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Fundamentação Bíblica,
Características e Sacramentos da
evkklhsi,a de Jesus Cristo
Autor:
Joab Martins de Lima
Bacharel em Teologia pelo Instituto Metodista Bennett. Mestre em Teologia Bíblica pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO).
Julho 2016
Eclesiologia
Sumário
Introdução ..................................................................................................................................... 3
1 Fundamentação bíblica de Igreja ............................................................................................... 6
1.1 Antecedentes no Antigo Testamento ................................................................................. 6
1.2 Significado de “evkklhsi,a” antes da literatura neotestamentária. ...................................... 8
1.3 O termo “evkklhsi,a” – significado e emprego no Novo Testamento. ................................. 9
1.3.1 “evkklhsi,a” no Evangelho de São Mateus................................................................... 11
1.3.1.1 Breve análise da Perícope de Mt 16, 13-20 ....................................................... 12
1.3.1.2 Breve análise da Perícope de Mt 18,15-18. ....................................................... 15
1.3.2 Considerações sobre a fundação da Igreja. ................................................................ 16
1.3.3 A Igreja (“evkklhsi,a”) em Atos dos Apóstolos (Igreja Primitiva) .............................. 18
1.3.4 Aspectos de Igreja (“evkklhsi,a”) nos escritos paulinos............................................... 20
2 Características e atos fundamentais da Igreja. ........................................................................ 24
2.1 O credo Niceno-Constantinopolitano ............................................................................... 24
2.1.1 Igreja Una. .................................................................................................................. 25
2.1.1.1 Exemplo bíblico de Unidade da Igreja............................................................... 26
2.1.2 Igreja Santa................................................................................................................. 27
2.1.3 Igreja Católica ............................................................................................................ 29
2.1.4 Igreja Apostólica ........................................................................................................ 30
2.2 Atos fundamentais da Igreja ............................................................................................. 32
2.2.1 Pregação e testemunho ............................................................................................... 32
2.2.2 Culto divino, sacramentos e oração ............................................................................ 32
2.2.3 Diaconia e comunhão fraternal................................................................................... 33
3 Sacramentos da Igreja .............................................................................................................. 34
3.1 Significado de sacramento e sua abordagem histórica..................................................... 34
3.2 Sacramento do Batismo .................................................................................................... 38
3.2.1 Conceito de batismo ................................................................................................... 40
3.2.2 Abordagem histórica sobre o batismo ........................................................................ 41
3.2.3 Abordagem teológica sobre o batismo. ...................................................................... 43
3.3 Sacramento da Eucaristia (Ceia do Senhor) ...................................................................... 44
3.3.1 Conceito de Eucaristia ................................................................................................ 44
3.3.2 Abordagem histórica sobre a Ceia do Senhor. ........................................................... 45
3.3.3 Abordagem teológica sobre a Ceia do Senhor. .......................................................... 49
Conclusão .................................................................................................................................... 53
Referências bibliográficas ........................................................................................................... 58
Introdução
1
Fundamentação bíblica de Igreja
1.1 Antecedentes no Antigo Testamento
1
O vocábulo Igreja tem seus antecedentes provenientes do termo hebraico lh'q'
(qähäl). A raiz do termo hebraico lhq, traduzida para o grego pela LXX2 como
evkklew3 (ekkleö), é empregada no Antigo Testamento como verbo ou substantivo4.
Como verbo lh;q' (qähal) tem o sentido de “reunir-se, congregar-se, juntar-se,
amotinar-se, concentrar-se” (Ni), “congregar, convocar, reunir” (Hi)5.
Expressa, portanto, a ideia de reunir um grupo de pessoas tais como o povo (cf.
Dt 4,10), autoridades e anciãos (cf. Dt 31,28) e as tribos de Israel (cf. 1Rs 12,21), para
um propósito seja ele:
defesa mútua (cf. Est 8,11; 9,2; 15-16,18); entrar em guerra (cf. Js
22,12; Jz 20,1); adorar (cf. 2Cr 20,26); pedir a ídolos (cf. Êx 32,1);
ungir Arão (cf. Lv 8,4); armar a tenda da congregação (cf. Js 18,1);
transportar a arca até o templo (cf. 1Rs 8,2; 2Cr 5,3); juntar uma turba
contra alguém (cf. Jr 26,9); rebelar-se contra alguém (cf. Nm 16,3;
20,2; 2Sm 20,14); recenseamento (cf. Nm 1,18); purificação dos
levitas (cf. Nm 8,9); para fazer sair água da rocha (cf. Nm 20,8); para
ouvir as palavras da lei (cf. Êx 35,1; cf. Dt 31,12,28), e para ouvir a
mensagem de despedida de Moisés (cf. Dt 4,10)6.
1
Substantivo masculino singular absoluto.
2
A sigla LXX refere-se a Septuaginta ou Bíblia dos Setenta que é a tradução do texto do Antigo
Testamento Hebraico para o Grego por volta dos séculos III e II a.C. Esta tradução foi feita, segundo a
lenda que se encontra no escrito extra canônico chamado Epístola a Aristeias {8.1.8}, por 70 sábios
judeus em Alexandria no Egito, estes por sua vez, incentivados pelo rei egípcio Ptolomeu II. A
Septuaginta (LXX) ou Bíblia dos Setenta contém livros a mais que a Bíblia Hebraica, os chamados livro
“deuterocanônicos”, aceito por cristão ortodoxos e em parte pelos católicos. Cf. KONINGS, Johan. A
Bíblia, sua origem e sua leitura. Petrópolis-RJ: Ed. Vozes 8ª edição, 2014. p.18.
3
Este vocábulo grego formado pela preposição evk (fora) junto ao verbo grego kalew (chamar, chamar
para fora, chamar de) dá o sentido de chamar para fora. Cf. RUSCONI, Carlo. Dicionário do Grego do
Novo Testamento. São Paulo-SP: Ed. Paulus 2ª edição, 2005. pp.153, 247. Na LXX kalew é usado com
frequência para “nomear coisas” (cf. Gn 1,5,8,9, “dia”, “noite”, “céu”, “terra”; cf. Gn 2,19 “os animais”)
ou pessoas (cf. Gn 25,26, Jacó; cf. Gn 29, 32-35; 30,6-24, “os filhos de Jacó) ou cidades (cf. 2Sm 5,9 “a
cidade de Davi”) ou qualidades (cf. Is 35,8 um caminho é chamado santo, e em Êx 12,16 um dia; Is 56,7,
onde o templo é chamado casa de oração). Cf. COENEN, Lothar. “Chamar kalew” DITNT. p.350.
4
Na forma verbal “lhq” é mais frequente em duas conjugações do verbo hebraico, a saber, Nifal (Ni) e
Hifil (Hi) Cf. ALONSO SCHÖKEL, Luis. “lhq” DBHP, p. 573. “O verbo ocorre 39 vezes nas formas
do nifal e do hifil, tendo o sentido de “reunir-se” ou “reunir”. A raiz lhq aparece 13 vezes no material
extra bíblico de Qumran, referindo-se a reuniões e a grupos de vários tipos, sendo que em apenas uma
ocasião a palavra aparece num contexto de adoração, fazendo paralelo com o uso encontrado em Salmos
22,23”. Cf. LEWIS, Jack P. “lh'q”' DITAT, p.1326.
5
No Nifal ocorre em: Ex 32,1; Lv 8,4; Js 18,1, 22,12; Jz 20,1; 2Sm 20,14; 1Rs 8,2; Est 8,11, 9,2,15,18;
Nm 16,2, 17,7, 20,2; Jr 26,9; Ez 7,8. No Hifil ocorre em: Ex 35,1; Lv 8,3; Nm 1,18, 20,8; Dt 4,10; 1Rs
8,1; Ez 38,13; Jó 11,10.
6
Cf. LEWIS, Jack P. “lh'q”' DITAT, p.1326.
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7
Cf. LEWIS, Ibidem. Em Gn, Lv e Nm lh'q' (qähäl) é traduzido por sunagwgh, (synagogëº) 21 vezes e em
15 passagens de Ez, com exceção de Ez 32,23. Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p.985.
8
Pode ser para dar maus conselhos ou fazer coisas ruins (cf. Gn 49,6; Sl 26,5), para tratar de assuntos
civis (cf. 1Rs 2,3; Pv 5,14; 26,26; Jó 30,28) ou para fazer guerra (cf. Nm 22,4; Jz 20,2 etc.). Os exércitos
reunidos presenciam o combate entre Davi e Golias (cf. 1Sm 17,47). Em outros contextos o termo pode
designar uma multidão de nações reunidas (cf. Gn 35,11), povos reunidos (cf. Gn 28,3; 48,4) ou mesmo
mortos reunidos (cf. Pv 21,16). Pode referir-se aos exilados que voltam (cf. Jr 31,8; Esd 2,64), e então a
comunidade restaurada em Jerusalém é um lh'q' (qähäl) (cf. Esd 10,12, 14; Ne 8,2,17). Cf. LEWIS,
Ibidem.
9
Parece que é intencional a distinção entre td:[] (`ádat) e lh'q' (qähäl) em Lv 4,13: “se toda a congregação
(hd'[)e de Israel pecar por ignorância, e isto for oculto aos olhos da coletividade ( lh'q' (qähäl))...” Aqui
lh'q' (qähäl) tem o sentido de representantes judiciais da comunidade. Existe também o caso em que
certos israelitas não podem entrar no lh'q' (qähäl) (cf. Dt 23,2). Mas em outras passagens os dois
vocábulos são empregados em frases sucessivas tendo o mesmo sentido (cf. Nm 16,3) e também são
colocados juntos (cf. Pv 5,14). Em geral são sinônimos. Cf. LEWIS, Ibidem.
10
Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p. 988.
11
Cf. LEWIS, Jack P. “lh'q”' DITAT, p.1327.
