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O Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional* Marina Guedes Duque** O fim da Guerra Fria e seu impacto na sociedade internacional en- gendraram mudangas profundas nos estudos de seguranga internac onal, ao colocar em xeque 0 paradigma até entdo predominante do realismo. Na academia, comegarama se fortalecer as demandas por uma nova agenda de pesquisa, Essa conjuntura abriu espago para. uma produtiva insergao dos estudos de seguranga internacional no didlogo — que ganhava intensidade no campo de teoria das Relagdes Internacionais — entre as abordagens racionalistas e construtivis- mo social: * Artigo recebido em fevereiro e aceito para publicagio em novembro de 2009, Este artigo se baseia na Dissertagao de Mestrado da autora, intitulada A teoria de securitizagio e o processo decis6rio da estratégia militar dos Estados Unidos na Guerra do Iraque, apresentada a0 Programa de P6s-Graduagdo em Relacdes Internacionais da Universidade de Brasilia em 2008. **® Mestre em Relagdes Internacionais pela Universidade de Brasflia e diplomata, E-mail: marina ‘guedes@ gmail.com. CONTEXTO INTERNACIONAL Rio de Janeiro, vol. 31, n?3, setembro/dezembro 2009, p. 459-501. 459 Marine Guedes Duque Durante a tiltima década, 0 campo dos estudos de seguranga tornou-se uma das areas mais di- namicas e contestadas em Relages Internacio- nais. Especificamente, ele se tomnou talvez. 0 f6rum primario no qual abordagens largamente construtivistas tm desafiado teorias tradicio- nais —em sua maioria realistas ou neorrealistas —no seu “terreno doméstico”, a area em que al- gumas das mais vibrantes novas abordagens para a andlise da politica internacional estio sendo desenvolvidas, e 0 Ambito em que alguns dos debates tedricos mais engajados estao ocorrendo (WILLIAMS, 2003, p. 511). ‘ No campo de relagdes internacionais, o construtivismo, em seus versos matizes, tem chamado atengo para a construgao social do co- nhecimento e a construgao social da realidade — 0 que tem suscitado Tevis6es e reposicionamentos nos estudos da area. Segundo Fearon e Wendt (2002, p. 53), dois pontos sao considerados principais no de- bate entre racionalistas e construtivistas: + aimportancia das ideias na politica internacional, assim como a maneira pela qual a influéncia das ideias se processa; nesse ponto, segundo os autores, ha bem menos discordancias do que se costuma pensar; e + arelacio entre os atores internacionais e as estruturas em que eles se inserem. Por outro lado, o debate entre as diversas variag6es do construtivismo sobre a natureza do conhecimento gerou o que Fearon e Wendt iden- tificam como trés posic¢des construtivistas: a positivista, a “interpre- tativista” e a pés-moderna. Todas essas questdes tém sido tratadas no debate que se realiza no campo dos estudos de seguranga, antes considerado um bastidio do racionalismo e, mais especificamente, do (neo)realismo. O construti- vismo, principalmente na forma do trabalho da Escola de Copenha- 460 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional gue, tem tido impacto no mainstream do campo, até ent&o represen- tado majoritariamente por perspectivas positivistas e autores nor- te-americanos. O grupo de Copenhague realizou uma sintese proficua nao s6 de dife- rentes vertentes dos estudos de seguranga, como também das corren- les realista € construtivista de teoria das Relagoes Internacionais. Abriu-se espaco, desse modo, para uma nova agenda de pesquisa em seguranga, que se fazia necessdria apés o fim da Guerra Fria e 0 ad- vento de uma nova configuragao das relag6es internacionais. O objetivo deste artigo € analisar a contribuigdo da Escola de Cope- nhague para os estudos de seguranga da atualidade, por meio do exa- ime de sua relagdo com as eorias das RelagGes Internacionais e seus desdobramentos no campo de seguranga internacional.’ Para tanto, em primeiro lugar, realizar-se-4 uma breve contextualizagao da lite- ratura académica mainstream dos estudos de seguranga desde a gé- nese do campo, com vistas a compreender melhor o impacto do cons- trutivismo na 4rea a partir da década de 1990. Posteriormente, proceder-se-4 a uma breve revisao dos debates reali- zados tanto entre racionalistas e construtivistas como entre as varia goes do construtivismo, com vistas a situar o trabalho do grupo de Copenhague nas discussdes da érea. Apresentar-se-4, por fim, um panorama da produgio da Escola de Copenhague, sustentado em dois eixs principais: (a) as contribnighes que mais se destacaram: @ (b) os debates suscitados, com as criticas recebidas e as respostas for- necidas pelos autores. 1. Breve Historico dos Estudos de Seguranga Assim como 0 campo das Relagées Internacionais, os estudos de se- guranga consolidaram-se ao longo do século XX, tendo como mar- 461 Marine Guedes Duque cos hist6ricos principais a Segunda Guerra Mundial, a revolugdio nu- clear, a Guerra Fria e o pés-Guerra Fria. Desde a consolidagao do campo até 0s dias atuais, ocorreram mudangas considerdveis tanto na conjuntura internacional como nas perspectivas de estudo utilizadas — as quais tiveram desenvolvimentos diferentes nos Estados Unidos da América (EUA) e na Europa, além de refletirem debates realiza- dos no campo de teoria das Relagdes Internacionais.” Até a Segunda Guerra Mundial, 0 estudo da guerra era dominio qua- se exclusivo dos militares, e o estudo da paz restringia-se ao Ambito do direito internacional. De acordo com Nye e Lynn-Jones (1988, p. 8), aemergéncia da Guerra Friae o desenvolvimento de armas nucle- ares chamaram a atengao dos civis para o tema, por causa do ineditis- mo dos problemas de seguranga a serem enfrentados pelos Estados Unidos. O contraste entre a situagao deste pafs e a da Europa, marca- da pelo flagelo de duas grandes guerras, gerou uma divisiio mais ou menos definida entre o que seriam: « 08 estudos estratégicos ~ predominantes nos EUA e, por con- seguinte, na maior parte do mundo:* centravam-se na seguran- ga nacional e eram largamente policy-oriented; € « os estudos para a paz—prevalecentes na Europa, nao possuiam tanta repercussfio coma a perspectiva das estudos estratégicos: enfatizavam as concepgdes de sociedade internacional e segu- ranga internacional. Em consonancia com a conjuntura politica internacional e as pers- pectivas tedricas da época, a génese dos estudos de seguranga nos EUA ocorreu sob o paradigma do realismo, o que propiciou a elabo- ragdo dos conceitos de estratégia nuclear, dissuasio ¢ deterrence. Essa fase inicial do campo, que Freedman (1998) denomina “Anos dourados” dos estudos estratégicos, ocorre a partir de meados da dé- cada de 1950 e até 0 comego da década de 1960. Nela, predomina o trabalho de autores como Thomas Schelling, que tinham por instru- 462 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenh nos Estudos de Seguranca Internacional mentos analiticos principais a teoria dos jogos ea premissa do ator ra- cional, além de, em geral, nao considerarem as varidveis domésticas das politicas externa e de defesa. Segundo Freedman (1998, p. 51), no entanto, apés as crises de Ber- lim e Cuba, no comego da década de 1960, 0 clima de disputa com a Unido das Repiblicas Socialistas Soviéticas (URSS) arreteceu-se, a0 Mesmo tempo em que 0 envolvimento dos EUA na Guerra do Vi- etna tornou o campo de estudos estratégicos menos atrativo. Como consequéncia, a produgdo dessa época adquiriu cardter mais cético, “coms analistas advertindo sobre os | (Alexander George), as distorgées causadas pela politica burocratica (Graham Allison) e os perigos das percepgdes equivocadas (Robert Jervis)” (FREEDMAN, 1998, p. 51). Além disso, o tema do controle de armamentos adquiriu espago politico e académico em meados da década de 1970. tes de deterrence e coeigio Com a invasao soviética do Afeganistaio em 1979 ¢ a eleicdo de Ro- nald Reagan em 1980, entretanto, enccrrou-se a década de détente, ¢ iniciou-se uma época caracterizada por preocupagdes com a compe- tigdo militar (MILLER, 2001, p. 14-15). Nao por acaso, a publicacio de Teoria da politica internacional (no original, Theory of inter- national politics), de Kenneth Waltz (1979), niio 86 renovou 0 inte- resse pela corrente realista de RelagGes Internacionais — entao revista na forma do que seria conhecido como neorrealismo ou realismo es- trutural —, como também consolidou uma concepgio de ciéncias so- ciais positivista, metodologicamente sofisticada e com inclinagées te6ricas.° De acordo com Walt (1991), essa “renascenca dos estudos de seguranga” permitiu a adogio de uma definicao mais ampla de po- litica, que contemplava fontes nao militares de tensio em lugar de ater-sc somente as capacidades militares.