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Para uma Teoria da Modelagem no Ensino de Física1

David Hestenes2

Tradução: Ednilson Souza3

Uma análise da estrutura conceitual da física identifica conhecimentos factuais e


procedimentais essenciais que não são explicitamente formulados e ensinados em
cursos de física. Isso leva à conclusão que a modelagem matemática deveria ser tema
central no ensino de física. Há razões para acreditar que o método tradicional é
ineficiente no ensino de física e uma melhora substancial pode ser alcançado por meio
de um vigoroso programa de pesquisa e desenvolvimento pedagógico.

I. QUEM PRECISA DE UMA TEORIA DA INSTRUÇÃO?

O resultado insatisfatório do ensino de física é bastante familiar para exigir


citação. A culpa é normalmente colocada no ensino primário de matemática e
ciências. A pesquisa cognitiva nas últimas décadas tem documentado sérias
deficiências no ensino tradicional em física. Não há razão para duvidar que essas
deficiências possam ser eliminadas sem o desenvolvimento de uma abrangente
pesquisa pedagógica.

A teoria pedagógica geralmente não é levada a sério pelos cientistas


universitários. Eles praticam em sala de aula o que jamais tolerariam dentro de
um laboratório de pesquisa. No laboratório eles são ávidos por compreender o
fenômeno e avaliar criticamente hipóteses alternativas sábias. Mas o ensino
deles é guiado por crenças não comprovadas sobre a aprendizagem dos
estudantes. Esse tipo de comportamento é desastroso no laboratório como é na
sala de aula. Por que eles não avaliam suas práticas de ensino com o mesmo
nível crítico que aplicam na pesquisa científica?

Embora a deficiência no ensino de física seja mais séria no nível médio,


não há razão para acreditar que ela é insignificante no nível superior. Apenas
alguns excelentes físicos emergem de nosso programa de graduação. Os
sintomas do problema são fáceis de perceber nas frequentes piadas e

1 Toward a modeling theory of physics instruction, Published in: Am. J. Phys. 55 (5), May 1987,
pp 440-454.
2 Department of Physics, Arizona State University, Tempe, Arizona.
3 Programa de Educação, Universidade Federal do Oeste do Pará.
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lamentações dos professores devido ao baixo desempenho dos estudantes da


graduação, especialmente nos exames orais, nos quais os estudantes devem
demonstrar uma compreensão coerentes sobre o assunto. A possibilidade disso
poder ser uma consequência do ensino deficiente parece nunca ocorrer na
faculdade. Na ausência da evidência você pode acreditar no que quiser. O fato
é que, com tempo suficiente e dedicação, alguns estudantes aprendem física em
nossas universidades sem nossa ajuda. A questão não é se os estudantes
podem aprender física, mas como o ensino pode ser desenvolvido de modo a
tornar essa aprendizagem mais eficiente.

Muitos professores universitários de física fazem seu ensino seriamente,


mas parece estranho que eles não tenham promovido um tipo de programa de
pesquisa coerente para melhorar o ensino que eles sabem que é essencial para
o desenvolvimento da física. Meu propósito neste artigo é discutir o que é
necessário para iniciar um programa desse tipo. Objetivo formular os rudimentos
de uma teoria instrucional com detalhes suficientes para servir como base para
criticar a prática de ensino corrente e guiar uma pesquisa pedagógica. Espero
chamar a atenção para a pesquisa em ciência cognitiva a qual pode contribuir
para o desenvolvimento da teoria da instrução. O objetivo final da investigação
pedagógica deverá ser construir uma teoria instrucional madura que consolide e
organize um corpo de conhecimento sobre o ensino. Sem tal teoria, pouco
conhecimento pedagógico é transmitido aos professores, professores não
podem melhorar se repetem erros de seus predecessores, somente melhor
capacitação e dedicação pode melhorar o ensino com um grau moderado de
percepção e astúcia. Tal é a situação hoje. Sem a consolidação do conhecimento
físico em teoria poderíamos esperar algum físico desenvolver além da percepção
de Galileu? A teoria da instrução procura responder a duas questões principais:
O que é essencial ao professor ensinar? e Como pode o essencial ser ensinado
efetivamente? A primeira questão envolve analisar a estrutura do conhecimento
científico. Uma teoria específica dos modelos matemáticos e modelagem é
esboçada com fins pedagógicos. Esta fornece base para uma estratégia
instrucional centrada em modelos, que é o coração da teoria instrucional.

Para a maior parte dos físicos, a teoria da modelagem poderá parecer


óbvia, suponho fornecer uma formulação explícita de coisas que eles conhecem
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muito bem. O que não significa que a teoria é trivial ou desnecessária. Muito do
conhecimento que explicarei é básico e bem sabido pelos físicos que não
percebem que deveria ser ensinado aos estudantes. A explicação sistemática do
conhecimento é um pré-requisito óbvio para o desenvolvimento de um programa
instrucional que assegure que a base é adequadamente ensinada. Quando um
professor tem certas bases e acha desnecessário ensina-las, os estudantes
ficam perdidos até descobrirem essas bases por eles mesmos, ou desenvolvem
alternativas inferiores para lidar com essas dificuldades. Penso que esse
problema é extremo em cursos de física e contribuem fortemente para as
dificuldades legendárias.

No perigo de fornecer jargão, tenho introduzido algumas terminologias


novas para designar conceitos importantes na ciência do ensino.
Esperançosamente, isto contribuirá para promover melhoramento e exploração
desses conceitos no futuro. Como em qualquer outra ciência, a ciência do ensino
precisa desenvolver seu próprio vocabulário especializado e estrutura
conceitual.

Como uma aplicação não trivial da teoria, uso uma explicação sistemática
do conhecimento básico que deverá ser ensinado em mecânica introdutória. Isso
levará a críticas específicas da atual prática de ensino. Minha intenção não é
condenar, mas verificar como o ensino pode ser melhorado. Se pareço estar
articulando o óbvio, basta notar como o conhecimento básico é ensinado em
cursos de física. Se minha análise é defeituosa, deixe ser um ponto de partida
para melhorar a teoria.

Na seção II oferecerei uma resposta para a questão sobre o que deverá


ser ensinado em cursos de física, uma resposta satisfatória para a questão sobre
como poderá ser ensinado efetivamente não é para ser esperado sem uma
pesquisa pedagógica abrangente. Para ajudar a guiar e estimular a pesquisa
necessária na seção III é feito um delineamento de alguns problemas e o exame
de fatos e ideias relevantes oriundos da ciência cognitiva e outras fontes.

II. A ESTRUTURA DO CONHECIMENTO CIENTÍFICO

O conhecimento científico é de dois tipos: factual e procedimental. O


conhecimento factual consiste de teorias, modelos e interpretação de dados
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empíricos (em algum grau) por modelos em concordância com a teoria. A teoria
é para ser considerada como factual, em vez de hipotética, porque as leis da
teoria têm sido corroboradas, apesar de que a teoria difere no alcance da
aplicação em graus de confirmação. O conhecimento procedimental da ciência
consiste de estratégias, táticas e técnicas para desenvolver, validar e utilizar o
conhecimento factual. Bastante vago em sistemas desorganizados, ou partes
dele, o conhecimento procedimental é geralmente referido como método
científico.

Conhecimento factual está presente em livros didáticos de ciências de


forma bastante explícita e de modo ordenado, embora um pouco a esmo, com
frequentes lacunas de compreensão e suposições ocultas. Quando os livros
didáticos tratam de conhecimento procedimental, isso é feito geralmente de
forma inadequada, consistindo de superficialidades sobre o método científico e
observações sem fundamento sobre resolução de problemas. Os estudantes são
deixados a descobrir conhecimentos procedimentais por eles mesmos a partir
de problemas práticos e geralmente observando o desempenho de professores
e seus assistentes. Resolver problemas é tão difícil para os alunos quanto tem
sido para os filósofos, que têm falhado em dar descrição adequada ao método
científico. Não é segredo que muitos alunos falham neste esforço. Mas o fato é
que o sucesso atesta o poder criativo do intelecto humano.

Para ensinar conhecimento procedimental de forma eficiente, precisamos


de uma teoria para organiza-lo. Isto dependerá de como caracterizamos a
estrutura do conhecimento factual. Geralmente, os cientistas aceitam que tal
estrutura está suprida por modelos e teorias. Mas uma definição satisfatória de
dos temos “modelo” e “teoria” não é encontrada em livros didáticos e poucos
cientistas fornecem essa definição. Para a maioria deles, o significado desses
termos é derivado da familiaridade com uma larga coleção de exemplos. Mas
não podemos deixar de ensinar conceitos claros de “modelo” e “teoria” aos
estudantes, os quais não tem a experiências dos cientistas, por isso temos que
caracterizar esses conceitos explicitamente. Nossa primeira tarefa nesta seção
será fornecer tal caracterização. O resultado ajudará a identificar lacunas de
compreensão e hipóteses tácitas encontradas em livros didáticos que
certamente deixam os estudantes confusos. Mais importante, veremos que o
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conceito de teoria pressupõe o conceito de modelo. Isto nos leva a identificar o


desenvolvimento de modelos como a principal estratégia dos cientistas e, assim,
fornecer a chave para uma teoria coerente do conhecimento procedimental em
ciência.

A segunda tarefa nesta seção será explicar os princípios e técnicas de


modelagem com propósitos pedagógicos. Especificamente com aplicações em
mecânica introdutória, já que é onde o ensino de física normalmente começa.
Mas meu objetivo maior é formular um princípio de modelagem geral aplicável
em qualquer ramo da física, ou melhor, em qualquer ramo da ciência.

Nossa discussão sobre modelos, teorias e modelagem nesta seção


enfocará o interesse pedagógico. Mais detalhes e discussões é encontrado na
referência 01, de onde as principais ideias nessa seção foram retiradas. Uma
análise valiosa do conhecimento estrutural em mecânica de um ponto de vista
relacionado é dada por Reif and Heller (referência 02).

A. Modelo

Um modelo é um objeto substituto, uma representação conceitual de uma


coisa real. Os modelos em física são modelos matemáticos, o que significa que
propriedades físicas são representadas por variáveis quantitativas dentro dos
modelos.

Um modelo matemático possui quatro componentes:

1) Um conjunto de nomes para o objeto e agentes que interagem com ele,


bem como para qualquer parte do objeto representado no modelo.
2) Um conjunto de variáveis descritivas (ou descritores) representando
propriedades do objeto.
3) Equações do modelo, descrevendo a estrutura e evolução temporal.
4) Uma interpretação relativa às variáveis descritivas para propriedades de
alguns objetos que o modelo representa.

Há três tipos de descritores: variáveis de objeto, variáveis de estado e


variáveis de interação.

Variáveis de objeto representam propriedades intrínsecas do objeto. Por


exemplo, massa e carga são variáveis de objeto para um elétron, enquanto
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momento de inércia e especificações de tamanho e forma são variáveis de objeto


para um corpo rígido. As variáveis de objeto têm valores fixos para um objeto
particular, então elas são de fato variáveis do ponto de vista da teoria de
modelagem.

Variáveis de estado representam propriedades intrínsecas de valores que


podem variar com o tempo. Por exemplo, posição e velocidade são variáveis de
estado para uma partícula. Um descritor considerado como variável de estado
em um modelo pode ser considerado como variável de objeto em outro modelo.
Massa, por exemplo, é uma variável de estado em um modelo-partícula de
foguete, apesar de ser constante na maioria dos modelos-partícula. Assim,
variáveis de objeto podem ser consideradas como variáveis de estado com
valores constantes.