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12
O período clássico da língua grega foi de 900 a 330a.C tornando-se conhecida graças as famosas obras
literárias que tiveram origem neste período e foram preservadas até hoje, como a Ilíada e a Odisseia
ambas atribuídas a Homero. Estas obras são as mais antigas da literatura grega, seguidas por obras de
Hesíodo, Heródoto e Platão, entre outros. O dialeto que mais se destacou neste período foi o ático o qual
chegou a ser a base principal para o grego koinê, o grego que foi escrito a LXX e o Novo Testamento. Cf.
REGA, Lourenço. BERGMANN, Johannes. Noções do Grego Bíblico. São Paulo-SP. Ed. Vida Nova. p.
8.
13
Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p.984.
14
Ibidem. p.985.
15
Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p. 985.
16
Com as conquistas de Alexandre o “Grande”, por volta de 330 a.C, o grego usado passou a ser o
“Koinê”, ou seja, o grego conhecido como “comum”. Lembrando que foi neste período que a tradução do
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Antigo Testamento hebraico para o grego conhecida por Septuaginta “LXX”, utilizou o grego Koinê.
Mais tarde, já no séc. I d.C, os escritores do Novo Testamento utilizaram o mesmo grego nos seus
escritos. Cf. REGA, Lourenço. BERGMANN, Johannes. Noções do Grego Bíblico. p. 8.
17
Cf. COENEN, op. cit. p. 985.
18
Ibidem p. 989.
19
Ibidem p. 988-989.
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para fora”. Com frequência esta preposição é usada em composição a outra palavra
significando “fora de, embora”. Sugere também a “algo que parte do interior para o
exterior”20.
O substantivo klhsi,a (klësia) é a forma mais curta do verbo kalew (kaleö)
{“chamar, chamar para”}. Este denota o mesmo sentido do verbo assumindo o
significado de “um chamado, convite, intimação, mensagem, convocação de Deus para
a religião da vida”21.
Tendo em vista os dados até aqui apresentados, desde o substantivo hebraico lh'q'
(qähäl), passando pela abordagem do termo evkklhsi,a (ekklësia) no período que
antecedeu os escritos do Novo Testamento, podemos, então, afirmar, que evkklhsi,a
(ekklësia) nos escritos neotestamentários poderá assumir o significado literal de: “um
chamado (para) fora; uma assembleia; reunião da assembleia; uma comunidade;
congregação; Igreja; sociedade; a assembleia de cristãos na cidade ou comunidade”22.
O emprego de evkklhsi,a (ekklësia) no Novo Testamento ocorre 114 vezes23;
Nos evangelhos somente em Mateus 3 vezes;
Em Atos dos Apóstolos 23 vezes;
Nos escritos paulinos 62 vezes;
Em Hebreus 02 vezes e em Tiago 01 vez;
Na terceira carta de João 03 vezes;
Em Apocalipse 20 vezes;
No entanto, evkklhsi,a (ekklësia) não aparece em 1ª e 2ª Pedro; 2ª Timóteo e Tito24.
20
Cf. SOUTER, Alexander M. A. A Pocket Lexicon to the Greek New Testament. p. 74. Cf. STRONG,
James. Greek Dictionary of The New Testament. p.145. Cf. RUSCONI, Carlo. Dicionário do Grego do
Novo Testamento. p. 153.
21
Cf. STRONG, James. Greek Dictionary of The New Testament. p. 265.
22
Cf. SOUTER, Alexander M. A. A Pocket Lexicon to the Greek New Testament. pp. 75-76.
23
Cf. em Mateus (cf. Mt 16,18; 18,17{2x}); em Atos dos Apóstolos (cf. At 5,11; 7,38; 8,1,3; 9,31;
11,22,26; 12,1,5; 13,1; 14,23,27; 15,3,4,22,41; 16,5; 18,22; 19,32,39,40; 20,17,28) em Romanos (Rm
16,1,4,5,16,23); em 1/2 Coríntios (cf. 1Cor 1,2; 4,17; 6,4; 7,17; 10,32; 11,16,18,22; 12,28; 14,4,5,12,
19,23,28,33,34,35; 15,9; 16,1 16,19 (2x); 2Cor 1,1; 8,1, 18,19,23,24; 11,8,28; 12,13); em Gálatas (cf. Gl
1,2,13,22) em Efésios (cf. Ef 1,22; 3,10,21; 5,23,24,25,27,29,32) em Filipenses (cf. Fl 3,6; 4,15) em
Colosenses (cf. Cl 1,18,24; 4,15,16); 1/2 Tessalonisenses (cf. 1Ts 1,1; 2,14; 2Ts 1,1,4); em 1 Timóteo (cf.
Tm 3,5,15; 5,16); em Filemom (cf. Fm 1,2) em Hebreus (cf. Hb 2,12; 12,23) em Tiago (cf. Tg 5,14); em 3
João (cf. 3Jo 1,6,9,10); em Apocalipse (cf. Ap 1,4,11,20{2x}; 2,1,7,8,11,12,17,18,23,29; 3,1,6,7,13,14,22;
22,16).
24
Cf. COENEN, Lothar. “Igreja evkklhsi,a ” DITNT. p. 991.
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25
Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da
Bíblia. p. 117.
26
“Estes evangelhos são chamados de sinóticos, porque possuem semelhança e oferecem concordância de
material e de linha estrutural, podendo ser dispostos em colunas paralelas”. Ibidem. p. 118.
27
“Querigma” significa proclamação. “No uso profano indica a proclamação que um arauto realiza em
nome do rei (cf. Gn 41,43; Is 42,9; 52,7). No NT, o termo indica o conteúdo essencial da pregação que os
apóstolos fazem sobre Jesus Cristo (cf. At 2,22-24; 3,13-26; 4,10-12 etc.). Em um evangelho, significa o
anuncio da proximidade do reino de Deus feito por João Batista, por Jesus e seus discípulos (cf. Mt 3,1-2;
4,17; 10,7.27)”. Ibidem. p. 117.
28
O relato de Mt 22,7, da parábola do banquete nupcial, faz referência direta a destruição de Jerusalém no
ano 70 na primeira destruição da cidade, o que leva os exegetas a datá-lo entre os anos 70 e 80 d.C.
Quanto ao local de composição deste evangelho, sugeriu-se primeiramente a cidade de Jerusalém, mas, no
entanto, este foi rejeitado, pois sabe-se que a partir da morte de Tiago (irmão de João, ambos filhos de
Zebedeu Mc 3,17) entre os anos 44-46 d.C, os discípulos fogem de Jerusalém e é nessa dispersão para a
Fenícia, Chipre e Antioquia que o evangelho é anunciado somente aos judeus dessas regiões (cf. At
11,19). Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. pp. 5-6. Cf. MAZZAROLO, Isidoro. A
Bíblia em suas mãos. p. 133. Cf. CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário
sociopolítico e religioso a partir das margens. p. 16.
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Faremos uma rápida análise de duas perícopes do Evangelho de São Mateus, onde
os termos evkklhsi,a (ekklësia) aparece nos lábios de Jesus. No entanto, esta análise não
será hermenêutica no ponto de vista exegético utilizando os métodos diacrônicos ou
sincrônicos. Será uma análise para entender o sentido de evkklhsi,a (ekklësia) no
Evangelho de São Mateus.
29
Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 11.
30
Cf. Ibidem.
31
Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da
Bíblia. p. 119.
32
O que nos interessa nesta rápida análise é a palavra evkklhsi,a, portanto analisaremos o texto até o
v.18.
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“19
Eu te darei as chaves do reino dos Céus e o que ligares na terra será
ligado nos céus, e o que desligares na terra será desligado nos céus”.
“20
Em seguida, proibiu severamente aos discípulos de falarem a
alguém que ele era o Cristo”. Mt 16,13-20 (Bíblia de Jerusalém).
33
Esta expressão tem dois sentidos, sendo, um humano em sentido de homem ser humano e um sentido
teológico fazendo alusão a Dn 7,13-14 onde Filho do Homem designa um ser celeste, transcendente. No
Novo Testamento esta expressão e encontrada nos lábios de Jesus ao referir-se a sua vida terrestre (cf. Mt
8,20); as predições de seu sofrimento, morte e ressurreição (cf. Mc 8,31; 9,31; 10-33-34); e a sua vinda
como Filho do Homem em futuro próximo glorioso (cf. Mc 8,38; 13,26; 14,62). Cf. MAZZAROLO,
Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 251.
34
Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 251.
35
Esta expressão aramaica “bar-Iônah (cf. Jo 1,42) seria uma forma revolucionária ou anarquista de
caracterizar a pessoa, de modo semelhante a Mt 10,4 definindo Simão, o cananeu”. Cf. MAZZAROLO,
loc. cit.
36
Cf. CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das
margens. p. 423.
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Logo após a esta afirmativa, Jesus, continua suas afirmativas a Pedro dizendo que
sobre a rocha construirá a sua Igreja evkklhsi, a (ekklësia): “18Também te digo que tu és
Pedro, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)}, e as portas do
Hades nunca prevalecerão contra ela.”
Em torno desta temática sobre qual seria a rocha que Jesus declara há outras teses
aqui elencadas;
Sobre a questão das portas do Hades não prevalecerem sobre a Igreja, entendemos
isto num contexto que a Igreja mateana estava sendo perseguida e já haviam ocorrido
martírios como o de Estevão no ano 36 d.C (cf. At 7,55-60) e Tiago irmão de João no
ano 44-46 d.C (cf. At 12,2).
37
Cf. MAZZAROLO, loc. cit. Ulrich Luz teólogo protestante suíço identifica quatro linhas clássicas de
interpretação sobre quem é a rocha; (1) Pedro o representante de todo cristão; (2) a fé ou confissão de
Pedro no v.16; (3) Cristo; (4) Pedro, o bispo modelo. Cf. LUZ, Ulrich, Matthew in History. pp 57-74, esp.
pp 57-63; Burgess, History of the Exegesis of Matthew 16,17-19. Apud CARTER, Warren. O Evangelho
de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das margens. p. 423.
