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DIVISÕES DE CLASSE E POBREZA RELATIVA NO BRASIL

artigo
CLASS DIVISIONS AND RELATIVE POVERTY IN BRAZIL

José Alcides Figueiredo Santos*

Introdução econômicas da pobreza que destacam o pa-


pel do controle de ativos. Revisa-se a ma-
As mudanças recentes da distribuição neira como a noção de classe social tem si-
de renda no país têm alterado as desvanta- do utilizada para a abordagem deste pro-
gens de recompensas das pessoas situadas blema na sociologia contemporânea. Reali-
na base da estrutura social. Este estudo ex- za-se com esta finalidade uma caracteriza-
plora as possibilidades que um enfoque de ção dos agrupamentos de trabalhadores tí-
classe social, centrado na ideia de controle picos e das posições de classe destituídas no
de recursos valiosos, pode oferecer para o Brasil (SANTOS, 2005, 2010 e 2014).
entendimento dos processos de privação São avaliadas as mudanças nas chances
relativa na ampla e heterogênea base da es- relativas (odds ratio) dos integrantes das ca-
trutura social brasileira. Levando em conta tegorias de estar numa situação de pobreza
a importância do desenvolvimento e da de renda e de pobreza de recursos. A evolu-
elaboração teórica no tratamento da reali- ção dos riscos absolutos e relativos de ser
dade empírica, são consideradas as refle- pobre envolve uma articulação entre des-
xões e os enfoques da questão da pobreza vantagens dadas, meios mobilizáveis e fato-
que valorizam, de algum modo, os planos res protetivos desigualmente distribuídos
das relações sociais, da estruturação das entre as categorias. A estrutura da desigual-
oportunidades e das capacidades dos ato- dade existente pode fazer com que os pro-
res. São incorporadas ao debate teórico, gressos realizados, ou as situações negativas
igualmente, abordagens sociológicas ou encontradas, não se distribuam de modo a

* Doutor em sociologia e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF /Juiz de Fora/MG/BR).
As investigações que realiza sobre classe social, raça, gênero, renda e saúde no Brasil têm sido publicadas
nos principais periódicos de Ciências Sociais do país. josealcidesf@yahoo.com.br.

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favorecer mais ou desfavorecer menos os 1. Pobreza relativa, exclusão social e con-
grupos em maior desvantagem. A noção de trole de ativos
chances relativas oferece o benefício de cap-
tar, numa perspectiva comparativa entre os Embora a noção de pobreza seja um tan-
grupos, a realidade resultante da razão entre to intuitiva, existe muito debate sobre o
as oportunidades negativas de ser pobre (fa- conceito e sua forma de mensuração. Pobre-
tores incrementadores de risco) e as oportu- za diz respeito a um estado de falta de recur-
nidades positivas de não ser pobre (fatores sos que leva a um padrão de vida insuficien-
minimizadores e protetivos). te ou baixo. O nível insuficiente pode ser
Num contraponto à noção de pobreza considerado em termos de um mínimo de
como um padrão fixo de necessidades bási- necessidades humanas de sobrevivência ou
cas, o conceito de pobreza relativa norteia de padrões relativos de bem-estar em uma
o estudo por incorporar e revelar a dimen- sociedade. A adoção de uma linha de pobre-
são de comparação entre os grupos e as in- za absoluta baseia-se numa quantidade mí-
terdependências – entre os padrões para vi- nima de recursos que cada pessoa possui,
ver e os meios para desenvolver atividades sem relação com as situações e experiências
na sociedade. Agrega-se à análise da po- das demais pessoas, como se os padrões de
breza relativa de renda a dimensão de acú- vida não estivessem inter-relacionados. A
mulo de recursos, visando incorporar na re- dicotomia absoluto/relativo, no entanto,
presentação da privação relativa influên- tende a se mostrar problemática quando en-
cias diferenciadas dos fluxos de renda e tra em questão a mensuração do conceito,
suas flutuações. A abordagem da pobreza pois não há como fugir do julgamento das
na perspectiva de classe social leva em con- necessidades e da influência do contexto em
ta que este fenômeno envolve processos que se vive (PLATT, 2006). A noção e a men-
mais extensivos, associados aos mecanis- suração da pobreza absoluta como um pa-
mos institucionalizados de distribuição dos drão pré-determinado de “necessidades bá-
recursos valiosos, cujas consequências não sicas” têm sido aplicadas particularmente
se circunscrevem a um grupo estritamente em países periféricos ou em desenvolvimen-
diferenciado da maioria. Os processos sub- to, mas existe certo ceticismo a respeito da
jacentes à pobreza impactam em diversos capacidade de um limiar fixo de bem-estar
grupos e repercutem em várias direções; ao capturar a complexidade da pobreza. Nos
mesmo tempo, são socialmente seletivos na países desenvolvidos, têm sido preferidas
estruturação dos riscos de pobreza e afetam medidas relativas de pobreza que captam as
com mais força os membros mais vulnerá- diferenças de condições de vida entre o po-
veis das classes mais expostas ou menos bre e a maioria da sociedade, em um contex-
protegidas dos fatores de empobrecimento to nacional e histórico concreto. Medidas re-
(LAYTE; WHELAN, 2002; GOLDTHORPE, lativas são inseridas em um ambiente social,
2010). Essas orientações representam uma refletem os padrões prevalentes de necessi-
contribuição sociológica relevante para o dades, e mostram-se mais pertinentes para a
entendimento das desvantagens e dos ris- investigação sociológica das causas e ten-
cos de pobreza que estão conectados às di- dências da pobreza (BRADY, 2003). Na lite-
mensões institucionais e relacionais da es- ratura econômica, continua a circular a re-
trutura social. jeição da noção de pobreza relativa sob o ar-

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gumento de que é sinônimo de desigualda- mantêm-se como os principais precursores
de, como se a pobreza devesse obrigatoria- da exclusão social, mas o conceito reflete
mente se ancorar em algum tipo de absoluto dimensões sociais e culturais mais amplas.
(SOARES, 2009). Entretanto, enquanto a de- Exclusão social concebida em termos de
sigualdade envolve essencialmente a com- capacidades tem um sentido absoluto, ao
paração entre grupos, a pobreza relativa significar ausência de níveis básicos de
acrescenta a esta comparação a noção de in- funcionamento social, mas reflete uma di-
capacidade de realizar certas necessidades, mensão relativa quando são consideradas
relacionadas à participação na sociedade, as insuficiências de meios econômicos
cujas definições e satisfações dependem dos (BRADY, 20035). Amartya Sen (2000) situa
contextos sociais (LISTER, 2004). Na avalia- a noção de exclusão social dentro da visão
ção da pobreza, não faz sentido ignorar o mais geral de pobreza como um resultado
que ocorre em torno dos pobres, pois os bens da privação de capacidades. A exclusão so-
funcionam como meios necessários para de- cial, nesta ótica, é entendida como uma
senvolver atividades na sociedade em que se parte constitutiva da privação de capacida-
vive (ATKINSON, 1998). A adoção de uma de, assim como uma causa instrumental de
linha móvel de pobreza, referida a um ponto diversas falências de capacidade. A lingua-
intermediário da distribuição, como a renda gem da exclusão tem o mérito de focalizar
mediana, faz com que o limiar da pobreza a atenção nas características relacionais da
fique em sintonia com as mudanças nos ní- privação. Entretanto, a natureza dos pro-
veis típicos da renda, na distribuição da ren- cessos causais é crucial para invocar, ou
da entre a população e nos condicionamen- não, a ideia de exclusão. Ela pode oferecer
tos das necessidades. A noção de pobreza se um entendimento melhor dos diversos fe-
aproxima da ideia de divisão social ao ser nômenos de privação e pobreza que envol-
realçada a dimensão relativa, comparativa e vem a operação de obstáculos relacionais.
de exclusão social. A visão sociológica da Os processos de falência de capacidade e
pobreza como divisão social implica em pobreza, de outro lado, em muitas situações
compreender os fatores que estruturam as nascem da existência de termos desfavorá-
chances de vida das pessoas e geram dife- veis de inclusão e de participação adversa.
renças marcantes nos riscos de pobreza A natureza causal do problema – se exclu-
(PLATT, 2006). são social ou inclusão desfavorável –, deve
Insatisfações com a estreiteza teórica ser claramente diferenciada. Entretanto,
dos conceitos e medidas de pobreza leva- vista nesse ângulo mais abrangente da pri-
ram ao desenvolvimento da noção de ex- vação de capacidades, não existe dificulda-
clusão social. Embora o conceito ainda ca- de em situar e articular as diversas origens
reça de uma fundamentação mais clara, po- e formas de manifestação da falência de ter
de sugerir novas questões e facilitar inova- capacidades básicas adequadas (SEN, 2000).
ções metodológicas. A noção de capacidade Argumenta-se na literatura econômica que
pode prover esta base e servir de elo com o o conceito de exclusão social, mais amplo
problema da pobreza. Esta aproximação se do que a noção de pobreza, reflete a natu-
faz com a consideração de padrões relati- reza multidimensional da desvantagem, o
vos e relacionais que estão enraizados no caráter dinâmico dos processos excluden-
contexto social. Os recursos econômicos tes, assim como as implicações da inade-

