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DOM CARLOS VERZELETTI

BISPO DE CASTANHAL

LEIGOS e LEIGAS
pela VIVÊNCIA do BATISMO,
CRISTÃOS TESTEMUNHAS,
SAL da TERRA
e LUZ DO MUNDO

CARTA PASTORAL 2018

DIOCESE DE CASTANHAL
Imagem de Capa: Batistério da Catedral de Castanhal
Fotografia: Everardo Freitas

Capa, diagramação e projeto gráfico: Erivan Freitas


Revisão: Frei Gentil Gianellini

C 2018 by Diocese de Castanhal - Pará - Brasil


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escrita do autor - Diocese de Castanhal.
Estimado e querido irmão e irmã!
Ao escrever esta Carta Pastoral convido-te a refletirmos jun-
tos sobre a nossa maravilhosa realidade batismal. Somos ho-
mens e mulheres renascidos e regenerados pelo dom de sermos
cristãos. Somos transformados em nossa natureza de criaturas
e divinizados pela natureza da Santíssima Trindade. Em Jesus
Cristo, o Pai amoroso, pela força do seu Espírito Santo, nos faz
todos seus filhos e filhas, participantes da sua graça e herdeiros
da sua glória.
Pela fé aceitamos e assumimos o projeto de Deus que vai se
revelando a nós na nossa história pessoal e familiar, enquan-
to percorremos o caminho da iniciação cristã. Nenhum de nós
pode viver como um cristão solitário ou isolado. A nossa voca-
ção batismal pode ser comparada com o mistério da Anuncia-
ção a Maria, com o nosso sim ao projeto de Deus formamos um
só Corpo unidos pela força redentora de Jesus Cristo. O Verbo
de Deus Pai se faz carne na nossa carne, se faz história na nossa
história, assume o nosso rosto, sua vida se torna a nossa vida.
Isto é ser cristão! Seria muito fraca a nossa resposta batismal se
apenas pendurássemos uma medalha ou um belo crucifixo em
nosso pescoço. E vazia seria a nossa fé cristã se apenas possuís-
semos a certidão de batismo esquecida em alguma gaveta ou
nem procurada nos livros paroquiais. Também é muito pouco
participar de alguma procissão ou missa nas festas comunitá-
rias. Ser cristão é ser amigo de Jesus Cristo, sempre encontrando
um jeito de estar perto dEle, e ir se transformando em homens e
mulheres novos, renascidos pela fé do batismo.
O cristão leigo age em todas as realidades desse mundo sem
afastar-se do Senhor da sua vida. Tu que és uma pessoa cristã,
tens um compromisso permanente com a Igreja, um compro-
misso de ser evangelizador, missionário e transformador. Olha
ao teu redor e vai ver quantas realidades humanas estão caren-
tes da tua presença e do teu testemunho de cristão forte na fé,
amigo e amiga do Senhor Jesus Cristo.
Animados pela esperança e desafiados na caridade a dar nos-
sa vida, vamos caminhar juntos como Igreja diocesana, supe-
rando a violência e outros males que nos afastam de Jesus e da
sua Igreja, e não nos deixam ser irmãos e irmãs uns dos outros.
Jesus afirma: “Vós sois todos irmãos”, e “Vós sois sal da terra e
luz do mundo” (Mt 23, 8 – 5, 13-14). Esta é a nossa identidade,
é a nossa missão; ser a Igreja Diocesana em saída a serviço do
Reino.
1.
Leigos e Leigas

A nossa Diocese de Castanhal, em comunhão com toda a


Igreja Católica do Brasil, quer viver o ano de 2018 como Ano
do Laicato. É uma oportunidade para descobrir ou retomar o
papel do laicato numa Igreja “em saída” e para refletir sobre
o protagonismo dos leigos no mundo secular e nas culturas,
conforme o modelo de Igreja pedido pelo Concílio Vaticano II.
É verdade que devemos ajudar os leigos a serem “o sal da
terra e a luz do mundo” (Mt 5,13-14), mas ao fazermos isso,
temos de trabalhar para que eles sejam também o sal da paró-
quia e a luz da Igreja. Para que isso ocorra, precisamos supe-
rar e vencer o clericalismo que ainda trava a ação pastoral da
Igreja. Papa Francisco na sua Carta ao cardeal Marc Ouellet,
de março de 2016, lembra “a famosa frase ‘Chegou a hora dos
leigos!’... mas – diz ele - parece que o relógio parou!”. O que
esperamos deste Ano do Laicato é que o relógio seja posto no-
vamente em movimento.
Para que o laicato seja “sujeito” da evangelização, como
pede o Concílio  Vaticano II, é necessário superar a visão de
Igreja do Concilio de Trento que colocava o clero como princi-
pal agente da evangelização. Para que o protagonismo dos lei-
gos possa avançar, a Igreja deve superar o clericalismo– “uma
das maiores deformações que a América Latina deve enfrentar”
– como lembra o Papa na sua Carta ao cardeal Quellet.
Na compreensão comum do povo a palavra “leigo” è refe-
rida à pessoa que não sabe e se sente alheia a determinados
assuntos. Na Igreja, porém, fiéis leigos são chamados “os cris-
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tãos que estão incorporados a Cristo pelo batismo, que formam
o povo de Deus e participam das funções de Cristo: sacerdote,
profeta e rei. Realizam, segundo sua condição, a missão de todo
o povo cristão na Igreja e no mundo” (LG 31; cf. DAp 209).
Por isso, para que o santo Povo de Deus, leigos e leigas, pos-
sa viver as dimensões messiânicas inerentes ao sacramento
do batismo, nós trabalharemos ao longo do Ano do Laicato
com a intenção de recuperar a consciência de que, em virtu-
de do batismo, todos são sacerdotes e sacerdotisas, profetas
e profetisas, reis e rainhas, ajudando-os a exercerem tais fun-
ções “na Igreja e no mundo”.
Os leigos e as leigas exercem seu sacerdócio batismal an-
tes de tudo quando se constituem em assembleia celebrante.
Esta congregação dos batizados e batizadas se torna sacra-
mento da presença de Deus. De fato, Jesus disse: “Onde dois
ou mais estiverem reunidos em meu nome, eu estarei no meio
deles” (Mt 18,20). É a assembleia celebrante, congregada em
nome da Trindade Santa, que pode dizer com toda a força e a
convicção: “O Senhor está no meio de nós!”. Nesta assembleia
todos e todas são concelebrantes. Com efeito, pelo batismo
eles são “consagrados para ser edifício espiritual e sacerdócio
santo” (LG 10).
Leigos e leigas exercem sua profecia batismal no serviço da
Palavra de Deus. No seguimento missionário de Jesus eles re-
correm à Palavra de Deus como fonte de sua espiritualidade.
Esta Palavra é a alma da ação evangelizadora. Conhecer a Pa-
lavra impulsiona a anunciá-la. Desconhecer a Palavra é des-
conhecer o próprio Cristo. Leigos e leigas através da Escola
da Palavra aprendem a interpretar adequadamente os textos
bíblicos e a partilhar o Pão da Palavra na liturgia, na cateque-
se e nas várias expressões pastorais. Toda pessoa batizada se
torna, pois, agente da pastoral bíblica e se preocupada com a
animação bíblica de qualquer ação pastoral (cf. DAp 248).

6 Leigos e leigas
Em virtude do batismo os leigos se tornam reis e rainhas,
chamados a viver a caridade a partir das três dimensões mes-
siânicas do batismo. A dimensão batismal régia os torna todos
corresponsáveis pela condução do povo de Deus, pela manu-
tenção do patrimônio da Igreja e pela organização eclesial.
Eles exercem esta função régia ao ocuparem cargos na admi-
nistração ou na coordenação das comunidades, paróquias ou
diocese.
Não se pode negar que houve avanços significativos no pro-
tagonismo dos leigos no âmbito da vida eclesial. A formação
teológica dos nossos leigos foi aprimorada, surgiram diferen-
tes ministérios e novas formas de organização eclesial, foram
melhor distribuídas as responsabilidades pastorais. Entriste-
ço-me, todavia, quando percebo que há ainda tentativas de es-
vaziar e anular a participação dos leigos, silenciando sua voz,
reduzindo seus espaços de comunhão e participação. Conti-
nua acontecendo o que Papa Francisco lembra em sua já cita-
da carta:
“O clericalismo... limita as diversas iniciativas e esforços e,
ousaria dizer, as audácias necessárias para poder anunciar
a Boa Nova do Evangelho em todos os âmbitos da atividade
social e, sobretudo, política. O clericalismo, longe de dar im-
pulso aos diversos contributos e propostas, apaga pouco a
pouco o fogo profético do qual a Igreja está chamada a dar
testemunho no coração de seus povos”.
Papa Francisco, falando aos membros do Comitê Diretivo
do Celam em Bogotá no dia 7 de setembro de 2017, diz que
“a esperança na América Latina passa através do coração, da
mente e dos braços dos leigos”. Para que isso ocorra, precisa-
mos de
“um laicato cristão que esteja disposto a contribuir, como
crente, nos processos dum desenvolvimento humano autên-
tico, na consolidação da democracia política e social, na
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superação estrutural da pobreza endêmica, na construção
duma prosperidade inclusiva fundada em reformas dura-
douras e capazes de tutelar o bem social, na superação das
desigualdades e na salvaguarda da estabilidade, no deli-
neamento de modelos de desenvolvimento econômico sus-
tentável que respeitem a natureza e o verdadeiro futuro do
homem que não passa por um consumismo ilimitado e na
rejeição da violência e na defesa da paz”.

Alguns meses depois, no dia 16 de janeiro deste ano, Papa


Francisco no seu discurso aos bispos do Chile ressaltou com
veemência a questão do protagonismo dos leigos, afirmando
que eles não são servos e empregados do bispo e do padre. Eis
na íntegra as suas palavras:
“A falta de consciência de pertencer ao povo fiel de Deus
como servidores, e não como patrões, pode-nos levar a uma
das tentações que mais dano causa ao dinamismo missio-
nário, que somos chamados a promover: o clericalismo, que
é uma caricatura da vocação recebida... A falta de consciên-
cia do fato que a missão é de toda a Igreja, e não do padre
ou do bispo, limita o horizonte e – o que é pior – corta todas
as iniciativas que o Espírito pode suscitar no meio de nós.
Digamo-lo claramente: os leigos não são os nossos servos,
nem os nossos empregados. Não precisam de repetir, como
«papagaios», o que dizemos. «O clericalismo longe de dar
impulso às diferentes contribuições e propostas, apaga
pouco a pouco o fogo profético do qual a Igreja inteira está
chamada a dar testemunho no coração dos seus povos. O
clericalismo esquece que a visibilidade e a sacramentalida-
de da Igreja pertencem a todo o povo fiel de Deus (cf. Lumen
gentium, 9-14), e não só a poucos eleitos e iluminados».

Consciente de que para uma verdadeira mudança de menta-


lidade acerca dos leigos é imprescindível cuidar da formação
dos futuros padres, Papa Francisco no mesmo discurso disse:

8 Leigos e leigas
“Os Seminários devem pôr o acento no fato que os futu-
ros sacerdotes sejam capazes de servir o santo povo fiel de
Deus, reconhecendo a diversidade de culturas e renuncian-
do à tentação de qualquer forma de clericalismo... Cabe a
nós pastores discernir como prepará-los para realizar a sua
missão nesse cenário concreto e não nos nossos «mundos
ou situações ideais». Uma missão que se realiza em união
fraterna com todo o povo de Deus. Lado a lado, impelindo
e incentivando o laicato num clima de discernimento e si-
nodalidade, duas características essenciais do sacerdote
de amanhã. Não ao clericalismo e a mundos ideais, que só
entram nos nossos esquemas, mas que não tocam a vida de
ninguém” (Francisco - Discurso aos Bispos do Chile -Santia-
go, 16 de janeiro de 2018).
Estes desafios propostos aos leigos pelo Papa e que de ime-
diato podem aparecer impossíveis, na realidade são vivencia-
dos nas atitudes daqueles leigos e leigas que se esforçam para
manter bons relacionamentos, tecem relações de amizade, sa-
bem carregar as dificuldades, as dores, os problemas das pes-
soas que encontram no cotidiano da vida. Nelas a Igreja vive
tudo aquilo que o homem comum vive: mesmas esperanças,
dificuldades, problemas, as mesmas turbulências da história.
Ela, porém, vive essas realidades de um modo novo, numa óti-
ca nova e mais ampla. E isso ela faz não porque possua ins-
trumentos mais poderosos, obras maiores e mais influentes,
mas em virtude da Vida de Cristo que com a sua Páscoa mol-
da a inteligência, a consciência e a prática de vida do cristão.
O cristão tem condições de estabelecer uma ligação entre o
momento histórico que vive e a redenção de Cristo sempre
atuante. O significado de tudo se encontra n’Ele, mas é o Es-
pírito Santo que no-lo comunica como realidade que já nos
pertence, que percebemos já ser nossa e que nos une a Cristo
e aos homens.

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2.
Para viver em plenitude o batismo

1. Por que descobrir ou redescobrir o batismo?


Para que leigos e leigas assumam sua missão na Igreja e no
mundo é preciso que eles descubram o batismo como funda-
mento da sua existência cristã e tenham consciência da sua
importância para a sua vida pessoal, segundo a palavra do
Apóstolo: “Vós todos que fostes batizados em Cristo vos reves-
tistes de Cristo” (Gl 3,27). Esta consciência não se forma em
poucos dias. De fato, a existência inteira do fiel leigo “tem por
finalidade levá-lo a descobrir a radical novidade cristã que bro-
ta do Batismo, sacramento da fé, a fim de poder viver as suas
exigências segundo a vocação que recebeu de Deus” (João Paulo
II, Exortação Ap.  Christifideles laici, n. 10). Redescobrir o ba-
tismo é, pois, tomar consciência da dignidade do ser cristão,
conforme a admoestação do papa São Leão Magno:
“Toma consciência, ó cristão, da tua dignidade. E já que
participas da natureza divina, não voltes aos erros de antes
por um comportamento indigno de tua condição. Lembra-
-te de que cabeça e de que corpo és membro. Recorda-te que
foste arrancado do poder das trevas e levado para a luz e o
reino de Deus. Pelo sacramento do batismo te tornaste tem-
plo do Espírito Santo! Lembra que o preço de tua salvação é
o sangue de Cristo” (Discurso para o Natal,1).
Compreender o significado do sacramento do Batismo sig-
nifica entender a essência da vida, da missão e da dignidade
do cristão. Em nossa sociedade secularizada e marcada pela
fragmentação da experiência humana, nós batizados devemos
voltar às raízes do nosso batismo. Temos a responsabilidade
de reavivar a consciência desse acontecimento que, tornan-

10 Para viver em plenitude o batismo


do-nos “uma coisa só”, mediante essa unidade, torna presen-
te Cristo na história, no espaço e no tempo. Somos chamados
a alcançar aquela maturidade que unicamente pode recom-
por a experiência do homem, tornando-o capaz de objetivos
audaciosos. Só assim, só vivendo o nosso batismo, só sendo
homens e mulheres livres, congregados na unidade, seremos
também cristãos testemunhas, “sal da terra e luz do mundo”
(Mt 5,13-14).