38
Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p. 251-252.
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Entendemos que a rocha sobre a qual Jesus declara construir a sua Igreja é a
profissão de fé que Pedro faz ao declarar que Jesus é o Cristo filho do Deus vivo. Sendo
assim, sobre esta profissão de fé revelada por Deus é que a Igreja será construída, ou
seja, a fé no filho do Deus vivo.
“15
Se o teu irmão pecar, vai corrigi-lo a sós. Se ele te ouvir, ganhaste o
teu irmão.
“16
Se não te ouvir, porém, toma contigo mais uma ou duas pessoas,
para que toda questão seja decidida pela palavra de duas ou três
testemunhas”.
“17
Caso não lhes der ouvido, dize-o à Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)}. Se
nem mesmo à Igreja {evkklhsi,a (ekklësia)} der ouvidos, trata-o como
gentio ou publicano”.
“18
Em verdade vos digo: tudo quanto ligares na terra será ligado no
céu e tudo quanto desligardes na terra será desligado no céu.” Mt
18,15-18 (Bíblia de Jerusalém).
Esta perícope é parte do capítulo 18 que descreve várias instruções sobre a vida
comunitária. Neste capítulo o autor do evangelho “passa algumas máximas de vida
validas para todos aqueles que querem fazer parte da nova família, da nova
comunidade”41.
É, portanto, neste capítulo, o discurso eclesiológico em que as palavras de Jesus
soam como instruções para a sua evkklhsi,a (ekklësia).
Essas instruções visam criar na comunidade relações e práticas sustentadoras.
Pode-se elencar, conforme o vocabulário – chave repetido e temas distintos, seis seções:
39
Cf. MAZZAROLO, Isidoro. Evangelho de São Mateus. p 252.
40
O que nos interessa nesta rápida análise é a palavra evkklhsi,a, portanto analisaremos o texto até o
v.17.
41
Ibidem. p 267.
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“Jesus instituiu, ou fundou a Igreja una”43. Esta afirmativa pode ser entendida da
seguinte forma:
42
Cf. CARTER, Warren. O Evangelho de São Mateus. Comentário sociopolítico e religioso a partir das
margens. p. 455.
43
Formulação que está claramente expressa no juramento antimodernista do Papa Pio X formulado em 1
setembro de 1910, a ser proferido obrigatoriamente por todos os padres, bispos, catequistas e
seminaristas. “eu acredito com fé igualmente firme que a Igreja, Guardiã e mestra da Palavra Revelada,
foi instituída pessoalmente pelo Cristo histórico e real quando Ele viveu entre nós...” Este juramento,
mais tarde, foi abolido pelo Papa Paulo VI em 1967. Cf. X, Papa São Pio - "Juramento contra o
Modernismo" MONTFORT Associação Cultural http://www.montfort.org.br
44
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 56.
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45
Significa que o “reino de Deus se realiza plena e definitivamente no final dos tempos e como
acontecimento já está perto”. A ideia escatológica do reino de Deus “significa o regime de Deus que põe
fim ao curso anterior do mundo, aniquila o que é hostil a Deus, tudo que é satânico, que faz agora suspirar
o mundo, e da mesma forma põe fim a toda necessidade e dor, traz a saúde para o povo de Deus, que
aguarda o cumprimento das promessas proféticas. Cf. KÜNG, Hans. La Iglesia. Editorial Herder.
Barcelona, 1968. pp. 62-63.
46
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 56.
47
Ibidem. pp. 61-63.
48
Ibidem. p. 56-57.
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Igreja49. Podemos também dizer, que o Jesus pré-Pascal lança os fundamentos para
surgir a Igreja pós pascal. Seria uma
49
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 58.
50
Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. pp.46-47.
51
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. p. 58.
52
Ibidem. p. 57.
53
Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. p. 40. O autor de Atos dos Apóstolos enfatiza o
constante crescimento da Igreja apostólica ou primitiva (cf. At 2,47; 4,4; 5,14; 6,1.7; 9,31; 11,21.24;
13,48-49; 19,20).
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Eclesiologia
54
Bíblia de Jerusalém. p. 1905, nota “e”.
55
Bíblia de Jerusalém. p. 1905, nota “f”.
56
Bíblia de Jerusalém. p. 1905, nota “g”.
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Eclesiologia
Nas cartas paulinas o termo Igreja aparece relacionado a três aspectos; corpo de
Cristo; povo de Deus; e templo de Deus ou templo do Espírito Santo.
- Corpo de Cristo.
Aquele que crê em Cristo e em sua obra redentora, passa a estar em Cristo e isso
implica em ser uma nova criatura como uma nova realidade. É estar num novo espaço
de vida agora dominado por Cristo. Nesta nova realidade há uma nova socialização da
qual o crente em Jesus Cristo passa a fazer parte, onde “não há judeu nem grego, não há
escravo nem livre, não há homem nem mulher; pois todos sois um só em Cristo Jesus”
(cf. Gl 3,28). Acontece então a anulação das estruturas sociais, antes, em vigor.
Diante de tal realidade, a Igreja fica condicionada pela cristologia passando,
assim, a ser o corpo de Cristo, pois os participantes deste corpo comungam juntos do
corpo e sangue de Cristo, unindo-se assim ao Cristo crucificado e ressurreto através da
eucaristia (Ceia do Senhor)60.
A Igreja formada por muitos crentes e unida por um só Espírito (cf. Rm 12,5; 1
Co 12,12.27) “cujos diversos membros estão aí uns para com os outros e uns com os
57
Cf. NINOT-PIÉ, Salvador. Introdução à Eclesiologia. p. 40.
58
Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e ao estudo da
Bíblia. p. 132.
59
Ibidem.
60
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 66.
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Eclesiologia
outros”, formam o corpo terreno do Cristo exaltado. Isto significa “que a Igreja é a
forma de apresentação histórica e a forma de apresentação terrena de comunicação de
Cristo, por meio do qual, Cristo, atua e está presente na história” (cf. Ef 1,22s; 4,7-16;
5,21-33; Cl 1,18; 2,19)61.
A Igreja como corpo de Cristo é uma unidade orgânica na qual todos tem uma
função (cf. 1Cor 12,12ss). Por isso, no corpo de Cristo não há nenhum membro mais
importante que o outro. No corpo de Cristo nenhum membro é dispensável e até os
considerados mais fracos têm a sua importância.
Em Rm 12,4-8 o apóstolo Paulo elenca diversas funções, ou dons, que os
membros do corpo de Cristo exercem “...segundo a graça que...foi dada...” a cada um.
Esta diversidade de funções, ou dons, produz valor ao corpo, pois a sua fonte é Cristo.
Desta forma, notamos que todos os membros do corpo de Cristo têm uma função a
desempenhar para a saúde do corpo de Cristo, ou seja, a Igreja. Portanto, se cada
membro do corpo se empenhar em sua função dentro do corpo, a Igreja crescerá e se
manterá saudável.
Para isso, faz-se necessário o atendimento ao chamado à vida de santidade,
expressando pertença a Cristo no pensamento e no testemunho diário. Sendo assim,
entendemos, que os membros do corpo terão saúde (espiritual) e poderão desempenhar
funções que possibilitarão a edificação do corpo, sob a liderança de pessoas escolhidas
por Cristo e reconhecidos pela igreja, para funcionar harmoniosamente por estar em
obediência a Cristo e ao seu serviço coletivo.
- Povo de Deus.
O aspecto da Igreja como povo de Deus a relaciona com Israel. Para tanto o
apóstolo Paulo usa várias designações da Igreja como povo de Deus.
61
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol. 2. Eclesiologia. p. 66.
62
Ibidem. p. 67.
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Eclesiologia
promessas feitas a Israel (cf Lv 26,11; Ez 37,26; Zc 8,8) pois Deus viverá neste templo
por seu Espírito66.
A Igreja como templo de Deus é edificada por ele através dos dons espirituais
distribuídos pelo Espírito Santo para que haja vida, edificação, pois, é o princípio vital
de serviço aos seus membros67.
Como templo de Deus a Igreja é possessão de Deus por se encontrar plena do
Espírito Santo. É a possessão sagrada de Deus na terra, que a santifica e a guarda68.
66
Cf. SCHLIER, Heinrich. Eclesiologia Del Nuevo Testamento In Mysterium Salutis. Manual de
Teologia como história de La salvacion IV/1. La Iglesia. p.169.
67
Cf. Rm 8,1;12,11;15,16; 1Cor 2,10; 6,11; 12,1; 2Cor 1,22; 3,37; Gl 3,1; 5,16; 1Ts 1,5; Ef 1,13; 2,19;
3,3; 5,18.
68
Cf. SCHLIER, Heinrich. op. cit. p.170.
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Eclesiologia
2
Características e atos fundamentais da Igreja.
2.1 O credo Niceno-Constantinopolitano
69
Cf. SCHWIKART, Georg. Dicionário Ilustrado das Religiões. p. 32.
70
“Do grego “hairesis” = diferença, escolha. Tese que se desvia da doutrina comumente aceita (dogma).
As Religiões e Confissões religiosas definiram mais ou menos o que faz e o que não faz parte do seu
elenco doutrinário. Caso o membro da comunidade em questão sustente uma opinião fortemente
contrária, esta é condenada como heresia, conforme o princípio: Uma doutrina que leva ao erro, já é
errônea. - No caso de graves heresias, pode-se chegar até à exclusão da comunidade”. Cf. Ibidem p. 52.
71
İznik, Niceia na Antiguidade, é uma cidade situada na região de Mármara, província de Bursa, Turquia.
A antiga cidade foi o local onde se realizaram o Primeiro e o Segundo concílios de Niceia,
respectivamente em 325 e 787 d.C. Cf. https://pt.wikipedia.org/wiki/Iznik.
