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CURSO SUPERIOR DE

LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA
CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

Ministério da Educação
Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica
Secretaria de Educação a Distância

Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do


Sul de Minas Gerais - Campus Muzambinho

Centro de Educação a Distância – CEAD

Curso
Licenciatura em Pedagogia EaD

Coordenadora do Curso
Maria Lúcia Queiroz Guimarães Hernandez

Coordenadora de Plataforma e Tutoria


Professora Assistente
Cristiane Fortes Gris Baldan

Disciplina
Metodologia do Ensino da Matemática II

Professor
Carlos Renato Soares

Diagramação da Capa
Igor Xavier de Magalhães Silva Brasil

Diagramação
Pamela Hélia de Oliveira

Muzambinho
2018
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APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA

E preciso, ainda, não esquecer que a Matemática, além do objetivo de resolver


problemas, calcular áreas e medir volumes, tem finalidades muito mais
elevadas.

Por ter alto valor no desenvolvimento da inteligência e do raciocínio, e a


Matemática um dos caminhos mais seguros por onde podemos levar o homem
a sentir o poder do pensamento, a mágica do espírito. A Matemática e, enfim,
uma das verdades eternas e, como tal, produz a elevação do espírito.
(TAHAN,2008, p.107)

Prezados(as) acadêmicos(as), o material didático da disciplina


Metodologia do ensino da Matemática II destina-se a continuidade do estudo
dessa disciplina com ênfase nos primeiros anos de escolaridade, embora
resguarde semelhanças com os conteúdos discutidos no material didático da
disciplina Metodologia do Ensino Matemática I, estudado período passado
deste Curso.

A organização desse material tem o propósito de construirmos juntos


uma trajetória em relação ao processo ensino/aprendizagem do conhecimento
matemático. Essa produção traz para as discussões questionamentos
pertinentes que são necessários a esse processo, não só no que diz respeito
ao planejamento de atividades para o aprendizado da matemática, mas
também uma possibilidade de desenvolvimento do trabalho docente realizado
em sala de aula.

Esse processo não pode ser desconectado do significado e do sentido


que a Matemática tem em nosso dia a dia e do lugar que ela ocupa dentro do
espectro científico. O trabalho com a Matemática desde o primeiro momento na
Educação Infantil até as séries mais avançadas da profissionalização ou
especialização merece um cuidado enorme para não justificar, nos educandos,
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um sentimento que não representa o que a Matemática é de fato: uma ciência


que foi construída ao longo da história da humanidade pelos e para os homens
com a intenção de resolver problemas da própria sociedade.

Essas reflexões apresentadas são resultados do empenho em oferecer


um material a docentes em formação, que contribuam para o aprimoramento
da matemática e da desmistificação de que esse saber é para poucos, além de
sabermos o quanto essas discussões são relevantes e pertinentes para a
Educação Matemática, principalmente por sabermos que, infelizmente, em
alguns casos, a Matemática e vista como uma disciplina difícil de ser ensinada
e de ser aprendida (o que não concordemos). Isso ano representa o verdadeiro
sentido dela, pois podemos dizer que ela apresenta características próprias,
assim como as outras disciplinas.

Nesse percurso, esperamos estimular o debate e despertar inquietações


a partir das contribuições do material impresso, das dicas, de eventuais
curiosidades, sugestões de atividades e dos materiais em meio eletrônico, bem
como da lista de referências básicas e complementares que você poderá
consultar para ampliar esse conhecimento.

Desse modo, esperamos que este material proporcione seu interesse,


sua crítica e que sirva de referência para outros momentos de formação. De
certo, salientamos que ele não dispensa a pesquisa em outras fontes para
melhorá-lo na construção de seu conhecimento.

Um forte abraço, bom trabalho!

Carlos Renato Soares


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INDICAÇÃO DE ÍCONES

Os ícones funcionam como elementos gráficos utilizados para facilitar a


organização e a leitura do texto, bem como solicitar exercícios e atividades
complementares. Veja a função de cada um deles:

Atenção: Mostra pontos relevantes encontrados no texto.

Saiba mais: Oferece novas informações que enriquecem o assunto


como “curiosidades” ou notícias recentes relacionadas ao tema
estudado.

Glossário: Utilizado para definir um termo, palavra ou expressão


utilizada no texto.

Mídias Integradas: Indica livros, filmes, músicas, sites, programas de


TV, ou qualquer outra fonte de informação relacionada ao conteúdo
apresentado.

Pratique: Indica exercícios e/ou Atividades Complementares que você


deve realizar.

Resumo: Traz uma síntese das ideias mais importantes apresentadas


no texto/aula.

Avaliação: Indica Atividades de Avaliação de Aprendizagem da aula.


Sumário
1. Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades..............................................1

1.1 Primeiras palavras.................................................................................................................................1

1.2 Problematizando o tema......................................................................................................................2

1.3 Compreendendo o nosso sistema de numeração.................................................................................2

1.4 Os conceitos envolvendo as quatro operações fundamentais..............................................................4

1.4.1 As operações fundamentais..........................................................................................................5

1.4.2 As técnicas operatórias (os algoritmos)......................................................................................11

1.4.3 O ensino da Aritmética: algumas sugestões...............................................................................17

1.4.4 Propriedades das operações fundamentais................................................................................18

1.4.5 Considerações finais...................................................................................................................20

1.4.6 Estudos complementares...........................................................................................................20

1.4.7 Alguns comentários finais...........................................................................................................20

2. Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


raciocínio combinatório e multiplicação retangular..................................................................................24

2.1 Cálculos e resolução de problemas na sala de aula............................................................................24

2.1.3 Análise de estratégias que levam a erros....................................................................................32

2.2 Situações aditivas e multiplicativas no ciclo de alfabetização.............................................................34

2.2.1 Situações Aditivas.......................................................................................................................36

2.2.2 Situações de composição simples...............................................................................................38

2.2.3 Situações de transformação simples..........................................................................................39

2.2.4 Situações de composição com uma das partes desconhecida....................................................42

2.2.5 Situações de transformação com transformação desconhecida.................................................44

2.2.6 Situações de transformação com estado inicial desconhecido...................................................46

2.2.7 Situações de comparação...........................................................................................................47

2.2.8 Situações Multiplicativas............................................................................................................52

2.2.9 Situações de divisão por distribuição..........................................................................................57

2.2.10 Situações de divisão envolvendo formação de grupos.............................................................60


2.2.11 Situações de configuração retangular.......................................................................................62

2.2.12 Situações envolvendo raciocínio combinatório.............................................................................63

2.3 Sobre cálculos e algoritmos................................................................................................................66

2.3.1 Contagem.........................................................................................................................................70

2.3.2 Recurso à propriedade comutativa..................................................................................................72

2.3.3 Memorização de fatos numéricos....................................................................................................74

2.3.4 Dobros e metades............................................................................................................................80

2.4 Algoritmos Tradicionais......................................................................................................................86

2.4.1 Adição sem agrupamento ou reserva.........................................................................................89

2.4.2 Subtração sem desagrupamento................................................................................................91

2.4.3 Adição com agrupamento ou reserva.........................................................................................93

2.4.4 Subtração com desagrupamento...............................................................................................98

2.5 As Operações, as Práticas Sociais e a Calculadora............................................................................102

3. Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico......................................................108

3.1 Primeiras palavras.............................................................................................................................108

3.2 Problematizando o tema..................................................................................................................109

3.3 Primeiras considerações sobre a Geometria.....................................................................................110

3.4 O ensino de Geometria nos anos iniciais..........................................................................................122

3.4.1 Observação, manipulação, comparação e classificação em Geometria....................................129

3.5.1 Os triângulos.............................................................................................................................140

3.5.2 Os quadriláteros.......................................................................................................................142

3.6 Algumas considerações.....................................................................................................................143

3.7 Estudos complementares.................................................................................................................143

4. Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico......................................................145

4.1 Primeiras palavras.............................................................................................................................145

4.2 Problematizando o tema..................................................................................................................146

4.3 O homem como medida das coisas..................................................................................................148

4.3.1 A necessidade de padronizar os padrões..................................................................................149

4.3.2 A Terra como medida das coisas...............................................................................................149


4.4 O metro............................................................................................................................................149

4.5 Sistema métrico decimal...................................................................................................................150

4.5.1 Medidas de comprimento........................................................................................................150

4.5.2 Medidas de superfície...............................................................................................................151

4.5.3 Medidas de volume..................................................................................................................152

4.6 Exemplos de atividades que podem ser desenvolvidas com as crianças..........................................153

4.7 Considerações finais.........................................................................................................................154

4.8 Estudos complementares.................................................................................................................154

5. Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.........................................155

5.1 Primeiras palavras.............................................................................................................................155

5.2 Problematizando o tema..................................................................................................................156

5.3 Considerações iniciais.......................................................................................................................156

5.4 Algumas ideias de fração..................................................................................................................162

5.5 Representação de frações.................................................................................................................165

5.6 Frações equivalentes........................................................................................................................166

5.7 Operações com frações....................................................................................................................167

5.7.1 Adição e subtração...................................................................................................................168

5.7.2 Multiplicação............................................................................................................................169

5.7.3 Divisão......................................................................................................................................170

5.8 Porcentagem.....................................................................................................................................173

5.9 Algumas reflexões a respeito dos obstáculos com números decimais e números fracionários........173

5.10 Considerações finais.......................................................................................................................177

5.11 Estudos complementares...............................................................................................................178

6. O desenvolvimento do pensamento estocástico.................................................................................180

6.1 Primeiras palavras.............................................................................................................................180

6.2 Problematizando o tema..................................................................................................................181

6.3 O tratamento de dados.....................................................................................................................182

6.4 O pensamento combinatório............................................................................................................193

6.5 O pensamento probabilístico............................................................................................................195


6.6 Estudos complementares.................................................................................................................197

7. Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
alfabetização: laboratório de ensino de matemática...............................................................................198

7.1 Do laboratório de ciências e matemática ao laboratório didático....................................................199

7.2 O surgimento das atividades experimentais e o Laboratório de Ciências.........................................200

7.3 Primeiros registros de um laboratório de Ciências em especial: o Laboratório de Matemática.......204

7.4 Atividades experimentais: uma alternativa na concepção construtivista para o laboratório didático
.................................................................................................................................................................207

7.4.1 O uso de material didático manipulável no ensino de Matemática: da ação experimental à


reflexão...............................................................................................................................................210

7.5 Os diferentes tipos de abordagem do laboratório em matemática..................................................217

7.5.1 Laboratório/ Depósito-arquivo.................................................................................................218

7.5.2 Laboratório/ Sala de aula..........................................................................................................219

7.5.3 Laboratório/ Disciplina..............................................................................................................221

7.5.4 Laboratório/ Laboratório de Tecnologia...................................................................................222

7.5.5 Laboratório/ Tradicional - Laboratório de Matemática............................................................225

7.5.6 Laboratório/ Sala Ambiente - Laboratório de Ensino de Matemática.......................................228

7.5.7 Porque Laboratório de Ensino de Matemática?.......................................................................233

7.7 Laboratório/ Agente de formação - Laboratório de Educação Matemática......................................234

7.7.1. Porque Laboratório de Educação Matemática?.......................................................................239


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Operações fundamentais
1
- I: multiplicação e divisão
e suas propriedades
Cármen Lúcia Brancaglion Passos e Mauro Carlos
Romanatto

Licenciatura em Pedagogia
Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.
PASSOS, Cármen Lúcia Brancaglion. A Matemática na formação de professores
dos anos iniciais: aspectos teóricos e metodológicos / Cármen Lúcia
Brancaglion Passos e Mauro Carlos Romanatto. -- São Carlos: EdUFSCar, 2010. 69
p. – (Coleção UAB-UFSCar).

1.1 Primeiras palavras

Nesta unidade, conteúdos matemáticos dos anos iniciais do ensino


fundamental são abordados em seus aspectos conceituais, pretendendo com isso
possíveis repercussões metodológicas tanto na Educação Infantil quanto nos
primeiros anos da escolarização matemática.

Enfatizamos que as discussões teóricas e metodológicas dos conteúdos


matemáticos têm como perspectiva a formação dos professores que ensinam
Matemática visando a trabalhos docentes significativos para os estudantes.

A noção de número natural, as propriedades do sistema de numeração


decimal, uma abordagem tanto qualitativa quanto quantitativa das operações

Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 1


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fundamentais e a primeira ampliação dos conjuntos numéricos (frações) são as


temáticas que desenvolveremos nesta unidade.

1.2 Problematizando o tema

O nosso sistema de numeração parece perfeito, pois com dez signos


podemos escrever qualquer número e realizar operações. Como isso foi possível?
Ensinar os números naturais para as crianças é uma tarefa fácil? Qual o ponto de
partida?

1.3 Compreendendo o nosso sistema de numeração

Estudos da História da Matemática mostram que diferentes civilizações


construíram distintas formas de representar o resultado de contagens e medições.
Diversos símbolos, signos e regras foram criados por egípcios, babilônios, maias,
romanos, etc. Conhecê-los é importante para a compreensão do processo de
construção do conhecimento matemático e, em particular, das regras do Sistema de
Numeração Decimal (SND).

Podemos afirmar que o sistema de numeração atual é uma síntese dos mais
variados sistemas de numeração que a humanidade criou. Ele se mostrou mais
interessante do que os outros, pois com dez signos e algumas regras podemos

escrever qualquer número e realizar operações.

O nosso sistema de numeração tem características que precisam ser


explicitadas para facilitar a sua compreensão. São elas:

 A base é dez (decimal). Nosso sistema de numeração tem 10 signos: 1, 2, 3,


4, 5, 6, 7, 8, 9 e 0.

 Tem o zero, que é um signo representante da ausência de quantidade. É uma


contribuição dos hindus no sistema de numeração e sua utilização é recente.

 É posicional (por exemplo, 222 – o primeiro dois é duzentos, o segundo é


vinte e o terceiro é dois). Para representar cada quantidade, nossos
antepassados criavam novos signos. No entanto, nosso sistema de

2 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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numeração decimal tem uma propriedade, a posição indica a quantidade de


elementos daquele agrupamento. Da direita para a esquerda temos as
unidades, as dezenas, as centenas e assim por diante. Cada três ordens
forma uma classe. Assim o número 222 tem duas centenas, duas dezenas e
duas unidades. Cabe ressaltar que esta é uma leitura em termos das
quantidades de todos os agrupamentos que esse número possui, mas 222
também pode ser decomposto em 22 dezenas e duas unidades assim como
222 unidades. Com o zero e o valor posicional foi possível passar para o
papel a lógica que estava nos ábacos.

 É aditivo ( 245 = 200 + 40 + 5 ).

 É multiplicativo ( 245 = 2 ×100 + 4 ×10 + 5 ×1 ).

Quando começamos o trabalho com a Aritmética nas séries iniciais do Ensino


Fundamental, o trabalho docente com a Matemática deve ser feito de maneira que a
parte conceitual fique bem fundamentada. O fato de uma criança falar ou mesmo
escrever os números não significa plena compreensão dessa importante noção
matemática.

Assim, poderíamos começar com os números de 1 a 9, para em seguida


trabalharmos com o zero (ausência de quantidade). De 1 a 9, a ideia essencial é
associarmos os números às quantidades. No entanto, quando passamos para os
números 10, 11, 12,..., além de quantidades há também a ideia de agrupamento.
Nesse caso, a nossa língua não ajuda muito, pois 11, 12, 13, 14 e 15 não explicitam
as quantidades dez-e-um, dez-e-dois, dez-e-três, dez-e-quatro e dez-e-cinco. Já o
número dezesseis dá a entender um grupo de dez unidades mais seis unidades.
Isso ocorre com outros números também, como dezessete, dezoito e dezenove,
pois, decompondo-os, temos: dez-e-sete, dez-e-oito e dezenove.

Devemos também ressaltar que do ponto de vista matemático a ideia de


número é a síntese de duas relações lógicas: a classificação e a seriação. A
classificação é o aspecto cardinal do número, ou seja, os objetos de um conjunto
podem ter uma propriedade característica comum e, assim, considerando-se cada
objeto individualmente como uma unidade podemos expressar a quantidade desses

Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 3


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objetos no conjunto. Em outras palavras, classificar é o ato de separar em categorias


de acordo com semelhanças ou diferenças. A seriação é o aspecto ordinal do
número. Ordenamos objetos de um conjunto para que possamos contá-los sem
deixar de contar algum deles ou contá-lo mais de uma vez. No entanto, é essencial
ressaltarmos que a seriação na contagem dos números naturais tem ainda outro
aspecto importante. Por exemplo, o número quatro contém o número três mais o
número um, ou dois mais um mais um, ou um mais um mais um mais um. Então: 4 =
3 + 1 = 2 + 1 + 1 = 1 + 1 + 1 + 1. Assim, para quantificar os objetos como um
conjunto, a criança tem que colocá-los em uma relação de inclusão hierárquica. Isso
significa que a criança deve incluir mentalmente um em dois, dois em três, três em
quatro, etc.

Temos também que os números podem ser usados como um código:


telefones, documentos, identificações. Então, as crianças falam ou escrevem
números como códigos, e esse conhecimento do dia a dia nem sempre ajuda na
compreensão das ideias de número e de sistemas de numeração.

1.4 Os conceitos envolvendo as quatro operações fundamentais

A literatura em educação matemática tem destacado a necessidade de se


enfatizar, por meio de metodologias diferenciadas, os conceitos matemáticos,
sobrepondo-se às regras e técnicas que são memorizadas e, por muitos,
esquecidas. Devemos ressaltar que não é para se abandonar regras e técnicas e
nem mesmo a memória. No entanto, tais aspectos envolvendo o aprendizado da
Matemática só têm sentido se forem articulados aos conceitos e princípios
matemáticos.

Pensando nessas ideias e relacionando-as com as quatro operações


fundamentais da Aritmética, inferimos que é necessário refletir sobre o conceito de

número e das operações de adição, subtração, multiplicação e divisão.

Para Onuchic & Botta (1998), a Aritmética é a parte da Matemática que


trabalha sobre números, estabelecendo relações, definindo operações e
identificando propriedades. Para as autoras, a natureza do número, em suas

4 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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diferentes operações, muda quando deixamos de adicionar e subtrair para


multiplicar e dividir os números naturais. E muda, ainda mais, quando passamos, por
exemplo, das operações com os números naturais para as operações com os
números fracionários.

1.4.1 As operações fundamentais

No contexto matemático, uma operação tem as seguintes características: é


uma ação mental, reversível e que tem propriedades.

As quatro operações fundamentais, até há pouco tempo, refletiam as ideias


de adição (processo de juntar coisas de mesma natureza), subtração (a operação
inversa da adição, ou seja, a ideia de tirar uma quantidade de outra), multiplicação (o
processo de adicionar, repetidamente, parcelas iguais) e divisão (a ideia de
reconhecer quantas vezes alguma coisa cabe em outra).

Numa visão mais recente sobre as quatro operações fundamentais com os


números naturais, observamos que: a) cada operação fundamental da Aritmética
geralmente permanece ligada a um modelo primitivo, intuitivo, implícito e
inconsciente; b) as ideias subjacentes a essas operações não são tão simples, são
complexas; e c) há diferentes tipos de problemas que são resolvidos por uma
mesma operação.

Nesse sentido, algumas recomendações já poderiam ser feitas para o


trabalho com as operações fundamentais nos números naturais. Por exemplo:

a) as operações adição e subtração, assim como as operações


multiplicação e divisão, deveriam ser trabalhadas simultaneamente;

b) há uma distinção entre a situação-problema e o procedimento de


achar a sua solução; e

c) as crianças raciocinam melhor nas ações do que nas


representações.

Os problemas de adição podem estar relacionados, por exemplo, às ideias de


“mudar adicionando”, de “combinar fisicamente” e de “combinar conceitualmente”.

Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 5


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Os problemas de subtração podem apresentar três ideias diferentes: o “mudar


subtraindo – tirar”, o “igualar ou completar” e o “comparar”. Os problemas de
multiplicação podem ser gerados a partir de “grupos iguais”, de “comparação
multiplicativa”, de “produto cartesiano” e de “área”.

Por fim, os problemas de divisão modelam tipos distintos de divisão: A


“divisão partitiva – repartir igualmente”, a “divisão quotitiva – medida” e a “divisão
cartesiana”. Toda esta complexidade de ideias pode gerar dificuldades para a plena
compreensão, por parte das crianças, dos conceitos de adição, subtração,
multiplicação e divisão, pois situações-problema com ideias operatórias diferentes
são resolvidas por um mesmo algoritmo.

As operações de adição e subtração deveriam ser trabalhadas a partir de


“problemas aditivos e subtrativos” que permitissem desenvolver, simultaneamente,
os conceitos de adição e subtração. Esse trabalho deveria ser feito juntamente com
o trabalho da construção do significado dos números naturais. A seguir, é que se
deveria relacionar os símbolos aos conceitos de adição e subtração. Assim, os
problemas aditivos e subtrativos seriam entendidos como elementos de uma mesma
estrutura e não poderiam ser trabalhados separadamente.

A adição é uma operação que produz uma soma a partir de duas parcelas
conhecidas, e a subtração é uma operação que produz uma das parcelas a partir de
uma soma conhecida e da outra parcela também conhecida. Assim, duas dessas
quatro situações são aditivas (combinar e adicionar) enquanto as outras duas são
subtrativas (tirar, comparar e completar).

Exemplifiquemos algumas situações-problema categorizadas por Gerard


Vergnaud e resumidas por Pires (2002) que envolvem as estruturas aditivas que
expressam as operações adição e subtração.

Problemas de combinação

São aqueles em que duas partes são combinadas para se obter uma soma ou
um total.

6 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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1. Em uma fruteira há 5 laranjas e 8 bananas. Quantas frutas há nessa


fruteira? (adição – busca da soma ou total).

2. Em uma fruteira há 13 frutas, sendo 5 laranjas e as demais bananas.


Quantas são as bananas dessa fruteira? (subtração – busca de uma das
partes).

Problemas de transformação

São aqueles em que um estado inicial sofre uma mudança para chegar a um
estado final.

1.Pedrinho tinha 10 figurinhas. Ganhou 5 de seu amigo. Com quantas


figurinhas ele ficou? (adição – busca do estado final).

2.Pedrinho tinha 10 figurinhas. Ganhou algumas de seu tio e ficou com 15.
Quantas figurinhas ele ganhou de seu tio? (subtração – busca da
transformação).

3.Pedrinho ganhou 5 figurinhas de seu tio e ficou com 15. Quantas figurinhas
ele tinha inicialmente? (subtração – busca do estado inicial).

Problemas de comparação

São aqueles em que se estabelece uma comparação entre dois estados.

1. João tem 15 selos e José tem 10 selos. Quantos selos João tem a mais
que José ou quantos selos José tem a menos que João? (subtração –busca
da diferença).

Problemas de igualdade

1. Maria tem 8 bonecas. Ana tem 5. Quantas bonecas Ana tem que comprar
para ficar com a mesma quantidade de Maria? (subtração – adicionando a
diferença).

Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 7


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2. Bianca tem 7 bonecas. Marina tem 3. Quantas bonecas Bianca tem


que perder para ficar com o mesmo número de bonecas de Marina?
(subtração – subtraindo a diferença).

Problemas de composição de transformações

São aqueles em que duas transformações são compostas para formar uma terceira.

1. Hoje pela manhã João ganhou 10 figurinhas e à tarde ganhou 5.


Quantas figurinhas ele ganhou hoje? (adição – duas transformações
positivas).

2. Hoje pela manhã João deu 4 figurinhas a um amigo e à tarde deu 3


ao seu primo. O que aconteceu com as figurinhas de João hoje?
(adição – duas transformações negativas).

3. Hoje pela manhã João ganhou 10 figurinhas de um amigo e à tarde


deu 4 ao seu primo. O que aconteceu com as figurinhas de João hoje?
(subtração – uma transformação positiva e outra negativa).

O importante desses exemplos de situações-problema é mostrar que existem,


em diferentes contextos, diferentes ideias e que muitas delas são resolvidas com o
mesmo algoritmo.

Outros contextos podem levar-nos a categorizar diferentemente outras


situações-problema. No entanto, se o professor trabalhar as duas operações (adição
e subtração) simultaneamente, a compreensão pode acontecer de maneira mais
efetiva, pois o raciocínio aditivo pode ser resumido na relação entre as parcelas e o
todo. Nos mais diferentes contextos em que aparecem, os problemas aditivos
podem ser resolvidos com duas operações: conhecidas as parcelas temos a adição
e conhecidos o todo e uma das parcelas temos a subtração.

Em relação à multiplicação e à divisão, as ideias habituais diziam que o


modelo para a multiplicação era o de adições repetidas e para a divisão era o
modelo baseado na partição ou o modelo apoiado nas subtrações sucessivas.

8 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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Sobre a multiplicação e a divisão dos números naturais, uma complexidade


se manifesta quando as operações são consideradas não somente da perspectiva
do cálculo, mas em termos de como elas modelam situações. No trabalho com a
Matemática em sala de aula, sente-se que a maior dificuldade encontrada por muitas
crianças está no ato de decidir se um problema dado será modelado pela operação
multiplicação ou divisão. A complexidade maior reside em um primeiro momento em
tal percepção e, posteriormente, na resolução do algoritmo.

As classes mais importantes de situações envolvendo a multiplicação e a


divisão com os números naturais são: a de grupos iguais, a de comparação
multiplicativa, a de produto cartesiano e a de área retangular.

Exemplifiquemos algumas situações-problema envolvendo as estruturas


multiplicativas.

1. Joãozinho, Zezinho e Pedrinho têm, cada um, 5 figurinhas. Quantas


figurinhas eles têm? (multiplicação).

2. João tem 4 vezes mais figurinhas do que Pedro. Pedro tem 5 figurinhas.
Quantas figurinhas tem João? (comparação multiplicativa).

3. Marcos tem 4 camisas e 3 calças. De quantas maneiras diferentes ele


pode se vestir? (multiplicação – produto cartesiano).

4. Um retângulo tem lados de 5 cm e 4 cm. Qual é a área dessa figura?


(multiplicação – área retangular).

5. Quinze laranjas são distribuídas igualmente entre 3 crianças. Quantas


laranjas cada criança recebeu? (divisão – partição ou distribuição equitativa).

Se tomarmos as crianças como grupos, essa divisão deve explicitar quantos

elementos (laranjas) serão distribuídos em cada grupo:

1. Se tenho 15 laranjas, para quantas crianças posso dar 5 laranjas? (divisão


– medida ou quota).

Se nesse problema conhecemos a quantidade de elementos em cada grupo,


então devemos calcular quantos grupos (crianças) serão contemplados. Em outras

Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 9


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palavras, quantas vezes uma quantidade cabe em outra. Nos números naturais,
calculamos quantas vezes uma quantidade menor está contida em uma quantidade
maior, podendo, às vezes, sobrar um resto. É possível uma quantidade maior caber
em uma menor?

Estamos trabalhando com os números naturais, mas nada impede de


lançarmos algumas questões aos estudantes. Por exemplo: quantas vezes R$ 0,50
cabem em R$ 2,00? A resposta 4 é esperada nos números naturais. E a questão:
quantas vezes R$ 2,00 cabem em R$ 0,50? Esses problemas podem ser bons
exemplos para justificar a necessidade de ampliação dos conjuntos numéricos, ou
seja, precisaremos de outros números para modelar o problema proposto. Nesse
caso, os números fracionários.

As crianças são curiosas e, em muitas oportunidades, o próprio professor


pode propor situações-problema além do conteúdo que está ensinando. No entanto,
as respostas devem ser intuitivas e contextualizadas, além disso o incentivo à
imaginação é essencial para o aprendizado.

A divisão é uma operação em que ideias intuitivas que as crianças trazem


podem dificultar a sua compreensão. A própria palavra divisão tem diferentes
significados em nossa língua. Por exemplo:

a) a plateia ficou dividida quanto ao resultado... (discórdia);

b) o rio divide as cidades... (separação);

c) o livro está dividido em... (partes).

E mais, as divisões no dia a dia nem sempre são feitas em partes iguais. Um
adulto pode dividir algo com as crianças levando em conta a idade ou o tamanho de
cada uma delas, assim as partes podem não ser equitativas.

Em termos matemáticos, as partes de uma divisão são, necessariamente,


iguais, e quando sobrar um resto este deve ser o menor possível.

Por fim, temos que o raciocínio multiplicativo envolve duas relações:

a) um a vários que leva à multiplicação e

10 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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b) distribuição que leva à divisão.

Retomando, podemos concluir que as operações mudam de adição e


subtração para multiplicação e divisão. Os números mudam de números naturais
para números fracionários. Nessas mudanças está uma que é fundamental e com
implicações distintas: uma mudança na natureza da unidade. Enquanto as situações
aditivas envolvem quantidades que são derivadas da realidade e quantificadas por
contagem ou medida, as situações multiplicativas quase sempre requerem a
manipulação de relações entre as quantidades. E essa mudança não é trivial.

Assim, o domínio de muitos conceitos numéricos e das relações numéricas ao


longo da escolarização parece requerer uma reconceituação da noção de número,
isto é, uma mudança significativa no modo pelo qual o número é concebido. Por
exemplo, enquanto o número natural é quantidade, o número fracionário é uma
síntese da quantidade e da medida.

Dadas as mudanças fundamentais na natureza do número, não será


surpreendente que reorientações cognitivas significantes sejam necessárias para
construir e compreender tais mudanças. Isso significa que é provável não haver
caminhos contínuos suaves da adição e subtração para a multiplicação e divisão,
nem dos números naturais para os números fracionários. A multiplicação não é,
simplesmente, adição repetida; e números fracionários não são, simplesmente,
pares ordenados de números naturais. Os novos conceitos não são extensões dos
conceitos anteriores.

1.4.2 As técnicas operatórias (os algoritmos)

Adição e subtração

As primeiras adições e subtrações com dois números parecem não


apresentar nenhuma dificuldade para as crianças, de forma que elas podem
adicionar ou subtrair tanto da direita para a esquerda quanto da esquerda para a
direita. Cabe ao professor ir articulando os algoritmos com materiais concretos
como, por exemplo, o ábaco e mostrar que nas operações de adição e subtração

Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 11


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adiciona-se ou subtrai-se os algarismos dos números naturais sempre da direita


para a esquerda.

As dificuldades das crianças com adições e subtrações podem aparecer nas


situações a seguir:

Pensamos que na adição não seria errado se alguns estudantes escrevessem


um resultado como 612, pois em um momento posterior o 12 poderia ser
decomposto em 10 + 2, de forma que o 2 ficaria na coluna da unidade e o 10 se
transformaria em uma dezena. O papel quadriculado poderia ser um bom recurso
didático. A regra seria: cada quadradinho não poderia conter mais de um número.

Em relação às subtrações apresentadas, elas poderiam ser trabalhadas como


inversas das adições e com a ideia de decompor uma dezena em 10 unidades,
acrescentando-as à ordem das unidades.

Essas subtrações também podem ser feitas pelo método da compensação.


Esse método é justificado por uma propriedade da subtração. Propriedade: se
acrescentarmos quantidades iguais ao minuendo e ao subtraendo, o resto de uma
subtração não se altera. Em símbolos, temos que:

se x ❑ y=k , entª o( x+ a)❑( y+a)=k

12 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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Assim, o que faríamos no algoritmo seria:

Assim, acrescentaríamos 10 a 2, obtendo 12, e para compensar


acrescentaríamos 10 a 20, obtendo 30, ou ainda acrescentaríamos uma dezena às
duas já existentes.

E poderia ser justificado da seguinte maneira:

Temos, a seguir, outro exemplo do método da compensação:

E a sua justificativa:

Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 13


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Nos exemplos envolvendo o método da compensação, os acréscimos e as


compensações feitos aos números das subtrações são 10 e 100 porque o nosso
sistema é decimal.

Multiplicação

Poderíamos exemplificar a multiplicação, nos primeiros exercícios, mostrando


todos os produtos feitos por meio da decomposição (nesse caso: unidades, dezenas
e centenas) dos números que expressam os fatores. Então:

Divisão
Método habitual (curto):

14 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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Esse algoritmo tem cálculos escondidos que precisam ser mostrados. E mais, a
divisão pode, em um primeiro momento, ser trabalhada em termos de previsão e estimativa.

O resultado dessa divisão é um número com um algarismo.

O algoritmo da divisão poderia ser justificado pelos exemplos:

Outro exemplo. Método habitual (curto):

Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 15


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Pensamos que as ideias de previsão e estimativa poderiam vir primeiro.


Então:

Essa divisão tem como resultado um número com três algarismos, pois o
número 3.742 tem unidades de “grupos de mil (3)”, mas não é possível dividir esses
grupos em 13 partes sem decompô-los, no caso em grupos de cem. Assim, é
possível dividir 34 centenas em 13 partes. Portanto, esse número tem centenas, ou
três algarismos.

Outro modo de justificar o algoritmo da divisão:

Inicialmente temos a tabuada do 13, em seguida multiplicamos os resultados


da tabuada por 10 e depois por 100. Agora, a estimativa é melhor, ou seja, o
resultado da divisão é um número entre 200 e 300.

Os números em negrito auxiliam nas outras estimativas sobre o resultado final


da divisão.

16 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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Por fim, temos o método curto, mas agora justificado:

Esses exemplos mostram que em Matemática tudo precisa ser justificado,


comprovado e, na maioria das vezes, essas demonstrações são bastante simples.
Os algoritmos, no caso das operações fundamentais, são estruturas matemáticas
que estão embasadas nas propriedades dessas operações, assim como nas
propriedades do sistema de numeração decimal. Uma vez compreendidos, as suas
utilizações facilitam e tornam mais rápida a resolução dos cálculos das situações-
problema.

1.4.3 O ensino da Aritmética: algumas sugestões

O ensino habitual da Aritmética sempre teve uma sequência parecida: uma


determinada operação era definida a partir de seus elementos constitutivos; em
seguida, dava-se ênfase nas técnicas operatórias e, por fim, eram dados os
problemas de fixação ou aplicação relacionados a essa operação. A ênfase nos
algoritmos valorizava uma Matemática mais quantitativa com sérios prejuízos para
os aspectos qualitativos das operações, que são necessários para a plena
compreensão dos conceitos e princípios matemáticos envolvidos nas operações. As

aplicações das operações em problemas geravam dúvidas nos estudantes, pois


estes não sabiam, em determinadas situações, qual a operação que deveriam
Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 17
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utilizar. Perguntas do tipo: “é conta de mais ou de menos?” eram comuns em salas


de aula de Matemática. Muitos problemas também eram resolvidos a partir da
identificação de palavras associadas a determinadas operações.

Atualmente, o trabalho com cálculo tem outra proposta. Desde o início da


aprendizagem é aconselhável que as operações adição e subtração e multiplicação
e divisão sejam trabalhadas aos pares, pois uma operação é o inverso da outra.

O ensino das operações começa por situações-problema significativas,


desafiadoras e inteligentes, as quais permitem, em um primeiro momento, que as
crianças utilizem seus conhecimentos intuitivos ou exercitem sua imaginação na
busca das soluções. Estimativas, cálculo mental, desenhos ou recursos
manipulativos podem ser usados para a resolução dos problemas. Esse momento é
essencial na aprendizagem matemática, pois o que queremos não é mostrar o que o
estudante pode fazer pela Matemática, mas sim o que a Matemática pode fazer pelo
estudante, que é, por exemplo, mostrar que ele pode pensar por si mesmo.

Em seguida, o professor trabalha qualitativamente as operações destacando


os seus elementos constitutivos. As propriedades das operações são identificadas e
exemplificadas. Os algoritmos são justificados como estruturas matemáticas que
expressam as propriedades tanto do sistema de numeração decimal quanto das
operações.

Por fim, novos problemas são trabalhados na perspectiva de que as


operações fiquem plenamente compreendidas. Nesse momento, estratégias de
verificação e controle dos resultados dos problemas devem ser incentivadas.

1.4.4 Propriedades das operações fundamentais

No estudo das operações fundamentais com os números naturais é


importante também que o professor mostre algumas propriedades dessas
operações. Para a adição, por exemplo, apresentar as propriedades:

a) fechamento: o resultado da adição de dois números naturais (soma)


é também um número natural;

18 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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b) comutativa: adicionar a + b dá o mesmo resultado que adicionar b +


a;

c) elemento neutro: zero mais qualquer número natural dá como


resultado o próprio número;

d) associativa: se tivermos três números naturais em uma adição, o


resultado é sempre o mesmo independentemente da ordem que
adicionarmos as parcelas.

Em relação à subtração, a propriedade de fechamento, por exemplo, não é


válida e isso pode preparar os estudantes para a necessidade de se ampliar o
conjunto dos naturais. Nesse caso, a ampliação será o conjunto dos números
inteiros. Assim, o professor pode mostrar para os estudantes alguns contextos que
precisam dessa ampliação para ser modelados.

Com a multiplicação temos propriedades semelhantes, ou seja:

a) fechamento: o resultado da multiplicação de dois números naturais


(produto) também é um número natural;

b) comutativa: multiplicar a por b dá o mesmo resultado que multiplicar


b por a;

c) elemento neutro: a unidade vezes qualquer número natural dá como


resultado o próprio número;

d) associativa: se tivermos três números naturais em uma


multiplicação, o resultado é sempre o mesmo independentemente da
ordem que multiplicarmos os fatores.

Em relação à divisão, por exemplo, a propriedade de fechamento não é válida


e isso significa que precisamos ampliar os números naturais. Nesse caso, a
ampliação será os números fracionários.

Ainda podemos apresentar aos estudantes uma propriedade que une a


adição com a multiplicação – a propriedade distributiva da adição em relação à
multiplicação –, que simbolicamente podemos escrever: a(b + c) = a . b + a . c.

Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 19


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1.4.5 Considerações finais

Nesta unidade procuramos articular as ideias qualitativas relacionadas às


operações fundamentais com os seus aspectos quantitativos (algoritmos). Assim,
um mesmo algoritmo pode expressar ideias e contextos diferentes de uma
operação.

E mais, esses algoritmos são estruturas matemáticas justificadas pelas


propriedades de nosso sistema de numeração. A nossa experiência tem mostrado
que as dificuldades que as crianças apresentam para a plena compreensão das
operações fundamentais residem tanto em não entender que contextos diversos
podem ser modelados por uma mesma operação quanto pela dissociação entre as
propriedades do sistema de numeração e as técnicas operatórias.

Cabe ao professor identificar essas dificuldades e, principalmente, sua


natureza para, então, levar as crianças a superá-las.

1.4.6 Estudos complementares

Um material muito bom para o professor que ensina Matemática nos anos
iniciais do ensino fundamental é o livro:

CARDOSO, V. C. Materiais didáticos para as quatro operações. São Paulo:


CAEMIME- USP, 2006.

Para outras leituras sobre o movimento entre o aprender e o ensinar


matemática nos anos iniciais, sugerimos o livro de:

NACARATO, A. M.; MENGALI, B. L. S.; PASSOS, C. L. B. A matemática nos anos


iniciais do ensino fundamental: tecendo fios do ensinar e do aprender. Belo
Horizonte: Autêntica, 2009.

1.4.7 Alguns comentários finais

Ao longo das quatro unidades que compõem este livro, enfatizamos a


importância do trabalho do professor de modo que tenha condições de ajudar seus
alunos a envolverem-se com conceitos matemáticos importantes para sua formação

20 Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades.


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intelectual.

Concordamos com Charlot (2005, p 84-85) quando diz que é “o aluno quem
deve aprender e que não se pode aprender em seu lugar” e que, para isso, deve-se
colocá-lo em uma “atividade intelectual”. Essa atividade é central ao processo de
aprendizagem, deste modo “é legítimo prestar maior atenção a ela, no que ela tem
de singular”. Colocar o estudante no centro do processo de ensino permitirá que
ocorra o compartilhamento do princípio de que “ensinar não é somente transmitir”
(CHARLOT, 2005, p 84-85). Isso significa que o conceito de ensino não é passivo, e
é importante que se estabeleça a relação entre professor e aluno. Nas relações
sociais e culturais que são estabelecidas no processo de ensino e aprendizagem, há
a aprendizagem mútua e a construção de conceitos entre indivíduos. Em outras
palavras, pode-se dizer que é possível aprender procedimentos na repetição de
mecanismos, mas não significa que a aprendizagem de conceitos tenha ocorrido.

Temos certeza que esta é uma obra inacabada. Muitos conceitos importantes
não foram abordados neste livro. No entanto, esperamos que ele contribua para
reflexões sobre a matemática e o papel que o professor dos anos iniciais tem que
assumir para proporcionar seu ensino num ambiente de aprendizagem, no qual
professor e estudante envolvam-se intelectualmente numa atividade em que todos
ensinam e todos aprendem.

Referências

BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Ensino Fundamental.


Parâmetros Curriculares Nacionais: matemática. Brasília: MEC/SEF, 1997.

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PEDAGOGIA

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Operações fundamentais - I: multiplicação e divisão e suas propriedades. 23


CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

Operações fundamentais
2
- II: Diferentes tipos de
problemas envolvendo o
campo multiplicativo:
raciocínio combinatório e
multiplicação retangular.
Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica,
Diretoria de Apoio à Gestão Educacional

Licenciatura em Pedagogia
Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo: raciocínio
combinatório e multiplicação retangular.

Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa: Operações na resolução de


problemas / Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, Diretoria de
Apoio à Gestão Educacional. – Brasília: MEC, SEB, 2014. 88 p.

