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RESUMO
Mundicarmo Ferretti2
INTRODUÇÃO
resistência da população negra, que foi trazida para o Brasil como mão de obra escrava
ou que descende de africanos que entraram no Brasil como escravos. Mas, antes de
enfocar essa questão diretamente, vamos procurar refletir um pouco sobre a idéia da
propalado que ela reflete e legitima o sistema social. Mas, desde a antigüidade, são
abundantes os exemplos onde ela foi um fator de resistência à dominação. Como mostra
a Bíblia, livro sagrado dos judeus e dos cristão, a religião foi importante na saída do
povo judeu do Egito, onde fora escravizado. No Brasil, antes do governo militar, o
criação do partido de esquerda “Ação Popular – AP”. E não é à toa que muitos
começou a ser imposto à população indígena pela igreja Católica que, como foi
(PELTRO:1967, p. 26). Mas é preciso lembrar que tal imposição era vista por ela como
estavam convencidos de que o gênero humano fora redimido do pecado original pelo
sangue de Cristo, mas que era preciso que todas as populações conhecessem o
cristianismo (entendido ali como catolicismo) e que aderissem a ele, para que a
redenção fosse completada. Pregar pois a fé cristã aos habitantes das terras conquistadas
parecia aos missionários católicos um objetivo altruísta, elevado, que, para ser
Hoje, adotando a mesma postura, podemos ver também que a catequese, em última
crença das populações dominadas, liberdade essa que na época nem todos tinham
consciência de que poderia ser conquistada e que mais tarde procurou ser assegurada no
Ainda sobre a religião como opressão, tem sido argumentado que ela leva os
adeptos a uma submissão cega, sem contestação ou crítica, inibindo o seu senso crítico,
afirmam poder entrar em contato com eles. A história tem registrado exemplos trágicos
santas” e os suicídios coletivos que têm ocorrido em vários países, algumas vezes em
grupos cristãos. Felizmente não vivemos mais sob o jugo da Inquisição e várias
Sobre a religião como forma de resistência, embora não se possa dizer que a
religião de origem africana tem inspirado no Brasil muitas ações revolucionárias, fala-se
(BASTIDE, 1971, p., 148). Mas a religião afro-brasileira ficou bastante conhecida pela
africanas.
população negra (constituída por africanos trazidos como escravos e por seus
Brasil, e dos terreiros afro-brasileiros terem sido muitas vezes objeto de perseguição
policial, a existência hoje de casas de culto abertas por africanos e crioulos antes da
abolição da escravidão, como a Casa das Minas e a Casa de Nagô (de São Luís-MA),
maranhenses que as adotaram como modelo, as pessoas têm geralmente duas religiões:
africanas) e os santos canonizados pela Igreja Católica. E, embora seja antigo no Brasil
brasileiros.
religiosas africanas, o que teria causado um “sincretismo” entre sua religião tradicional
brasileira que adotam o catolicismo têm uma relação apenas de conveniência com ele.
(RN) onde a mãe-de-santo, sendo impedida de receber a comunhão pelo padre da igreja
de seu bairro, por ser de Candomblé, realizava uma vez por ano (quando suas finanças
São Francisco, no Canindé (CE) e à terra do Padre Cícero, em Juazeiro (CE), quando,
não sendo identificada como mãe-de-santo, podia assistir a missa e receber a comunhão
terreiros são freqüentados por pessoas de todas as camadas sociais e a religião afro-
brasileira vem conquistando o respeito da Igreja Católica, principalmente nos setores
ligados à pastoral do negro. Espera-se que num futuro próximo esse comportamento
seja imitado pelos evangélicos, principalmente pela Igreja Universal do Reino de Deus
que, apesar de não ser das mais antigas e prestigiadas, numa demonstração de
arquivos da Torre do Tombo, em Lisboa, afirma não ter encontrado nenhuma referência
em festas de santo de São Luís (MA), como os mencionados em 1818 pelo Frei
(PRAZERES: 1818), e que alguns rituais de “cura” reprimidos mais tarde em Códigos
Terecô, ou Cura3.
