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António Lopes Pires Nunes

O autor

A SUBLEVAÇÃO DA BAIXA DO CASSANGE


Neste excelente livro o autor, tenente coronel António Lopes Pires Nunes, relata
minuciosamente o que se passou realmente em Angola desde a Sublevação da Baixa do
Cassange a Nambuangongo. Sugerimos vivamente a sua leitura a todos aqueles que
estão interessados em saber a verdade sobre a descolonização e guerra em Angola.
Como o livro tem copyright e não será fácil de adquirir àqueles que vivem em Angola,
solicitamos a complacência da Editora e do Autor. Obrigado

No dia 11 de Janeiro, o Comando Militar de Angola foi alertado, através do Governo


Geral, que havia uma rebelião dos nativos da povoação de Milando, no distrito de
Malange. A 3a Companhia de Caçadores Especiais (3a CCE), sedeada em Malange,
destacou para Milando uma patrulha, que ali chegou na madrugada do dia 12
encontrando a população bastante alarmada. O chefe de posto informou, então, que os
nativos das sanzalas de Ganga-Mexita e Quivota, respectivamente a 5 e 9 quilómetros
da povoação, se tinham recusado a trabalhar e afirmavam que matariam qualquer cipaio
que ali fosse. A patrulha deslocou-se à primeira das sanzalas onde encontrou, dispostos
em linha, cerca de 200 nativos com armas gentílicas e, embora inicialmente se gerasse
alguma confusão, tudo serenou quando os rebeldes verificaram as intenções pacíficas da
tropa. Três representantes dos amotinados falaram com o oficial comandante da patrulha
dizendo-lhe que não trabalhavam por ordem de Kasavubu e ao administrador da
circunscrição, que entretanto ali se deslocara, que Maria os proibira de trabalhar pelo
que era com ela, que os castigaria se trabalhassem, que deveria falar (ver capítulo "Os
antecedentes da Sublevação da Baixa do Cassange - o PSA"). Tornavam-se confusos os
motivos que os levara à rebelião, porquanto Kasavubu era Presidente do Congo ex-
belga, e a alusão a Maria indicava uma preparação das populações por agentes que
exploravam as suas crenças no sobrenatural.

Na manhã do dia seguinte soube-se que fora assassinado um capataz mestiço da


Cotonang e, quando a patrulha voltou às sanzalas, verificou que estavam já totalmente
abandonadas, com indícios de a fuga ter sido preparada. No dia 22, ocorreu idêntica
rebelião em Tembo Aluma, por parte de 300 nativos, alguns dos quais empunhando
dísticos do PSA e, à semelhança dos acontecimentos do dia 11, não houve agressões ou
violências. A rebelião manifestou-se depois em Cunda-Ria-Baza, Quela, Marimba,
longo e Xamuteba. Em pouco tempo a sublevação estendeu-se a toda a Baixa do
Cassange, com a adesão dos bangalas e dos maholos, sobre os quais o PSA exercia uma
forte e sistemática pressão. A influência de um partido congolês em território angolano
explica-se pela continuidade das etnias angolanas no Congo ex-belga e por haver
mesmo sobas portugueses que ali habitavam.

A calma pareceu reinar em Milando; apesar disso, o Comando Militar de Angola


ordenou a permanência de uma secção de atiradores naquela região, enquanto a 3a CCE
fazia intensos e longos patrulhamentos, que se estenderam até Camaxilo, no norte da
Lunda, tendo em vista esclarecer a extensão da rebelião. A situação na Baixa do
Cassange piorava de dia para dia. No dia 1 de Fevereiro mais de mil nativos
concentraram-se próximo de Cunda-Ria-Baza e, no dia 2, os europeus desta povoação
fugiram para Malange, perante as ameaças dos amotinados que gritavam não querer ali
brancos e exigiam a sua saída. No Relatório Especial de Informações de 2 de Fevereiro,
do Comando Militar de Angola para o Chefe de Estado Maior General das Forças
Armadas, em Lisboa, diz-se mais "(... ) cerca de 600 trabalhadores voluntários das
prospecções mineiras ao longo do rio Cuango, abandonaram o trabalho (...).

