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2011

ESEC - Seridó
UFRN
Curso de Campo PPG Ecologia

Programa de Pós-Graduação em Ecologia


Universidade Federal do Rio Grande do Norte
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AGRADECIMENTOS

Ao professor André Megali, Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ecologia


(PPGE) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, por todo apoio dispensado para a
realização desta segunda versão da disciplina Ecologia de Campo; Ao Sr George S. Batista,
Gestor da Estação Ecológica do Seridó-RN, por todo apoio e hospitalidade na Unidade; Ao
Prof Adalberto Varela e ao Sr Carlos Varela Freire, pelo auxílio nas várias etapas da
realização deste Curso; Ao SISBIO pela rapidez na liberação da autorização (número:
23310-1) para a realização da disciplina; À Sra Ana Rúbia da Silva pelas deliciosas refeições
e compreensão.
2

PESQUISADORES

Alexandre Vasconcellos Gindomar G. Santana Márcio Zikán Cardoso Mauro Pichorim

DOUTORANDOS

Adriana Pellegrini Manhães David Lucas Rohr Eliana Faria de Oliveira

Guilherme Gerhardt Ricardo Almeida Emidio Silvana Masciadri Bálsamo


Mazzochini
3

MESTRANDOS

Ana Clezia Simplicio de Morais Bruno Gazola de Faria Emerson de Medeiros Sousa

Gustavo Brant de C. Paterno Honara Morgana da Silva Laura Martina Fernandez

Leide Amara Pereira da Silva Leonardo Emmanuel F Carvalho Lucas Viegas Francisco

Nicholas S Aires de Araujo Pedro de Farias C. Macedo Phoeve Macario

Tanagara Irina de S. N. Falcao Tonny Marques de O. Júnior


4

A CAATINGA DA ESEC SERIDÓ


O bioma da Caatinga é considerado o principal característica desta região é a
único bioma exclusivo do Brasil, cobrindo irregularidade pluviométrica, com pluviosidade
734.478 km2 na região Nordeste e ocorrendo altamente concentrada e podendo chegar a 10
em manchas no norte de Minas Gerais meses secos ao ano. É uma área com longa
(Scardua, 2004). O bioma Caatinga é história de perturbação, usada há longo tempo
caracterizado por um clima quente e semi- por pecuária, assim como mineração (Velloso,
árido, fortemente sazonal, com menos de 2002).
1000mm de chuva anuais, concentrados
A região do Seridó é considerada um
fortemente em um período de três a seis
meses. Os totais de chuva variam muito de ano dos centros críticos de desertificação no país.
para ano e, em intervalos de dez a vinte anos, A região do Seridó tem longo histórico de
caem a menos de metade da média (podendo degradação, com relatos de queimadas feitas
levar até cinco anos), fenômeno conhecido por fazendeiros para defender suas terras e
como “seca” (Velloso et al., 2002). abrir caminho na caatinga fechada na década
de 1920 (Scardua, 2004). Atualmente existe
Os ambientes da caatinga são uma grande pressão de olarias na região que
extremamente diversos, proporcionados por demandam uma grande quantidade de lenha.
um mosaico de tipos de vegetação, em geral
caducifólia, xerófila e espinhosa, dependendo A Estação Ecológica do Seridó possui
1,163 ha e encontra-se no município de Serra
do mosaico de solos e disponibilidade hídrica
(Velloso et al., 2002). Os diversos tipos de Negra do Norte, vizinho à Caicó, a terceira
Caatinga estendem-se também por regiões cidade em tamanho e número de habitantes
mais altas e de relevo variado, incluindo do estado do Rio Grande do norte. A ESEC-
caatinga arbustivo arbórea, mata seca, mata Seridó foi criada em 1982 em uma área antes
úmida, carrasco e formações abertas com pertencente à fazenda Solidão. Em sua área
eram desenvolvidas atividades de pecuária e
dominância de cactáceas e bromeliáceas.
cultivo de algodão. Dentre as perturbações
A Estação Ecológica do Seridó anteriores à instalação da reserva encontram-
encontra-se localizada na ecorregião se a construção de um açude, extração de
caracterizada como Depressão Sertaneja madeira e introdução de espécies exóticas
Setrentional (Velloso et al., 2002), região essa como algaroba e leucena (Simon, 2004).
que engloba a maior parte dos estados da
Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará e Referências
prolonga-se até uma faixa no estado do Piauí. Scardua, F.P. (coord) 2004. Plano de manejo da
Dentre as áreas do bioma Caatinga, esta ESEC Seridó. MMA.
ecorregião é uma das mais impactadas pela
Simon, M.F. 2004. Avaliação ecológica rápida para o
ação antrópica, mas entretanto possui poucas plano de manejo da Estação Ecológica do
áreas protegidas em termos de número e área Seridó, RN. MMA.
total.
Velloso, A.L., Sampaio, E.V.S.B., Pareyn, F.G.C. 2002.
Ecorregiões – Proposta para o bioma
A região do Seridó apresenta relevo
caatinga. Resultado do Seminário de
suave, com solos pedregosos e mais raros que Planejamento Ecorregional da Caatinga,
o restante da região. A altitude varia de 100 a Aldeia-PE. MMA. Nature Conservancy do
400m, com elevações de 400 a 700m. A Brasil e PNE.
Conteúdo
Conteúdo Página

Parte I Projetos com orientação

Projetos com orientação I 4

O EFEITO DO PARASITISMO POR Phoradendon sp. (Santalalaceae) NO MOFUMBU 5


(Combretum leprosum, Combretaceae)

TRADE-OFF EM INVESTIMENTO REPRODUTIVO E COMPETIÇÃO INTRA-ESPECÍFICA 11


EM UMA HERBÁCEA DO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE RECURSOS OU IDENTIDADE DE ESPÉCIES: O QUE É 16


MAIS IMPORTANTE PARA A HERBIVORIA DE DUAS ESPÉCIES DA CAATINGA?

AVES COMO ILHAS: QUANTO MAIORES MAIS RIQUEZA E ABUNDÂNCIA DE 23


ECTOPARASITAS?

COMPORTAMENTO DE FUGA EM Lepitodactylus macrosternum E Rhinella jimi 30


(AMPHIBIA, ANURA) SOB CONDIÇÕES EXPERIMENTAIS

Projetos com orientação II 35

CANHOTO OU DESTRO? ANÁLISE DA LATERALIZAÇÃO MOTORA EM Rhinella jimi 36


(Amphibia, Anura: Bufonidae)

EFEITO DE Poinceianella pyramidalis NO RECRUTAMENTO DE ESPÉCIES LENHOSAS E 40


HERBÁCEAS

ORIENTAÇÃO DE BORBOLETAS MIGRATÓRIAS NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO 45

ESTRATÉGIAS DE VIDA EM DIFERENTES HABITATS E GUILDAS TRÓFICAS DA 50


COMUNIDADE DE AVES NA CAATINGA, SERRA NEGRA DO NORTE, RN

ARTRÓPODES SOB ROCHAS AO LONGO DE UM RIO TEMPORÁRIO NO SEMI-ÁRIDO 58


NORDESTINO: CO-OCORRÊNCIA EXPLICA A ESTRUTURAÇÃO DESSAS
COMUNIDADES?

Projetos com orientação III 63

DIVERSIDADE DA EPIFAUNA DE ARTRÓPODES DO SOLO SOB DUAS ESPÉCIES DE 64


ÁRVORES DA CAATINGA

AVALIAÇÃO DO GRAU DE ASSIMETRIA EM TRÊS ESPÉCIES DE AVES DA FAMÍLIA 68


COLUMBIDAE NA ESEC-SERIDÓ, NORDESTE DO BRASIL

INFLUÊNCIA DO HEMIPARASITO Phorodendrum sp. (ERVA DE PASSARINHO) NA 73


DISPERSÃO DE SEMENTES DE Combretum leprosum (MUFUMBO)
2
Curso de Campo PPG Ecologia, UFRN, 2011. Caatinga, ESEC Seridó

EFEITO DA FLORIVORIA SOBRE A TAXA DE VISITAÇÃO DOS POLINIZADORES EM 78


Ipomoea nil (Convolvulaceae)

Nasutitermes corniger (Isoptera, Termitidae) CONSTROI NINHOS POLICÁLICOS NO 83


SEMI-ÁRIDO NORDESTINO?

Parte II - Projetos livres

Projetos sem orientação I 87

A RIQUEZA DE FORMIGAS É MENOR NA COPA DE ÁRVORES DA CAATINGA QUE NO 88


SOLO?

RIQUEZA E ABUNDÂNCIA DE ARANHAS RELACIONADAS À COMPLEXIDADE 92


ESTRUTURAL DE Croton sonderianus Muell. Arg.

EFEITO DA FLORIVORIA SOBRE AS TAXAS DE VISITAÇÃO DE TRÊS ESPÉCIES DE 97


HYMENOPTERA EM Ipomoea nil (CONVOLVULACEA)

RELAÇÃO ENTRE A ESTRUTURA E RIQUEZA DA VEGETAÇÃO LENHOSA E RIQUEZA DE 103


AVES NA SERRA VERDE DA ESTAÇÃO ECOLÓGICA DO SERIDÓ, RN

EFEITO DE TRILHA SOBRE A COMUNIDADE DE FORMIGAS EM UM FRAGMENTO DE 108


CAATINGA NO SERIDÓ

Projetos sem orientação II 113

RIQUEZA E ABUNDÂNCIA DE HERBÁCEAS SOB O DOSSEL DE LENHOSA EXÓTICA 114


(Prosopis juliflora) E LENHOSA NATIVA (Mimosa hostilis) NA CAATINGA, ESEC-
SERIDÓ

EVIDÊNCIA DE DIRECIONALIDADE DO VÔO EM BORBOLETAS LIBERADAS EM MATRIZ 120


AQUÁTICA NA ESEC-SERIDÓ

NA BORDA OU NA MATA DA CAATINGA, ONDE HÁ MAIS HERVIBORIA? 125


ESTUDO DE CASO PARA Croton sonderianus Müll. Arg. (EUPHORBIACEAE)

RIQUEZA DE ARANHAS AO LONGO DE UM GRADIENTE ALTITUDINAL NA SERRA 130


VERDE, ESEC-SERIDÓ, RN

HERBIVORIA DE ESPÉCIES LENHOSAS E ÁREA ESPECÍFICA FOLIAR (SLA): UM TESTE 136


PILOTO EM CAATINGA DO RIO GRANDE DO NORTE

PADRÃO DE PREDAÇÃO DE OVOS DEPENDENTE DA DENSIDADE DE ÁRVORES 143


LENHOSAS: ASPECTOS DE ESTRATÉGIAS ANTI-PREDATÓRIAS DE AVES NIDIFICANTES
EM SOLO
REDE DE INTERAÇÕES ENTRE PLANTAS NA CAATINGA DA ESTAÇÃO ECOLÓGICA DO 147
SERIDÓ

INFLUÊNCIA DE UM GRADIENTE DE UMIDADE NA CO-OCORRÊNCIA DE ARANHAS E 155


FORMIGAS EM ÁREA DE CAATINGA DO RN
3
Curso de Campo PPG Ecologia, UFRN, 2011. Caatinga, ESEC Seridó
4
Curso de Campo PPG Ecologia, UFRN, 2011. Caatinga, ESEC Seridó

Projetos com orientação I


5
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

O EFEITO DO PARASITISMO POR Phoradendon sp. (Santalalaceae) NO MOFUMBU


(Combretum leprosum, Combretaceae)

EMERSON DE MEDEIROS SOUSA, LEIDE AMARA SILVA, RICARDO ALMEIDA EMIDIO, TONNY MARQUES
DE OLIVEIRA JUNIOR, GUILHERME GERHARDT MAZZOCHINI