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quação de participação social e da falta de renda, no condicionamento das oportunida-
poder (NOLAN; MARX, 2011). des econômicas ou chances de vida. A litera-
Charles Tilly (2007) contesta a visão da tura tem demonstrado a influência da ori-
desigualdade e da pobreza como resultan- gem social na capacidade de acumular ati-
tes da competição entre indivíduos num vos no curso da vida e as marcantes diferen-
contexto em que as regras do jogo são mu- ças na acumulação de ativos entre diferentes
tuamente aceitas: enfatiza o papel dos pro- segmentos da população, mas tem olhado
cessos sociais de exclusão na geração da pouco para as consequências da desigualda-
desigualdade e o impacto da desigualdade de de ativos (MORILLAS, 2007). As contri-
na pobreza entre populações excluídas; e buições sociológicas nesse campo muitas
considera que as distinções e interações or- vezes têm se mantido programáticas, foca-
ganizadas entre membros de diferentes ca- das nas estratégias de escape da pobreza.
tegorias geram mais vantagens para um Propõem-se estratégias de construção de
desses conjuntos de pessoas do que para o ativos que teriam o potencial de alterar os
outro. Essa abordagem está centrada na ex- padrões sociais em que a pobreza é gerada e
clusão de membros das categorias subordi- reproduzida. A redução da pobreza envolve
nadas dos benefícios gerados pelo controle o desenvolvimento de atividades que podem
de recursos. A exclusão produz e mantém a auxiliar a aquisição individual ou coletiva
pobreza relativa do excluído. O impacto da da propriedade de ativos, a capacidade de
exclusão na experiência de pobreza absolu- efetivamente manejar esses ativos e de sus-
ta do excluído depende dos fatores: 1) a ex- tentar ou melhorar a qualidade desses ati-
tensão da exclusão; 2) a disponibilidade de vos. Os ativos financeiros, humanos, sociais
recursos alternativos; 3) o montante abso- e culturais podem propiciar o desenvolvi-
luto da parte que fica com as categorias su- mento de capacidades e favorecer o aprovei-
bordinadas. A exclusão produz pobreza, tamento de oportunidades (OLIVER; GRANT,
mais diretamente, na medida em que os re- 2000). Morillas esboçou uma narrativa ex-
cursos cruciais que são controlados com- plicativa dos elos ao nível micro dos efeitos
prometem os meios de vida da maioria das da riqueza como um dispositivo que condi-
pessoas na população. Os canais organiza- ciona as oportunidades e realizações socioe-
dos categoricamente, em vez da ação pura- conômicas. As (des)vantagens acumuladas e
mente individual, facilitam a superação da sedimentadas no curso do tempo, entre as
pobreza numa escala maior. A redução da gerações e na trajetória da geração atual,
exclusão estimula o escape individual e co- produzem a desigualdade de riqueza, e esta,
letivo da pobreza. Essa redução pode se dar por sua vez, cria uma rede de segurança pa-
pela segmentação ou multiplicação de re- ra os seus possuidores que serve de proteção
cursos produtores de valor, a ação coletiva contra as dificuldades, e de estímulo às ini-
dos excluídos, a descoberta ou criação de ciativas de risco das quais podem ser obtidas
novos recursos por estas categorias e a sub- vantagens. O controle de um nível mínimo
versão das fronteiras entre estas categorias de recursos, ao garantir suficiente bem-estar
(TILLY, 2006). e segurança, assim como certo isolamento
Estudos de estratificação têm enfatizado, dos constrangimentos do mercado, favorece
a partir dos anos 90, o papel do controle de e incentiva o aproveitamento das oportuni-
ativos ou riqueza, como algo distinto da dades de mobilidade e progressão socioeco-

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nômicas. As proposições testadas empirica- ta dos próprios ativos, a redistribuição pode
mente confirmaram a expectativa teórica de envolver a renda dos ricos que seria canali-
que os ativos estão associados com as opor- zada para viabilizar um processo de acumu-
tunidades de aquisição de rendimentos (MO- lação de ativos entre os pobres (BOURGUIG-
RILLAS, 2007). Estudos econômicos inspira- NON, 2006).
ram-se no trabalho de Shapiro e Oliver
(1995) para elaborar a noção de “pobreza de 2. Modelos de classe social da chance de
ativos”. Famílias que não possuem um col- pobreza
chão de rede de segurança (safety-net
cushion), formado pela posse de ativos, são Grusky e Weeden (2008) consideram que
consideradas em posição econômica vulne- os instrumentos de mensuração existentes
rável. Haven e Wolff (2004) consideram que não são plenamente adequados para repre-
a pobreza de ativos compreenderia aquelas sentar a estrutura da pobreza, já que sua re-
famílias nos Estados Unidos com ativos in- presentação envolve considerar e esclarecer
suficientes para atender às suas necessida- a configuração e o formato que ela assume.
des básicas, por um período de três meses, Além disso, índices estatísticos de natureza
na hipótese de perda da renda. Estipulam meramente sumária não capturam a estrutu-
duas definições de ativos: mais ampla de va- ra de grupos institucionalizados. O espaço
lor líquido, ou seja, o valor de todos os ati- da pobreza tem descontinuidades compostas
vos vendáveis, menos os débitos; mais res- por agrupamentos distintos de condições, e
trita de ativos líquidos, isto é, os ativos fi- as categorias constituídas não podem ser
nanceiros ou em dinheiro que possam ser traduzidas em nenhuma graduação unidi-
prontamente convertidos em moeda. A fa- mensional. David Gruksy (2006) caracteriza
mília seria pobre em ativos se o valor do que a prevalência no tratamento sociológico da
possui for inferior a 25% da linha de pobre- questão da desigualdade e da pobreza de
za para famílias do seu tamanho e composi- dois conjuntos de modelos de classe social.
ção. A medida pode ser combinada com me- O primeiro conjunto expressa uma razão ou
dida mais tradicional de pobreza de renda, motivação estruturalista; neste âmbito a
de modo a considerar a pobreza nas duas di- maioria das formulações compartilha a su-
mensões (HAVEMAN; WOLFF, 2004). A crí- posição de que as classes são agrupamentos
tica ao paradigma da pobreza de renda ofe- pré-existentes de condições estruturais que
rece como estratégia alternativa uma mu- compõem uma realidade diferenciada. A vi-
dança de foco explicativo para as dotações. são Weberiana clássica enfatiza o papel de
A distribuição particularmente de ativos de um conjunto de dotações na estruturação de
diferentes tipos, cujos processos estão além chances ou oportunidades de vida típicas. O
do controle dos indivíduos, determinaria a segundo campo de interpretação expressa
ocorrência da pobreza. A pobreza é definida uma razão culturalista: as classes envolve-
em termos de um conjunto multidimencio- riam a existência de agrupamentos social-
nal de dotações e acesso a mercados e bens. mente fechados caracterizados por culturas
A equalização de dotações ou oportunidades distintas que influenciariam as atitudes,
demanda a redistribuição de ativos. Entre- comportamentos e mesmo as preferências
tanto, dados os impedimentos ou dificulda- dos seus membros. Na literatura, as relações
des em fazer a transferência direta e imedia- entre as condições mais objetivas e esse

