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ENSAIO

Estudos Culturais

IMAGEM: YARA MITSUISHI

A cultura tornou-se, nas últimas décadas, um con-


ceito presente nas mais diversas áreas do conheci-
mento e da prática. Para estudar suas várias di-
mensões e implicações, surgiu nas universidades
norte-americanas a área de Estudos Culturais. Nes-
te ensaio, Daniela Sandler, arquiteta e colunista do
Digestivo Cultural, analisa os principais focos de in-
teresse e as características da área, e mostra como
ela pode contribuir para o desenvolvimento de abor-
dagens críticas e inovadoras sobre os fenômenos
associados à cultura.

ultura é um termo de defini- Lei de Incentivo à Cultura, gestão to é útil, permitindo que a idéia se
C ção difícil e vaga. Talvez por
isso mesmo a palavra seja ubíqua:
cultural, patrimônio cultural. No
conceito amplo cabe tudo: ativida-
adapte a contextos diferentes. Por
outro lado, a indefinição permite
associada a atividades tão diversas des artísticas como pintura ou tea- disfarçar usos políticos ou econô-
quanto investimentos, urbanismo, tro, manifestações folclóricas e po- micos sob a aparência neutra do
informação, lazer e educação. Fala- pulares, práticas sociais e entrete- termo: afinal, quem é contra “cul-
se em “Corredor Cultural da Luz”, nimento. A flexibilidade do concei- tura”?

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Destrinchar essas ligações é es-
sencial para que os usos da cultura Os Estudos Culturais, como todo campo novo, são encarados
beneficiem a todos de modo demo-
com entusiasmo desmedido, de um lado, ou com vilipêndios
crático e plural. Tal abordagem críti-
ca motiva ativistas, jornalistas e – preconceituosos, de outro.
como tema deste texto – pesquisado-
res acadêmicos. A tarefa no campo
teórico é múltipla: examinar a função ticas e ressaltando a ligação entre fe- de de Birmingham, com destaque
da cultura na sociedade contemporâ- nômenos econômicos, políticos, so- para Stuart Hall e Raymond Williams,
nea; redefinir o próprio conceito de ciais e estéticos. As encarnações ins- ganhou atenção. Mas a polarização
cultura diante de transformações his- titucionais dos estudos culturais re- socioeconômica entre high e low logo
tóricas; e desenvolver uma metodo- fletem essa abertura, abrigando pes- seria transformada por novos movi-
logia de pesquisa rigorosa e adequa- quisadores de formações diversas: fi- mentos migratórios (indianos para a
da. Disciplinas tradicionais, como losofia, letras, história da arte, cine- Inglaterra, norte-africanos para a
história, literatura, sociologia e eco- ma e comunicações. França, turcos para a Alemanha) e
nomia, têm incorporado “cultura” a Em sua origem, os estudos cultu- pela mundialização de sistemas fi-
seus temas de estudo. Ao mesmo tem- rais estavam ligados à sociologia e se nanceiros e industriais, com o enfra-
po, um campo novo e interdiscipli- opunham à abordagem tradicional das quecimento de barreiras nacionais –
nar vem integrando contribuições obras literárias (análise de estilo, in- tanto econômicas quanto de infor-
dessas disciplinas e desenvolvendo terpretação de conteúdo e biografia de mação e cultura. O antagonismo bi-
uma linha própria: os chamados cul- autor), julgada apolítica. A perspecti- nário entre elite e classe operária foi
tural studies (estudos culturais). va sociológica pretendia investigar a sacudido por novas formas de orga-
Os estudos culturais, como todo relação entre literatura e sociedade: a nização do trabalho.
campo novo, são encarados com en- função social de obras literárias, sua A multiplicidade e fragmentação
tusiasmo desmedido de um lado ou dimensão política e a influência de social deram relevo a outras questões
com vilipêndios preconceituosos de contextos históricos sobre os autores. além da classe, como identidade,
outro. Nas duas últimas décadas, uma Essa postura é engajada. Visa não raça e gênero. Ainda não cristaliza-
enxurrada de conferências, livros, apenas à crítica a sistemas de domi- dos em estruturas acadêmicas rígi-
journals e eventos acompanhou a cria- nação (perpetuados, por exemplo, em das, os estudos culturais responde-
ção de departamentos e programas livros cuja influência no comporta- ram a essas transformações. Filóso-
universitários, em especial nos Esta- mento das pessoas é eficaz justamen- fos franceses ganharam ressonância
dos Unidos, Canadá, Europa e Aus- te por ser “invisível”) como também pelas críticas radicais a instituições
trália. Com o sucesso, há resistência à atuação social, difundindo literatu- (de manicômios à imprensa) e pelo
imensa – que é de se esperar, não ape- ra entre classes desfavorecidas ou re- questionamento da racionalidade e
nas com todo novo campo investiga- velando e celebrando manifestações da lógica cartesianas. Entre os nomes
tivo, como também pela “rebeldia” populares. de impacto estão Michel Foucault,
intrínseca dos estudos culturais. Jacques Derrida, Giles Deleuze, Louis
Uma questão de classe? Os es- Althusser, Jacques Lacan e Roland
Estudos indisciplinados. “Es- tudos culturais surgiram na Inglater- Barthes, entre outros. A veia política
tudos culturais” não é uma discipli- ra da década de 1960, local e época dos estudos culturais, voltada para a
na. São mesmo antidisciplinares, re- em que a divisão de classes era mar- democratização da cultura, abriu-se
cusando a divisão artificial do mun- cada. O trabalho pioneiro do Centro aos movimentos sociais das décadas
do em fatias metodológicas ou temá- de Estudos Culturais da Universida- de 1960 e 1970, como o feminismo e