Infelizmente, nas nossas paróquias não só aumentou o nú-


mero dos que não receberam o batismo, mas também muitos
dos batizados não têm consciência ou se esqueceram daqui-
lo que se tornaram em virtude da graça recebida, a saber, o
fato de serem “novas criaturas” que se revestiram de Cristo.
Essas situações exigem de nossa parte um intenso trabalho
missionário que proponha itinerários de iniciação à vida cris-
tã aos jovens e aos adultos que venham solicitar a recepção
do batismo ou da crisma, e que reavive e reforce a formação
cristã daqueles que se afastaram da fé inicial. Este é, de fato, o
nosso maior desafio: educar a fé das pessoas e nela fazer per-
severar e progredir numa época em que a vontade e os meios
de transmitir as razões e os conteúdos da fé em continuidade
com a sã tradição parecem ter perdido o vigor e a capacidade
de gerar adesão e convicção.
Tertuliano, teólogo do III século, explicava com clareza que
não nascemos cristãos, mas que “nos tornamos cristãos”, e
afirmava também que “nós, peixinhos, que tomamos o nosso
nome do ICHTHUS*, Jesus Cristo, nascemos na água e somen-
te ficando nela somos salvos”. Com esta bela imagem Tertu-
liano nos introduz na compreensão daquilo que significa ser
batizado (“nascer na água”), isto é, ser mergulhado totalmen-
te em Cristo. Sem Ele seríamos como peixes fora da água, fora
* Este termo grego significa “peixe” e era usado pelos primeiros cristãos como símbolo de
Jesus Cristo, porque as suas letras eram o acrônimo da profissão de fé cristológica: “Jesus
Cristo Filho de Deus Salvador”.

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do seu natural elemento vital. O batismo, que etimologica-
mente significa “mergulho”, é o sinal que expressa o nosso ser
“mergulhados em Cristo”. Certamente, estamos nos movendo
na ordem dos sinais, mas sabemos muito bem que os “sinais”
apontam para uma realidade concreta.

2. Três nascimentos
Mergulhados em Cristo nascemos para a vida cristã. Na ver-
dade, nós passamos por três nascimentos: o físico, o espiritual
e o carnal. São Máximo, o Confessor, a esse respeito escreve:
“O nascimento físico claramente não depende de nós. De
fato, não nascemos porque quisemos nascer, mas porque
outros nos doaram a vida. Há, porém, o nascimento espiri-
tual que em parte é um dom, pois é realizado pelo Espírito,
mas em parte depende também da nossa vontade, pois te-
mos a possibilidade de aceitar o dom da fé, o batismo, ou de
recusá-lo. Ninguém o impõe. Recusar o dom e colocar nós
mesmos como critério do bem e do mal, com a consequên-
cia de escolher o mal, é como um terceiro nascimento, o
da “carne”, como fala São Paulo, o qual distingue os frutos
do Espírito dos frutos da carne, onde “carne” não é a reali-
dade material corpórea, mas a vida vivida não segundo o
Espírito, mas segundo o nosso “eu”. O nascimento espiritual
orienta para o bem, o carnal orienta para o mal. Em última
análise, o “segundo nascimento” é aquele processo de pro-
gressiva humanização que vem do fato de termos acolhido
o dom do Espírito que gera em nós uma vida nova.

3. Batismo: começo e fundamento da vida cristã


Em virtude do batismo somos gerados à vida nova em Cris-
to. O batismo marca não só o começo cronológico da nossa
vida cristã, mas também o seu fundamento. Com o batismo
se põe o fundamento da vida cristã sob o sinal de uma vida

12 Para viver em plenitude o batismo


vivida de forma filial e fraterna. O batismo é a entrada na vida
espiritual, a porta de acesso aos outros sacramentos. É o sa-
cramento que liberta do pecado e nos regenera como filhos de
Deus, nos torna membros de Cristo, nos incorpora na Igreja.
4. Dinamismo da vida batismal
Nós não nascemos cristãos, mas nos tornamos cristãos atra-
vés de um processo longo e dolorido. Antigamente, antes de
poder receber o batismo era necessário passar por um longo
percurso, por uma preparação de três ou quatro anos. O ca-
tecúmeno era acompanhado pelos introdutores, apresentado
ao bispo, inscrito no livro, vivia tempos de jejum, de cateque-
se. Era um período em que a pessoa tomava progressivamen-
te consciência do seu desejo de aderir a Cristo e, por isso, de
renunciar a Satanás (isto é, a uma vida desordeira e medíocre,
a um mundo de falsidade e de mentiras).
O batismo não se concluía no dia em que era recebido. Os
sinais que eram entregues – a veste branca, a vela acesa hau-
rindo do Círio pascal – exigiam que fossem manifestados na
vida cotidiana. Toda a nossa vida nada mais é que um longo
processo de gestação e de vir à luz para que o homem novo
nascido nas águas do batismo assimile a si e transforme o ho-
mem carnal. O homem novo deve plasmar o homem natural e
instintivo através dos sacramentos e da luta espiritual.
O batismo nos introduz numa novidade de vida, numa qua-
lidade de vida nova. A minha inteligência, a minha vontade,
os meus sentidos, os meus gostos precisam ser moldados so-
bre a forma da vida nova recebida, senão eu sou sim batizado,
mas continuo pensando segundo o homem velho, segundo a
“lógica da carne”, e continuo sendo um homem velho que só
tem uma camada de “verniz” do homem novo. Pelo contrário,
depois do batismo se instaura um dinamismo que vai pro-
gressivamente curando o homem inteiro: corpo, inteligência,
vontade, sentimentos, sentidos. Tudo em nós pede que seja
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restaurado. Se não for assim, corremos o risco de vivermos na
mentira. Que adiantaria termos recebido a graça do batismo,
se ignorarmos a vida nova recebida e continuarmos a viver
na falsidade do homem velho? Por que não registramos qua-
se nenhuma diferença entre a vida da maioria dos cristãos e
aquela dos pagãos? Por que nós batizados não somos sal da
terra e luz do mundo? Exatamente porque, ainda presos nos
grilhões da estupidez do pecado, não acolhemos a vida nova
e seguramos tenazmente aquela que já morreu. Persistimos
em proteger o nosso cadáver, a vida morta ligada à nossa fra-
gilidade.
Se, ao contrário, tomarmos consciência de que pelo batis-
mo já somos salvos, trabalharemos para que toda a nossa vida
seja um “sim” a todo o nosso ser agora redimido. O sacramen-
to nos oferece a totalidade do dom, mas nós o assimilamos
lentamente e aos poucos. Nossa tarefa é lutarmos para nos
tornarmos plenamente aquilo que somos, fazendo transpare-
cer a vida nova em todas as circunstâncias da vida concreta.
Quanto mais seguirmos e favorecermos o crescimento em nós
dessa vida redimida, mais nos tornaremos familiares à sua
linguagem.

5. Batismo como participação na morte e na ressur-


reição de Cristo (Rm 6)
Na carta aos Romanos Paulo explica a vida cristã como mor-
te e ressurreição de Jesus a partir do batismo.
“Que diremos? Vamos permanecer no pecado para que a
graça aumente? De modo algum. Nós que já morremos para
o pecado, como vamos continuar vivendo no pecado? Acaso
ignorais que todos nós, batizados no Cristo Jesus, é na sua
morte que fomos batizados? Pelo batismo fomos sepultados
com ele na morte, para que, como Cristo foi ressuscitado
dos mortos pela ação gloriosa do Pai, assim também nós

14 Para viver em plenitude o batismo


vivamos uma vida nova” (Rm 6,1-4).
Somos como “vivos provindos dos mortos” (Rm 6,13). O even-
to de Cristo ressuscitado da morte possui caráter definitivo e
todos aqueles que estão envolvidos nesse evento participam
da sua eficácia e obtêm a vida nova. O que Cristo viveu em si
mesmo é comunicado a todos os membros do seu corpo.
São Paulo mostra com clareza a situação paradoxal daquele
que crê e como ela deve ser vivida: o cristão, de um lado é li-
berto do mal pela morte e ressurreição de Jesus, mas de outro
lado, ele está ainda exposto à força e à tirania do pecado. O
que significa que o batizado participa da ressurreição de Jesus
Cristo? Significa que o pecado perde o seu poder sobre ele;
significa que nós, enquanto crentes, não estamos mais sob o
domínio da escravidão do pecado. Cristo venceu a morte e o
seu amor é mais forte do meu pecado.
Por isso, nós devemos ter consciência de que somos feitos
capazes de viver uma vida livre do mal, isto é, livres para es-
colher entre as seduções do pecado e a vida colocada sob a
graça de Deus. O batismo, que é o sacramento da fé, possui os
traços da passagem, da escolha (imersão-emersão, renúncia-
-adesão). A graça soltou a minha liberdade, reabilitou-me a
escolher o bem. Por isso, agora posso fazer escolhas concretas
que me protejam contra o mal, contra tudo o que me faz mor-
rer enquanto filho de Deus, contra tudo aquilo que não me
permite viver segundo a minha mais profunda e verdadeira
identidade. Esta escolha sempre encerra a exigência da luta
e do discernimento. Ela comporta uma tendência a aceitar a
morrer em favor daquilo pelo qual se quer viver.
Apresentam-se inúmeras ocasiões ao longo do dia para que
eu escolha viver não segundo o homem velho: não responder
de forma imprópria a um irmão, respeitar seu jeito de traba-
lhar diferente do meu, expressar uma idéia deixando ao ou-
tro a liberdade de não segui-la, etc. Essas escolhas mostram
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o quanto sou livre interiormente e como não preciso mais
justificar-me e defender-me. As várias ocasiões da vida nas
quais nos sentimos incompreendidos, mal interpretados nas
nossas intenções, não apoiados nas nossas propostas, podem
ser vistas como meios de que Deus se serve para libertar-nos
do egoísmo. Nesses casos deveríamos rezar assim: “Peço-te, ó
Deus: limpa meus olhos e meu coração, mostra-me qual obra
estás realizando em mim para libertar-me”.
A vida espiritual exige treinamento constante. Por isso, é
necessário sempre discernir com diligência, porque, às vezes,
o combate pode assumir a forma da fuga. Os ritos do batismo,
de alguma maneira, representam também um drama, pelo
fato de que o candidato, até o momento do batismo, pertence
às trevas e procura fugir delas. Com o batismo começa con-
cretamente a dura luta que acompanhará a vida toda. Por esse
motivo o celebrante põe as mãos na cabeça do neófito em si-
nal de proteção: todos aqueles que se decidem seguir a Cristo
devem preparar-se para uma luta persistente e cansativa. De-
vemos lembrar que esta luta é a do próprio Cristo, é o mesmo
Cristo que a combate em nós. No primeiro domingo de qua-
resma Santo Agostinho explica muito bem essa dimensão:
“De fato, Cristo foi tentado pelo demônio. Mas em Cristo
também tu eras tentado. Porque Cristo assumiu a tua con-
dição humana, para te dar a sua salvação; assumiu a tua
morte, para te dar a sua vida; assumiu os teus ultrajes, para
te dar a sua glória; por conseguinte, assumiu as tuas tenta-
ções, para te dar a sua vitória. Se nele fomos tentados, nele
também vencemos o demônio. Consideras que o Cristo foi
tentado e não consideras que ele também venceu? Foste tu
a ser tentado nele, mas reconhece também que nele tu és
vencedor. O Senhor poderia impedir o demônio de aproxi-
mar-se dele; mas, se não fosse tentado, não te daria o exem-
plo de como vencer na tentação”. (Agostinho, “No Cristo fo-
mos tentados e nele vencemos o demônio”, no Comentário sobre

16 Para viver em plenitude o batismo


os Salmos, (Sl 60,2-3; CCL 39,766).
6. Feitos Corpo de Cristo. Nossa pertença à Igreja

Jesus, pelo dom do seu Espírito, continua no meio de nós


que somos o seu corpo presente na história. De fato, é o Es-
pírito Santo  que constitui os batizados filhos de Deus e, ao
mesmo tempo, membros do corpo de Cristo, a Igreja. Paulo
recorda-o aos cristãos de Corinto: «Foi num só Espírito que
todos nós fomos batizados, a fim de formarmos um só corpo»
(1 Cor 12, 13), de forma que o apóstolo pode dizer aos fiéis
leigos: «Sois agora corpo de Cristo e Seus membros, cada um
na parte que lhe toca» (1 Cor 12, 27).

Regenerados como “filhos no Filho”, os batizados são inse-


paravelmente “membros de Cristo e membros do corpo da Igre-
ja”. Através do sacramento, Jesus une o batizado à Sua morte
para uni-lo à Sua ressurreição, despoja-o do “homem velho”
e reveste-o do “homem novo”, isto é, de Si mesmo: “Todos vós
que fostes batizados em Cristo — proclama o apóstolo Paulo —
vos revestistes de Cristo” (Gl 3, 27). Daí resulta que “nós, embo-
ra sendo muitos, constituímos um só corpo em Cristo” (Rm12,
5). Viver em Cristo significa, por isso, viver a nossa pertença
à Igreja. Assim, o batismo nos insere em Cristo, inserindo-nos
na Igreja, seu corpo místico, que prolonga a sua presença na
história.
Depois da Ascensão, Cristo está junto do Pai no seu corpo
glorioso e aqui na terra no seu corpo eclesial, que continua
a amadurecer e a viver na história, na espera da vinda do Se-
nhor. Se depois do Pentecostes Cristo é uma coisa só com o
seu Corpo, nós batizados não podemos viver a não ser em
comunhão profunda com Cristo e com os irmãos. É uma co-
munhão não unicamente com a Igreja terrestre, mas também
com a Igreja celeste. De fato, no dia do batismo o nosso nome
foi inscrito no livro da Igreja celeste, dos eleitos: do batismo

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tomamos a cidadania celeste.
Já na Igreja antiga a preparação ao batismo era concebida
como uma introdução progressiva à vida da Igreja e o cate-
cúmeno era acompanhado passo a passo em sua inserção na
comunidade. Quando celebramos a eucarística invocamos por
duas vezes o Espírito Santo. A primeira vez, sobre o pão e so-
bre o vinho para que Ele os transforme no corpo e no sangue
do Senhor; a segunda vez, sobre a comunidade reunida, para
que comendo desse pão e desse vinho, ela se torne o corpo
de Cristo. Portanto, o batismo, a crisma e a eucaristia aperfei-
çoam a união com Cristo e a união entre nós como irmãos. O
batismo é a porta de entrada, pois nos insere no corpo ecle-
sial; e a eucaristia nutre essa vida de comunhão que exige per-
manecer numa dinâmica de renúncia aos modelos de domina-
ção, de isolamento, de exclusão, de indiferença.
Vejamos agora as razões que fundamentam esta vida de
comunhão. Por meio do batismo recebemos gratuitamente a
vida de Deus, mas que tipo de vida é essa? A vida de Deus é a
comunhão com a vida das três Pessoas divinas. Este é o dom
que recebemos. Na medida em que participo dessas relações,
torno-me eu mesmo o que sou: pessoa, ser de comunhão. O
Espírito que recebemos como dom se exprime em nós como
comunhão. Jesus Cristo na sua vida terrena nos ensina como
viver a vida humana na modalidade divina, isto é, a da comu-
nhão, de maneira filial e fraterna, amando a Deus Pai e aos
nossos irmãos. A comunhão entre nós é o mais bonito louvor
ao Pai. Com o batismo recebemos o imenso dom da comunhão
trinitária e somos chamados a vivê-la entre nós! Não é por
acaso que o âmbito onde somos mais tentados seja o da vida
fraterna!