2.1 Cálculos e resolução de problemas na sala de aula

Ettiene Cordeiro Guerios


Neila Tonin Agranionih
Tania Teresinha Bruns Zimer

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


24
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

Um aspecto fundamental na atividade com resolução de cálculos e problemas


em sala de aula é que os professores observem e considerem os modos próprios de
resolução e de aprendizagem de cada criança.

Ilustramos essa afirmação apresentando exemplos de estratégias diferentes


para resolução de um problema proposto aos alunos por uma professora. Observem
que as crianças elaboram estratégias e evidenciam o raciocínio que empregam, ao
contrário de apenas executarem mecanicamente cálculos previamente indicados
para serem feitos, sem compreensão conceitual.

Exemplo:

 Um aquário tem 15 peixes de cor amarela e verde. 6 peixes são da


cor amarela. Quantos são os peixes da cor verde?

Observe as estratégias que as crianças elaboraram para essa resolução.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


25
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
CURSO SUPERIOR DE
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PEDAGOGIA

A partir da resolução das crianças é possível perceber as estratégias e


aprendizagens de cada uma.

Ana Gabrielli inicialmente desenhou os 15 peixes em sequência. A seguir, •


pintou os últimos 6 de amarelo e os restantes de verde. Contou então os peixes
verdes e escreveu o resultado 9 ao lado. Observe que Ana Gabrieli espelhou a
grafia do 9. Ana Gabrielli resolveu o problema pela contagem da diferença entre os
peixes amarelos e os demais e mostra estar aprendendo a grafia dos algarismos.

Anita pintou em cores diferentes os dados do problema, escreveu o valor •


encontrado ao lado do enunciado, pintou e escreveu a resposta: “9 peixes são
verdes”. Inicialmente, desenhou os 15 peixes agrupados em duas linhas utilizando
critério aparentemente estético, pintou os seis primeiros de amarelo e os restantes
de verde. Ao lado da representação pictórica fez o cálculo usando o algoritmo
tradicional da conta armada e fez mais uma representação pictórica com pequenas
bolinhas. Anita compôs sua estratégia de resolução utilizando três representações,
que nos parecem complementares.

Maria desenhou os 15 peixes, fez dois grupos de 6, abaixo, usou o algoritmo •


tradicional da subtração 15 – 6 = 9 e ao lado fez mais uma representação pictórica.
Percebe-se que tentou outras estratégias anteriormente, pois há sinais de escritas
apagadas que embora não legíveis, evidenciam tentativas de Maria. Na resposta
encontramos marca apagada da escrita 24. Faz-nos pensar que em determinado
momento Maria encontrou 9 como resultado de suas estratégias, mas, ao elaborar a
resposta, continuou efetuando cálculos, sem entender exatamente o que solicitava o
enunciado. A resposta 24 apagada pode ser o cálculo da adição do 9 ao 15 presente
no enunciado.
Ao nos depararmos com
O que essas diferentes estratégias permitem
uma situação e fazermos
considerar? perguntas sobre a mesma,
a transformamos em uma
Os três alunos desenvolveram estratégias situação-problema. Nesse
caderno utilizaremos, sem
diferentes e todas conduziram à resolução correta do
fazer distinção, problemas
problema. Evidenciam movimentos cognitivos diferentes e situações-problema.

em função de conhecimentos matemáticos mobilizados


Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:
26
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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por cada uma delas. Maria evidencia que está em processo de construção
conceitual, mas que requer atenção, uma vez que pode estar operando com dados
numéricos do problema sem ter compreendido a situação presente no problema e,
sem saber o que necessita, matematicamente, fazer. Observe, agora, como Anita
realizou a atividade. A professora dela tem uma orientação própria para resolução
dos problemas que passa para seus alunos: eles devem colorir os dados e a
pergunta do problema para evidenciá-los. É importante salientar que são os alunos
que devem identificar quais são esses dados e qual a pergunta do problema e pintá-
los adequadamente. Se os professores indicarem previamente quais os dados a
serem pintados, ou se pintarem os dados no quadro antes de os alunos os
identificarem, o potencial didático da Resolução de Problemas estará comprometido,
porque será reduzido à resolução das contas envolvidas no enunciado. Lembre que
o potencial da atividade está, exatamente, em que os alunos compreendam a
situação-problema e elaborem a estratégia de resolução.

Se os alunos compreenderam a situação configurada, então poderão pensar


sobre ela e identificar o conhecimento matemático que a resolve. Ana Gabrielli, Anita
e Maria, por exemplo, desenvolveram estratégias diferentes para resolver o mesmo
problema, mas, mesmo que as estratégias tenham sido distintas, cada uma a seu
modo, chegou à resposta correta.

É possível afirmarmos que as crianças envolvidas na atividade descrita, Ana


Gabrielli, Anita e Maria, construíram as ideias matemáticas pertinentes ao problema?
Não podemos afirmar, categoricamente, que sim. O que podemos afirmar é que as
estratégias que realizaram evidenciam um processo de construção conceitual, nesse
caso, das operações matemáticas pertencentes ao campo conceitual aditivo, que
será, explorado mais adiante.

A socialização dessas estratégias desenvolvidas pelos alunos é um recurso a


mais para que os mesmos percebam as diferentes possibilidades de resolução de
um problema. É interessante que os caminhos pensados e construídos para chegar
às respostas sejam discutidos pelo grupo de alunos. Por exemplo, na resolução de
Maria ao problema apresentado anteriormente, seria relevante questionar o

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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significado do “9” e do 24, assim como as relações entre “6”, “9” e “15” no contexto
do problema o que possibilitará que os alunos se apropriem de diferentes
procedimentos. Para tal, é importante também promover a reflexão sobre os
caminhos percorridos e as respostas obtidas, bem como, valorizar as estratégias
realizadas.

É importante que as estratégias individuais sejam estimuladas. São elas que possibilitam aos alunos vivenciarem
as situações matemáticas articulando conteúdos, estabelecendo relações de naturezas diferentes e decidindo
sobre a estratégia que desenvolverão. A socialização dessas estratégias com toda a turma amplia o repertório
dos alunos e auxilia no desenvolvimento de uma atitude mais flexível frente a resolução de problemas.

Em primeiro lugar, é preciso que as crianças interpretem a situação-problema


vivenciada, compreendam o enunciado do problema, seja oral ou escrito. Ao
compreenderem, poderão estabelecer relações entre o que a situação propõe por
meio do enunciado e os conhecimentos matemáticos a ela pertinentes.

Para auxiliar as crianças nessa compreensão, diversas estratégias poderão ser utilizadas. Pode-se tomar um
texto de um problema em que faltem partes para que as crianças as completem. Em outro momento, podem ser
dados textos de problemas com excesso ou falta de dados. Estratégias como essas auxiliam a romper com o
contrato didático que tem levado as crianças a apenas procurarem a operação necessária para encontrar a
solução.

Por isso, é importante que os professores dediquem um tempo para a


interpretação da situação proposta para ser resolvida. Compreendida a situação
proposta, oralmente ou no enunciado do problema, os alunos terão condição de
desenvolver as estratégias de resolução. É nesse momento que mobilizarão
conceitos matemáticos conhecidos e fundamentarão os que estão em processo de
construção conceitual. É o importante momento em que os alunos decidirão COMO
resolver. Cabe aqui uma observação: este momento só terá valor didático se, de
fato, o aluno mobilizar seu pensamento para a construção da estratégia de
resolução. Se os alunos estiverem repetindo procedimentos, ou executando o que
lhes for dito para fazer, não estarão desenvolvendo estratégias de resolução. O
problema estará se convertendo em exercício de repetição ou em execução

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


28
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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algorítmica. Observe-se que, nesses casos, a atividade matemática em si (resolver


problema por repetição de procedimento ou por execução do que foi dito para fazer)
pode ocorrer; o que pode não acontecer é a compreensão conceitual, pois a
atividade matemática assim orientada não permite que ocorra. Por isso, enfatizamos
que a Resolução de Problema, ou de situação- -problema, possibilita uma
aprendizagem matemática conceitual.

Construída a estratégia, o aluno realizará os cálculos, promoverá a solução,


chegará à resposta. A realização dos cálculos pode ocorrer de diferentes modos.
Pode ser a algorítmica propriamente dita, oral, pictórica, com a utilização de material
dourado ou de outro modo que expresse a resolução da estratégia construída.

É interessante que os alunos reflitam sobre a resposta obtida. Os professores


devem incentivar os alunos a compararem a resposta obtida com o enunciado do
problema, ou com a situação-problema que gerou a necessidade de solução. É
preciso que argumentem se a resposta obtida faz sentido no contexto do problema.
É preciso examinar o sentido matemático da resposta. Nesse momento, se os
alunos perceberem inconsistência entre resposta e dados do problema, eles
mesmos deverão rever a estratégia.

O trabalho com Resolução de Problemas sempre envolve aspectos mais


amplos da construção dos conhecimentos escolares, a começar pelo fato destes
conhecimentos estarem inseridos em contextos. A seleção que o professor fizer
sobre os contextos, a delimitação das aproximações que eles terão com o universo
de experiências vividas pelos alunos, será fundamental para determinar o grau de
envolvimento das crianças com as questões que lhes forem propostas. Em seguida,
trabalhados coletivamente os enunciados dos problemas, cada aluno deve ser
estimulado a questionar sua própria resposta, a questionar os dados e o enunciado
do problema, e, deste modo, instigado a transformar os dados e sua solução em
uma fonte para novos problemas. Esse procedimento coloca em evidência alguns
pressupostos em relação ao ensino e a aprendizagem que superam a perspectiva
da simples “reprodução de conhecimentos”.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


29
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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PEDAGOGIA

A professora da Rede Municipal de Curitiba, Alessandra Nacur Gauliki,


trabalha com Resolução de Problemas em sua prática cotidiana. Ela disponibilizou
sua experiência conforme o relato a seguir.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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No relato da Professora Alessandra, observamos como ela organiza a


atividade com Resolução de Problemas. A compreensão pelos alunos da situação-
problema é evidente, como também é evidente que a prática por ela adotada
privilegia a construção das estratégias de resolução e a análise do resultado obtido.
Vamos, a seguir, abordar aspectos importantes no trabalho com Resolução de
Problemas.

2.1.3 Análise de estratégias que levam a erros

Até aqui abordamos estratégias que conduzem a respostas corretas pelos


alunos. E o que fazer diante de estratégias que conduzem a erros?

Há várias situações que dificultam a construção de estratégias resolutivas e


que, consequentemente, conduzem os alunos a erros. Citamos aqui erros de duas
naturezas: os decorrentes de dificuldades linguísticas e os decorrentes de
compreensão de natureza matemática.

Os de natureza linguísticas são decorrentes das dificuldades de compreensão


de textos, considerando que o enunciado dos problemas é um texto, seja ele
apresentado de modo oral ou escrito. Os de natureza matemática são os
decorrentes de limitações na compreensão de conceitos envolvidos impedindo o
estabelecimento das relações necessárias para a solução do problema.

Guérios e Ligeski (2013) desenvolveram pesquisa com alunos do Ensino


Fundamental em atividades com Resolução de Problemas e identificaram os
seguintes fatores, entre outros, que levam os alunos a erros:

 Ausência de compreensão ou compreensão inadequada na leitura : o aluno


não compreendeu o que leu e, consequentemente, não identificou uma
situação a ser resolvida matematicamente, ou seja, não pode desenvolver
estratégia alguma de resolução;

 Ausência ou equívoco de compreensão matemática : o aluno compreendeu o


que leu mas não identificou o conceito matemático que o resolve.

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Embora as autoras tenham identificado tais dificuldades em situação de


leitura, esclarecemos que a mesma não ocorre apenas da leitura feita pelo aluno,
pois muitas vezes a dificuldade persiste mesmo quando o enunciado é lido para o
aluno.

Devemos observar atentamente se os alunos estão compreendendo os problemas e/ou seus enunciados. É
imperativo que compreendam, porque é a partir dessa compreensão que haverá atividade matemática. Erros que
equivocadamente são considerados dificuldades de aprendizagem em Matemática, algumas vezes, têm sua
origem na falta de compreensão do problema ou do seu enunciado. Por isso é importante que os professores
analisem a origem dos erros dos alunos para poder ajudá-los na aprendizagem.

As pesquisadoras identificaram uma terceira situação não caracterizada por


ausência de compreensão, mas pela evidência de que o aluno está em processo de
construção conceitual ao realizar tentativas de resolução testando diferentes
caminhos. No caso de Maria, comentado anteriormente, percebemos que ela errou
para acertar.

Analisar as tentativas ajuda a compreender como as crianças aprendem, como elaboram suas estratégias, qual
seu ritmo de aprendizagem e, principalmente, como está acontecendo a base estruturante do pensamento
matemático dos alunos.

Erros de compreensão do contexto delineado pelo problema ocorrem e são


bastante comuns. Nestes casos, deve-se retornar à busca de sentido da situação.
Devemos atentar para verificar o que os alunos erraram. Isto pode ser ocasionado
por um erro de cálculo, uma distração, ausência de compreensão ou compreensão
equivocada tanto do enunciado como do conhecimento matemático a ele pertinente
para a solução. Para cada uma das possibilidades há estratégias diferenciadas de
intervenção pedagógica.

De fato, os processos resolutivos das crianças dizem muito sobre como estão
aprendendo e a resolução de problemas e de situações-problema possibilitam ao
professor identificar se respostas numéricas obtidas representam aprendizagem
efetiva.

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Devemos também ficar atentos quando as crianças se valem de indícios


linguísticos presentes nos problemas para realizar cálculos que conduzam à
solução. Por exemplo, considere o problema a seguir:

 Ana tem 5 doces e Maria tem 8 doces. Quantos doces Maria tem a
mais?

Se diante desse problema adicionarem 5 + 8 = 13, induzidos pela palavra


“mais” presente no enunciado, temos um forte indício de que não compreenderam
conceitualmente as operações necessárias para resolvê-lo.

Podem, também, ao terem sido expostas a um ensino baseado em palavras- -


chaves relacionadas com operações (mais, juntar, ganhar, etc. implicam no uso do
algoritmo da adição, assim como tirar, perder, etc., implicam no uso do algoritmo da
subtração), simplesmente terem deduzido se tratar de uma adição. É preciso que
sejam trabalhadas as respostas dos alunos, identificando como pensaram para
podermos encontrar circunstâncias reveladoras do processo de aprendizagem de
cada um. Veremos no texto seguinte que o uso de palavras-chave relacionados com
as operações pode levar a equívocos.

2.2 Situações aditivas e multiplicativas no ciclo de alfabetização

Ettiene Cordeiro Guerios


Neila Tonin Agranionih
Tania Teresinha Bruns Zimer

É bastante comum que as crianças e também adultos relacionem aprender


Matemática com aprender a fazer contas uma vez que por muito tempo o ensino de
cálculos foi enfatizado no ciclo inicial do Ensino Fundamental. Por conta disso,
muitas crianças desenvolveram e desenvolvem habilidades algorítmicas, nessa fase
da escolarização, muito mais do que habilidades de resolução de problemas.

Professor, que conta tem que fazer? É de mais ou de menos?


É de vezes ou de dividir?

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Perguntas como essas são bastante comuns na prática cotidiana de muitos


professores. Se os alunos perguntam recorrentemente que contas devem fazer
diante de problemas matemáticos, possivelmente não estão compreendendo as
ideias envolvidas no problema e/ou não atribuem significado aos algoritmos que
sabem usar. Para aprender matemática precisam saber mais do que fazer contas: é
importante saber o que os cálculos significam e compreender os conceitos
envolvidos nas operações que representam. Exemplo disso é o fato de que
diferentes problemas podem ser resolvidos com o mesmo cálculo, como pode ser
observado a seguir:

Exemplos:

 Em um vaso há 3 rosas amarelas e 5 rosas vermelhas. Quantas flores há


no vaso?

3+5=8

Resposta: no vaso há 8 flores.

 Luísa tinha alguns lápis de cor em seu estojo. Perdeu 3 lápis de cor •
durante a aula de artes e ficou com 5. Quantos lápis de cor Luisa tinha
em seu estojo no início da aula de artes?

3+5=8

Resposta: Luísa tinha em seu estojo 8 lápis de cor.

O primeiro problema é facilmente resolvido pelas crianças. Já o segundo


envolve um raciocínio mais complexo, a compreensão da adição como operação
inversa da subtração, tornando-se mais difícil para as crianças, mesmo que
consigam realizar com tranquilidade o cálculo numérico 3 + 5 = 8. Ou seja, saber
fazer a conta não é suficiente, é necessário compreender a operação envolvida no
problema. É necessário construir os conceitos envolvidos nas operações.

Vergnaud (2009) afirma que conceitos não podem ser compreendidos de


modo isolado, mas sim a partir de campos conceituais. Isto implica em considerar
que conceitos, como por exemplo, de adição e subtração, envolvem e são

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envolvidos por situações, estruturas, operações de pensamento e representação


que se relacionam entre si. Assim, adição e subtração fazem parte de um mesmo
campo conceitual denominado aditivo. Do mesmo modo, multiplicação e divisão
fazem parte do campo conceitual denominado multiplicativo.

Apresentamos uma proposta de trabalho com cálculos as operações básicas


que contempla a construção de conceitos a partir de campos conceituais, partindo
de situações que promovem o pensamento operatório e suas diferentes formas de
representação. É importante salientar que as classificações de situações são
conhecimentos importantes para a prática docente, pois permitem ao professor
propor e selecionar situações variadas, as quais levarão as crianças a uma maior
compreensão das situações envolvidas. Por outro lado, isso não deve levar o
professor a tomar como conteúdo de sala de aula a classificação dos problemas, ou
mesmo, trabalhá-los separadamente com as crianças. Tal prática, pode levar as
crianças a decorar procedimentos de resolução, o que não é adequado na atividade
matemática escolar.

2.2.1 Situações Aditivas

A vivência trazida pela criança no início do processo de escolarização não é


pequena e, acrescentamos, não deve ser ignorada. Trata-se de uma riqueza a ser
considerada e explorada no processo de alfabetização matemática. Ao ingressarem
na escola, as crianças já conseguem resolver problemas que envolvem situações
aditivas simples, coordenando ações de “juntar”, “ganhar” e “perder”, por exemplo,
com ou sem auxílio de objetos ou registros escritos, uma vez que são as primeiras
representações que as crianças formam sobre adição e subtração, antes mesmo de
ir para a escola, nas brincadeiras, na interação com outros, enfim, nas relações que
estabelecem no seu dia a dia (MAGINA et al., 2001; NUNES; BRYANT, 1997). Por
outro lado, a coordenação dessas ações com a contagem, constitui um
procedimento bastante eficaz na resolução de situações-problema, e merece uma
atenção especial no início da escolarização.

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A atividade de contagem permite que as crianças construam estratégias que


lhes possibilitam resolver problemas de complexidade crescente. Mas, para tanto,
conforme Orrantia (2000), há necessidade de desenvolver algumas habilidades,
dentre elas:

 começar a contagem a partir de qualquer ponto arbitrário da série numérica,


por exemplo, contar a partir do 6;

 identificar o último objeto contado como o cardinal que expressa a quantidade


total sem necessidade de contar os objetos novamente;

 estender a contagem iniciada no primeiro conjunto ao segundo conjunto de tal


forma que o primeiro objeto deste seja considerado o número seguinte na
sequência de contagem, por exemplo: na adição de um conjunto de 3 lápis
com um outro de 4 lápis, a contagem se daria da seguinte maneira: 1, 2, 3
seguida por 4, 5, 6, 7.

Com o tempo, e à medida que interagem com diferentes situações,


desenvolvem estratégias de contagem mais sofisticadas, abstratas e eficientes, tais
como as necessárias para a resolução de problemas aditivos (FAYOL, 1996;
ORRANTIA, 2000). Essas estratégias são identificadas como:

 contar todos;

 contar a partir do primeiro (reter o 5 na memória em 5 + 6, contando os


restantes: 6, 7, 8, 9, 10, 11, por exemplo);

 contar a partir do maior (reter o 6 em 5 + 6, contando os restantes: 7, 8, 9, •


10, 11);

 usar fatos derivados (em 5 + 6, efetuar o cálculo 5 + 5 + 1 = 10 + 1 = 11);

 recuperar fatos básicos da memória (lembrar fatos memorizados, como a


tabuada).

A escolarização contribui, ou deveria contribuir, para o uso de estratégias


mais maduras em relação à contagem, tais como, fatos derivados e recuperação de
fatos da memória, na resolução de problemas e na realização de cálculos.
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Por volta dos 5 anos, as crianças conseguem resolver problemas, tais como,
os que envolvem as situações de composição e de transformação simples pela
contagem que veremos a seguir.

2.2.2 Situações de composição simples

As situações de composição relacionam as partes que compõem um todo por


ações de juntar ou separar as partes para obter o todo sem promover transformação
em nenhuma das partes.

Exemplo:

 Em um vaso há 5 rosas amarelas e 3 rosas vermelhas. Quantas rosas •


há ao todo no vaso?

Os números referem-se a dois conjuntos de rosas que se compõem formando


o total de rosas no vaso. Não há transformação na situação, uma vez que não houve
acréscimo de rosas e nenhuma rosa foi retirada do vaso, mas a ação de “juntar” as
partes para determinar o todo.

A criança poderá pegar 5 objetos, representando as 5 rosas, contando-os um


a um (1, 2, 3, 4, 5) depois 3 objetos, também contando-os um a um (1, 2, 3). A
seguir, juntá-los e contar todos novamente iniciando do 1 até o 8. Esse
procedimento é descrito na literatura como “contar todos”.

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Problemas de composição podem ser trabalhados a partir de jogos didáticos


que possibilitem às crianças coordenar ações próprias às situações aditivas e
subtrativas. Veja o jogo a seguir.

Problematizar situações do jogo é uma forma bastante interessante para


desafiar os alunos a refletir sobre as estratégias e os cálculos realizados bem como
suas diferentes formas de representação. Por exemplo:

Problematizando situações após o jogo Comprando Fichas:

2.2.3 Situações de transformação simples

As situações de transformação envolvem um estado inicial, uma


transformação por ganho ou perda, acréscimo ou decréscimo e um estado final.

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As situações mais simples de transformação são aquelas em que o estado


inicial e a transformação são conhecidos e o estado final deve ser determinado.
Exemplo:

 Aninha tem 3 pacotes de figurinhas. Ganhou 4 pacotes da sua avó.


Quantos pacotes tem agora?

– Estado inicial: 3 pacotes de figurinhas

– Transformação: ganhou 4 pacotes

– Estado final: ?

A criança poderá pegar 3 objetos, representando os 3 pacotes (estado inicial),


contando-os um a um (1, 2, 3) depois 4 objetos, também contando-os um a um (1, 2,
3, 4). A seguir, juntá-los (transformação) e contar todos novamente iniciando do 1
até o 7, obtendo o estado final 7.

Também poderia
pegar 3 pacotes de figurinhas
e continuar pegando mais 4
pacotes, um a um,
continuando a contagem até
7. Esse procedimento é conhecido como “contar na sequência”. Problemas de
subtração também podem envolver situações de transformação simples e podem ser
resolvidos a partir da coordenação das ações de retirar e contar.

Exemplo:

 Zeca tinha 7 bolinhas de gude. Deu 3 para Luís. Quantas ele tem agora?

– Estado inicial: 7 bolinhas

– Transformação: deu 3 bolinhas

– Estado final:?

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As crianças podem resolver o problema da seguinte maneira: contar 7


bolinhas (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7) (estado inicial). Deste conjunto, contar 3 bolinhas e
separá-las das demais (transformação). Contar as bolinhas restantes, reiniciando a
contagem (1, 2, 3, 4), obtendo o estado final 4.

Inicialmente as crianças desenvolvem esquemas de “juntar”; “separar” e


“correspondência um a um” independentemente uns dos outros. Isso lhes permite
dar conta de situações mais simples. No entanto, o avanço no processo de
compreensão das relações aditivas envolve coordenar estes esquemas
reconhecendo a relação inversa que existe entre adição e subtração, e, numa fase
posterior, coordená-los com a correspondência um a um (NUNES et al., 2005).

Situações de composição, como veremos a seguir, podem envolver relações


inversas entre o todo e suas partes, tornando-se mais difíceis, mesmo com o auxílio

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de objetos. A maioria das crianças ao entrar na escola não desenvolveu meios de


coordenar esses esquemas. Cabe à escola ajudá-las.

Se desejamos promover o desenvolvimento conceitual das crianças


em adição/subtração, devemos ajudá-las a estabelecer uma conexão
entre duas coisas que elas já conhecem. Elas já sabem como
comparar usando correspondência termo a termo e elas já têm um
conceito de adição/subtração relacionado a situações de
transformação. Se elas podem coordenar estes dois itens de
conhecimento, sua compreensão de adição/subtração se tornará muito
mais poderosa (NUNES; BRYANT, 1997, p.137).
A seguir apresentamos alguns exemplos dessas situações mais complexas
de adição e subtração.

2.2.4 Situações de composição com uma das partes desconhecida

Problemas de composição podem envolver situações em que o todo e uma


das partes são conhecidos, sendo necessário determinar a outra parte. No exemplo
que segue a situação envolve subtrair uma parte do todo para obter a outra parte,
sem alterar as quantidades.

Exemplo:

 Em um vaso há 8 rosas, 3 são vermelhas e as outras são amarelas. •


Quantas rosas amarelas há no vaso?

– Todo: 8 rosas

– Parte conhecida: 3 rosas vermelhas

– Parte desconhecida: ?

A resolução pode ser realizada por


um processo simples como fez Igor:
desenhou o vaso com 3 rosas vermelhas
e a seguir foi desenhando rosas amarelas
até completar 8 rosas no vaso,
representando o que fez com o cálculo:

5 + 3 = 8.
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Dentre os procedimentos adotados para a resolução, a criança também pode,


após contar oito objetos, separar os que correspondem às rosas vermelhas e contar
os restantes: 1, 2, 3, 4, 5, concluindo que há 5 rosas amarelas no vaso, ou seja,
subtrair a parte conhecida (3) do todo (8), obtendo a parte desconhecida (5).

Luana, em seu registro, evidencia ter desenvolvido raciocínios mais


complexos. Inicialmente, ela desenhou o todo (8 rosas). Pintou 3 rosas de vermelho
(parte conhecida) e escreveu o número 3. A seguir, pintou as restantes de amarelo e
escreveu o número 5. Fez a subtração (8 – 3 = 5), representando o resultado por
meio de um novo desenho.

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O procedimento realizado por Luana evidencia o uso da operação inversa na


resolução do problema aditivo e a representação da mesma por meio do cálculo da
subtração.

2.2.5 Situações de transformação com transformação desconhecida

Trata-se de problemas aditivos de transformação desconhecida, uma vez que


são conhecidos os estados iniciais e o estado final da situação.

Exemplo:

 Aninha tinha 5 bombons. Ganhou mais alguns bombons de Júlia. Agora


Aninha tem 8 bombons. Quantos bombons Aninha ganhou?

– Estado inicial: 5 bombons

– Transformação: ?

– Estado final: 8 bombons

A contagem poderia ser um recurso para a resolução de problemas com


transformação desconhecida, tanto envolvendo a estratégia de “contar todos” como
a de “contar na sequência”. Outro modo de resolver o problema envolveria a
compreensão e a aplicação da subtração como operação inversa da adição. Trata-
se de acrescentar a uma quantidade inicial conhecida uma quantidade
desconhecida, para obter um total também conhecido, ou seja, 5 + ? = 8. A
operação envolvida é a adição, mas a resolução do problema requer ações próprias
da subtração, ou seja, subtrair 5 do estado final 8.

A seguir, temos um caso de transformação desconhecida em que a operação


envolvida é de subtração.

Exemplo:

 Zeca tinha 8 bombons. Deu alguns bombons para Luís e ficou com 3. •
Quantos bombons Zeca deu para Luís?

– Estado inicial: 8 bombons

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– Transformação: ?

– Estado final: 3 bombons

A operação envolvida na situação é 8 – ? = 3. Ou seja, envolve saber quanto


deve ser retirado de 8 para obter 3. O problema pode ser resolvido de diferentes
formas. As crianças poderiam contar 8 bombons, desses, separar os 3 que ficaram
com Zeca e contar os restantes, obtendo o resultado, assemelhando-se ao processo
de resolução de problemas de transformação simples, conforme indica o desenho de
Marcela:

Embora tenha encontrado o número correto, a aluna indica, pela resposta que
forneceu, que não compreendeu o problema. De fato, parece que toma 8 bombons e
retira 3, o que pode indicar que foi induzida pelos aspectos linguísticos do problema
(“deu”). Marcela, aparentemente, não percebe que 3 indica a quantidade de
bombons com que Zeca ficou e não o quanto deu.

Outro modo de resolver o problema envolve a operação inversa: quanto devo


acrescentar ao três para obter 8, ou seja 3 + ... = 8. Nesse caso, a criança poderia
contar 3 objetos e juntá-los num único grupo, a partir daí seguir contando até chegar
a 8 objetos.

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2.2.6 Situações de transformação com estado inicial desconhecido

O estado inicial também pode ser desconhecido nas situações de


transformação. Esses problemas costumam ser mais difíceis para as crianças, pois
envolvem operações de pensamento mais complexas.

Exemplo:

 Maria tinha algumas figurinhas. Ganhou 4 figurinhas de Isa. Agora •


Maria tem 7 figurinhas. Quantas figurinhas Maria tinha?

– Estado inicial: ?

– Transformação: ganhou 4 figurinhas

– Estado final: tem 7 figurinhas

Para resolver o problema, as crianças poderiam, por tentativas, somar 4 a


algumas quantidades. Por exemplo, se somassem 1 ao 4, não obteriam 7, se
somassem 2, também não, mas se somassem 3 obteriam 7, concluindo que o
resultado do problema é 3.

Também poderiam pensar que “somar um pouco a 4 é o mesmo que somar 4


a um pouco” e dessa forma resolver o problema por estratégias semelhantes às
discutidas nos problemas de transformação desconhecida. Essa forma de resolver o
problema envolve a compreensão da propriedade comutativa da adição.

A propriedade comutativa da adição é definida por “a + b = b + a”, ou seja, a ordem das parcelas não altera a
soma. Por exemplo, 3 + 4 = 4 +3.

A seguir, temos um caso de transformação em que o estado inicial é


desconhecido e a operação envolvida é de subtração.

Exemplo:

 Paulo tinha alguns carrinhos. Deu 4 carrinhos para Pedro e ficou com 7.
Quantos carrinhos Paulo tinha?

– Estado inicial: ?
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– Transformação: deu 4 carrinhos

– Estado final: ficou com 7 carrinhos

A resolução do problema pela inversão pode ser influenciada pela palavra


“deu”, que sugere subtração. Se as crianças se deixarem influenciar pelos indícios
linguísticos, certamente chegarão a resultados incorretos, tanto em problemas de
adição como de subtração com início desconhecido. Uma solução possível
envolveria a operação inversa no sentido de acrescentar aos carrinhos que ficaram
com Paulo os carrinhos que ele deu para Pedro (7 + 4 = 11).

2.2.7 Situações de comparação

Nas situações de comparação não há transformação, uma vez que nada é


tirado ou acrescentado ao todo ou às partes, mas uma relação de comparação entre
as quantidades envolvidas.

Exemplos:

 João tem 7 carrinhos e José tem 4 carrinhos. Quem tem mais carrinhos?

João tem 7 carrinhos e José tem 4 carrinhos. Quantos carrinhos João tem a
mais do que José? Problemas como o do primeiro exemplo são resolvidos de modo
intuitivo por crianças desde bem pequenas. Já o segundo possui um grau maior de
dificuldade, uma vez que a operação que conduz à solução não está explícita no
enunciado do problema.

Juan, no exemplo seguinte, usou a correspondência um a um para resolver o


segundo problema. Desenhou os carrinhos de João e os carrinhos de José. A seguir
fez corresponder um carrinho de João com um de José, verificando que restaram 3
carrinhos sem correspondência.

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Já Arthur usou o mesmo esquema, mas utilizando risquinhos. Para evidenciar


os risquinhos que correspondiam ao que João tinha a mais, utilizou o sinal de + e
continuou fazendo correspondência um a um entre os risquinhos de João e José,
verificando que foram necessários 3 risquinhos a mais.

Arthur utiliza uma forma de representação diferenciada de Juan. No primeiro


registro, a criança utiliza uma forma de representação pictográfica, a qual
corresponde ao contexto e ao objeto envolvido na situação-problema. Já no segundo
registro, a criança utiliza uma forma de representação simbólica, demonstrando
evolução em relação ao conhecimento de diferentes formas de representação.
Nunes et al. (2005), sugerem que uma boa estratégia para ajudar as crianças
a pensarem sobre “quantos tem a mais” é solicitar que relacionem os números
envolvidos no problema a partir de uma ação, reformulando a pergunta do problema.
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Por exemplo: quantos carrinhos temos que dar a José para que ele fique com a
mesma quantidade de João? Pensando dessa forma o problema se torna
semelhante a um problema de transformação desconhecida: 4 + ? = 7, tornando-se
mais fácil de ser resolvido por envolver uma informação mais precisa em relação à
ação a ser realizada.

Jogos matemáticos em que as crianças necessitem coordenar o que já


sabem sobre adição, subtração e correspondência um a um podem ser benéficos
para a compreensão de problemas de comparação. Por exemplo:

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Problematizando situações após o jogo:

Jogos de percurso também podem ser uma excelente oportunidade para


problematizar situações aditivas com as crianças uma vez que permitem a resolução
de problemas pela contagem de casas. Veja o jogo a seguir:

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2.2.8 Situações Multiplicativas

Reflita a respeito da seguinte questão: Se um aluno utiliza corretamente um


algoritmo de multiplicar ou de dividir significa que ele aprendeu a multiplicação ou a
divisão?

Se a resposta a esse questionamento for positiva e estiver pautada


exclusivamente na concepção de que multiplicar ou dividir é fazer os algaritmos de
forma correta, temos aí evidências de redução destas operações a cálculos e à
aplicação de procedimentos. Entretanto, se a resposta a esse questionamento for
negativa, podemos considerar o entendimento destas operações (multiplicação e
divisão) como formas de organização do pensamento a partir das estruturas e
conceitos matemáticos específicos de um determinado raciocínio, no caso, do
raciocínio multiplicativo.

O raciocínio multiplicativo é diferente do raciocínio aditivo, e é importante


conhecermos e diferenciarmos as características de cada um. Para isso, nos

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fundamentaremos nos estudos de Nunes e Bryant (1997), Nunes et al.( 2005) e


Correa e Spinillo (2004).

 Raciocínio aditivo: envolve relações entre as partes e o todo, ou seja, ao


somar as partes encontramos o todo, ao subtrair uma parte do todo
encontramos a outra parte. Envolve ações de juntar, separar e corresponder
um a um.

 Raciocínio multiplicativo: envolve relações fixas entre variáveis, por exemplo,


entre quantidades ou grandezas. Busca um valor numa variável que
corresponda a um valor em outra variável. Envolve ações de correspondência
um para muitos, distribuição e divisão.

O raciocínio multiplicativo envolve a multiplicação e a divisão com diferentes


complexidades. É possível observar nos problemas apresentados a seguir como o
raciocínio é desenvolvido tanto em relação à multiplicação quanto em relação à
divisão.

Situações de comparação entre razões

Para compreendermos essas situações multiplicativas vamos analisar os


exemplos que seguem:

Exemplo:

 Em uma caixa de lápis de cor há 12 lápis. Quantos lápis há em 3 • caixas


iguais a esta?

É possível pensar que a resolução mais fácil ao problema seria adicionar: 12


+ 12 + 12 = 36. Na escola é comum o ensino da multiplicação como adição de
parcelas iguais. Há, de fato, a possibilidade de resolver alguns problemas
multiplicativos mais simples por estratégias próprias ao raciocínio aditivo. No
entanto, o raciocínio multiplicativo é diferente e bem mais abrangente e complexo
que o raciocínio aditivo.

O problema pode ser resolvido desta forma:

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


53
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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PEDAGOGIA

O esquema “um para muitos”, utilizado no registro da resolução é importante


para a forma de pensar sobre o problema: para cada caixa correspondem 12 lápis. A
quantidade de caixas e a quantidade de lápis (medidas) estão relacionadas por um
número fixo de lápis por caixa, ou seja, 12 lápis por caixa. Vejamos: há duas
medidas no problema, número de lápis e número de caixas. Estas medidas estão
relacionadas por uma relação fixa que é de 12 lápis por caixa. Observe o esquema:

Aumentando o número de caixas numa relação fixa +1, temos um aumento na


quantidade de lápis numa relação também fixa: +12.

Observa-se que, embora o problema seja relacionado ao campo


multiplicativo, a resolução foi essencialmente relacionada ao campo aditivo. Abaixo,
temos um esquema que mostra o raciocínio relativo ao campo conceitual
multiplicativo, evidenciando a proporcionalidade:

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


54
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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LICENCIATURA EM
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Observa-se uma proporção entre a quantidade de caixas e a quantidade de


lápis por caixa, uma vez que, sempre que se dobra o número de caixas, dobra-se
também, o número de lápis, e, caso se triplique o número de caixas, se triplicará o
número de lápis. A correspondência “um para muitos”, “dois para o dobro de muitos”
e assim por diante, é a base do conceito de proporção. A proporção entre as
coleções permanece constante, mesmo quando o número de caixas e de lápis
muda. A proporção é a expressão da relação existente entre as duas coleções.

O raciocínio multiplicativo também envolve situações de divisão.

Exemplo:

 Júlia ganhou 12 chocolates e quer dividir entre 4 amigos de sua sala • de


aula. Quantos chocolates cada um vai receber?

Qual é a expectativa de resposta a essa situação-problema? Provavelmente,


o que é bastante comum nas salas de aula, espera-se que o aluno utilize um
algoritmo para a resolução de tal situação, isto é, faça 12 ÷ 4 = 3. Mas, essa forma
de resolução evidencia o raciocínio multiplicativo ou o conhecimento dos
procedimentos de cálculo?

O aluno do 1º ao 3º ano do Ensino Fundamental, possivelmente, não utilizará


o algoritmo da divisão para a resolução, mas buscará outros meios, como: a
contagem de objetos; a ação de repartição entre os amigos ou a representação por
meio de desenhos (registro pictórico).

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


55
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

O registro pictórico é uma ilustração de como o aluno evidencia seu raciocínio


multiplicativo, operando conceitualmente com a questão sem fazer uso do algoritmo.
Observe que
Maria desenhou
os 12 chocolates,
circulando a
quantidade que
cada um
receberá.

É possível distinguir o raciocínio aditivo do multiplicativo analisando o


problema anterior: a quantidade de chocolates e de pessoas foi transformada em
chocolates por pessoa, isto é, não se trata de uma relação com elementos de uma
mesma natureza, chocolate com chocolate ou pessoas com pessoas, conforme
acontece com as estruturas aditivas. Mas, de uma relação entre chocolates e
pessoas. A transformação reside no princípio de que o resultado dessa relação se
constitui em outro elemento, neste caso, chocolates por pessoa. Essa transformação
diz respeito ao modo como as informações foram relacionadas, conforme pode ser
observado na resolução de Gabriel.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


56
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

Várias possibilidades de resolução do problema poderiam ser adotadas pelos


alunos. Um exemplo é quando a criança “divide” ao seu modo os 12 chocolates
entre seus 4 amigos, conforme a ilustração.

Nesse caso, a criança determinou uma quantidade diferente de chocolate a


cada amigo, dividindo os chocolates a partir de critérios próprios. Ações como essas
são comuns entre as crianças, bem como, o uso da distribuição para resolver
problemas semelhantes.

Já Gabriel realizou a divisão dos chocolates entre os amigos de modo que


todos recebessem a mesma quantidade, distribuindo os chocolates entre eles por
um esquema de distribuição: um para você, um para você, um para você, até
terminar os chocolates, garantindo uma divisão equitativa dos chocolates entre os
amigos. Nesse caso, Gabriel recorreu a uma estratégia aditiva ao acrescentar +1
chocolate para cada criança a cada rodada de sua ação de distribuição.

2.2.9 Situações de divisão por distribuição

O problema resolvido por Gabriel envolve uma divisão por distribuição.


Observe:

Exemplo:

 Júlia ganhou 12 chocolates e quer dividir entre 4 amigos de sua sala de


aula. Quantos chocolates cada um vai receber?

Quantidade a ser dividida: 12 chocolates

Número de amigos: 4

Chocolates por amigo: ?

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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O que caracteriza esses problemas é o fato de a quantidade a ser dividida e o


número de amigos que receberão chocolates serem conhecidos. O quanto caberá a
cada um é o que deverá ser determinado. Esses problemas são considerados mais
simples e geralmente são muito explorados nas salas de aula. São conhecidos como
típicos problemas de divisão.

Mas, é importante estar alerta para o fato de que a divisão envolve situações
mais complexas do que a distribuição.

A criança ao realizar a distribuição, pode fazê-lo simplesmente


recorrendo a um raciocínio aditivo em que vai acrescentando mais um
elemento a cada rodada até que não haja mais elementos para uma
nova distribuição. No entanto, dividir, como uma operação
multiplicativa, implica que a criança possa também prestar atenção às
relações entre as quantidades em jogo. Implica, em outras palavras,
poder estabelecer relações de covariação entre os termos envolvidos
na operação (CORREA; SPINILLO, 2004, p.109-110).