Uma variável de interação representa a interação de algum objeto externo


(chamado agente) com o objeto que está sendo modelado. A variável de
interação básica em mecânica é o vetor força. Trabalho, potência, energia e
torque são variáveis de interação alternativas.

Em mecânica de partícula, as equações do modelo consistem


normalmente das equações do movimento (equações dinâmicas) para cada
partícula no modelo e possivelmente equações de restrição descrevendo certos
tipos de interação. Para alguns propósitos é conveniente substituir as equações
de movimento por leis de conservação relacionando variáveis de estado em
momentos diferentes. Isto leva a uma representação alternativa do objeto, mas
não é um modelo diferente a menos que a lei de conservação específica
contenha menos informação que as equações de movimento, como às vezes é
o caso. Nas equações do modelo as “variáveis de interação interna”,
descrevendo interações entre partes de um objeto composto, são expressas
como funções das variáveis de estado, assim elas são variáveis dependentes
que podem ser eliminadas matematicamente. Todavia são essenciais para a
interpretação do modelo.

Interpretações são tratadas tão casualmente em livros didáticos de física


que não é surpresa encontrar estudantes confusos por causa disso. De fato, uma
prática comum entre físicos e matemáticos é identificar as equações do modelo
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com o próprio modelo matemático. Isto, é claro, limita a interpretação do modelo,


que pode ser interpretado corretamente pelo cientista experiente, embora
raramente a interpretação não seja motivo de discórdia. Mas os estudantes
precisam reconhecer a interpretação como um componente crítico do modelo.
Sem uma interpretação a equação do modelo nada representa, são meramente
relações abstratas entre variáveis matemáticas. Indubitavelmente, por isso é que
as equações frequentemente mostram-se confusas aos estudantes de física,
que não desenvolvem a habilidade do professor para fazer uma interpretação
automática.

B. Teoria

Uma teoria científica pode ser considerada como um sistema de princípios


visando a modelagem de objetos reais. Este ponto de vista deixa claro que o
conceito de teoria pressupõe o conceito de modelo. De fato, uma teoria científica
pode ser relacionada à experiência somente quando a usamos para construir um
modelo específico que pode ser comparado com o objeto real. As leis de uma
teoria podem ser testadas e validadas pela testagem e validação dos modelos
derivados da teoria.

Uma teoria científica possui três componentes importantes:

1) Um quadro de leis específicas e genéricas caracterizando as variáveis


descritivas da teoria.
2) Uma base semântica de regras de correspondência relacionando as
variáveis descritivas às propriedades de objetos reais.
3) Uma superestrutura de definições, convenções e teoremas para facilitar
a modelagem em uma variedade de situações.

O quadro determina a estrutura da teoria, enquanto que a base semântica


determina a interpretação da teoria e qualquer modelo derivado dela. O quadro
e a base semântica são componentes essenciais da teoria e qualquer mudança
significativa neles produz uma nova teoria. Contudo, a superestrutura é
subsidiária, crescendo e mudando com novas aplicações da teoria.

A ideia de uma lei científica é amplamente identificada com o conceito-


chave dentro da teoria científica, ainda que em livros textos raramente se faça
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tal definição ou mesmo se distingue claramente entre os diferentes tipos de leis.


Uma lei científica é uma relação entre variáveis descritivas que representam uma
relação entre propriedades de objetos reais, por isso tem sido validada dentro de
algum domínio empírico pela testagem de modelos. A maioria das leis da física
são expressas como equações matemáticas. As leis de uma teoria são básicas
ou derivadas. As leis básicas, tais como as leis do movimento de Newton, são
suposições independentes no quadro da teoria. As leis derivadas, tais como o
Teorema Trabalho-Energia e as leis de Galileu para a queda livre de corpos são
teoremas na superestrutura da teoria.

Leis genéricas definem as variáveis descritivas básicas da teoria. Leis


genéricas são aplicadas a qualquer modelo derivado da teoria, enquanto que leis
específicas são aplicadas somente sob condições especiais. As três leis de
Newton do movimento são leis genéricas da mecânica clássica definindo as
variáveis básicas de massa e força. Infelizmente, livros textos dão a falsa
impressão de que essas são as únicas leis genéricas da mecânica e deixam de
salientar que a formulação de Newton é insuficiente para definir o conceito de
força completamente. Uma formulação completa e análises de leis genéricas da
mecânica e feito na referência 01. Não entrarei em tais detalhes aqui por que
estudantes iniciantes não estão preparados para aprecia-los. De qualquer forma,
uma análise completa ajudará a identificar deficiências sérias na formulação
convencional que são provavelmente as causas das dificuldades dos
estudantes.

As leis de Newton são frequentemente parafraseadas em livros textos


para faze-las mais compreensíveis aos alunos, mas as deficiências na
formulação original dela são reiteradas. Primero as leis deixam de explicitar que
toda força tem um agente, que toda força é uma função binária descrevendo a
ação de um agente sobre um objeto. A seriedade dessa deficiência é mostrada
pela evidência empírica da “crença do ímpeto” que a maioria dos estudantes
retém, ou seja, que a força pode ser transmitida a um objeto e atua sobre ele
independentemente de qualquer agente; além disso, poucos estudantes mudam
suas crenças depois das aulas de mecânica. Segundo, a formulação newtoniana
refere-se à força sobre um corpo em vez de uma partícula. Uma formulação
rigorosa inicia com forças sobre partículas e depois define-se força sobre um
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corpo como a soma de forças sobre as partículas. A maior parte dos livros textos
não dizem claramente que a segunda lei de Newton não pode ser aplicada
diretamente a um corpo, a menos que o corpo seja modelado como uma
partícula. Isso dificulta a distinção entre a segunda lei de Newton e o teorema do
centro de massa. Certamente, a distinção entre corpo e partícula contribui para
as dificuldades que os estudantes têm em identificar a localização da força
atuante sobre um corpo extenso. A terceira deficiência é que Newton não
considerou o princípio da superposição de forças como uma lei separada, porque
ele acreditava que tal princípio poderia ser derivado de suas outras leis. O
princípio da superposição é frequentemente considerado como parte da segunda
lei, mas ele é tão importante que merece consideração em separado. Há mais
dificuldades sutis com a formulação das leis de Newton mas não preciso abordar
aqui porque são de menor interesse pedagógico.

Além das deficiências na formulação das leis de Newton, o conjunto de


leis é incompleto em dois importantes aspectos: Primeiro, as leis cinemáticas
básicas definindo os conceitos de posição, tempo e movimento não são
explicitamente formuladas. Segundo, o status lógico das leis específicas de
força, como a lei da gravitação de Newton, não é bem delineado. Estudantes não
são informados que o conceito de uma lei de força é uma parte essencial do
conceito de uma força. Incompletudes na formulação das leis básicas da
mecânica é um assunto de interesse pedagógico. Como os estudantes
distinguem conceitos e leis básicas de conceitos e leis derivadas? Como eles
distinguem o essencial do periférico? Como eles distinguem discrepâncias entre
suas próprias crenças e os conceitos científicos se estes não são bem
delineados?

Em vez de meramente listar as leis de Newton, como geralmente é feito,


seria melhor classifica-las de acordo com seus papeis na teoria. As leis da
mecânica são de três tipos: Leis cinemáticas, dinâmicas e de interação. Esta
classificação aplica-se tanto nas leis básicas como nas derivadas. E tem a
vantagem de ampliar a aplicabilidade fora da mecânica. A consciência dessa
classificação ajudaria os estudantes na aplicação das leis.

As leis cinemáticas básicas definem os conceitos físicos de espaço,


tempo, referencial, partícula, posição e trajetória. A primeira lei de Newton
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pertence a esta classe, pois ela define referencial inercial pela distinção com
referencial acelerado. Ao lado desta lei, os livros textos introduzem
informalmente e de forma não sistemática outras leis cinemáticas sem identifica-
las. Para ensinar cinemática informalmente isso é bom, mas os estudantes
precisam de ajuda para distinguir leis físicas de meras fórmulas matemáticas.
Por que eles não levados a saber que o familiar Teorema de Pitágoras aplicado
a um espaço físico é uma lei física, pois ele especifica a relação entre medidas
independentes de período de tempo? Isto os prepara para a ideia de curvatura
do espaço na teoria geral de Einstein. Por que os livros textos não identificam o
teorema da adição de velocidade (relacionando velocidades em diferentes
sistemas de referência) como uma lei cinemática derivada? Que poderia
preparar os estudantes para uma eventual compreensão que essa lei é somente
uma verdade aproximada de acordo com a teoria especial de Einstein. Sem
formulação explícita das leis cinemáticas básicas da física clássica como os
estudantes poderiam avaliar que as teorias geral e especial da relatividade de
Einstein são ambas modificações dessas leis? Se isso é considerado esotérico
para uma física clássica introdutória, perguntamos, “Em que grau é a confusão
dos estudantes entre descrições físicas em diferentes sistemas de referência e
diferentes especificações de leis físicas envolvidas?

Leis dinâmicas determinam a evolução temporal de variáveis de estado


em modelos. A lei dinâmica básica da mecânica é, é claro, a segunda lei de
Newton. Mas há muitas outras leis dinâmicas derivadas que são aplicadas sob
condições especiais, por exemplo, as leis da energia, momento linear e
conservação do momento angular. Outras leis dinâmicas são aplicadas a tipos
especiais de modelos. Por exemplo, duas leis dinâmicas são necessárias para
caracterizar um corpo rígido em movimento: o teorema do centro de massa para
caracterizar o movimento translacional e o teorema do torque-momento angular
para caracterizar o movimento rotacional.

As leis de interação básica da mecânica newtoniana incluem as três leis


de Newton e a lei de superposição de força bem como uma variedade de leis
específicas de força, tais como a lei da gravitação de Newton. Interações
conservativas podem alternativamente ser caracterizadas por funções de
energia potencial. Algumas vezes interações são expressas por equações de
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restrição. Estudantes podem se beneficiar com uma classificação e descrição


completa e sistemática de interações e leis de interações com ênfase nos
agentes para cada tipo e condições de interações que sejam significativas.
Pesquisas (referências 3, 4) mostram que, sob instrução convencional,
estudantes demoram a dominar conceitos de interação, talvez por que eles não
tenham clareza sobre o que é para dominar.

Figura 1. Desenvolvimento do modelo em mecânica.


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C. Modelagem e resolução de problemas

O processo cognitivo de aplicação de princípios de uma teoria para


produzir um modelo de algum objeto ou processo físico é chamado
desenvolvimento do modelo ou simplesmente modelagem. Uma estratégia para
desenvolvimento de modelos em mecânica é apresentada esquematicamente
na figura 1. A estratégia coordena a aplicação de conhecimentos matemáticos e
científicos para a modelagem de processos e objetos físicos. O desenvolvimento
do modelo é subdividido em quatro estágios maiores para serem implementados
sucessivamente, como indicado pelas setas nos subestágios na figura 1. A
implementação de cada subestágio é direcionada por uma tática especial de
modelagem para um tipo particular de modelo a ser desenvolvido.