18 Para viver em plenitude o batismo


3.
Cristãos testemunhas

1. Tudo isto é possível graças à força do Batismo


Somos cristãos testemunhas quando mostramos a vida
nova que recebemos no batismo. O sacramento do batismo
gera uma novidade de vida, doa uma qualidade de vida nova
que deve tornar-se visível na vida cotidiana. É nesta dimensão
de concretude - afirma o Papa Francisco - que entra em campo
a necessidade e a urgência do cristão enquanto testemunha,
sal da terra e luz do mundo.
“Com efeito, é em virtude do Batismo que, libertados do pe-
cado original, somos inseridos na relação de Jesus com Deus
Pai; que somos portadores de uma esperança nova, porque
o Batismo nos dá esta nova esperança: a esperança de per-
correr o caminho da salvação, a vida inteira. É esta espe-
rança que nada e ninguém pode desiludir, porque a espe-
rança não decepciona. Recordai-vos: a esperança no Senhor
nunca desilude. É graças ao Batismo que somos capazes de
perdoar e amar também quem nos ofende e nos faz mal; que
conseguimos reconhecer nos últimos e nos pobres o rosto do
Senhor que nos visita e se faz próximo. O Batismo ajuda-nos
a reconhecer no rosto dos necessitados, dos sofredores, tam-
bém do nosso próximo, a face de Jesus. Tudo isto é possível
graças à força do Batismo! ”(FRANCISCO - Audiência geral-
quarta-feira, 8 de janeiro de 2014).
A vida segundo o Espírito suscita e exige de todos e de cada
um dos batizados o seguimento e a imitação de Jesus Cristo, no
acolhimento das suas Bem-aventuranças, na escuta e medita-
ção da Palavra de Deus, na consciente e ativa participação na
vida litúrgica e sacramental da Igreja, na oração individual,
familiar e comunitária, na fome e sede de justiça, na prática
do mandamento do amor em todas as circunstâncias da vida
19
e no serviço aos irmãos, sobretudo os pequeninos, os pobres
e os doentes.(Christifideles laici, 16).
O “problema” da nossa fé é a encarnação. Se o batismo é o
sacramento que nos gera à vida nova, que nos doa uma quali-
dade de vida nova, isto significa que ele nos pede uma dispo-
nibilidade para que esta vida nova se encarne, tome carne em
nosso modo de pensar, sentir, querer e agir. A vida de fé, então,
progressivamente plasma o meu modo de trabalhar, de cola-
borar, de gerenciar a economia, os tempos de descanso, etc.

2. Receber a vida
O batismo é recebido, nós somos batizados. O mesmo acon-
tece também com a nossa vida: nós a recebemos de nossos
pais, pois é impossível dá-la a si próprios. Todo homem é
consciente de que não pode de forma alguma dar-se a vida ou
dispor dela; só pode recebê-la de...
Papa Francisco numa catequese sobre o batismo lança esta
pergunta:
“Uma pessoa pode batizar-se a si mesma? Ninguém pode
batizar-se a si mesmo! Ninguém. Podemos pedi-lo, desejá-
-lo, mas temos sempre a necessidade de alguém que nos
confira este Sacramento em nome do Senhor. Porque o Ba-
tismo é um dom que é concedido num contexto de solicitude
e de partilha fraterna. Ao longo da história sempre um ba-
tiza outro, outro, outro... é uma corrente. Uma corrente de
Graça. Mas, eu não me posso batizar sozinho: devo pedir o
Batismo a outra pessoa. É um ato de fraternidade, um ato
de filiação à Igreja” (FRANCISCO - Audiência geral- quarta-
-feira, 8 de janeiro de 2014).
Quando tomamos consciência de que a vida e o batismo são
dons que recebemos, sentimo-nos como que expropriados de
nós mesmos, porque nós instintivamente somos como que le-

20 Cristãos testemunhas
vados a não depender de ninguém e a querer sozinhos geren-
ciar a nossa vida.
Viver como “expropriados” significa permanecer na cons-
ciência de ser “mandados”. Este é o espaço no qual Deus pode
agir: quando ficamos um pouco atrás, Deus pode fazer conos-
co coisas maravilhosas. Viver como “expropriados” significa
renunciar a viver a posse de si mesmos, não estar preocupa-
dos consigo mesmos, aprender a pensar não sendo nós os
protagonistas dos nossos pensamentos, mas perguntando-
-nos sempre: “Senhor, o que queres fazer de mim?”. A vida in-
teira é um pôr-se de lado para que seja Deus a agir; assim, ela
se torna o espaço no qual Deus pode operar. Nossa tarefa é
remover os obstáculos que impedem o fluir da vida.
Deus por sua vez faz uma promessa irrevogável: doa a sua
disponibilidade sem reservas. O batismo nos garante que so-
mos destinatários da irrevogável disponibilidade de Deus. No
começo da celebração batismal o nome de cada um é pronun-
ciado na assembleia cristã diante de Deus. Assim, é procla-
mado que junto de Deus há um lugar para cada um, em sua
própria singularidade. Deus se propõe como interlocutor e
garante do “nome” de cada um e o põe entre os outros.
O Senhor Jesus estabeleceu uma aliança conosco e seu re-
sultado é a graça batismal. Acolher o batismo para nós signi-
fica acolher a soberania de Deus na nossa vida: somos seus!
Pertencemos a Ele! A fé batismal professa Jesus como o Se-
nhor, como “Aquele que é” e que nos oferece uma vida plena, à
altura da dignidade do viver humano.

3. Um olhar novo
Somos como árvores com as raízes no céu e a copa na terra.
Em nossa vida profundamente humana, marcada pela dimen-
são do espaço e do tempo, somos chamados a estar na dimen-

21
são da história de maneira nova. Deus não para de revelar-se,
pois a história sagrada continua no meio de nós e por nós.
Como isto concretamente pode acontecer? É preciso per-
ceber o fluxo de vida divina que flui dentro de nós, isto é, a
comunhão com a vida pessoal de Deus. Vivendo esta relação,
tornamo-nos uma ponte, o espaço onde o mundo divino e o
mundo humano podem entrar em contato. Isso se dá especial-
mente na liturgia. Nós podemos continuamente beber dessa
fonte; em cada instante podemos ter acesso aos benefícios
dos eventos de salvação da morte e ressurreição de Cristo
e santificar a nossa história. O tempo e a história que Deus
nos deu se tornam então uma aprendizagem do amor. Só o
egoísmo nos torna impermeáveis a esta penetração do eterno
na história.
Como batizados, cristãos, leigos e leigas, somos chamados
a intuir e decifrar a voz de Deus na história. É isto que sig-
nifica ser profetas, ser testemunhas: aprender a verdadeira
sabedoria da vida. Homens e mulheres capazes de ler a trama
do desígnio de salvação de Deus. Muitas vezes nós pedimos
sinais ao Senhor, mas o problema é saber reconhecê-los. Face
àquilo que nos acontece, temos sempre duas possibilidades.
Dizer: “Isso me prejudicou” ou dizer: “Isso me foi favorável, le-
vou-me a dar mais espaço a Deus, a libertar-me de tudo aquilo
que não é amor”. O vértice deste olhar espiritual é alcançado
quando se consegue ver o bem no mal. Muitas vezes a ação
poderosa e criadora do Espírito se exprime exatamente nos
momentos de fracasso, fragilidade e luto. Aqueles que entre-
gam continuamente a própria causa nas mãos de Deus são
aqueles que em tudo conseguem ver a ação de Deus.

4. Permanecer numa dinâmica de conversão


Sobre a palavra ‘conversão’, tão central na experiência cristã,
pesa um forte preconceito. Muitas vezes a palavra conversão

22 Cristãos testemunhas
é interpretada como sinônimo de renúncia, de mortificação,
de “não é permitido”, de limites impostos aos espaços da vida,
de “não se poder fazer”. A conversão evangélica, ao contrário,
deve ser entendida como um processo constante do vir a ser
da pessoa batizada, uma disposição estável do seu coração.
A conversão diz respeito à transformação profunda do nos-
so coração, não às atitudes exteriores individuais. Conver-
ter e mudar o coração dos homens é o maior milagre feito
por Jesus. Às vezes não podemos mudar a situação exterior
(doenças, dificuldades), mas podemos mudar o nosso modo
de viver essas situações, e esta é a conversão do coração que
Jesus pode realizar, porque as suas palavras são divinas e
por isso elas têm poder e força para mudar aquele que as
acolhe. Somos chamados a nos deixar converter no nosso
íntimo (Magdeleine de Jesus).
A conversão é uma oportunidade, é uma ocasião oferecida
por Jesus, o homem novo, o Senhor capaz de renovar radical-
mente a nossa humanidade. O encontro com o rosto de Deus
Pai, em Cristo, graças ao Espírito Santo, evidencia o quanto
seja preciosa a nossa identidade e liberdade. Diante de um
dom tão grande que nos exalta não devemos nos esquivar,
mas antes nos sentir seriamente convidados a tomar com co-
ragem decisões profundas e duradouras. O cristianismo não é
algo medíocre, mas sim uma valiosa proposta para vivermos
segundo a nossa originária nobreza.
O batismo nos torna capazes de reconhecer o bem e de re-
sistir ao mal. Esta conversão nos introduz numa dinâmica de
contínuo discernimento. Aquele que tem fé, em força de seu
batismo aprende aos poucos a renunciar a tudo aquilo que o
desumaniza, que não está em sintonia com a sua identidade
mais profunda de filho de Deus. Trata-se de um caminho de
progressiva integração das dimensões de sua personalidade e
dos acontecimentos que o atingem, para que tudo nele possa

23
manifestar sua identidade de filho de Deus.
Uma disposição de espírito que mais do que outras nos per-
mite permanecer na dinâmica da conversão é a obediência.
“Sem a obediência aos superiores e à Igreja os maiores de-
sejos de santidade e amor não trarão nenhum fruto porque
ficam no plano humano da própria vontade... Reflete bem,
porque a obediência será muitas vezes para ti uma das mais
duras exigências do Amor. É toda a tua liberdade, que ti é
tão preciosa, é toda a tua vontade, à qual até agora nunca
inteiramente renunciaste, que terás que entregar nas mãos
de uma criatura humana que talvez julgarás sem grandes
capacidades e sem real santidade” (Magdeleine de Jesus).

5. A vida nova assume em nós a forma da diaconia


O batismo requer que a vida cristã se desenvolva como me-
mória daquilo que nele foi definitivamente oferecido. Trata-se
de memória objetiva: torno-me sempre mais consciente do
dom que Deus me concedeu e que nunca mais será retirado,
do seu excedente inesgotável.
O batizado que se coloca a serviço dos outros e vive o dom
de si, é sinal de uma liberdade adulta. A graça batismal toma
em nós a forma da diakonia, do serviço que desarma todas as
formas de competição, de concorrência, e faz saborear a bele-
za de ver a vida dos outros florescer.
O Espírito, em sua exuberância efusiva, tece relações, favo-
rece percursos de reconciliação, colaboração e corresponsa-
bilidade. E assim a comunidade cristã é vivificada por esse
mesmo espírito de amor e fraternidade. Cristo ofereceu-se ao
Pai em favor da humanidade para permitir-lhe ter novamen-
te acesso ao Pai. Nós também somos chamados a oferecer a
nossa vida em favor da humanidade. Depois da redenção rea-
lizada por Cristo, também eu posso viver uma vida doada no

24 Cristãos testemunhas
serviço, na entrega de mim mesmo, buscando em fraternida-
de o último lugar, submetido a todos, sendo humilde em pen-
samentos, palavras e ações, tanto diante dos pequenos como
dos grandes, no sucesso como no fracasso, ao receber louvo-
res como também injúrias.

6. Uma vida santa


Santo significa “diferente”, “separado”. Só Deus é santo, mas
nos pede: “Sede santos porque Eu sou Santo”. Somos todos
chamados à santidade, porque somos filhos. Somos santos
quando nos tornamos o que somos: filhos de Deus.
“Que nossos irmãos ao nos encontrar possam encontrar
verdadeiros filhos de Deus, verdadeiros irmãos e irmãs de
Jesus Cristo, verdadeiros membros da Igreja” (FRANCISCO -
Audiência, quarta feira, 08 de janeiro de 2014).
É uma questão de parentesco: somos chamados a viver
como Deus porque temos a sua mesma vida. Em virtude do
batismo circula em nós a mesma vida divina. Podemos diver-
gir dos esquemas mundanos porque somos como Ele.
A nossa santidade não é algo estranho. A santidade é aquele
comportamento tão perfeitamente humano que é divino. É a
plenitude da vida e da alegria que há em Deus, plenitude que
somos chamados a experimentar na vida cotidiana. Santo não
quer dizer perfeito, porque temos as nossas misérias, os nos-
sos limites, os nossos pecados. A santidade consiste em viver
até o pecado de maneira diferente, isto é, como lugar de per-
dão e não como lugar de culpa e de expiação. O meu limite é
vivido não como autoflagelação ou ocasião para “devorar” os
outros, mas como lugar de comunhão. Podemos decidir viver
a realidade cotidiana de maneira divina ou de maneira dia-
bólica, na comunhão ou na divisão e fragmentação. A Palavra
que nos chama à santidade de Deus é amor, misericórdia, ter-
nura, experimentados exatamente no pecado, no limite, nos
defeitos.

