Sei sulla pagina 1di 7

http://www.espacoacademico.com.br/022/22cmunanga.

htm acessado em 05/08/2015


Revista Espaço Acadêmico - Ano 2 - Nº 22 - Março de 2003 - ISSN 1519.6186

Políticas de Ação Afirmativa em Benefício da População


Negra no Brasil – Um Ponto de Vista em Defesa de Cotas

Um breve histórico

As chamadas políticas de ação afirmativa são muito recentes na história da


ideologia anti-racista. Nos países onde já foram implantadas (Estados Unidos,
Inglaterra, Canadá, Índia, Alemanha, Austrália, Nova Zelândia e Malásia, entre
outros), elas visam oferecer aos grupos discriminados e excluídos um tratamento
Por diferenciado para compensar as desvantagens devidas à sua situação de vítimas
KABENGELE do racismo e de outras formas de discriminação. Daí as terminologias de “equal
MUNANGA oportunity policies”, ação afirmativa, ação positiva, discriminação positiva ou
Professor Titular políticas compensatórias.
do Departamento
de Antropologia Nos Estados Unidos, onde foram aplicadas desde a década de sessenta, elas
da Universidade pretendem oferecer aos afro-americanos as chances de participar da dinâmica da
de São Paulo. mobilidade social crescente. Por exemplo: os empregadores foram obrigados a
Autor de vários mudar suas práticas, planificando medidas de contratação, formação e promoção
trabalhos na área nas empresas visando a inclusão dos afro-americanos; as universidades foram
de antropologia obrigadas a implantar políticas de cotas e outras medidas favoráveis à população
da população negra; as mídias e órgãos publicitários foram obrigados a reservar em seus
negra africana e programas uma certa percentagem para a participação dos negros. No mesmo
afro-brasileira, momento, programas de aprendizado de tomada de consciência racial foram
entre outros, Os desenvolvidos a fim de levar a reflexão aos americanos brancos na questão do
Basanga de combate ao racismo.
Shaba (1986);
Negritude (1988), Qualquer proposta de mudança em benefício dos excluídos jamais receberia uma
Estratégias e apoio unânime, sobretudo quando se trata de uma sociedade racista. Neste
políticas de sentido, a política de ação afirmativa nos Estados Unidos tem seus defensores e
combate à detratores. Foi graças a ela que se deve o crescimento da classe média afro-
discriminação americana, que hoje atinge cerca de 3% de sua população, sua representação no
racial (1996) e Congresso Nacional e nas Assembléias estaduais; mais estudantes nos níveis de
Rediscutindo a ensino correspondentes ao nosso ensino médio e superior; mais advogados,
mestiçagem no professores nas universidades, inclusive nas mais conceituadas, mais médicos nos
Brasil (1999) grandes hospitais e profissionais em todos os setores da sociedade americana.
Apesar das críticas contra ação afirmativa, a experiência das últimas quatro
décadas nos países que implementaram não deixam dúvidas sobre as mudanças
alcançadas.

Argumentos em favor das cotas para a população negra no Brasil

As experiências feitas pelos países que convivem com o racismo poderiam


servir de inspiração ao Brasil, respeitando as peculiaridades culturais e
históricas do racismo à moda nacional. Podemos, sem cópia, aproveitar das
experiências positivas e negativas vivenciadas por outros para inventar
nossas próprias soluções, já que não contamos com receitas prontas para
enfrentar nossas realidades raciais.

Vozes eloqüentes, estudos acadêmicos qualitativos e quantitativos recentes


realizados pelas instituições de pesquisas respeitadíssimas como o IBGE e o IPEA
não deixam dúvidas sobre a gravidade gritante da exclusão do negro, isto é, pretos
e mestiços na sociedade brasileira. Fazendo um cruzamento sistemático entre a
pertencia racial e os indicadores econômicos de renda, emprego, escolaridade,
classe social, escolaridade, idade, situação familial e região ao longo de mais de 70
anos desde 1929, Ricardo Henriques (2001) chega à conclusão de que “no Brasil, a
condição racial constitui um fator de privilégio para brancos e de exclusão e
desvantagem para os não-brancos. Algumas cifras assustam quem tem
preocupação social aguçada e compromisso com a busca de igualdade e qualidade
nas sociedades humanas”:

Do total dos universitários, 97% são brancos, sobre 2% de negros e 1% de


descendentes de orientais.

Sobre 22 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza, 70% deles
são negros.

Sobre 53 milhões de brasileiros que vivem na pobreza, 63% deles são negros
(Henriques, 2001).