A estratégia de modelagem delineada na figura 01 é óbvia para os físicos,


visto que eles aprenderam a segui-la automaticamente nas análises de situações
e problemas físicos. De fato, a figura 01 pode ser considerada como um
esquema dos passos essenciais no processo de modelagem em vez de uma
estratégia prescritiva. Porém, já que cada passo é essencial à modelagem, a
estratégia prescritiva deve ser seguida, embora ocorra algum desvio na ordem
em que os passos são realizados e um refinamento (back-tracking) seja
frequentemente necessário. Os físicos têm aprendido estratégias de modelagem
de longa experiência e estudantes de física iniciantes fracassarão até
aprenderem por eles mesmos. O ensino de formulação explícita de estratégias
e táticas de modelagem poderia acelerar a aprendizagem de habilidades efetivas
de modelagem.

Acredito que a resolução de problema em física é primariamente um


processo de modelagem. Consequentemente, proponho a estratégia de
modelagem da figura 01 como uma estratégia de resolução de problema geral
para ser ensinado explicitamente aos estudantes de física. Para compreender
como se aplica a estratégia precisamos ver como coordena-la com táticas e
técnicas específicas de modelagem. Com esse objetivo discutiremos os quatro
estágios de modelagem – (I) Descrição, (II) Formulação, (III) Ramificação e (IV)
Validação – na ordem de sua implementação.
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I) O estágio de descrição é restringido pela escolha da mecânica como


teoria a ser aplicada, para a teoria descrever que tipo de objeto e propriedade
pode ser modelada. Note que os três componentes do estágio descritivo
correspondem aos três tipos de variáveis descritivas. O produto principal do
estágio descritivo é um completo conjunto de nomes e variáveis descritivas para
o modelo, junto com as interpretações físicas para todas as variáveis.

A descrição do objeto requer uma decisão sobre o tipo de modelo a ser


desenvolvido. Por exemplo, um dado objeto sólido pode ser modelado como uma
partícula material, um corpo rígido ou um sólido elástico. A teoria fornece
modelagem especial de princípios e técnicas para cada tipo de modelo diferente.

No movimento descrito (figura 01) as variáveis de estado e o modelo são


especificados. As variáveis de estado podem ser básicas ou derivadas. Variáveis
básicas são definidas implicitamente por leis genéricas da teoria, enquanto
variáveis derivadas são definidas explicitamente em termos de variáveis básicas.
Em mecânica, velocidade e posição de partículas são variáveis de estado
básicas, enquanto posição do centro de massa, energia cinética, momentum, e
momentum angular são variáveis derivadas. Determinar a escolha ótima das
variáveis de estado é um problema tático cuja solução depende do tipo de
processo sendo modelado. Por exemplo, variáveis de posição e velocidade são
geralmente melhores para movimento de projéteis, enquanto momentum e
energia cinética são normalmente melhores para colisões. Note que as variáveis
de estado não são bem definidas sem (tacitamente, ao menos) invocar leis
cinemáticas e especificar um quadro de referência.

Além das especificações das variáveis de estado, uma descrição do


movimento caracteriza-o com um todo, ao menos qualitativamente, e especifica
quaisquer valores conhecidos das variáveis de estado. A variedade de técnicas
de modelagem tem sido desenvolvida com este propósito, incluindo tabelas,
mapas e gráficos. Para um objetivo pedagógico, mapas de movimento, tais como
aquele na Figura 02, merece ênfase especial. Um mapa de movimento para uma
partícula é um diagrama de sua trajetória no espaço, com grandeza vetorial ou
escalar somente para variáveis cinemáticas.
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Figura 2. Modelos cinemáticos.

Os vetores indicam velocidade, aceleração e posição (como apropriado) em


momento típico e crítico, tais como o início e o meio da trajetória. Como Heller e
Reif tem enfatizado (referência 5) forças não pertencem a um mapa de
movimento, senão eles se confundem com variáveis cinemáticas.

É claro, um mapa de movimento acurado não pode ser desenhado até


que as equações do movimento estejam resolvidas, então a descrição do
movimento pode ficar incompleto até que se tenha tal resolução. De qualquer
maneira, a descrição qualitativa baseada na hipótese cinemática (na verdade,
lei) que o movimento é contínuo é possível nesse estágio inicial de modelagem.

Na descrição de interação, cada atuação do agente sobre o objeto é


identificada junto com o tipo de interação. Por isso as variáveis de interação são
introduzidas para representar as interações e suas características são descritas
qualitativamente usando técnicas diagramáticas. A técnica apropriada depende
do modelo e do tipo de interação. Diagramas de força são apropriadas quando
as interações são representadas por força. Mas diagramas de energia são
apropriados quando as interações são representadas por potencias (variáveis de
interação derivadas). Todavia, em contraponto ao diagrama de força, um
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diagrama de energia não pode ser desenhado até que as leis de interação fiquem
bem especificadas, então ele é menos prático para uma descrição inicial. Para
objetivos pedagógicos, mapas de interação merecem ênfase especial, como Reif
e Heller têm mostrado. Um mapa de interação descreve as forças atuantes sobre
uma partícula em pontos chaves da trajetória. É como um mapa de movimento,
exceto que os diagramas de forças são desenhados nos pontos chaves em vez
dos diagramas cinemáticos indicando velocidade e aceleração. Pela
comparação no mapa de interação com o correspondente mapa de movimento,
estudantes podem verificar a correspondência entre a força resultante e os
vetores aceleração. Essa verificação é valiosa para a consistência entre os
movimentos e as descrições de interação, bem como um importante teste de
compreensão básica.

Livros textos são decorados generosamente com diagramas, mas não


mostram aos estudantes o papel essencial dos diagramas na resolução de
problemas, ou mesmo distinguem o papel dos diferentes tipos de diagramas. É
verdade que às vezes um experiente resolve problemas sem usar diagramas,
mas a informação no diagrama deve dar uma representação equivalente na
cabeça dos experts. Estudantes precisam lidar com a representação explícita da
informação em diagramas, porque eles não têm a necessária “intuição física”
para se dar bem sem eles. Realmente, a prática de construir e interpretar
diagramas de vários tipos provavelmente contribui bastante para o
desenvolvimento da intuição física.

O objetivo de um mapa em modelagem é representar relações


geométricas entre objetos no modelo ou caraterísticas cinemáticas da trajetória
no mapa de movimento. Classificações para variáveis geométricas como
distâncias, ângulos, direções e posições coordenadas são partes integrantes de
um mapa, porque eles especificam os referentes físicos, ou melhor, a
interpretação física dos símbolos que aparecem nas equações do modelo
matemático.

Forças podem ser representadas em um mapa por setas com a cauda


ligada ao ponto onde a força atua. Infelizmente, livros textos de engenharia e de
física frequentemente negligenciam essa importante convenção. Algumas vezes
eles colocam a cabeça da flecha no ponto de aplicação para indicar um
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“empurrão” em vez de um “puxão”. Este pouco de antropomorfismo somente traz


maiores dificuldades aos estudantes para distinguir suas percepções sensoriais
do conceito físico objetivo de força. Além disso, para desenvolver uma
concepção clara de um campo de força é essencial associar cada força com um
ponto particular onde elas atuam. Esta é a razão para cada estudante associar
a cauda do vetor força a um ponto de aplicação desde o início.

Para escrever as equações do movimento para um objeto material,


devemos separar conceitualmente o objeto de seu ambiente. A construção de
“diagramas de corpo livre” ajuda os estudantes em suas aprendizagens. Um
diagrama desse tipo representa somente as forças sobre um corpo e o ponto
onde elas atuam. Deveríamos distinguir de um diagrama de forças que
representa forças isoladas. Infelizmente, muitos livros textos falham nisso. Eles
desenham um diagrama de corpo livre completo para algum corpo rígido como
um bloco sobre um plano inclinado; então escrevem um monte de equações para
um ponto no modelo-partícula do corpo, sem ao menos mencionar que, ao fazer
isso, eles ignoram informações sobre o ponto onde as forças atuam. Esta é uma
boa oportunidade para enfatizar aos estudantes que todo modelo é somente uma
representação parcial de um objeto, algumas vezes ignorando propriedades
óbvias. Nesse caso, o modelo-partícula ignora o tamanho e forma do objeto,
propriedades que depois podem ser retomadas dentro de uma abordagem mais
completa do modelo de corpo rígido. Consequentemente, quando um modelo-
partícula é utilizado, o diagrama de corpo livre para um corpo extenso deverá ser
reduzido a um diagrama de força, o diagrama de corpo livre para uma partícula.

A importância pedagógica de desenhar os diagramas de força não pode


ser subestimada. Para desenhar tal diagrama, o estudante primeiramente deve
identificar forças relevantes. Os rótulos no diagrama promovem a interpretação
física para símbolos nas equações de movimento. Um diagrama completo com
a cauda do vetor força em um ponto ajuda nas necessidades do estudante para
escrever as equações corretas do movimento. Poucos estudantes percebem o
significado do diagrama de forças a menos que isso seja enfatizado na instrução.

Nossa discussão sobre o estágio de descrição tem sido bastante prolixa,


porque é onde os estudantes têm maiores dificuldades, é o estágio de
modelagem mais preterido pela maioria dos livros textos e professores.
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(II) No estágio de formulação do desenvolvimento do modelo, as leis


físicas de interação e movimento são aplicadas para determinar equações
específicas do movimento para o objeto modelado e qualquer equação
subsidiária de restrição. A passagem do diagrama de forças para equações de
movimento não é de forma automática. O ponto principal para ser entendido é
que 𝑓 = 𝑚𝑎 transforma-se uma equação do movimento somente quando a forma
funcional de 𝑓 pode ser especificada com uma ou mais leis específicas. Livros
textos e professores escrevem equações do movimento sem que os alunos
tenham identificado todas as hipóteses envolvidas. Em particular, há uma
tendência para usar equações de restrição “fora do chapéu”. Geralmente os
livros textos não explicam que equações de restrição em mecânica aparecem de
hipóteses tácitas sobre forças internas. Estudantes deveriam ser alertados para
isto analisando exemplos particulares, então eles compreenderiam que qualquer
conexão física em mecânica vem de forças.

(III) No estágio de ramificação, as propriedades e implicações especiais


do modelo são trabalhadas. As equações do movimento são resolvidas para
determinar trajetórias com várias condições iniciais; a dependência temporal da
descrição derivada tais como energia é determinada; resultados são
representados analiticamente e graficamente e então analisados. A ramificação
que descreve a evolução temporal de alguma variável descritiva, tal como
energia, pode ser considerada como um modelo em processo. Nos referimos a
um modelo juntamente com uma ou mais destas principais ramificações como
um modelo ramificado.

O processo de ramificação é, em grande parte, matemática e livros textos


geralmente tratam dele adequadamente, por exemplo, na análise do movimento
harmônico simples como uma ramificação do modelo resumido para uma
partícula vinculada a uma força linear. Algumas técnicas de ramificação geral, tal
como o método da satisfação restrita, são discutidas por Reif e Heller (Referência
02). A principal deficiência em tratamentos de livros textos é que a ramificação
não é identificada claramente como tal e integrada como um processo geral de
modelagem. Isto contribui para as dificuldades que os estudantes têm em
reconhecer quando uma ramificação particular deve ser usada.
18

A figura 2 mostra ramificações para o principal modelo cinemático da


mecânica de partículas. Os modelos são especificados pelas equações definidas
em forma vetorial ou coordenada. As ramificações incluem soluções e mapas de
movimento como ajuda para interpretar as soluções. A figura 2 é mostrada aqui
para uso geral como ajuda instrucional, exibindo o mais importante pensamento
que os estudantes precisam ter para saber sobre mecânica básica. Tenho
encontrado nele utilidade ao dar uma cópia para cada estudante como referência
rápida durante a resolução de problemas em sala de aula e dever de casa.
Recomendo que os estudantes iniciem familiarizando-se bastante com modelos
ramificados de cada tipo cinemático na figura antes de estudar a dinâmica
associada. Eles poderão identificar o tipo cinemático em cada modelo dinâmico
até isso tornar-se automático. Assim, por exemplo, eles podem reconhecer que
uma força constante, qualquer que seja a origem, implica aceleração uniforme,
então eles terão suas ramificações conforme a figura 2. Eles deverão se
familiarizar com o conteúdo da figura e a cópia impressa não será necessária na
hora da prova.

