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DIREITO PROCESSUAL PENAL

4.º ANO – NOITE

Coordenação e Regência
Professor Doutor Paulo de Sousa Mendes

Colaboração
Mestre Rui Soares Pereira

Exame escrito (época de recurso)


10 de fevereiro de 2014
Duração da prova: 90m

Hipótese

António e Bernardo, funcionários de uma drogaria, conhecendo da sua intenção de pôr cobro à
vida, forneceram a Carlos um veneno que este lhes pedira e com o qual veio a suicidar-se. Aberto o
inquérito, o Ministério Público (doravante, MP) interrogou António e Bernardo, que entretanto
haviam sido detidos, sobre o ocorrido. António não respondeu a nada do que lhe foi perguntado,
nomeadamente sobre a sua identidade, pelo que o MP decidiu aplicar-lhe a medida de coação
caução no valor de € 15.000, e a Bernardo apenas termo de identidade e residência.
No final do inquérito, o MP deduziu acusação contra António e Bernardo como coautores do
crime de auxílio ao suicídio, previsto e punido no art. 135.º, n.º 1, do Código Penal (CP), e do crime
de furto do veneno à drogaria, previsto e punido no art. 203.º do CP, e requereu que o julgamento
ocorresse em tribunal singular.
Inconformado com a decisão de acusação, Bernardo requereu a abertura da instrução com
fundamento na inadmissibilidade legal do procedimento relativamente ao crime de furto e pediu
que fosse determinada a suspensão provisória do processo relativamente ao crime de auxílio ao
suicídio.

Responda justificadamente às seguintes questões:

1 – Pronuncie-se sobre a atuação do MP durante o inquérito.

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2 – Qual seria o Tribunal competente para o julgamento dos crimes de auxílio ao suicídio e de furto
(arts. 135.º, n.º 1, e 203.º, ambos do CP)?
3 – Poderia in casu ser aberta a instrução nos termos e para os efeitos requeridos por Bernardo?
4 – Admita que, no decurso da instrução, o MP veio sustentar que António devia ser pronunciado
apenas pelo crime de auxílio ao suicídio (art. 135.º, n.º 1, do CP), já que afinal nada permitiria
concluir que tivesse subtraído o veneno da drogaria. Pronuncie-se sobre a mudança de orientação
do MP durante a instrução.
5 – Suponha agora que das diligências de prova realizadas durante a instrução resultaram indícios
suficientes de António e Bernardo terem injetado o veneno em Carlos e de não se terem limitado
a fornecer-lhe o veneno. Poderia o Juiz, finda a instrução, pronunciar António e Bernardo pelo
crime de furto, previsto e punido no art. 203.º do CP, e também pelo crime de homicídio a pedido
da vítima, previsto e punido no art. 134.º do CP?

Cotações: 1. 4 valores; 2. 3 valores; 3. 3 valores; 4. 3 valores; 5. 5 valores; e Apreciação Global


(sistematização, síntese, clareza, fundamentação e português) 2 valores.

Nota: As respostas ininteligíveis (caligrafia pouco ou não percetível) não serão avaliadas.