Deduz-se dessa pesquisa que se por milagre o ensino básico e fundamental


melhorar seus níveis para que os alunos desses níveis de ensino possam competir
igualmente no vestibular com os alunos oriundos dos colégios particulares bem
abastecidos, os alunos negros levariam cerca de 32 anos para atingir o atual nível
dos alunos brancos. Isso supõe que os brancos fiquem parados em suas posições
atuais esperando a chegada dos negros, para juntos caminharem no mesmo pé de
igualdade. Uma hipótese improvável, ou melhor, inimaginável. Os lobbyes das
escolas particulares cada vez mais fortes deixarão os colégios públicos subirem seu
nível de ensino, tendo como conseqüência a redução de sua clientela
majoritariamente oriunda das classes sociais altas e médias e a diminuição de seus
lucros? Quanto tempo a população negra deverá ainda esperar essa igualdade de
oportunidade de acesso e permanência a um curso superior ou universitário gratuito
e de boa qualidade?

Num país onde os preconceitos e a discriminação racial não foram zerados, ou


seja, onde os alunos brancos pobres e negros ainda não são iguais, pois uns são
discriminados uma vez pela condição sócio-econômica e outros são discriminados
duas vezes pela condição racial e sócio-econômica, as políticas ditas universais
defendidas sobretudo pelos intelectuais de esquerda e pelo ex-ministro da
educação Paulo Renato, não trariam as mudanças substanciais esperadas para a
população negra. Como disse Habermas, o modernismo político nos acostumou a
tratar igualmente seres desiguais, em vez de tratá-los de modo desigual. Daí a
justificativa de uma política preferencial no sentido de uma discriminação positiva,
sobretudo quando se trata de uma medida de indenização ou de reparação para
compensar as perdas de cerca de 400 anos de decolagem no processo de
desenvolvimento entre brancos e negros. É neste contexto que colocamos a
importância da implementação de políticas de ação afirmativa, entre as quais a
experiência das cotas, que pelas experiências de outros países, se afirmou como
um instrumento veloz de transformação, sobretudo no domínio da mobilidade sócio-
econômico, considerado como um dos aspectos não menos importante da
desigualdade racial.

A questão fundamental que se coloca é como aumentar o contingente negro no


ensino universitário e superior de modo geral, tirando-o da situação de 2% em que
se encontra depois de 114 anos de abolição em relação ao contingente branco que
sozinho representa 97% de brasileiros universitários. É justamente na busca de
ferramentas e de instrumentos apropriados para acelerar o processo de mudança
desse quadro injusto em que se encontra a população negra que se coloca a
proposta das cotas, apenas como um instrumento ou caminho entre tantos a serem
incrementados. Por que então a cota e não outros instrumentos e que
instrumentos? Numa sociedade racista, onde os comportamentos racistas
difundidos no tecido social e na cultura escapam do controle social, a cota
obrigatória se confirma, pela experiência vivida pelos países que a praticaram,
como uma garantia de acesso e permanência aos espaços e setores da sociedade
até hoje majoritariamente reservados à “casta” branca da sociedade. O uso deste
instrumento seria transitório, esperando o processo de amadurecimento da
sociedade global na construção de sua democracia e plena cidadania.
Paralelamente às cotas, outros caminhos a curto, médio e longo prazos projetados
em metas poderiam ser inventados e incrementados. Tratando-se do Brasil, um
país que desde a abolição nunca assumiu seu racismo, condição sine qua non para
pensar em políticas de ação afirmativa, os instrumentos devem ser criados através
dos caminhos próprios ou da inspiração dos caminhos trilhados por outros países
em situação comparável.

Reações absurdas e inimagináveis vieram dos setores informados e esclarecidos


que geralmente têm voz na sociedade brasileira. Que absurdo, reservar vagas para
negros, o que caracterizam como uma injustiça contra alunos brancos pobres! Aqui
somos todos mestiços, quer dizer que no Brasil não existem mais nem negros, nem
brancos, nem índios, nem japoneses, por causa do alto degrau de mestiçamento.
Aqui, não estamos nos Estados Unidos para impor soluções que nada tem a ver
com nossa realidade genuinamente brasileira, etc. Vejam que se deixa de discutir
uma questão social que, como apontam as estatísticas das pesquisas do IBGE e
IPEA, é caracterizada por uma desigualdade racial brutal e gritante. Por que isso?
Parece-me que o imaginário coletivo brasileiro está ainda encobertado pelo mito da
democracia racial.