° Por outro lado, na década de 1970, 0 declinio relativo da economia norte-americana e as duas crises do petrdleo levaram alguns estudio- 463 Marine Guedes Duque sos a demandar a inclusao de quest6es da economia internacional no conceito de seguranga.” Na década de 1980, a crescente importéncia concedida as relag6es transnacionais ¢ a interdependéncia econdmi- ca gerou desafios ao paradigma realista, ainda que continuasse ocor- rendo no ambito do positivismo metodolégico. A corrente libe- |-institucionalista, também racionalista, e representada por obras como Keohane (1984) e Krasner (1983), afirmava que: a seguranca nao consistia em drea tematica tinica ou prioritéria na agenda interna- cional; e a cooperagao entre os Estados modificava os incentivos para agdo, de forma que o uso da forga nem sempre possufa a melhor rela- ¢4o custo-beneticio. ral Os interesses estatais, segundo a corrente liberal-institucionalista, nao seriam definidos apenas em termos de poder ou da luta por sobre- vivéneia; 0 poder militar, por sua vez, perderia utilidade em um qua- dro de cooperagia interestatal, em decorréncia de seu alto custo rela- tivo. Além disso, o alargamento da concepgao de seguranga passou a ser demandado para incluir quest0es relativas a: (i) recursos, meio ambi- ente e demografia (MATHEWS, 1989); (ii) ameagas nao militares e internas (ULLMAN, 1983); e (iii) economia, ecologia, fatores do- mésticos da seguranga e ameagas transnacionais (HAFTENDORN, 1991). A producio da corrente (neo)realista como um todo, dessa forma, parecia insuficiente para o estudo dos fendmenos da politica internacional.” De modo andlogo, segundo Freedman (1998), 0 colapso da URSS gerou perda de credibilidade na utilidade de previsao dos estudos es- tratégicos, uma vez que o evento nao poderia ser explicado dentro do paradigma do (neo)realismo. Assim, consolidou-se a mudanga do campo de estudos “estratégicos” para o campo de estudos “de segu- ranga”. Por outro lado, com a queda do Muro de Berlim, o desapare- cimento da questdo que até entdo havia ocupado lugar central no 464 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional campo ~a Guerra Fria~ foi, segundo Miller (2001, p. 27-37), “libera- dor” para os estudos de seguranga. Tornou-se possivel, assim, a reali- zagdo de grandes debates sobre: « temas fundamentais das RelagSes Internacionais, como a con- figuragdo da nova ordem mundial e suas consequéncias; + aguerra em geral. Consideraram-se nao sé instrumentos alter- nativos de politica externa, tais como as sangdes econdmicas, como também as guerras civis em diferentes partes do mundo, 0 fatores hist6ricos, culturais e socioecondmicos que as influ- enciavam, e a temdtica da intervenedo internacional; e bas metodolégicas, te6ricas e conceituais da andlise de politica internacional e de seguranga. Nessas circunstancias, os estudos de seguranga inseriram-se no de- bate mais geral realizado no campo das Relagées Internacionais — aquele entre racionalistas, pertencentes as correntes (neo)realista e liberal-institucionalista, e as diferentes variagdes do construtivismo social. Na proxima secdo, apresentar-se-d de forma breve esse deba- te, assim como seus reflexos nos estudos de seguranga. 2. O Construtivismo e seu Impacto nos Estudos de Seguranca 2.1 Diferencas principais entre 0 racionalismo e o construtivismo” De acordo com os construtivistas, 0 mundo social — assim como as identidades ¢ interesses dos agentes ~ é construido por estruturas ¢ processos intersubjetivas e coletivos. Para estudé-lo, portanto, é ne- cessério questionar as premissas realistas ¢ liberal-institucionalistas sobre a natureza das relagées internacionais, de modo a analisar di- versas varidiveis que stio tomadas como dadas (ou “naturalizadas”) na 465 Marine Guedes Duque epistemologia racionalista. O construtivismo, dessa forma, busca re- ver perspectivas estabelecidas no campo de teoria das RelagGes Inter- nacionais com o propésito de desvendar processos antes desprezados ¢ de chamar atengao para varidveis cuja relevancia para a anilise vi- nha sendo subestimada: strutivistas interessam da vida pela forma cial sio I... 0s cor como os objetos e as pritic: “construidos”, especialmente aqueles que as sociedades ou os pesquisadores tomam como dados ou naturais. A naturalizagao € problemé- tica porque obscurece as formas como objetos € priticas sociais dependem, para sua existén- cia, de escolhas continuas, de modo que ela pode ser opressiva e representar uma barreira A mudanga social (FEARON; WENDT, 2002, p.57). As principais discordancias epistemolégicas entre racionalistas ¢ construtivistas dizem respeito: (a) a importancia das ideias na andlise das relag6es internacionais; (b)a relagdo agente-estrutura; ¢ (c) Ana- tureza das explicagdes no campo de Relagdes Internacionais. Primeiramente, para os racionalistas, as ideias possuem importancia no estudo das relagdes internacionais, mas stio objeto marginal de andlise. Os construtivistas, por sua vez, enfatizam o papel das ideias na politica internacional, por considerarem que elas desempenham funcao primordial na construg%o do mundo social. Para os racionalistas, as varidveis materiais, e nio as ideativas, ocu- pam lugar central no estudo das relagdes intenacionais. Um exemplo da centralidade das varidveis materiais nas explicagdes racionalistas €oconceito de Waltz (1979, p. 79-101) de estrutura do sistema inter- nacional, definido em termos de trés fatores: o principio ordenador do sistema; a fungao das unidades que compdem o sistema; e a distri- buigao relativa de capacidades materiais entre as unidades do siste- ma, 466 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional A anarquia internacional — entendida como a auséncia de autoridade supraestatal — é, para Waltz, a “caracterfstica proeminente” do siste- ma internacional, ou seja, corresponde ao principio ordenador do sis- tema desde sua instituigdo. A fungao das unidades que formam o sis- tema, por sua vez, 6a mesma para todas, pois todas sao Estados. Des- se modo, segundo Waltz, dois dos fatores definidores da estrutura do sistema internacional s4o constantes. A distribuicdo relativa de capacidades entre os Estados, portanto, 6 0 fator central do conceito de estrutura do sistema internacional (WALTZ, 1979, p.97); para Waltz, mudangas na distribuigdo relativa de capacidades equivalem a mudangas na estrutura do sistema inter- nacional. Além disso, Waltz procura desenvolver uma teoria sistémi- ca, na qual o sistema internacional concentra as varidveis indepen- dentes da explicago dos fendmenos internacionais. As capacidades materiais e sua distribuicao relativa, dessa forma, possuem peso con- siderdvel nas explicagdes neorrealistas das relagdes internacionais. De acordo com os construtivistas, por outro lado, as capacidades ma- teriais e os fatos sociais apenas adquirem significado por meio da es- trutura de conhecimento compartilhado na qual se inserem, ou seja, por meio das ideias. Essa premissa construtivista é a base da famosa frase de Alexander Wendt (1992): “a anarquia é aquilo que os Esta- dos fazem dela”. Para Wendt (1999, p. 260), a auséncia de autoridade supraestatal no significa, necessariamente, que os Estados viverao algo proximo ao estado de natureza hobbesiano. U estado de guerra de todos contra todos provém de uma estrutura de ideias comparti- Ihadas, é resultado de contingéncias hist6ricas — e nao uma conse- quéneia direta da natureza humana ou da anarquia internacional, conforme afirmam, respectivamente, realistas e neorrealistas. A segunda principal discordancia entre as duas epistemologias fun- da-se em concepgées distintas da relaco agente-estrutura. Os con trutivistas consideram que as estruturas de ideias e os agentes se 467 Marine Guedes Duque constituem mutuamente, em um processo dindmico e que abre espa- co para a mudan¢a social perpetrada pelos agentes. De acordo com Wendt (1999, p. 308-312), por exemplo, a depender do grau de inter- nalizagao da cultura politica compartilhada no sistema internacional, © padrao de interagao entre Estados pode modificar-se mais facil- mente entre os tipos ideais de cultura hobbesiana (inimizade), locke- ana (rivalidade) e kantiana (amizade). Além disso, a menos que ocor- raum grande choque externo, é provavel que o sistema internacional evolua progressivamente de uma cultura hobbesiana para uma locke- ana e, finalmente, para uma cultura kantiana (WENDT, 1999, p. 312). Wendt, assim, além de buscar explicar as mudangas nas rela- Ges internacionais, possui uma visao prospectiva mais otimista do que aquela dos racionalistas.!° Os racionalistas, por seu turno, concentram-s ¢ NOs constrangimentos ¢ incentivos das estruturas sobre os agentes, ou seja, concebem uma relacdo agente-estrutura de caréter mais estitico, em que se privilegi- am as continuidades no sistema internacional. A prépria intengao de ‘Waltz, por exemplo, de elaborar explicagdes causais nas quais as va- ridveis explicativas sao sistémicas demonstra a énfase dada a estrutu- ra do sistema internacional, em detrimento das unidades estatais (os agentes). Além disso, a relagao entre estruturas e agentes, para os ra- cionalistas, centra-se nus aspects matetiais: apenas os agentes privi- legiados pela distribuigdo relativa de capacidades interferem de algu- ma forma na estrutura, a0 passo que os agentes mais fracos se limi- tam a sofrer constrangimentos. Nas palavras de Waltz (1979, p. 94): “Contanto que os Estados principais sejam os atores principais, a es- trutura da politica internacional é definida em termo deles”. As agdes dos Estados mais poderosos, desse modo, possuem impacto sobre to- das as unidades do sistema internacional. A terceira discordancia principal entre as epistemologias racionalista e construtivista concerne aos objetivos da explicago no campo das Relagdes Internacionais. Os construtivistas nao buscam formular 468 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional apenas explicagdes causais, como os racionalistas, mas também ex- plicagdes constitutivas — ou seja, eles nio pretendem apenas dizer como as coisas sao, mas também como elas se tornaram 0 que sao. Para 0s construtivistas, tanto as estruturas e processos sociais como 08 objetos de andlise so historicamente contingentes, e nao a Gnica configuragiio possivel das relag6es internacionais — como 0 mundo foi apresentado, por muito tempo, pelos racionalistas. A anarquia in- ternacional ou uma determinada concepgdo da natureza humana, nesse sentido, nao implicam que os Estados vivam em condigao se- melhante ao estado de natureza hobbesiano, e tampouco determinam que os interesses estatais sejam definidos em termos de poder ou de sobrevivéncia.'