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GLOBALIZAÇÃO E
RACISMO NO
BRASIL
Estratégias políticas de combate ao racismo na
sociedade capitalista contemporânea
2000
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Jardim Brasil
Tel: 11-6987-2080
E-mail: unegro@unegro.org.br
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Agradecimentos
Boa parte deste livro foi produzida durante minha militância política
na Unegro (União de Negros pela Igualdade) cujos militantes quero agradecer, em
especial os membros da coordenação geral de São Paulo na gestão 1998/2000 –
Salaciel Vilela, João Mendes dos Santos, Roberto Almeida de Oliveira e Esther
Francisco da Silva. Esta coordenação foi responsável pela sobrevivência e
reconstrução da Unegro em São Paulo que passou por um período difícil no final
dos anos 90 devido a uma série de problemas internos que culminaram com o
afastamento de alguns quadros da entidade, além do que foi abalada pelo
falecimento de duas grandes lideranças – Luiz Carlos Felipe, o popular Doido,
diretor do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Água, Esgoto e Meio
Ambiente, responsável pela inserção da discussão do racismo no movimento
sindical; e Rosângela Ferreira, responsável pela construção do núcleo da Unegro
no bairro do Jardim Brasil e vítima da má qualidade da saúde pública neste país.
Dedico este livro a pessoas do meu círculo familiar que estão sempre
do meu lado em todos os momentos: meus pais – Reinaldo de Oliveira (in
memorian) e Maria Elisa de Oliveira, minha companheira Conceição e minha linda
filha Camila.
Dennis de Oliveira
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SUMÁRIO
Introdução_______________________________________________________ 4
Cap. 1 - A exclusão racial como base da formação do capitalismo no Brasil 7
Cap. 2 - O caráter social e político dos projetos de desenvolvimento
industrial _______________________________________________________ 18
Cap. 3 - O neoliberalismo no Brasil _________________________________ 29
Cap. 4 - Identidade e globalização neoliberal _________________________ 42
Cap. 5 - A exclusão ______________________________________________ 56
Considerações finais _____________________________________________ 74
BIBLIOGRAFIA __________________________________________________ 76
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Segundo esta pesquisa, em 1997 existiam no Brasil cerca de 7 milhões de negros com renda pessoal acima
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Qual será a condição desta classe média negra emergente em garantir tudo isto
com um desemprego crescente que atinge todas as famílias, em especial negras,
o que força àqueles que continuam empregados a repartir as suas rendas
pessoais com mais pessoas da família que estão sem ocupação; com o
sucateamento e queda na qualidade da educação pública e o aumento vertiginoso
das mensalidades das escolas particulares; com a queda nos serviços públicos de
saúde e o aumento dos preços dos planos de saúde e da medicina privada em
geral; com a inexistência de financiamentos habitacionais compatíveis com a
renda assalariada?
Os dados mostram outra face: de 1980 para cá, o Brasil (e demais países latino-
americanos) passaram por um processo de mobilidade social descendente, isto é,
um processo de aumento da concentração de renda, o que significa uma minoria
cada vez mais minoria e cada vez mais rica; e uma maioria cada vez mais maioria
e cada vez mais pobre. E isto é fruto de políticas governamentais locais adotadas
de acordo com o receituário da globalização neoliberal.
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Dennis de Oliveira
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BRESCIANI, Maria Stela. “O cidadão da república” in Revista da USP, n. 17, mar/abr/mai 1993, p. 124
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Mas Sodré vai além e ainda afirma com muita propriedade que o
“longo predomínio do escravismo respondeu pela degradação física e moral da
população trabalhadora, face a sua selvagem exploração, como pela estagnação
nas técnicas d produção com a utilização apenas de instrumentos de trabalho os
mais primitivos.”6 Ë importante ressaltar que esta herança do escravismo e do
período colonial e imperial não encontrou no projeto republicano das elites
nenhuma resposta que corrigisse os rumos do capitalismo brasileiro. Por esta
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idem, p. 125
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SODRÉ, Nelson Werneck. Capitalismo e revolução burguesa no Brasil, p. 80
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idem, ibidem
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Do ponto de vista social, este período foi marcante por dois motivos:
a proibição do tráfico de escravos deu início a uma abolição lenta, gradual e
controlada da escravidão que resultou num processo brutal de exclusão e
genocídio contra os negros e seus descendentes. As leis que se seguiram – Lei do
Ventre Livre e Lei dos Sexagenários – ao contrário do que poderia se supor,
cristalizaram duas práticas que permearam toda a história republicana do país: o
descaso com as crianças e com os idosos. A Lei do Ventre Livre que libertava os
filhos de escravos nascidos a partir daquela data foi, na prática, uma forma de tirar
a responsabilidade dos senhores de escravos sobre as crianças que nasciam na
senzala. Acrescente-se a isto a inexistência de qualquer tipo de política social que
atendesse as demandas daquelas crianças. Data daí a marginalização de crianças
e adolescentes negros que hoje são chamados de “menores”.