A situação parece extremamente grave e tudo indica que estes acontecimentos se


possam alastrar ao norte do distrito do Congo, e ao distrito da Lunda (...)". Não percebia
ainda o CMA a verdadeira causa da sublevação, mas o mesmo manifestava como
provável que "(...) se pretende que os europeus abandonem a região e que a agitação
possa estar ligada ao caso do "Santa Maria". Teme-se ainda que a área da Diamang, na
Lunda, até então calma, venha a agitar-se e que se iniciem acções urbanas que fixem as
tropas nas cidades para que seja mais fácil o alastramento da subversão nas zonas
rurais." (mesmo Relatório Especial de Informações).(...)

A OPERAÇÃO CASSANGE
(...)

OPERAÇÕES DA 4a CCE

(...) A 4a CCE iniciou a operação (a primeira em África da geração de 1961) partindo de


Malange em direcção a Quela mas cedo se verificou que as dificuldades eram muitas. A
principal relacionava-se com o facto de as tropas portuguesas serem constantemente
desprestigiadas pelas atitudes dos revoltosos que as desafiavam e insultavam, dançando
em frente às viaturas, o que exigiu muito sangue frio e uma rigorosa disciplina. Pesou
também o mau estado dos itinerários daquela região alagadiça, onde as viaturas se
atolavam a todo o momento e os nativos começavam a destruir as pontes e pontões.

Os reabastecimentos constituíam outro grave problema, em grande parte resolvido pela


Força Aérea. As tropas da 4a CCE depararam-se sempre com grandes concentrações de
nativos, frequentemente na ordem dos milhares, totalmente indiferentes à soberania
portuguesa, visto considerarem-se independentes e indispostos com os representantes da
autoridade e com os funcionários da Cotonang, para a qual a maioria trabalhava na
cultura do algodão. Da inicial recusa ao trabalho em breve passaram à acção violenta,
tendo saqueado, destruído e queimado as instalações da Cotonang, as casas comerciais e
os edifícios dos postos administrativos de algumas localidades (Marimba, Tembo-
Aluma).

Habilmente manobradas por elementos subversivos vindos do Congo, essas grandes


massas de nativos julgavam-se totalmente protegidas por uma Maria que lhes dava o seu
beneplácito, desde que se tratasse de escorraçar o homem branco.

Como estava determinado, as tropas pretenderam inicialmente fazer só demonstrações


de fogo, mas o facto de dispararem para o lado e para o ar só piorava a situação, porque
os amotinados convenciam-se ainda mais da sua imunidade às balas e granadas, o que
os levavam a tomar atitudes cada vez mais afoitas e agressivas. Mesmo os aviões não
passavam para eles de "enviados de Maria", para os quais entoavam cânticos. Porém, os
primeiros tiros mostraram-lhes que a Maria os tinha enganado e, a partir de então, as
operações tomaram o rumo da captura dos cabecilhas, que logo eram desprestigiados
perante a multidão, e da apreensão das armas em seu poder.

Procurou-se imediatamente dar ajuda material às populações famintas que, antes,


haviam destruído os seus haveres e a sua criação, porque essas eram as ordens de Maria,
que também lhes tinha dito que só deveriam fazer capelas e embelezar as sanzalas para
o dia da sua chegada.

Em Quela, a situação tornou-se gravíssima e intolerável pelo que a 4a CCE viu-se


obrigada a abrir fogo, para defesa própria:

"(.-.) Dei ordem de fogo às duas metralhadoras e à bazuca, que já havia mandado
preparar com uma granada explosiva. O tiroteio foi infernal, ouvindo-se tiros por todos
os lados, mesmo dos homens do pelotão que se encontravam a proteger o flanco. As
primeiras linhas dos revoltosos começaram a cair, sempre cantando e dizendo "agora
podemos abrir fogo" e ouviram-se alguns tiros. A bazuca abriu no meio deles uma
grande clareira e, sob continuação da intensa metralha, o grupo foi caindo sempre a
cantar, verificando-se já algumas tentativas de fuga. Ordenei alto ao fogo, sendo
necessário gritar e apitar intensamente, no que fui ajudado pelo senhor alferes
Condesso, que se encontrava ao meu lado. Após tudo serenado, verifiquei que os
homens se encontravam lívidos e que alguns haviam até disparado para o ar, sendo
necessário andar a acalmá-los e a encorajá-los. O balanço total das baixas foi de um
morto e quatro feridos no nosso pessoal e de 71 mortos e 41 feridos entre os indígenas
revoltados (...)". (cf. relatório de 6 de Fevereiro do comando da companhia) A
companhia dirigiu-se depois para Cunda-Ria-Baza de onde partiu para patrulhamentos a
várias sanzalas amotinadas.
"(...) Esta sanzala, a primeira da região baixa, mostrava-se mais hostil, como aliás todas
as outras que iríamos encontrar. Nela fomos recebidos com cânticos, mas bastaram
umas granadas de mão ofensivas e umas coronhadas para a desarmar, Não se
verificaram incidentes graves.

