Sei sulla pagina 1di 72

ANO XXV - Dezembro 2017 - Nº 98

Coordenação Editorial:
Vicky Safra
Manuscrito integrante da Assistentes de Coordenação:
coleção conhecida como os Clairy Dayan
Pergaminhos do Mar Morto Fortuna Djmal
Assessora Internacional:
Muriel Sutt Seligson
Supervisão Religiosa:
Rabino Y. David Weitman
Rabino Efraim Laniado
Rabino Avraham Cohen
Jornalista Responsável:
Desirée Nacson Suslick
MTb 13603
Colaboradores especiais:
Jaime Spitzcovsky
Reuven Faingold
Tev Djmal
Zevi Ghivelder
Revisão e tradução de texto:
Lilia Wachsmann
Consultor:
Marcello Augusto Pinto
Coordenação de Marketing:
Hillel de Picciotto
Produção Gráfica:
Joel Rechtman
JR Graphiks - Tel: 3873 0300
Projeto Gráfico:
LEN - Tel: 3815 7393
Serviços Gráficos:
C&D Editora e Gráfica - Tel: 3862 8417
Tiragem: 25.700 exemplares

A distribuição é gratuíta sendo sua comercialização expressamente


proíbida. Morashá significa Herança Espiritual; contém termos
sagrados. Por favor, trate-a com o devido respeito. Os artigos
assinados são de inteira responsabilidade de seus autores, não
refletindo necessariamente a opinião da revista. É proíbida
a reprodução dos artigos publicados nesta revista sem prévia
autorização do Instituto Morashá de Cultura.

www.morasha.com.br
morasha@uol.com.br

Rua Dr. Veiga Filho, 547


Diretoria Tel: 11 2597 2812
Vicky Safra
01229 000 São Paulo SP
Clairy Dayan
Fortuna Barbara Djmal
Dionysios Emmanuil Inglesis
Hiromiti Mizusaki
Edson Marinelli
Carta ao leitor
A festa de Chanucá celebra dois milagres ocorridos há Outro motivo é que Chanucá celebra não apenas
mais de dois milênios: a vitória militar dos Macabeus o milagre do azeite, mas também as lições desse
sobre os sírio-gregos e o fenômeno sobrenatural de um evento sobrenatural. Indiscutivelmente, ao longo de
único jarro de azeite que manteve acesa a Menorá do nossa história, ocorreram fenômenos muito mais
Templo por oito dias. impressionantes do que o do azeite. Contudo, esse
milagre ensina uma lição singular, de importância
Milagres impressionantes e inspiradores, sem dúvida. fundamental para o Povo Judeu durante os quase dois
Contudo, cabe a pergunta: por que Chanucá foi mil anos em que não tínhamos nem país nem exército.
instituída como uma de nossas festas? Afinal, Essa lição nos mostrou que se há um pouco de luz, é
ao longo da história judaica, ocorreram milagres em possível sobreviver a qualquer escuridão. As mensagens
abundância, e excetuando-se Pessach e Purim, transmitidas pelas luzes de Chanucá foram especialmente
não há festas judaicas que os celebrem. O Tanach e relevantes nas épocas mais difíceis de nossa história: a
o Talmud relatam muitos deles. Alguns exemplos: destruição do Templo Sagrado de Jerusalém por Roma
Yehoshua fez o sol parar, os profetas Eliyahu e o subsequente exílio de nosso povo; a Inquisição
e Elishá realizaram ressurreições e Rabi Chanina Espanhola que, assim como os sírio-gregos, tentou
ben Dosa fez o vinagre queimar. Além da vitória converter os judeus e forçá-los a abandonar o judaísmo;
dos Macabeus, ocorreram outras vitórias militares e, acima de tudo, o Holocausto, que exterminou quase
milagrosas na antiga Israel; por exemplo, a conquista de sete milhões de judeus. Muitos acreditavam que os
Jericó por Yehoshua. E, de fato, continuam ocorrendo judeus nunca se reergueriam após o genocídio e o
até hoje no moderno Estado de Israel. A Guerra de sofrimento ímpar a que foram submetidos. No entanto,
Independência também foi uma vitória dos poucos nosso povo nunca se esqueceu do simples milagre
contra os muitos, dos fracos contra os fortes. A incrível do azeite. Não surpreende, portanto, que alguns
vitória na Guerra dos Seis Dias constituiu outro judeus acendessem algo que se assemelhasse a uma
milagre. A reviravolta e subsequente vitória na Guerra Chanuquiá nos campos de extermínio: isso lhes dava
de Yom Kipur foi ainda outro triunfo militar milagroso. força, fazendo-os recordar que nosso povo é capaz de
Qual, então, a singularidade de Chanucá? Por que se sobreviver mesmo a situações impossíveis. O milagre
tornou uma festa celebrada por todo o Povo Judeu, do azeite celebrado em Chanucá lembra que não há
geração após geração? escuridão nesse mundo que possa extinguir a luz eterna
do Povo Judeu. Houve vários episódios em nossa história
Há muitas respostas para essa pergunta. Uma delas em que tínhamos apenas “um pequeno jarro de azeite
é que Chanucá comemora, também, seu significado puro” e parecia não haver quantidade suficiente para
histórico para o Povo Judeu. Os Macabeus lutaram sobreviver à escuridão. Mas, milagrosamente, a luz se
uma guerra contra um inimigo aparentemente manteve acesa, iluminando e permitindo que nosso povo
invencível, mas era necessário que vencessem, pois sobrevivesse até o alvorecer.
nada menos que o futuro do judaísmo estava em jogo.
Esses guerreiros judeus não tinham nem a força, nem Ao longo dos milênios, enfrentamos muitos impérios e
os armamentos, nem os homens, nem o treinamento forças opressoras poderosas. Mas sobrevivemos a todos
militar necessário para vencer a poderosa máquina de eles. Nossa luz não se apagou e nunca se apagará, e
guerra sírio-grega. Mas possuíam uma dupla porção prevalecerá, sempre, sobre a escuridão.
do espírito judaico que está disposto a lutar, longa e
arduamente, e fazer qualquer sacrifício em prol do Chanucá Sameach!
judaísmo e de seu povo. Chanucá é uma festa celebrada
por todo o Povo Judeu porque, não fosse pela vitória
dos Macabeus, é bem provável que nosso povo tivesse
sido completamente assimilado pelos helenistas e o
judaísmo deixado de existir.
ÍNDICE

15 34

42 50

56 66
03 carta ao leitor 20 NOSSAS FESTAS
Os mandamentos da

Festa de Purim
06 NOSSAS FESTAS
Oito considerações para 26 história de Israel
os oito dias de Chanucá 70 anos da Partilha

por zevi ghivelder

15
NOSSAS leis 34 CAPA
Tu B’Shvat Os Pergaminhos do

e as sete espécies Mar Morto

4
REVISTA MORASHÁ i 98

06

26
42
educação 66
destaque
Science Day - Ciências de forma O avanço da extrema direita
prática e interativa na Alemanha
Judaísmo na Escola Beit Yaacov por JAIME SPITZCOVSKy

46 MORAShA.COM

50
PERSONALIDADE
69 HISTÓRIA DE ISRAEL
A “Questão Das Terras”
Simone Veil um ícone mundial
na Palestina Britânica
56
comunidades
por reuven faingold

Os judeus na Polônia entre


as duas guerras mundiais 75 cartas

5 dezembro 2017
nossas festas

Oito considerações para


os oito dias de Chanucá
Há 22 séculos, quando a Terra de Israel estava sob ocupação
do Império sírio-GREGO, o Rei Antíoco IV emitiu uma série de
decretos malignos para subjugar e humilhar o Povo Judeu,
visando A forçá-lo a abandonar o Judaísmo e A abraçar o
helenismo. Antíoco proibiu o estudo da Torá e o cumprimento
de muitos de seus mandamentos, e ergueu uma estátua de UMA
divindade grega no Templo Sagrado de Jerusalém

E
m resposta aos cruéis decretos de Antíoco Para comemorar esses dois milagres – o azeite e a vitória
e seu empenho de extirpar o Judaísmo, dos Macabeus –, celebramos a festa de Chanucá durante
um grupo de judeus intrépidos, os oito dias. O triunfo militar desses valentes judeus foi,
Macabeus, enfrentou as forças sírio- como dizemos em nossas orações, uma vitória dos
gregas, superpotência da época. Após três poucos contra os muitos, dos fracos contra os fortes.
anos de guerra, os Macabeus tiveram uma vitória O profeta Zechariah resumiu o acontecimento de
espetacular contra o exército mais poderoso da forma poética: “‘Não pelo poder nem pela força, mas
Antiguidade. Após vencer Antíoco e seus exércitos, pelo Meu Espírito’, diz o Eterno”. O milagre do azeite
libertaram Jerusalém, reinauguraram o Templo que se seguiu à vitória militar foi um sinal Divino de
Sagrado e reacenderam a Menorá – o candelabro que os judeus tinham vencido a guerra apenas porque
de sete braços –, valendo-se apenas de um jarro de o Eterno, D’us Todo Poderoso, tinha operado milagres
azeite de oliva ritualmente puro encontrado em em seu favor. O suprimento de azeite para um dia
meio aos escombros. Todos os outros jarros de azeite milagrosamente ardeu durante oito não apenas porque
ritualmente puro para o serviço no Templo, que esse era o mínimo tempo necessário para produzir
levavam o selo do Cohen Gadol, o Sumo Sacerdote, azeite ritualmente puro, mas porque, segundo a Torá,
tinham sido propositalmente profanados pelos sírio- o número oito representa o sobrenatural, o milagroso.
gregos. Esse fenômeno sobrenatural assinalava que a Divina
Providência possibilitara o triunfo dos Macabeus, ainda
Esse único jarro continha azeite que daria para que eles não tivessem nem a força nem o poder nem
acender a Menorá durante um único dia – e os armamentos nem os homens para vencer a máquina
eram necessários oito para produzir mais azeite de guerra sírio-grega. Essa vitória militar significou
ritualmente puro. Os Macabeus usaram esse jarro; a sobrevivência do Judaísmo e, por conseguinte, do
mas o azeite, milagrosamente, ardeu durante oito Povo Judeu. A festa de Chanucá, portanto, não é apenas
dias – o prazo necessário para que fosse produzido a celebração de milagres. Comemora, também, a
mais azeite ritualmente puro. eternidade da Torá e do Povo de Israel.

6
REVISTA MORASHÁ i 98

Este ano, Chanucá se inicia em uma Judeu, mas para todas as pessoas após a Criação (ano de 1273 AEC no
terça-feira à noite, 12 de dezembro de bem no mundo. Suas luzes nos calendário gregoriano), e os milagres
de 2017. Na primeira noite da festa, ensinam que cedo ou tarde, a luz de Chanucá ocorreram nos anos de
acendemos um jarro de azeite ou triunfa sobre a escuridão, a bondade 3621-3622 (ano de 140-139 AEC no
uma vela; na segunda noite, duas; sobre a maldade, a justiça sobre a calendário gregoriano). No entanto,
na terceira, três, e assim por diante. iniquidade e a santidade sobre o D’us, que é Onisciente e acima do
Na oitava e última noite, acendemos profano. tempo e de todas as demais limitações,
todos os oito jarros de azeite ou velas incluiu alusões à Chanucá na Torá.
da Chanuquiá – o candelabro de oito Chanucá e suas luzes transmitem Isso não surpreende, pois a Torá é o
braços reminiscente da Menorá de inúmeras mensagens e lições. projeto de toda a Criação: todo evento
sete braços do Templo Sagrado de Preparamos, pois, oito considerações de maior ou menor porte – já ocorrido
Jerusalém. sobre Chanucá – uma para cada um ou que um dia ocorrerá – tem
dos oito dias da Festa das Luzes. fundamento ou alusão no Pentateuco.
Chanucá é uma das festas judaicas
mais apreciadas. Suas luzes são 1º dia Seguem-se algumas das alusões à
queridas não apenas para o Povo Chanucá na Torá Chanucá encontradas nos Cinco
Judeu, mas para muitas pessoas de Livros da Torá:
outras religiões. Uma Chanuquiá é Chanucá e seus mandamentos não
acesa na Casa Branca e no Kremlin são mencionados explicitamente na • A 25a palavra na Torá é Or, “luz”.
e líderes políticos do mundo todo, Torá, pois os eventos comemorados Começamos a acender as luzes de
inclusive do Brasil, a acendem. na festa ocorreram mais de 1.000 Chanucá na noite do 25o dia do mês
Chanucá é reconhecida de forma anos após D’us ter dado a Torá ao judaico de Kislev.
ampla porque seus temas e lições Povo Judeu. Moshé terminou de
são atemporais e universais. São transcrever o Pentateuco – os Cinco • Durante a jornada de 40 anos dos
relevantes não apenas para o Povo Livros da Torá – no ano de 2488 judeus pelo deserto a caminho da

7 DEZEMBRO 2017
nossas festas

Terra Prometida, eles acamparam D’us instruiu Moshé a dizer a seu Esse número não é acidental – como
em diversos lugares. O 25º lugar era irmão Aaron que não se aborrecesse nada na vida o é, especialmente em
chamado Chashmoná. Isso é uma com o fato de sua tribo não trazer assuntos diretamente relacionados à
alusão à família de sacerdotes, os sacrifícios, já que estes durariam Torá. Rabi Levi-Yitzhak Schneerson
Chashmonayim, que lideraram os apenas enquanto existisse o Templo revela um profundo significado
Macabeus na luta contra os sírio- Sagrado – ao passo que as luzes da desse número, associado a um dos
gregos. Menorá continuariam a ser acesas principais temas de Chanucá.
por todo o sempre. A mensagem
• O 23o capítulo de Levítico, terceiro de D’us a Aaron aludia às luzes da Está escrito na passagem Al
livro da Torá, descreve os vários Chanuquiá, que são uma recordação Hanissim, recitada na oração da
feriados judaicos. Logo a seguir, das luzes da Menorá do Templo. E Amidá e no Bircat Hamazon durante
no início do capítulo 24, vemos o de fato, já transcorreram quase 2.000 os oito dias de Chanucá, que os sírio-
mandamento de acender a Menorá. anos desde que foram interrompidos gregos se empenharam em “Fazer
Isso é uma alusão à Chanucá – nossa os serviços de sacrifício, mas as [Israel] esquecer a Sua Torá”.
festividade ligada ao acendimento da luzes da Chanuquiá, remanescentes
Chanuquiá - a Menorá de oito braços. diretas da Menorá, nunca deixaram Em sua tentativa de fazer com
de brilhar. Apesar da ausência do que isso acontecesse, os sírio-
• O capítulo 7 de Números, Templo Sagrado de Jerusalém, elas gregos visaram à Torá Oral, que
quarto livro da Torá, descreve as continuam a iluminar a escuridão explica e elucida a Torá Escrita. Os
oferendas trazidas pelos líderes que há no mundo. invasores perceberam que a própria
das tribos após a inauguração do Torá Escrita, tão amplamente
Mishkan – o Tabernáculo. 2º dia – As 36 velas documentada em milhares de rolos,
O capítulo 8 se inicia com as de Chanucá jamais seria esquecida. Sua estratégia
seguintes palavras: “O Eterno falou foi, então, erradicar todos
a Moshé, dizendo: ‘Fala a Aaron e Este ensinamento provém dos os vestígios da Torá Oral,
diz-lhe: Quando acenderes as luzes, escritos de um gigante espiritual, que era preservada e transmitida
faz de modo que as sete Cabalista, o Rabi Levi-Yitzchak oralmente de uma geração
luzes iluminem a luz central Schneerson, pai do Lubavitcher à outra. Sem a Torá Oral, é
da Menorá’ ”. Vemos, aqui, uma Rebe. impossível entender corretamente
conexão entre a inauguração do a Torá Escrita e cumprir seus
Tabernáculo – que foi o predecessor Durante a festa de Chanucá, mandamentos. Os sírio-gregos
do Templo Sagrado de Jerusalém – e acendemos um total de 36 luzes: perceberam que se conseguissem
o acendimento da Menorá. 1 +2 + 3 + 4 + 5 + 6 + 7 + 8. fazer o Povo Judeu esquecer a Torá
Na história de Chanucá, depois Oral, o fim do Judaísmo seguir-se-ia.
que os Macabeus venceram a
guerra, os judeus restauraram Séculos após o milagre de Chanucá,
e reinauguraram o Templo a Torá Oral foi finalmente redigida.
Sagrado, novamente Seu núcleo, conhecido como a
acendendo a Menorá. Mishná, foi editado pelo Rabi
Yehudá HaNassi. Nas gerações
Além disso, o Midrash nos seguintes, mais conteúdo
ensina que após ser inaugurado da Torá Oral foi escrito,
o Tabernáculo, D’us ordenou formando-se os dois principais
que cada líder de tribo trouxesse corpos da Lei Judaica: um em
uma oferenda. Uma tribo foi Israel, o Talmud Yerushalmi
excluída – a de Levi. D’us (Talmud de Jerusalém), e
ordenou a Aaron, o primeiro o outro na Babilônia – o
Sumo Sacerdote e chefe Talmud Bavli (Talmud da
da tribo de Levi, que não Babilônia). Este último,
trouxesse oferenda, mas em geral mais estudado do
que acendesse a Menorá. que o de Jerusalém, contém

8
REVISTA MORASHÁ i 98

comentários sobre exatamente


36 tratados da Mishná, que é o
número total de velas acesas durante
Chanucá. As 36 velas de Chanucá
celebram a sobrevivência da Lei
Oral, que foi transcrita e preservada
nos 36 tratados do Talmud Bavli.

Há outra conexão entre Chanucá e


a Torá Oral. O editor do Talmud
Bavli foi Rav Ashi, cujo nome é
foneticamente ligado a Esh, palavra
em hebraico para “fogo” – o veículo
para a celebração de Chanucá.
Pode-se traçar uma terceira conexão candelabro de chanucá com queimadores de azeite em vidro azul, provavelmente da
entre as 36 velas de Chanucá e a tunísia ou dos bálcãs, c. 1800

Torá Oral. Os principais guardiães


da Torá Oral eram os 71 membros O milagre do azeite é o fato de uma vestígio fossem mínimas. E por
do Sanhedrin, a Suprema Corte de quantidade suficiente para apenas que procuraram, assim mesmo?
Israel. Para que qualquer decisão um dia ter durado oito. Algo de Porque tinham fé de que mesmo
do Sanhedrin fosse obrigatória, era miraculoso ocorreu do segundo em meio à maior tragédia, algo
necessário haver uma maioria de, no ao oitavo dia, mas era natural que sobreviveria. E estavam certos. Um
mínimo, 36 juízes. o suprimento encontrado ardesse jarro de azeite ritualmente puro
durante um dia. O fato de o jarro de realmente sobreviveu. Por alguma
Quando acendemos a Chanuquiá, azeite ritualmente puro ter mantido razão, inexplicável, os invasores não
devemos lembrar que estamos a Menorá acessa durante o primeiro o encontraram.
fazendo mais do que celebrar uma dos oito dias não constituiu milagre
vitória militar e o milagre do azeite. algum – era o esperado. O milagre O milagre celebrado na primeira
Estamos celebrando a sobrevivência foi continuar a queimar nos demais noite de Chanucá é o da fé pura, total
da Torá Oral, sem a qual a Torá sete dias. Por que, então, recitamos e simples – a fé em que, apesar de
Escrita não pode ser entendida. a bênção “Que fez milagres para toda a destruição perpetrada, algo
Sem a Torá Oral, o Judaísmo nossos antepassados” na primeira precioso, sagrado e puro restaria
autêntico não pode sobreviver. noite de Chanucá? para que dali os judeus pudessem se
As 36 luzes de Chanucá simbolizam, Uma das respostas é que o milagre erguer e começar de novo. Portanto,
assim, o triunfo e a eternidade da celebrado no primeiro dia foi o a primeira noite de Chanucá celebra
Torá e, por conseguinte, do Povo de fato de os Macabeus terem o próprio fato de um pouco de azeite
Israel. encontrado um jarro de azeite ritualmente puro ter sobrevivido à
que não havia sido profanado destruição. Não era muito – apenas a
3º dia – O Povo Judeu pelos sírio-gregos. Em outras quantidade para um dia – mas aquilo
é uma Vela Eterna palavras, na primeira noite de milagrosamente manteve acesa a
Chanucá, celebramos o milagre da Menorá durante oito dias – tempo
Nossos Sábios lançam uma pergunta “sobrevivência” desse jarro de azeite. suficiente para que mais azeite
intrigante acerca do mandamento De fato, não havia razão para se ritualmente puro fosse produzido.
de acender as luzes de Chanucá. supor que algo tivesse sobrevivido
Durante as oito noites da festividade, à profanação sistemática feita pelos Esse milagre simboliza um dos
acendemos azeite de oliva ou velas e sírio-gregos e seus seguidores no temas principais na História
recitamos a benção “She-assá Nissim Templo Sagrado. No entanto, Judaica. Várias foram as ocasiões na
La-Avotenu (“Que fez milagres para quando os Macabeus reconquistaram longa e árdua caminhada de nosso
nossos antepassados”). Mas, qual o o Templo, insistiram em procurar povo em que tudo parecia perdido.
milagre que estamos celebrando na azeite ritualmente puro, ainda que Uma outra nação teria desistido,
primeira noite de Chanucá? as chances de encontrar qualquer em meio ao desespero. O Povo de

9 DEZEMBRO 2017
nossas festas

Israel vivenciou a destruição de dois As luzes de Chanucá ensinam ao hoje. O mundo, particularmente
Templos Sagrados e foi expulso Povo Judeu e a toda a humanidade a Civilização Ocidental, deve
da Terra de Israel. Na Diáspora, que o poder do espírito humano de muito à Grécia Antiga. Eles
foi submetido a perseguições e vencer qualquer dificuldade não tem geraram filósofos como Sócrates,
expulsões constantes, aos massacres limites. A festa de Chanucá nos faz Platão e Aristóteles; historiadores
dos Cruzados, às fogueiras da recordar, repetidamente, que temos como Heródoto e Tucídides, e
Inquisição espanhola, aos pogroms que nos recusar a aceitar a derrota. dramaturgos como Sófocles e
e, acima de tudo, ao Holocausto. O jarro de azeite ritualmente Ésquilo. Os antigos gregos foram
Mas, de um modo ou outro, os puro que sobreviveu à destruição mestres na Arte e na Arquitetura,
judeus não desistiram. Não se representa o Povo Judeu. Somos uma entre inúmeros outros campos do
prostraram e choraram. Juntaram Ner Tamid – uma Vela Eterna – cuja conhecimento humano. Foram
o pouco que restara, reconstruíram luz perene não há potência na Terra grandes pensadores, linguistas,
nosso povo e brilharam de forma que possa extinguir. artistas, intelectuais, desportistas,
ainda mais vibrante do que antes. líderes políticos e guerreiros. Ainda
A luz do Judaísmo sempre se 4º dia - Um choque de assim, essa superpotência foi
recusou a ser apagada. Pelo civilizações: Atenas vencida por um grupo pequeno de
contrário, sempre que a escuridão versus Jerusalém combatentes judeus, conhecidos
ameaça extingui-la, consegue brilhar como os Macabeus e, a partir de
com intensidade ainda maior. É comum ouvirmos, atualmente, a então, entrou em declínio. A Grécia
O resultado foi que as maiores expressão “choque de civilizações”. Antiga desapareceu para nunca
catástrofes na História Judaica A história de Chanucá foi um dos ressurgir. Hoje, vive apenas nos
foram seguidas pelos maiores primeiros grandes choques de livros de História: os descendentes
triunfos do Povo Judeu. O estudo e a civilizações, travado entre os gregos dos gregos da Antiguidade não
disseminação da Cabalá floresceram da Antiguidade e os judeus – entre mais vivem em Atenas nem em
após a Inquisição na Espanha. Atenas e Jerusalém. outro lugar qualquer. Por sua vez, o
O retorno dos judeus à Terra de minúsculo Povo Judeu, destituído
Israel e a Jerusalém, bem como a Não se pode negar que os gregos de seu Lar e perseguido, sobreviveu
disseminação do Judaísmo pelos produziram uma das civilizações a 2.000 anos de exílio, perseguições
quatro cantos do mundo, ocorreram mais extraordinárias na história constantes e mesmo genocídio, e
pouco após o Holocausto. humana. Seu legado dura até hoje vive soberano em sua Pátria
ancestral e eterna. Seus filhos
chanuquiá. nuremberg, alemanha, c. 1790. brincam, hoje, nas ruas de Jerusalém
ourives: johann nicholas wollenberg (1759-1789)
e falam a mesma língua que os
Profetas usavam há 3.000 anos.

Como explicar que um dos maiores


impérios de todos os tempos tenha
perecido e um povo minúsculo
tenha sobrevivido e florescido? As
respostas são inúmeras. Uma delas,
óbvia, é a Divina Providência. D’us
assegurando a eternidade do Povo
de Israel é um tema constante em
nossas orações e celebrado em nossas
datas sagradas, inclusive em Chanucá.
Mas há outra resposta que também
explica o choque de civilizações entre
os antigos gregos e os judeus.