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complexo cultural têm sido entendidas de ria da pobreza na sociedade e esta não po-
três modos. As culturas de classe são meios de ser adequadamente representada como
culturalmente prescritos, na forma de regras uma minoria homogeneamente diferente e
práticas, que expressam respostas comporta- desconectada da maioria. A pobreza origi-
mentais às condições institucionais preva- na-se de relações sociais institucionaliza-
lentes. Em outra visão, corresponde a fins das por meio das quais uma distribuição al-
culturalmente prescritos que envolvem a tamente desigual dos recursos econômicos
própria avaliação dos objetivos perseguidos é criada e mantida. Vincula-se à classe so-
pelos atores, o que pode gerar “culturas de cial já que diz respeito à existência de dife-
oposição” aos valores mais influentes de ou- renças socialmente estruturadas no risco de
tras classes. As culturas de classe dos pobres ser pobre. A pobreza envolve processos
têm sido consideradas também como mal mais “extensivos”, que se espraiam em vá-
adaptadas, pois filtram informação e geram rias direções na sociedade, afetando parti-
um comportamento de baixa eficácia para cularmente os membros mais vulneráveis
lidar com as circunstâncias desfavoráveis dos estratos em maior desvantagem (TO-
(GRUSKY; KANBUR, 2006). Wilson (2006) WNSEND, 1979; NOLAN; WHELAN, 1999;
entende que o ambiente em que vivem os LAYTE; WHELAN, 2002; GOLDTHORPE,
grupos incorporam constrangimentos e 2010). Em virtude das posições de classe
oportunidades de natureza tanto estrutural que ocupam, os indivíduos possuem dife-
quanto cultural. Os padrões de comporta- rentes recursos que condicionam as possi-
mento da subclasse representam adaptações bilidades e os constrangimentos na obten-
culturais ao bloqueio sistemático de oportu- ção de segurança, estabilidade e perspecti-
nidades no ambiente da cidade e da socieda- va econômicas (GOLDTHORPE; MCK-
de como um todo. Esse processo se reflete NIGHT, 2006). O conceito e a mensuração
nos hábitos, qualificações, estilos e atitudes de classe social têm sido considerados nos
a que a pessoas estão expostas, que passam estudos de pobreza e privação na Europa,
a constituir os traços e características dos com resultados relevantes e promissores.
grupos, e ajudam a explicar os resultados Estas iniciativas têm sido favorecidas pelo
sociais divergentes entre os grupos. próprio processo de compatibilização e in-
O estudo da pobreza deve englobar uma tegração dessa noção sociológica e suas es-
perspectiva relacional e ir além da quantifi- tratégias de mensuração nas estatísticas so-
cação de alterações nos seus padrões de in- ciais da União Europeia. Estudo envolven-
cidência, intensidade e severidade ao nível do quatorze países europeus mostrou que a
agregado. Uma elaboração do nexo entre força do efeito de classe social aumenta na
classe social e pobreza emerge de um en- medida em que o foco explicativo se move
tendimento mais abrangente da dinâmica da pobreza de renda para a privação e des-
de riscos e proteções que afetam as trajetó- ta para a pobreza consistente (renda mais
rias de indivíduos e grupos em relação aos privação). O efeito de classe social aumenta
limiares de pobreza. Duas questões prelimi- igualmente quando se introduz a dimensão
nares são consideradas e articuladas na in- temporal para captar tanto a pobreza per-
terpretação sociológica que orienta o pre- sistente de renda quanto a privação persis-
sente estudo do fenômeno. Determinações tente (WATSON; WHELAN; MAITRE, 2010).
sociais presidem a distribuição não aleató- Estudo comparativo europeu constata uma

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clara hierarquia de classe nos riscos relati- da pobreza absoluta, no período de 2004 a
vos deter persistente vulnerabilidade eco- 2009 no Brasil, ao olhar para o tipo de em-
nômica nos nove países estudados. A clas- prego do pobre, ofereceu indicações acerca
se profissional e gerencial ocupa a posição da natureza “extensiva” dos processos que
mais favorável seguida das ocupações in- levam à pobreza, pois condições diversas co-
termediárias. Os autoempregados e supervi- mo produtor agrícola, empreendedor (autô-
sores e técnicos vem depois na hierarquia nomo), empregado informal e empregado
de classe. Já as ocupações de serviços e téc- formal, estão “bem” representadas entre os
nicas de menor grau estão próximas ao pobres e os vulneráveis. Entretanto, a pobre-
grupo não manual de rotina. Em todos os za e a vulnerabilidade estão menos associa-
casos, mas com variações de grau entre das à condição de empregado formal. Já a
países, as classes de ocupações de rotina es- redução da proporção de empregos formais
tão em maior desvantagem. A investigação entre os pobres no período, mostrou que a
revela padrões de diferenciação por classe ocupação desse tipo de emprego passou a
social dentro dos regimes de bem-estar so- restringir ainda mais a possibilidade de ser
cial na Europa. Os níveis absolutos de vul- pobre (OSÓRIO et al., 2011).
nerabilidade são comparativamente eleva-
dos entre as classes sociais baixas nos regi- 3. Categorias de classe focalizadas e méto-
mes de bem-estar menos afluentes, en- dos de análise
quanto as discrepâncias relativas de classe
são mais marcantes em um número de regi- 3. 1. Características de classe da base da
mes de bem-estar mais afluentes (NOLAN; estrutura social
WHELAN, 2011).
Neste período mais recente de queda da A noção de classe social que orienta a in-
desigualdade de renda no Brasil, ainda são vestigação baseia-se na ligação entre as
poucos os estudos que fazem alguma relação classes, o controle de ativos e a desigualda-
entre classe social e pobreza usando dados de. Classes podem ser definidas estritamente
empíricos de alcance nacional. Um artigo em termos de relações de propriedade e as
utilizou linhas regionalizadas de pobreza desigualdades entre elas podem ser deduzi-
absoluta no ano de 2004 para demonstrar das da assimetria previamente estabelecida
que a proporção de pobres no Brasil varia na distribuição dos ativos. Divisões de clas-
claramente conforme as posições sociais se são constituídas por desigualdades de po-
ocupadas pelas pessoas. O controle de capi- deres e direitos sobre ativos geradores de va-
tal, qualificação e o exercício de autoridade lor que produzem vantagens e desvantagens
diminuem significativamente as possibilida- entre categorias. Ativos geradores de valor
des de ser pobre. A incidência da pobreza são recursos cujo controle e emprego au-
absoluta é de apenas 2% nos empregos de mentam o valor transferível de bens e servi-
classe média, porém alcança 36% no traba- ços. As relações de propriedade e poder na
lhador elementar não agrícola, 33,4% no sociedade capitalista geram formas de desi-
trabalhador elementar agrícola, 35,1% no gualdade estruturada e apoiada pelo contro-
empregado doméstico e 27% no trabalhador le assimétrico sobre os recursos econômicos,
não elementar, mas informal (FURTADO, o trabalho e a renda (TILLY, 1998; WRIGHT,
2011). Um estudo das mudanças do perfil 2005; ROEMER, 1988). Essa, noção permite