Não era possível imaginar as propostas de ação afirmativa num país onde há pouco
tempo se negava os indícios de preconceito étnicos e de discriminação racial. Em
dezenas de anos os movimentos sociais negros lutaram duramente para arrancar
da voz oficial brasileira, a confissão de que esta sociedade é também racista.
Embora o racismo esteja ainda muito vivo na cultura e no tecido social brasileiro, a
voz oficial reagiu há pouco tempo aos clamores dos movimentos negros, como bem
ilustrado pelo texto do “Relatório do Comitê Nacional Para a Reparação da
Participação Brasileira na III Conferência Mundial das Nações Unidas Contra o
Racismo, Discriminação racial, Xenofobia e Intolerância Correlata”, realizada em
Durban, África do Sul, de 31 de agosto a 07 de setembro de 2001. Nesse relatório,
no que tange às propostas em benefício da “comunidade” negra: “a adoção de
medidas reparatórias às vítimas do racismo, da discriminação racial e de formas
conexas de intolerância, por meio de políticas públicas específicas para a
superação da desigualdade. Tais medidas reparatórias, fundamentadas nas regras
de discriminação positiva prescritas na Constituição de 1988, deverão contemplar
medidas legislativas e administrativas destinadas a garantir a regulamentação dos
direitos de igualdade racial previstos na Constituição de 1988, com especial ênfase
nas áreas de educação, trabalho, titulação de terras e estabelecimentos de uma
política agrícola e de desenvolvimento das comunidades remanescentes dos
quilombos”, - adoção de cotas ou outras medidas afirmativas que promovam o
acesso de negros às universidades públicas” (Ministério da Justiça, 2001: 28-30).

Infelizmente, comparativamente ao avanço constatado nesse relatório, os três


candidatos principais ao posto de Presidente da República nas eleições de 2002
não mostraram uma postura clara e firme sobre este problema, ou adotaram uma
estratégia de desinformação, ora para não se comprometerem com a população
negra, ora para não perderem seus eleitores no meio de racistas brancos, já que o
importante para alguns deles era ser eleito presidente, a qualquer custo! O atrito
entre o estudante negro Rafael dos Santos e o candidato Ciro Gomes no debate
que ocorreu em 7 de abril na UnB, não deixa dúvida sobre a estratégia do silêncio e
da desinformação. Indagado sobre sua posição no que diz respeito às políticas de
cotas para negros, o candidato desconversou dizendo que os negros não precisam
que ninguém tenha “peninha” deles, além de impedir que a palavra fosse
franqueada ao estudante. Como explicar o silêncio, a incerteza e até mesmo a
desinformação dos candidatos sobre uma questão tão importante para a vida e o
futuro de mais de 70 milhões de brasileiros de ascendência africana? Estratégia ou
resíduo perverso do mito de democracia racial que ainda ronda no inconsciente
coletivo do brasileiro? Tudo é possível!

O que me espanta muito não é tanto a reação popular, facilmente explicável. O que
me surpreende é que as mesmas reações e os mesmos lugares comuns se
encontram na minha universidade, uma das mais importantes do Hemisfério Sul em
termos de produção de conhecimento científico e da reflexão crítica sobre as
sociedades humanas. Nessa universidade brotou a chamada Escola Sociológica de
São Paulo, da qual participaram eminentes estudiosos como Florestan Fernandes,
Octávio Ianni, Fernando Henrique Cardoso, Oracy Nogueira, João Batista Borges
Pereira e tantos outros que iniciaram os estudos sobre o negro na ótica das
relações raciais e interétnicas, rompendo com a visão apenas raciologista e
culturalista de Nina Rodrigues e seu discípulo Arthur Ramos, entre outros.