25
Somos santos porque somos homens e mulheres libertados
pelo sangue de Cristo. Por isso, somos chamados a viver como
pessoas que têm consciência de possuir uma dignidade infini-
ta. Valemos o sangue do Filho. Somos dignos, livres. “Sei que
tenho um Pai, sei que sou filho e honro as minhas origens”.
Tu vens de Deus, podes escolher viver segundo a tua origem.
Somos estirpe eleita, todos os homens são estirpe eleita, mas
muitas vezes não o sabem, temos consciência da nossa digni-
dade divina. A palavra gera em nós os mesmos sentimentos:
Deus é esperança e nos faz esperança, Deus é amor e nos faz
amor, Deus é diferente e nos torna diferentes. Não se trata de
esforço, mas de acolhida da Palavra de Deus. E, como vimos,
não basta ter nascido, mas é preciso crescer no caminho da
salvação. Nós nos tornamos a Palavra que ouvimos.
A graça batismal traz em si a tarefa de nos tornarmos hu-
manos humanizando o mundo no caminho aberto por Jesus,
o Senhor, na fecundidade da única paternidade de Deus e na
força mansa e firme do seu Espírito. A vida que vem do batis-
mo, vida em Cristo, filial, fraterna, é plenamente humana, não
é diferente ou separada dos outros, mas totalmente humana.
O mundo não afasta de Deus, não há oposição entre o estar no
mundo e o permanecer em comunhão com Deus!
O amor de Deus é único, mas é experimentado por cada um
de maneira totalmente pessoal. Deus ama a todos com o mes-
mo infinito amor, e a sua vontade é que todos sejam salvos e
vivam esta vida como filhos da ressurreição. Depende, toda-
via, de cada um viver de tal modo que esteja compenetrado
mais radicalmente por este amor e saiba corresponder-lhe. A
vontade de Deus, sendo Ele amor, é uma só. Cabe, porém, a
cada um descobrir como pode abrir-se mais radicalmente a
este amor e como pode, por sua vez, amá-lo mais plena e to-
talmente.

26 Cristãos testemunhas
4.
Sal da terra e luz do mundo

Logo depois da proclamação das Bem-aventuranças, Jesus


diz aos seus discípulos e a todos nós: “Vós sois o sal da ter-
ra... Vós sois a luz do mundo” (Mt, 5, 13-14). Isto quer dizer
que todos aqueles que assumem as Bem-aventuranças como
programa de vida são chamados a uma responsabilidade ime-
diata e constante. Eles não vão se tornar sal da terra e luz do
mundo num tempo futuro, mas já agora devem sê-lo em bene-
fício de todos os outros que ainda não o vivem.
Jesus é o único que pode dizer de si mesmo: “Eu sou a luz do
mundo, quem me segue não andará nas trevas, mas terá a luz
da vida”. De fato, ele é o sal da sabedoria, o sal que dá sentido à
vida humana na terra. Ele é “a luz verdadeira que ilumina todo
homem” (Jo 1,9). A vida de Jesus foi “sal” e “luz” pelo que Ele
era e vivia. Sua mensagem era sumamente simples, centrada
na doação de si a todos e numa presença compassiva. Afinal
das contas, “sal” e “luz” são os outros nomes da compaixão.
Jesus suscitou um movimento de humanização, portadora de
sabor e de luz, beneficiando todos os que d’Ele se aproxima-
vam. Ele não se preocupou em fazer proselitismo e tampouco
em anunciar uma nova religião ou uma doutrina mais agradá-
vel. Sua presença desvelava a luz e o sal presentes em todas
as pessoas. Nós cristãos poderemos ser sal e luz somente se
procurarmos todos os dias estar em comunhão com Deus, so-
mente se nossas ações mostrarem de fato que Deus é “nossa
luz e nossa salvação” (Sl 27,1).

27
A luz ilumina, aquece, guia, reúne, acalma, reconforta. A Luz
é força fecundante, princípio ativo, condição indispensável
para que haja vida. Ela tem a capacidade de purificar e rege-
nerar. Em oposição às trevas, a luz exalta o que é belo, bom
e verdadeiro. Vivemos imersos num oceano de luz; carrega-
mos dentro de nós a força da luz. Ela sempre está aí, disponí-
vel. Basta abrir-nos a ela com a disposição de acolhê-la e de
operar as transformações que ela inspira. Por ser benfazeja
e criadora, a luz nos permite cantar até mesmo no meio de
impasses, ameaças e conflitos que pesem sobre a nossa vida.
Deixemo-nos, pois, iluminar pela luz de Deus. Levemos a luz
nas nossas pobres e frágeis mãos, iluminando os recantos do
nosso cotidiano. Sejamos uma “sarça ardente” diante dos ou-
tros, consumindo-nos constantemente, no humilde serviço.
Sejamos uma lamparina humilde, brilhando na janela da nos-
sa pobre casa, indicando aos outros o caminho da segurança
e do aconchego.

1. Uma responsabilidade plena

O evangelho não diz que Cristo é a luz do mundo e que


nós devemos refletir esta luz. O evangelho diz: “Vocês
são a luz do mundo” (Mt 5,14). Quer dizer: nós temos a
mesma responsabilidade e a mesma dignidade que o Cristo
ressuscitado. O mesmo vale em relação ao sal: “Vocês são o sal
da terra” (Mt 5,13). Nós temos, portanto, a responsabilidade
de dar o sabor de Deus e de Cristo aos outros.

2. Eis o que somos pela graça do batismo

O Senhor nos diz: “Vós sois a luz do mundo”. Mas estamos nós
prontos a responder-lhe com franqueza: “Sim, nós queremos
sê-lo”? Esta é a resposta que Ele espera de nós. É importante

28 Sal da terra e luz do mundo


também que percebamos que Jesus não nos faz uma exorta-
ção: “Sejam o sal da terra!” e tampouco uma antecipação ou
uma previsão acerca do nosso futuro. Ele usa com muita exa-
tidão o verbo no tempo indicativo presente: “Vós sois o sal da
terra”. Este não é um detalhe insignificante. Diz o que nós so-
mos. E se o somos, deveríamos ser capazes de agir de acordo
com o que somos: se um é médico, faça o médico! Se alguém
é “luz e sal deste mundo”, procure agir nesse sentido, pois
foi constituído tal pela graça do batismo. Certamente, que o
façamos ou não, depende de como usamos a nossa liberdade
com tudo aquilo que se segue. Evitemos, todavia, de pensar,
por uma errônea humildade, que esta definição de Jesus seja
exagerada e excessiva.

3. Sal e luz no ambiente humano

“Vós sois o sal da terra... Vós sois a luz do mundo”. Os des-


tinatários desta breve frase, se pensarmos bem, não somos
somente nós. Jesus está preocupado - e até chegou a chorar
por isso! – com o mundo e com os homens. Profundamente
preocupado com o ambiente humano, Jesus nos diz: “Neste
mundo, que eu muito amo, pelo qual dei a vida e que, toda-
via, continua tão cheio de problemas, vós sois sal e luz”. É esta
uma promessa importante e decisiva.
Graças a Deus, nestes últimos anos começamos a nos preo-
cupar com o ambiente. Todavia, fala-se muito da ecologia, mas
muito pouco da ecologia humana, do ambiente humano. Nos-
sos discursos tratam de questões tais como o ar poluído, o bu-
raco na camada do ozono, o efeito estufa, etc. Evidentemente
esses são problemas reais. Infelizmente, porém, deixamos de
lado quase totalmente a preocupação com a ecologia humana,
com o ambiente humano. Somos peritos em questões psicoló-
gicas, sociais, educacionais, mas nos consideramos como que
derrotados naquelas outras referentes ao ambiente humano,

29
entendido como o conjunto de relações sociais, culturais, mo-
rais, onde cada um de nós vive, onde os jovens desenvolvem a
sua personalidade, onde todos experimentam alegria e sofri-
mento, onde vivemos e morremos. Toda essa realidade escapa
de nós.
Cada um de nós pertence a diversos ambientes: o da família,
do trabalho, das instituições, da empresa, da escola, da socie-
dade. Cada qual vive em relação constante com os outros, mas
como concretamente se processam estas relações? Se hoje até
a família, primeiro “ambiente” que nos acolhe ao nascermos,
se encontra em profunda crise no plano da felicidade huma-
na, da moralidade, do sentido teológico; se nem ela consegue
ser um ambiente positivo, isto significa que há interações, in-
fluências recíprocas que fazem sofrer, corroem, desgastam,
exasperam.
Reconhecemos humildemente que todo ambiente humano,
todo grupo de pessoas em relação, está potencialmente doen-
te. Temos de admitir que sentimos dificuldades em viver jun-
tos. Jesus, porém, olha com carinho para todo esse ambien-
te humano: a pequena família, a grande sociedade, a nação,
o mundo; olha para estas realidades com seu olhar amoroso
que não abandona e nos diz: “Você, no seu ambiente será sal e
luz. Você é tudo isso. Eu mesmo prescrevi isso para você”.
O sal é indispensável, assim como a luz que nos permite vi-
ver, pois todos os seres viventes precisam da luz. As plantas
sem luz morrem e nada do que determina a vida na terra pode
acontecer sem ela. Sal e luz dão também sabor e alegria às
coisas.
A tarefa do cristão, por ser ele membro de Cristo, é esta:
estar no meio dos homens para tornar mais rica de sentido e
mais saborosa a vida deles. Esta é a missão que brota do ba-
tismo! De nada serve termos sido batizados, se pensarmos ser
suficiente não incomodar a ninguém e não ter problemas com
30 Sal da terra e luz do mundo
ninguém. O que os outros esperam de nós é que os amemos
com sinceridade.
Precisamos reconhecer que o clima humano dos ambientes
concretos depende muito dos nossos comportamentos. Chega
a nós uma pessoa cordial, risonha, serena, trazendo alegria.
Quando ela vai embora é como se um pouco de sol tenha ido
embora também. Chega uma pessoa maldizente, fofocando
sobre a vida dos outros. Cedo o clima se torna tenso e insu-
portável. Quando ela vai embora, a gente respira aliviada.
É muito bonita a nossa missão de tornar agradável a vida ao
nosso redor, em círculos concêntricos sempre mais amplos:
na família, no trabalho, nos diversos lugares que frequenta-
mos, nos grupos, na comunidade, na sociedade, no mundo.
Viver com simplicidade, esforçar-se para ser uma pessoa bon-
dosa, bela por dentro, agradável, luminosa. Desse modo nós
tornamos “gostosa” a vida dos outros.
Há muita amargura em torno de nós, há muita tristeza. E
nós cristãos somos aqueles que deveriam levar a alegria aos
ambientes sombrios e desanimados. Quando visitamos um
doente, levamos com certeza um pouco de sabor, um pouco
de gosto, um pouco de consolação. Jesus, porém, quer muito
mais de nós, quer que a vida seja bela e fecunda todos os dias,
mesmo quando não há doentes para visitar. A bondade não é
fraqueza, ela pode e deve ser acompanhada pela firmeza, pelo
cuidado e rigor, sobretudo conosco mesmos. É tão agradável
encontrar uma pessoa bondosa, ouvi-la falar, olhar o seu ros-
to, ver como enfrenta os problemas, que logo dizemos: “Gosto
de encontrar aquela pessoa, sinto-me bem com ela”. O verda-
deiro cristão constrói a si mesmo com simplicidade, vivendo
a caridade.
Somos chamados a tornar saborosa, gostosa a vida dos ou-
tros. Começamos a fazer isso ao partilhar o pão de cada dia.
Em Jesus temos, porém, um recurso magnífico. Mesmo que
31
não houvesse pão para todos, mesmo que esta vida nos cau-
sasse sofrimento, nós nunca deixamos de ser sal e luz, porque
podemos recorrer a uma fonte segura: nós trazemos o poder,
a verdade e a grandeza de um Deus crucificado. Sabemos so-
frer, sabemos esperar além da dor, sabemos até esperar além
da morte.
Quando nos achegamos de uma pessoa prestes a cair no
desespero, podemos devolver-lhe o gosto de viver, se a aju-
damos a transformar sua dor em esperança transfigurada.
Verdadeiramente, Deus nos doa esta capacidade de salgar e
iluminar e nós seremos bons cristãos sem dúvida alguma, se
não estragarmos esse poder de sermos sal e luz, mas antes
considerarmos isso a nossa missão específica.
Precisamos aceitar com todo o nosso coração este bonito
dom. Se todos os fiéis levassem a sério tal graça e a conside-
rassem a coisa mais séria da vida, o horizonte humano ficaria
mais iluminado, porque Jesus não falha em sua Palavra: “Se
fordes sal, se fordes luz, vereis coisas admiráveis” – como diz
o profeta Isaías: “Então brilhará entre as trevas a tua luz, a
tua escuridão será como o meio dia”. Não, porém, a nossa luz
pessoal, e sim a nossa luz enquanto povo de Deus.
Às vezes dizemos: “Aquele cristão é uma boa pessoa”. Não
basta, porém, que isso seja dito com referência a uma só pes-
soa. Deveríamos chegar a dizer: “Como é bom este povo de
Deus! Sabe viver, sabe qual é a sua missão, realiza coisas boni-
tas, dá sabor e luz a tudo aquilo que o cerca. É realmente ma-
ravilhoso encontrar alguém que pertença ao povo de Deus!”.
Será que vai haver uma cultura assim? Uma civilização assim?
É a única coisa desejável. Vale a pena tentar realizar esse so-
nho neste mundo.
Aceitemos este grande desafio, pois todos nós estamos com
dívida em relação ao próximo. Diante da palavra de Deus te-
mos de reconhecer que nem sempre temos oferecido aquela
32 Sal da terra e luz do mundo
luz que faz enxergar, aquele sal que dá o gosto. Não importa,
tentemos mais uma vez. Porém, esforcemo-nos para ser con-
cretos e objetivos. Não façamos grandes programas, não di-
gamos: “Serei luz”. Digamos: “Iluminarei um pouco aquele
cantinho onde vive aquela pessoa que muitas vezes deixei na
escuridão. Tornarei mais “gostosa” a vida dessa outra pessoa,
procurando não revidar sempre, não tratá-la asperamen-
te, evitando ter preconceitos a seu respeito”. É assim que se
transforma a vida. E esse é o presente mais bonito.