(IV) O estágio de validação é concernente à avaliação empírica do modelo


ramificado. Em problemas de livros textos isto pode atingir não mais que
avaliação do raciocínio de resultados numéricos. Entretanto, na pesquisa
científico pode envolver um teste experimental de laboratório.

Frequentemente os estudantes não conseguem perceber quando a


resposta para um problema do livro texto é irracional e não têm ideia como a
resposta pode ser checada. Penso que a maior razão para esse insucesso é
que os estudantes não têm ciência do modelo subjacente a seus resultados. Eles
não sabem que a solução completa de um problema é baseada em um modelo
no qual qualquer resposta numérica é um resultado subsidiário. É o modelo
inteiro que precisa ser avaliado quando uma solução é checada. Enquanto os
estudantes procuram a solução como um mero número ou fórmula, somente
poderão checa-lo pela comparação com as respostas chaves.

A abordagem que defendo aqui é completamente caracterizada pelo


slogan O MODELO É A MENSAGEM. Estudantes poderão ser ensinados que a
chave para resolver um problema típico de física é o desenvolvimento de um
modelo da informação. Realmente, um problema não pode ser completamente
19

compreendido até que o modelo tenha sido construído. No entanto, a informação


dada em um problema é insuficiente para compreende-lo totalmente. Deve ser
suplementado pelo conhecimento teórico para construir um modelo. Isto, sugiro,
é o núcleo de verdade do velho ditado “um problema bem compreendido está
quase resolvido!”

A estratégia de modelagem que tenho discutido fornece um quadro teórico


coerente para leituras sobre modelos durante um curso de física. Recomendo
que o professor explane a relevância da apropriação dos estágios de modelagem
em seu discurso. Se ele não souber, poderá aprender alguma coisa a respeito.
Deverá esforçar-se também para mostrar aos alunos como os modelos são
usados para “compreender” fenômenos empíricos. Em particular a exposição de
cada demonstração ou experimento deverá ser acompanhada por uma
demonstração clara do modelo ou modelo parcial usado para interpreta-lo. O
MODELO É A MENSAGEM! E vale a pena comparar modelos alternativos para
mostrar como a evidência empírica é usada para determinar qual é o “melhor”.
“DIFERENTES MODELOS, DIFERENTES MENSAGENS!” Finalmente,
estudantes deverão ser encorajados a aplicar a estratégia de modelagem na
análise de livros textos. Eles aprenderão a reconhecer em suas leituras quando
O MODELO É A MENSAGEM.

Para resolver problemas, nossa estratégia de modelagem precisa ser


suplantada por alguns procedimentos procedimentais adicionais. Qualquer
problema físico pode ser atacado com a seguinte estratégia geral de
desenvolvimento de modelo:

(I) Desenvolver um modelo adequado da situação especificada pelo


problema (se possível).

(II) Ramificar o modelo para gerar a informação desejada (se possível).


Este posicionamento estratégico direciona o desenvolvimento do modelo para
um objetivo específico. Um físico possui uma coleção de modelos abstratos com
ramificações já trabalhadas ou facilmente geradas. Ele resolve muitos problemas
rotineiros pela simples seleção de um modelo ramificado de sua coleção e
combina-os para a situação no problema. Por exemplo, uma vez identificado um
problema como um “problema de projétil” imediatamente fazemos a ramificação
20

para aceleração uniforme na figura 2 para resolve-lo. Se necessário podemos


gerar mais ramificações, tal como uma “cadeia de fórmulas” do projétil. Para
problemas como este, a chave para o desenvolvimento do modelo é
simplesmente escolher o modelo ramificado correto. Para outros problemas é
necessário desenvolver um modelo de partida. Para implementar a estratégia de
desenvolvimento geral necessitamos de alguns procedimentos táticos:

(1) O ataque sobre um problema inicia pela extração de informações que


podem ser usadas no desenvolvimento do modelo e representando-o de
forma esquemática. Essa informação é de dois tipos: sobre objetos e suas
propriedades ou sobre processos.
(2) A análise inicial do problema é completada pela formulação do objetivo
em termos de informação sobre objetos ou processos a serem
determinados.
(3) Para dar informações sobre propriedades pode-se determinar a teoria
científica relevante e selecionar os tipos de modelos para os objetos de
interesse. Para um problema em mecânica podemos prosseguir com o
processo de desenvolvimento de modelo delineado na figura 01.
(4) Antes de gerar a descrição de um modelo devemos decidir em usar
variáveis básicas ou derivadas. A melhor decisão depende da
especialidade do conhecimento relativo ao problema. Por exemplo,
sabemos da experiência que variáveis de momentum são mais
convenientes para descrever processos de colisões.
(5) Depois que um modelo foi formulado deverá ser checado para ver se a
informação especificada é teoricamente suficiente para determinar a
informação desejada. Neste ponto deverá também ser possível identificar
alguma informação específica que seja contraditória ou irrelevante para o
objetivo.
(6) Para chegar mais rapidamente ao objetivo é melhor selecionar ou derivar
equações para variáveis desejadas da lei do modelo e então proceder à
resolução dessas equações. O principal ponto é que, no desenvolvimento
estratégico do modelo, a ramificação é direcionada para um objetivo
específico, enquanto que, no desenvolvimento do modelo geral, o
propósito da ramificação é explorar e analisar implicações do modelo.
21

Exploração e análise são o motivo principal da informação específica


precisar guiar o desenvolvimento estratégico do modelo, incluindo
decisões como a melhor escolha de variáveis no estágio descritivo.

Físicos têm aprendido estratégias e táticas de modelagem de longa


experiência. A questão pedagógica é se os estudantes podem aprender
modelagem rápida e eficientemente quando é explicitamente formulada e
ensinada.

A pesquisa em resolução de problemas mostra que, para problemas


rotineiros, os físicos passam rapidamente e facilmente do estágio de descrição
do desenvolvimento do modelo. Eles têm controlado o processo descritivo tão
perfeitamente que a maior parte dele pode ser feito mentalmente somente com
um pouco de observação, tal como um desenho diagramático rápido. Mas os
estudantes frequentemente não conseguem completar o estágio de descrição e
consequentemente não completam a modelagem necessária para resolver o
problema. Por outro lado, para problemas complexos ou “manhosos”, o expert
geralmente gasta muito mais tempo que o novato no estágio de descrição. O
expert não passa para o estágio de formulação até uma descrição satisfatória
ser realizada. Sendo a descrição o primeiro estágio da modelagem, tudo isso
sugere que um bom ensino do estágio de descrição em modelagem é o passo
mais crítico para aprimorar a compreensão e performance dos estudantes.
Evidências empíricas em apoio a esta conjectura deverá ser dada em artigo
subsequente.

D. Teoria da modelagem

Teoria da Modelagem é uma teoria geral do conhecimento procedimental


em ciência. Nas páginas precedentes a teoria da modelagem foi formulada com
um olhar na aplicação específica em mecânica. Mas temos interesse em
desenvolver uma teoria geral da instrução aplicável ao ensino de qualquer parte
da física. Para mostrar que a teoria da modelagem é facilmente generalizada, o
processo de desenvolvimento do modelo é esquematizado na figura 03 como
uma generalização direta da figura 01.
22

Figura 3. Desenvolvimento geral do modelo

O desenvolvimento do modelo esquematizado na figura 03 não se aplica


somente a uma parte da física, mas a qualquer campo da ciência. A teoria da
modelagem deve ser considerada como um complemento da Teoria dos
Sistemas, uma teoria geral da estrutura e função dos modelos matemáticos que
tem sido desenvolvida durante as últimas décadas principalmente por
23

engenheiros e matemáticos aplicados. Mario Bunge (referência 07) desenvolveu


uma teoria do sistema dentro de uma estrutura geral da ciência. A aplicabilidade
da teoria da modelagem para qualquer campo científico é evidente em seu
trabalho.

Notemos algumas características peculiares na figura 03, especialmente


em comparação com a figura 01. O objeto a ser modelado pode ser um objeto
composto, em outras palavras, um sistema composto de mais de um objeto.
Consequentemente, a descrição dessa composição deve especificar o tipo de
cada objeto componente como determinado pela teoria científica relevante. A
descrição do movimento na figura 01 foi generalizada para o conceito de
descrição do processo, mas as variáveis de estado ainda representam
propriedades intrínsecas do sistema que podem variar com o tempo. A descrição
da interação inclui a descrição da estrutura do sistema pela especificação das
conexões internas (ou interações) entre os objetos componentes. As relações
específicas das interações internas das variáveis de estado são determinadas
pela teoria relevante. Importante é a determinação das propriedades emergentes
no estágio de ramificação. Essas são propriedades peculiares do sistema como
um todo que não são propriedades de nenhum de seus objetos componentes. A
determinação das propriedades emergentes pode ser dificultada em “sistemas
não lineares”.

Para garantir que a caracterização do desenvolvimento do modelo na


figura 03 não seja vaga, vamos considerar sua aplicação para modelagem fora
do domínio da mecânica. Uma aplicação para modelar um circuito elétrico
simples é mostrada na figura 04. Note que a classificação do objeto como um
circuito elétrico pesa para a decisão que a teoria do circuito elétrico é a teoria
relevante para aplicar na modelagem. A teoria do circuito especifica o tipo de
variáveis para serem empregadas na descrição e conta-nos que outras variáveis,
tais como a massa do objeto, são irrelevantes. A teoria do circuito tem ela própria
um sistema de técnica especial de modelagem, incluindo a construção e
interpretação de diagramas tal como o da figura 04. Note como o diagrama
relaciona os três subestágios descritivos.
24

Figura 4. Modelagem de um circuito LRC

I. Descrição
A. Descrição do objeto. Tipo: Circuito elétrico. Composição: Indutor, resistor, capacitor.
Variáveis do objeto: L, C, R.
B. Descrição do processo (ver ramificações). Variáveis de estado: Corrente I e carga do
capacitor Q.
C. Descrição da interação. Tipo e agente: Gerador AC. Conexões internas (entre
componentes): ver diagrama. Conexões externas: Princípios de Fem. Variáveis de interação: E
(Fem.).
II. Formulação
A. Leis de interação: (1) 𝐸 = 𝐸0 sin 𝜔𝑡. (2) Potenciais através dos componentes:
𝐿𝐼, 𝑅𝐼, 𝑄/𝐶.
B. Leis dinâmicas: Leis de Kirchhoff.
𝑄
C. Modelo abstrato: Equações de transformação: 𝐿𝐼 ̇ + 𝑅𝐼 + = 𝐸, 𝐼 = 𝑄̇ .
𝐶

III. Ramificações (exemplos): Descrição da solução de estado constante pelo diagrama de fase.
Propriedades emergentes: ressonância e modulação.

