eventos ambientais. Assim, as expli-
Psicologia. De maneira geral, tanto na lingua- cações causais são dadas em termos de relações
gem cotidiana quanto em grande parte das abor- interativas entre o indivíduo e o ambiente (ante-
dagens psicológicas, o comportamento é vis- cedentes e consequentes à emissão da resposta).
to como um indício de processos que ocorrem Essa visão considera a causalidade ao longo
dentro da pessoa (processos neurológicos, fi- do tempo; ou seja, não há um evento único ou
siológicos ou mentais), como manifestações de uma causa que produza linear e diretamente um
acontecimentos internos (desejos, expectativas, efeito, mas, sim, relações funcionais, de maneira
sentimentos, etc.) ou também como a expressão que o comportamento é considerado uma variá-
de um agente interno ou de uma entidade com vel dependente em relação aos eventos ambien-
vontades próprias. Skinner, em seu famoso livro tais, os quais seriam variáveis independentes.
Ciência e Comportamento Humano (1953/2003), Conclui-se daí que o comportamento é função de
discorre sobre diversas causas popularmente uti- condições ambientais. Em uma perspectiva sele-
lizadas para explicar comportamentos, desde a cionista de causalidade, para explicar o compor-
posição dos planetas quando a pessoa nasce ou tamento não é necessário que os acontecimen-
a estrutura física do indivíduo (p. ex., as propor- tos sejam contíguos (próximos) no espaço e no
ções do corpo, o formato da cabeça, a cor da pe- tempo, mas, sim, que sejam contingentes, isto é,
le e dos olhos, os sulcos nas palmas das mãos) que exista uma relação de dependência entre o
até causas interiores conceituais, quando se usam comportamento e as variáveis ambientais que
descrições redundantes como forma de atri- o controlam. A probabilidade de ocorrência do
buir explicações (p. ex., “Joaquim fuma porque comportamento no futuro é, portanto, determi-
é viciado”, “Larissa come porque tem fome”). De nada pelas condições contextuais e consequên-
acordo com o autor, esse tipo de explicação en- cias produzidas pelo comportamento. Desse mo-
volve riscos por sugerir que as causas do com- do, as relações de dependência são bidirecionais,
portamento já foram encontradas e não precisam ou seja, o comportamento do indivíduo modifica
mais ser investigadas. os eventos ambientais, que, por sua vez, alteram
A perspectiva analítico-comportamental traz a probabilidade de ocorrência futura do compor-
um contraponto às abordagens tradicionais, de- tamento (Catania, 1999; Chiesa, 1994/2006; Mar-
finindo a Psicologia como estudo do compor- çal, 2010; Skinner, 1981; Todorov, 1989).
tamento, isto é, das interações organismo-am- Moore (2008) destaca que, nas concepções
biente (de Rose, 2001; Todorov, 1989). A filoso- vigentes a respeito da origem do comportamen-
fia que embasa a Análise do Comportamento é to, as explicações causais se dão de forma sim-
o Behaviorismo Radical, o qual propõe um mo- ples, linear e unidirecional, muitas vezes basea-
delo selecionista de causalidade. De acordo com das em relações de contiguidade no espaço e no
esse modelo, dentro de uma ampla faixa de pos- tempo (p. ex., “Pedro bateu no primo porque es-
sibilidades, os padrões comportamentais de ca- tava com raiva”, “Mariana toca piano bem porque
da indivíduo são selecionados, mantidos e forta- é talentosa”). De acordo com o autor, o Behavio-

FARIAS_Cap_01.indd 1 06/11/2017 15:02:05


2  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

rismo Radical rejeita essas explicações do com- faixa de possibilidades. O resultado dessa sele-
portamento em termos da noção de uma entida- ção é o repertório de comportamento operante
de presumida que antecederia o comportamento do indivíduo. A adequação do comportamento,
e teria o poder mecânico de causá-lo, bem como assim como no nível anterior, é definida a partir
rejeita qualquer explicação internalista/mentalis- das demandas do ambiente (Moore, 2008). Por
ta, uma vez que esse tipo de explicação não per- exemplo, um bebê balbucia uma ampla variedade
mite previsão e controle, que seriam os objetivos de sons, porém, somente os sons próprios da lín-
primordiais de uma ciência. Ademais, embora gua de seus cuidadores terão maior probabilidade
considere a relevância e a contribuição de aspec- de serem recebidos com expressões de reconhe-
tos fisiológicos, a perspectiva behaviorista rejeita cimento/alegria ou com o acesso a consequên-
a concepção tradicional de que variáveis fisioló- cias que satisfaçam as necessidades do bebê ao
gicas exerceriam algum tipo de força interna ca- falar. Assim, ao longo da história de desenvolvi-
paz de causar comportamentos por si só. mento do bebê, os sons da língua de sua comu-
Tendo em vista esse modelo de causalidade, nidade verbal serão fortalecidos e gradualmen-
Moore (2008) aponta que, na proposta do Beha- te se tornarão, em média, mais frequentes do
viorismo Radical, o ambiente seleciona caracte- que os sons que não fazem parte daquela língua
rísticas comportamentais da mesma forma que (Cole & Cole, 2004).
seleciona características morfológicas, segun- Por fim, há o nível de seleção cultural, que tra-
do a noção de evolução pela seleção natural pro- ta da seleção de práticas culturais ao longo da his-
posta por Darwin. Nessa perspectiva, determi- tória de uma cultura. Nesse contexto, há reforça-
nadas características comportamentais são sele- mento social das práticas que são benéficas para
cionadas ao longo do tempo de acordo com sua a cultura, as quais se tornam parte dela. As prá-
adequação ao ambiente. Há três níveis de seleção ticas culturais, assim, são transmitidas e manti-
do comportamento por suas consequências: o fi- das por meio das contingências sociais entrelaça-
logenético, o ontogenético e o cultural (Skinner, das e dos padrões de reforçamento social da cul-
1981). O nível filogenético diz respeito à seleção tura. O resultado desse nível de seleção é o que
de comportamentos inatos ao longo da história se chama de cultura (Glenn, 1991, 2004; Moore,
evolucionária da espécie. A adequação do com- 2008). Exemplos de comportamentos que podem
portamento inato é analisada a partir das con- ser afetados pelo nível de seleção cultural são os
sequências: sucesso diferencial no contato com comportamentos de gênero, ou seja, os compor-
formas específicas de estimulação ambiental e tamentos típicos de meninas/mulheres e de meni-
sucesso reprodutivo. Assim, por exemplo, as bor- nos/homens, que variam de acordo com os costu-
boletas com tom amarelo escuro têm maior van- mes, as regras e os valores de diferentes culturas.
tagem ao pousar nos troncos das árvores de uma Nesse contexto, nas Olimpíadas de 2016 no Brasil,
determinada região porque ficam menos visíveis por exemplo, as atletas brasileiras jogaram vôlei de
aos predadores do que as borboletas de tom mais praia de biquíni, enquanto as egípcias jogaram
claro. Esses indivíduos, portanto, tenderão a dei- de calça comprida e hijab (véu sobre a cabeça), ou
xar mais descendentes, de modo que, na próxima seja, as jogadoras de cada país jogaram com ves-
geração, seu genótipo será mais frequente. Nes- timentas coerentes com os valores/costumes de
se contexto, as borboletas com os genes para o suas respectivas culturas no que se refere à prática
tom amarelo escuro sobreviverão mais naquela da modalidade esportiva vôlei de praia.
região, em média, e, portanto, deixarão mais des- Em conclusão, de acordo com a perspectiva
cendentes. Assim, aos poucos, a população irá se behaviorista radical, o comportamento atual é
tornando mais escura (Baum, 1994/2006). resultante de características genéticas únicas, de
Já o nível ontogenético se refere à seleção uma história única de reforçamento (expe­riência
de comportamentos durante a história de vida de de vida) e das relações do indivíduo com o am-
um organismo, isto é, as consequências de um biente atual e com as práticas culturais da comu-
determinado comportamento afetam a probabi- nidade em que se insere. Assim, considera-se a
lidade futura de sua ocorrência em uma situação possibilidade de causação múltipla, ou seja, de
semelhante, selecionando comportamentos com que um único comportamento possa ser função
características específicas dentro de uma ampla de mais de uma variável e de que uma única va-

FARIAS_Cap_01.indd 2 06/11/2017 15:02:05


Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  3

riável possa afetar mais de um comportamento ANÁLISES FUNCIONAIS


(Marçal, 2010; Skinner, 1953/2003, 1981).
Na perspectiva da Análise do Comportamen- A unidade de análise utilizada para descrever
to, os comportamentos podem ser classificados ba- comportamentos individuais no nível ontogené-
sicamente de acordo com duas categorias: respon- tico é a contingência de reforçamento, que mos-
dentes e operantes. Os comportamentos respon- tra relações funcionais entre o comportamento
dentes (ou reflexos) são aqueles que envolvem operante e o ambiente com o qual o organismo
uma relação organismo-ambiente em que uma interage. Assim, de acordo com Todorov (1989),
resposta (mudança no organismo) é eliciada/ a contingência pode ser definida como uma regra
provocada por um estímulo antecedente (mu- que especifica relações entre eventos ambientais
dança em parte do ambiente). Por exemplo, co- ou entre comportamentos e eventos ambientais.
mida na boca (estímulo) elicia salivação (respos- Na Análise do Comportamento, o conceito de
ta), luz nos olhos (estímulo) elicia a contração da contingência se refere a uma relação de depen-
pupila (resposta), encontrar o namorado (estí- dência que descreve como a probabilidade de um
mulo) por quem se está apaixonada pode eliciar evento pode ser afetada por outros eventos. A re-
respostas emocionais, como sudorese e taquicar- lação funcional substitui a noção tradicional de
dia. O paradigma que representa a contingên- causa e efeito (Catania, 1999; de Souza, 2001).
cia respondente é S → R (de Rose, 2001; Morei- O comportamento operante é definido co-
ra & Medeiros, 2007), enfatizando-se que as res- mo um grupo de respostas de topografias dife-
postas respondentes são controladas por seu(s) rentes que constituem uma classe funcional por
antecedente(s). Entretanto, parte significativa do produzirem uma consequência comum (Glenn,
comportamento animal/humano não é eliciada 1986/2005). Com a utilização do termo “ope-
por estímulos antecedentes, mas, sim, controla- rante”, enfatiza-se que o comportamento opera
da por suas consequências. sobre o ambiente gerando consequências. As
Denomina-se operante o comportamen- contingências de reforço envolvem inter-rela-
to que opera no ambiente produzindo conse- ções decorrentes de pelo menos três aspectos:
quências (modificações no ambiente), as quais, a) a ocasião em que ocorre uma resposta, b) a
por sua vez, afetam a probabilidade de ocor- resposta e c) as consequências por ela produzi-
rência futura do comportamento. Dirigir um das. Segundo Skinner (1953/2003), uma formu-
carro, ler, escrever, falar, solucionar proble- lação adequada da interação entre um organis-
mas matemáticos, namorar ou organizar a ca- mo e o ambiente deve conter pelo menos esses
sa são exemplos de respostas operantes, ou se- três termos, a chamada contingência tríplice, fer-
ja, controladas por suas consequências. Assim, ramenta básica para a realização de análises fun-
os operantes são definidos pelas consequências cionais moleculares. Moreira e Medeiros (2007)
que produzem, e são elas que determinarão se enfatizam que a análise de contingências ou análi-
o comportamento voltará a ocorrer ou se ocor- se funcional consiste na identificação das relações
rerá em maior ou menor frequência. Uma con- entre o indivíduo e o seu mundo, isto é, na obser-
sequência é reforçadora quando mantém ou vação de um comportamento e na compreensão
aumenta a probabilidade de ocorrência da res- de qual tipo de consequência ele produz.
posta que a produziu. Diferentemente, a conse- Quando se trata de condicionamento ope-
quência é punitiva/aversiva quando diminui a rante, a probabilidade de ocorrência de uma
probabilidade de ocorrência da resposta que resposta é influenciada por suas consequências
a antecede. O paradigma que representa a con- (modificações no ambiente). Ao fazer uma aná-
tingência operante é R → C (de Rose, 2001; Mo- lise funcional, é importante identificar que tipo
reira & Medeiros, 2007; Pierce & Cheney, 2004; de relação entre resposta e consequência está em
Skinner, 1953/2003; Todorov, 1982). Destaca-se operação. O reforçamento é definido quando a
que um mesmo comportamento pode produzir probabilidade de ocorrência de uma resposta au-
simultaneamente consequências reforçadoras e menta ou se mantém, o que pode ocorrer devido
aversivas, de modo que múltiplas variá­veis es- à adição de um estímulo reforçador (reforçamen-
tão envolvidas na determinação de um dado to positivo) ou pela retirada de um estímulo aver-
comportamento. sivo/punitivo (reforçamento negativo). Por outro