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século XIX – e ainda dizem-se modernos!). Segundo, que a lei libertava mas
também não garantia nenhum tipo de assistência que atendesse esta demanda
social.
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A idéia de que a culpa da miséria é do próprio miserável e que, num sentido maior,
gerou um sentimento de inferioridade étnica no seio da própria sociedade
brasileira, foi um arcabouço ideológico que legitimou a idéia de que a única via
possível para o desenvolvimento do capitalismo brasileiro seria a associação de
forma dependente ao capitalismo europeu. Schwartz ainda afirma que:
“... recém saída da desastrosa Guerra do Paraguai e vivendo, nos últimos anos do
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SCHWARTZ, Lilian. O espetáculo das raças, p. 47
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idem, p. 30
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idem, p. 166
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“O Brasil foi palco, de 1930 a 1945, de uma luta extrema entre o velho e o novo.
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Velhas foram, sob todos os aspectos, as relações feudais que aqui sempre
importaram em fragmentação e privilégio; novas eram as reformas que,
avançando aceleradamente às vezes, estagnando outras vezes procuravam
vencer os obstáculos ao desenvolvimento nacional. (...) o mercado interno, a
unificação do poder político, o rompimento de barreiras impostas à circulação da
produção traduziam o novo.”10
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SODRÉ, Nelson Werneck, op cit, p. 176
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“A fúria com que a reação se lançou à luta para impedir que Getúlio Vargas
realizasse a sua política foi o traço denunciador da singular importância que lhe
emprestava. Em sua campanha presidencial, o candidato assumiu compromissos
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idem, p. 177
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renda.
Foi novamente uma nova configuração do capitalismo internacional que pôs este
modelo em cheque. A abundância de crédito existente no início dos anos 70 deixa
de existir, particularmente com a crise do petróleo nos anos 80. A súbita elevação
dos preços do combustível fizeram com que parte dos investimentos dos países
capitalistas centrais deslocassem para os centros produtores de petróleo e
passassem a cobrar as faturas dos empréstimos concedidos aos países
dependentes no início dos anos 70, entre eles o Brasil.
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transnacional via as estatais. O governo fica então a mercê das vontades dos
credores. Assina acordos com o Fundo Monetário Internacional em 1983, toma
medidas no sentido de conter a expansão do consumo e direcionar a maior parte
da produção interna para a exportação e, assim, gerar divisas para o pagamento
da dívida externa. O governo militar já tinha esgotado o seu projeto e, por isto, não
interessava mais às classes dominantes, ainda mais porque se encontrava
desgastado junto às camadas populares.
De qualquer forma, as classes dominantes arquitetam mais uma vez, uma saída
conservadora, que mantém o modelo econômico capitalista dependente, para
transitar do regime autoritário para um de feições liberais. Por isto, a derrota da
emenda Dante de Oliveira foi sucedida da negociação que levou a chapa
Tancredo Neves – José Sarney à vitória na eleição indireta realizada no início de
1985.
Estes indicadores sociais pioram após os anos 80, devido a falência do projeto do
regime militar. Entre os anos de 1968 e 1973, o PIB brasileiro cresceu em média
11,12% ao ano. Já entre 1974 e 1980, o crescimento foi médio anual foi menor:
7%. E entre 1981 e 1983, houve uma queda média anual do PIB da ordem de
1,6%. Mas é importante ressaltar que, mesmo nos períodos de grande
crescimento, houve uma concentração de renda: entre 1960 e 1976 (portanto
dentro do período do milagre brasileiro), os 20% mais ricos do país aumentaram
sua participação na renda nacional em 18%; enquanto que os 50% mais pobres
tiveram sua participação reduzida em 32%.