72
Cf. BETTENSON, Henry. Documentos da Igreja Cristã. São Paulo. pp. 62-64.
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Eclesiologia
Ao referir-se à Igreja como “Una”, não se pode confundir com a ideia de “uma
Igreja”. A Igreja como Una refere-se à unidade, e esta provem do próprio Deus que lhe
dá origem, pois, há um só Deus, um só Senhor, um só batismo, um só Espírito73.
A unidade da Igreja não se refere a unidade denominacional e nem a união de
várias Igrejas em uma única Igreja formando uma megaIgreja mundial. A unidade da
Igreja refere-se aos alcançados pela graça de Deus, através da fé, ou seja, a abertura ao
acolhimento da ação de Deus expressa na salvação em Cristo74.
O Espírito Santo é o responsável pela unidade da Igreja. Sendo assim, podemos
afirmar que a unidade da Igreja consiste na comunhão daqueles que só Deus sabe os
nomes e conhece, ou seja, uma Igreja invisível, o corpo místico de Cristo75.
Este corpo místico de Cristo tem no texto de Ap 21,2-3 imagens que servem de
revelação sobre a Igreja como tenda, cidade, esposa, povo de Deus. Estas expressões
apontam para Deus como ponto final da unicidade e unidade que se comunicam com o
templo onde ele habita, a cidade cujo princípio é o próprio Deus, o esposo que chama
sua esposa trazendo-a a existência e consagrando-a, criando, desta forma, uma unidade.
Portanto, a Igreja é única porque Deus é UNO e ÚNICO em sim mesmo76. Sendo assim,
podemos afirmar que o princípio fundamental da unidade da Igreja está no Deus Trino,
73
Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. São Paulo. Editora Mundo Cristão. 2007. p.
23.
74
Ibidem. p. 24
75
Ibidem.
76
Cf. CONGAR, Yves. Eclesiologia Del Nuevo Testamento In Mysterium Salutis. Manual de Teologia
como história de La salvacion IV/1. La Iglesia. p. 382.
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Eclesiologia
aquele que é Pai, Filho e Espírito Santo. Deus Pai arquiteto do plano de salvação; Jesus
Cristo consumador do plano de salvação; e Espírito Santo santificador e unificador da
Igreja que prepara a Igreja una para seu encontro com o esposo Jesus Cristo.
Tomando como base os livros de Atos dos Apóstolos, podemos notar como era a
unidade da Igreja Primitiva. Podemos, assim, destacar três pontos; a) a Igreja tinha
unidade no ensino apostólico; b) a Igreja tinha unidade no plano de vida social; e c) a
Igreja tinha unidade na celebração do culto77.
a) Unidade no ensino apostólico; essa unidade implica na aceitação por parte
da Igreja do ensino apostólico, através do qual era inserida unidade da fé e
confissão (cf. At 2,42; 1Cor 1,10; Rm 15,6; Ef 4,14ss).
b) Unidade no plano de vida social; essa unidade implica em uma
comunidade fraterna que se traduz numa forma de vida comum (cf. At
2,44-47); numa comunidade que voluntariamente repartia os seus bens (cf.
4,32-37; Hb 13,16); numa comunidade unida em sentimentos (cf. At 4,32;
Fl 2,2); numa comunidade que repartia o pão por causa de sua convivência
fraterna (cf. Mt 5,23-24; 18,19-20).
c) Unidade cúltica; essa unidade implica na oração e partilha do pão
eucarístico, através do qual os cristãos eram unidos a Cristo e entre si (cf.
1Cor 10,16-17).
A forma de unidade vivida pela Igreja primitiva nos leva a refletir em algo, que
hoje, torna-se escasso em nossa sociedade e atinge nossas famílias. Esse algo que nos
falta é o amor, que consideramos uma marca do evangelho pregado por Cristo e que a
Igreja apostólica cultivou. Prova disso é a forma de unidade que a Igreja primitiva vivia,
pois, esta vivia, como já elencamos acima: a unidade no ensino apostólico, sendo esta
permeada pelo amor, pois, amavam o ensino da palavra do Senhor proferida pelos
apóstolos; a unidade no plano de vida social também tinha como base o amor, pois,
com o amor fraternal podia-se repartir e tornar em comum os bens que tinham. Embora
hoje nossa realidade seja totalmente diferente, há cristãos que se tronaram amantes de si
mesmos e não repartem o que tem, com os que não tem, fechando os olhos e o coração
para os necessitados; e pôr fim a unidade cúltica nos mostra o quanto tinham o prazer
de orar, cultuar e comungar juntos. O comungar causava a união entre eles, porque
77
Cf. CONGAR, Yves. Eclesiologia Del Nuevo Testamento In Mysterium Salutis. Manual de Teologia
como história de La salvacion IV/1. La Iglesia. p. 387.
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Eclesiologia
repartiam, além dos bens que possuíam e com isso não havia necessitados entre eles, o
pão eucarístico, e o alimento que era comum nestas reuniões de comunhão.
Cristo como cabeça do corpo Igreja, lhe confere vida e, portanto, esta está sob o
seu domínio. Sendo assim, a Igreja, sob o domínio de Cristo, torna-se UNA. No entanto,
esta unidade é manifestada na palavra e nos sacramentos. Esta unidade não é
uniformidade de organização, doutrina ou vida, mas sim, no fator unificador Evangelho.
“As várias comunhões eclesiásticas são expressões diversas da Igreja Una”78.
“Se a Igreja é sinal de salvação, sacramento histórico do amor de Deus, seria uma
contradição que não fosse santa”. Assim se expressa o Teólogo Jon Sobrino79 acerca da
santidade da Igreja.
Demonstrar este atributo da santidade da Igreja é difícil, pois a mesma não é um
aglomerado de santos impecáveis, mas de pecadores redimidos por Cristo, composta ao
mesmo tempo por pessoas justas e pecadoras, fato este que pode ser visto em várias
Igrejas; a pecaminosidade de seus membros. Sendo assim, podemos dizer que a Igreja é
ao mesmo tempo santa e pecadora porque os seus membros também o são80.
A Bíblia em algumas passagens do Novo Testamento demonstra que haviam
problemas terríveis na Igreja como: mentira (cf. At 5,1-11); divisões e rixas entre os
membros (cf. 1Cor 1,10-13); carnalidade entre os membros (cf. 1Cor 3,1-4);
imoralidade por parte de membro da Igreja (cf. 1Cor 5,1); discordância de ensino
doutrinário ( cf. 1Cor 15,12 ); falta de unanimidade entre irmãos (cf. Fp 4,2-3); inveja,
ambição, maldade, autoritarismo (cf. 3Jo 9-11); abandono do primeiro amor, desvios
doutrinários, prostituição sagrada, esfriamento espiritual (cf. Ap 2,4-5, 14-16, 20-23;
3,1-3, 14-19). Como, então, falar de santidade da Igreja diante de tais fatos?
Precisamos entender que santidade não reflete perfeição. Ser santo não é ser
perfeito, pois somente Deus é perfeito em todos os seus atos. A santidade da Igreja
refere-se ao seu crescimento (em graça) e fortalecimento dado por Deus que dia a dia
trabalha, através do Espírito Santo, para tirar as manchas do pecado que os seus
membros possuem. Em outras palavras, santidade é um processo, dependente da ação
do Espírito Santo que nela age, e não um estado de vida, pois na Igreja sempre haverá
78
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 274.
79
Cf. SOBRINO, Jon. Ressurreição da verdadeira Igreja. São Paulo: Loyola, 1982. Apud CALDAS,
Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 25.
80
Ibidem. p. 25. Cf. AULÉN, Gustaf. op. cit. p. 279.
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Eclesiologia
pessoas que não fazem parte do reino de Deus bem como de pessoas hipócritas que
vivem uma falsa santidade.
Portanto, “o homem não é detentor de qualquer santidade subjetiva própria”,
sendo “ao mesmo tempo justo e pecador”81.
A santidade da Igreja reside, também, no fato de que a mesma, embora viva e aja
neste mundo, não pertence a este mundo. Esta verdade fundamenta-se no fato que seus
membros, que vivem sob o domínio de Cristo, vivem uma perspectiva, na fé, de um
mundo superterreno. Esta ideia de santidade, que torna a Igreja não pertencente a este
mundo, defende a Igreja de tendências que podem confiná-la a este mundo85.
Contudo, precisamos estar alertas quanto a alienação que pode vir desta santidade,
que faz com que a Igreja se feche para o que acontece em seu redor e faz com que seus
membros se fechem também para a vida.
A santidade da Igreja deve refletir o amor e a justiça divina, justamente pelo fato
da Igreja não ser deste mundo. Somente desta forma, a Igreja pode mostrar sua
verdadeira cidadania do reino de Deus, sendo luz de Cristo em um mundo cheio de
trevas, e não se fechando em si mesma.
81
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 278.
82
Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 26.
83
Cf. AULÉN, Gustaf. op. cit. p. 278.
84
Ibidem. p. 279.
85
Ibidem. p. 279.
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Eclesiologia
Antes de falar sobre o atributo “Igreja Católica”, vamos entender o que o termo
“Católica” significa. O termo Católica (o) deriva do grego καθολικος, (katolikos) e é
formada pela combinação de duas palavra gregas; kata (kata) – com sentido de
concernente, pertencente a; e o[lovj (ólos) com sentido de – totalidade, abrangente86.
Sendo assim, podemos entender que o termo “católica” expressa um sentido; de
pertencer a uma totalidade, um todo, universal. Portanto, quando nos referimos ao
atributo da Igreja como “Igreja Católica”, estamos na verdade expressando o sentido de
autenticidade e universalidade da Igreja. A Igreja por ser católica é uma Igreja
universal, não pertencendo a uma localidade.
