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3 IDEIAS MODIFICADAS EM OBJETOS DO SENSO COMUM 3.1 A objetivagdo Como ¢ formada a representagio de um objeto social de tal ‘maneira que a ameaca que representa seja evitada e a identidade que ameaga soja restaurada? A questo no pode ser totalmente Tespondida. Além disso, o verbo “formar” nao tem um significado genético; designa mais uma sucessdo provavel de fenémenos cu- Jas etapas, um dia, serdo validadas pela observagao experimental, Porém, nao se trata somente de hipéteses, Essa sucessio foi esta- belecida pelo relacionamento de varias andlises e o material da en- ‘quete corrobora nossas afirmagées e, caso necessdrio, corrige a eventual artificialidade. A representacdo social é elaborada a partir de dois processos fundamentals: a objetivagao e a ancoragem. A lenta assimilagdo da psicanalise pe Social e a influéncia dos valores de refe- éncia sobre sua evolugdo se relacionam com a ancoragem, ‘sabemos, a objetivagao permite tomnar real um escruema cot itu- ale substituir uma imagem por sua contrapartida material, resul- tado que tem primeiramente um alcance cognitivo: o estoque de {ndicios ¢ de significantes que a pessoa recebe, emite e manipula no ciclo das infracomunicagées pode tornar-se superabundante, Para reduzir a distancia entre a massa de palavras que circulam @ 08 objetos que as acompanham, e como néo se poderia falar de “nada”, os “signos linguisticos” s4o acoplados a “estruturas mate- ‘Hais" (tentamos acoplar a palavra a coisa). Esse processo é mais indispensavel quanto mais a linguagem - a linguagem cientifica rincipalmente ~ pressupuser as convengées que fixam sua ade- cquacto ao real Por exemplo, 0 “complexo de Bdipo” designa, se- gundo Freud, uma organizagao especifica da relacdo pais-filhos, Os psicanalistas reagrupam sob essa formula um conjunto de liga- (98es entre os incividuos e a utilizam para interpretar alguns sinto- 100 mas. Esse emprego, no entanto, néo implica de modo algum apre- ‘senga do complexo. Os individuos e grupos que desconhecem as regras pr6prias da psicandlise e néo participaram da convengio, tomama palavra como indicador de um fenémeno material atesta- do. Quando a ruptura entre as normas técnicas da linguagem e 0 1éxico corrente acontece, o que era simbolo aparece como signo. natural, assim, que procuremos saber signo de que e fazé-lo cor- responder a uma “realidade” Através dessa descentralizagdo, os elementos da linguagem cientifica passam para a linguagem corrente na qual obedecem a novas convengées. As palavras “complexo" e “recalque”, investi- das de novo poder, designam manifestagdes ostensivas do real’. No limite, mesmo que depois de muito tempo a psicandlise tivesse sido esquecida, como foi o caso da fisica de Aristoteles, ainda as- ‘sim impregnaria nossa visdo do mundo e seu vocabulario sempre serviria para designar os comportamentos psicolégicos. Ot ‘significa resolver o excesso de significagdes pela mate (e assim guardar distancia em relagao a elas). Também ‘transplantar, no plano da observagao, o que era sé inferé1 simbolo. Conforme observa Gibson: “A percepgao visual frequen- temente ndo nos da a impressao do conhecimento, mas de um co- nhecimento imediato ou de um contato direto"’. As ideias ndo sao mais percebidas como produtos da atividade intelectual de alguns espiritos, mas como reflexos de coisas que existem no exterior. Houve substituigéo do conhecido pelo percebido. O distancia- ‘mento entre a ciéncia e o real diminui, 0 que era especifico de um coneeito & proposto como propriedade de sua contrapartida no teal. Assim, cada um pode, em nossa sociedade, reconhecer os “complexos” de um individuo como se fossem atributos de sua ‘pessoa; sem que, no entanito, esse reconhecimento esteja associa. do a psicanalise Analisamos a seguir a importéncia e as formas possiveis da objetivagao. 1."0 observador normal supbe ingen ‘Acota a manifestagto da percepcao (fo visual é meciada pel sistema do ded DT. & HERSKOVITZ, MJ. The influence of ‘Bobb- Meri, 1986, p:) 2. GIBSON, JJ. "Picture, perspective and perception”, Dasdalue, 89, 1960, p. 220, 101 No capitulo anterior vimos como a difuséo de uma ciéncia co- Joca em diivida a integridade da coletividade, escapando ao con- tole, e como cria uma telagSo de dependéncia relacionada ao gru- ‘po que a representa. Para que uma concepgao cientifica se harmo- nize com as condutas as quais nos identificamos, é preciso que seja afastada do grupo de “especialistas” Quando objetiva o conteiido cientifico da psicandlise, a socie~ dade deixa de se situar em relagdo & psicandlise e aos psicanalis- tas e o faz em relacdo a uma série de fenémenos que trata como bem entende. A confirmago dos homens se transforma na confir- ‘mago dos sentidos, 0 universo desconhecido se toma familiar a todos. 