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construir uma solução unificadora capaz de de, diversificado e heterogêneo agregado
caracterizar o conjunto da estrutura social destituído de ativos que compõe a base da
do Brasil e, como parte da base da sua hie- estrutura social no Brasil. Na abordagem
rarquia social, as circunstâncias de classe deste agrupamento vale-se de uma exten-
social que este estudo focaliza: 1) a classe são teórica do princípio de exclusão de ati-
trabalhadora típica; 2) os processos de desti- vos ou recursos econômicos valiosos para
tuição e suas diferenciações. O trabalhador delimitar conceitualmente este amplo agru-
típico representa a categoria majoritária e de pamento social (SANTOS, 2010 e 2014). Em
grande densidade social. Caracteriza-se por um sistema em que os ativos são desigual-
possuir o controle pessoal do ativo de capa- mente distribuídos, os agentes que não têm
cidade de trabalho, mas é constrangido a ce- certo montante de ativos estão “livres para
der ao empregador parte dos frutos do em- perder” (ROEMER, 1988). Instalam-se pro-
prego produtivo desta capacidade. Este con- cessos de destituição socioeconômica quan-
tingente mantém uma posição claramente do se intensifica a exclusão, a insuficiência
subordinada na organização social do traba- e a depreciação dos ativos produtores de
lho em relação à propriedade de capital, ao valor. O trabalhador elementar é destituído
controle de credenciais e ao exercício de au- por um processo de elevada depreciação do
toridade. As relações de emprego em que se valor da sua capacidade de trabalho devido
encontra inserido preservam de modo mais às circunstancias de forte assimetria em
típico as interdependências assimétricas ca- que o trabalho manual simples é desenvol-
racterísticas dos processos de dominação e vido. O trabalho assalariado de produção
exploração. Foram apresentados adicional- de valores de uso para o consumo direto de
mente dados relativos ao autônomo agríco- um domicilio, realizado pelo empregado
la: a categoria retrata a situação diferencia- doméstico, além de ser de natureza não co-
da da pequena produção agrícola, onde exis- letiva, isolada e dispersa, em que os pode-
te o controle da terra como ativo produtivo, res e direitos no trabalho são muito assimé-
porém sem a contratação de trabalho assala- tricos, sofre de uma depreciação estrutural
riado. As demais categorias da tipologia de e intrínseca associada ao fato de ser um
classes foram omitidas visando preservar o emprego terminal (dead-end) em que existe
foco escolhido (SANTOS, 2010 e 2014). quase nenhuma chance de progressão nes-
O modelo de classe social considerado ta modalidade de ocupação. O autônomo
padrão nos estudos de pobreza nos países precário é literalmente destituído de ativos,
desenvolvidos corresponde a uma formula- seja de capital ou de qualificação escassa, e
ção de três classes: uma subclasse virtual- vê-se compelido a reproduzir a sua ativida-
mente sem engajamento no mercado de de nos interstícios do mercado de produtos
trabalho; o trabalhador pobre com vinculo e serviços. A dificuldade de acumular ati-
precário num trabalho ou emprego de bai- vos, a grande concorrência entre iguais, a
xo-salário; e o grupo pobre no setor infor- demanda insuficiente ou incerta, as insegu-
mal com uma conexão precária com o au- ranças quanto à operação cotidiana da ati-
toemprego (GRUSKY; WEEDEN, 2008). Em vidade, conjugam-se para depreciar o re-
vez de transpor esta solução para a realida- torno associado à aplicação do esforço de
de nacional, o estudo utiliza uma caracteri- trabalho na atividade. O agrícola precário é
zação socioeconômica específica do gran- destituído devido ao montante insuficiente

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de ativos de terra que possui, seja em fun- pecialista e gerente. De modo diferenciado
ção da incerteza que cerca o seu controle, dos estudos econômicos tradicionais, o ar-
ou face às limitadas possibilidades de apli- tigo privilegia a noção de pobreza relativa,
cação rentável do que possui no mercado. caracterizada por estar abaixo do limiar de
Esse produtor agrícola possui terra pouca 70% da mediana, no critério de padrão de
ou insuficiente: na condição de posseiro, vida considerado. Além disso, introduz
não tem o domínio legal sobre a sua posse, uma abordagem de pobreza relativa de re-
ou vê-se compelido a vender a totalidade cursos, visando captar dimensões das cir-
ou parte (ou a maior parte) da sua produção cunstâncias econômicas que vão além dos
principal para o consumidor direto em mer- fluxos de renda. A análise adota uma linha
cados meramente locais. Aproxima-se do móvel de pobreza, referida à mediana da
prognóstico teórico de destituição econô- renda, de modo a refletir a evolução dos ní-
mica de um modo próprio à atividade agrí- veis típicos de renda, assim como as mu-
cola (SANTOS, 2010 e 2014). danças nos padrões sociais de necessidades
Entende-se que os mecanismos de ex- básicas. Como a mediana da renda não é
clusão, restrição e depreciação de ativos, alta no Brasil, ao contrário dos países mais
nas suas várias manifestações, como ativos ricos, o uso do limiar de 70% da mediana
de capital, terra, qualificação, emprego e mostra-se razoável. Comparações feitas
força de trabalho, estão associados, em com os níveis de pobreza absoluta, calcula-
maior ou menor grau, aos riscos de pobre- dos pela metodologia de Sonia Rocha
za expressa neste estudo como um limiar (2003), mostram que não se propõe um li-
móvel e relativo que reflete as mudanças de miar “exagerado”. No ano de 1992, base de
padrões de vida, as comparações entre gru- comparação, a proporção de pobreza abso-
pos e as influências do contexto social luta na população era de 44%, e a de pobre-
abrangente em que pobres e não pobres es- za relativa era de 29% entre os que têm
tão inseridos. A distribuição de recursos uma posição de classe. Nos anos posterio-
valiosos envolve a operação de padrões res, os níveis de pobreza absoluta ficam
institucionalizados e os riscos de ser pobre muito próximos dos níveis de pobreza rela-
são socialmente estruturados, o que faz tiva que são considerados na análise: 34,0%
com que os processos de empobrecimento contra 35,2% de pobreza relativa em 2002
impactem mais entre os membros mais vul- e 21,9% contra 21,7% em 2009. Os dois in-
neráveis dos estratos sociais em maior des- dicadores, no entanto, passam a divergir
vantagem (GOLDTHORPE, 2010). bem em 2011 (20,6% contra 30,5% de po-
breza relativa) (IETS, 2013a e 2013b). Essa
3.2. Métodos de análise discrepância surge particularmente devido
à elevação da mediana do trabalho princi-
O estudo recorre a modelos logísticos pal que passou de 673 Reais em 2009 para
para avaliar a evolução das chances relati- 800 em 2011, em valores de 2011.
vas das categorias da base da estrutura so- Os efeitos das posições de classe foram
cial de estar em situação de pobreza em estimados na forma de chances relativas
comparação às posições mais privilegiadas (odds ratio) ajustadas. Todos os coeficientes
compostas como um conjunto por capita- nas tabelas foram expressos em termos de
lista, especialista autônomo, empregado es- mudanças percentuais na razão entre as