FARIAS_Cap_01.indd 3 06/11/2017 15:02:05


4  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

lado, quando há punição, a probabilidade de ção reforçadora independe de variáveis motiva-


emissão de uma resposta diminui pela apresen- cionais. Um reforçador condicionado torna-se
tação de um estímulo aversivo/punitivo (puni- generalizado a partir do emparelhamento com
ção positiva) ou pela retirada de um estímulo re- mais de um reforçador primário. Pode-se citar
forçador (punição negativa) (Baum, 1994/2006; como exemplo de reforçador condicionado ge-
Moreira & Medeiros, 2007; Pierce & Cheney, neralizado o dinheiro (Skinner, 1953/2003).
2004; Skinner, 1953/2003; Todorov, 1982). Além Além da classificação dos reforçadores co-
disso, também é possível verificar diminuição da mo incondicionados e condicionados, ressalta-se
frequência de uma resposta por meio do proces- também a diferença entre reforçadores naturais
so de extinção operante, que ocorre quando há e arbitrários. Os reforçadores naturais são con-
uma quebra na contingência, ou seja, o reforço sequências produzidas diretamente por uma res-
anteriormente contingente a uma resposta deixa posta. Por exemplo, uma boa nota é consequên­
de ocorrer (Skinner, 1953/2003). cia natural da resposta de dedicar-se bastante aos
Cabe ressaltar que há diferentes tipos de re- estudos ou um quarto limpo e organizado e a fa-
forçadores. Alguns estímulos, por sua relevância cilidade para encontrar objetos são consequên-
para a sobrevivência da espécie (p. ex., alimento, cias naturais da resposta de arrumar o quarto.
água e sexo para indivíduos privados de acesso Por sua vez, consequências arbitrárias são produ-
a esses estímulos por determinado período), não to indireto do comportamento, como é o caso de
requerem uma história de aprendizagem para estrelinhas, “parabéns” ou presentes dos pais por
adquirirem função reforçadora. A sensibilidade emitir as respostas de estudar ou arrumar o quar-
de nosso comportamento à propriedade refor- to. Destaca-se que, nesse caso, as consequências
çadora desses estímulos é herdada. Trata-se de não são diretamente produzidas pelos comporta-
estímulos reforçadores primários, ou incondicio- mentos descritos.
nados, cujo valor reforçador é determinado filo- De acordo com Kohlenberg e Tsai (1991/2001),
geneticamente, de forma que sua função de for- esses dois tipos de reforçadores diferem em quatro
talecer comportamentos (nas devidas condições aspectos básicos. Ao contrário do que ocorre em
motivacionais) é inata (Baum, 1994/2006; Pierce relação aos reforçadores arbitrários, o reforçamen-
& Cheney, 2004; Tomanari, 2000). to natural seleciona uma ampla classe de respostas,
Já os reforçadores condicionados são estímu- leva em conta o repertório inicial do indivíduo,
los inicialmente neutros que adquirem função beneficia primordialmente a pessoa cujo compor-
reforçadora por meio de um processo de apren- tamento está sendo reforçado e não o agente que
dizagem, o reforçamento condicionado, que se provê o reforço, além de ser mais comum no am-
refere a uma história de associação com um es- biente natural, de forma que favorece a generaliza-
tímulo reforçador já estabelecido (primário ou ção do aprendizado. Contudo, em algumas situa­
condicionado) (Tomanari, 2000). Há, portanto, ções, os reforçadores arbitrários são necessários
reforçadores e punidores adquiridos ou condi- em um momento inicial, até que o organismo en-
cionados ao longo da história pessoal de refor- tre em contato com os reforçadores naturais, espe-
çamento, uma vez que, desde o início da infân- cialmente no caso de repertórios que envolvem alto
cia, as pessoas de nosso ambiente social nos ensi- custo para serem desenvolvidos. Por exemplo, no
nam reforçadores e punidores condicionados, ou caso de uma criança que está aprendendo a ler, es-
seja, ensinam a denominar boas as consequên­ trelinhas e presentes podem ser importantes como
cias que reforçam e as atividades que são reforça- reforçadores intermediários, até que a criança de-
das e, más, as consequências que punem e as ati- senvolva a habilidade de ler e o acesso a novas in-
vidades que são punidas. Vale ressaltar que os re- formações (reforço natural) passe a controlar a res-
forçadores condicionados variam de acordo com posta de ler. Ademais, nem sempre é possível esta-
a época, a história de vida da pessoa e com a cul- belecer uma distinção clara entre os dois na prática
tura em que ela se insere. Trata-se de consequên­ e, frequentemente, um mesmo estímulo pode apre-
cias cujo valor tem origem social, como é o ca- sentar características de ambos os tipos.
so de notas, elogios, medalhas, prêmios e críticas A análise funcional configura-se, portanto, co-
(Baum, 1994/2006; Tomanari, 2000). Existem, mo um instrumento básico de trabalho dos analis-
ainda, os reforçadores generalizados, cuja fun- tas do comportamento. Nesse contexto, o compor-

FARIAS_Cap_01.indd 4 06/11/2017 15:02:05


Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  5

tamento de um organismo individual é a variável Assim sendo, na perspectiva analítico-com-


dependente, e as variáveis independentes seriam portamental, ainda que um comportamento se-
as condições externas das quais seu comporta- ja aparentemente inadequado ou socialmen-
mento é função (Skinner, 1953/2003). O analista te reprovado, ele tem uma função no repertório
do comportamento busca identificar contingên- daquele que o emite e foi selecionado por suas
cias atuais e inferir sobre contingências que ope- consequências. Logo, é papel do terapeuta inves-
raram no passado a partir da observação direta ou tigar em que contingências o comportamento se
de relatos de comportamentos (Meyer, 2001). instalou e se mantém, utilizando, para isso, da-
Na prática clínica, a análise funcional permite dos da história de vida do cliente, das contingên-
a elaboração de hipóteses a respeito da aquisição cias atuais e da relação terapêutica (Delitti, 2001).
e manutenção de repertórios comportamentais, Em síntese, a análise funcional constitui, pa-
possibilita a programação de intervenções visan- ra o analista do comportamento, um instrumento
do ao desenvolvimento de novos repertórios e é fundamental de diagnóstico, intervenção e avalia-
fundamental para o planejamento da manutenção ção do processo terapêutico. Trata-se de um ponto
e generalização para o ambiente natural das mu- de partida para o planejamento e acompanhamen-
danças alcançadas. Verifica-se assim que a análi- to das intervenções. As análises, que são realizadas
se funcional tem papel importante durante todo o basicamente a partir do relato verbal e dos compor-
processo terapêutico (Delitti, 2001; Meyer, 2001). tamentos públicos do cliente observados durante
Complementando, de acordo com Delitti as sessões, podem ser construídas pelo terapeuta e/
(2001), a análise funcional constitui um dos ins- ou em conjunto com o cliente. Ademais, destaca-se
trumentos mais valiosos para a prática clínica, que esse instrumento contribui para a promoção de
uma vez que favorece o levantamento dos da- autoconhecimento, a ampliação do repertório com-
dos necessários para o desenvolvimento do pro- portamental e a ocorrência de mudanças.
cesso terapêutico. A partir dela, é possível desco- A construção de análises funcionais relevantes
brir a função do comportamento, em que con- para o caso clínico se apresenta frequentemente
tingências se instalou e em quais se manteve, como um desafio para os terapeutas, uma vez que
bem como planejar a construção de novos pa- é um processo que envolve dificuldades e obstácu-
drões comportamentais. De modo geral, a aná- los. Em primeiro lugar, é preciso que o profissio-
lise funcional acompanha o terapeuta no início nal tenha clareza sobre qual é a unidade de análi-
do processo, com o levantamento das hipóteses; se que pretende estudar. A determinação de qual
durante o processo, com a observação do com- é o fenômeno a ser analisado depende do obje-
portamento do cliente durante a sessão e de seu tivo, da conveniência e das informações coleta-
relato sobre o que acontece fora dela, o que per- das. Por exemplo, pode-se escolher como uni-
mite estabelecer objetivos terapêuticos e planejar dade de análise uma classe mais ampla, como
o desenvolvimento de novos repertórios; e, no fi- a “depressão”, a qual envolve diversas respostas
nal do processo, com o planejamento da manu- mais específicas e com diferentes topografias,
tenção e generalização das mudanças comporta- ou uma resposta mais específica, como o “relato
mentais alcançadas. autodepreciativo”.
Segundo Cirino (2001), para identificar os Outra possível dificuldade é o fato de que a
motivos pelos quais um indivíduo se comporta fonte de informações do terapeuta é frequente-
da forma como se comporta, é preciso investigar mente restrita ao relato do cliente e ao comporta-
tanto as contingências atuais em vigor como as mento observado durante a sessão. Dessa forma,
contingências históricas. Sugere-se que a história é possível que haja distorções, além de variáveis
está diluída no comportamento atual. Dessa ma- relevantes que o cliente desconheça ou das quais
neira, para que haja uma compreensão ampla de não se lembre, ou seja, variáveis que o terapeuta
um caso, é preciso ir além de uma investigação dificilmente conseguirá acessar. Há diferentes re-
de determinantes de comportamentos atuais es- cursos para lidar com essa limitação da terapia.
pecíficos, mas buscar uma análise molar, isto é, Um exemplo seria convidar pessoas relevantes,
uma análise que inclua aspectos ligados à história com o consentimento do cliente, para participar
de vida e ao desenvolvimento de padrões com- do processo e/ou observar o comportamento do
portamentais (Marçal, 2005). cliente em ambientes diferentes do terapêutico.