Rebatendo e refutando algumas críticas contra as cotas para negros no Brasil

1. Dizem que é impossível implementar cotas para negros no Brasil, porque é difícil
definir quem é negro no país por causa da mestiçagem, tendo como conseqüência
a possibilidade da fraude por parte dos alunos brancos que alegando sua afro-
descencência pelo processo de mestiçagem ocupariam o espaço destinado às
verdadeiras vítimas do racismo. Em primeiro lugar, não acredito que todos os
alunos brancos pobres possam cometer este tipo de fraude para ingressar na
universidade pública, por causa da força do ideal do branqueamento ainda atuando
no imaginário coletivo do brasileiro. Um racista essencialista, psicologicamente
convencido da superioridade de sua “raça” não troca de campo com tanta
facilidade. Muitos não aceitarão a troca, em nome do chamado orgulho da raça.
Conscientes desta dificuldade, alguns recorrem aos falsos princípios de democracia
advogando a introdução de uma flagrante injustiça contra brancos pobres se o
Brasil adotar cotas em favor da maioria de negros pobres. Se for fácil identificar os
alunos brancos pobres, por que o seria tão difícil para os alunos negros pobres?
Em segundo lugar, a identificação é uma simples questão de auto definição,
combinando os critérios de ascendência politicamente assumida com os critérios de
classe social. Isto tem sido o critério ultimamente utilizado até pelos pesquisadores
e técnicos no último recenseamento do IBGE. Ele vale tanto para brancos quanto
para negros e para os chamados amarelos. Não vejo necessidade em recorrer seja
ao exame da árvore genealógica dos auto declarados negros, seja ao exame
científico através do teste de DNA. Se constatar depois de algum tempo e
experiência que a maioria de alunos pobres beneficiados pela política de cotas é
composta de alunos brancos pobres falsificados em negros, será então necessário
reavaliar os critérios até então adotados. De qualquer modo, os recursos investidos
não seriam perdidos, pois teriam sido aproveitados por segmento da população que
também necessita de políticas públicas diferenciadas. Uma definição pelos critérios
científicos dificultaria qualquer proposta de ação afirmativa em benefício de
qualquer segmento, pois muitos que se dizem negros podem ser portadores dos
marcadores genéticos europeus. Também muitos dos que se dizem brancos podem
ser portadores dos marcadores genéticos africanos. O que conta no nosso
cotidiano ou que faz parte de nossas representações coletivas do negro, do branco,
do índio, do amarelo e do mestiço não se coloca no plano do genótipo, mas sim do
fenótipo, num país onde segundo Oracy Nogueira o preconceito é de marca e não
de origem.
2. Outros argumentos contra a política de cota recorrem ao fato do abandono desta
política nos Estados Unidos, por não ter ajudado no recuo da discriminação racial
entre brancos e negros naquele país e por ter sido aproveitado apenas pelos
membros da classe média afro-americana, deixando intocada a pobreza dos
guetos. Ponto de vista rejeitado pelos defensores de cotas nos Estados Unidos,
baseando-se na mobilidade social realizada pelos afro-americanos nos últimos
quarenta anos, mobilidade que não teria sido possível se não fosse implantado a
política das cotas. Os próprios americanos observam que no Estado da Califórnia, o
primeiro a incrementar cotas e o primeiro também a abandoná-las, recuou o
ingresso de alunos afro-americanos nas universidades públicas daquele Estado.
Mas devemos dizer que os afro-americanos têm outras alternativas para ingressar e
permanecer nas universidades que aqui não temos por causa das peculiaridades
do ”nosso” racismo. Eles têm universidades federais de peso criadas para eles, a
Universidade de Howard, por exemplo, e universidades criadas pelas Igrejas
independentes negras para as comunidades afro-americanas, principalmente nos
Estados do Sul considerados como os mais racistas (é o caso da universidade de
Atlanta que foi fundada pelos negros e para os negros). Além disso, a maioria das
universidades públicas americanas até as mais conceituadas como Princeton,
Harvard e Stanford continuam a cultivar as ações afirmativas em termos de metas,
sem recorrer necessariamente às cotas ou estatísticas definidas. Deixar de discutir
cotas em nossas universidades por que não deram certo nos Estados Unidos, como
dizem os argumentos contra, é uma estratégia fácil para manter o status quo. As
cotas se forem aprovadas por alguns Estados como já está acontecendo no Rio de
Janeiro e na Bahia, deveriam, antes de serem aplicadas, passar por uma nova
discussão dentro das peculiaridades do racismo à brasileira, cruzando os critérios
de “raça e de “classe” e respeitando a realidade demográfica de cada Estado da
União. Um censo étnico da população escolarizada de cada Estado é indispensável
para incrementar as políticas públicas no que diz respeito à educação dos
brasileiros, a curto, médio e longo prazo.

3. Por que a cota misteriosamente não é também destinada aos índios e sua
descendência cujos direitos foram igualmente violados durante séculos, além de
serem despojados de seu imenso território, indagam outros argumentos contra a
política de cotas. Os movimentos negros que reivindicam as cotas nunca foram
contra as propostas que beneficiariam as populações indígenas, as mulheres, os
homossexuais, os portadores de necessidades especiais, até as classes sociais
pobres independentemente da pigmentação da pele. Apenas reivindicam um
tratamento diferenciado, tendo em vista que foram e constituem ainda a grande
vítima de uma discriminação específica, racial. Eles têm uma clara consciência da
diluição no social geral e abstrato como propõe o pensamento da esquerda, que até
hoje continua a bater nas teclas de uma questão que segundo eles é simplesmente
social, fechando os olhos a uma cultura racista que abarca indistintamente pobres,
médios e ricos em todas as sociedades racistas.