Introdução (Silva & del Rio 1996). Na maioria dos


casos, a redução na performance de
Plantas parasitas dependem de
seus hospedeiros é significativa e, em
seus hospedeiros para adquirir
casos de alta infestação, podem levar à
carbono, nutrientes ou água para sua
morte (Press & Phoenix 2005). Por
sobrevivência. Essas plantas fazem isso
causa disso, plantas parasitas têm
utilizando estruturas especializadas que
efeitos consideráveis na estrutura das
penetram o xilema de sua hospedeira
comunidades, modificando o balanço
e/ou formam conexões com o floema
das interações entre as plantas e
(Press & Phoenix 2005). A
também na dinâmica do ecossistema
produtividade primária da comunidade
(Callaway & Pennings 1998).
vegetal pode ser negativamente
afetada por parasitas. Isso ocorre Plantas parasitas são
devido a baixa eficiência na utilização classificadas como hemiparasitas,
dos recursos por esses indivíduos, uma quando possuem órgãos
vez que seu acúmulo de biomassa é fotossintetizantes, ou holoparasitas
bem menor se comparado a produção quando todo o recurso necessário para
realizada pelo hospedeiro (com a seu crescimento é obtido de seu
mesma quantidade de recurso) se este hospedeiro. Phoradendron (família
não fosse parasitado, o aumento da Santalaceae) é um gênero de plantas
biomassa do seu hospedeiro é maior hemiparasitas encontrado desde a
que o ganho de biomassa do parasita América do Norte até a América do Sul.
(Hollinger 1983). Dessa forma, as Na Caatinga, plantas desse gênero
plantas parasitas podem exercer um ocorrem em diversas espécies de
forte efeito negativo em seus hospedeiros, mas, com maior
hospedeiros, reduzindo sua frequência em indivíduos da espécie
produtividade ou sucesso reprodutivo Combretum leprosum (Família
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Combretaceae), uma árvore muito espécies arbustivas e arbóreas de


representativa da flora da Caatinga na pequeno porte. (Bencke et al. 2006).
região do Seridó (Amorim et al. 2005).
Para a coleta de dados foi
Por isso, é importante identificar o
realizada uma busca por doze
efeito negativo que indivíduos de
indivíduos da espécie Mofumbo
Phoradendron têm nos indivíduos de
(Combretum leprosum), sendo seis
Combretum leprosum para prever o seu
parasitadas pela erva-de-passarinho
possível efeito na estrutura da
(Phoradrendon sp.) e seis não
comunidade e na dinâmica do
apresentando o hemiparasita. O
ecossistema.
universo amostral foi delimitado pela
O objetivo deste estudo foi distribuição do mofumbo na região da
caracterizar o efeito do Phoradendron ESEC. Como unidades amostrais para
sp. no investimento fotossintético e coleta de dados foram utilizadas os
reprodutivo da espécie Combretum galhos de cada indivíduo parasitado e
leprosum. Foi previsto que indivíduos não parasitado. Para os indivíduos
parasitados da hemiparasita terão área parasitados, foram coletados entre
foliar menor, frutos menores e menos quatro e doze ramos de dois galhos,
frutos por inflorescência que indivíduos sendo um contendo o parasita e outro
não parasitados. sem a presença deste. Nos indivíduos
sem o hemiparasita, foram amostrados
Material e Métodos
os ramos terminais de apenas um
O estudo foi realizado na galho.
Estação Ecológica do Seridó-ESEC
Foi medido o comprimento e
(6º35’S e 37º15’W) que possui 1.128ha,
largura de 10 folhas aleatorizadas de
situado, no estado do Rio Grande do
cada galho. Para calcular a área foliar
Norte, no munícipio de Serra Negra do
de cada amostra foi utilizada a fórmula
Norte pertencente à mesorregião
da elipse. Foi contado o número de
Seridó. A área de caatinga,
frutos presentes nas inflorescência de
apresentando vegetação secundária,
cada ramo. Em seguida foi mensurada a
caracterizada por predominância de
massa (em gramas) de 30 a 118 frutos
por galho (dependendo da
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

disponibilidade) para obter a massa


média dos frutos por galho.

Foram realizadas análises


utilizando modelos lineares de efeitos
mistos, sendo as variáveis dependentes
a área foliar média por galho, o número
de frutos por inflorescência/galho e a Figura 1: Áreas foliares médias dos
massa média dos frutos por galho. A galhos de indivíduos não parasitados de
variável independente possuía três mofumbu (Controle = C), galhos não
níveis: C) Galho de indivíduo não parasitados de indivíduos parasitados
parasitado (controle), CP) galho não (CP) e os galhos parasitados (P) desses
parasitado de indivíduo parasitado indivíduos. As barras representam os
(controle parasitado) e P) galho intervalos de confiança de 95%.
parasitado de indivíduo parasitado. Os
A massa média dos frutos foi
indivíduos foram incluídos como efeito
mais alta em C, intermediário em CP e
randômico nos modelos para levar em
menor em P (χ² = 6,7; g.l. = 2; p = 0.035;
conta a dependência dos níveis CP e P.
Figura 2).
A significância do parasitismo foi
testado com um teste de razão de
verossimilhança.

Resultados

De acordo com o esperado, a


área foliar média por galho foi menor
nos galhos dos indivíduos parasitados,
não havendo diferença entre os níveis
CP e P (χ² = 14.05; g.l. = 2; p < 0.001;
Figura 1). Figura 2: Massas médias dos frutos nos
galhos dos indivíduos não parasitados
(C), os galhos não parasitados de
indivíduos parasitados (CP) e os galhos
8
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

parasitados (P) desses indivíduos. As Discussão


barras representam os intervalos de
A infecção pelo hemiparasita
confiança de 95%.
levou a uma redução tanto da área das
folhas quanto do peso dos frutos. Esses
resultados sugerem que o nível de
parasitismo pode influenciar
negativamente o crescimento e
reprodução, diminuindo
expressivamente o desempenho das
hospedeiras (Press et al. 1988 e Howell
et al. 2004).

A diminuição da área foliar com


a infecção por Phoradendron pode
Figura 3: Número médio de
implicar na redução da taxa
frutos/inflorescência dos galhos dos
fotossintética das plantas parasitadas.
indivíduos não parasitados (C), os
Isso pode estar relacionado com a
galhos não parasitados de indivíduos
massa reduzida dos frutos nos galhos
parasitados (CP) e os parasitados (P)
parasitados. Dessa forma, pode haver
desses indivíduos. As barras
uma diminuição da capacidade
representam os intervalos de confiança
reprodutiva das plantas hospedeiras, já
de 95%.
que a massa reduzida dos frutos pode
Os galhos não parasitados de influenciar negativamente no
indivíduos infectados com o estabelecimento de seus propágulos
hemiparasita produziam um número por diminuir o tamanho da semente e
maior de frutos que os outros níveis, suas chances de sobrevivência (Kidson
não havendo diferença entre os níveis C & Westoby, 2000). De fato, foi
e P (χ² = 12.7; g.l. = 2; p = 0.002; Figura observado que, em alguns indivíduos,
3). os galhos parasitados não
apresentavam frutos. No entanto, foi
encontrado que plantas parasitadas
investem em uma maior quantidade de
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frutos nos galhos não parasitados. Isto Agradecimentos


é uma evidência de que ocorre
Aos Professores orientadores pelo
realocação dos recursos para produção
comprometimento em ajudar-nos com
de frutos em galhos não parasitados na
este trabalho a qualquer hora da noite
tentativa de compensar o deficit
e a todos o que fazem parte da ESEC –
imposto ao galho parasitado. Porém,
Seridó.
no presente trabalho foi mensurado a
produção de frutos em apenas dois Referências
galhos de indivíduos parasitados.
Amorim, I. L. De; Sampaio, E. V. S. B. &
Trabalhos futuros devem avaliar se a
Araújo, E. De Lima. 2005. Flora e
quantidade total de frutos produzidos é
estrutura da vegetação arbustivo-
realmente compensada por essa
arbória de uma área de Caatinga do
estratégia de realocação dos recursos.
seridó, RN, Brasil. Acta botanica
Esses efeitos negativos da brasilica, N 19: 615-623.
Phoradendron sobre seus hospedeiros
Bencke, G. A., G. N. Maurício, P. F.
podem ter importantes consequências
Develey & J. M. Goerck (orgs.). 2006.
na estrutura da comunidade vegetal da
Áreas Importantes para a
Caatinga, alterando o balanço das
Conservação das Aves no Brasil.
interações entre as espécies já que
Parte I – Estados do Domínio da
indivíduos parasitados podem ter suas
Mata Atlântica. São Paulo: SAVE
capacidades competitivas diminuídas
Brasil, p. 139.
(Reid et al. 1994). Adicionalmente,
considerando que a eficiência na Callaway RM, Pennings SC. 1998.

produção de biomassa do hemiparasita Impact of a parasitic plant on the

é menor do que seu hospedeiro, essa zonation of two salt marsh

espécie pode resultar na perda da perennials. Oecologia 114: 100–105.

produtividade primária regional na


Hollinger, D.Y. (1982) Photosynthesis
ESEC-Seridó. and water relations of the mistletoe,
Phoradendron villosum, and its host,
the California valley oak, Quercus
lobata. Oecologia. 396-400.
10
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Press, M.C. & Phoenix, G.K. 2005 Press M. C., Graves J. D. Stewart G. R.
Impacts of parasitic plants on 1988. Transpiration and carbon
natural communities. The New acquisition in root hemiparasites.
phytologist, 166, 737-51. Jornal of experimental botany. 39:
1009-1014.
Reid N; Yan Z., Fittler J. 1994. impact of
mistletoes (Amyema miquelii) on Howell B, E. Mathiasen R.L. 2004.
host (Eucalyptus blakelyi and Grouth impacts of Psitacanthus
Eucalyptus melliodora) survival and angustifolius Kuijt on Pinnus oocarpa
growth in temperate Autralia. Forest Schiede in Honduras. Forest ecology
ecology management 70: 55-65. and management 198: 75-88.