Os gregos antigos, que acreditavam


em várias divindades, não

10
REVISTA MORASHÁ i 98

acreditavam em um D’us único, uma vela? Deve usá-la como vela


que ama e Se preocupa com tudo de Shabat ou de Chanucá? Não dá
e todos. A Grécia Antiga deu ao para usá-la para os dois propósitos.
mundo o conceito de tragédia. A lógica sugere que deve acendê-
Para seu povo, os seres humanos la como vela de Chanucá. Afinal,
nasciam para se empenhar e, às não há lei ordenando que se venda
vezes, atingiam a grandeza. Mas para algo ou se tome empréstimo para
eles a vida não tinha um propósito comprar velas para Shabat. Mas a
supremo. De acordo com sua cultura, Lei Judaica dita que em tal situação,
o Universo desconhecia e não se deve-se usar a vela para o Shabat e
importava com o destino do homem. não para Chanucá. Por que seria?
Chanuquiá no estilo barroco.
Alemanha, século 19
Para o Judaísmo, esse conceito é Maimônides explica: “A vela de
um anátema. Os judeus ensinaram Shabat tem prioridade porque
ao mundo que estamos aqui na Judaísmo e sua cultura de esperança, simboliza Shalom Bait – a paz no
Terra porque D’us nos criou com propósito e amor, sobreviveram. As lar. E a paz é de suma importância
amor. O Judaísmo ensina que D’us luzes de Chanucá são um símbolo porque toda a Torá nos foi dada para
está preocupado não apenas com dessa sobrevivência. trazer paz ao mundo”.
o mundo em sua totalidade, mas Chanucá comemora uma das maiores
também com o destino de cada uma A Acrópoles de Atenas sobreviveu, vitórias militares na História Judaica.
de suas criaturas. O Judaísmo deu à mas os antigos gregos, não. O Até hoje, os Macabeus simbolizam
humanidade a ideia de que a vida tem Templo Sagrado de Jerusalém não a bravura e a coragem do Povo
significado e propósito, pois o mundo sobreviveu, mas o Povo Judeu, sim. Judeu. Não fossem os Macabeus, o
e todos os que o habitam foram Os judeus ainda estão nesta Terra Judaísmo e, por conseguinte, o Povo
criados e são supervisionados por um por causa da Divina Providência, Judeu, teriam desaparecido da face
Ser Infinito que está intimamente mas também porque nosso povo da Terra. No entanto, a Lei Judaica
envolvido com absolutamente todos sempre acreditou no poder da determina que se tivermos apenas
os detalhes de Sua criação. luz e de tudo o que representa. uma vela às vésperas do Shabat
As civilizações cujos conceitos Chanucá nos ensina que uma durante a festa de Chanucá, devemos
fundamentais são a tragédia vela de esperança pode parecer usá-la como vela de Shabat – não
e a futilidade da existência pouco, mas dela pode depender a de Chanucá. A precedência para o
inevitavelmente se desintegram. própria sobrevivência de toda uma Shabat se deve ao fato de que nem
Povos destituídos de qualquer senso civilização. mesmo a maior vitória militar é mais
de significado e propósito superiores importante do que a paz no lar.
não possuem as convicções morais 5º dia - A Luz da Guerra
das quais depende a continuidade. e a Luz da Paz Os antigos gregos foram grandes
Aqueles que creem que a vida guerreiros, conquistadores e
é fútil e destituída de propósito Maimônides, o maior filósofo judeu, governantes, mas sua civilização foi
sacrificam a felicidade em troca que produziu uma obra que é um extinta. Como o Povo Judeu pôde
do prazer. Vendem o futuro pelo dos pilares da Lei Judaica, escreveu: sobreviver a eles? Entre outras, pelo
presente. Negligenciam sua alma, “O mandamento das luzes de fato de os judeus darem mais valor a
que é eterna, e apenas alimentam Chanucá é muito precioso. Quem seu lar do que ao campo de batalha.
o corpo, que é temporário. Tais não tem meios de comprar as suas A paz no lar importava muito mais
civilizações hedonistas, cedo ou luzes deve vender algo de seus a nossos ancestrais do que as vitórias
tarde, perdem a paixão, a energia, a bens ou, se necessário, tomar um militares.
sabedoria e a direção que lhes trouxe empréstimo, para poder cumprir essa
grandeza. A decadência espiritual mitzvá”. Ao celebrarmos Chanucá e
inevitavelmente é seguida pelo fim comemorarmos os triunfos militares
de uma civilização, mesmo de uma Uma pergunta: E se em uma tarde e atos de bravura e heroísmo
tão grandiosa como o foi a Grécia de 6a feira, durante a festividade de do Povo Judeu – sejam os dos
Antiga. Em nítido contraste, o Chanucá, a pessoa se vê com apenas Macabeus ou dos valorosos soldados

11 DEZEMBRO 2017
nossas festas

do Estado de Israel –, não podemos Após a destruição do segundo de Israel, o Hatikvá (A Esperança),
esquecer que a vitória suprema é Templo Sagrado de Jerusalém, que inspirou o Povo Judeu a voltar
vencida não no campo de batalha, muitos rabinos julgavam que a festa ao seu Lar e à sua capital eterna,
mas em nossos lares e em nossas de Chanucá deveria ser abolida. Jerusalém, onde um dia brilhou
comunidades. O Povo Judeu é Argumentavam que como Chanucá majestoso o Templo Sagrado.
singular porque valoriza a vida, o celebra a reinauguração do segundo Ao acendermos as luzes de Chanucá,
casamento, os filhos e o lar – mais do Templo Sagrado, deixara de existir devemos lembrar-nos que, apesar
que as grandes vitórias militares. uma razão para seguir celebrando-a da queda do Templo Sagrado e de
– já que o Templo havia sido toda a destruição que nosso povo
Os judeus comprovaram ser capazes destruído por Roma. vivenciou, o Povo Judeu manteve
de produzir os melhores guerreiros viva a sua esperança, e essa esperança
do mundo. Os Macabeus foram Conta-nos o Talmud que em uma nos manteve vivos como povo.
soldados determinados e destemidos cidade, Lod, Chanucá chegou Nunca se deve duvidar do poder
que, com a ajuda de D’us, venceram mesmo a ser abolida. No entanto, da esperança. Ela é mais potente
uma superpotência militar. Hoje, o Povo Judeu decidiu que, apesar e duradoura que grandes impérios
o Estado de Israel tem as forças da destruição do segundo Templo, e exércitos. A luz da esperança
armadas mais bem treinadas no continuariam a celebrar a festividade. preservou e sustentou nosso povo
mundo. País algum, nem mesmo os Esse foi o terceiro milagre de mesmo em seus momentos mais
Estados Unidos ou a Rússia, tem Chanucá: a decisão de continuar a difíceis. As luzes de Chanucá
pilotos, forças especiais, tecnologia celebração apesar da ausência do Beit despertam o coração e a alma de
militar e serviços de inteligência HaMikdash, o Templo Sagrado. tantas pessoas porque nos ensinam a
melhores do que os de Israel. E por que tomaram essa decisão? nunca perder a esperança.
O Estado Judeu não tem outra Porque, apesar de ter caído a
opção – tem que ser uma “Morada de nossa Vida”, a esperança 7º dia - Constante
superpotência militar, pois se o judaica continuava de pé. Podíamos crescimento espiritual
Holocausto nos deixou alguma ter perdido o Beit HaMikdash – a
lição, esta foi que nós, judeus, Morada Divina na Terra –, mas os Na primeira noite de Chanucá,
temos que nos defender sozinhos. romanos não nos tinham tirado a acendemos um jarro de azeite ou
Nosso desejo, no entanto, é formar lembrança, a esperança e a luz de uma vela. Na segunda, acendemos
eruditos e cientistas, não soldados. Chanucá e tudo o que simboliza. duas, e na terceira, três. Somente na
Contrariamente aos antigos gregos, Tinha sido destruída uma gloriosa oitava e última noite de Chanucá
preferimos viver para nossos filhos e estrutura física, mas seu espírito acendemos todas as luzes da
netos do que ter uma morte heroica continuou a viver dentro de cada Chanuquiá. Essa progressão nos
no campo de batalha. um dos judeus e dentro de cada ensina que o que importa na vida não
uma de nossas sinagogas – que são é nosso ponto de partida, mas nosso
Há vezes em que a luz da guerra um Mikdash Me’at – um pequeno progresso. O que D’us espera de cada
é necessária, como na história de Templo Sagrado. Continuamos um de nós é que cada dia consigamos
Chanucá e na do Estado de Israel. a celebrar Chanucá 2.000 anos dar um passo à frente: que possamos
Mas, quando há opção, a luz da paz depois do segundo Templo ter sido produzir mais luz hoje do que ontem
é preferível. destruído, porque sabemos que um e que amanhã possamos brilhar mais
dia o terceiro Templo Sagrado será intensamente do que hoje.
6º dia - O terceiro construído. Sempre acreditamos que
milagre de Chanucá os milagres dos dias dos Macabeus Ninguém se torna um sábio ou um
poderiam voltar a acontecer – e gigante espiritual da noite para
A festa de Chanucá celebra dois de que acontecerão, de fato. As o dia. Isso exige muitos anos de
milagres: a vitória militar dos palavras Od Lo Avdá Tikvatenu, estudo, prática e auto-refinamento.
Macabeus e o suprimento de azeite “nossa esperança não está perdida”, O processo é longo e árduo. Tornar-
para um único dia ter durado oito. reverberaram, sem parar, na alma se mestre em Torá e – ainda mais
Mas houve um terceiro milagre. coletiva dos Filhos de Israel nos difícil – tornar-se mestre de si
Poucos o conhecem. Ocorreu séculos últimos 2.000 anos: tornaram-se mesmo, requer um empenho e
mais tarde. parte do Hino Nacional do Estado uma bravura enormes. Mas, se

12
REVISTA MORASHÁ i 98

chanuquiá. escola bezalel de artes, jerusalém, 1908-1929

avançarmos constantemente – se Estão convencidos de que o fim do nós havemos de prevalecer.


brilharmos, dia após dia, um pouco mundo está próximo e temem pelo Venceremos a guerra mundial
mais intensamente –, poderemos que o futuro possa trazer. De fato, final. A paz advirá, a escuridão será
atingir alturas inconcebíveis. E para os Profetas falaram de uma guerra banida para sempre e a Luz Divina,
isso basta coragem e determinação apocalíptica que precederá a vinda simbolizada pelas luzes de Chanucá,
de dar o primeiro passo e continuar do Mashiach. Mas essa guerra final preencherá o mundo inteiro.
crescendo. Basta acender uma vela não será travada nos campos de Que D’us nos ajude a vencer essa
hoje e uma vela adicional amanhã. batalha, nem no mar e tampouco guerra o mais breve possível. Amén,
nos céus. Não se usarão armamentos Ken Yehi Ratson.
Temos que nos empenhar para avançados ou bombas nucleares. Não
constantemente subir a Escada será uma guerra entre líderes nem
de nosso patriarca Jacob, que toca entre nações.
BIBLIOGRAFIA
a Terra e alcança os Céus. Não
8 Short Thoughts for 8 Chanukah Nights -
importa quantos atos de bondade A guerra final que precederá a Era Rabbi Jonathan Sacks - http://rabbisacks.
um ser humano praticou; não Messiânica será travada no coração org/8-thoughts-8-nights/
importa quanto da Sabedoria de cada pessoa, com os exércitos de The Mystical Significance of the 36
Divina aprendeu e nem quantos atos seus atos neste mundo. A Guerra Chanukah Candles - Adaptado das obras
sagrados e generosos praticou. Ele Final é a reencenação da batalha de Rabi Levit-Yitzhak Schneerson
nunca deve estar satisfeito com suas espiritual de Chanucá – a batalha http://www.chabad.org/therebbe/article_
cdo/aid/2792398/jewish/The-Mystical-
realizações. Ainda que hoje tenha da luz contra a escuridão. E nós Significance-of-the-36-Chanukah-
praticado muitos atos de bondade, todos seremos forçados a participar Candles.htm
amanhã terá que praticar ainda dessa guerra final. Na verdade, quer Bringing Heaven Down to Earth - Rabbi
muitos atos mais. o saibamos ou não, já a estamos Tzvi Freeman, CreateSpace Independent
Publishing Platform
travando. O resultado dessa guerra
Is Chanukah Mentioned in the Torah?
8º dia - Chanucá e a determinará o destino do mundo, Rochel Chein, http://www.chabad.
Guerra Mundial Final e isso está nas mãos de cada um de org/holidays/chanukah/article_cdo/
nós. Mas não devemos temer seu aid/610029/jewish/Is-Chanukah-
Muitas pessoas estão esperando resultado: D’us nos assegurou Mentioned-in-the-Torah.htm
por uma guerra mundial final. por meio de seus Profetas que

13 DEZEMBRO 2017
nossas festas

acendendo a Chanuquiá
Todas as noites, antes de acender as velas Costuma-se colocar a Chanuquiá sobre
pronunciam-se as seguintes bênçãos: uma mesa no lado esquerdo da porta
de entrada, em frente à mezuzá, ou na
janela que dá para a via pública.
Os seguintes horários são referentes
apenas a São Paulo.
A cada noite, após recitar as bênçãos,
acendem-se as velas da Chanuquiá 1ª noite
com o shamash, que é colocado na 25 de Kislev
Terça,
Chanuquiá de modo a ficar mais 12 de dezembro,
Baruch Atá A-do-nai, E-lo-hê-nu alto do que as demais chamas. Após a partir de 20:18 horas
Mêlech haolam, asher kideshánu acender as velas, recita-se em seguida
bemitsvotav, vetsivánu lehadlic ner
Hanerot halálu: 2ª noite
Chanucá.
26 de Kislev
Quarta,
Bendito és Tu, Eterno, nosso D’us, Rei 13 de dezembro,
a partir de
do Universo, que nos santificaste com 20:18 horas
Teus mandamentos, e nos ordenaste
acender a vela de Chanucá. 3ª noite
27 de Kislev
Quinta-feira,
14 de dezembro,
a partir de
20:19 horas

4ª noite
Baruch Atá A-do-nai, E-lo-hê-nu Hanerot halálu ánu madlikim, 28 de Kislev
Mêlech haolam, sheassá nissim al hanissim veal hapurkan, veal Sexta-feira,
laavotênu, bayamim hahêm, 15 de dezembro,
haguevurot veal hateshuot, veal 19:31 horas, antes de
bazeman hazê. haniflaot, sheassita laavotênu, acender as velas de
Shabat
bayamim hahêm, bazeman hazê, al
Bendito és Tu, Eterno, nosso D’us, Rei yedê cohanêcha hakedoshim. Vechol 5ª noite
29 de Kislev
do Universo, que fizeste milagres para shemonat yemê Chanucá, hanerot Sábado,
nossos antepassados, naqueles dias, halálu côdesh hem, veen lánu reshut 16 de dezembro,
nesta época. lehishtamesh bahem êla lir’otam 20:30 horas,
após a Havdalá
bilvad, kedê lehodot lishmêcha,
Apenas na primeira noite, al nissêcha, veal nifleotêcha, veal
6ª noite
depois de recitar as duas yeshuotêcha. 30 de Kislev
bênçãos, recita-se o Domingo,
shehecheyánu: 17 de dezembro,
Acendemos estas luzes em virtude a partir de
dos milagres, redenções, bravuras, 20:21 horas
salvações, feitos maravilhosos e
auxílios que realizaste para nossos 7ª noite
antepassados, naqueles dias, nesta 1 de Tevet
Segunda-feira
Baruch Atá A-do-nai, E-lo-hê-nu época, por intermédio de Teus 18 de dezembro, a
Mêlech haolam, shehecheyánu sagrados sacerdotes. Durante todos os partir das 20:21 horas
vekiyemánu vehiguiyánu lazeman oito dias de Chanucá, estas luzes são
hazê. sagradas, não nos sendo permitido 8ª noite
fazer qualquer uso delas, apenas mirá- 2 de Tevet
Terça-feira,
Bendito és Tu, Eterno, nosso D’us, Rei las, a fim de que possamos agradecer 19 de dezembro,
do Universo, que nos deste vida, nos e louvar Teu grande nome, por Teus a partir de 20:22 horas
mantiveste e nos fizeste chegar até a milagres, Teus feitos maravilhosos e
presente época. Tuas salvações.

14
nossas leis

Tu B’Shvat e as Sete Espécies

“Porque o Eterno, teu D’us te traz a uma boa terra...


terra de trigo e cevada, de figueira e de romeira;
terra de oliveira que dá azeite, e de tamareira”
(Deuteronômio 8:7-9)

O
15o dia do mês judaico de Shvat, Tu No sétimo ano do ciclo, não havia separação de dízimos,
B’Shvat, é o Ano Novo das Árvores – um pois toda a produção que cresce durante a Shemitá não
dos quatro Anos Novos mencionados no tem dono e pode ser colhida por qualquer um.
Talmud. Os outros três são 1o de Tishrei
(Rosh Hashaná), 1o de Nissan e 1o de Elul. Como a Torá não nos permite separar dízimos
das safras de um ano anterior, era fundamental
Qual o propósito de um Ano Novo para as árvores? determinar o início de uma nova safra. Nossos Sábios
Segundo a Lei da Torá, o ciclo agrícola na Terra de determinaram que os frutos que floriam antes do dia
Israel leva sete anos, e conclui com um ano sabático – a 15 de Shvat eram safra do ano anterior. Se cresciam
Shemitá. Quando o Templo Sagrado de Jerusalém estava a partir desse dia 15, eram produto do novo ano. No
de pé, nos seis primeiros anos de cada ciclo os plantadores entanto, o ano novo para grãos, legumes e verduras é
eram obrigados a separar uma porção de sua produção o dia 1º de Tishrei – Rosh Hashaná. Por que, então,
anual e reservá-la para os seguintes propósitos sagrados: o ano novo das frutas é no dia 15 de Shvat e não em
cerca de 2% da produção eram dados a um Cohen – isso Rosh Hashaná? Porque na região do Mediterrâneo,
é conhecido como Terumá – e 10% a um Levi – o que a estação chuvosa se inicia na festa de Sucot. Leva
se chama de Maaser Rishon (Primeiro Dízimo). Após aproximadamente quatro meses – de Sucot (que se
determinar a Terumá e o Maaser Rishon, nos anos um, inicia no dia 15 de Tishrei) até o dia 15 de Shvat - para
dois, quatro e cinco de cada ciclo, os plantadores tinham que as chuvas do ano novo saturem o solo e as árvores
que separar outros 10% de sua produção e comê-los deem frutos. Todos os frutos que florescem antes
em Jerusalém. Esse dízimo é chamado Maaser Sheni são produto das chuvas do ano anterior e, portanto,
(Segundo Dízimo). No 3o e 60 anos do ciclo, em vez contabilizados para os dízimos juntamente com a safra
de comer o Maaser Sheni em Jerusalém, os fazendeiros do ano anterior.
davam esse Segundo Dízimo aos carentes, que, por sua
vez, podiam consumi-lo onde quisessem. Esse dízimo é As leis dos dízimos são técnicas. Preenchem muitas
conhecido como Maaser Ani (Dízimo do Carente). páginas do Talmud Yerushalmi, mas têm pouca

15 DEZEMBRO 2017
nossas leis

relevância para a maioria dos judeus. Shivat HaMinim - as Sete animal (Talmud Bavli, Sotá 14a). O
Na verdade, Tu B’Shvat é uma data Espécies da Terra de trigo simboliza a alma Divina, ao
que não teve significado prático Israel passo que a cevada, a alma animal. O
durante os milênios em que o Povo trigo representa o empenho humano
Judeu esteve exilado da Terra de Ademais de ser um livro de leis e em buscar transcendência – ou seja,
Israel. Contudo, sempre foi uma data ensinamentos, a Torá é um código. elevar-se para alcançar o Divino.
festiva no calendário judaico. Ainda Significa exatamente o que está
que não seja um Yom Tov – um dia escrito, mas há infinitos níveis O Talmud tece um comentário de
sagrado –, é uma data festiva na qual metafóricos e alusivos em suas que o fruto proibido no Jardim do
omitimos as preces de Tachanun entrelinhas. Por exemplo, quando a Éden era o trigo. Ainda que o trigo
(pedidos de perdão e confissão). Torá afirma que a Terra Prometida não seja tecnicamente uma fruta, sua
São muitas as razões para esse dia se distingue por meio de suas natureza era diferente no Éden. Por
ser festivo. Uma delas é o fato de sete espécies, faz alusão à alma do que teria Eva sucumbido à tentação
que durante os 2000 anos em que homem e às sete qualidades que a e consumido o fruto proibido?
nós, judeus, vivemos na Diáspora, movem e enriquecem. Como um dos Porque a serpente lhe havia dito que
Tu B’Shvat nos recordava a conexão propósitos primordiais do estudo da se o fizesse, o ser humano se tornaria
eterna de nosso povo com a Terra Torá, e particularmente da Cabalá, como D’us. O desejo de comer
de Israel. Outra razão para sempre é atingir-se o autoconhecimento, é o fruto proibido surgiu do anseio
termos celebrado Tu B’Shvat é importante nos aprofundarmos no humano de união com o Divino,
que apesar de ser o Ano Novo das que dizem os livros místicos sobre o ainda que isso fosse autodestrutivo.
árvores, atribuímos significado simbolismo das Shivat HaMinim –
especial à data pois, como nos ensina as Sete Espécies da Terra de Israel Contrariamente à alma animal, que
a Torá, “o homem é a árvore do – que temos o costume de comer na busca a autopreservação e o prazer, a
campo” (Deuteronômio 20:19). As celebração de Tu B’Shvat. alma Divina busca a comunhão com
leis referentes a essa data podem D’us. Aquele que apenas alimenta
ser técnicas e irrelevantes para 1. Trigo: Transcendência sua alma animal e priva a Divina
muitos judeus, mas nossos Sábios de seu alimento espiritual, nunca
derivam muitas lições relevantes da Aprendemos na Cabalá que cada encontrará a verdadeira felicidade,
comparação que a Torá faz entre o um de nós tem duas almas distintas: satisfação e paz. A alma Divina
homem e a árvore do campo. uma Divina, que incorpora nossos somente pode ser alimentada com
impulsos transcendentes, e uma espiritualidade. Não há quantidade
Celebramos Tu B’Shvat consumindo animal, que é a origem de nossos de fartura material que a sacie. O
frutas, particularmente as sete instintos naturais e auto orientados. trigo – a primeira das Sete Espécies
espécies destacadas pela Torá como – nos ensina que nossa prioridade na
prova da fertilidade da Terra de Na Torá, o trigo é considerado a vida tem que ser nutrir, adequada e
Israel: trigo, cevada, uvas, figos, base da dieta humana, enquanto a plenamente, nossa alma Divina.
romãs, azeitonas e tâmaras. cevada é mencionada como alimento
2. Cevada: Vitalidade

Como vimos acima, a cevada


representa a alma animal.
Aparentemente, o trigo tem uma
conotação positiva e a cevada,
negativa. No entanto, é um erro
acreditar que a alma animal deva
ser menosprezada. Segundo a
Cabalá, nosso empenho em nutrir
e desenvolver a alma animal é uma
tarefa não menos fundamental
para nossa missão na vida do que o
aperfeiçoamento da alma Divina.

16
REVISTA MORASHÁ i 98

É verdade que, contrariamente A importância da alegria se


à alma Divina, a alma animal percebe em tudo. Quando estamos
é envolta em uma carga de alegres, tudo o que fazemos fica
negatividade – egoísmo, ganância, mais evidente: nossa mente fica
luxúria, vaidade e crueldade, entre mais brilhante, nosso amor mais
muitas outras falhas humanas. profundo, nossos desejos mais
Contudo, ela tem certas vantagens intensos. A alegria permite que as
sobre a alma Divina: a vitalidade, emoções brotem. Como ensina o
a determinação e a paixão que o Talmud, “Quando o vinho entra,
lado mais espiritual do ser humano os segredos saem”. Quando nos
não possui, em geral. Aqueles embebemos de alegria, podemos
que sabem aproveitar a vitalidade revelar mais facilmente os grandes
da alma animal podem realizar tesouros que estão profundamente
grandes coisas – talvez até mais do aninhados em nossa alma.
que aqueles que são principalmente
impulsionados pela alma Divina. O Por outro lado, uma vida sem
essencial é que se use a alma animal alegria é rasa e vazia. O ser humano
para causar impacto positivo pode ter tudo – pode possuir uma
no mundo, pois nada é mais 3. Uva - Alegria infinidade de bênçãos materiais e
destrutivo do que a vitalidade mal espirituais –, mas se não tiver alegria,
direcionada. As uvas são associadas com a não viverá toda a plenitude da vida.
alegria. Como está no Tanach, “… Tanto a alma Divina como a animal
A cevada, segunda das Shivat meu mosto, que alegra a D’us e aos contêm amplos reservatórios de
HaMinim, ensina que se homens...” ( Juízes 9:13). discernimento e sentimento, mas, na
direcionarmos adequadamente ausência de alegria, esse manancial
nossa alma animal, esta pode ser A alegria é um elemento nunca é expresso plenamente
um excelente aliado de nossa alma indispensável à vida. A Torá nos porque não há nada que os estimule.
Divina em ajudar-nos a executar ordena servir a D’us com alegria e A uva representa justamente o
nossa missão neste mundo. desaprova a tristeza e a depressão. elemento que libera esses potenciais,

17 DEZEMBRO 2017
nossas leis

adicionando-lhes cor, profundidade e com cada uma das criaturas Divinas


intensidade em tudo o que fazemos. – mesmo com o mal, que D’us
proibira.
4. Figo - Envolvimento
O figo do Jardim de Éden foi a
Uma vida plena, no entanto, não origem de todas as forças destrutivas
exige apenas alegria – mas também do mundo. Contudo, essa fruta
envolvimento. Podemos realizar também simboliza nossa capacidade
muitas coisas de forma séria e de envolvimento profundo e íntimo
competente, mas podemos não estar com nossos esforços positivos – um
envolvidos muito profundamente envolvimento que significa que nos
na tarefa que temos que realizar. preocupamos profundamente com
Envolvimento significa mais do tudo o que fazemos.
que executar algo com cuidado
e precisão; significa envolver-se 5. Romã - Ação
plenamente em algo com nossa
mente, coração e alma. Romãs simbolizam ação. Há
muitas ocasiões, na vida, em que o
imperativo nos dita simplesmente os vazios, entre os judeus, estão
realizar algo, sem sentir nem pensar, repletos de boas ações como a romã
mas agir. Por exemplo, a Torá nos está repleta de sementes”. Um dos
impõe cumprir seus mandamentos significados desse ensinamento é que
mesmo se os realizarmos sem mesmo quem é “vazio” – aquele que
conscientização, alegria ou possui pouco conhecimento e não
envolvimento. Nas palavras dos está ligado com sua alma Divina –,
Sábios: “O mais importante é a mesmo ele realiza uma enormidade
ação”. O Judaísmo está muito mais de boas ações. Trata-se de uma
preocupado com as ações de uma característica que redime a alma
pessoa do que com suas intenções. humana: a capacidade de erguer-se
É melhor ajudar pessoas carentes acima de si mesmo e fazer o que é
mesmo sem sentirmos compaixão certo mesmo quando não se tem
do que estar cobertos de piedade motivação para tal.
O figo simboliza esse envolvimento. pelos necessitados e nada fazer para
São várias as opiniões a respeito da socorrê-los. 6. Azeitona - Desafio
identificação do fruto proibido no
Jardim de Éden: uva, trigo (como Há um famoso ensinamento Um dos grandes mistérios da
vimos acima) e Etrog (uma das talmúdico que diz que “mesmo condição humana é que, em geral,
quatro espécies de Sucot). Mas há
também uma opinião que diz que o
fruto da Árvore do Conhecimento
do Bem e do Mal era o figo. Como
ensina a Cabalá, o conhecimento
requer um profundo envolvimento
– simbolizado pelo figo – com algo
ou com alguém. O pecado original
se originou na recusa do ser humano
em se reconciliar com o fato de que
há certas coisas com as quais não se
pode envolver. Adão e Eva comeram
do fruto proibido porque queriam se
igualar a D’us. Queriam se envolver

18
REVISTA MORASHÁ i 98

somos mais inovadores


e capazes quando nos deparamos
com limitações, pressões
e dificuldades. Damos o
melhor de nós quando
pressionados; quando nosso
“combustível” espiritual é
“espremido” de nós devido a
uma situação desafiadora ou
opressiva. A sexta qualidade da
alma é representada pela azeitona,
que, espremida, produz azeite de
oliva – fonte de sustento e de luz.
O fruto da oliveira representa a
capacidade humana de transformar
dificuldades em forças poderosas
para a realização e o crescimento
– física e espiritualmente.
consigo mesmo, com os seus Tu B’Shvat é um dia festivo que
7. Tâmara - semelhantes e com D’us. nos transmite muitas lições. Com
Tranquilidade as Sete Espécies da Terra de Israel
Apesar de azeitonas e tâmaras aprendemos que a vida é plena
Em contraste com a azeitona serem antíteses metafóricas, ambas quando o ser humano é guiado pela
temos a sétima fruta, a tâmara, podem existir dentro de todo ser transcendência de sua alma Divina
que simboliza nossa aptidão para humano. Mesmo em meio a nosso e impulsionado pela vitalidade de
a paz, tranquilidade e perfeição. É empenho mais ardente, podemos sua alma animal. As Sete Espécies
bem verdade que damos o melhor sempre encontrar conforto e força também nos ensinam que uma vida
de nós diante de um desafio, mas na perfeição que reside na essência plena requer alegria, envolvimento,
também é verdade que há muito de nossa alma. Ao mesmo tempo, vontade de agir, habilidade de
potencial em nossa alma que mesmo quando encontramos a paz vencer as dificuldades e capacidade
apenas emerge quando estamos em – interna e com o mundo –, sempre de encontrar tranquilidade dentro
paz – apenas quando atingimos o podemos encontrar um desafio que de si próprio e no mundo. Um dos
equilíbrio e a harmonia entre os nos impulsione a realizações ainda temas centrais de Tu B´Shvat é a
diferentes componentes de nossa maiores. comparação entre o homem e a
alma. “árvore do campo”. Assim como o
fruto é a maior conquista da árvore,
Está escrito no Livro dos Salmos D’us conclama os seres humanos
que “Os Tzadikim, os justos, a usar seus poderes e recursos
florescerão como a tamareira” espirituais para constantemente dar
(Salmos 92:13). O Zohar, obra frutos.
fundamental da Cabalá, explica
que há uma certa espécie de
tamareira que só dá frutos após
70 anos. A alma humana é Bibliografia:
composta de sete atributos básicos, The Seven Species and Seven Attributes, Rabbi
cada um deles, por sua vez, com Simon Jacobson, http://www.chabad.org/library/
article_cdo/aid/2776/jewish/The-Seven-Species-
10 subcategorias. Assim, o Tzadik -and-Seven-Attributes.htm/sc/em_share
que floresce após cumprir 70
anos é fruto de uma alma cujo Seven Fruits of the Soul, Rabbi Yanki Tauber
http://www.chabad.org/library/article_cdo/
caráter, em todas os seus aspectos, aid/408049/jewish/Seven-Fruits-of-the-Soul.
foi refinado e está em harmonia htm/sc/em_share

19 DEZEMBRO 2017
nossas festas

Os mandamentos
da Festa de Purim
Purim, celebrada no 14o dia do mês de Adar, é A DATA mais
alegre do ano judaico. Comemora a milagrosa salvação do
Povo Judeu na antiga Pérsia da trama de Haman para “destruir,
matar e aniquilar todos os judeus, jovens e idosos,
crianças e mulheres, em um único dia”.