Divisões de classe e pobreza relativa no Brasil 199


chances ou chances relativas das categorias ses a renda do trabalho principal, por moti-
confrontadas (Odds Ratio – 1 * 100). Os da- vo de ajuste. A renda mediana usada no es-
dos apresentados mostram o quanto au- tudo foi expressa em valores de 2011 usan-
mentam em percentagem as chances de ser do deflatores baseados no INPC, com ajus-
pobre para os membros da categoria indi- tes na transição para o Plano Real (COR-
cada, em comparação ao grupo de referên- SEUIL; FOGUEL, 2002).
cia (omitido) formado pelo conjunto do to- O estudo está estimando discrepâncias
po da estrutura social. Os modelos com entre categorias extremas da estrutura so-
controles incorporam as variáveis raça, gê- cial e efeitos de classe bastante fortes. To-
nero, setor econômico, região geográfica, das as categorias são formadas por muitos
dimensão da área urbana, tempo de traba- casos. Tudo isso favorece sobremaneira a
lho e horas trabalhadas. Gênero foi expres- significância e a precisão das estimativas
so de forma binária. Raça diferencia o gru- que, com regressão logística foram ajusta-
po branco e o não branco. Foram seis os se- das ao desenho complexo do plano amos-
tores econômicos considerados (indústria tral da PNAD, com o comando ‘’svy do Sta-
de transformação, indústria extrativa, ser- ta’’. A passagem para uma estimativa com
viços produtivos, serviços de distribuição, ajuste ao desenho amostral não mostrou
serviços sociais e serviços pessoais). As re- impacto relevante na significância estatís-
giões envolvem Sudeste, Sul, Nordeste, tica dos resultados. Os coeficientes foram
Centro-Oeste e Norte; a dimensão da área estimados com intervalos de confianças de
urbana demarca região metropolitana, mu- 99%. A inspeção dos coeficientes e interva-
nicípios auto representativos (proxy para los de confiança das categorias de interesse
médio porte) e demais municípios. O tempo do estudo (base da estrutura social) não
de trabalho foi estimado pela idade atual desperta nenhuma preocupação razoável.
diminuída da idade quando a pessoa come- O conceito de pobreza relativa de recur-
çou a trabalhar; as horas de trabalho na se- sos expressa um limiar crítico de assimetria
mana são relativas ao trabalho principal, na posse e comando de um estoque de bens
por motivo de ajuste com a renda. O tipo de acumulados no tempo. Foi mensurado nes-
composição familiar, baseada na variável te estudo como uma linha móvel baseada
v4723 originária da PNAD, considera a no valor inferior a 70% da mediana de um
combinação de casal, mãe sem cônjuge, fi- índice ponderado de patrimônio habitacio-
lhos e idade dos filhos, tomando 14 anos nal e bens de consumo duráveis. O índice
como divisor. foi composto de dez itens. Quatro itens vi-
O estudo utiliza os microdados da Pes- sam retratar a habitação, que é o tipo de
quisa Nacional por Amostra de Domicílios patrimônio mais importante que a maioria
– PNAD, levantados pelo IBGE. Foram ex- das pessoas pode ter ‒ além da condição ou
cluídos nos anos recentes os dados da zona não de proprietário, três outros itens foram
rural da região Norte, exclusive Tocantins, escolhidos de modo a retratar o padrão in-
com a finalidade de comparação com os ferior, mediano e superior de habitação.
anos anteriores a 2004. Tendo em vista que Habitação com água encanada em pelo me-
a classificação de classe social foi construí- nos um dos cômodos diferencia por contra-
da com base em informações sobre o traba- ponto o padrão inferior (96% têm água en-
lho principal, utiliza-se em todas as análi- canada), com seis cômodos ou mais o me-

200 Repocs, v.14, n.27, jan/jun. 2017


diano (53% têm) e com dois banheiros ou tualmente ter se tornado maior ou menor.
mais o superior (29% têm) em 2011. Nos Esta característica da noção de chances re-
itens relativos particularmente a bens de lativas faz com que ela possa ser usada
consumo duráveis, procurou-se contemplar para comparar momentos e situações que
tanto itens mais difundidos quanto mais di- diferem na distribuição dos casos entre as
ferenciados. Eles incluem posse de televisão categorias. O foco em diferenças observa-
colorida, geladeira, freezer (ou geladeira de das tem naturalmente limitação, pois par-
duas portas), máquina de lavar, computa- te do que está sendo observado nas cate-
dor e telefone fixo. No espírito da noção de gorias pode se dever a outros fatores, co-
pobreza relativa os itens foram ponderados mo região, por exemplo, e não propria-
conforme o seu grau de escassez, ou seja, mente a um efeito de classe social. Nos
quanto mais escasso maior o seu peso. O modelos estatísticos, estes outros fatores
coeficiente de confiabilidade da escala (al- vão ser controlados de modo a isolar mais
pha de Cronbach) envolvendo estes itens é apropriadamente o efeito de classe social.
de 0,7197. O índice de recursos varia na A Tabela 1 mostra a evolução da pobre-
amostra estudada de 0,48 a 4,09, com 2,26 za de renda, da pobreza de recursos, da pre-
de mediana, média de 2,22 e 0,39 de coefi- valência de um dos dois tipos de pobreza e
ciente de variação. do acúmulo simultâneo de ambos os tipos
de pobreza. A proporção de pobres pode ser
4. Chances relativas de classe de ser pobre vista como uma estatística simples do risco
no Brasil absoluto de pobreza para um grupo (LAY-
TE; WHELAN, 2002). Estes dados apresen-
O trabalho avalia as chances relativas tados se baseiam na mediana do trabalho
das categorias de classe da base da estru- principal dos que têm uma posição de clas-
tura social de se encontrarem numa situa- se que tende a ser mais elevada do que o
ção de pobreza relativa. Num primeiro valor para o conjunto da população. São
momento, antes de estimar as chances re- apresentados também os dados de 2009 pa-
lativas através de modelos logísticos, cabe ra o critério de renda, pois a elevação signi-
considerar a evolução da incidência de ficativa da renda mediana em 2011 (em que
pobreza relativa nas categorias de classe. se baseia a medida) alterou bastante a inci-
Observa-se então a dimensão do que vai dência da pobreza relativa no critério de
ser confrontado, ou seja, os níveis preva- renda do trabalho principal. O indicador de
lecentes de pobreza conforme os critérios pobreza de recursos construído não pode
usados. Isso é importante, pois a análise ser operacionalizado para o ano de 1992 de
das chances relativas de ser pobre não forma comparável com o período mais re-
considera nem o tamanho das categorias cente. Não são apresentados dados de po-
de classe nem a alteração dos níveis de breza de recursos para 2009 já que o indi-
pobreza. Ela avalia essencialmente as cador não é afetado por flutuações da me-
chances relativas entre duas categorias de diana e reflete um processo de acúmulo de
estar num nível de pobreza que pode even- bens que se dá no curso do tempo.

Divisões de classe e pobreza relativa no Brasil 201


Tabela 1 - Incidência de pobreza relativa (%) em categorias de classe dos indivíduos. Brasil, 1992-2011.

Categorias de classe Pobreza de renda P. recursos Um tipo * Ambos **


1992 2002 2009 2011 2002 2011 2002 2011 2002 2011
Topo privilegiado 3,3 3,9 1,8 4,3 7,8 3,4 10,1 7,0 1,6 0,7
Autônomo agrícola 53,7 59,9 50,5 63,9 66,4 58,7 77,3 76,1 49,1 46,5
Trabalhador típico 14,2 22,9 9,1 22,9 38,0 22,4 48,5 36,2 12,4 9,1
Trabalhador elementar 48,9 58,7 31,9 52,8 72,9 55,1 83,8 72,3 47,7 35,6
Autônomo precário 47,0 49,4 46,4 43,8 49,6 32,3 70,0 57,0 29,0 19,0
Empregado doméstico 62,3 69,7 49,1 67,4 57,1 37,5 81,7 72,8 45,2 32,2
Agrícola precário 76,9 84,9 76,9 84,9 86,7 75,6 95,4 91,8 76,3 68,7
Total 28,9 33,6 21,0 30,5 41,8 26,4 53,3 41,8 22,0 15,1

Nota: * Presença de um ou outro tipo de pobreza. ** Presença cumulativa dos dois tipos de pobreza. As proporções es-
timadas são estatisticamente significativas ao nível de 0,01 ou mais. A mediana foi baseada na renda das categorias de
classe e não do conjunto da população.