0 individuo, ligado ao meio que nao sofre mais a interven- io do especialista ou da ciéncia, passa da relago com 0 outro ‘para a elago como objeto, ¢ essa apropriacdo indireta do poder & ‘um ato gerador de cultura: “Raification the making of ideas into things located outside of n- dividual mentality —is proscribed (sometimes not invariably) ia f sciance and even In some part of common sense. rescribed as a Canon of the common sense of cultural involvement... Collective reification, then, isthe most revealing ‘concise account of cultural idea treated in terms of ts behavio- ral sources. How persons succeed in projecting notions on toa publi he erg probe ote empial esearch ig cu ture to behavior ‘A maior parte dos estimulos provocados por nossa resposta 6, de fato, 0 resultado de duplo esforgo. O primeiro, como falamos, 6 ‘um salto no imaginario que transporta os elementos objetivos para ‘omeio cognitive e prepara uma mudanga fundamental de estatuto ede fungao. Naturalizados, presume-se que os conceitos de com- plexo e inconsciente reproduzam a imagem de uma realidade qua- ‘se fisica. O carter intelectual do sistema ao qual participam perde importéncia; mesmo ocorre com 0 aspecto social de sua exten- 40, O segundo cortesponde ao esforgo de classificagao que esta~ belece e organiza as partes do ambiente e, por recortes, introduz ‘uma ordem que se adapta & ordem preexistente, dessa forma ate- nuando 0 choque que qualquer concepgao nova causa, Seja ela adaptada aos seres, aos gestos ou aos fendmenos, a classificagao ‘3, ROBE, B.“Untermites in cane: eas wih histone". n: WASHBURN, NF. (ea) ‘Desnona, Vaies and Groups. Vo 2. OnorMLanties \sel, p72, 102 responde a uma necessidade psicologica. Trata-se de cortar o flu xo incessante dos estimulos para conseguir se orientar e decidir cquais sto os elementos acessiveis, sensorial ou intelectualmente, Um diagrama ¢ imposto permitindo nomear os diferentes aspectos do real e, assim, defini-lo. Se um diagrama diferente aparece, a nova nomenclatura associada as entidades preexistentes ajuda a redefini-las. Depois do surgimento da psicandlise nao se diz mais que al- guém é irascivel ou briguento, diz-se que agressivo ou recalca- do. As categorias do normal e do patolégico mudaram. Naturalizar classificar s&o duas operagdes essenciais da objetivacdo. Uma ‘toma o simbolo real, a outra dé a realidade um ar simbdlico. Uma enriquece a gama de seres atribuidos a pessoa (e nesse sentido podemos dizer que as imagens participam do nosso desenvolvi- mento), a outra destaca certos desses seres de seus atributos para poder olh-los no quadro geral conforme o sistema de referéncias que a sociedade institu Neste capitulo e nos dois subsequentes, tentarei mostrar que a0 se desenvolver, a cultura leva todas as partes a um denomina- dor comum. 3.2 Da teoria a representacao social 3.2.1 O que é a psicandlise? Como uma teoria cientifica se transforma em representagao social? Percebi desde o inicio que af estava uma questéo funda- mental para 0 meu trabalho. Talvez possamos responder come- gando por compreender o que é uma ciéncia explicativa. Mas sei o quanto responder a tal questao comporta de armadilhas e preferi contornar 0s obstAculos filoséticos e epistemoldgicos partindo do seguinte postulado: A psicandlise é uma ciéncia explicativa. Para poder qualificar uma teoria de explicativa basta mostrar ue o conjunto de suas leis é subentendido pelo principio funda- mental. Se, por exemplo, nos referimos ao sistema newtoniano, observamos que é a partir do fendmeno principal da gravitagao ‘universal. que explica a maioria dos movimentos em nosso planeta as interagdes entre planetas. De fato, a queda dos corpos, a traje- 103 t6ria dos planetas, a gravitagdo eram fendmenos conhecidos isola- damente até que a sintese newtoniana‘ deu-lhes o cardter unitario. Que a propria natureza da gravitagao universal fosse desco- nhecida em nada mudaria sua fungo epistemologica. A “libido” 6 para a psicandlise o que a gravitagdo universal € para o sistema newrtoniano. Ou pelo menos as primeiras esquema- tizagdes de Freud (as que marcam presenga em nossa sociedade) foram centradas nesse fenémeno fundamental. A classificagao das neuroses, a sintomatologia, as telagées pais-filhos, a interpre- taco dos sonhos e do simbolismo dela derivam ou para ela con- vergem. A primeira “versio” da psicandlise era estruturada em ‘tomo desse principio, a propria nogdo de libido nunca foi de uma clareza