Os afro-descendentes constituem um pouco mais de 70 milhões de brasileiros, em


relação às populações indígenas estimados em menos de quinhentos mil, apesar
do seu notável crescimento demográfico. Visto deste ângulo, o problema do
ingresso dos estudantes negros, tendo em vista que a sua taxa de escolaridade na
escola é das mais baixas. O que faltam são as propostas de políticas públicas
específicas a curto, médio e longo prazo, direcionadas para atender aos problemas
de escolaridade, educação e ingresso dos índios na universidade. Diluí-los nos
problemas sociais dos negros e ou dos pobres em geral seria cometer no plano da
prática social os erros do pensamento teórico e livresco do intelectual de esquerda
sem pés no chão.

No já citado relatório do Comitê Nacional para a Preparação Brasileira na III


Conferência Mundial das Nações Unidas contra o Racismo, Discriminação Racial,
Xenofobia e Intolerância Correlata, nota-se entre as medidas governamentais a
serem tomadas em favor dos índios:

§ Criação, no âmbito do Ministério da Educação, da Coordenação Geral de


Educação Escolar Indígena;

§ Estabelecimento de 1666 escolas indígenas, que contam com 3041 professores


indígenas;

§ Realização do projeto Tucum, de formação e capacitação de professores


indígenas em nível de magistério, para as comunidades de Mato Grosso (Xavante ,
Peresi, Apiaká, Irantxe, Nambikwara, Umotina, Rikbaktsa, Munduruku, Kayabi,
Borôro e Bakairi, entre outras). É coordenado pela Secretaria de Estado da
Educação-MT, além da FUNAI, tem convênio com a Universidade Federal do Mato
Grosso e prefeituras municipais do estado.

§ Realização do projeto 3º grau indígena, visando a implantação de três Cursos de


Licenciatura Plena na Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT,
destinados à formação de 200 professores indígenas, com previsão de início das
aulas em julho de 2001 e término em 2005. A iniciativa está sendo viabilizada por
meio do Convênio 121/2000, de 30 de junho de 2000, celebrado entre aquela
instituição de ensino e a Secretaria de Estado de Educação do Mato Grosso
(SEDUC-MT0 e do Convênio nº 11, de 15 de dezembro de 2000, celebrado entre a
UNEMAT e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI). As atividades pedagógicas
intensivas ocorrerão no Campus da UNEMAT localizado na cidade de Barra do
Bugres-MT.

Os professores José Jorge de Carvalho e Rita Laura Segato, em sua proposta de


cotas e ouvidoria para a universidade de Brasília, ilustram a inconsciência das
universidades brasileiras face à questão indígena pelo fato “dos primeiros quatro
índios brasileiros que neste momento se preparam para ser médicos somente
conseguiram ingressar numa Escola de Medicina de Cuba! Imaginemos a situação:
é uma faculdade cubana, que não dispõe nem minimamente dos recursos com que
contam universidades como a USP, a UNICAMP, ou a UnB, que está ajudando o
Brasil a saldar a sua dívida de cinco séculos para com os índios brasileiros!”
(Carvalho e Segato: 2001)

