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1. Considerações iniciais
Em Aristóteles, o percurso de estudo sobre a arte poética guia-se por meio de duas
coordenadas centrais. Por um lado, há uma análise prescritivo-descritiva sobre a
composição dos enredos (mythos) de acordo com suas partes constituintes: caracteres,
elocução, pensamento, espetáculo e melopeia (Aristóteles, p. 77). Por outro lado, há o
desenvolvimento de uma teoria da recepção que pensa a finalidade da tragédia. Tais
perspectivas de análise complementam-se em seus entrecruzamentos: é a partir do domínio
sobre a arte/técnica de composição do enredo que o dramaturgo nos leva à catarse.
2. Mimesis e kathársis
“Tomando as palavras como signo de evidência” (idem, p. 55), uma noção etmológica
ajuda a entender o porquê a poética aristotélica define a mímese de ações como a essência da
tragédia: o substantivo dráma deriva do verbo dráo (dráō), cujo significado é ‘agir’ (idem, p.
53).
Há trechos breves em que a poética é comparada em relação à pintura: por ser
também uma arte mimética, a pintura também se baseia na representação de personagens
melhores, piores ou tais quais nós (idem, p. 47), ao lhe dar uma forma, o enredo é um
princípio ordenador necessário à tragédia do mesmo modo que a pintura (na concepção de
arte clássica) só encanta na representação bem delineada das imagens, o que seria incapaz de
se atingir caso as cores, mesmo as mais belas, fossem aplicadas aleatoriamente sobre a
superfície da obra (idem, p. 83). Tais exemplos adiantam a noção horaciana na qual “poesia é
como pintura”/ut pictura poesis (p. 65).
“a tragédia se desenvolveu pouco a pouco, à medida que progredia cada uma das
partes que nela se manifestavam. E após muitas transformações ocorridas, ela se fixou
justo quando atingiu sua natureza própria” (Aristóteles, p. 63).
Assim, para que o bom poeta garanta a unidade do enredo, ele deve evitar reviravoltas
desnecessárias, inesperadas, improváveis e artificiais — deus ex machina (p. 131) — pois
deve buscar adequar-se sempre às justezas do decoto trágico. A reviravolta/peripéteia
(“modificação que determina a inversão das ações segundo o verissímil ou o necessário”) e o
reconhecimento/angagnórisis (“passagem da ignorância ao conhecimento”) são dois
momentos fundamentais para que o enredo nos conduza ao fim catártico da tragédia
(Aristóteles, p. 105). Aristóteles menciona o Édipo como peça exemplar nesse sentido, uma
vez que nela há “a coincidência entre a reviravolta da ação e o reconhecimento da verdade no
momento em que o mensageiro coríntio noticia a morte de Políbio” (Vieira, 2012, p. 17). O
erro trágico cometido em ignorância, a mímese de ações que incitam uma comoção causada
por temor e compaixão: esses são, e nesse sentido se afirma que “a composição da mais bela
tragédia não deve ser ‘simples’, mas ‘complexa’” (Aristóteles, p. 111).
Referências
HORÁCIO. “Arte Poética”. In: A poética clássica. 6. ed. São Paulo, SP: Cultrix, 1995.
LACAN. “Os paradoxos da ética ou Agiste em conformidade com teu desejo?”. In: O
Seminário, livro 7: A ética da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1997. pp. 373–
391.
VIEIRA, Trajano. “Entre a razão e o daímon”. In: Édipo Rei de Sófocles. Tradução e
introdução de Trajano Vieira. São Paulo: Perspectiva, 2012.