FARIAS_Cap_01.indd 5 06/11/2017 15:02:05


6  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

Além dos obstáculos listados, outro ponto es- quências (A: R→C). Além disso, podem ser acres-
sencial é que as análises funcionais realizadas no centados efeitos (emocionais e/ou de frequência
contexto clínico envolvem operantes complexos, da resposta) e o processo comportamental en-
isto é, diferentemente das análises lineares apren- volvido na contingência analisada (reforçamen-
didas quando se está iniciando o estudo da Aná- to positivo, reforçamento negativo, punição po-
lise do Comportamento, na prática, trabalha-se sitiva, punição negativa ou extinção). Os passos
com situações em que múltiplas contingências para a composição de análises funcionais mole-
estão em operação ao mesmo tempo, bem como culares são os seguintes:
com cenários em que contingências contraditórias
(envolvendo reforçadores e estimulação aversiva) 1º Passo: Identificar a resposta: atividade do or-
controlam o mesmo comportamento. Nesse con- ganismo, que envolve eventos públicos e priva-
texto, há que se considerar as interações entre di- dos. Em outras palavras, o terapeuta identifica-
ferentes comportamentos/padrões comportamen- rá desde ações publicamente observáveis até res-
tais e suas variáveis de controle, de forma que se- postas privadas/encobertas, como pensamentos,
jam contemplados eventos públicos e privados, sentimentos e emoções.
variáveis atuais e históricas. O clínico utiliza-se
1. Escolher respostas relevantes ao caso, conside-
de diferentes recursos, como fantasias, desenhos,
rando a queixa do cliente, as demandas iden-
sonhos, músicas, poemas, diários, filmes e cartas,
tificadas pelo terapeuta e os objetivos tera-
como forma de acessar os elementos fundamen-
pêuticos. Ao longo do processo terapêutico,
tais à composição das análises funcionais1.
os clientes apresentam uma infinidade de re-
Este capítulo tem como objetivo apresentar,
latos com diferentes conteúdos. Entretanto,
de forma didática, o passo a passo para a rea­
lização de análises funcionais no contexto clí- nem tudo o que é falado tem relação direta
nico. Serão abordados dois modelos de análises com as demandas a serem trabalhadas na te-
funcionais, quais sejam: análises funcionais mo- rapia. Assim, entre uma ampla faixa de pos-
leculares (microanálises) e análises funcionais sibilidades, é necessário que o terapeuta sele-
molares (macroanálises). Destaca-se que as in- cione as respostas de maior valor terapêutico,
formações reunidas neste capítulo foram siste- considerando-se as características idiossin-
matizadas a partir de conteúdos, slides de aulas cráticas de cada cliente.
e outros recursos de ensino de diversos professo- 2. Evitar respostas negativas. Ao escolher a res-
res do Instituto Brasiliense de Análise do Com- posta para análise, o terapeuta deve lembrar-se
portamento (IBAC). Por isso, agradecemos enor- de que não é possível analisar “não comporta-
memente aos professores João Vicente de S. Mar- mentos”, de modo que é importante trabalhar
çal, Andréa Dutra, Ana Karina C. R. de-Farias, com o que o cliente faz e não com o que ele dei-
Helen Tourino, Marianna Braga, Carlos Augus- xa de fazer. Afinal, é inviável identificar os pro-
to de Medeiros e Luciana Verneque, pelas contri- cessos comportamentais envolvidos quando se
buições, em aulas e discussões, que nos permiti- trata da não ocorrência de uma resposta, isto é,
ram organizar este capítulo. identificar, de acordo com a consequência pro-
duzida, se uma “não resposta” aumentou ou di-
minuiu de frequência. Por exemplo, no caso de
Análises funcionais moleculares
uma criança que não segue uma determinação
(microanálises) de seu pai de não correr, seria mais adequado
A análise funcional molecular envolve a análise analisar o que ela faz, ou seja, “ignora a orienta-
de contingências pontuais (moleculares) impor- ção e corre”, do que escolher como unidade de
tantes para a compreensão de comportamentos análise “não obedece”.
específicos em contextos específicos. A sua com- 3. Evitar respostas que não estão sob controle ope-
posição é a base para a construção de análises rante, como morrer, cair e esbarrar em objetos
mais amplas, as chamadas análises molares. O re- acidentalmente, sentir-se angustiado, taqui-
curso básico para a composição de análises mo- cardia, ansiedade, sudorese, uma vez que essas
leculares é a tríplice contingência, que envolve a respostas não estão sob controle de suas conse-
identificação de antecedentes, respostas e conse- quências. Respostas respondentes podem ser

FARIAS_Cap_01.indd 6 06/11/2017 15:02:05


Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  7

incluídas nas análises funcionais; contudo, é dens e valores) também podem ser especificadas
importante especificar que são respondentes, entre os antecedentes, como SDs, OEs ou estímulos
ou seja, que estão sob controle dos anteceden- alteradores de função de outros estímulos (FAS).2
tes e não das consequências. Destaca-se tam-
bém que, quando incluídas na análise funcio- 3º Passo: Identificar consequências: estímulos
nal molecular, as respostas respondentes po- no ambiente produzidos por uma resposta e que
dem ser especificadas em uma contingência alteram a probabilidade de ocorrência dessa res-
tríplice de duas maneiras diferentes: posta no futuro, ou seja, trata-se de uma variável
a. logo depois do antecedente e, nesse caso, independente. Destaca-se que, nesse caso, a mu-
trata-se de uma resposta respondente eli- dança é no ambiente. Podem-se especificar con-
ciada diretamente pelo estímulo que a an- sequências em curto, médio e longo prazo.
tecede. Por exemplo, entrada do chefe au-
toritário na sala (estímulo antecedente) → 4º Passo: Identificar processos: para cada con-
ansiedade (resposta respondente). Res- sequência, deve-se especificar qual é a contin-
postas operantes podem ocorrer conco- gência envolvida a partir da relação entre a res-
mitantemente, evocadas pelo mesmo es- posta e a consequência produzida, ou seja, se o
tímulo antecedente; ou processo caracteriza contingência de reforça-
b. como efeito de uma contingência operan- mento positivo (R+), reforçamento negativo (R-),
te, de modo que uma resposta operante punição positiva (P+), punição negativa (P-) ou
produz uma consequência, e o tipo de re- extinção. O Quadro 1.1 sintetiza os processos.
lação que se estabelece nessa contingên- Vale ressaltar, como foi mencionado anterior-
cia operante produz um efeito emocio- mente, que uma mesma resposta pode ter dife-
nal, ou seja, uma resposta respondente. rentes antecedentes e produzir várias consequên­
Por exemplo, estudar a semana inteira pa- cias, com frequência envolvendo processos dife-
ra uma prova (resposta operante) → nota rentes e até contraditórios entre si.
baixa (consequência) – efeito emocional:
frustração (resposta respondente). 5º Passo: Identificar possíveis efeitos: são sub-
produtos de contingências operantes. De acordo
2º Passo: Identificar antecedentes: ocasião na com Baum (1994/2006), são os efeitos que defi-
qual o comportamento ocorre. Dividem-se basica- nem comportamentos bem e malsucedidos, de
mente em duas categorias: estímulos discriminati- modo que uma atividade é tida como bem-su-
vos (SDs) e operações estabelecedoras (OEs). Estí- cedida quando é reforçada, enquanto atividades
mulos discriminativos são estímulos na presença malsucedidas são aquelas menos reforçadas ou
dos quais uma resposta é reforçada. Na presen- punidas. Assim, os efeitos são colaterais às con-
ça do namorado (SD), o relato queixoso de dor da tingências, ou seja, são produtos da contingência
namorada (resposta) é reforçado positivamente inteira e não determinam diretamente a frequên-
com atenção e carinho (consequência). Opera- cia do comportamento no futuro. Trata-se de va-
ções estabelecedoras são eventos antecedentes que
riáveis dependentes, que podem ser de dois tipos:
podem alterar momentaneamente a efetividade
reforçadora de um estímulo e evocar os compor- 1. Frequência: tendência da frequência da res-
tamentos que o produzem (Michael, 1982, 1993; posta sob análise em aumentar ou em dimi-
Miguel, 2000). Os exemplos mais comuns são pri- nuir após uma determinada consequência.
vações, saciações e contato com estimulação aver- Respostas reforçadas tendem a ocorrer com
siva. No contexto da análise sobre os namorados, mais frequência, enquanto as punidas ou não
poder-se-ia classificar a dor como uma estimu- consequenciadas (em extinção) tendem a
lação aversiva que funciona como operação esta- ocorrer com menos frequência.
belecedora ao alterar momentaneamente o valor 2. Emocional: sentimentos, sensações e emo-
reforçador da atenção e do carinho providos pe- ções produzidos pelo contato com as con-
lo namorado, alterando, também, a probabilidade sequências. Trata-se de mudanças no com-
de respostas que produzam atenção e carinho. Va- portamento emocional do próprio indiví-
le ressaltar que regras (instruções, conselhos, or- duo cujas respostas estão sendo analisadas.

FARIAS_Cap_01.indd 7 07/12/2017 14:39:30


8  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

Quadro 1.1 Tipos de processos de reforçamento


Tipo de estímulo Reforçador Punidor (estímulo aversivo)
Tipo de processo
Positivo (acréscimo de estímulo) Reforçamento Punição positiva ↓
positivo ↑
Negativo (retirada de estímulo) Punição negativa ↓ Reforçamento negativo ↑
↑, aumento da frequência da resposta em análise; ↓, diminuição da frequência da resposta em análise.