Diante de heresias como arianismo, fez-se necessário que a Igreja no séc. IV,
tivesse em seu credo uma afirmação de universalidade, para mostrar que o cristão
católico está legitimamente ligado à Igreja Católica e que não se separou dela como
herege.
Como entender, no sentido hodierno, o atributo de Igreja Católica? São Cirilo
(314-387), Bispo de Jerusalém no sec. IV d.C, em sua catequese define a catolicidade da
Igreja da seguinte forma:
A Igreja é chamada católica porque se estende por todo o mundo, de
um extremo da terra ao outro. E porque ensina completamente, e sem
quaisquer omissões, todas as doutrinas que devem ser conhecidas da
humanidade concernentes aos assuntos visíveis e invisíveis, terrestres
e celestes; e porque congrega todos os tipos de pessoas – soberanos ou
súditos, eruditos ou ignorantes – sob influência da verdadeira piedade;
e porque universalmente trata de todo tipo de pecado e o cura, seja
cometido pela alma seja pelo corpo [...] Ela (a igreja) é a noiva de
nosso Senhor Jesus Cristo, o Filho unigênito de Deus88.
86
Cf. STRONG, James. Greek Dictionary of The New Testament. pp. 238, 244.
87
Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 27.
88
Catequese XVIII apud CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 28.
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Eclesiologia
O último dos apóstolos de Jesus a morrer, por volta do ano 90, foi João o mais
jovem dentre eles. Conta a tradição que João morreu em Éfeso onde foi bispo de todos
89
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 282.
90
Apóstolo (avpo,stoloj), é literalmente, “enviado” (formado de apo, “de”, e stello, “enviar”). Enviado,
mensageiro. “A palavra é usada acerca do Senhor Jesus para descrever sua relação com Deus (cf. Hb 3.1;
Jo 17.3). Os doze discípulos escolhidos pelo Senhor para treinamento especial foram chamados assim (cf.
Lc 6.13; 9.10). Paulo, embora tivesse visto o Senhor Jesus (cf. 1Cor 9.1; 15.8), não tinha ‘acompanhado’
os Doze ‘todo o tempo’ do Seu ministério terrestre e, consequentemente, não era elegível para um lugar
entre eles, de acordo com a descrição de Pedro sobre as qualificações necessárias (cf. At 1.22, ARA).
Paulo foi comissionado diretamente pelo próprio Senhor, depois de sua ascensão, para levar o Evangelho
aos gentios”. Cf. VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W. (Ed.). Dicionário Vine. Rio de Janeiro:
CPAD, p 407.
91
Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. Ed. Vida. São Paulo. p. 25.
92
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 123.
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Eclesiologia
93
Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 25.
94
A categoria de “pais apostólicos” consiste em pessoas e documentos que interpretam e pregaram a
mensagem apostólica na primeira geração depois dos apóstolos, que foi cercada de falsos evangelhos e
ataques de céticos pagãos. Quem foram os pais apostólicos? A partir do século XVI, os historiadores
incluem nessa categoria entre oito e dez autores e documentos anônimos. (Os historiadores
tradicionalmente referem-se a certos documentos anônimos como “pais apostólicos”). Entre os aceitos por
todos estão Clemente, Inácio, Policarpo, o Didaquê [o ensino dos doze apóstolos], epístola de Barnabé e
O pastor de Hermas. Outros comumente citados e descritos como pais apostólicos são a chamada
Segunda epístola de Clemente, de autor desconhecido, a Epístola a Diogneto e fragmentos de escritos de
Papias. Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 40.
95
Cf. CALDAS, Carlos. Fundamentos da Teologia da Igreja. p. 29.
96
Ibidem.
97
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 123.
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Eclesiologia
A Igreja por ter acolhido, através dos apóstolos, a palavra de Cristo, ou seja, a boa
nova anunciada, recebe a incumbência de dar continuidade a esse testemunho e anuncio.
Não poderá existir fé salvadora, ou seja, a fé que conduz a Cristo se não houver anuncio
e testemunho.
A palavra anunciada e testemunhada pela Igreja deve gerar na mesma comunhão e
experiência com Deus, pois esse anuncio e testemunho só se tornará vivo e eficaz nos
ouvintes do evangelho se tiver vida e eficácia no anunciante, a Igreja.
98
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 104.
99
Ibidem. p. 105.
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Eclesiologia
100
Cf. WIEDENHOFER, Siegfried. In Manual de Dogmática Vol 2. Eclesiologia. p. 106.
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Eclesiologia
3
Sacramentos da Igreja
3.1 Significado de sacramento e sua abordagem histórica
101
O termo grego musth,rion (mysterion) ocorre 17 vezes (cf. Mc 4,11; Rm 11,25; 1Cor 2,1; 15,51; Ef
1,9; 3,3; 5,32; 6,19; Cl 1,26; 4,3; 2Ts 2,7; 1Tm 3,9,16; Ap 1,20; 10,7; 17,5; 17,7).
102
“No século I d.C., os livros bíblicos já circulavam em latim, pois era a língua do Império romano. As
versões bíblicas nesta língua ficaram conhecidas como Vetus Latina que seguia uma tradução do AT, a
partir do texto grego da LXX. A Vetus Latina é uma expressão usada pelos estudiosos, para falar das
várias tradições da versão latina da Bíblia que circularam durante os séculos I-VIII d.C. A Vetus Latina é
anterior à Vulgata e continuou circulando depois dela. A sua tradução baseia-se, para o AT, na versão dos
LXX. Após o século XVI, uma versão latina da Bíblia tornou-se o texto oficial da Igreja Católica Romana
ou do rito Ocidental, conhecida como Vulgata. A Vulgata deve-se ao interesse do Papa Damaso I (366-
384), que queria fazer uma revisão da Bíblia em latim, a partir dos manuscritos em hebraico, aramaico e
grego. Tal tarefa foi confiada a um ilustre personagem, São Jerônimo, que se transferiu para a Palestina,
instalando-se em Belém, numa gruta próxima daquela que se acredita ter sido o local onde nasceu Jesus
Cristo. São Jerônimo levou mais de vinte anos para fazer as traduções. A Vulgata foi oficializada,
solenemente, pelo magistério da Igreja Católica durante o Concílio de Trento (1545-1563), após uma
nova revisão do texto, para corrigir os erros que, sucessivamente, foram cometidos pelos copistas. A
versão oficial, texto padrão estampado na Bíblia de Gutemberg, entre os anos 1452-1455, servirá de base
para as várias traduções que serão feitas nas diferentes línguas. A Vulgata, para o NT, totaliza 27 livros e
46 para o AT”. Cf. FERNANDES, Leonardo Agostini. A Bíblia e a sua mensagem. Introdução à leitura e
ao estudo da Bíblia. pp. 28-29.
103
O termo sacramentum ocorre na vulgata latina dez vezes, sendo quatro vezes no Antigo Testamento
(cf. Tb 12,7; Dn 2,30, 47; 4,6) e no Novo Testamento ocorre seis vezes (cf. Ef 1,9; 3,3; 5,32; 1Tm 3,6; Ap
1,20; 17,7).
104
“O vocábulo grego parousia (de páreimi: estar presente, estar aí, chegar) é originalmente referido tanto
para a descida ou manifestação de pessoas divinas na terra (por ocasião de uma festa religiosa ou por uma
intervenção milagrosa), quanto para as visitas que reis e príncipes fazem às cidades submetidas ao seu
império. O sentido principal do termo, conforme a cultura Grega, é de visita, chegada, advento de um
soberano ou de uma divindade. Serve tanto para ser empregado como conceito político, quanto religioso.
Esta identificação entre o profano e o sagrado deve-se ao fato de que em ambiente helenístico as figuras
reais são consideradas com acentos divinos. O que sempre de destaca para a parousia é o seu caráter
triunfal e glorioso. Trata-se de uma manifestação em poder e glória, que tem um acento explicitamente
jubiloso e festivo. No Novo Testamento, o conceito é utilizado para descrever a futura vinda de Cristo,
Senhor de tudo e de todos (Pantocrátor) do final dos tempos. As descrições desse advento valem-se das
imagens da manifestação gloriosa do imperador romano. Na época imperial, a parusia do César podia
inclusive dar lugar a uma nova era, comportando uma virada determinante da história. O imperador era
aclamado em sua parusia como senhor e portador da salvação. O povo aguardava com expectativa a sua
vinda, porque da mesma se esperava conseguir benefícios excepcionais. Cf. BRUSTOLIN, Leomar
Antônio. Quando Jesus vem...: a parusia na escatologia cristã. São Paulo-SP. Ed. Paulus. 2001. p. 17.
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Eclesiologia
105
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. pp. 173-
174.
106
Ibidem. pp. 173-178. Cf. OTT, Ludwig. Manual de Teologia Dogmática. Editoral Herder. Barcelona.
Espanha. 1966. p. 486.
107
A teologia patrística abarca o período de seis séculos, compreendendo desde a geração imediatamente
posterior aos apóstolos até a dos que prepararam a teologia medieval. A teologia patrística viveu fases
distintas da seguinte forma: séc. I-II Padres apostólicos (Clemente, Inácio, Policarpo, Didaché); séc. II
Apologistas (Justino, Taciano, Teófilo, Carta a Diogneto); séc. II-III Reflexão sistemática (Tertuliano,
Orígenes, Irineu, Hipólito); séc. III-IV Escolas teológicas (Alexandria: Atanásio, Cirilo. Capadócia:
Basílio, Gregório de Nazianzo, Gregório de Nissa. Antioquia: Teodoro, Cirilo de Jerusalém, João
Crisóstomo); séc. IV-V Fase de esplendor: (Agostinho, Jerônimo, Ambrósio, Leão Magno, Efrém); séc.
VI-VII Final (Gregório Magno, Isidoro de Sevilha, Boécio, João Damasceno). Cf. LIBÂNIO, J. B;
MURAD, Afonso. Introdução à Teologia. Perfil, enfoques, tarefas. Ed. Loyola. São Paulo-SP. pp.