A teoria do circuito pode ser formulada como uma teoria do próprio


conteúdo para modelagem de uma classe especial de objetos, incluindo a
aplicabilidade e condições de utilidade para decidir qual teoria é relevante. Isso
poderá facilitar o uso da teoria do circuito no desenvolvimento e aplicação do
modelo. Contudo, em livros textos de física básica, os princípios e técnicas
especiais da teoria do circuito são dispersas e nunca são reunidas em uma
formulação completa e sistemática. Isso parece ser devido ao fato de que a teoria
do circuito não é uma teoria fundamental da física, livros textos são preocupados
em criar a base para teoria do circuito mais de princípios fundamentais tais como
as leis de Ampere e Faraday. A derivação dos princípios da teoria dos circuitos
é de grande importância, porque elas estabelecem as limitações bem como
origens genéricas daqueles princípios especiais de leis. Porém, a derivação deve
ser claramente separada da formulação da teoria do circuito por razões teóricas
bem como por razões práticas já mencionadas. A teoria dos circuitos fornece aos
25

estudantes um excelente exemplo de estrutura da ciência em que os princípios


para modelagem de objetos em um nível são os próprios conteúdos, mas
derivados de princípios em um nível genérico maior. Como Bunge (referência
07) mostrou, a elucidação do nível de estrutura da ciência é o grande tema da
Teoria dos Sistemas para inter-relacionar toda a ciência. A teoria dos circuitos
também fornece bons exemplos de propriedades emergentes que ocorrem em
sistemas de complexidade crescente, em particular as propriedades de
ressonância e modulação que aparecem em ramificação de um circuito RLC.

Essas observações são um meio de sugerir que o uso sistemático da


teoria da modelagem na instrução poderá ajudar os estudantes a ganharem uma
visão unificada e coerente da ciência. A teoria da modelagem é necessária tanto
para o desenvolvimento como para a aplicação. E a tarefa está longe de trivial,
embora em grande parte consistirá de articulação e organização de ideias
conhecidas.

III. CIÊNCIA COGNITIVA E TEORIA INSTRUCIONAL

A maioria dos físicos dão pouca atenção à psicologia, mas eles não
podem evita-la em seus ensinos. A prática instrucional é necessariamente
fundamentada em algum sistema de crença sobre inteligência e conhecimento,
contudo tácita ou rudimentar. A psicologia cognitiva ainda é imatura para
promover uma fundamentação segura para a teoria instrucional, mas a situação
está mudando. Pesquisas cognitivas recentes têm identificado sérias falhas na
prática de ensino tradicional e trouxe à tona problemas difíceis que precisam ser
abordados. Meu objetivo aqui é chamar atenção para alguns destes trabalhos e
suas implicações pedagógicas. Isto aumenta e atualiza a discussão em artigo
anterior (referência 08), que serão tomadas como pano de fundo.

O desenvolvimento de uma teoria científica para processos cognitivos é


muito difícil e importante para ser deixada somente a cargo dos psicólogos. De
fato, ela já evoluiu a um programa de pesquisa multidisciplinar chamado Ciência
Cognitiva (referência 09). O objetivo geral é produzir um sistema teórico da
inteligência compreensível, incluindo inteligência artificial por um lado e
inteligência humana por outro. O programa transfere todo o campo de esforço
intelectual da ciência da computação para a psicologia, incluindo a história e
26

filosofia da ciência, bem como linguística, matemática e várias outras ciências.


O processo de aprendizagem e compreensão física e matemática torna-se um
foco da pesquisa cognitiva, porque esses conteúdos são especialmente claros e
bem desenvolvidos. Enfatizarei tal trabalho porque é especialmente relevante
para o ensino de física. Mas meu principal interesse é localizar o
desenvolvimento da teoria instrucional dentro do programa da ciência cognitiva.

A. Resolução de problema e sistema especialista

A análise de processos cognitivos em resolução de problemas emergiu


como uma importante linha da pesquisa cognitiva nas últimas duas décadas
(referência 10). Isto inclui pesquisas sobre resolução de problemas de livros
textos em física básica (referências 11-15). A pesquisa vem ocupando-se com a
identificação e documentação de diferentes fontes empíricas sobre a
performance na resolução de problemas de especialistas e novatos e
desenvolveu uma teoria plausível para dar conta dessas diferenças. Embora o
especialista, como é de se esperar, possua bem mais conhecimento factual que
o novato, sua superioridade na performance em resolução de problemas é
devida principalmente ao conhecimento procedimental que o habilita a buscar os
fatos e princípios corretos para resolver o problema em um curto tempo.
Identificar e descrever precisamente o conhecimento procedimental é um
problema difícil em pesquisa cognitiva, pois muito dele é conhecimento tácito
que não é reconhecido pelo especialista que o possui. O valor pedagógico de tal
pesquisa é óbvio em qualquer domínio cognitivo, pois deverá ajudar a pontuar
precisamente o que precisa ser aprendido para o desempenho habilidoso nesse
domínio. Outra aplicação é com relação ao desenho de sistemas especialistas.
Um sistema especialista é um programa de computador habilidoso na resolução
de problemas em um domínio específico. Evidentemente, tal programa não pode
ser escrito até que o conhecimento procedimental possa ser descrito
precisamente. O desenvolvimento de sistemas especialistas para aplicações
especializadas, desde o ajuste diário de tarifas aéreas ao diagnóstico médico,
está em rápida expansão. Isso terá um maior impacto econômico e social nas
próximas duas décadas.

Em um domínio cognitivo específico, tal como a mecânica newtoniana, o


conhecimento procedimental necessário para resolução de um problema pode
27

ser descrito como um sistema de produções. A produção é definida como um par


condição-ação expresso na forma: Se a condição A é satisfeita, então realiza a
ação B. Um bom teste para a adequação de uma descrição procedimental é usa-
la para descrever um programa de computador para emular o desempenho na
resolução de problema de um sujeito humano. Isto é frequentemente difícil ou
impossível com os atuais sistemas de computadores, porque eles não podem
comparar capacidades de percepção humana para reconhecer quando
condições são satisfeitas, mesmo que a emulação em computador tenha
estimulado pesquisas para melhorar as descrições de conhecimentos
procedimentais e identificar certas lacunas. A dificuldade nesse assunto deixou
claro que o conhecimento do especialista, mesmo em um “simples” domínio
como mecânica elementar, é mais complexo e extenso do que os próprios
especialistas geralmente se dão conta.

A pesquisa e teoria em resolução de problema tem implicações


importantes para o ensino de física. Para iniciar, o fato não é que os especialistas
não resolvem problemas, mas o modo como eles fazem é que não tem sido
cuidadosamente documentado. Aquilo que o especialista diz tem sido registrado
como um recital de um livro texto padrão. No entanto, o que ele faz é
completamente diferente daquilo que diz. Algum tempo atrás, Einstein notou uma
discrepância similar no que físicos teóricos diziam sobre o método que eles
usavam e o que realmente faziam, e deu um conselho: “Não escutem suas
palavras, observem o que eles fazem”. Acredito que essa atitude é um dos
princípios da genialidade de Einstein, pois seu grande trabalho veio de uma
crítica de um pressuposto físico que os demais cientistas negligenciaram. Tudo
isso sugere que um típico professor de física não é, provavelmente, muito bom
no ensino de resolução de problemas para estudantes iniciantes.

Algumas estratégias gerais de resolução de problemas, tais como “análise


meio-fim”, têm sido identificadas e estudadas a fundo. Uma estratégia é “geral”
quando aplica-se a um vasto campo de domínio cognitivo. Tais estratégias são
também “fracas” no sentido que, por si mesmas, suportam métodos ineficientes
de resolução de problemas. Métodos e estratégias poderosas empregam
domínio de conhecimento específico, por isso elas têm um alcance limitado de
aplicabilidade. Não tem havido muito sucesso na formulação de estratégias de
28

força intermediária. Assim, a maioria dos sistemas de especialistas


desenvolvidos até agora são pouco mais que pacotes de produtos, sem uma
estratégia significativa para organiza-los. E a maioria das pesquisas em
resolução de problemas em física tem reconhecido somente métodos muito
fracos ou muito fortes. Contudo, vimos na seção II que a teoria da modelagem
fornece uma estratégia potente para resolução de problemas com larga
aplicabilidade em ciências.

Consequentemente, sugiro que especialistas empreguem tacitamente


uma estratégia centrada em modelos para resolução de problemas em física.
Isto é o mesmo que dizer que o especialista ataque um problema físico
primeiramente pela construção de um modelo abstrato a partir dos “dados
adquiridos” no problema e então aplique o modelo para determinar a “incógnita”
desejada. Os truques táticos do especialista para resolver problemas são assim
coordenados em uma estratégia de modelagem geral. Em outras palavras, a
teoria da modelagem discutida na parte I fornece a base para uma detalhada
teoria da modelagem de resolução de problemas por especialistas em física. Ela
pode ser usada para dar conta de dados empíricos durante a resolução de
problemas por peritos, mas estamos mais concentrados aqui com a maneira dela
se ajustar em uma teoria geral da instrução.

A resolução de problemas é tradicionalmente ensinada por meio de


exemplos que os estudantes imitam. A desvantagem é que os estudantes
tendem a imitar apenas o que eles veem. E o que eles veem normalmente é que,
depois de poucas palavras do professor, algumas fórmulas são escritas no
quadro branco e uma solução numérica é obtida pela manipulação ou
substituição de dados. O professor pode até dizer que é importante, por exemplo,
“desenhar um diagrama”, mas ele raramente diz o porquê, além disso, o
estudante pode ver que a resposta vem da fórmula, então porque se incomodar
com um diagrama? Não é de admirar que os estudantes veem na escolha da
fórmula correta como a chave para a resolução do problema. Dessa forma eles
tendem a desenvolver uma estratégia de resolução de problemas centrada em
fórmulas tal como a seguinte: (a) compreensão do enunciado do problema para
elaboração de uma lista de dados e variáveis a serem encontradas, (b) pesquisa
de uma lista de fórmulas para encontrar uma equação que envolva essas
29

variáveis, (c) resolução da equação para encontrar a incógnita e rapidamente


dar a solução! Esta estratégia é especialmente efetiva para resolver dever de
casa quando as fórmulas necessárias podem ser encontradas no capítulo do
qual os problemas são retirados. Estudantes dedicados aprendem essa
estratégia trabalhando na resolução de um monte de problemas, então eles
percebem que “a prática faz a perfeição!” De fato, eles podem tornar-se muito
bons em caça fórmulas.

O problema com o ensino desse tipo é que há muito do conhecimento


procedimental do perito que é invisível ao estudante. Considerando a
investigação necessária para identificar o conhecimento tácito dos peritos, uma
pergunta que se faz é como tal conhecimento nunca é transmitido ao estudante
durante o ensino tradicional. Possivelmente ele não é transmitido, é somente
aprendido pelos poucos estudantes que descobrem-no por eles mesmos. De
qualquer modo, o conhecimento tácito do especialista deverá ser
frequentemente ensinado por meio de uma formulação explícita.