Portanto, observa-se que Gabriel ainda precisa pensar sobre as relações de


covariação entre os termos envolvidos no problema para compreender a divisão
como operação multiplicativa. Analisando o problema podemos observar essas
relações. Temos duas variáveis, número de chocolates e número de amigos e uma
relação fixa: número de chocolates por amigo. No caso da divisão envolvida no
problema, a relação entre as variáveis “número de chocolates por amigo” é
constante e é justamente o que as crianças precisam compreender e encontrar para
a resolução do problema. A relação de covariação está na ideia de que quando o
número de amigos varia, o número de chocolates também varia na mesma
proporção. Por exemplo:

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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Observa-se novamente que, embora do campo conceitual multiplicativo, as


crianças os resolvem por estratégias aditivas. A seguir temos o esquema que
evidencia o raciocínio multiplicativo:

Problemas como esses são resolvidos com facilidade pelas crianças nos
primeiros anos do Ensino Fundamental pelo uso de esquemas de correspondência e
distribuição, mas é fundamental que esses esquemas sejam coordenados entre si e
possibilitem a resolução de problemas mais complexos. Surge, assim, a
necessidade de propor aos alunos a resolução dos mesmos desde o início da
escolarização e por meio de diferentes suportes de representação. O Material
Dourado pode ser um recurso para explorar estratégias mais sistematizadas em
relação ao algoritmo tradicional, já envolvendo as propriedades do Sistema de
Numeração Decimal conforme o exemplo:

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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2.2.10 Situações de divisão envolvendo formação de grupos

Problemas de divisão podem envolver a formação de grupos, quando o


tamanho do grupo é conhecido e o número de grupos possíveis deve ser
determinado.

Os registros elaborados pelas crianças são apresentados a seguir como


ilustração de situações de estruturas multiplicativas. Uma sugestão para a
organização da prática pedagógica baseada em histórias infantis consiste em propor
às crianças que façam a leitura da história. Em seguida, propor-lhes que contem a
história e a representem por meio de um desenho. Nesse desenho, de modo geral,
as crianças costumam representar os elementos que mais lhe chamam a atenção.
Pode-se, na sequência, propor problematizações sobre a história. A solução das
problematizações pode ser evidenciada nos registros feitos pelas crianças.

Além dessa obra, livros infantis são fontes interessantes para a elaboração de
problemas que permitam a exploração das estruturas aditivas e multiplicativas.

A história “As Centopeias e seus Sapatinhos” pode disparar uma situação de


divisão envolvendo formação de grupos, como a seguir:

Exemplo:

 Dona Centopeia levou 20 caixas de sapatos em sacolas. Em cada sacola


foram colocadas 4 caixas de sapatos. Quantas sacolas foram utilizadas?

Quantidade a ser dividida: 20 caixas de sapatos

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Tamanho do grupo: 4 caixas de sapatos em cada sacola

Número de grupos: ?

A quantidade total de caixas de sapatos a ser colocada nas sacolas é


conhecida, bem como a quantidade a ser colocada em cada sacola (a quantidade de
elementos de cada grupo). Com materiais concretos, as crianças podem facilmente
resolver o problema formando grupos de 4 e usando o esquema da correspondência
um para muitos: 4 caixas para 1 sacola, uma vez que a relação fixa entre número de
caixas e número de sacolas é conhecida.

É visível pelo desenho a seguir que Gabrielli tentou apagar o que havia feito
para desenvolver outro raciocínio. É comum as crianças tentarem resolver
problemas como esse distribuindo as caixas em 4 sacolas e obter o resultado 5. No
entanto, nesse caso, o resultado corresponderia a 5 caixas de sapato em cada
sacola. Embora o resultado numérico seja o mesmo, foi obtido por um erro de
interpretação da situação envolvida no problema.

Este é mais um exemplo de que é necessário observar qual é a compreensão que o aluno tem da situação-
problema, considerando o processo de resolução e não apenas o cálculo realizado ou a resposta final
apresentada.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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2.2.11 Situações de configuração retangular

Os problemas deste tipo exploram a leitura de linha por coluna ou vice-versa.


Exemplo:

 Dona Centopeia organizou seus sapatos em 7 fileiras com 5 caixas •


empilhadas. Quantas caixas de sapatos dona Centopeia organizou?

Medida conhecida: 7 fileiras

Outra medida conhecida: 5 caixas por fileira

Produto: ?

Para a resolução do problema, Danilo organizou as caixas de sapatos


relacionando as duas medidas conhecidas: a quantidade de fileiras com a
quantidade de caixas de sapatos por fileiras, constituindo uma representação com
linhas e colunas, cujo resultado expressa o produto da relação entre essas
quantidades, isto é, 7 fileiras por 5 colunas, resultando em 35. Este tipo de tabela é
considerada por Vergnaud (2009) a forma mais natural de representação da relação
entre as três medidas envolvidas em problemas dessa natureza.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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No caso exemplificado, tem-se as duas medidas simples conhecidas e busca-


se a medida composta (o produto).

No caso de Danilo, o registro pictórico permite observar sua compreensão


sobre a situação-problema e, também, pode ter contribuído para a busca do
procedimento que melhor representasse a operação utilizada para a resolução do
problema, pois é possível perceber a tentativa de fazê-lo pelo algoritmo da divisão
(escrita apagada pela criança). Certamente, como não obteve o resultado esperado,
buscou encontrá-lo pelo algoritmo da multiplicação, com sucesso. A opção pela
divisão, possivelmente, tenha ocorrido pela ideia de “distribuir” as caixas de sapatos
entre as fileiras, gerando um entendimento de que se tratava de um cálculo de
divisão. Outro aspecto a destacar é a forma como o algoritmo da multiplicação foi
escrito, colocando o 7 na ordem das dezenas e o 5 na ordem das unidades,
indicando a necessidade de uma intervenção sobre o modo de compreensão a
respeito do significado das ordens numéricas no Sistema de Numeração Decimal.

2.2.12 Situações envolvendo raciocínio combinatório

Algumas situações envolvem a necessidade de verificar as possibilidades de


combinar elementos de diferentes conjuntos. Por exemplo:

 Dona Centopeia tem dois chapéus, um branco (B) e outro preto (P) e
três bolsas, uma rosa (R), uma azul (A) e uma cinza (C). De quantas
maneiras diferentes Dona Centopeia pode escolher seus acessórios
para ir passear?

Conjunto conhecido: 2 chapéus

Conjunto conhecido: 3 bolsas

Número de possibilidades: ?

Temos dois conjuntos conhecidos: chapéus e bolsas, que devem ser


combinados entre si para determinar o número de possibilidades de combinação.
Vejamos como Lucca resolveu o problema:

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Lucca constituiu as diferentes possibilidades de formar conjuntos como


expressa em seu registro. Combinou os elementos dos conjuntos sem usar um
esquema determinado e a seguir contou as diferentes possibilidades de conjuntos
diferentes. O resultado foi encontrado pela contagem do total de possibilidades de
combinações possíveis.

Vejamos como Carolina resolveu o problema:

Carolina registra por desenho o entendimento da relação de “um para muitos”


na organização das combinações possíveis, ou seja, ela identifica a existência de
dois conjuntos básicos: chapéus e bolsas e relaciona-os entre si ligando-os: chapéu
branco com bolsa rosa, chapéu branco com bolsa azul, chapéu branco com bolsa
cinza. Após esse processo faz o mesmo com o chapéu preto. Obtém 3
possibilidades de combinar o chapéu preto com as bolsas e três possibilidades de
combinar o chapéu branco com as bolsas, ou seja, 2 vezes 3, obtendo ao todo 6
possibilidades de combinações diferentes. Carolina valeu-se do raciocínio
multiplicativo para a resolução do problema e expressa esta ação pela escrevendo
uma multiplicação.

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Diagramas que evidenciam as possibilidades de combinações podem


ser recursos interessantes para a resolução desses problemas. Por exemplo:

Embora não sejam familiares às crianças no ciclo fundamental de


alfabetização, diagramas como esses podem ser representações interessantes a
serem usadas pelo professor na discussão desses problemas com as crianças, pois
ajudam a organizar o pensamento e compreender o raciocínio envolvido.

Para o desenvolvimento do raciocínio aditivo e multiplicativo é importante propor aos alunos problemas variados,
envolvendo as diferentes situações que compõem os campos conceituais. Assim as crianças enfrentam
situações desafiadoras e não apenas resolvem problemas a partir da repetição de estratégias já conhecidas.

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2.3 Sobre cálculos e algoritmos

Ettiene Cordeiro Guerios


Neila Tonin Agranionih
Tania Teresinha Bruns Zimer

Até agora enfatizamos que aprender sobre adição e subtração, multiplicação


e divisão, envolve construir estratégias variadas e resolver diferentes problemas. No
entanto, é importante lembrar que a compreensão dos conceitos próprios a essas
operações requer coordenação com os diferentes sistemas de representação, o que
torna clara a importância da interação da criança com diferentes formas de registros,
dentre eles, os numéricos. Portanto, afirmar a necessidade de comprometer o
processo de alfabetização matemática com o desenvolvimento das operações de
pensamento necessárias para que as crianças se tornem capazes de resolver
diferentes situações, não significa dizer que cálculos numéricos não devam ser
trabalhados. Pelo contrário, desempenham um papel fundamental no processo.
Como afirmam Nunes, Campos, Magina e Bryant: “[...] enfatizar o raciocínio não
significa deixar de lado o cálculo na resolução de problemas: significa calcular
compreendendo as propriedades das estruturas aditivas e das operações de adição
e subtração.” (2005, p. 56) Por outro lado, à medida que a dificuldade dos problemas
avança e o campo numérico é ampliado, os cálculos numéricos tornam-se recursos
importantes e necessários para a resolução e é fundamental que sejam trabalhados
no ciclo inicial do Ensino Fundamental.

Quando afirmamos a importância do trabalho com cálculos, não estamos nos


referindo apenas aos procedimentos de cálculo tradicionalmente ensinados na
escola, que envolvem técnicas operatórias determinadas, tais como: “vai um”, “pede
emprestado”, “deixar uma casa em branco”, “abaixar o número”, entre outros,
usados nos algoritmos tradicionais. Estamos nos referindo também a outros

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procedimentos de cálculo, como estratégias inventadas pelos alunos e o uso de


recursos didáticos como o ábaco, material dourado e a calculadora.

Dificilmente os algoritmos tradicionais com lápis e papel são utilizados em


situações extraescolares. Muitos adultos e crianças desenvolvem técnicas de cálculo
próprias a partir da necessidade de resolver problemas numéricos do seu dia a dia.

Por exemplo, o cálculo necessário para fornecer o troco de uma compra no


valor de R$ 48,00, paga com uma cédula de R$100,00, dificilmente é realizado com
o uso do procedimento escolar.

Certamente, estratégias mais eficientes e rápidas possibilitam o cálculo


correto do troco, como por exemplo:

 completar quanto falta: se tenho R$ 48,00 para R$ 50,00 faltam R$ 2,00. Já


para R$ 100,00, faltam R$ 50,00. Portanto, o troco é de R$ 52,00; tirar R$
40,00 de R$ 100,00, restando R$ 60,00. Destes, tirar R$ 8,00, restando R$
52,00.

O mesmo em uma situação que envolve determinar o preço a pagar por 8


metros e meio de fita sendo que o metro custa R$ 1,50.

O algoritmo tradicional pode ser substituído por estratégias de cálculo, como:

Mas, não só adultos constroem métodos próprios de calcular em situações-


problema do cotidiano. No livro “Na vida dez na escola zero”, Carraher, Carraher e
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Schliemann (1988) já evidenciaram que meninos feirantes usavam métodos de


cálculo “naturais” ou “inventados”, diferentes dos da escola, nas situações que
envolviam o comércio de frutas. Por exemplo, ao ser questionado sobre quanto
custariam 9 abacates se o preço de 1 abacate era, na época, 5 Cruzeiros, um aluno
respondeu de imediato 45. Questionado sobre o porquê da resposta, explicou: 7 são
35, com mais 1, 40; com mais 1, 45. Essas crianças, no entanto, não se saíam tão
bem na escola, pois não dominavam as técnicas operatórias ensinadas por seus
professores e também não as relacionavam com as situações que vivenciavam em
seu trabalho.

Van de Walle (2009) refere-se a essas formas de calcular como estratégias


“inventadas” e as define como métodos pessoais e flexíveis de calcular que são
compreendidos pela pessoa que os usa. São estratégias que podem ser feitas
mentalmente ou por escrito, mais rápidas e menos sujeita a erros do que os
algoritmos tradicionais, uma vez que fazem sentido para quem as utiliza.

Para o autor o desenvolvimento dessas estratégias inventadas, além de


proporcionar fluência no cálculo e possibilitar que se tornem mais ágeis e cometam
menos erros, expressam uma compreensão rica e profunda do sistema numérico,
fornecendo uma base sólida para o cálculo mental e por estimativas e contribuem
para o envolvimento num processo de “fazer matemática”.

A importância de trabalharmos com cálculos na escola de modo distinto ao


que é tradicionalmente trabalhado e de modo bastante semelhante ao realizado por
adultos e crianças fora do contexto escolar já foi defendida por Parra (1996),
também há algum tempo. Sua proposta envolve trabalhar com cálculos que
denominou “pensados” ou “refletidos”, ou seja, procedimentos mentais ou escritos
selecionados em função dos números e da operação envolvida num problema, não
automatizados e diferentes dos algoritmos tradicionais, mas apoiados nas
propriedades do sistema de numeração decimal e nas propriedades das operações.
Esses cálculos colocam em ação, conforme a autora, diferentes relações entre os
números. Em outras palavras, permitem “raciocinar” sobre o que está sendo feito, ao
contrário de utilizarem algoritmos de forma mecânica.

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Estratégias de cálculo diferentes das tradicionais são construídas a partir da


compreensão das propriedades das operações e do Sistema de Numeração Decimal
de quem as “inventa”. Por exemplo, cálculos realizados por decomposição de
números são utilizados com frequência por facilitar e tornar mais ágil o processo e
estão apoiados na compreensão do princípio aditivo do sistema de numeração
decimal.

A proposta didática de Parra (1996) é que os alunos possam articular o que


sabem com o que têm que aprender diante de situações partindo da análise dos
dados, buscando os procedimentos que lhes pareçam mais úteis, discutindo suas
escolhas e analisando sua pertinência e sua validade. Nessa perspectiva, cada
cálculo é um problema novo e o caminho a ser seguido é próprio de cada aluno, o
que faz com que para uns possa ser mais simples e, para outros, mais complexo.

O fato é que, estratégias de cálculo construídas a partir dos conhecimentos


que já fazem parte da bagagem dos alunos e a partir das relações sobre os números
e operações que os envolvem, costumam ser mais rápidas e eficientes para quem
as utiliza.

Estratégias como essas não surgem do nada. Precisam ser trabalhadas em sala de aula.

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Dentre os procedimentos possíveis de serem estimulados e propostos pelos


professores sugerimos alguns que descreveremos a seguir.

2.3.1 Contagem

A contagem é um procedimento natural e bastante útil na resolução de


cálculos pelas crianças. Alguns procedimentos que auxiliam no desenvolvimento de
estratégias de cálculo são: contar para frente; contar para trás; contar de 2 em 2, 3
em 3, 5 em 5, 10 em 10; contar a partir de um determinado número.

Jogos de percurso em que as crianças avançam e retrocedem casas são um


excelente recurso para desenvolvimento do raciocínio aditivo e também de
estratégias de contagem. O jogo de percurso “Coelhinho procurando a toca” tem o
objetivo de propor a contagem de 2 em 2. O mesmo jogo pode ser adaptado para
trabalhar a contagem de 3 em 3 ou outros intervalos.

Coelhinho procurando a toca

Objetivo do jogo: Contagem de 2 em 2

Materiais:

 1 tabuleiro;

 1 dado com três faces azuis e com três faces vermelhas, contendo apenas o •
número 2 nas faces;

 3 peões (coelhinhos).

Número de jogadores: 3 jogadores

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Regras do jogo: Os jogadores deverão “ajudar” o coelhinho a encontrar sua toca


saltando sobre as casinhas do tabuleiro. O jogador poderá “sair” da toca inicial
somente quando cair uma face azul no dado. Caso contrário, nela permanecerá até
que isso ocorra. Se cair uma face azul avança duas casas. Se cair uma face
vermelha volta duas casas. Ganha o jogo o jogador que conseguir chegar primeiro à
última casa (onde está a toca).

O mesmo jogo pode ser jogado com outro dado: 3, 3, 3 azul e 3, 3, 3


vermelho, explorando a contagem de 3 em 3.

Problematizando situações após o jogo:

João estava na casinha 4. Quantas vezes Mário terá que jogar o dado e que
cores têm que cair para que ele possa chegar na casinha 20 o mais rápido possível?
Vá preenchendo as casinhas pelas quais o coelhinho deverá passar.

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Caio teve muita sorte! Em todas as rodadas do jogo sorteou nos dados: 2
azul, o que lhe permitiu avançar sempre e ganhar o jogo. Escreva as casas pelas
quais Caio passou para chegar à toca do coelhinho.

2.3.2 Recurso à propriedade comutativa

A propriedade comutativa da adição e da multiplicação é um recurso


importante para o cálculo, uma vez que facilita a memorização e também a
realização dos cálculos.

A propriedade comutativa da multiplicação é definida por “a x b = b x a”, ou seja, a ordem dos fatores não altera o
produto. É válida para qualquer número natural. Por exemplo, 3 x 4 = 4 x 3.

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É importante chamar a atenção para o fato de que a propriedade comutativa é uma


propriedade da adição e da multiplicação, mas que nem sempre se aplica à
situação-problema nelas envolvida.

Será que ao mudar a ordem dos fatores, a situação-problema continua sendo


a mesma? Veja um exemplo:

 Um professor trabalha 4 horas por dia, de segunda-feira à sexta-feira. •


Quantas horas ele trabalha nesse período da semana?

O problema pode ser resolvido pelo cálculo 5 x 4 = 20, considerando 4 + 4 +


4+ 4 + 4 = 20, uma vez que o professor trabalha 4 horas durante 5 dias da semana,
totalizando 20 horas semanais. Mas, qual seria a situação para esse professor se a
representação fosse 4 x 5 = ?

A quantidade de horas trabalhadas na semana é a mesma do problema


anterior? E a quantidade de horas trabalhadas por dia? E a quantidade de dias
trabalhados por semana? Nessa situação, apesar de o total de horas trabalhadas
por semana ser a mesma da primeira situação, 20 horas, nesse último caso, o
professor trabalharia 5 horas por dia ao invés de 4 horas e somente 4 dias na
semana ao invés de 5 dias: 5 + 5 + 5 + 5 = 20

No caso da adição, ocorre algo semelhante. Veja o exemplo:

 Júlia foi fazer compras para a sua mãe. Na padaria comprou pão e • leite,
e gastou R$ 6,50 e no açougue comprou um quilo de carne e gastou R$
13,30. Quanto Júlia gastou ao todo?

O problema pode ser resolvido pelo cálculo: 6,50 + 13,30 = 19,80, onde a
primeira parcela corresponde ao que Júlia gastou na padaria e a segunda ao que
Júlia gastou no açougue. Podemos afirmar que alterando as parcelas 13,30 + 6,50 =
19,80 obteríamos o mesmo resultado, o que não está incorreto se pensarmos
apenas nos números envolvidos no problema. Mas, e se Júlia tiver que prestar
contas dos gastos à sua mãe? Alterar as parcelas poderia dificultar a explicitação do
valor correspondente a cada gasto.

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2.3.3 Memorização de fatos numéricos

Quando falamos em memorização como recurso aos cálculos mentais, logo


vem à mente a questão da tabuada: decorar ou não decorar? Há várias críticas, com
as quais concordamos, ao ensino da tabuada de modo mecânico e memorístico e ao
entendimento dessa abordagem como forma de ensino da multiplicação. Como já
comentado, aprender multiplicação requer muito mais do que memorizar as
tabuadas.

Por outro lado, há aqueles que, como nós, reconhecem na tabuada uma
maneira de agilizar processos de cálculos a partir da memorização de resultados da
multiplicação entre os fatores. No entanto, entendemos que essa memorização deva
ser consequência da adoção de estratégias metodológicas que permitam a
construção/estruturação de regularidades entre os fatos numéricos e a memorização
dos mesmos por caminhos diferentes da “decoreba” destituída de significado, muitas
vezes presentes nas salas de aula1.Observe um depoimento sobre a questão da
memorização de fatos e a tabuada.

1
A esse respeito, veja Spinillo e Magina (2004).
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Outro olhar sobre a tabuada

Construa a tabuada do 3. O que encontra de curioso nesta tabuada? Prolongue-a calculando 11 x 3, 12 x 3, 13 x


3 ... e formule algumas conjecturas. (PONTE et al., 2005, p. 64)

Além das sugestões apresentadas pela professora Marina sobre as


estratégias para o trabalho com a tabuada, Ponte et al. (2005), propõe o trabalho
com os fatos numéricos da multiplicação pelo desenvolvimento de atividades
investigativas, nas quais os alunos são convidados a analisar padrões e
regularidades existentes nas operações, por exemplo a seguinte:
Atividades como essa, tanto em relação à multiplicação como em relação à
adição, contribuem para a construção de recursos cognitivos que auxiliam a
memorização, pois as crianças têm a oportunidade de estabelecer relações entre os
fatos e perceber regularidades por processos investigativos.

Outra sugestão é proposta por Pires (2013) para a construção de Fatos


Básicos da Multiplicação por meio da elaboração coletiva e gradativa da “Tábua de
Pitágoras”. A autora explica que se
trata de uma “tabela de dupla
entrada na qual são registrados os
resultados da multiplicação dos
números que ocupam a linha e a
coluna principais” (p. 148). A
atividade volta-se para a
possibilidade de exploração das
regularidades que aparecem na
construção da Tábua. É uma
proposta bastante semelhante a
apresentada por Van de Walle
(2009, p. 203).

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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Pires (2013, p. 148-156) propõe que a construção da “Tábua de Pitágoras”


seja feita de forma gradativa e iniciada com o preenchimento da primeira linha e da
primeira coluna, após a discussão sobre como a atividade deve ser realizada. Este
diálogo visa a problematizar situações para que os alunos percebam regularidades
tais como:

 1 x 3 tem o mesmo resultado de 3 x 1, embora representem situações


distintas, conforme já comentado (propriedade comutativa);

 quando um dos fatores é ”1”, o resultado da multiplicação é igual ao outro •


fator (elemento neutro);

 o preenchimento da segunda linha e coluna se constitui no dobro dos •


resultados da primeira linha e coluna. O mesmo acontece com a quarta linha
e coluna em relação à segunda e com a oitava linha e coluna em relação à
quarta.

Outras regularidades são observáveis, tais como as relações entre as


tabuadas do 3, 6 e 9 e ao fato de que os resultados da tabuada do 5 terminam em 5
ou 0.

Entretanto, esta não deve ser a única alternativa para o trabalho com o
estudo dos fatos fundamentais da multiplicação. O professor pode se valer de jogos
como recursos também para a memorização de fatos numéricos da multiplicação.
Um exemplo é o jogo adaptado de Kamii e Livingston (1995, p. 177) e as
problematizações propostas por Agranionih e Smaniotto (1999).

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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Problematizando situações do jogo:

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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2.3.4 Dobros e metades

Dobros e metades são fáceis de memorizar e podem ser um recurso bastante


interessante para o cálculo mental. O reagrupamento em torno de um dobro pela
decomposição de uma das parcelas e o apoio da propriedade associativa da adição
permitem relacionar os números de modo a facilitar o cálculo.

A propriedade associativa da adição é definida por (a + b) + c = a + (b + c), ou seja, o resultado não altera quando são
associadas parcelas diferentes. É válida para qualquer número natural. Por exemplo: (3 + 7) + 2 = 3 + (7 + 2)

Exemplos:

a) 7 + 8 = 7 + (7+ 1) = Observe que o 8

(7 + 7) + 1 = 15 foi decomposto

14 + 1 = 15 de modo a obter 7.

b) 7 + 14 = 7 + (7 + 7) = 21 ou 3 x 7 = 21

c) 14 – 6 = (7 + 7) – 6 =

7 + (7 – 6) =

7+1=8

Estes procedimentos podem ser trabalhados em sala de aula a partir de


atividades investigativas como a que segue:

Veja como Rui resolveu os cálculos abaixo:


4+5=4+4+1=9
8 + 9 = 8 + 8 + 1 = 17
7 + 8 = 7 + 7 + 1 = 15

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Rui falou que desse jeito é mais fácil de encontrar o resultado.


Explique o jeito de Rui fazer os cálculos: ______________________________.
Você concorda com Rui? __________________________________________.
Por quê?_______________________________________________________.

Jogos são excelentes recursos para a memorização de dobros e metades e


dão suporte à construção de estratégias, por exemplo, como ocorre no jogo “Dobros
e Metades”.

Dobros e metades metades

Materiais:

 2 baralhos de números pares com cartas do 2 ao 20;

 1 dado com as seguintes faces: dobro, metade, dobro, metade, dobro, metade;

 Objetos para contagem: fichas ou palitos.

Número de jogadores: 4

Regras do jogo:

Colocar as cartas do baralho sobre a mesa, embaralhadas, com a face virada para baixo. Distribuir as
cartas do outro baralho entre os 4 jogadores. O primeiro jogador vira a primeira carta do monte e
joga o dado. Se a carta for 4 e no dado cair metade, deverá procurar entre as suas cartas se tem o 2.
Caso tenha, junta o quatro da mesa formando um par e o coloca ao lado para posterior contagem
de pontos. Caso não tenha, passa a vez ao próximo jogador que deverá proceder do mesmo modo,
ou seja, procurar entre suas cartas o 2, se tiver como, forma o par e se não tiver passa a vez, caso
não seja possível formar o par (por exemplo, ao virar a carta do monte saiu 20 e o dado caiu como
dobro), o próximo jogador joga o dado novamente. Sempre que um dos jogadores formar um par, o
próximo deverá virar mais uma carta do baralho que está sobre a mesa.

Problematizando situações após o jogo

Marta tem em sua mão as cartas: 4, 10, 12. Com quais cartas poderá formar par se no dado cair
“dobro”?
Juca virou a carta 20. O que terá que cair no dado para que possa formar par com algumas de suas
cartas? Por quê?

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Quais cartas fariam par nas jogadas a seguir:

Carta com 2
Carta com 4
Carta com 6
Carta com 8
Carta com 10

Quais cartas fariam par nas jogadas abaixo?

Carta com 20
Carta com 18
Carta com 16
Carta com 10
Carta com 8
Carta com 4

Reagrupar em dezenas ou centenas

Vejam alguns exemplos do uso deste procedimento na resolução das


operações.

Na resolução abaixo observamos que o aluno decompôs os números em


dezenas e unidades, subtraindo as dezenas e as unidades separadamente e
somando os resultados.

Já na segunda resolução decompôs o 12 em 10 + 2, subtraindo inicialmente o


10 de 34 e por fim subtraindo o 2 do 24 restante.

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Já na última resolução não usou a decomposição em dezenas e unidades,


mas a adição e um esquema de complementar quantos faltam para a dezena mais
próxima, no caso 20 e depois, complementar quantos faltam para 34.

Estas estratégias podem ser trabalhadas também a partir de atividades


investigativas que chamem a atenção para a possibilidade de serem utilizadas no
cálculo, como abaixo:

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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Como já salientamos, é fundamental que o professor proporcione às crianças


oportunidades de desenvolver estratégias de cálculo a partir da coordenação dos
conhecimentos que já possuem sobre as operações e sobre o sistema de
numeração decimal. Um modo bastante interessante de fazer isso é propor
atividades que permitam às crianças estabelecer relações e/ou encontrar
regularidades entre os números envolvidos que possam ser úteis ao cálculo, desde
as mais elementares às mais complexas.

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2.4 Algoritmos Tradicionais

Ettiene Cordeiro Guerios


Neila Tonin Agranionih
Tania Teresinha Bruns Zimer

A expressão “fazer contas” faz parte do cotidiano escolar. Até o momento


mostramos que o “fazer contas” pode ser realizado de diferentes maneiras. O
algoritmo tradicional é uma dessas maneiras e é sobre ele que trataremos a seguir.

O algoritmo tradicional das operações permite realizar cálculos de uma


maneira ágil e sintética principalmente quando envolve números altos. Possibilita,
também, ampliar a compreensão sobre o Sistema de Numeração Decimal (SND).

Primeiramente trataremos das conhecidas “conta de mais” e “conta de


menos”. São modos de representar os processos operativos da adição e da
subtração pautados nas propriedades do SND. É importante que a criança tenha se
apropriado das características do SND para que
compreenda os processos sequenciais dos
algoritmos.

O material dourado, o ábaco e o Quadro


Valor Lugar (QVL), são recursos que podem ser
utilizados, para favorecer a compreensão dos
algoritmos tradicionais.

O QVL já é conhecido e foi explorado no Caderno


anterior. O ábaco é considerado, historicamente, como
o precursor da calculadora e conhecido como a
primeira máquina de calcular construída pelo homem.
Há diferentes modelos de ábaco, todos eles com o
mesmo princípio constitutivo do SND que permite o

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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trabalho centrado no valor posicional do número. Por razões didáticas, para o ciclo
de alfabetização, sugerimos atividades com o ábaco aberto e apenas até a ordem
das unidades de milhar. Isto porque, a ideia é que depois disso, o algoritmo já esteja
consolidado, não sendo mais necessário o uso de materiais manipuláveis.

O material dourado é formado por cubinhos, barras, placas e cubo, em que


uma barra é formada por 10 cubinhos, uma placa é formada por 10 barras e um
cubo é formado por 10 placas. A principal contribuição desse consiste na
possibilidade de explorar propriedades do SND, tais como: a base 10, a composição
aditiva e multiplicativa, explorar trocas e composição/decomposição de números em
unidades, dezenas e centenas. É importante salientar que o valor posicional do
número não é tratado de forma explicita neste recurso como o é no QVL e no ábaco.

Vejamos alguns exemplos de como podemos trabalhar os algoritmos


tradicionais com o material dourado e com o ábaco, tendo como base o trabalho
sugerido com agrupamentos em base dez e o Quadro Valor de Lugar no caderno
anterior a este.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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Inicialmente sugerimos que as crianças joguem o Jogo “Nunca Dez” utilizando


as peças do Material Dourado. Deste modo, se familiarizarão com as trocas e
destrocas possíveis:

 10 cubinhos por 1 barra (dez unidades por uma dezena); 10 barras por 1 •
placa (dez dezenas por uma centena).

 1 placa por 10 barras (uma centena por dez dezenas); 1 barra por 10
cubinhos (uma dezena por dez unidades).

Também sugerimos que realizem o mesmo jogo com o Ábaco. Nesse caso,
as trocas e destrocas assumirão características diferentes, uma vez que unidades,
dezenas e centenas são determinadas pela posição que ocupam no ábaco:

 10 argolas na casa das unidades por 1 argola na casa das dezenas; 10


argolas na casa das dezenas por 1 argola na casa das centenas.

 1 argola na casa das centenas por 10 argolas na casa das dezenas; 1 argola
na casa das dezenas por 10 na casa das unidades.

É importante que os alunos representem diferentes números no ábaco antes


de iniciarem o trabalho com cálculos para que o processo se torne mais ágil. Isto
porque a tendência inicial é que ao representar 25 unidades no ábaco, por exemplo,
o façam colocando 25 unidades na casa das unidades. Em alguns ábacos, a
impossibilidade de que as 25 argolas caibam no pino correspondente à casa das
unidades gera a necessidade de o aluno encontrar uma alternativa para solucionar o
impasse. É importante neste momento, que o professor desafie os alunos a
representarem diretamente no ábaco as 2 dezenas que compõem o número
colocando diretamente 2 argolas na casa das dezenas e 5 argolas na casa das
unidades. Para isso poderão retomar o processo do jogo “Nunca Dez”, discutindo as
diferentes possibilidades de trocas.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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2.4.1 Adição sem agrupamento ou reserva

A adição sem agrupamento é aquela que não exige o “vai um” 2, como na
adição abaixo:

A adição não envolve agrupamento. Para realizar 24 + 15 = inicialmente as


crianças podem separar 24 cubinhos e 15 cubinhos, juntá-los e contar todos,
verificando a soma, tendo a contagem simples como apoio, conforme estratégias já
discutidas sobre a resolução de
problemas aditivos. Esta ação é
bastante comum no início do
trabalho com material dourado
ou ábaco. Nesse caso, o
trabalho do professor consiste
em desafiar a criança a pensar em 24 como 2 grupos de dez mais 4 unidades e em
15 como 1 grupo de dez mais 5 unidades. Isto pode ser feito pelo desafio às trocas
ou à representação direta do número com o material dourado: 24 cubinhos podem
ser trocados por 2 barras e 4 cubinhos. Já 15 pode ser trocado por 1 barra e 5
cubinhos.

Usando o algoritmo tradicional da adição, iniciamos pela casa das unidades,


somando os valores correspondentes. Com o apoio do material dourado, juntamos
os 4 cubinhos (unidades) correspondentes à primeira parcela e os 5 cubinhos
(unidades) correspondentes à
segunda, obtendo 9 cubinhos.
Representamos este valor colocando
o algarismo 9 na casa das unidades.

2
De fato, nunca “vai um”. Como veremos mais adiante “vai uma dezena”, “vai uma centena”, “vai um
milhar” e assim por diante.
Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:
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No caso, não houve necessidade de fazer trocas de unidades por dezenas,


pois não formou uma dezena. A seguir juntamos 2 barras (dezenas)
correspondentes à primeira parcela e 1 barra (dezena) correspondente à segunda
parcela, obtendo 3 barras (dezenas). Representamos este valor com o algarismo 3
na casa das dezenas.

Com o apoio do ábaco, o cálculo é realizado da seguinte forma:


representamos o 24 no ábaco, colocando 2 argolas na casa das dezenas e 4 argolas
na casa das unidades. No quadro ou em um papel registramos esses valores no
formato da conta tradicional, identificando unidades e dezenas.

A seguir acrescentamos no mesmo ábaco, 1 argola na casa das dezenas e 5


argolas na casa das unidades, uma vez que se trata de uma ação de juntar.
Registramos na conta, cada quantidade de argolas nas respectivas casas. A seguir,
contamos quantas argolas há na casa das unidades (9) e registramos na conta e
quantas argolas há na casa das dezenas e registramos na conta (3), concluindo que
a soma é 39.

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2.4.2 Subtração sem desagrupamento

Trata-se de uma subtração em que não se requer desagrupar3 3 um número


em uma ordem superior e colocá-lo na ordem imediatamente inferior, por exemplo,
trocar uma dezena por 10 unidades para realizar o cálculo. Abaixo uma subtração
sem desagrupamento:

Para resolvê-la com o auxílio do material dourado, inicialmente, buscamos as


peças que representam o 35, ou seja, 3 barras (dezenas) e 5 cubinhos (unidades).

Novamente, lembramos que no início a


criança poderá pegar 35 cubinhos, sendo
necessário desafiar as crianças a realizar as
trocas das unidades pelas dezenas, uma vez que
em 35 temos 10 + 10 + 10 + 5, ou seja, 3
dezenas e 5 unidades.

Dos 35 cubinhos estão sendo subtraídos 11. Como no algoritmo da subtração


iniciamos pela unidade, retiramos 1 cubinho (unidade) das 5 que tínhamos, ficando
com 4 cubinhos (unidades).

3
É comum dizer “pegar emprestado” para sinalizar o desagrupamento. No entanto, esta expressão é
inadequada, pois, de fato, o que houve foi um desagrupamento. Não houve empréstimo, porque não
haverá devolução.
Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:
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A seguir subtraímos as dezenas. Então, retiramos 1 barra das 3 que tínhamos


inicialmente, ficando com 2. Representamos o valor obtido na conta: tínhamos 3
dezenas, subtraímos 1, ficando com 2 dezenas.

Com o ábaco é possível fazer esse cálculo do seguinte modo: inicialmente


colocamos no ábaco o número de argolas correspondentes às unidades e dezenas
de 35, ou seja, 3 dezenas e 5 unidades representando-as nos lugares
correspondentes na conta.

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A seguir, retiramos do ábaco, iniciando pela casa das unidades, 1 argola da


casa das unidades, ou seja, 1 unidade, registrando a ação realizada na conta:

Posteriormente, retiramos 1 argola da casa das dezenas, ou seja, 1 dezena,


registrando a ação realizada na conta, concluindo que o resultado é 24.

2.4.3 Adição com agrupamento ou reserva

Nesse caso temos um cálculo de adição com reserva, como a seguir:

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Inicialmente, com o material dourado, separamos as peças equivalentes à


primeira parcela, ou seja, 2 barras e 5 cubinhos, isto é, 2 dezenas e 5 unidades.

A seguir separamos as peças equivalentes à segunda parcela: 1 barra (1


dezena) e 6 cubinhos (6 unidades), juntando-as às separadas anteriormente.
Acrescentamos a segunda parcela:

Verificamos que ao todo temos 11 cubinhos, o que equivale a 10 + 1, ou seja,


1 dezena mais 1 unidade.

Como operamos em um sistema de numeração de


base dez, temos que trocar 10 cubinhos por 1 barra, ou
seja, 10 unidades por 1 dezena, restando, após a troca, 1
cubinho que equivale a 1 unidade. Aqui temos o que
conhecemos como o “vai um”, ou seja, “vai uma” dezena
para a casa das dezenas, uma vez que fizemos a troca de
10 unidades por 1 dezena.

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Como representamos esse movimento no algoritmo? A compreensão do


valor posicional do número é muito importante neste momento, ou seja, a
compreensão de que o algarismo 1 na “casa” das dezenas tem um valor equivalente
a dez unidades.

Se não fosse o movimento do “vai” uma dezena para a casa da dezena,


teríamos a seguinte configuração no cálculo, o que não estaria de acordo com o
algoritmo:

Portanto, a representação fica da seguinte forma:

Com o ábaco, inicialmente representamos a primeira parcela do cálculo (25)


colocando 2 argolas na casa das dezenas e 5 argolas na casa das unidades.
Representamos este valor na conta.

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A seguir, juntamos a segunda parcela: 1 argola na casa das dezenas e 6 na


casa das unidades, representando o acréscimo na conta.

Contando a quantidade de argolas da casa das unidades verificamos que


obtemos 11.

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Então, como 11 = 10 + 1, ou seja, 1 dezena + 1 unidade, temos que proceder


a troca de 10 argolas que estão na casa das unidades por 1 argola na casa das
dezenas.

Finalmente, contamos as argolas na casa das dezenas obtendo 4 dezenas.


Representamos esse valor na conta, finalizando o cálculo.

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2.4.4 Subtração com desagrupamento

Trata-se de contas de subtração em que necessitamos fazer trocas entre


dezenas por unidades ou centenas por dezenas, milhares por centenas e assim
sucessivamente para realizarmos a conta. Exemplo de troca de dezena por
unidades:

Inicialmente pegamos 2 barras (dezenas) e 6 cubinhos (unidades) do material


dourado.

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Precisamos subtrair de 26, 1 barra (dezena) e 8 cubinhos (unidades).

Conforme o algoritmo, iniciamos a subtração pela casa das unidades, então,


devemos subtrair 8 cubinhos. De imediato é possível percebermos que para fazê-lo,
precisamos de uma estratégia, uma vez que temos, somente, 6 cubinhos. Tal
estratégia consiste em trocar dezenas por unidades. Trocamos, então, 1 barra (1
dezena) por 10 cubinhos ( unidades), ficando com 1 barra e 16 cubinhos.

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Como representar este movimento na conta?

Finalizamos o cálculo subtraindo 8 cubinhos dos 16 e 1 barra daquela que


restou da troca. No cálculo, isto equivale a subtrair 8 unidades da casa das unidades
e 1 dezena da casa das dezenas. O resultado do cálculo é 8 unidades.

No ábaco, inicialmente, representamos a quantidade inicial 26, colocando 2


argolas na casa das dezenas e 6 na casa das unidades.

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A seguir, começamos o cálculo pela casa das unidades. Precisamos subtrair


8 argolas das unidades, mas temos 6. Trocamos, então, uma argola da casa das
dezenas por 10 argolas, colocando-as na casa das unidades, uma vez que 1 dezena
equivale a dez unidades. Ficamos então com 16 argolas na casa das unidades, o
que nos permite subtrair 8.

Iniciando a subtração pela casa das unidades, de 16 subtraímos 8 e ficamos


com 8 unidades. Após, subtraímos 1 dezena da casa das dezenas, não restando,
portanto, nenhuma dezena.

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2.5 As Operações, as Práticas Sociais e a Calculadora

Emerson Rolkouski

O objetivo principal desse caderno foi o de abordar com um nível adequado


de profundidade questões relacionadas aos campos aditivo e multiplicativo e isso foi
feito tendo como foco a prática social do professor, que em seu cotidiano terá que
lidar com as dificuldades de aprendizagem, além de se preocupar em inserir estas
práticas no universo mais amplo das práticas sociais dos seus alunos.

Na leitura de um jornal, de uma revista, de um livro de literatura, ao assistir


um vídeo, o professor deve estar atento à matemática que ali está presente,
podendo lançar problemas aos seus alunos, fazendo com que a alfabetização
matemática faça sentido às crianças.

Para que aprendizagem se torne ainda mais interessante, o mundo da criança


precisa ser respeitado, de forma que a seleção das fontes deve ser cuidadosa.
Como um dos exemplos citamos o site da revista Ciência Hoje das Crianças. Leia a
seguir o extrato de uma reportagem sobre as minhocas e como podemos explorá-lo
para o trabalho com as medidas e com os campos conceituais aditivo e
multiplicativo.