Silva, A. & del Rio, C. M. 2008. Effects of Westoby, M. (2000) Seed mass and
the Mistletoe Tristerix aphyllus seedling dimensions in relation to
(Loranthaceae) on the Reproduction seedling establishment. Oecologia,
of Its Cactus Host Echinopsis 11-17.
chilensis. Oikos, 75, 437-442.
11
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

TRADE-OFF EM INVESTIMENTO REPRODUTIVO E COMPETIÇÃO INTRA-ESPECÍFICA EM


UMA HERBÁCEA DO SEMI-ÁRIDO BRASILEIRO

LEONARDO EMMANUEL FERNANDES DE CARVALHO; BRUNO GAZOLA DE FARIA & ELIANA FARIA DE
OLIVEIRA

Introdução uma menor parcela destinada ao


crescimento vegetativo. Em
A competição intra-específica
contrapartida, quando a competição é
tem um profundo efeito no número de
intensa uma maior parcela de recursos
indivíduos de uma população. Algumas
subsidia o crescimento, em detrimento
plantas são afetadas negativamente
do investimento reprodutivo (Belcher
por seus vizinhos devido à sobreposição
et al., 1995).
na utilização de recursos (Tilman,
1987). Em situações em que a Levando em consideração as
competição é menos intensa, medidas abordagens levantadas acima, este
de biomassa, como o peso dos estudo teve como objetivo avaliar o
indivíduos, tende a ser bem investimento reprodutivo relativo de
distribuídos ao redor da média. Porém, Stachytarpheta sanguinea em relação à
quando o efeito competitivo é maior, densidade intra-específica e verificar se
há um desvio dos valores dos pesos dos há um trade-off entre o investimento
indivíduos para a esquerda, reprodutivo e o crescimento
configurando um quadro de muitos vegetativo.
indivíduos pequenos e poucos
indivíduos grandes (Begon, 2006).
Material e Métodos
Em geral, a competição é difícil
de ser definido entre plantas. Isso O estudo foi desenvolvido na
porque não se tem muita certeza sobre Estação Ecológica do Seridó – ESEC
alguns aspectos ecológicos desses (UTM 0692935, 9273445), localizada no
seres, como a obtenção de recursos município de Serra Negra do Norte, RN.
alocados no crescimento, o A Unidade de Conservação encontra-se
investimento reprodutivo e a influência no domínio da caatinga (Silva et al.,
de vizinhos (Baueri et al., 2004). 2003).
Além disso, os organismos Foi realizado um transecto
apresentam, em geral, um trade-off contínuo de 300 metros ao longo de
entre o investimento reprodutivo e o uma trilha, no qual a cada 5 metros foi
crescimento vegetativo. Em época de marcado um indivíduo de S. sanguinea
floração as plantas alocam mais pós-reprodutivo, totalizando uma
recursos para o componente população alvo de 60 indivíduos. Dos
reprodutivo (órgãos florais), deixando
12
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

60 indivíduos marcados, foram Resultados


aleatorizados 30 para as análises
O peso médio da raiz foi 0,25 ±
estatísticas.
0,18 (média ± desvio padrão) gramas,
Para cada indivíduo de S. enquanto o peso do talo e da
sanguinea foi calculada a densidade inflorescência foi 1,08 ± 0,76 gramas e
intra-específica em um raio de 50 0,52 ± 0,3 gramas, respectivamente. A
centímetros pelo método de vizinhança biomassa individual variou de 0,6 a 5,6
por raio fixo (Berger et al., 2008). Na gramas (Figura 1).
ausência de vizinhos na área
A densidade intra-específica de
delimitada, a densidade foi considerada
S. sanguinea variou de zero a 38
igual a zero. O indivíduo marcado foi
indivíduos, sendo a densidade média
coletado e levado ao laboratório para
igual a 8,37 ± 10,1 indivíduos.
posterior medições. Cada indivíduo foi
dividido em três partes, inflorescência, O peso da raiz (F1,28=0,597;
talo e raiz, e seus pesos aferidos em p=0,446), do talo (F1,28=0,155; p=0,696),
uma balança pesola de 5 gramas com da inflorescência (F1,28=0,153; p=0,699)
precisão de 0,05. e a biomassa total (F1,28=0,79; p=0,79)
não foram influenciados pela densidade
Foi analisado o (1) peso da raiz,
de coespecíficos. Todas estas relações
(2) peso do talo e (3) peso da
não significativas seguiram um padrão
inflorescência, bem como a (4)
similar ao ilustrado no gráfico da Figura
biomassa total, em relação à densidade
2. O investimento reprodutivo
intra-específica. Foram também criadas
(F1,28=2,617; p=0,117) e o crescimento
novas variáveis – (5) investimento
vegetativo (F1,28=0,229; p=0,636)
reprodutivo (peso da
também não foram relacionados à
inflorescência/peso do talo + peso da
densidade. O peso da inflorescência foi
raiz) e (6) crescimento vegetativo (peso
significantemente relacionado ao
do talo + peso da raiz) – as quais foram
crescimento vegetativo (F1,28=81,215;
analisadas em relação à densidade.
p<0,001; r2=0,744; Figura 3).
Além disso, foi avaliada a influência (7)
do crescimento vegetativo no peso da
inflorescência. Todas as análises acima
utilizaram o módulo GLM (General
Linear Model) e foram realizadas no
programa SYSTAT 12.0.
13
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Figura 1. Frequência da biomassa Figura 3. Relação entre crescimento


individual em Stachytarpheta vegetativo e peso da inflorescência de
sanguinea. Stachytarpheta sanguinea.

Discussão

Os resultados das medidas de


biomassa em relação à densidade intra-
específica mostraram que não houve
uma influência da densidade no
crescimento de partes vegetativas ou
reprodutivas da S. sanguinea.

A utilização do método de
vizinhança por raio fixo pode não ter
sido ideal para detectar o efeito real da
densidade dos vizinhos coespecíficos.
Berger et al. (2008), numa revisão
Figura 2. Relação entre a densidade e sobre competição entre plantas,
biomassa em Stachytarpheta mostrou que a metodologia de
sanguinea. vizinhança por raio fixo não considera a
heterogeneidade das amostras, uma
vez que a influência dos vizinhos
diminui com a distância do centro.

Além disso, o fato do cálculo da


densidade dos vizinhos ter incluído
tanto indivíduos reprodutivos como
pós-reprodutivos, pode ter interferido
14
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

na análise da competição entre Mazzochini pela ajuda com o


coespecíficos. Isso porque interações fornecimento de material bibliográfico
recentes foram somadas a interações e auxílio estatístico, e aos funcionários
pretéritas. da ESEC-Seridó pelo apoio durante todo
o curso de campo.
Outro aspecto a ser considerado
é a competição inter-específica, que
não foi avaliada no estudo, mas que
Referências
pode ter um efeito maior na população
estudada. O papel da competição inter- Bauer, S., Wyszomirski, T., Berger, U.,
específica pode ser determinante na Hilderbrandt, H., Grimm, V. 2004.
estruturação de uma determinada Asymmetric competition as a
população (Tilman, 1987). natural outcome of neighbour
interactions among plants: results
O esperado trade-off entre o
from the field-of-neighbourhood
investimento reprodutivo e o
modelling approach. Plant
crescimento das partes vegetativas não
Ecology. 170: 135–145.
foi observado. Para a S. sanguinea, uma
planta anual de característica Begon, M., Townsend, C. R., Harper, J.
reprodutiva sazonal, a morfologia de L. 2006. Ecology: from Individuals
sua inflorescência em espiga cresce to Ecosystems. 746p.
proporcionalmente com a parte
vegetativa, com a possível finalidade de Belcher, J.W., Keddy, P.A, Twolan-
atrair mais polinizadores. Strutt, L. 1995. Root and shoot
competition intensity along a soil
Além disso, o peso da depth gradient. Journal of
inflorescência pode não ser uma Ecology, 83: 673-682.
medida eficiente para estimar o trade-
off entre investimento reprodutivo e Berger, U., Piou, C., Schiffers, K.,
crescimento vegetativo. A utilização de Grimm, V. 2008. Competition
outras medidas, como a massa de among plants: Concepts,
sementes, pode refletir uma melhor individual-based modeling
estimativa da contribuição do approaches, and a proposal for a
investimento reprodutivo (Kidson & future research strategy.
Westoby, 2000). Perspectives in Plant Ecology,
Evolution and Systematics, 9:
121-135.
Agradecimentos Silva, J. M. C. 2003. Introdução. Pp 9-
10. In: J. M. C. Silva, M. Tabarelli,
Agradecemos aos professores e colegas
M. T. Fonseca & L. V. Lins (eds.),
do PPG em Ecologia da UFRN, em
Biodiversidade da Caatinga: áreas
especial ao professor Márcio Zikan pela
e ações prioritárias para a
orientação. Ao nosso colega Guilherme
15
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

conservação. Ministério do Meio Kidson, R. & Westoby, M. 2000. Seed


Ambiente. Universidade Federal mass and seedling dimensions in
de Pernambuco, Fundação de relation to seedling
Apoio ao Desenvolvimento da establishment. Oecologia, 125:
UFPE, Conservation International 11–17.
do Brasil, Fundação Biodiversitas,
EMBRAPA Semi-Árido.

Tilman, D. 1987. The importance of the


mechanisms of interspecific
completion. American Naturalist,
129: 769-774.
16
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

ABUNDÂNCIA E DIVERSIDADE DE RECURSOS OU IDENTIDADE DE ESPÉCIES: O QUE É


MAIS IMPORTANTE PARA A HERBIVORIA DE DUAS ESPÉCIES DA CAATINGA?

GUSTAVO BRANT, NÍCHOLAS SEBASTIAN, ADRIANA PELLEGRINI E TANÁGARA FALCÃO

Introdução A biomassa aérea da vegetação


é uma medida biológica importante e
A Caatinga pode ser classificada
está intimamente relacionada com a
como uma vegetação arbórea ou
produtividade primária (Sampaio &
arbustivo-arbórea, contendo um dossel
Silva, 2005), podendo, assim, afetar
baixo e deciduidade marcante durante
positivamente a taxa de herbivoria
a seca (Queiroz, 2009). Ela é dividida
sobre as espécies vegetais. A riqueza de
por unidades de paisagem que são
espécies, por outro lado, pode
influenciadas por interações ecológicas
influenciar negativamente a herbivoria
e pelo histórico de pertubação local
de espécies lenhosas, uma vez que a
(Silva et al., 2003). O estágio de
diversidade de recursos alimentares
sucessão ecológica que a unidade da
pode diluir a chance de uma espécie ser
paisagem se encontra pode definir a
herbivorada. Entretanto, outros fatores
riqueza e abundância dos indivíduos
podem influenciar a intensidade de
em uma escala local. A distribuição das
herbivoria nas espécies vegetais. Por
espécies lenhosas pode definir a
exemplo, algumas espécies de
presença de herbívoros específicos,
herbívoros podem se especializar em
principalmente se uma espécie é
consumir plantas específicas, enquanto
dominante em uma paisagem em
as plantas podem desenvolver
estágio inicial de sucessão. Isto ocorre
mecanismos de defesa ou tolerância
devido a coevolução herbívoro-planta,
contra seus herbívoros dando origem a
que pode explicar uma relação positiva
um processo co-evolutivo (Strauss &
entre a densidade dos indivíduos de
Agrawal, 1999).
cada espécie (Begon, 2007).
O presente estudo teve como
A herbivoria é o consumo de
objetivos: (i) investigar os efeitos da
toda planta viva ou parte dela. Os
biomassa, abundância, riqueza e
herbívoros mostram suas preferências
distância do leito de um córrego
e exibem seu comportamento em
temporário sobre as taxas de herbivoria
relação ao que comem, como e quando
de duas espécies típicas da Caatinga:
comem (Gurevitch et al. 2006). Estudos
Poncianella pyramidalis (catingueira) e
sobre herbivoria nos trópicos focam em
Croton sonderianus marmeleiro ; (ii)
ambientes úmidos, enquanto
comparar a intensidade de herbivoria
ambientes secos são menos conhecidos
entre essas duas espécies.
(Janzen, 1981).
17
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Material e Métodos Para avaliar o grau de herbivoria


sobre a catingueira e o marmeleiro,
As coletas foram realizadas na
foram coletadas as folhas de três
Estação Ecológica do Seridó (ESEC -
indivíduos nos diferentes estratos da
Seridó), no córrego da “trilha da
copa (baixo, médio e alto). Quando
caveira”. Posicionamos um transecto
mais de três indivíduos de catingueira
de 200 m ao longo do leito do córrego.
ou marmeleiro foram encontrados em
Foram sorteados 4 pontos aleatórios
uma parcela, sortearam-se quais seriam
(10 m, 40 m, 60 m, 110 m) para
utilizados para a amostragem das
amostragem de dados.
folhas. Do total de folhas, foram
Perpendicularmente, a cada um dos
sorteadas 30 folhas de cada espécie por
pontos, foram definidas 3 parcelas de
parcela e classificadas segundo as
5x5 m, sendo a primeira distante 3 m
seguintes categorias: (1)-0%; (2)-1-6%;
do leito do rio, a segunda 23 m e a
(3)-6-12%; (4)- 12-25%; (5)-25-50%; (6)-
terceira 43 m, formando assim, um
50-100%, para o cálculo do índice de
gradiente de distâncias do leito em
dano foliar (Benítez-Malvido et al.
relação ao rio (Fig.1).
2005).