4. Sal e luz fazem a diferença

Este é o segredo da felicidade: tentar mudar aquilo que se


pode mudar e acolher com a maior serenidade possível aquilo
que realisticamente não se pode mudar.
É como se Jesus nos dissesse: “Prestem bem atenção! O que
o sal e a lâmpada possuem em comum? O sal e a luz fazem dife-
rença! Portanto, vocês, meus discípulos, serão sal e luz, serão
aqueles que vão fazer a diferença! O sal e a luz transformam as
coisas, por eles a realidade muda. Como seria uma sopa sem
o sal? Intragável! Para onde vocês forem, as coisas terão um
sabor diferente; para onde vocês forem, as coisas aparecerão
numa luz diferente. Será a tua vida, o teu estilo, o tom da tua
voz, o teu olhar que irá mudar as coisas ao teu redor”.
O que o Senhor espera de nós é que levemos uma existên-
cia e tenhamos um comportamento diferentes dos outros
que não são cristãos. Esta “diferença” não é consequência de
teimosa vontade de nos distinguir dos outros, mas é porque a
vida dos cristãos, modelada à vida de Cristo, é realmente ou-
tra, diferente da vida mundana, sem nenhum desprezo para
os homens nossos irmãos, sem nenhuma postura de supe-
rioridade que julgue o mundo como perverso e pecador, mas
com a lúcida consciência de sermos chamados a “estar no mundo

33
sem sermos do mundo” (Cf Jo 17,11-16)
São Paulo, na carta aos Romanos, nos convida a não nos
conformarmos com o mundo: “Não vos conformeis com este
mundo, mas transformai-vos, renovando vossa maneira de pen-
sar e julgar, para que possais distinguir o que é da vontade de
Deus” (Rm 12, 2). No início do II século, um cristão anônimo,
na carta dirigida a Diogneto, mostra qual é o jeito dos cristãos
estarem no mundo.
“Os cristãos, de fato, não se distinguem dos outros homens,
nem por sua terra, nem por sua língua ou costumes. Com
efeito, não moram em cidades próprias, nem falam língua
estranha, nem têm algum modo especial de viver. Sua doutri-
na não foi inventada por eles, graças ao talento e a especu-
lação de homens curiosos, nem professam, como outros, al-
gum ensinamento humano. Pelo contrário, vivendo em casa
gregas e bárbaras, conforme a sorte de cada um, e adaptan-
do-se aos costumes do lugar quanto à roupa, ao alimento e
ao resto, testemunham um modo de vida admirável e, sem
dúvida, paradoxal. Vivem na sua pátria, mas como forastei-
ros; participam de tudo como cristãos e suportam tudo como
estrangeiros. Toda pátria estrangeira é pátria deles, a cada
pátria é estrangeira. Casam-se como todos e geram filhos,
mas não abandonam os recém-nascidos. Põe a mesa em co-
mum, mas não o leito; estão na carne, mas não vivem segun-
do a carne; moram na terra, mas têm sua cidadania no céu;
obedecem as leis estabelecidas, as com sua vida ultrapassam
as leis; amam a todos e são perseguidos por todos; são des-
conhecidos e, apesar disso, condenados; são mortos e, deste
modo, lhes é dada a vida; são pobres e enriquecem a muitos;
carecem de tudo e tem abundância de tudo; são desprezados
e, no desprezo, tornam-se glorificados; são amaldiçoados e,
depois, proclamados justos; são injuriados, e bendizem; são
maltratados, e honram; fazem o bem, e são punidos como
malfeitores; são condenados, e se alegram como se recebes-
sem a vida. Pelos judeus são combatidos como estrangeiros,
34 Sal da terra e luz do mundo
pelos gregos são perseguidos, a aqueles que os odeiam não
saberiam dizer o motivo do ódio.
Em poucas palavras, assim como a alma está no corpo, assim
estão os cristãos no mundo. A alma está espalhada por todas
as partes do corpo, e os cristãos estão em todas as partes do
mundo. A alma habita no corpo, mas não procede do cor-
po; os cristãos habitam no mundo, mas não são do mundo. A
alma invisível está contida num corpo visível; os cristãos são
vistos no mundo, mas sua religião é invisível. A carne odeia e
combate a alma, embora não tenha recebido nenhuma ofen-
sa dela, porque esta a impede de gozar dos prazeres; embora
não tenha recebido injustiça dos cristãos, o mundo os odeia,
porque estes se opõem aos prazeres. A alma ama a carne e
os membros que a odeiam; também os cristãos amam aque-
les que os odeiam. A alma está contida no corpo, mas é ela
que sustenta o corpo; também os cristãos estão no mundo
como numa prisão, mas são eles que sustentam o mundo. A
alma imortal habita em uma tenda mortal; também os cris-
tãos habitam como estrangeiros em moradas que se corrom-
pem, esperando a incorruptibilidade nos céus. Maltratada
em comidas e bebidas, a alma torna-se melhor; também os
cristãos, maltratados, a cada dia mais se multiplicam. Tal é
o posto que Deus lhes determinou, e não lhes é lícito dele de-
sertar” (Da Carta a Diogneto)
Então, os cristãos estão no mundo, no meio dos homens,
solidais com eles; vivem em plena responsabilidade para com
a sociedade, são cidadãos da cidade a pleno título, mas não
devem conformar-se às modas, à lógica do tempo, não devem
viver mundanamente. Não conformar-se à mentalidade deste
mundo significa ter a coragem de levar uma vida sabendo dis-
cernir os ídolos que alienam e combatê-los. Isso é levar uma
vida marcada pela diferença cristã. Num mundo onde há indi-
ferença tão grande, a única possibilidade de vencê-la consiste
em apresentar uma forma de vida compreensível e eloquente,
capaz de oferecer uma contribuição específica à sociedade em
35
busca de modelos para implantar um tipo de vida que seja
verdadeiramente à medida do homem.
Esta diferença consiste na nossa maneira de estar no meio
dos outros, de trabalhar na evangelização e na missão, de ir
ao encontro dos outros, sejam eles crentes ou não. Sem cair
na tentação buscar mais as aparências do que a substância,
precisamos cuidar da nossa maneira de anunciar a Boa Nova
do Evangelho, porque disso depende a própria credibilidade
da Palavra. Sem dúvida alguma, o nosso modo de apresentar a
mensagem cristã é determinante. Não podemos falar de man-
sidão, de humildade e de misericórdia utilizando um estilo de
vida e de comunicação que seja arrogante, prepotente, mun-
dano.
Se soubermos fazer a diferença na sociedade, seremos sal,
no sentido de que saberemos inserir nela o sabor; seremos
luz, se acolhermos a luz de Cristo e a irradiarmos entre os ir-
mãos. Caso contrário, estaremos perdendo o sabor e ofuscan-
do a luz, exatamente no momento em que temos a pretensão
de salgar e iluminar.

5. O sal some, a luz se consome

A referência ao sal remete a uma ação invisível. Assim é a


presença dos cristãos no mundo sob forma de encarnação, de
presença silenciosa dentro da realidade, de inserção na socie-
dade, permitindo que, através do testemunho de cada cristão,
se desprenda a força do evangelho, como faz a semente que,
uma vez semeada, germina no campo, de dia e de noite, sem
que o semeador perceba.
O sal e a luz, na verdade, não mudam as coisas em função
de um interesse pessoal, mas mudam as coisas para que ou-
tros possam gozar delas. O sal muda o sabor para que outros

36 Sal da terra e luz do mundo


possam saborear o alimento. A luz ilumina a sala para que
outros possam movimentar-se com segurança. O sal e a luz
são símbolos do discípulo que doa a vida pelo bem dos ou-
tros. “Só quem vive para os outros vive com responsabilidade,
isto é, vive de verdade” (Dietrich Bonhoeffer). Onde tiver um
homem bom e puro, cedo ou tarde no seu ambiente surgirão
sinais de vida nova. O rosto da terra muda com o trabalho hu-
mano, o mundo será tal como o fizermos com a ajuda de Deus.
O sal e a luz têm algo em comum. O sal enquanto dá sabor se
some, a luz enquanto ilumina se consome. Sim, dar a vida é de-
saparecer, é colocar-se de lado, é perder-se. Perder-se é uma
palavra que nos assusta terrivelmente. Preferimos conquis-
tar, ganhar, possuir, vencer! Jesus, porém, não muda opinião
e declara com clareza e firmeza: “Quem perder a sua vida por
causa de mim e do Evangelho, a encontrará!” (Mt 16,25). O
nosso narcisismo, velado ou ostensivo, nos impede de acolher
esta palavra de Jesus. Quem procura promover a própria ima-
gem ou o próprio ponto de vista, não estará disposto a perder-
se, mas também não poderá ser discípulo de Jesus.

6. Sem vaidade e superioridade

Aqueles que estão mais preocupados em subir e ocupar a


posição do candeeiro para aparecer e colocar-se acima dos
outros a fim de serem vistos e elogiados pelos homens, não
serão certamente uma presença iluminadora. Quem anseia
por estar no lugar do candeeiro revela não ter em si a luz para
iluminar os outros, mas só será uma luz autorreferencial.
O candeeiro não é para ser visto; o candeeiro é para que a luz
se irradie e ilumine melhor. O candeeiro está no alto só por-
que sua luz possa chegar a lugares mais afastados. Assim deve
ser a vida dos cristãos verdadeiros discípulos.

37
Fica, pois, claro que nós cristãos, para sermos “luz do mun-
do”, não devemos ter nenhuma pretensão de brilhar, pensan-
do que somos nós que iluminamos os outros com nossa inte-
ligência e saber. O cristão, pois, chamado a ser sal e luz, não
sai às ruas e praças clamando e tocando o trombone. Ele é sal
e luz não por suas belas ideias, doutrinas e pelos preceitos
morais que tenta impor aos outros, mas por aquilo que ele é
na sua interioridade.
Concretamente, é “sal” aquele que nos ajuda a saborear a
vida com maior profundidade, porque sua sabedoria e seu
gosto pela vida nos contagia e nos incentiva a experimentar
o mesmo na nossa vida também. É “luz”, porque com sua pre-
sença amorosa dissipa nossas obscuridades e nos permite
perceber o sentido luminoso de nossa existência e de nossa
verdadeira identidade.
Ser “luz” e “sal”, portanto, é a atitude que mais radicalmente
se opõe a qualquer tentativa de superioridade e de proselitis-
mo. Nem a vaidade, nem o fanatismo trazem sabor e luz.

7. A dosagem

A utilização do sal é questão também de dosagem. Nem es-


casso, nem demais. Se faltar o sal, a comida fica sem sabor. O
excesso, porém, de sal pode tornar a comida desgostosa, in-
tragável. É por isso que ousamos imaginar que Jesus naque-
le dia tenha dito: “Usem o sal com prudência, porque o sal é
como o amor. É necessário aprender a dosá-lo”.
É verdade. Precisamos aprender a não sufocar, a não inva-
dir a vida dos outros. Amar não é impor si mesmo ao outro,
não é impor-lhe os próprios gostos. Não devemos dar a todos
o açaí só porque nós gostamos muito. Amar é perguntar-se
sempre: - Isto é bom para outros?

38 Sal da terra e luz do mundo


Há um estilo cristão insosso, derrotista, tímido. E há também
um estilo cristão invasivo, que choca e indispõe, agressivo, arro-
gante, barulhento. Não é compatível com a vocação cristã tam-
bém uma atitude passiva, resignada, queixosa, resmungona.
O testemunho franco e ousado não tem nada a ver com o
abuso, o atrevimento, a sem-vergonhice, a insolência, a petu-
lância, a provocação barulhenta. A nossa presença não deve
ser confundida com o apossamento e a invasão de campo.
O sal, no tempo de Jesus, era usado também como adubo.
Hoje também muitos fertilizantes contêm vários sais mine-
rais. O sal, certamente queima, porque contém o fogo. É preci-
so, pois, impedir que ameace e apague a vida.
As mesmas observações valem para a luz. Não se pode e não
se deve escondê-la. A lâmpada não deve ficar escondida. A luz
evangélica é sempre uma luz discreta, respeitosa, não estron-
dosa, não barulhenta, não cega e ofusca a ninguém. A visibili-
dade não deve ser confundida com a exibição, com o espetácu-
lo. A percepção da justa medida não diminui em nada a força
de irradiação, antes, confere-lhe maior intensidade e eficácia.

8. Uma pitada de loucura

Eu penso que o sal que não perde o seu sabor e, além de


dar gosto à mensagem cristã, impede a degradação e a cor-
rupção do mundo, seja exatamente aquela pitada abundante
de loucura que encontramos nos paradoxos evangélicos: “Fe-
lizes vós, os pobres, vós que agora tendes fome, vós que chorais,
quando os homens vos odiarem... ai de vós ricos, ai de vós que
agora estais saciados, ai de vós que rides, quando todos disse-
rem bem de vós...” (cfLc 6, 20-26). Quando acolhida, essa lou-
cura torna-nos capazes de derrotar a escuridão e o caos que
nos envolvem.

39
O homem com sua inteligência sempre foi causa de muitos
e enormes desastres. A salvação da humanidade se dará uni-
camente através do cristão que se libertar dos cálculos, das
prudências estratégicas, dos equilíbrios, da medida do justo
preço e enveredar o caminho da loucura evangélica. O mundo
não precisa de beatos engessados, nem de doutores refinados
que prescrevem receitas, e sim de “loucos de Deus”, capazes
de gestos incomuns, que surpreendem pela sua extraordiná-
ria e escandalosa caridade. De fato, o que são as bem-aventu-
ranças senão uma desconcertante “sinfonia de loucos” (Renzo
Patraglio)? Se nós não recuperarmos o valor da loucura evan-
gélica, nunca entenderemos o espírito que permeia o Sermão
da Montanha. Infelizmente, muitas vezes, somos cristãos in-
sensíveis, indiferentes, mesquinhos, sem valor, justamente
porque não bastante dispostos e abertos a essa loucura. O en-
contro com Jesus sempre é perigoso para nós e para os outros,
pois ele nos impulsiona a sair da uniformidade, da timidez, da
insignificância, da obrigação.
Deus precisa do nosso coração enlouquecido por paixão
amorosa. De um coração assim precisam também aqueles que
ainda se encontram na escuridão, obrigados a engolir comida
insossa.
Jesus nos apresenta a vocação cristã como serviço prestado
a todos. Esta é a função indispensável do sal e da luz. Vós sois
o sal da terra, vós sois a luz do mundo.
Evidentemente não somos sal nem luz só com palavras,
declarações, boas intenções, mas com obras que brotam do
amor e são dignas de amor. Elas devem manifestar o amor e
não ser suporte ao prestígio e ao poder. Claramente, “as boas
obras” não devem ser confundidas com os “negócios”.
Precisamos tomar consciência de nossas responsabilidades
e medir as nossas culpas.

40 Sal da terra e luz do mundo


A Palavra nos convida a colocarmo-nos a serviço do mundo.
Que fogo de esperança nós acendemos no mundo dos deses-
perançados, e através de quais ações concretas e provocató-
rias? De quais movimentos de paz, unidade e compreensão
somos nós protagonistas?
Em lugar de sentirmo-nos ofendidos por acharmos não ser
considerados e deixados de lado, perguntemo-nos se, por-
ventura, o sal em nós não tenha ficado sem sabor. Isso já foi
previsto pelo Senhor quando disse que o sal que perdeu sa-
bor seria pisado pelos homens. De modo especial devemos
tomar consciência que se iluminamos tão pouco, isso se deva
ao fato de que somos pouco receptivos e transparentes diante
d’Aquele que unicamente é a luz do mundo.
Quando estamos muito sobrecarregados e cheios de nós
mesmos, por demais preocupados em brilhar, é natural que
acumulemos uma camada de opacidade que a luz divina não
consegue atravessar.

