Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
Introdução
O motivo desse trabalho é explorar as questões relacionadas a crianças que
possuem um universo religioso diferenciado da maioria em, seu entorno no ambiente escolar.
Vamos lançar um pouco de luz sobre a questão de como a escola se relaciona com os aspectos
culturais e religiosos experimentados por essas crianças nos terreiros, mas precisamente o
Candomblé. Vamos nos ater a questões relacionadas a existência de discriminação e de como as
crianças candomblecistas a enfrentam. Vamos também tentar entender um pouco mais sobre de
que maneira a lei em torno do ensino religioso obrigatório afeta as crianças de terreiros e de
como a escola se relaciona com as crianças e adolescentes que frequentam o candomblé. Para
tanto vamos percorrer os caminhos traçados por Estela Guedes Caputo em seu livro, “Educação
nos terreiros, e como a escola se relaciona com crianças de candomblé”, resultado de quase 20
anos de pesquisa e editado pela Editora Pallas em 2012.
Segundo relatos da própria autora, a motivação inicial da pesquisa para sua tese
de Doutorado em Educação, defendida no dia 11 de julho de 2005, e que dá origem a este livro,
surgiu a partir de uma reportagem para o jornal O Dia, na época em que ainda era jornalista. A
reportagem, que tinha na pauta o objetivo de mapear os terreiros de Candomblé da Baixada
Fluminense, ganhava então novo rumo. Ao descobrir crianças desempenhando funções religiosas
nos terreiros, a autora traça um caminho para tentar entender como é a rotina de aprendizado e
como elas se relacionam com o mundo educacional exterior aos terreiros. Sendo assim, sua ideia
seria entender o universo educacional dentro dessas instituições religiosas, tentando também
entender como agem as escolas em relação a essas crianças, principalmente em torno da aplicação
da lei de obrigatoriedade de ensino religioso nas escolas públicas.
Em seu livro, as primeiras questões que saltam são relacionadas ao que se aprende
nos terreiros. Como as crianças vivenciam esse espaço e que funções desempenham e as relações
que são estabelecidas entre elas e os adultos praticantes do Candomblé. Na segunda parte, com
base em uma metodologia empírica, a autora se debruça sobre a vida dessas crianças na escola
para construir hipóteses que a levam a elaborar questões relacionadas
a existência de discriminação, e de como as crianças candoblecistas a enfrentam, e de como a
escola se relaciona com a existência dessas crianças em seu ambiente. Nesse sentido, Stela
apresenta elementos de socialização dentro do espaço público do Candomblé, através do relato de
certas ritualísticas comuns àquele universo. Aproveitando esse relato, ela vai tratar da relação entre
o Candomblé e a escola nas figura tanto de educadores quanto dos alunos.
Dentro do terreiro, a realidade vivenciada pelas crianças e adolescentes no
processo de socialização acaba sendo bem diferente daquele enfrentado por eles na escola,. Em um
país de ampla maioria cristã, o espaço escolar tem se transformado em um lugar de discriminação
aos praticantes de outras matrizes religiosas, principalmente com o crescente engajamento político
de setores evangélicos nas questões relacionadas a educação. Em uma das entrevistas feitas por
Stela Caputo para compor seu trabalho, a entrevistada, uma menina, que ocupa uma posição de
destaque para com aquela comunidade, crescida no terreiro onde virá a ocupar uma posição
proeminente, chega a declarar que: “Eu quero ser crente, na escola só gostam dos alunos
crentes”(CAPUTO, S. p. 32)
Ao se debruçar sobre sua pesquisa nota-se uma visão diferenciada da relação entre
crianças e adultos dentro dos terreiros. Nos terreiros de Candomblé a hierarquização independe de
fatores relacionados a idade biológica, sendo importante a visão de uma antiguidade iniciática, o
que amplia certos entendimentos quanto a hierarquização nesses espaços para um contexto
diferenciado daquele vivenciado fora dos terreiros. As crianças devem sim respeito aos mais
velhos biologicamente, mas, misturados a eles dentro da visão do sagrado, são igualmente
respeitadas. No terreiro, o tempo de iniciado é o que conta, sendo a “antiguidade iniciática
superior a idade civil.(CAPUTO, S. p. 45) Essa visão quebra de certa forma a lógica no qual só os