ID = Σ ni*Ci/N

ni= quantas vezes na categoria i;


Ci= categoria i de dano foliar
N= número de amostras totais

Para testar qual variável afeta


de maneira mais significativa a
Figura 1. Esquema da amostragem intensidade de herbivoria nas duas
realizada ao longo do córrego da trilha espécies (catingueira e marmeleiro),
da caveira. realizou-se uma regressão múltipla. No
modelo, utilizou-se a riqueza,
Em cada uma das parcelas
abundância, biomassa e distância do
amostrou-se a riqueza e a abundância
leito como variáveis independentes. O
total de plantas lenhosas. Além disso,
índice de dano foliar por herbívoros foi
mediu-se o DAS (diâmetro a altura do
utilizado como variável dependente.
solo) de cada indivíduo encontrado.
Apenas indivíduos com DAS maiores do Para testar a existência de um
que três cm foram considerados. Para gradiente ambiental, no qual a
estimar a biomassa das espécies foram abundância, a riqueza e biomassa das
utilizadas equações alométricas espécies lenhosas aumenta com a
específicas, a partir do DAS, proximidade do córrego (mais
desenvolvidas por Sampaio & Silva umidade), foi realizada uma MANOVA.
(2005). No modelo, as variáveis citadas a cima
foram utilizadas como dependentes e a
18
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

distância do leito como variável (catingueira: R² = 0,078; F4,1 = 0,021; p


independente. = 0,98; marmeleiro: R² = 0,399 ; F4,1 =
0,083; p = 0,54).
Para testar se a herbivoria é
diferente entre as duas espécies, O resultado da MANOVA para o
realizou-se um teste t, utilizando a gradiente ambiental demonstrou que a
espécie como variável independente e riqueza, a abundância e a biomassa
índice de dano foliar como variável total não dependem da proximidade
dependente. com o córrego temporário (F2,9 = 0,261;
p = 0,81).
Resultados
Ao comparar a taxa de
Foram encontrados 198
herbivoria entre a catingueira e o
indivíduos pertencentes a nove
marmeleiro, encontrou-se que o
espécies lenhosas. A biomassa média
marmeleiro teve mais herbivoria que a
estimada foi de 44,75 kg/m² e o
catingueira (Figura 3, t = -0.8834, p =
número de indivíduos por metro
0.001).
quadrado foi 7,92. O marmeleiro foi a
espécie dominante na área analisada,
representando 75% dos indivíduos
amostrados e 39% da biomassa total
(Figura 2).

0,8
0,7 Ab. Total
0,6
0,5 Bio. Total
0,4
0,3
0,2 Figura 3. Índice de dano foliar para
0,1
0 Catingueira (Ca) e Marmeleiro (Ma).

Discussão
Figura 2. Abundância e biomassa total A vegetação de Caatinga da
das espécies encontradas no estudo ESEC encontra-se em estado de
O resultado da regressão regeneração, contendo muitas áreas
múltipla para herbivoria da catingueira com domínio de espécies pioneiras
e marmeleiro mostrou que nenhuma (Santana, 2009). Isso se deve ao fato da
das variáveis analisadas (riqueza, ESEC ter sido criada em uma área com
abundância, distância do leito e histórico de cultivo de algodão e forte
biomassa) influenciou a taxa de pressão antrópica.
herbivoria nas espécies estudadas
19
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

A partir da biomassa total das apresentam preferências alimentares


espécies encontradas no presente (Allcock & Hik, 2004) o que dificilmente
estudo, podemos dizer que a vegetação ocorreria em escassez de recursos.
da área estudada encontra-se em Apesar de esperarmos encontrar uma
processo de sucessão secundária, uma maior intensidade de herbivoria com o
vez que 80% da biomassa total é aumento da biomassa e abundância,
representada apenas por duas espécies devido à maior disponibilidade de
de estratégia pioneira (catingueira e recursos para os herbívoros, em nosso
marmeleiro). Essas duas espécies são estudo este padrão não foi encontrado
típicas da Caatinga e ambas são boas para nenhuma das duas espécies
colonizadoras de áreas degradadas analisadas.
(Queiroz, 2009; Santana, 2009). Em
Entretanto, encontrou-se uma
especial, o marmeleiro é considerada
forte relação da intensidade de
uma espécie invasora de áreas
herbivoria com a identidade das
antropizadas, apresentando alta
espécies. Esse padrão está de acordo
capacidade de dispersão e densidades
com as teorias relacionadas aos
que chegam a mais de 1000 indivíduos
processos evolutivos envolvendo
por hectare dentro da ESEC (Santana
interações do tipo herbívoro-planta,
2009). A catingueira, por sua vez, é uma
nas quais os herbívoros podem se
espécie endêmica da Caatinga e possui
especializar em consumir certas
ampla distribuição neste domínio.
espécies, enquanto as plantas se
Apesar da elevada densidade de especializam em se defender
marmeleiro encontrada em nosso (quimicamente/mecanicamente) ou
estudo (6 indivíduos/m²), a biomassa compensar a herbivoria (Strauss &
média desta espécie foi de apenas de Agrawal, 1999). Para as espécies
2,8 kg/planta. Esses resultados estão de estudadas, os autores acreditam que os
acordo com Santana (2009), que fatores históricos são mais importantes
encontrou mais de 80% dos indivíduos que a abundância de recursos para
de marmeleiro com DAS menor que 8,5 explicar a intensidade de herbivoria.
cm, ou seja, de pequeno porte. Por
No caso, o marmeleiro teve
outro lado, a catingueira apresentou
maior taxa de herbivoria que a
uma densidade média de apenas 0,28
catingueira e praticamente todas as
plantas/m² mas uma biomassa média
suas folhas apresentaram algum nível
extremamente alta (38,2 kg/planta).
de dano foliar. Silva et al. (2009)
Devido às características de encontraram o mesmo padrão em um
semi-aridez da Caatinga, a biomassa estudo de herbivoria com o
foliar é um recurso limitante e está marmeleiro, no qual todos os
disponível apenas na época das chuvas. indivíduos adultos amostrados
Em épocas nas quais o recurso foliar apresentaram algum tipo de herbivoria.
não é limitante, os herbívoros Esses resultados demonstram que o
20
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

marmeleiro é uma espécie tipicamente liberam um cheiro pungente que inibe


atacada por herbívoros e que a herbivoria destes animais (Dantas et
provavelmente a abundância de al. 2009). Como o presente estudo foi
indivíduos não afeta a intensidade realizado no final da estação chuvosa, a
desses ataques. Essa espécie pode maioria das folhas amostradas não era
estar sendo mais atacada porque não jovens, o que pode explicar a baixa
possui defesas específicas contra herbivoria sobre as mesmas. Além
herbívoros ou porque é uma espécie disso, suas folhas são mais grossas que
tolerante à herbivoria, podendo as folhas do marmeleiro, podendo ser
apresentar compensação (Strauss & menos palatáveis para os herbívoros
Agrawal, 1999). em geral.

Esta compensação está No presente estudo, a riqueza


relacionada ao aumento na produção de espécies lenhosas não afetou o dano
de folhas novas e a capacidade foliar por herbívoros. No caso, a
fotossintética do indivíduo com a hipótese levantada pelos autores
indução da herbivoria. A associação postulava que a intensidade de
herbívoro-espécie pode ser a causa da herbivoria diminuiria com o aumento
herbivoria não ter afetado da diversidade de recursos. Entretanto,
drasticamente a espécie, pois ela como ilustrado anteriormente, a
coevolui com o herbívoro específico comunidade vegetal em questão
(Strauss & Agrawal, 1999). Além disso, encontra-se em estágio sucessional
a elevada taxa de herbivoria sobre esta inicial, com dominância de espécies
espécie pode estar relacionadas com o pioneiras e pobre em riqueza (apenas
fato de suas folhas serem nove espécies). Nas parcelas
extremamente finas e por isso mais amostradas, cinco das sete espécies
palatáveis, o que facilita o ataque dos eram raras, diminuindo assim o efeito
herbívoros. da riqueza (diversidade de recursos)
sobre a intensidade da herbivoria.
Por outro lado, encontrou-se
uma taxa de herbivoria menor para a Em síntese, nossos resultados
catingueira, a qual apresentou a demonstram que as estratégias de vida
maioria das folhas pouco danificadas. e os processos históricos, envolvendo
Segundo Dantas et al. (2009), a as interações herbívoro-planta, podem
catingueira é uma espécie que inicia a explicar a intensidade de herbivoria
produção de folhas logo nos primórdios encontrada nas espécies estudadas.
da estação chuvosa, sendo umas das Não houve nenhuma evidência de que
primeiras espécies a responder ao a quantidade ou a diversidades de
aumento da pluviosidade. Enquanto recursos da comunidade vegetal
suas folhas estão jovens, elas são pudesse influenciar a taxa de herbivoria
extremamente palatáveis para o gado, das espécies avaliadas. Pelo contrário,
entretanto, após maturação, as folhas as características individuais de cada
21
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

espécie foram o que definiram a Dantas, B. F., Lopes, A P., Silva, F. F. S.,
intensidade de herbivoria sobre as Lúcio, A A, Batista, P. F., Pires, M.
mesmas, sendo a caatingueira pouco M. M. L., Aragão, C. A, 2009.
predada provavelmente por um Taxas de crescimento de mudas
mecanismo de inibição e o marmeleiro de Catingueira submetidas a
altamente predado por sua habilidade diferentes estratos e
de tolerar e compensar o efeito sombreamentos. Revista Árvore
negativo dos herbívoros. 33:413-423

Agradecimentos Gurevitch, J., Scheiner, S.M., Fox, G.A.


2006. Ecologia Vegetal. Porto
Os autores agradecem
Alegre: Artmed, pp. 262-263.
Alexandre Vasconcellos pela dedicação
em campo e contribuições teóricas, Janzen, D.H. 1981. Patterns of
Márcio Zikán e Guilherme Mazzochini herbivory in a tropical deciduous
pelo constante apoio nas análises forest. Biotropica 13:271–282.
estatísticas. Agradecemos também aos
Queiroz, L. P. 2009. Leguminosas da
funcionários e dirigentes da ESEC pelo
Caatinga. Universidade Estadual
carinho e acolhimento durantes todos
de Feira de Santana. 913p.
os dias deste estudo.
Sampaio, E.V.S.B. & Silva, G.C. 2005.
Referências
Biomass equations for Brazilian
Allcock, K.G., Hik, D.S. 2004. Survival, semiarid caatinga plants. Acta
growth, and escape from bot. Bras. 19(4): 935-943.
herbivory are determined by
Santana, J. A. S. 2009. Padrão de
habitat and herbivore species for
distribuição e estrutura
three Australian woodland.
diamétrica de Croton sonderianus
Oecologia, 138: 231–241.
na Caatinga da Estação Ecológica
Begon, M., Townsend, C.R., Harper, J.L. do Seridó. Revista Verde 4:85-90
2007. Ecologia, de indivíduos a
Silva, R.A., Santos, A.M.M., Tabarelli, M.
ecossistemas. Porto Alegre:
Riqueza e diversidade de plantas
Artmed. 752p.
lenhosas em cinco unidades de
Benítez-Malvido, J., Martínez-Ramos, paisagem da caatinga 2003. In:
M., Camargo, J. L. C. & Ferraz, I. I.R. Leal, M. Tabarelli & J.M.C.
D. K. 2005. Responses of seedling Silva (eds.). Ecologia e
transplants to environmental conservação da Caatinga. Editora
variations in contrasting habitats Universitária, Universidade
of Central Amazonia. Journal of Federal de Pernambuco, Recife,
Tropical Ecology 21:397–406. Brasil. pp. 237-273.
22
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Strauss, S. Y., Agrawaw, A. A., 1999. The


ecology and evolution of plant
tolerance to herbivory. TREE
14:179-185
23
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

AVES COMO ILHAS: QUANTO MAIORES MAIS RIQUEZA E ABUNDÂNCIA DE ECTOPARASITAS?