brasileira continuou a ser proibida. Embora, como lembrou Beatriz Dantas, a “feitiçaria”
não tenha aparecido como crime no Código Criminal de 1830 (DANTAS: 1989),
UFMA), como os de Codó (1848) e Guimarães (1856) previam penas para livres e
libertos que “curavam feitiço” e o Código de Postura de São Luís (1866) sujeitava a
terapêuticas, o que mais tarde passou a ser alvo de perseguição policial; 2) a influência
da cultura indígena nos terreiros; 3) ou sugere a identificação de negros com índios que,
republicana que foi promulgada em 1891) previa prisão por prática de espiritismo,
Contravenções Penais (de 1940) e no Novo Código Penal (de 1985), ainda em vigor. A
3 De acordo com a história oral, a Casa das Mina-Jeje, situada na Rua São Pantaleão, em São
Luís pelo menos desde 1847 (data da escritura do prédio da esquina), é o terreiro de Mina mais
antigo. Foi fundada por africanos do Daomé que teriam entrado no país como contrabando (após
1831), e funcionou inicialmente em outro local (PEREIRA, 1979, p.24; FERRETTI, S., 1996,
p.58). Emanuela Ribeiro, quando ex-bolsista do PIBIC/UFMA e orientanda de Sergio Ferretti,
localizou no Arquivo Publico do Maranhão um pedido de licença da Casa das Minas, datado de
1885 e dirigido à Polícia, para fazer uma festa (possivelmente uma de suas obrigações religiosas
para com os voduns). Localizou também em documentos da Polícia o registro de um toque
realizado em 1897 na Casa de Nagô, terreiro igualmente fundado por africanos, fundado na
capital maranhense logo depois daquele.
proibição do curandeirismo tem justificado ainda hoje a invasão a terreiros e tem levado
muitos deles a abandonar suas tradições a manipular sua genealogia para simular uma
ligação a terreiros fundados por africanos mais prestigiados e mais respeitados pela
Polícia.
foi uniforme e geralmente foi maior na cidade do que nas periferias e na área rural, em
alguns períodos foi mais forte e mais abrangente. Em outros foi mais leve, mais
localizada e mais específica. Tudo indica que entre 1876 e 1886, por exemplo, essa
repressão foi bastante forte em São Luís e seus arredores (FERRETTI, M.: 2000, p.
272), pois várias foram as prisões de curadores e chefes de culto noticiadas em jornais e
Pajé, o que foi retransmitido em Jornal de São Paulo localizado pela pesquisadora Liana
Trindade (USP).
Brasileiro”, era obrigatório o registro dos terreiros na polícia e, como foi denunciado
Embora essa obrigatoriedade tenha caído ha mais tempo na Bahia e em outros Estados,
no Maranhão vigorou até mais ou menos 1988. Os terreiros de São Luís e de outros
Estados eram obrigados a pedir licença à Polícia para realizar suas festas, pois eram
cadastrados não como “casas de culto” e sim como “casas de diversão”, não só porque
costumam fazer várias festas de santo durante o ano, mas também porque a religião
terapêuticas de terreiros como “sabedoria popular na área de saúde”, elas tendem a ser
encaradas pela classe dominante e seus representantes mais como “crendice” do que
cultural africana” ou como religião africana pura ou autêntica, pois alguns, como a
Casa das Minas, de São Luís (MA), conseguiram chegar aos nossos dias continuando
música, dança e tantos outros elementos da cultura de seus ancestrais africanos, eles
que essa “concessão” foi usada muitas vezes mais para negar verdadeiros extermínios
africana” que eles próprios ajudaram a construir, como foi tão bem apresentado por
mas a religião afro-brasileira continua encarada com desconfiança por muitos. Basta
para eclodir uma onda de suspeitas direcionadas para o “povo de santo”. Mesmo quando
o criminoso é considerado “louco”, os elementos de seu depoimento que sugerem uma
possível ligação com a religião afro-brasileira é logo destacado e encarado como prova
ações judiciais contra os agressores têm se multiplicado e muitas delas têm sido
brasileira na INTERNET.
CONCLUSÃO
deve ser combatida por todos, tanto pelos que se definem como religiosos, quanto pelos
que se apresentam como sem religião; e que a saída de problemas provocados pelo
BIBLIOGRAFIA
FREITAS, João Alfredo de. Lendas e superstições do norte do Brasil. Recife: [s.e.],
1876.
MAGGIE, Yvonne. Medo de feitiço: relações entre magia e poder no Brasil. Rio de
Janeiro: Arquivo Nacional, 1992.
PEREIRA, Manoel Nunes. A Casa das Minas: culto dos voduns jeje no Maranhão. 2 ed.
Petrópolis: Vozes, 1979 (Original de 1947).
Mundicarmo Ferretti
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