115,124.
108
Cf. NOCKE, Franz-Josef. op.cit. p. 181.
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Eclesiologia
Hugo de São Vitor († 1140), afirma que os sacramentos “contem a graça que sinalizam;
portanto, não são apenas sinais, mas também vasos da graça”. Esta figura do vaso tem
significado terapêutico na doutrina sacramental da escolástica109, e a graça sacramental
é entendida como remédio contra o pecado e suas consequências. Isto faz dos
sacramentos recipientes de medicamento. Hugo de São Vitor dá uma definição mais
restrita de sacramento em sua obra sacramentum christianae fidei (sacramento da fé
cristã);
Outro teólogo escolástico, Pedro Lombardo († 1160) afirma que sacramento não é
somente sinal, mas causa de graça. Já Tomás de Aquino († 1274), defende que
sacramentos “são instrumentos na mão de Deus. O próprio Deus permanece sendo o
verdadeiro sujeito do agir da graça; no entanto, os sacramentos não são necessários
apenas em virtude de uma ordem divina, mas em virtude da causa em si”111.
Entre os teólogos protestantes há um entendimento diferente em relação a
sacramento. Este refere-se a fórmula teológica sacramental da escolástica, ex opere
operato, que quer dizer, que independente da fé do ministrante e do recebedor, o
sacramento não perde a sua eficácia, pois é o agir de Deus que confere ao sacramento a
sua eficácia. Esta fórmula “quer deixar claro que nos sacramentos o sujeito da ação não
é o ser humano, e, sim, Deus, respectivamente Cristo”112.
A refutação dos teólogos protestantes em relação a fórmula teológica sacramental
da escolástica, ex opere operato, está no argumento que os sacramentos necessitam de
109
A teologia escolástica medieval atravessou praticamente oito séculos, marcando ainda presença
durante a idade moderna. Pode-se identificar três grandes fases; a transição e gestação da dialética, a
grande escolástica e a escolástica tardia. Séc. VII-X gestação da escolástica; séc. XI-XII inícios da
escolástica (Anselmo de Cantuária, Pedro Abelardo, Pedro Lombardo); séc. XIII alta escolástica (Escola
Dominicana: Alberto Magno, Tomás de Aquino, Mestre Eckart); séc. XIV-XV escolástica tardia (Escola
franciscana: Boaventura, Duns Escoto, Guilherme de Ockham, Gabriel Biel). Cf. LIBÂNIO, J. B;
MURAD, Afonso. Introdução à Teologia. Perfil, enfoques, tarefas. pp. 127,131.
110
Na época da pré-escolástica ainda proliferam ideias muito divergentes sobre o número dos
sacramentos. Os bispos Fulberto de Chartres († 1028) e Bruno de Würzburg († 1153) admitem somente
dois: Batismo e Eucaristia, enquanto Bernardo de Claraval († 1153) admite dez (entre eles o lava pés), e o
cardeal Pedro Damião († 1072) quer doze (inclusive a unção do rei). Outros se movem entre essas
grandezas. Somente com o interesse sistematizante da escolástica primitiva surgem os primeiros tratados
sobre os sacramentos, e, com eles, tentativas de definição, bem como (por volta da metade do século XII)
a fixação em sete. Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos
Sacramentos. p. 181.
111
Ibidem. p. 182.
112
Ibidem. pp. 183-184.
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Eclesiologia
João Calvino, com essa conceituação de sacramento, amplia o conceito dado por
Santo Agostinho em que o sacramento “é o sinal visível de uma coisa sagrada”; ou: “a
forma visível de uma graça invisível”118.
Entendemos que sacramentos são meios de graça conferidos por Deus, através
do rito que transmite o mistério de sua relação com Jesus Cristo, fazendo uso do
113
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. p. 186.
114
Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 403.
115
Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 402.
116
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. pp. 186-
187.
117
Cf. CALVINO, João. Institutas. IV 14,1.
118
Ibidem.
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Eclesiologia
119
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. pp. 206-
208.
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Eclesiologia
120
“A ‘lei da pureza’ (Lv 11-16) está unida à ‘lei de santidade’ (Lv.17-26) como dois aspectos, negativo e
positivo, de uma mesma exigência divina. As regras dadas aqui repousam sobre interditos religiosos
muito antigos: é puro aquilo que pode aproximar-se de Deus, e é impuro aquilo que se torna impróprio
para o seu culto ou do qual é excluído. Os animais puros são os que podem ser oferecidos a Deus (Gn
7,2), os animais impuros são os que os pagãos consideram como sagrados ou que, parecendo repugnantes
ou maus para o homem, são considerados desagradáveis a Deus (cap.11). Outras regras dizem respeito ao
nascimento (cap.12), à vida sexual (cap.15), à morte (21,1.11; cf. Nm 19,11-16), domínios misteriosos
onde age Deus, o senhor da vida. Indício de corrupção como a lepra (13,1+) torna igualmente impuro.
Mas, além dessa pureza ritual, os profetas insistirão na purificação do coração (Is 1,16; Jr 33,8; cf. Sl
51,12), preparando o ensinamento de Jesus (Mt 15,10-20), que libera os seus discípulos de prescrições
que ainda retinham apenas o aspecto material (Mt 23,24-26). Dessa antiga legislação guardar-se-á a lição
de ideal de pureza moral, protegido por regras positivas”. Bíblia de Jerusalém. p. 174, nota “b”.
121
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. p.207.
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Eclesiologia
A palavra batismo tem sua origem no verbo grego bate (baptö) que significa
“mergulhar, mergulhar em, imergir, mergulhar na tinta, tingir, colorir”. Deste verbo
deriva a palavra bapti,zw (baptizö) que é a forma intensiva de baptw (baptö), a qual é
traduzida por batismo, com o mesmo significado do verbo que lhe dá origem, porém
com sentido diferente. Para entender esta diferença, toma-se como exemplo um texto de
um médico e poeta chamado Nicander, que viveu por volta do ano 200 a.C, que deixa
claro a distinção sentido de baptw (baptö) e de bapti,zw (baptizö). Este texto, na
verdade, é uma receita para preparar “picles”, utilizada por Nicander. Em sua receita,
Nicander explica que para preparar picles o vegetal deverá ficar baptw [baptö]
(mergulhado) em água fervente e depois deverá ser bapti,zw [baptizö] (mergulhado) no
vinagre. Embora ambos descrevam a ação de mergulhar, haverá diferença entre eles. A
primeira ação (baptw) [baptö] indica uma ação temporária, enquanto a segunda ação
(bapti,zw) [baptizö] indica ação permanente123.
A palavra bapti,zw (baptizö), como forma mais intensiva do verbo baptw (baptö),
significa, “mergulhar, imergir, submergir (de embarcações afundadas), limpar
mergulhando ou submergindo, lavar com água, tornar limpo com água, lavar-se”. Tem
no Novo Testamento o seu emprego relacionado ao batismo de João e ao batismo
cristão124.
Antes de abordarmos a questão do batismo de forma histórica, ou seja, dentro da
história da Igreja e sua questão dogmática, precisamos esclarecer dois pontos;
1. O batismo de João, como “batismo de arrependimento para remissão dos
pecados” (cf. Mc 1,4) tinha dois enfoques: a) conversão de um judeu para Deus.
Isto quer dizer que, “o batismo de João era um processo de iniciação para entrar
no grupo dos que se julgavam o povo digno de se encontrar com Deus125”; b)
antecipar o batismo no Espírito e com fogo126.
122
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. p. 207-
208.
123
Cf. STRONG, James. Dicionário bíblico, léxico hebraico, aramaico e grego. p. 1242.
124
Cf. STRONG, James. Dicionário bíblico, léxico hebraico, aramaico e grego. p. 1242. Cf. DANKER,
Frederick. W. GRINGRICH, Wilbur. Léxico do Novo Testamento Grego/Português. Ed. Vida Nova, São
Paulo-SP. 1993. p. 40.
125
Cf. TAYLOR, Justin. As origens do Cristianismo. Ed. Paulinas, São Paulo-SP. 2010. p. 52.
126
Cf. BEASLEY-MURRAY, G. R. “bapti,zw”. DITNT. p. 182.
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Eclesiologia
2. O batismo de Jesus realizado por João é fato histórico e é relatado por todos os
evangelhos. Isto imprime um significado importante para a Igreja primitiva.
Jesus ao ser batizado se solidariza com o povo carente de salvação, pois ele é um
messias que não se separa dos pecadores, mas coloca-se ao lado deles. Além
disso os evangelistas narram o batismo de Jesus como o início de seu ministério,
pois ao ser batizado sobre ele repousa o Espírito (cf. Mt 3,16-17)127.
Os evangelistas também infiltraram na história do batismo de Jesus
sua própria compreensão do batismo cristão praticado nas
comunidades: batismo é sinal de salvação escatológica; nele Deus dá
seu espírito, sua disposição amorosa; por meio dele surge
solidariedade entre todos os batizados. Os aspectos relevantes
cristologicamente são, ao mesmo tempo, relevantes em termos de
teologia dos sacramentos. Está visto que as comunidades
neotestamentárias viam o batismo cristão fundamentado no caminho
de Jesus e no batismo de Jesus por João128.
127
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. p.208.
128
Ibidem. pp.208-209.
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Eclesiologia
Em geral o batismo era feito por imersão, no entanto havia lugares que não era
possível tal prática por falta de água. Sendo assim, praticava-se, de forma legítima, o
batismo por derramamento vertendo água na cabeça do neófito por três vezes usando a
fórmula batismal, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo133.
129
Cf. GONZÁLEZ. Justo L. Uma história ilustrada do cristianismo Vol 1; A era dos Mártires. pp. 152-
154.
130
Cf. GONZÁLEZ. Justo L. Uma história ilustrada do cristianismo Vol 1; A era dos Mártires. p. 154.