Exigi a apresentação, no dia seguinte, do respectivo soba, também nesta região (...)".
(cf. relatório de 7 de Fevereiro do comando da companhia) "(...) Como esta sanzala se
encontrava ainda bastante afastada da estrada e como a noite se aproximava
rapidamente e se ouviam nela igualmente os mesmos cânticos, ordenei um tiro de
bazuca com granada explosiva para perto, ao mesmo tempo que pedia ao avião outra
demonstração de força. Depois de uma rajada de metralhadora executada pelo avião e
terem parado os cânticos, prossegui viagem. Não houve qualquer ferido. (...)". (idem)

"(...) Com raras excepções, as machambas encontram-se completamente destruídas. A


criação foi totalmente morta, raríssimos bois se encontram e os cães, animais de maior
estimação dos indígenas, desapareceram por completo tendo apenas encontrado um cão
amarrado e já em decomposição dentro de uma palhota.

Nesta situação, estas populações estão condenadas a morrer à fome dentro em breve
(...)". (idem) No dia 8, ocorreu o que podia ter sido um verdadeiro massacre, quando a
4a CCE foi ameaçada por uma gigantesca concentração de nativos, mas a amotinação
foi esvaziada com apenas baixas ligeiras. Por representar o modo de actuação das forças
em operações na Baixa do Cassange transcreve-se na íntegra o relatório do capitão
Morais elaborado a meio dos acontecimentos: "(...) A cerca de 300 metros da sanzala
levantou-se um enorme alarido para os lados da sanzala, que se transformou em coro de
cânticos à Maria.

Ordenei que os pelotões formassem em linha e continuei o avanço com o capim pela
cintura e em terreno alagado. A cerca de 100 metros mandei parar o avanço, porque,
agora com o campo de observação desimpedido do capim, verifiquei que junto à casa do
soba estavam reunidos cerca de 10.000 indígenas, homens, mulheres e crianças,
encontrando-se os homens armados. Com a ajuda do intérprete, senhor Frade, que me
acompanhava, soube que estavam a fazer uma jura de guerra perante o soba e se
preparavam para nos atacar.

Ordenei a um sargento que voltasse atrás e que num jeepão viesse pedir reforços de
mais um pelotão e a secção de morteiros. Entretanto, o intérprete procurava parlamentar
com o soba, mas quem lhe respondia, à frente do bando, era o feiticeiro.

Para os amedrontar, mandei lançar 4 granadas de mão ofensivas e uma granada de


bazuca, que rebentaram em frente à sanzala, levantando-se um grande alarido, seguido
de um coro. Traduzido pelo intérprete, diziam que a Maria lhes falava verdade e que as
armas dos brancos nada lhes faziam.

Chegados à entrada da sanzala, o senhor Frade, que se encontrava a meu lado, subiu a
um poste e chamou novamente o soba a fim de parlamentar, mas o feiticeiro interpunha-
se sempre. Então o senhor Frade pediu uma das nossas espingardas e, apontando
cuidadosamente, abateu o feiticeiro. Imediatamente outro indígena o substituiu, que vim
mais tarde a saber ser o filho do soba, futuro substituto do pai. Outro guia, que também
me acompanhava, senhor Leonel, pediu uma espingarda a um soldado, apontou com
cuidado e abateu esse indígena com um tiro numa coxa.

Os cânticos redobraram e mandei então fazer um tiro de bazuca para a frente do grupo,
mas as três granadas não funcionaram, pelo que desisti. Pegando eu próprio numa
metralhadora ligeira, de um cabo que se encontrava a meu lado, em posição de tiro e
marchando, executei uma rajada por cima do grupo. Começaram a dizer que as nossas
armas "só deitavam água", o que me levou a concluir que água para eles é "nada".