absoluta. Vejamos entao como a psicandlise é definida pelo publico e que esquema do funcionamento psiquico lhe é atribuido. Novecentos e cinquenta pessoas pertencentes a todas as ca- tegorias so ssponderam @ questao aberta: “Para vocé 0 que é a psi 7" A tonalidade fugitiva de certos enunciados, opondo-se a ge- neralidade estereotipada de outros, demonstra a dificuldade de colocé-los no molde das categorias. Comegamos pela exposicao dos contetidos do que foi enunciado livremente. Primeiro, a psica- nélise é uma ciéncia, uma teoria: “Estudo cientifico do individuo” (P.O_). “A psicandlise é uma teo- ria cientifica” (P.E.). “Uma ciéncia que permite conhecer 0 ho- mem" ‘Giéncia relativamente moderna qug aborda os pro- blemas até aqui reservados ao ocultistas” (P.M.) Essas definigdes demonstram que seus autores nao tém con- digdes de detalhar o contetido da psicandlise. Trata-se para eles somente de colocé-la dentro de um dominio conhecido. Muitas vezes é a nogdo de terapia que predomina. Essa nogao aparece ra~ ramente sozinha, mas sua frequéncia mostra que a psicandlise é percebida frequentemente como uma pratica. Que a terapia seja 4, KOYRE, A. “The signifance of the newtonian synthesis”. Arch. Intemat. His. 8. 1, 1969, p. 281-311. 65. Bssas deingbes aparecem com a seguinte frequéncla: 17% nos estudantes, 10% nosin- teleceuais, 6% nos informantes das classes médias, 24% nos alunos das escolastécnicas © 8% nos opetris. 104 [ percebida como benéfica ou nefasta o que impressiona nela é mui to menos 0 seu conteiido que sua agao: +A psicandlise 6a terapia dos complexos” (P.E,). “A psicanlise ¢ cums terapia que, baseando-se no conhecimento psicologico do jindividuo, pode ajudé-lo a se libertar de algumas angiistias: 0 12 cia, se livrar deles” (P. Gestinada aos desequilibrados mentais, mas nao aos loucos' (PM). ‘A distingdo entre ciéncia e terapia és vezes se apaga e é subs- tivufda por uma espécie de pratica nao definida relativa @ pessoa humana’: “A psicandlise é um método de investigagao, de conhecimento da pessoa” (P.E.). “A psicanalise ¢ um estudo da vida humana’ (P.M). “Uma andlise que podemos fazer sobre qualquer coisa & uma andlise aprofundada’ (P.O.). Ciéncia, terapia, pratica nao defi , a psicandlise é sem- pre percebida através de alguns atributos que contribuem ‘mais para distingui-la que para circunscrever seu domi A “novidade" que a destaca da massa de conhecimentos psico- Jégicos constitui um dos signos (simbolos marcas) que, acres- centado a alguns tragos originais, fixam a atengaéo e bastam para individualiz4-la: “um novo sistema americano que consiste em fazer com que a3 pessoas se deitem em uma sala escura e contem seus ‘sonhos” (P.0.). "Nova moda que tende a conhecer 0 que se passa naalma das pessoas e dos deprimidos” (P.M.). “Invengao modema que tenta fazer com que os doentes acreditem que se esto doentes porque foram infelizes antes” (P.0.). ‘Aessa originalidade se acrescenta o fato de que a psicanalise 6 uma técnica da linguagem: “Appsicandlise é uma medicina sem medicamentos” (P.O.), "Esta do das caracteristicas ou comportamentos dos individuos, final- mente, a psicandlise é um contar sua historia” (P.M.) 6. Nas amostas “intelectuas” (profisbes lberais,estudantes,alunoe das escolas técni ‘cas}, a fiequéncia desse tipo de resposta é de 25% e de 17% nas outs, 105 A psicandlise é apreendida através de suas manifestagées ri- tuais extrinsecas e a minticia da descrigéo nao deixa filtrar ne- nhum conhecimento preciso de sua teoria. Essa preciséo aumenta quando é reconhecida uma concepgao particular da personalida- de da “alma”, do “carater” ou do “individuo”. Esses termos desig- nam, na linguagem corrente, uma organizagao vaga que se imagi- na representar, nao a pessoa com seus atributos, mas sua essén- cia. Essa esséncia, tomada no claro-escuro de uma apreensao fu- gitiva ou de um habito de linguagem, s6 se distingue do conceito rigorosamente delimitado de estrutura da personalidade pela dis- tingéio socialmente convencional do mais organizado ao menos. Dizer que “a psicanélise é uma ciéncia da alma”, “apsicandlise 60 estudo do cardter”, “a psicandllise é 0 estudo da pessoa” nao colo- ca problemas para quem profere essas proposigées: "A psicandlise? Uma série de conceitos recobrindo as realidades da alma humana de sempre" (P.L.). “Um novo meio que médi- cos descobriram para decifrar a alma humana” (P.M). “Estudo da alma e dos efeitos do comportamento do homem em fungao de sua alma, do meio onde vive e de suas experiéncias passadas” (PM). Fundamentalmente, sempre se trata do mesmo tema, a psica- nélise 6 uma teoria da pessoa, uma teoria particular; as