S
ão quatro as mitzvot (mandamentos de ouvir a leitura da Meguilá duas vezes durante a festa:
Divinos) básicas associadas com a festa na noite e, novamente, no dia de Purim.
de Purim. Apesar de não ser um Yom Tov,
um dia sagrado – já que não há restrições O mandamento de ouvir a leitura da Meguilá se
como no Shabat ou nas festas bíblicas aplica a homens e mulheres. É preferível que seja feita
(Rosh Hashaná, Yom Kipur, Sucot, Pessach e Shavuot) na presença de um minyan. Como uma das razões
–, deve-se, se possível, tirar o dia de folga do trabalho para a leitura é divulgar os milagres celebrados nesse
para celebrar essa festividade alegre e, assim, poder dia, o fato de ser feita na sinagoga permite que o
cumprir seus mandamentos de forma adequada. mandamento seja cumprido da melhor forma.

É importante lembrar que no calendário judaico, Ouvir essa leitura é tão importante que tem
o novo dia começa ao pôr-do-sol. Purim, portanto, precedência sobre o cumprimento de todos os demais
que é uma festa de um só dia, se inicia ao anoitecer mandamentos positivos da Torá. Isso significa que
e termina no dia seguinte, com o cair da noite. mesmo quem estuda a Torá durante o dia todo, deve
Excetuando-se o mandamento de ouvir a leitura da interromper seus estudos para ouvir a Meguilá. A única
Meguilá, que deve ser lida à noite e novamente no dia mitzvá que não é suspensa para a leitura da Meguilá é o
de Purim, os outros três mandamentos da festa são enterro de uma pessoa que foi encontrada morta e não
realizados durante o dia. tem quem a enterre.

1º mandamento: Ouvir a leitura A leitura é feita a partir de um rolo de pergaminho


da Meguilá escrito à mão. Para cumprir o mandamento, é
necessário ouvir cada uma das palavras. O ideal é que
A Meguilat Esther, um dos livros do Tanach (Torá, todos os que estão na sinagoga tenham uma Meguilá
Profetas e Escritos Sagrados) conta-nos a história de manuscrita sobre pergaminho diante de si para poder
Purim. Como mencionamos acima, há o mandamento acompanhar a leitura. Desta forma, tem-se a certeza

20
REVISTA MORASHÁ i 98

o pergaminho de esther, Jacob Ben Bezalel, Frankfurt, alemanha, 1806/07

de que mesmo quem não conseguiu a “Solução Final para a Questão Outro tema importante em Purim é
ouvir uma ou outra palavra, poderá Judaica” de Haman se aplicava a sobrevivência física do Povo Judeu.
ler sozinho e, assim, cumprir o a cada um deles. E juntos, eles Se Chanucá celebra o triunfo do
mandamento. Quem não tiver uma enfrentaram essa ameaça à sua Judaísmo, Purim comemora eventos
Meguilá manuscrita, deverá ler de existência. Oraram e jejuaram juntos. bem mais dramáticos e extremos.
uma impressa. E juntos prevaleceram contra seus Haman não estava interessado em
inimigos. Assim, em Purim, todos os converter ou assimilar nosso povo,
2º mandamento: Dar judeus celebram juntos. Se Haman, o como os sírio-gregos. Ele queria
presentes aos carentes Hitler da Antiguidade, nos ensinou realizar o que seu “filho espiritual”
(Matanot LaEvyonim) algo, esse algo foi que, apesar de quase conseguiu, dois milênios
nossas diferenças e discórdias – mais tarde: extirpar todos os judeus
Um dos temas primordiais de nosso grau de observância religiosa, da face da Terra. Assim sendo,
Purim é a união do Povo Judeu. nossas tendências políticas, se enquanto Chanucá celebra uma
O notório antissemita Haman, somos sefaraditas ou asquenazitas, vitória militar em guerra travada por
primeiro-ministro do rei persa se vivemos em Israel ou na razões espirituais, Purim comemora
Achashverosh, tentou matar todos Diáspora –, nós, judeus, somos um a existência física do Povo Judeu.
os judeus, sem exceção – homens, povo indivisível. Nossos inimigos
mulheres e crianças. Não fazia – antigos e atuais – não fazem Como Purim comemora a
distinção entre os judeus; para ele, distinção entre nós. Às vezes, sobrevivência física do Povo Judeu,
todos eram iguais – e cada um deles como nesse caso, até a maldade celebramos essa festa contribuindo
tinha que ser exterminado. Pouco personificada tem algo a nos ensinar para o bem-estar físico dos demais
lhe importava se eram religiosos, – ou seja, que não há distinção judeus, em especial, dos mais
eruditos, bem-sucedidos – ou real entre os judeus, pois todos os necessitados. O mandamento da
não. Como todos eles viviam sob Filhos de Israel constituem um só Tzedacá, a mitzvá mais importante
o domínio do Rei Achashverosh, organismo. da Torá, se aplica a todos os dias do

21 DEZEMBRO 2017
nossas festas

ano nos quais a Torá nos permite Os Matanot LaEvyonim não devem alimentos devem ser prontos para
usar dinheiro. O judaísmo nos ser dados antes de Purim, para que o consumo, como biscoitos, frutas,
ordena ser generosos e empenhar- quem os recebe não os utilizem doces, vinho ou outras bebidas.
nos em ajudar os demais ao nosso antes da festa – pois nesse caso, É importante observar que esse
máximo – a judeus e não judeus. o doador não teria cumprido o mandamento não pode ser cumprido
Mas em Purim, o mandamento da mandamento. com dinheiro ou outro tipo de
Tzedacá é especialmente enfatizado; presentes. É louvável enviar os
temos que ser generosos com todos Quem não deparar com pessoas Mishloach Manot ao máximo de
os que buscam ajuda. carentes em Purim, deve doar amigos possível. E mais, é adequado
o dinheiro a uma sinagoga que que sejam substanciais ao ponto de
Um dos quatro mandamentos dessa esteja arrecadando fundos com denotar respeito. Portanto, devemos
festa é dar Matanot LaEvyonim, esse propósito. É necessário que atentar para não enviar um presente
literalmente, “presentes aos carentes”. o dinheiro dado em Purim seja de alimentos qualquer para que não
Devemos dar Tzedacá a duas pessoas destinado aos necessitados: não seja insulto a quem o recebe.
necessitadas, no mínimo. Isso pode pode ser usado para nenhum outro
ser cumprido por meio de qualquer propósito, por mais nobre ou sagrada É importante ressaltar que ao
tipo de presente: dinheiro, alimento, que seja a finalidade. cumprirmos os mandamentos de
bebida ou roupa. O ideal é que seja Purim, devemos ser mais generosos
um presente substancial. Em Purim, doamos dinheiro a quem nos presentes para os carentes do
Os Matanot LaEvyonim devem ser o pede: não fazemos perguntas nem que nos presentes de alimentos
dados durante o dia de Purim e, de procuramos saber se quem pede a para os amigos. Devemos priorizar
preferência, na parte da manhã, para Tzedacá realmente a necessita ou não. os Matanot LaEvyonim ao alocar
que quem os recebe possa usufruí-los a verba que iremos gastar no
durante a festa. A quantia dada deve O mandamento de Matanot cumprimento dessas mitzvot.
ser suficiente para que comprem LaEvyonim é dever de todos os É muito mais importante ser
alimento e bebida, dessa forma judeus – homens, mulheres e até generoso com os necessitados do que
possibilitando que tenham uma crianças. enviar Mishloach Manot elegantes e
refeição festiva nesse dia. Contudo, caros aos amigos.
quem recebe o presente não é 3º mandamento:
obrigado a gastar o dinheiro em Enviar presentes de O mandamento de Mishloach Manot
Purim: pode usá-lo em outra data e alimentos para amigos deve ser cumprido durante o dia
da forma que quiser. (Mishloach Manot) de Purim, não na noite da festa. Os
homens enviam Mishloach Manot
Como explicamos acima, Purim a homens; as mulheres, a mulheres.
celebra a unidade judaica e a É preferível que os presentes de
sobrevivência física do Povo alimentos sejam entregues por um
Judeu. Por isso, os mandamentos terceiro – e não diretamente. Apesar
relativos à festa enfatizam e buscam de haver uma regra geral na Torá de
promover a amizade e o senso de que é preferível cumprir a mitzvá
comunidade. Uma das formas de em pessoa a delegá-la a um terceiro,
o fazer é cumprir o mandamento esse mandamento é diferente,
de Mishloach Manot: o envio de pois a expressão Mishloach Manot
presentes de alimentos a amigos e usada na Meguilat Esther implica
conhecidos. que essa mitzvá em particular é
mais adequadamente cumprida
Essa mitzvá é cumprida mediante se realizada por meio de um
o envio de um presente contendo, intermediário. (Mishloach significa
no mínimo, dois tipos diferentes de envio). No entanto, se a pessoa
alimentos prontos ou bebidas a, pelo entregar seus presentes de alimentos
menos, um amigo ou conhecido. pessoalmente, terá cumprido
Para cumprir essa obrigação, os plenamente o mandamento.

22
REVISTA MORASHÁ i 98

4º mandamento:
Refeição festiva no dia
de Purim (Seudat Purim)

Um dos mandamentos da festa é


fazer uma refeição festiva – uma
Seudat Purim. Isso celebra o fato
de que na história de Purim,
a queda de Haman ocorreu durante
um banquete organizado pela
Rainha Esther. Essa refeição deve
ocorrer durante o dia; aquele que
realiza uma Seudat Purim durante
a noite da festa não cumpriu o
mandamento. No entanto, após
ouvir a leitura noturna da Meguilá,
deve-se também festejar e fazer
uma refeição mais elaborada que de “A Festa de Purim”, cartão postal reproduzindo pintura de Moritz Daniel Oppenheim,
costume. Alemanha, 1910-1920.

É importante observar que como Deve-se comer carne e tomar vinho Torá antes de se iniciar a Seudat
Purim não é um Yom Tov, não se na Seudat Purim. Também é costume Purim. O Zohar, obra fundamental
recita o Kidush nessa festividade. comer legumes, comemorando o da Cabalá, revela que ao se realizar
Contudo, antes de iniciar a Seudat fato de que a Rainha Esther comia um banquete em Purim, pode-
Purim, deve-se lavar as mãos com a legumes e verduras enquanto vivia se conseguir a mesma elevação
bênção de Netilat Yadayim e comer no palácio real, pois se recusava a espiritual que se consegue ao jejuar
pão. Após a refeição, recita-se o comer a comida não casher servida em Yom Kipur.
Birkat Hamazon (Oração após as no palácio.
Refeições), incluindo-se a passagem Nossos Sábios ordenaram-nos servir
de Ve’Al Hanissim – que menciona o Deve-se notar que a refeição festiva vinho nesse banquete pelo fato de o
milagre de Purim. de Purim é outro mandamento que milagre de Purim ser intimamente
enfatiza o plano físico: essa mitzvá ligado ao vinho. A queda da Rainha
A Seudat Purim deve começar antes é cumprida com alimento e bebida. Vashti, mulher de Achashverosh,
do pôr-do-sol. Merece louvores O mandamento de Seudat Purim ocorreu em um banquete de vinhos –
quem convida amigos para seu enfatiza, novamente, o tema geral e foi a oportunidade para que Esther
banquete. Se Purim cai numa 6a da festa – a sobrevivência física e o tomasse seu lugar ao lado do Rei e
feira, a refeição festiva é realizada bem-estar material do Povo Judeu. salvasse nosso povo do genocídio.
mais cedo e tem que estar concluída Além disso, também a derrota de
bem antes do Shabat para que se É importante enfatizar, contudo, que Haman se deu em meio a uma festa
possa desfrutar da refeição do dia apesar de que a refeição de Purim de vinho organizada pela Rainha
sagrado com prazer; contudo, há deve ser alegre, o mandamento não Esther.
quem tenha o costume de fazer deve ser cumprido frivolamente. Não
a refeição de Purim bem mais se trata de uma refeição desregrada e, Nossos Sábios também ordenaram
tarde na 6a feira, estendendo-a até muito menos, uma bacanal romana. que, em Purim, devemos beber vinho
a chegada do Shabat: coloca-se, Ainda que seja um mandamento até nos embriagarmos. Ensinaram
então, a toalha própria na mesa, cumprido por meio de comida e que é louvável beber até não se poder
recita-se o Kidush de Shabat e bebida, essa refeição festiva tem um diferenciar entre “que Haman seja
segue-se com a refeição – que passa, enorme significado espiritual, pois amaldiçoado” e “que Mordechai seja
então, a ser duplamente festiva, eleva a alma enquanto satisfaz o abençoado”. No entanto, se a saúde
tanto em honra de Shabat quanto corpo. Na verdade, é recomendado da pessoa for prejudicada com esse
de Purim. que se realize algum estudo de excesso, ou se ela temer que bebendo

23 DEZEMBRO 2017
nossas festas

demais seja levada a agir de forma ocorrida em Purim e agradece a D’us prêmios para as crianças. Além de
irresponsável ou desagradável, ou a pelos “milagres de redenção, atos acrescentar alegria ao dia e despertar
negligenciar as bênçãos e orações, poderosos, de salvação e de milagres” a curiosidade das crianças, o costume
ela não deve beber demais. Há quem que Ele realizou em prol de nossos de se fantasiar reflete um dos
não deva beber de forma alguma. antepassados, salvando-os do plano principais temas de Purim: o fato de
Estes devem tirar um cochilo de Haman de exterminá-los. que D’us está sempre presente no
durante o dia, pois aquele que está mundo e em nossa vida pessoal, mas
adormecido não sabe diferenciar Durante as orações matinais do que Ele geralmente “Se disfarça”. Na
entre “que Haman seja amaldiçoado” dia de Purim, lê-se uma porção maioria das vezes, D’us age em total
e “que Mordechai seja abençoado”. especial da Torá (Êxodo 17:8-16), segredo. Como ensina o Talmud – e
que descreve a batalha de Yehoshua como rezamos na oração da Amidá,
Ainda que seja louvável realizar contra Amalek – o povo ancestral de três vezes ao dia –, D’us está sempre
uma Seudat Purim elaborada e Haman e inimigo mortal do Povo operando milagres – à noite, de
farta, é preferível ser generoso Judeu –, ocorrida quase mil anos manhã e à tarde. Se a maioria de nós
com os necessitados do que gastar antes dos eventos de Purim. não os percebe, é porque eles vêm
demais em um rico banquete de disfarçados em “eventos naturais”.
Purim. Como explicamos acima, O uso de fantasias
o mandamento de Matanot Costumes antes
LaEvyonim – presentes aos Em Purim, é costume que as crianças e depois de Purim:
carentes – supera a mitzvá de – e até mesmo alguns adultos –
Mishloach Manot. Supera, também, usem fantasias. A tradição é alusiva Leitura de Zachor,
o mandamento de Seudat Purim. aos milagres Divinos ocultos que na Torá
Evidentemente, é necessário cumprir salvaram nosso povo do nefasto
todos os quatro mandamentos objetivo de Haman. A Meguilat Na manhã do Shabat que antecede
de Purim. Contudo, a maioria Esther é o único livro do Tanach que Purim, após a leitura da porção da
dos gastos com a festa deve ser não faz menção a D’us – nem uma Torá da semana, lê-se uma passagem
direcionada aos presentes para os vez sequer. A razão para essa omissão especial chamada Zachor (“Lembra-
necessitados, como vimos. A razão é que na história de Purim, D’us te”). Ouvir a leitura dessa passagem
para isso é que, como dissemos “usou um disfarce”: Ele Se ocultou é um mandamento bíblico. Nela,
acima, não há mandamento mais e agiu sigilosamente. Ao orquestrar D’us ordena a todo o Povo Judeu
importante no Judaísmo do que a uma série de eventos naturais – uma se lembrar dos feitos da nação de
Tzedacá. E também, como ensinam série incrível de coincidências –, Ele Amalek – os ancestrais de Haman,
nossos Sábios, não há alegria maior salvou o Povo Judeu. cujo objetivo é aniquilar os Filhos de
ou ato mais digno do que alegrar o Israel.
coração do necessitado, do órfão e Em Purim, muitas sinagogas
da viúva. Escreveu Maimônides, que organizam uma festa à fantasia, com A porção de Zachor nos recorda
quem alegra o coração deles pode que Amalek e seus descendentes –
ser comparado à Shechiná, a Presença Haman e Hitler, entre muitos outros
Divina, como diz o versículo: “(D’us) vilões – são os inimigos jurados
reanima o espírito dos oprimidos e do Povo Judeu, da Humanidade
restaura o coração dos humilhados” e até de D’us. Amalek personifica
(Rambam, Hilchot Meguilá 2). todas as formas de escuridão e
mal que há no mundo. Esse povo
Orações especiais assume diversas formas – físicas e
para a festa de Purim espirituais – e há um mandamento
na Torá para erradicá-lo da face da
A passagem Ve’Al Hanissim é Terra. Todos os anos, no Shabat que
recitada nas orações da Amidá precede a festa de Purim, ouvimos a
e no Birkat HaMazon (Oração porção de Zachor porque nosso povo
após as Refeições). O trecho de precisa lembrar que homens como
Ve’Al Hanissim descreve a salvação Haman e Hitler jamais poderão

24
REVISTA MORASHÁ i 98

ser desculpados como lunáticos frustrar os planos de Haman. às moedas de prata que Haman
que guardavam no coração um Para celebrar esse jejum de três dias, deu ao Rei Achashverosh em troca
ódio irracional contra os Filhos que foi instrumental para a salvação da permissão de aniquilar todos os
de Israel. Esses filhos de Amalek de nosso povo, jejuamos no dia que judeus. Além disso, o Talmud ensina
sabiam exatamente o que faziam antecede Purim. Taanit Esther (o que a Tzedacá nos salva de todo o
quando tentaram exterminar o Povo Jejum de Esther) se inicia cerca de mal, mesmo da morte. Assim como
Judeu. Seu propósito era extirpar o uma hora antes do nascer do sol e os meio-shekels pouparam os judeus
Povo Eleito por D’us para poderem dura até a noite. É costume quebrar da destruição na história de Purim,
estabelecer o reino da escuridão no o jejum após ouvir a leitura noturna nós também fazemos Tzedacá na
mundo. O maior inimigo de Amalek da Meguilá. tarde do Jejum de Esther como fonte
é o Povo de Israel – o Povo da Luz de proteção e bênção.
(Isaías 60:3). A porção de Zachor As “meias moedas”
recorda a nosso povo que uma de (Machatzit HaShekel) Shushan Purim
nossas missões é combater e vencer
Amalek – total e definitivamente. Na tarde do Jejum de Esther, ou Em Jerusalém, Purim é celebrado no
Somente quando isso acontecer, a antes da leitura da Meguilá na dia 15 de Adar – e não 14 de Adar.
paz reinará no mundo. noite de Purim, há uma tradição de O dia 15 é chamado de Shushan
doar certa quantia à sinagoga para Purim. Fora de Jerusalém, inclusive
Jejum de Esther celebrar o meio-shekel que todos os na Diáspora, a data de 15 de Adar
judeus contribuíam como sua parte não é Purim – não se podendo
Quando a heroína da festa, a Rainha nas oferendas comunitárias na época cumprir as mitzvot da festa nesse
Esther, foi informada sobre o decreto do Templo Sagrado de Jerusalém. dia. Contudo, Shushan Purim é um
genocida de Haman, ela pediu ao seu Qual a conexão entre o donativo de dia de alegria e celebração para todos
tio Mordechai, líder do Povo Judeu, meio-shekel ao Templo Sagrado e os judeus, tanto em Israel como na
que ordenasse aos judeus jejuarem Purim? Diáspora.
por três dias. Ela própria jejuaria,
bem como Mordechai. O propósito Ensina o Talmud que “D’us manda a
do jejum era ganhar o favor do Todo cura antes da enfermidade”. O meio-
Bibliografia
Poderoso, Rei dos Reis, para que ela, shekel que cada judeu contribuía http://www.chabad.org/holidays/Purim/
Esther, conseguisse influenciar seu como seu quinhão para as oferendas article_cdo/aid/1362/jewish/Purim-
esposo, rei terreno poderoso, para comunitárias serviu como antídoto -How-To-Guide.htm

25 DEZEMBRO 2017
HISTÓRIA DE ISRAEL

70 ANOS DA PARTILHA
POR Zevi Ghivelder

O dia 29 de novembro de 1947 ascendeu à condição de data


histórica por registrar a decisão da Assembleia Geral das
Nações Unidas que adotou a resolução de dividir a antiga
Palestina em dois estados, um árabe, outro judeu. Agora está
sendo celebrado o 70º aniversário desta partilha que se
desdobrou em um sucesso e um fracasso

O
sucesso corresponde à efetiva criação de linhas telefônicas e bloqueando estradas, além de
Israel, no ano seguinte, e que em sete incendiarem propriedades e plantações do ishuv
décadas alcançou êxitos surpreendentes (judeus residentes na Palestina) e atacarem os ingleses
em todos os campos da atividade com operações de guerrilhas.
humana na moldura de um estado
democrático de direito. O fracasso diz respeito à A chefia da comissão foi confiada ao lorde William
recusa dos árabes em aceitar os termos da partilha, Peel, 69 anos, destacado político e empresário inglês.
tendo deixado de estabelecer sua própria nação no A chamada Comissão Peel chegou à Palestina em
território que lhes competiria, preferindo submeter-se novembro, tendo os árabes desde logo anunciado
à soberania do rei Abdullah, da então Transjordânia, que boicotariam todas as suas ações. Os líderes do
atual Jordânia. ishuv perceberam que seu futuro estava ameaçado
e preparam para apresentar à Comissão Peel um
Entretanto, é importante assinalar que sobre o memorando com 228 páginas e cinco apêndices, no
atual 70o aniversário avulta outro, de 80 anos, qual esmiuçaram a história da Palestina e seu vínculo
igualmente relevante, que foi a semente do conceito ancestral com o povo judeu, as implicações legais e
da implantação de dois estados na antiga Palestina. territoriais que levaram à atribuição do mandato ao
Trata-se da Comissão Peel, constituída em maio de Império Britânico e os progressos materiais e agrícolas
1936 pelos mandatários britânicos, com a finalidade alcançados pelos colonos judeus nos últimos vinte
de resolver os dramáticos problemas então existentes anos, ou seja, desde a Declaração Balfour. (Trata-se de
naquela região. Sete anos antes, uma rebelião árabe um documento emitido por Lord Balfour, membro do
havia massacrado judeus em Jerusalém, Hebron, gabinete inglês, em novembro de 1917, afirmando que
Safed e outras cidades, resultando em mais de uma o governo de Sua Majestade era favorável à criação de
centena de mortos e mais de 300 feridos. No mesmo um lar nacional judaico na Palestina). A argumentação
ano de 1936, os árabes promoveram uma greve geral do ishuv enfatizava que há três anos os nazistas
no território sob mandato, sabotando ferrovias, estavam no poder na Alemanha e, portanto, eram

26
REVISTA MORASHÁ i 98

VOTAÇÃO DA ONU EM 29 DE NOVEMBRO DE 1947

graves as ameaças que pairavam o recinto em Londres lotado e mais novos depoimentos, os membros
sobre os judeus. milhares de pessoas fazendo vigília da Comissão Peel começaram a
em torno do prédio. Weizmann concluir que a solução mais plausível
Entre novembro de 1936 e fevereiro também falou em Londres, a portas seria a partilha da Palestina em dois
de 1937, Chaim Weizmann, David fechadas, advertindo aos ingleses que estados. Chamaram Weizmann
Ben Gurion e Zeev Jabotinsky, eles se arrependeriam das concessões informalmente para ouvir sua
líderes proeminentes do movimento que estavam sendo estendidas ao opinião e este disse: “Não estou
sionista, prestaram depoimentos Mufti de Jerusalém, um declarado autorizado a falar em caráter oficial.
perante a Comissão Peel. Uma aliado do regime nazista. Mas acho que é uma boa ideia e que
leitura atual de suas palavras deve ser levada adiante”. Em março,
demonstra que o sionismo jamais foi Por causa das repercussões o parlamentar Winston Churchill
apresentado e defendido com tanto internacionais alcançadas por esses compareceu perante a Comissão e
fervor e precisão desde a atuação depoimentos, os árabes decidiram se opôs à partilha, argumentando
de Theodor Herzl no Primeiro suspender o boicote à Comissão que tal divisão daria origem a uma
Congresso Mundial Sionista, Peel e o próprio Mufti testemunhou: guerra na qual os judeus da Palestina
quarenta anos antes. De todos, Ben “Tanto o mandato quanto a seriam exterminados em face da
Gurion foi o mais assertivo: “Nossos Declaração Balfour são inválidos abissal diferença numérica existente
direitos na Palestina não decorrem porque resultaram de pressões entre os dois lados. Em junho, Sir
do mandato, nem da Declaração exercidas pelos judeus que querem Archibald Sinclair, líder do Partido
Balfour. Nossos direitos estão no reconstruir o Templo de Salomão Conservador da Inglaterra, ofereceu
mandato da Bíblia que nós mesmos em nossas sagradas propriedades. um jantar a Chaim Weizmann
escrevemos em nosso idioma, A Palestina está plenamente ao qual compareceram Churchill,
aqui nesta terra”. O depoimento ocupada e não tem como acolher o líder sionista britânico James
de Jabotinsky foi em fevereiro de dois povos”. Nos meses seguintes, de Rothschild e outros ilustres
1937, na Câmara dos Lordes, com à medida em que eram colhidos políticos. Quando Weizmann se

27 dezembro 2017
HISTÓRIA DE ISRAEL

foram contrários. Nos Estados


Unidos, o célebre magistrado Louis
Brandeis manifestou-se contra
aquela proposta de partilha e o fez
por escrito numa carta endereçada
a Felix Frankfurter, outro famoso
magistrado americano. Desgostoso,
Weizmann escreveu em seu diário:
“O terrorismo árabe acaba de
conquistar uma grande vitória”. No
20o Congresso Mundial Sionista,
reunido em Zurique poucas
semanas depois da divulgação do
relatório, Chaim Weizmann pediu
aos 484 delegados que aprovassem
COMISSÃO PEEL
a partilha tal como fora sugerida
porque “trata-se de uma proposta
revolucionária que abre caminho
referiu à ideia da partilha, ainda dos árabes contra outros árabes que para o nosso objetivo”. Ben Gurion
em gestação, Churchill foi incisivo: não se submetiam às determinações também aprovou: “Por menor que
“Isso não passa de uma miragem. sectárias do Mufti. seja o estado, de uma forma ou
Vocês, judeus, têm que perseverar, de outra ele poderá ser expandido
perseverar e esperar!” Mais adiante o documento diz no futuro”. Depois de acalorados
que o nacionalismo árabe, em vez debates, o plano da Comissão Peel
No dia 7 de julho de 1937, o de emanar de fatores positivos, só foi aprovado por 300 votos contra
gabinete britânico divulgou o tinha como meta incentivar o ódio 158 e 26 abstenções. Por seu turno,
relatório da Comissão Peel, com 435 aos judeus. Mesmo assim, foram os árabes rejeitaram a totalidade do
páginas. O documento assinalou a acolhidos os nacionalismos de relatório e afirmaram que jamais
conexão judaica com a Palestina ao ambas as partes como movimentos reconheceriam um território judaico
longo de três mil anos, as vantagens legítimos e, por fim, a Comissão Peel na Palestina por menor que fosse.
obtidas pelos árabes por conta do sugeriu uma tragicômica divisão da A violência árabe prosseguiu até
fluxo do capital judaico investido Palestina: os judeus ficariam com 1939, quando os ingleses emitiram
na Palestina, pelo aumento da 13% do território e os árabes com o infame White Paper que além de
população árabe nas áreas urbanas 80%, cabendo o pouco restante proibir a imigração de judeus para a
desenvolvidas pelos judeus, pelos ao Império Britânico, incluindo Palestina também anulou o relatório
novos hospitais e clínicas que Belém e Jerusalém. A Comissão da Comissão Peel. Mas, a semente
atendiam tanto a judeus quanto sugeriu, ainda, que os árabes da solução por dois estados estava
a árabes, além de destacar que a locais se incorporassem à então plantada e viria a frutificar dez anos
ação dos judeus contra a malária Transjordânia. depois de sua concepção.
beneficiava a todos na Palestina, sem O relatório acirrou ânimos entre os A Segunda Guerra Mundial, de
distinção. O documento ressaltou judeus, entre os árabes e também 1939 a 1945, provocou um hiato
que no decorrer dos últimos vinte entre os ingleses, chegando a nas aspirações sionistas e o ishuv
anos os árabes não tinham se atravessar o Atlântico. Lloyd George, participou do conflito com a criação
afastado sequer uma polegada de chanceler à época da Declaração da Brigada Judaica que lutou
sua forma contrária e irredutível Balfour, disse que adotar a proposta incorporada às forças britânicas.
ao abordar a Declaração Balfour divisão seria a “afirmação do fracasso Finda a guerra, do ponto de vista
e o mandato britânico. Em outro da nossa política externa”. britânico, a situação na Palestina
trecho, o relatório afirmou que o se tornara insustentável. No mar,
maior problema não eram os ataques Dezenas de parlamentares, mesmo os ingleses faziam de tudo para
dos árabes contra os judeus, nem os simpáticos ao sionismo, tendo à interceptar os navios da Haganá
contra os ingleses, mas os ataques frente Winston Churchill, também (exército clandestino judeu), que

28
REVISTA MORASHÁ i 98

traziam imigrantes ilegais para a tinha à frente Moshe Sharett (futuro que se deparou com um ambiente
Terra Santa, e muitas vezes não chanceler e primeiro-ministro imerso em rancor, a ponto de Bevin
eram bem sucedidos. Em terra, de Israel) e seu braço direito, o ter-se recusado a receber Weizmann,
enfrentavam as ações da Irgun, economista David Horowitz. Ambos o que era uma absurda quebra no
organização também clandestina decidiram que a Agência Judaica comportamento tradicional da
comandada por Menachem Begin, deveria ter dois observadores junto chancelaria britânica. Além disso,
que atacava e sabotava sem cessar à Unscop. Levaram este pleito à membros da Câmara dos Comuns se
grande número de alvos militares ONU, que o aceitou. Horowitz mostraram céticos quanto à missão
britânicos, incluindo, com grande seria um deles. Àquela altura, da Unscop, tendo um deles afirmado
audácia, seu quartel-general no hotel encontrava-se em missão em que o problema da Palestina só seria
King David, em Jerusalém. Amsterdã um jovem de 32 anos de resolvido com guerra e não com um
idade, militante da Agência Judaica relatório. A propósito, num trecho
No dia 27 de janeiro de 1947, teve em Londres, nascido na África do muito significativo da autobiografia,
início uma série de reuniões em Sul, chamado Audrey Sacks, que se Eban escreve: “Um dos momentos
Londres, com uma delegação árabe tornaria uma celebridade mundial mais sensíveis da minha vida pública
e outra judaica, separadamente. e seria consagrado chanceler de aconteceu quando eu, Horowitz
Após dez dias de conversações, os Israel com o nome de Abba Eban. e John Kimche (historiador e
ingleses apresentaram às partes a Chamado por Sharett para ir a jornalista judeu de nacionalidade
possibilidade de uma prorrogação Nova York e integrar-se como o suíça), fomos ao encontro do
de quatro anos do mandato na segundo observador na Unscop, diplomata egípcio Azzam Pasha,
Palestina, seguido de independência ele conta em sua autobiografia que secretário-geral da Liga Árabe, no
para ambas as partes, caso chegassem voltou a Londres e correu para a hotel Savoy, em Londres.  Horowitz
a um posterior entendimento e livraria Foyle’s onde comprou tudo foi o primeiro a falar. Disse que a
permissão para uma entrada limitada que havia sido publicado até então presença dos judeus no Oriente
de judeus. Não houve acordo e em sobre as Nações Unidas e sobretudo Médio era um fato consumado
abril de 1947, o chanceler Ernest sobre os seus procedimentos e que, mais cedo ou mais tarde,
Bevin, ferrenho adversário do internos: “Foi a minha entrada na os árabes teriam que aceitar essa
sionismo, que já havia remetido arena internacional”. Pouco adiante realidade. Em seguida, apresentou
para o âmbito das Nações Unidas acrescentou: “Como pressenti que o um plano de acordo político, de
o problema da Palestina, decidiu trabalho a partir dos Estados Unidos garantias mútuas de segurança e
jogar mais uma cartada. Propôs a seria longo, levei comigo, por minha de cooperação econômica. Azzam
criação de uma Comissão Especial conta, minha mulher Suzy”. Em Pasha respondeu que o mundo árabe
das Nações Unidas Para a Palestina, Londres, antes de partir, Eban narra não estava propenso a nenhum
a United Nations Special Committee
on Palestine, ou seja, a sigla Unscop
em inglês, que, a partir de junho,
percorreria a região e apresentaria
novas recomendações para a solução
da questão entre árabes e judeus.
Bevin julgava que poderia manipular
o comitê em favor dos árabes e de
seus próprios interesses.