Baum (1994/2006) destaca que as pessoas Vamos treinar?


se sentem mal quando seus comportamen-
Patrícia (nome fictício) chegou à terapia com a
tos são punidos. Por sua vez, em situações
queixa de que ficava triste de repente, chorava com
nas quais seus comportamentos são refor- frequência sem saber o motivo. Ela veio de outra ci-
çados, as pessoas experimentam sensações dade para fazer graduação em Brasília. Segundo ela,
agradáveis. De acordo com o autor, situa- a situação piorou muito depois que se mudou pa-
ções que envolvem contingências de refor- ra a nova cidade. Relatou sentir-se insegura e im-
çamento positivo geram reações emocio- potente em relação a tudo: namorado, família, ami-
nais de bem-estar, como alegria, prazer, feli- gos e faculdade. Atribuía a queixa à sua insegurança
cidade, confiança e orgulho. Contingências e incompetência para resolver os próprios proble-
de reforçamento negativo costumam pro- mas. Seus objetivos na terapia eram: aprender a li-
duzir como efeito a sensação de alívio. Por dar melhor com os próprios problemas e melhorar
outro lado, contextos que envolvem puni- a relação com a mãe e o namorado.
ção positiva geram reações emocionais de- Embora inicialmente Patrícia não identifi-
sagradáveis, como medo, ansiedade, pavor, casse qualquer relação entre as mudanças de hu-
vergonha e culpa. Já o cancelamento de re- mor e variáveis ambientais presentes no seu dia
forçadores, ou seja, a punição negativa, pro- a dia, ao longo das primeiras sessões, observou-
duz sentimentos de frustração, decepção e -se que suas relações sociais mais relevantes eram
desapontamento. Destaca-se, portanto, nes- pouco reforçadoras e receptivas às suas tentativas
de interação, além de serem permeadas por crí-
se contexto, que sentimentos são subprodu-
ticas. Assim, quando surgiam conflitos ou ques-
tos das contingências e não causas do com-
tões nas relações com a mãe e o namorado, Patrí-
portamento.
cia tomava a iniciativa de falar sobre o assunto,
Vejamos alguns exemplos no Quadro 1.2. expressar suas opiniões e propor soluções. O na-

Quadro 1.2 Exemplos de consequências versus efeitos


Consequências Efeito de frequência Efeito emocional
Atenção (quando chora) Continuar chorando com -
frequência
Castigo sem videogame (quando desobedece ao pai) Desobedecer ao pai com Ficar chateado
menos frequência
Perder acesso a diversos reforçadores (ao terminar o namoro) - Entrar em “depressão”
Crítica severa da professora (ao fazer uma pergunta) Nunca mais perguntar em Sentir-se envergonhado
sala de aula

Aumento do prazo de entrega de um trabalho (ao comentar - Sensação de alívio


com o chefe que estava doente)

FARIAS_Cap_01.indd 8 06/11/2017 15:02:05


Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  9

morado e os familiares invalidavam suas queixas, Patrícia contou que sua relação amorosa era
criticavam sua conduta ou simplesmente a deixa- muito monótona. No fim de semana, ela geral-
vam sem resposta. Nesse contexto, fazia sentido mente ficava em casa com o namorado. Depois
que Patrícia se sentisse triste, insegura e impo- de refletir na terapia sobre o que gostaria de fa-
tente, efeitos da contingência de controle aversi- zer com o namorado, a cliente tomou uma ini-
vo. Então, a queixa poderia ser operacionalizada ciativa. Em um sábado, ela o convidou para fazer
como mostrado no Quadro 1.3. um programa diferente, e ele disse que preferia
No decorrer das sessões, Patrícia relatou ficar em casa, pois estava cansado. Ela ficou mui-
vários conflitos no relacionamento amoroso. to chateada (Quadro 1.5).
Quando ela conversava com o namorado sobre o Na terapia, Patrícia relatou que a monotonia
que a incomodava, ele mudava de assunto, dizia também era característica da vida sexual do casal.
que conversar sobre a relação “não levava a na- As relações sexuais sempre aconteciam do mes-
da” e que preferia “deixar as coisas acontecerem” mo jeito: na hora de dormir, sempre no mesmo
(Quadro 1.4). local, por iniciativa do namorado. Novamente,

Quadro 1.3 Operacionalização da queixa inicial de Patrícia


Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos

Problemas/conflitos Conversar, Críticas/represálias P+ Tristeza


nos relacionamentos aproximar-se,
Os problemas continuam P+ Insegurança
interpessoais expressar
sentimentos Pouco interesse e pouca Extinção Sensação de impotência
e opiniões atenção das pessoas
P+, punição positiva.

Quadro 1.4 Análise funcional das tentativas de Patrícia de resolver as dificuldades com o namorado no início
do processo terapêutico
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Conflitos no Patrícia conversa Ele muda de assunto, diz Extinção Tristeza, frustração,
relacionamento com o namorado que prefere deixar as coisas insegurança.
amoroso sobre o que a acontecerem
incomoda
Presença do Repetição de problemas P+
namorado ou ocorrência de
novos problemas no
relacionamento
P+, punição positiva.

Quadro 1.5 Análise funcional da resposta de Patrícia de tomar iniciativa na relação com o namorado após
reflexões no processo terapêutico a respeito de outras possíveis formas de lidar com os aspectos que a
incomodavam no relacionamento
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos

Monotonia na relação com o namorado Patrícia toma Ele disse que Extinção Patrícia ficou
a iniciativa preferia ficar em chateada
Discussões em terapia de convidar o casa, pois estava
namorado para ir cansado
Fim de semana em casa com o ao cinema
namorado

FARIAS_Cap_01.indd 9 18/01/2018 11:33:19


10  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

no contexto terapêutico, foram discutidas as pos- Ainda no contexto dos relacionamentos de


sibilidades que a cliente tinha para melhorar o re- amizade, uma das queixas de Patrícia era a
lacionamento sexual com o namorado, com o ob- de que, muitas vezes, sentia-se inadequada e de-
jetivo de que ela discriminasse o que gostaria que sinteressante. Quando saía com amigos, quando
fosse diferente. Assim, no aniversário de namoro, entrava em contato com outras pessoas, falava
Patrícia comprou uma lingerie nova. Contou pa- apenas o necessário, evitava dar sua opinião ou
ra o namorado e pediu que ele preparasse algo di- iniciar um assunto. Relatava que tinha medo da
ferente para a noite. Ele respondeu que a lingerie reação das pessoas, não queria que ninguém pen-
servia apenas para que a mulher se sentisse bem, sasse mal dela ou a criticasse. Além disso, a partir
mas não fazia diferença para o homem. Não pre- das discussões com a terapeuta, discriminou que
parou nada de especial. Na ocasião, Patrícia rela- seu repertório de habilidades sociais era restrito,
tou que se sentiu rejeitada por ele e muito triste uma vez que tinha dificuldade em iniciar e de-
(Quadro 1.6). senvolver conversas, apresentando pouca varia-
A cliente apresentou também demandas rela- bilidade em relação aos assuntos sobre os quais
cionadas às suas relações de amizade. Afirmou ser conseguia conversar. Dessa forma, ela se sentia
conhecida pelos amigos como uma pessoa pres- extremamente ansiosa em situações de contato
tativa. Geralmente, atendia a qualquer pedido social com amigos (Quadro 1.8).
que lhe fizessem. Ela disse para a terapeuta que
não gostava de entrar em conflito com ninguém e Algumas dificuldades comuns...
não queria ser vista como egoísta. Descreveu uma
situação em que sua colega de curso telefonou pe- 1. Realizar análises lineares, em que uma res-
dindo ajuda para um trabalho de última hora. posta é antecedida por apenas um estímulo
Os pais de Patrícia estavam lhe fazendo uma visi- e produz apenas uma consequência, mesmo
ta em Brasília e passariam o fim de semana em sua quando há outros dados já disponíveis.
casa. Ademais, ela também tinha o próprio traba- Veja o exemplo a seguir, considerando a
lho da disciplina para fazer. Por isso, explicou a si- resposta de Sheila como objeto de sua análise:
tuação e respondeu que não poderia ajudar a ami-
A mãe de Sheila e Betinho disse que iria ao mer-
ga daquela vez, pois não teria tempo. No dia se-
cado e demoraria a voltar. Deixou a roupa de ca-
guinte, a colega a desqualificou na frente da turma
ma que havia acabado de passar em cima da me-
toda, dizendo que Patrícia era egoísta e só pensa- sa. Betinho teve uma ideia brilhante: chamou
va em si mesma. Entretanto, apesar do desconfor- Sheila para pegar a roupa de cama e usar pa-
to por ter sido publicamente desqualificada pela ra deslizarem no corrimão da escada, entre um
amiga, a cliente discriminou em terapia que, à me- andar e outro, já que a mãe não estava em casa.
dida que negou o pedido, teve tempo para pas­sear Sheila aceitou o convite, e os dois brincaram por
com sua família e para se dedicar à conclusão de horas. Quando a mãe voltou, deu uma bronca
seu trabalho com tranquilidade (Quadro 1.7).

Quadro 1.6 Análise funcional da resposta de Patrícia de tomar iniciativa na relação sexual com o namorado
após reflexões no processo terapêutico a respeito de possíveis formas de lidar com os aspectos que a
incomodavam
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Monotonia na vida sexual Patrícia comprou uma Ele respondeu que P+ Patrícia se sentiu
do casal roupa íntima nova e lingerie é para que a triste e rejeitada
pediu que o namorado mulher se sinta bem, pelo namorado
Discussões em terapia preparasse uma noite mas não faz diferença
diferente para os dois para o homem
Data comemorativa do
namoro Ele não preparou nada Extinção
especial
P+, punição positiva.

FARIAS_Cap_01.indd 10 06/11/2017 15:02:05


Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  11

Quadro 1.7 Análise funcional das respostas de Patrícia de atender a todos os pedidos que lhe fazem versus
dizer “não” ao pedido de uma colega
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Pedidos de qualquer Patrícia atende aos Evita conflitos, críticas R- Satisfação pelo
pessoa pedidos (evita dizer reconhecimento e
“não”) É considerada por todos uma R+ autocobrança para
Regra de que sempre pessoa prestativa corresponder às
se deve ajudar os Sobrecarga P+ expectativas
outros para ser uma
pessoa boa Cansaço/somatizações
Colega telefona Patrícia explica a A colega a desqualifica na P+ Vergonha e culpa
pedindo ajuda de situação para a colega frente da turma, diz que ela
última hora e diz que, dessa vez, é egoísta e só pensa em si
não poderá ajudá-la, mesma
Visita dos familiares mesmo se sentindo
desconfortável com Patrícia tem tempo para R+ Alegria com o contato
Trabalho da faculdade o fato de negar um passear com a família e para com a família
para fazer pedido concluir o seu trabalho com
tranquilidade
R-, reforçamento negativo; R+, reforçamento positivo; P+, punição positiva.