Acabei por despejar esse carregador com tiros para o tecto da casa do soba.
Levantaram-se gritos que traduzidos pelo intérprete diziam que iam atacar. Metendo
novo carregador na metralhadora, fiz fogo directo sobre o grupo dispersando-se o
mesmo aos gritos. Uma nuvem de indígenas armados fugiu na direcção de este e o
grupo mais pequeno na direcção do norte. Tendo mandado avançar os dois pelotões em
linha, revistando as palhotas, aproximei-me do centro da sanzala. Verifiquei então que
cerca de 300 mulheres, muitas crianças e velhos se encontravam reunidos por detrás da
casa do soba, acompanhados por uns 100 homens que não tiveram tempo de fugir,
quase todos eles armados.

No chão, ferido, encontrava-se o Chirimbimbe, filho do soba da região, com um tiro na


coxa, como aliás atrás foi dito. Tendo mandado ao senhor Frade fazer uma prelecção
aos amotinados sobre o grave incidente que motivaram, tornando-os responsáveis pelas
mortes já feitas, esbofeteei o soba grande que caiu para o chão, mandando-o amarrar
com os seus sobas e sobetas. Seguidamente mandei transportar para esta povoação os
feridos em padiolas, pelos homens prisioneiros que saíram à frente do enorme grupo de
mulheres, crianças e velhos.

Comigo seguiram os sobas e sobetas amarrados. O balanço das baixas foi de 4 mortos e
4 feridos. Mandei tratar dos feridos e fazer comida para o pessoal aprisionado. Tendo
falado aos prisioneiros, por intermédio do intérprete, concordaram que haviam sido
enganados e que os culpados tinham sido os maholos. Fiz seguir vários emissários para
as sanzalas dos sobas principais da região, ordenando-lhes a sua presença imediata e
entrega das armas levando como amostra um cartucho completo de espingarda, dizendo-
lhes que a Maria não transformava aquele ferro em água.

Pela tarde apareceram nesta povoação, a apresentar-se, uma enorme quantidade de


sobas e sobetas com armas trazidas das suas sanzalas. Um ex-soldado indígena, que
prestara serviço em Macau, apresentou-se-me também como enviado de um soba,
trazendo um molho de armas gentílicas. Aguardo para amanhã a chegada de mais sobas,
que enviaram à sua frente os seus emissários, dizendo que devido à idade, tinha sido
impossível apresentarem-se hoje. Quartel em Cunda, 8 de Fevereiro de 1961.(...)"

De Cunda, a 4a CCE passou a Belo Horizonte e ao Caombo, mas viu-se na necessidade


de voltar à primeira povoação porque um grupo de cerca de 200 nativos, todos armados,
ameaçava de morte a população branca. Sendo intimados a entregar as armas e a
manterem-se pacificados, não aceitaram a rendição e apontaram as armas para disparar.
Gerou-se um pequeno tiroteio, do qual resultaram 20 mortos e 16 feridos, que foram
imediatamente tratados.
Quando as tropas se encontravam no rio Gombe, a caminho de Marimba, depararam
com o chefe de posto de Tembo Aluma e dois guardas da PSP que tinham sido
obrigados a fugir. Haviam feito uma marcha forçada durante a noite e ao passar por
Marimba foram desarmados, vexados e torturados.

Informaram que a situação por aquelas bandas era insustentável. A tropa seguiu para
Marimba e, perante as atitudes usuais por parte dos amotinados, foram disparados
alguns tiros de metralhadora, o que os obrigou a dispersar. Ao aproximarem-se do rio
sucedeu que a sanzala que domina a margem, até então desabitada, encheu-se de uma
multidão que, entrincheirada na paliçada de canas que a rodeava, a desafiou esgrimindo
trabucos e catanas. Naquela direcção foram disparadas algumas rajadas de uma
metralhadora pesada, enquanto um morteiro ligeiro de 60 executava tiros para as suas
imediações. Não houve vítimas e, pouco depois, tudo recaía na calma, enquanto
prosseguia a construção de uma jangada.

No dia 17, já a companhia atingira Tembo Aluma, onde as sanzalas estavam desabitadas
e o edifício da administração arrombado e saqueado. Perseguindo o bando, as tropas
aproximaram-se da fronteira e na região das Quedas Guilherme, ao chegarem perto de
uma sanzala, depararam com um grande grupo de nativos armados. Foram aconselhados
a entregarem-se, explicando-se-lhes que seriam bem recebidos. Perante a recusa foi
disparada uma granada de bazuca sobre uma palhota próxima que, com surpresa,
explodiu violentamente. Era um esconderijo de pólvora, armas e munições que,
incendiando as outras palhotas, provocou a debandada do grupo. A 4- CCE ao atingir
Tembo Aluma cumprira a sua missão.