professores(adultos) podem ensinar, bem como a de que não aprendem também no processo. A
democratização do processo de aprendizagem acaba de certa forma sendo posta em pauta ao
compararmos os dois ambientes. As crianças de candomblé desempenham funções como os
adultos, sendo esse processo de iniciação o fator que as distingue e as iguala entre os demais
dentro do terreiro. Essa relação acaba por justificar a indagação do porque de uma criança ser
iniciada, de como acontece esse aprendizado e de o que se aprende em um terreiro. Segundo a
pesquisa da autora, esse processo de iniciação vai variar de terreiro para terreiro, sendo contudo
adaptado para questões especiais que o fato de ser criança possa apresentar. Sendo assim, questões
como as relativas a alimentação e recolhimento, características bastantes comuns dos processos de
iniciação do Candomblé, vão sendo descortinadas ao longo do trabalho da autora. Cultos pouco
conhecidos como o destinado aos mortos vão sendo mostrados, em um ambiente onde as crianças
são participantes ativas, desempenhando funções que somente as distinguem dos adultos em
relação ao processo iniciático em si, não havendo hierarquização em relação a idade biológica.
O aprendizado nos terreiros: porque, como, quem ensina e o que se aprende.
Em uma forma de ver como na pesquisa de Caputo isso se comprova, teremos em seu
questionário dirigida aos professores de um conselho de classe. No mesmo questionário, a autora
indaga sobre a lei do Ensino Religioso, esses professores aprovavam essa disciplina para as
escolas. De 13 professores que responderam o questionário, 11 vão responder que aprovavam sim,
desde que excluísse as ‘seitas’ como a ‘macumba’. Continuando, uma professora diz que tentaria
tirar essa ideia de macumba de qualquer aluno seu, e que usaria da leitura da Bíblia todo dia na
escola como metodologia. (CAPUTO, S. 2012)
Ligada desde seu início a religião, a história da educação no Brasil começa com a
chegada dos primeiros jesuítas que vai inaugurar uma fase que haveria de deixar marcas profundas
na cultura do país. O domínio dos jesuítas na educação do país vai durar 210 anos, e quando
expulsos das colônias portuguesas, o que resta de ensino no Brasil continuou sendo oferecido por
outras ordens religiosas. (COSTA, A. 2009)
O Ensino Religioso no período imperial não mudou muito de figura, tudo porque a
Religião Católica Romana era a religião oficial do Império e o Ensino Religioso passara a ser
acobertado e submetido à Metrópole como aparelho ideológico. No período republicano o Ensino
da Religião Católica Romana passa por uma crise, pois um novo regime que surgiu em 1891 pede
a separação do Estado e da Igreja. Na redação da Primeira Constituição Republicana a orientação
quanto ao Ensino Religioso era mostrar que só poderia ou deveria ser ministrado apenas em
alguns estabelecimentos específicos, como por exemplo nas escolas de cunho religioso e não mais
naquelas mantidas pelo Poder Público. Porém mesmo saindo de cena por cerca de 4 décadas, a
mobilização e a pressão da Igreja Católica nunca cessaram, podendo portanto durante diversas
ocasiões obter vitória sobre os setores mais laicos da educação. Como exemplo disso temos a
concordata assina entre Brasil e a Santa Sé em 2008 e aprovado pelo Sena Federal em 2009.
(COSTA, A. 2009).
Em 1931, o decreto 19941 coloca a oferta do Ensino Religioso nas escolas públicas
facultada a necessidade de no mínimo 20 alunos, e fora do horários das demais disciplinas. Porém
a Constituição de 1934 lhe confere o status de “matéria”, tornando-a obrigatória, mesmo que em
caráter facultativo. Em 1937 a obrigatoriedade do Ensino Religioso foi substituída pelo termo
“possibilidade”, estabelecendo uma cláusula de dispensa um pouco mais transparente. Em 1946,
volta-se a obrigatoriedade facultativa, de acordo com a confissão religiosa do aluno. Nos anos
posteriores, já em Regime de Ditadura Militar, a Constituição de 1967 vai garantir o ensino
Religioso como uma disciplina normal nas escolas mas sem ônus para os cofres públicos, porém
essa diretriz somente vai durar até 1971, que revogaria esse artigo. Sendo assim, graças a essa
revogação bem como da pressão dos dirigentes católicos foi possível que professores públicos de
outras disciplinas fossem desviados para o Ensino Religioso(CAPUTO, S. 2012).