Conhecimento procedimental complexo não é fácil de ensinar, até quando


uma formulação explícita dos procedimentos está disponível. Em seu estudo de
resolução de problemas matemáticos, Schoenfeld (referência 18) mostrou como
o desempenho intelectual dos estudantes é profundamente afetado pelas suas
próprias crenças pessoais, a disciplina, o ambiente e a tarefa em ação. Por
exemplo, um estudante que acredita que “ciência é uma coleção de fatos” é
propenso a abordar a física como uma coleção de fatos e não vê a estrutura real
da mesma. Não é fácil livrar os estudantes de uma estratégia de resolução de
problemas centrada em fórmulas que eles têm usado com sucesso no passado.
Eles devem ser confrontados com situações em que a estratégia centrada em
fórmulas não resolva o problema e reconheçam que necessitam de outra
estratégia mais eficaz. Para facilitar a transição a uma estratégia centrada em
modelos, o professor precisa de uma compreensão clara da teoria da
modelagem e um método sistemático para ensina-la.

B. Representações do conhecimento

Há uma tendência em considerar as emulações computacionais do


desempenho humano durante a resolução de problemas como um modelo do
30

próprio processo cognitivo. Devemos considerar que tais modelos são


seriamente limitados e, algumas vezes, enganosos. A maioria dos modelos
computacionais para a cognição humana sofre duas principais restrições. Em
primeiro lugar, eles são incapazes de aprender, apenas acumulam dados. Seus
desempenhos podem ser aprimorados somente por programadores os quais
aprendem para eles. Em segundo lugar, os computadores representam e
processam informações em série, enquanto que o cérebro humano é, sem
dúvida, um processador em paralelo. Mas modelos em série resultam
diretamente de comportamento em paralelo na resolução de problemas. Por isso
emulações computacionais para a percepção humana, tais como o
reconhecimento de objetos, tem provado ser especialmente difícil, em grande
parte, porque esta é uma modelagem de processos paralelos utilizando um
computador em série.

Ao lado das simulações computacionais, modelos em série para a


cognição têm sido seriamente considerados pelos filósofos e psicólogos
operando sobre a premissa que linguagem é essencial para a cognição. A
produção da linguagem parece ser um processo em série, pelo menos em
superfície. Iniciando com George Boole em 1854, a análise da sintaxe da
linguagem levou ao desenvolvimento da lógica proposicional (ou simbólica), que
tem sido reconhecida como uma teoria das operações básicas do fundamento
da cognição. Uma variação dessa ideia foi proposta pelo psicólogo Jean Piaget,
o qual considerou que a lógica não é uma derivação da linguagem, mas originada
especialmente de uma coordenação total de ações (referência 19). Piaget
sugere que um grupo de quatro operações (matemáticas) chamadas grupo INRC
desenvolve-se espontaneamente no homem como um sistema de operações
mentais fundamentada em seus “Estágios de Operações Formais”, um nível de
desenvolvimento cognitivo em que a matemática e o pensamento científico
possivelmente iniciam. Esta hipótese arrojada é forte o suficiente para ser
submetida a teste empírico. Infelizmente, a conclusão depois de uma avaliação
cuidadosa é que é falha (referência 20). Evidentemente, a relação entre
operações mentais básicas e operações lógicas não é tão simples. Mas grande
parte da teoria de Piaget se mantem viável, incluindo sua caracterização dos
estágios da cognição humana (referência 08).
31

A ideia do uso da lógica proposicional para modelar processos cognitivos


enfrenta muitas outras dificuldades, a maioria notavelmente sobre o significado
das explicações usadas para compreender uma proposição. Johnson-Laird tem
argumentado persuasivamente que uma compreensão de uma proposição sobre
o mundo real ocorre somente pela construção de um modelo mental da situação
a qual a proposição se refere (referência 21). Esta ideia tem implicações
pedagógicas de longo alcance, e eu proponho faze-la como uma premissa de
nossa teoria pedagógica. A ideia que o desenvolvimento de modelos mentais é
crucial para “compreensão física” tem sido o assunto de uma série de estudos
cognitivos (referência 22). Contudo, há pouca aceitação sobre o que constitui um
modelo mental.

A teoria da modelagem nos diz que uma situação do mundo real é


considerada “fisicamente” pela construção de um modelo matemático para
representa-la. Agora devemos distinguir dois tipos de representação para o
modelo: uma representação externa (objetiva) em termos de símbolos
matemáticos, mapas, diagramas etc., e uma representação interna (mental ou
subjetiva) na mente de alguém que compreende. Em outras palavras, para
compreender um modelo matemático precisamos de um correspondente modelo
mental. A habilidade para construir tais modelos mentais é que os físicos
entendem por “intuição física”. Possivelmente, o desenvolvimento cognitivo deve
melhor ser descrito como desenvolvimento da habilidade de modelagem mental.
Não sabemos muito sobre representações mentais, mas sabemos que elas são
relatadas por meio de representações externas, e há toda razão para acreditar
que o desenvolvimento da intuição física é estimulado pela experiência
adequada com representações externas.

Qualquer bit de conhecimento pode ser representado de muitas maneiras


diferentes. O modo mais apropriado de representação depende de como a
informação está sendo usada. Modelos específicos de representação têm
frequentemente logrado papel crítico na descoberta científica. Isto tem sido
documentado por Arthur Miller em seus estudos sobre o papel das imagens em
descobertas importantes da física (referências 23 e 24). Por “imagem” ele
entende alguma forma de representação mental, mas sua análise enfatiza o
32

desenvolvimento de representações externas para as imagens, tal como um


diagrama de nível de energia ou diagrama de Feynman.

Técnicas diagramáticas certamente são importantes na pedagogia e


compreensão objetivando investigação e descoberta. Mas seu papel pedagógico
quase não tem sido estudado. Os estudantes precisam saber claramente o que
elas são. Para isso são necessárias pesquisas visando determinar como ensinar
o uso habilidoso delas. Sabemos que a maioria dos estudantes falham ao
dominar o uso do “diagrama de corpo livre” em física introdutória. Isso indica que
há grande falha na compreensão de técnicas mais complexas para representar,
por exemplo, os campos elétrico e magnético. Qualquer físico sabe que essas
técnicas são essenciais para compreender um determinado campo conceitual e
grande esforço tem sido dispensado ao ensino delas usando livros textos.
Contudo, esses esforços têm sido direcionados para uma técnica ineficaz, sem
qualquer estudo das dificuldades que os estudantes têm em aprender tais
técnicas ou mesmo como os estudantes podem tornar-se experts na utilização
delas.

A conclusão que chego é que o domínio de várias formas de


representação externa do conhecimento é essencial ao desenvolvimento da
intuição física e uma pesquisa pedagógica vigorosa é necessária para
determinar como isso pode ser ensinado eficientemente. Embora a pesquisa
pedagógica deva ser capaz de percorrer um longo caminho pelo estudo
sistemático de como a representação externa do conhecimento é aprendida e
aplicada, ela deve ser baseada, em última análise, pela teoria da representação
interna do conhecimento na mente do sujeito. Poucas pessoas sabem que uma
teoria desse tipo já existe e está se desenvolvendo rapidamente. Como a teoria
ainda não está consolidada sobre suas implicações pedagógicas, um breve
relato sobre seu status pode ser útil.

A teoria da rede de comunicação neural para o processo de informação


no cérebro é baseada sobre a “doutrina do neurônio” que diz que os neurônios
são elementos básicos do processamento mental. Embora a doutrina do
neurônio ainda não esteja consolidada, há evidências consideráveis em seu
favor e não há alternativas significativas disponíveis. Além disso, há grande
aceite sobre a maneira de transmissão do sinal neural, fazendo-se um conteúdo
33

ativamente pesquisado. Stephen Grossberg desenvolveu uma teoria de


comunicação em rede neural com um punhado de mecanismos básicos e
princípios que possui um alcance impressionante sobre a percepção,
aprendizagem, memória, atenção, controle motor e emoções (referências 25 e
26). De acordo com esta teoria, a unidade de representação básica da
informação no cérebro ocorre por meio de um padrão espacial. Assim a
informação temporal é representada como um padrão espacial. A teoria identifica
mecanismos neurais específicos que os psicólogos chamam de memória de
curto prazo (STM) e memória de longo prazo (LTM). A STM é um mecanismo
para armazenamento temporário de informação que permite processamento
rápido e seleção de informações que mereçam ser guardadas permanentemente
pelo mecanismo LTM. O mecanismo LTM para o armazenamento permanente
de informação e restauração é também um mecanismo universal de
aprendizagem. Cada tipo de aprendizagem humana é explicado pela
combinação desses mecanismos em uma rede de comunicação adequada.

Grossberg formulou uma porção de problemas gerais, princípios e


teoremas para guiar o desenho de redes de comunicação com capacidade de
processar informação. A chave do problema é o desenho de um filtro adaptativo
para codificar padrões significativos. A solução final do problema explica como o
cérebro desenvolve espontaneamente e atualiza um código para classificar
padrões recebidos. Ele diz como desenhar um sistema auto-organizador para
extrair invariantes de sua experiência. O mesmo desenho explica o processo de
unitarização em que grupamentos coerentes de informações codificadas são
comprimidas em unidades individuais, um processo chamado chunking por
psicólogos. Qualquer sistema adaptativo capaz de desenvolver e atualizar
códigos para informações recebidas precisa de um mecanismo de proteção para
prevenir codificação adventícia de informações errôneas. Grossberg chama isso
de dilema estabilidade-plasticidade. “Como pode um mecanismo de adaptação
do organismo ser suficientemente estável para resistir a flutuações ambientais
que não alteram o sucesso de seu comportamento, mas suficientemente plástico
para mudar rapidamente em resposta à demanda do ambiente que faz alterar o
sucesso de seu comportamento”. Sua solução brilhante para este problema tem
implicações profundas para a teoria da aprendizagem. Ele mantém que eventos
34

familiares e novos poderiam ser processados diferentemente. Para isso ele


propôs um sistema com dois subsistemas complementares: um subsistema
atencional para processos familiares (ou eventos esperados) e um subsistema
orientador ativado por eventos desconhecidos (ou inesperados). Todo o sistema
controla a atribuição de atenção consciente, um mecanismo para identificar
padrões significativos e armazenando-os na LTM (aprendizagem).

Essas observações qualitativas são superficiais sobre a teoria de


Grossberg. Devo acrescentar que a teoria tem uma formulação matemática na
tradição da física teórica. É suficientemente bem definida para ser emulada em
um computador. Na verdade, ele oferece a teoria para o desenho de novos
sistemas computacionais com interativa em tempo real e processamento
paralelo, com recursos além do alcance dos computadores em série (referência
27). Tais sistemas estão sendo construídos agora mesmo e com a promessa de
levar a revolução da informática além da assim chamada “quinta geração dos
computadores”.

C. Dialética da mudança conceitual

Há evidências substanciais que estudantes novatos em física formam


falsas concepções (misconceptions) sobre o mundo físico as quais interferem na
aprendizagem e compreensão de conteúdos (referências 3 e 4). Essas falsas
concepções são bastante estáveis no sentido de que a instrução convencional é
ineficaz para a correção delas. Além disso, parece que algumas misconceptions
graves sobre o mundo são inadvertidamente promovidas pela instrução
tradicional, como por exemplo a abordagem centrada em fórmula durante a
resolução de problemas. Para planejar uma instrução eficiente precisamos dar
conta da estabilidade dessas misconceptions e promover condições necessárias
e suficientes para corrigi-las. Não são poucas as pesquisas pedagógicas
atuando diretamente sobre essa questão. Meu objetivo aqui é apresentar uma
perspectiva intelectual para tais pesquisas.