nogdes de alma, de pessoa, de carter sdo substituidas por outras nogdes es- pecificas: “A. psicanélise, 6 0 estudo do subconsciente ¢ do consciente” (P.O). "A psicandlise 6 uma teoria cientifica que se esforga para colocar em evidénoia os fendmenos inconscientes ¢ conscientes que determinam nosso comportamento” (P-E.). “O estudo dos ‘complexos conscientes e subconscientes de um individuo” (P-E.). Bo estudo do inconsciente, das coisas que néo brir pelos proprios meios de introspecgao” (P.T. propde revelar 0 que ha de mais secreto em nds e de justificar cada ato nosso pelas relagdes com 0 subconsciente” (P.L.). Apsicandlise 6 assim uma ciéncia de personalidade com ca- racteristicas estruturais inéditas que, no espirito do pubblico, esta associada a varias relagdes que o homem mantém com ele mesmo sobre a dimensdo imagindria de. profundidade (relagées similaresa varios focos de atengao): escondido/aparente, voluntario/invo- luntario, auténtico/falso, superficial/fundamental etc. A opiniao se forma através dessas relagdes; ela ordena as semelhangas e 0S 106 elementos da representagao dela emergem simples aperfeigoa- dos. Os pares de oposigao se correspondem termo a termo (apa- rente para falso, escondido para auténtico) para depois se encar- nar em instancias da pessoa; as relagdes auxiliam na compreen- sao de seu funcionamento. O que é a psicandlise? “Pesquisa no ser todas as circunstancias da vida anterior que pu- deram fomecer as teagdes que nao sao sua verdadeira personali- dade e provocar, por meio dos educadores, um estado que foi contraido num ser invélido” (P.M.). "O estudo interno do sujeito ¢ oestudo do ser involuntario que habita o sujeito em relagao com 0 ser voluntério” (P.T.). “Ciéncia que permite conhecer as reagdes mais intimas, as mais secretas até o subconsciente. Todos vive- mos com méscaras, sem ao menos saber. Pela psicandlise nds ti- ramos as mascaras" (P.E.). Assim, para 0 mito antigo das "poténcias” e das “forgas” ine- rentes a cada um, a psicandlise modela uma nova face, codificada e racional; encama assim a esperanga de romper com a opressdo exercida pela vida cotidiana sobre a historia acabada e microscépi- ado individuo. O interior, o implicito, o possivel, o exterior, expli- cito e 0 realizdvel se recobrem no desejo de viver, de se libertar, de restabelecer a verdade: o que existe “além” das aparéncias. A psi- candllise se distingue como a marca do restabelecimento da subjeti- vidade e realiza o desnudamento da personalidade auténtica. “A psicandlise serve para que vejamos 0 que no podemos ex- pressar e que nao ousamos dizer” (P.O.). “Tentar encontrar nas ages e nas reagdes das pessoas algo de secreto que nao desco- briréo sozinhos” (P.M. _ Aexposigio do que 6 a psicanalise através dessa imagem da vida pessoal permite melhor circunscrever 0 papel que o inconsci- ente eo consciente representam como dramatics personae da or- ganizagao psiquica. | Ja esbogamos os tragos da organizagao psiquica associada 4 psicandlise: “A psicandlise é o estudo do subconsciente, das inclinagdes geralmente recalcadas” (P.L.). “Estudo do inconsciente & suas relagdes com o consciente e com os antecedentes do individuo" (P.M.). "Hé duas coisas: 0 consciente e 0 incons- ciente” (P.O. 107 0 consciente e o inconsciente so frequentemente vistos ‘como transposigao dos pares de categorias expostos: escondl- do/aparente, involuntario/voluntari, interior/exterior, elevando-os {A dignidade de conceitos quando a mutagao ocorre. Os proprios ‘conceitos (consciente, inconsciente, recalque) séo penetrados por imagens concretas cujo dinamismo ¢ o de qualquer contradigao. ‘A designagao da psicandlise cot ja do inconsciente e de suas relagdes com o conscien' ‘ao mesmo tempo @ teoria e a concepoao estilizada e preestabelecida dos proces- sos existenciais, (© conjunto das definigdes fornecidas revela a estrutura da ppersonalidade associada a psicandlise. A organizagao psfquica ¢ composta de duas partes: inconsciente e consciente (interior/ex- terior, escondido/apai is percebemos a agdo da pressao de uma contra a outra, ou uma relagao de alteridade con- fAltuosa expressa pelas nogdes de repressao e recalque, Podemos nos perguntar sobre o resultado do funcionamento; a resposta imediata: é 0 complexo. O esquema de conjunto é o seguinte: Inconsclente + Reclque Complexo Consclente ‘Perguntamos 4s pessoas interrogadas que "palavras psicana- liticas” conheciam. Na ordem, as palavras mais citadas sdo as se- guintes: ‘Tabola 1. Froqudncia dos termos pslcanaliticos Populagto 1 poagao 2 pongo 3 porto F pongo Encarta Chopin Feral teoncentsgu Uo macieona ‘cose msian —Commplexo —Recalque—_Subconsctonte ou Libido Ioonacson Protaber Uber Complexo Recelque —_‘Inconecients ou ibid ‘nuboonacione ecolptanicas —Complaxo Inconsctenta_Lbido Recalue Go piblico. Os estudantes que acal @ 08 intelectuais que 4 02 do contito de ¢hecem profundamente wlizaram o modelo Trcartr do qual a equacdo 6 desenvolvida) entre 0 wnoore ‘consciente e 0 recalque. Pod ndlise se cristalizou em primeiro 1g ‘que no puderam em seguida ser ré Podemos também supor que o esquema é pregnant, isto & que corresponde de maneira perceptivel a dinamca da pesko® wal se eg desenvolvida a partir da experiencia cotidiana, & con ggruencia com a viséo dicotomica do que ¢ intimo ¢ evident (visao jemos perisar entao que 2 no de parentesco com os modelos mais corentes. A cai ‘reta dos elementos desse “aparelho psiquico” poder de traduair as situagdes habituais. A origem cientifica © 0 Gesenvolvimento especificam varias “teorias” que operam no sen. so comum. A falsa moeda metaforica amalgama os complexos © 0S inconscientes, actescenta recortes titeis @ formagao de uma ima: ‘gem que goza da familiaridade do signo e do prestigio da ciencia 3.2.2 Q amélgama dos conceitos ‘Adistancia entre a teoria e sua tepresentacdo é explicada pela presenga da primeira concepgio psicanalitica e pela dificuldade Ge mudar rapidamente as imagens e os simbolos. Essa concep¢ao feudiana reserveva um lugar importante para a “ibido™. {7.LAGACHE, D. “La poychanaiyse, évoluton, tondance et problemas acwels™ Cahier a de Snowe do Encyciophte rancaso, 1856 in para um elemento vital da ostrutara do pensamento de Freud HM. Noo Freudan socal philosophy Stanford Stanford Uns Ora, a sexualidade néo representa nenhum papel no esquema ue descrevemos. 1% dos sujeitos menciona a libido nas defini- ‘e0es dadas para a psicandlise. Isso se explica por que em nossa Sociedade os valores dominantes se opdem ao reconhecimento das pulsdes sexuais como forgas essenciais da personalidade. Seo individuo vive o mundo como um confito entre dois termes, um interno e auténtico e outro extemo, a estrutura da petsonalidade Teproduzida por essa contradigo é por si s6 suficiente como ele- mento dinamogénico, o elemento sexual, enetgético, sendo dado como suplemento, e no contribui para a coeréncia da construcao. Se eliminamos ou negamos a libido e sua 0, epistemolo- gica ou real (sem substitui-la por outro principio), transformamos a ‘teoria psicanalitica num conjunto de relagdes (interpretagées, fe- némenos, propriedades) que podem guardar alguma autonomia e, Por isso mesmo, integrar-se a outra concepgio. Ao colocar entre ‘parénteses o principio essencial, retiramos da teoria o cardter de es- ‘trutura unitatia, Esse foi o objeto e o resultado do conflito entre a Psicandlise e as normas de nossa sociedade. Desse fato, durante a difusdo social, as concepgies e nogies psicanaliticas foram e con- ‘inuam sendo admitidas, mas o principio é negado ou dissimulado: "Acho que Freud exagerou bastante fazendo da sexualidade a ‘mola-mestra do psiquismo. Outros instintos, a fome, sdo também fortes; os neurdticos (muitos fazem parte da clientela), alguns com desequiliorios sexuais, mas talvez porque sejam neuréticos” (PL). “O problema sexual néo tem a importéncia dada por Freud, 'Nao actedito que 0 ato sexual liberteo individuo dos complexos. Conhego pessoas que néo mantém relagdes sexuais e s8o equill- bradas* (PL), A psicanilise ¢ socialmente aceitavel sem a teoria da sexuali- dade e, esse principio fundamental estando afastado, o grupo pro- ‘cede & reorganizagao da topogtafia dos conceitos sobre a base que melhor Ihe convém, cada uma das relagdes podendo entao ser “manipulada’ admitida ou rejeitada sem levar em conta sua uni- dade nem a ordem original. Esse trabalho de conversdo é antigo e Freud, que tinha a mente pronta para apreender as armadilhas que a razao prepara para a ciéncia, escreve’: “No mundo cientifico, uma espécie de tampa formou-se entre a andlise e seus adver- 8. FREUD, 8. New introductory lectures on psychoanalysis. Nova York, 1925: 180-190, 110 .e ha algona andlise... mas que... Sinus pares Aigns fem objegdo& sealed, us co inconsciente e, a existéncia do simbolismo ¢ particularmente ob- jeto de aversdo. O fato de que a estrutura da psicandlise, mesmo que inacabada, entretanto possua organizagéo unificada, da qual nao se pode retirar elementos a bel-prazer, parece nao penetrar 0 espirito dessas pessoas ecléticas”. ‘No que conceme a elaboragao social da representagao, tra- ta-se menos de ecletismo que de tentativa de instrumentalizar 0 modelo cientifico e de reconstnui-lo sobre valores e categorias dis- poniveis. A medida que a