Quadro 1.8 Análise funcional das respostas de Patrícia em situações sociais


Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Situações sociais Patrícia fala pouco, Evita críticas e que as pessoas a R- Alívio
com amigos somente o necessário julguem inadequada

(Respondentes de Perde oportunidades de P- Insegurança e


ansiedade: taquicardia, aprofundamento/ fortalecimento solidão
sudorese e rubor na face) das relações de amizade

R-, reforçamento negativo; P-, punição negativa.

neles e mandou Sheila lavar e passar novamente consequência e efeito são aspectos diferen-
a roupa de cama. Betinho continuou brincando. tes. A consequência se refere a um estímulo
Um exemplo de análise linear é apresen- do ambiente que é produzido pela resposta
tado no Quadro 1.9. e altera diretamente a sua probabilidade fu-
Veja, no Quadro 1.10, como a análise fica tura de ocorrência, enquanto o efeito é pro-
mais completa da seguinte maneira. duto de toda a contingência, de modo que
variará de acordo com a consequência pro-
2. Confundir consequência e efeito: como já duzida.
se comentou anteriormente neste capítulo,

Quadro 1.9 Exemplo de análise funcional linear


Antecedentes Respostas Consequências Processos
Convite de Betinho para brincar com a Sheila aceita o Mãe dá bronca ao chegar em casa P+
roupa de cama limpa convite e brinca
com o irmão
P+, punição positiva.

FARIAS_Cap_01.indd 11 18/01/2018 15:42:41


12  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

Quadro 1.10 Exemplo de análise funcional mais completa, se comparada à do quadro anterior
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Roupa de cama limpa Sheila aceita o Diversão e brincadeira com o irmão R+ Alegria
disponível convite e brinca
com o irmão Mãe dá bronca ao chegar em casa P+ Tristeza, raiva e
Ausência da mãe em frustração
casa Mãe manda Sheila lavar e passar a P+ Sente-se
roupa de cama injustiçada
Convite de Betinho
para brincar com a Betinho continua brincando, P+
roupa de cama limpa enquanto ela lava roupa

R+, reforçamento positivo; P+, punição positiva.

Observe os exemplos a seguir: lece a resposta que a produziu, não é identifi-


Antes de sair para o trabalho, o pai de Luísa fez
cada. Veja o exemplo no Quadro 1.11.
uma graça, lhe deu um abraço e um beijo, des- A análise da contingência ficaria correta
pediu-se e foi cumprir seus compromissos pro- conforme consta no Quadro 1.12.
fissionais. A mãe cobrou que ela terminasse de Veja que os efeitos seriam diferentes se a
se arrumar logo para que pudesse deixá-la na reação da mãe de Luísa (consequência) fos-
escola sem atraso. No caminho, Luísa disse à se outra:
sua mãe: “Mamãe, eu te amo muito, muito, mas Antes de sair para o trabalho, o pai de Luísa fez
amo mais o meu pai”. A mãe sorriu e respon- uma graça, lhe deu um abraço e um beijo, despe-
deu: “Não tem problema, minha filha, na vida é diu-se e foi cumprir seus compromissos profis-
assim mesmo: sempre gostamos mais de umas sionais. A mãe cobrou que ela terminasse de se
pessoas do que de outras, temos mais afinida- arrumar logo para que pudesse deixá-la na esco-
de com algumas pessoas do que com outras. Faz la sem atraso. No caminho, Luísa disse à sua mãe:
sentido que você se sinta assim em relação ao “Mamãe, eu te amo muito, muito, mas amo mais
seu pai. Ele é muito carinhoso, não é? A mamãe o meu pai”. A mãe chora, muda o tom de voz e
te ama muito, muito, também!”. Luísa seguiu sa- responde: “Como assim você ama mais o seu pai?
tisfeita para a escola. Sua ingrata! Faço tudo por você, e é assim que
você reconhece? Seu pai não está aqui para levar
Frequentemente, observam-se análises você à escola. Quem foi que fez o seu café da ma-
em que os efeitos são especificados no lugar nhã? Isso não é coisa que se diga a uma mãe! Es-
da consequência, de forma que a análise fun- tou muito chateada com você”. Luíza passou o dia
cional fica incompleta, uma vez que a verda- triste, culpando-se por ter falado algo tão inade-
deira consequência, que enfraquece ou forta- quado à sua mãe (Quadro 1.13).

Quadro 1.11 Exemplo de análise funcional em que a consequência não é identificada


Antecedentes Respostas Consequências Processos

Pai faz carinho antes de ir Luísa expressa sentimentos: Alegria, satisfação e R+ (Cuidado: o efeito pode
para o trabalho “Mamãe, eu te amo muito, tranquilidade. (Observe dar pistas sobre o processo
muito, mas amo mais o meu que esse é o efeito e não envolvido, mas é necessário
Mãe cobra que se arrume pai”. a consequência!) identificar a relação entre a
logo para não se atrasar resposta e a consequência para
que se possa determiná-lo)
Caminhada com a mãe
para a escola
R+, reforçamento positivo.

FARIAS_Cap_01.indd 12 18/01/2018 11:36:23


Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  13

Quadro 1.12 Exemplo de análise funcional em que consequência e efeitos são identificados
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Pai faz carinho antes de ir Luísa expressa Mãe acolhe, dá R+ Alegria, satisfação e
para o trabalho sentimentos: “Mamãe, eu atenção, valida os tranquilidade
te amo muito, muito, mas sentimentos da filha
Mãe cobra que se arrume amo mais o meu pai”
logo para não se atrasar

Caminhada com a mãe


para a escola
R+, reforçamento positivo.

Quadro 1.13 Exemplo de análise funcional em que os efeitos mudam de acordo com mudanças nas
consequências
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Pai faz carinho antes de ir para Luísa expressa Mãe critica, invalida P+ Sentimentos de
o trabalho sentimentos: “Mamãe, eu e demonstra culpa, tristeza e
te amo muito, muito, mas chateação inadequação
Mãe cobra que se arrume logo amo mais o meu pai”
para não se atrasar

Caminhada com a mãe para a


escola
P+, punição positiva.

3. Identificar uma cadeia de respostas: frequen- ra, sim, ela teria de lhe dar banho, pois esta-
temente, o relato do cliente pode ser des- va “mijada”. Muito contrariada, a professora foi
membrado em mais de uma análise molecu- dar banho em Duda.
lar, de modo a caracterizar uma cadeia. Nem Observe que a situação descrita envolve
sempre eventos específicos podem ser des- uma cadeia de respostas, de forma que uma
critos por meio de uma única análise mo- análise mais completa será obtida a par-
lecular. tir da identificação das respostas separada-
Veja o exemplo: mente com a especificação dos antecedentes
específicos de cada uma delas. Nesse caso, é
Duda estava na creche. Viu o amigo tomar ba- interessante salientar que a consequência de
nho mais cedo, em horário próximo ao do lan- uma resposta assume, depois, função de es-
che (pois ele tinha uma consulta médica), e pe- tímulo antecedente para a resposta seguinte
diu para a professora para tomar banho tam- (Quadro 1.14).
bém. A professora explicou a situação e disse
que não seria possível que ela tomasse banho 4. Especificar respostas como antecedentes e/ou
naquele momento, pois era a hora do lanche. consequências: é importante ressaltar que,
Duda, então, derramou suco na roupa e dis- mesmo que se identifique no relato do clien-
se à professora que agora precisaria de um ba- te uma cadeia ou sequência de respostas, em
nho, pois estava suja de suco. A professora dis- última instância, os antecedentes e os conse-
se que não lhe daria banho, pois era a hora do quentes são estímulos do ambiente. Portan-
lanche, e que Duda havia derramado suco na to, respostas do próprio indivíduo em aná-
roupa de propósito. Então, Duda se levantou, lise devem ser evitadas ao se especificarem
fez xixi na roupa e disse à professora que ago- antecedentes e consequentes.

FARIAS_Cap_01.indd 13 06/11/2017 15:02:06


14  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

Quadro 1.14 Exemplo de análise funcional de uma cadeia de respostas


Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Na creche, amigo toma Duda pede à professora A professora recusa, Extinção Frustração, raiva e
banho em horário para tomar banho explicando que aquele era revolta
diferente devido à também o horário do lanche
situação especial

Hora do lanche
Recusa da professora Duda derrama suco na A professora recusa, Extinção Frustração, raiva e
roupa e refaz pedido para explicando que aquele era revolta
tomar banho o horário do lanche
Recusa da professora Duda faz xixi na roupa e A professora atende ao R+ Satisfação
refaz pedido pedido e dá banho nela
R+, reforçamento positivo.

Por exemplo, Ricardo é um jovem mui- 5. Especificar apenas respostas respondentes em


to autoexigente e bem-sucedido profissional- uma análise molecular operante: quando a
mente. Desde pequeno, sempre teve facilidade queixa do cliente envolve comportamentos
para aprender os conteúdos das disciplinas es- respondentes, alguns terapeutas costumam
colares. Graduou-se cedo e passou em diver- enfocar apenas as respostas respondentes
sos concursos públicos. No trabalho, execu- em suas análises moleculares e é comum que
identifiquem antecedentes e consequências,
ta bem as atividades de sua responsabilidade.
mas negligenciem a resposta operante que se
Costuma conversar sobre suas conquistas com
relaciona às consequências produzidas. Faz-
os colegas de trabalho e é bastante admirado
-se relevante destacar que respostas respon-
em seu contexto profissional (Quadro 1.15). dentes são controladas pelo estímulo antece-
Na descrição anterior, não fica claro o an- dente e não por consequências. Veja o exem-
tecedente, o que pode levar o terapeuta a ter plo a seguir:
dificuldade de identificá-lo. Nesse contexto,
enfatiza-se a importância de que o profissio- Eduardo tem 31 anos, é casado e tem uma filha.
nal desenvolva o repertório de elaborar hipó- Ele procurou terapia com a queixa de que está
teses e fazer perguntas que favoreçam a com- tendo crises de pânico e não consegue mais tra-
posição de todos os termos da contingência balhar. Foi ao médico e fez diversos exames, mas
nada foi descoberto. Conclusão: o problema não
descrita. No exemplo citado, tanto executar
é físico. Relatou que está afastado do trabalho,
bem as atividades quanto conversar com os devido a uma licença médica, e tem um mês pa-
colegas sobre suas conquistas são respostas ra ficar bom e voltar a trabalhar ou há risco de
de Ricardo e devem ser analisadas como tais, demissão. As crises de Eduardo são caracteri-
conforme o modelo no Quadro 1.16. zadas por choro, suor frio, desespero, angústia,

Quadro 1.15 Exemplo de análise funcional em que uma resposta do próprio indivíduo em análise é
especificada como antecedente
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Executa bem as atividades de sua Ricardo conversa Admiração dos R+ Orgulho e
responsabilidade sobre suas colegas em seu satisfação
(Cuidado: essa também é uma resposta conquistas com os contexto de
de Ricardo e não um antecedente) colegas de trabalho trabalho
R+, reforçamento positivo.