As maiores minhocas do Brasil

Pescar era uma das nossas diversões quando eu e meus primos visitávamos
a fazenda de meus avós nas férias. Com varas de bambu e uma lata cheia de
minhocas em mãos, seguíamos em direção a um pequeno córrego onde
passávamos algumas horas testando a paciência em busca de alguns peixinhos, até
que a última isca fosse para o anzol.

Nem os especialistas sabem ao certo como surgiu a palavra “minhoca”. Uma


das possibilidades é que seja uma modificação de “nyoka” ou “nhoka”, que, na
língua Quimbundo – falada por muitos escravos africanos que foram trazidos para o
Brasil –, significa “cobra”. A única certeza é que “açu” ou “uçu” quer dizer “grande”
Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:
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em tupi, e, portanto, minhocuçu significa “minhoca grande”. Em inglês, fica mais


fácil: as minhocas são chamadas de “earthworm”, cujo significado é “verme da terra”.

As minhocas que
usávamos não mediam
mais que nossa mão.
Naquela época, eu nem
imaginava que pudessem
existir algumas espécies
mais compridas que minha
perna e da espessura de
um dedão – os minhocuçus!

São conhecidas no
Brasil mais de 50 espécies
de minhocuçus, a maioria medindo entre 30 e 50 centímetros de comprimento. A
mais famosa delas é Rhinodrilus alatus. Desde muito tempo, a população das áreas
onde essa espécie ocorre sabia de sua existência, mas foi só em 1971 que ela foi
reconhecida por um especialista e ganhou seu nome científico.

Revista Ciência Hoje das Crianças. Disponível em:


<http://chc.cienciahoje.uol.com.br/as-maiores-minhocas-do-brasil/>. Acesso em: 14
de fevereiro de 2014.

Além do trabalho interdisciplinar que pode ser efetivado com Ciências,


observa-se que há algumas informações numéricas que podem ser exploradas.

Depois de ler e discutir sobre o que diz a reportagem, o professor poderá


lançar perguntas como:

– Uma minhoca de 50 cm mede quantos centímetros a mais que sua perna?

– Quantas minhocas de 30 cm, dispostas uma depois da outra, seriam


necessárias para dar a sua altura?

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


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Pode-se perceber que reportagens como essa, além de tratarem de um


assunto que, de modo geral, atrai as crianças, suscita uma série de perguntas.

Na leitura de jornais, por exemplo, há uma série de informações numéricas


que podem ser problematizadas, por exemplo, em outubro de 2013, a Folhinha
(seção do jornal a Folha de São Paulo para as crianças), para comemorar seus 50
anos, fez uma série de reportagens sobre antigas manchetes, como a que se pode
conferir a seguir:

Com apenas 5 anos de idade, menina já domava elefantes

Com apenas 5 anos, Kitty já domava elefantes. Por lidar com animais maiores
do que ela, a menina apareceu em uma reportagem da “Folhinha” de outubro de
1973.

A profissão de domador de animais exige não só muita coragem, mas


também paciência e amor aos bichos.

O animal é treinado a ouvir uma pessoa – geralmente um adulto – e, depois


de muitos ensaios, começa a obedecer ordens em troca de alguma recompensa.

Quer saber como Kitty conseguiu domar os elefantes? Leia a íntegra da


matéria de 1973.

Fonte: Folha de São Paulo. Disponível em:


<http://www1.folha.uol.com.br/folhinha/2013/10/1351217-com-apenas-5-anos-de-
idademenina-ja-domava-elefantes.shtml>. Acesso em: dez. 2013.

Perguntas como, quantos anos a Kitty tinha a menos que você, quando
domava elefantes? Quanto um elefante é maior que o seu professor? Pode disparar
interessantes discussões em sala de aula.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


104
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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Uma outra possibilidade é a problematização de situações reais de sala de


aula. Por exemplo, a tabela a seguir foi construída tendo como ponto de partida
dados coletados por crianças que diziam respeito à quantidade de sorvetes que
conseguiram vender em uma gincana. A professora retirou alguns valores, cabendo
aos alunos a tarefa de completá-los com números que podiam ser colados. As
hipóteses de soluções eram discutidas:

Tabelas como a apresentada e gráficos simples podem sugerir uma grande


variedade de situações-problema, assim como constituem-se como importantes
formas de representação, como é discutido no Caderno 7 sobre Educação
Estatística.

Além dessas possibilidades, os livros de literatura do PNBE trazem uma


grande variedade de títulos, que, de forma intencional trabalham com as operações
e têm sido apresentados nos diversos cadernos que compõem este material de

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


105
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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formação, durante os relatos de experiência, nas atividades do “Compartilhando” e


nas “Sugestões de atividades para os encontros em grupos”.

Dependendo do objetivo da atividade proposta, poderá ou não ser solicitado o


uso da calculadora. É importante enfatizar que o que está em jogo não é o uso ou o
não uso dessa tecnologia, mas sim, quando utilizá-la.

Em situações reais, em que os números são muito grandes ou muito


pequenos, a utilização da calculadora é recomendada. Isso porquê, o que está em
jogo é a resolução da situação-problema real e não o uso de algoritmos. Por
exemplo, caso precisemos saber com exatidão, quantos litros de gasolina
conseguiremos comprar com R$ 50,00, certamente utilizaremos uma calculadora,
pois a operação a ser realizada seria muito trabalhosa para ser efetivada a mão.

No ciclo de alfabetização, uma série de atividades com a calculadora podem


ser realizadas para construir e/ou sistematizar fatos importantes das operações, ou
mesmo para disparar problemas.

Por exemplo, ao solicitar às crianças que encontrem o resultado de 4 x 5 sem


utilizar a tecla x, esperamos que o aluno execute 5 + 5 + 5 + 5, enfatizando a
multiplicação adições de parcelas iguais.

Em outro momento, podemos pedir que façam 20 ÷ 4, sem utilizar a tecla ÷,


esperando que o aluno perceba que deve encontrar a quantidade de vezes que o 4
cabe em 20, o que pode ser realizado com sucessivas subtrações.

Em outra direção, poderemos elaborar problemas que podem ser explorados


com o uso da calculadora e que abordam, de forma mais abstrata os conceitos
presentes nesse caderno:

Apertei a tecla 8, depois a tecla +, teclei ainda um outro número, o sinal de =


e obtive 14. Que número apertei?

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


106
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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Com vistas a ampliar a memorização de fatos básicos ampliando a


capacidade de cálculo mental, pode-se solicitar às crianças que construam várias
possibilidades de se obter a soma 10, ou 100 ou 1000, e assim por diante.

Esse texto teve como principal objetivo mostrar algumas possibilidades


pedagógicas que favorecem a construção de uma sala de aula com maior sentido
para as crianças.

Operações fundamentais - II: Diferentes tipos de problemas envolvendo o campo multiplicativo:


107
raciocínio combinatório e multiplicação retangular.
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3
Espaço e Forma: o
desenvolvimento do
pensamento geométrico
Mauro Carlos Romanatto

Licenciatura em Pedagogia
1 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico

ROMANATTO, Mauro Carlos. A matemática na formação de professores dos


anos iniciais:um olhar para além da aritmética / Mauro Carlos Romanatto, Cármen
Lúcia Brancaglion Passos. -- São Carlos : EdUFSCar, 2011. 107 p. -- (Coleção UAB-
UFSCar)

3.1 Primeiras palavras

Desde o início da escolarização, o conhecimento geométrico deve estar


presente. Isso significa possibilitar à criança maior convívio com ideias e aspectos
da Geometria relacionados com o seu dia a dia, favorecendo o processo de
elaboração desse conhecimento. Paulatinamente, a criança, desde a Educação
Infantil, vai conseguindo maior coordenação de suas atividades no espaço, podendo
pegar um objeto que deixou cair, reiniciar uma atividade interrompida, antecipar o
deslocamento de um objeto móvel oculto (por exemplo, quando um carrinho se
desloca por detrás de uma cortina, a criança acompanha seu movimento e sabe

108 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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onde o carrinho aparecerá) ou mesmo diferenciar os objetos que estão ao seu


alcance daqueles que não estão.

Compreende-se que a construção do espaço e dos conceitos geométricos


implica em um processo gradual de elaborações e reelaborações do sujeito.

Apenas a exposição oral e as explicações do professor não seriam


suficientes para a aquisição do conhecimento geométrico. O senso comum pode
levar o professor a imaginar que a visão dos objetos e a sua manipulação são
recursos suficientes para que o estudante aprenda Geometria. Mas isso não é tão
simples. Discutiremos essas questões ao longo desta unidade.

3.2 Problematizando o tema

Apenas a exposição oral e as explicações do professor não seriam suficientes


para a aquisição do conhecimento geométrico. O senso comum pode levar o
professor a imaginar que a visão dos objetos e a sua manipulação são recursos
suficientes para que o estudante aprenda Geometria. Mas isso não é tão simples.
Discutiremos essas questões ao longo desta unidade.

Melhor que o estudo do espaço, a geometria é a investigação do


‘espaço Intelectual’, já que, embora comece com a visão, ela caminha
em direção ao pensamento, indo do que pode ser percebido para o
que pode ser concebido.
Wheeler. Imagem e pensamento geométrico.

A Geometria se constitui em um campo de conhecimento muito importante


para a descrição e a inter-relação do homem com o espaço em que vive, podendo
ser considerada como a parte da Matemática mais intuitiva, concreta e ligada com a
realidade, sendo, portanto, fundamental na formação dos estudantes.
As experiências geométricas se apresentam de forma espontânea para
crianças em atividades de exploração de objetos e do espaço físico em que se
desenvolvem. As relações e as ideias geométricas são úteis em situações diárias,

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 109


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podendo ser relacionadas com outros tópicos da Matemática e com outras áreas do
conhecimento. Entretanto, quando a criança ingressa na escola, comumente não lhe
são oferecidas oportunidades para desenvolver ideias geométricas que aproveitem o
potencial que ela traz consigo. Por que isso ocorre?
Entre os matemáticos e educadores em geral, muitas discussões têm sido
feitas a respeito da forma com que o ensino da Geometria deveria ser introduzido às
crianças.
Existe certo consenso que este ensino deveria ter início logo que a criança
ingressa na escola; há, entretanto, divergências em relação aos conteúdos e aos
métodos de ensino. O que deve ser ensinado de Geometria na Educação Infantil?
Que conteúdos precisam ser desenvolvidos nos anos iniciais? Entre as razões para
essas divergências estaria a multiplicidade de aspectos relativos ao seu conteúdo e
sua inerente complexidade. Portanto, não é simples definir um único caminho, linear,
hierárquico, desde os seus princípios elementares até as abstrações e
formalizações.

3.3 Primeiras considerações sobre a Geometria

O conhecimento dos estudantes sobre Geometria nem sempre decorre da


escola. Para os gregos da Antiguidade, Matemática traduzia-se pela Geometria. Na
filosofia grega, defendia-se a crença milenar de que a Geometria era inerente à
natureza e não parte do arcabouço que o indivíduo lançaria mão para descrevê-la. A
Geometria situava-se no topo de todas as atividades intelectuais. Essa visão
exerceu influência decisiva sobre a ciência e a filosofia ocidentais. Ao contrário, a
filosofia oriental sempre sustentou que as noções de espaço e tempo são
elaborações da mente e, dessa forma, a Geometria jamais atingiu, no Oriente, status
semelhante ao da Grécia. Essa atitude filosófica advertia que nossas noções de
Geometria não são propriedades absolutas e imutáveis da natureza, mas sim
construções intelectuais.
Assim, a Geometria lida com relações entre objetos reais e objetos teóricos.
Sua origem está em trabalhos práticos reais (resolução de problemas) e, ao mesmo
tempo, em teorias abstratas.

110 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Como já dito, a manipulação dos objetos por si só não é recurso suficiente


para o aprendizado de Geometria. Podem ocorrer equívocos conceituais quando
figuras geométricas são identificadas apenas com base em sua representação
gráfica.
Estudos têm revelado esses equívocos conceituais por parte de professores
quando os objetivos são definidos a partir apenas da percepção visual que eles têm
das figuras. Um exemplo disso seria classificar um polígono não convexo, conforme
o que aparece representado na Figura 1, com as mesmas propriedades do triângulo.
A justificativa apresentada foi: “é um triângulo, uma figura com três lados porque tem
três pontas”.

Figura 1: Polígono não convexo

Esse exemplo de equívoco evidencia que o aspecto figural prevaleceu sobre


o aspecto conceitual de polígonos. Esses termos são definidos por Fischibein
(1993). O autor explica que o objeto geométrico é tratado como possuidor de duas
componentes: uma conceitual e outra figural. A componente conceitual expressa
propriedades que caracterizam certa classe de objetos por meio da linguagem
escrita ou falada, com maior ou menor grau de formalismo, com que se está
trabalhando. A componente figural corresponde à imagem mental que associamos
ao conceito e que, no caso da Geometria, tem a característica de poder ser
manipulada por meio de movimentos como translação, rotação e outros, mantendo
invariáveis certas relações.
A simetria de translação é a transformação de uma figura deslocada
paralelamente a uma reta. Todos os seus pontos são deslocados numa mesma
direção e a uma mesma distância. A forma, as dimensões, as medidas de seus
ângulos e a distância entre seus pontos permanecem as mesmas, como pode ser
observado abaixo. A figura A foi transladada em dois movimentos, resultando nas

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 111


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figuras A’ e A’’.
Notem que a figura A transladou para a direita, no mesmo sentido, quatro
unidades (representadas pelos retângulos da malha), resultando na figura A’; e
transladou para baixo no mesmo sentido, sete unidades (representadas pelos
retângulos da malha), resultando na figura A’’.

Figura 2: Exemplo de translação.

Figura 3: Escorregador

112 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Quando uma criança escorrega em um escorregador, está realizando um


movimento de translação.
A simetria de rotação é a transformação de uma figura que obtemos girando
cada um de seus pontos segundo um arco de circunferência ao redor de um ponto,
percorrendo um determinado ângulo, no sentido horário ou anti-horário. Ao
efetuarmos a rotação de uma figura em torno de um ponto, a imagem obtida é
congruente à figura dada. A forma, as dimensões, as medidas de seus ângulos e a
distância entre seus pontos permanecem as mesmas. Veja um exemplo:

Figura 4: Simetria de rotação

Figura 5: Roda Gigante

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 113


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Em livros didáticos, algumas vezes, encontramos situações nas quais os


triângulos são apresentados apenas na forma equilátera (com os três lados de
mesma medida). Essa prática pode contribuir para que o professor venha a
apresentar, equivocadamente, em sala de aula, uma única forma de representar o
triângulo, dificultando o progresso dos estudantes. Em muitas situações didáticas,
encontramos padrões de representação de uma figura geométrica como única
maneira de representar graficamente a imagem de um objeto geométrico. Tal
procedimento faz com que o conceito de uma figura geométrica, por exemplo, fique
restrito apenas à posição que a figura ocupa no plano.
Um típico exemplo de figura-protótipo é o quadrado, que em muitos livros é
apresentado sempre como uma figura com um dos lados paralelo à margem. Isso
contribui para que ele não seja reconhecido também como um losango.

Figura 6 : Quadrado em duas posições.

Esses exemplos são certamente triviais; entretanto, muitos outros – que


podem causar conflitos como esses –, nos quais o conceito figural poderia ser usado
e interpretado, poderiam ser usados sistematicamente na sala de aula a fim de
discutir a predominância da definição sobre a figura desenhada. A percepção
espacial desempenha um papel fundamental no estudo da Geometria. Contribui para
a aprendizagem de números e medidas, estimula a criança a observar, perceber
semelhanças e diferenças entre objetos e quantidades e auxilia na identificação de
regularidades ou não. O reconhecimento das formas geométricas quando
representadas no plano, assim como as propriedades intrínsecas a elas, precisa ser
efetivamente trabalhado na sala de aula desde os anos iniciais. Há vários níveis de
compreensão da percepção espacial. Alguns são necessários e básicos para o dia a
dia, outros são solicitados pelos diferentes níveis profissionais do indivíduo. Dessa
forma, uma boa formação espacial pode melhorar a adaptação desse indivíduo ao
114 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico
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mundo tridimensional, capacitando-o a compreender as diferentes formas e


expressões de nossa cultura. Nesse sentido, a partir da exploração dos objetos do
mundo físico, de obras de arte, de pinturas, de desenhos, de esculturas, de
artesanatos, etc., o estudante terá oportunidade de fazer conexões entre a
Matemática e outras áreas do conhecimento.
Os famosos quadros dos pintores Pieter Corneles Mondriaan e Giorgio
Morandi são exemplos de que obras de arte podem fazer parte do cotidiano escolar.

Figura 7: Mondriaan, “Composição com Amarelo, Preto, Azul, Vermelho e Cinza”,


1923.

Figura 8: Morandi, “Natureza Morta”, 1943.

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 115


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Os estudantes poderão ser incentivados a reconhecer no espaço da sala de


aula figuras semelhantes às das obras de arte. Identificar nas obras objetos
semelhantes aos sólidos geométricos que aparecem na obra de Morandi será um
exercício bastante importante para o desenvolvimento do pensamento geométrico.
Os estudantes poderão ainda reproduzir as obras, criar outras e também escrever
sobre elas. Uma atividade interessante será visitar exposições e museus com outro
olhar.
Em Nacarato, Mengali & Passos (2009), uma atividade realizada com
estudantes do quinto ano sobre a obra “Os retirantes”, de Cândido Portinari, resultou
em uma interessante atividade interdisciplinar envolvendo, além dos conteúdos de
artes, conteúdos de outras áreas do conhecimento, como: história (migração);
geografia (localização de estados brasileiros e problemas sociais); língua portuguesa
(leitura e interpretação de texto sobre a obra e a visita a museu, biografia do artista
plástico); ciências (doenças causadas pela falta de higiene e pela fome); educação
física (expressão corporal); e matemática (confecção em papel, do tamanho original
da obra de arte; elaboração de situações-problema, dimensões da figura plana,
perímetro).
A produção de textos a partir da interpretação que os estudantes fazem de
obras de arte, comunicando sobre o que visualizam e o que sentem sobre elas, se
constitui em um aspecto importante em sua formação e é uma prática que deve ser
explorada pelos professores.
Situações do cotidiano podem ser levadas para a sala de aula na exploração
de sólidos geométricos. Imagine o que comporia uma lista de cilindros pouco
habituais. Geralmente, a imagem que fazemos do cilindro está ligada a objetos do
cotidiano, como a forma e o tamanho de uma lata de refrigerante. As pessoas têm
de fazer um esforço para pensar em casos extremos de cilindros quase planos,
como, por exemplo, uma moeda, ou estreitos, como um pedaço rígido de espaguete.

116 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Figura 9: Face de moeda.

Figura 10: Espaguete.

Figura 11: Cilindro.

Práticas em que essas experiências ocorrem possibilitam um exercício que


tem muito mais consequências do que ampliar a nossa imagem de cilindro. É um
dos primeiros exercícios para nos tornarmos conscientemente atentos à
independência dos atributos que definem a forma; nesse caso, reconhecer que o

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 117


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diâmetro da base e a altura são distintos, e que podem ser manipulados


independentemente. Pense agora na definição de circunferência. O que lhe vem à
mente quando falamos de circunferência?
Esta é habitualmente definida como lugar geométrico dos pontos (do plano)
equidistantes de um dado ponto, mas raramente temos tendência para pensar muito
sobre o que queremos dizer com distância. O que lhe vem à cabeça quando falamos
de distância?
Goldenberg (2010) faz uma comparação entre essa definição e o que ele
chama de a “geometria do motorista de táxi”. Para o motorista, no quadriculado
abaixo, o conjunto de pontos que estão a uma mesma distância de um dado ponto
central O, por exemplo, forma um quadrado com uma diagonal horizontal.
Observa-se que, na Figura 12, cada um dos pontos dista do centro; para o
motorista de táxi são três quarteirões. Como se trata de um percurso de táxi, o
caminho não é direto e obedece aos quarteirões representados na malha
quadriculada.

Figura 12: Geometria do motorista de táxi segundo Goldenberg (2010).

118 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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O lugar geométrico dos pontos (do plano) equidistantes de um dado ponto


(centro) resulta numa figura geométrica denominada circunferência.

Figura 13: Circunferência indicando centro e arco.

Os elementos de uma circunferência são arco e corda. Qualquer curva entre


dois pontos da circunferência é chamada de arco de uma circunferência. A corda é
composta por segmentos que unem dois pontos do arco. Na figura a seguir,
identificamos uma corda AB ou BA, e um arco AB (a nomeação de um arco é
sempre no sentido anti-horário). A maior
corda de uma circunferência chama-se
diâmetro.

Figura 14: Circunferência indicando arco


e corda.

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 119


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Figura 15: Circunferência indicando o diâmetro.

A metade do diâmetro chama-se raio. Cada um dos pontos que forma o


arco está a uma mesma distância do centro.

Figura 16: Circunferência indicando o raio.

120 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Figura 17: Circunferência e seus elementos.

Figura 18: Círculo

A nomenclatura específica da Geometria contribui muitas vezes para que


muitos de seus aspectos não sejam considerados no momento de ensino ou até
para que sejam negligenciados.
Para muitos professores, ainda não é clara a importância do ensino da
Geometria ou até mesmo quais conteúdos devem ser selecionados para os Anos
Iniciais do Ensino Fundamental. As dúvidas são apontadas também quanto à
Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 121
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metodologia que deve ser utilizada e como os estudantes devem ser avaliados.

3.4 O ensino de Geometria nos anos iniciais

A Geometria é o agarrar do espaço... esse espaço no qual a criança


vive, respira e se movimenta. O espaço que a criança deve aprender a
conhecer, explorar, dominar, com vista a viver, respirar e movimentar-
se melhor.
Freudenthal. Mathematics as an Educational Task.

O estudo da Geometria ajuda os estudantes a representar e a dar significado


ao mundo. Os modelos geométricos fornecem uma perspectiva a partir da qual os
estudantes podem analisar e resolver problemas. As interpretações geométricas
podem ajudá-los a compreender mais facilmente uma representação abstrata
(simbólica). Os estudantes devem ter a oportunidade de visualizar e de trabalhar
objetos tridimensionais a fim de desenvolver o domínio do espaço fundamental na
vida cotidiana.
Na unidade sobre a Matemática na Educação Infantil, traremos algumas
considerações e sugestões de como pode ser desenvolvido o trabalho com a
Geometria. Discutiremos aqui a Geometria nos Anos Iniciais do Ensino
Fundamental.
Nesse nível de ensino, a Geometria deve centrar-se em atividades de
manipulação, exploração, percepção, comparação, conexão, classificação,
construção, transformação e relação com um grande número de experiências que
levem à descoberta do espaço e da forma que a criança realizou anteriormente na
Educação Infantil ou mesmo antes de ingressar na escola.
É importante que as crianças encontrem na escola o ambiente, a
oportunidade e as condições para que ocorra a aquisição de noções e princípios
geométricos. As atividades de exploração do espaço e das formas contribuem para
a criatividade, imaginação e o desenvolvimento do sentido estético das crianças.
No processo de ensino e aprendizagem da Geometria, alguns aspectos
122 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico
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podem ser contemplados, tais como experimentação, formulação de conjecturas,


representação, relação, comunicação, argumentação e validação. Experimentar, ou
seja, pôr à prova empiricamente, pode levar o estudante a construir ou adquirir
noções, princípios e procedimentos matemáticos concretamente. Conjecturar
significa juízo de opinião sem fundamento preciso, ou seja, por suposição ou por
hipótese. A representação pode ser expressa por falas, gestos, desenhos, figuras
geométricas, imagens mentais ou conceitos.
Descobrir relações, padrões, regularidades, fazer analogias entre coisas
diferentes e confrontar ideias é especialmente importante no processo de aprender
Geometria. A comunicação, expressa por relações, com vocabulário e simbologia
próprios, decorre da compreensão em Geometria. A partir dessa iniciação
geométrica, o estudante conseguirá, na continuidade de sua escolarização,
identificar relações; analisá-las significa que estará argumentando sobre o conteúdo,
de modo a atingir, provavelmente no ensino médio, o momento da validação, ou
seja, legitimar uma afirmação através de prova dedutiva.
A organização dos conteúdos ao longo dos anos iniciais pode ser pensada
progressivamente, enfatizando o desenvolvimento do pensamento geométrico
iniciado pela visualização, quando as crianças percebem o espaço como algo que
existe ao redor delas.
O espaço no qual vivemos varia em natureza e em tamanho. No espaço ao
alcance da criança pode-se explorar tarefas geométricas de montar, desmontar,
compor e decompor, construir e desconstruir. No espaço, mais amplo, alcançado
pelo olhar, em desenhos ou em fotos, podemos nos movimentar, nos orientar e nos
localizar, ou seja, é um espaço maior, que não se pode manipular, mas sim
representar em desenhos ou na construção de modelos, por exemplo. Considerando
essas diferenças entre tais espaços e as possibilidades de exploração, inúmeras
tarefas geométricas podem ser criadas.
Mas por onde começar?
No início da escolarização, digamos no primeiro ciclo (correspondente ao 1º,
2º e 3º anos do Ensino Fundamental), deve-se sempre partir da manipulação de
objetos de modo que as crianças possam se situar no espaço em relação às

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 123


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pessoas e aos objetos de diferentes naturezas. Essa manipulação vai permitir-lhes


reconhecer o interior e o exterior de um domínio limitado por uma linha ou por uma
superfície fechada. Brincar dentro e fora de caixas (embalagens grandes) ou ficar
dentro ou fora de um bambolê colocado no chão, por exemplo, são atividades que
as colocam nesse movimento de reconhecer o interior e o exterior. Seria
interessante solicitar às crianças que fizessem uma coleção de objetos (trazidos de
casa ou que a escola já possui) para poderem manipulá-los, enfileirá-los, entrar
neles. Elas precisam experimentar recortar figuras e objetos que apareçam em
revistas e reconhecer em que lugar se encontram no mundo real.
Assim, poderão estabelecer relações entre objetos segundo suas posições no
espaço. As tarefas propostas deverão possibilitar às crianças a utilização do
vocabulário próprio da relação que se estabelece com o espaço, como em cima,
atrás, à frente, entre, dentro, fora, à esquerda, à direita, sobre, antes, depois.
A comparação de objetos poderá ser introduzida ao se manipular materiais
moldáveis, transformando, cortando, fazendo e desfazendo construções com objetos
como tubos, caixas, bolas e materiais de encaixe.
Na sequência, deverão ser propostas tarefas que levem ao reconhecimento
de superfícies planas e não planas em objetos diversos e em objetos geométricos. A
partir dessas experiências, as crianças poderão reconhecer e nomear, nos sólidos
geométricos, alguns dos seus elementos, como suas faces. Por exemplo, ao
desenhar o contorno de uma face de um cubo, será possível reconhecer que a figura
plana que a define é um quadrado, e mais, que o cubo possui seis faces, todas
iguais. Ao fazer o contorno das faces de um prisma reto de base retangular (que não
seja cubo), também encontrarão seis faces, todas retângulos. E assim, desenhando
o contorno de objetos que representam sólidos geométricos, encontrarão exemplos
de triângulos, pentágonos, círculo, etc. Por exemplo, se tivermos uma pirâmide de
base quadrada, como na Figura 19, podemos solicitar aos estudantes que analisem
como são as faces desse sólido fazendo o contorno das faces, como mostra a
Figura 20.

124 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Figura 19: Pirâmide de base quadrada.

Figura 20: Imagem em que as faces do sólido estão sendo contornadas.

A partir do contorno do sólido, obtém-se o desenho de quatro polígonos.

Figura 21: Faces desenhadas da pirâmide.

Outros materiais manipuláveis contribuirão para que sejam feitas


Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 125
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composições com figuras geométricas, tais como recorte e colagem,


dobragem, geoplano4, tangram e demais quebra-cabeças.

Figura 22: Geoplano e Tangram.

Permeando as atividades de manipulação, as crianças podem ser


incentivadas a desenhar as figuras que compuseram usando papel
quadriculado, desenhando livremente ou seguindo regras. Elas poderão ainda
fazer a reprodução ou ampliação de figuras simples. Reconhecer figuras
geométricas em diversas posições é outra noção geométrica importante
nessa fase de escolarização. Veja, por exemplo, alguns objetos e tente
reconhecê-los:

Figura 23: Foto de objetos vistos de perspectivas não habituais.


4
O geoplano é um material criado pelo matemático inglês Calleb Gattegno. É constituído por uma placa de
madeira marcada com uma malha quadriculada ou pontilhada. Em cada vértice dos quadrados formados
fixa-se um prego (ou outro tipo de pino), onde se prenderão os elásticos usados para “desenhar” sobre o
geoplano.
126 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico
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Discutir sobre os diferentes pontos de vista que um objeto pode ser


observado e desenhado contribui para a ampliação do conhecimento e para
despertar a curiosidade e criatividade dos estudantes. É importante também, para
explorar simetrias, a utilização de espelhos e dobraduras em papel com pingos de
tinta guache.

Figura 24: Simetria obtida com tinta e dobradura (a linha tracejada representa o eixo
de simetria).
As dobraduras e recortes também contribuem para o reconhecimento de
simetria em figuras. Experimente fazer um conjunto de bonecos de papel de mãos
dadas. Esse primeiro contato com as noções geométricas é fundamental para que
as crianças possam comparar sólidos geométricos e fazer classificações simples.
Segundo Rangel (1992, p.103), “classificar é agrupar objetos de um dado
universo, reunindo todos os que se parecem num determinado valor de um atributo,
separando-os dos que se distinguem neste mesmo atributo”. Rangel explica, com
base na teoria de Piaget, que a classificação exige compreensão e extensão. A
compreensão refere-se ao aspecto qualitativo da classe, o que faz com que alguns
elementos pertençam a uma mesma classe e outros não; a extensão relaciona-se ao
aspecto quantitativo da classe, isto é, os elementos agrupados são alguns dentre os
muitos que estariam numa mesma classe. A classificação nos anos iniciais pode ter

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 127


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início com a criança agrupando objetos por sua função utilitária, depois por dados
perceptivos, como cor, material, tamanho (são as coleções figurais); numa próxima
fase, a criança organiza coleções não figurais, explicitando o critério utilizado para
agrupar os elementos; por fim, ela consegue formar subgrupos dentro de um grupo,
atingindo assim as inclusões hierárquicas ao fazer relações entre o todo e suas
partes. A operação de classificação é fundamental para o desenvolvimento do
pensamento conceitual. Em Matemática, a classificação é necessária para o
desenvolvimento do pensamento lógico, favorecendo o estabelecimento de relações
lógicas pelo estudante.
Num movimento de transformar e cortar objetos, as crianças experimentam
novas formas, o que permitirá que reconheçam linhas curvas e linhas retas e
comparem figuras geométricas planas, como quadrado, retângulo, triângulo e
círculo. Isso pode ser potencializado a partir de composições com figuras
geométricas, utilizando diferentes meios e instrumentos, como recorte e colagem,
dobragem, geoplano, tangram e quebra-cabeça. Representar, no geoplano, figuras
geométricas e desenhar essas figuras em papel quadriculado ou pontilhado
possibilita, além do registro, a realização de outras tarefas, como, por exemplo,
desenhar figuras simétricas a partir de um eixo de simetria.
Uma forma de ampliar a representação do espaço pode ser a partir de
desenhos de plantas e mapas (da sala de aula, da escola, da rua, de percursos,
etc.) sem, é claro, a exigência de rigor ou realismo.
Já para o segundo ciclo (4ºe 5º anos), é possível ampliar essas noções para
além da comparação com atividades que possibilitem a identificação de sólidos
geométricos, como cubo, esfera, cilindro e paralelepípedo, diferenciando os sólidos
geométricos que rolam (corpos redondos – cilindro, cone, esfera) dos que não rolam
(prismas e pirâmides). Começando pela transformação de sólidos geométricos feitos
em materiais moldáveis, os estudantes poderão construir um cubo por meio do
recorte e colagem de quadrados geometricamente iguais. O uso de papel
quadriculado auxiliará na identificação das diferentes planificações do cubo, uma
importante atividade de exploração.
Deverão ser propostas tarefas para que os estudantes reconheçam, a partir

128 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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da observação e manipulação de sólidos, retas paralelas e retas perpendiculares


entre si, podendo representá-las por meio de dobras sucessivas de uma folha de
papel e em papel quadriculado. Posteriormente, poderão ser introduzidos
instrumentos de desenho como, por exemplo, régua e esquadro.
Para além da identificação de polígonos, será nesse momento que os
estudantes terão condições de distinguir círculo de circunferência, como comentado
anteriormente.
Godinho & Ruíz (2010) destacam que nos livros didáticos geralmente não há
a diferenciação entre o objeto abstrato e a realidade concreta quando, por exemplo,
pede-se para que se desenhe uma reta ou um triângulo. Parece óbvio que não se
pode desenhar uma reta ou um triângulo como entidades abstratas; o que se
desenha é um objeto perceptível que evoca, simboliza ou representa o objeto
abstrato correspondente. A reta como entidade matemática é ilimitada e não tem
espessura – o que não ocorre quando a desenhamos. Ao desenhar uma reta não é
fácil aceitar, por exemplo, que entre dois pontos contidos nela existam infinitos
pontos. Da mesma forma que um triângulo – enquanto entidade matemática – não é
uma peça material de uma figura espacial, nem uma imagem desenhada no papel;
geometricamente o triângulo é uma forma “controlada” por sua definição. Como
mencionamos anteriormente, as figuras geométricas são criadas mediante
definições e regras.
Superada a primeira fase de classificação das formas, de identificação das
suas propriedades das classes de objetos e da criação de uma linguagem que
permita sua descrição de maneira precisa, a atividade geométrica se ocupará de
estruturar as entidades geométricas criadas. Como enfatizam Godinho & Ruíz (2010,
p.11), sairemos do “cômodo mundo das nossas percepções para entrar no mundo
da linguagem, da gramática e da lógica” geométricas.
Além de desenhar figuras geométricas ou reconhecê-las em desenhos ou
fotografias, será necessário compreender o que as define.

3.4.1 Observação, manipulação, comparação e classificação em Geometria

Vamos partir de um conjunto de objetos para definirmos o que entendemos

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 129


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para curva, superfície e sólidos a partir da secção dos mesmos (MlGUEL & MIORIM,
1986). Partindo da observação da secção resultante após o corte é que faremos a
classificação dos objetos.
Imagine o conjunto composto dos seguintes objetos: pedaços de cartolina ou
papel cartão, sólidos geométricos de madeira, sólidos geométricos construídos com
cartolina, pedaços de barbante, espiral de caderno, mola, clipe para papel, pedra de
sabão, canudos de refrigerante, rolinho suporte de papel toalha, uma batata, argola,
moeda, embalagens diversas, latas de refrigerante, caixas, palitos, esfera de isopor,
pedaços de arame, etc.

Figura 25: Foto de diversos objetos para classificação.


Tente classificar esses objetos em três grupos, tendo como critério o corte:b1)
tudo que, ao ser cortado, a secção der a “ideia” de um ponto; 2) todos osbobjetos
que, após o corte, a secção sugerir uma curva; 3) todos os objetos que, após o
corte, a secção sugerir uma superfície. Temos aqui uma classificação a partir da
secção.

Curvas
O primeiro conjunto, composto pelos objetos cuja secção sugere um ponto,
será classificado como conjunto de curvas. Pertencerão a esse conjunto: pedaços
de barbante, argola, espiral de caderno, clipe para papel, canudos, palitos, pedaços
de arame e mola. Esses objetos poderão ser planos ou não planos, simples ou não
simples (ou seja, ter intersecção ou cruzamento), fechados ou abertos (por exemplo,

130 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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uma argola seria a representação de uma curva fechada e um clipe seria a


representação de uma curva aberta). Cada uma dessas características vai
determinar que tipo de curva eles representam. Denominamos de curva qualquer
“caminho” contínuo, aberto ou fechado. “Caminho” reto também é uma curva; assim,
a reta, a semirreta e o segmento de reta são exemplos de curvas. As curvas planas
são aquelas em que todos seus pontos estão totalmente contidos em uma superfície
plana. Um exemplo de representação de curva não plana é uma espiral de caderno.
Chamamos de curvas simples aquelas que não têm intersecção. Nos desenhos
seguintes, representaremos alguns tipos de curvas:

Figura 26: Representação de curvas planas, simples e abertas.

Figura 27: Representação de curvas planas, não simples e abertas.

Figura 28: Representação de curvas planas, fechadas e simples.

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 131


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Figura 29: Representação de curvas planas, fechadas e não simples.

Figura 30: Foto de objetos que representam curvas não planas, abertas e simples
(espiral de caderno e mola).

Superfície

O conjunto composto pelos objetos cuja secção sugere uma curva será
classificado como conjunto de superfícies. Tem-se inclusos nesse conjunto: pedaços
de cartolina, sólidos geométricos construídos com cartolina, rolinho suporte do papel
higiênico, latas de refrigerante, caixas vazias e outras embalagens.

132 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Figura 31: Representação da secção horizontal do rolinho de suporte de papel


higiênico.
Se o corte foi feito verticalmente em relação à base circular, teremos como
resultado da secção um segmento.
Entre essas superfícies podemos ter superfícies planas (pedaços de cartolina,
por exemplo) e superfícies não planas (como o rolinho suporte de papel higiênico).
Podemos ainda ter superfícies contínuas (as que não possuem buracos em seu
interior) ou não contínuas. A classificação dessas superfícies será muito importante
para o momento do estudo de polígonos.

Sólidos
O conjunto de objetos cuja secção sugere uma superfície será denominado
de sólidos. Entre os sólidos identificamos os que são sólidos geométricos, como
prismas, pirâmides, cones, cilindros, esferas, etc. Os demais objetos, como pedaços
de sabão, batatas, etc., serão apenas sólidos.
Entre os sólidos geométricos podemos encontrar aqueles que rolam e os que
não rolam. Entre os que rolam estão: esfera, cilindro e cone; entre os que não rolam,
ou seja, têm superfícies planas, encontramos: prismas e pirâmides.
O estudo dos sólidos no Ensino Fundamental deve ser feito gradualmente;
contudo, em cada ano, esse estudo deve fazer parte do planejamento das aulas.
É interessante que, em um primeiro momento, os estudantes trabalhem em
grupo e manipulem um conjunto de sólidos geométricos (cubos, paralelepípedos,
Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 133
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outros prismas, pirâmides, cilindros, cones, esferas) e façam a classificação


segundo o critério que eles julguem pertinente. O professor deve acompanhar essa
classificação, verificando a coerência e discutindo com a turma os critérios
escolhidos. É fundamental que sejam percebidas as diferenças e as semelhanças
entre as classes de sólidos e por qual motivo um determinado sólido estaria fora de
um grupo.
Posteriormente, o professor direcionará a tarefa de modo que sejam apenas
dois grupos. O objetivo é que os estudantes classifiquem os sólidos em poliedros e
corpos redondos. No grupo de poliedros, ficarão os sólidos que possuem
superfícies, arestas e vértices. O professor pode ampliar a discussão contando o
número de faces, arestas e vértices dos poliedros.

Figura 32: Pirâmide de base triangular e seus elementos (face, aresta e


vértice).

Quantas faces têm essa pirâmide? Quantas são suas arestas? Quantos são
seus vértices? As faces são os polígonos da superfície de um sólido, o encontro das
faces é denominado aresta e o encontro de arestas denomina-se vértice.

134 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Figura 33: Os elementos do prisma (aresta, face e vértice).


O professor pode debater com a turma a característica das faces dos
poliedros: os estudantes perceberão que se trata de polígonos. No cubo, por
exemplo, as seis faces são quadrados congruentes. Elas poderão também contar o
número de arestas, faces e vértices de um prisma.
Existe uma importante relação entre o número de faces, vértices e arestas
que é verdadeira para poliedros convexos, denominada Relação de Euler. Em
determinadas turmas, a Relação de Euler pode ser trabalhada no 5º ano do ensino
fundamental. Nessa relação, temos que o número de vértices (V) mais o número de
faces (F) será sempre igual ao número de arestas (A) mais 2. Assim, a Relação de
Euler5: V + F = A + 2 ou V + F – A = 2. Contudo, esse conteúdo está previsto para
ser desenvolvido a partir do 6º ano.
Solicitar que os estudantes escrevam sobre o que aprenderam a respeito dos
sólidos geométricos ajudará na organização e na compreensão das propriedades
intrínsecas a cada um. Essa escrita pode vir acompanhada de representação.
A intervenção do professor para a compreensão desses conceitos na fase da
aprendizagem é fundamental. Socializar as escritas e as representações feitas pelos
estudantes, discutindo com eles sobre o que diferencia um prisma de uma pirâmide,
por exemplo, é um momento rico para o que chamamos de negociação de
significados.
5
Matemático suíço, Leonard Euler (1707-1783), em 1751, divulgou que os poliedros guardam uma
interessante relação entre os números de vértices, de faces e de arestas.
Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 135
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3.5 Estudando polígonos


A partir de classificações como a proposta aqui, pode-se iniciar o estudo
particular de curvas, polígonos e poliedros. Os conceitos de polígono e de poliedro
constituem um excelente ponto de partida para a compreensão da natureza das
definições em Matemática. As atividades de classificação desses objetos podem ser
bons exemplos para disparar uma primeira identificação das figuras geométricas e,
gradualmente, introduzir conceitos e propriedades que permitam distinguir figuras,
polígonos, poliedros, cilindros, pirâmides, etc.
Vamos iniciar nosso estudo discutindo as concepções existentes para
polígonos. Mesmo entre os professores que ensinam Matemática, existem diferentes
concepções do que é um polígono; alguns consideram que basta que a figura seja
plana e fechada por segmentos de reta para que seja definida como um polígono.
Embora essa seja uma concepção aceita, adotaremos neste livro aquela que
considera como um polígono uma superfície plana e contínua, cujo contorno é uma
curva plana, fechada e simples, formada apenas por segmentos de reta.
A definição mais corrente em Matemática (e adotada aqui) é a que
corresponde à Figura 34, representada pelo quadrilátero XTUV; nesse sentido, a
Figura 35, representada apenas pelos segmentos de reta e nomeada nos seus
vértices por CDEF, não será um polígono.