HONARA MORGANA, SILVANA MASCIADRI, PEDRO DE F. CAPISTRANO E LUCAS VIEGAS

Introdução et al., 2002) e abundância de parasitos


(Clatyon & Walther, 2001). Aliás,
O parasitismo é um tipo de
existem estudos que corroboram essa
predação na qual o predador,
correlação (Morand & Poulin, 1998;
conhecido como parasita normalmente
Nunn et al., 2003). Postula-se que o
provoca pouco dano ao outro
tamanho do bico pode influenciar a
indivíduo, o hospedeiro, geralmente
riqueza e abundância de ectoparasitos,
não matando-o e alimentando-se
já que bicos maiores seriam mais
apenas de um ou poucos indivíduos em
efetivos na limpeza destes (Hughes &
toda sua vida (Begon et al., 2007). Por
Page, 2007).
causa dessa especificidade em relação
ao hospedeiro, os parasitos (ecto ou Uma grande diversidade de
endo) têm uma característica de vida ectoparasitos utiliza as aves como
bem inusitada, pois seu alimento hospedeiros. Entre os mais comuns das
também é seu habitat. Muitos estudos aves brasileiras destacam-se insetos
são realizados sobre as comunidades (malófagos e hiposboscídeos) e
de parasitos em vertebrados, como aracnídeos (ácaros plumícolas e
mamíferos (Morand & Poulin, 1998), carrapatos moles e duros) (Arzua &
peixes (Takemoto et al., 2005) e aves Valim, 2010). Embora os parasitos
(Hughes & Page, 2007; Clayton et al., possam afetar a vida e reprodução das
2010). aves, ainda são pouco estudados.

Existem duas abordagens Este estudo foca-se em 1–


principais que tentam explicar os Descrever a fauna de ectoparasitos das
padrões ecológicos que influenciam na aves da Estação de Seridó; 2-Relacionar
riqueza de parasitos nos seus o tamanho da ave com a abundância de
hospedeiros, a teoria biogeografia de ectoparasitos registrados nelas; e 3-
ilhas (TBI) (MacArthur & Wilson, 1963), Testar se o tamanho do bico se
e a teoria epidemiológica. Porém nesse relaciona com a riqueza e abundância
trabalho focaremos na visão da TBI, a de ectoparasitas.
qual postula que quanto maior a área
A hipótese deste trabalho é que
do habitat maior o número de espécies
aves maiores apresentam maiores
nela presente. Se considerarmos os
abundância e riqueza de ectoparasitos.
hospedeiros (as aves) como habitats,
espera-se que exista uma relação entre
o tamanho deste com a riqueza (Stanko
24
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Materiais e Metodologia Resultados

A área de estudo localiza-se no Registraram-se 14 espécies de


Município de Serra Negra, na Estação aves e 20 indivíduos, sendo as espécies
Ecológica de Seridó (6°15’S e 37°16’O). mais abundantes Crotophaga ani (3),
O clima apresentou-se com céu claro e Columbina squammata (2), C. talpacoti
sol. Para coletar as aves, colocaram-se (2), Hemitriccus margaritaceiventer (2),
nove redes de neblina ao longo da e Nystalus maculatus (2) (Figura 1). A
trilha da Caveira (floresta) e uma (mata Famílias Tyrannidae (3 ind.) e
aberta de trepadeiras) na Sede da Columbidae (2 ind.) foram as mais
Estação Ecológica de Seridó, com representadas (Tabela 1).
horário de abertura das 6:00 às 7:20,
totalizando 1h20 de esforço amostral.
As aves foram postas em sacolas de C. melacoryphus

tecido, e em seguida, serem I. jamacaii


M. maculatus

processadas em laboratório. M. tyrannulus


P. dominicana
S. frontalis

Registrou-se a riqueza e T. major


T. musculus

abundância das aves coletadas e se T. rufiventris


C. squammata

utilizou câmera para o registro C. talpacoti


H. margaritaceiventer

fotográfico. No processamento foram N. maculatus


C. ani

mensuradas as variáveis peso, e 0 1 2 3 4


nº de individuos
cumprimento do bico (cúlmen
exposto). Em seguida as aves foram Figura 1. Distribuição de abundâncias
colocadas em sacola plástica com de espécies de aves colectadas na ESEC
algodão embebido em 10 ml de acetato (Seridó, Serra Negra, RN).
de etila, afim de que os parasitos
morressem, mantendo a cabeça das
aves fora das sacolas. Esta metodologia
é conhecida como câmara de
fumigação (Arzua & Valim, 2010). Após
20 minutos, realizou-se a remoção
mecânica dos parasitos passando
algodão pelo corpo da ave, antes de
liberá-la. Uma ave morreu no
procedimento. Para as análises dos
dados foram realizadas regressões
lineares afim de relacionar riqueza e
abundância total de parasitos com o
peso e as variáveis do bico. Utilizou-se
o software Systat 12.
25
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Tabela 1. Lista taxonômica das aves registradas na ESEC (Seridó, Serra Negra, RN).

Familia Nome científico Nome popular

Cuculidae Crotophaga ani anu preto

Columbidae Columbina squammata fogo apagou

rolinia caldo de
Columbidae Columbina talpacoti feijão

Hemitriccus maria de olho de


Tyrannidae margaritaceiventer ouro

Bucconidae Nystalus maculatus joão bobo

Cuculidae Coccyzus melacoryphus papa lagarta

Icteridae Icterus jamacaii Concriz

Tyrannidae Myiarchus tyrannulus maria cavaleira

Tyrannidae Myiodynastes maculatus ben-te-vi rajado

Emberizidae Paroaria dominicana galo de campina

Furnadidae Synallaxis frontalis Petrin

Thamnophilidae Taraba major choró-boi

Turdidae Turdus rufiventris sabiá laranjeira

Troglodytidae Troglodytes musculus rouxinol

Cinco morfoespécies (MfSP) de


ectoparasitos foram encontradas em 18
indivíduos analisados (Fig. 2).
Registraram-se maiores riqueza e
abundância em alguns indivíduos (1,3,
4, 5, 15, 16) enquanto outros menores
ou nenhuma riqueza e abundância (2,
6, 7, 8, 9, 10, 11, 14, 15, 17, 18).
26
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011
25
MfSP1

Abundância de ectoparasitas 20
MfSP2
MfSP3

15 MfSP4
MfSP5
10

0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18
Indivíduos

Figura 2. Distribuição de abundâncias


de ectoparasitos (MfSP) nos indivíduos
amostrados.
Figura 4. Intervalo de confiança (azul) e
da predição (marrom) do modelo
estimado (vermelho) da regressão
A relação entre a riqueza de
linear da abundância de ectoparasitos
ectoparasitos e o peso das aves foi
por peso dos indivíduos.
significativa e positiva (R2=0,573;
F1,16=21,457, p<0.001) (Fig.3).

Mas a abundância não mostrou Por outro lado, o cumprimento


significância no análise de regressão em do bico (cúlmen exposto) não mostrou
relação ao peso (R2=0,218; F1,16=4,48, significância nem com a riqueza
p= 0.051) (Fig.4). (R2=0,044; F1,16=0.741, p=0.402)
tampouco com a abundância de
ectoparasitos (R2=0,006; F1,16=0.09,
p=0,768) (Fig. 5).

Figura 3. Intervalo de confiança (azul) e


da predição (marrom) do modelo
estimado (vermelho) da regressão
linear para riqueza de ectoparasitos por
o peso dos indivíduos.
27
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

trabalhos, tais como o de Clayton &


Walther (2001), no qual a abundância
de ectoparasitos variou positivamente
com o tamanho do hospedeiro. Essa
divergência de resultados pode ser
devida principalmente a diversidade de
métodos utilizados pelos diferentes
investigadores e pelo esforço amostral,
como acima citado (Hughes e Page,
2007). É importante salientar que entre
as amostras foram considerados
indivíduos da mesma espécie, isso
também pode ser considerado um fator
influente na análise, partindo do
princípio de que indivíduos da mesma
espécie possuem peso similar; no
entanto, caso exista algum tipo de
efeito ambiental sobre a diversidade
parasitos das aves da região, a fauna
abrigada por indivíduos da mesma
Figura 5. Intervalo de confiança (azul) e espécie pode diferir, pois esse efeito
da predição (marrom) do modelo ambiental seria mais atuante que o
estimado (vermelho) da regressão efeito filogenético sobre a riqueza de
linear de riqueza (acima) e abundância espécies parasitas. Para afirmar essas
(embaixo) de ectoparasitos por cúlmen hipóteses teóricas são necessários
exposto. estudos que avaliem tais efeitos
ambientais e filogenéticos, a fim de
entender quais fatores são
Discussão determinantes mais fortes da
diversidade de parasitos em uma dada
Diferentemente do esperado, área (Poulin, 2004).
não foi possível afirmar a existência de
uma relação significativa entre a Em contrapartida, a relação
abundância de ectoparasitos e o peso significativa entre o peso, um
do hospedeiro, apesar do valor de P substituto para o tamanho corporal do
encontrado estar bastante próximo do hospedeiro, e a riqueza ectoparasítica
ponto de corte (p=0,051), confirma a relação encontrada em
provavelmente um maior esforço outros trabalhos, havendo um aumento
amostral diminuiria o valor de P, da riqueza de parasitos, quanto maior o
possibilitando a corroboração da peso do hospedeiro (Poulin 2004;
hipótese teórica. Esse resultado Hughes e Page, 2007). Apesar do valor
contrastou com resultados de outros de R2 obtido (R2=0,573) ser
28
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