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O que pretende-se demonstrar com isto que se é possível estabelecer uma luta
conta a discriminação racial nos Estados Unidos por meio de um projeto de
minorias (lutas pontuais de inserção desta minoria à sociedade de consumo), no
Brasil, a luta contra o racismo passa, necessariamente, por um projeto de maioria,
o que significa uma ruptura com o modelo econômico vigente e, necessariamente,
uma articulação com todos os setores oprimidos por este modelo. É por isto que o
MNU/CDR fundado em 1978 perde seu caráter quando se transforma em MNU
que opta por uma estratégia de minoria, abandonando a política de se articular
com os demais segmentos excluídos e, assim, restringir barbaramente o seu
espectro de ação social.
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“Em termos de política social, tornam-se parâmetros fundamentais: a-) precisa ser
redistributiva e não apenas distributiva com se renda e poder fossem disponíveis
(...); b-) precisa ser equalizadora de oportunidades no sentido de instrumentar os
desiguais para que tenham chance histórica pelo menos mais aproximada (...); c-)
precisa ser emancipatória no sentido de reconhecer que, no confronto da
desigualdade social, somente pode haver mudança importante e sobretudo
radical, a partir dos desiguais, ninguém faz a emancipação do outro porque seria
estratégia de desmobilização; de modo geral, as políticas sociais tendem a
construir a cortina tutelar sobre a população pobre fazendo-a dependente dos
recursos públicos (...) d-) precisa ser preventiva no sentido de agir na raiz dos
problemas antes que eles surjam.”12
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DEMO, Pedro. Cidadania menor, pp. 18/19
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DREYFFUS, Renée. O jogo da direita, pp. 17/18
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modelos de organização sindical vigentes nos países europeus também vai neste
sentido, uma vez que descartará a representação profissional daquelas categorias
não hegemônicas no mercado de trabalho, como alguns setores de serviços.
Enfim, a institucionalização política da exclusão cumprirá o papel de apagar
qualquer traço de visibilidade destes setores, facilitando, assim, projetos de faxina
étnica e de extermínio físico destas populações.
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Relatório do Banco Mundial sobre a pobreza, setembro/99
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"A chave para estes e outros planos não relacionados com o emprego é formulá-
los de tal maneira que mantenham sua função de representar uma segurança para
os mais pobres e não sejam utilizados por aqueles que não se encontram em uma
situação menos desesperada."
O sociólogo norte-americano James Petras afirma que "à medida que aumentou a
oposição ao neoliberalismo, o Banco Mundial incrementou os donativos às ONGs.
O ponto fundamental de convergência que une as ONGs e o Banco Mundial é o
rechaço de ambas entidades ao estatismo. Superficialmente, as ONGs criticavam
o Estado desde uma perspectiva de esquerda na qual defendiam a sociedade civil,
enquanto que o Banco Mundial o criticava em nome do mercado" (PETRAS, Las
dos caras de las ONGs, texto publicado no La Jornada, do México, em 8/8/2000, e
reproduzido no site Oficina de Informações)
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Os seis países que mais crescem atualmente são: Índia (21%), China (12%),
Paquistão (5%), Nigéria (4%), Bangladesh (4%) e Indonésia (3%) – somente estes
países são responsáveis pela metade do crescimento anual da população
mundial.
Estes dados são importantes para uma reflexão das perspectivas do racismo a se
manter o atual padrão de acumulação de riquezas, pois sabe-se que os países
mais ricos concentram cerca de 80% da riqueza mundial. Isto significa que as
regiões mais pobres é que concentram e concentrarão ainda mais a população
mundial, uma conta que faz aumentar a concentração de riquezas.
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c-) O fato da direção do movimento negro cultural e religioso atingir uma camada
de população excluída que, para sobreviver, depende de favores prestados pelo
Poder Público, fazendo com que estas organizações sejam facilmente cooptadas
pelos segmentos políticos dominantes em troca de favores.15
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Clóvis Moura chamou estes dois tipos de organização negra contemporânea de “movimento negro letrado”
e “movimento negro plebeu”. Ver MOURA, Clóvis. Dialética radical do Brasil negro, São Paulo, Editora
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Anita, 1995.