FARIAS_Cap_01.indd 14 06/11/2017 15:02:06


Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  15

Quadro 1.16 Exemplo de análise funcional em que são especificadas variáveis ambientais como
consequências e antecedentes
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Demandas de trabalho Ricardo executa bem Sucesso/ reconhecimento R+ Orgulho e
Reuniões com colegas de as atividades de sua profissional satisfação
trabalho responsabilidade
Papel de destaque na equipe R+
Regra: “Faça tudo bem Ricardo conversa
feito ou é melhor nem sobre suas conquistas
fazer” com os colegas de Admiração dos colegas em R+
trabalho seu contexto de trabalho
R+, reforçamento positivo.

coração acelerado e sensação de morte iminen- regado o orçamento da família. Antes das crises,
te. De início, as crises aconteciam no trabalho costumava encontrar os pais apenas uma vez nos
e na faculdade. Nessas situações, pegava o car- fins de semana. Atualmente, eles têm se encon-
ro e ia para casa. A primeira crise foi na faculda- trado todos os dias. Ademais, disse que os pais
de durante uma aula. Simplesmente sentiu o co- sempre foram amorosos, mas agora há mais con-
ração parar, teve uma sensação forte de medo e tato físico, cuidado, carinho, beijos e abraços.
de que sua alma estava saindo do corpo. Eduardo A família está mais unida. Até seus irmãos estão
se levantou e foi embora. Outra crise ocorreu em mais próximos. Contudo, o cliente destaca a to-
casa, depois de uma discussão com a esposa. Se- do momento que as crises estão roubando seu di-
gundo ele, quando discutem, ele a deixa ficar fa- nheiro, sua saúde e seu trabalho.
lando e não responde, o que a irrita muito. Afir-
Quando se negligenciam as respostas ope-
mou que a esposa precisa entender que ele está
rantes, a análise fica como no Quadro 1.17.
passando por um momento difícil, em que se es-
quece das coisas e tem muito sono. Diante das Observe que as respostas descritas na
crises, sua mãe chora e seu pai tenta ajudar. O pai análise anterior envolvem apenas eventos
está muito mais próximo de Eduardo, o acom- privados, de modo que não afetam direta-
panha durante as crises e o acalma, sempre mui- mente o ambiente, ou seja, não produzem
to atencioso. O cliente destaca que as crises es- consequências. Uma análise completa deve
tão afetando a família: a esposa está mais preocu- incluir a descrição das respostas operantes
pada, atenciosa e amorosa, mas está triste; a mãe que produzem as modificações ambientais
chora muito; a filha está constantemente em es- descritas no relato. Frequentemente, os clien-
tado de alerta. Exames e consultas têm sobrecar- tes podem apresentar dificuldade de descre-

Quadro 1.17 Exemplo de análise molecular operante em que são especificadas apenas respostas respondentes
Antecedentes Respostas Consequências Processos
Demandas/cobranças Crises de pânico Atenção, carinho e proximidade da família R+
no trabalho/na (ansiedade,
faculdade taquicardia e sensação Licença médica que justifica afastamento do trabalho R-
de morte iminente) e da faculdade
Conflitos com a Evita conflitos com a esposa P+
esposa
Familiares demonstram ansiedade e preocupação P-
Gastos financeiros com exames e consultas P+
Emprego ameaçado P+
R+, reforçamento positivo; R-, reforçamento negativo; P+, punição positiva; P-, punição negativa.

FARIAS_Cap_01.indd 15 06/11/2017 15:02:06


16  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

ver essas respostas. Nesse caso, é importante que sua irmã Claudete fazia um escândalo, pa-
que o terapeuta seja capaz de elaborar hipó- recia que estava morrendo, talvez na tentativa
teses e estratégias de intervenções que favo- de compadecer a mãe e amenizar a intensidade
reçam a descrição da contingência completa, das palmadas, o que deixava Amélia muito as-
envolvendo respostas respondentes e operan- sustada. Hoje, já adulta, ela se ressente de tudo
tes. No exemplo de Eduardo, quando a tera- o que perdeu durante a infância por ter tido me-
peuta perguntou o que ele fazia quando a cri- do de enfrentar a mãe e sair para brincar, como
se vinha, ele disse que “dava um jeito” de vol- os irmãos faziam dia após dia, apesar da surra
tar para casa, ficava agitado, andava para lá da mãe. Anos depois, casou-se com um mari-
do autoritário e continua abrindo mão de fazer
e para cá e dizia que estava se sentindo mal.
coisas de que gosta, como viajar e sair com ami-
Veja o exemplo no Quadro 1.18. gos, com receio da reação dele (Quadro 1.19).
6. Misturar aspectos históricos com os anteceden- Nesse caso, a realização de duas análises é
tes específicos da análise molecular: como foi mais adequada, sendo uma referente à situa-
dito anteriormente, as análises moleculares ção vivida no passado, e outra relativa ao com-
envolvem antecedentes pontuais para respos- portamento no presente. Destaca-se que o an-
tas específicas. Embora a história de vida se- tecedente histórico descrito na análise anterior
ja essencial para a compreensão do compor- não é válido para a resposta atual analisada,
tamento atual do indivíduo, na contingên- pois se trata de uma descrição de um compo-
cia tríplice não há um espaço explícito para o nente da história de vida de Amélia, mas não
papel desempenhado por ela (Meyer, 2001). do evento ambiental específico que é ocasião
É possível fazer análises moleculares de situa- para sua resposta atual de recusar convites.
ções históricas. Entretanto, a relação entre as- Observe como poderíamos compor a contin-
pectos históricos e comportamentos atuais só gência histórica e a atual no Quadro 1.20.
será estabelecida na análise molar, que será
abordada no próximo tópico.
Veja o seguinte exemplo:
Análises funcionais molares
(macroanálises)
Amélia era a filha caçula de seis irmãos. Desde
pequena, os irmãos a chamavam para brincar Tomando como base as análises moleculares, é
na rua, mas ela sempre recusava, pois observava preciso buscar análises mais amplas a partir de
a surra que levavam da mãe quando chegavam informações coletadas ao longo do tempo. Com
um pouco mais tarde do que o esperado. Conta o objetivo de obter maior compreensão sobre um

Quadro 1.18 Exemplo de análise molecular operante mais completa, em que são especificadas respostas
operantes e respondentes
Antecedentes Respostas Consequências Processos
Demandas/cobranças Operantes: Sai da aula/do Atenção, carinho e proximidade da família R+
no trabalho/na trabalho mais cedo e volta
faculdade para casa, fica agitado, anda Licença médica que justifica afastamento do R-
de um lado para o outro, trabalho e da faculdade
Conflitos com a relata seu mal-estar para Evita conflitos com a esposa R-
esposa quem estiver perto dele,
chora. Familiares demonstram ansiedade e P+
preocupação
(Respondentes: crises
Gastos financeiros com exames e consultas P-
de pânico – ansiedade,
taquicardia e sensação de Emprego ameaçado P+
morte iminente)
R+, reforçamento positivo; R-, reforçamento negativo; P+, punição positiva; P-, punição negativa.

FARIAS_Cap_01.indd 16 06/11/2017 15:02:06


Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  17

Quadro 1.19 Exemplo de análise funcional em que são especificados aspectos históricos nos antecedentes
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Histórico de medo da Recusa convites para Evita conflitos com o marido R- Alívio
mãe: mãe dava surra sair com amigos e
quando os irmãos viajar
descumpriam uma regra
Perde oportunidades de contato com P- Frustração
pessoas e atividades reforçadoras
R-, reforçamento negativo; P-, punição negativa.

Quadro 1.20 Exemplos de análises funcionais com antecedentes específicos e pontuais de cada resposta
Antecedentes Respostas Consequências Processos Efeitos
Convites dos irmãos Recusava Evitava surras da mãe, enquanto os R- Alívio
para brincar na rua convites, irmãos apanhavam na frente dela
ficava em casa
com a mãe Hipótese: perdia contato reforçador P- Frustração
(Respondente: com irmãos e amigos em situações de
medo) brincadeira

Convites para viajar e Recusa convites, Evita desagradar o marido e entrar em R- Alívio
sair com amigos fica em casa com conflito com ele
o marido
Marido autoritário (Respondente: Perde contato com pessoas e atividades P- Frustração
medo) reforçadoras

R-, reforçamento negativo; P-, punição negativa.

caso, a análise do terapeuta deverá incluir a in- quências semelhantes. O primeiro passo da aná-
vestigação da construção de padrões comporta- lise molar, então, seria a identificação dos pa-
mentais, isto é, a realização de uma análise molar drões comportamentais relevantes para o caso e a
(macroanálise). A proposta da análise molar é in- operacionalização desses padrões, isto é, deve-se
tegrar os repertórios atuais e suas variáveis man- descrever quais comportamentos caracterizam
tenedoras aos aspectos históricos que provavel- um determinado padrão. Há diferentes possibi-
mente contribuíram para a instalação/aquisição lidades de rótulos ou nomes para identificar os
dos padrões comportamentais do cliente. Os as- padrões comportamentais, desde que sejam cla-
pectos a serem contemplados para a composição ramente especificados os comportamentos que o
das análises molares são: padrões comportamen- caracterizam, como será detalhado a seguir.
tais, comportamentos que caracterizam o pa- Destaca-se que, para uma formulação com-
drão, história de aquisição, contextos atuais man- portamental de qualidade, as respostas utilizadas
tenedores, consequências que fortalecem o pa- nas análises moleculares devem embasar a com-
drão (quando é funcional)3 e consequências que posição das análises molares. Alguns exemplos
enfraquecem o padrão (quando não é funcional) de padrões comportamentais frequentemente
(Marçal, 2005), conforme descrito a seguir: encontrados em pessoas que buscam terapia são:
controle, autoexigência/perfeccionismo, inasser-
1º Passo: Identificar padrões comportamen- tividade (passividade, agressividade), controle
tais: um padrão comportamental pode ser carac- excessivo por regras (insensibilidade às contin-
terizado por comportamentos ou características gências) e fuga/esquiva.
que ocorrem em diferentes contextos e apresen- Retomando o exemplo de Patrícia, é pos-
tam a mesma função, ou seja, produzem conse- sível identificar que a cliente apresenta um pa-

