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O substantivo latino fabula, -ae deriva-se do verbo fari, que significa “falar,
dizer”. Na antiguidade clássica, como gênero literário, a fábula tem a função de narrar
ou descrever comportamentos humanos, de forma velada, com a intenção de educar e
entreter seus leitores.
No século VI a.C., na Grécia, houve uma grande quantidade de fábulas
atribuídas a Esopo. Séculos depois, Fedro, um ex-escravo, encontra este gênero humilde
ainda não explorado em Roma, que reflete sua condição. Assim, acompanhando os
passos do sábio grego, produz fábulas semelhantes.
Estas pequenas narrativas, que carregam uma espécie de sabedoria popular, têm
como característica a presença não só de homens, mas também de animais, objetos e
divindades com características e costumes humanos.
A utilização de um discurso mais próximo do coloquial e de uma sintaxe mais
simples está relacionada à intenção de Fedro de ser entendido por seu público, em geral
o povo. As simplificações nas descrições, quando ocorrem, têm a finalidade de ressaltar
determinados traços da personalidade dos personagens. Em vez de se preocupar em
descrever as cores das rãs, opta por representá-las como miseras; a ovelha, como
patiens iniuriae.
É possível observar que estas pequenas histórias, que sempre possuem um
ensinamento moral, informam aos mais humildes o abuso dos mais poderosos, desta
forma os alertando de que suas condições de mais fracos são imutáveis.
Este abuso ou poder, nas fábulas de Fedro, pode ser definido como um tipo de
relação existente entre indivíduos ou entre grupos. Neste contexto, o que Van Dijk
(2008) denomina poder social emerge na interação entre uma entidade (opressor) sobre
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outra (oprimida). Assim, aquela possui poder sobre esta, que passa a ter sua liberdade
limitada, surgindo, com isso, uma forma de controle.
Para manter este controle sobre o dominado, o dominador necessitará de alguns
elementos para legitimar seu poder. Logo, este possuirá status, autoridade, riqueza,
conhecimento, habilidades, privilégios ou simplesmente pertencer ao grupo dominante.
Na fábula I, 15, Fedro revela que transformações ocorrem na vida dos mais
pobres quando há uma mudança de um governante ou um opressor:
I, 15. Asinus ad Senem Pastorem
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O terceiro verso, iniciado pelo anafórico id, retoma a promitio dos versos
anteriores, indicando que sua história tem como finalidade fundamentar a sua máxima.
O termo parua fabella, diminutivo do vocábulo fabula precedido pelo adjetivo parua,
ressalta não somente a extensão deste texto, como a natureza deste gênero, considerado
menor. Além disso, é um sinal de modéstia de Fedro.
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como seu dono. Tal diferença de comportamento evidencia as diferentes condições dos
dois personagens.
Para o pastor, ser capturado significaria uma modificação de estado, pois os
inimigos certamente exerceriam algum tipo de poder sobre ele, visto que o velho não
possuía meios para enfrentá-los. Desta forma, tendo de se sujeitar ao controle deles,
assim, tendo sua liberdade reduzida.
Diferentemente, para o asno, ser capturado pelos inimigos, desde que seja
obrigado a carregar a mesma carga, não modifica seu estado, pois seria um servo de
uma maneira ou de outra. Assim, de acordo com a moral, a mudança de quem domina
não traz mudanças para quem é dominado. A alteração de dono não implica uma
modificação das condições de servidão do animal, mas apenas uma manutenção do
poder sobre ele, já que continuaria sendo controlado, tendo suas liberdades limitadas.
Esta narrativa, portanto, apresenta ao leitor o ponto de vista das classes mais
baixas da sociedade romana, sobretudo a dos escravos, no que diz respeito às mudanças
ocorridas nas altas esferas. A mudança de um imperador nada modificaria suas vidas
simples, visto que a relação de poder estabelecida não seria modificada: os opressores
continuariam dominando os oprimidos. Brenot (1924, p.11) contextualiza esta fábula:
Cette fable, qui appartient au livre II, a une intention politique bien marquee.
Rome, quand Phèdre écrivit sa fable, avait change de maître plusierus fois en
peu d’années. Séjan, favori tout-puissant de Tibère, avait été disgracié et
massacré en 31; Tibère était mort en 37; son successeur Caligula avait été
assassiné en 41, et remplacé par Claude.
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verdade, afirmou que eram dez. A ovelha, condenada pelo falso testemunho,
pagou o que não devia. Após poucos dias, a vítima avistou o lobo num fosso.
Ela diz: é dada pelas divindades celestiais a punição da fraude.
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sacrifício”, ou seja, a vítima. No entanto, neste momento que se segue, há uma inversão
dos valores, visto que o lobo se encontra em situação desprivilegiada, no fosso.
Neste novo contexto, este personagem não exerce poder sobre a vítima. Esta,
neste momento, possui sua liberdade, enquanto que o outro se encontra preso. Portanto,
não mais oprimida e controlada pelo animal infame, a ovelha tem direito à fala.
Por fim, esta profere palavras que estão de acordo com a moral vista no começo
da fábula. No entanto, apesar de estar em situação favorável em relação ao outro, o que
fica claro é que tal punição sobre o mais forte não viria dos mais fracos, mas de
entidades superiores aos poderosos: as divindades. Deste modo, apesar de se ver a
queda do lobo, esta fábula não afirma que há mudanças nas relações de poder entre
opressores e oprimidos. No máximo, cabe ao mais fraco, esperar que o mais forte seja
punido pelos deuses.
Esta fábula, portanto, mostra ao leitor que os mentirosos geralmente são
castigados. Além disso, denuncia um abuso de poder por parte dos mais poderosos da
sociedade, que comentem injustiças sobre os mais fracos. O indivíduo oprimido, por
não possuir instrumentos para atacar ou se defender, tais como habilidade ou força, e
por não ter direito à palavra, é obrigado a aceitar a acusação injusta.
Comentadores afirmam que esta narrativa faz referência a alguns fatos ocorridos
no império de Tibério, dos quais, o próprio Fedro afirma ter sido vítima, já que “foi
condenado num processo em que Sejano fez de acusador, de testemunha e de juiz (...) o
pérfido ministro de Tibério manobrava testemunhas de acusação e juízos de
condenação.” (CITRONI, 2006, p. 703.) Assim como o lobo fraudulento caiu no fosso,
Sejano foi condenado e executado por conspirar contra o imperador.
A partir da leitura das duas fábulas, observa-se de que forma a relação de poder
entre os mais fortes e os mais fracos é caracterizada por Fedro.
Na primeira, a mudança dos soberanos nada modifica a vida dos mais humildes.
O asno se mostra indiferente diante dos conselhos do velho pastor. Este é o ensinamento
de Fedro nesta narrativa, já que, nesta sociedade escravista e autoritária, só cabe ao
escravo e ao pobre cidadão serem submissos àqueles acima deles.
A partir da interação dos personagens, seja por meio de comportamentos, seja
por meio da fala, as relações de poder são explicitadas. Num primeiro momento, quando
o pastor apascentava o asno, aquele controlava as ações deste. A partir do momento em
que os inimigos se aproximam, a relação de dominação entre estes dois é rompida e,
com isso, o primeiro passa a não controlar as ações do bicho.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAYET, Jean. La Littérature Latine. Paris: Armand Colin, 1965.
PHÈDRE. Fables. Texte établi et traduit par Alice Brenot. Paris: Les Belles Lettres,
1924.
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