Figura 34: Polígono XTUV.

136 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Figura 35: Curva fechada CDEF.

Embora esses conceitos sejam introduzidos no Ensino Fundamental,


não podemos desconsiderar que mesmo antes de iniciar os primeiros anos na
escola as crianças desenham e têm contato com figuras geométricas
desenhadas sem preencher seu interior, o que representaria a superfície
plana do polígono.Cabe ao professor inserir gradualmente as concepções. O
bom senso será fundamental nesse momento, sendo importante não entrar
em contradição.
A partir da definição que assumimos, apresentamos a seguir exemplos
de polígonos e não polígonos.

Figura 36: Exemplos de polígonos.

Figura 37: Exemplos de não polígonos.

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 137


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Será interessante a construção de diferentes polígonos, como


triângulos e retângulos, no geoplano e, nesse caso, eles serão representados
apenas pelas linhas poligonais. O computador também será importante
nessas construções. Existem recursos próprios do computador (ferramenta de
desenho do Word ou do Paint), mas há softwares livres que podem contribuir
para a construção e compreensão das figuras geométricas, como, por
exemplo, o Logo6. Trata-se de um software que, além de desenhar figuras
geométricas, contribui para a construção de conceitos geométricos.
As figuras seguintes foram desenhadas no geoplano com a ajuda do
computador. O estudante poderá observar que as representações de
triângulos e retângulos podem variar em relação à forma, o que não acontece
com o quadrado e com o círculo. Utilizando o geoplano, será possível
“representar” diferentes tipos de triângulos, uma boa oportunidade para
perceber que existem triângulos cujos lados possuem o mesmo comprimento,
triângulos com dois lados iguais e triângulos com três lados diferentes.

Figura 38: Triângulos desenhados no geoplano.

6
O software Logo pode ser acessado no endereço:
<http://eurydice.nied.unicamp.br/softwares/softwares.php>.
138 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico
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Figura 39: Quadriláteros desenhados no geoplano.

O geoplano é um excelente material manipulável para usar no ensino da


Geometria, pois permite que os estudantes corram riscos, “desenhando” com
elásticos e “apagando”, sem indicação de que foi cometido algum erro. Crianças dos
primeiros anos do Ensino Fundamental geralmente não têm a motricidade fina
necessária para desenhar ou escrever bem, e o material ajuda muito nesse caso.
Existem softwares de geoplano que podem ser acessados, conforme o
disponibilizado anteriormente, como o desenvolvido pelo Departamento de
Informática e Estatística – Centro Tecnológico – da Universidade Federal de Santa
Catarina7.
Os polígonos são denominados a partir do seu número de lados: triângulo é o
polígono de três lados, quadrilátero o de quatro lados, pentágono o de cinco lados e
assim por diante. Note que o prefixo das palavras relaciona-se com o número de
lados e o sufixo com a palavra ângulo (gono) ou lado (látero), isso porque os
polígonos possuem o mesmo número de lados e ângulos.
Nos próximos subitens, 1.5.1 e 1.5.2, proporemos explicações e questões que
podem ser aplicadas em sala de aula sobre os triângulos e quadriláteros,
respectivamente.

7
Para mais informações sobre o software desenvolvido pelo Centro Tecnológico, Departamento de
Informática e Estatística da Universidade Federal de Santa Catarina, acesse: <http://www.inf.ufsc.br/~edla/
projeto/geoplano/software.htm>.
Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 139
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3.5.1 Os triângulos

Ampliando a discussão sobre polígonos, a partir do desenho abaixo, podemos


iniciar o estudo de triângulos e quadriláteros identificando na figura:

a) um triângulo equilátero;
b) um triângulo isósceles;
c) um triângulo escaleno;
d) um triângulo retângulo;
e) um trapézio;
f) um retângulo;
g) um losango.

Figura 40: Hexágono.

Os triângulos são classificados a partir da medida do comprimento de seus


lados e também pela medida dos seus ângulos internos. Há várias respostas
possíveis para a questão proposta. Encontre-as!
Mas como identificar os tipos de triângulos?
Comece identificando na figura os triângulos que possuem um ângulo reto
(90°). Esses são classificados como triângulos retângulos.
Identifique os triângulos que têm as medidas de todos os lados iguais. Esses
são classificados como triângulos equiláteros. O que se pode dizer da medida dos
ângulos desses triângulos?
Os triângulos que possuem dois de seus lados com medidas iguais são os
isósceles. Notem que esses triângulos também possuem dois ângulos com a mesma
medida.
Já os triângulos que possuem os três lados com medidas diferentes também
terão a medida de seus ângulos diferentes e são chamados de triângulos escalenos.
Mas, afinal, o que define os triângulos e quadriláteros? Como classificá-los?
Será possível construir um triângulo com três palitos (tipo espetinho) de quaisquer

140 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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comprimentos? Experimente construir triângulos com conjuntos de palitos que


medem:

a) 10 cm, 5 cm e 5 cm;
b) 12 cm, 7 cm e 9 cm;
c) 12 cm, 3 cm e 4 cm;
d) 10 cm, 10 cm e 10 cm.

O que você pode dizer a respeito dessa experiência?


Na verdade existe uma condição de existência de triângulos e essa condição
pode ser verificada com atividades semelhantes à anterior e propostas aos
estudantes dos anos iniciais. Logo eles perceberão que com três palitos pode-se
construir um triângulo somente se a soma das medidas dos comprimentos de dois
palitos for maior que a medida de comprimento do terceiro.
Essa é a condição de existência de um triângulo. Matematicamente, essa
propriedade recebe o nome de postulado, ou seja, uma verdade dada pela
experiência.
A nomenclatura que identifica diferentes tipos de triângulos relaciona-se com
as medidas de comprimentos dos lados e com as medidas dos seus ângulos
internos.
Se um triângulo possuir os três lados de mesma medida, seus ângulos
também terão a mesma medida. Esse triângulo denomina-se equilátero. Se o
triângulo possuir dois de seus lados com a mesma medida, será denominado de
triângulo isósceles. O triângulo isósceles terá ainda dois de seus ângulos com
medidas iguais. Se um triângulo for equilátero ele também será isósceles? Investigar
essa questão será muito interessante. Experimente.
O triângulo que tiver todos seus lados com medidas de comprimento
diferentes será denominado escaleno. O que acontecerá com as medidas dos seus
ângulos? Investigue.

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 141


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3.5.2 Os quadriláteros

Como podemos classificar os


quadriláteros? Experimente escrever tudo
que você sabe a respeito dos quadriláteros,
procurando relacionar as palavras ou
expressões que escreveu, construindo um
mapa conceitual8 a seu respeito. Vamos
começar escrevendo quadrilátero e uma frase (definição), o leitor complementa.
O leitor poderá concluir que polígonos que possuem quatro lados e quatro
ângulos são denominados quadriláteros. Os quadriláteros serão classificados como
trapézios ou não trapézios.
Os trapézios que possuírem apenas um par de lados paralelos serão
denominados de trapézios não paralelogramos. Já aqueles quadriláteros que
possuírem dois pares de lados paralelos serão denominados paralelogramos.
Dentro do conjunto de paralelogramos podemos identificar os não retângulos
ou não losangos.
Se os paralelogramos tiverem os quatro ângulos com a mesma medida serão
denominados retângulos; se os paralelogramos tiverem os quatro lados com a
mesma medida, serão denominados losangos.
Os retângulos que tiverem quatro lados com a mesma medida serão
denominados quadrados. Os losangos que tiverem os quatro ângulos com a mesma
medida serão denominados quadrados.
Há muito ainda a se falar e debater sobre a Geometria nos anos iniciais. Mas
não poderíamos deixar de destacar que todo processo deverá ser desencadeado
num ambiente de comunicação e troca de ideias, o qual deverá influenciar a
aprendizagem de todos os envolvidos no processo.

8
Mapa conceitual: são representações gráficas, semelhantes a diagramas, que indicam relações entre
conceitos ligados por palavras. Geralmente, são utilizados para auxiliar na ordenação e na sequência
hierárquica dos conteúdos de ensino, de forma a oferecer estímulos aos alunos. A técnica de construção e
a teoria dos mapas conceituais foram desenvolvidas pelo pesquisador norte-americano Joseph Novak.
142 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico
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3.6 Algumas considerações

Há ainda muito que se estudar e aprender sobre Geometria. Mas vamos


deixar para um outro momento.
Apresentamos uma pequena parcela de tudo que consideramos fundamental
para o desenvolvimento do pensamento geométrico. Deixamos o convite para que o
leitor, que será um futuro professor dos anos iniciais, busque sempre ampliar seus
estudos a respeito.
Contudo, não poderíamos finalizar esta unidade sem destacar o papel
importante que o professor exerce nas práticas de sala de aula. Será ele o
responsável para que ocorra a comunicação em linguagem oral ou escrita, em
linguagem matemática, em linguagem gestual, em forma de desenhos, maquetes e
esculturas. As diferentes formas de comunicação revelam a interpretação e a
compreensão dos estudantes. Em um ambiente de interações e reflexões, ocorre a
negociação de significados, essencial para a aprendizagem. E esse ambiente de
comunicação e de troca de ideias influencia a aprendizagem de todos os envolvidos
no processo.
Concordamos com Charlot (2005, p.84) quando ele diz que é “o aluno quem
deve aprender e que não se pode aprender em seu lugar. Mas isso supõe que o
aluno entre em uma atividade intelectual”. Essa atividade é central ao processo de
aprendizagem. Desse modo, “é legítimo prestar maior atenção a ela, no que ela tem
de singular”. Colocar o estudante no centro do processo de ensino permitirá que
ocorra o compartilhamento de ideias e de saberes.

3.7 Estudos complementares

O aprofundamento das questões aqui debatidas poderá ser feito a partir da


leitura das obras citadas nesta unidade ou com outras referências complementares:
FONSECA, M.C.F.R. et al. O ensino de geometria na escola fundamental: três
questões para a formação do professor dos ciclos iniciais. Belo Horizonte: Autêntica,
2001.
A obra acima referida é destinada a educadores em formação inicial ou
continuada, e foi elaborada para discutir questões que emergem no e do trabalho

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 143


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com o ensino de Geometria.


Na obra referida a seguir, é apresentada a discussão de duas vertentes: a
Geometria no currículo escolar e a Geometria e a formação de professores.
NACARATO, A.M.; PASSOS, C.L.B. A geometria nas séries iniciais: uma análise
sob a perspectiva da prática pedagógica e da formação de professores. São
Carlos: EdUFSCar, 2003.

144 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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4
Espaço e Forma: o
desenvolvimento do
pensamento geométrico
Mauro Carlos Romanatto

Licenciatura em Pedagogia
2 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico

ROMANATTO, Mauro Carlos. A matemática na formação de professores dos


anos iniciais : um olhar para além da aritmética / Mauro Carlos Romanatto,
Cármen Lúcia Brancaglion Passos. -- São Carlos : EdUFSCar, 2011. 107 p. --
(Coleção UAB-UFSCar)

4.1 Primeiras palavras

Para os Parâmetros Curriculares de Matemática (1997), na vida em


sociedade as Grandezas e Medidas estão presentes nas mais diferentes atividades
que realizamos. Assim, esse conteúdo escolar mostra a utilidade do conhecimento
matemático em nosso dia a dia. Foi em tempos passados, quando o homem
começou a construir suas habitações e a desenvolver a agricultura, que houve a
necessidade de construir instrumentos para efetuar medições.

Atividades bem trabalhadas com os estudantes sobre as noções de


grandezas e medidas proporcionam uma ampliação de conceitos relativos ao
espaço e às formas. Os contextos envolvendo grandezas e medidas são

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 145


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extremamente significativos para trabalhos com as noções de números, operações,


proporcionalidade, escala, estimativa, entre outros.

E mais, o tema grandezas e medidas é um assunto em que a abordagem


histórica para o ensino da Matemática pode ser utilizada para mostrar aspectos da
construção desse conhecimento.

4.2 Problematizando o tema

As crianças, desde muito cedo, têm experiências com a medição de


grandezas (comprimento, área, volume, capacidade, tempo, massa, temperatura,
ângulo, sistema monetário), por exemplo:

 Acordei às 6 horas.

 O termômetro marcava 10 graus. Que frio!

 Comprei 1 litro de leite.

 Andei dois quarteirões para chegar ao ponto de ônibus.

 O ônibus percorreu aproximadamente cinco quilômetros até chegar à escola.


Gastei R$ 5,00 para comprar um lanche e terminadas as aulas voltei a pé
para casa.

 Acho que emagreci uns dois quilos.

Mas isso não significa a compreensão dos aspectos mensuráveis de um


objeto nem a dominação de procedimentos de medida.

Os conceitos relacionados às medidas são desenvolvidos ou adquiridos por


meio de experiências que enfocam as duas ideias básicas de medida, que são:

 Comparação;

 Unidade-padrão.

146 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Assim, podemos dizer que somos mais altos ou mais baixos que alguém.
Mas, também, podemos dizer que temos 1,75 m. Essa segunda ideia relaciona a
medida de uma determinada grandeza a um número e isso é um aspecto de
fundamental importância, pois é por meio dele que o estudante aprofundará o seu
conhecimento numérico e terá a justificativa para a ampliação dos conjuntos
numéricos. A ampliação dos conjuntos numéricos (os números fracionários e os
úmeros negativos) pode ser justificada em contextos envolvendo grandezas e
medidas. Mas, afinal, o que podemos comparar?

O que é maior: a minha idade ou o meu pé?

Para Machado (1988), se você estranhou a pergunta, isso é bom. Não faz
sentido compararmos idade com tamanho de pé. São grandezas diferentes: a idade
se refere a tempo e o tamanho do pé a comprimento. Assim, só podemos comparar
grandezas de mesma espécie.

O que comparamos: grandezas ou números?

Tenho cinco borrachas iguais e uma caneta. O comprimento da caneta é igual


ao das cinco borrachas enfileiradas. Portanto, cinco vezes o comprimento da
borracha equivale ao comprimento da caneta. Cinco é o número que obtemos
comparando essas duas medidas. Em outras palavras, tomando-se como padrão o
comprimento da borracha, o comprimento da caneta é cinco vezes o comprimento
da borracha.

Vejamos outro exemplo: podemos medir uma das dimensões (comprimento,


largura, altura) de uma mesa tomando-se o palmo como padrão ou as dimensões de
uma sala com o tamanho do pé.

Pensemos na seguinte situação: o comprimento de um tapete retangular é de


6 pés, e a sua largura é de 3 pés.

Em geral, é desse modo que relacionamos duas grandezas da mesma


espécie. Em vez de comparar diretamente uma com a outra, comparamos as duas

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 147


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com uma terceira, escolhida como padrão, no caso o pé. Dessas duas comparações
resultam dois números. Por meio deles, comparamos as grandezas
correspondentes.

4.3 O homem como medida das coisas

Protágoras, filósofo grego, afirmava que o homem era a medida de todas as


coisas. Por isso, no passado, para medir comprimentos, o homem tomava a si
próprio como referência. Usava como padrões determinadas partes de seu corpo.
Foi assim que surgiram a polegada, o palmo, o pé, a jarda, a braça e o passo:

▪ Polegada: corresponde a 2,54 centímetros ou 25,4 milímetros.

▪ Palmo: diz respeito a uma medida de comprimento que se obtém com


a mão toda aberta, correspondendo a aproximadamente 22
centímetros.

▪ Pé: um pé correspondia a 11,5 polegadas, mas atualmente


corresponde a 12 polegadas, o tamanho médio dos pés masculinos
adultos. Essa medida é amplamente utilizada na aviação, equivalendo,
atualmente, a 30,48 centímetros.

▪ Jarda: era originalmente a medida do cinturão masculino de mesmo


nome. No século XII, o rei Henrique I da Inglaterra fixou a jarda como a
distância entre seu nariz e o polegar de seu braço estendido.
Atualmente é utilizada no futebol americano.

▪ Braça: é uma antiga medida de comprimento equivalente a 2,2 metros.

▪ Passo ou passo duplo: é uma unidade de medida de comprimento


utilizada no Império Romano, valendo 5 pés, ou seja, 1,48 m.

A escolha de um ou de outro padrão depende do que se deseja medir. Um


padrão pode servir para medir uma coisa e não ser adequado para medir outra. Por
isso, não podemos dizer que um padrão é “bom” ou “ruim”, mas apenas que é ou
148 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico
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não apropriado para certa medição. Como exemplo, temos que, para medir o
comprimento do corredor de uma escola, a jarda é preferível à polegada.

4.3.1 A necessidade de padronizar os padrões

Ainda conforme Machado (1988), podemos imaginar que, como as pessoas


têm tamanhos diferentes, as medidas associadas ao corpo humano resultaram em
confusões. E mais, para se comparar duas medidas obtidas com padrões diferentes,
tais como o pé e a jarda, precisamos saber que relação existe entre elas.

4.3.2 A Terra como medida das coisas

Com o desenvolvimento do comércio e das cidades e o consequente aumento


do intercâmbio entre os povos, tornou-se cada vez mais essencial estabelecer
padrões que fossem utilizados por todos os países. Então, a Terra passou a ser
utilizada como padrão para medidas, lembrando que algumas medidas de tempo
usadas já se relacionavam com o nosso planeta: o dia e o ano. Foi assim que surgiu
a légua como medida de comprimento.

4.4 O metro

A palavra metro vem do grego métron, que significa “que mede”. Vejamos,
então, a primeira definição da unidade metro. Imagine a quarta parte do meridiano
terrestre dividida em 10 milhões de partes iguais. Cada uma dessas partes é igual a
1 metro.

Acontece que os meridianos terrestres não são iguais, pois a Terra não é
perfeitamente esférica, nem sua superfície totalmente lisa. Assim, foi necessário
procurar outra forma de conceituar o metro.

A partir da criação do metro como uma unidade-padrão, foi possível


expressar, de modo simples, e por meio de um único número, o resultado de uma
medição feita com ele ou seus múltiplos e submúltiplos.

Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 149


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PEDAGOGIA

A última definição do metro, que passou a vigorar em 1983, é baseada na


velocidade da luz. Sabemos que a luz se propaga no espaço vazio com a velocidade
constante de aproximadamente 300.000 km por segundo. Pois bem, o metro pode
ser definido como uma fração ou parte da distância percorrida pela luz, no vácuo,
em um segundo. Como 300.000 km correspondem a 300 milhões de metros, então o
metro corresponde a 1/300.000.000 da distância percorrida pela luz em um segundo.

Essa caminhada por certo não terminou. É importante perceber que a história
dos padrões e instrumentos de medida de comprimento acompanha a história da
humanidade. É bem provável que a definição de metro sofra ainda outras
transformações.

Portanto, as duas ideias fundamentais de medida são: comparação e unidade


padrão. No caso dos comprimentos, as comparações são expressas pela unidade-
padrão que denominamos: o metro.

4.5 Sistema métrico decimal

4.5.1 Medidas de comprimento

No sistema métrico decimal, a unidade-padrão para medir comprimentos é o


metro, cujo símbolo é m. Existem outras unidades (múltiplos ou submúltiplos) do
metro. Considerando-o como unidade-padrão, temos:

▪ Quilômetro (km = 1.000 m);

▪ Hectômetro (hm = 100 m);

▪ Decâmetro (dam = 10 m);

▪ Metro (m = 1 m);

▪ Decímetro (dm = 0,1 m);

▪ Centímetro (cm = 0,01 m);

▪ Milímetro (mm = 0,001 m).

150 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Se as medições forem muito pequenas ou muito grandes, existem ainda


outras unidades de comprimento, por exemplo o mícron (10-6 m) e o ano-luz (9,46
10 ) 15 × m .

Como podemos observar, há uma relação entre as unidades de comprimento:


cada unidade de comprimento é dez vezes maior que a unidade imediatamente
inferior ou dez vezes menor que a unidade imediatamente superior. Por exemplo:

Assim, para converter uma unidade maior em uma unidade menor, multiplica-
se por dez a cada unidade que se passa até chegar àquela que se quer. Já para
converter uma unidade menor em uma unidade maior, divide-se por dez a cada
unidade que se passa até chegar àquela desejada.

Alguns exemplos:

4.5.2 Medidas de superfície

No sistema métrico decimal, a unidade fundamental para medir superfícies é


o metro quadrado, cuja representação é m². O metro quadrado é a medida da
superfície de um quadrado de 1 metro de lado. Como na medida de comprimento,
na área também temos os múltiplos e os submúltiplos (km², hm²,dam², dm², cm² e
mm²). As transformações de uma unidade de área para outra são feitas como nas
transformações das unidades de medida, porém, para cada mudança, devemos
multiplicar ou dividir por 10² ou 100.
Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 151
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Alguns exemplos:

Quando queremos medir grandes porções de terra, usamos uma unidade


agrária chamada hectare (ha). O hectare é a medida de superfície de um quadrado
de 100 m de lado. Assim, 1 hectare (ha) = 1 hm² = 10.000 m².

Em alguns estados do Brasil, utiliza-se também uma unidade não legal


chamada alqueire. Um alqueire mineiro equivale a 48.400 m² e 1 alqueire paulista
equivale a 24.200 m².

4.5.3 Medidas de volume

No sistema métrico decimal, a unidade fundamental para medir volume é o


metro cúbico, cuja abreviatura é m³. O metro cúbico (m³) é o volume ocupado por
um cubo de 1 m de aresta. Como nas medidas de comprimento e de área, no
volume também temos os múltiplos e os submúltiplos. Analogamente à
transformação de unidades da medida de comprimento, faz-se o mesmo para as
medida de volume, porém, para cada mudança, deve-se multiplicar ou dividir por
103 (ou 1.000). Veja os exemplos:

A unidade fundamental para medir volume ou capacidade é o litro (L). Para as


aplicações práticas, podemos definir: 1 litro = 1 dm³.

152 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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Figura 42: Cubo de 1 dm3 e uma caneca de 1 litro.

Exemplo: Na leitura de um hidrômetro, constatou-se que o consumo do último


mês foi de 25 m3. Quantos litros de água foram consumidos?

Resposta: 25 m³ = 25.000 dm³ = 25.000 litros.

4.6 Exemplos de atividades que podem ser desenvolvidas com as crianças

O conteúdo envolvendo Grandezas e Medidas pode possibilitar ao professor


o desenvolvimento de uma pesquisa com os estudantes. Essa pesquisa se daria da
seguinte forma: os estudantes trariam para a escola os mais diversos instrumentos
ou aparelhos utilizados para medições. Esses materiais seriam tanto atuais como
antigos e, ao final da pesquisa, depois dos trabalhos com ideias, princípios e
procedimentos matemáticos envolvendo medições, o professor e os estudantes
poderiam expor os objetos encontrados em uma feira de conhecimento. Os pais dos
estudantes, assim como a comunidade, poderiam participar de uma pesquisa desse
tipo.

Mais do que mostrar os conteúdos matemáticos no dia a dia, essa pesquisa


mostra também a relação da Matemática com a resolução de problemas em
contextos sociais, econômicos e científicos, por exemplo. Enfim, mostra a
Matemática como uma atividade humana e social e pode desenvolver um significado
para essa disciplina junto às crianças.
Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico 153
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Outro exemplo de atividade pode relacionar os conhecimentos intuitivos que


as crianças possuem com os conhecimentos científicos. A noção de ângulo, por
exemplo, seria a região plana limitada por duas semi-retas de mesma origem. No
entanto, em suas brincadeiras, as crianças giram, rodam e assim possuem,
intuitivamente, a ideia de ângulo. Nas brincadeiras com skate, as crianças utilizam
expressões do tipo: “Vou dar um 180°” ou até mesmo “Vou dar um 540°”,
significando meia volta ou uma volta e meia. Pensamos que nessas brincadeiras a
ideia de ângulo como um giro está presente e poderia, em estudos posteriores de
trigonometria, ser recuperada para fundamentar o raciocínio periódico.

Esse exemplo mostra-nos que muitas definições matemáticas, embora


rigorosas do ponto de vista formal, podem não explicitar as ideias matemáticas que
elas sintetizam. Então, não deveríamos ensinar tão somente pela definição, mas sim
construir com os estudantes a definição. A definição seria o coroamento de ideias
trabalhadas ou recuperadas de contextos em que estão presentes.

4.7 Considerações finais

A utilização de medidas mostrou-se não somente como um eficiente processo


de resolução de problemas práticos como também desempenhou um papel
fundamental em várias relações envolvendo conteúdos matemáticos. A
compreensão dos números, em especial os fracionários, assim como de muitas
relações geométricas, é facilitada por causa das medidas.

4.8 Estudos complementares

No endereço <www.dominiopublico.gov.br> existem vários vídeos


relacionados às ideias discutidas nesta unidade, entre eles podem ser encontrados
vídeos sobre medidas, forma dentro de forma, quadrados, cubos, etc.

154 Espaço e Forma: o desenvolvimento do pensamento geométrico


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5
Operações fundamentais
– III: frações, números
decimais e porcentagem.
Mauro Carlos Romanatto

Licenciatura em Pedagogia
3 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.

ROMANATTO, Mauro Carlos. A matemática na formação de professores dos


anos iniciais : um olhar para além da aritmética / Mauro Carlos Romanatto,
Cármen Lúcia Brancaglion Passos. -- São Carlos : EdUFSCar, 2011. 107 p. --
(Coleção UAB-UFSCar)

Garçom: Em quantos pedaços divido essa pizza: seis ou oito?


Cliente: Em oito, pois hoje estou com fome.
Anônimo

5.1 Primeiras palavras

Nesta unidade, iniciaremos o estudo das frações procurando conceituar a


ideia de fração, suas diferentes representações, a noção de fração equivalente e as
operações com os números fracionários. As operações com frações são discutidas e
justificadas articulando-se as ideias com os algoritmos.

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 155


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5.2 Problematizando o tema

Os números fracionários representam a primeira ampliação dos conjuntos


numéricos. Nesse sentido, o trabalho do professor precisa atentar para o surgimento
de um novo tipo de número que expressa relações matemáticas diferentes daquelas
que envolvem o número natural. Por extensão, as operações fundamentais,
envolvendo os números fracionários, também precisam ser revistas em relação aos
números naturais.
Assim, o fato de que os números fracionários representam outras ideias
matemáticas e que essas ideias têm repercussões nas operações realizadas com
eles deve ser contemplado pelo trabalho docente para que o aprendizado desses
números ocorra significativamente. Como exemplo, temos os números decimais e a
porcentagem, que estão muito presentes em nosso dia a dia.

5.3 Considerações iniciais

Conta-se que o rei Sesóstris tinha dividido todo o Egito entre os egípcios. Deu
a cada um deles uma porção igual e retangular de terra, às margens do rio Nilo, com
a obrigação de que fosse pago por ano um imposto. Mas, no período das chuvas, o
rio inundava algumas dessas terras, levando parte delas.
Então, esses proprietários tinham que procurar o rei e explicar o que tinha
acontecido. Assim, o rei enviava medidores ao local a fim de saber quanto diminuiu
o terreno e o proprietário pagava o imposto segundo o que tivesse ficado de terra.
Os medidores utilizavam uma marcação com cordas, que seria uma espécie de
unidade de medida. As cordas eram esticadas e, assim, eles verificavam quantas
vezes aquela unidade de medida estava contida nos lados do terreno. Porém,
raramente essa medida dava certo no terreno, isto é, não “cabia” um número inteiro
de vezes nos lados do terreno. Diante disso, houve a necessidade de dividir a
unidade de medida e assim foi criado o número fracionário.
Esse aspecto da História da Matemática é essencial para a compreensão dos
números fracionários, pois este novo tipo de número é uma síntese de duas ideias:
quantidade e medida.

156 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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Quando lemos uma fração, por exemplo , e dizemos “dois terços” e não
“dois três” é porque esses números expressam ideias diferentes. E mais, uma fração
não é dois números, mas sim uma relação expressa por dois números.
As frações representam uma ampliação significativa dos conhecimentos das
crianças sobre números. Quando as crianças possuem um conhecimento sólido
acerca das noções de frações, podem usar esse conhecimento para descrever
fenômenos do mundo real e para aplicá-los a problemas envolvendo medidas,
partições, comparações, probabilidades e estatística. A compreensão de frações e,
por extensão, a dos números racionais, alarga a consciência que os estudantes têm
sobre a utilidade e o poder dos números e amplia o seu conhecimento sobre o
sistema numérico. Nos níveis elementares de escolaridade, é fundamental o
desenvolvimento de ideias e de relações que funcionarão como alicerces para
noções e capacidades mais avançadas.
O ensino de frações nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental deve ajudar os
estudantes a compreender esse conceito, a explorar as suas relações e a construir
noções de ordem e equivalência. Dado que as investigações sugerem que as
crianças constroem essas ideias lentamente, é importante que usemos materiais
manipuláveis, modelos e situações do mundo real juntamente a esforços
progressivos para que elas descrevam as suas experiências de aprendizagem por
meio da linguagem oral e de símbolos. Se, nesses anos da escolaridade, houver a
preocupação em enfatizar as ideias básicas, haverá a redução do tempo
habitualmente gasto, nas séries seguintes, para corrigir as concepções errôneas e
para superar as dificuldades processuais.
Todo o trabalho, nesses anos, deve envolver frações úteis na vida diária, isto
é, frações que sejam facilmente modeladas. O trabalho inicial com as frações deve
ser sugerido por experiências de partilha equitativa, tais como várias crianças
partilharem um conjunto de figurinhas (grandeza discreta) ou um chocolate
(grandeza contínua). A noção de unidade e a sua subdivisão em partes iguais são
fundamentais para compreender frações e decimais, quer se trate de repartir um
chocolate retangular ou um conjunto de figurinhas. Inicialmente, o ensino deve

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 157


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realçar a linguagem oral (um quarto, dois terços) e associá-la a modelos. Para iniciar
um modelo nessa área, podemos propor uma variedade de atividades, tais como
dobraduras com tiras de papel em partes iguais, descrições do tipo de partes
(quintos, por exemplo) e a quantidade de partes consideradas (dois quintos, por
exemplo).
Em uma atividade, os estudantes podem construir o todo, o inteiro, a unidade,
uma vez conhecida uma das partes.
O exemplo a seguir é uma interessante atividade dessa natureza:
“Se este pedaço é um quarto do todo, desenhe o todo”.

Figura 43: Representação da parte e do todo.

Contarmos nas ordens crescente ou decrescente por unidades de frações

1 1 1 1
, , ,
2 3 4 5
( ,etc.) uma atividade que ajuda as crianças a tomar consciência da
sequência de frações e as prepara quer para o cálculo mental, quer para o cálculo
com papel e lápis. Mais do que o estudante saber que, na notação a/b, a é o
numerador e b o denominador, é necessária a compreensão das relações que tais
termos representam. Em questões do tipo: “Qual das frações de um mesmo todo

158 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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3 2 2
5 6 6
representa um número maior, ou ?”, a resposta é bastante frequente. A
razão normalmente apresentada é o fato de 6 ser maior do que 5.
1 2
e ,
4 3
As frações propriamente ditas, tais como os símbolos só devem ser
introduzidas depois que as crianças desenvolverem as noções e a linguagem oral
que tornam os símbolos significativos, devendo estes ser cuidadosamente
associados quer a modelos, quer à linguagem oral.
O conhecimento do tamanho relativo das frações sustenta o sentido do
número e reforça compreensões básicas. A atividade ilustrada por figuras ajuda as
crianças a pensar sobre a quantidade (área) representada por uma fração.
Vejamos o retângulo a seguir, que ilustra esse tipo de informação.

Pode-se então questionar: Quanto vale a parte pintada do retângulo? Cerca

3 1 1
, ,
8 2 3
de menos que menos que ?
Qual a condição para responder essa pergunta?
Aconselhamos o uso de materiais manipuláveis para a exploração de
frações equivalentes e comparações de frações de um mesmo todo. Por exemplo,

1
2
com tiras de papel dobrado, as crianças constatam, facilmente, que representa a

3 2 3
, e que .
6 3 4
mesma porção que é menor do que Veja as representações de tiras de
papel:

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 159


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As crianças podem também usar o mesmo raciocínio, utilizando a

1 1
,
5 8
manipulação de tiras de papel, para concluir que é maior do que ou do que

1
,
10
porque quanto maior for o número de partes iguais em que o mesmo todo é
dividido, menor será cada uma dessas partes.
3 1
4 2
Os estudantes devem reconhecer, por exemplo, que está entre e 1, e

1 1 1
,
3 10 4
que é grande quando comparado a próximo do tamanho de e pequeno

5
.
6
quando comparado a
1
2
Devem, também, explorar frações de valor próximo de zero, de e de 1. As
experiências sobre o tamanho relativo dos números fracionários promovem o
desenvolvimento do sentido de número. Os estudantes precisam relacionar
numeradores e denominadores nas frações para obter a compreensão correta dos
tamanhos dessas frações, o que vai possibilitar, mais tarde, a localização exata na

9 5 1
, e
5 10 10
reta numérica. Assim, precisam ser entendidos, das mais diversas
maneiras, relativamente aos seus trabalhos.
160 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.
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Os materiais manipuláveis também podem ser usados com sucesso em


trabalhos exploratórios para as operações com frações, para que as crianças
resolvam problemas reais e possam fazer partições de conjuntos, relacionando essa
atividade com a divisão. Como exemplo, podemos citar que as crianças aprendem

1
d e 30
30
que é equivalente a 30 dividido por 3, o que as ajuda a relacionar as
operações com frações às operações com números naturais. Ainda em relação à
divisão, é importante que as atividades ou situações-problema abordem com
compreensão as ideias de partição e de medida associadas a essa operação.
Fazermos com que as crianças explorem, com modelos, as ideias de frações
decimais pode ajudá-las a compreender futuramente a representação decimal dos
números racionais. O ensino dos decimais deve incluir experiências informais que
relacionem frações com decimais, de forma que os estudantes comecem a
estabelecer conexões entre os dois sistemas. Trataremos desses aspectos ainda
nesta unidade.
Em relação às operações, é importante ressaltarmos que muitas destas que
envolvem frações diferem em alguns aspectos daquelas que envolvem os números
naturais. Um estudante que compreende os princípios básicos das relações entre
números naturais precisa descobrir como esses princípios operam com frações para
poder proceder efetivamente com essa outra espécie de número.
Os estudantes podem compreender que a evolução das ideias de número
está intimamente relacionada com as exigências das mais variadas operações. No
caso de 1 dividido por 2, o novo número criado é uma fração e tem como nome “um

1
2
meio”, sendo escrito, convenientemente, como . Certamente, em uma
apresentação a estudantes dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, uma fração
pode ser descrita como uma ou mais partes iguais da unidade, ou, talvez, como uma
das partes iguais de diversas unidades. Basicamente, porém, não se deve esquecer
que uma fração é um novo número, criado para ampliar os naturais.
As sugestões apresentadas para um trabalho diferenciado com as frações
não são únicas, mas são relevantes dentro do contexto do estudo ora apresentado.

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 161


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Quando da extensão das frações, ou seja, quando apresentamos os números


racionais nos anos seguintes do Ensino Fundamental, um trabalho eficiente, num
primeiro momento, seria a extensão de ideias que envolvam esse novo tipo de
número em atividades e situações-problema significativas. Assim sendo, a
formalização da noção e dos princípios do número racional seria, então, a síntese
a
de uma série de relações em que a forma b seria utilizada. Contextos, por exemplo,
em que as ideias de probabilidade, razão e proporção são trabalhadas poderão tanto

a
aprofundar quanto ampliar esse novo número escrito na forma b .

5.4 Algumas ideias de fração

A melhor forma de compreender as ideias relacionadas à fração será a partir


de situações-problema ou de um contexto em que a fração se faz presente.

Partição
Situação 1: dividir uma pizza em quatro partes iguais e comer três delas

3
4
(unidade: 1 pizza; o resultado é ou três quartos).
Situação 2: três quartos de um grupo de 12 pessoas (unidade: 12 pessoas; o
resultado é nove pessoas).
Esses exemplos envolvem grandezas contínuas e discretas e alguns
aspectos devem ser destacados no trabalho do professor. O primeiro seria a ideia de
unidade. Para as crianças, considerar que a unidade, ou o todo, equivale a 12 não é
tão simples. Elas precisam entender que nesse caso a unidade representa o número
de elementos do grupo, da coleção, do conjunto. E mais, é possível dividir
grandezas contínuas em qualquer número de partes iguais. Já nas grandezas
discretas, o denominador deve ser um divisor do número de elementos do grupo.
Assim, em um grupo de 12 pessoas, só poderíamos expressar frações cujos
denominadores fossem: 2, 3, 4, 6 e 12.

162 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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Quociente
Situação: dividir igualmente três pizzas entre quatro pessoas. Nesse caso,
3 3
4 4
o resultado da divisão de 3 por 4 é igual a . Portanto, o número representa o
quociente de uma divisão exata. Esse é um aspecto que deve ser ressaltado,
enquanto nos números naturais a divisão pode comportar um resto, nos números
fracionários a divisão é exata, ou seja, não tem resto.

Medida
Quanto de R$ 2,00 “cabe” em R$ 0,50?
A unidade monetária é interessante para as crianças compreenderem que R$
2,00 não “cabe” um número de vezes “inteira” em R$ 0,50, mas que parte de R$

1
4
2,00 “cabe” em R$ 0,50. A resposta será: (um quarto) de R$ 2,00 “cabe” em R$
0,50.

Número
A fração é também um número. Historicamente, foi a primeira ampliação dos

3
4
conjuntos numéricos. Assim, é um número, mais próximo de 1 do que de zero.
Algumas crianças sentem dificuldade em aceitar que fração é um número. É
compreensível que ocorram alguns obstáculos, afinal, até o aparecimento das
frações, todo número que as crianças conheciam era representado por um só
numeral, sendo que a fração, por sua vez, é representada por dois numerais (além
do traço horizontal) e esse número, a fração, não será nenhum dos dois numerais
que a compõem, individualmente, mas o todo. Assim, é nesse momento que pela
primeira vez as crianças se deparam com três símbolos para representar uma única
quantidade.

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 163


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Operador multiplicativo (divisão e multiplicação)


3
4
A fração de 60 pode ser obtida dividindo por 60 por 4 e multiplicando por 3,
ou multiplicando por 60 por 3 e dividindo por 4.
3
4
Ainda na ideia de operador multiplicativo, a fração pode ter interpretações
diversas, por exemplo:
3 1
4 4
a) = três vezes ;
3 3
4 4
b) = uma vez ;
3 3
4 4
c) = de um;
3 1
4 4
d) = de três.

Probabilidade
Uma fração também pode representar um contexto que envolve
probabilidade, pois esse conceito matemático é uma comparação (parte/todo) entre
os casos favoráveis e os casos possíveis. Discutiremos mais sobre robabilidade na
próxima unidade.
Romanatto (1997) afirma que os números fracionários modelam situações
nos mais distintos contextos. Para que esses números sejam plenamente
compreendidos, essas diversas situações em que eles estão presentes precisam ser
trabalhadas, pois são diferentes as noções matemáticas expressas por uma mesma

a
notação b .

164 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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5.5 Representação de frações

3
4
As frações podem ser representadas nas formas: barra fracionária ,
decimal (0,75), percentual (75%), três quartos (falada) e pictórica (desenhos em que
a fração que se quer é destacada por uma cor, por exemplo).
No início dos estudos com as frações, o professor poderia destacar um todo
(grandeza contínua) ou um grupo (grandezas discretas) e mantê-los até que as
ideias sobre esse novo número fiquem bem compreendidas.
Por que não falar ao mesmo tempo de frações, números decimais e
porcentagem? Essa é uma das propostas que trazemos para a Matemática ensinada
nos anos iniciais.
Primeiramente, é preciso considerar o mito de que a noção de fração surge
na criança bem antes das noções de porcentagem e de número decimal. Se
verificarmos a origem desse mito, encontraremos somente que essa ordem é
apenas curricular. Como afirmado anteriormente, frações, números decimais e
porcentagem se referem a um mesmo conceito; eles são representações de uma
mesma ideia.

1
10
Figura 44: Representação pictórica de , 0,1 ou 10%.

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 165


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1
100
Figura 45: Representação pictórica de , 0,01 ou 1%.
1
100
É importante considerar que ou 0,01 ou 1% indicam a mesma ideia
matemática, mas que possuem regras diferentes para ser manipuladas nas
diferentes operações. E o que acontece quando aplicamos a uma representação as
regras de outra? Em resumo, as representações podem ser sinônimos matemáticos,
mas se mal tratadas podem nos levar a distintas e falsas conclusões. Ampliaremos
esses aspectos quando abordarmos operações.