! Essa percepgaio das relagées internacionais identifi- cada com 0 (neo)realismo se constituiu por meio de processos hist6- ricos e sociais; ela ndo é, portanto, inevitével ou imutavel. Além de analisar os processos causais de socializacéo por meio dos quais os agentes adquirem identidades e interesses especificos, por exemplo, os construtivistas procuram analisar as condig6es constitu- tivas das estruturas ¢ dos processos sociais que influenciaram a for- magio de identidades e interesses. Os interesses estatais, de acordo com a epistemologia construtivista, nao decorrem diretamente de circunstancias sistamicas on psicoldgicas: eles pravém de processos de socializago, nos quais so formadas também as identidades esta- tais. E essencial, por conseguinte, nao sé analisar os processos cau- sais de formagio de identidades e interesses estatais, como também examinar as condig6es constitutivas desses processos. Apenas assim € possivel, segundo os construtivistas, explicar por que, entre uma gama de identidades ¢ interesses concebiveis, formaram-se algumas combinagées especificas. Por outro lado, é justamente a busca por explicagdes constitutivas que permite ao construtivismo questionar 0 determinismo (neo)realista e explicar a mudanga nas relagées inter- nacionais. Em suma, os racionalistas: concedem as varidveis materiais papel central na andlise das relagdes internacionais; enfatizam os constran- 469 Marine Guedes Duque gimentos e incentivos das estruturas sobre os agentes; e visam tecer explicagdes causais para os fendmenos estudados em Relacées Inter- nacionais. Os construtivistas, por seu turno: enfatizam a importancia das ideias no estudo das relagées internacionais, consideram que agentes ¢ estruturas se constituem mutuamente; ¢ buscam tecer explicagées nao s6 causais como também constitutivas. Uma vez apresentado o panorama geral das diferengas epistemolégi- cas entre o racionalismo e o construtivismo, analisar-se-ao, na pr6xi- ma seco deste artigo, as diferentes vertentes do construtivismo, com © propésito de se examinarem, na segaio seguinte, os desdobramentos te6ricos do campo das Relagées Internacionais nos estudos de segu- ranga internacional. Isso permitird considerar, posteriormente, as contribuigées da Escola de Copenhague para a nova agenda de pesquisa do campo de seguranga internacional. 2.2 As variagées do construtivismo Apesar de haver uma base comum da abordagem construtivista das Relagoes Internacionais, ha importantes pontos de dissenso entre os autores, que se identificam com diferentes variagées do construtivis- mo, Da mesma forma que as discordancias entre o racionalismo ¢ 0 construtivismo se refletem nos estudos de seguranga internacional, Os pontos de dissenso entre construtivistas possuem impacto sobre as Pperspectivas no campo de seguranga, como se vera. E, portanto, fun- damental analisar as diferentes variagdes do construtivismo antes de se considerarem as principais correntes teéricas do campo de segu- ranga internacional. Segundo Fearon e Wendt (2002, p. 57), um dos pontos de dissenso entre construtivistas diz respeito & natureza do conhecimento —o que configura uma discussio na qual se distinguem pelo menos duas questoes epistemolégicas principais. A primeira questiio epistemo- 470 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional I6gica é denominada a “questo do relativismo”: pode-se conceder as declaragdes de conhecimento sobre 0 mundo social mais do que po- der discursivo? Em outras palavras: existe uma realidade externa aos observadores, que pode ser “testada” empiricamente? E, por outro ado, quais as consequéncias de se adotar tal premissa? A segunda questo epistemol6gica é denominada a “questo do naw- para os estudos so- ralismo”: as explicagdes causais so apropriad: ciais? Ou elas implicariam a naturalizagao de praticas construidas so- cialmente? Essa questio diz respeito a possivel interferéncia dos ob- servadores na reprodugao, constituigio e fixacilo das praticas sociais observadas; ela pressupde outra questio: € possivel separar 0 obser- vador do agente? Com base na “questao do relativismo” e na “questao do naturalis- mo”, Fearon e Wendt (2002, p. 56-58) estabelecem trés posigdes dentro do construtivismo: (i) a positivista, que reponde afirmativamente a ambas as ques- tes, ¢ aproxima-se do racionalismo. Para os construtivistas positivistas, existe uma realidade objetiva que pode ser “testa- da” empiricamente, e as explicagdes causais sao apropriadas para os estudos sociais. Essa posicao é, assim, caracterizada como “objetivista”, e tenta se espelhar nos procedimentos metodolégicos das ciéncias naturais; (ii) ainterpretivista, que responde afirmativamente & “questo do relativismo” © negativaneute & “questau du naturalisu”. Os construtivistas interpretivistas também podem ser qualifica- dos como “objetivistas”, por considerarem que ha uma reali- dade externa aos observadores, mas, diferentemente dos cons- trutivistas positivistas, eles acreditam que explicagées causais acarretam a natnralizacio de pratieas canstrnidas socialmente: e (iii) _apds-moderna, que responde negativamente a ambas as que: toes. Os construtivistas pés-modernos refutam a existéncia de 471 Marine Guedes Duque uma realidade objetiva e consideram ser impossivel separar 0 observador do agente. Para eles, a observacao implicaria sem- pre a naturalizagao das praticas observadas, ou seja, a interfe- réncia nas praticas sociais observadas, no sentido de sua repro- dugio, constituigao e fixacao. De modo similar, Hopf (1998) realiza uma distingao entre 0 que de- nomina variag6es convencional e critica do construtivismo. Sua dis- tingao baseia-se em outro ponto de dissenso entre os construtivistas. Os construtivistas criticos, segundo Hopf, possuem 0 objetivo de ilu- minare emancipar os individuos, ao desvendar, por meio da observa- ao e da anilise, as relagdes sociais de poder. As consequéncias poli- ticas desencadeadas pela andlise constituem preocupagio central dos construtivistas criticos, ao passo que os construtivistas convencio- nais nao concedem relevancia a essa questao: A abordagem da identidade por parte da teoria critica fundamenta-se em pressupostos sobre 0 poder. Os te6ricos criticos veem 0 poder como sendo exercido em cada intercambio social, e hd sempre um ator dominante nesses intercam- bios. Desmascarar as relagdes de poder é uma grande parte da agenda substantiva da teoria critica: 0 construtivismo convencional, por ou- tro lado, permanece “neutro analiticamente” sobre a questiio das relagdes de poder (HOPF, 1998, p. 185) O construtivismo, dessa forma, nao deve ser concebido como um mondlito. Hé uma base comum para a epistemologia construtivista— apresentada de modo breve, na segao anterior, durante a comparagao com o racionalismo ~, mas exisiem, ao mesmo tempo, discordancias importantes dentro da corrente construtivista. Coma se veré na préxi- ma segio deste artigo, as controvérsias tanto entre racionalistas e construtivistas como entre construtivistas refletem-se nas discussdes atuais dentro do campo de seguranga internacional. 472 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional 2.3 Reflexos das discussées teéricas nos estudos de seguranca internacional Segundo Buzan (1997), no campo te6rico dos estudos de seguranca, podem-se distinguir trés vertentes: w (ii) (ii) a tradicionalista, que: (a) enfatiza 0 uso da forca e as questoes militares; (b) estuda as ameagas a seguranga a partir de uma perspectiva objetivista, mesmo quando considera os proble- mas de percepgao por parte dos tomadores de decisao; e (c) € estado-céntrica em alguns de scus autores; a vertente critica, que considera que as ameagas e os objetos de seguranga so socialmente construidos, de forma que nao é possivel determiné-los sem realizar uma interferéncia na cons- trugdo social (ou uma naturalizagio). Para essa vertente, por- tanto, os académicos possnem o papel de mostrar a possibili- dade de construgées sociais diferentes e, dessa forma, emanc! par os individuos;"” e avertente abrangente —na qual se inclui a Escola de Copenha- gue —, que defende: (a) o alargamento do conceito de seguran- ga, com base na existéncia de ameagas nao militares e (b) a re- definigdo do significado de seguranga como ato de fala (spe- ech-act). Essa vertente representa, assim, uma posigdo inter- mediaria entre as duas outras vertentes de estudos de seguran- ga. As trés vertentes no campo de seguranga internacional identificadas por Buzan (1997) refletem nao s6 as discordancias no campo de teo- ria das Relages Internacionais, entre racionalistas e construtivistas, como também os pontos de dissenso entre construtivistas. Como de- monstra 0 Quadro 1, a vertente “tradicionalista” de seguranga inter- nacional pode ser associada ao racionalismo e ao construtivismo “positivista” ou “convencional”, da mesma forma que a vertente “cri- tica” se associa ao construtivismo “pés-moderno” ou “critico”. A’ 473 Marine Guedes Duque vertente “abrangente”, por sua vez, est4 relacionada ao construtivis- mo “interpretivista” ou “convencional”. Quadro 1 Base Tebrica das Vertentes do Campo de Seguranga Internacional Racionalismo Variagées do _Variagées do Construtivisime Consuutivisiie Construtivismo (FEARON; — (HOPF, 1998) WENDT, 2002) A 3 & Tradicionalista racionalista _posttivista, ‘convencional $s geek gest eg Ss ‘i 5 ‘i $8235 critica constutivista |pés-modema —_eritica saSes $235 Abrangente consrutivista jnterpretivista_convencional S8g3Ee Embora ambas as vertentes tenham realizado contribuig6es relevan- tes A acumulagiio de conhecimento na drea de seguranca internacio- nal, tanto a vertente tradicionalista como a critica enfrentam limita- des em seu desenvolvimento. Por um lado, os tradicionalistas, que ocupam historicamente posigdo hegemOnica dentro do campo de es- tudos de seguranga, ainda nao lograram formular um quadro te6rico € conceitual que permita lidar com as mudangas verificadas no con- texto p6s-Guerra Fria. A posigdo tradicionalista no debate limita-se a contestar as perspectivas bascadas no construtivismo, sem propor novas alternativas ou mesmo assimilar contribuig6es construtivistas. Por outro lado, a vertente critica, em larga medida, nao visa formular um quadro teérico e conceitual ou realizar investigagdes empiricas, mas sim demonstrar as construgdes sociais realizadas no campo dos estudos de seguranga. Ela se limita, muitas vezes, ao objetivo politico de emancipar os individuos das relagdes de poder consolidadas. Dessa forma, destaca-se o trabalho da vertente abrangente. Ao longo das duas tiltimas décadas, a Escola de Copenhague desenvolveu um quadro tesrico e conceitual inovador, cujo escopo permite a interpre- 474 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional tagdo de continuidades e mudangas no ceniirio internacional, ao ser aplicdvel nao sé ao perfodo atual como também a histéria recente das relages internacionais. O grupo de Copenhague realizou uma pro- dutiva sintese tanto das vertentes tradicionalista e critica de seguran- ¢a internacional como das abordagens realista ¢ construtivista de teorias das Relagdes Internacionais; ele abriu espago, assim, para uma nova agenda de pesquisa na Area. O trabalho da Escola de Copenhague, além disso, concedeu fluidez a0 didlogo entre os estudos sobre seguranga, de origem estaduniden- se, e os estudos para a paz, de origem europeia. Observa-se, assim, um impacto inédito de perspectivas europeias no mainstream do campo de seguranga, centrado nos Estados Unidos. Faz-se nec rio, por conseguinte, conhecer e analisar os instrumentos analiticos sa possibilitar 9 refinamento e 0 aprofundamento da abordagem proposta pelo grupo. sdi- desenvolvidos pela Escola de Copenhague, com vis As discussées epistemoldgicas e tedricas entre racionalistas e cons- trutivistas, e de construtivistas entre si, desse modo, estabelecem 0 contexto do desenvolvimento do trabalho do grupo de Copenhague, que serd analisado na proxina segao, 3. A Escola de Copenhague: Uma Perspectiva Nesta se¢do, apresentar-se-4 um breve histérico da produgao da Escola de Copenhague, sobre dois eixos principais: (a) as contribui- ges que mais se destacaram; e (b) os debates suscitados pelo traba- Iho da Escola, com as criticas recebidas e as respostas fornecidas pe- Jos autores. Como referéncia, serao consultadas as obras mais recen- tes e que possuem carater mais geral/tedrico da Escola, notadamente Waever (1995), Buzan (1997), Buzan et al. (1998) e Buzan e Waever (2003). 475 Marine Guedes Duque Em 1985, fundou-se o Centre for Peace and Conflict Research, atual- mente Conflict and Peace Research Institute (COPRD, que veio a ser conhecido como Escola de Copenhague, pela coeréncia e continui- dade do conjunto de sua obra.'* Ole Waever esteve no projeto desde o inicio, e Barry Buzan passou a incorpora-lo em 1988. O trabalho an- terior do grupo, no entanto, ja refletia impacto considerdvel de obras de Buzan, Pode-se dizer que a raiz do papel de sintese do trabalho da Escola se encontra na parceria entre os dois autores, que em obras an- teriores possufam, respectivamente, inclinagdes mais associadas ao construtivismo e ao realismo.' O trabalho da Escola de Copenha- gue, portanto, caracteriza-se por uma dinamica coletiva e pelo que Huysmans (1998b) chama “desenvolvimento criative”: ha unidade, proveniente da continuidade e coeréncia que o caracterizam, e ao mesmo tempo hi criatividade, representada por mudangas proveni- entes da revisio do trabalho e da formulagao de ideias. Como observa Huysmans (1998b, p. 482), ha duas motivagdes prin- cipais no alargamento da agenda de estudos de seguranga proposto pela Escola: + o interesse, de natureza empirica, em relagio a tendéneia veri- ficada nas agendas de seguranga da Europa de considerar as questdes nio militares como questdes de seguranga: € + 0 interesse académico de formular uma contribuigao original para os debates tesricos realizados na drea de seguranga inter- nacional. Talvez. como consequéncia do carter tanto empirico como académi- co de suas motivagdes de pesquisa, a Escola adota uma abordagem interpretativa da seguranca internacional, na qual: “Os fatos nao cor- roboram ou falsificam [a teoria]; eles nao esta externamente, mas internamente relacionados ao empreendimento tedrico” (HUYSMANS, 1998b, p. 485). Ao mesmo tempo, ao pressupor que existe uma realidade empirica que pode ser investigada e, assim, pro- 476 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional ver a base para seus estudos, a Escola desvincula-se da perspectiva que denomina “(des)construtivista”, caracteristica da vertente critica dos estudos de seguranca. Entre as contribuigdes mais relevantes da Escola de Copenhague para os estudos de seguranca, encontram-se: (i) 0 conceito de securi- tizayau; (ii) as uuvas unidades da andlise de seguranga; € (iii) a abur- dagem multissetorial da seguranga.!° A seguir, serdio explorados es- ses pontos, com o propésito de se observar seu papel de sintese nos debates do campo de seguranga e de teoria das Relagdes Internacio- nais. 3.1 Contribuicées do trabalho da Escola de Copenhague 3.1.1 O conceito de securitizacao Oconceito de securitizagao proposto pela Escola de Copenhague é 0 exemplo mais evidente da aplicagao da epistemologia construtivista no trabalho do grupo. De acordo com os construtivistas, o mundo so- cial—assim como as identidades e os interesses dos agentes — é cons- trufdo por estruturas ¢ processos intersubjetives e coletivos. Enquan- to os tradicionalistas vinculam o estudo da seguranga a existéncia de ameagas objetivas, os autores de Copenhague consideram que as ameagas a seguranga sao socialmente construidas. A securitizagao e 08 critérios para securitizagao, segundo o grupo de Copenhague, so praticas intersubjetivas, por meio das quais um agente securitizador procura estabelecer socialmente a existéncia de uma ameaga a sobre- vivéncia de uma unidade (BUZAN et al., 1998, p. 29-31). Para Buzan etal. (1998, p. 30), como nao é possivel medir a seguran- ¢a objetivamente, uma abordagem objetivista da seguranga sé é vid- vel em casos de ameagas inequivocas e imediatas, como tanques hos- 477 Marine Guedes Duque tis cruzando a fronteira de um pais. Mesmo nesse caso, no entanto, os autores observam que a condig2o de “hostilidade” resulta de uma re- lacdo constitufda socialmente e, por conseguinte, nao é objetiva; os tanques poderiam ser, por exemplo, parte de uma operag&o de paz. Para que uma questao seja considerada como de seguranga, é neces- sdrio que isso seja estabelecido socialmente por meio de praticas intersubjetivas. A Escola utiliza, assim, 0 conceito de “ato de fala” (speech-act), pro- veniente da lingufstica, para analisar 0 processo comunicativo por meio do qual uma questao é transposta para a esfera da seguranga. A securitizagao é, segundo Buzan et al. (1998), um “ato de fala”. Esse conceito, cuja formulacao se atribui a John L. Austin, baseia-se na premissa de que o discurso € uma forma de ago e, portanto, carrega consequéncias.'° Segundo a Escola de Copenhague, palavras que fa- zem referéncia a ameagas a existéncia de uma unidade, além de serem apenas signos linguisticos, trazem consigo a demanda de que medidas sejam tomadas para contrabalangar as ameagas. Tal aspecto se reforga se o agente securitizador é um representante do Estado e se encontra, por conseguinte, em condigdes de implementar as medidas demandadas, ap6s requerer poderes especiais para tanto: O que &, entio, a seguranga? Com 0 auxilio da teoria da linguagem, podemos conceber a se guranga como um ato de fala. Nessa acep¢ao, a seguranga nfo é objeto de interesse como um signo que se refere a algo mais real: a fala em si €oato, Ao se falar, algo ¢ feito (como ao se fa- zerem apostas Ou promessas, ou ao se dar nome um navio). Ao dizer “seguranga”, um repre- sentante estatal faz referéncia a um aconteci- mentoem uma drea especffica, e assim deman- da um direito especial para utilizar quaisquer meios que se fizerem necessérios para evitd-lo (WAEVER, 1995, p. 55). 