Á medida que ia resolvendo a agitação que se lhe deparava, da forma que se descreveu,
verificava-se que os povos mais pacíficos voltavam à sua vida normal e a região podia
considerar-se pacificada. Só os maholos não se aproximavam e fugiam para o Congo
sem voltarem a criar problemas. Os agitadores falharam os seus propósitos e a 4a CCE
havia conseguido o que à partida parecia impossível - pacificar a região em 12 dias.
Espalhou depois os seus pelotões pelas povoações da área onde estivera em operações
aguardando o evoluir da situação, enquanto executava patrulhamentos e fazia acção
psico-social sobre as populações nativas, impondo aos sobas a obrigação de entregar os
agitadores e os feiticeiros. No dia 17 de Fevereiro o major Rebocho Vaz elaborou para o
Comando Militar de Angola a seguinte apreciação (Plano de Operações nº 3 - Operação
Cassange):

"(...) O elevado moral da 4a CCE, o espírito de decisão do comandante e das tropas e


ainda o bom senso e equilíbrio revelados na resolução de incidentes graves, limitaram o
número de baixas sofridas pelos indígenas. Houve sempre o propósito de causar o
mínimo de mortos ou feridos e, sempre que houve necessidade imperiosa de abrir fogo,
procurou-se fazer pontaria baixa. Este facto reflectiu-se nos feridos apresentados no
hospital de Malange, que têm, na grande maioria, ferimentos nas pernas. Também
nessas ocasiões se procurou sempre abater, em primeiro lugar, os indivíduos que,
nitidamente, se destacavam como cabecilhas.

É de realçar a ajuda prestada por civis, utilizados como pisteiros e conselheiros nas
relações com os indígenas, em especial a do sr. Frade, de Malange. Actualmente julga-
se que ainda é necessário manter, por um período razoável, uma ocupação na zona
pacificada com a finalidade de mostrar aos indígenas que as Forças Armadas estão
atentas e dar aos europeus a confiança necessária para retomarem as suas actividades
comerciais. Também servirá para mostrar aos povos gingas que o Estado está pronto a
protegê-los contra a influência perniciosa dos maholos que, antes da pacificação,
chegou a atingir graves aspectos (obrigaram alguns sobas gingas a aderir).

Seria de encarar a hipótese de as Autoridades Administrativas substituírem todos os


sobas que se sublevaram. Teria também uma influência extraordinária na atitude dos
maholos se lhes tirassem a concessão que têm sobre as minas de sal gema existentes na
região de Milando. Segundo informações, dessas minas exportavam sal praticamente
para toda a Baixa e até para a República do Congo. Bastaria atribuir, como castigo
temporário ou definitivamente, essa concessão aos povos bondo e bangala (que parece
que foram os primeiros concessionários) para que material e psicologicamente os
maholos fossem muito atingidos e sentissem o castigo imposto.

Tem de se encarar desde já a necessidade urgente de se acudir com alimentos às


populações indígenas. A parcial destruição das culturas, a morte do gado e dos cães, a
apreensão das armas normalmente utilizadas na caça, irão provocar, sem dúvida, uma
crise gravíssima. É opinião geral que a miséria é enorme e que muitos morrerão à fome
se não houver uma acção centralizada de auxílio em alimentos. Esta acção, além do
fundamental aspecto humanitário, teria também paralelamente um efeito psicológico
decisivo sobre as populações, que foram arrastadas a esta situação por agitadores que,
habilmente, exploravam condições locais péssimas, originadas pelos indiscutíveis
abusos dos agentes das empresas concessionárias e até das Autoridades Administrativas
(...)".