teoria se toma um conjunto de relagdes, ela perda coeréncia; o principio interno, as dimensdes, o alcance das relagdes tomadas separadamente dependem das regras s0- Giais do grupo. Reservando o dominio politico, os sujeitos comu- nistas limitam significativamente as fronteiras desse conjunto. Os rentes, mais abertos em certos aspectos como os que se relacio- nam ao subconsciente, s4o mais reticentes em outros. Mencionei aqui casos extremos. Ser ainda o caso de insistir sobre as conse- ‘quéncias da eliminagéo do elemento explicativo? A partir do mo- mento que ndo consideramos a sexualidade, as interpretagdes pparciais se tornam possiveis, e pode ser constituido um esquema do psiquismo humano que tem raizes na teoria psicanalitica, mas no qual a libido nao intervém. Nesse caso particular, a transforma- 40 de uma teoria estruturada em um conjunto de relagdes com autonomia e extenséo varidveis é a primeira condigao para a cons- tituigdo de uma representagdo social. No entanto, ao colocar o acento em uma série de fenémenos ligados a sexualidade, a psicandlise provocou a conscientiza- ‘¢80 de seu cardter “tabu” e das repercussoes sobre a personall- dade; esta assim associada, no geral, ao comportamento sexual do individuo. “Desde os 15 anos, é preciso alertar os adolescentes sobre a psi- canzlise. Mais franqueza nas relagdes familiares e com as mulhe- tes. Percebo que meus alunos (20 anos) ainda se perturbam com. ‘certas coisas, para dizer francamente” (P L.) Um sujeito a quem perguntamos que relagdo existe entre psi- candlise e teligigo, responde: “Um teblogo disse que é melhor deixar no escuro as partes vergo- ‘nhosas do homem:; tocar no assunto com moderagao” (P.M) m1 no detuacto do tretamento analtic também se orienta em tor- Joa a Simbslca.O casa anal ¢peroebdo como heterose- 0 diva analitico numa sala isolada completa esse quacto: Arstcantice?# um natamento na moda das mulheres do mun- Shia lames, contemes um monte de hstias sobre avi, @ ‘ie coniugal © 8 veoesdetamos com o picanalista” (P.O). "A ise” Eepéete de magnetisno paa as mulheres histricas. io ctentico...O que exsencia para mulher, 6a libido, Mais uulher 6 primitive, mais éibidingsa eadora que aesoutemn.. ‘Clientela de mulheres nerw Sean mulheres nervosa que nd saben o qu fz con: raver Semvalidade nem sempre é vista por esse aspecta destavo- "A picandlise tem cortamente grande interesse no "A int que conceme roblomas sexuais, Bu iia com cetteza, acho que poder re sole cuss (P.M). “0 grande pbc als mut sobre as. ccandlise. Liberagio dos preconceitos socials 208 feoli, beaeo com relagio acs ta Por um lado, a representagéo nega a libido, >. Por outro, faz da Dsicandlise o emblema de tudo o que é sexual. A tooria psicanaliti- ca teve uma influéncia sobre as condutas individuais. Depois de seu apatecimento vimos diminuirem as proibigdes com respeito & {ida sexe Os que aoompanharam ess evolu oonsidram-na terminada. Como se apés as proibigdes sexuais a nogdo de "Iibi- do” tivesse se tornado init vse dei Com relagao a isso, as avaliagdes 16% ao si ae .g6e8 recolhidas sao signifi- “A pnts and ne ete vs ebro, Pet be caasoctad, dopa ds coe lau pment sles dle, Deed aoe eas em gel. sem Ovi ded fines Go paca. Pa tomaticos, com relagoa el, nd tim malsomeamosigniicado © Na medida em que se tomou um indice de certa liberdade de costumes, a psicandlise ¢ apreendida como um todo. Quando é di- versificada e ampliada em seu contetido, quando se fala social- 12 mente, ela adquire a unidade simbélica descrita. Nao dduzir que os contextos de penetragao de uma teona na definam 0 sentido dominante que esta ligado @ repr para a representaglo implica que: + Bla ge modifique em um conjunto de relagées auténomas, suscetiveis de constituir um qua ‘em ligago com os fenémenos que ela atualizou e compativeis, com o sistema de valores dominante, + Soa estabelecida a unidade de significagao em relagdo com ‘as olrcunstancias da penetragao social e com. ‘essen- ‘da Tealidade que ela atinge e sobre os quais tém wma ‘O choque com os valores estabelecidos provoca lleva) & liminago do principio fundamental dessa ci :nquanto ‘sua representacéo, como unidade, assume t cla 20 ‘principio eliminado. O niicleo se tora sombra, mas uma som- bra tenaz, ativa. ‘Tudo ocorre como se estivessemos na presenga de uma psica- nélise-conjunto das relages, no ambito da qual podemos compre tender a pessoa, o comportamento, e de uma psicandlise-emblema cujo alcance depende das normas coletivas ‘A representagéo social de uma doutrina cientifica se forma de acordo com os mesmos principios que aqueles de qualquer tepre- ‘sentagao social? Tudo leva. crer que