9. Responsabilidade individual e coletiva

A responsabilidade não é somente individual. Ela é também co-


letiva. De fato, o símbolo da luz do mundo nos remete à vocação
de Jerusalém, a cidade-luz, lugar situado sobre a montanha para
atrair todos os povos a Deus e nos remete também à vocação de
Israel para ser a luz das nações. A imagem, pois, se aplica não
só ao indivíduo cristão, mas à comunidade cristã inteira definida
pelas Bem-aventuranças.
Pois bem, o que é esta luz da qual são portadores os discípulos?
“As boas obras que vocês fazem” (Mt 5,16). O que deve brilhar são
as boas ações, as boas obras manifestadas no compromisso com
os pobres, os excluídos, os abandonados, a fim de que a justiça
seja restaurada. A única maneira de sermos verdadeiramente
41
sal da terra e luz do mundo é aquela de sair de nós mesmos todos
os dias para irmos ao encontro das pessoas lá onde elas vivem, lá
onde a dignidade humana é ameaçada, lá onde reina a injustiça,
lá onde mulheres e homens são rejeitados, ridicularizados e ex-
cluídos por causa de sua condição de vida, de sua origem, de sua
cultura pelos que se julgam detentores da verdade sobre Deus e
sobre o mundo. Eles desvirtuam o sal que deveriam agir em be-
nefício das pessoas que encontram e escondem a luz debaixo do
alqueire de suas certezas negando a liberdade dos outros.
Ser luz do mundo é engajar-se, não só pessoalmente, mas
especialmente como Igreja, no restabelecimento da justiça, no
espírito das Bem-aventuranças e na prática cotidiana do maior
mandamento do amor que liberta e salva.
O sal que perde o gosto é a recusa a testemunhar. A lâmpada
debaixo do alqueire é a recusa a comprometer-se com o caminho
da liberdade, é a recusa a dar pés e mãos ao maior mandamento
do Amor. Isso nada tem a ver com a prática religiosa na Igreja.
Esta é importante, certamente, mas é secundária em relação ao
testemunho e ao engajamento.
Vou concluir lembrando o apelo de Papa Francisco convidando
os cristãos a se comprometerem:
“Vejo com clareza que aquilo de que a Igreja mais precisa
hoje é a capacidade de curar as feridas e de aquecer o cora-
ção dos fiéis, a proximidade. Vejo a Igreja como um hospital
de campo depois de uma batalha. É inútil perguntar a um
ferido grave se tem o colesterol ou o açúcar, altos. Devem
curar-se as suas feridas. Depois podemos falar de todo o
resto. Curar as feridas, curar as feridas... E é necessário co-
meçar de baixo”(PAPA FRANCISCO - Entrevista exclusiva
às revistas dos Jesuitas, 19 agosto 2013).

42 Sal da terra e luz do mundo


5.
Orientações Pastorais

1. A vivência do batismo: verdadeira urgência pastoral

O batismo nos introduz numa radical novidade de vida. Se


refletíssemos mais profundamente sobre o bem imenso que
nos é dado com o batismo e que constitui o que de mais pre-
cioso possuímos na nossa vida, certamente teríamos maior
cuidado não só em sublinhar o seu primado, como também
entenderíamos que não há outro aspecto de onde partir a não
ser desse evento. Muitas vezes os planos pastorais com tudo
aquilo que consideramos ser mais urgente na ação evangeli-
zadora, nos levam a focar a nossa atenção sobre muitas coisas,
quando na realidade há uma urgência primária que precede
todas as demais. Antes de considerar qualquer urgência, é ne-
cessário descobrir a identidade de “filhos da ressurreição” (Lc
20,36), característica específica daquele homem novo que sai
das águas do batismo.
Se alguém ainda não se deu conta da novidade introduzi-
da pelo batismo, ele acaba raciocinando incorretamente, pois
como é possível elaborar ações pastorais, estratégias de evan-
gelização, ocupar o devido lugar dentro e fora da comunidade
eclesial possuindo uma mentalidade de homem velho?
O elemento discriminador do batismo é de tal natureza que
1Pd 1,14 define de modo abrupto o tempo que antecede o ba-

43
tismo como sendo o tempo da “ignorância”. Realmente, o tem-
po anterior ao batismo é o tempo da ignorância, ao passo que
o do batismo é o tempo da iluminação, da graça, da presença
da luz e da ressurreição, da incorporação nesse corpo ressus-
citado e glorioso, juntamente com todos os dons espirituais
que prolongam e tornam presente essa graça, de modo espe-
cial a Palavra e a Eucaristia. Podemos dizer que toda a liturgia
é o âmbito onde eu vou adquirindo o olhar do homem novo,
onde treino a visão do homem novo, de tal forma que no pão
não vejo mais só o pão, mas o Corpo de Cristo; no pecado não
vejo mais só o meu pecado, mas a misericórdia de Deus que
me lava e me restaura.
A partir dessa visão, mudam os critérios. Antes das nos-
sas urgências, daquelas da ação pastoral, antes de elaborar
qualquer discurso ou plano, se quisermos que seja bem fun-
damentado, é preciso que partamos do homem novo gerado
nas águas batismais. O batismo, de fato, dá origem a uma nova
antropologia, que é exatamente a do homem novo, do homem
que adquiriu um novo tipo de conhecimento espiritual. Do
corpo ressuscitado de Cristo nós recebemos um novo corpo
espiritual em lugar do velho corpo de pó que Cristo fez morrer
na cruz. Vivemos em nosso corpo humano um prolongamen-
to misterioso da ressurreição do Senhor e somos elevados a
uma condição espiritual nova e gloriosa, liberta da morte, do
pecado, da separação, da inveja, do egoísmo. A qualidade da
nossa fecundidade e criatividade espiritual e pastoral depen-
de deste ponto de partida.

2. Recomecemos com os adultos

Se não tivermos clara a nossa identidade batismal corremos


o perigo de fazer mil coisas, de levarmos adiante iniciativas,
obras e trabalhos usando critérios próprios do homem velho.

44 Orientações Pastorais
Não será o olhar e o pensamento de Cristo, do homem novo
que irá direcionar as nossas escolhas pessoais, familiares,
eclesiais, sociais, mas sim uma mentalidade fechada, pessi-
mista, sem esperança, carregada de morte. Não é esta, por-
ventura, a situação que percebemos na grande maioria dos
nossos jovens batizados, para os quais o batismo não diz nada,
não é referência para nada? A eles faltou o nosso testemunho
de “homens novos”. O que temos feito para que eles valori-
zassem, amassem, tomassem consciência da vida nova que
receberam no batismo? Se nós adultos batizados não temos
deixado a vida divina crescer em nós, se não a temos deixado
transbordar nos nossos gestos, palavras, projetos, relações e
se temos levado uma existência insossa, como se nada tivesse
acontecido em nós, como se o homem velho não tivesse sido
destruído, como se estivéssemos ainda mortos, logicamente
não é pensável que eles possam ter adquirido essa consciên-
cia de vida cristã.
Os primeiros que mais precisam assumir o batismo com
garra e com toda a força transformadora somos nós, os adul-
tos: bispo, padres, religiosos/as, diáconos, catequistas, pais e
mães, que nos alimentamos com frequência da Eucaristia.

3. Antes de tudo, viver como filho de Deus

É útil lembrar e tomar consciência de que antes de ser bis-


po, padre, religioso/a, diácono, esposo/a, somos filhos de
Deus. Talvez sejamos filhos desnaturados, filhos pródigos,
desgarrados, teimosos, violentos, egoístas, autossuficientes,
criminosos, mas sempre e acima de tudo filhos amados e in-
cessantemente procurados pelo Pai, pacientemente espera-
dos, nunca amaldiçoados, abraçados, regenerados, refeitos,
recriados. Filhos no Filho, lavados no sangue do Filho, redimi-
dos pelo Filho que tomou o nosso lugar, que carregou nossas
culpas, que aceitou ser cravado na cruz para que nós pudés-
45
semos experimentar o arrepio da verdadeira liberdade, para
que as correntes da morte que nos prendiam fossem arreben-
tadas pela força do seu amor.
O que significa ser filho de Deus, viver como filho de Deus?
Antes de tudo significa que devemos reconhecer que Deus, o
nosso criador, é Pai e que tudo o que somos e temos o temos
recebido dele. Significa reconhecer nossa dependência, nossa
insuficiência, nossa precariedade. Sem Ele nada somos e nada
podemos. Somos filhos de Deus especialmente quando nutri-
mos para com Ele sentimentos e atitudes de gratidão; quando
confiamos nele totalmente; quando deixamos de lado os nos-
sos projetos pessoais para assumir os seus planos; quando fa-
zemos sempre a sua vontade. Nossa obediência a Ele, que se
verifica quando lhe entregamos mente, coração, espírito, é a
verdadeira prova do nosso amor de filhos.
Eu sou filho de Deus, o outro é filho de Deus; minha esposa
é filha de Deus, meu esposo é filho de Deus; os meus filhos são
filhos dele; o pobre, o pequeno, o último, o pecador, o assassi-
no também são todos filhos dele.
Quando deixo a vida divina transbordar em mim, posso
olhar para o outro com o olhar divino. Então sou capaz de re-
conhecer no outro a sua semelhança com Deus, sua beleza,
sua dignidade, seus lados positivos, seu valor, sua unicidade,
sua originalidade, seu potencial insubstituível, sua relação
fraterna comigo e com todos.
Somos irmãos em Cristo Jesus. O outro é irmão de Jesus, eu
sou irmão de Jesus, todos somos irmãos sem exclusão. Cristo
é a fonte, a nascente da fraternidade, da vida em comunhão.
Se Deus é amor, é relação, é família, é Trindade, então quando
saímos do nosso “eu” vivemos o amor e construímos relações
de respeito, de comunhão, de família. Quando nos acolhemos
uns aos outros, nos perdoamos, temos estima recíproca, nos

46 Orientações Pastorais
doamos para o bem dos irmãos, então revelamos a presença
e a ação de Deus em nós. Quando, ao contrário, expressamos
palavras, atitudes, projetos, atividades, iniciativas, obras, fora
da comunhão eclesial, visando à promoção de nós mesmos ou
de grupos fechados explorando os outros, então não revela-
mos nada de Deus, mas o escondemos e o afastamos.
Precisamos, pois, incentivar a vida de comunhão em família,
tomando as refeições juntos, rezando juntos, marcando pre-
sença perseverante e dinâmica na comunidade, especialmen-
te na celebração litúrgica dominical, atuando em comunhão
efetiva e afetiva com a paróquia e com a Diocese, assumindo
o Plano de Pastoral, participando dos encontros de formação,
valorizando todos os meios que promovem a comunhão, a
Coordenação da Comunidade, o Conselho Pastoral Paroquial,
o Conselho de Assuntos Econômicos, o Conselho Diocesano
de Pastoral, etc. Enfim, precisamos ter o mesmo pensamento,
nos esforçar para sermos de verdade um só coração e uma só
alma. Só assim, só se nos amarmos uns aos outros, seremos
convidativos e saberemos atrair outros irmãos para Cristo.
Foi exatamente isso que Jesus nos disse no seu discurso de
despedida: “Nisto reconhecerão todos que sois meus discípulos,
se tiverdes amor uns pelos outros” (Jo 13, 35).

4. Batismo e missão

É facilmente compreensível que se nós não sairmos ao


encontro de todos para anunciar-lhes a Boa Nova da filiação
divina proposta na Revelação e da fraternidade universal que
dela brota, muitas pessoas ficarão privadas e excluídas des-
sa relação. Se nós ficarmos entrincheirados em nossas igrejas
e sacristias, se nos fecharmos em nossos pequenos grupos e
panelinhas, se levantarmos cercas e barreiras ao nosso redor
para nos proteger, poderemos correr o perigo de excluir mui-
tos e nos considerarmos os melhores entre os homens.
47
É imprescindível que saiamos das nossas tocas, também
porque diminuiu bastante o número dos que pedem o ba-
tismo e aumentou o número daqueles que não lhe dão mais
valor algum. “É perfeitamente possível viver sem o batismo”:
- afirmam muitos.
Perguntamo-nos agora: de que modo devemos sair? Assim:
desarmados como pombas, como cordeirinhos, com ternura
e humildade. Não com discursos fotocopiados dos livros, mas
oferecendo o belo testemunho da nossa vida posta a serviço,
narrando por quais caminhos Deus nos conquistou para a
vida nova, nos tirou das trevas e das sombras da morte e nos
introduziu na sua luz e no seu paraíso. É narrando como isso
se deu em nossa vida...
Sair ao encontro dos casais que estão esperando um filho.
Deve-se iniciar este trabalho desde o início da gravidez da
mãe. Ir visitar em suas casas os casais que pedem o batismo
para seus filhos, instaurar com eles um diálogo duradouro
no tempo, semear no coração deles a Boa Nova ao dizer-lhes:
“Deus ama vocês, espera por vocês, quer entrar no coração de
vocês para transformar-lhes a vida”.
Precisamos, pois, preparar casais adultos e apaixonados
pelo anúncio, encantados com a pessoa de Jesus, e que se de-
diquem a levar as pessoas a descobrirem o tesouro inestimá-
vel do batismo e suas implicâncias: a vida nova em Cristo.
Precisamos rever o método e as modalidades com as quais
preparamos as pessoas para o Batismo; ter a coragem de
mudar, de surpreender, de arriscar novos caminhos; pensar
numa preparação ao sacramento do Batismo “em saída”, de
forma missionária, como algumas paróquias e comunidades
já estão fazendo, tendo como objetivo despertar nos pais o de-
sejo de conhecer o Senhor, de iniciar um caminho de fé. Tra-
ta-se de utilizar melhor o primeiro anúncio, o Kerigma, parti-
lhando com eles a novidade de Jesus: sua pessoa, sua palavra,
48 Orientações Pastorais
seus gestos, sua Páscoa, sua missão. Levá-los ao encontro com
Jesus e introduzi-los na Igreja passando por uma experiên-
cia em pequenas comunidades onde possam sentir-se acolhi-
dos, valorizados, atraídos, por experimentarem o amor dos
irmãos.
Precisamos investir na formação dos introdutores, isto é,
dos missionários que despertam as pessoas para a vida de
fé e as iniciam no caminho catecumenal, tendo o cuidado de
acompanhá-las pessoalmente: prepará-las, treiná-las, motivá-
-las. Das respostas delas dependerá o futuro das nossas co-
munidades.
Não há como fundamentar a nossa vida batismal sem as-
sumir de verdade e seriamente todo o trabalho de iniciação
à vida cristã. Costumamos gastar de 8 a 9 anos para preparar
um padre; de 4 a 6 anos para formar uma freira; de 4 a 5 anos
para ordenar um diácono; de 2 a 3 meses para os noivos pode-
rem celebrar seu matrimônio. E (mirabilia!) para a recepção
do sacramento do batismo, que é o fundamento de toda a vida
cristã, gastamos poucas horas, claramente insuficientes para
formar a consciência e para formular o bom propósito de vi-
ver o compromisso da vida nova.
• Para favorecer a tomada de consciência da beleza do batis-
mo e da importância de vivê-lo na própria história, realiza-
remos em Abril a “Semana de Atualização Teológica”, que
terá como tema: “A vivência do batismo”. Padres, diáconos,
religiosas, catequistas, leigos e leigas responsáveis pela
Pastoral do batismo, sintam-se desde já convidados a par-
ticipar.
• Sempre no mês de Abril teremos um encontro para formar
“introdutores” ao processo da iniciação à vida cristã.
• No mês de Maio haverá um encontro específico de espiri-
tualidade para os que trabalham na preparação do batismo.