No geral, os indicadores descritivos de olhar para o acesso a recursos e vice-ver-


pobreza de renda aumentaram em 2002, sa. As duas dimensões devem ser levadas
entraram em queda de lá até 2009, mas em conta tendo em vista as diferenças de
aumentaram depois de modo a ultrapassar natureza, implicação e incidência entre es-
o patamar de 1992 – esse aumento, no en- sas situações. Pesquisas sobre pobreza e
tanto, se deve à elevação da mediana em privação na União Europeia têm constata-
2011. As categorias de assalariados tive- do uma significativa disjunção (mismatch)
ram um melhor desempenho no período de entre as medidas baseadas em renda e os
2002 a 2011. O trabalhador típico sempre indicadores não monetários de privação
esteve abaixo da incidência percentual ge- material. Este nível de disjunção existe
ral de pobreza, e as demais categorias não tanto na mensuração transversal quanto
privilegiadas sempre acima. Num movi- longitudinal. A renda parece não captar
mento diferenciado do critério de renda, a apropriadamente o padrão de vida dos do-
proporção de pobreza de recursos experi- micílios decorrente da relação entre co-
mentou uma redução ponderável ou ex- mando sobre recursos e necessidades (NO-
pressiva para todas as categorias estampa- LAN; WHELAN, 2011).
das. Todas as posições destituídas, do tra- A Tabela 2 mostra como evoluíram as
balhador elementar ao agrícola precário, chances relativas (odds ratio), já converti-
encontram-se num tipo de situação de po- das em percentagem, de se estar numa si-
breza, na maioria dos casos num patamar tuação de pobreza relativa. O grupo de
superior aos 70%. A marcante diferença comparação (omitido) é formado pelo bloco
entre a incidência de uma das formas de de posições privilegiadas de classe compos-
pobreza e a ocorrência simultânea de am- to por capitalista, especialista autônomo,
bas as formas mostra que os dois critérios empregado especialista e gerente. Esse
não convergem. Este fenômeno sugere a agrupamento perfaz 9% da estrutura social
limitação de focalizar apenas a renda sem em 2011. Tendo em vista a mudança do li-

202 Repocs, v.14, n.27, jan/jun. 2017


miar de pobreza relativa, devido à ponderá- O contraste realizado com a pessoa de
vel elevação da mediana em 2011, são referência da família (PRF), que representa
apresentadas também as estimativas para uma forma de tomar a família como unida-
2009. Essa elevação significativa da renda de de análise, mostra, ao final do período,
mediana serve para mostrar, numa espécie uma desigualdade de classe mais intensa
de experimento natural, como os diferentes nas chances relativas de ser pobre. A pes-
grupos acompanham ou se defasam quan- soa de referência da família tende a apre-
do ocorre uma melhora no patamar da ren- sentar uma situação de classe mais favorá-
da disponível e como isso afeta a sua posi- vel do que os demais membros. Isso signifi-
ção relativa face ao novo limiar de pobreza ca que os mais privilegiados têm pessoas de
que se estabelece. O fato da linha de pobre- referência ainda mais proeminentes. Ao se-
za relativa elevar-se com o aumento do ní- rem comparadas as famílias com este indi-
vel geral da renda reflete o processo de “in- cador, no ano de 2011 as discrepâncias de
terdependência dos padrões de vida” (AT- oportunidades de ser ou não ser pobre en-
KINSON, 1976). Note-se, em primeiro lugar, tre as classes mostram-se ainda maiores,
que o condicionamento de classe sobre a revertendo um padrão inverso que antes
chance relativa de pobreza é muito elevado. predominava. Note-se, por fim, que as
Regra geral, alguém, em posição destituída, chances de classe de ser pobre da pessoa de
tem uma chance 1400% a mais, quando referência não são afetadas pelo tipo de
não maior, de ser pobre relativamente fa- composição familiar (FAM), pois as estima-
lando no contraste com alguém em posição tivas são pouco alteradas ao ser agregada
privilegiada. O trabalhador típico tem uma esta variável. O coeficiente da família for-
posição melhor, mas ainda hoje tem uma mada por mãe com filhos menores (não
chance 588% maior. No conjunto do perío- mostrado aqui) mostra que esta tem mais
do, as chances relativas de ser pobre se re- chance de ser pobre de renda, ao controlar
duziram até 2009 para as categorias de tra- por classe, raça, gênero e os demais fatores,
balhador elementar e empregado domésti- mas isso não afeta as chances de classe de
co, mas voltaram a subir fortemente em ser pobre em relação ao grupo privilegiado.
2011, indicando que as oportunidades des- Note que este padrão não pode ser genera-
tes grupos ficaram defasadas no curso do lizado para outros contrastes de classe dife-
processo de elevação da mediana. rentes deste grupo de comparação.

Divisões de classe e pobreza relativa no Brasil 203


Tabela 2 - Chances relativas (%) de pobreza de renda em comparação ao topo privilegiado. Brasil, 1992-
2011. Modelos com controles.

Categorias de classe Classe do indivíduo PR Família +FAM


1992 2002 2009 2011 1992 2002 2011 2011
Autônomo agrícola 976 1686 1774 2733 763 1475 2819 2796
Trabalhador típico 338 604 288 588 240 511 663 657
Trabalhador elementar 1074 2409 988 2206 877 2577 2959 2954
Autônomo precário 1579 1684 2120 1428 1419 1581 1794 1787
Empregado doméstico 2078 2487 1322 2123 1795 2126 2634 2682
Agrícola precário 1653 3995 3747 6176 1334 3386 6496 6445
Pseudo R2 * 0,33 0,32 0,38 0,30 0,34 0,35 0,34 0,34

Fonte: Tabela A-1 do Anexo Estatístico.


Nota: * Vide nota no anexo. Estimativas realizadas com todas as categorias da tipologia de classes. Coeficientes estatisti-
camente significativos ao nível de 0,0001. PR Família: pessoa de referência da família. FAM: composição familiar.

Tendo em vista os limites do critério de lativas de classe de ser pobre de recursos,


renda, o trabalho introduz, com a Tabela no contraste entre base e topo da estrutu-
3, a noção de pobreza relativa de recursos, ra social, pois o seu controle não reduz a
visando captar outras dimensões da priva- diferença. Ao contrário, o tipo de família
ção relativa e da insegurança econômica. funciona como uma espécie de variável de
Os dados da Tabela mostram que as chan- supressão do efeito original. Isto significa
ces relativas de ser pobre de recursos, em que as discrepâncias seriam um pouco
comparação ao grupo privilegiado, pouco maiores se não fossem as diferenças de ti-
se alteraram ou se deterioram para os que pos de família, já que elas crescem quando
têm desvantagens de classe. Ao se mudar este fator é controlado. A família formada
a unidade de análise do indivíduo para a por mãe com filhos menores tem mais
pessoa de referência da família, a desvan- chance de ser pobre de recursos, ao se
tagem de classe aumenta. Esta última op- controlar por classe, raça, gênero e demais
ção oferece possivelmente um melhor fatores (dados não mostrados na Tabela).
ajuste, pois o indicador de recursos cons- Entretanto, o controle da composição fa-
truído foi aferido ao nível do domicílio. O miliar aumenta a chance de ser pobre nes-
tipo de família da pessoa de referência não tas categorias de classe social em relação
explica o padrão existente de chances re- ao grupo privilegiado.

204 Repocs, v.14, n.27, jan/jun. 2017


Tabela 3 - Chances relativas (%) de pobreza de recursos em comparação ao topo privilegiado. Brasil, 2002-
2011. Modelos com controles.