5.6 Frações equivalentes

Uma noção essencial no estudo dos números fracionários é a noção de


fração equivalente. Toda fração tem uma classe infinita de frações equivalentes. Por

1 2 4 8
, , , ...
2 4 8 16
exemplo, a fração tem um conjunto de infinitas frações equivalentes:

166 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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A noção de fração equivalente é importante para a comparação de frações


assim como para o trabalho com as operações de adição e subtração.

5.7 Operações com frações

As operações com os números fracionários devem começar com materiais


manipulativos. Com tiras de papel, pode-se trabalhar, principalmente nos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental, todas as operações com frações. Frações
equivalentes são decisivas em trabalhos com a adição e a subtração de números
fracionários, e atividades com materiais concretos podem fazer a diferença entre a
compreensão ou não dessas operações. Também as operações envolvendo a
multiplicação e a divisão de frações podem ter o seu pleno entendimento
extremamente facilitado com a utilização de materiais manipulativos.

Nos anos iniciais, o ensino das operações com frações deve associar os
materiais concretos com representações pictóricas para que o aprendizado ganhe
significado para as crianças. Assim, as representações formais seriam o coroamento
dessas compreensões.

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 167


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5.7.1 Adição e subtração

É comum propor a adição e a subtração de frações com o mesmo


denominador e, em seguida, como extensão, apresentar frações com
denominadores diferentes. Pensamos que deveríamos propor, inicialmente, essas
operações com denominadores diferentes, pois são nessas condições que a
necessidade de denominadores iguais se apresenta. O denominador de uma fração
está associado com a ideia de medida, e sabemos que só podemos adicionar ou
subtrair grandezas expressas numa mesma unidade de medida. Exemplificando:
1 1
+
2 3
Note que a representação considera o mesmo todo como referência:

Destacamos que inserir a noção de mínimo múltiplo comum (mmc) interrompe


o caminho natural da construção da ideia de fração. Além disso, esse conceito não é
imprescindível aos cálculos, pelo menos nos anos iniciais.

168 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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5.7.2 Multiplicação

2 4 4 2
x de
3 5 5 3
Resolver a multiplicação significa encontrar “quanto vale de um
todo”.
Primeiramente, a figura foi dividida em três partes iguais e, em seguida, foram

2
3
tomadas duas delas ( de um todo):

2
3
A seguir, os foram divididos em cinco partes iguais e tomadas quatro delas.

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 169


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Assim, o todo inicial foi dividido em 15 partes iguais e oito delas foram
tomadas.

5.7.3 Divisão

Vamos analisar as diferentes divisões com frações.


1
a) Fração por número inteiro: ÷2 =
2
Metade dividida por 2. Qual é o resultado comparado com o todo inicial?
1
Resp.:( ).
4

1
4
Observe que a parte referente ao resultado ( ) representa a quarta parte
do todo inicial.
2÷1
2
b) Número inteiro por fração: 2 =

Quantas metades cabem em dois todos?


Resp.: 4.

170 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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1 1 1 1
: ou :
2 3 3 2
c) Fração por fração
1 1
3 2
Na primeira divisão, podemos pensar em “quantas vezes cabe em e, na

1 1
2 3
segunda divisão, “quantas vezes cabe em ”. Vejamos as representações:

3
,
2
Na primeira divisão, a resposta é uma vez e meia ou e, na segunda

2
3
divisão, a resposta é de vezes.
Os algoritmos envolvendo as frações são até mais simples do que aqueles
que envolvem as operações fundamentais nos números naturais, mas em relação a
essas técnicas operatórias sua justificação é essencial para o seu aprendizado.
Dizer que na divisão de duas frações “conserva a primeira e multiplica pelo inverso
da segunda” é algo que necessita de uma comprovação tanto concretamente quanto
conceitualmente.

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 171


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PEDAGOGIA

1 1
Observe que na divisão ÷ realizada anteriormente, podemos encontrar o
2 3
resultado a partir da divisão de frações equivalentes às frações dadas, cujos
denominadores são iguais:

Na segunda divisão proposta, temos, então:

Após a realização de divisões a partir desse algoritmo, possivelmente os


estudantes poderão perceber o que está ocorrendo com os resultados (regra
geralmente ensinada nas escolas). E isso, provavelmente, não se dará nos anos
iniciais, os estudantes terão tempo para essa compreensão.
Por fim, é importante destacar que, da mesma forma que precisamos
reconceituar a noção de número natural para o pleno entendimento do que é um
número fracionário, isso também deve ser feito com as operações fundamentais e,
em especial, com a multiplicação e a divisão.
Nos números naturais, a multiplicação sempre aumentava (exceção de um
número multiplicado pela unidade) e a divisão sempre diminuía (exceção quando o
divisor era a unidade).
Agora, com os números fracionários, dependendo das frações, a multiplicação pode
aumentar, mas também pode diminuir. Vejamos o exemplo:
2 4 8
x =
3 5 15
A multiplicação
E na divisão de frações, dependendo das frações, o quociente pode

1
=4
2
aumentar: 2 :

172 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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5.8 Porcentagem

Um assunto que podemos também trabalhar com os números fracionários é a


porcentagem. Porcentagem é uma fração em que o denominador é 100, ou seja, um
todo que foi dividido em cem partes iguais.
3
4
Assim, se quisermos expressar a fração em porcentagem, devemos

3
4
transformá-la em uma fração equivalente cujo denominador seja 100. Então tem

75 3
100 4
como fração equivalente ( na fração multiplicamos 3 por 25 e 4 por 25),

3
4
portanto é o mesmo que 75%.
Ao trabalhar frações e porcentagem simultaneamente, é muito simples

3
4
determinar 25% de um todo, ou seja, basta determinar desse todo.

5.9 Algumas reflexões a respeito dos obstáculos com números decimais e


números fracionários

Estudos revelam que a dificuldade de representação de um número racional


está relacionada com a compreensão do conceito. Na pesquisa realizada por
Carpenter (1981, apud MATOS & SERRAZINA, 1996, p.247), 88% dos estudantes
de 9 anos e 40% dos estudantes de 13 anos apresentaram como resposta à
questão: “Qual dos números seguintes representa 37 milésimos? a) 0,037; b) 0,37;
c) 37; d) 37.000”, o número 37.000. Nesse mesmo estudo, quando os estudantes
foram questionados sobre “como se escreve três centésimos”, as respostas
equivocadas apresentadas foram: “0,300; 3,00; 3,0; 3,100; 00,3; 0,3”.
Em curso de formação continuada, uma professora nos relatou uma situação
ocorrida com seus estudantes da 3ª série. Na resolução do problema, fica evidente

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 173


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que, para esse estudante, a representação fracionária nada significa. Observem o


problema e a resolução:

Um estudo de Monteiro & Costa (1996) identificou estudantes com idades


entre 13 e 17 anos que apresentavam dificuldades com os números decimais. As
autoras mostram alguns exemplos:
• na adição de 4 com 1,3, alguns estudantes apresentaram como
resposta 1,7;
• na comparação entre 1,63 e 1,9, alguns estudantes justificaram que
“63 é maior que 9, então 1,63 é maior que 1,9”;
• na comparação para ver qual é maior entre 1,63 e 1,4, alguns
estudantes responderam que “1,4 é maior que 1,63 porque o
primeiro só tem décimos enquanto o outro tem décimos e
centésimos”.
Esses exemplos indicam que provavelmente o sistema de numeração decimal
não foi convenientemente compreendido pelos estudantes.
O ensino a partir da aplicação de regras mecanizadas, como, por exemplo,
“ao se multiplicar um número inteiro por 10 basta acrescentar um zero à direita do
último algarismo”, representará um obstáculo importante, pois quando se trata da
multiplicação por números decimais, essa regra não vale. Daí, não seria estranho
encontrar 437,560 como resposta para 437,56 × 10, ou 30,15 para 3,15 × 10.
O esforço para que as crianças compreendam as diferenças entre os
números naturais e os números decimais precisa ser intencionalmente enfrentado
pelo professor. Se as crianças fixarem a regra “quanto maior o número de dígitos
maior é o valor do número”, provavelmente continuarão a aplicá-la para os decimais,

174 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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cometendo equívocos decorrentes da forma com que lhes foi ensinado. Vejam
alguns exemplos de erros, a partir de questões colocadas aos estudantes, e as
justificativas apresentadas por eles:
• Ordenar do menor para o maior os seguintes números: 4,5; 4,15; 4,05. A
resposta mais frequente é: 4,05 < 4,5 < 4,15. Explicação: “O menor é o
que tem um zero, pois o 5 é menor que 15”.
• Qual é o maior número entre: 0,09; 0,385; 0,3; 0,1814? A resposta mais
frequente é 0,1814. A explicação é do mesmo tipo da questão anterior.
• É feita a leitura do número depois da vírgula como se se tratasse de um
número inteiro.
• Intercalar um decimal entre 1,23 e 1,24. Resposta: “Não há nenhum
número entre 1,23 e 1,24. O número 1,24 é o número seguinte a 1,23 ”.
Muitas vezes, os estudantes “inventam regras” que lhes permitam obter
resultados corretos. Essas regras podem ser desconhecidas para o professor se não
conduzirem a erros. Algumas regras implícitas para ordenar decimais que muitas
vezes os estudantes estabelecem são:
• “É menor o número que tem mais algarismos depois da vírgula”. A
aplicação dessa regra, que é falsa, pode conduzir a resultados certos em
alguns casos, por exemplo: 12,04 < 12,4; no entanto, é falsa em 12,413 <
12,4.
• “Aplicar a ordenação dos números inteiros aos números que estão antes
da vírgula e aos que estão depois da vírgula”. Muitas vezes, pode-se
chegar a resultados errados, por exemplo: 4,15 > 4,5 (15 é maior que 5).
Outras vezes, os estudantes aplicam regras válidas para outras situações,
como por exemplo:
 Na adição de duas quantidades, não se usa a regra conhecida (para números
naturais); é por isso que as crianças fazem tranquilamente:
1 2 3
+ =
4 3 7

 Na simplificação de frações, regras válidas para multiplicação não são válidas


para adição, por exemplo:

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 175


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15 3 x 5 3
= =
Na fração 20 4 x 5 4 , é possível simplificar os fatores 5 do numerador e

15 3 9 8+ 1 4
= , = = =4
20 4 3 2+ 1 1
do denominador, pois enquanto na adição a simplificação

9
3 = ≠4.
3
resulta em erro, pois
Na proposição de problemas, é necessário ter muito cuidado com as
possíveis interpretações que os estudantes podem ter. Vejamos um exemplo: “Em
um treino de futebol, Robinho chutou 10 vezes ao gol e marcou 3 gols e, em
seguida, chutou 6 vezes e marcou 3 gols”. Como expressar os gols feitos por
Robinho? Vamos analisar quatro possibilidades de interpretação:

1º modo:
10 6 16
+ = =5,3
3 3 3
é a média de gols de Robinho neste treino.

2º modo:
3 3 18 30 48 4
+ = + = = =0,8
10 6 60 60 60 5

Isso significa que Robinho acertou 80% dos chutes.

3º modo:
 3 em 10 resulta aproximadamente em 33%;
 3 em 6 resulta exatamente 50%;
 33 + 50 = 83.

Então, a média é de 83 ÷ 2 = 41,5%. Portanto, Robinho acertou 41,5%.

4º modo:
 16 chutes correspondem a 100%.

176 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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Os 6 gols marcados correspondem a x (um valor desconhecido). Podemos


determinar esse valor desconhecido resolvendo a equação resultante 16 × x = 6
×100, ou, por meio do cálculo resultante de uma regra de três simples:
(6 ×100) ÷16 é aproximadamente 37%. Portanto, Robinho acertou 37% dos chutes.
Os quatro modos de calcular são corretos? São equivalentes? Caso não, o
que houve de errado?
Esse exemplo nos indica que diante de um enunciado ou problema é preciso
compreender o que é informado e o que é pedido; em seguida, é preciso traduzir a
linguagem de apresentação para uma linguagem matemática e então, escolhida
esta, é preciso trabalhar com as normas específicas a ela e, inclusive, a
interpretação do resultado obtido (sem se esquecer de compará-lo com o bom
senso).

5.10 Considerações finais

Nesta unidade, procuramos mostrar a necessidade de trabalhar a noção de


número fracionário nas mais variadas situações e em diferentes contextos em que
ele pode modelar para que as mais diversas relações matemáticas expressas na

a
notação b tenham significado e sejam plenamente compreendidas. Como a
primeira ampliação dos conjuntos numéricos, esse conteúdo matemático é uma
excelente oportunidade de aprofundar ideias sobre números e operações
matemáticas como consequência de novas situações-problema práticas ou
especulativas propostas para a ciência matemática.
Assim como fizemos com as operações fundamentais envolvendo os
números naturais, a articulação entre as ideias e os algoritmos das operações com
os fracionários é um elemento a ser destacado.
O conteúdo de frações costuma ser um dos mais difíceis nos Anos Iniciais do
Ensino Fundamental e tal fato é atestado pelo baixo rendimento dos estudantes. A
construção do sentido de número fracionário não é uma tarefa que possa ser
resolvida em poucas aulas. É preciso encontrar caminhos para que o estudante
identifique essas quantidades em seu contexto cotidiano e possa se apropriar da

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 177


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ideia de número fracionário, usando-o com significado. É evidente que ninguém


comenta que comeu 0,25 de uma pizza, mas é importante compreender que esse

1
4
número corresponde ao mesmo uma pizza que foi dividida em quatro partes
iguais.
As pesquisas sobre essa temática são muitas, embora ainda não se tenha
muita certeza sobre a melhor maneira de se abordar esse tema nos anos iniciais.
Contudo, é certa a constatação de que os símbolos são obstáculos à compreensão
inicial do significado desses números pela criança. Isso quer dizer que se deve
dedicar razoável tempo inicial de aprendizagem não simbólica das frações.
É possível trabalhar uma variedade grande de problemas desafiantes para a
criança, antes mesmo de ela começar a aprender frações. Eles servirão para ela
pensar nessas quantidades, de maneira significativa e real, e podem servir de
ocasião para a introdução de nomes das partes que aparecem.

5.11 Estudos complementares

O leitor poderá ampliar seus estudos sobre frações consultando um


interessante material produzido pelo Instituto de Ciências Matemáticas e de
Computação (ICMC) da USP de São Carlos, que se encontra disponibilizado na
web: <http://educar.sc.usp.br/matematica/m5let2.htm>. Acesso em: 18 jun. 2010.
Consulte também:
IMENES, L.M.; LELLIS, M.; JAKUBO, J. Frações e números decimais. São Paulo:
Atual, 1990. (Coleção Prá Que Serve a Matemática).
Trata-se de um livro paradidático muito interessante, que em uma linguagem
simples apresenta as frações e números decimais a partir de fatos históricos e
cotidianos.
MACHADO, N.J. O pirulito do pato. São Paulo: Scipione, 1989. (Coleção História
de
Contar).

178 Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem.


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PEDAGOGIA

Trata-se de outro livro paradidático indicado para crianças que estão iniciando
a escolarização. Conecta a Literatura Infantil com a Matemática numa história muito
divertida.
RAMOS, L.F. Doces frações. São Paulo: Ática, 2000.
Esse é outro livro que sugere a conexão entre a Literatura Infantil e a
Matemática. Conta a história de uma avó que prepara tortas para serem vendidas
aos pedaços.
MIGUEL, A.; MIORIM, M.A. O ensino de Matemática no 1º grau. São Paulo: Atual,
1987. (Coleção Magistério).
Trata-se de um livro muito bom que aborda a Matemática na formação do
professor que a ensina.

La estadística es la ciencia de los datos. Con más precisión, el objeto


de la estadística es el razonamiento a partir de datos empíricos. La
estadística es una disciplina científica autónoma, que tiene sus
métodos específicos de razonamiento. Aunque es una ciencia
Matemática, no es un subcampo de la Matemática. Aunque es una
disciplina metodológica, no es una colección de métodos. Moore.
Teaching Statistics as a respectable subject.

Operações fundamentais – III: frações, números decimais e porcentagem. 179


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PEDAGOGIA

6
O desenvolvimento do
pensamento estocástico
Mauro Carlos Romanatto

Licenciatura em Pedagogia
4 O desenvolvimento do pensamento estocástico

ROMANATTO, Mauro Carlos. A matemática na formação de professores dos


anos iniciais : um olhar para além da aritmética / Mauro Carlos Romanatto, Cármen
Lúcia Brancaglion Passos. -- São Carlos : EdUFSCar, 2011. 107 p. -- (Coleção UAB-
UFSCar)

6.1 Primeiras palavras

Esta unidade será dedicada a reflexões sobre o desenvolvimento do


pensamento estocástico na formação dos professores da Educação Infantil e dos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Verificar que podemos inferir informações e conhecimentos sobre uma


população a partir dos dados coletados de uma amostra significativa é outro
conteúdo importante no contexto atual, em que o raciocínio probabilístico predomina
sobre o determinístico nos mais variados campos científicos. A Estatística pode ser
trabalhada desde a Educação Infantil e pode preparar a criança para pensar sobre
fatos, fenômenos e eventos em termos de probabilidade.

180 O desenvolvimento do pensamento estocástico


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6.2 Problematizando o tema

Qual a razão da inserção dos raciocínios estatístico, probabilístico e


combinatório no currículo de Matemática desde os Anos Iniciais da Escola Básica?
Quais as relações ou implicações dessa inserção com a formação e atuação dos
professores nesse nível de ensino? As propostas curriculares de Matemática
justificam a importância desses temas na formação dos estudantes, destacando que
isso contribuirá para o desenvolvimento de uma aprendizagem significativa,
decorrente da demanda social atual. Tais propostas sugerem também que o bloco
Tratamento da Informação integre as noções de estatística, de probabilidade e de
combinatória.

Contudo, Lopes (2010a) pondera que se a estocástica (termo utilizado para


tratar da probabilidade integrada à estatística) for incluída apenas como mais um
tópico a ser estudado nas aulas de Matemática, priorizando a parte da estatística
descritiva, seus cálculos e fórmulas, em nada contribuirá para o desenvolvimento do
pensamento estatístico e probabilístico. Esses pensamentos envolvem a estratégia
de resolução de problemas e a análise sobre os resultados obtidos.

Lopes (2010a, p. 60) comenta que a competência em probabilidade e


estatística permite

aos alunos uma sólida base para desenvolverem estudos futuros e


atuarem em áreas científicas como a biologia e as ciências sociais.
Além disso, ao considerarmos o mundo em rápida mudança como o
que estamos vivendo, é imprescindível o conhecimento da
probabilidade de ocorrência de acontecimentos para agilizarmos a
tomada de decisão e fazermos previsões

Nesse sentido, faz-se necessário tratar essa temática por meio de problemas
próximos dos contextos dos estudantes, para que eles “possam observar e construir
os eventos possíveis, por meio da experimentação concreta de coleta e de
organização de dados” (LOPES, 2010a, p.58-59). Nessa perspectiva didática, a

O desenvolvimento do pensamento estocástico 181


CURSO SUPERIOR DE
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PEDAGOGIA

aprendizagem da estocástica cumprirá o papel de complementar a formação dos


estudantes significativamente.

6.3 O tratamento de dados

A perspectiva teórica que consideramos pertinente para a formação do


pensamento estocástico requer que o professor assuma uma postura de respeito
aos saberes dos estudantes. O professor precisará discutir temáticas do contexto
que interferem na qualidade de vida das pessoas e que normalmente são
comentadas na sala de aula. A análise de questões sociais, que aparentemente não
interessariam aos estudantes, deverá fazer parte das aulas de Matemática.

Essa análise de fatos que determinam a condição de vida do cidadão (como a


poluição de rios e oceanos, a escassez da água, o problema do lixo urbano e
industrial, a precariedade da saúde, o trabalho infantil e muitos outros) faz parte dos
chamados temas transversais nos Parâmetros Curriculares Nacionais e, quase
sempre, é acompanhada de índices, tabelas e gráficos, os quais podem ser
discutidos em sala de aula.

O professor precisará prestar atenção ao que os estudantes dizem e


escrevem e deverá observar no trabalho de sala de aula se estes estão “fazendo”
Matemática. Essa perspectiva teórico-metodológica contribuirá para que o professor
perceba o que eles compreendem sobre as ideias matemáticas. Essas informações
conduzirão o planejamento do professor.

A problematização dos temas relacionados à estocástica, princípio norteador


da aprendizagem da Matemática, já mencionado anteriormente, pode possibilitar o
desenvolvimento do trabalho com estatística e probabilidade na escola. A Estatística
também se desenvolveu por meio da resolução de problemas de ordem prática da
humanidade. Lopes (2010a) diz que não teria sentido propor uma coleta de dados
desvinculada de uma situação-problema, nem a construção de tabelas e gráficos
desvinculados de um contexto ou relacionados a situações que não são próximas
dos estudantes, pois não garantiria o desenvolvimento da criticidade deles.

182 O desenvolvimento do pensamento estocástico


CURSO SUPERIOR DE
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Batanero & Godino (2010) explicam que a Estatística costuma ser dividida em
estatística descritiva e estatística inferencial. A estatística descritiva tem como
finalidade apresentar resumos de um conjunto de dados e suas características,
sendo geralmente representada graficamente. Os dados são usados para fins
comparativos e não são utilizados princípios da probabilidade. O essencial, nesse
caso, é a descrição do conjunto de dados, sem a pretensão de estender as
conclusões a outros dados ou a uma população. A inferência estatística, pelo
contrário, estuda os resumos de dados com referência a um modelo probabilístico.
Ou seja, um conjunto de dados analisados que se constitui em uma amostra de uma
população, sendo o interesse principal prever o comportamento de toda a
população.

Geralmente, as pesquisas realizadas por órgãos governamentais têm


interesse em conhecer a totalidade de uma população. O estudo estatístico
realizado nessa perspectiva denomina-se Censo, que, no Brasil, tem sido realizado
a cada 10 anos.

O currículo de Matemática tem de incluir situações que envolvam as ideias de


acaso e de aleatório, pois, do contrário, estaremos reduzindo o seu ensino ao
verdadeiro e falso de suas proposições.

Godino et al. (1987 apud LOPES, 2010a, p.63) defendem que a educação da
intuição probabilística na escola básica possibilite que os estudantes se tornem mais
conscientes da “natureza probabilística de distintos jogos de azar (loterias, máquinas
caça-níqueis, bingos, etc.), jogos que são magníficos negócios para aqueles que os
promovem e um risco desproporcional de perder dinheiro para aqueles que
apostam”.

A ação docente para que essa perspectiva seja inserida nas aulas de
Matemática é primordial. Podemos evocar Paulo Freire, para quem a educação é um
ato político, e o educador matemático D’Ambrosio (1996), o qual destaca que se
algum professor julga sua ação politicamente neutra, não entendeu nada de sua
profissão.

O desenvolvimento do pensamento estocástico 183


CURSO SUPERIOR DE
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O estudo da probabilidade e chance requer que os estudantes entendam


conceitos e termos relacionados à chance, à incerteza e à aleatoriedade, com as
quais cotidianamente convivemos. Outras ideias importantes que devem ser
discutidas nas séries iniciais dizem respeito ao fato de que algumas vezes nossas
intuições são incorretas e nos levam a conclusões erradas. Lopes (2010a, p.70)
destaca que para uma pessoa ser educada estatisticamente, deverá “ser capaz de
comunicar efetivamente as discussões sobre os resultados de investigações
estatísticas, críticas estatísticas ou argumentos probabilísticos que clamam estar
baseados em alguma informação”.

As crianças têm de criar e recriar conhecimentos, precisam desenvolver a


curiosidade, a imaginação e a criatividade, o que justifica a presença da Matemática
desde a Educação Infantil. Nessa perspectiva, o desenvolvimento do pensamento
estatístico e probabilístico deverá ser inserido nessa faixa de escolarização,
contribuindo para a formação desde a infância. Propostas de tarefas que envolvem
aleatoriedade e estimativas, experiências de coletar, representar e analisar dados
que sejam significativas para as crianças podem ampliar o universo de capacidades
e acentuar o potencial criativo delas.

As orientações curriculares indicam que desde a Educação Infantil é


importante a inclusão de experiências com análise de dados para que os estudantes
sejam capazes de classificar objetos de acordo com seus atributos e que possam
organizar e representar dados usando objetos concretos, desenhos e gráficos. São
indicadas atividades informais de classificação para que as crianças se habituem a
formular questões, testar suas hipóteses e para que, gradativamente, possam
progredir de modo a serem capazes de ver um conjunto de dados como um todo e a
usarem as características estatísticas para comparar um conjunto de dados.

Batanero & Godino (2010) sugerem que sejam realizadas atividades a partir
de características da classe e dos estudantes na primeira etapa da escolarização, as
quais ajudarão no desenvolvimento do raciocínio estatístico e probabilístico. Os
autores consideram importante envolver os estudantes em projetos em que estes
reconheçam seus próprios dados a partir da observação, como por exemplo:

184 O desenvolvimento do pensamento estocástico


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 De que cor são os olhos das crianças da sala?

 Qual tipo de trabalho exercem as mães e/ou os pais?

 Com que tipo de calçados as crianças da sala estão em um determinado dia?

Segundo os referidos autores, atividades desse tipo contribuem para os


estudantes perceberem que cada fato isolado é parte de um todo (distribuição dos
dados) e que há questões que não podem ser respondidas com apenas um dado,
mas sim com uma distribuição de dados.

Encontramos em Lopes (2010a, p.65) exemplos de atividades, de diferentes


partes do mundo, que podem favorecer o desenvolvimento do pensamento
probabilístico desde o início da escolarização. Apresentaremos uma delas.

A proposta era fazer a ordenação de eventos de acordo com a probabilidade


de ocorrência. Para tanto, foram apresentadas às crianças (de 4 a 11 anos) quatro
cartas com as seguintes afirmações:

 Talvez chova amanhã.

 Um elefante vai passar em frente à escola amanhã.

 Eu vou ganhar na loteria.

 Eu virei à escola amanhã.

Foi solicitado às crianças que colocassem as cartas em ordem: do que fosse


mais provável para o que fosse menos provável.

A ordenação das cartas deveria vir acompanhada de argumentos (ou as


razões) para que as crianças optassem por tal ordem.

Na sequência, foi sugerida a introdução de uma escala, primeiramente


utilizando o vocabulário: “certo”, “possível” e “impossível”.

A autora comenta que as crianças de seu estudo, ao longo dessa atividade,


foram incentivadas a criar outras categorias, tais como “certamente provável”,
“provável”, “improvável” e “certamente improvável”.
O desenvolvimento do pensamento estocástico 185
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Após esse momento, introduziram a escala numérica: 0 para o impossível e 1


para o certo.

Observamos na dinâmica desenvolvida durante a atividade que novos


conceitos foram trabalhados sem que tenham sido formalizados.

Outro aspecto relevante para que a estocástica seja abordada refere-se à


habilidade de construir, ler e interpretar tabelas e diferentes gráficos que serão
solicitados com frequencia na resolução de problemas, tanto no contexto escolar
quanto fora dele. Nesse sentido, tarefas que conduzam os estudantes a selecionar,
organizar, relacionar e interpretar dados, informações e conhecimentos
representados de diferentes formas, para enfrentar situações-problema, possibilitará
que, aos poucos, os estudantes adquiram uma visão crítica e possam tomar
decisões a partir de análises.

São vários os temas que podem fazer parte das aulas de Matemática nos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental e que proporcionam a oportunidade de se
trabalhar a organização e a representação de dados.

Uma atividade inicial pode se dar a partir do levantamento das idades dos
estudantes da turma. O levantamento poderá ser feito, inicialmente, por meio da
tabulação e organização desses dados em uma tabela, como a exemplificada a
seguir, e, posteriormente, poderá ser construído um gráfico de colunas. Utilizando
papel quadriculado, as crianças terão a oportunidade de pintar quadradinhos
correspondentes ao número de crianças de cada idade

A tabela de frequência está organizada de modo que na primeira coluna foi


registrada a categoria da variável em estudo (no caso, idade, em anos, das crianças
de uma turma) e, na segunda coluna, a variável da frequência absoluta, em que se
registra o total de elementos da amostra (turma de crianças da classe) que

186 O desenvolvimento do pensamento estocástico


CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
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pertencem a cada categoria. Há tabelas que têm ainda uma terceira coluna, a das
frequências relativas (ou percentuais), em que se coloca, para cada categoria, o
valor que se obtém dividindo a respectiva frequência absoluta pelo total. A quarta
coluna, relativa à porcentagem, também é bastante utilizada para o registro de
dados.

Utilizando a tabela anterior, teríamos então:

Tabela 2: Número de crianças por idade, com frequência relativa e percentual.

Notem como fica a tabela com a linha relativa ao total de dados:

Tabela 3: Número de crianças por idade, com dados totalizados.

Tabelas desse tipo contribuirão para a construção e análise de gráficos de


setores que nos reportaremos ainda nesta unidade.

A partir do levantamento dos dados, da construção da tabela de frequência


pode ser construído o gráfico de colunas. O gráfico a seguir representa os dados
trazidos na tabela que estamos nos referindo.

O desenvolvimento do pensamento estocástico 187


CURSO SUPERIOR DE
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Gráfico 1: Gráfico de colunas: Número de crianças por idade.

Será fundamental explorar com as crianças o gráfico de colunas, ou seja,


será importante explicar-lhes a representação dos dois eixos. No eixo horizontal
serão escritas as idades das crianças da sala e, no eixo vertical, a contagem
orrespondente a cada uma das idades. O papel quadriculado será útil para iniciar o
estudo de gráficos, pois facilita que seja obedecida a mesma distância entre as
linhas.

O gráfico de barras simples também é bastante utilizado para representar a


organização dos mesmos dados anteriores.

188 O desenvolvimento do pensamento estocástico


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Gráfico 2 : Gráfico de barras: Número de crianças por idade.

O gráfico de barras simples também é bastante utilizado para representar a


organização dos mesmos dados anteriores.

Se a escola dispuser de laboratório de informática, esses gráficos poderão


ser construídos com aplicativos do próprio sistema de computador, como, por
exemplo, com planilhas do tipo Excel.

A representação desses mesmos dados não seria indicada em um gráfico de


linhas. O leitor saberia dizer por quê? Investigar a respeito será bastante
interessante.

O gráfico de linhas é indicado para os chamados dados contínuos, que


resultam de medições de, por exemplo, tempo e altura das pessoas. Já os gráficos
de colunas, ou barras, são indicados para os chamados dados discretos, resultantes
da contagem, por exemplo, do número de estudantes, de carros, etc.

Já a representação desses dados em gráfico de setores poderá ser feita


desde que o total de crianças da turma seja conhecido. Gráficos de setores são
utilizados quando se deseja comparar cada uma das partes com o todo da
população.

O desenvolvimento do pensamento estocástico 189


CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

Nos anos iniciais, não é indicado que os estudantes construam gráficos de


setores, pois tal construção envolve o conhecimento de elementos da circunferência
e de círculo, que é a figura geométrica representada nesse tipo de gráfico. Na
construção de um gráfico de setores, o círculo deverá ser dividido em tantos setores
circulares quantas forem as categorias consideradas na tabela de frequência. O
ângulo de cada setor será proporcional à frequência observada na classe que lhe
corresponde. Para a construção desses setores, é necessário que se domine
conceitos sobre ângulos e proporcionalidade, assuntos que não são estudados nos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental. Contudo, é interessante entender o setor
circular correspondente a cada círculo. Nesse caso, os estudantes poderão
interpretar dados apresentados em gráficos de setores. Muitas vezes, o gráfico de
setor está expresso em porcentagem. No caso dos dados trabalhados
anteriormente, teríamos:

Gráfico 3: Gráfico de setores: Número de crianças por idade.

Também é muito utilizado nos anos iniciais o gráfico de setores com dados
percentuais. Com os mesmos dados da tabela do número de crianças por idade,
temos um gráfico de setores com dados percentuais.

190 O desenvolvimento do pensamento estocástico


CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

Gráfico 4: Gráfico de setores: Porcentagem de crianças por idade.

Também é muito utilizado nos anos iniciais o gráfico de setores com dados
percentuais. Com os mesmos dados da tabela do número de crianças por idade,
temos um gráfico de setores com dados percentuais.

Como destacado anteriormente, as habilidades de ler gráficos e interpretar


tabelas não são assuntos apenas para serem utilizados no ambiente escolar. Para
ler jornais e revistas, não basta ser alfabetizado em língua materna. Milhares de
informações são divulgadas a todo o momento pela rede mundial de computadores
via internet e não podemos esquecer que as crianças desta geração dominam muito
mais as tecnologias informáticas do que muitos adultos. Assim, para acompanhar
esse desenvolvimento de forma crítica e criativa, é indispensável saber ler e
compreender tabelas e gráficos.

Além dos tipos de gráficos citados anteriormente, há outros. Mas nos anos
iniciais, são basicamente estes os mais explorados.

Ultimamente, temos convivido com muitos dados apresentados em gráficos


pictóricos. Os pictogramas são representações gráficas que utilizam figuras, o que
faz com que essas representações se tornem ilustrações de uma situação.

Como alertam alguns pesquisadores, há casos em que essas representações


são utilizadas erroneamente, como o apresentado por Martins, Loura & Mendes
O desenvolvimento do pensamento estocástico 191
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PEDAGOGIA

(2007, p. 78), em que se pretende mostrar que a quantidade de leite de uma


determinada marca, vendida em um determinado período, duplicou.

Gráfico 5: Gráfico pictórico equivocado (Martins , Loura & Mendes, 2007, p. 78).

Verificamos que de fato a representação da altura da caixa de leite em 1991 é


o dobro da representação de 1985. Contudo, podemos ter a impressão que o
aumento foi bem mais que o dobro, induzindo ao erro de análise. As autoras
sugerem que se se quiser manter o gráfico fazendo uso da caixa de leite, deve-se
manter outros elementos dela e dobrar apenas a altura.

Gráfico 6: Gráfico pictórico aceitável (Martins , Loura & Mendes, 2007, p.78).

192 O desenvolvimento do pensamento estocástico


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LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

Podemos dizer, depois dessas considerações, que o bom senso será um


elemento muito importante em práticas escolares que farão parte das aulas em que
o desenvolvimento do conteúdo de análise de dados se fizer presente. Como já
comentado, o professor deverá ter em mente que a formação do pensamento
estocástico requer tempo e muita reflexão. A escolha das temáticas precisa emergir
do contexto dos sujeitos que estão em processo de aprendizagem. A análise de
questões sociais, que aparentemente não interessariam aos estudantes, poderá ser
inserida desde os anos iniciais de escolarização, contribuindo para a formação de
cidadãos mais conscientes do papel que desempenham na sociedade.

Além disso, destacamos que não basta apenas introduzir esses conteúdos
nas aulas de Matemática. É preciso analisar e relacionar criticamente os dados
apresentados, ponderando até mesmo a veracidade deles. Fazer essa análise é o
que nos permitirá desenvolver o pensamento estatístico. Como ressalta Lopes
(2010a, p.60), “não é suficiente ao aluno desenvolver a capacidade de organizar e
representar uma coleção de dados, faz-se necessário interpretar e comparar esses
dados para tirar conclusões”.

Na próxima sessão, apresentaremos algumas reflexões sobre o pensamento


combinatório e o probabilístico, que são igualmente importantes na construção do
pensamento estocástico.

6.4 O pensamento combinatório

Ao trabalharmos com as ideias de multiplicação, uma delas refere-se ao


pensamento combinatório, que muitas vezes encontra apoio metodológico em
desenhos e pinturas. Um problema bastante comum é aquele que se refere às
possibilidades de “combinar” camisetas e bermudas e que é colocado aos
estudantes em início de escolarização. Por exemplo, “no armário de Mariana há três
blusas de cores diferentes e duas calças também de cores diferentes. De que
maneira Mariana pode escolher a roupa para se vestir?”.

O desenvolvimento do pensamento estocástico 193


CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

Figura 46: A calça mais escura com cada uma das blusas forma três possibilidades
para Mariana se vestir.

Figura 47: A calça mais clara combinada com cada uma das blusas forma três
possibilidades para Mariana se vestir.

Depois de explorar a situação problema, utilizando o desenho das peças de


roupas, geralmente os estudantes são questionados sobre o número de maneiras
194 O desenvolvimento do pensamento estocástico
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LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

diferentes que Mariana pode se vestir. A sucessão de tarefas semelhantes à


apresentada será promotora do desenvolvimento do pensamento combinatório e
auxiliará na organização e apresentação de dados antes da introdução formal da
multiplicação. Além disso, os problemas de raciocínio combinatório contribuem para
o desenvolvimento de conceitos de probabilidade e estatística.

6.5 O pensamento probabilístico

O conhecimento informal, ou intuitivo, da probabilidade de ocorrência de


acontecimentos faz parte das decisões que tomamos todos os dias. Mas é na escola
que esse conhecimento precisa ser trabalhado para que possamos tomar essas
decisões de maneira mais bem fundamentada. Tal conteúdo é tão importante quanto
os outros estudados na escola, como Geometria ou Aritmética.

A resolução de problemas é um bom começo para o trabalho com


probabilidade na escola. Vamos supor a seguinte situação-problema:

a) Lançar uma moeda 100 vezes. Mas, antes de iniciar os lançamentos,


responda: quantas vezes você espera que saia “cara”?

b) Faça as jogadas. Registre os resultados em um tabela semelhante ao


apresentado a seguir:

c) Analise sua predição inicial (item a). Ela se confirmou ou não?

A situação apresentada coloca em xeque o que pode ocorrer mesmo que a


probabilidade de um evento esteja correta. Se uma moeda tem duas faces, a
probabilidade de sair “cara” é igual a probabilidade de sair “coroa”, ou seja, 50% de
chance para cada uma. A ocorrência de 50 eventos com cada face pode não
acontecer de fato.

Essa discussão inicial pode ser trazida para os anos iniciais no bloco
Tratamento de Informações, considerando que cada vez mais contextos como esse

O desenvolvimento do pensamento estocástico 195


CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

têm entrado no nosso cotidiano, tais como o controle de qualidade de peças, dados
relativos a nascimentos e à expectativa de vida, entre outros. Além disso, os
princípios probabilísticos têm se tornado instrumento de trabalho para muitas áreas
do conhecimento. Muitos fenômenos são tratados matematicamente mediante
simulações aleatórias.

O desafio que temos está em como introduzir esse conteúdo na Matemática


escolar. Há a necessidade de se romper com a visão determinista que essa
disciplina constrói. Não é um tema fácil de ser aprendido nem ensinado.

Lidar com o acaso e o azar não é tarefa fácil, nem intuitiva. Estudos apontam
que as pessoas não têm intuição probabilística da mesma forma que têm a intuição
geométrica ou visual, por exemplo.

Santos (2010) explica que não é difícil para um estudante aceitar que a
probabilidade de obter cara no lançamento de uma moeda é a mesma de obter
coroa; no entanto, durante a realização do experimento, a incerteza se torna um
conflito. Ocorrem muitas dúvidas sobre quantos seriam os lançamentos mínimos
para que o experimento seja confiável.

Uma proposta que a autora sugere consiste em colocar os estudantes diante


de experimentos, possibilitando-os de realizar alguns deles, em que suas crenças a
respeito de um evento sejam explicitadas. O papel do professor nesse processo será
o de propiciar os experimentos, ouvir o que os estudantes têm a dizer e confrontar
pontos de vista. A ele cabe ainda promover a troca de opiniões e ponderar sobre as
respostas dos estudantes. O importante é que todos entrem no movimento proposto
pela atividade e que as crianças possam se desenvolver em um ambiente de
desafios, problematizador, em que a curiosidade possa ser trabalhada de forma
intencional pelo professor.

196 O desenvolvimento do pensamento estocástico


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LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

6.6 Estudos complementares

No artigo de Souza (2008), o leitor poderá conhecer uma experiência muito


interessante de uma proposta didático-pedagógica para a abordagem de estatística
realizada com crianças de 5 e 6 anos de uma escola municipal.

SOUZA, A.C.A análise das etapas de uma proposta didático-pedagógica para a


abordagem de algumas idéias estatísticas com alunos de Educação Infantil. In:
LOPES, C.E.; CURI, E. (Orgs.). Pesquisas em Educação Matemática: um encontro
entre a teoria e a prática. São Carlos: Pedro & João Editores, 2008. p. 21-42.

Lopes & Moura (2002) propõem, numa linguagem simples, diferentes


possibilidades de desenvolver o estudo de estocástica com as crianças.

LOPES, C.E.A.; MOURA, A. R. L. (Orgs.). Encontro das crianças com o acaso, as


possibilidades, os gráficos e as tabelas. Campinas: Editora Gráfica FE/Unicamp,
Cempem, 2002. v. 1.

Em outro livro de Lopes & Moura (2003), o leitor poderá ampliar seu
conhecimento sobre a temática apresentada.

LOPES, C.E.A.; MOURA, A. R. L. (Orgs.). As crianças e as idéias de número,


espaço, formas, representações gráficas, estimativa e acaso. Campinas:
FE/Unicamp, 2003.

O desenvolvimento do pensamento estocástico 197


CURSO SUPERIOR DE
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PEDAGOGIA

7
Planejamento de
atividades e materiais de
ensino na área da
matemática nos anos
finais do ciclo de
alfabetização: laboratório
de ensino de matemática
Fredy Coelho Rodrigues

Licenciatura em Pedagogia
5 Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
alfabetização: laboratório de ensino de matemática
RODRIGUES, Fredy Coelho. Laboratório de Educação Matemática: Descobrindo
potencialidades do seu uso num curso de formação de professores. 2011. 199
p. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências e Matemática)- PUC-Minas,
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2011. 1.
Disponível em:
<http://www.biblioteca.pucminas.br/teses/EnCiMat_RodriguesFC_1.pdf>. Acesso
em: 02 jul. 2018.

Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
198
alfabetização: laboratório de ensino de matemática
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7.1 Do laboratório de ciências e matemática ao laboratório didático

O ensino de Ciências e a proposta do ensino experimental

De acordo com Arnoni, Koike e Borges (2005), o ensino de Ciências no


Brasil encontra-se “distante da realidade dos alunos”. O modelo de ensino baseado
na transmissão do saber científico faz com que o aluno perca o interesse facilmente
pelo conteúdo a ser aprendido, uma vez que a intrusão desse conhecimento o leva a
assimilar informações prontas, sem conexão com a sua realidade social (ARNONI;
KOIKE; BORGES, 2005). Os autores consideram que esse modelo de ensino
impossibilita o aluno ter uma participação ativa no processo ensino-aprendizagem.
Segundo Alves (2002), essa concepção empirista de ensino vem sendo alvo
de muitas críticas. O autor aponta que uma alternativa a esse problema seria a
adoção de uma nova concepção de ensino (construtivista), que pudesse considerar
o aluno como um sujeito ativo e reflexivo, que traz consigo uma história de vida, com
experiências pessoais e conhecimentos prévios, a partir dos quais consegue
transformá-los em conhecimento científico, podendo, assim, dar explicações
próprias para as suas relações sociais no ambiente onde está inserido. Nessa nova
concepção de ensino, muitos autores defendem que o processo
ensinoaprendizagem seja resultante de um “processo interativo e não de um
processo unilateral” (ALVES, 2002, p.1). Essa concepção de ensino-aprendizagem
se faz presente em Vygotsky (2009) e será adotada no decorrer deste trabalho.
De acordo com Arnoni, Koike e Borges (2005), os trabalhos de Amaral
(1990), Fracalanza (1992) e Melo (2000) apontam, de uma maneira geral, para a
necessidade de se renovar o Ensino de Ciências indicando, para isto, possibilidades
de inovações metodológicas em seu componente curricular, tais como:
a) relacionar o estudo de Ciências ao entendimento do dia-a-dia do aluno;
b) incentivar as habilidades e qualidades dos alunos;
c) tornar os alunos participativos;
d) valorizar os conhecimentos prévios dos alunos;
e) trabalhar com a realidade sociocultural; e

Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
199
alfabetização: laboratório de ensino de matemática
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LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

f) utilizar a atividade experimental como uma possibilidade de tornar o ensino


de Ciências mais atrativo aos olhos do estudante. (ARNONI; KOIKE; BORGES,
2005, p.284).
Em relação a essas propostas para o ensino de Ciências, Arnoni, Koike e
Borges (2005) citam, portanto, que duas recomendações básicas delineiam-se em
torno da discussão destas propostas: “[...] centrar-se no saber do aluno e
desenvolver atividades experimentais sobre o conteúdo científico.” (ARNONI;
KOIKE; BORGES, 2005, p.284). Estes autores consideram que o objetivo dessas
duas recomendações é permitir que o aluno, ao realizar atividades experimentais no
estudo dos conteúdos de Ciências, possa construir o seu conhecimento científico a
partir do seu saber inicial e, então, a partir disso, transformar a sua realidade social a
partir desses novos conhecimentos.

7.2 O surgimento das atividades experimentais e o Laboratório de Ciências

As atividades experimentais datam do final do século XVIII, período em que


somente algumas universidades dispunham de laboratórios reservados para
realização destas atividades. Com o passar do tempo, por meio da influência da
universidade no currículo de Ciências, o ensino experimental passou a ser
disseminado nas escolas e colégios com o objetivo de melhorar a aprendizagem dos
conteúdos científicos através da possibilidade de aplicação prática da teoria
estudada (GALIAZZI et al. 2001).
De acordo com Benini (2006), durante a segunda metade do século XIX, a
Ciência passou por uma fase de transformação muito grande com o surgimento das
Geometrias de Riemann e Lobachevsky. Neste período, repensou-se todo o
conceito de Ciência até então aceito, colocando-se em prova a Geometria
Euclidiana. Todo esse abalo provocado contribuiu para a ampliação do campo de
investigação da Matemática como também de todas as outras Ciências, anunciando,
assim, uma nova etapa de exploração do conhecimento científico (BENINI, 2006).
Nesse contexto, de acordo com Aguiar (1999), a importância dada ao que se
convencionou a chamar de “método científico” para a construção do conhecimento
científico, a partir do advento da Ciência Moderna, veio a influenciar muitos
Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
200
alfabetização: laboratório de ensino de matemática
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educadores nas escolas a investirem na aprendizagem baseada no uso desse


método. Acreditava-se que o aluno pudesse ter uma aprendizagem significativa, a
partir da experiência e vivência das etapas que compõem o modelo de método
científico: observação empírica, “o levantamento de hipóteses, a realização de
experiências para a verificação, comprovação ou refutação do conceito trabalhado.”
(AGUIAR, 1999, p.17).
Ainda segundo Aguiar (1999), esse tipo de aprendizagem baseada na
aprendizagem do método científico pretendia dar ao aluno “maior capacidade de
compreensão a fim de que ele próprio começasse a questionar e a investigar o
mundo”. (AGUIAR, 1999, p.17). De acordo com essa autora, a partir dessa proposta,
um espaço próprio foi criado nas escolas para que os alunos pudessem realizar
suas experiências, assim como era feito nas outras Ciências, e a este espaço foi
dado o nome de laboratório, tornando-se réplica dos laboratórios científicos
encontrados nas universidades.
Aguiar (1999) também revela que esse laboratório criado nas escolas
preservou muitos vestígios do laboratório científico utilizado na academia. Entre
eles, a autora destaca a existência de um lugar fixo, equipado com materiais a
serem utilizados durante as atividades de experimentação.
Toda essa organização de espaço e infra-estrutura tinha como objetivo, de
acordo com a autora, garantir a realização de experiências nos moldes “de um
método apenas” - o método científico. (AGUIAR, 1999, p.19).
Somente a partir da década de 60, o ensino experimental começou a receber
um grande impulso por meio de projetos 9 de ensino oriundos dos EUA. A disputa
armamentista com a Rússia, na época União Soviética, as guerras e o vertiginoso
desenvolvimento tecnológico justificaram um maciço investimento do governo norte-
americano em projetos de ensino que visavam à formação de novos cientistas.
Estes projetos foram traduzidos e divulgados no Brasil (GALIAZZI et al. 2001). Estes
autores ainda citam que muitas crenças dos professores, da época, sobre o ensino
experimental, refletiram sobre as propostas acerca desses projetos e, com isso, o

9
CHEMS –Chemical Educational Material Study, PSSC – Physical Science Study Comithe e CBA – Chemical
Bond Aproach Project.
Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
201
alfabetização: laboratório de ensino de matemática
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ensino que se pretendia que fosse uma inovação nas escolas acabou por conservar
princípios empiristas característicos do ensino experimental tradicional.
Mesmo assim, de acordo com Benini (2006), esse período, em “maior ou
menor grau”, influenciou o desenvolvimento da Ciência, bem como o uso de
laboratórios nas escolas e a aceleração de pesquisas usadas para fins pacíficos ou
não. (BENINI, 2006, p.32).
Segundo Aguiar (1999) a utilização do laboratório na escola tinha como
objetivo “questionar a experiência pessoal dos alunos, ou seja, o conhecimento do
senso comum, e como contraponto a ele, construir o conhecimento científico.”
(AGUIAR, 1999, p.18). Dessa forma, a idéia seria partir do conhecimento inicial (do
senso comum) do aluno e desenvolver atividades experimentais sobre um conteúdo
de ensino, de modo que ele pudesse transformar o seu saber inicial em saber
científico por meio de atividades experimentais que viessem contemplar a aplicação
do método científico.
A pouca utilização de atividades experimentais no dia-a-dia das escolas
brasileiras talvez possa estar relacionada ao fato de que essa prática ainda não
fosse também muito comum no cotidiano dos laboratórios de Ciências existentes
nas muitas universidades do país. Quanto a isso, Grandini e Grandini (2004)
revelam que, por mais que o laboratório já tenha o seu espaço definido dentro das
Ciências para a realização desse tipo de atividade, a maioria dos docentes das
universidades brasileiras ainda se dedica a aulas mais teóricas.
Valadares (2001) aponta a simulação de um modelo de método científico
empirista, apontando a dinâmica de funcionamento de um laboratório de Ciências
como um lugar reservado às atividades de ensino experimental. Para o autor, as
etapas de trabalho nesse local se dão da seguinte forma:
1º- Observação: aplicar atentamente os sentidos, fazer medições com
todo o cuidado para recolher dados científicos, o mais exactamente
possível.
2º- Hipótese: fazer uma suposição acerca da lei que explica o
fenômeno.

Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
202
alfabetização: laboratório de ensino de matemática
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3º- Experimentação: recriar o fenômeno em laboratório, usando aparelhos


experimentais e as regras de Francis Bacon, preenchendo uma tábua
<<tábua de presença>>, outra de <<ausência>> e <<outra de graus>> ou,
querendo ser mais actual, a metodologia de Stuart Mill, um refinamento da
de Bacon ou, querendo ser ainda mais moderno, recorrendo às actuais
tabelas de dupla ou tripla entrada, estatísticas, etc.
4º- Indução: generalizar as regularidades encontradas com as
transformações dos dados obtidos experimentalmente para todos os
fenômenos análogos, ou fenômeno em causa.
5º- Etc., etc. (VALADARES, 2001, p.5).

O autor faz uma crítica quanto a esse modelo afirmando que: “No ponto 1
(...) . Estamos à espera que a natureza se encarregue de nos dar de bandeja os
dados de que necessitamos? Falta uma reflexão profunda (...) Falta um passo 0
chamado reflexão (uso da mente) (...)” (VALADARES, 2001, p.5).
Nessa idéia de método científico, o laboratório tem a sua manutenção
garantida pela “primazia de ensinar o método experimental” (ALVES, 2002, p.18). As
experiências realizadas no ambiente do laboratório, na maioria das vezes, seguem
um roteiro prescritivo de procedimentos a serem seguidos no formato passo-a-
passo. O aluno, em contato com o seu objeto de estudo, retira do mesmo todas as
informações possíveis, através dos seus órgãos de sentido. Esses dados coletados
empiricamente são examinados na tentativa de se buscar uma regularidade e,
posteriormente, uma generalização para o fenômeno estudado. Ao fim da atividade
experimental, o aluno entrega um relatório para o professor sobre as conclusões
tiradas acerca da experiência realizada. A atividade experimental desenvolvida,
dentro do modelo de método científico empirista, acaba privilegiando, portanto, na
maioria das vezes, destrezas manuais e técnicas de instrumentos em detrimento às
“destrezas cognitivas de alto nível intelectual”, conforme preconiza Galiazzi et al.
(2001, p.254).
Nesse contexto, a grande mudança que possa ocorrer, no ensino
experimental seria a transição do seu caráter empírico intuitivo a uma concepção de

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203
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atividade experimental construtivista. Dessa forma, o laboratório passaria a ter outro


sentido, um papel diferente daquele cuja primazia é propor experiências de ensino
baseado na vivência das etapas que compõe o método científico.

7.3 Primeiros registros de um laboratório de Ciências em especial: o


Laboratório de Matemática

De acordo com Tahan (1962), o que se determinou chamar de método do


laboratório, no final do século XIX, pode ser entendido como um método de ensino
capaz de apresentar o ensino da Matemática “ao vivo”, com auxilio de material
concreto “adequado” a uma aprendizagem mais “eficiente” (TAHAN, 1962, p.61).
Através deste método, de acordo com Tahan (1962):
As demonstrações, os problemas, as equações, certos conceitos teóricos,
são ensinados por meios concretos, isto é, por meio de aparelhos especiais, figuras,
filmes, dispositivos mecânicos; as propriedades de certas figuras são verificadas,
oudemonstradas, por meio de experiências ou com recursos mecânicos.
(TAHAN,1962, p.61).

Ainda segundo Tahan (1962), há vantagens e desvantagens com relação à


aplicação do método do laboratório. Entre as vantagens, o autor destaca:
1. Torna o ensino vivo, e eficiente e agradável;
2. Facilita a tarefa do professor;
3. Permite ao professor apreciar certas tendências dos alunos;
4. Leva o aluno a fazer observações e descobertas;
5. Reabilita o ensino da Matemática;
6. Permite relacionar o ensino da Matemática com o ensino de outras
matérias (TAHAN, 1962, p.81-82).

Em relação às desvantagens, o autor destaca:


1. Exige recursos materiais (laboratório) que os colégios não oferecem
aos professores;

Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
204
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2. Não pode ser aplicado a todos os pontos do programa;


3. Leva o aluno a fugir das abstrações e procurar recursos materiais
para as demonstrações matemáticas;
4. Só pode ser proporcionado a classes não numerosas;
5. É dispendioso;
6. Exige grande habilidade, entusiasmo e dedicação do professor;
7. Leva o aluno a aceitar, como rigorosas, certas demonstrações
experimentais grosseiras;
8. Exige muito tempo para o ensino (TAHAN, 1962, p.82).

Para se garantir a excelência na aplicação do método, o autor cita a


necessidade de o professor de Matemática ter à sua disposição, uma sala ambiente,
“um laboratório, no qual se encontram as peças consideradas úteis, interessantes ou
mesmo indispensáveis ao ensino da Matemática” (TAHAN, 1962, p.61). É neste
ambiente que ele, de acordo com o autor, “poderá, com maior facilidade, motivar
seus alunos por meio de experiências e orientá-los, mais tarde, com maior
segurança, pelo caminho das pesquisas mais abstratas” (TAHAN, 1962, p.62).
Ainda para Tahan (1962), as primeiras tentativas de aplicação do método do
laboratório surgiram na França, em 1877, quando se pretendia fazer o uso do
mesmo para ensinar certos conteúdos de Geometria.
Também segundo o autor, no Brasil, essa idéia começou a ser divulgada
ainda no final do século XIX, quando Rui Barbosa “em seu notável parecer sobre a
reforma do ensino primário, exaltava de um modo especial o emprego” da
“Taquimetria de Lagout10” como um método a ser utilizado para o ensino de
Geometria (TAHAN, 1962, p.76). Neste parecer, Rui Barbosa, citado por Tahan
(1962), afirma que “A Taquimetria é a concretização da Geometria, é o ensino da
Geometria pela evidência material, a acomodação da Geometria às inteligências
mais rudimentares: é a lição das coisas aplicada à medida das extensões e

10
Edouard Lagout, engenheiro francês responsável pela invenção do método de Laboratório conhecido como
Taquimetria. De acordo com o dicionário Michaelis: “sf (taqui+metro2+ia1) 1 Aplicação do taquímetro;
medida de rotações por meio de taquímetro. 2 Mat Método que permite demonstrar os teoremas da
geometria, materializando as figuras”.
Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
205
alfabetização: laboratório de ensino de matemática
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volumes” (TAHAN, 1962, p.76). Assim, por meio dessa relação de interação entre
Taquimetria e Geometria, o entendimento dos conceitos e regras fundamentais para
cálculo geométrico passariam a se tornar mais acessíveis aos “entendimentos
menos desenvolvidos” (BARBOSA, citado por TAHAN, 1962, p.76).
Em 1929, o professor de Matemática Euclides Roxo (1890-1950), já chamava
a atenção de todos os seus colegas de trabalho para as excelências que o método
de laboratório poderia proporcionar ao ensino da Matemática. Enquanto isso, a
importância dada ao espaço físico denominado “Laboratório de Matemática”, para o
melhor desenvolvimento desse método, só ganharia força durante a década de
cinquenta, após a realização do I Congresso Nacional de Ensino da Matemática, a
partir do qual uma tese de Doutorado aconselhava como vantajoso ao ensino da
Matemática a organização de uma sala separada para laboratório, devendo esta
facilitar o estudo dessa Ciência (ROXO, 1929, citado por TAHAN, 1962, p.77-78).
Em se tratando dos primeiros registros sobre a existência do Laboratório de
Matemática no Brasil, Tahan (1962) revela que:
O Instituto de Educação do Rio de Janeiro já teve um pequeno
Laboratório de Matemática, organizado pelo prof. Pereira Caldas. Esse
laboratório era fraco, em sala privativa (sem acomodação para os
alunos), deficiente; dotado de muitas peças inúteis, caras e mal
imaginadas. Pouco serviço prestava ao ensino e eram raríssimos os
professores que ilustravam ou visualizavam suas aulas com peças ou
aparelhos do laboratório (veja os itens 6 e 8 das desvantagens). Mas
esse laboratório, com todos os seus defeitos, representava, afinal, um
progresso no ensino da Matemática para as nossas normalistas. O
diretor do Instituto de Educação precisou da sala em que se achava o
Laboratório Pereira Caldas a fim de aproveitá-la para uma sala de aula.
E o laboratório foi sacrificado, isto é, foi aniquilado por determinação do
diretor e já não existe mais. Declarou o Prof. Nivaldo Reis, catedrático
da Faculdade de Filosofia de Belo Horizonte: “A supressão desse
Laboratório foi um passo negativo no ensino da Matemática no Brasil”
(TAHAN, 1962, p.83). (Grifo do autor).

Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
206
alfabetização: laboratório de ensino de matemática
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PEDAGOGIA

No próximo tópico, pretende-se discutir uma proposta de ensino para o


laboratório que visa retirar a ideia de atividade experimental associada ao uso do
método científico, o que evidenciaria uma proposta de ensino tradicional. Dessa
forma, sugere-se abandonar a ideia do laboratório tradicional (de Matemática) e
seguir em busca de uma concepção mais didática para o mesmo, de modo que ele
possa contribuir de uma forma mais significativa para o processo ensino-
aprendizagem.

7.4 Atividades experimentais: uma alternativa na concepção construtivista


para o laboratório didático

Perez (1993) citado por Turrioni e Perez (2006) salienta que,


tradicionalmente, o laboratório é tido como um lugar onde se realizam experiências
com materiais didáticos, assim como os Laboratórios de Física, Química e Biologia,
acontecendo o mesmo com o Laboratório de Matemática.
Existe uma preocupação de alguns estudiosos como Matos e Valadares
(2001), Alves (2002) e Arnoni, Koike e Borges (2005) em relacionar as atividades
experimentais a uma proposta construtivista para ensino de Ciências, bem como a
necessidade de se criar ambientes construtivistas de aprendizagem para a
realização dessas atividades. ‘Toda essa preocupação pretende evitar que as
atividades experimentais não sejam vistas e nem utilizadas como forma de transmitir
o conhecimento científico (concepção empírica de ensino) e muito menos servir de
ilustração e confirmação de teorias. A idéia é que a atividade experimental seja vista
como um instrumento didático no ensino de Ciências (ARNONI; KOIKE; BORGES,
2005).
Para Alves (2002), a adoção de uma concepção construtivista de ensino
permite que se abandone a idéia do laboratório tradicional e suas práticas
experimentais de caráter empírico indutivo e se caminhe em busca de atividades
ligadas a um “laboratório didático” diferente do laboratório tradicional mencionado
anteriormente (ALVES, 2002). Ainda segundo esse autor, essas novas atividades
passam a ser denominadas de “atividade experimental”, diferente dos termos
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207
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“experiência”, que vem do cotidiano, e do termo “experimentação”, que vem do


cientista. Além disso, a utilização do termo “laboratório didático” tem a pretensão, de
acordo com Alves (2002), de libertá-lo da ideia empírica que envolve o laboratório
tradicional, vindo a ressaltar a orientação construtivista da atividade a ser realizada
neste espaço (ALVES, 2000 citado por ALVES, 2002, p.6).
Ainda de acordo com Alves (2002):
A atividade experimental deve ser entendida como um objeto didático,
produto de uma Transposição Didática de concepção construtivista da
experimentação e do método experimental, e não mais um objeto a
ensinar. Como objeto didático sua estrutura deve agregar
características de versatilidade, de modo a permitir que seu papel de
mediador11 se apresente em qualquer tempo e nos mais diferentes
momentos do diálogo sobre o saber no processo ensino-
aprendizagem. E principalmente, é um objeto de ação que, manipulado
didaticamente pelo professor, irá se inserir no discurso construtivista
12
facilitando a indução do fenômeno didático que objetiva o ensino
de saberes (ALVES, 2002, p.6). (Grifos do autor).

Assim, ao se pensar numa proposta de ensino, com atividades experimentais numa


concepção construtivista, o autor cita a necessidade de um espaço que sirva como um
instrumento didático mediador do processo ensino-aprendizagem. Para Matos e
Valadares (2001, p.228) este espaço é um “ambiente de aprendizagem onde os alunos
<<manipulem>> objetos e idéias e <<negociem>> significados entre si e com os
professores”, o que é denominado por eles como “ambiente construtivista de
aprendizagem”, ao qual Alves (2002) refere-se como “laboratório didático”. Esse
laboratório, por ser considerado um ambiente construtivista de aprendizagem possui as

11
O termo mediação, tomado no sentido vygotskyano, pode ser entendido como uma intervenção programada
e induzida pelo professor no espaço didático, na forma de questionamentos, desafios, estímulos para
discussões, etc.

12
O fenômeno didático, o qual se refere o autor é entendido aqui como “[...] uma dinâmica da mediação
planejada pelo professor e sua execução, de forma induzida, por meio do diálogo construtivista na
elaboração do conhecimento científico na sala de aula”.
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208
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seguintes características:
1ª - É posta a ênfase na construção activa e significativa do
conhecimento e não na sua retenção passiva e reprodução de
memória.
2ª - São privilegiadas as tarefas dos alunos em contextos significativos,
em vez das prelecções abstractas do professor fora dos contextos
adequados.
3ª - Privilegiam-se também as situações do mundo real e do dia a dia,
em vez das sequências de ensino academicamente rígidas e pré-
determinadas.
4ª- São propiciadas múltiplas representações dos mesmos
objectos/fenómenos e não uma só (representações icónicas, verbais,
formais, qualitativas, semiquantitativas, quantitativas, etc.).
5ª - Encoraja-se a reflexão crítica constante dos alunos durante as
suas actividades, a análise do que dizem e fazem, bem como o que
dizem e fazem os seus colegas.
6ª - Proporcionam-se actividades dependentes do contexto e do
conteúdo e são tidos em conta os estilos e ritmos de aprendizagem
dos alunos.
7ª - Estimula-se a construção colaborativa do conhecimento através da
negociação social e não a competição individual pela classificação.
8ª - Privilegia-se a avaliação formadora que, tal como a encaramos,
deve estar voltada não só para a regulação da aprendizagem de cada
aluno pelo professor, como também para a reflexão, auto-avaliação e
auto-regulação da própria aprendizagem.
9ª - São criadas condições agradáveis e propiciadores de boas
relações interpessoais dentro e fora das aulas.
10ª - Os alunos são motivados e responsabilizados pelas suas próprias
aprendizagens (VALADARES, 2001, p.10-11).
Corroborando com as idéias de Valadares (2001), para Alves (2002), uma das
principais razões que justificam o laboratório didático dentro da concepção

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209
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construtivista é:
[...] é o tratamento das idéias prévias. Por meio do laboratório didático,
se torna possível, através de um diálogo questionador, perceber quais
as argumentações utilizadas pelos estudantes para explicar o
fenômeno envolvido. As diferentes argumentações permitirão ao
professor mapear quais os equívocos de interpretação. Cria-se, então,
uma oportunidade importante para o professor, que pode discutir tais
idéias prévias, colocando-as em cheque concretamente (ALVES, 2002,
p.4).
Ainda segundo esse autor, esse laboratório pode ser utilizado como um
instrumento didático que oferece objetos concretos que servirão de modelos para
mediar a realidade do aluno e as teorias científicas.
Dessa forma, o laboratório caracterizado acima, se opõe ao laboratório
tradicional, de forma a se constituir num ambiente construtivista de aprendizagem. É
nesse ambiente que os alunos podem se sentir mais a vontade para expor suas
dificuldades sem medo de algum prejulgamento. O estímulo à participação ativa do
aluno, o instiga a refletir e seguir em busca de respostas.

7.4.1 O uso de material didático manipulável no ensino de Matemática: da ação


experimental à reflexão

Para Lorenzato (2006), o professor tem um papel muito importante para o


sucesso ou fracasso escolar do aluno. De acordo com ele, não basta que o
professor disponha de um bom laboratório para que se tenha a garantia de uma
aprendizagem significativa. Mais importante do que a instituição possuir um
laboratório, é o professor saber utilizar corretamente os seus materiais
(LORENZATO, 2006). Nesse sentido, a proposta do laboratório didático discutido
anteriormente vem contemplar a ideia proposta por este último autor.
Em relação às dificuldades encontradas por alunos e professores no processo
ensinoaprendizagem, Fiorentini e Miorim (1990) destacam, por um lado, o aluno que não
consegue entender a Matemática que lhe é transmitida pela escola e, do outro, o
professor, que não conseguindo alcançar resultados satisfatórios junto a seus alunos,
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210
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acabam lotando as salas de aula de cursos, encontros e congressos em busca de


materiais didáticos que possam resolver os seus problemas da sala de aula.
Assim, os autores destacam que, esses professores, tendo dificuldade em repensar
sua prática pedagógica, depositam toda a sua esperança no uso do material em si,
acreditando que ele possa se tornar a solução dos seus problemas de sala de aula.
Passos (2006) ressalta que esse apego à materialidade, como forma de amenizar as
dificuldades de ensino teve influência a partir do Movimento Escola Nova, que defendia o
uso de material concreto para que os alunos pudessem aprender fazendo. No entanto,
segundo essa autora, muitos professores tiveram uma compreensão restrita desse
processo, ao entenderem que a simples manipulação empírica destes objetos levaria à
aprendizagem de conceitos. Porém, essa falsa ideia em relação ao aprender fazendo,
ainda que mal interpretada, contrapunha a postura tradicional da escola, que afirmava que
o “uso de materiais ou objetos era considerado pura perda de tempo, uma atividade que
perturbava o silêncio ou a disciplina da classe”. (FIORENTINI; MIORIN, 1990, p.2).
Lorenzato (2006) define material didático como “qualquer instrumento útil ao
processo de ensino e aprendizagem” (LORENZATO, 2006, p.18). Entram, nessa
definição, materiais como o giz, calculadora, jogos, cartaz, caderno, caneta e etc. Em
meio a essa variedade de materiais, o autor destaca, em especial, o material didático
concreto que no entendimento dele pode ter duas interpretações: “uma delas refere-se ao
palpável, manipulável e a outra, mais ampla, inclui também imagens gráficas”.
(LORENZATO, 2006, p.22-23). Ainda em relação ao MD concreto manipulável, o autor
estabelece uma classificação para esses tipos de materiais:
1) O material manipulável estático: material concreto que não permite a
transformação por continuidade, ou seja, alteração da sua estrutura física a
partir da sua manipulação. Durante a atividade experimental, o sujeito apenas
manuseia e observa o objeto na tentativa de abstrair dele algumas
propriedades. Se restringirmos o contato com o material didático apenas ao
campo visual (observação), correremos o risco de obter apenas um
conhecimento superficial desse objeto.
2) O material manipulável dinâmico: material concreto que permite a
transformação por continuidade, ou seja, a estrutura física do material vai

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mudando de forma à medida que ele vai sofrendo transformações por meio
de operações impostas pelo sujeito que o manipula. A vantagem desse
material em relação ao primeiro, na visão do autor, está no fato de que este
facilita melhor a percepção de propriedades, bem como a realização de
redescobertas que podem garantir uma aprendizagem mais significativa.

Segundo Lorenzato (2006) há ainda a diferença de potencialidades entre o


material concreto manipulável e sua representação gráfica. O autor explica que a
representação gráfica não “retrata as reais dimensões e posições dos lados e faces
dos objetos, uma vez que camufla o perpendicularismo e o paralelismo laterais”
(LORENZATO, 2006, p.27). Em relação a isso Kaleff (2006) se posiciona em defesa
do material concreto manipulável explicando que, por mais sofisticadas que sejam
as simulações produzidas na tela do computador, essas representações
tridimensionais permanecem planas, não dispensando a utilização do MD
manipulável. Nesse caso, uma experiência não invalida a outra, pois ambas podem
se completar.
Assim, ainda segundo Lorenzato (2006), os materiais didáticos podem
desempenhar várias funções, dependendo do objetivo a que se prestam: apresentar
um assunto, motivar os alunos, auxiliar a memorização de resultados e facilitar a
redescoberta.
Fiorentini e Miorim (1990) ressaltam que geralmente o professor costuma
justificar a escolha do MD pelo seu caráter motivacional, que vem tornar as aulas
mais alegres e descontraídas ou também pelo fato de muitos professores já terem
ouvido falar que o ensino de Matemática deve começar pelo concreto. Essas
justificativas fazem com que o professor não venha a refletir sobre a razão pela qual
o MD é importante, bem como a melhor forma e o melhor momento de se utilizá-lo
(FIORENTINI; MIORIM, 1990). Esses autores consideram que “por trás de cada
material, se esconde uma visão de Educação, de Matemática, do homem e de
mundo; ou seja, existe, subjacente ao material, uma proposta pedagógica que o
justifica” (FIORENTINI; MIORIM, 1990, p.2).

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Corroborando com as idéias dos autores, Turrioni e Perez (2006) afirmam que o
material concreto é fundamental para o ensino experimental, uma vez que “facilita a
observação, análise, desenvolve o raciocínio lógico e crítico, sendo excelente para auxiliar
o aluno na construção dos seus conhecimentos” (TURRIONI; PEREZ, 2006, p.61).
Matos e Serrazina (1996) complementam que a aprendizagem baseia-se “na
experiência, e a construção de conceitos matemáticos é um processo longo que requer o
envolvimento ativo do aluno que vai progredindo do concreto para o abstrato”.
(SERRAZINA, 1990, p.1). Nessa transição, acredita-se que o material didático concreto
pode ter um importante papel nesse processo, atuando como meio auxiliar de ensino,
podendo ser um recurso capaz de catalisar experiências individuais de aprendizagem na
construção dos conceitos matemáticos.
Entretanto, ainda em relação a isso, Lorenzato (2006), complementando as idéias de
Matos e Sarrazina (1996), explica que por melhor que seja o material didático (MD), este
“[...] nunca ultrapassa a categoria de meio auxiliar de ensino, de alternativa metodológica
à disposição do professor e do aluno, e, como tal, o MD não é garantia de um bom
ensino, nem de uma aprendizagem significativa e não substitui o professor.”
(LORENZATO, 2006, p.18).
Assim, para este autor, também a eficiência do material didático manipulável
depende mais da forma como professor irá utilizá-lo no momento em que está a mediar
uma atividade com este material do que simplesmente considerar o seu uso pelo uso.
Em relação a isso, Lorenzato (2006) ainda nos alerta para o fato de que:
[...] convém termos sempre em mente que a realização em si de
atividades manipulativas ou visuais não garante a aprendizagem. Para
que esta efetivamente aconteça, faz-se necessária também a atividade
mental, por parte do aluno. E o MD pode ser um excelente catalisador
para o aluno construir seu saber matemático (LORENZATO, 2006,
p.21).
Matos e Serrazina (1996) também concordam que a manipulação do material por si
só não garante uma aprendizagem significativa. Para eles, o papel do professor é de suma
importância nesse processo, uma vez que ele deverá escolher o material adequado, de
forma cuidadosa, para que se tenha o devido sucesso durante a atividade manipulativa.

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Ainda de acordo com Matos e Serrazina (1996) “mais importante que os materiais com
que está a trabalhar, a experiência que o aluno está a realizar deve ser significativa pra
ele”. (MATOS E SERRAZINA, 1996, p 197).
Assim, diante do exposto, Rêgo e Rêgo (2006) destacam que a aprendizagem não
reside na estrutura física do material concreto em si ou na simples manipulação do
mesmo, devendo resultar de reflexões sobre as operações impostas sobre a ação
manipulativa.
Segundo Kaleff (2006) muitos professores que utilizam o MD com finalidade em si
mesmo, priorizam em suas aulas as características lúdicas e estéticas destes materiais
sem refletir sobre qual o conceito matemático eles poderiam estar representando, bem
como os obstáculos cognitivos que existem em relação à sua utilização.
Assim, ainda em relação aos materiais didáticos, Passos (2006) revela
que: Qualquer material pode servir para apresentar situações nas
quais os alunos enfrentam relações entre objetos que poderão fazê-los
refletir, conjecturar, formular soluções, fazer novas perguntas,
descobrir estruturas. Entretanto, os conceitos matemáticos que eles
devem construir, com a ajuda do professor, não estão em nenhum dos
materiais de forma a ser abstraídos deles empiricamente. Os conceitos
serão formados pela ação interiorizada do aluno, pelo significado que
dão às ações, às formulações que enunciam, às verificações que
realizam (PASSOS, 2006, p.81).
A autora defende, portanto, que aluno não aprende Matemática apenas
manipulando objetos, isto é, os conceitos matemáticos não residem no material em
si, ou na simples ação sobre ele. É preciso, então, que haja uma atividade mental
por parte do aluno mediado pelo professor, permeada de reflexões sobre a ação
manipulativa, que deve permitir ao aluno o reconhecimento de relações que o levem
a pensar, analisar e agir (PASSOS, 2006). Em relação a isso, o professor poderá
formular questões adequadas que permitam ao aluno passar do concreto ao
abstrato por meio de construções racionais bem elaboradas.
Nesse contexto para que haja uma experiência matemática, que “toque” o
aluno, é recomendável, de acordo com Lorenzato (2006), que este além da

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exploração e reflexão sobre o material didático também participe da construção do


mesmo. Assim, o professor poderá garantir que o aluno possa tirar o maior proveito
possível desse material manuseado. O conceito de experiência que adotaremos
para o laboratório didático nos remete ao conceito proposto por Larrosa (2002),
segundo o qual, a experiência pode ser entendida como aquilo “que nos passa, o
que nos acontece, o que nos toca”. O saber que se adquire através da experiência é
um saber diferente do saber científico e do saber da informação. É um saber que,
segundo o autor, advém da relação entre conhecimento e vida humana, ou seja, é
um saber que nasce a partir daquilo que nos toca e acaba por aproximar o
conhecimento da vida humana. É um saber pessoal, subjetivo, que surge ao passo
que algo venha a nos acontecer (LARROSA, 2002, p.21).
Assim, segundo Lorenzato (2006), “talvez”, a melhor potencialidade do MD
seja a sua construção por parte do aluno, pois, durante essa fase, surgem
imprevistos e desafios que acabam por conduzi-lo à elaboração de conjecturas e
soluções para as situações imprevistas.
Passos (2006) ressalta que, os materiais didáticos em uma aula de
Matemática, na maioria das vezes, têm um objetivo funcional, uma vez que esses
são utilizados como suporte experimental na organização do processo de ensino-
aprendizagem. Entretanto, a autora considera que o verdadeiro objetivo desse
material didático é servir de mediador na construção do conhecimento, “facilitando a
relação professor/aluno/conhecimento” (PASSOS, 2006, p.78)
Para Rêgo e Rêgo (2006), durante a utilização do material didático, cabe ao
professor alguns cuidados básicos, dentre os quais se destacam:
I. Dar tempo para que os alunos conheçam o material (inicialmente é
importante que os alunos o explorem livremente);
II. Incentivar a comunicação e troca de idéias, além de discutir com a
turma os diferentes processos, resultados e estratégias envolvidos;
III.Mediar, sempre que necessário, o desenvolvimento das atividades
por meio de perguntas ou da indicação de materiais de apoio,
solicitando o registro individual ou coletivo das ações realizadas,
conclusões e dúvidas;

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IV.Realizar uma escolha responsável e criteriosa do material;


V. Planejar com antecedência as atividades, procurando conhecer bem
os recursos a serem utilizados, para que possam ser explorados de
forma eficiente, usando o bom senso para adequá-los às necessidades
da turma, estando aberto a sugestões e modificações ao longo do
processo, e
VI.Sempre que possível, estimular a participação do aluno e de outros
professores na confecção do material (RÊGO; RÊGO, 2006, p.54).
Assim, na opinião de Ottesbach e Pavanello (2009), em relação à
atividade manipulativa, é importante ressaltar que as conjecturas formuladas,
por mais que sejam verificadas e observadas por vários alunos, precisam ser
validadas através de uma organização lógica Matemática.
Nesse sentido, Ottesbach e Pavanello (2009) ratificando o que foi dito
anteriormente, também destacam a necessidade da demonstração dessas
conjecturas, ao afirmarem que:
Quando se utilizam materiais manipuláveis no aprendizado da
Matemática, convém enfatizar com os alunos que a constatação
da validade de uma afirmação em diversas experiências não é
suficiente para comprovar que essa afirmação é sempre válida.
As constatações que se repetem devem ser vistas como “dicas”
importantes da possibilidade da afirmação estar correta, de
modo que os matemáticos enfatizam a necessidade de uma
demonstração para comprovar a sua validade (OTTESBACH;
PAVANELO, 2009, p.5). (Grifo das autoras)
De acordo com Lorenzato (2006), há uma diferença pedagógica entre uma
aula em que o professor apresenta o assunto ilustrando-o com MD e uma aula em
que os alunos manuseiam o material. Segundo ele, o MD é o mesmo nas duas
situações de ensino, mas os resultados no segundo tipo de aula, “serão mais
benéficos à formação dos alunos, porque, de posse do MD, as observações e
reflexões deles são mais profícuas, uma vez que poderão, em ritmos próprios,

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realizar suas descobertas e, mais facilmente, memorizar os resultados obtidos


durante suas atividades” (LORENZATO, 2006, p.27).
Nesse sentido, segundo Passos (2006), o mau uso do MD pode estar ligado
“à distância existente entre o material concreto e as relações matemáticas que
temos a intenção que eles representem, e também quanto à seleção dos materiais
na sala de aula” (PASSOS, 2006, p.80). Em relação a esse posicionamento, Kaleff
(2006) explica que as características inerentes à natureza da fabricação do material
concreto, como por exemplo, a sua forma espacial, pode contribuir para o
surgimento de obstáculos cognitivos. Um exemplo disso,pontua a autora, é o caso
dos blocos lógicos, dos quais sua adequação do ponto de vista geométrico deixa
muito a desejar. Essa inadequação acontece quando determinadas peças do
material recebem nomes como: quadrado, retângulo, triângulo e, na verdade, se
referem a prismas e cilindros.
Diante de tudo o que foi exposto sobre o material concreto, acreditamos que
os cursos de formação de professores em Matemática deverão oferecer, por meio
do laboratório didático, a instrumentalização necessária para o desenvolvimento
profissional do acadêmico, possibilitando aos mesmos aprender a confeccionar e
utilizar o material didático a ser utilizado na sua prática pedagógica.
Toda essa discussão realizada ao longo deste capítulo aponta para a
necessidade de um tipo de laboratório que possa oferecer maiores contribuições
para a formação de professores.
Nesse sentido, o próximo capítulo irá abordar os vários tipos de laboratórios
encontrados na literatura. Em cada um deles iremos destacar o seu papel,
importância, objetivos e formas de utilização deste em um curso de formação de
professores. Pretende-se, com isso, construir um cenário que sirva de referência
para a análise dos dados desta pesquisa.

7.5 Os diferentes tipos de abordagem do laboratório em matemática

De acordo com Varizo (2007), são inúmeros os cursos de Licenciatura em


Matemática espalhados pelo Brasil que vêm implementando o seu laboratório.
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Entretanto, a autora destaca que as funções deste laboratório e seu vínculo em cada
instituição têm sido diferentes. Uns estão vinculados à Faculdade de Educação e
outros aos institutos da área de Ciências Exatas. Segundo Varizo (2007):
A maioria (dos laboratórios) está voltada para questões pedagógicas
da Matemática no Ensino Básico (EB), alguns se dedicam ao ensino da
Matemática na universidade, outros priorizam uma única disciplina e
poucos se destinam só à pesquisa. Quanto ao foco da formação
docente, uns visam à formação inicial e continuada de professores de
Matemática, outros enfatizam apenas uma delas (VARIZO, 2007, p.1-
2). (Grifo nosso).