relativamente baixo quando variação, sendo necessário testar


comparado a outros estudos, este pode fatores ambientais, filogenéticos e
ser considerado um bom valor, visto comportamentais, para poder afirmar
que apenas uma variável (peso de os padrões encontrados.
hospedeiro) explicou cerca de 57% da
variação na riqueza de ectoparasitos.
Além disso, a variável testada está Agradecimentos
entre as características do hospedeiro
avaliadas como fatores influentes na Agradecemos especialmente ao
riqueza do parasito e, segundo Poulin Professor Mauro Pichorim por sua
(2004), a soma dessas características ótima disposição, apoio e ensino na
morfológicas, explicam geralmente execução do trabalho, ao Tony pela
pouco a variação na diversidade de assistência com as redes de coleta, ao
parasitos. pessoal da ESEC por sua amabilidade
para conosco, e aos Professores em
A insignificância das relações geral pelo total apoio e dedicação para
tamanho do bico versus riqueza e que aproveitemos ao máximo esta
tamanho do bico versus abundância se instância de aprendizagem.
deu principalmente, porque a fauna
Acariforme não foi amostrada. O
comportamento de limpeza anti-
Referências
parasita é bastante eficiente em
algumas partes do corpo, como Arzua, M., Valim, M.P., 2010. Bases
rêmiges, onde se concentra grande para o estudo qualitativo e
parte da fauna acarina. A metodologia quantitativo de ectoparasitos
utilizada também pode ser apontada em aves. In: Matter et al.
como influente sobre esse resultado. (Orgs.), Ornitologia e
Amostrar áreas mais próximas ao conservação: ciência aplicada,
pescoço (regiões não contempladas técnicas de pesquisa e
pela metodologia) poderia surtir levantamento. Technical Books,
melhores resultados, partindo do Rio de Janeiro, pp. 347-366.
princípio que apenas aves com bicos
Begon M., Townsend C.R., Harper J.L.,
maiores seriam mais eficientes na
2007. Ecologia: de indivíduos a
retirada de ectoparasitos (Clayton, et
ecossistemas-Parasitismo e
al. 2010).
Doença, 4 ed., Armed, Porto
Assim, com os resultados Alegre, pp. 347-380.
obtidos é possível inferir que existem
Clayton, D.H., Walther, B.A., 2001.
relações entre as variáveis morfológicas
Influence of host ecology and
do hospedeiro e a riqueza de
morphology on the diversity of
ectoparasitos, entretanto, essas
variáveis não explicam muito dessa
29
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Neotropical bird lice. Oikos, Nunn, C.L., Altizer, S., Jones, K.E.,
94(3), 455-467. Sechrest, W., 2003. Comparative
Tests of Parasite Species
Clayton, D.H., Koop, J.A.H., Harbison,
Richness in Primates. The
C.W., Moyer, B.R., Bush, S.E.,
American Naturalist, 162 (5),
2010. How Birds Combat
597-614.
Ectoparasites. The Open
Ornithology Journal, 3, 41-71. Poulin, R., 2004. Macroecological
patterns of species richness in
Hughes, J., Page, R.D.M., 2007.
parasite assemblages. Basic and
Comparative tests of
Applied Ecology 5, 423-434.
ectoparasite species richness in
seabirds. BMC Evolutionary Stanko, M., Miklisová, D., Goüy de
Biology, 7: 227. Bellocq, J., Morand, S., 2002.
Mammal density and patterns
MacArthur R.H., Wilson O.W. 1963. An
of ectoparasite species richness
Equilibrium theory of insular
and abundance. Oecologia
zoogeography. Evolution 17:
131:289–295.
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Takemoto, R.M., Pavanelli, G.C.,
Morand, S., Poulin R., 1998. Density,
Lizama, M.A.P, Luque, J.L.,
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Poulin R., 2005. Host population
richness of terrestrial mammals.
density as the major
Evolutionary Ecology, 12, 717–
determinant of endoparasite
727.
species richness in floodplain
fishes of the upper Paraná River,
Brazil. Journal of Helminthology
79, 75-84.
30
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

COMPORTAMENTO DE FUGA EM Lepitodactylus macrosternum E Rhinella jimi


(AMPHIBIA, ANURA) SOB CONDIÇÕES EXPERIMENTAIS

DAVID LUCAS ROHR, LAURA MARTINA FERNANDEZ, ANA CLÉZIA S. DE MORAIS, PHOEVE MACARIO

Introdução distância do salto entre as espécies; e


entender a relação entre a distância de
Os anuros apresentam uma
fuga e de salto com as medidas
gama de adaptações e estratégias de
morfométricas das espécies.
defesa para evitar a predação (Patto &
Pie, 2006), sendo o mecanismo de fuga
uma das principais. O comportamento
Material e Métodos
de fuga pode ser influenciado por
diversas variáveis, tais como O estudo foi realizado na
microhabitat, densidade de Estação Ecológica do Seridó (ESEC),
agrupamentos e tamanho corpóreo localizada no município de Serra Negra
(Martín et al. 2005, Cooper & do Norte-RN, possuindo uma área total
Sherbrooke 2010, Toledo et al. 2011). de 1.166 hectares (Amorim, 2005).
Para tentar explicar o comportamento
de fuga as variáveis comumente As espécies estudadas foram a
medidas são: a distância mínima de L. macrosternum, conhecida
aproximação do predador tolerada pela popularmente como caçote, ocorre na
presa antes que esta se desloque e região nordeste do Brasil do Maranhão
escape (tolerância de aproximação); e a até a Bahia e Piauí em elevações de 400
distância de deslocamento (fuga) a 500 m. A outra espécie é a R. Jimi,
percorrida pelos indivíduos (Patto & Pie cujo nome popular é cururu, ocorre na
2006, Toledo et al. 2011). Amazônia, Colombia, maior parte da
Venezuela, no sul da Guiana, e do Brasil
Estudos empíricos e teóricos até a Bolívia (Frost 2011).
indicam que a presa pode apresentar
comportamentos anti-predação Para realização do experimento,
diferenciados, sempre objetivando foram coletados, na noite de 20 de
minimizar os custos de fuga (Martín et junho de 2011, 30 indivíduos de cada
al. 2005). Dessa forma, os espécie de anuros (L. macrosternum e
objetivos deste estudo foram: verificar R. jimi) e acondicionados em baldes de
a freqüência de comportamento de plástico. O experimento foi conduzido
fuga nas espécies Lepitodactilus na manhã seguinte em condições de
macrosternum e Rhinella jimi; analisar laboratório, onde foram construídas
se existe relação entre a tolerância de duas pistas para avaliar o deslocamento
aproximação e tamanho corpóreo nas referente ao comportamento de fuga
espécies analisadas; comparar a para cada indivíduo das espécies
31
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

estudadas. Para tanto, cada indivíduo espécies. Para estas análises foi
foi colocado na pista distante 6m de um utilizado o software PAST versão 2.08.
“observador-predador”, que se
Resultados
aproximava a uma velocidade
constante até que o indivíduo Comportamento de fuga
apresentasse um comportamento de
fuga ou fosse alcançado. Assim, foram A espécie L. macrosternum
observadas medidas da tolerância de apresentou comportamento de fuga
aproximação - distância mínima de significativamente mais freqüente do
aproximação do observador tolerada que R. jimi (χ² = 11,43; g.l. = 1; p <
pelo sapo/rã antes do deslocamento; 0,001) (Fig. 1).
distância da fuga - deslocamento total
até o último pulo; o número de saltos -
saltos dados logo após aproximação;
distância do salto – média dos saltos
(distância de fuga/número de saltos).
Além disso, foram realizadas as
seguintes medições morfométricas:
comprimento rostro-cloacal (CRC);
circunferência da coxa; e comprimento
da pata posterior direita, objetivando
relacioná-las à distância de fuga e do Figura 1. Frequência de
salto. comportamento de fuga, sendo barras
pretas o número total de indivíduos
Foi realizado um teste de Qui- testados e barras cinzas o número de
quadrado para avaliar se havia indivíduos que não fugiram.
diferença significativa entre o número
de indivíduos de cada espécie que Influência do CRC na tolerância de
apresentaram comportamento de fuga. aproximação
Para verificar se o CRC influencia a
tolerância de aproximação, foi utilizada A tolerância de aproximação de
uma regressão linear simples. Um teste ambas as espécies não foi influenciada
t foi aplicado objetivando detectar de forma significativa pelo tamanho
diferença significativa na distância do corpóreo dos indivíduos (L.
salto entre as espécies. Foi feita uma macrosternum - R²=0,0112; g.l.= 25; F=
Análise de Componentes Principais 0,2832; p=0,6053. R. Jimi – R²= 0,039;
(ACP) para reduzir o número de g.l.= 13; F= 0,2832; p=0,6053).
variáveis morfométricas, onde os
Distância do salto entre as espécies
“scores” do primeiro eixo mais
explicativo foram utilizados Não houve diferença
posteriormente numa regressão com a significativa entre a distância do salto
distância do salto e da fuga para ambas
32
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

entre L. macrosternum e R. jimi (t= - A


1,96; g.l.= 33,619 ;p= 0,056847).

Dados morfométricos

A ACP dos dados morfométricos


(CRC, comprimento da pata,
circunferência da coxa) mostrou que o
eixo um explica mais de 93% da
variação detectada para as duas
espécies estudadas (Fig. 2). A análise de
regressão indicou que o resultado foi
significativo para a distância do salto B
em L. macrosternum (R² = 0,142 g.l. =
25, F = 5,30, p = 0,028) mas não em R.
Jimi (R² = 0,0207 g.l. = 13, F = 0,02751,
p = 0,6130). Houve significância no
teste de regressão para distância de
fuga em R. jimi (R² = 0,4298, g.l. 13, F =
9,8007, p = 0,0079), mas não em L.
macrosternum (R² = 0,0142, g.l. 25, F =
0,3613, p = 0,5598) .

Figura 2. A - Análise de componente


principal para Lepitodactilus
macrosternum. O eixo 1 explica 94,89%
da variação total e os eixos 2 e 3
explicam, respectivamente, 3,2% e
1,8%. B - Análise de componente
principal para R. jimi. O eixo 1 explica
93,36% da variação total e os eixos 2 e
3 explicam, respectivamente, 5,08% e
1,54%. Retas verdes são as medidas
morfométricas e os pontos
representam os indivíduos.
33
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Discussão menores confiam mais na sua


capacidade críptica, e desta forma
Comportamento de fuga
aguardam uma aproximação maior do
A diferença na freqüência do predador antes de apresentar o
comportamento de fuga detectada comportamento de fuga (Cooper &
entre as duas espécies estudadas já era Sherbrooke, 2010). No presente
um resultado esperado, uma vez que estudo, a distância do predador na qual
muitas espécies da família Bufonidae, o indivíduo apresentou
inclusive a do presente estudo (R. jimi), comportamento de escape não foi
apresentam um mecanismo de defesa relacionada ao tamanho do corpo para
bastante característico contra as duas espécies. Além da confiança na
predadores além da fuga. Em muitas cripticidade possivelmente não variar
ocasiões onde estes anuros sentem-se com o tamanho do corpo para estes
sob ameaça, inflam os pulmões para anuros, outra explicação para este
causar a impressão de um maior resultado pode estar relacionado ao
tamanho corpóreo e assim intimidar o fato do experimento ter sido realizado
predador (Dornelles et al. 2010, Toledo em substrato de azulejo branco, onde a
et al. 2011). Em alguns casos este cripticidade perde a sua função.
comportamento pode desencorajar a
Distância de salto entre as espécies
investida devido ao limite de tamanho
de presa que os predadores (e.g. O fato de não ter sido detectada
serpentes) podem engolir (Duellman & uma diferença significativa na distância
Trueb, 1986). O comportamento de de salto entre as espécies é um
inflar pode também destacar suas resultado intrigante, uma vez que os
glândulas paratóides, intimidando leptodactilideos apresentam uma
ainda mais o predador, uma vez que as morfologia mais adaptada para saltar
mesmas possuem toxinas que podem em relação aos bufonideos, nos quais
ser letais para algumas espécies predomina uma locomoção cursorial.
(Dornelles et al. 2010) . Este Este resultado pode ter sido
comportamento não é observado em L. influenciado pelo tipo de substrato liso
macrosternum e em nenhuma espécie onde o experimento foi realizado, uma
de sua família (Leptodactylidae). vez que ele reduziu a força de atrito, no
momento do salto, diminuindo a força
Influência do CRC na fuga
de propulsão das patas posteriores dos
Diversos estudos têm indivíduos testados de ambas as
demonstrado que existe uma influência espécies. Isto deve ter afetado muito
do tamanho corpóreo na tolerância de mais o desempenho dos saltos dos
aproximação de predadores em anuros indivíduos de L. macrosternum.
(Martín et al. 2005, Cooper &
Sherbrooke, 2010). Estes pesquisadores
sugerem que indivíduos de tamanhos
34
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Dados morfométricos Brasil. Acta Botânica Brasílica, 19 (3):


615 – 623.
Os resultados mostram que os
Cooper, W.E. & Sherbrooke, W. C.;
dados morfométricos avaliados
2010. Crypsis influences escape
influenciam a distância do salto de L.
decisions in the Round-tailed
macrosternum e a distância de fuga do
Horned Lizard
R. jimi. Este padrão pode estar
(Phrynosomamodestum). Canadian
relacionado a diferentes caminhos
Journal of Zoology, 88:1003-1010.
evolutivos na locomoção destas
famílias de anuros, onde os Dornelles, M.F., Marques, Boucinha M.
Leptodactylidae foram selecionados da G., Renner, M.F.; 2010. Ciência
para serem saltadores eficientes, em movimento 24: 103-117.
enquanto a locomoção cursorial Duellman, W.E. & Trueb, L. 1986,
predomina nos Bufonidae. Desta Biology of anphibians. The Johns
forma, os indivíduos de L. Hopkins University Press, Maryland.
macrosternum com a morfologia Frost, Darrel R. 2011. Anphibian Species
melhor adaptada apresentam uma of The World: an online reference.
salto maior, enquanto os indivíduos de Version 5.5 (31 January, 2011).
R. jimi com a morfologia melhor Electronic Database accessible at
adaptada consigam fugir distâncias http://research.amnh.org/vz/herpet
maiores através de locomoção ology/amphibia/ American Museum
cursorial. of Natural History, New York, USA.
Patto, C.E.G., Pie, M.R.; 2006. Escape
behaviour in the Neotropical frog
Agradecimentos Hylodesasper (Anura:
Leptodactylidae). Acta
Ao professor Gindomar Santana Herpetologica, 1: 141-146.
pela orientação no projeto. Toledo, L.F., Sazima I., Haddad C.F.B.;
Agradecemos ao professor Alexandre 2011. Behavioura ldefences of
Vasconcellos pela ajuda nas análises anurans: an overview. Ethology
estatísticas deste estudo e aos Ecology & Evolution, 23: 1–25.
funcionários da ESEC que colaboraram
com a realização do experimento.