FARIAS_Cap_01.indd 17 06/11/2017 15:02:06


18  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

drão comportamental que chamaremos de Au- vida uns dos outros; mãe preocupada com o que
toexigência/Perfeccionismo. Esse padrão pode os outros pensam, comparações constantes com
ser operacionalizado com a citação dos seguin- outras pessoas (a mãe sempre comentava: “a fi-
tes exemplos de características e respostas emi- lha da dona Maria passou para Medicina em São
tidas frequentemente pela cliente: faz e refaz vá- Paulo”); histórico de dificuldades financeiras na
rias vezes seus trabalhos e sempre os avalia como família, com cobranças dos pais para que ela mu-
não suficientemente bons, baixa tolerância ao er- dasse a situação.
ro, preocupa-se muito com o que qualquer pes-
soa pensa sobre ela, fala só o necessário em situa- 3º Passo: Identificar contextos atuais mantene-
ções sociais com receio de “falar besteira”, assume dores: além dos aspectos históricos, faz-se neces-
diversos compromissos ao mesmo tempo e con- sário investigar possíveis contextos atuais man-
sidera que é a sua obrigação dar conta de todos tenedores, que seriam condições em que o clien-
eles, segue a regra de que “tudo deve ser bem fei- te está inserido atualmente e que favorecem a
to ou é melhor nem fazer”, assume mais respon- manutenção do padrão. Novamente, é relevante
sabilidades que os colegas nos trabalhos de gru- destacar que os contextos que mantêm o padrão
po com o objetivo de que tudo saia perfeito e di- também devem ser descritos em termos de variá-
ficuldade de pedir ajuda. veis independentes (ambientais) e não de respos-
tas do cliente. O contexto atual de vida de Patrí-
2º Passo: Identificar histórico de aquisição: a cia, no que se refere ao padrão comportamental
análise molar, diferentemente da molecular, in- em análise, poderia ser caracterizado pela inser-
clui a investigação do provável histórico de aqui- ção em ambiente acadêmico e de trabalho muito
sição dos padrões comportamentais do cliente. exigentes e competitivos, namorado muito bem-
Isso significa que o terapeuta deve explorar situa­ -sucedido na mesma área profissional que ela
ções passadas que podem ter contribuído para a (o que gerava cobranças para que ela atingisse o
construção de determinados padrões. É impor- mesmo patamar de sucesso), círculo social res-
tante obter informações a respeito dos diver- trito e composto por pessoas muito intelectuali-
sos contextos históricos de vida do cliente: fami- zadas e com condição socioeconômica superior,
liar, socioafetivo, acadêmico, profissional, médi- contato intenso com os familiares, que expressa-
co-psicológico e religioso-espiritual. Enfatiza-se vam muitas expectativas sobre seu desempenho.
que o histórico deve ser descrito em termos de
variáveis independentes, ou seja, variáveis am- 4º Passo: Consequências que fortalecem o pa-
bientais que contribuíram para a aquisição do drão/consequências que enfraquecem o padrão:
padrão. Em geral, terapeutas confundem o his- um importante elemento para a composição de
tórico de aquisição com comportamentos que o análises molares é a análise motivacional, a qual
cliente apresentou no passado. consiste na identificação de consequências que
Por exemplo, em vez de citar “Patrícia sem- reforçam o padrão (benéficas/reforços em curto,
pre foi boa aluna”, que se refere a um comporta- médio e longo prazo) e consequências que enfra-
mento que caracteriza o padrão de perfeccionis- quecem o padrão (perdas/desvantagens/estimu-
mo, o correto, no histórico, seria “sucesso e bons lação aversiva/punidores em curto, médio e lon-
resultados nas atividades escolares”. Ainda no ca- go prazo). Ressalta-se que, com frequência, os
so de Patrícia, podemos identificar alguns fatos clientes buscam a terapia no momento em que
relevantes em seu histórico de vida que prova- um padrão historicamente reforçado e, assim,
velmente contribuíram para o desenvolvimen- construído e estabelecido ao longo de sua vida
to do padrão de autoexigência/perfeccionismo: passa a produzir consequências aversivas.
pais exigentes, atenção dos pais condicionada a Para Patrícia, o padrão de autoexigência/per-
bom desempenho (diante de nota 10, a mãe dizia feccionismo traz diversas consequências refor-
“você não fez mais do que a sua obrigação”); ne- çadoras (positivas e negativas), como bom de-
ta mais velha das famílias paterna e materna, de sempenho e boas notas, reconhecimento social e
modo que a família cobrava que fosse referência/ profissional, novas oportunidades de crescimen-
modelo para os demais netos; criação em cida- to no trabalho e possibilidade de evitar críticas e
de do interior em que todos comentavam sobre a julgamentos. Por outro lado, observam-se tam-

FARIAS_Cap_01.indd 18 06/11/2017 15:02:06


Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  19

bém importantes consequências aversivas: so- para tratamento de comportamentos específicos,


brecarga constante de atividades (que tem como o que favorece a substituição de sintomas5 e difi-
efeito somatizações, como tonturas e problemas culta a generalização do aprendizado para outros
estomacais recorrentes), pouco tempo para lazer, contextos; desenvolvimento por parte do clien-
pessoas se aproveitam/”se encostam” nela em ati- te de regras fechadas, o que pode contribuir para
vidades de estudo e trabalho, há desgaste nos re- uma baixa sensibilidade às contingências; depen-
lacionamentos (uma vez que ela se dedica muito, dência do cliente em relação ao terapeuta, uma
mas também tem grandes expectativas e faz co- vez que as análises são pontuais e não favorecem
branças em relação ao retorno que as pessoas de- o desenvolvimento de autoconhecimento amplo,
vem lhe dar), poucas relações de intimidade (já de modo que o cliente não aprende a realizar no-
que as atividades acadêmicas e profissionais ocu- vas análises ao surgirem novos problemas. En-
pavam praticamente todo o seu tempo). tretanto, as análises funcionais moleculares têm
Há diferentes maneiras de apresentação das papel fundamental no embasamento de análises
análises molares. As informações podem ser des- mais amplas, as análises molares.
critas em forma de texto ou sintetizadas em um A composição da análise molar (macroaná-
quadro, como no Quadro 1.21. lise) envolve a integração de informações histó-
Como se pode observar, a análise molar per- ricas e atuais da vida do cliente. As variáveis que
mite uma compreensão mais ampla e integra- compõem a análise molar são: padrão compor-
da do cliente, relacionando aspectos históricos e tamental, operacionalização dos comportamen-
atuais, o que contribui para o desenvolvimento tos específicos que caracterizam o padrão, histó-
do repertório de autoconhecimento e para a ela- ria de aquisição, contextos atuais mantenedores
boração de estratégias de intervenção igualmente e consequências que fortalecem e que enfraque-
amplas, o que torna o tratamento mais eficaz. As- cem o padrão. Diferentemente das análises mole-
sim, as análises funcionais moleculares e molares culares, as análises molares favorecem o desenvol-
complementam-se e, quando integradas, ofere- vimento do repertório de autoconhecimento, de
cem uma compreensão mais aprofundada e com- modo que o cliente passa a ter mais autonomia em
pleta dos casos, o que permite o estabelecimento relação ao terapeuta para realizar as suas próprias
de objetivos terapêuticos pertinentes e de estraté- análises ao se deparar com novas dificuldades e
gias de intervenção adequadas a esses objetivos.4 novos desafios. Ademais, há outras vantagens no
uso das análises molares como instrumento tera-
pêutico: favorece a exposição a novas contingên-
CONSIDERAÇÕES FINAIS cias e aumenta a sensibilidade às contingências;
O presente capítulo teve como objetivo apresen- favorece a ampliação dos repertórios do cliente e
tar um modelo de realização, passo a passo, de a sua generalização para outros contextos; favo-
análises funcionais moleculares e molares na prá- rece a ocorrência de mudanças em classes mais
tica clínica. Dicas e exemplos de erros comuns amplas de respostas sem que se necessite de uma
foram utilizados como forma de prevenir possí- intervenção específica para cada resposta ou si-
veis dificuldades que podem surgir ao longo do tuação; evita a substituição de sintomas; o cliente
processo de elaboração de análises funcionais. aprende a fazer análises funcionais contextuais,
Inicialmente, foi abordado o tema das análises o que contribui para a diminuição da ocorrência
funcionais moleculares (microanálises). Trata-se de generalizações indevidas; ao conhecer as va-
da análise de respostas pontuais/específicas do riáveis que contribuíram para o desenvolvimen-
cliente, que ocorrem também em contextos pon- to de suas dificuldades, há uma redução da cul-
tuais/específicos. A operacionalização da análise pabilização do cliente por suas limitações e um
molecular é basicamente caracterizada pela con- aumento da responsabilização pela mudança. De
tingência tríplice (A: R → C), de modo que são acordo com Skinner (1953/2003), ao desenvol-
identificados: respostas, seus antecedentes, suas ver o repertório de autoconhecimento, o indiví-
consequências e seus possíveis efeitos. Caso o te- duo assume posição privilegiada para atuar so-
rapeuta elabore suas intervenções apenas com bre si mesmo e sobre o mundo. Nesse contexto,
base em análises moleculares, há alguns riscos: destaca-se a importância de que o terapeuta fa-
aplicação restrita de técnicas comportamentais ça perguntas e intervenções que contribuam pa-

FARIAS_Cap_01.indd 19 06/11/2017 15:02:06


FARIAS_Cap_01.indd 20
Quadro 1.21 Exemplo de análise molar do padrão de autoexigência/perfeccionismo de Patrícia
Padrão: Autoexigência/Perfeccionismo
Comportamentos que História de aquisição Contextos atuais mantenedores Consequências que Consequências que enfraquecem
caracterizam fortalecem o padrão o padrão
20  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

• Faz e refaz várias vezes seus • Pais exigentes • Ambiente acadêmico muito exigente e • Bom desempenho e • Sobrecarga e somatizações
trabalhos • Atenção dos pais competitivo boas notas • Pouco tempo para lazer
• Nunca os avalia como condicionada a bom • Ambiente de trabalho exigente e • Reconhecimento social • Poucas relações de intimidade
suficientemente bons desempenho competitivo e profissional • Colegas de faculdade se
• Dificuldade de lidar com erros • Comparações constantes • Namorado muito bem-sucedido na • Oportunidades de “encostam” nela
• Preocupa-se muito com o que com outras pessoas mesma área que ela crescimento no • Desgaste nos relacionamentos
qualquer pessoa pensa sobre • Neta mais velha da • Muitas expectativas familiares sobre o trabalho (faz muito pelos outros e cobra
ela família => Deveria ser desempenho dela • Evita críticas e muito em troca)
• Fala só o necessário em “modelo” • Círculo social restrito e composto julgamentos
situações sociais • Mãe muito preocupada por pessoas intelectualizadas e com
• Assume diversos compromissos com o que os outros condição socioeconômica superior
ao mesmo tempo pensam (modelo)
• Regra: “Faço tudo bem feito ou • Criação em cidade do
é melhor nem fazer” interior, em que todos
• Assume mais responsabilidades comentavam sobre as
do que os colegas nos trabalhos vidas uns dos outros
em grupo • Comparações constantes
• Dificuldade de pedir ajuda com outras pessoas
• Histórico de dificuldades
financeiras na família