49
• Além destes encontros, estamos preparando um livrinho
com as catequeses sobre o batismo, elaboradas por Papa
Bento XVI e por Papa Francisco.
• Ao longo deste ano é oportuno que em cada Igreja Matriz,
seguindo as orientações da Diocese, seja identificado o es-
paço liturgicamente adequado onde erguer o batistério,
assim que sua presença permanente possa ajudar a com-
preender melhor o mistério ali celebrado.
• Retomando a prática dos primeiros séculos, proposta tam-
bém no documento 107 da CNBB sobre a Iniciação à Vida
Cristã, n. 228, convoco os catecúmenos adultos das paró-
quias da cidade de Castanhal que irão ser batizados na Vi-
gília Pascal deste ano, a participarem de quatro catequeses
mistagógicas sobre o Batismo, do Retiro espiritual no Sá-
bado Santo e da celebração do batismo, administrado por
mim na Catedral.
As catequeses serão feitas na Catedral Santa Maria Mãe de
Deus, às 19h, nos dias 16, 20, 23 e 27 de março. O Retiro do
Sábado Santo, no dia 31 de março, começará às 8h e termi-
nará às 12h. A Vigília Pascal, no dia 31 de março, começará
às 20h.

5. Despertar a memória do nosso Batismo para vivê


-lo todos os dias.

Papa Francisco em diversas ocasiões ressaltou a importân-


cia de a pessoa conhecer a data em que recebeu o batismo e
de lembrá-la constantemente.
“Muitos de nós não recordam minimamente a celebração
deste Sacramento, e é óbvio, se fomos batizados pouco de-
pois do nascimento... É importante conhecer o dia no qual

50 Orientações Pastorais
eu fui imergido precisamente naquela corrente de salvação
de Jesus. E permito-me dar uma tarefa. Hoje, em casa, pro-
curai, perguntai a data do Batismo e assim sabereis bem o
dia tão bonito do Batismo. Conhecer a data do nosso Batis-
mo significa conhecer uma data feliz. Mas o risco de não a
conhecer significa perder a memória daquilo que o Senhor
fez em nós, a memória do dom que recebemos. Então aca-
bamos por considerá-lo só como um evento que aconteceu
no passado — e nem devido à nossa vontade, mas à dos
nossos pais — por conseguinte, já não tem incidência al-
guma sobre o presente. Devemos despertar a memória do
nosso Batismo. Somos chamados a viver o nosso Batismo
todos os dias, como realidade atual na nossa existência. Se
seguimos Jesus e permanecemos na Igreja, mesmo com os
nossos limites, com as nossas fragilidades e os nossos pe-
cados, é precisamente graças ao Sacramento no qual nos
tornamos novas criaturas e fomos revestidos de Cristo...
Peçamos então de coração ao Senhor para podermos ex-
perimentar cada vez mais, na vida diária, esta graça que
recebemos com o Batismo. Que os nossos irmãos ao encon-
trar-nos possam encontrar verdadeiros filhos de Deus, ver-
dadeiros irmãos e irmãs de Jesus Cristo, verdadeiros mem-
bros da Igreja. E não esqueçais a tarefa de hoje: procurar,
perguntar a data do próprio Batismo. Assim como eu co-
nheço a data do meu nascimento, devo conhecer também a
data do meu Batismo, porque é um dia de festa. (FRANCIS-
CO - Audiência, quarta feira, 08 de janeiro de 2014).

• Todo ano, na noite pascal, os cristãos são convidados a fazer


memória do batismo. É como um grande aniversário cole-
tivo do sacramento recebido um dia, crianças ou adultos. É
a ocasião de lembrar um evento pessoal que marcou para
sempre a existência. É a ocasião também para reavivar mais
intensamente o compromisso assumido naquele dia e vivi-
ficar a seiva recebida da verdadeira videira (Jo 15,5). A as

51
• persão dominical também, no início da missa, é feita como
recordação do batismo recebido e da promessa do Senhor:
“Derramarei sobre vós água pura e sereis purificados” (Ez
36,25). E toda vez que fazemos o sinal da cruz com a água
benta, fazemos memória do nosso batismo.
• Celebrar o aniversário coletivo do batismo na vigília pascal e
incentivar cada pessoa a celebrar pessoalmente o aniversá-
rio do próprio batismo.
• Celebrar juntos o aniversário da crisma. Aqueles que foram
crismados na mesma data podem organizar uma bonita e
festiva celebração.

6. Em comunhão com a Igreja Católica no Brasil

Somos chamados a estudar e a colocar em prática o docu-


mento da CNBB, N. 105: “Cristãos leigos e leigas na Igreja e na
Sociedade” e demais documentos do Magistério, em especial
do Papa Francisco, sobre o Laicato, com o intuito de estimular
a presença e a atuação dos cristãos leigos e leigas, “verdadei-
ros sujeitos eclesiais”, como “sal, luz e fermento” na Igreja e na
Sociedade. Precisamos aprender a dialogar com os diferentes
sujeitos da sociedade, promovendo a cultura do encontro e
o cuidado com a vida e o bem comum, na esperança de que
outro mundo é possível.
• No âmbito da Sociedade temos muito ainda a fazer: sobre-
tudo, promover mecanismos de participação popular para
o fortalecimento do controle social e da gestão participati-
va: Conselhos de Direitos, Grupos de Acompanhamento ao
Legislativo, Iniciativas Populares, Audiências Públicas, Refe-
rendos, Plebiscitos, entre outros. Para promover a formação
de lideranças cristãs que assumam com convicção o seu pro-
tagonismo na evangelização e transformação da sociedade

52 Orientações Pastorais
vamos oferecer um Curso de Fé e Política destinado às li-
deranças das nossas comunidades eclesiais que assumem
responsabilidades em organizações e movimentos sociais,
que já assumem ou pretendem assumir cargos em instân-
cias partidárias. O Curso acontecerá de forma intensiva das
08hs às 17hs nos dias de sábado de maio e junho de 2018
na Catedral tratando dos seguintes temas: 1. Doutrina Social
da Igreja e a Participação Política dos cristãos – 2. Ética, Fé e
Política – 3. Projetos para o Brasil - 4. Projetos dos Partidos
Políticos - 5. Projetos Populares Democráticos – 6. Controle
Social e Participação e os Instrumentos de controle social.
• No âmbito Eclesial vamos dar continuidade à formação dos
leigos na coordenação e animação de comunidades, pasto-
rais e movimentos e apostar sempre mais nas pequenas co-
munidades investindo na formação e acompanhamento dos
animadores das Pequenas Comunidades (Doc. 100), confor-
me às propostas de formação da Diocese.
Eventos
• Visitação da Sagrada Família, imagem ou estandarte, pelas
paróquias e comunidades;
• Destacar na Abertura da CF/2018, o papel dos cristãos leigos
e leigas na superação da violência;
• O Encontro Diocesano dos Jovens na tarde do Domingo dos
Ramos, na Catedral
• Vigília de Pentecostes na Catedral
• Semana Missionária “Igreja em Saída” nas paróquias.
• Dia Mundial dos Pobres - 18 de novembro de 2018;
• 2º Congresso Diocesano das Pequenas Comunidades e Encer-
ramento do Ano Laicato na festa de Cristo Rei (25/11/2018)
em Castanhal.
Semana Missionária
Convido todas as paroquias a assumir e organizar a Sema-
na Missionária “Igreja em saída” proposta pela CNBB com

53
o propósito de alcançar todas as comunidades e os diversos
areópagos modernos, na semana antes da Visita Pastoral, ou
em preparação à Festa do Padroeiro, seguindo estas orienta-
ções práticas:
- capacitar grupos de discípulos missionários para realizar;
- organizar visitas às famílias de cada rua ou às pessoas de
determinado ambiente de trabalho, concluindo com o con-
vite à participação de um Círculo Bíblico no início da noite;
- em todos os dias da Semana Missionária lembrar da tríplice
missão batismal (sacerdotal, profética e real), utilizar a Ora-
ção, o Hino, Ladainha e Objetivo Geral para Ano Nacional do
Laicato;
- utilizar símbolos: Logomarca do Ano do Laicato, Imagem ou
estandarte da Sagrada Família, Documento 105 da CNBB.
Em cada dia da semana refletir a partir da atuação dos Cristãos
leigos e leigas nos areópagos modernos (Doc. 105, nº 250 a 273).
• 2ª-feira - Família (Amoris Letícia) e Mundo do Trabalho (terceiri-
zação e Reforma Trabalhista, Previdenciária, “NÃOs” da Alegria do
Evangelho).
• 3ª-feira - Política (lembrar dos Legados na Sociedade) e Políticas Pú-
blicas (Saúde, Educação, Assistência Social, entre outras, Carta de papa
Francisco sobre indispensável atuação pública dos cristãos).
• 4ª-feira - Comunicação (Grande Mídia, Redes Sociais, Rádio Comunitá-
ria), Culturas (Povos Tradicionais, Consumismo) e Educação (Reforma
Ensino Médio, papeis de estudantes e educadoras);
• 5ª-feira – Casa Comum (pobreza, Socioambiental, REPAM, Laudato Si,
desmatamento, agrotóxicos, migrantes, refugiados);
• 6ª-feira - Violências (temas da CF/2018) e Paz (tolerância, Mediação
de Conflitos, Justiça Restaurativa)
• Sábado – Juventude (Jovens, a fé e o discernimento vocacional – Docu-
mento Preparatório ao Sínodo dos Bispos)
• Encerramento – Celebração com todas pessoas que participa-
ram...

54 Orientações Pastorais
Conclusão

Estimados e queridos irmãos e irmãs, nossa reflexão que


volve ao fim, não teve a pretensão de ser um tratado exaus-
tivo sobre o batismo e sobre o protagonismo dos leigos, pois
sabemos quão é grande o dom que temos recebido de Deus
ao sermos gerados realmente seus filhos amados no Filho
unigênito, e quão pequena é a nossa compreensão. Quisemos
somente mostrar, mesmo se de forma sintética, a raiz, a causa
e a profunda razão que faz de cada batizado, um cristão tes-
temunha, sal da terra e luz do mundo. Voltamos ao batismo,
fonte da vida cristã, na certeza que sua vivencia cotidiana gera
leigos e leigas que, com sua presença e ação, fazem diferença
na Igreja e nos diversos areópagos do mundo. Gera sacerdotes
autênticos que si colocam com humildade e amor ao servi-
ço do sacerdócio batismal promovendo a participação e cor-
responsabilidade dos leigos e leigas na ação evangelizadora
da Igreja. Gera consagrados e consagradas que encantam e
atraem por viver com alegria sua entrega total a Deus.
Enfim, damo-nos conta da enorme responsabilidade a nós
confiada de levarmos adiante o plano de Deus da cristificação
e deificação da humanidade e do universo mediante o nos-
so humilde e dedicado serviço ao anúncio, à transformação
e transfiguração das realidades terrestres. Não tenhamos
medo, não fujamos do nosso compromisso batismal, pois Je-
sus Cristo é o Ressuscitado, o Vivente, que está conosco até o
fim dos tempos e nos acompanha ao longo dos caminhos da
55
história para que também pela nossa ação generosa e fraterna
ela possa ser de verdade uma história de salvação para todos
os homens e para toda a criação.
Com o coração agradecido façamos nossas as palavras do
Prefacio dos Domingos do Tempo Comum, I, louvando a Deus
pela obra maravilhosa que realizou em nós.
Na verdade, é justo e necessário,
é nosso dever e salvação
dar-vos graças, sempre e em todo o lugar,
Senhor, Pai Santo, Deus eterno e todo-poderoso,
por Cristo, vosso Filho,
que, pelo mistério da sua Páscoa,
realizou uma obra admirável.

Por ele, vós nos chamastes das trevas


à vossa luz incomparável,
fazendo-nos passar do pecado e da morte
à glória de sermos o vosso povo,
sacerdócio régio e nação santa,
para anunciar, por todo o mundo, as vossas maravilhas.

Por essa razão,


agora e sempre,
nós nos unimos à multidão dos anjos e dos santos,
cantando a uma só voz…

Castanhal, 14 de fevereiro de 2018


Quarta-feira de Cinzas

Dom Carlos Verzeletti


Bispo Diocesano de Castanhal do Pará

56 Conclusão
Anexo

Alguns números significativos do Documento 105 “Cristãos


leigos e leigas na Igreja e na sociedade, sal da terra e luz
do mundo”
É oportuno que ao longo deste ano, em todas as paróquias
e comunidades seja apresentado e estudado o Documento n.
105 da CNBB, Cristãos leigos e leigas na Igreja e na sociedade,
sal da terra e luz do mundo,que retoma e aprofunda a partici-
pação dos leigos e leigas na Igreja e na sociedade. Chamados
pelo Batismo e pela Crisma ao seguimento de Jesus Cristo, lei-
gos e leigas assumem a responsabilidade de serem sujeitos na
Igreja e na sociedade: sal e luz!

Campo específico de ação do cristão leigo é o mundo


63. Queremos, mais uma vez, recordar e insistir que o primei-
ro campo e âmbito da missão do cristão leigo é o mundo.
65. Com seu peculiar modo de agir, [os cristãos leigos] levam
o Evangelho para dentro das estruturas do mundo e agindo
em toda parte santamente, consagram a Deus o próprio mun-
do.
71. Vivendo neste mundo, o cristão que não tem a consciên-
cia de ser sujeito corre o risco da alienação, da acomodação e
da indiferença.
78. O desafio do cristão será, sempre, viver no mundo sem ser
do mundo (Jo 17,15-16), examinar tudo e ficar com o que é
bom” (1 Ts 5,21).

57
81. O mundo influencia a Igreja, oferece-lhe tentações, inspira
desvios, impõe modelos de vida, a ponto de mundanizá-la.

Necessária mudança de mentalidade


87. O Papa Bento XVI bem alertou: “A corresponsabilidade
exige uma mudança de mentalidade, relativa, em particular,
ao papel dos leigos na Igreja, que devem ser considerados não
como ‘colaboradores’ do clero, mas como pessoas realmente
‘corresponsáveis’ do ser e do agir da Igreja. Por conseguinte,
é importante que se consolide um laicato maduro e compro-
metido, capaz de oferecer a sua contribuição específica para
a missão eclesial, no respeito pelos ministérios e pelas tare-
fas que cada um desempenha na vida da Igreja, e sempre em
comunhão cordial com os bispos” (Mensagem do Papa Bento
XVI à VI Assembleia Ordinária do Foro Internacional da Ação
Católica em Iasi, Romênia, 10 de agosto de 2012)”.