A criação da Unscop agitou a


delegação da Agência Judaica (órgão
representativo do ishuv), que se
encontrava nos Estados Unidos para
acompanhar os trabalhos da ONU,
instalada num grande rinque de
patinação em Flushing Meadows,
perto de Nova York. A delegação sessões da unscop em jerusalém

29 dezembro 2017
HISTÓRIA DE ISRAEL

entendimento, acrescentando que John D.L. Wood representava a britânico, onde por controle remoto
o plano de Horowitz era lógico e Austrália e assim Eban se refere na de Bevin, o Comitê foi tratado
racional, mas que os destinos das autobiografia aos três indicados da com uma descortesia que beirou à
nações não eram determinados por América Latina: “Salazar, do Peru, hostilidade.
lógicas racionais. E enfatizou que era um estereótipo de embaixador
nações não concedem, lutam. Disse de cinema, cabelos brancos, Dos dias 18 de junho a 3 de julho a
que talvez os judeus poderíamos taciturno, austero e dono de um ar Unscop percorreu Jerusalém, Haifa,
conseguir algo, mas que isso só de mistério decerto adquirido no o Mar Morto, Hebron, Beersheva,
daria através da força das armas, Vaticano, aonde servira. O dinâmico Gaza, Jaffa, a Galiléia, Acre, Nablus,
razão pela qual os árabes tentariam e loquaz Rodriguez Fabregat era Tel Aviv, Tulkarm e Rehovot, além
nos derrotar e porque qualquer do Uruguai e García Granados, da de visitar dezenas de kibutzim
acordo só seria aceitável segundo Guatemala, tinha experiência com (colônias agrícolas coletivas). As
os termos da Liga Árabe”. Em os britânicos no que se referia ao audiências públicas da Unscop,
seguida, conforme Eban escreve, conflito de seu país a respeito do constantes de depoimentos de
Pasha foi dura e francamente território de Belize”. O nomeado judeus e árabes, aconteceram de 4 a
explícito: “O mundo árabe vê da Checoslováquia foi Karl Lisicky, 17 de julho, tendo a Agência Judaica
os judeus como invasores e está incerto quanto ao futuro de seu país, apresentado um inacreditável total
pronto para lutar contra vocês”. prestes a ser dominado pela União de 32 toneladas de documentos. As
Depois de duas horas de conversa, Soviética. Da Iugoslávia incorporou- oitivas foram tão extensas que até
Kimche, Horowitz e Eban se Vladimir Simic, diplomata mesmo o Partido Comunista da
chegaram à rua atônitos. Eles não veterano. O mundo islâmico se fez Palestina teve espaço para manifestar
haviam percebido nenhum sinal representar pelo indiano Sir Abdul sua posição contra o sionismo.
de ódio nas palavras de Azzam Rahman, que, segundo a descrição
Pasha que, inclusive, se referira de Eban, “era 120% britânico no No dia 19 de julho, parte dos
aos judeus como primos. O que sotaque e nos maneirismos” e o membros da Unscop se deslocou até
lhes aterrorizou foi a impassível persa Nazrollah Entezam, diplomata o porto de Haifa, aonde estava em
postura árabe no sentido de ignorar de primeira categoria. A Unscop curso o drama do navio Exodus, cujos
a lógica, até mesmo a lógica do foi oficialmente confirmada pelas 4.554 passageiros, sobreviventes do
rancor, dando lugar a um cego Nações Unidas no dia 15 de maio Holocausto, fizeram uma greve de
fatalismo. de 1947 e desembarcou na Palestina fome que emocionou o mundo, mas
um mês depois. Abba Eban descreve mesmo assim foram impedidos pelos
Chegando em Nova York, Eban uma escala em Malta, protetorado ingleses de pisar o solo da Terra
juntou-se a Horowitz e os dois Santa e deportados à força de volta
se dedicaram a analisar os onze para a Europa. Os componentes
nomes internacionais indicados do Comitê ficaram horrorizados
para a constituição da Unscop. com o macabro espetáculo que
Chegaram à conclusão de que, com presenciaram e ficaram ainda mais
poucas exceções, não eram homens sensibilizados quando ouviram o
públicos ou diplomatas de primeira testemunho do reverendo cristão
grandeza. O presidente do Comitê John Stanley, que estivera a bordo
era o sueco Emil Sandstrom, juiz do Exodus e implorou à Unscop que
da Suprema Corte de Estocolmo decidisse em favor dos judeus. Anos
em fim de carreira, mas uma mais tarde, Golda Meir declarou que
pessoa conhecida por suas posições a intervenção de Stanley tinha sido
humanitárias. Nicholas Blum, da crucial para a criação do Estado de
Holanda, tinha sido governador Israel.
das Índias Orientais, atual
Indonésia. Uma figura central era o Depois da Palestina, a Unscop foi
juiz da Suprema Corte canadense para o Líbano, onde foi recebida
Ivan Rand, magistrado probo pelo primeiro-ministro Riad al-
e independente. O diplomata “Exodus” chega a haifa, julho 1947 Sohld e pelo chanceler Hamid

30
REVISTA MORASHÁ i 98

Franjieh, e manteve prolongada


conferência com representantes da
Liga Árabe e breve encontro com
maronitas cristãos favoráveis ao
sionismo. Em seguida, parte dos
componentes do Comitê rumou
para a Transjordânia com audiência
marcada com o rei Abdullah. O
monarca declarou que via com muita
dificuldade a aceitação por parte dos
árabes do estabelecimento de um
estado judeu na Palestina, mas que
ele mesmo não era completamente
contrário a tal hipótese e que se a
mesma se concretizasse, os palestinos
deveriam fazer parte de seu reino.
David Ben Gurion e Moshe Sharett, Jerusalém, 1947

O passo seguinte da Unscop, no


dia 26 de julho, foi na direção de
Genebra, de onde saiu um sub- 1 milhão e 200 mil árabes e 570 mil
comitê para percorrer as zonas da judeus, cabendo às Nações Unidas
Alemanha e da Áustria ocupadas a tutela de Jerusalém.O futuro
pelos britânicos e entrevistar Estado Judeu ficaria com 55% do
centenas de sobreviventes judeus, território e 58% do total de seus
mantidos em campos de refugiados. habitantes. O Estado Árabe, com
Mais de 90 por cento responderam 45% da área e 99% dos habitantes.
que queriam emigrar para a A decisão final sobre a partilha
Palestina. Nas semanas seguintes, a caberia à Assembleia Geral.
Unscop deu início à tarefa de redigir
seu relatório final que constou Abba Eban escreveu em sua
de dez recomendações, sendo a autobiografia: “Nós tínhamos
primeira o fim do mandato britânico bons aliados. O presidente da
da Palestina e outras disposições de Assembleia, Oswaldo Aranha,
natureza econômica, além de dispor do Brasil, estava religiosamente
claramente que o território deveria devotado ao conceito da existência
ser partilhado entre árabes e judeus, de um estado judaico. Ao seu lado
conforme o estipulado e de acordo “O presidente estava a sólida e rotunda figura
com um mapa anexado. A cerimônia do secretário-geral, Trygve Lie,
da Assembleia,
de assinaturas do documento, que tinha um interesse duplo
em ordem alfabética, pelos onze Oswaldo Aranha, em nosso sucesso: era necessário
membros da Unscop foi completada do Brasil, estava um acontecimento que desse
no Palácio das Nações, em Genebra, ressonância às Nações Unidas
faltando 15 minutos para a meia- religiosamente na opinião pública mundial
noite do dia 31 de agosto de 1947. devotado ao e, como socialista norueguês,
O secretariado das Nações Unidas tinha acompanhado de perto
contabilizou que desde o dia de sua
conceito da as perseguições nazistas em seu
investidura até o final dos trabalhos, existência de um país”. David Horowitz e Moshe
a Unscop havia recebido 27 mil Sharett mais outros militantes
estado judaico”.
comunicações, entre cartas e cartões trabalhavam 24 horas por dia.
postais. A Palestina a ser dividida abba eban Telefonemas, cartas e telegramas
contava com uma população de percorriam febrilmente os

31 dezembro 2017
HISTÓRIA DE ISRAEL

contra, dava sinais de que poderia


mudar de ideia. À última hora, o
chefe da delegação árabe, o libanês
Camile Chammoun, desencavou
uma resolução do comitê político
das Nações Unidas, através da
qual uma comissão formada
pelos embaixadores da Austrália,
Tailândia e Islândia tentaria uma
solução de compromisso entre as
partes. O relatório final caberia ao
islandês Thor Thors.

Na manhã do dia 29 de novembro


de 1947, o embaixador da
Embaixadores árabes na onu. os árabes eram representados por cinco países Tailândia, Príncipe Wan, deixou
Nova York às pressas, alegando que
havia um princípio de revolução
continentes. Era preciso encontrar Ao anoitecer, Oswaldo Aranha em seu país. Foi a maneira que
alguém nas Filipinas que tivesse cedeu aos apelos da liderança encontrou para fugir à pressão
acesso ao presidente e alguém, judaica e num gesto amigável árabe de votar contra a partilha.
nos Estados Unidos, que fosse deu a sessão por encerrada. O
amigo do presidente da Libéria. dia seguinte seria feriado nos De qualquer maneira, a sessão
Faltava convencer diversos países Estados Unidos, o Dia de Ação de seria aberta por Thor Thors;
da América Latina e, muito mais Graças, e, portanto, a Assembleia Abba Eban decidiu procurá-lo
difícil ainda, atrair a França e só voltaria a se reunir dois dias de manhã cedo no Hotel Barclay.
a Bélgica para a causa sionista. depois. Esse intervalo de 24 horas Disse-lhe que se o povo judeu
Dentre os embaixadores de fala acabou se tornando crucial. Foi triunfasse com a partilha, estaria
espanhola, García Granados, da nesse tempo que, a exemplo de realizando um sonho duas vezes
Guatemala, ex-Unscop, foi um outros países, as Filipinas e a milenar. Se fracassasse, esse sonho
gigante na defesa da causa sionista. Libéria asseguraram seus votos pela poderia ficar extinto por muitas
partilha. A França, inclinada a votar gerações. Tudo dependeria da
No dia 27 de novembro, quando atmosfera que viesse a ser criada
a Assembleia Geral se reuniu, por ele na abertura dos trabalhos.
os líderes judeus eram uma só A emocionada resposta de Thors
depressão. Se houvesse a votação, deixou Eban desconcertado. Ele
estava longe a possibilidade de disse que a Islândia estava menos
serem alcançados os dois terços remota do destino judaico do que
dos votos. A única alternativa se poderia supor porque a cultura
era pedir aos embaixadores de seu país estava impregnada de
dos países favoráveis à partilha lições bíblicas, porque seu povo
que ocupassem a tribuna e lutava contra terríveis adversidades
discursassem o máximo possível da natureza e, portanto, bem
para que o horário extrapolasse, compreendia a luta dos judeus.
obrigando o adiamento da sessão.
O representante do Uruguai, À tarde, era indescritível a
Rodriguez Fabregat, também tensão nas Nações Unidas, com
ex-Unscop, foi particularmente frenéticos repórteres, fotógrafos
brilhante, falando por longo tempo, e cinegrafistas de todas as partes
sem, no entanto, deixar transparecer do mundo, os embaixadores sendo
que se tratava de uma obstrução. oswaldo aranha assediados nos corredores, as

32
REVISTA MORASHÁ i 98

galerias lotadas. Aberta a sessão,


Oswaldo Aranha deu a palavra a
Thor Thors. O embaixador islandês
declarou de forma imperativa
estar convencido de que era
impossível um acordo e que cabia
à Assembleia Geral tomar uma
decisão. Camille Chamoun ainda
tentou obter novo adiamento, mas
foi obstado por Aranha, apoiado
pelos embaixadores Herschel
Johnson, dos Estados Unidos,
e Andrei Gromiko, da União
Soviética. Judeus comemoram nas ruas de Tel Aviv decisão da ONU, em 1947

Quando os discursos terminaram


e Oswaldo Aranha deu início à ausência. A resolução está BIBLIOGRAFIA
Eban, Abba, An Autobiography, Random
votação, chamando os países por adotada”. Já era madrugada em House, 1977.
ordem alfabética, um manto de Jerusalém. A multidão dançava e Gavison, Ruth, The Two-State Solution,
solenidade cobriu a Assembleia. cantava nas ruas. Sozinho em seu Bloomsbury Academy, 2013.
Os votos foram-se alternando, mais gabinete da Agência Judaica, Louis, William Roger e Stookey, Robert
para “sim” do que para “não” e a David Ben-Gurion mantinha a M., The End of the Palestine Mandate,
vitória sionista tornou-se evidente cabeça abaixada e coberta pelas University of Texas Press, 1988.
quando a França disse “oui”. palmas das mãos. Ele avistava a Cohen, Michael J., Palestine and the Great
Powers 1935-1948, Princeton University
Ao término, Aranha declarou fumaça de uma guerra terrível Press.
com voz firme: “São 33 a favor, que viria e que não poderia ser
13 contra, 10 abstenções e uma evitada.  ZEVI GHIVELDER é escritor E JORNALISTA

Os votos
Votação referente à Partilha da Palestina na Assembleia Geral
das Nações Unidas, no dia 29 de novembro de 1947

A favor: 33   Contra: 13
África do Sul, Austrália, Bélgica, Afeganistão, Arábia Saudita, Cuba,
Bolívia, Brasil, Bielorússia, Egito, Grécia, Iêmen, Índia, Irã,
Canadá, Checoslováquia, Costa Iraque, Líbano, Paquistão, Síria e
Rica, Dinamarca, Equador, Turquia.
Estados Unidos, Filipinas,  
França, Guatemala, Haiti,
Holanda, Islândia, Libéria, Abstenções: 10
Luxemburgo, Nicarágua, Argentina, Chile, China, Colômbia,
Noruega, Nova Zelândia, El Salvador, Etiópia, Honduras,
Panamá, Paraguai, Peru, Polônia, Iugoslávia, México e Reino Unido.
República Dominicana, Suécia,  
Ucrânia, União Soviética, Ausência: 1
Uruguai e Venezuela. Tailândia

33 dezembro 2017
CAPA

os pergaminhos
do mar morto
uma coleção de manuscritos antigos foram descobertos
entre 1947-1956, em cavernas do Deserto da Judeia, e constituem
a maior descoberta arqueológica do século 20. poucos
achados arqueológicos – quiçá nenhum – são tão conhecidos
ou despertaram tanto interesse ou controvérsia. Esses
manuscritos revolucionaram o entendimento que se tinha
sobre o último período do Segundo Templo, quando emergiram
o Judaísmo rabínico e o Cristianismo.

e
m 1947 o Oriente Médio estava 900 diferentes textos. Eles contêm passagens de todos
tumultuado, o que fazia da época o pior os livros do Tanach, exceto o Livro de Esther, além de
momento para se lidar com manuscritos textos apócrifos, orações e textos sobre a Leis Judaica.
antigos. Mas, para o Povo Judeu, que lutava Foram escritos predominantemente em hebraico,
política e militarmente pela recriação de sendo apenas 15% deles em aramaico e alguns em
seu Estado, em sua terra, a Terra de Israel, a descoberta grego.
dos primeiros pergaminhos e sua aquisição no exato
dia em que as Nações Unidas votaram pela Partilha No início da década de 1950 era costume falar na
da Palestina, tinha significado simbólico. Era como se “batalha dos pergaminhos” em virtude dos inúmeros
eles estivessem escondidos na escuridão das cavernas e candentes debates públicos acerca da identidade
durante 2.000 anos, apenas esperando pelo retorno do de seus autores e sua relevância para o Judaísmo e
Povo de Israel a seu Lar ancestral. Cristianismo. Muitas das hipóteses e teorias da época
  estão hoje sendo questionadas ou descartadas.
A descoberta original se resumia a alguns pergaminhos
encontrados em uma caverna próximo a Qumran. Mas, Durante décadas, a maioria dos achados arqueológicos
os arqueólogos e beduínos continuaram procurando, ficaram nas mãos da Jordânia e de uma equipe de
durante anos, ao longo da margem oriental do Mar estudiosos cristãos – a maioria católicos. Por mais
Morto, e encontraram no interior de outras dez absurdo que fosse, apesar dos manuscritos terem
das centenas de cavernas existentes milhares de sido escritos por judeus e versarem apenas sobre
documentos antigos e de fragmentos de textos assuntos relativos à vida religiosa judaica, ao Templo
escritos sobre pele de animal, papiros e até sobre cobre. de Jerusalém, e ao Tanach - composto de 24 livros: a
Hoje, esse tesouro, conhecido como os Pergaminhos Torá, os Profetas (Neviim), e das Escrituras Sagradas
do Mar Morto, inclui seis pergaminhos praticamente (Ktuvim). Nenhum judeu podia fazer parte desse
completos, 80 mil fragmentos agrupados em grupo. Como veremos adiante, somente em 1980 os
20 mil segmentos, que representam mais de estudiosos judeus passaram a fazer parte da equipe.

34
REVISTA MORASHÁ i 98

Santuário do Livro, Heichal ha-Sefer, Museu de Israel, Jerusalém

Hoje, a maioria dos estudiosos mar Morto foram escritos entre o


acreditam que os pergaminhos foram século 2 AEC e o século 1 EC,
reunidos por uma seita de judeus- a durante os períodos helenístico
seita de Qumran ou do Mar Morto e romano. Por outro lado, a
– que ocupava uma área adjacente às composição dos textos varia dentro
cavernas, chamada Khirbet Qumran de um período extenso. Os textos
(Ruína de Qumran). A seita viveu bíblicos incluem os primeiros livros
na área desde 150 AEC até 68 EC, do Tanach; os não-bíblicos foram
quando o local foi destruído pelos compostos a partir do século 3 AEC
romanos, durante a Grande Revolta e vão até a virada da Era Comum.
Judaica (66-73 EC). Ainda que Isto significa que a maior parte dos
na sociologia da religião o uso do textos não foram compostos pela Os Pergaminhos do Mar Morto estão
termo “seita” implique uma “igreja” seita, apenas copiados, e que os guardados no Santuário do Livro
normativa à qual a seita possa ser textos são pré-Cristianismo.
comparada, o termo é usado para características que os separavam
descrever os vários grupos que De acordo com o Prof. Lawrence estava a sua prática da Lei. Mas,
existiam entre os judeus à época do H. Schiffman, especialista nos temos que ter em mente que
Segundo Templo. Pergaminhos do Mar Morto e a grande maioria das práticas
em Judaísmo na Antiguidade, haláchicas – cumprimento da lei do
Tanto a análise paleográfica1 quanto História da Lei Judaica e Literatura sacrifício, o Shabat, as leis da pureza
a datação por radiocarbono-14 Talmúdica, “o papel central da e outras – eram comuns aos judeus
concluíram que os Pergaminhos do Halachá (Lei Judaica) no estudo do período do Segundo Templo”.
do Judaísmo à época do Segundo
1
A Paleografia estuda a origem, forma e Templo é crucial para a definição O período do Segundo Templo
evolução da escrita. de uma seita. Isto porque entre as foi marcado de diversidade e

35 DEZEMBR0 2017
CAPA

complexidade na vida religiosa o das letras que ele estudara em


judaica, uma época em que grupos ossuários de Jerusalém, datados no
tentavam conquistar e manter a início da Era Comum. Sukenik
liderança política e religiosa na decidiu comprar os pergaminhos,
Terra de Israel. Os Pergaminhos se mas pediu para ver mais amostras.
tornaram uma fonte básica sobre as Conseguiu um passe para entrar na
crenças, a vida e os eventos históricos Zona B e, depois de examinar outros
ocorridos nesse período. Até serem fragmentos, resolveu ir a Bethlehem.
descobertos, nossas principais fontes
eram a obra do historiador Flavius Tratava-se de uma viagem perigosa.
Josephus e o livro dos Macabeus. O clima era de extrema tensão
porque as Nações Unidas estavam
A descoberta para votar a partilha da Palestina.
Sua esposa foi totalmente contrária à
A história que envolve os eliezer Sukenik com um dos
sua ida. Seu filho mais velho, Yigael
Pergaminhos do Mar Morto é pergaminhos Yadin, também pediu ao pai que não
legendária2 e se inicia no final fosse a Bethlehem, pois a Haganá
do ano de 1946, início de 1947, tratamento usado para os bispos recebera informações de que haveria
quando jovens da tribo beduína de da Igreja Ortodoxa Siríaca). atos de violência contra os judeus.
Ta’amireh pastoreavam suas cabras
nas proximidades de Qumran. Um Salahi, por sua vez, pediu a Levon Mas Sukenik estava determinado
deles, Muhammad Ahmad el- Ohan, filho de um armênio a comprá-los em nome da
Hamed, conhecido como edh-Dhib comerciante de antiguidades Universidade Hebraica. Em
(Muhammad, o Urso), enquanto da Cidade Velha, para ajudá-lo. 29 de novembro, enquanto
procurava uma ovelha que se Em novembro, Ohan contatou a ONU votava o futuro de Israel,
desgarrara, atirou uma pedra dentro Eliezer Lupa Sukenik, professor ele, junto com Ohan, tomou um
de uma caverna e ouviu o som de de arqueologia na Universidade ônibus para Bethlehem. Ele era o
barro se rachando. Ao explorar Hebraica e pai de Yigael Yadin, único judeu. Em seu diário, Sukenik
a caverna, ele e os companheiros chefe das operações da Haganá, à conta o momento em que Salahi
descobriram dois grandes jarros época, que se tornaria o arqueólogo trouxe os dois jarros contendo os
dentro dos quais viram alguns mais respeitado de Israel e grande manuscritos: “Minhas mãos tremiam
pergaminhos antigos. estudioso dos Pergaminhos do Mar quando comecei a desembrulhar um
Morto. deles. Li algumas frases. Estavam
Em abril de 1947, os beduínos foram escritas em um lindo hebraico
a Bethlehem com os pergaminhos, Sukenik relata os eventos: bíblico. O linguajar era igual ao
e contataram dois comerciantes de “Estávamos em 1947, últimos dias dos Salmos, mas o texto me era
antiguidades: Faidi Salahi e Khalil do Mandato Britânico. A violência desconhecido.... De repente, me senti
Iskander Shahin, mais conhecido corria solta. Os britânicos tinham muito privilegiado que o destino me
como Kando. Este último adquiriu dividido Jerusalém em zonas estivesse fazendo contemplar um
quatro pergaminhos e Salahi, três. militares, separando as partes judaica pergaminho hebraico que não fora
Em julho, Kando – membro da e árabe da cidade e delimitando-as lido por mais de 2.000 anos...”.
Igreja Ortodoxa Siríaca que iria ter com arame farpado. Para se ir de
um papel importante na saga dos uma zona a outra era necessário Sukenik disse a Salahi que
Pergaminhos – vendeu os quatro um passe militar”. Nem ele nem “provavelmente” iria comprar os
a Athanasius Yeshue Samuel, Ohan tinham esse passe, portanto pergaminhos todos, mas levaria
Arcebispo Metropolitano da Igreja se encontraram no portão que dois consigo para examinar.
Ortodoxa Siríaca, conhecido como dava acesso à Zona B. Através do No caminho de volta a Jerusalém,
Mar Samuel (“Mar”, pronome de arame farpado, Ohan mostrou um ele estava de posse do “Pergaminho
fragmento de um dos pergaminhos dos Salmos de Ação de Graças”
2
Alguns desses eventos têm várias versões, e Sukenik percebeu que o formato - Hodayot, em hebraico, e do
das mais realistas às mais fantasiosas. das letras hebraicas se parecia com “Pergaminho da Guerra dos