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“negros” ou “raça negra” foi construída pelos povos europeus com o objetivo de
legitimar a espoliação e escravização dos africanos. Assim, motivados por um
projeto político e econômico, os europeus constituíram uma identidade de si
enquanto brancos e civilizados em oposição aos africanos, negros e bárbaros. A
pigmentação da pele foi o traço utilizado como critério diferenciador para esconder
estas intenções políticas.
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Adotamos o conceito de “consenso social” no sentido gramsciano da palavra, isto é, a disseminação da
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Em um trabalho onde analisou a imagem dos negros nas telenovelas, a professora Solange Couceiro
constatou que a mulher negra aparece sempre como um “elemento perturbador” da família: amante de homens
casados ou uma empregada que seduz o patrão ou uma jovem cujo casamento era indesejado pela família do
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noivo. Ver COUCEIRO, Solange. O negro na televisão brasileira. S. Paulo: FFLCH/USP, 1985.
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OLIVEIRA, Dennis. Comunicação sindical, globalização neoliberal e mundo do trabalho. São Paulo:
ECA/USP, 1998 (tese de doutorado)
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O que queremos dizer com tudo isto é que a simples valorização de alguns traços
ultilizados pelas classes dominantes para tipificar população negra não significa o
fim ou mesmo a redução do racismo.Se antes o samba a capoeira, o carnaval, o
candomblé eram criminalizados; o fato de deixarem de o ser não implica
necessariamente a redução do racismo. Hoje, com a nova estratégia da indústria
de bens simbólicos de diversificar seus produtos para legitimar seu controle
monopolista, esta inversão de sinais fica muito mais fácil. É uma reivindicação dos
agentes destes grupos culturais (que é legítima, é importante frisar) muito mais
fácil de ser atendida e incorporada nas atuais formas de acumulação de riquezas
que a inserção total e completa do conjunto da população negra no estatuto da
cidadania. Por isto se visualiza hoje uma maior visibilidade do negro e suas
manifestações e, paralelamente, a um aumento da exclusão social da população
negra.
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Conceito elaborado pelo sociólogo Edgar Morin para designar as pessoas do mundo artístico e de
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entretenimento em geral que tem sua vida pública amplamente divulgada pelos mass media causando
fascinação junto ao grande público. O termo olimpiano vem de Olimpo, local de moradia dos deuses segundo
a mitologia grega. Ver MORIN, Edgard. A cultura de massas no século XX (vols 1 e 2). S. Paulo: Graal,
1990.
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Este projeto foi idealizado pela UNEGRO em 1998 como forma de instituir entre a juventude negra a
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Isto é o que está por trás da idéia de racismo cordial que a Folha de S. Paulo
lançou em 1995, a partir de uma pesquisa quantitativa realizada naquele ano para
celebrar os 300 anos de Zumbi dos Palmares21. E também nas vária reportagens
que a revista Veja lançou para demonstrar a ascensão social dos negros
brasileiros. E, porque não dizer, está também no discurso da revista Raça Brasil
que aponta como uma vitória o fato dela ter descortinado para vários modelos
negros, oportunidades de aparecer em anúncios publicitários.
Não queremos aqui defender que todas as manifestações culturais negras voltem
à situação de clandestinidade e de criminalização que viviam. Nem tampouco
estamos condenando os artistas e atletas negros que conseguiram subir na escala
importância de, mantendo a sua diferença étnica, lutar pela igualdade de oportunidades enquanto cidadão.
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O jornal Folha de S. Paulo fez uma extensa e minuciosa pesquisa sobre a questão racial com a população
brasileira e concluiu que, embora exista um preconceito por parte dos brancos, estes não rejeitam a
convivência com os negros, razão pela qual ela conceituou as relações raciais no Brasil de “racismo cordial”,
porque utilizou como referência, a segregação racial existente nos EUA e África do Sul.
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social graças aos seus talentos. O que defendemos é que há um jogo malicioso de
cooptação do sistema que é preciso perceber e estar atento para não cairmos na
tentação de acabar defendendo um sistema político, econômico e social que nos
exclui. Para isto, é urgente e necessário construirmos o nosso projeto político de
identidade.