4. A política de cotas raciais poderia prejudicar a imagem profissional dos


funcionários, estudantes e artistas negros, porque eles serão sempre acusados de
ter entrado por uma porta diferente. Ou seja, no momento das grandes
concorrências as cotas poderiam perigosamente estimular os preconceitos. Pior
ainda, sob pretexto de favorecer materialmente uma população desfavorecida, essa
política pode prejudicar os valores mais respeitáveis: o orgulho e a dignidade da
população negra. Contra este tipo de argumento, eu diria que ninguém perde seu
orgulho e sua dignidade ao reivindicar uma política compensatória numa sociedade
que por mais de quatrocentos anos atrasou seu desenvolvimento e prejudicou o
exercício de sua plena cidadania. Desde quando a reparação de danos causados
por séculos de discriminação prejudica a dignidade e o orgulho de uma população?
Os judeus têm vergonha em reivindicar a indenização das vítimas do holocausto?
Onde estão o orgulho e a dignidade de uma sociedade que continue a manter em
condições de igualdade gritante um segmento importante de sua população e que
durante muitos anos continuou a se esconder atrás do manto do mito da
democracia racial? As cotas não vão estimular os preconceitos raciais, pois estes
são presentes no tecido social e na cultura brasileira. Discriminar os negros no
mercado de trabalho pelo fato deles terem estudado graças às cotas é
simplesmente deslocar o eixo do preconceito e da discriminação presentes na
sociedade e que existem sem cotas ou com cotas. Mas uma coisa é certa, os
negros que ingressarão nas universidades públicas de boa qualidade pelas cotas
terão, talvez, uma oportunidade única na sua vida: receber e acumular um
conhecimento científico que os acompanhará no seu caminho da luta pela
sobrevivência. Apesar dos preconceitos que persistirão ainda por muito tempo, eles
serão capazes de se defender melhor no momento das grandes concorrências e
nos concursos públicos a exibir um certo conhecimento que não dominavam antes.
Abrirão com facilidade algumas portas, graças a esse conhecimento adquirido e ao
restabelecimento de sua auto-estima. A história da luta das mulheres ilustra melhor
o que seria o futuro dos negros. A discriminação contra elas não foi totalmente
desarmada, mas elas ocupam cada vez mais espaços na sociedade não porque os
homens se tornaram menos machistas e mais tolerantes, mas porque, justamente
graças ao conhecimento adquirido, elas demonstram competências e capacidades
que lhes abrem as portas antigamente fechadas. O racismo contra negros não
recuou nos Estados Unidos. Mas hoje, graças ao conhecimento adquirido com
cotas, eles tiveram uma grande mobilidade social, jamais conhecida antes.

5. Os responsáveis das universidades públicas dizem que o ingresso de negros nas


universidades pelas cotas pode levar a uma degradação da qualidade e do nível do
ensino, por que eles não têm as mesmas aquisições culturais dos alunos brancos.
Mas, acredito que mais do que qualquer outra instituição, as universidades têm
recursos humanos capazes de remediar as lacunas dos estudantes oriundos das
escolas públicas através de propostas de uma formação complementar. (Carneiro,
2002: p.23). Algumas universidades encaminharam propostas de projetos neste
sentido, solicitando recursos financeiros junto ao Programa Nacional de Cor junto a
UERJ, financiado pela Fundação FORD.

Finalmente, a questão fundamental que se coloca não é a cota, mas sim o ingresso
e a permanência dos negros nas universidades públicas. A cota é apenas um
instrumento e uma medida emergencial enquanto se busca outros caminhos. Se o
Brasil na sua genialidade racista encontrar alternativas que não passam pelas cotas
para não cometer injustiça contra brancos pobres – o que é crítica sensata – ótimo
Mas dizer simplesmente que implantar cotas é uma injustiça, sem propor outras
alternativas a curto, médio e longo prazo, é uma maneira de fugir de uma questão
vital para mais de 70 milhões de brasileiros de ascendência africana e para o
próprio futuro do Brasil. É uma maneira de reiterar o mito da democracia racial,
embora este já esteja desmistificado.

Os que condenam as políticas de ação afirmativa ou as cotas favorecendo a


integração dos afro-descendentes utilizam de modo especulativo argumento que
pregam o status quo, ao silenciar as estatísticas que comprovam a exclusão social
do negro. Querem remeter a solução do problema a um futuro longínquo,
imaginando-se sem dúvida que medidas macroeconômicas poderiam
miraculosamente reduzir a pobreza e a exclusão social.

As cotas não serão gratuitamente distribuídas ou sorteadas como os imaginam os


defensores da “justiça”, da “excelência” e do “mérito”. Os alunos que pleitearem o
ingresso na universidade pública por cotas, submenter-se-ão às mesmas provas de
vestibular que os outros candidatos e serão avaliados como qualquer outro de
acordo com a nota de aprovação prevista. Visto deste ângulo, os sistema de cotas
não vai introduzir alunos desqualificados na universidade, pois a competitividade
dos vestibulares continuará a ser respeitada como sempre. A única diferença está
no fato de que os candidatos aspirante ao benefício da cota se identificarão como
negro ou afro-descendente no ato da inscrição. Suas provas corrigidas, eles serão
classificados separadamente, retendo os que obtiverem as notas de aprovação
para ocupar as vagas previstas. Desta forma, serão respeitados os méritos e
garantida a excelência no seio de um universo específico.

KABENGELE MUNANGA

Potrebbero piacerti anche