A primeira coisa a perceber é que a estabilidade das misconceptions


sobre física não é um sinal de ignorância entre os estudantes. Ao contrário, é a
consequência da resistência da mudança conceitual que cada sistema
inteligente deve possuir para escapar do dilema estabilidade-plasticidade. É um
35

sinal que a condição necessária para mudança conceitual não tem sido atendida.
Quais são essas condições? A teoria de Piaget para o desenvolvimento cognitivo
sugere uma resposta.

De acordo com Piaget, a cognição tem um aspecto figurativo e um aspecto


operativo. O aspecto figurativo diz respeito à representação do conhecimento em
figurações estáticas (ou estados). O aspecto operativo concerne às operações
que transformam um estado em outro estado. Essas operações são integradas
dentro de sistemas ou “estruturas mentais”, chamadas esquemas, que são
usadas para interpretar e responder ao sinal de entrada provinda do ambiente.
Ele defende que “o problema central do desenvolvimento (cognitivo) é
compreender a formação, elaboração, organização e funcionamento dessas
estruturas”. Grossberg vai além de Piaget na identificação das configurações
como padrões espaciais de um tipo definido e caracterizando as operações
básicas desses padrões como um mecanismo de execução das operações e
organizando-os dentro dos esquemas.

Seguindo a teoria biológica, Piaget sugere que há dois tipos de


aprendizagens, chamadas por ele de assimilação e acomodação. Assimilação é
a integração da informação dentro de um esquema existente. Acomodação é a
modificação do esquema para ser consistente com a nova informação. Sob
condições apropriadas, a mudança do esquema ocorre espontaneamente por
um processo chamado de equilibração ou auto-regulação que envolve um
mecanismo de retroalimentação (feedback) relativo à ação e suas
consequências. Grossberg vai novamente além de Piaget na investigação do
mecanismo neural capaz de ambos os tipos de aprendizagem. Este inclui os
subsistemas atencional e orientador mencionados anteriormente. Parece que a
“assimilação” de Piaget pode ser identificada como um processo pelo
subsistema atencional. Este pode ser reconhecido como uma codificação da
informação em um código já existente, enquanto que “acomodação” envolve a
formação de novos códigos. Atualmente, dentro da teoria neural, qualquer
codificação da informação produz mudanças sutis dentro do código. Grossberg
(referência 28) argumenta que “estudantes são pessoas minimamente adptáveis
que mudam suas representações internas de eventos externos quando baseiam
seus comportamentos gerados por um feedback ambiental inesperado”. Isto
36

apoia um “quadro teórico epistemológico onde cada observador pode possuir


idiossincrasia e definições pessoais de objetos e eventos, e essas definições são
refinadas somente quando estão desadaptadas”.

O mesmo princípio geral de auto-organização adaptativa dentro de um


indivíduo pode ser visto operando na comunidade científica. O historiador
Thomas Kuhn distingue entre os processos de “ciência normal” e “ciência
revolucionária” que são análogas ao processo de assimilação e acomodação.
Em uma revolução científica a estrutura conceitual da ciência é revisada. A
resistência à revolução científica deve ser forte o suficiente para assegurar a
estabilidade da ciência em face das flutuações de opinião pública. Ideias
revolucionárias nunca são incorporadas no quadro teórico da ciência até que
elas tenham sido perfeitamente testadas em comparação a outras alternativas.
Depois de uma análise mais atenta, a distinção entre ciência normal e
revolucionária é difícil de fazer (referência 30). Assim, na ciência normal o
processo de acomodação é continuamente operado para reconciliar
discrepâncias entre modelos científicos e dados empíricos.

O processo pelo qual novas ideias sobre o mundo real são testadas,
aceitadas e integradas a um quadro teórico conceitual é de tal importância que
merece um nome. Proponho chama-lo de processo dialético. O termo “dialético”
tem hoje conotação infeliz, mas refiro-me à ideia subjacente. Dialética é sobre a
controvérsia e sua resolução por meios racionais, é o motor da mudança
conceitual em qualquer domínio intelectual. A essência do processo dialético é
a competição entre ideias incompatíveis no âmbito de algum quadro conceitual
para alcançar uma solução chamada “verdade”. A competição na ciência segue
regras bastante definidas, embora uma explicação coerente das regras não
possa ser encontrada em qualquer livro texto de física. Essas regras, de fato,
podem ser consideradas como regras de inferência, deixe-me chama-las de
inferência dialética em vez de processo dialético. Uma coerente, embora
incompleta, teoria da inferência dialética foi proposta por Edwin Jaynes e
sucessivamente ampliada para uma grande variedade de problemas em física e
engenharia (referência 31). Ela deve ter um lugar central no currículo de ciências.
Mas o principal ponto de interesse é que a inferência dialética é uma extensão,
ou talvez uma reflexão, do processo de auto-regulação na cognição humana. A
37

principal função deste processo dentro do indivíduo ou da comunidade científica,


é produzir uma representação ótima do mundo real consistente com as
informações disponíveis atualmente.

Uma revolução científica é uma revolução no arcabouço conceitual dos


cientistas. Para estudantes novatos a transição de um arcabouço conceitual
baseado no senso comum para um arcabouço conceitual newtoniano é uma
revolução. Nessa perspectiva, não é nenhuma surpresa que os alunos tenham
dificuldade em fazer essa transição. Contudo, a mesma perspectiva sugere que
a transição pode ser feita somente por um processo dialético. Então deveríamos
ser capazes de usar aquilo que sabemos sobre o processo dialético para
desenhar uma estratégia instrucional que provoque tal transição. Chamarei essa
estratégia de estratégia dialética de ensino.

Uma estratégia dialética de ensino é apropriada quando o estudante tem


concepções prévias (esquemas) que são incompatíveis com o que se quer
ensinar. A estratégia visa provocar no estudante um estado de “conflito cognitivo”
entre o novo saber e o conhecimento prévio e induzir o estudante a resolver o
conflito por meios racionais. Espera-se que a transição desejada ocorra porque
o estudante deve reconhecer deficiências em seu conhecimento prévio e atribuir
sentido ao conhecimento novo.

Antes que uma estratégia de ensino dialética possa ser implementada,


alguma coisa deve ser conhecida sobre a situação dos conceitos iniciais dos
estudantes. Quanto mais se saiba sobre esses conhecimentos, melhor é a
implementação. Infelizmente, esse conhecimento não é fácil de ser obtido. Ele
está armazenado nos esquemas dos alunos, que não podem ser inspecionados
diretamente pelo instrutor. O senso comum da intuição física de um estudante
que entra pela primeira vez em um curso de física foi desenvolvido ao longo de
sua experiência pessoal, na maioria das vezes sem esforço consciente. O ensino
tradicional não leva em conta adequadamente a intuição do estudante. Ele
frequentemente não é capaz de estabelecer as condições para o conflito
cognitivo necessário para dirigir a transição a partir do senso comum para uma
intuição próxima aos dos físicos.
38

Para o planejamento de uma instrução que leve em conta a intuição física


dos estudantes é necessário saber alguma coisa sobre a estrutura e composição
dessa intuição física. Um esquema “físico” é um tipo de crença que pode ser
observada somente indiretamente pelo comportamento padrão de um indivíduo.
Apesar disso, esquemas podem ser estudados, classificados e representados
(pelo menos parcialmente) como crença formulada verbalmente. Isto tem sido
usado com algum sucesso para a avaliação do senso comum sobre movimento
e suas causas (referência 04). Felizmente, as intuições físicas individuais não
são totalmente idiossincráticas. Particularmente, algumas crenças de senso
comum (esquemas) enquadram-se em um pequeno número de categorias bem
definidas. Então, uma instrução prática pode ser planejada a partir dessas
categorias de esquemas sem entrar nas idiossincrasias dos estudantes.

Esquemas individuais (crenças) estão inter-relacionados, assim um bom


planejamento instrucional deve levar isso em conta. A intuição física pode ser
considerada como um sistema desarticulado de crenças. Pesquisas mostram
que as crenças de senso comum da maioria dos indivíduos estão fracamente
inter-relacionadas e frequentemente inconsistentes. No entanto, as crenças dos
físicos estão fortemente inter-relacionadas e altamente consistentes. Isto sugere
que as crenças dos físicos podem ser mais resistentes a mudanças (como uma
revolução científica) que as crenças dos estudantes.

Para provocar conflitos cognitivos e direcionar equilibração que leve a um


sistema de crenças consistentes internamente em total acordo com a
experiência, ou seja, como o sistema de crença científico, recomendo uma
estratégia de ensino dialética com os seguintes elementos:

(1) Formulação explícita. Estudantes devem ser incentivados a


considerarem sistemas de crenças de senso comum formuladas
explicitamente (não necessariamente próprias deles). Provavelmente,
o professor terá que auxiliar nessa formulação, embora seja desejável
que os estudantes façam isso sempre que possível. Pesquisas sobre
crenças de senso comum mostram que é possível fazer isso
sistematicamente.
(2) Verificação para validade externa. Estudantes devem ser induzidos a
verificar suas crenças em face de evidências empíricas.
39

(3) Verificação de consistência interna. Estudantes devem ser induzidos a


verificar consistências mútuas entre suas crenças.
(4) Comparação com crenças alternativas. Estudantes devem ser
induzidos a comparar e decidir entre crenças conflitantes e sistemas
de crenças, incluindo as crenças científicas relevantes.

A estratégia de ensino dialética pode ser implementada em uma variedade


de métodos de ensino que podem ser cuidadosamente avaliados em sua
eficácia. Algum sucesso usando esta estratégia em resolução de problemas é
mostrado em um artigo subsequente (referência 32). Minstrell relata sucesso
impressionante no ensino do conceito de força newtoniana com estudantes do
ensino médio (referência 33). Se seu resultado puder ser reproduzido e
estendido, então teremos evidência empírica convincente que sustenta que a
instrução pode transformar o pensamento da maioria dos estudantes em
mecânica newtoniana. Devo mencionar que outros tem propostos métodos de
ensino para promover conflitos cognitivos (referência 34). É claro, o venerado
método socrático emprega uma estratégia dialética, e a dialógica socrática é um
meio comprovado para promover conflito cognitivo. Contudo, o propósito da
estratégia aqui é mais sistemático e direciona o método socrático.

Métodos de ensino dialéticos são lentos e pesados, embora eles possam


ser excitantes e efetivos quando habilmente empregados. Felizmente, nossa
teoria nos diz para quais propósitos os métodos dialéticos são mais apropriados,
quer dizer, para tornar visíveis crenças enraizadas e pouco claras por meio de
uma avaliação crítica. Para outros objetivos instrucionais, métodos dialéticos são
possivelmente mais eficientes e mais eficazes.

O objetivo do ensino dialético deve ser bem mais que alteração de crenças
profundas e enraizadas. Deve principalmente ensinar objetivos procedimentais
e critérios para avaliar crenças. Estudantes devem aprender a reconhecer as
falhas em suas crenças de senso comum e justificar suas próprias crenças. Eles
devem aprender a avaliar formulações explícitas e precisas, são necessários
testes empíricos cuidadosos e processos de avaliação objetiva. Em resumo, o
ensino da ciência dialética deve ter por objetivo ensinar métodos racionais
(científicos) para avaliar crenças sobre o mundo físico.
40

IV. CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES PARA PESQUISA

O principal ponto de vista deste artigo é que modelagem matemática deve


ser o tema central no ensino de física. Isto significa que o ensino de fatos e
teorias físicas deve ser subsidiário ao ensino de princípios e técnicas de
modelagem matemática. Chamo a atenção para uma severa reorganização de
prioridades no ensino de física, que pode ser justificada por fortes fundamentos
cognitivos e metodológicos.