36
REVISTA MORASHÁ i 98

Filhos da Luz contra os Filhos da Em janeiro de 1948, Sukenik recebe sobre o “Livro de Habakuk” (Pesher
Escuridão”, ou “Pergaminho da uma ligação de Anton Kiraz, da Habakuk, em hebraico) e o “Livro
Guerra” – em hebraico, Milchamá. Comunidade Ortodoxa Siríaca, Apócrifo de Gênesis”. Este último
Uma semana mais tarde, ele adquiriu colocando à sua disposição os quatro estava tão enrolado e frágil que não
o terceiro, um manuscrito do Livro pergaminhos que estavam em posse pôde ser desenrolado. Trever envia
de Isaías, conhecido como “Isaiahb”. de Mar Samuel. Quando Kiraz fotos a William Foxwell Albright,
Horas após seu retorno, Sukenik os mostrou a Sukenik, este percebeu, renomado arqueólogo bíblico e
estava em seu escritório quando de imediato, que pertenciam especialista em epigrafia semita da
seu filho menor, Mati, entra ao mesmo conjunto que os que época, que lhe responde em 15 de
correndo para lhe contar que as adquirira. Ofereceu £2.000 libras maio de 1948, justo o dia em que
Nações Unidas tinham aprovado a esterlinas por eles, mas como Israel Israel declarava sua independência:
Resolução da Partilha. estava às vésperas da Guerra de “Minhas congratulações …pela
Independência, ele não conseguiu o maior descoberta em manuscritos
Yigael Yadin, relembra: “Não pude dinheiro. Sukenik nunca mais os viu. dos tempos modernos! … a escrita
evitar a sensação de que havia algo Em seu diário, ele conta: “O Povo é mais arcaica do que a do Papiro
de simbólico na descoberta dos Judeu perdeu uma herança preciosa”. Nash... Eu diria que data por volta
pergaminhos e em sua aquisição, Mas ele estava enganado, pois, do ano 100 AEC ”.
no momento exato da criação do anos mais tarde, seu filho Yigael os
Estado de Israel. Parecia que os adquiriria para o Estado de Israel. Em janeiro do ano seguinte, Mar
manuscritos ficaram esperando em Samuel contrabandeia os quatro
cavernas, por 2.000 anos, desde o Frustrada a venda, Mar Samuel pergaminhos para fora do Oriente
fim da independência de Israel até decide mostrá-los à Escola Médio, instalando-se em New Jersey,
que Am Israel retornasse a seu Lar Americana de Pesquisa sobre o nos EUA. Uma vez lá, ele recomeça
ancestral e recuperasse sua liberdade. Oriente, em Jerusalém3, então as buscas por um comprador. Nove
O simbolismo fica ainda mais forte sob a direção de Millar Burrows. meses depois, os pergaminhos foram
pelo fato de que os três primeiros O assistente de Mar Samuel, expostos na Biblioteca do Congresso.
pergaminhos foram comprados por Butros Sowmy, contata o diretor Despertaram enorme interesse, mas
meu pai, em nome de Israel, no dia em exercício, John Trever. nenhuma instituição se apresentou
29 de novembro de 1947, dia exato Arqueólogo e estudioso bíblico, com uma proposta de compra.
em que a ONU votou pela recriação este último lhe pede que leve os
de um Estado judeu na Terra de pergaminhos à Escola. No dia Após a descoberta
Israel, após 2.000 anos...”. seguinte, quando Sowmy surge inicial...
com os quatro manuscritos, Trever
fica boquiaberto. A escrita era Nesse ínterim, a notícia da
3
Hoje, Instituto W.F. Albright de Pesquisa semelhante à do Papiro Nash, descoberta se tinha espalhado pelo
Arqueológica. datado de cerca de 150 AEC 4. mundo arqueológico. Na tentativa
4
O Papiro Nash, fragmento mais antigo Ele fotografa os pergaminhos, o de localizar a caverna onde os
do Tanach conhecido até então, contém o
texto dos Dez Mandamentos e do Shemá Livro de Isaías (Isaiaha), o “Manual pergaminhos iniciais haviam
Israel. da Disciplina”, um comentário sido encontrados, o diretor do

37 DEZEMBR0 2017
CAPA

Departamento de Antiguidades arenito, entre as encostas de calcário Algumas eram riquíssimas em


da Jordânia, o arqueólogo inglês e a costa do Mar Morto. manuscritos e fragmentos. Na
G. Lankester Harding, conseguiu Caverna 3, por exemplo, foram
que a Legião Árabe vasculhasse Os membros da tribo de Ta’amireh descobertos fragmentos do “Livro
a área onde foram supostamente também estavam atrás de novos de Ezequiel” e dos Salmos, textos
encontrados. Em 28 de janeiro de achados. Ainda em 1950, o apócrifos e dois rolos oxidados
1949, foi descoberta a Caverna diretor Harding e o padre de Vaux em cobre martelado (Pergaminho
1. Ele próprio encarregou-se da sabiam que seria problemático de Cobre), que constituiu o mais
exploração da mesma, junto com se os fragmentos encontrados envolto em mistério dentre todos
o diretor da Escola Bíblica de pelos beduínos fossem vendidos os achados arqueológicos do Mar
Jerusalém Oriental, o padre Roland para vários compradores. Seria Morto.
de Vaux. Este padre dominicano impossível reuni-los de acordo com
francês lideraria a equipe que iria o manuscrito ao qual pertenciam Em 1952, enquanto os arqueólogos
trabalhar nos Pergaminhos. ou reconstituir qualquer um deles. escavavam em Qumran durante o
Assim sendo, procuraram Kando dia, os beduínos o faziam à noite,
Organizou-se uma grande expedição e compraram dele os fragmentos e foram eles que descobriram a
arqueológica para escavar a área que haviam sidos posteriormente Caverna 4. Com uma entrada a uns
ao longo da costa noroeste do Mar removidos da Caverna 1 e que ainda 100 metros de onde os arqueólogos
Morto. À época, a região estava estavam com ele. Nesse meio tempo, estavam escavando, a caverna
sob domínio jordaniano e nenhum Kando se associara ao xeque dos continha 15 mil fragmentos de cerca
israelense ou judeu podia participar Ta’amireh, passando a ter um quase de 500 pergaminhos diferentes.
da expedição. Decidiram escavar monopólio dos achados. Tendo os beduínos removido
também as ruínas de Khirbet a maior parte, mais uma vez
Qumran (também chamada de Nos anos seguintes, arqueólogos e Kando foi o caminho para que os
Khirbet Yahud) que ficavam a menos beduínos encontram em dez, das arqueólogos os adquirissem.
de 2 km ao sul da Caverna 1, centenas de cavernas examinadas,
em uma formação mais baixa de um verdadeiro tesouro arqueológico. O material encontrado na Caverna
11, descoberto em 1956, foi
parque nacional de Qumran
extremamente rico. Mas, continua
sendo um mistério o número de
pergaminhos descobertos pelos
beduínos. Entre os achados estava
um manuscrito do “Livro Levítico”,
da Torá, usado antes do exílio
da Babilônia, e um dos Salmos,
contendo salmos adicionais.

Harding, à época diretor do


Departamento de Antiguidades e
curador do Museu Arqueológico
da Palestina (PAM), localizado
em Jerusalém, tomou uma decisão
crucial. Encaminhou os pergaminhos
ao PAM ao invés de consigná-los
ao Museu Nacional da Jordânia, em
Amã. Como veremos adiante, não
fosse pela decisão de Harding, os
preciosos achados poderiam estar,
hoje, em Amã, e não em Israel.
Com a chegada, na década de 1950,
de milhares de fragmentos ao Museu

38
REVISTA MORASHÁ i 98

Arqueológico da Palestina, reuniu-se Kochba de 132-135, combatentes


uma equipe de estudiosos bíblicos judeus se estabelecem em Qumran.
para tratar da enorme quantidade Depois disso, o local foi abandonado.
de material. Segundo um relato Acredita-se que grande parte dos
recente: “Harding e de Vaux queriam manuscritos encontrados tenham
uma equipe que representasse, de sido escondidos nas cavernas durante
fato, os países e credos atuantes na a guerra contra Roma.
pesquisa bíblica, com uma ressalva
– não incluiriam nenhum judeu Os Pergaminhos do Mar
ou israelense. Tem-se falado que o Morto em mãos de Israel
padre de Vaux era antissemita. Certo
é que, a exemplo de Burrows, Trever Foram necessários mais de 20 anos,
e muitos outros pesquisadores, ele mais precisamente até a Guerra dos
era veementemente contrário à Seis Dias, para que todo o precioso
criação do Estado de Israel”. material arqueológico estivesse em
mãos israelenses.
Khirbet Qumran AEC e representa um documento
(a Ruína de Qumran) formativo da seita, logo após a Os quatro pergaminhos da
Revolta dos Macabeus. descoberta inicial que ainda estavam
Uma equipe de arqueólogos nas mãos de Mar Samuel, voltaram
encabeçada por Harding e de Vaux A seita chegou a seu ponto alto para Israel em 1954. Em 1o de junho
iniciou as escavações em Khirbet entre o final do Séc.1 AEC e o daquele ano, desesperado, ele publica
Qumran, em 1949, em busca de Séc.1 desta Era. Foi nesse período um anúncio no The Wall Street
mais pergaminhos e, principalmente, que a maioria dos pergaminhos Journal colocando-os à venda. Na
respostas. Haveria uma relação entre foram escritos. Um terremoto época, Yigael Yadin estava nos EUA
o local e os pergaminhos? Teriam destruiu o local, provavelmente em dando palestras e a Embaixada de
seus habitantes os escondido nas torno de 31 AEC . Reconstruído Israel o coloca a par do anúncio.
cavernas próximas? alguns anos depois, foi arrasado por
tropas romanas à época da Primeira Determinado a comprar os
Desencavaram várias estruturas Revolta Judaica (66-73 EC), antes pergaminhos para seu país, ele sabia
de grande porte que acreditavam do sítio a Jerusalém. que tinha que agir com cautela,
ser o centro de uma seita pequena mantendo seu nome e o de Israel
judia, muito religiosa. Seguindo- Os romanos ocupam o local durante por fora temendo que Mar Samuel
se às escavações iniciais, de Vaux 20 anos. Durante a Revolta de Bar não consentisse em vendê-los. Yadin
sugeriu que o local poderia ter sido entra em contato com seu amigo,
fundado pelos essênios, uma das o Dr. Harry Orlinsky, estudioso e
diferentes seitas de judeus da época. tradutor de textos bíblicos, e lhe
Atualmente, a teoria dos essênios pede que vá a Nova York. Explica
é amplamente discutida e rejeitada que devia assumir o nome de “Mr.
por muitos estudiosos. Todos, porém, Green” e fazer-se passar por um
concordam que no século 2 AEC perito enviado por um possível
, durante a época dos Macabeus, comprador para autenticar os
Qumran foi ocupado por um grupo pergaminhos; e ir ao Chemical Bank
judeu que tinha sido expulso ou and Trust Co, assegurando-se de não
se afastado do culto no Templo de estar sendo seguido.
Jerusalém. Um dos manuscritos
encontrados, a “Carta Haláchica”, Orlinsky encontra-se no cofre do
lista assuntos sobre os quais os Banco com o representante de
sectários não concordavam com a Mar Samuel. Este retira de um
maneira em que o culto no Templo Anúncio no The Wall Street Journal cofre preto os quatro manuscritos.
colocando quatro pergaminhos à
era praticado. O texto data de 150 venda. Após autenticá-los, Orlinsky vai a

39 DEZEMBR0 2017
CAPA

um telefone público, liga para um pergaminho completo por Museu de Israel. Todos os demais
número e diz as palavras-código: US$ 100.000. Era o Pergaminho do manuscritos e fragmentos de
Lechaim, Viva! A missão tinha sido Templo. O intermediário concordou textos estão preservados no Museu
um sucesso. O preço acordado em enviar um fragmento a Yadin, Rockefeller, em Jerusalém, onde fica
pelos quatro pergaminhos foi de que, após examiná-lo, garantiu ser o Departamento de Antiguidades de
US$ 250.000 – uma barganha autêntico. O texto, em hebraico, que Israel. 
mesmo para a época. Os recebera tratava do papel do Sumo
pergaminhos são despachados, Sacerdote. Iniciam-se as negociações, A batalha para
separadamente, para Israel. Lá, mas o vendedor continuava a subir publicá-los
foram reunidos aos outros três rolos o preço, e em maio de 1962, cessou
que, sete anos antes, o pai de Yadin toda a comunicação entre as partes. Os textos dos sete pergaminhos da
comprara. descoberta inicial foram publicados
Em 7 de junho, Yadin enviou um por estudiosos israelenses e
Em fevereiro de 1955, o Primeiro coronel do Exército de Israel a americanos já na década de
Ministro de Israel à época, Moshe Bethlehem, já em mãos israelenses, 1950 e disponibilizado a outros
Sharett, convoca uma coletiva de para confrontar Kando. As suspeitas pesquisadores. No entanto, o tesouro
imprensa para anunciar que todos de Yadin estavam corretas. Ao ser arqueológico que estava nas mãos
os sete pergaminhos estavam, confrontado, Kando removeu alguns do time de estudiosos reunidos pelo
finalmente em Israel. No início da ladrilhos do chão de sua casa e de padre de Vaux publicara uma parte
década de 1960, construiu-se em lá tirou uma caixa de sapatos onde bem reduzida do material, e não
Jerusalém o Santuário do Livro, tinha colocado o “Pergaminho do permitia que outros pesquisassem
Heichal ha-Sefer, para abrigar os sete Templo”, enrolado em celofane e o material. Estudiosos acreditavam
tesouros encontrados na Caverna 1. toalha e embrulhado com papel. que após Israel ter assumido o
As autoridades israelenses o controle, os pergaminhos seriam
Mais 12 anos se passaram até que confiscam, pagando a Kando US$ disponibilizados rapidamente. Mas
todos os achados estivessem, por 105.000. Finalmente, o “Pergaminho tudo ficou na mesma. Mesmo sob
fim, em mãos de Israel. Durante a do Templo” estava a salvo e foi os auspícios israelenses e apesar
Guerra de Seis Dias, de 1967, os exposto junto dos primeiros sete da insistência de Yadin, os avanços
jordanianos não os transferiram rolos, no Santuário do Livro, no para sua publicação continuavam
para um local “mais seguro”, como emperrados.
acontecera em 1956, antecipando
um possível avanço de Israel. Eles O problema era que Israel queria
foram simplesmente levados ao ser visto como “um conquistador de
subterrâneo do Museu. No terceiro boa paz”. Avraham Biran, diretor do
dia da Guerra, Israel capturou Departamento de Antiguidades, e
Jerusalém Oriental e arqueólogos Yigael Yadin trabalharam em busca
israelenses entraram no museu em de um relacionamento amigável
busca dos Pergaminhos. entre Israel e a equipe de publicação,
apesar de saber que o sentimento
Yadin, à época assessor militar do prevalecente na Escola Bíblica era
Primeiro Ministro Levi Eshkol, de ressentimento contra Israel – ao
sabia que o “Pergaminho do ponto de os pesquisadores, todos
Templo” estava sendo escondido por antissionistas, recusarem-se a pisar
um comerciante de antiguidades. em Jerusalém após 1967.
Descoberto na Caverna 11 em 1956,
até o início dos anos 1960 ninguém Mas Israel não queria ser acusado de
no Ocidente sabia de sua existência. apropriação intelectual e, de início,
Um pastor americano, preposto de manteve o status quo, deixando a
um negociante de antiguidades – responsabilidade pela publicação em
que, mais tarde se soube ser Kando mãos da equipe original e aceitando
Yigael Yadin estudando um dos
– escreveu a Yadin oferecendo um Pergaminhos do Mar Morto a exclusão dos pesquisadores judeus

40
REVISTA MORASHÁ i 98

e israelenses. Quando de Vaux Em dezembro de 2012, mediante Uma das várias conclusões do
procura Biran, este lhe comunica colaboração com a Google, o trabalho é que mesmo no contexto
que Israel honraria os direitos de Departamento de Antiguidades das inúmeras disputas entre os
publicação de sua equipe – ou seja, de Israel disponibilizou on-line diferentes grupos judaicos à época,
os direitos exclusivos de publicar os Pergaminhos, constituindo a certos pontos básicos em comum
os pergaminhos sem permitir “Biblioteca Digital Leon Levy de caracterizam o Judaísmo.
que outros estudiosos tivessem Pergaminhos do Mar Morto”. Essa
acesso aos mesmos nesse ínterim. biblioteca digital pode ser acessada A centralidade do estudo da
Mas o “monopólio” e a demora gratuitamente. Torá era comum a todas as seitas
na publicação desperta conflitos e e, apesar das disputas entre
controvérsias crescentes. Importância dos fariseus, saduceus e a seita de
Pergaminhos Qumran, é importante esclarecer
Em 1980, Emanuel Tov e Elisha que a observância da lei dos
Qimron são os primeiros israelenses Atualmente há um consenso entre sacrifícios, do Shabat, de pureza
a trabalhar nos pergaminhos. os estudiosos acerca da necessidade e de outras práticas haláchicas
John Strugnell, chefe da equipe de um grande foco no contexto eram comuns aos judeus do
internacional de 1986-1990, judaico dos Pergaminhos do Mar período do Segundo Templo.
aumenta ainda mais o número de Morto. Entendem, ainda, que essa Ademais, os Pergaminhos revelam
participantes e inclui alguns judeus. abordagem também permite que a existência de um grande grau
Em 1990, depois de uma entrevista esses documentos tenham um de continuidade entre o Judaísmo
onde ele se auto descreve como “anti- papel ainda maior em facilitar o antes e após a destruição do
judaísta”, dizendo entre outros : “... entendimento sobre os primórdios Segundo Templo.
Judaísmo – uma religião horrível”, do Cristianismo.
ele é destituído e Emanuel Tov,
professor da Universidade Hebraica, A descoberta dos Pergaminhos nos
Bibliografia
assume como editor-chefe do projeto ofereceu a oportunidade de aprender
Lawrence H. Schiffman, Qumran
de publicação dos manuscritos. O muito não apenas sobre a seita de and Jerusalem: Studies in the Dead Sea
Prof. Tov aumentou o número de Qumran, mas também sobre outras Scrolls and the History of Judaism.
pesquisadores e ficou na direção até o seitas do período do Segundo Edição do Kindle.
término dos trabalhos. Templo. Somente compreendendo Shanks, Hershel, The Mystery and
a complexa dialética entre acordo Meaning of the Dead Sea Scrolls.
Edição do Kindle.
Em 2008, Tov presenciou o e desacordo podemos traçar
Leonard, Cheryl, The Dead Sea
término real da série oficial de corretamente o panorama religioso Scrolls: Ancient Secrets Unveiled.
40 volumes, e sua publicação. da antiga Terra de Israel. Edição do Kindle.

41 DEZEMBR0 2017
@
MORASHA.COM

Exposição de arte
confiscada pelo 3º Reich
O conteúdo e propósitos de ambas
as exposições foram cuidadosamente
coordenados.

A de Berna focaliza os
trabalhos de “Arte degenerada”
confiscados pelos nazistas de museus
alemães durante o período. O Centro
de Bonn, por sua vez, expõe as obras
saqueadas pelos nazistas durante sua
campanha de perseguição, além de
peças cuja procedência ainda não foi
esclarecida. As duas mostras estarão
em exibição a partir deste novembro
de 2017 até março de 2018. E, nos
meses seguintes, a exposição agora
em Bonn será exibida no Museu de
Soldado americano guarda, logo após a guerra, o chamado. Collecting Point, Belas Artes de Berna.
depósito de arte roubada pelos nazistas Este museu porá em exibição

O
200 trabalhos considerados “Arte
Museu de Belas 3º Reich. Mais de 1.200 obras foram degenerada” pelos nazistas em
Artes, em Berna, e escondidas em seu apartamento em virtude de serem trabalhos “não-
o Centro de Artes Munique e outras 250 ou mais em germânicos, feitos por judeus ou
e Exposições da Salzburgo, na Áustria. por comunistas” – ou eram obras
República Federal impressionistas ou mais modernistas,
da Alemanha, em Bonn, estão não apresentando, portanto, o
apresentando, simultaneamente, realismo tradicional. Os trabalhos
obras de arte da Coleção Cornelius foram confiscados em uma investida
Gurlitt. nazista, em fins da década de 1930,
contra o que eles chamaram de
Cerca de 1.500 trabalhos foram “Arte degenerada”, sendo mais tarde
descobertos, há cinco anos, durante vendidas para financiar a máquina de
uma investigação oficial sobre guerra nazista.
uma questão tributária. As peças  
de arte estavam escondidas nas Já a exposição do Centro de Artes
várias residências do colecionador e Exposições de Bonn, concentra-
alemão, Cornelius Gurlitt, cujo pai, se em arte saqueada e roubada – a
Hildebrand Gurlitt, foi um dos maioria de colecionadores judeus
principais marchands do Hildebrand Gurlitt – pelos nazistas. Entre elas incluem-

46
REVISTA MORASHÁ i 98

1 2

1. “No Jardim do Palácio de Oberhofen”,


August Macke, 1914. Em exposição em Berna
2. “Leonie”, 1923, Otto Dix 3. “Dois ciclistas
na praia”, Max Liebermann, 1901. Considerado
“arte saqueada” 4. “Casal”, Hans Christoph,
1924. Em exposição em Bonn 5. “Mulher de
cócoras”, Auguste Rodin, 1882

4 5

se trabalhos dos grandes mestres se para assegurar que todas as


como Claude Monet e Albrecht obras saqueadas de judeus fossem
Durer, e estavam escondidas do devolvidas a seus herdeiros.
olhar público há décadas. Os peritos  
identificaram, a princípio, mais de As duas exibições foram
90 obras provavelmente roubadas, involucradas em um contexto
com trabalhos de Toulouse-Lautrec, histórico e se baseiam nas últimas
Henri Matisse, Edvard Munch Museu de Belas Artes, Kunstmuseum. descobertas da pesquisa sobre o
e Rembrandt. Destas, apenas Berna tesouro artístico de Gurlitt. Será
quatro, inclusive uma de Camille a primeira vez em que o público
Pisarro – foram devolvidas a seus ao Museu de Belas Artes, mas em geral terá a oportunidade
legítimos herdeiros.  Estas haviam uma fundação subvencionada de apreciar essa coleção muito
sido legadas por um testamento pelo governo alemão empenhou- expressiva e abrangente.

Página do Facebook estimula troca


de receitas Casher

A
página do Facebook “Eu restrições alimentares religiosas é envolve a culinária judaica.
não cozinho, mas dou um desafio para qualquer cozinheiro Desde a sua criação, há 10 anos,
receitas”, criada pelas irmãs ou dona-de- casa. Além do mais, tornou-se algo mais do que um
Goldie Adler Nathan e Esty Adler os jantares de Shabat em família espaço para troca de receitas.
Wolbe, moradoras do Brooklyn são geralmente considerados o Com cerca de 30 mil membros,
(Nova York) em 2007, está fazendo ponto alto da semana. A página a página transformou-se em
sucesso na comunidade judaica do Facebook tornou-se um fórum uma comunidade de mulheres,
americana e da diáspora. Afinal, para troca de receitas, com o fluxo principalmente ortodoxas, que
usufruir de um jantar formal com de informações sobre tudo o que discutem os mais variados temas.

47 DEZEMBRO 2017
MORASHÁ.COM

Após 100 anos de tratativas


com o governo russo,
a Coleção Judaica Günzburg
será disponibilizada on-line

A
Coleção Günzburg, uma das autoridades russas assinaram um
coleções de Judaica uma das contrato de compra do acervo, com
mais importantes do mundo a transferência de 500.000 rublos
judaico, guardada na Biblioteca de ouro o governo imperial russo,
Estatal Russa, em Moscou, será conseguidos mediante doações de
digitalizada e disponibilizada ao sionistas russos. Essa soma equivale, à Rússia documentos comprovando
público pela Biblioteca Nacional de hoje, a cerca de US$ 15 milhões, de a posse da coleção, esperando que
Israel, em Jerusalém. Para tanto, em acordo com o valor atual do ouro. as relações entre os dois países, que
7 de novembro de 2017 foi assinado O acervo já estava encaixotado, estão em fase de reaquecimento,
um histórico documento entre pronto para ser despachado à então possam dar um fim ao impasse.
as duas importantes instituições. Palestina, mas a 1a Guerra Mundial
Trata-se de um marco significativo interrompeu os planos. Com a Netanyahu falou várias vezes com
nas tratativas entre ambas, iniciadas Revolução Bolchevista, os livros o Presidente Vladimir Putin sobre
exatamente há 100 anos, quando a foram confiscados, nacionalizados o caso, mas chegou à conclusão que
Biblioteca Nacional de Israel ainda e transferidos à Biblioteca Estatal por ora não há possibilidade de
era chamada de Beit Hasfarim Lenin, em Moscou. Albert Einstein, receber a coleção. Recentemente,
Haleumi. Chaim Weizmann e inúmeras outras o Premier Bibi Netanyahu revelou
personalidades do mundo judaico que apesar de Israel não abrir mão
A Coleção Günzburg contém mais tentaram, em vão, no decorrer dos da demanda pela recuperação de
de 14.000 itens, entre os quais anos persuadir os russos a devolver a posse do acervo, desejava, primeiro,
milhares de livros raros em hebraico, coleção. cooperar em sua digitalização como
bem como manuscritos nesse forma de permitir aos estudiosos
idioma e em muitos outros. Nas Em anos recentes, Israel tem o acesso ao importante material.
palavras do Dr. Aviad Stollman, da abordado o assunto durante Assim sendo, orientou a Biblioteca
Biblioteca de Jerusalém, a coleção encontros oficiais com autoridades Nacional a acelerar o projeto de
é um tesouro nacional para o Povo russas, com o envolvimento do digitalização. O diretor da Biblioteca
Judeu. Constam da Coleção obras Ministério das Relações Exteriores Estatal Russa, por sua vez, afirmou
medievais sobre Ciências, Filosofia e de Israel, do próprio Bibi Netanyahu que “A moderna tecnologia da
Estudos Judaicos, Midrashim, cópias e do então Presidente Dmitry informação abriu e possibilidades
de trabalhos de Maimônides e do Medvedev, da Rússia. Israel enviou novas e ilimitadas para o acesso aos
Rashba (Rabi Shlomo ibn valores culturais dos países e seus
Aderet), comentários bíblicos, povos”.
livros de gramática hebraica e
Halachá (Lei religiosa judaica), O projeto de digitalização
poesia medieval, Cabalá e foi financiado pela Fundação
textos médicos. Peri, presidida por Ziyavudin
Magomedov, bilionário
O acervo foi reunido muçulmano russo, do Daguestão,
por três gerações de uma muito atuante na preservação
aristocrática família judaica da cultura. Há algum tempo, ele
russa, a partir de meados contribuiu para um projeto de
do séc. 19. Em 1917, o Beit preservação da mesquita de Kala
Hasfarim Haleumi e as Koreysh, em seu país.

48
REVISTA MORASHÁ i 98

França restitui quadro de Pissarro confiscado


pelos nazistas a descendentes de colecionador
Em 1943, após a Alemanha ocupar Paris, emprestadada por um casal
a França, os nazistas confiscaram americano, no marco da retrospectiva
o acervo do colecionador de arte do pintor Pissarro. O casal comprara
judeu, Simon Bauer. Entre os 93 legalmente o quadro por 800 mil
quadros da coleção Bauer, estava “A dólares num leilão em 1995, em
Colheita”, também chamada de “A Nova York. Os descendentes de
Colheita de Ervilhas”. Pintado em Simon Bauer conseguiram que a
1887 pelo impressionista francês obra não fosse exposta enquanto a
Camille Pissarro, o quadro retrata justiça decidia seu destino.
várias mulheres colhendo ervilhas
no campo. A coleção de Bauer foi Durante o julgamento o advogado do
vendida pelas autoridades nazistas a pequena parte de suas obras. Seus casal americano defendeu que seus
um comerciante de arte designado descendentes continuaram a ação, clientes não sabiam da procedência e
pelo Comissário de Assuntos atualmente cerca de 20 quadros não deveriam pagar pelos crimes de
Judaicos do regime colaboracionista ainda não foram recuperados. Vichy. O tribunal reconheceu a boa-
de Vichy. fé do casal que, durante uma emotiva
“A Colheita” ficou desaparecida audiência em outubro, explicou
Simon Bauer um prospero durante décadas, reaparecendo também serem judeus e sensíveis à
empresário no setor de calçados foi brevemente em 1965 durante uma memória do Holocausto. A Justiça
levado em julho de 1944 ao campo venda, mas foi logo retirada do Francesa determinou que o quadro
francês de Drancy, mas conseguiu território francês, e desapareceu. No fosse entregue aos descendentes da
escapar da deportação graças a começo deste ano de 2017, a família família Bauer, baseando a decisão
uma greve de ferroviários. Antes de Bauer soube que a pintura estava num decreto de abril de 1945 sobre a
morrer, em 1947, recuperou uma exposta no Museu Marmottan, de anulação dos atos de espoliação.