478 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional Segundo Buzan et al. (1998, p. 26), portanto, para se estudar a securi- tizagdo, é necessério estudar os discursos de securitizagao, que pos- suem uma estrutura ret6rica especifica. Nesse tipo de discurso, 0 agente securitizador faz referéncia nao s6 a sobrevivéncia de uma unidade, como também a prioridade de acdo para conter uma ameaga a existéncia da unidade — sem necessariamente utilizar a palavra “se- guranga”, Segundo os autores, o significado da securitizagiio nao é fixo, mas se baseia em seu uso por parte dos agentes securitizadores. O discurso de securitizagao, no entanto, nao acarreta a securitizagio de um tema de forma automitica; ele é apenas uma iniciativa de secu- ritizagdo (securitization move), que pode ser aceita ou no. A securi- tizagio sé é efetivada quando o piiblico considera legitima a deman- da do agente securitizador, e a ameaga é estabelecida com saliéncia suficiente para que se justifique a quebra das regras normais da politica com vistas a contrabalangar essa ameaga (BUZAN et al., 1998, p. 25). Quando um tema é securitizado, ele sai da esfera da politica normal e pas: sa para a esfera da politica emergencial, caracterizada pela confi- dencialidade © pela desconsideragau dos mecanismos institucionais normais ~ 0 que costuma legitimar, por exemplo, 0 uso da forga.'7 Uma securitizagaio bem-sucedida, desse modo, “possui trés compo- nentes (ou passos): ameagas a existéncia, agdo emergencial e efeitos nas relagdes entre as unidades por meio da quebra de regras” (BUZAN et al., 1998, p. 26). A securitizagao pode ser vista de forma mais geral como uma verso extrema da politizagio (BUZAN et al., 1998, p. 23). Politizagaio e se- enritizagiio, assim, encantram-se emnm continuum de temas, que vai desde temas “ndo politizados” (que nao so objeto de politicas esta- tais ou de debates piblicos) aos “politizados” (objeto de politicas publicas) e, entio, aos securitizados: 479 Marine Guedes Duque A “seguranga” 6 a iniciativa que leva a politica além das regras estabelecidas do jogo e identi- fica a questo como uma forma especial de po- litica ou acima da politica, A securitizac: pode ser vista, assim, como uma versio mais extrema da politizacdo. Em tese, qualquer as- sunto ptiblico pode ser situado no espectro que vai de assuntos nao politizados (ou seja, 0 Esta- do nao lida com eles, ¢ eles no so temas de discussdes ou decisdes piiblicas) a assuntos po- litizados (ou seja, 0 assunto é objeto de politi- cas puiblicas e requer decisdes e alocagoes de recursos por parte do governo, ou, mais rara- mente, requer outra forma de administracao comunitaria) e ainda a assuntos securitizados (ou seja, apresentados como uma ameaga a existéncia, que requer medidas de emergéncia ¢ justifica a tomada de agdes fora das fronteiras normais dos proccdimentos politicos) (BUZAN et al, 1998, p. 23-24). A securitizagaio coloca as questées acima da politica normal, ¢ no Ambito do que Waever (1995) denomina “politica do panico”, na qual a desvinculacio em relacdo as regras normais justifica tornar assun- tos confidenciais, criar poderes executives adicionais ou desempe- nhar atividades que, de outro modo, seriam ilegais. A securitizagao possui, portanto, impacto consideravel sobre © processo decisério que concerne a questdes relacionadas ao objeto referente. Para a Escola de Copenhague, uma vez que a securitizagao leva as questdes para o Ambito da “politica do panico”, a seguranga nao pos- sui valor intrinsecamente positivo, como veem os tradicionalistas. Muito pelo contrario; segundo Buzan et al. (1998, p. 4, 29), ndo s6a securitizagfo deve ser evitada na maioria dos casos, como também se deve visar a “dessecuritizagao” dos temas e a sua discussio no ambi- to da politica normal. Essa posigdo consiste, assim, na parte normati- va da teoria desenvolvida pela Escola de Copenhague. Ela represen- 480 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional ta, ademais, um limite ao alargamento da agenda de seguranca que se realiza ao se considerar a “politica de ameagas a existéncia” como o foco dos estudos de seguranga e se permitir, por conseguinte, a andli- se de varios setores tematicos. De acordo com Buzan (1997, p. 15), esse limite impede que se perca a qualidade essencial do conceito de seguranga. Ao mesmo tempo em que conceber a securitizagao como um ato de fala permite considerar um amplo espectro de ameagas in- tersubjetivas, variando de Estado para Estado, 0 objetivo normativo de dessecuritizago reduz a gama de temas com legitimidade sufi- ciente para pertencerem a agenda de seguranca. Além disso, as iniciativas de securitizagao com maior probabilidade de sucesso, o formato em que podem ser feitas, os objetos a que po- dem se referir e as posigdes sociais que Ihe conferem mais credibili- dade sao praticas profundamente sedimentadas e estruturadas. Exis- tem “condigdes facilitadoras” —condicSes sob as quais um ato de fala € bem-sucedido em relagdo a seus objetivos — especificas para cada setor temdtico, o que limita as chances de sucesso das iniciativas de das ao objetivo normativo de limitar 0 conjunto de temas sujeitos a securitizacao, as condigées facilitadoras fornecem & nova agenda de pesquisa em seguranga internacional, segundo os autores de Cope- nhague, um objeto de estudo relativamente previsivel, em lugar de aberto e sujeito a todo tipo de expansdes. © conceit de securitizagau deseuvelvido pela Escola de Cupentia- gue, desse modo, é representativo da posicio intermedidria que grupo ocupa nas discuss6es tedricas do campo de seguranga interna- cional. Para a corrente critica, como se vera, 0 conceito de seguranga deve ser alargado, mas sem que se determinem (ou “naturalizem”) as praticas que corresponderiam a ele. Para a corrente tradicionalista, por outro lado, o alargamento acarreta a perda da coeréneia intelectu- al do conceito de seguranga, que deveria continuar a se restringir ao que a Escola de Copenhague denomina setores politico e militar. 481 Marine Guedes Duque Embora os autores de Copenhague proponham um alargamento do conceito de seguranga por meio do conceito de securitizagao, esse alargamento é circunscrito a um ntimero de praticas ¢ pautado por critérios determinados — cle nao é infinito, como defende a corrente critica, mas ocorre, apesar das reservas dos tradicionalistas. 3.1.2 As unidades da anilise de seguranca De acordo com Buzan et al. (1998, p. 35-42), ha trés tipos de unida- des envolvidas na anélise de seguranga, as quais compdem o proces- so de securitizagio: os objetos referentes, os atores securitizadores e os atores funcionais. Essas unidades sao definidas da seguinte forma: (i) _ objetos referentes sao as unidades cuja existéncia 0 ator securi- tizador declara ameagada, para demandar que se tomem medi- das com vistas a protegé-las (BUZAN et al., 1998, p. 36). Tra- dicionalmente, o objeto referente tem sido o Estado, e tem-se relacionado a sobrevivéncia estatal 4 manutengio da sobera- nia. Apesar de a teoria de securitizagao permitir a ampliagdo do ntimero de objetos referentes possiveis, as condigdes facili- tadoras da securitizagao fazem com que a aceitagao de alguns deles seja mais provavel. Segundo os autores, objetos referen- tes que remetem a coletividades limitadas — como Estados, na- g6es ou civilizagdes — tém mais chances de serem aceitos do que objetos referentes demasiado amplos. Os objetos referen- tes, por fim, sio a base para a definigdio dos setores de seguran- ¢a propostos na abordagem multissetorial da Escola de Cope- nhagu (ii) atores securitizadores sao os autores das iniciativas de securiti- zagio, que utilizam a estrutura retérica da seguranga com 0 propésito de chamar atengdo para a necessidade de se tomarem medidas de emergéncia, a fim de proteger um determinado ob- jeto referente da ameaga que identificam (BUZAN etal., 1998, 482 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 (iii) © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional p. 36). Em geral, os atores securitizadores so lideres politicos, burocratas, representantes governamentais e porta-vozes de grupos de pressao. Eles podem falar em nome do objeto refe- rente, no caso de serem representantes do Estado — como cos- tuma ocorrer nos setores militar e politico. Em outros casos, em que 0 objeto referente nao corresponde ao Estado, é possf- vel fazer a distingdo analitica entre objeto referente e ator securitizador; e atores funcionais, por seu turno, sao “atores que afetam a dina- mica de um setor. Sem serem 0 objeto referente ou o ator que demanda seguranga em favor do objeto referente, so atores que influenciam de forma significativa as decisGes na area de seguranca” (BUZAN et al., 1998, p. 36). No setor militar, por exemplo, os atores funcionais so as agéncias de forga (por exemplo, companhias mercendrias, burocracias de defesa, Forgas Armadas), 05 provedores dos instrumentos de forga (por exemplo, a indiistria de armamentos) e agéncias governa- mentais que possam influenciar as politicas externa e de defe- sa. No setor ambiental, por outro lado, os atores funcionais po- dem ser: atores econ6micos cuja atividade esteja diretamente ligada 4 qualidade do meio ambiente. governos. agéncias governamentais, organizag6es intergovernamentais e organi- zagoes nao governamentais. Se, na abordagem tradicionalista, o Estado é considerado o tinico ob- jeto referente, na abordagem abrangente, o Estado é apenas um entre 08 diversos objetos referentes possiveis. A Escola de Copenhague abre espago para que unidades nao estatais sejam objetos referentes da securitizagio; 0 Estado deixa de ser objeto referente exclusivo, e niio mais domina a agenda de pesquisa, como concebe a maior