A teoria da modelagem preocupa-se com o conhecimento procedimental,


ela é melhor aprendida em um contexto de atividade específica de modelagem,
onde a teoria é desenvolvida gradualmente para monitorar e orientar estas
atividades. Chamo isto de estratégia instrucional centrada em modelos. A
atividade de modelagem requer a coordenação e integração de fatos com teoria
científica, é mais que uma mera coleção passiva de fatos e fórmulas. Os
princípios de modelagem organizam o conhecimento em uma teoria científica
que pode ser aplicada em problemas e situações físicas concretas. Portanto, a
instrução centrada em modelos deve ser um meio eficiente para ensino e
organização do conhecimento científico. Além disso, tal instrução foca sobre a
construção e aplicação de modelos bem definidos de objetos e processos físicos.
Um objeto modelo é uma representação conceitual de uma coisa real que se
comporta de acordo com as leis da física. Assim, a instrução centrada em
modelos focaliza sobre a reconstrução conceitual da realidade física. Espera-se,
então, que seja efetiva no desenvolvimento da intuição física dos estudantes.

Embora alguma evidência empírica encorajadora seja verificada, a melhor


justificativa para a instrução centrada em modelos vem da análise do
empreendimento científico. A ciência tem se desenvolvido rapidamente por meio
da emulação da mecânica newtoniana. Penso que o processo dessa emulação
deriva de uma transferência dos princípios gerais de modelagem embutidos na
mecânica newtoniana para outro domínio. A teoria da modelagem é uma síntese
desses princípios, produzindo uma formulação de uma estratégia de modelagem
e aplicação tática para toda a ciência. A instrução por modelagem é, portanto,
estratégia que une ciência e método científico. Mas a teoria da modelagem é
também referente ao domínio específico de técnicas de modelagem. As técnicas
de modelagem que ensinamos devem exemplificar a prática científica para
41

minimizar a artificialidade dos exercícios dos livros textos e maximizar a


transferência para uma pesquisa científica genuína.

Pesquisa e desenvolvimento pedagógico substancial serão necessários


para implementar efetivamente a estratégia instrucional centrada em modelos. A
formulação de domínios específicos de técnicas de modelagem suficientes para
o objetivo instrucional tem sido levada a cabo unicamente no campo da mecânica
newtoniana. Este é o único domínio para o qual temos disponível um perfil
completo das misconceptions dos estudantes. Mas métodos efetivos de
instrução que fazem uso dessa informação ainda não foram desenvolvidos.
Embora tenhamos boas razões para acreditar que misconceptions básicas
podem ser eliminadas pelo método dialético, isto ainda tem que ser demonstrado
na prática. Ainda que a teoria da modelagem deva auxiliar no planejamento da
instrução, muito da teoria deve ser explicitamente ensinado aos estudantes para
ser eficaz. Além disso, um ensino efetivo por meio da resolução de problemas
pode envolver a análise de um “modelo teórico”. Finalmente, provavelmente será
necessário integrar a teoria da modelagem em livros textos básicos de mecânica.

A mecânica newtoniana deve obviamente ser o melhor campo do


conhecimento onde a teoria instrucional centrada em modelos pode ser testada
para verificar sua eficácia no ensino de física. A aplicação da teoria da
modelagem em outro campo do saber físico não é uma tarefa trivial e requer
bastante ensaio científico. Sugiro, por exemplo, que a formulação tradicional da
termodinâmica em livros textos possa ser substancialmente modificada por meio
de uma análise profunda da teoria da modelagem. Em qualquer campo da física
há a necessidade de analisar o domínio específico de técnicas de modelagem,
incluindo técnicas diagramáticas de representação conceitual para determinar
como ela pode ser usada efetivamente no ensino e talvez aprimorada.

Infelizmente, as perspectivas para a pesquisa pedagógica em física não


são boas devido à falta apoio adequado da comunidade de físicos. Há muitos
pesquisadores jovens que gostariam de se engajar em tal empreitada, mas as
oportunidades quase não existem. Poucos departamentos de física dos Estados
Unidos têm incentivados doutorados na área, e a maioria dessas pessoas não
segue nessa linha de pesquisa, pois percebem que não há recompensa. De fato,
42

professores de física são mais penalizados que reconhecidos por uma pesquisa
pedagógica.

Não é de surpreender que a maioria das pesquisas pedagógicas são de


baixa qualidade! Em qualquer campo é extremamente difícil para um sujeito
isolado alcançar uma pesquisa substancial. Um programa de pesquisa produtivo
requer uma comunidade de investigadores ativos. O estabelecimento de
programas de pesquisa em educação em ciências tem sido repetidamente
oprimido por cientistas em nível nacional bem como em âmbito de departamento.
Quando a pesquisa em educação é forçada a competir com pesquisa científica
visando apoio financeiro é sempre deixada de lado. A Fundação Nacional de
Ciência teve que ser forçada pelo Congresso para alocar recursos significativos
para a pesquisa em educação em ciências. Ela levou mais de uma década sob
vigorosa defesa do diretor geral Robert Karplus do NSF Educação Científica para
montar uma equipe necessária e desenvolver programas de pesquisas
significativos. Tudo isso foi destruído em uma noite quando a administração de
Reagan assumiu o poder.

Como a tomada de consciência de uma crise nacional em educação em


ciências tem aumentado recentemente, fundos federais substanciais têm sido
alocados para lidar com a crise no ensino médio. Contudo, pouco disso tem sido
direcionado para uma pesquisa pedagógica substancial, e muito disso promoveu
uma reacionária abordagem “back-to-basics” (de volta ao básico). Não estou
sozinho ao pensar que o principal resultado desse movimento será um ensino
de ciências de péssima qualidade e que uma pesquisa pedagógica substancial
será essencial para um resultado salutar (referência 36 e 37).

a) Partially supported by a grant from TRW Corporation.

1D. Hestenes, New Foundations for Classical Mechanics (Reidel,


Dordrecht/Boston, 1986), Chap. 9. (A reasonably priced student edition will
be available in the summer 1987.)

2F. Reif and J. I. Heller, "Knowledge Structure and Problem Solving in


Physics," Educ. Psychol. 17, 102-127 (1982).
43

3I. A. Halloun and D. Hestenes, "The Initial Knowledge State of College


Physics Students," Am. J. Phys. 53, 1043 (1985).

4I. A. Halloun and D. Hestenes, "Common Sense Concepts about Motion,"


Am. J. Phys. 53, 1086 (1985).

5 J. I. Heller and F. Reif, "Prescribing Effective Human Problem Solving


Processes: Problem Description in Physics," Cognition and Instruction I, 177-
216 (1984).

6This slogan was coined by psychologist Robert I. Stemberg in an article


about models of intelligence, Science 230, 1111 (1985).

7M. Bunge, The Furniture of the World, Volume 4 of Treatise of Basic


Philosophy (Reidel, Dordrecht/Boston, 1973).

8D. Hestenes, "Wherefore a Science of Teaching?", Phys. Teach. 17, 235-


242 (1979).

9D. A. Norman, ed., Perspectives on Cognitive Science (Lawrence Erlbaum


Associates, Hillsdale, New Jersey, 1981).

10 J. R. Anderson, ed., Cognitive Skills and Their Acquisition (Lawrence


Erlbaum Associates, Hillsdale, New Jersey, 1981).

11J. H. Larkin, J. McDermott, D. P. Simon, and H. A. Simon, "Expert and


Novice Performance in Solving Physics Problems," Science 208, 1335-1342
(1980).

12M. Chi, P. J. Feltovich, and R. Glaser, "Categorization and Representation


of Physics Problems by Experts and Novices," Cognitive Sci. 5, 121-152
(1981).

13J. H. Larkin and F. Reif, "Understanding and Teaching Problem Solving in


Physics," Eur. J. Sci. Educ. I, 191-203 (1979).

14J. H. Larkin, J. McDermott, D. P. Simon, and H. A. Simon, "Models of


Competences in Solving Physics Problems," Cognitive Sci. 4, 317-345 (1980).

15J. H. Larkin, "Cognition of Learning Physics," Am. J. Phys. 49, 534-541


(1981).
44

16Alan Newell, "Production Systems: Models of Control Structures," W. G.


Chase, ed., Visual Information Processing (Academic, New York, 1973).

17A. P. French, ed., Einstein (Harvard U.P., Cambridge, 1979), p. 310. IRA.

18Schoenfeld, Mathematical Problem Solving (Academic, New York, 1985).

19 J. Piaget, "Cognitive Development in Children: Development and Learning,"


J. Res. in Sci. Teach. 2, 176-186 ( 1964).

20W. Wollman, Developmental Implications of Science Teaching; Early


Adolescence (ERIC Clearinghouse for Science, Mathematics and
Environmental Education, Ohio State University, Columbus, Ohio, 1978).

21P. N. Johnson-Laird, Mental Models (Harvard U.P., Cambridge, 1983).

22D. Gentner and A. L. Stephens, eds., Mental Models (Lawrence Erlbaum


Associates, Hillsdale, NJ, 1983) .

23A. I. Miller, Imagery in Scientific Thought; Creating 20th Century Physics


(Birkhauser, Boston, 1984).

24A. I. Miller, "Werner Heisenberg and the Beginning of Nuclear Physics,"


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25S. Grossberg, Studies of Mind and Brain (Reidel, Dordrecht, 1982).

26An introduction to Grossberg’s Theory for physicists and engineers is given


by D. Hestenes, "How the Brain Works," in Maximum Entropy and Bayesian
Methods in Spectral Analysis and Estimation Problems, edited by C. Ray
Smith (Reidel, Dordrecht/Boston, 1987).

27R. Hecht-Nielsen, "Neural Analog Processing," Proc. SPIE 360, 180-199


(1982).

28Ref. 25, p. 229.

29T. S. Kuhn, The Structure of Scientific Revolutions (University of Chicago


Press, Chicago, 1970), 2nd ed.

30I. B. Cohen, Revolution in Science (Harvard U.P., Cambridge, 1985).


45

31 E. T: Jaynes; Papers on Probability, Statistics and Statistical Physics, R. D.


Rosenkrantz, ed. (Reidel, Dordrecht, 1983). An analytical review of this work
is given by D. Hestenes, Found. Phys. 14, 187-191 (1984).

32I. Halloun and D. Hestenes, "Modeling Instruction in Mechanics," Am. J.


Phys. 55, 455 (1987).

33 J. Minstrell, "Teaching for the Understanding of Ideas: Forces on Moving


Objects." In the 1984 Yearbook of the Association for the Education of
Teachers, ERIC Clearinghouse for Science, Mathematics and Environmental
Education, Ohio State University, Columbus, Ohio.

34Peter Hewson and Mariana A’Beckett Hewson, "The Role of Conceptual


Conflict in Conceptual Change and the Design of Science Instruction,"
Instructional Sci. 13, I (1984) .

35A. Arons, "Thinking, Reasoning and Understanding in Introductory Physics


Courses," Phys. Teach. 19, 166-172 (1981).

36Charles W. Anderson and Edward L. Smith, "Teaching Science," in The


Educator’s Handbook. A Research Perspective, Virginia Koehler, ed.
(Longman, New York, 1986).

37F. Reif, "Educational Challenges for the University," Sci. 184, 537-542
(1974).

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