Economia de Israel – uma das mais fortes do mundo 

O
shekel israelense desponta a saltar, em abril, para
atualmente como a o 3o lugar em uma lista
segunda moeda mais forte das economias mais
no mundo, segundo relatório do estáveis e promissoras
Deutsche Bank, conglomerado no ano passado, segundo
alemão bancário e de serviços a agência Bloomberg.
financeiros. O mesmo documento A economia israelense
coloca o yuan, moeda chinesa, continua a ter bom
como a mais forte do mundo. desempenho, de
Segundo seu analista estratégico acordo com os padrões
para moedas estrangeiras, nos internacionais.
últimos 12 meses o shekel teve uma  
valorização de 6,1 % face às moedas Em janeiro, Israel
dos principais parceiros comerciais entrou para as 10
de Israel, como o dólar americano, melhores na versão 2017
a libra inglesa, o euro e o iene. do Índice de Inovação
Bloomberg (Bloomberg Innovation pontuando seu dispêndio anual
A inflação quase inexistente e o Index), que classifica o nível de em P&D e o número de empresas
baixo desemprego ajudaram Israel inovação na economia de um país de tecnologia de capital aberto.

49 DEZEMBRO 2017
PERSONALIDADE

Simone Veil,
um ícone mundial
A França ficou de luto em junho deste ano de 2017
ao tomar conhecimento do falecimento de Simone Veil.
Judia, sobrevivente do Holocausto, ela ocupou vários
postos governamentais, tornando-se um ícone na luta
contra a discriminação das mulheres. Empenhada em todas
as causas em que acreditava, conquistou os franceses,
e sua popularidade ia muito além dos limites da política

A
vida de Simone Veil foi turbulenta. de sobreviventes do Holocausto e conquistou o respeito
Vivenciou épocas de terror e de luto, internacional por sua atuação para a preservação das
assim como de amor e de vitórias, memórias das vítimas de Hitler.
sempre demostrando uma dignidade e
uma seriedade que incutiam o respeito e Em uma das primeiras reações à sua morte, o presidente
admiração de todos em sua volta. Uma pesquisa realizada francês, Emmanuel Macron, declarou esperar que Simon
em 2010 a indicou como a preferida entre as mulheres da Veil “possa inspirar, com seu exemplo, os franceses a
França. encontrar o melhor da França”.

Dona de uma força de vontade ímpar aliada a um talento Sua vida


intelectual singular, a força de Simone Veil residia em
sua capacidade de adaptação e luta diante dos desafios. A família Jacob tem suas origens em Bionville-sur-
Suas tendências políticas dependiam da causa em que Nied, na região da Lorraine. Seu pai, André Jacob, era
estava envolvida. Convidada para o programa L’Heure de arquiteto de renome, tendo obtido, em 1919, o segundo
Vérité (A Hora da Verdade) para revelar suas tendências grande prêmio de Roma. Ele se casou, em 1922, com
políticas, ela se declara “à esquerda em certos assuntos, Yvonne Steinmetz, filha de um peleteiro também judeu.
à direita em outros”. Ao ser eleita para a Academia Após o casamento, Yvonne abandona seus estudos
Francesa, o escritor Jean d’Ormesson, escolhido para dar na universidade por exigência do marido. Em sua
as boas-vindas, disse: “Contra todas as probabilidades, autobiografia, Simone escreveu que apesar de sua “família
sem jamais alterar a voz, você conseguiu convencer a ser laica”, “o fato de pertencer à comunidade judaica
todos. Podemos dizer sem presunção, no coração da vida jamais foi um problema para mim. Essa condição era
política, você ofereceu uma imagem moral e republicana”. altamente reivindicada por meu pai”.

Apesar de não praticante, Simone jamais negou seu Após o nascimento de seus dois primeiros filhos,
judaísmo. Participou ativamente de várias organizações Madeleine e Denise, o casal trocou Paris por Nice.

50
REVISTA MORASHÁ i 98

2 3
1. a jovem Simone Veil 2. em casa com seu cachorro, Paris, 1974 3. Simone Veil, em seu escritório

Nessa cidade, na Riviera Francesa, O país é, então, dividido – o norte Pétain. E uma área do sudeste fica
nasceram seu filho Jacob e, no e a costa do Atlântico, inclusive nas mãos da Itália fascista. Milhares
dia 13 de julho de 1927, Simone. Paris, ficam sob ocupação nazista, de judeus refugiam-se na Zona Livre,
Com a crise de 1929, os projetos enquanto o sul e o sudeste, a inclusive Nice, onde viviam Simone
arquitetônicos do pai diminuem chamada Zona Livre, passam a e sua família. Em 11 de novembro
drasticamente e a família se muda ter um governo leal à Alemanha, de 1942, alemães e italianos invadem
para um apartamento menor. Sua o Regime de Vichy, do marechal o território francês, quebrando o
mãe, Yvonne, começa a fazer roupas Armistício, e Nice fica sob domínio
de tricô para famílias necessitadas. italiano até 1943.

Simone tinha 10 anos no dia 3 A Shoá


setembro de 1939, quando a França
e Grã-Bretanha declararam guerra à Os judeus franceses acreditavam
Alemanha nazista que havia invadido estar seguros e que não seriam
a Polônia dois dias antes. Exércitos perseguidos, mas estavam enganados.
alemães invadiram a França em Os anos seguintes foram de muito
maio de 1940 e, no dia 14 de junho, sofrimento. A França de Vichy
tomam Paris. A Itália de Mussolini, voluntariamente promulga, em
que, no dia 10 de junho, entrara na 4 outubro de 1940, as primeiras
Guerra ao lado do Terceiro Reich, leis contra os judeus. O ‘Statut des
invade o território francês. Juifs”, que se baseava nas “diretrizes“
nazistas já postas em prática na
A França se rendeu oficialmente zona de ocupação alemã, impunha
Yvonne Jacob, bela e melancólica,
no dia 22 de junho, e assina um Simone dizia: “Ela foi o personagem segregação racial e a obrigatoriedade
armistício com Alemanha e Itália. mais importante da minha vida”. de que os judeus se identificassem

51 DEZEMBRO 2017
PERSONALIDADE

Jacquiers numa tentativa de escapar


às garras nazistas. No dia 30 desse
mês, quando estava com amigos no
centro da cidade comemorando o
término dos exames de baccalauréat1,
foi detida por dois alemães em
trajes civis. Foi levada ao Hotel
Excelsior, quartel-geral nazista e
local de concentração dos judeus
que seriam deportados. O restante
da sua família, que, até então,
vivia escondida na casa de amigos
não judeus, é também preso pela
Simone Veil, aos 21 anos, já com dois filhos, nicolas e jean, o mais velho. na foto,
Gestapo.
com o marido
No dia 7 de abril de 1944, Simone,
sua mãe e sua irmã Madeleine, foram
como tal junto às autoridades. Eles
enviadas para o campo de Drancy
foram excluídos da vida pública e
no comboio número 71, no qual
militar, da indústria e comércio, das
estavam, também, Anne-Lise Stern
profissões liberais e das artes.
e Marceline Rosenberg, que viriam a
se tornar suas melhores amigas. De
André Jacob foi um dos milhares
Drancy foram despachadas em trens
de judeus que obedeceram a
de gado para Auschwitz-Birkenau,
determinação de se registrar como
onde chegaram no dia 15 do mesmo
judeu e perdeu o direito de exercer
mês. Seu pai e seu irmão Jean foram
sua profissão. Sua esposa, Yvonne,
deportados para a Lituânia no
passava o dia em busca de algum
comboio 73 e ela jamais os reviu.
trabalho para alimentar a família.
Os Jacobs passam a enfrentar a
Assim que chegou em Auschwitz,
segregação cada vez maior decorrente
um prisioneiro que falava francês a
das leis anti-judaicas.
alertou que ao ser interrogada pelos
nazistas devia dizer que tinha mais
Em novembro de 1942, Nice, como
de 18 anos, quem sabe assim ela
vimos acima, fica sob ocupação Simone Veil no Parlamento defendendo
a “Lei Veil”, que descriminalizou a conseguiria sobreviver à “seleção”.
italiana. Apesar de aliada de Hitler, interrupção voluntária da Ela se torna o prisioneiro número
a Itália de Mussolini se recusava gravidez,1974
78651, tatuado em seu braço, e teria
a entregar judeus aos nazistas, a
que “descarregar as pedras enormes
despeito de repetidas exigências.
entre a Itália e os Aliados, as tropas que chegavam diariamente em
Apesar do antissemitismo, a vida
italianas são forçadas a se retirar. caminhões e, com elas, aplainar o
dos judeus melhorara. Simone e
Os alemães, sob o comando de Alois solo”. Poucos sobreviviam muito
seus irmãos frequentavam a escola
Brunner, ocupam a Côte d’Azur. tempo a essa tarefa.
e participavam ativamente nas
Para os judeus, o perigo rondava
atividades do Escoteiros e das
cada esquina, pois para os nazistas, Uma prostituta que se tornara
Bandeirantes. A situação em Nice, e
tornara-se uma questão de honra pôr Kapo lhe salva a vida ao decidir
em toda Riviera Francesa, mudaria
um fim na vida judaica na Riviera. transferi-la para um anexo de
em setembro de 1943, quando
Auschwitz. Disse-lhe que ela era
após a assinatura do armistício
Em março de 1944, então com “muito bonita para morrer”. Simone
16 anos, Simone vivia com sua disse que iria se mudar, na condição
professora de letras, Madame de que sua mãe e irmã Madaleine
1
Fim dos exames secundários, hoje, Ensino
Médio, pré-universitário. de Villeroy. Usava o sobrenome pudessem acompanhá-la, o que

52
REVISTA MORASHÁ i 98

de fato aconteceu. Em julho de


1944, Simone com a mãe e a irmã
Madeleine foram transferidas para
Bobrek, perto de Birkenau. Nesse
ínterim, sua irmã Denise, então
com 19 anos, que fazia parte de
um grupo da Resistência em Lyon,
foi presa e, em 1944, deportada
para Ravensbruck. Ela conseguiu
sobreviver.

Em janeiro de 1945, pouco antes


da libertação de Auschwitz pelas
tropas soviéticas, ocorrida no Simone Veil, ministra da saúde, com Jacques Chirac, primeiro ministro, 1974
dia 27, os nazistas evacuaram o
campo e enviaram os prisioneiros a
Bergen-Belsen, numa das chamadas Em 1946, conheceu Antoine Veil,
“Marchas da Morte” durante as quais judeu, futuro Inspetor das Finanças
eles eram forçados a caminhar longas e empresário, durante umas férias
distâncias em direção à Alemanha, numa estação de esqui. Foi amor à
expostos ao frio extremo, sem roupas, primeira vista e Simone e Antoine
comida, água ou descanso. Simone, se casam em 26 de outubro. Eles
sua mãe e sua irmã contam-se entre viveram juntos durante 67 anos, até o
os poucos que sobreviveram. Ao falecimento de Antoine, em 2013. O
chegar em Bergen-Belsen, Simone é casal teve três filhos: Jean, advogado;
indicada para trabalhar no refeitório. Claude-Nicolas, médico, e Pierre
Sua mãe, muito enfraquecida, não François, advogado e presidente
conseguiu resistir e morreu de tifo, do Comitê Francês do Yad Vashem.
em março de 1945. Tanto Simone Claude-Nicolas faleceu em 2002.
quanto a irmã Madeleine ainda
estavam vivas quando os britânicos Em 1952, ela fica abalada por mais
libertaram o campo, em 15 de abril uma perda dolorosa. Sua irmã
de 1945. Madeleine morre com o filho Luc
De volta à França em um acidente de carro na estrada.
Ao voltar para a França ela estava Ela era a única pessoa com a qual
pronta para revelar o que era Simone chegou em Paris no dia 23 de podia falar sobre os anos passados
Auschwitz, os horrores vividos, mas maio de 1945. Assim como os outros nos campos.
tinha a impressão de que ninguém sobreviventes teria que enfrentar o
estava interessado em ouvir. Nunca duro desafio de reconstruir a vida. Carreira em ascensão
esqueceu, no entanto, o tempo Foi alojada no Hotel Lutetia, com
em que ficou presa nos campos outros sobreviventes dos campos, Simone se muda por algum tempo
nazistas e lutou para manter a viva recebendo um documento de para Wiesbaden e depois para
a memória dos crimes nazistas. De repatriamento, roupas e comida. Foi Sttugart, em função da carreira de
2001 até 2007 foi presidente da também informada de que havia sido Antoine. Formada em Direito e
Fundação pela Memória da Shoá. Ao aprovada nos exames de baccalauréat em Ciências Políticas, ela revela
deixar o cargo, tornou-se Presidente prestados antes de ser presa - a única ao marido que não quer desistir de
de Honra. Em 22 de dezembro de de sua turma a passar. uma carreira, como sua mãe fizera,
2004 aceitou retornar a Auschwitz, para ser apenas dona de casa. Na
com seus cinco netos, a convite do Ainda em 1945, ela entra na época, apenas 40% das francesas
diretor da revista Paris Match, Alain Faculdade de Direito e no Instituto trabalhavam e, ainda menos, no
Genestar. de Ciências Políticas de Paris. círculo da burguesia parisiense.

53 DEZEMBRO 2017
PERSONALIDADE

Decide entrar para a Magistratura, Em 1979, ela mesmo fumante,


onde passa a ocupar cargos no alto encabeça a luta contra o tabagismo
escalão, até chegar ao Ministério no país, impondo serias restrições.
da Justiça, de 1957 a 1959. Seu Manteve até julho daquele ano a
primeiro passo em direção à vida pasta da Saúde, quando abandonou
política foi participar do governo do o governo para participar, a pedido
primeiro-ministro René Pleven. Ela de Giscard d’Estaing, das eleições do
representou a França na Sociedade Parlamento Europeu. Simone presidiu
Internacional de Criminologia, o Parlamento Europeu de 1979 até
em 1959, e se dedicou a lutar por 1982, na primeira vez em que seus
reformas nas leis relativas à adoção, integrantes foram eleitos por sufrágio
e a adultos com necessidades simone veil e seu marido, antoine.
universal. Na época, o Parlamento
especiais. Indicada como assessora no nov. 2011 tinha poucos poderes, mas Simone lhe
Gabinete de Pleven, era encarregada deu visibilidade com sua atuação na
do relacionamento com a imprensa e na França a interrupção voluntária área de direitos humanos.
questões de leis civis e judiciárias. da gravidez. Na ocasião, Simone
teve que enfrentar uma oposição Em março de 1980, recebe o
Em 1970 foi indicada secretária do particularmente dura da Direita. Prêmio Athenae concedido pelo
Conselho Superior de Magistratura. Alguns deputados chegaram a Fundo Aristóteles Onassis por sua
Seu trabalho foi reconhecido ao acusá-la de “apoiar o genocídio contribuição para a reaproximação
ser nomeada Cavaleiro da Ordem e de comportamento similar ao dos povos e pelo respeito à dignidade
Nacional do Mérito e membro do dos nazistas”. No Parlamento, humana. Em 2005 é a vez do
Conselho da ORT da França e da proferiu um emocionante discurso Prêmio Príncipe das Astúrias para a
Fundação da França. em que revelou sua preocupação Cooperação Internacional.
sobre os riscos enfrentados pelas
Em maio de 1974, Valéry Giscard mulheres que realizavam abortos Volta a ocupar um cargo no governo
d’Estaing, presidente recém-eleito, clandestinos, cujo número aumentara da França, em março de 1993,
a escolheu como ministra de Saúde drasticamente na França. O projeto quando é nomeada ministra de
no gabinete do primeiro-ministro de lei foi aprovado na íntegra e a Estado dos Assuntos Sociais, no
Jacques Chirac.  Durante seu “Lei Veil” entrou em vigor em 1975. governo de Édouard Balladur, onde
mandato, Simone Veil conseguiu Após esse famoso embate político, o permanece até julho de 1995. Foi
que fosse aprovada pelo Parlamento jornal Nouvel Observateur concede- membro do Conselho Constitucional
a “Lei Veil”, que descriminalizou lhe o título de “Revelação do Ano”. entre 1998 e 2007.

Em 31 de outubro de 2007 publica a


autobiografia “Uma vida”, traduzida
para mais de 15 idiomas. Somente na
França foram vendidos mais de 550
mil exemplares.

Em 2008, é eleita para uma cadeira


na Academia Francesa de Letras,
uma distinção rara entre os políticos
do país. Sobre sua espada de Imortal,
criada pelo escultor tcheco Ivan
Theimer, foram gravados o número
que lhe fora tatuado em Auschwitz
– 78651 - e o lema “Liberdade,
Igualdade, Fraternidade” ao lado da
Simone entre o então primeiro ministro da polônia. D. Tusk; o então presidente
do parlamento europeu, o polonês Jerzy Buzek e o então primeiro ministro da
expressão “in Varietate concordia”,
bélgica, Yves LertemE. inauguração da praça simone Veil, bruxelas, 2011 unidos pela diversidade.

54
REVISTA MORASHÁ i 98

1 2 3
1. Simone Veil segura sua espada de Imortal, 2010. Ela foi eleita dois anos antes para Academia Francesa de Letras
2. com o Presidente Shimon Peres, 2008 3. com Nicolas Sarkozy, 2010

Após a morte de seu marido Simone faleceu em 30 de junho de


Antoine, em 2013, e de sua irmã 2017, sexta-feira, aos 89 anos, em
Denise Vernayem, no mesmo ano, sua residência em Paris. Segundo
Simone se afasta da vida pública. seu filho Pierre-François, a última
Ainda assim, manteve-se no coração palavra que pronunciou antes de
dos franceses. Em 2016 ainda morrer foi “obrigado”. Simone
aparecia nas pesquisas como a foi enterrada no Cemitério de
terceira personalidade preferida do Montpanasse, em Paris. Diante
país. de seu túmulo, seus filhos Jean
e Pierre-François recitaram o
“Sou judia” Kadish. A cerimônia fúnebre foi
conduzida pelo grão-rabino da
No artigo “Sou judia: o Kadish França, Haim Korsia. Foi muito
será recitado diante do meu simples, na presença apenas de
Simone Veil retorna a Auschwitz
túmulo”, Simone escreveu em pessoas muito próximas que ali
2005: “Nasci e cresci no seio de foram para prestar sua última
uma família francesa de longa jamais haviam deixado de lutar: a homenagem à uma mulher que,
data, fui francesa sem nenhum tolerância, o respeito dos direitos de após ter passado os horrores dos
questionamento. Mas ser judia, cada um e de todos, a solidariedade. campos de concentração nazistas,
o que isto significava tanto para Ambos morreram no exílio, deixou sua marca pessoal na história
mim quanto para meus pais, já deixando-me como única herança e na política da França. Sobre ela o
que, ambos agnósticos – como já o os valores humanistas que, para Journal Dimanche escreveu: “Numa
tinham sido meus avós –, a religião eles, o judaísmo representava. Desta época em que a política só inspira
estava totalmente ausente de nosso herança não me é possível dissociar desconfiança, Simone Veil será
lar? Do meu pai pude aprender que as lembranças sempre presentes, sempre lembrada como um exemplo
sua ligação com o judaísmo estava de certa forma obsessiva, dos seis de coragem e dignidade tanto
mais relacionada ao conhecimento e milhões de judeus exterminados pela sua trajetória pessoal quanto
à cultura que os judeus adquiriram pelo simples fato de serem judeus. profissional”.
ao longo dos séculos, em épocas em Seis milhões dentre os quais
que muito poucos tinham acesso meus pais, meu irmão e inúmeros
aos mesmos. Haviam permanecido familiares. Não posso me separar
como Povo do Livro, fossem quais deles. Isto é suficiente para que, até BIBLIOGRAFIA

fossem as perseguições, a miséria a minha morte, meu judaísmo seja Veil, Simone e Black,Tamsin, A Life .
imprescritível. Kindle edition
e a vida errante. Para minha mãe,
Deloeuvre, Guy, Simone Veil: Destin. Kindle
o judaísmo era uma questão de edition
um compromisso com valores O Kadish será recitado diante de
Jactance, Assoumou Ondo, Ce que serait
com os quais, ao longo de sua meu túmulo. Sou judia”. Seus filhos devenue la femme française sans Simone Veil.
longa e trágica história, os judeus atenderam sua vontade. Kindle edition

55 DEZEMBRO 2017
COMUNIDADES

Os judeus na Polônia entre


as duas guerras mundiais
Com a criação, em 1918, da Segunda República Polonesa, os
judeus acreditavam que passariam a ser aceitos na nova
nação com igualdade de direitos. Mas, nas duas décadas
de existência da República, as esperanças judaicas se
transformaram em desespero. Os sinais do precipício que os
iria tragar já se faziam ver. No entanto, apesar da hostilidade,
discriminação e isolamento, no período entre guerras o
judaísmo polonês forneceu grande vitalidade à vida judaica

N
o dia da invasão do Terceiro Reich, Varsóvia era a capital do novo estado, e os judeus que
1º de setembro de 1939, viviam na lá viviam desempenhavam um papel central na vida
Polônia 3,2 milhões de judeus – era a da cidade, da população judaica polonesa, bem como
maior comunidade judaica da Europa. dos asquenazitas do mundo todo. Em 1921, viviam em
Milhares de autores têm escrito Varsóvia cerca de 310 mil judeus, número apenas superado
detalhadamente sobre a Shoá, sem dúvida o mais por Nova York. A vida judaica na cidade era ao mesmo
doloroso período da História Judaica, e sobre o tempo tradicional e criativa, religiosamente ortodoxa e
extermínio de milhões judeus em terras polonesas. sionista, politicamente atuante. Era grande o número
Pouco, porém, tem-se escrito sobre o período em de partidos, instituições, organizações beneficentes e
que existiu a Segunda República Polonesa movimentos juvenis com sede na cidade.
(1918-1939), quando o endêmico e profundo
antissemitismo dos “poloneses étnicos” cresceu ainda No período entre guerras o judaísmo polonês forneceu
mais. E, infelizmente, sobrevive até os dias de hoje. uma poderosa, podemos até dizer inigualável, vitalidade
Neste 11 de novembro de 2017 houve em Varsóvia à vida judaica religiosa e secular, à sua cultura, ao teatro
uma manifestação durante a qual cerca de 60 mil iídiche, assim como à vida política, apesar da hostilidade
pessoas gritavam “Europa Branca”, “Fora, judeus” e e pobreza de grande parte da população, principalmente
“Retirem os judeus do poder”. após a Crise de 1929.

Em 1918, quando nasceu a Segunda República, os Era uma comunidade organizada, tinha suas próprias
cerca de 3 milhões de judeus que viviam no país eram escolas, ieshivot, hospitais, instituições assistenciais,
vistos como “elementos estranhos”, que ocupavam partidos políticos, editoras, jornais e teatros. Na Polônia
funções econômicas e posições de poder que deveriam se fortaleceram partidos e movimentos judaicos de
estar em mãos dos poloneses étnicos, e, para “o bem todas as tendências - sionistas, religiosos, socialistas,
da nação”, tais elementos deveriam ser removidos e revisionistas. Viviam na Polônia grandes rabinos e
substituídos por poloneses. talmudistas, importantes mestres chassídicos, líderes de

56
REVISTA MORASHÁ i 98

Cidade Velha de Varsóvia. É patrimônio mundial histórico e cultural, tombado pela UNESCO em 1966

movimentos juvenis que se tornaram Russo ficou com mais de 60% do de Lublin, Lódz, Mazóvia e Kielce.
heróis, renomados sionistas, território: a Ucrânia, Lituânia e O novo estado era uma monarquia
historiadores, artistas, escritores e Polésia, inclusive Varsóvia. Com constitucional, a princípio
músicos de renome. as anexações, a vida política semiautônoma em relação ao
A comunidade judaica polonesa era e econômica dos habitantes, Império Russo. O Czar da Rússia
a principal arena onde floresceram principalmente dos judeus, passa a era também o Rei da Polônia. A
diferentes linhas de pensamento depender das decisões tomadas em Polônia do Congresso constituía o
religioso, ideológico, político e Berlim, Viena e São Petersburgo. coração da Polônia étnica, centro
cultural. político e cultural; uma área
A Era napoleônica, de 1799 a 1815, econômica de grande importância.
Os anos que provocara mudanças geopolíticas
antecederam a em toda a Europa. Após a derrota Após o esmagamento de uma
independência de Napoleão, para trazer de volta revolta armada polonesa contra
a estabilidade, representantes o domínio russo – o Levante de
No final do século 18, desaparece dos países vencedores (Impérios Novembro (1830-1831) pelas
do mapa da Europa a Comunidade Austríaco e Russo, Prússia e Reino forças imperiais – a Polônia do
Polaco-lituana. Em 1772, 1793 Unido) reúnem-se, em 1815, em Congresso perde grande parte
e 1795 a nação foi invadida e Viena e redesenham o mapa da de sua semi autonomia. No ano
seu território anexado por seus Europa. No Congresso de Viena seguinte é abolida Constituição,
poderosos vizinhos. O Reino da é criado o Reino da Polônia, fechada a Assembleia Legislativa e
Prússia ficou com a parte ocidental mais conhecido como Polônia desmantelado o exército.
- Poznan, Silésia e Pomerânia até do Congresso, para distingui-lo
o Mar Báltico; o Império Austro- de reinos poloneses anteriores. Há uma intensificação da política
húngaro com o Sul, que incluía Seu território correspondia, de “russificação”. Em 1863, após ter
Galícia e Cracóvia; o Império a grosso modo, às regiões sido esmagada mais uma revolta,

57 dezembro 2017
COMUNIDADES

a Polônia do Congresso é 5 milhões, constituindo o maior


incorporada ao Império Russo e, em componente (40%) da população
1874, o nome oficial da região passa judaica mundial, à época.
a ser País do Vístula.
Era também substancial a população
No entanto, apesar das repressões judaica que vivia na Galícia (os
e ausência de estruturas políticas judeus Galitsyaner), que se tornara
formais durante mais de um século, uma província do Império Austríaco.
os poloneses mantiveram vivo o O Imperador José II sobe, em 1765,
anseio por um estado soberano. ao trono da Áustria. Entre todos
As lutas pela independência os governantes da época, ele foi o
fortaleceram o nacionalismo polonês. mais adepto às ideias iluministas,
Nesse período são levantadas Os judeus eram a maioria dos
habitantes desse shtetl na Galícia,
introduzindo inúmeras reformas,
questões do que era a “Polônia” na c.1910 inclusive em relação aos judeus. Em
ausência de um estado soberano 1781, aboliu o infame distintivo
e sobre a natureza da identidade mas tais esforços não tiveram, na amarelo nas roupas. No ano seguinte,
nacional. O nacionalismo polonês prática, nenhum impacto sobre as emitiu o Toleranzpatent - o “Edito
era profundamente católico e massas judaicas. Eles continuavam de Tolerância”, que, entre outros,
praticamente imune à secularização, a falar o iídiche; eram ortodoxos eliminou algumas das restrições
consequentemente, um “polonês – divididos entre Mitnagdim ou em vigor em relação à população
étnico”, um “verdadeiro polonês”, Chassidim. A educação judaica era a judaica. Entre as concessões estava
era necessariamente católico. Nesse tradicional, no cheder ou na ieshivá. a liberdade de viver onde quisessem,
período, o lugar das minorias dentro Casamentos com não-judeus eram apesar de não poderem adquirir
de uma futura nação soberana, raros, assim como conversões. imóveis, e podiam frequentar
principalmente dos judeus, é Os judeus eram orgulhosos de seu universidades. O Edito também
questionado. Com a criação de novos judaísmo, de suas lindas sinagogas, removeu algumas das restrições a
partidos políticos poloneses, o tema de seus Rebes e sábios... determinados ofícios e profissões
das minorias torna-se questão de liberais. Por outro lado, passaram a
extrema importância. Em 1772, após a primeira anexação, vigorar várias leis para acabar com as
milhões de judeus se tornaram particularidades do judaísmo.
Vida judaica antes os novos súditos indesejados e
da Independência desprezados pelo Império Russo. Na região anexada pelo Reino da
Num primeiro momento de seu Prússia, o nacionalismo polonês foi
Após a anexação dos territórios governo, a Czarina Catarina II, a reprimido e seu povo submetido
da Comunidade Polaco-lituana, Grande, concedeu-lhes o direito a uma política de germanização.
os impérios invasores viram sua de residência. Mas, em 1775, ela A população judaica teria status
população judaica aumentar promulga um decreto determinando legal separado até que a região foi
consideravelmente, e a vida dos seu confinamento numa parte de incorporada no arcabouço geral da
judeus passa a depender de cada seu Império, a chamada “Zona Prússia. Em 1812, a Prússia se torna
um dos soberanos. Viviam em sua de Residência” ou “Território o primeiro Estado a emancipar os
maioria, nas regiões anexadas pela do Acordo” – em russo, Cherta judeus.
Rússia e sua história será ainda mais Osedlosti. A área incluía parte da
sofrida do que a daqueles que ficaram Rússia Ocidental, a Ucrânia e os Na Polônia do Congresso eram
sob domínio da Prússia e da Aústria. territórios atuais da Bielorrússia, substancialmente diferentes do
Lituânia e Moldova. Na Cherta restante do Império russo as leis que
Assim como havia uma identidade viviam mais de 90% dos judeus do governavam os judeus. Em 1862, são
nacional polonesa, havia uma Império; seus maiores contingentes removidas as restrições legais sobre
enraizada identidade judaico- na região das atuais Polônia e eles, apesar de algumas terem sido
polonesa. Inúmeros foram os Bielorrússia. Em seu ponto alto, reintroduzidas pelo Czar após 1863.
esforços realizados pelos diferentes a Zona de Residência tinha uma O estatuto jurídico dos judeus que
governos para assimilar os judeus, população judaica de mais de viviam na Polônia do Congresso