Aqui fazemos nossa opção política pela constituição de uma sociedade igualitária
que garanta o direito de cidadania a todos, particularmente aos descendentes dos
africanos escravizados que tiveram sistematicamente negado o usufruto estrutural
desta condição. Isto implica em construir um projeto de identidade que abarque
todos aqueles que foram jogados na condição de excluídos pelos mecanismos
racistas existentes no período da escravidão e quando da passagem do sistema
de mão de obra escrava para o de mão de obra assalariada – ou seja, um projeto
de maioria que abarque todos os descendentes em qualquer grau dos africanos
escravizados.
Neste sentido, o conceito de negro por estar associado diretamente à cor da pele,
embora não deva ser descartado, não se consolida, principalmente porque está
associado a tipificações negativadas e vinculado historicamente ao processo de
branqueamento operado pelas classes dominantes brancas no início do século
XX. Defendemos o conceito de afrodescendente por abarcar todas as tipificações
desta população descendente dos africanos escravizados (negros, pardos, pretos,
morenos, mulatos, entre outros) e que mantém um laço histórico com a origem do
racismo: a segregação do continente africano por parte dos europeus como forma
estratégica de legitimar a espoliação dos povos daquele continente milenar.
Mas esta questão do termo empregado não é a central. O que nos interessa aqui
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são as tipificações que dão lastro a este conceito de identidade. E o que é mais
importante ressaltar, no nosso entendimento, é a situação de permanente
exclusão que esta população vive com o objetivo de sustentar os privilégios de
uma minoria. Que esta diferenciação grupal é fruto de uma forma de acumulação
de riquezas predatória de gente e recursos naturais, que se prima pela
desigualdade, pela exploração e pela negação do direito à vida digna.
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religiosas, mas políticas e sociais. Trocando em miúdos, ser negro não significa
necessariamente e tão somente ser sambista ou do candomblé ou ainda usar
camisetas escrito Negro é lindo - ser negro é, essencialmente, ser participante de
uma população vitimada do processo de exclusão social existente desde a
escravidão, mantida na transição do trabalho escravo para o assalariado e
intensificada na construção do capitalismo e, particularmente, na etapa do
neoliberalismo.
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Não se pode dizer que a direita brasileira não previu isto. Previu e até
apontou soluções. No ano de 1990, a UNEGRO denunciou um documento
elaborado pela Escola Superior de Guerra (ver anexo) intitulado "Estrutura do
poder nacional para o século XXI", um extenso estudo que foi apresentado aos
candidatos às eleições presidenciais de 1989 situados no espectro do centro à
direita.
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Ficou famosa a edição do último debate presidencial entre Lula e Collor, às vésperas do segundo turno
das eleições, feito pelo Jornal Nacional; manipulação que causou a saída do diretor e fundador do
telejornal Armando Nogueira, após mais de 30 anos de serviços prestados à Globo.
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O presidente Fernando Collor veio com um discurso moralista, de ser contra os políticos e prometendo
construir um "Brasil Novo". O falso caráter oposicionista do seu discurso encantou o eleitorado e isto,
aliado ao apoio explícito da Globo, o levou à vitória, apesar de pertencer a uma legenda de aluguel (o PRN
- Partido da Reconstrução Nacional)
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trabalho industrial, outro, entrou nos trabalhos informais prestados à classe média
urbana (trabalhos domésticos, prestação de serviços não qualificados, entre
outros) mantendo uma integração pela franja do sistema. Por isto, nos anos 70 e
80, as grandes metrópoles vivenciaram uma situação de exclusão integrada, onde
a periferia mantinha uma tênue ligação com o sistema formal de trabalho e
consumo.
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VIDAL, J. W. Bautista. A reconquista do Brasil. Rio: Espaço e Tempo, 1997, p. 55
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Relatório do Banco Mundial sobre a pobreza, setembro/99
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Relatório do Banco Mundial sobre pobreza de 1999.
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Esta situação ficou explícita a partir de um levantamento sobre o número de crianças de rua feito pela
própria Secretaria em 1992, pesquisa esta que teve apoio de várias entidades entre elas a Unegro.