seja da mesma forma, O dis- tanciamento ao qual nos referimos, entre 0 conceito psicanalitioo fe sua representagao, é o sinal que ela teve desenvolvimento auto- nomo. No entanto, ainda é mareada e favorecida pela autoridade ‘inerente a ciéncia. controle social e 0 conticle cientifica obedecem a regras e objetivos especificos. A presonga da ciéncia na sociedade modifi- ‘ca ao mesmo tempo a viséo e abordagem do real. As tepresenta~ (es sociais tm um grau de objetividade vari relagao a ciéncia que esta na origem. As praticas como of podem pender num ou noutro sentido; a necest ‘x80, 0 conflito resultante, a transformagao das res fazem parte da histéria e da estrutura da ret de uma ciéncia, Por sua vez, sear tringir e favorecer o desenvolvimento dessa ciéncia, isso é uma 113 ‘Nao 6 necessério multiplicar os exemplos. A mutago do abs- trato, a impregnagao por elementos metaforicos e imagéticos indi- vidualizam um momento importante da objetivagao: aquele em que oedificio teérico é esquematizado. O esquema ou omodelo f- urativo resultante preenche varias fungdes: + Bum ponto comum entre a teoria cientifica e a representa- do social; sua exatidéo é relativa, no entanto, concentra a maioria dos conceitos importantes da psicandlise. + Amudanga do “indireto" em “direto” é realizada; ou seja, 0 que na teoria é expresso geral e abstrata de uma série de fenémenos toma-se, na representagao, tradugao imediata do real. + O modelo associa os elementos indicados numa sequéncia auténoma com dinémica propria (a do conflito entre implici- to/explicito, intemo/extemo), unidade inspirada pela psica- nélise, da qual se exciui o que entra em contradigao com 0 sis- tema de classificagao dicotémico e as normas sociais: a libido. exigéncia propria a sociedade e penso també: - Tantia de sua vitalidade. am coe 3.3 A materializacdo dos conceitos 3.3.1 O modelo figurativo Chamarei modelo figurativo ao esquema da organizacdo da personalidade como acabamos de descrever. Sempre recorremos a esse esquema quando queremos explicar a conduta da crianga, alliberagdo dos conflitos ou a agao terapia através dos conceitos de origem psicanalitica. Nao se pode dizer que seja falso, mas ele re- produz a teoria psicanalitica de maneira seletiva. A reconstituigao toma apreensiveis formas abstratas e gerais que séo proprias ara- cionalidade cientifica acabada. Quando o modelo ¢ descrito como figurativo, é ndo s6 uma maneira de classificar as informagées, mas 0 resultado da coordenagao que caracteriza cada termo da re- presentagao. No esquema, por exemplo, o inconsciente 6: ‘Ao penetrar no meio social como expresso do “real”, o mode- Jo figurativo se torna ento “natural”, utilizado como se fosse copi- a) primeiramente, parte de um todo: - P i ado diretamente dessa realidade. A conjungao de dois movimen- O conflito personalizad ‘mos ilustrar uma tendét ca com respeito ao complexo: “A psicandlise se propde reduzir os problemas psiquicos resultan- tes do conflito entre as duas partes do individuo, consciente ¢ in- consciente, ou, de certo modo, entre as duas partes do individuo e seu entomo” (P.E.). “A psicanalise existe para tratar doengas que misturam 0 subconsciente com 0 consciente" (P.M.). b) em seguida; se apresenta como instancia aut6noma: A psicanélise estuda o papel do inconsciente na génese da con- duta” (P-E.). “Ciéncia que permite discemir 0 que as pessoas no ‘sdo capazes de formular e que é aparentemente pensado pelo in- consciente” (P.M.). "A psicandlise? Trazer 0 inconsciente para 0 consciente passando pelo pré-consciente” (P.T.) “forga” em conflito com outra, 0 consciente. io se desenvolve através do recalque. Pode- ncia andloga a amplificagao fenomenologi- c) por fim, é uma a "(.0.). "A psica- “Dar 8s pessoas complexadas o gosto de viver’ (P. g nalise? Um tratamento_ que tira das pessoas 08 complexe de infe- nételade para que consigam viver como todo mundo” (P.M). v4 tos, o da generalizagao coletiva de uso e o da expressdo imediata dos fenémenos concretos permite representacéo tornar-se um aparato cognitivo estavel e orientar as petcepgoes ou as opinides sobre 0 comportamento ou as relagGes interindividuais. 3.3.2 A ciéncia e o animismo invertido A naturalizagdo das ideias tem significagao particular, pois confere realidade ao que antes era abstrago. Por isso, o complexo @ 0 inconsciente nao séo somente nogées, mas termos materiali- zados, organizagbes quase fisicas. O fato ¢ ilustradio pelas seguin- tes entrevistas: “A psicanélise é aplicdvel para alguns casos raros, doengas mentais caracterizadas. Nas neuropatias, a cura é mais frequen- te: choques morais precipitados parcialmente no inconsciente, af o recalque é mais marcado” “Na educagao, € preciso evitar a aguisigao dos complexos" (P.L.). “O inconsciente esté in- quieto” (P.O). 