58
REVISTA MORASHÁ i 98

ainda era preferível à dos judeus áreas econômicas e comerciais. No Segunda República
que viviam em outras partes do final do século, em Varsóvia, dos 26 Polonesa
Império. Esse fato, juntamente com principais bancos privados 18 eram
o desenvolvimento econômico da propriedade de judeus ou de judeus Em 1918, depois de 136 anos de
região na segunda metade do século convertidos ao catolicismo. E os ocupação, França e Reino Unido
19, levou muitos judeus a migrarem judeus se destacavam cada vez mais decidem restabelecer um estado
para lá. Foi particularmente grande nas profissões liberais. polonês soberano, a Segunda
o influxo dos chamados Litvaks, os República Polonesa. Os impérios
judeus originários de Lita, palavra em O crescimento de uma classe que tinham anexado o território
iídiche que identificava a Lituânia. média urbana católica, aliado ao polonês no final do século 18
fortalecimento do nacionalismo, haviam entrado em colapso.
Nas últimas décadas do século 19, já levam à exacerbarão das relações Áustria-hungria e Alemanha,
emancipados, os judeus se organizam entre os “poloneses étnicos” e derrotadas militarmente, estavam
politicamente. Um de seus maiores população judaica. As acusações arrasadas internamente. Na Rússia,
problemas era a atitude a ser tomada contra os judeus de práticas a Revolução de 1917 depusera
em relação aos vários concorrentes comerciais “desleais” e de o Czar e o país estava engolfado
à hegemonia sobre os territórios da “separatismo” vão ressoar doravante numa sangrenta guerra civil entre
antiga Comunidade Polaco-lituana com força. os bolcheviques e as várias forças
onde viviam. Nas rebeliões armadas contrárias a eles, inclusive polonesas.
dos poloneses de 1830-1831 e 1863, A criação, em 1897, do Endecja
haviam participado milhares de (ou Endeks), partido nacionalista No Tratado de Versalhes de 1919,
judeus. Muitos acreditavam que a de extrema-direita, profundamente que encerrou oficialmente a 1a
independência polonesa levaria ao antissemita, é sintomática do forte Guerra Mundial, os termos impostos
desaparecimento do antissemitismo. crescimento do anti-judaísmo. As à Alemanha incluíam a perda de
Mas, a “indecisão” demostrada pela raízes econômicas e políticas do uma parte de seu território para
população judaica no primeiro novo antissemitismo (sem contar nações fronteiriças. A Polônia
momento sobre quem deveriam a tradicional vertente religiosa) acabou ficando com territórios
apoiar não seria esquecida pelos manifestaram-se, claramente, dos Impérios Austro-húngaro e
poloneses. em 1912, quando o Endecja Alemão – entre outros, a Província
organizou um boicote às empresas de Posen, outrora parte da Grande
No final do século 19, os judeus eram de proprietários judeus. Na véspera Polônia, “berço da nação polonesa”,
um elemento basicamente urbano em da 1ª Guerra Mundial, as relações e a parte leste da Alta Silésia. Ficou,
uma região grandemente camponesa. entre poloneses e judeus estavam também, com parte do território
Eram um grupo econômico distinto, extremamente tensas. que a Rússia perdera no Tratado de
uma minoria mais educada cuja
fé, idioma e costumes diferiam
Meninos estudando no cheder. Lublin, Polônia, 1924
frontalmente dos da maioria. Apesar
da emigração em grande escala para o
continente americano, nos territórios
da atual Polônia cerca de 14% dos
habitantes eram judeus, sendo que
em inúmeras cidades eram uma
grande parcela dos habitantes e, nos
shtetls, muitas vezes a maioria.

Os judeus haviam desempenhado


importante papel na urbanização e
industrialização da Polônia, inclusive
em empreendimentos comerciais e
financeiros. A média e alta burguesia
judaica se destacava em todas as

59 dezembro 2017
COMUNIDADES

Brest-Litovski1. Depois de anexar a Alegavam que outras nações não em relação a estrutura de um estado
região da Galícia oriental, a Polônia, tinham o direito de interferir polonês independente apresentava
no decorrer da Guerra Polaco- nos assuntos internos e que esses duas vertentes principais. A da
soviética (1919-1921), consegue tratados eram fruto do lobby direita acreditava que deveria
expandir-se mais para leste. judaico-americano. As negociações haver uma completa identificação
A guerra era, em parte, o resultado desses tratados ocorriam enquanto do Estado com a nação polonesa
da insegurança dos poloneses em na fronteira russo-polonesa eclodiam étnica – ou seja, com a população
relação às fronteiras orientais por pogroms. polonesa e católica. A extrema
causa da Guerra Civil na Rússia. direita, o Endecja, ia além, queria um
Mas, a verdade é que o Marechal Que papel as minorias teriam no estado polonês católico de domínio
Józef Piłsudski, revolucionário e novo Estado era uma pergunta que exclusivo dos poloneses étnicos.
líder das forcas armadas, viu nesta muitos poloneses étnicos se faziam. A esquerda e centro se inclinavam
instabilidade a oportunidade de Por que “estrangeiros” detinham o para uma “parceria” mais ampla do
expandir as fronteiras do jovem controle da indústria, comércio, e Estado com as minorias. Poloneses
estado, como de fato ocorreu. de outros setores fundamentais à étnicos eram “os primeiros entre
economia? A bem da verdade, os iguais”, mas a Polônia seria um
Em 1921, quando foram definidas judeus não eram o único alvo dessa estado de muitas nacionalidades.
as fronteiras, a Segunda República hostilidade. Milhões de cidadãos Parecia não haver muito espaço
da Polônia era o sexto maior país da das antigas potências imperiais eram para os milhões de habitantes não
Europa, contando com 27,2 milhões também vistos como “estrangeiros” poloneses que viviam no território
de habitantes. Destes, cerca de 11 usurpadores da riquezas e direitos da Segunda República, muito menos
milhões eram minorias. Os judeus dos poloneses. Havia, porém, uma para a população judaica.
chegavam a 3 milhões. diferença básica: todos, a não ser os
judeus, tinham um “estado-irmão” Os judeus na Polônia
Em teoria, as minorias, inclusive a ao qual podiam recorrer mesmo não independente
judaica, eram protegidas por tratados sendo cidadãos. Os judeus estavam
internacionais assinados pelos recém- sós. A criação de um estado polonês
criados estados na Conferência de soberano não levou, como muitos
Paz de Versalhes, em 1919. Entre Na época da criação da Segunda judeus acreditavam, a uma
outros, esses tratados garantiam a República, o pensamento político aproximação com os não judeus.
liberdade religiosa e a igualdade civil;
asseguravam o direito das minorias
Interior da Sinagoga Velha de Cracóvia
de manter suas tradições sem ser
discriminadas, e seus idiomas. Entre
as garantias dadas aos judeus, em
particular, estava o respeito ao Shabat
por parte do Estado.

Os tratados das minorias não foram


bem recebidos pelos recém-criados
Estados. Polônia, assim como
Romênia, resistiram fortemente.

1
Tratado de Brest-Litovski, assinado
em março de 1918 entre o novo
governo russo e as Potências Centrais 
(os Impérios Alemão, Austro-húngaro,
Otomano e a Bulgária), reconhecia a
saída da Rússia do conflito. A Rússia foi
obrigada a abrir mão da Finlândia, Países
Bálticos, Polônia, Bielorrússia e Ucrânia.

60
REVISTA MORASHÁ i 98

Nenhum tratado internacional


poderia mudar a atitude polonesa
em relação a eles. Os judeus
eram vistos como “elementos
desnecessários”, até mesmo
“prejudiciais”. Eles eram “estranhos”,
sem nenhum direito legítimo
de estar na Polônia. A Igreja
católica para qual a esmagadora
maioria de poloneses se voltava
1 2
em busca de orientações morais,
era profundamente impregnada de
doutrinas antijudaicas e preconceitos
antissemitas. Apesar do Papa
Pio XI ter dito, em 1938, que o
antissemitismo era “inadmissível”,
ele próprio, enquanto Núncio
Apostólico da Polônia, em 9 de
janeiro de 1919, época marcada por
pogroms, escreveu numa carta ao
Cardeal Pietro Gasparri, Secretário
de Estado do Vaticano: “Uma das
influências mais fortes e nocivas aqui
sentidas, talvez a mais forte e a mais
3 4
nociva de todas, é a dos judeus”.
1. Duas meninas judias. Varsóvia,1930 2. Karcelak, mercado das pulgas ao
ar livre. Varsóvia, 1930 3. Judeu trabalhando em uma malharia. Grodziks,
Ademais, a 1 Guerra e a
a
na Voivódia, província da Grande Polônia, 1930 4. Lendo as notícias em um
independência polonesa haviam jornal em iídiche. Varsóvia,1930

deixado um legado de profunda


amargura. Para os poloneses, os Outros milhares foram mortos massa só terminou quando os Aliados
anos de Guerra provaram que os no decorrer da Guerra Polaco- ameaçaram intervir; mas as matanças
judeus eram “anti-poloneses”, “pró- soviética (1919 -1921), quando as esporádicas seguiram em frente.
bolcheviques” e “pró-ucranianos”. forças polonesas invadiram regiões
Para a população judaica, foram anos onde viviam um grande número Apesar do derramamento de
extremamente trágicos. Milhares de judeus ucranianos. O soldado sangue judaico, em termos jurídicos
foram mortos pelos russos tanto típico, camponês-polonês, era a situação da população judaica
durante a invasão do território católico fervoroso e crescera sendo na Polônia independente era
do futuro Estado polonês, como alimentado com ideias antijudaicas. aparentemente excelente. Eram
na retirada de seu exército. Em Seu ódio crescia ainda mais ao grandes as esperanças de um futuro
inúmeras ocasiões os judeus foram identifica-los com os odiados pacífico lado a lado aos poloneses.
apanhados entre forças inimigas bolcheviques. No avanço ou retirada
– entre os poloneses e os lituanos de suas tropas, os polacos devastavam As esperanças não demoraram a
em Vilna, entre os poloneses e os comunidades judaicas inteiras, que cair por terra. Os líderes judeus
ucranianos em Lvov, e entre os já haviam sido massacradas pelos encontravam dificuldades em
poloneses e os bolcheviques durante russos e ucranianos. Eles invadiam assegurar a implantação dos termos
a guerra de 1920. Como se não os bairros judeus, bombardeando do Tratado das Minorias. Os
bastasse, haviam-se tornado alvo casas, incendiando lojas, enfileirando dois elementos fundamentais da
de uma campanha polonesa de os judeus que capturavam para os autonomia judaica – a escola e a
terror e pogroms. Os dois principais fuzilar. Cerca de 30 mil judeus foram Kehilá (comunidade organizada)
ocorrerem em Lvov, em 1918, e em mortos, outros milhares feridos, – não foram autorizados a se
Vilna, em 1919. mulheres violadas. O assassinato em desenvolver livremente. Ademais,

61 dezembro 2017
COMUNIDADES

a República Polonesa chegou eleitoral que afetaria a representação e o governo adotou a política de
a tolher os poderes das Kehilot, proporcional das minorias no Sejam estatismo, uma forma de capitalismo
restringindo-as a funções puramente (Parlamento), os judeus reagiram de Estado. No campo econômico
religiosas. Os dispositivos legais formando uma frente unida para essa política implica uma
discriminatórios remanescentes concorrer às eleições. Em 1922, o forte intervenção do Estado
contra os judeus nos territórios “bloco das minorias” conseguiu uma que atua como empresário em
herdados do Império Russo e substancial vitória. A facção judaica diversos setores.
Austríaco permaneceram até 1931. elegeu 35 dos 444 membros do Sejm,
Nesse ínterim, uma série de medidas Câmara de Deputados. Mas a união As medidas antijudaicas adotadas
tornou o tratado ineficaz e, em entre as minorias não perdurou e a pelo governo, que podemos definir
1934, diante da aprovação pública, o influência dos partidos judaicos foi como um “pogrom morno”, era
governo o repudiou. diminuindo. resultado dessa política, aliado a uma
grande dose de antissemitismo.

À medida que o estado passa a


controlar toda a economia, as
políticas econômicas arruinaram
muitos dos grandes comerciantes e
industriais judeus, assim como os
pequenos empresários tradicionais.
Uma lei que obrigava a todos os
cidadãos o descanso dominical
acabou arruinando os lojistas
judeus que perderam o lucrativo
comércio dos domingos. Até os
artesãos passaram a necessitar de
licença para trabalhar. Ademais, os
judeus deixaram de ser contratados
para trabalhar na administração
pública, em bancos e monopólios
estatais. Milhares foram demitidos
de fábricas de cigarro quando o
Estado assumiu o monopólio do
tabaco. Outros tantos ficaram
sem emprego em outros setores
Manifestação sionista. Chelm,1932
controlados pelo estado. Líderes
judeus chegaram a acusar o governo
de estar promovendo “o extermínio
Mas os judeus poloneses eram Política de Estado econômico dos judeus poloneses”.
resilientes, determinados a lutar Esse processo, já perceptível no
pelos seus direitos na arena política. Em termos da História Judaica, final do século 19, foi acelerado de
A política judaica atingira nesse país o que distingue o período antes forma tremenda por um governo que
seu mais pleno desenvolvimento. da 1ª Guerra daquele entre as queria todas as principais posições
O sionismo, que emergira em duas Guerras é a política de econômicas em mãos de elementos
meados do século 19, era uma força Estado abertamente antissemita. “leais”, a dizer, poloneses étnicos.
política não apenas na comunidade, Em tempos caracterizados pelo
mas também na política nacional, papel dominante que o governo Em 1926, em meio a profunda crise
e internacional. Quando o governo assumira na vida econômica, essa econômica e uma inflação galopante,
polonês, que, no início, era discriminação foi desastrosa. o marechal Józef Piłsudski, herói
constituído por partidos de centro Na década de 1920, a situação nacional, dá um golpe de Estado
e direita, tentou adotar um sistema econômica da Polônia era grave e assume o poder, instalando um

62
REVISTA MORASHÁ i 98

governo autoritário. A princípio, seu não judeus, em parte pelo fato de Joint Distribution Committee -
governo tem uma atitude positiva em terem sido barrados do serviço JDC), organização de assistência
relação aos judeus. Apesar de odiá- público onde os empregos eram humanitária norte-americana2,
los, pessoalmente – como demostrara mais seguros, e porque era pequeno sustentava mais de 150 mil famílias
durante a Guerra Polaco-soviética o número de trabalhadores judeus e fornecia fundos para a TOZ e
– um dos primeiros atos de Piłsudski nas grandes empresas. A maioria outras congêneres. Mas a ajuda
foi acabar com a política antissemita trabalhava em pequenas oficinas que acabou sendo reduzida por causa
do governo. Centralizando a maior rapidamente foram à falência. da Grande Depressão de 1929
parte de suas atenções nos assuntos e, após 1933, pela necessidade
de defesa e relações públicas, ele não Em 1931, um milhão de judeus de enviar recursos para ajudar
demostrava um interesse especial estavam desempregados. Lódz, os judeus alemães vítimas da
em relação à “questão judaica” e importante centro têxtil, fora perseguição nazista.
nem exibia em público sentimentos transformado num necrotério
contrários aos judeus. Um líder industrial. Em Lvov, 29 % dos Cresce o fascismo
sionista, Apolinary Hartglas, judeus estavam sem emprego. polonês
escreveu que, no primeiro ano do Em 1931, em Varsóvia, onde dois
governo de Piłsudski, a “propaganda de cada cinco habitantes eram Com a Crise de 1929, as ideias
antissemita cessara ... ninguém se judeus, 34% da força de trabalho de Piłsudski de um Estado que
atrevia mais a publicar listas negras judaica estava desempregada. A abrangesse todos os cidadãos deu
de poloneses que ousavam comprar Beth Lechem, uma entidade de lugar à ideologia nacionalista. Com
de estabelecimentos judeus… assistência social judaica, mantinha a paralização de um segmento da
ninguém atacava ou surrava os judeus vans nas ruas oferecendo chá e economia nacional após o outro, os
...”. No entanto, nenhum avanço pão para que judeus famintos não camponeses, o proletariado urbano
foi feito em relação às minorias, caíssem de fraqueza. A Sociedade e a classe média polonesa começam
principalmente a judaica. de Proteção à Saúde dos Judeus a vociferar cada vez mais seu
(TOZ), fundada em 1921, forneceu descontentamento.
O banimento de Piłsudski ao em seus relatórios a trágica As classes privilegiadas polonesas –
antissemitismo “oficial” veio muito evidência do colapso econômico os grandes industriais, a oligarquia
tarde para poder ajudar a população de sua gente. As comunidades nobre, assim como os latifundiários
judaica. Menos de três anos mais judaicas do exterior ajudavam como e a Igreja – donos de grande parte
tarde, a Crise de 1929 atinge a podiam; o Joint (American Jewish das terras cultiváveis da Polônia,
Polônia e o país entra em profunda
depressão econômica. Empresas
faliram e havia desemprego em
massa entre os trabalhadores
e os agricultores. Os que mais
sofreram foram os judeus, que, já
enfraquecidos economicamente pelo
estatismo, foram alijados para uma
marginalização econômica da qual
nunca se recuperaram.
O desemprego entre sua população
era bem maior do que entre os

2
Fundada em 1914, seu propósito inicial
era arrecadar e distribuir fundos para
ajudar as populações judias da Europa
Oriental durante a 1ª Guerra. Na década
de 1920, o JDC se tornou a principal
agência para socorro e reabilitação dos
judeus no exterior. varsóvia, 1930

63 dezembro 2017
COMUNIDADES

não estavam dispostos a 12 de maio de 1935, o ódio aos De 1935 em diante, a violência
implementar as mudanças judeus aumentou; parecia que com irrompeu em um clima de ardorosa
necessárias no tecido econômico do sua morte as forças que o haviam retórica e de atividades políticas,
país, que implicaria necessariamente contido se desencadearam. Uma com distúrbios organizados em
na perda de seus privilégios, para variedade de grupos paramilitares 50 cidades polonesas que deixaram
sanear a economia. Esses grupos fascistas, apoiados pelos muitas mortes. Em março de
usaram o antissemitismo da acontecimentos na Alemanha, 1936 um pogrom em Przytyk, um
população ao máximo para ocultar proliferam pelo país inteiro, shtetl perto de Radom, deixou dois
das massas trabalhadoras e dos abertamente estimulados pela judeus mortos e muitos feridos.
camponeses a verdadeira origem das propaganda católica. Os grupos Em julgamentos subsequentes dos
dificuldades econômicas que a nação paramilitares mais notórios eram envolvidos, os defensores judeus
enfrentava. Endeks e Naraso. Vagando pelas receberam penas muito mais pesadas
ruas à procura de judeus, os grupos que os atacantes. Milhares de
A maioria dos poloneses estavam fascistas provocavam badernas, judeus participaram de marchas de
convencidos de que a economia, distúrbios públicos, atacando protesto em Radom e outros lugares
e consequentemente sua situação, brutalmente os judeus nas ruas da Polônia. O clima entre judeus e
melhoraria se os judeus fossem e nos trens. Lojas e residências não judeus se intensifica e cresce o
eliminados, ao menos da esfera judaicas eram saqueadas. número de pogroms.
econômica.
Uma campanha ativa, semioficial, Um boicote econômico foi iniciado
As atitudes políticas dos poloneses procurou limitar o acesso dos tendo amplo apoio da população,
étnicos passaram a variar de judeus à instrução superior, com o e a aprovação da Igreja e membros
profunda hostilidade da direita a fatídico numerus clausus. Os poucos do governo. Em 1936, uma carta
uma atitude cautelosa da esquerda. que conseguiam ser aceitos nas pastoral do Cardeal Hlond, Primaz
Os partidos da direita, como o universidades eram perseguidos; da Polônia, publicamente conclama
Endeks, defendiam abertamente a em inúmeras universidades eram a população de aderir ao boicote.
completa eliminação dos judeus da obrigados a assistir às aulas nos O primeiro Ministro Felicjan Sławoj
sociedade e dos postos de emprego “bancos do gueto”. Składkowski o endossa, com a única
remunerado e sua imigração em ressalva de “não violência”.
massa. Os socialistas, embora
condenando os ataques físicos e No início de 1937 formou-se
verbais violentos que ocorriam um novo agrupamento político,
na época contra os judeus, não o OZON, “campo da unidade
estavam imunes ao antissemitismo. nacional”. A ênfase dessa facção
Havia inclusive socialistas entre política, que dominou até a invasão
aqueles que preconizavam a partida alemã, era sobre os princípios
em massa da população judaica. totalitários e os laços católicos.
O partido dos Camponeses, que Era extremamente antissemita,
se opusera ao antissemitismo não aceitando membros judeus,
na década de 1920, em meados preconizando leis discriminatórias
da década de 1930 declara que e também exigindo a emigração
os judeus eram uma “nação judaica.
estrangeira”, endossando o incentivo
à emigração judaica. Nos primeiros anos da república,
o antissemitismo embora um fato
A partir de 1933, o problema da aceito, era contido; em 1938 era
sobrevivência judaica se complicava. aberto e unia governo e oposição.
Um antissemitismo cuidadosamente Na época, chegou a ser cogitada
cultivado somou-se ao desastre a imigração de judeus para o
econômico da Grande Depressão. Pôster comemorativo dos Jogos Madagascar. Eles eram vistos como
Atléticos Shtern, em Varsóvia.
Após a morte de Piłsudski, em 31 maio - 2 junho 1933 um “empecilho” ao progresso da

64
REVISTA MORASHÁ i 98

Fotos de judeus que pereceram durante a 2a Guerra Mundial em um dos poucos edifícios remanescentes na Rua Prozna, Varsóvia

Polônia. Alguns círculos liberais parlamento havia sido imensamente chegava mais perto do status de
e socialistas saíram em defesa reduzida a partir de 1935. “capital da Diáspora Judaica”. Nos
do judaísmo, mas suas vozes se A resposta política dos judeus dias que antecederam a invasão
perderam. foi voltar-se para o nacionalismo alemã, a atmosfera entre os judeus
judaico. O colapso econômico e da cidade era uma mistura de medo
A verdade era que para a maioria crescimento do antissemitismo e euforia patriótica. A medida
dos poloneses, a Polônia sofria de levaram a uma maior radicalização que aumentava a probabilidade de
uma “superpopulação judaica” e dos partidos e movimentos. uma guerra, eles ingressavam na
sua emigração em massa era uma mobilização civil e militar. Estavam
necessidade premente. Muitos À medida que desapareciam as aliviados em perceber que, ao menos
judeus pensaram em deixar o país. esperanças de uma autonomia nessa crise suprema, os poloneses os
Em 1936, Vladimir Jabotinsky, judaica e de um avanço pacífico, aceitavam. Grave engano.
cognominado Ze’ev, que fundou o ganharam mais adeptos as soluções
Movimento Revisionista Sionista mais extremas para a “questão No dia 1º de setembro, quando
Betar, declarou publicamente que judaica”. Dentro do Movimento a Alemanha nazista invadiu a
os judeus deviam deixar a Polônia. Sionista cresceram as facções Polônia, viviam no país 3,3 milhões
Mas a pergunta era: para onde? Na socialistas e a Direita Revisionista, de judeus, quase 10% do total de
década de 1930 inúmeros países, encabeçada por Jabotinsky, assim seus habitantes. Quando a guerra
para não dizer a grandíssima como o Partido Sionista Religioso, terminou, entre 50 a 70 mil estavam
maioria, não hesitavam em declarar o Mizrahi. O Bund disputava o ainda vivos na Polônia, e outros 180
sua má-vontade em recebê-los. terreno com o Comunismo e o mil na União Soviética. Três milhões
Sionismo Socialista. Aumentam de judeus poloneses haviam sido
Os judeus poloneses estavam os movimentos como o Halutz, assassinados.
cercados de hostilidade. Sem HeHalutz Hatzair, Hashomer
poder contar com aliados Hatzair, que resultaram na
poloneses, tampouco com nações- emigração em larga escala para Eretz
irmãs, os partidos judaicos e Israel. BIBLIOGRAFIA
os líderes da comunidade não Wasserstein, Bernard,On The Eve: The Jews
of Europe before the Second World War. eBook
conseguiam influenciar o curso dos Em 1939, Varsóvia com seus 381 Kindle
acontecimentos. A participação mil judeus, número maior do que Gold, Ben-Zion, The Life of Jews in Poland
dos partidos judaicos no em qualquer cidade do continente, before the Holocaust: A Memoir. eBook Kindle

65 dezembro 2017
DESTAQUE

O avanço da extrema direita


na Alemanha
POR JAIME SPITZCOVSKY

Nas últimas eleições gerais alemãs, em setembro, pela primeira


vez desde a Segunda Guerra Mundial, um partido de extrema
direita conquistou cadeiras no Bundestag, o Parlamento
federal. Trata-se do maior desafio para a Alemanha
depois de 1945, avaliou o Conselho Central dos Judeus,
principal entidade comunitária no país

O
“Alternativa para a Alemanha” (AfD), O resultado eleitoral do AfD se insere no avanço da
com sua plataforma populista e xenófoba, extrema direita europeia, impulsionado por fatores
contabilizou 13% dos votos na eleição como recentes ataques terroristas na Europa e pela
de 24 de setembro, resultado responsável onda antiglobalização, já verificada com a vitória
por ofuscar a vitória da primeira-ministra do “Brexit”, em junho de 2016. A mobilização dos
Angela Merkel, que conquistou seu quarto mandato partidos populistas e anti-imigração se intensificou
consecutivo. Ela lidera o governo, com seu partido CDU ainda com a crise dos refugiados, com a chegada, ao
(centro-direita), desde 2005. velho continente, de mais de 1 milhão de pessoas
fugindo da violência e da guerra em países como Síria
“Parabéns a nossos aliados do AfD por seu resultado e Iraque.
histórico! É um novo símbolo do despertar dos povos
da Europa”, reagiu Marine Le Pen, líder da Frente Além da Alemanha, a França também testemunha
Nacional, partido de extrema direita na França. “A avanço recente da extrema direita. Embora Emmanuel
entrada do AfD no Bundestag é um grande choque”, Macron tenha vencido as eleições presidenciais de
opinou o Pierre Moscovici, socialista francês que ocupou maio com 66% dos votos, sua adversária, Marine Le
o Ministério de Assuntos Europeus entre 1997 e 2002. Pen, alcançou a marca de 34%, recorde histórico para
Mas, acrescentou, a “democracia na Alemanha do pós- seu partido, a Frente Nacional.
guerra é forte”.
Merkel e Macron, entre outros líderes internacionais,
Ronald Lauder, presidente do Congresso Judaico enfrentam desafios históricos, com objetivo de desfazer
Mundial, escreveu: “É abominável que o AfD, um a ameaça representada por grupos baseados em
movimento reacionário e vergonhoso que lembra o pior plataformas xenófobas e anti-imigração. Nos próximos
do passado da Alemanha e que deveria ser banido, agora anos, Alemanha e França, por exemplo, terão de
conta com a capacidade, dentro do Parlamento alemão, conquistar avanços em áreas como luta antiterrorismo
de promover sua plataforma vil”. e na absorção social e econômica de refugiados, a fim

66
REVISTA MORASHÁ i 98

Reichstag, sede do parlamento alemão, berlim

de esvaziar o discurso de partidos consolidar a liderança de Berlim no apoiada na crítica ao projeto de


como o AfD e a Frente Nacional. continente. resgate financeiro, correspondia a
um “novo tipo de partido, que não
A economia representa também À época, o porta-voz do AfD, Bernd é de direita nem de esquerda”. Em
sério desafio para Merkel e Macron. Lucke, afirmou que sua organização, 2013, na primeira eleição federal, os
O AfD conquistou votações adversários da política europeia de
expressivas em regiões da antiga Merkel não conseguiram ultrapassar
Alemanha Oriental, que ainda a barreira de 5% dos votos, mínimo
apresenta taxas de desemprego exigido para entrar no Bundestag.
maiores do que no restante do país.
Na Saxônia, a extrema direita alemã As eleições para o Parlamento
ultrapassou a barreira dos 25% dos europeu, no ano seguinte, registraram
sufrágios e, na Turíngia, alcançou avanço do AfD, ao amealhar 7% da
22%. votação. A agenda de campanha se
apoiou essencialmente no fim da
O AfD surgiu em 2013 com adoção da moeda comum, o euro.
uma plataforma essencialmente
econômica. Seus líderes criticavam Em 2015, a crise de refugiados
as iniciativas governamentais de resultou na ampliação do discurso do
canalizar recursos a países europeus AfD, com a inclusão de elementos
em crise, como Grécia, Portugal anti-imigração. A primeira-ministra
e Espanha. Merkel adotou um Angela Merkel adotou a política
programa de ajuda financeira com da “porta aberta”, o que resultou na
o objetivo principal de manter chegada de mais de 1 milhão de
a coesão da União Europeia e angela merkel pessoas ao país.