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O grande problema do Estatuto é que ele foi promulgado em uma conjuntura que
o país inseria-se no projeto neoliberal que, devido ao crescimento das
vulnerabilidades sociais, contribuiu decisivamente para a desmobilização da
sociedade civil. Assim, boa parte do Estatuto não foi aplicada, principalmente os
mecanismos de controle da sociedade das políticas públicas. Houve casos em que
membros de grupos de extermínio foram eleitos para “representar” a sociedade
nos conselhos previstos no Estatuto, legitimando a ação repressiva como
mecanismo de solução do problema das crianças abandonadas.
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Ver as obras de DIMENSTEIN, Gilberto. A guerra dos meninos e Meninas da noite.
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Esta discriminação acontece, inclusive, nos questionários aplicados aos voluntários que doam sangue em
alguns hemocentros. De acordo com o comportamento sexual do voluntário, ele é descartado como doador
por supostamente pertencer ao “grupo de risco” da Aids.
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Entrevista de Elói Pietá a revista Painel nº18, novembro de 1997
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cega.
No ano de 1992, a Polícia Militar de São Paulo bateu o seu recorde histórico de
assassinatos: 1.470 pessoas foram mortas pela PM, uma média de 4,01 pessoas
por dia. O jornalista Caco Barcellos elaborou um ranking com os maiores
matadores da Polícia Militar de Sã o Paulo. Neste ranking, estavam o então
sargento Gílson Lopes, o capitão Conte Lopes e o coronel Edson Ferrarini. Depois
desta divulgação, aconteceu o seguinte: o sargento Gílson Lopes continuou na
corporação e chegou a ser promovido a tenente, fazendo um trabalho de
esclarecimento de medidas de segurança para moradores de condomínios
fechados; Conte Lopes e Edson Ferrarini foram eleitos, com as maiores votações,
para as cadeiras de deputado estadual na Assembléia Legislativa de São Paulo.
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O deputado Conte Lopes, mesmo afastado da corporação, costumava comandar extra-oficialmente,
“batidas” com policiais, tudo com grande estardalhaço para mostrar sua ascendência sobre a tropa e
desmoralizar os outros comandantes que não fossem identificados com a sua filosofia de ação policial.
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BARCELLOS, Caco. Rota 66: a história da polícia que mata.
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Este coeficiente é um índice que mede a relação entre a renda apropriada pelos 20% mais ricos e a
apropriada pelos 20% mais pobres. Quanto mais próximo de zero, maior é a igualdade; quanto mais próximo
de 1, maior é a desigualdade e a concentração de renda.
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Tentamos mostrar, neste ensaio, como o processo de globalização
neoliberal implicou em uma radicalização da exclusão racial no Brasil. Esta talvez
seja uma das particularidades do impacto da globalização no país: o fato dela
acontecer em uma sociedade que sequer estruturou uma sociedade civil nos
parâmetros de uma democracia burguesa. Ao contrário de outras experiências, o
capitalismo brasileiro não foi acompanhado de um projeto político de igualdade na
acepção iluminista do termo – ele foi constituído sob uma base arcaica,
estamental e gestou-se sobre uma acumulação predatória de recursos materiais e
humanos. A ideologia do racismo no Brasil cumpre uma função primordial ao
legitimar este modelo, justificando os abismos sociais pelas distinções de caráter
racial.
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" #$ %
BARCELLOS, Caco. Rota 66: a história da polícia que mata.
BRESCIANI, Maria Stela. “O cidadão da república” in Revista da USP, n. 17, mar/abr/mai
1993,
COUCEIRO, Solange. O negro na televisão brasileira. S. Paulo: FFLCH/USP, 1985.
DEMO, Pedro. Cidadania menor,
DIMENSTEIN, Gilberto. A guerra dos meninos e Meninas da noite.
DREYFFUS, Renée. O jogo da direita,
MORIN, Edgard. A cultura de massas no século XX (vols 1 e 2). S. Paulo: Graal, 1990.
MOURA, Clóvis. Dialética radical do Brasil negro,
OLIVEIRA, Dennis. Comunicação sindical, globalização neoliberal e mundo do
trabalho. São Paulo: ECA/USP, 1998 (tese de doutorado)
Relatório do Banco Mundial sobre a pobreza, setembro/99
SCHWARTZ, Lilian. O espetáculo das raças
SODRÉ, Nelson Werneck. Capitalismo e revolução burguesa no Brasil,
VIDAL, J. W. Bautista. A reconquista do Brasil. Rio: Espaço e Tempo, 1997
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