Referências

Amorim, I.L., Sampaio, E.V.S.B., Araujo,


E.L.; 2005. Flora e estrutura da
vegetação arbustivo-arbórea de uma
área de caatinga do Seridó, RN,
35
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Projetos com orientação II


36
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

CANHOTO OU DESTRO? ANÁLISE DA LATERALIZAÇÃO MOTORA EM Rhinella jimi


(Amphibia, Anura: Bufonidae)

ELIANA FARIA DE OLIVEIRA; BRUNO GAZOLA DE FARIA; LEONARDO EMMANUEL FERNANDES DE


CARVALHO

Introdução apresenta lateralização a nível


populacional e individual.
O padrão de lateralização tem
sido verificado em diversos grupos de
vertebrados, como peixes, anfíbios,
Material e Métodos
répteis e, sobretudo, em aves e
mamíferos (Bisazza et al., 1998). Tal O estudo foi desenvolvido na
padrão está associado à assimetria Estação Ecológica do Seridó – ESEC
cerebral presente nesses grupos, que (UTM 0692935, 9273445), localizada no
por sua vez se reflete em estruturas e município de Serra Negra do Norte, RN.
comportamentos também assimétricos A ESEC-Seridó possui clima semi-árido
(Malashichev & Wassersug, 2004). com temperatura média anual variando
entre 22 e 33°C. As precipitações são
A lateralização pode ocorrer
irregulares, com chuvas no período de
tanto a nível individual quanto
janeiro a maio e variações
populacional. Uma população é dita
pluviométricas entre 127 a 916 mm
lateralizada quando mais de 50% dos
(IBAMA, 2004).
indivíduos apresentam uma resposta
unidirecionada (Bisazza et al., 1998). Em 21 de junho de 2011, foi
Neste caso, pressões seletivas devem realizada uma coleta noturna de
estar atuando em direção a um lado indivíduos de Rhinella jimi no entorno
particular e tornando-o especializado. da sede da ESEC-Seridó. Os 30
Além de processos evolutivos, eventos indivíduos coletados foram alocados
aleatórios do ambiente podem também em recipientes plásticos com volumes
agir em direção a um dos lados, entre 50 e 100L, para posterior
afetando o potencial do organismo marcação numérica e aleatorização de
para a lateralização (Bisazza et al., 15 indivíduos a serem submetidos a
1998). dois tratamentos (T1 e T2), com apenas
um nível cada. Aplicou-se uma medida
Com base em evidências de
única de massa viscosa (farinha de trigo
lateralização para algumas espécies de
e água) na região interocular de cada
anfíbios (Bisazza et al., 1998; Robbins et
indivíduo (T1), para registro da resposta
al., 1998; Malashichev & Wassersug,
motora do membro anterior (direito-D
2004; Malashichev, 2006), este estudo
ou esquerdo-E) ao estímulo. Um tempo
objetivou verificar se Rhinella jimi
limite de sete minutos de observação
37
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

foi estabelecido, por vez e para cada distribuição de Chi-quadrado. Todas as


indivíduo, para obtenção de alguma das análises estatísticas foram realizadas no
respostas (incluindo a ausência-O). Em programa R.
seguida, procedeu-se pela postura em
decúbito dorsal do indivíduo (T2), a fim
de observar o lado para o qual o Resultados
espécime analisado girava o corpo (D
ou E), retornando à postura de A Tabela 01 apresenta os
decúbito ventral. Para este tratamento registros de respostas de lateralização
o tempo não foi contabilizado, pois o de Rhinella jimi aos tratamentos T1 e
indivíduo reagia de forma imediata. T2. Na análise da resposta populacional
Ambos os tratamentos foram aplicados ao T1, aproximadamente 58% dos
em uma arena construída com indivíduos responderam com
substrato arenoso em um recipiente de lateralização unidirecionada para a
plástico (raio= 31 cm e altura=38 cm), esquerda. No entanto, essa tendência
no qual as direções (D e E) foram não foi significativa (z=0,924; p=0,356).
fixadas para um único eixo de Para a mesma análise em T2,
observação. Tais procedimentos foram aproximadamente 60% da população
executados em três rodadas (três respondeu com lateralização
repetições) nos mesmos 15 indivíduos unidirecionada também para a
sorteados anteriormente. esquerda, porém, não
significativamente (z=1,333; p=0,183).
Para testar se em ambos os Portanto, as respostas motoras
tratamentos, separadamente, a lateralizadas na população amostrada
população amostrada apresentava não ocorreram significativamente
lateralização unidirecional, os dados de diferentes do esperado pela proporção
respostas positivas (D e E) foram dos 50% (esquerda e direita).
aplicados como frequência em uma
análise GLM binomial, para estimar o As análises para ambos os
intercepto e testar se seu valor difere tratamentos em nível individual
de zero, o qual representa 50% do valor também não foram significativas (T1:
esperado. Para testar se a lateralização X2<0,01, p=0,99, g.l.=1; T2: X2=1,07,
ocorria em nível individual, foi ajustado p=0,30, g.l.=1). Ou seja, não foi
um modelo de efeito misto com a constatado um comportamento
identidade do indivíduo como uma individual relevantemente
variável randômica. Posteriormente, foi unidirecionado de resposta motora,
testada a significância da variação entre seja para direita ou para esquerda.
indivíduos através de um teste de
Razão de Verossimilhança. A diferença
do log da verossimilhança entre os
modelos com e sem a identidade dos
indivíduos foi testado com uma
38
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Tabela 01. Registros de respostas de tendência para uma resposta


lateralização de Rhinella jimi aos unidirecionada para a esquerda. Alguns
tratamentos T1 e T2. estudos têm evidenciado esse padrão
para outras espécies deste mesmo
Indivíduo T1 T2
gênero ou para a família Bufonidae.
1 2 3 1 2 3
2 E E E E E E Malashichev & Wassersug (2004)
3 D E O D D E apresentam uma revisão de
10 E O D D E E lateralização em anfíbios em que
11 E D E E D D apontam lateralização motora e visual
12 D D D D D D em Rhinella marina. Robbins et al.
14 E E O E E E
15 O O O E E D (1998) também encontrou uma
16 O O O D D E resposta motora direcionada para essa
17 O E O E D E mesma espécie. Além de Rhinella
18 D O O D E D marina, os bufonídeos Bufo viridis e B.
20 E D D D D D bufo também apresentam resposta
23 E O O E E E
motora unidirecionada (Malashichev &
24 D E E E E E
25 E D O E D E Wassersug, 2004).
30 E D E E E E
A assimetria comportamental
Legenda: T1 e T2 (massa viscosa na
pode ser variável tanto na população
região interocular e postura em
como na espécie (Malashichev &
decúbito dorsal, respectivamente); 1, 2
Wassersug, 2004). Uma revisão
e 3 (repetições); E, D e O (esquerdo,
realizada sobre o tema com peixes,
direito e ausência, respectivamente).
anfíbios e répteis considerou que
mecanismos lateralizados podem estar
relacionados com padrões
Discussão
comportamentais de predação, fuga do
O resultado não significativo predador e seleção sexual (Bisazza et
para a lateralização em Rhinella jimi al., 1998). Deste modo,
pode estar atrelado ao baixo número comportamentos lateralizados podem
de repetições realizadas, bem como ao ser dependentes do tipo de estímulo
número de indivíduos amostrados. ambiental oferecido que determina a
Malashichev (2006), ao estudar preferência unidirecionada do uso de
Ceratophrys ornata, encontrou uma determinadas partes do corpo.
resposta unidirecionada utilizando
entre sete a 10 repetições e um
número de 40 indivíduos. Agradecimentos

Apesar do presente estudo não Agradecemos aos professores e colegas


ter constatado de forma significativa a do PPG em Ecologia da UFRN, em
lateralização em Rhinella jimi aos níveis especial ao professor Gindomar
populacional e individual, houve uma Santana pela orientação. Ao professor
39
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Alexandre Vasconcellos e ao colega IBAMA. 2004. Plano de Manejo da ESEC


Guilherme Mazzochini pelo auxílio nas do Seridó.
análises estatísticas. Aos funcionários
Malashichev, Y. B. & Wassersug, R. J.
da ESEC-Seridó pelo apoio durante todo
2004. Left and right in the
o curso de campo.
amphibian world: which way to
develop and where to turn?
BioEssays. 26: 512–522.
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and Amphibians. Neuroscience
and Biobehavioral Reviews. 22(3): Robins, A., Lippolis, G., Bisazza, A.,
411–426. Vallortigara, G. & Rogers, l. J.
1998. Lateralized agonistic
responses and hindlimb use in
toads. Animal Behaviour. 56:
875–881.
40
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