Assim, Lorenzato (2006) explica que estes laboratórios possuem diferentes


propostas de utilização, umas mais teóricas, outras mais práticas, algumas em
tecnologia da informação e comunicação e outras não. O autor revela, então, que
diante da variedade de concepções que envolvem os vários tipos de laboratório,
destaca-se a importância do papel professor como elemento mediador na
construção de um conhecimento significativo, como já visto.
A partir da leitura de livros, artigos, dissertações e teses sobre o assunto
Laboratório de Ensino/Educação Matemática, foram construídas as seguintes
categorias para representar os diferentes tipos de laboratório existentes:

7.5.1 Laboratório/ Depósito-arquivo

Numa classificação de modalidades, este laboratório ocupa o nível mais baixo


em relação ao tipo de envolvimento que poderia haver entre professores e alunos
dentro do seu próprio espaço físico. A explicação para isso se revela na medida em
que o seu espaço físico é entendido apenas como um lugar, um depósito de
materiais que deverá servir de apoio, emespecial ao professor, para a realização de
suas atividades práticas fora desse ambiente.
Nesse sentido, encontramos em Lorenzato (2006) uma definição para este
laboratório:
[...] um local para guardar materiais essenciais, tornando-os acessíveis

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para as aulas; neste caso, é um depósito/arquivo de instrumentos, tais


como: livros, materiais manipuláveis, transparências, filmes, entre
outros, inclusive matérias primas e instrumentos para confeccionar
materiais didáticos(LORENZATO, 2006, p.6).
Diante dessa caracterização, fica implícita a ideia de que as aulas de
Matemática não ocorrerão no espaço físico deste laboratório, estando o mesmo
apenas restrito ao apoio e suporte, por meio de seus materiais manipuláveis, para as
atividades experimentais que serão desenvolvidas pelo professor fora desse
ambiente. Prioriza-se, nessa descrição, o que Benini (2006) considera como
“aspecto funcional” em relação ao objetivo desse laboratório, ou seja, oferecer uma
infra-estrutura necessária que possa abrigar e dar acesso os materiais didáticos que
irão facilitar a tarefa do professor no processo ensino-aprendizagem.
Este espaço físico pressupõe a iniciativa do professor em utilizar os materiais
ali disponíveis para a realização de atividades experimentais junto a seus alunos
como também, se for procurado individualmente pelo aluno, pressupõe certa
independência do mesmo para utilizar o material ali existente.
Lorenzato (2006) juntamente com Turrioni (2004) admitem que, na ausência
deste espaço físico na escola ou até mesmo na instituição de Ensino Superior, nada
impede que este laboratório aconteça sob a forma de um laboratório móvel, ou seja,
dentro de uma caixa que pode ser transportada, ou mesmo no porta-malas de um
carro. Porém, ainda nesse caso, tanto o objetivo como o seu papel ainda continuam
sendo os mesmos de um Laboratório Depósito/arquivo.
De modo geral, a utilização deste laboratório se assemelha muito ao uso de
uma biblioteca, pelo fato de poder oferecer aos professores e alunos o acesso aos
materiais que possibilitam a construção do conhecimento. Isso acontece à medida
que ele disponibiliza aos seus usuários, um acervo de livros, materiais didáticos
diversificados que irão contribuir para o desenvolvimento das atividades práticas.
Dessa forma, o nome Laboratório Biblioteca ilustra essa concepção.

7.5.2 Laboratório/ Sala de aula

De acordo com Lorenzato (2006), “para muitos professores, todas as salas de


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aula e todas as suas aulas devem ser um laboratório onde se dão as aprendizagens
da Matemática” (LORENZATO, 2006, p.7). No entanto, o autor alerta que esta
concepção reflete uma utopia que pode induzir muitos professores a não sentirem
falta de construir um laboratório no seu ambiente de trabalho.
Entretanto, Aguiar (1999) explica, que, ainda assim, o ambiente da sala de
aula pode ser pensado e entendido como um tipo de laboratório, uma vez que
muitas experiências que ocorrem nesse lugar não necessitam que o mesmo esteja
abarrotado de materiais didáticos. Muitas dessas experiências “ocorrem no campo
das idéias, no uso da imaginação e provocam discussões, investigações e
pesquisas” (AGUIAR, 1999, p.144). Nesse sentido, cabe ao professor orientar e
mediar essas discussões/reflexões, de modo que as experiências individuais de
cada aluno possam surgir e resultar em uma aprendizagem significativa.
De acordo com, Refosco e Bassol (2007), alguns professores que são
adeptos dessa concepção de laboratório, acreditam que o ambiente da sala de aula,
como também todas as suas aulas de Matemática podem se transformar num
importante espaço para o aluno descobrir essa Ciência de uma maneira informal,
por meio da realização de atividades práticas com material manipulável ou pela
vivência de metodologias alternativas. Ao fazer uso de material concreto em sala de
aula, o professor estará utilizando uma abordagem de laboratório que, segundo
Tahan (1962), recebe o nome de “método do laboratório”. Através da aplicação
desse método, o ensino da Matemática é apresentado “ao vivo” pelo professor aos
seus alunos, com o auxilio de material concreto para ilustrar e demonstrar alguns
conceitos de Matemática, de uma forma diferente e divertida (TAHAN, 1962).
Entretanto, é conveniente reforçar que “há uma diferença pedagógica entre
uma aula em que o professor apresenta o assunto ilustrando-o com MD e uma aula
em que os alunos tenham a oportunidade de vivenciar situações-problema,
manuseando material didático” (LORENZATO, 2006, p.27). De acordo com este
autor, o segundo tipo de aula é mais benéfico para o aluno uma vez que ele poderá,
no seu próprio ritmo, observar, refletir e realizar as suas próprias descobertas.
Nesse sentido, o sucesso da abordagem do laboratório em sala de aula
dependerá muito da forma como o professor irá conduzir este processo, seja “para

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220
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apresentar um assunto, para motivar os alunos, para auxiliar a memorização de


resultados, para facilitar a redescoberta pelos alunos” (LORENZATO, 2006, p.18).
Aguiar (1999) entende que, algumas atividades experimentais necessitam de
recursos materiais que não estão presentes no ambiente da sala de aula, havendo,
assim, a necessidade de um espaço físico, diferente, que represente a continuação
ou a extensão desse lugar no desenvolvimento de atividades mais específicas. É
nesse ambiente que se poderá garantir maior participação dos alunos na
manipulação dos materiais concretos, bem como o sucesso do método do
laboratório. O referido lugar, diferente do ambiente da sala de aula, o Laboratório
Tradicional, será caracterizado mais a frente.

7.5.3 Laboratório/ Disciplina

Como disciplina do curso de Licenciatura em Matemática, este componente


curricular poderá estar “voltado para o conhecimento e uso de um laboratório no
ensino e aprendizagem da Matemática” (BERTONI; GASPAR, 2006, p.137), como
também “integrar a pesquisa no projeto de formação inicial do educador matemático”
(PIRES, 2008).
Nesse sentido, de acordo com o autor, esta disciplina poderá tratar os
conteúdos da Educação Básica através de “oficinas e micro-aulas, por meio da
pesquisa, de estudo, de manipulação e de confecção de materiais didáticos e de
jogos, com ênfase nos tratamento dos porquês matemáticos e na formação do
educador-pesquisador” (PIRES, 2008, p.9).
Entre os temas tratados nesse componente curricular, Pires (2008) sugere:
a) Ludicidade
b) Os materiais manipuláveis
c) Os objetivos e a metodologia para trabalhar com jogos
d) A relação entre jogo e a resolução de problemas
e) Os objetivos da construção de um Laboratório de Ensino de
Matemática nas escolas de Educação Básica.
Ao considerar o laboratório como uma disciplina, portanto, o mesmo passa a
ter uma ementa que, na maioria das vezes, propõe a discussão de assuntos
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alfabetização: laboratório de ensino de matemática
CURSO SUPERIOR DE
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relativos à Educação Matemática. Entretanto, essa concepção teórica de laboratório


necessita de um espaço físico para a realização da prática pedagógica. Quando isso
acontece, é preciso que os objetivos instrucionais e epistemológicos da disciplina
sejam privilegiados em detrimento do objetivo funcional ligado à estrutura física
deste laboratório. Nesse caso, a disciplina laboratório possui uma concepção
teórico-prático (LORENZATO, 2006; BENINI, 2006).
A prática dessa disciplina realizada em laboratório refere-se a todo o
processo que envolve a construção de material didático, utilização de jogos,
realização de oficinas didáticas e atividades experimentais, bem como a orientação
de estágios e etc.
Por fim, Pires (2008) revela que este componente curricular poderá contribuir
para a elaboração do trabalho final de conclusão de curso, na medida em que a
ementa proposta para a disciplina dê suporte a este tipo de investigação.

7.5.4 Laboratório/ Laboratório de Tecnologia

A idéia do Laboratório de Tecnologia descrito aqui vai desde a sua concepção


mais simples, como Laboratório de Informática, a uma concepção mais ampla
proposta por Miskulin (2006).
Na concepção mais redutora (Laboratório de Informática), o Laboratório de
Tecnologia pode ser entendido como um espaço, com computadores, por meio dos
quais poderão ser feitas pesquisas e visitas em sites da internet. Além disso, pode
ser considerado como um espaço onde os conceitos matemáticos poderão ser
explorados por meio de um software dinâmico, havendo sempre a mediação do
professor e que possibilita que alguns conteúdos de Matemática sejam explorados e
discutidos através de animações e simulações a partir das quais a visualização vem
permitir o estabelecimento de relações e propriedades que podem ser verificadas
diretamente na tela do computador (SCHEFFER, 2006).
Esta autora explica que a utilização do laboratório se tornará ainda mais
proveitosa para o aluno à medida que o professor vier a realizar atividades que
envolva, de forma conjunta, o laboratório de materiais (com artefatos
tridimensionais) e o laboratório de informática (com materiais virtuais gráficos),
Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
222
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promovendo um aprofundamento das reflexões em torno da utilização de mídias


variadas na construção e discussão dos conceitos matemáticos.
Segundo Lorenzato (2006), a utilização de material didático manipulável
constitui “um eficiente recurso para muitos alunos, que não compreendendo a
mensagem (visual) da tela do computador, recorrem ao MD (manipulável) e, então,
prosseguem sem dificuldades com o computador” (LORENZATO, 2006, p.33).
Também sobre a necessidade da utilização do material concreto manipulável
no ambiente do LEM, Kallef (2006) revela que “[...] por mais sofisticadas que possam
vir a ser as simulações tridimensionais geradas, as representações permanecem
planas na tela do computador e não dispensam a utilização dos artefatos
tridimensionais desenvolvidos para essa atividade” (KALLEF, 2006, p.118).
Já sob uma visão mais ampla, o laboratório de tecnologia mediado pelo
computador é concebido como algo que vai muito além do espaço físico,
constituindo-se num ambiente com dimensão infra-estrutural e dimensão conceitual.
A dimensão infra-estrutural envolve o espaço físico do laboratório em si, com
todo o suporte técnico de computadores e softwares disponíveis para a produção de
mídias que serão disponibilizadas num ambiente online a serviço da educação à
distância. Já a dimensão conceitual relaciona-se a uma concepção didático-
pedagógica, sendo considerada “um cenário de aprendizagem colaborativa e de
conhecimento compartilhado, um espaço de formação, apoiado numa abordagem
teórico-metodológica e conduzida pela mediação do professor/pesquisador”
(MISKULIN, 2006, p.163). É nesse cenário de aprendizagem colaborativa que “os
professores podem refletir sobre a sua prática docente e compartilhá-la com seus
colegas, inseridos em seus locais de trabalho” (MISKULIN, 2006, p.164).
Para Miskulin (2006) a troca de experiências mediada pelo ambiente
computacional possibilita a ressignificação dos conceitos e crenças dos professores
em relação ao seu trabalho docente, “o que constitui-se uma aprendizagem
compartilhada” (MISKULIN, 2006, p.164).
A autora considera esse ambiente de aprendizagem colaborativa como:
Um cenário que pressupõe ambientes computacionais ou softwares
educativos e metodologias nas quais a comunicação se realiza de

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223
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forma dinâmica entre várias pessoas, com independência de ritmo, e


em que a aprendizagem pode aparecer em qualquer tempo e em
qualquer lugar, estando implícito um processo de interatividade total
entre os vários participantes (MISKULIN, 2006, p.164)
Porém, neste espaço de formação, por mais rico que seja por si só, faz-se
necessária a presença do professor para mediar o processo de construção do
conhecimento. A mediação do professor é fundamental, uma vez que, “ao trabalhar
com a tecnologia, ele pode criar situações desafiantes”, promovendo contextos
propícios à exploração e à construção do conhecimento (MISKULIN, 2006, p.165).
Nessa concepção teórico-metodológica de um laboratório mediado pelo
computador e suas tecnologias, portanto, como já dito, reserva-lhe a função de
incentivar e favorecer o desenvolvimento do conhecimento compartilhado e a
aprendizagem colaborativa.
Kaleff (2006) tem ressaltado a importância do computador como instrumento
didático que vem sendo utilizado nos empreendimentos de ensino à distância, e
nesse sentido, revela a necessidade de o laboratório se adaptar a essa nova
modalidade de ensino através de cursos de formação continuada de professores.
A educação à distância tem aparecido no meio acadêmico, como forma de
permitir o acesso a uma educação sem fronteiras mediada pelas Novas Tecnologias
de Informação e Comunicação (NTIC), aproximando pessoas geograficamente
distantes para uma formação profissional superior (CAVALCANTI, 2009). Essa nova
forma de educação tem buscado “viabilizar ações didático-pedagógicas embasadas
num trabalho colaborativo de equipes multidisciplinares” que atuam no sentido de
poder cumprir com os objetivos dessa nova proposta de educação (CAVALCANTI,
2009, p.4).
Para Nunes, Souza e Dandolini (2005) o objetivo do laboratório voltado para o
ensino da Matemática à distância é “atender as necessidades do curso de
Matemática nesta nova modalidade de ensino” (NUNES; SOUZA; DANDOLINI,
2005, p.1). Dentro dessa concepção de laboratório, o aluno não produz material
didático. O professor responsável pela disciplina, cujas atividades são
disponibilizadas online, juntamente com a equipe pedagógica que dá suporte é

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quem serão responsáveis pela confecção dos materiais que serão disponibilizados
nesse curso à distância. Os autores ainda citam que nesse ambiente serão
“elaborados os materiais disponibilizados em diferentes meios, sejam eles em áudio,
vídeo, impressos, página web ou outros.” (NUNES; SOUZA; DANDOLINI, 2005, p.3).
O gerenciamento de todo esse processo que envolve os materiais didáticos
se dá nesse ambiente por meio de uma equipe de trabalho multidisciplinar que visa
apresentar uma coesão esperada dessa metodologia de trabalho (NUNES; SOUZA;
DANDOLINI, 2005).
Uma das grandes dificuldades enfrentadas por essa modalidade de ensino
está na comunicação professor-aluno que não acontece face a face. Quando isso
não acontece, o aluno fica impossibilitado de obter resposta ao seu questionamento
no momento em que ele está frente a uma atividade proposta na plataforma de
ensino (SOLETIC, 2005).

7.5.5 Laboratório/ Tradicional - Laboratório de Matemática

De acordo com Benini (2006, p.48) é difícil estabelecer regras rígidas para
determinar o que é e o que não é um laboratório tradicional. No entanto, a autora
explica que, ao analisar como os estudantes de várias outras áreas da Ciência se
“desenvolvem” durante a realização de atividades práticas dentro da sua própria
área de formação profissional, foi possível encontrar alguns pontos em comum a
partir dos quais se tornou possível traçar, grosso modo, os seguintes objetivos para
este laboratório:
Habilitar os estudantes no manuseio de instrumentos de medidas;
realizar experimentos como o intuito de verificar leis e fenômenos;
motivar os estudantes para o estudo da disciplina em questão; dar
suporte aos cursos teóricos da disciplina estudada e introduzir os
alunos no método científico (BENINI, 2006, p.48).

Perez (1993), citado por Turrioni (2004), salienta que, tradicionalmente, o


Laboratório de Matemática é tido como um lugar onde se realizam experiências com
materiais didáticos, assim como os laboratórios de Física, Química e Biologia.
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Nesse sentido, se considerarmos o fato de que, historicamente, a


experimentação inserida no Laboratório de Ciências possui caráter empírico
(GALLIAZZI et al. 2001) e considerando a Matemática como uma ciência em
particular, passamos a imaginar este laboratório, dentro da perspectiva empirista,
como um lugar onde ocorre a ênfase no procedimento. Procedimento este, que
inicialmente se evidencia na fala de Passos, Gama e Coelho (2007), ao revelarem
que nesta concepção empírica, “[...] o conhecimento matemático é extraído
diretamente do material concreto, de forma absoluta e segura, de modo que o
simples manuseio do material seria capaz de levar o aluno a apreender o conceito
matemático” (PASSOS; GAMA; COELHO, 2007, p.7).
Assim, o procedimento poderia ser entendido também como uma
sequência préestabelecida de instruções para o desenvolvimento de
experimentos tendo como referência o modelo de método científico criticado
neste trabalho por Valadares (2001). Esses experimentos, ao serem
realizados no ambiente do laboratório, visam reconstituir fenômenos,
demonstrar leis e verificar propriedades a partir do material concreto ali
existente; pretende, também, motivar os alunos, podendo, ainda, desenvolver
nestes, outras habilidades menos recorrentes do que as habilidades
procedimentais, como, por exemplo, as habilidades de processo13 (MILLAR;
DRIVER, 1987, citados por LABURÚ, 2005) e as habilidades de atitude 14
(TRUMPER, 2003, p.649 citado por LABURÚ, 2005).
Entretanto, a ênfase no procedimento dado a este Laboratório
Tradicional (Matemática) limita o poder de decisão do aluno, uma vez que
este, ao seguir os passos de um roteiro prescrito pelo professor, durante o
13
A habilidade de processo refere-se a uma habilidade cognitiva de reunir informações científicas, organizar ou impor
uma ordem intelectual sobre os dados, de forma a reconhecer regularidades, interpretar, elaborar e testar hipóteses,
extrair conclusões e fazer inferências de dados e observações, indagar questões científicas, assegurando as respostas
via experimento, desenvolver o pensamento lógico e crítico, [...] saber transpor o raciocínio concreto e a linguagem
verbal para uma linguagem e um raciocínio matemático mais abstrato e viceversa.

14
A habilidade de atitude será entendida como a habilidade que envolve a aptidão para a aprendizagem
colaborativa, trabalhar em cooperação, participar da distribuição e conjugação de tarefas, compartilhar
resultados com outras equipes, respeitar e comparar idéias opostas às das pessoas etc..
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desenvolvimento de uma experiência, é levado a tirar conclusões já


conhecidas e estabelecidas. Neste contexto, esse aluno não tem liberdade de
pensar ou tentar novas estratégias, uma vez que a sua maneira de pensar e
agir é conduzido por um roteiro programado pelo professor (BENINI, 2006).
Dessa forma, diante do exposto, este tipo de laboratório pode contribuir
em menor escala para o desenvolvimento de habilidades de atitudes e de
processos ao se comparar com as procedimentais. No entanto, a habilidade
de processo poderia se tornar mais evidente à medida que a ação
manipulativa viesse acompanhada de uma ação reflexiva durante a
experiência com os materiais de ensino, o que, nesse caso, seria uma
qualidade do ambiente construtivista de aprendizagem e não se constitui uma
característica importante para o laboratório em questão.
Assim, o laboratório tradicional vem a se constituir num espaço para
introduzir os alunos na experiência e vivência das etapas que compõe o
método científico. É neste lugar, diferente do ambiente da sala de aula
convencional, que o professor de Matemática dispõe de toda uma infra-
estrutura preparada para o desenvolvimento de experiências com materiais
didáticos. De acordo com as idéias de Passos (2006; 2007), a aquisição do
conhecimento começa pela crença desse professor de que a observação
empírica e a manipulação do material por parte do aluno, possibilitada pelos
órgãos de sentido, possam produzir neste impressões que o levem à
construção de conceitos que são extraídos diretamente do material
manipulado. Esse apego ao material como um fim em si é um traço do
laboratório tradicional.
Segundo Benini (2006), o papel do professor neste laboratório consiste
em supervisionar e auxiliar a realização de experimentos, mais
especificamente estabelecer os passos que o aluno deverá seguir para o
desenvolvimento dessas atividades, a fim de que se possa chegar ao

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resultado esperado.
Para que este laboratório possa cumprir de forma eficiente os seus
objetivos, Tahan (1962) explica que o mesmo deverá estar “bem instalado e
conter copioso material destinado a facilitar a tarefa do professor e assegurar
o aproveitamento integral dos alunos” (TAHAN, 1962, p.64). Toda essa
preocupação com o espaço e com os materiais é importante para se garantir
a realização de experiências estruturadas nos moldes de um método 15 apenas
(AGUIAR, 1999). Ainda de acordo com esta autora, a função deste laboratório
é estabelecer a relação entre a teoria estudada em sala de aula com a sua
prática realizada no laboratório.

7.5.6 Laboratório/ Sala Ambiente - Laboratório de Ensino de Matemática

Este tipo de laboratório tem como foco central a realização de atividades de


ensino com ênfase na vivência de processos que auxiliam a construção do
conhecimento matemático, bem como a realização de atividades que promovam o
desenvolvimento de atitudes nos alunos.
Na descrição do espaço físico desse laboratório, encontramos em Aguiar
(1999) uma proposta de junção do espaço físico, que tradicionalmente se reconhece
como laboratório tradicional (Laboratório de Matemática), com o espaço físico da
sala de aula, devendo, estes dois lugares se constituírem como um só espaço,
denominado pela autora de “Sala Ambiente”. De acordo com ela, esta proposta
pretende evitar uma suposta separação que possa existir entre a teoria vista em sala
de aula e a prática realizada em laboratório.
Aguiar (1999) explica, ainda, que essa ruptura da teoria com a prática
geralmente ocorre quando o ambiente da sala de aula e o espaço físico do
laboratório estão separados em ambientes diferentes, tendo, em cada um, um
professor responsável por suas atividades.
Para Lorenzato (2006), o Laboratório de Ensino de Matemática é definido
como:

15
O método em questão faz referência ao método científico descrito e criticado no capítulo anterior.
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Uma sala-ambiente para estruturar, organizar, planejar e fazer


acontecer o pensar matemático, é um espaço para facilitar, tanto ao
aluno como ao professor, questionar, conjecturar, procurar,
experimentar, analisar e concluir, enfim, aprendere principalmente
aprender a aprender (LORENZATO, 2006, p.7).
Nessa descrição do Laboratório de Ensino de Matemática como sala
ambiente, percebe-se que a ideia proposta por este autor não fica somente restrito
ao lugar; inclui também todo o desenvolvimento de um processo que antecede a
construção do conhecimento matemático.
Essa caracterização desse tipo de laboratório como um processo também
pode ser verificado nas descrições de laboratório propostas por Oliveira (1983) e
Passos (2006). Para Oliveira (1983, p.82) o “Laboratório é entendido aqui como o
espaço onde se criam situações e condições para levantar problemas, elaborar
hipóteses, analisar resultados e propor novas situações ou soluções para questões
detectadas”.
Complementando a ideia de Oliveira (1983), Passos (2006) coloca que o
Laboratório de Ensino de Matemática
[...] é um ambiente que propicia às crianças, aos futuros professores e
aos professores formadores um conjunto de explorações e
investigações matemáticas com o propósito de descobrir alguns
princípios matemáticos, padrões e regularidades (PASSOS, 2006,
p.90).
Em ambas as falas, as autoras descrevem a realização de atividades que
possibilitam ao aluno elaborar hipóteses, testar, analisar, refletir e concluir, ou seja,
aprender a fazer, fazendo. É neste ambiente, que o professor poderá aguçar a
curiosidade dos alunos, promover discussões, reflexões, realizar atividades
experimentais e investigações, bem como problematizar situações e conceitos, em
busca de uma aprendizagem significativa (AGUIAR, 1999).
Nessa ideia de Laboratório de Ensino de Matemática, entendida como um
processo, a construção do conhecimento se dá de forma dialética, havendo sempre
a mediação do professor entre o objeto a ser conhecido e o sujeito (aluno). Durante

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o desenvolvimento desse processo, cabe ao professor oportunizar aos alunos


momentos de reflexão durante a interação destes com o objeto a ser conhecido, de
forma que experiências individuais de formação e transformação possam surgir de
forma significativa para cada um (LARROSA, 2002). Nesse contexto, segundo
Lorenzato (2006), os materiais didáticos “criam vida” à medida que dinamizam e
enriquecem as atividades de ensino-aprendizagem. Sendo assim, é recomendável
que o mesmo seja utilizado como um meio auxiliar do processo de ensino-
aprendizagem (LORENZATO, 2006) e não como um objeto material com finalidade
em si mesmo, conforme se verifica na caracterização do Laboratório Tradicional
(Laboratório de Matemática).
Assim, Passos (2006) alerta que este laboratório não deve ficar somente
restrito a “lugar”, ou “processo”, mas deve incluir ainda “atitude” (PASSOS, 2006,
p.90). De acordo com essa autora, a ideia é proporcionar ao aluno maior autonomia
de pensamento, de modo que este seja capaz de observar, refletir e questionar por
si mesmo. Nesse sentido, a autora exalta a grande importância do laboratório no
desenvolvimento de atitudes ligadas à formação do perfil investigativo do aluno,
possibilitando um contato mais próximo do mesmo com a Matemática, aumentando,
assim, a sua perseverança na busca de soluções e sua confiança na sua
capacidade de aprender e investigar.
Toda essa descrição da sala ambiente como um lugar e processo, capaz de
gerar atitudes positivas em relação à construção do conhecimento matemático vai
ao encontro das ideias descritas em relação ao ambiente construtivista de
aprendizagem proposto e caracterizado por Valadares (2001). É neste ambiente que
as experiências de aprendizagem,formação e transformação poderão se tornar mais
intensas e significativas à medida que o aluno estiver profundamente envolvido
neste processo (LARROSA, 2002).
Lorenzato (2006) explica que este laboratório pode ser utilizado tanto nas
escolas de ensinos Fundamental e Médio, como também nos cursos de formação de
professores de Matemática. No primeiro caso, o autor considera este espaço como:

[...] um local da escola reservado preferencialmente não só para aulas

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regulares de Matemática, mas também para tirar dúvidas de alunos;


para professores de Matemática planejarem suas atividades, sejam
elas aulas, exposições, olimpíadas, avaliações, entre outras,
discutirem seus projetos, tendências e inovações. Um local que sirva
também para a criação e desenvolvimento de atividades
experimentais, inclusive de produção de materiais instrucionais que
possam facilitar o aprimoramento da prática pedagógica
(LORENZATO, 2006, p.6).

Ainda de acordo com Lorenzato (2006), o Laboratório de Ensino de


Matemática nas escolas de ensinos Fundamental e Médio deve ser considerado
como
[...] o centro da vida matemática da escola; mais do que um depósito
de materiais, sala de aula, biblioteca ou museu de matemática, o LEM
é o lugar da escola onde os professores estão empenhados em tornar
a Matemática mais compreensível aos alunos (LORENZATO, 2006,
p.7).

Já em relação à utilização deste tipo de laboratório nas instituições de Ensino


Superior, Lorenzato (2006) ressalta a importância do mesmo, como um local para a
realização da prática pedagógica do acadêmico durante a sua formação inicial.
Segundo ele, é neste ambiente que os futuros professores deverão aprender a
utilizar corretamente os materiais de ensino. Dessa forma, torna-se altamente
recomendável que o MD esteja sempre que necessário “presente no estudo didático-
metodológico de cada assunto do programa de metodologia ou didática do ensino da
Matemática, pois o conteúdo e seu ensino devem ser planejados e ensinados de
modo simultâneo e integrado” (LORENZATO, 2006, p.10).
Complementando as idéias de Lorenzato (2006), segundo Lopes e Araújo
(2007), o objetivo desse laboratório num curso de Licenciatura em Matemática é
propiciar ao futuro professor “o conhecimento e a vivência de metodologias
alternativas para o ensino e a aprendizagem da Matemática” (LOPES; ARAÚJO,

Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
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2006, p.60).
Para que este objetivo seja alcançado, os autores recomendam que este
laboratório deva oferecer um
[...] amplo acervo de livros didáticos, paradidáticos, obras de interesse
histórico, propostas curriculares, revistas científicas, registros de
experiências, artigos para pesquisas e softwares educativos, assim
como computadores ligados a um sistema de busca pela internet. Tal
acervo, intermediado pelo professor capacitado, certamente leva os
alunos a terem uma atitude de investigação e, assim, cria-se a
possibilidade de tornarem-se sujeitos críticos e criativos, participantes
do seu próprio processo de aprendizagem (LOPES; ARAUJO, 2007,
p.60).

Assim, Oliveira (1983), considera que os objetivos desse laboratório são:


a) “Desenvolver no licenciando a atitude de indagação”;
b) “Buscar o conhecimento”;
c) “Aprender a aprender”;
d) “Aprender a ajudar”;
e) “Desenvolver a consciência crítica” (OLIVEIRA, 1983, p.95-96;
TURRIONI, 2006, p.64).
No quarto objetivo, Turrioni (2004) propõe a substituição da palavra “ajudar”
pela palavra “cooperar” uma vez que segundo que “cooperar é mais abrangente,
implica construir o conhecimento junto com o outro, supondo trabalho colaborativo”
(TURRIONI, 2004, p.68).
Além desses objetivos, esse laboratório possui outras funções, segundo
Oliveira (1983), sendo elas: “proporcionar a integração de todas as disciplinas da
formação pedagógica do curso com as demais disciplinas da formação profissional
geral e promover uma real aplicação das teorias, desenvolvidas nas mesmas
disciplinas, nas exigências de cada grupo” (OLIVEIRA, 1983, p.92).
Segundo Varizo (2007), a importância do Laboratório de Ensino de
Matemática aumentou após a LNDBE de 20.12.1996 e da CNE/CP nº2 de
Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
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19.02.2002 determinarem a obrigatoriedade de 400 horas de estágio curricular


supervisionado. A partir disso, muitas instituições de Ensino Superior sentiram a
necessidade de um ambiente que pudesse contribuir para realização das atividades
de estágio, bem como para a realização das atividades práticas das disciplinas
pedagógicas.

7.5.7 Porque Laboratório de Ensino de Matemática?

De acordo com Benini (2006), o objetivo de um laboratório ligado ao ensino


da Matemática “não é criar novas teorias ou obter resultados inéditos para a
Matemática, mas propiciar aos alunos meios para que eles compreendam melhor a
Matemática já existente, isto é, prezar o encontro da teoria com a prática.” (BENINI,
2006, p.80).
Essa diferença nos objetivos de um laboratório em relação ao outro, pretende
evitar, em nosso entendimento, que a Matemática seja vista como uma ciência
experimental, assim como outras Ciências que, ao longo dos anos, fizeram ou ainda
fazem uso de uma proposta de ensino experimental baseada na aplicação do
método científico.
Com base nessa reflexão, encontramos em Benini (2006) uma proposta de
substituição da expressão Laboratório de Matemática (LM) pela expressão
Laboratório de Ensino de Matemática, não sendo a primeira mais apropriada, uma
vez que, de acordo com a autora:
[...] o que se pretende é o desenvolvimento de estratégias que
permitam uma melhor qualidade de aprendizagem, no processo de
construção do conhecimento dos alunos, por meio de experimentos e
tendo-se como principal objetivo colocar em prática os processos de
reflexão, as comparações, as relações e associações (BENINI, 2006,
p.80).

Diante do que foi exposto acima por Benini (2006) propomos a


substituição dos termos experimento e experimentação pela expressão
atividades experimentais, no intuito de evitar qualquer tipo de referência a
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alfabetização: laboratório de ensino de matemática
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uma proposta de ensino baseado na vivência das etapas que compõem o


método científico, conforme preconiza Alves (2002).

7.7 Laboratório/ Agente de formação - Laboratório de Educação Matemática

O Laboratório descrito aqui como “Agente de formação” (TURRIONI, 2004)


engloba a concepção de sala ambiente (Laboratório de Ensino de Matemática)
discutido anteriormente, como também abarca outras idéias propostas por:
Lorenzato (2006), Passos (2006), Varizo (2007), Rêgo e Rêgo (2006), Oliveira
(1983), Lopes e Araújo (2007), Turrioni (2004), Turrioni e Perez (2006). Este tipo de
laboratório, entendido também como “Laboratório de Educação Matemática”, tem
como foco central a realização de atividades de ensino, pesquisa e extensão com
ênfase na formação inicial e continuada de professores em Matemática.
De acordo com Turrioni (2004), esta concepção de laboratório engloba
também uma nova função:

[...] constituir-se num ambiente que funciona como um centro para


discussão e desenvolvimento de novos conhecimentos dentro de um
curso de licenciatura em Matemática, contribuindo tanto para o
desenvolvimento profissional dos futuros professores como para sua
iniciação em atividades de pesquisa (TURRIONI, 2004, p.62).

A autora entende que, diante dessa proposta, o laboratório deve ser


entendido como um “agente de mudança num ambiente onde se encontram esforços
de pesquisa na busca de novas alternativas para o aperfeiçoamento do curso de
Licenciatura em Matemática, bem como do currículo dos cursos de Ensino
Fundamental e Médio” (TURRIONI, 2004, p.64). Nesse sentido, as atividades
desenvolvidas por meio da metodologia de projetos deverão ser fundamentais nesse
ambiente “para que o aluno futuro-professor possa se desenvolver profissionalmente
e fazer pesquisa” (TURRIONI, 2004, p.66).
Ainda de acordo com essa autora, além da integração das disciplinas de
formação pedagógica e profissional, é também objetivo do Laboratório de Educação
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alfabetização: laboratório de ensino de matemática
CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

Matemática durante a formação inicial de professores: a preparação de “novos


professores com uma formação mais próxima das pesquisas recentes e imbuídos de
um sentimento de indagação e procura” (TURRIONI, 2004, p.80).
De acordo com Varizo (2010), o papel do Laboratório de Educação
Matemática é atuar como coadjuvante das disciplinas de cunho didático-pedagógico,
mais especificamente em ações voltadas para a formação inicial de professores,
como por exemplo:
a) capacitar os professores para atuar como investigadores e
pesquisadores na sala de aula e possibilitar estratégias para manter
uma visão crítica construtivista da sociedade e do currículo.
b) formar um profissional reflexivo-crítico-investigador na sala de aula e
demais dependências da escola, participativo na organização
pedagógica e membro de uma comunidade social educativa;
c) perseguir a aquisição de destrezas práticas que possibilitem, por
parte dos professores, um comportamento adequado a cada situação;
d) capacitar um profissional para desenvolver uma reflexão
colaborativa, bem como um trabalho cooperativo (VARIZO, 2010, s.p).

Diante disso, a autora ainda coloca que o professor em formação deverá ser
“capaz de gerenciar o seu processo de desenvolvimento profissional, do seu
aprender para a vida toda, sempre engajado nos aspectos histórico-sociais, capaz
de trabalhar coletivamente e compromissado com o seu fazer” (VARIZO, 2010, s.p.).
Na tentativa de tornar mais amplo o campo de atuação desse laboratório,
encontramos em Lopes e Araújo (2007) uma proposta para a utilização do
Laboratório de Educação Matemática, tanto na formação inicial de professores
quanto na formação continuada. Nessa proposta, o laboratório aparece como:

a) Órgão de assessoria didático pedagógico ao curso de Licenciatura


em Matemática.
b) Órgão de prestação de serviços à universidade e à comunidade.
c) Órgão de pesquisa visando à qualidade do ensino da Matemática

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CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

(LOPES; ARAÚJO, 2007).

Como órgão de assessoria didático-pedagógica ao curso de Licenciatura em


Matemática, Lopes e Araújo (2007) explicam que o laboratório deverá “atuar no
sentido de elevar o nível de desempenho dos acadêmicos, contribuindo para o seu
desenvolvimento profissional” (LOPES; ARAÚJO, 2007, p.61).
Nesse sentido, a realização de atividades envolvendo a construção e
utilização de material didático, a vivência de metodologias de ensino alternativas
como: a modelagem matemática, atividades de exploração e investigação, a
vivência de projetos interdisciplinares, a resolução de problemas e o uso das
tecnologias de informação e comunicação aliadas a uma postura construtivista do
professor poderão tornar o ensino e a aprendizagem da Matemática mais agradável
e eficiente no ambiente do laboratório.
Já como órgão de prestação de serviço, deverá capacitar professores,
oferecendo cursos como, por exemplo: palestras, oficinas e mini-cursos (LOPES;
ARAÚJO, 2007).
Dessa forma, as atividades desse laboratório ganhariam maior alcance social
à medida que os professores e alunos da Educação Básica pudessem ter a
oportunidade de experimentar materiais didáticos alternativos, bem como novas
propostas de ensino, aulas de reforço escolar, monitoria, palestras, cursos de
capacitação e participação em grupos de pesquisa e trabalho colaborativo. Essa
parceria entre a comunidade e a instituição formadora é também uma característica
dessa proposta de laboratório.
Como órgão de pesquisa, segundo os autores, deverá incentivar a formação
de grupos de pesquisa voltados para o ensino da Matemática, bem como
impulsionar a realização de projetos de iniciação científica (LOPES; ARAÚJO, 2007).
Nesse contexto, poderão ser propostos estudos e pesquisas na área de
Educação Matemática, com o intuito de identificar os problemas educacionais
enfrentados pela comunidade escolar existente neste local. Essa vivência da
pesquisa educacional no ambiente do Laboratório de Educação Matemática permite
o desenvolvimento da postura investigativa, reflexiva e crítica do aluno em formação,

Planejamento de atividades e materiais de ensino na área da matemática nos anos finais do ciclo de
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CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

devendo este, por si só, através da prática da pesquisa, tornar-se um agente capaz
de buscar a solução para os problemas enfrentados em sala de aula.
Nessa mesma direção, Rêgo e Rêgo (2006) explicam que o papel deste
laboratório, quando instalado em instituições de Ensino Superior, é incentivar a
melhoria da formação inicial e continuada de professores, promovendo ações que
visam à integração das áreas de ensino, pesquisa e extensão, como também
favorece o estreitamento da relação entre a instituição e a comunidade, além de
estimular a prática da pesquisa em sala de aula. Nesse sentido, de acordo com os
autores, o laboratório possibilita:
 estreitar as relações entre a instituição e a comunidade, atuando como
parceira na solução dos problemas educacionais que esta apresenta,
buscando a melhoria do ensino e constituindo um espaço de
divulgação e de implantação de uma cultura de base científica;
 estimular a prática da pesquisa em sala de aula, baseada em uma
sólida formação teórica e prática; e
 firmar projetos de parceria com os sistemas locais de ensino, visando à
instalação de clubes e laboratórios de Matemática, além de oficinas e
cursos de formação continuada para seus professores. (RÊGO; RÊGO,
2006, p.41).

Diante do que foi exposto, Rêgo e Rêgo (2006) consideram importante o uso
do Laboratório de Educação Matemática nos cursos de formação de professores à
medida que este vem oportunizar a realização de atividades onde os professores da
Educação Básica e alunos do curso de Licenciatura possam trocar experiências,
refletirem e avaliarem o sistema de ensino adotado nas escolas, bem como
contribuir para a elaboração de propostas de ensino que possam superar os
aspectos negativos dessa avaliação.
Nesse sentido, para que as atividades propostas por este laboratório possam
atender a comunidade acadêmica bem como a comunidade externa, este laboratório
deverá centrar seus objetivos, de acordo com o proposto por Bertoni e Gaspar
(2006), em:
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CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

◦ dar oportunidade ao aluno de licenciatura em Matemática de aplicar


e avaliar os conteúdos e as propostas pedagógicas discutidas nas
disciplinas de formação profissional do currículo do curso de
licenciatura em matemática (...)
◦ subsidiar professores do ensino fundamental e médio em propostas
pedagógicas, materiais didáticos e uso de novas tecnologias no
ensino-aprendizagem da Matemática, e
◦ criar situações que possam levar a despertar nos alunos,
professores e membros da comunidade o interesse pelo
conhecimento matemático e possam modificar algumas das
concepções que se tem da Matemática, como, por exemplo de que
é um conhecimento que não é acessível a todos, que a Matemática
é difícil etc. (BERTONI; GASPAR, 2006, p.150).

De acordo com Oliveira (1983), esse laboratório deverá proporcionar


situações para a realização da pesquisa à medida que:
[...] constituir-se num ambiente que funciona como um centro para
discussão e desenvolvimento de novos conhecimentos dentro de um
curso de licenciatura em Matemática, contribuindo tanto para o
desenvolvimento profissional dos futuros professores como para sua
iniciação em atividades de pesquisa (TURRIONI, 2004, p.62).
Por fim, a autora considera que esse laboratório será de extensão “na medida
em que proporcionar oportunidade a todos os professores da comunidade, de
participação no processo de pesquisa” (OLIVEIRA, 1983, p.92). Ainda de acordo
com a autora, essa participação poderá acontecer da seguinte forma:

a) na testagem de uma nova metodologia;


b) na avaliação de objetivos;
c) na contribuição com suas experiências e nos intercâmbio das
mesmas com os alunos do curso de Licenciatura;
d) na participação de cursos de aperfeiçoamento propostos pelo
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CURSO SUPERIOR DE
LICENCIATURA EM
PEDAGOGIA

laboratório para atender às necessidades da mesma comunidade.


(OLIVEIRA, 1983, p.92-93).

7.7.1. Porque Laboratório de Educação Matemática?

Varizo et al. (s.d, s.p.) entende que o nome Laboratório de Educação


Matemática abrange uma concepção muito mais ampla do que Laboratório de
Ensino de Matemática. Segundo estes autores, a palavra Educação “é mais
abrangente do que ensino, uma vez que ela, além de se referir ao ensino, refere-se
à aprendizagem, à didática, à experimentação e a socialização do conhecimento”
(VARIZO, 2010, s.p).
De acordo com essa autora, é no ambiente do Laboratório de Educação
Matemática que serão desenvolvidos: estudos, pesquisas sobre o ensino e
aprendizagem da Matemática, projetos de extensão, atividades experimentais,
metodologias para o ensino da Matemática e difusão do conhecimento.
Varizo (2007) explica ainda que o que dá nome ao laboratório é “a ciência
objeto de seus estudos e experiências” (VARIZO, 2007, p.2). Dessa forma, ela
revela que o nome Laboratório de Educação Matemática faz referência ao objeto de
estudo e experiências da Ciência da Educação, voltando-se para o contexto da
Educação Matemática.

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