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TÓPICOS DE CORREÇÃO

Questão n.º 1

Estamos perante dois crimes de natureza diferente: o crime do art. 135.º do CP é um crime
público e o crime do art. 203.º do CP é um crime semi-público, ou seja, dependente de queixa pelo
respetivo titular.
Quanto ao crime do art. 135.º, o MP tem legitimidade para promover o processo penal e
abrir inquérito, nos termos dos arts. 48.º e 262.º, n.º 2, ambos do CPP.
O art. 263.º do CPP estabelece que a direção do inquérito cabe ao MP, assistido pelos
órgãos de polícia criminal, devendo aquele praticar os atos e assegurar os meios de prova
necessários à realização das finalidades do inquérito, nos termos dos arts. 267.º e seguintes do CPP.
No caso em apreço, estamos perante uma situação de detenção fora de flagrante delito e
que não foi ordenada por um juiz. É por isso ilegal, pois só poderia ter sido efetuada nos termos do
art. 257.º do CPP, nomeadamente sendo admissível prisão preventiva. Ora, uma vez que o art. 202.º
do CPP estabelece como pressuposto da aplicação da medida de prisão preventiva a existência de
fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a três
anos, e tendo em conta que para cada um dos crimes, individualmente considerados, se encontra
prevista uma pena de prisão até três anos, nunca tal medida de coação poderia ter aplicação, pelo
que a detenção fora de flagrante delito deveria ser considerada ilegal. Contra o exposto não se
invoque que as penas de ambos os crimes, em concurso, resultariam num máximo aplicável de seis
anos de prisão, justificando assim a aplicação do art. 257.º do CPP, pois se a aplicação de uma
medida de coação depender da pena aplicável deve atender-se ao máximo da pena correspondente
ao crime que justifica a medida, nos termos do art. 195.º do CPP.
Quanto aos interrogatórios, os mesmos deveriam ter sido levados a cabo pelo juiz de
instrução, e não pelo MP, atendendo ao disposto nos arts. 268.º, n.º 1, al. a) e 141.º, ambos do CPP.
Apesar de o art. 143.º do CPP prever o primeiro interrogatório não judicial de arguido detido, esse
interrogatório surge (de forma residual) como ato preliminar e, nos n.º 3 do mesmo artigo, após o
interrogatório sumário, o MP, se não libertar o detido, deve providenciar para que ele seja presente
ao Juiz de Instrução, nos termos dos arts.141.º e 142.º, ambos do CPP. A ilegalidade dos
interrogatórios traduzir-se-ia numa mera irregularidade, nos termos do art. 123.º do CPP. A
circunstância de António, constituído regularmente como arguido, se ter recusado a responder com
verdade sobre a sua identidade poderia fazê-lo incorrer em responsabilidade criminal, nos termos
do art. 359.º, n.º 2, do CP, ex vi art. 61.º, n.º 3, al. b), do CPP.
Quanto às medidas de coação aplicadas, supondo que ambos os detidos estariam já
regularmente constituídos arguidos, o termo de identidade e residência (TIR) deveria ter sido

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aplicado tanto a António como a Bernardo, tendo o MP legitimidade para tal, nos termos do art.
196.º do CPP. Já a caução teria que ser aplicada pelo Juiz de Instrução, a requerimento do MP, nos
termos dos arts. 268.º, n.º 1, al. b) e 194.º, ambos do CPP. As motivações apresentadas pelo MP
para a aplicação desta medida não são legítimas, atendendo aos requisitos gerais de aplicação das
medidas de coação previstos no art. 204.º do CPP. A aplicação da caução, sendo ilegal, poderia
justificar a apresentação por António de um requerimento de revogação desta medida de coação,
nos termos do art. 212.º, n.º 1, al. a) e n.º 4, do CPP.