parte dos tradicionalistas. Tampouco ha uma divisio rigida entre os niveis. doméstico ¢ internacional, como veem os tradicionalistas, porque muitos objetos referentes nfo so definidos pelo conceito de Estado, 483 Marine Guedes Duque mas sim por valores € objetivos mais ou menos amplos — como o livre-comércio, as temperaturas globais, uma cultura regional ou um ecossistema local. A principal inovacao decorrente da adogao dessas unidades de andlli- se, no entanto, consiste na possibilidade de se separarem atores secu- ritizadores ¢ objetos referentes. Quando o Estado € 0 objeto referen- te, 0 governo pode falar em seu nome; neste caso, o objeto referente (Estado) coincide com o agente securitizador (representante do E: do). Por outro lado, quando ha objetos referentes que nao 0 Estado, como a nagiio ou o meio ambiente, a distingao entre objeto referente e agente securitizador torna-se importante para se observar que 0 go- verno, embora possa adotar esta retérica, nao est4 falando em nome proprio, ou seja, em nome do Estado. A adogdo dessas unidades de anélise propde um critério para se examinar o discurso dos agentes securitizadores que sao representantes estatais e, ao desvendar esses mecanismos retéricos, enfraquece 0 papel do Estado na rea de seguranga internacional. A teoria de securitizagao, portanto, retira o foco de andlise do Estado, por meio: (a) da distingdo entre objeto referente e agente securitiza- dor; e (b) da adogiio de objetos referentes nao estatais. A Escola de Copenhague reconhece, entretanto, que as acdes para combater as ameagas percebidas pela sociedade ainda passam, na maior parte das vezes, pelo Estado —o qual, em geral, poderd ser considerado, na ana- lise, pelo menos um ator funcional. Q abjetive das antores, dessa for ma, nao consiste em negar a importancia do Estado, mas antes em de- senvolver instrumentos analiticos que permitam explicar a participa- do significativa de outros atores. A Escola parte do pressuposto de que a importancia atual do Estado é historicamente contingente, de modo que, no futuro, outro ator pode ser mais relevante — contexto no qual a teoria de securitizagao ainda poderd ser valida. 484 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenh nos Estudos de Seguranca Internacional 3.1.3 A abordagem multissetorial da seguranca A abordagem multissetorial da seguranga, proveniente de Buzan (1991) e refinada em Buzan et al. (1998), forneceu uma base tedrica para o alargamento da concepgaio de seguranga, que vinha sendo de- mandado no campo académico, para além da agenda estreita que se concentrava nas relagdes politico-militares. Nessa abordagem. reali- za-se uma distingdo analitica entre cinco setores — militar, politico, econdmico, societal e ambiental — nos quais pode ocorrer securitiza- Gio, € que so definidos de acordo com os objetos referentes posst- 19 - 1 veis em cada um. Nosetor militar, 0 objeto referente é,em geral, o Estado, embora pos- sam ser outros tipos de entidade politica, como as Forgas Armadas. No setor politico, 0 objeto referente é tradicionalmente definido em fungao de um principio constituinte do Estado — a soberania estatal, mas, em alguns casos, também uma ideologia; além disso, segundo os autores, uma variedade de objetos referentes supranacionais (co- mo a Unido Europeia, os regimes internacionais e a sociedade inter- nacional) est surgindo no Ocidente, onde ha relag6es interestatais mais interdependentes e institucionalizadas (BUZAN etal., 1998, p. 22), Juntos, os setores militar e politico constituem a agenda tradicio- nal dos estudos de seguranca, por conterem os objetos referentes identificados com mais frequéncia ao longo do século XX (BUZAN, 1997, p. 6-7, 20-21). Os setores econdmico, societal e ambiental, por seu turno, represen- tam o alargamento da agenda de seguranga, demandado a partir do fi- nal da década de 1980 ¢ desenvolvido pela Escola de Copenhague. No setorecondmico, as abjetos referentes podem ser supranacionais, como regimes especificos ou o préprio mercado. No setor societal, 0 objeto referente sio identidades coletivas de larga escala que funcio- nam independentemente do Estado, como nacoes e religides. Por 485 Marine Guedes Duque fim, no setor ambiental, a gama de objetos referentes possiveis é am- pla, abrangendo desde a sobrevivéncia de espécies ou habitats até 0 clima planetario ca biosfera propicios 4 vida humana (BUZAN ctal., 1998, p. 22-23). Em virtude da natureza dos objetos referentes —em geral, nao relacionados diretamente com o Estado —, os setores econémico, societal e ambiental afastam-se da agenda tradicional dos estudos de seguranca. Os autores de Copenhague nao desprezam os trabalhos da corrente tradicionalista dos estudos de seguranga. Os setores politico e militar, que compreendem 4 concepgiio tradicionalista de seguranga, esto contidos na agenda de pesquisa abrangente, da qual constituem um subcampo. O que a corrente abrangente propée é que, além dos seto- res classicos dos estudos de seguranca — os setores politico e militar —, os setores econdmico, societal e ambiental sejam objeto de andlise na 4rea, Para Buzan et al. (1998, p. 24), o que determina quais sero os setores analisados no é uma concepgao académica do que deveria ser a se- guranga internacional, e sim a utilizagao do termo por parte dos ato- res—o que requer a aceitagao de iniciativas de securitizagao, em cada setor, por parte do piiblico. Com a expansao da agenda de pesquisa em seguranga internacional, por meio da adogo de uma abordagem multissetorial, a Escola de Copenhague pretende argumentar que a concepeaio de seguranga internacional € um processo dinamico, uma construgo social que depende da ago de agentes ¢ estruturas. Se- gundo 0s autores, é a securitizagao que deve fazer com que um tema seja considerado pela academia como um tema de seguranga Essa tese € exemplificada por meio do estudo da hist6ria recente. De acordo com Buzan (1997, p. 6-7), no comego da Guerra Fria, quando oconceito de seguranga nacional foi formulado, os desafios concebi- dos pelo Ocidente em relagao 4 URSS possuiam natureza nao apenas militar, mas também ideolégica, social e econdmica. A corrida arma- 486 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional mentista nuclear e as teorias de deterrence, entretanto, dominaram os estudos de seguranga e trouxeram uma concep¢ao centrada no Ambi- to militar. Apenas nos tltimos anos da Guerra Fria a agenda mais abrangente emergiu, conforme os aspectos nao militares da seguran- ca adquiriram novo cardter. A guerra ja nao era considerada uma boa opgao para alcangar varios dos objetivos politicos ¢ econdmicos nas relacdes entre Europa Ocidental, Japaio e América do Norte, princi- palmente apés a Guerra do Vietna.”” Segundo Buzan (1997, p. 6-9), a seguranga nao foi sempre reduzida aos aspectos militares; essa € apenas uma construgio social da era nuclear. Desse modo, paralelamente ao arrefecimento da Guerra Fria e ao declinio do paradigma realista, ocorriam securitizagdes: + da economia internacional — referentes ao declinio relativo da economia estadunidense e a reagdes A crescente liberalizagao da economia mundial —, desde a década de 1970; + do meio ambiente — referentes a impactos negativos provoca- dos pela humanidade, como mudanga climética, diminuigaio da biodiversidade, destruigdo de reservas, poluigdio -, desde a década de 1960; ¢ + de identidades e de crimes transnacionais, durante a década de 2 1990, O trabalho da Escola de Copenhague visa desvendar nao s6 os pro- Cessus constitutives da agenda dos estudos de segura |, COLIY LAL bém as implicagées politicas da agenda atual, A abordagem multis- setorial proposta pelos autores de Copenhague decorre da nogao de que o conceito de seguranga ¢ historicamente contingente ¢ esta, por conseguinte, sujeito a modificagdes com o passar dos anos. Assim, ainda que os setores militar e politicocontinuem a concentrar a maior parte das iniciativas de securitizagio observadas, a expansio da agenda de pesquisa tem o propésito de fornecer ferramentas te6ricas para se lidar com as modificagdes no conceito de seguranga. 487 Marine Guedes Duque O conceito de securitizagiio, as unidades de andlise e a abordagem multissetorial da seguranga internacional constituem, dessa forma, 0s pontos mais inovadores do trabalho da Escola de Copenhague. Na proxima se¢ao, serao apresentadas as reag6es a obra do grupo de Co- penhague no campo académico de seguranga internacional. 3.2 Criticas ao trabalho da Escola de Copenhague” Como a Escola de Copenhague se encontra na posicio intermediria do debate sobre os estudos de seguranga, ela € alvo de crit por parte dos tradicionalistas, por nao ser considerada realista 0 sufi- ciente, como por parte dos te6ricos eriticos, que ndo a consideram construtivista o suficiente: icas tanto Enquanto os tradicionalistas rejeitam a expan- fio [da agenda de scguranga] por considera- rem-nauma atitude meramente politica, que li- mita a utilidade analitica do conceito, os cons- trutivistas e os te6ricos criticos concebem qualquer definigdo conceitual da seguranga nao como uma realidade objetiva, mas como um construto politico de responsabilidade dos atores (ERIKSSON, 1999a, p. 312). Nesta secio, serao tratadas trés criticas principais, e as resposta sa elas fornecidas pelo grupo de Copenhague. A primeira critica pro- da vertente Wadi oualista dos estudos de seguranga, © Consiste no argumento de que a abordagem desenvolvida pela corrente abran- gente acarretaria uma perda da coeréncia intelectual do conceito de seguranga. A vertente critica dos estudos de seguranga, por sua vez, realiza duas outras criticas ao trabalho da Escola de Copenhague: pri- meiramente, a de que a abordagem multissetorial propasta concede- ria papel politico aos analistas de seguranga; e, em segundo lugar, a critica de que o conceito de securitizagao seria insustentavel sociolo- gicamente. 