06/11/2017 15:02:06
Teoria e Formulação de Casos em Análise Comportamental Clínica  21

ra a composição de análises funcionais molecu- o processo terapêutico e apresenta alguns critérios pa-
lares e molares. ra sua definição.
As análises funcionais discutidas no presente 5. A substituição de sintomas acontece quando um sin-
toma é tratado superficialmente sem que sejam iden-
capítulo são ferramentas fundamentais para a ela- tificadas suas origens, de modo que surgem outros
boração da formulação (ou diagnóstico) compor- sintomas com a mesma função no repertório do in-
tamental, que será discutida no próximo capítulo. divíduo em tratamento. Por exemplo, no caso de uma
pessoa com padrão controlador (caracterizado pela
dificuldade de lidar com situações imprevisíveis e pe-
NOTAS la necessidade de que todas as suas atividades sejam
1. Os capítulos de Almeida Neto e Lettieri e de Silva e estritamente planejadas e organizadas) que chega ao
Bravin, neste livro, apresentam alguns recursos tera- consultório com a queixa “fobia de viagens de avião”
pêuticos que podem ser úteis na coleta e intervenção. (situação em que o próprio indivíduo exerce pou-
co controle), se as intervenções enfocarem somente
2. Ao discutir o papel funcional da regra, Kerr e Keenan
o ambiente do avião sem que se trabalhem as ques-
(1997) apresentam a visão tradicional das regras como
tões relacionadas ao padrão controlador, há chances
estímulos discriminativos (Skinner, 1969/1980). Por de-
de que a fobia relacionada a aviões se resolva pontual­
finição, um estímulo discriminativo evoca determinado
mente, mas podem surgir outras dificuldades, como
comportamento devido a uma história de reforçamento
diferencial na presença do estímulo: há uma maior pro- medo de dirigir ou de sair de casa (situações que tam-
babilidade de reforçamento na sua presença do que na bém envolvem imprevisibilidade).
sua ausência. No entanto, essa definição de regra é ques-
tionada por alguns autores (Blakely & Schlinger, 1987;
Hayes, 1989; Schlinger, H.& Bakely, 1987; Schlinger, REFERÊNCIAS
1993), já que há casos em que o comportamento descri- Baum, W. M. (2006). Compreender o Behaviorismo: Com-
to pela regra é emitido em um momento posterior, na portamento, cultura e evolução (2a ed., M. T. A. Silva, M.
ausência dela. De acordo com esses autores, há diver- A. Matos, G. Y. Tomanari, & E. Z. Tourinho, trads.). Porto
sos casos em que a regra em si não evoca as respostas Alegre: Artmed. (Obra originalmente publicada em 1994).
do ouvinte da mesma maneira que um SD, mas, na ver-
Blakely, E., & Schlinger, H. (1987). Rules: Function-al-
dade, altera a função de estímulos ambientais que são
tering contingency-specifying stimuli. The Behavior
descritos na regra. Por sua vez, esses estímulos descri-
Analyst, 10, 183-187.
tos exercem a função de estímulos discriminativos, os
quais evocam respostas. Por exemplo, uma mãe emite a Catania, A. C. (1999). Aprendizagem: Comportamento, lin-
regra: “filho, quando estiver andando sozinho na rua, se guagem e cognição (4a. ed., A. Schmidt, D. das G. de Souza,
F. C. Capovilla, J. C. C. de Rose, M. de J. D. dos Reis, A. A.
um estranho falar com você, corra!”. Nesse caso, a crian-
da Costa, ... & A. Gadotti, trads.). Porto Alegre: Artmed.
ça não irá correr no momento em que a mãe lhe disser
essa regra; ela apresentará esse comportamento apenas Chiesa, M. (2006). Behaviorismo Radical: A filosofia e a
posteriormente, em uma situação em que um estranho ciên­cia (C. E. Cameschi, trad.). Brasília: IBAC; Celeiro.
(SD) a abordar na rua quando ela estiver sozinha. Dessa Cirino, S. (2001). O que é história comportamental. In H.
forma, sugere-se que a regra pode funcionar como um J. Guilhardi, M. B. B. F. Madi, P. P. Queiroz, & M. C. Scoz
estímulo alterador da função de outros estímulos (FAS). (Orgs.), Sobre Comportamento e Cognição: Expondo a va-
No exemplo, a emissão da regra não teria evocado dire- riabilidade (Vol. 7, pp. 132-136). Santo André: ESETec.
tamente o comportamento de correr, mas, sim, alterado (Obra original publicada em 2006).
a função do estímulo por ela descrito (estranho falando Cole, M., & Cole, S. R. (2004). O desenvolvimento da crian-
com a criança sozinha na rua), de modo que este pas- ça e do adolescente (M. F. Lopes, trad.). Porto Alegre: Art-
sou a ter função de estímulo discriminativo e a evocar o med.
comportamento da criança de correr. de Rose, J. C.C. (2001). O que é comportamento? In R. A.
3. A terminologia originalmente utilizada por Marçal Banaco (Org.), Sobre Comportamento e Cognição: Aspectos
(2005) era “quando é funcional” e “quando não é fun- teóricos, metodológicos e de formação em Análise do Com-
cional”; entretanto, o uso desses termos pode gerar portamento e Terapia Cognitivista (Vol. 1, pp. 82-84). San-
confusão para leitores iniciantes. A Análise do Com- to André: ESETec.
portamento compreende todo comportamento como de Souza, D. G. (2001). O conceito de contingência. In R.
funcional, no sentido de que, se um comportamento A. Banaco (Org.), Sobre Comportamento e Cognição: As-
está presente no repertório de um indivíduo, necessa- pectos teóricos, metodológicos e de formação em Análise do
riamente há consequências que o mantêm, ainda que Comportamento e Terapia Cognitivista (Vol. 1, pp. 85-89).
haja também a produção de consequências aversivas. Santo André: ESETec.
Desse modo, os termos foram substituídos por “con- Delitti, M. (2001). Análise funcional: O comportamen-
sequências que fortalecem o padrão” e “consequências to do cliente como foco da análise funcional. In M. Delit-
que enfraquecem o padrão”, respectivamente. ti (Org.), Sobre Comportamento e Cognição: A prática da
4. Quinta, em seu capítulo neste livro, defende o estabe- Análise do Comportamento e da Terapia Cognitivo-Com-
lecimento de objetivos terapêuticos como base de todo portamental (Vol. 2, pp. 35-42). Santo André: ESETec.

FARIAS_Cap_01.indd 21 06/11/2017 15:02:06


22  de-Farias, Fonseca & Nery (Orgs.)

Glenn, S. S. (1991). Contingencies and metacontingencies: Michael, J. (1982). Distinguishing between discriminati-
Relations among behavioral, cultural, and biological evo- ve and motivational functions of stimuli. Journal of Expe-
lution. In P. A. Lamal (Ed.), Behavioral Analysis of Societies rimental Analysis of Behavior, 37, 149-155.
and Cultural Practices (pp. 39-73). New York: Hemisphere Michael, J. (1993). Establishing operations. The Behavior
Publishing Corporation. Analyst, 16(2), 191-206.
Glenn, S. S. (2004). Individual behavior, culture and social Miguel, C. F. (2000). O conceito de operação estabelecedo-
change. The Behavior Analyst, 27, 133-151. ra na Análise do Comportamento. Psicologia: Teoria e Pes-
Glenn, S. S. (2005). Metacontingências em Walden Dois quisa, 16(3), 259-267.
(R. C. Martone, & D. S. C. Ferreira, trads.). In J. C. Todo- Moore, J. (2008). Conceptual foundations of Radical Beha-
rov, R. C. Martone & M. B. Moreira (Orgs.). Metacontingên- viorismo. New York: Sloan Publishing.
cias: Comportamento, cultura e sociedade (pp. 13-28). Santo
André: ESETec. (Obra originalmente publicada em 1986). Moreira, M. B., & Medeiros, C. A. (2007). Princípios bási-
cos de Análise do Comportamento. Porto Alegre: Artmed.
Hayes, S. (1989). Rule-governed behavior: Cognition, con-
tingencies, and instructional control. New York: Plenum Pierce, W. D., & Cheney, C. D. (2004). Behavior analysis
Press. and learning. Mahwah (NJ)Lawrence Erlbaum.
Kerr, P. F., & Keenan M. (1997). Rules and rule-gover- Schlinger, H., & Blakely, E. (1987). Function-altering
nance: New directions in the theoretical and experimen- effects of contingency-specifying stimuli. The Behavior
tal analysis of human behavior. In K. Dillenburger, M. F. Analyst, 10(1), 41-45.
O´Reilly, & M. Keenan (Eds.), Advances in behavior analy- Schlinger, H. D., Jr. (1993). Separating discriminative and
sis (pp. 205-226). Dublin, Ireland: University College Du- function-altering effects of verbal stimuli. The Behavior
blin Press. Analyst, 16, 9-23.
Kohlenberg, J. R., & Tsai, M. (2001). Psicoterapia Analíti- Skinner, B. F. (1980). Contingências do Reforço: Uma aná-
ca Funcional: Criando relações terapêuticas intensas e cura- lise teórica (R. Moreno, trad.).(Coleção Os Pensadores).
tivas (F. Conte, M., Delitti, M. Z. S, Brandão, P. R. Derdyc, São Paulo: Abril Cultural. (Obra original publicada em
R. R. Kerbauy, R. C. Wielenska, ... & R. Starling, trads.). 1969).
Santo André: ESETec. (Obra original publicada em 1991).
Skinner, B. F. (1981). Selection by consequences. Science,
Marçal, J. V. S. (2005). Refazendo a história de vida: Quan- 213, 501-504.
do as contingências passadas sinalizam a forma de inter-
Skinner, B. F. (2003). Ciência e Comportamento Humano
venção clínica atual. In H. J. Guilhardi, & N. C. Aguirre
(Orgs.), Sobre Comportamento e Cognição:Expondo a va- (J. C. Todorov, & R. Azzi, trad.). São Paulo: Martins Fon-
riabilidade (Vol. 15, pp. 258-273). Santo André: ESETec. tes. (Obra original publicada em 1953).
Marçal, J. V. S. (2010). Behaviorismo Radical e prática clíni- Todorov, J. C. (1982). Behaviorismo e Análise Experimen-
ca. In A. K. C. R. de-Farias (Org.), Análise Comportamen- tal do Comportamento. Cadernos de Análise do Compor-
tal Clínica: Aspectos teóricos e estudos de caso (pp. 30-48). tamento, 3, 10-23.
Porto Alegre: Artmed. Todorov, J. C. (1989). A psicologia como estudo de intera-
Meyer, S. B. (2001). O conceito de análise funcional. In M. ções. Psicologia: Teoria e Pesquisa, 5, 325-347.
Delitti (Org.), Sobre Comportamento e Cognição:A prática Tomanari, G. Y. (2000). Reforçamento condicionado. Re-
da Análise do Comportamento e da Terapia Cognitivo-Com- vista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva,
portamental (Vol. 2, pp. 29-34). Santo André: ESETec. 2(1)I, 61-77.

FARIAS_Cap_01.indd 22 06/11/2017 15:02:06

Potrebbero piacerti anche