Questão n.º 2

O Tribunal funcionalmente competente para o julgamento seria, em qualquer um dos


crimes, o Tribunal de Julgamento.
Relativamente ao crime de auxílio ao suicídio (art. 135.º, n.º 1, do CP), a competência
material pertenceria ao tribunal singular (art. 16.º, n.º 2, al. b), do CPP). Porém, suscita-se a questão
de saber se esse mesmo crime não se incluirá também na previsão do art. 14.º, n.º 2, al. a), do CPP,
ou seja, se não se tratará de um crime doloso em que a morte seja elemento do tipo. A questão é
controversa e o problema fundamental consiste em saber se o ato suicida exigido (quer dele resulte
a morte ou não) é um resultado típico ou uma mera condição objetiva de punibilidade.
Quanto ao crime de furto (art. 203.º do CP), a competência material para o julgamento
caberia também ao tribunal singular, aplicando-se a al. b) do n.º 2 do art. 16.º do CPP.
Os crimes de auxílio ao suicídio (art. 135.º, n.º 1, do CP) e de furto (art. 203.º do CP)
deveriam ser processados conjuntamente, dado o tribunal material e funcionalmente competente
para conhecer deles todos ser o mesmo. À partida, nada impediria a conexão desses crimes ao
abrigo da al. d) do n.º 1 do art. 24.º do CPP, que, concatenado com o art. 27.º do CPP, atribui a
competência material ao tribunal de espécie mais elevada (no caso de ter sido defendido
anteriormente a competência do tribunal coletivo para o julgamento do crime do art. 135.º do CP, o
tribunal de espécie mais elevada seria o tribunal coletivo).
Devido ao facto de existir um concurso efetivo de crimes, as penas abstratamente
aplicáveis aos dois crimes em conjunto resultam em seis anos de prisão, pelo que também seria de
aplicar o art. 14.º, n.º 2, al. b), do CPP. À partida, não se vislumbra a possibilidade de o crime em
questão vir a ser julgado em processo sumário, tanto mais que não estavam reunidos os respetivos
pressupostos. Mas suscita a questão de saber se o MP poderia ter feito uso da faculdade prevista no
art. 16.º, n.º 3, do CPP, por forma a tais crimes serem julgados em tribunal singular. Contudo, a
referida norma restringe expressamente o seu âmbito de aplicação aos casos em que a competência
do tribunal coletivo resulte da aplicação da al. b) do n.º 2 do art. 14.º do CPP, ou seja, quando
resulte da aplicação do critério quantitativo. Assim, para quem defenda que o crime do art. 135.º do

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CP se enquadra no art.14.º, n.º 2, al. a), do CPP estaria excluída a possibilidade de o MP fazer uso
da faculdade prevista no art. 16.º, n.º 3, do CPP.

Questão n.º 3

A resposta à questão depende da verificação do preenchimento do requisito de legitimidade


previsto no art. 287.º, n.º 1, al. a), do CPP.
Bernardo requereu a abertura da instrução com fundamento na inadmissibilidade legal do
procedimento relativamente ao crime de furto e pediu que fosse determinada a suspensão
provisória do processo relativamente ao crime de auxílio ao suicídio.
Assim, no primeiro caso, trata-se de saber se o requerimento para abertura de instrução
(doravante, RAI) pode ser utilizado para suscitar uma questão que não diz respeito aos factos da
acusação: a verificação ou não da condição de procedibilidade exigível para o furto (a queixa do
ofendido – art. 49.º, n.º 1 do CPP, e art. 203.º, n.º 3, do CP). O ponto é saber se o RAI pode servir
para o arguido discutir algo que não corresponde aos factos constantes da acusação do MP (art.
287.º, n.º 1, al. a), do CPP). É verdade que existe uma divergência doutrinária sobre se é permitido o
arguido usar o RAI só para discutir questões-de-direito. No caso vertente, porém, todos os Autores
aceitariam a possibilidade de Bernardo requerer a abertura da instrução, dado que o arguido, ao
suscitar a inadmissibilidade legal do procedimento relativamente ao crime de furto, pretendia obter
um despacho de não-pronúncia, o que tornaria sempre indiscutível a utilidade daquele
requerimento.
Já relativamente ao pedido de determinação da suspensão provisória do processo, tratando-
se de uma medida de diversão processual prevista no encerramento do inquérito mas
correspondentemente aplicável ao encerramento da instrução (arts. 281.º e 307.º, n.º 2, ambos do
CPP), importava ter em consideração dois aspetos: por um lado, o facto de ser discutível a inclusão
de um pedido subsidiário no RAI; por outro lado, a circunstância de ser discutível a qualificação do
crime de auxílio ao suicídio, previsto no art. 135.º do CP, como tratando-se de uma “bagatela
penal” (ou crime de pequena ou média gravidade) a que seja aplicável uma medida de diversão
processual.

Questão n.º 4

Nos termos do art. 219.º da CRP, compete ao MP representar o Estado e defender os


interesses que a lei determinar e participar na execução da política criminal definida pelos órgãos de
soberania, exercer a ação penal orientada pelo princípio da legalidade e defender a legalidade
democrática.