Categorias de Classe Indivíduo PR Família


2002 2011 2002 2011 + FAM
Autônomo agrícola 451 782 518 844 900
Trabalhador típico 482 506 576 565 596
Trabalhador elementar 1290 1377 1596 1594 1694
Autônomo precário 654 684 746 733 761
Empregado doméstico 1049 1097 1202 1125 1238
Agrícola precário 1116 1247 1379 1377 1457
Pseudo R2 * 0,21 0,24 0,23 0,24 0,26

Fonte: Tabela A-2 do Anexo Estatístico.


Nota: * Vide nota no anexo. Estimativas realizadas com todas as categorias da tipologia de classes. Coeficientes estatisti-
camente significativos ao nível de 0,0001. PR FAMÍLIA: pessoa de referência da família. FAM: composição familiar.

A comparação entre as chances de po- menos suscetível de alterações do que os


breza de renda e de pobreza de recursos fluxos de renda.
mostra-se informativa. As desigualdades de
chances relativas de ser pobre dos indiví- Considerações finais
duos são muito mais pronunciadas no crité-
rio de renda do que no de recursos. Esse re- O estudo conjugou o uso de classe como
sultado parece refletir tanto a existência de determinante de resultados e o foco na po-
maior dispersão na renda pessoal, quanto a breza relativa como resultado a ser aferido.
menor capacidade do indicador de recursos Uma parte ponderável das posições desti-
de captar discrepâncias, pois este apresenta tuídas de ativos de valor, devido aos pro-
um coeficiente de variação baixo. No perío- cessos de exclusão, insuficiência ou depre-
do pós 2002 as discrepâncias de classe entre ciação de ativos, não é pobre relativamente
os indivíduos aumentam para os estratos falando. Entretanto, a incidência da pobre-
agrícolas em ambos os critérios. Entretanto, za, quando computada a presença de algu-
nas demais categorias, as desigualdades ma das duas formas, renda ou recursos,
caem no critério de renda e aumentam um chega a atingir mais de dois terços das pes-
pouco no critério de acúmulo de bens. Na soas. A mensuração da pobreza relativa
verdade, as reduções mais ponderáveis ocor- mostrou-se como um instrumento revela-
rem basicamente no critério de renda para as dor para olhar para a realidade brasileira.
categorias de autônomo precário e emprega- Ela capta mudanças importantes na posi-
do doméstico . O quadro configurado na ção relativa dos grupos. O tratamento da
análise da pobreza relativa parece refletir o noção de pobreza de recursos agregou uma
fato de que as oportunidades comparativas dimensão diferenciada que não é captada
de acumulação de recursos, mensuradas por pela informação sobre renda. Algumas ca-
um indicador que leva em conta a escassez tegorias na base da estrutura social são
relativa desse estoque de bens, mostra-se mais pobres de renda e outras no plano dos

Divisões de classe e pobreza relativa no Brasil 205


recursos. A divergência na incidência dos na avaliação do padrão de vida. A tese do
dois tipos de desvantagem, embora em par- potencial extensivo e da estruturação social
te reflita diferenças na unidade de análise dos riscos de pobreza orientou uma investi-
(indivíduo ou família), mostra que ambos gação incomum no Brasil das desigualda-
os fatores precisam ser considerados na des de classe nas chances relativas de estar
avaliação do padrão de vida. A disjunção em situação de pobreza, num contexto de
constatada entre os dois indicadores revela queda da desigualdade da renda. Embora a
um aspecto positivo, já que a sua sobrepo- incidência da pobreza relativa tenha se al-
sição seria o pior dos mundos. O resultado terado no período, com altos e baixos entre
sinaliza a importância de aprofundar o en- 33,6% e 21%, isso não mudou o condicio-
tendimento da divergência entre os fluxos namento de classe dos riscos de pobreza,
de renda e o acúmulo de recursos no âmbi- em termos comparativos, de um modo con-
to dos grupos em desvantagem. sistentemente mais favorável aos grupos
A diminuição da incidência proporcional mais vulneráreis. Num contraponto aos es-
da pobreza relativa após 2002 pode ser vista tudos e debates atuais que se fixam unila-
como um benefício geral, mas isso não quer teralmente nos padrões de incidência da
dizer que todos tenham se beneficiado igual- pobreza e em distinções entre os pobres, o
mente do que ocorreu. As discrepâncias de estudo demonstrou, para o caso brasileiro,
classe social nas chances relativas de ser po- como um resultado geral (positivo ou nega-
bre mantiveram-se em níveis muito eleva- tivo) pode ser repartido sem alterações con-
dos ou ampliaram-se no conjunto do perío- sistentes e marcantes nas oportunidades re-
do. No subperíodo pós 2002, as chances re- lativas dos grupos em maior desvantagem.
lativas de se estar em situação de pobreza A pobreza envolve processos de exclu-
relativa de renda, em contraste com o topo são, restrição ou depreciação de recursos
privilegiado, excetuando os dois estratos que levam a um padrão de vida insuficien-
agrícolas, melhoraram um pouco para os de- te e a uma inserção social desfavorável na
mais grupos da base ao se focalizar o indivi- sociedade. As circunstâncias que caracteri-
duo como unidade de análise. Ao se tomar zam a condição de pobre estão se alterando
a pessoa de referência da família como uni- e alimentando mudanças nos limiares de
dade, as chances relativas pioraram para to- pobreza que se movem no curso do tempo.
dos na base, inclusive na década mais recen- Os grupos e os indivíduos podem em dife-
te. A desigualdade no processo de acúmulo rentes graus ultrapassar, acompanhar ou se
de recursos, que considera a distribuição re- defasar em relação ao novo padrão de vida
lativa dos bens e das chances de obtê-los, que se tornou disponível. Pobreza não é um
embora mostre discrepâncias menores de estado permanente que adere a um grupo
chances relativas na comparação com a ren- relativamente fixo de pessoas com determi-
da, revela-se persistente no período recente nados atributos compondo um circuito fe-
pós 2002. chado. Não parece fazer sentido sociológi-
O estudo mostrou a pertinência da ado- co a ideia de categorias de risco total ou
ção de uma linha móvel de pobreza relati- risco zero de pobreza. Num sentido mais
va para a análise da realidade nacional. geral, pobreza é uma questão de riscos, não
Além disso, indicou a necessidade de agre- estritamente confinados, que são alimenta-
gar a consideração da pobreza de recursos dos e precipitados por diferentes tipos de

206 Repocs, v.14, n.27, jan/jun. 2017


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208 Repocs, v.14, n.27, jan/jun. 2017


Anexo Estatístico

Tabela A-1 - Chances Relativas (Odds ratio-OR), com Intervalos de Confiança (IC) de 99%, de estar em Po-
breza Relativa de Renda (indivíduos). Brasil, 1992, 2002 e 2011.