488 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenh nos Estudos de Seguranca Internacional 3.2.1 Critica da vertente tradicionalista De acordo com os tradicionalistas, a seguranga internacional lida com as questées fundamentais da guerra e da paz, relacionadas ao uso da violéncia organizada e a atividade militar; a diplomaciae aco- operacdo, e nao a torga militar, séo apropriadas para lidar com pro- blemas econdmicos e ambientais (FREEDMAN. 1998, p. 48, 53). Além disso, nos estudos de seguranga internacional, devem ser ob- servados: (i) a primazia da forga militar e dos conflitos de larga escala em relagdo a quaisquer outras ameacas; (ii) 0 cardter objetivo das ameagas & seguranga; ¢ (iii) a importancia do Estado na organizagio da violéncia (KNUDSEN, 2001, p. 356).”* Na visio dos tradiciona- listas, considerar como uma questao de seguranga qualquer proble- ma que gere ansiedade ou ameace de alguma forma a qualidade de vida de uma populagao traz ao campo dos estudos de seguranga grande risco, no s6 de perda de foco, como também de perda da coeréncia intelectual do conceito de seguranga. Segundo Buzan (1997, p. 11), a critica dos tradicionalistas deriva da visio da seguranga como um bem universal. Para Buzan, deve-se vi- sar, no entanto, a dessecuritizagdo dos temas, ou seja, a retirada das questdes do modo emergencial e seuretorno A esfera da politica nor- mal, na qual seu tratamento segue regras e praticas institucionaliza- das, além de estar sujeito ao escrutinio ptiblico. O objetivo da Escola de Copenhague de limitar 0 escopo éa securitizagao, assim, pode ser visto como um argumento a favor de uma agenda estreita para os estudos de seguranca, como a defendida pelos tradicionalistas (BUZAN, 1997, p. 22). Para Buzan, os estudas de seguranga tradicionais sfio.um resultado da abordagem de dessecuritizagao caracteristica do projeto liberal, 0 qual desvincula do uso da forga os setores nao militares, para depois marginalizar o setor militar — com vistas a se criarem regras prdprias 489 Marine Guedes Duque para o setor econ6mico, relacionadas ao livre-comércio. A dessecuri- tizago dos setores nao militares, entretanto, suscitou uma légica de supersecuritizacao (over-securitization) dos assuntos militares du- rante a Guerra Fria, além de vir facilitando a penetragao econémica dos Estados fortes nos fracos. Logo, segundo 0 autor, a propria or- dem liberal traz.a demanda por uma agenda de seguranga abrangente, que diminua a securitizagao do setor militar e contribua para que se evitem conflitos armados entre os Estados (BUZAN, 1997, p. 25). De acordo com Buzan, portanto, a tnica incompatibilidade entre os tradicionalistas e a Escola de Copenhague é metodolégica, pois aqueles adotam uma perspectiva objetivista das ameacas, enquanto esta pressupée a intersubjetividade das ameagas a seguranca. Com essa ressalva, os estudos de seguranga tradicionais podem ser vistos como uma parte do quadro teérico e conceitual do grupo de Cope- nhague, notadamente os setores politico e militar (BUZAN, 1997, p. 20). Se a abordagem multissetorial permite conceber uma prolifera- ¢ao da securitizagao para setores que nao os tradicionais, o construti- vismo, por outro lado, fornece meios para questionar e politizar cada caso de securitizagao — o que termina por limitar 0 escopo da securitizacao. 3.2.2 Criticas da vertente critica De acurdo com a vertente critica dos estuds de seguranga, Como as ameagas € os objetos de seguranga so socialmente construfdos, nao € possivel determiné-los sem realizar uma interferéncia na constru- do social. A determinagao de ameagas e objetos de seguranga, além disso, consistiria em uma rentincia, por parte dos analistas, ao dever de emancipar as individuas por meio da revelagao da possibilidade de se realizarem construgdes sociais diferentes das existentes. A po- sigdo emancipat6ria da vertente critica é a origem das duas principais criticas feitas ao trabalho da Escola de Copenhague.”* 490 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenh nos Estudos de Seguranca Internacional Primeiramente, a proposta da Escola de Copenhague de dividir a agenda de seguranga em setores temiticos, segundo Eriksson (1999a, p. 316), equivale a objetivacao (ou naturalizagao) dos setores escolhidos ¢, por conseguinte, a uma interferéncia na construgao so- cial da seguranga. A proposigao de uma abordagem multissetorial, por meio do estabelecimento de setores analiticos definidos de acor- do com 0s objetos referentes, de acordo com Eriksson, corresponde- ria a uma troca do papel de analista pelo de ator politic Se [a abordagem multissetorial] é vista pela perspectiva da securitizacio, a agdo dos auto- res pode ser mais bem concebida como politi- ca, ¢ nao analitica, em virtude da objetivagio da seguranga e da expansio de conotagées ne- gativas como ameacas e inimigos para novas reas tematicas. Além disso, ao objetivarem se- tores, eles mesmos caem no papel de securiti- adores (ERIKSSON, 1999a, p. 316). Segundo Waever (1999, p. 334), no entanto, é paradoxal que se criti- quem as implicag6es politicas e éticas da abordagem da Escola de Copenhague, jé que uma de suas vantagens é justamente permitir 0 questionamento de tais pontos no dmbito dos estudos de seguranga. Além disso, os autores de Copenhague nao sao favoraveis a securiti- zagiio; no que tange ao componente normativo da teoria de securiti zagao, a Escola defende a dessecuritizagao dos setores, ¢ seu retorno Aesfera da politica normal.”> Waever também argumenta que os seto- res apresentados nao sio uma iniciativa dos autores e, por conseguin- te, nao consistem em uma naturalizagao ou objetivaciio de constru- ges sociais: eles se baseiam, antes, nos discursos de seguranga existentes, ou seja, em uma realidade externa aos observadores. A segunda eritica dirigida A Escola de Copenhague por parte da ver- tente critica considera que, como um todo, a abordagem abrangente nao é sustentavel do ponto de vista sociolégico. Essa critica parte de dois pressupostos: 491 Marine Guedes Duque + alguns pontos da abordagem abrangente so objetivistas — em especial, o conceito de identidade; e « a.adogao de pontos objetivistas, sem as problematizagdes que seriam necessarias, tem consequéncias importantes sobre a concepgao mais ampla das relagdes sociais adotada pela Esco- la de Copenhague.”° De acordo coma vertente critica dos estudos de seguranga, 0 constru- tivismo do grupo de Copenhague nao se encontra distribufdo unifor- memente. Segundo Huysmans (1998b, p. 493), embora a concepgaio de seguranga e de ameagas formulada pela corrente abrangente seja radicalmente construtivista, a concepgdo das relagées sociais € obje- tivista, mesmo durkheimiana, ao manter fixos: (a) alguns tipos de identidades, como as de sociedades e Estados; e (b) alguns tipos de estruturas, como a anarquia e a sociedade internacional. Em resposta a essa critica, Buzan e Waever (1997, p. 243-248) afir- mam que considerar diferentes tipos de coletividades — tais como so- ciedades, Estados e sociedade internacional — como unidade basica de anilise faz-se necessério, para evitar que 0 conceito de seguranga se torne demasiado particular, como ocorre ao se utilizar 0 conceito de seguranga humana. Além disso, os autores rechagam a abordagem que denominam “(des)construtivista”. correspondente ao construti- vismo p6és-moderno ou critico, e se identificam com 0 construtivismo, “interpretivista” ou “convencional”. A Escola de Copenhague, as- sim, parte do princfpiv de que existe una realidade externa aos obser- vadores, ainda que socialmente construfda; isso Ihe permite manter alguns pontos fixos (ou objetivistas) de andlise, ao mesmo tempo em que questiona a utilidade de outros pressupostos racionalistas. Conclusées A significativa contribuigdo da Escola de Copenhague para os estu- dos de seguranga é mais bem apreendida por meio da contextualiza- 492 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional cdo de seu trabalho em relagdo ao hisi6rico dos estudos de seguranga, assim como em relagdo aos debates realizados no campo de teoria das Relagdes Internacionais. Uma das principais contribuigdes dos autores de Copenhague para os estudos de seguranga diz respeito ao papel de sintese de seu trabalho em relagao aos debates mais amplos realizados no campo de teoria das Relagdes Internacionais ¢ a0 debate sobre seguranga internacional no pés-Guerra Fria. O trabalho do grupo de Copenhague estabelece parimetros para um didlogo académico na area de seguranga internacional mais pragma- tico do que aquele realizado em outras areas tematicas das Relagdes Internacionais, ao mesmo tempo em que enriquece ¢ amadurece as perspectivas atuais de seguranga. A vertente abrangente ultrapassa os debates de caréter mais metafisico ja realizados, sem ignoré-los, muito pelo contrario; ela assimila importantes pontos discutidos, for- mando as bases para a discussio e a aplicacao de pressupostos mais. avangados. O trabalho da Escola de Copenhague pode ser considera- do, por conseguinte, o que Fearon e Wendt (2002, p. 52) descrevem como “trabalho que ignora interpretagdes da relagdo [entre as abor- dagens racionalista e construtivista] como uma soma-zero e, em lugar disso, emprega diretamente quest6es que transitam na fronteira entre oracionalismo eo construtivismo como costumam ser concebi- dos”. A vertente abrangente fornece uma nova agenda de pesquisa ao cam- po dos estudos de seguranga, ao apresentar um quadro conceitual © te6rico que serve de base nao s6 para discuss6es abstratas, como tam- bém para aplicagao em estudos de caso e estudos comparados. E pre- ciso, desse modo, explorar ¢ aprofundar a nova agenda de pesquisa no campo de seguranga internacional aberta pelo trabalho da Escola de Copenhague. E importante ingressar, em especial, no Ambito pra- ticamente inexplorado das consequéncias da securitizagéio — caracte- rizada pela restrigdo do tema securitizado a esfera da confidenciali- dade e pela desconsideragao dos mecanismos institucionais normais 493 Marine Guedes Duque — sobre a dinamica do processo decisGrio nas politicas externa e de defesa. Notas 4. Esta e as demais citacdes de originais em lingua estrangeira foram livre- mente traduzidas para este artigo. 