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E N S A I O : E ST U DOS C U LT U RAI S

dos culturais desnecessários. É raro


A proposta dos Estudos Culturais é responder à sociedade que um departamento de história da
arte norte-americano não ofereça,
contemporânea em vez de se apegar cegamente a modelos
além do estudo puramente estético ou
tradicionais ultrapassados. formal das artes plásticas, cursos com
abordagem mais teórica. Talvez isso
indique que os estudos culturais te-
o movimento negro. A rebeldia punk por exemplo, entre um filósofo nham se tornado moda. Nesse caso,
virou objeto de estudo, enquanto o consagrado em sua disciplina e um os críticos estariam certos, e o proje-
feminismo e o anti-racismo conver- historiador da arte que recorre a to dos estudos culturais enfrentaria
teram-se em linhas teóricas conheci- Nietzsche para analisar a obra de um uma crise. Mas talvez a popularização
das hoje como gender studies (gêne- pintor. O atrito talvez venha da des- dos estudos culturais seja um sinal de
ro), race studies (raça) e toda uma sé- confiança em relação a um campo de mudança nas disciplinas tradicionais.
rie de area studies (women studies, pesquisa novo, cujo espaço intelec- Nesse caso, os estudos culturais te-
Brazilian studies etc.). tual e concreto dentro das universi- rão cumprido sua missão, ainda que
dades não está consolidado – e que os departamentos desapareçam. Nada
Campo aberto. Entre as críticas ameaça, à sua maneira, o status quo mais justo para um campo teórico
freqüentes aos estudos culturais, es- das disciplinas estabelecidas. que, em sua natureza, é essencialmen-
tão a de ser apenas modismo; de não A ironia é que as “vítimas” mais te instável; um campo cuja proposta
ter rigor suficiente em relação às dis- prováveis dos estudos culturais sejam é responder à sociedade contempo-
ciplinas tradicionais; e de abordar te- talvez os próprios departamentos de rânea em vez de se apegar cegamente
mas fúteis e irrelevantes. É certo que estudos culturais. Áreas tradicionais, a modelos tradicionais ultrapassados.
muitas teses de estudos culturais fo- como literatura, história da arte e fi-
ram dedicadas a temas inócuos, irre- losofia, têm incorporado cada vez Daniela Sandler
levantes ou específicos demais (exem- mais a abordagem dos estudos cultu- Colunista do Digestivo Cultural
plo hipotético: o significado de rótu- rais, tornando os programas de estu- E-mail: sand@mail.rochester.edu
los de ketchup para adolescentes de
New Jersey), mas o mesmo argumen-
to pode ser feito sobre trabalhos em
áreas consagradas, tais como história,
biologia ou química. Pesquisas medío-
cres podem ocorrer em qualquer área
e não desmerecem ou “contaminam”
os trabalhos de valor em seu campo.
A acusação de falta de rigor refe-
re-se à liberdade com que trabalhos
de estudos culturais servem do apa-
rato teórico de outras disciplinas. No
entanto, a falta de rigor não pode ser
creditada exclusivamente à interdis-
ciplinaridade, pois pesquisas tradicio-
nais também podem ser inconsisten-
tes. A diferença é de “autoridade” –

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