OPERAÇÕES DA 3a CCE

No dia 16 de Fevereiro, a 4a CCE tinha já a sua missão cumprida e o comandante do


batalhão considerou que a zona de acção onde aquela companhia interviera se
encontrava praticamente pacificada, chegando a altura de atribuir uma missão à 3a CCE.
No Plano de Operações nº 2, elaborado nessa data, diz-se que as regiões de Caombo,
Benge-Angola, Marimba, Tembo Aluma, Anguengo, Chiquita, Quinzenga e de Cunda-
Ria-Baza eram já pacificadas, em especial as zonas sul e oeste, prevendo-se que a 4-
CCE pudesse cumprir sozinha a pacificação total da área sem mais problemas. Os
nativos estavam a regressar ao trabalho e iam voluntariamente receber sementes da
Cotonang.

Acrescentava o mesmo documento que os povos gingas, situados a noroeste da estrada


Caombo-Marimba, estavam a apresentar cumprimentos ao comandante da coluna e a
entregar os agitadores que neles se tinham introduzido. O Plano expressava ainda que
não havia indícios de sublevação a sul da estrada Malange-Xandel-Xa-muteba e
apontava como único problema, o receio das populações brancas de Milando, o coração
da rebelião, de voltar a trabalhar na região. O comandante de batalhão era da opinião
que ali deveria ser colocada uma força com armas automáticas, o que, por si só,
resolveria a situação, pois não se previa que houvesse mais mostras de força por parte
dos sublevados.

Faltava agora percorrer a faixa a leste de Milando, ou seja, o sector a norte da linha
Cassange-Iongo-Cuango até Luremo e Catxinga. Uma vez que se previa que a 5a CCE
demoraria pouco tempo a chegar a Malange, o mesmo documento operacional
expressava que ela deveria ir efectuar a segurança de Malange e libertar a 3a CCE para
operar naquela região.

Foi então dada à 3a CCE a missão de se deslocar no itinerário Malange-Quela-Iongo a


fim de avançar para norte, procurando sufocar as eventuais sublevações com que
deparasse e, para sul, proceder de igual forma até à linha Xandel-Xamuteba.

Em relação à 4a CCE confirmou-se a previsão do Plano de Operações e, em 19 de


Fevereiro, o seu comandante pôde relatar para o comandante de batalhão: "tudo se
encontra pacificado e o terror de Maria desapareceu para dar lugar ao terror do exército.
O mito desfez-se e a principal cutilada foi dada ontem pela avioneta que eles estavam
convencidos que vinha do Congo e que eles cumprimentaram. Evidentemente que a
resposta que lhes deram matou dez e convenceu-os que Maria estava zangada com eles
(...)".

A 3a CCE não estivera até então completamente inactiva. Por se preverem alterações da
ordem na região de Cuango, o administrador de Canhungula solicitou ao destacamento
de Camaxilo (norte da Lunda) que ali se deslocasse uma patrulha. No dia 9 de
Fevereiro, durante o deslocamento e já próximo de Cuango, a força deparou com cerca
de 300 a 400 nativos amotinados que haviam cortado a estrada e várias pontes. Tendo
sido intimados a reparar imediatamente os estragos, pois as pontes eram necessárias
para a passagem das viaturas, recusaram sempre com o mesmo argumento de Maria,
deram sinais de querer iniciar um ataque e dispararam um tiro apontando ao
administrador.

No alvoroço que se gerou, as tropas dispararam primeiro para o ar e fizeram, depois, tiro
ajustado e intencional, resultando a morte de 8 amotinados e muitos feridos, num total
de 50 baixas. No dia 11, chegaram ao Cuango notícias de que as populações já haviam
iniciado a reparação da estrada e das pontes e, no dia 12, todas elas estavam já
reconstruídas, como o administrador confirmou. Uma informação posterior da
Autoridade Administrativa referia também que, depois do sucedido em Cuango, os
nativos de Luremo, com algumas excepções na fronteira, apareceram todos a fazer as
suas lavras. Na zona de acção desta companhia tudo se passava igualmente da forma
habitual - a pacificação era rápida mas só ocorria depois de os revoltosos sentirem na
pele o efeito das balas das forças portuguesas.

Transcrevem-se alguns excertos significativos, de 23 de Fevereiro, do comandante da 3a


CCE: "(...) Operação 'Truta' (região de Monte Papo) - a primeira que a companhia
realizou: após o bombardeamento efectuado ontem tive conhecimento, por intermédio
do chefe de posto de Iongo, que foram mortos muitos indígenas e enviei um emissário
para Donga, a fim de averiguar ali os resultados da acção aérea. Foram confirmados 11
mortos e 21 feridos (...)"