131
Ibidem.
132
Ibidem.
133
Ibidem. Esta forma de batizar por derramamento está legitimada pela Didaquê, que significa instrução
ou doutrina, daí tem a sua segunda nomenclatura ou “Ensino dos doze Apóstolos”, que é um escrito que
data de fins do século I, portanto bem próximo dos escritos do Novo Testamento. A Didaquê é dividida
em três partes: uma regra de conduta (capítulos I-IV) chamada “os dois caminhos”; um ritual de culto
(VI-X) e ordenanças relativas ao ministério (XI-XVI). “Quanto ao batismo, batizareis na forma seguinte:
tendo antecipadamente disposto todas as coisas, batizai em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo,
em água viva; se não tiverdes água viva, batizai em outra água; se não puderdes em água fria, batizai em
água quente. Se não tiverdes nem uma nem outra, derramai água na cabeça três vezes em nome do Pai e
do Filho e do Espírito Santo. Antes do batismo, jejuem, além de outros que o possuam, o batizante e o
postulante. A este último mande-se jejuar um ou dois dias antes”. Cf. BETTENSON, Henry. Documentos
da Igreja Cristã. p. 120.
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Eclesiologia
Diante de tudo que dissemos até agora, sobre o sacramento do batismo, fica claro
que o mesmo é o ato pelo qual o neófito é incorporado na comunidade cristã, o corpo de
Cristo. Além disso, o sacramento do batismo confere a graça que nos atrai a Deus, que
nos confere o desejo de comunhão com Deus e com os irmãos e nos capacita a ter fé,
durante nossa vida cristã. Esse é o sentido do batismo.
Esta graça conferida pelo sacramento do batismo é um ato de Deus, um ato do
poder divino. O ato de Deus no batismo é o ato mediante o qual Cristo constrói a sua
Igreja na terra, o seu corpo místico. Isto significa, que Cristo faz no presente o seu
ministério de vida morte e ressurreição em sua Igreja, de forma invisível através da obra
do Espírito Santo quando a Igreja recebe novos membros. Podemos ver a atuação da
Santíssima Trindade na Igreja, por isso o batismo é conferido em nome do pai, e do
filho e do Espírito Santo.
Ao ser conferido à qualidade de membro da Igreja, o cristão recebe obrigações
inerentes a essa qualidade. Isto diz respeito a comunhão com Deus e com os irmãos,
porque ao ser batizado reveste-se de Cristo (cf. Gl 3,27). Dessa forma o cristão é
revestido do “amor de Deus que é o fundamento único e seguro da vida cristã”. É este
amor que nos liberta do poder das trevas e nos leva a comunhão com Deus e com os
irmãos. Por isso, podemos dizer que o sacramento do batismo “traslada o homem ao
‘reino da graça’.... o batismo é ‘um novo nascimento’ (cf. Jo 3,5ss.), incorporação à
nova criação advinda em Cristo (cf. 2Cor 5,17)”134.
O batismo confere uma nova existência ao homem da seguinte forma: morrer com
Cristo; ressuscitar e viver com Cristo; morrer para o pecado e viver por Cristo estando
unido em amor a Ele (cf. Rm 6,3-4; 2Cor 5,17; Gl 6,15). No entanto, essa união a Cristo
deve nos levar ao amor ao próximo como o próprio Cristo ordenou (cf Jo 13,34-35).
Esta nova existência conferida pelo batismo aponta para um futuro em relação à
vida na Igreja de Cristo quanto em relação a consumação escatológica. “A intenção do
batismo é fazer que o homem receba o dom na obediência da fé e então cresça até ‘a
perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo’ (Ef 4,13)”135.
...essa nova existência não é alguma coisa que o próprio homem possa
criar e desenvolver mediante seus próprios esforços. Ela lhe é dada no
ato gracioso de Deus. Mediante a obra do Espírito, torna-se sua posse
e transforma-se no próprio conteúdo da sua vida na obediência da fé.
134
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 308.
135
Ibidem.
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Eclesiologia
136
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 308.
137
Cf. ESSER, Hans-Helmut. Eucaristia “euvcaristi,a”. DITNT. p. 35. Cf. DANKER, Frederick. W.
GRINGRICH, Wilbur. Léxico do Novo Testamento Grego/Português. p. 89.
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Eclesiologia
Jesus instituiu a eucaristia quando celebrou a páscoa com seus discípulos (cf. Mt
26,26-29; Mc 14,22-25; Lc 22,19-20). Desta forma, para o cristianismo a páscoa passou
a ter um sentido diferente do que era para os judeus. A páscoa para os cristãos passou a
ser o evento quando Jesus morreu e ressuscitou. Para entendermos melhor a eucaristia,
voltaremos no tempo para compreender a páscoa judaica.
A páscoa judaica tem seu antecedente num ritual praticado por pastores nômades
do deserto antes do êxodo do Egito. Este ritual religioso, pré israelita, era uma
festividade pastoril com refeições sacrificais de cordeiro e pães ázimos, relacionada à
migração dos rebanhos na lua cheia da primavera. Era um ritual familiar que tinha por
objetivo, a defesa contra poderes demoníacos que poderiam acometer homens e animais
durante as viagens a procura de pastos139.
A saída do povo de Israel do Egito, relacionada a páscoa por eles celebrada é na
verdade ocasional. O êxodo do Egito coincidiu com a celebração da páscoa (cf. Ex 12,
21-28)140. Com este evento de libertação do Egito, o povo de Israel comemorava a
páscoa com o sentido de libertação da escravidão. A páscoa passa a ser um ritual que
relembrava a saída de um povo que por séculos foi escravo e que pela mão forte do seu
Deus foi liberto da escravidão.
No século I, no período que Jesus exerceu o seu ministério, a páscoa judaica era
celebrada em uma refeição. Servia-se ervas amargas que simbolizavam os tempos
difíceis de escravidão e os pães ázimos que simbolizavam saída às pressas do Egito,
relembrando que as mulheres não tiveram tempo de colocar o fermento nos pães. Antes
e depois tomava-se uma taça de vinho141.
O pai era indagado pelo filho mais novo sobre o sentido de todas esse cerimonial
e o pai lhe explicava como Deus de forma milagrosa livrou o seu povo da escravidão do
138
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. p.255.
139
Cf. LIVERANI, Mario. Para além da Bíblia. História antiga de Israel. São Paulo: Paulus/Ed. Loyola,
2008. p. 224. Cf. ALBERTZ, R. História de la religión de Israel en tiempos del AntiguoTestamento, vol.
1. Madrid: Trotta, 1999. pp. 75-76. Com relação aos ázimos, a sua festividade era agrícola e só foi unida
com a páscoa posteriormente com o povo na terra de Canaã (cf. Dt 16,1-8) época da reforma religiosa do
rei Josias (cf. 2Rs 23,21-23).
140
Cf. ALBERTZ, R. História de la religión de Israel en tiempos del AntiguoTestamento, vol. 1. p. 75.
141
Cf. AQUINO, Felipe Rinaldo Queiroz de. Os sete sacramentos. À luz do Catecismo da Igreja Católica
e do Código de Direito Canônico. Lorena-SP. Ed Cleofas. 2004. p. 75.
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Eclesiologia
Egito, passando das trevas para as luz. Após essa explicação, cantavam recitando parte
do Hallel (Salmos 112 e 113,1-8). Em seguida fazia-se a ceia. O pai da família tomava
um dos pães ázimos, partia-o e distribuía-o. Logo após comiam o cordeiro e no final
tomavam um novo cálice de vinho e proferiam ações de graças após a refeição. Todos
bebiam o mesmo cálice de vinho, após isso cantavam a segunda parte do Hallel (cf. Sl
113,9; 117,29 e 135)142.
Jesus como um judeu, celebrou nesse mesmo contexto a páscoa com os seus
discípulos, porem lhe imprimiu um novo sentido “fazei isto em memória de mim” (cf.
1Cor 11,24s).
A eucaristia no tempo apostólico era celebrada em uma refeição comum, nas
casas, e cada membro da Igreja levava sua refeição. No entanto, haviam abusos como
mostra o apóstolo Paulo em sua Carta aos Coríntios, e com o tempo houve a separação
da refeição comum da eucaristia.
Sendo assim, a eucaristia passou a ser celebrada nas primeiras horas do domingo
da ressurreição144. No século II a celebração da eucaristia era a segunda parte do culto
cristão. Participavam da eucaristia somente os batizados. Quem viesse de outra
congregação e já tivesse recebido o batismo poderia participar da eucaristia145.
Na patrística a atenção voltou-se para os elementos da eucaristia, o pão e o vinho.
Merecem destaque nesse tempo Ambrósio bispo de Milão († 397) e Agostinho bispo de
Hipona († 430) que influenciaram a história da teologia eucarística, porém com ênfases
diferentes.
Ambrósio de Milão, enfatizava a transformação das oferendas (pão e vinho).
Assim se expressa esse teólogo:
142
Cf. AQUINO, Felipe Rinaldo Queiroz de. Os sete sacramentos. À luz do Catecismo da Igreja Católica
e do Código de Direito Canônico. Lorena-SP. Ed Cleofas. 2004. p. 75.
143
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina Geral dos Sacramentos. p. 255.
144
“Plínio ‘o jovem’, Governador da Bitínia na Ásia Menor, em 111, atestava: ‘os cristãos estão
habituados a se reunirem em determinado dia, antes do nascer do sol, e cantar um cântico a Cristo, que
eles têm como Deus’. De tarde reúnem-se de novo em uma ceia comum em favor dos mais pobres,
chamada ágape’ (Epístola a Trajano 10,96) in AQUINO, Felipe Rinaldo Queiroz de. Os sete sacramentos.
À luz do Catecismo da Igreja Católica e do Código de Direito Canônico. p. 76.