Conclusão
Uma questão que deve ser bastante considerada enquanto descaso do Estado em
relação ao direcionamento do Ensino Religioso nas escolas públicas pode ser visto nas declarações
dadas pelos demais professores que professam outras religiões. Para eles, que são minoria, “o
Estado do Rio de Janeiro está cometendo uma grave injustiça porque está catequizando e
convertendo os alunos”(CAPUTO, S. p.220). Se colocando favoráveis ao ensino religioso, em sua
maioria, os professores entrevistados dizem que a forma como é estabelecido está errado. Em seus
depoimentos conclui-se que eles acham que o ensino religioso deve servir para que os alunos
conheçam outras formas de religião e organização do mundo de uma forma interconfessional. De
acordo com 5 professores entrevistados pela educadora Stela Caputo, até a distribuição do material
didático para a disciplina ocorre de forma injusta.
“Cada credo ficou de preparar seu material. Ora, os católicos tem a Cúria na
mão, os evangélicos, muito dinheiro, e tanto a Umbanda quanto o
Candomblé não possuem nem organização, alguma entidade que nos
centralize efetivamente, nem dinheiro. Que material didático podemos fazer?
questiona.”(CAPUTO, S. p. 221) .
Para ele, segundo a autora, o ideal seria a implementação de forma mais eficiente da lei
federal que incorpora a História da África ao currículo. Outras soluções apresentadas por esses
professores, que tentam implementar em suas aulas um ensino mais plural, é falar da história de
todas as religiões, pensando também em incorporar as festas de Umbanda e de Candomblé ao
calendário escolar nas escolas que lecionam. Essas iniciativas em sua maioria das veze sofrem
forte resistência da comunidade escolar. Em seus depoimentos vê-se que de certa forma eles
acabam ocupando o lugar em que o Estado se propôs a ocupar ao instituir o Ensino Religioso
confessional. No desejo de ver uma melhor democratização do Ensino Religioso que contemple
também a sua fé, esses professores se vêem na condição de terem que ser cada vez mais criativos
no trato do ensino onde o Estado deixa a desejar e enfatizam:
A luta por uma escola laica vem perdendo as forças com as investidas de certos setores
conservadores aumentando suas conquistas. Com o passar dos anos esses setores introduziram o
cristianismo como parte da cultura escolar, e ao mesmo tempo, mediante ao forte preconceito, vão
afastando cada vez mais outros segmentos religiosos das salas de aula. As escolas ao celebrarem
as festas religiosas cristãs como Páscoa e Natal por exemplo, se posicionam em direção a escolha
de um segmento cultural religioso. Essa atitude tende a reforçar a percepção do cristianismo como
algo natural dentro do ambiente escolar. Essa questão é explicitada nas falas das irmãs Tuana e
Tainara: “Porque católico é católico e macumbeiro e macumbeiro. Eles são aceitos e nós não.”
(CAPUTO, S. p.223). É bom deixar claro que a aprovação do Ensino Religioso é somente a
afirmação ou reforço dessa política. Mesmo antes da aprovação dessa lei, a religião cristã, antes na
figura do catolicismo e hoje reforçada com o crescimento do movimento evangélico, já fazia parte
da cultura escolar. Nesse sentindo que é também social e histórico, fica cada vez mais difícil os
alunos de outras matrizes religiosas encontrarem espaço na escola para se expressar religiosamente.
(CAPUTO, S. p.223)
COSTA, Antonio Max Ferreira da. Um breve histórico do ensino religioso na educação brasileira,
Anais da XVII semana de Humanidades UFRN, 2009.