67 DEZEMBRO 2017
DESTAQUE

O AfD também critica as


relações atuais entre Israel e
Alemanha. Desde o pós-guerra,
nos anos 1950, em estratégia
arquitetada pelos líderes israelense
David Ben-Gurion e o alemão
Konrad Adenauer, os dois países
construíram importantes parcerias
nos campos político, econômico e
militar.

Merkel, por exemplo, se refere aos


laços com Israel como “relação
bilateral especial”. Alexander
Gauland questionou a diretriz do
governo alemão. “Se a existência de
A EXTREMA DIREITA E OS POPULISTAS NO PARLAMENTO EUROPEU Israel é parte do interesse nacional
alemão, então teríamos de estar
preparados para enviar soldados
A Alemanha passou a testemunhar imperador, e os britânicos, de Nelson
alemães para defender o Estado
a ascensão de discursos xenófobos e Churchill, nós temos o direito de
judeu”, o que, acrescentou o líder
em um nível inédito desde o fim nos orgulhar dos soldados alemães
do AfD, seria “problemático” e
da Segunda Guerra Mundial. O em duas guerras mundiais”.
“difícil”.
AfD ocupou espaço que antigos
grupelhos de extrema direita, como Os alemães são o “único povo do
Gauland também reservou discurso
o NPD, jamais haviam conquistado mundo a plantar um monumento de
ofensivo para Angela Merkel, a
em décadas passadas. vergonha no coração de sua capital”,
quem chamou de “ditadora”. Logo
declarou, em referência ao memorial
após as eleições, o líder da AfD
Discursos de líderes do AfD às vítimas do Holocausto em Berlim,
defendeu a criação de um comitê
geram extrema indignação e Bjorn Hocke, liderança da extrema
para investigar a política migratória
preocupação. Alexander Gauland, direita no estado de Turíngia. Para
da atual primeira-ministra. “Vamos
um dos mais vocais dirigentes do Hocke, do AfD, a população da
recuperar nosso país e nosso povo”,
partido, declarou: “Se os franceses Alemanha apresenta a “mentalidade
declarou Gauland.
corretamente se orgulham de seu de um povo totalmente derrotado”.
Com 94 das 709 cadeiras do
Bundestag, o AfD conquistou,
além de resultado histórico,
importante plataforma para
vociferar seu radicalismo. Se o
avanço da extrema direita na
Europa provoca temores, em um
país com o passado trágico como
a Alemanha, as preocupações são
ainda mais intensas.

Jaime Spitzcovsky foi editor


internacional e correspondente da
afd ganha popularidade com sua forte postura anti-imigração e anti-islamismo Folha de S. Paulo em Moscou e em Pequim

68
HISTÓRIA DE ISRAEL

A “QUESTÃO DAS TERRAS”


NA PALESTINA BRITÂNICA
POR reuven faingold

No século 20 dois nacionalismos lutavam, sem trégua,


no Oriente Médio, por um único pedaço de território:
árabes e judeus pretendiam ocupar o lugar da Grã-Bretanha.
Num disputado jogo de xadrez. quem soubesse movimentar
melhor as peças seria o vencedor

A
“Declaração Balfour” é de grande questão da posse das terras de Eretz Israel. A suposta
importância na história judaica moderna, pois “usurpação das terras” pelos colonos judeus é um tópico
nesse documento a Grã-Bretanha declarava constantemente utilizado pela propaganda árabe. A
“encarar favoravelmente o estabelecimento verdade, como veremos adiante, é que os judeus não
na Palestina de um Lar Nacional para o Povo usurparam as terras, mas as compraram de latifundiários
Judeu”. No entanto, antes de apoiar a causa sionista, árabes.
comprometia-se também com os árabes quanto à
formação de um Estado único e independente. A CORRESPONDÊNCIA
MC MAHON-HUSSEIN
Apesar de serem vagas e contraditórias as promessas
britânicas, historiadores concordam que a Às vésperas da 1ª Guerra, o Império Otomano
“Correspondência Mc Mahon - Hussein”, os “Acordos compreendia Síria, Líbano, Iraque, Palestina,
Sykes-Picot” e a “Declaração Balfour” são os documentos Transjordânia ( Jordânia), parte da Península Arábica
que decidiriam o futuro do Oriente Médio após o e Turquia. Em 1914, o Egito se tornaria oficialmente
desmembramento do Império Otomano no final da colônia inglesa. Em reação às mudanças geopolíticas,
1a Guerra Mundial. o sultão inicia uma “Guerra Santa” (jihad) contra os
aliados1, estratégia comum para fazer com que os estados
Parece-nos adequado analisar esse intenso processo islâmicos se revoltassem contra o domínio anglo-francês.
político ocorrido entre 1914 e 1917, pois envolve a
No momento da declaração da 1a Guerra, o mundo
1
NR. Em relação à história da 1a Guerra Mundial, usa-se o árabe se solidarizou com o Império Otomano, com a
termo “aliados” para os países que assinaram uma aliança militar intenção de impedir uma maior penetração dos europeus
chamada a Tríplice Entente: o Reino Unido, a França e o Império
Russo (a Rússia se retiraria após a Revolução Russa de 1917), para na região e impossibilitar uma eventual conquista dos
lutar contra os Impérios Centrais, o Império Alemão e a Áustria- territórios islâmicos pelas potências cristãs. Os árabes
Hungria, e o Império Otomano. aproveitariam esse apoio para ganhar, do governo turco,

69 dezembro 2017
HISTÓRIA DE ISRAEL

concessões e autonomia. No entanto, assegurasse a coroa do futuro divididas entre Inglaterra e França.
nas províncias árabes, assim como Reino Árabe após a Guerra. Este Os planos de uma “Grande Síria”
na Península Arábica, o anseio movimento nacionalista árabe teve (incluindo a Palestina otomana) sob
pela emancipação era maior e a início em 1915-1916. A promessa de influência francesa era má ideia,
diplomacia britânica trabalhava unificação e independência árabe era principalmente para uma população
para o rompimento definitivo da uma grande farsa diplomática, pois a judaica ligada à Inglaterra pelo
unidade otomana. Os ingleses Inglaterra fechara acordos paralelos reconhecimento e por necessidade.
tentavam, a todo custo, enfraquecer com a França e a Rússia czarista. Esse seria um excelente motivo para
internamente o Império Turco, os ingleses oficializarem seu apoio à
incentivando a revolta das províncias OS ACORDOS SYKES-PICOT causa sionista, fato que aconteceria
árabes. no final de 1917.
Os “Acordos Sykes-Picot” (1916),
O governo britânico, representado tratados entre os aliados durante a A “DECLARAÇÃO BALFOUR”
pelo Alto Comissário Sir Henri Mc 1a Guerra, dividiram a Europa do
Mahon, deu o aval para o ambicioso pós-guerra e o Oriente Médio. Em 2 de novembro de 1917, o
projeto do xerife de Meca, Hussein Os acordos previam para Jerusalém Ministro de Relações Exteriores
bin Ali Hussein: restabelecer uma administração internacional, da Grã Bretanha, Lord Arthur
James Balfour, comunicava ao
representante da Organização
Sionista Mundial, em Londres,
Lord Walter Lionel Rothschild:

“O governo de Sua Majestade encara


favoravelmente o estabelecimento,
na Palestina, de um Lar Nacional
para o Povo Judeu, e empregará
todos os esforços a fim de facilitar
a realização desse objetivo; ficando,
porém, claramente entendido que
nada se fará que possa prejudicar
os direitos civis e religiosos das
comunidades não judaicas que vivem
na Palestina, nem que prejudique
DA ESQ. À DIR.: General Edmund Allenby, o Primeiro Ministro e depois Ministro das
Relações Exteriores Arthur J. Balfour e o Alto Comissário da Palestina, Herbert
os direitos e disposições políticas de
Samuel. Jerusalém, 1925. que os judeus gozam em todos os
outros países”.
um grande Estado árabe sob sua enquanto nas outras áreas do
liderança. Ele pretendia criar um Oriente Médio dividiu-se a região Com essa declaração o governo
Estado árabe nacional reunindo a entre as potências aliadas em zonas inglês legitimava seu apoio ao
Península Arábica (com excepção de influência política. Mais tarde Sionismo e, automaticamente,
de Aden), o Iraque, a Palestina, a Rússia bolchevique sairia das impossibilitava o projeto de se criar
a Transjordânia e a Síria. Hussein negociações, ficando o acordo um futuro “Protetorado francês” na
completa a conquista da Península limitado aos interesses franco- Palestina otomana. A “Declaração
Arábica e o governo inglês aceita tal britânicos. Balfour” fortalecia as pretensões
projeto, excluindo partes da Síria. britânicas facilitando projetos
Nas negociações sobre a Palestina imperialistas.
Importante lembrar que Hussein otomana, o governo britânico
prometera à Grã-Bretanha colocar iria utilizar-se das aspirações e A Palestina otomana foi, durante
seus exércitos tribais na campanha pretensões sionistas para fazer 400 anos, uma área estratégica. Ao
militar contra o Império Turco, frente aos interesses da França. sudoeste encontrava-se o Canal de
desde que o governo inglês lhe Obviamente, as áreas seriam Suez, um fluxo comercial e militar

70
REVISTA MORASHÁ i 98

entre o Mediterrâneo e o Oceano cooperar com a mesma nos assuntos


Índico, rota marítima rumo à Índia concernentes ao Lar Nacional e
e ao Extremo Oriente. A criação aos interesses da população judaica.
de um “Estado tampão” nessa Assim, a Organização Sionista seria
área daria proteção ao Canal. A oficialmente reconhecida.
administração de Suez garantiria
uma continuidade territorial do Há ainda disposições promulgadas
Egito até a Índia, fortalecendo a pela Grã-Bretanha relativas à
influência inglesa na região. colonização sionista, tais como
“facilitar a imigração judaica,
DESDOBRAMENTOS DA potencializar o estabelecimento
“DECLARAÇÃO BALFOUR” intensivo de judeus sobre terras
existentes” (Art. 6); “promulgar uma
A “Declaração Balfour” contrariava lei sobre a nacionalidade para poder
os anseios das comunidades árabes facilitar a aquisição da cidadania
do Oriente Médio e anulava os palestina aos imigrantes sionistas”
direitos prometidos às “comunidades RECONSTRUINDO A TERRA DE ISRAEL, UM
PORTO SEGURO PARA O JUDEU ERRANTE.
(Art. 7); e “introduzir um sistema
não judaicas”. Os estudos são POSTER PUBLICADO PELA CAMPANHA UNIDA de solo que contemple interesses
PARA A PALESTINA, N. YORK 1927
unânimes em afirmar que, após da colonização sionista” (Art. 11).
o desmembramento do Império Obviamente, tais estipulações
Otomano, as chances dos árabes de A Palestina otomana seria eram acompanhadas de cláusulas
“manterem sua nacionalidade” se de governada e administrada pela que “preveem a salvaguarda dos
fato fosse criado um Lar Nacional potência mandatária (Art.1), a Grã- direitos civis e religiosos de todos os
Judaico” eram quase nulas. A Bretanha. Esta se esforçaria para habitantes da Palestina, seja qual for
imigração judaica era, pois, a “raison promover a autonomia local (Art. a raça ou religião à qual pertençam”.
d´être” do Lar Nacional Judaico, 3). O regime mandatário britânico
empenhado em crescer a cada dia. assumiria a responsabilidade de A “QUESTÃO DAS TERRAS”
A rigor, o maior problema era o instituir no país um estado de
político, pois o futuro Lar Judaico coisas políticas, administrativas Atualmente, um dos argumentos
era sustentado por uma organização e econômicas, de tal forma que mais frequentes da propaganda
sionista sólida e com fundos se assegurasse o estabelecimento contra o Estado de Israel é que
advindos da filantropia. do Lar Nacional para o Povo os judeus, ao chegarem à
Judeu (Art. 4). A Grã-Bretanha Palestina, em final do século 19 e
De acordo com os termos dos recomendava o reconhecimento início do 20, usurparam as terras dos
acordos concebidos pela Liga das de uma Agência Judaica para habitantes árabes que lá viviam. 
Nações em 1922, a Grã Bretanha
seria responsável pelo Iraque e
a Palestina Otomana, enquanto
a França ficaria com a Síria e o
Líbano. Nos territórios otomanos
do pré-guerra o único Estado
independente que surgiria seria a
República da Turquia, de Mustafá
Kamal Ataturk. Com relação à
Palestina, os historiadores apontam
para uma preferência britânica pelos
interesses sionistas.

Assim sendo, a “Declaração Balfour”


trazia em seu bojo a seguinte
situação: “Avodá Ivrit”, lema do trabalho judaico na Palestina britânica, c. 1920.

71 dezembro 2017
HISTÓRIA DE ISRAEL

fatores associados ao crescimento do


Lar Nacional Judaico. Em particular,
os árabes se beneficiaram com
serviços sociais que não poderiam ter
chegado à escala atual sem a receita
obtida dos judeus. Terras cultivadas
por estes últimos, onde hoje crescem
laranjais, eram dunas de areia ou
pântanos incultos quando foram
comprados. Havia no momento da
venda destas terras pouca evidência
de que os proprietários possuíam os
Trabalho agrícola na Palestina britânica, 1920. recursos ou treinamento necessário
para desenvolvê-las. A escassez
de terra lamentada pelos árabes
Os textos árabes, turcos e britânicos finalidade de analisar as causas da é devida menos à quantidade de
indicam exatamente o contrário: violência entre árabes e judeus e terrenos adquiridos por judeus do
não só os judeus não se apropriaram sugerir possíveis soluções. Depois que ao aumento da população árabe”.
indevidamente das terras, mas de meses de entrevistas com líderes
as compraram de vendedores dos dois lados, essa Comissão O MUFTI “CONFESSA”
dispostos a se desfazer das mesmas, publicou seu relatório em 1937,
ou seja, dos latifundiários árabes da recomendando um plano de partilha, Em 12 de janeiro de 1937, Sir Laurie
terra, ou seja, seus proprietários por com a coexistência, lado a lado, de Hammond (1873-1939) entrevistou
lei. um Estado árabe e um Estado judeu o Mufti, que insistentemente acusava
– recomendação adotada dez anos “os sionistas de roubarem terras
A maioria das fontes históricas sobre mais tarde pela ONU. árabes”. Na ocasião, ele fez uma
o conflito árabe-judeu na Palestina confissão inédita e surprendente:
britânica falam do Grão Mufti de A “Comissão Peel” propôs que
Jerusalém, Hadj Amin Al-Husseini, 80% do território fossem para um Sir L. Hammond: V.S.poderia me dar
o grande amigo de Hitler. Al- Estado árabe e 20% para um Estado novamente os números para a aquisição
Husseini - ideólogo do nacionalismo judeu. O Mufti, no entanto, rejeitou de terras? Eu quero saber quanta terra
palestino - era um opositor do categoricamente a proposta, bem foi comprada pelos judeus antes da
Sionismo. Aliado do Führer, o como todos os acordos de paz ocupação britânica.
Mufti recrutou muçulmanos na propostos. O relatório também
Bósnia para alistá-los ao Wehrmacht, discutia a presença dos judeus na Mufti: Cerca de 100 mil dunams.
as forças armadas da Alemanha Palestina e seu impacto sobre a terra
durante o Terceiro Reich. Ainda e a economia árabes. Eis um trecho Sir L. Hammond: Em que ano?
desenvolveu planos para, após a do Capítulo V do mesmo:
Alemanha invadir o Oriente Médio, Mufti: Na data da ocupação
criar campos de concentração na “A população árabe mostra britânica.
Palestina britânica. Ademais, rejeitou um crescimento notável desde
em 1937 as sugestões da “Comissão 1920 e tem participado no Sir L. Hammond: E agora quanto
Peel” e ignorou em 1947 a “Partilha aumento da prosperidade da eles detêm?
da ONU”, que determinava a criação Palestina. Proprietários árabes
de dois estados nacionais. Morreu no se beneficiaram com a venda de Mufti: Cerca de 1,5 milhão de
ostracismo, em Beirute (1974). terras aos judeus..... Os fellahin dunams, dos quais 1,2 milhão estão
(camponeses árabes) estão em melhor registrados em nome dos titulares
Como o mais alto representante situação no seu conjunto do que em judeus. Há 300 mil dunams que
árabe da Palestina britânica, Al- 1920. Este progresso árabe é, em são tema de discussão para acordos
Husseini foi entrevistado em parte, devido à importação de capital escritos, e que ainda não foram
1936 pela “Comissão Peel”, com a judaico para a Palestina e outros registrados. Isso não significa, é

72
REVISTA MORASHÁ i 98

claro, os cerca de 100 mil dunams


atribuídos originalmente.

Sir L. Hammond: Quais 100 mil


dunams foram atribuídos? Eles não
estão incluídos no 1,2 milhão de
dunams? O ponto é este. Você diz que
em 1920, no momento da ocupação
britânica, os judeus só tinham 100 mil
dunams, é isso? Consultei os dados do
Registro Predial. Você se surpreenderia
ao saber que não foram 100 mil, mas
650 mil dunams? Tempo da colheita no kibutz, s.d

Mufti: Pode ser que esta diferença


se deva ao fato de que muitas Mufti: Não. ausentes, que venderam a
terras foram compradas em terra sem qualquer consideração
contratos que não foram Sir L. Hammond: Mas estes cerca de sobre seus inquilinos, os
registrados. 700 mil dunams foram efetivamente quais foram despejados à força. 
vendidos? A maioria destes senhorios estava
Sir L. Hammond: Há uma diferença ausente. Não eram palestinos, mas
enorme entre 100 mil e 650 mil... Mufti: Sim, eles foram vendidos, libaneses.
mas o país foi colocado em
Mufti: Em um dos casos, foram condições tais que facilitassem essas Sir L. Hammond: Você pode dar à
vendidos cerca de 400 mil dunams compras. Comissão a lista das pessoas, os árabes
em um só lote. que venderam terras, além destes
Sir L. Hammond: Eu não proprietários ausentes?
Sir L. Hammond: Quem entendo muito bem o que você quer
vendeu? Um árabe? dizer com isso. Estas terras foram Mufti: Sim, é possível fazê-lo. 
vendidas. Quem as vendeu?
Mufti: Sarsuk. Um árabe de Beirute. Sir L. Hammond: Como você
Mufti: Os proprietários de terra. compara o padrão de vida atual com
Sir L. Hammond: Você quis passar aquele que existia sob o domínio turco?
[aos britânicos] a ideia de que os Sir L. Hammond: Árabes? A posição dos fellahin melhorou ou
árabes foram expulsos de suas terras piorou?
e suas aldeias foram varridas. O Mufti: Na maioria dos casos, eles
que quero saber é se o Governo da eram árabes. Mufti: De um modo geral, acho
Palestina, a Administração, adquiriu que sua situação piorou.
as terras para, em seguida, passá-las aos Sir L. Hammond: Eles foram
judeus? compelidos a vendê-las? Em caso Sir L. Hammond: Os impostos
afirmativo, por quem? eram mais pesados ou mais leves?
Mufti: Na maioria dos casos, as
terras foram adquiridas. Mufti: Como em outros tantos Mufti: Os impostos hoje são
países, há pessoas que, por força das menores, mas agora existem
Sir L. Hammond: Eu quero dizer, foi circunstâncias, forças econômicas, encargos adicionais.
uma aquisição compulsória de terras, vendem suas terras.
para uso público? Sir L. Hammond: O que estou
Sir L. Hammond: Isso é tudo que perguntando-lhe é se, nos dias de
Mufti: Não, não foi. você tem a dizer? hoje, os fellahin não têm um imposto
Sir L. Hammond: Não foi aquisição Mufti: Uma grande parte dessas muito mais leve do que tinham sob o
compulsória? terras pertencia a proprietários governo turco. 

73 dezembro 2017
HISTÓRIA DE ISRAEL

Mufti: A tributação hoje é mais PALAVRAS FINAIS


leve, mas os árabes, no entanto,
têm outros impostos. Por exemplo, Na relação “tripartite” entre
alfândega. britânicos, sionistas e árabes, na
Palestina, é evidente que as falsas
Sir L. Hammond: E a condição promessas dos ingleses visavam
dos fellahin no que diz respeito, por “burlar” tanto judeus quanto árabes.
exemplo, à educação. Há mais escolas ou A realidade dos anos 1917-1947
menos escolas agora? permitiu aos judeus tomarem
consciência de que um sonhado
Mufti: Eles podem ter mais escolas, “Lar Nacional” seria possível
comparativamente, mas, ao mesmo somente com a imediata posse
tempo, houve aumento populacional. Caixinha de doações do FUNDO da terra, trabalho produtivo e
NACIONAL JUDAICO, KEREN KAIEMET
  LEISRAEL (KKL). LONDRES consolidação de uma liderança que
Não apenas a entrevista do representasse os interesses sionistas
Mufti, mas uma análise da venda saber intermediar a venda de terras, na Palestina.
de terras desde 1880 até 1948 protegendo os inquilinos árabes.
nos mostra claramente que 73% Por sua parte, a liderança árabe
das terras compradas por judeus Para Stein, nem a oposição árabe à da Palestina não entendeu que os
pertenciam a latifundiários árabes. venda de terras, nem as tentativas britânicos também queriam ajudá-
Em “The Land Question in britânicas de regular a aquisição los, mas que, para isso, deveriam
Palestine: 1917-1939”, Kenneth de terras limitaram as vendas: organizar-se e “autogovernar-se”,
Stein afirma que os judeus “Houve sempre mais terra árabe criando instituições representativas,
conseguiram comprar o núcleo para vender do que fundos judaicos construindo estruturas econômicas
do Lar Nacional por três razões: para comprar. Na verdade, muitas das sólidas e administrando suas terras.
primeiro, tinham a obstinação e o terras foram vendidas por políticos
capital para comprar terras; segundo, árabes que eram publicamente Hoje, um século após a “Declaração
os árabes estavam dispostos a contra o Sionismo e até mesmo Balfour”, os árabes pagam um
vender suas terras; e finalmente, os organizaram agitações contra a preço alto por não terem percebido
britânicos foram ineficazes em não aquisição de terras por judeus”. o processo competitivo entre duas
nacionalidades em que, quem se
organizasse e tomasse a iniciativa,
seria o vencedor.

BIBLIOGRAFIA
Granott, A., The Land System in Palestine.
London, Eyre and Spottiswoode, 1952.
Kleiman, A., “The Palestine Royal Comission:
1937”. Garland Publications, 1987. 
Sachar, M. Howard, A History of Israel from
the Rise of Zionism to our Time. Alfred A.
Knopf, 1976.
Stein, K., The Land Question in Palestine,
1917-1939. University of North Carolina
Press, 2009.

Prof. Reuven Faingold é historiador


e educador; PHD em História e História
Judaica pela Universidade Hebraica de
Jerusalém. é responsável pelos projetos
educacionais do “Memorial da Imigração
Entrada de um kibutz no Neguev, sul de Israel. Judaica e do Holocausto” de São Paulo.

74
REVISTA MORASHÁ i 93

Queremos parabenizar a direção da Morashá pela


publicação do artigo “Ética Médica Nazista”, escrito
pelo Dr. morton scheinberg na edição 97, de setembro
de 2017. A leitura deste artigo de grande valor
informativo nos conscientizou ainda mais sobre as
atrocidades do regime nazista.
Enea Wainstock
Raanana, Israel

Extremamente interessante a Recebo a revista Morashá, mas quero Recebemos o material enviado a
matéria sobre Ética Medica Nazista, que minha filha, Marcia Rakoski, esta Fundação, em cumprimento
que acabei de ler on line. Muito comece a recebê-la porque meu neto à legislação vigente de Depósito
perturbador saber que dois médicos está se interessando em continuar Legal. Agradecemos esta importante
de renome foram nazistas. Adorei a nosso legado como judeus. contribuição para a preservação
matéria sobre a Polônia. Parabéns! Simão Stainer e a guarda da Coleção “Memória
Max Rotenberg
Paranavaí - PR Nacional”, composta pela produção
Rio de Janeiro - RJ intelectual do País.
Meus profundos agradecimentos Alessandra Moraes
Sou professor de História e Filosofia pelo lindo trabalho de tantos anos de Chefe da Divisão de Depósito Legal

e acabei de acessar o site, não dedicação. Digo isto, pois, retomei Fundação Biblioteca Nacional
Ministério da Cultura
conhecia. Ao ler as chamadas dos as edições Morashá de setembro Rio de Janeiro - RJ
textos fiquei impressionado com a dos quatro últimos anos, com as
quantidade de material à disposição, suas mensagens, fotos, qualidade
Essa revista é tão maravilhosa
parece uma enciclopédia judaica. Ao gráfica e, sobretudo, a profunda
que quando terminamos de lê-la,
ler alguns dos textos achei as matérias inspiração nas entrelinhas. Queria
ficamos querendo mais e mais.
muito instrutivas e gostosas de ler. me sentir acolhida à distância, ler em
Revista fantástica em conteúdo e em
Vi que traz assuntos dificilmente português as mensagens e ao mesmo
apresentação. Parabéns a todos.
encontrados com tamanha clareza tempo partilhar a alegria de estar em
e profundidade em outros sites. Jerusalém pensando em toda a equipe, Joanna Quintana
Por e-mail
Meus parabéns. Ao ler a matéria neste instante. Profunda gratidão é a
“Significado dos alimentos simbólicos minha partilha. Que o brilho desta
Conheci a Morashá através do Nº 97,
de Rosh Hashaná”, entendi o porquê revista continue por muitos anos.
Setembro 2017, em uma Biblioteca
de usarmos esses alimentos; sempre Sylvia Lakeland Pública do Rio de Janeiro. Parabéns!
Jerusalém - Israel
achei que era apenas um folclore. Me Matérias de alta qualidade, e tudo
interessei muito sobre o Krav Maga, e Renovo o entusiasmo por esta Revista. apresentado com um bom gosto
achei a matéria sobre a Polônia muito Além da bonita apresentação, seus único.
interessante. Meus avós são poloneses artigos habilmente selecionados, Vera Regina Affonso Basilio
e nunca quiseram nos contar sua entre os quais, a Carta ao Leitor; Rio de Janeiro - RJ
história. detalhes importantes sobre a Guerra
Marcio Kolipstein de 1967 e a Batalha de Jerusalém. Quando bem jovem ainda, na Bélgica,
Por e-mail
O que mais me impressionou foi o visitei Israel e fiquei um pouco mais
fato de rabinos ajudarem seus alunos de um mês no Kibutz Ein Carmel,
Há muitos anos recebo a Morashá a cavar trincheiras. Todos os demais perto de Haifa. Tive assim a sorte de
e a considero a melhor revista da artigos publicados são, como sempre, conhecer melhor esse ideal de vida
comunidade, tanto pelo conteúdo muito interessantes e servem para compartilhada que, infelizmente, já
como na produção gráfica. É esclarecer conhecimentos e dúvidas. começava a receber fortes críticas da
um orgulho ter esta revista na Aos componentes desta portentosa geração mais jovem. Leio a Morashá
comunidade, continuem assim. publicação, minha constante admiração. com muito interesse.
Flavio Derdyk Prof. Maurício Ary Jalom Dra. Theresa Calvet de Magalhães
São Paulo - SP Rio de Janeiro - RJ Belo Horizonte - MG

75 dezembro 2017

Potrebbero piacerti anche