"(...) Operação 'Raia' (região de Muanha): avistámos à volta do armazém da Cotonang


uma multidão de pretos reunidos. Aproximámo-nos a cerca de 50 metros; mandei
chamar o soba Muanha, mas ele respondeu-me que "fosse lá eu"...; insisti novamente,
dizendo-lhe que haveria muitos mortos se ele não comparecesse perante mim. Voltou as
costas, dizendo que era Deus e que só obedecia à Maria, começando a referir-se com
violência aos brancos. Mandei abrir fogo, indicando como alvos principais o soba e os
agitadores que estavam com ele; caíram todos e os outros, querendo reagir, foram
abatidos também (...). Foi capturada grande quantidade de material, entre catanas,
espingardas, azagaias e facas (resultado: 60 mortos e 80 espingardas e 150 catanas
apreendidas, cf. Sitrep 23/24 do Batalhão Eventual), A acção teve consequências
imediatas porquanto o pessoal das sanzalas vizinhas começou a regressar às cubatas,
normalizando-se a situação nessa zona.

"(...) Operação 'Limão' (região de Cuango): deparei com 200 indígenas sentados no
chão em atitude de oração, com o soba maior e sobetas. Não se mexeram; mandei
chamar o soba maior e os sobetas, os quais vieram logo. Disse-lhes para entregarem
todas as armas, o que fizeram a seguir: 130 catanas, 74 azagaias, 19 espingardas e
alguns punhais (...).

Tudo se transformou numa alegre reunião de brancos e pretos, numa verdadeira e franca
confraternização. Não houve um único tiro disparado. Expliquei-lhes também que
deviam recomeçar o trabalho do algodão, o que prometeram fazer imediatamente. (...)".

Com a evolução favorável dos acontecimentos na Baixa do Cassange, a acção


operacional das forças portuguesas foi, gradualmente, cedendo lugar à acção psicológica
e à assistência sanitária às populações da região. Em meados de Março, após uma
pacificação total, as companhias em operações recolheram e ficaram apenas destacados
elementos nos locais onde fora prevista a manutenção de efectivos militares, de acordo
com a informação ns 52/61 da 3a Rep/QG de 9 de Março de 1961, que a seguir se tran

screve: "(...) Marimba: 1 pelotão com secções destacadas em Forte República e Tembo
Aluma. longa: 1 pelotão com secções destacadas em Milando e Xamuteba.

Malange: a 3a CCE, reforçada com 4 secções de atiradores do Regimento de Infantaria


de Luanda para os destacamentos anteriores. (...)" A 4a CCE recolheu a Malange e
quando a 5a CCE chegou a esta cidade, foi extinto o Batalhão de Caçadores Eventual.

AS BAIXAS

Tendo os comandantes da 3a e da 4a CCE sido muito meticulosos na elaboração dos


seus relatórios e tido o cuidado de contar e confirmar as baixas entre os sublevados
(mortos e feridos), mesmo as causadas pela Força Aérea, podemos estimá-las entre
duzentos a trezentos mortos e uma centena de feridos entre os revoltosos e 2 mortos e 4
feridos entre os elementos da 4a CCE. A 2a Rep/RMA, pelas informações
posteriormente recebidas, acabou por contabilizar 173 feridos (cf. nota nº 5698 de 11 de
Março de 1961 para o Governo Geral de Angola). Acresce que as Forças Armadas
pareciam ter um preconceito contra a Cotonang, bem patente em todos os relatórios e a
meticulosidade dos números, que as tropas entendiam ser demasiado elevados, parece
um libelo acusatório contra a companhia algodoeira à qual atribuíam as culpas pela
sublevação, que enfrentavam mais com relutância do que com sentido de inimizade.
Diz-se com frequência que as forças portuguesas cometeram ali um massacre e que a
desproporção de armamento era abismal.

Deve ter-se, contudo, em atenção que as armas gentílicas podiam ser tão mortíferas
como qualquer outra e que centenas de amotinados, armados apenas com canhangulos e
catanas, podiam causar muitas baixas entre os militares. Poderá, no entanto, ter havido
excessos provocados pelo nervosismo em que as tropas estavam a operar e pelas
condições absolutamente novas em que as operações decorriam. Foi na Baixa do
Cassange que o Exército Português disparou pela primeira vez, em situação real, desde
a I Guerra Mundial.

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