Sujeito eclesial: discípulos missionários e cidadão do


mundo
92. Pelos sacramentos da iniciação cristã, sobretudo pelo Ba-
tismo, todos nos tornamos membros vivos do povo de Deus.
Nessa igualdade comum se funda a identidade e a dignidade
da vocação dos cristãos leigos e leigas, expressa no sacerdó-
cio comum, no sensus fidei, no perfil mariano da Igreja e na
vocação universal à santidade. Na eclesiologia de comunhão
funda-se a concepção dos cristãos leigos e leigas como sujei-
tos eclesiais, discípulos missionários, membros da Igreja e ci-
dadãos do mundo, caracterizados pela liberdade, autonomia e
relacionalidade. Como tais, são chamados a colaborar na ação
evangelizadora, em todos os âmbitos da Igreja e do mundo,
superando os entraves que atrapalham sua missão.
109. Não é evangélico pensar que os clérigos – ministros
ordenados – sejam mais importantes e mais dignos, sejam
“mais” Igreja do que os leigos. Esta mentalidade, errônea
58 Anexo
em seu princípio, esquece que a dignidade não advém dos
serviços e ministérios que cada um exerce, mas da própria
iniciativa divina, sempre gratuita, da incorporação a Cristo
pelo Batismo.

Vocação universal à santidade


116. Os cristãos leigos, homens e mulheres, são chamados,
antes de tudo, à santidade. São interpelados a viver a santi-
dade no mundo. Para isso, são instados pelo Espírito Santo a
cultivar com solicitude a vida interior e a relação pessoal com
Cristo, de modo que, iluminados pelo Espírito Santo, em todas
as circunstâncias, tudo façam para a glória de Deus, a salva-
ção do mundo e o bem de todos. A santidade de vida torna a
Igreja atraente e convincente, pois os santos movem e abalam
o mundo.

O cristão leigo como sujeito eclesial


119. O cristão leigo é verdadeiro sujeito na Igreja eclesial
mediante sua dignidade de batizado, vivendo fielmente sua
condição de filho de Deus na fé católica, aberto ao diálogo, à
colaboração e a corresponsabilidade com os pastores. Como
sujeito eclesial, assume seus direitos e deveres na Igreja, sem
cair no fechamento ou na indiferença, sem submissão servil
nem contestação ideológica. Ser “sujeito eclesial” significa ser
maduro na fé, testemunhar amor à Igreja, servir os irmãos e
irmãs, permanecer no seguimento de Jesus, na escuta obe-
diente à inspiração do Espírito Santo e ter coragem, criativi-
dade e ousadia para dar testemunho de Cristo.

A maturidade dos cristãos leigos


132. O cristão, sujeito na Igreja e no mundo, é discípulo mis-
sionário, seguidor e testemunha de Jesus Cristo. É o cristão
maduro na fé, que experimentou o encontro pessoal com Je-
sus Cristo e se dispôs a segui-lo com todas as consequências
59
dessa escolha. É o cristão que adere ao projeto do Mestre e
busca identificar-se sempre mais com ele, com seu ser e agir.
É o cristão que se coloca na escuta do Espírito e se percebe
enviado à edificação da comunidade e à transformação do
mundo como lugar do Reino de Deus, já iniciado, até a sua
consumação definitiva.

Âmbitos de comunhão eclesial e atuação do leigo como


sujeito
136.Temos insistido que a presença e a atuação dos cristãos
leigos e leigas se dá na Igreja e no mundo. No âmbito da Igreja
há muitos espaços nos quais os cristãos leigos e leigas pode
exercer seu ser e seu agir cristão, sua identidade e dignidade
de sujeito eclesial. Citamos alguns deles:

A família
138. Na celebração do sacramento do Matrimônio os cristãos
leigos e leigas exercem seu sacerdócio batismal. Eles são mi-
nistros da celebração. Exercem seu sacerdócio, não só na ce-
lebração, mas igualmente na consumação do sacramento, na
geração e educação dos filhos. Santificam-se no cotidiano da
família, Igreja doméstica, comunidade de vida e de amor, re-
flexo da comunhão trinitária.

A paróquia e as comunidades eclesiais


139. A paróquia e as comunidades eclesiais são espaço para
a vivência da unidade na diversidade onde os cristãos leigos
atuam como sujeitos e têm cidadania plena. As pequenas co-
munidades, os setores da paróquia, os grupos bíblicos de re-
flexão, as redes de comunidades, as assembleias pastorais, os
conselhos, a pastoral orgânica, os movimentos, as novas co-
munidades, as associações na pastoral orgânica e de conjunto,
são formas concretas de comunhão e participação nas quais o
cristão leigo atua como sujeito eclesial.
60 Anexo
Os Conselhos Pastorais e os Conselhos de Assuntos Eco-
nômicos
141. Os Conselhos Pastorais decorrem da eclesiologia de co-
munhão, fundamentada na Santíssima Trindade. São orga-
nismos de comunhão, participação e corresponsabilidade. A
ausência de Conselhos Pastorais é reflexo da centralização e
do clericalismo. Criem-se Conselhos de Pastoral em todos os
níveis: comunitário, paroquial, diocesano, regional e nacional.
“O bom funcionamento dos conselhos é determinante. Acho
que estamos muito atrasados nisso” (Papa Francisco, Discurso
aos dirigentes do CELAM, Rio de Janeiro nº 4). Os conselhos
devem ser apoiados, acompanhados e respeitados, superando
qualquer tentação de manipulação ou indevida submissão.
142. Os Conselhos de Assuntos Econômicos têm a tarefa de
colaborar na administração, manutenção e planejamento
financeiro das comunidades, paróquias e dioceses.

As Comunidades Eclesiais de Base e as pequenas comuni-


dades eclesiais
146. As Comunidades Eclesiais de Base são uma forma de vi-
vência comunitária da fé, de inserção na sociedade, de exercí-
cio do profetismo e de compromisso com a transformação da
realidade sob a luz da dimensão social do Evangelho. São pre-
sença da Igreja junto aos mais simples, aos descartados, aos
excluídos. São instrumentos que permitem ao povo conhecer
a Palavra, celebrar a fé, e contribuem para o crescimento do
Reino de Deus na sociedade. Para isso, estarão sempre em sin-
tonia com a paróquia local, com a pastoral diocesana e em co-
munhão com os pastores. Elas têm contribuído de forma clara
para que os leigos e leigas atuem como sujeito eclesial na vida
da Igreja e para sua missão no mundo. Em muitas situações
elas são o único espaço de partilha, acolhida mútua e valori-
zação das pessoas.

61
147. As pequenas comunidades eclesiais, como recorda o Do-
cumento de Aparecida, “são um ambiente propício para es-
cutar a Palavra de Deus, para viver a fraternidade, para ani-
mar na oração, para aprofundar processos de formação na fé
e para fortalecer o exigente compromisso de ser apóstolos na
sociedade de hoje. São lugares de experiência cristã e evange-
lização que, em meio à situação cultural que nos afeta, secula-
rizada e hostil à Igreja, se fazem muito mais necessários”.

Serviço cristão ao mundo


161. É missão do Povo de Deus assumir o compromisso sócio-
-político transformador, que nasce do amor apaixonado por
Cristo.
162. A participação consciente e decisiva dos cristãos em mo-
vimentos sociais, entidades de classe, partidos políticos, con-
selhos de políticas públicas e outros, sempre à luz da Doutrina
Social da Igreja, constitui-se num inestimável serviço à huma-
nidade e é parte integrante da missão de todo o Povo de Deus.

Igreja, comunidade missionária


173. A missão é o máximo desafio, é a primeira de todas as
causas, é paradigma de toda a vida da Igreja. Não podemos
ficar tranquilos no templo, nem dizer: “foi sempre assim”.
A vida é uma missão. Motivados pelas orientações do Papa
Francisco que convoca para uma “Igreja em saída”, os cristãos
leigos evangelizarão com ardor, dinamismo, ousadia, criati-
vidade, coragem e alegria. Não terão medo de se sujar com
a lama da estrada. Antes, terão medo de ficar fechados nas
estruturas que criamos. “Se uma pessoa experimentou verda-
deiramente o amor de Deus que o salva, não precisa de muito
tempo de preparação para sair e anunciá-lo, não pode esperar
que lhe deem muitas lições ou longas instruções. Cada cristão
é missionário na medida em que se encontrou com o amor de
Deus em Cristo Jesus”.
62 Anexo
Conhecimento profundo e vivencial da Palavra de Deus
175. “... é preciso educar o povo na leitura e meditação da Pa-
lavra de Deus: que ela se converta em seu alimento para que,
por própria experiência, vejam que as palavras de Jesus são
espírito e vida. Do contrário, como vão anunciar uma mensa-
gem cujo conteúdo e espírito não conhecem a fundo? Temos
que fundamentar nosso compromisso missionário e toda a
nossa vida na rocha da Palavra de Deus” (Bento XVI, Discurso
inaugural da Conferência de Aparecida, 13 de maio de 2007).

Espiritualidade de comunhão e missão


193. Em sua inserção no mundo, os cristãos leigos são con-
vidados a viver a espiritualidade de comunhão e missão. Co-
munidade missionária, a Igreja está voltada ao mesmo tempo
para dentro e para fora, num movimento de sístole e diástole.
A espiritualidade de comunhão e missão tem seu fundamento
na comunidade trinitária e no mandamento do amor. O ou-
tro não é apenas alguém, mas um irmão, dom de Deus, con-
tinuação da Encarnação do Senhor. As atitudes de alteridade
e gratuidade são expressão da espiritualidade de comunhão.
O outro é diferente de mim. E esta diferença nos distingue,
mas não nos separa. Espiritualidade de comunhão e missão
significa respeito mútuo, diálogo, proximidade, partilha, be-
nevolência e beneficência. “Com as atitudes de alteridade e
gratuidade, expressões do Amor, os discípulos missionários
promovem justiça, paz, reconciliação e fraternidade” (DAp
CNBB, Doc. 102, n. 12).
194. A espiritualidade de comunhão e missão se comprova no
esforço e na prática da misericórdia, do perdão, da reconcilia-
ção e da fraternidade, até ao amor aos inimigos. Cultiva o es-
quecimento de si e a elevação do outro. Portanto, é a espiritua-
lidade do encontro, do diálogo, da saída de si e da superação
da discriminação, da exclusão, da escravidão, da dominação. É
remédio contra o individualismo, o isolamento, o sectarismo.

63
Assim, o discípulo missionário torna-se fonte de paz, de rela-
cionamento, de concórdia, de unidade. Sem a espiritualidade
de comunhão e missão caímos nas “máscaras de comunhão”
e damos espaço ao terrorismo da fofoca, às suspeitas, ciúmes,
invejas que são sentimentos e atitudes destrutivas. A divisão
é um fracasso e leva à derrota os mais altos ideais e projetos.
Dessa maneira, não estaremos livres para o engajamento e o
serviço ao mundo.

Modos de ação transformadora


244. A ação transformadora do cristão leigo, como sujeito
eclesial, no mundo, pode ter diferentes modos de realização,
entre os quais destacamos:
a) O testemunho, como presença que anuncia Jesus Cristo, em
cada lugar e situação onde se encontra, a começar pela família
na sua condição de cidadão;
b) A ética e a competência, no exercício de sua própria ativi-
dade profissional, contribuindo, assim, de modo pessoal ou
coletivo, para a construção de um mundo justo e solidário;
c) O anúncio querigmático, nos encontros pessoais, nas visitas
domiciliares e nos ambientes de trabalho;
d) Os serviços, pastorais, ministérios e outras expressões or-
ganizadas pela própria Igreja, através das quais a Igreja se faz
presente e atuante no mundo;
e) A inserção na vida social, através das pastorais sociais, que
se dedicam às mais variadas atividades visando não só a as-
sistência imediata, mas também a conscientização e engaja-
mento nas lutas sociais;
f) Os meios de organização e atuação na vida cultural e políti-
ca, tendo em vista contribuir para a transformação da socie-
dade e a construção do mundo justo, sustentável e fraterno.

64 Anexo
A ação dos cristãos leigos e leigas nos areópagos moder-
nos
254. A partir da Eucaristia, nasce a coragem profética: “Não
podemos ficar inativos perante certos processos de globaliza-
ção que fazem crescer desmesuradamente a distância entre
ricos e pobres em âmbito mundial. Devemos denunciar quem
dilapida as riquezas da terra. É impossível calar diante dos
grandes campos de deslocados ou refugiados, amontoados
em condições precárias. O Senhor Jesus nos incita a tornar-
mo-nos atentos às situações de indigência em que vive gran-
de parte da humanidade. Pode se afirmar que bastaria menos
da metade das somas globalmente destinadas a armamentos,
para tirar de modo estável, da indigência o exército ilimitado
dos pobres. Isso interpela a nossa consciência”.

Os diversos mundos onde dar testemunho


Enfim, nos números de 267 a 273 são apresentados os diver-
sos mundos onde os leigos e leigas são chamados a dar seu
testemunho: o mundo da família, da política, das políticas pú-
blicas, do trabalho, da cultura e da educação, das comunica-
ções, o cuidado com a nossa casa Comum.

65
Indice

1. Leigos e Leigas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
2. Para viver em plenitude o batismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .10
1 - Porque descobrir ou redescobrir o batismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
2 - Três nascimentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
3 - Batismo: começo e fundamento da vida cristã . . . . . . . . . . . . . . . . . 12
4 - Dinamismo da vida batismal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
5 - Batismo como participação na morte e na ressurreição de Cristo . . . 14
6 - Feitos Corpo de Cristo. Nossa pertença a Igreja . . . . . . . . . . . . . . . 17
3. Cristãos testemunhas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
1 - Tudo isto é possível graças à força do Batismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19
2 - Receber a vida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
3 - Um olhar novo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
4 - Permanecer numa dinâmica de conversão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22
5 - A vida nova assume em nós a forma da diaconia . . . . . . . . . . . . . . . . 24
6 - Uma vida Santa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
4. Sal da terra e luz do mundo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . 27
1 - Uma responsabilidade plena . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
2 - Eis o que somos pela graça do batismo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
3 - Sal e luz no ambiente humano . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
4 - Sal e luz fazem a diferença . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
5 - O sal some, a luz se consome . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36
6 - Sem vaidade e superioridade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .37
7 - A dosagem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
8 - Uma pitada de loucura . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39
9 - Responsabilidade individual e coletiva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
5. Orientações Pastorais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43
1 - A vivência do batismo: verdadeira urgência pastoral . . . . . . . . . . . . . 43
2 - Recomeçemos com os adultos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44
3 - Antes de tudo, viver como filhos de Deus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
4 - Batismo e missão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
5 - Despertar a memória do nosso batismo para vivê-lo todos os dias . . . 50
5 - Em comunhão com a Igreja Católica no Brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
6. Conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55
7. Anexo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57

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