Variáveis PNAD 1992 PNAD 2002 PNAD 2011


OR** IC 99% OR** IC 99% OR** IC 99%
Autônomo agrícola 10,78 8,62 13,49 17,86 13,62 23,42 28,33 22,63 35,48
Trabalhador típico 4,34 3,59 5,27 7,04 6,12 8,10 6,88 5,99 7,90
Trabalhador elementar 11,62 9,51 14,20 25,09 21,52 29,25 23,06 19,81 26,84
Autônomo precário 16,62 13,57 20,36 17,84 15,23 20,90 15,27 13,11 17,80
Empregado doméstico 21,53 17,33 26,75 25,87 21,78 30,73 22,23 18,86 26,20
Agrícola precário 17,53 13,59 22,62 40,95 25,47 65,82 62,76 42,06 93,64
Homem 0,59 0,56 0,63 0,54 0,51 0,57 0,49 0,47 0,52
Branco 0,70 0,66 0,73 0,67 0,64 0,71 0,72 0,69 0,76
Anos de trabalho 0,99 0,98 0,99 0,983 0,981 0,985 0,988 0,986 0,989
Horas trabalho 0,96 0,96 0,96 0,961 0,959 0,962 0,958 0,955 0,960
Norte 0,55 0,50 0,60 0,47 0,42 0,51 0,54 0,50 0,59
Centro-Oeste 0,36 0,34 0,39 0,30 0,27 0,32 0,24 0,22 0,27
Sudeste 0,26 0,24 0,27 0,23 0,21 0,45 0,21 0,20 0,23
Sul 0,26 0,24 0,28 0,22 0,19 0,25 0,18 0,16 0,20
Ind. de transformação 0,62 0,57 0,68 0,56 0,51 0,61 0,55 0,50 0,59
Serv. de distribuição 0,56 0,51 0,61 0,68 0,62 0,74 0,71 0,66 0,77
Serv. produtivos 0,25 0,21 0,29 0,36 0,32 0,41 0,46 0,42 0,52
Serviços sociais 0,32 0,29 0,35 0,40 0,36 0,45 0,45 0,41 0,50
Ind. extrativa 1,57 1,41 1,76 1,15* 0,97 1,38 0,93* 0,81 1,07
Região Metropolitana 0,36 0,34 0,38 0,40 0,37 0,43 0,44 0,41 0,47
Município porte médio 0,46 0,43 0,49 0,52 0,48 0,56 0,51 0,47 0,54
Constante 3,55 2,90 4,61 4,39 3,62 5,33 4,23 3,50 5,11
Pseudo R2 *** 0,33 — — 0,32 — — 0,30 — —

Fonte: IBGE. PNAD 1992, 2002 e 2011 – Microdados.


Nota: Coeficientes das categorias de classe focalizadas no estudo são estatisticamente significativos ao nível de 0,0001. *
Coeficiente estatisticamente não significativo (IC cruza 1 = inexiste associação). ** OR: valor 1 equivale à inexistência de
associação estatística. Valores menores que 1 implicam em associação negativa e maiores que 1 em associação positiva.
*** Estatística extraída de modelos similares, porém sem ajuste ao desenho amostral complexo da PNAD. Categorias de re-
ferência omitidas: classe (bloco privilegiado), cor (não branco), gênero (mulher), região (Nordeste), setor (serviços pesso-
ais) e dimensão urbana (municípios menores). Modelos logísticos com ajuste ao desenho amostral complexo da PNAD. Nos
dados de 1992 não foi possível usar o comando ‘’svy do Stata’’. Estimativas completas para a pessoa de referência da famí-
lia e o ano de 2009 podem ser requisitadas ao autor: josealcidesf@yahoo.com.br

Divisões de classe e pobreza relativa no Brasil 209


Tabela A-2. Chances Relativas (Odds ratio-OR), com Intervalos de Confiança (IC) de 99%, de estar em
Pobreza Relativa de Recursos (indivíduos). Brasil, 2002 e 2011.

Variáveis PNAD 2002 PNAD 2011


OR** IC 99% OR** IC 99%
Autônomo agrícola 5,51 4,53 6,70 8,83 7,19 10,83
Trabalhador típico 5,83 5,19 6,54 6,06 5,25 7,09
Trabalhador elementar 13.90 12,19 15,86 14,77 12,64 17,25
Autônomo precário 7,54 6,66 8,54 7,84 6,71 9,15
Empregado doméstico 11,49 9,97 13,25 11,97 10,06 14,25
Agrícola precário 12,16 9,54 15,49 13,47 10,60 17,10
Homem 1,36 1,31 1,42 1,31 1,26 1,37
Branco 0,58 0,55 0,61 0,60 0,57 0,63
Anos de trabalho 0,994 0,992 0,995 0,994 0,995 0,998
Horas trabalho 1,000* 0,999 1,002 0,996 0,994 0,998
Norte 0,57 0,50 0,65 0,58 0,52 0,64
Centro-Oeste 0,43 0,38 0,48 0,33 0,29 0,36
Sudeste 0,37 0,34 0,41 0,24 0,22 0,26
Sul 0,22 0,20 0,25 0,19 0,17 0,21
Ind. de transformação 0,97* 0,90 1,05 1,08* 0,99 1,18
Serv. de distribuição 0,77 0,71 0,83 0,78 0,72 0,85
Serv. produtivos 0,53 0,48 0,59 0,51 0,46 0,57
Serviços sociais 0,56 0,51 0,61 0,61 0,55 0,67
Ind. extrativa 1,86 1,64 2,10 1,67 1,45 1,92
Região Metropolitana 0,52 0,48 0,56 0,33 0,30 0,36
Município porte médio 0,57 0,52 0,62 0,44 0,41 0,48
Constante 0,53 0,45 0,63 0,38 0,31 0,45
Pseudo R2 *** 0,21 — — 0,24 — —

Fonte: IBGE. PNAD 2002 e 2011 – Microdados.


Nota: Coeficientes das categorias de classe focalizadas no estudo são estatisticamente significativos ao nível de 0,0001.
* Coeficiente estatisticamente não significativo (IC cruza 1 = inexiste associação). ** OR: valor 1 equivale à inexistência
de associação estatística. Valores menores que 1 implicam em associação negativa e maiores que 1 em associação positi-
va. *** Estatística extraída de modelos similares, porém sem ajuste ao desenho amostral complexo da PNAD. Categorias de
referência omitidas: classe (bloco privilegiado), cor (não branco), gênero (mulher), região (Nordeste), setor (serviços pes-
soais) e dimensão urbana (municípios menores). Modelos logísticos com ajuste ao desenho amostral complexo da PNAD.
Estimativas completas para a pessoa de referência da família e o ano de 2009 podem ser requisitadas ao autor: josealci-
desf@yahoo.com.br

210 Repocs, v.14, n.27, jan/jun. 2017


RESUMO ABSTRACT
O artigo analisa a evolução, no período de The article analyzes over two decades the
duas décadas, da associação entre classe evolution of the association between so-
social e chances de ser pobre nos critérios cial class and chances of being poor in the
de renda e de recursos no Brasil. Modelos criteria of income and assets in Brazil. Lo-
de regressão logística foram usados para gistic regression models were used to esti-
estimar as chances relativas (odds ratio), mate the adjusted odds ratio of being in
ajustadas, de estar em situação de pobreza relative poverty (70% of the median
relativa (limiar de 70% da mediana). Na ba- threshold). At the bottom of the social
se da estrutura social, as desigualdades de structure, compared to the privileged top,
oportunidades relativas de ser pobre no cri- relative inequalities of opportunities of
tério de renda pessoal disponível, em com- being poor in the criterion of personal in-
paração ao topo privilegiado, mantiveram- come remained at very high levels or in-
se em níveis muito elevados ou ampliaram- creased. The relative odds of being poor in
se. As chances relativas de ser pobre de re- assets in the period after 2002 have
cursos ou bens acumulados no período pós changed little or have some deterioration
2002 se alteraram pouco ou tiveram certa for those at disadvantages. Progress in liv-
deterioração para os que têm desvantagens ing standards of the population was not
de classe. Os progressos nos padrões de vi- accompanied by a marked reduction in the
da da população não se fizeram acompa- unequal distribution of protective factors
nhar de reduções marcantes na distribuição that minimize risks and vulnerabilities
relativa de fatores protetivos que minimi- that enhance risk of being in relative pov-
zam riscos e de vulnerabilidades que po- erty in the contrast between the top and
tencializam riscos de estar em situação de the bottom of the social structure.
pobreza relativa no contraste entre o topo e
a base da estrutura social.

PALAVRAS-CHAVE KEYWORDS
Pobreza relativa. Classe social. Estrutura Relative poverty. Social class. social struc-
social. Renda e recursos. Sociedade brasi- ture. Income and resources. Brazilian so-
leira. ciety.

Recebido em: 27/03/15


Aprovado em: 14/06/16

Divisões de classe e pobreza relativa no Brasil 211

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