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Por seu turno, o art. 53.º do CPP atribui ao MP a competência para colaborar com o
tribunal na descoberta da verdade e na realização do Direito, obedecendo em todas as intervenções
processuais a critérios de estrita objetividade, ao mesmo tempo que lhe atribui a competência para
deduzir a acusação e sustentá-la efetivamente na instrução e no julgamento.
Assim, o MP encontra-se sujeito ao cumprimento de dois deveres que, por vezes, se
encontram em campos opostos, como acontece no caso em apreço. Se o MP tem, por um lado, o
dever de sustentar a acusação, por outro lado, não o poderá fazer quando, objetivamente, depare
com inexistência de indícios. Podemos então considerar correta a mudança de orientação do
magistrado do MP.
Porém, uma vez que na fase da instrução o MP já não é o dominus do processo, o Juiz de
Instrução deverá decidir autonomamente relativamente à mudança de orientação do MP, a qual não
elimina nem altera a acusação anteriormente formulada.
À luz do nosso sistema processual penal, também seria defensável a opinião segundo a qual
o MP continua a desempenhar, durante a fase da instrução, uma função acusatória, uma vez que
ainda se encontra em discussão a possibilidade de redefinição do objeto do processo. Este
entendimento baseia-se numa visão mais dinâmica da função acusatória do MP e mais flexível
acerca da articulação entre o Juiz de Instrução e o MP na fase de instrução, admitindo que a
mudança de orientação do MP possa valer como ajustamento da acusação a novos dados
adquiridos durante a instrução. Dado que a acusação formal encerra essencialmente o objeto do
processo e a estabilidade do processo assegura a estrutura acusatória e constitui por isso uma
garantia importante, os defensores desta posição só costumam conferir relevância à mudança de
orientação do MP na instrução quando ela for mais favorável, como seria in casu.

Questão n.º 5

O MP havia proferido despacho de acusação contra António e Bernardo como coautores


do crime de auxílio ao suicídio, previsto e punido no art. 135.º, n.º 1, do CP, e do crime de furto do
veneno à drogaria, previsto e punido no art. 203.º do CP.
A circunstância de as diligências de prova realizadas na instrução apontarem para a
existência de indícios suficientes de que António e Bernardo não se teriam limitado a fornecer o
veneno, mas injetaram-no eles próprios em Carlos, aponta para a descoberta de factos novos.
Neste caso, estaríamos perante uma alteração de factos em sentido próprio e caberia qualificá-la
como substancial, nos termos do art. 1.º, al. f), do CPP, por importar a imputação de crime diverso
do que constava do despacho de acusação. Com efeito, existem critérios apontados pela doutrina,
critérios naturalísticos e normativos, através dos quais se deve concluir no caso pela existência de
crime diverso (art. 134.º do CP).

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Os factos novos seriam não autonomizáveis, na medida em que não poderiam ser
destacados do processo penal em curso e integrar o objeto de um processo penal autónomo, sem
violação do princípio ne bis in idem, consagrado no art. 29.º, n.º 5, da CRP. Os novos factos só
poderiam ser conhecidos no processo em curso, se houvesse acordo do MP, arguido e assistente
nesse sentido e se considerasse admissível a aplicação analógica do disposto no art. 359.º, n.º 3, do
CPP.
Se o Juiz pronunciasse António e Bernardo pelo crime de homicídio a pedido da vítima
cometido contra Clarisse, sem o referido acordo dos sujeitos processuais, a decisão seria nula,
segundo o art. 303.º, n.º 3 do CPP, sendo uma nulidade sanável cuja arguição deveria ter lugar nos
termos do art. 309.º e, caso fosse indeferido o requerimento a arguir a nulidade, a decisão de
indeferimento seria passível de recurso, ex vi arts. 399.º e 310.º, n.º 3, ambos do CPP.

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