115 4 “a tee False igualmente da “diviséo" Ge a Consciente; 9 Complexo na © Particular, uma espécie de A a “mistura” do inconscien- ‘aduziria uma Telagdo, mas estado ou de érgaio: mesmo estando perty te itbada por compl 4 ay ‘A psicandlise é um ns oes) 6 diferente deles Plexo de inferioridade" (P O) Tetira das pessoas 0 de uma espécie de ‘tatamento neurocinirgico,) A passagem sutil di fe ctiada é reforgado pelos habitos de cleave ee Generalidade da transferéncia das metaforas do domino fies Para 0 dominio sensorial e Psicoldgico: a representagao que faze. mos do objeto ce qualquer ciéncia também tem influéncia. A psi- canélise, localizada entre a medicina, a psiquiatria e a biologta, ndo deixaria de ser uma ciéncia que age sobre os 6190s, vistveis ou invisiveis. A naturalizagdo das nogdes Psicanaliticas, toman- do-as parecidas com as outras denominagées cientificas, confere a elas uma presenca quase palpdvel. Qualquer ciéncia em nossa sociedade tem como paradigma a ciéncia matematica-fisica, isto 6, ciéncia dos objetos quantificaveis e mensurdveis. Verifica-se socialmente a eficiéncia de uma ciéncia conforme se aproxima ou se afasta dessas normas. A ciéncia, sit venia verbo, interessa-se ao que ndo é sujeito. O valor operacional do imperativo cientifico ul- trapassa 0 quadro metodoldgico, primeiro na diregao do controle social das atividades que se pretendem cientificas. Na medida em que 0 contetido cientifico supée certo tipo de realidade, manifesta-se uma incitagao 4 criagao dos seres (pela identificagdo do conceito com 0 real). Uma vez que a ciéncia fala em Orgaos e que a psicandlise é uma ciéncia, o inconsciente e o complexo serdo 6rgéios do aparelho psfquico. Podemos retirar, dei- xar evidentes e adquirir complexos: ha assimilagao do que esta vivo ao inerte, do subjetivo ao objetivo, do psicolgico ao fisiologi- 10. ASCH, S.E. The metaphor: a psychological inquiry. In: TAGIURI, R. & PETRULLO, LL. Person, perception and interpersonal behavior. Stanford: Stanford University Press, 1958, 86-95. 116 co. Esse animismo invertido é provocado Pela predominancia do tipo ideal que descrevemos. Para alguns informantes, a psicanalt se ja 6 essa ciéncia quase médica que age sobre o psicologico; Para outros, s6 seré quando sua ago fisiolégica se tomar possivel “IA psicandlise] é uma medicina essencial: porque é preciso levar em consideragao a parte do fisiolégico nos problemas mentais” (P.L.). “Ciéncia que ainda esta no comego, se desenvolveré com 0s progressos da psicologia do cérebro" (P.L.). 36% dos sujeitos da amostra “classes médias” censuram a psi- canalise pelo fato de nao possuir leis, de nao ser quantitativa ou fi- siolégica. As mesmas criticas foram formuladas pelos meios ci- entificos sem resultado claro. Os conceitos da psicandlise esto em contradicao com o modelo da ciéncia. Espera-se assim que a psicanalise se torne uma ciéncia para que a contradigao seja afastada, caso contrario significara que 6 somente uma terapia. Mas, de qualquer forma, é preciso que [a psicandlise] atue sobre alguma coisa ou [sobre] uma entidade, seus conceitos devem ser tradugées dos seres. O aparelho psiquico toma-se simplesmente um aparelho. Disso resulta um modelo da ciéncia cujo poder criativo desco- brimos no plano desse animismo invertido pelo qual o publico re- presenta 0 contetido da teoria que recebe significado cientifico. O processo que esta em jogo parece envolver dois movimentos con- vergentes, um que vai da teoria para a imagem, outro que vai da imagem para a construgao social da realidade. Num primeiro mo- mento, a concepgao cientifica é confrontada a sistemas de valores e uma escolha ¢ feita entre seus elementos. O segundo momento tem consequéncias mais complexas. Pelas raz6es dadas no inicio deste capitulo, as relagdes e os termos reunidos num modelo s4o cortelacionados pelo grupo social a realidade objetiva. Essa “natu- ralizagdo" confere a representagao social o estatuto de evidéncia. Nao é mais um duplo da ciéncia, toma-se também “teoria profa- na” autonoma. Quando alguém afirma que a psicandllise é a “ques- tao dos complexos”, ele reorganiza as ideias em tomo do “comple- xo” que até entdo nao estava devidamente associado a nenhuma ciéncia. Nao se sabe ao certo se essa “copia” da teoria cientifica é aquela da psicanilise ou é a do real. Esse caminho trilhado, ela se torna um instrumento prdprio para colocar pessoas € comporta- mentos em categorias. 117

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