2. A contribuigao do trabalho da Fscola de Copenhague para os estudos de se- guranca também foi analisada por Tanno (2003). 3. Para alguns hist6ricos dos estudos de seguranga, ver Nye ¢ Lynn-Jones (1988), Walt (1991), Kolodziej (1992), Buzan (1997), Freedman (1998) ¢ Miller (2001). 4. Waever (1998) apresenta uma interessante andlise sobre o predominio esta- dunidense no campo de Relagdes Internacionais como um todo. 5. Parail cificamente, no campo das Relagdes Internacion: (1991), King et al. (1994) e Nicholson (1996). =, ver Johnson e Joslyn 6. Kolodziej (1992) apresenta umacritica ao argumento de Walt, considerado excessivamente centrado na seguranca nacional norte-americana e na episte- mologia neorrealista. 7. Alémdisso, Kennedy (1994) chemava atengao para a relagao proxima entre fatores econdmicos e dominagio geopoliti B. Para outras visdes sobre 0 conceito de seguranca durante as décadas de 1980 e 1990, ver Buzan (1984) e Baldwin (1997). 9. As discordancias entre racionalistas e construtivistas envolvem questdes epistemoldgicas de complexidade e abrangéncia considerdveis. Para fins deste trabalho, no entanto, apresentar-se~d apenas um panorama das principais dife- rengas entre as duas epistemologias, com o objetivo especifico de situar os estu- dos de seguranea internacional em relacdo as discussdes epistemolégicas do campo mais amplo de Relagdes Internacionais. Para discussdes mais aprofun- dadas das contribuigdes do construtivismo para o campo de Relacdes Interna: onais, ver Dessler (1989), Checkel (1998), Hopf (1998), Wendt (1999), Copeland (2000) e Adler (1997, 2002). 494 CONTEXTO INTERNACIONAL ~ vol. 31, n®3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenh nos Estudos de Seguranca Internacional 10. Vale ressaltar, no entanto, que essa posi¢do de Wendt ndo é compartilhada por grande parte dos teéricos construtivistas. A. Wendt (1999, p. 246-312) identifica trés “culturas da anarquia”, que cor- respondem a trés padres distintos de relagdes interestatais: inimizade, rivalida- dee amizade. Apenas 0 padrao de inimizade se encaixa na concepgio raciona- lista de relagdes entre Estados. ‘WZ. Para exemplos de trabalhos da vertente critica dos estudos de seguranca, ver Hansen (1997), Huysmans (1998a), Krause (1998) e Williams (2003). 3. Entre as obras iniciais da Escola de Copenhague, destacam-se: Copenha- gen papers 1. European security - problems of research on non-military aspects (JHAN et al., 1987), European polyphony: perspectives beyond East-West confrontation (WAEVER et al., 1989), The European securi order recast, scenarios for the post-Cold War era (BUZAN et al., 1990) e Identity, migration and the new security agenda in Europe (BUZAN et al., 1993). 94, Buzan (1991) adota uma perspectiva estado-céntrica € mais objetivista que a atual, av considera, por exe cardter objetivo. Ju, que ay amnicayas & seguraga pussuctt 45. A tcoria dos complexos de seguranga regionais desenvolvida pela Escola de Copenhague, assim como a abordagem regional de seguranga de modo geral, também constituem ponto importante da obrado grupo, Em virtude da delimita- cdo do objeto deste trabalho, no entanto, ndo se analisard esse aspecto da producao dos autores. 1G. Austin (1975 [1962]) apud Buzan et al. (1998, p. 26). 97. De acordo com Buzan et al. (1998, p. 27-28), a securitizagao pode ser ad hoc owinstitucionalizada. No segundo caso, que ocorre quando um tipo de ame- aga é considerado recorrente —o que é comum no setor militar, existem organi- es e procedimentos permanentes para lidar com a ameaga. Apesar disso, 0 tratamento do tema securitizado também ocorre fora do Ambito da politica normal, e € caracterizado pela confidencialidade. 1B__ Austin (1975 [1962}) apud Buzan etal. (1998, p. 32). Segundo Austin, ha duas categorias de condigdes facilitadoras: (1) condigdes internas, lingu co-gramaticais, relativas aos procedimentos convencionais aceitos para o ato de fala; ¢ (2) condigdes externas, contextuais ¢ sociais: “Em dadas situagdes, pes- soas © circunsténcias especificas devem ser adequadas para que se possa demandar determinados procedimentos”. 495 Marine Guedes Duque 19. A adocdo do termo seguranga “societal” por parte dos autores possui o ob- jetivo de distinguir esse setor do queseria a seguranga social, ligada ao bem-e: tar social (BUZAN et al., 1998, p. 120). 20. Como haviam indicado Keohane e Nye (1989, p. 8-17). 21. Buzan (1997, p. 6-9). 22. Para uma perspectiva mais aprofundada do debate suscitada pelo trabalho da Escola de Copenhague, ver Buzan e Waever (1997), McSweeney (1998), Eriksson (1999a, 1999b), Waever (1999), Goldmann (1999), Knudsen (2001) e Pettiford (2001). 23. Para algumas criticas com baserealista ao trabalho da Escola de Copenha- gen, ver Knudsen (2001) e Walt (1991). 24, Para um simpésio sobre o tema do papel politico dos analistas de seguran- a, ver Eriksson (1999a, 1999b), Goldmann (1999), Waever (1999) e Williams (1999). 25. Apesar disso, Waever reconhece uma possivel politizagao, que ainda nao fui Ucvidamente cstudadda, da atividade analitiva ralizada na abordags gente. alnan- 26. Ver Huysmans (1998b) e McSweeney (1998). Referéncias Bibliograficas ADLER, Emanuel. Seizing the middle ground: constructivism in world poli- tics. European Journal of International Relations, v. 3, n. 3, p. 319-363, 1997, . Constructivism and International Relations. In: CARLNAES, W. RISSE. T.: SIMMONS. B. A. Handbook of International Relations. Londot SAGE Publications, 2002. BALDWIN, David A. The concept of security. 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Posteriormente, procede-se a uma breve revisdo dos debates realizados tanto entre raciona- 500 CONTEXTO INTERNACIONAL - vol. 31, n® 3, setembro/dezembro 2009 © Papel de Sintese da Escola de Copenhague nos Estudos de Seguranca Internacional listas e construtivistas como entre as variagdes do construtivismo, com vis- tas a situar 0 trabalho do grupo de Copenhague nas discussoes da drea. Apresenta-se, por fim, um panorama da produgao da Escola de Copenha- gue, sustentado em dois eixos principais: (a) as contribuigdes que mais se destacaram; ¢ (b) os debates suscitados, com as criticas recebidas e as res- postas fornecidas pelos autores. Conclui-se que uma das principais contri- buigdes dos autores de Copenhague para os estudos de seguranga internaci- respeito ao papel de sintese de seu trabalho em relagao aos debates mais amplos rcalizados no campo dc tcoria das Rclagdcs Internacionais cao debate sobre seguranga internacional no pés-Guerra Fria. Palavras-chave: Teoria das Rela s Internacionais — Racionalismo e Construtivismo ~ Estudos de Seguranga Internacional Abstract The Synthesis Made by the Copenhagen School in International Security Studies The objective of this article is to analyze the contribution made by the Copenhagen School to international security studies, by examining its relation with international relations theories and theories in the field of international security. Firstly, I review briefly mainstream academic literature in security studies since its genesis, with a view to understanding the impact of constructivism on the field since the 1990s. Secondly, I proceed to a brief revision of the debatesinvolving not only rationalists and constructivists but also different variants of constructivism, with the purpose of situating the work of the Copenhagen authors in the epistemological debates in the field of international relations. Lastly, I present a panorama of the work undertaken by the Copenhagen School, based on two main axes: (a) its main innovations; and (b) the debates evoked by its work, i.e. the critics received and the answers given by the authors. I conclude that one of the main contributions of the Copenhagen authors to international security studies corresponds to the role of synthesis of its work regarding not only wider debates undertaken in the field of international relations theory but also the post-Cold War debate about international security. Keywords: International Relations Theory — Rationalism and Constructivism — International Security Studies 501

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