145
Cf. GONZÁLEZ. Justo L. Uma história ilustrada do cristianismo Vol 1; A era dos Mártires. p. 152
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Eclesiologia
À pergunta como corpo de Cristo, que subiu ao céu e que agora está
sentado à direita do Pai, poderia estar no pão sobre o altar, ele
responde: ‘Se quiseres entender ‘corpo de Cristo’ então ouve o que o
apóstolo diz aos crentes: ‘Vós sóis o corpo de Cristo (...)’ Se, portanto,
vós sois o corpo de Cristo, então o vosso mistério [o mistério que sois
vós] está depositado na mesa do Senhor. Vós recebeis vosso mistério.
Ao que respondeis: ‘Amém’. (...) Tu ouves: ‘Corpo de Cristo, e
respondes: ‘Amém’. Sê um membro no corpo de Cristo, a fim de que
teu ‘amém’ seja verdadeiro!’ (Agostinho, Serm. 272)147.
146
Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina específica dos sacramentos.
Eucaristia. p. 256.
147
Ibidem. pp. 256-257
148
Ibidem. p. 257.
149
Ibidem.
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Eclesiologia
(1545-1563), que afirma, que o pão e o vinho ao serem consagrados pelo sacerdote por
ocasião da celebração eucarística, tornam-se em substancia o corpo e o sangue de
Cristo, embora permaneçam na aparência de pão e de vinho.
O entendimento sobre a eucaristia na teologia protestante é diferente em relação
ao pão e o vinho. Lutero († 1546) usa o termo Ceia do Senhor para referir-se a
eucaristia. Para Lutero o dogma da transubstanciação não tem apoio bíblico, embora
afirme que, Jesus ao afirmar “este é o meu corpo” comprova uma “presença real” do
corpo de Cristo no pão e no vinho. Este ensino de Lutero foi, mais tarde, rotulado por
historiadores eclesiásticos como consubstanciação150. A consubstanciação é uma
doutrina de Lutero, que afirma que na Ceia do Senhor o corpo e o sangue de Cristo
estão “em, com e sob” o pão e o vinho. “Para Lutero as duas naturezas do alimento
físico e do corpo humano glorificado de Cristo se reúnem e alimentam a alma do fiel na
refeição sacramental”151.
Para Ulrico Zwínglio († 1531) as Escrituras ensinam que carne e sangue não tem
e não podem produzir nada que se tenha proveito. Afirmava que comer carne e beber
sangue é uma pratica pagã nojenta. Zwínglio, também, afirmava que por Jesus ter
encarnado não poderia ser onipresente, pois o seu corpo ressurreto e glorificado não
pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo.152. Para Zwínglio Jesus não pode estar
ao mesmo tempo assentado ao lado de Deus Pai e ao mesmo tempo estar presente nos
elementos do pão e do vinho. Zwínglio entende que a frase “isto é o meu corpo” tem
sentido figurado, da mesma forma ao afirma-se que “a rocha é Cristo153.
Para João Calvino († 1564) na Ceia do Senhor, o Espírito Santo é quem
espiritualmente aproxima o corpo e o sangue de Cristo ao fiel mediante o simbolismo
do pão de do vinho. A presença real de Jesus na Ceia do Senhor é espiritual e o Espírito
Santo faz esse elo entre Cristo e sua Igreja154.
Esta rápida abordagem sobre a questão histórica da Ceia do Senhor, mostra o
quanto o sacramento da eucaristia é importante para a Igreja, devido a sua longa
reflexão teológica, no decorrer da patrística, escolástica e na idade média com a teologia
protestante.
150
Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 405.
151
Ibidem.
152
Ibidem.
153
Ibidem. Cf. NOCKE, Franz-Josef. In Manual de Dogmática Vol 2. Doutrina específica dos
sacramentos. Eucaristia. p. 260.
154
Cf. OLSON, Roger. História da Teologia Cristã. p. 422.
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Eclesiologia
155
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 313. Cf. GONZÁLEZ. Justo L. Uma história ilustrada do
cristianismo Vol 1; A era dos Mártires. p. 151-152.
156
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 314.
157
Ibidem.
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Eclesiologia
contra o Santo de Deus. Não foi o homem que ofereceu Cristo, mas
sim Cristo que se ofereceu a si mesmo158.
A Ceia do Senhor está vinculada ao sacrifício de Cristo, pois o pão como Corpo
de Cristo e o vinho como sangue de Cristo, “dado por vós”, torna a Igreja Cristã
participante da reconciliação que foi efetivada por Cristo na cruz. Ao celebrar o corpo e
o sangue de Cristo, respectivamente no pão e no vinho, a Igreja Cristã abre-se para a
presença de Cristo na Ceia do Senhor. Por estar presente, os elementos do pão e do
vinho, tornam-se, estes, portadores de graça159.
158
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 315.
159
Ibidem. pp. 317-318.
160
Ibidem p.318.
161
Ibidem.
162
Ibidem. p. 319.
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163
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 319.
164
Ibidem.
165
Ibidem, p. 319.
166
Ibidem. p. 320.
167
Ibidem.
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Eclesiologia
“Ao ser Cristo recebido na Ceia do Senhor, essa recepção pela fé caracteriza-se
por uma ‘oferta’ de ação de graças e de oração”168. A oferta de ação de graças na Ceia
do Senhor está envolvida de louvor, adoração e eucaristia. É oferta eucarística a Cristo o
cordeiro de Deus que foi morto e ressuscitou, o Senhor vivo, digno de honra, glória e
louvor (cf. Ap 5,12-13). Desde a Igreja primitiva e Antiga, entoavam-se hinos de louvor
que acompanhavam a Ceia do Senhor. “A Ceia do Senhor é um sacramento, não só de
amor sofredor, mas também de amor vitorioso. A luz da ressurreição ilumina a
celebração”169.
O ato de comungar implica, além da adoração e louvor, a oração. O ato de orar é
conversar com Deus. A Oração na celebração da Ceia do Senhor feita por cada
comungante deve ser livre e em comum com a oração congregacional. Esta oração deve
ser também de ação de graças, por reconhecer o pecado, indignidade e necessidade de
Deus, pois a Ceia do Senhor traz o amor sacrifical de Cristo ao encontro do cristão.
Portanto, isto faz da “Ceia do Senhor um céu aberto. Une o céu e a terra. Atesta que
Deus ‘juntamente com ele nos ressuscitou e nos fez assentar nos lugares celestiais em
Cristo Jesus’ (cf. Ef 2,6)”170.
Conjuntamente a adoração e oração, a Ceia do Senhor é, também, confissão.
168
Cf. AULÉN, Gustaf. A Fé Cristã. p. 321.
169
Ibidem.
170
Ibidem. p. 322.
171
Ibidem.
172
Ibidem.
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Eclesiologia
Conclusão
Igrejas nos dias hodiernos, pois, após os Apóstolos de Jesus Cristo a Igreja estava sob o
governo episcopal, bispos, presbíteros e diáconos. A Igreja na era apostólica estava
edificada sobre o ensino apostólico. A sucessão apostólica não seria de forma episcopal,
mas no que tange ao ensino, ao depósito da fé deixado pelos apóstolos. Esta
apostolicidade tem da mesma forma que a catolicidade um aspecto missionário, pois da
mesma forma que o ensino apostólico foi para a Igreja ultrapassando os limites de
Jerusalém, da mesma forma hoje a Igreja deve manter esta herança missionária. Mas,
vale aqui ressaltar que, embora vivamos em tempos diferentes aos dos apóstolos de
Jesus, o anuncio deve ser do Evangelho pregado e ensinado pelos apóstolos, sua
doutrina e prática na Igreja de Cristo, moldado, para os dias hodiernos, em uma
atualização e contemporização.
Pregação e testemunho, culto divino, sacramentos e oração, e diaconia e
comunhão fraternal, são os atos fundamentais que a Igreja está estabelecida em sua
existência e pratica. A Igreja anuncia e testemunha o Evangelho, cultua a Deus e o
adora, ministra os sacramentos como ritos de inserção e fortalecimento e de alimento da
fé em Cristo, pratica o amor – serviço de forma fraternal. São atos que a Igreja deve
viver e sempre estabelecer. Se a Igreja deixar esses atos fundamentais de lado se tornará
estéril e doente espiritualmente. Se não houver pregação e testemunho não haverá fé
salvadora e comunhão para anuncio do Evangelho. Se não houver culto divino,
sacramentos e oração, não haverá testemunho e anuncio, vida sacramental, e haverá,
sim, fraqueza espiritual por falta de oração. Se não houver o amor – serviço de forma
fraternal, a Igreja tem falta do que é essencial aos membros do corpo de Cristo, o amor
de Deus. Sem este amor não pode haver o serviço fraternal, não há comunhão, não há
pregação e não haverá testemunho. A Igreja por ser de Cristo precisa ter como marca
maior o amor.
Os sacramentos foram abordados em sua tradução para explicar o seu
significado. Embora não esteja na Bíblia, sacramento é a tradução do termo grego
musth,rion usada para a Vulgata Latina. Isto revela que o sacramento tem relação com
musth,rion, pois envolve algo que acontece através de um rito, expresso em sinais
visíveis. Entendemos que sacramentos são meios de graça conferidos por Deus,
através do rito que transmite o mistério de sua relação com Jesus Cristo, fazendo
uso do símbolo visível e sensivelmente perceptível, sendo estes consagrados a Deus
através da palavra, e, aceito e vivido pela Igreja, mediante a fé que recebe a graça,
conferida por Deus, no sacramento.
Referências bibliográficas
LIVERANI, Mario. Para além da Bíblia. História antiga de Israel. São Paulo:
Paulus/Ed. Loyola, 2008.
VINE, W. E.; UNGER, M. F.; WHITE Jr., W. (Ed.). Dicionário Vine. Rio de
Janeiro: CPAD, 1985.