EFEITO DE Poinceianella pyramidalis NO RECRUTAMENTO DE ESPÉCIES LENHOSAS E


HERBÁCEAS

PHOEVE MACARIO, ANA CLÉZIA S. DE MORAIS, LAURA MARTINA FERNANDEZ E GUILHERME


GERHARDT MAZZOCHINI

Introdução exercer sobre a outra (Maestre et al.,


2009). Desvendar como diferentes
As interações entre plantas são
espécies colonizadoras respondem à
consideradas como importantes
presença de espécies pioneiras é
determinantes da distribuição de
importante para entender como as
indivíduos na escala local, podendo
interações entre plantas podem
influenciar também a ocorrência de
estruturar comunidades em sucessão.
espécies na escala regional (Huston,
1999). Essas interações podem ser Em ambientes áridos e semi-
distinguidas em negativas áridos do mundo, o sombreamento por
(competição), quando a presença de adultos é o principal mecanismo
um indivíduo inibe o estabelecimento responsável por interações positivas
de outros, e em positivas (facilitação), em plantas (Brooker et al., 2007). Esse
quando a presença de um indivíduo sombreamento diminui a
promove o estabelecimento de outros evapotranspiração do solo e das
(Brooker et al., 2008). plantas abaixo dos adultos,
aumentando a chance de sobrevivência
A competição em plantas
das plântulas (Miriti, 2007). O clima na
geralmente está associada à redução
caatinga é semi-árido e durante seis
de um recurso limitante por alguma
meses a pluviosidade é muito baixa
espécie com alta habilidade
com médias anuais inferior a 700 mm,
competitiva. Já a facilitação pode estar
portanto, o principal recurso limitante
associada ao aumento de um recurso
é a água (Ibama, 2004). No entanto,
limitante para alguma espécie por
trabalhos que investigam interações
outra ou pela amenização de algum
positivas entre plantas nesse
outro estresse ambiental. Esses dois
ecossistema são escassos e o
processos não atuam separadamente
entendimento desse tipo de interação
na estruturação das comunidades
pode revelar mecanismos importantes
vegetais e o balanço entre interações
para a estrutura das comunidades
positivas e negativas pode depender de
vegetais da Caatinga.
diversos fatores (Callaway & Walker,
1997). Desses fatores, os diferentes A Poincianella pyramidalis
requerimentos de recursos das (Fabaceae), também conhecida por
espécies podem determinar a “catingueira”, é uma espécie pioneira
influencia que uma espécie pode presente também nos estágios tardios
41
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

de sucessão. Essa espécie possui A área escolhida para o estudo


fenologia particular, perdendo as folhas se encontra em estágio avançado de
mais tardiamente quando começa o sucessão. Nesta área foram escolhidos
período seco em relação às outras oito indivíduos de catingueira a esmo,
espécies, sendo que alguns indivíduos sendo que quando havia um
por vezes não perdem as folhas. Nesse agrupamento de indivíduos apenas um
mesmo sentido, quando começa o foi escolhido e o próximo foi procurado
período de chuvas, essa espécie é uma distante do agrupamento. Para cada
das primeiras a produzir folhas. indivíduo de catingueira, quatro
Portanto, o tempo de sombreamento parcelas de 1 m² foram dispostas sob a
abaixo da copa da catingueira é maior copa distantes 50 cm do tronco em
do que nas outras espécies. direções opostas. Outras quatro
Adicionalmente, essa espécie também parcelas com a mesma área distantes 1
é uma fixadora de nitrogênio, recurso m da copa foram amostradas seguindo
limitante na maioria das comunidades as direções das parcelas estabelecidas
vegetais terrestres (Vitousek & sob a copa da árvore. Dentro de cada
Howarth, 1991). Isso torna essa espécie parcela foram morfotipados e contados
uma potencial facilitadora do todos os indivíduos de plantas menores
recrutamento de outras. que 1,30 m de altura. Todos os
morfotipos também foram
O objetivo desse trabalho foi
categorizados de acordo com sua forma
avaliar o efeito da Poincianella
de crescimento (herbáceas, lenhosas e
pyramidalis sobre a regeneração abaixo
trepadeiras). Para cada indivíduo de P.
de sua copa. Foi previsto que a
pyramidalis foi calculada a riqueza e
densidade de indivíduos e a riqueza de
densidade sob e fora da copa
espécies será maior abaixo da copa da
agrupando os resultados das quatro
P. pyramidalis que no seu entorno.
parcelas respectivas.
Material e Métodos
Para avaliar o potencial
O estudo foi realizado na facilitador da catingueira, foi calculada
Estação Ecológica do Seridó (ESEC- a diferença média da densidade de
Seridó), município de Serra Negra do indivíduos e número de espécies das
Norte, Rio Grande do Norte, Brasil. A parcelas sob e fora da copa para
unidade tem uma área de 1.166,38 ha e herbáceas, lenhosas e trepadeiras
está inserida no domínio da Caatinga. O separadamente. Para testar a
clima dominante é semi-árido com significância dos resultados, foi
temperaturas médias anuais variando realizado um modelo nulo com 10.000
entre 22 e 33 graus e índices simulações, onde em cada simulação os
pluviométricos médios de 497 mm por dados originais foram embaralhados e
ano (Ibama, 2004). as diferenças médias calculadas e
comparadas com a diferença
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observada. As simulações foram abaixo da copa da P. pyramidalis do


realizadas no software estatístico R. que fora dela (p = 0,0316 e p = 0,0034,
respectivamente; Figura 1 A e B; Tabela
Resultados
1). Porém, para as herbáceas foi
Foram encontrados 837 encontrado um resultado oposto, onde
indivíduos e 46 morfotipos de plantas, a densidade de indivíduos e de
sendo 25 herbáceas, 16 lenhosas e morfotipos foi maior fora da copa da P.
cinco trepadeiras. pyramidalis (p=0,0237 e p=0,0105,
respectivamente; Figura 1 C e D). Para
De acordo com o esperado, a as trepadeiras a densidade de
densidade de indivíduos e o número de indivíduos e morfotipos foi similar sob e
morfotipos de lenhosas foram maiores fora da copa da P. pyramidalis.

A B

D
C

Figura 1. Valores observados sob e fora da copa de P. pyramidalis. A) Densidade de indivíduos de lenhosas.
B) Número de morfotipos de lenhosas. C) Densidade de indivíduos de herbáceas. D) Número de morfotipos
de herbáceas. As ligações entre os pontos representam os pares de tratamentos.
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Tabela 1 – Diferença média e intervalo sobrevivência das plântulas (Hastwell &


de confiança da densidade de Facelli, 2003). Adicionalmente, a
indivíduos e morfotipos abaixo da copa habilidade da catingueira de fixar
de P. pyramidalis e fora da copa. nitrogênio no solo pode estar
beneficiando o recrutamento das
Densidade lenhosas sob sua copa.
Número de
Grupos de
espécies Por outro lado, as herbáceas são
indivíduos
influenciadas negativamente pela
Lenhosas 3,0 + 2,1 1,5 + 1,2
presença da P. pyramidalis. Esse
Herbáceas -31,1 +18,8 -4,1 + 2,5
resultado foi o oposto ao esperado,
Trepadeiras -1,0 + 2,9 0 + 1,1
pois esse grupo de plantas necessita de
grande quantidade de nitrogênio por
possuir acelerada taxa de crescimento
(Grime et al., 1997). Isso pode estar
Discussão acontecendo devido à maioria das
Os resultados demonstram que a plantas desse grupo também exigir um
regeneração abaixo da copa da ambiente com alta intensidade de luz
Poinceianella pyramidalis é diferente para sobreviver, e por isso possuem
do encontrado fora de sua copa. No adaptações para suportar condições
caso das lenhosas, essa influência foi com baixa disponibilidade de água
positiva, em concordância com o (Valladares & Niinemets, 2008).
previsto, indicando um possível efeito Possivelmente o efeito positivo da
de facilitação da catingueira para esse fixação de nitrogênio não compensa o
grupo de plantas. O sombreamento efeito negativo do sombreamento
prolongado abaixo das copas da proporcionado pela catingueira.
catingueira pode melhorar o De acordo com esses resultados,
microclima local, aumentando a fica evidenciado que P. pyramidalis
sobrevivência das lenhosas durante o pode ser uma espécie importante na
período de escassez de chuva. A estruturação espacial da comunidade
maioria dos estudos que demonstraram de plantas da Caatinga. As condições
um efeito de facilitação foi realizada proporcionadas pela catingueira filtram
em regiões com baixa pluviosidade, a composição de espécies capazes de
sendo o principal mecanismo o regenerar sob sua copa. Isso indica que
sombreamento proporcionado pelos a P. pyramidalis pode acelerar o
adultos, beneficiando indivíduos mais processo de regeneração da Caatinga,
jovens (Callaway, 2007). A redução da sendo uma espécie importante para a
temperatura do solo e taxas de recuperação de áreas degradadas desse
evapotranspiração podem compensar domínio.
os efeitos negativos da redução dos
níveis de luz, aumentando a
44
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Agradecimentos Huston, M.A. 1999. Local process and


Agradecemos ao professor regional patterns: appropriate scales
Alexandre Vasconcellos pela sugestão for understanding variation in the
do tema escolhido e orientação no diversity of plants and animals.
trabalho. Ao professor Mauro pelas Oikos, 86: 393-401
sugestões que melhoraram o conteúdo Ibama. 2004. Plano de Manejo da ESEC
do manuscrito. Ao amigo Gustavo Brant do Seridó.
por ceder material e a todos que fazem
Maestre, F.T; Callaway, R.M.;
parte da ESEC Seridó.
Valladares, F.; Lortie, C.J. 2009.
Referências Refining the stress-gradient
hypothesis for competition and
Brooker, R. W.; Maestre, F. T.; facilitation in plant communities.
Callaway, R. M.; Lortie, C. L. et al. Journal of Ecology, 97: 199-205
2008. Facilitation in plant
Miriti, M. 2007. Twenty years of
communities: the past,the present,
changes in spatial associations of
and the future. Journal of Ecology
community structure among desert
96: 18 – 34.
perennials. Ecology 88: 1177-1190.
Callaway, R.M. & Walker, L.R. 1997.
Valladares, F. & Niinemets, U. 2008.
Competition and facilitation: a
Shade tolerance, a key plant feature
synthetic approach to interactions
of complex nature and
in plant communities. Ecology 78:
consequences. Annual reviews in
1958-1965.
ecology, evolution and systematics.
Grime, J.P., Thompson, K., Hunt, R., 39, 237-257.
Hodgson, J.G. et al. 1997.
Vitousek, P. M., & Howarth, R. W. 1991.
Integrated screening validates
Nitrogen limitation on land and in
primary axes of specialization in
the sea. How can it occur?
plants. Oikos 79: 259-281.
Biogeochemistry, 13:87–116.
Hastwell, G.T. & Facelli, J.M.. 2003.
Differing effects of shade-induced
facilitation on growth and survival
during the establishment of a
chenopod shrub. Journal of Ecology
91: 941–950.
45
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

ORIENTAÇÃO DE BORBOLETAS MIGRATÓRIAS NO SEMIÁRIDO BRASILEIRO

LUCAS VIEGAS, PEDRO DE F. CAPISTRANO, SILVANA MASCIADRI E HONARA MORGANA

Introdução existência de padrões na orientação


de movimento das borboletas
Navegação denota a forma de
Aphrissa statira e Ascia monuste e
orientação a longa distância pelos
estimar o padrão de atividade ao
animais (Oliveira et al. 1998). A
longo do tempo. Apontamos também
capacidade de navegação dos
uma relação entre as condições
organismos migratórios é de extrema
climáticas (nublado ou aberto) com a
importância para o alcance de um
abundância de borboletas, assim
determinado destino. Sabe-se que o
como a direção do vento com o
campo magnético da Terra afeta a
deslocamento dos indivíduos.
orientação de diversos organismos,
como a borboleta monarca Danaus Metodologia
plexippus. Apesar de muitas espécies
O estudo foi realizado na
de borboletas serem migrantes
Estação Ecológica do Seridó (ESEC-
conhecidos, até hoje o mecanismo de
Seridó), localizada no município de
orientação diária ou durante
Serra Negra do Norte/RN (6° 35'° S e
períodos migratórios ainda é pouco
37° e 15' W). Sua vegetação é um
conhecida (Oliveira et al., 1998).
mosaico de arbustos espinhosos e
A família Pieridae, florestas sazonalmente secas (Leal et
cosmopolita, compreende mais de al. 2005), típicas da região semi-árida
1000 espécies, sendo onde o estudo foi conduzido.
predominantemente tropical. Os
Foi observado o ângulo, em
pierídeos voam em áreas abertas e
relação aos pontos cardeais, do vôo
visitam flores para a obtenção de
das duas espécies de borboletas. As
néctar.(DeVries, 1987) Os gêneros
observações foram realizadas em
migratórios mais bem conhecidos das
uma trilha ao longo do açude
áreas tropicais são Ascia e Phoebis
próximo a sede da ESEC. A trilha
(Oliveira 1990). Borboletas
apresenta eixo NE-SW, com açude a
migratórias aparecem justamente
NW, vegetação arbórea nas
depois do início da estação chuvosa
extremidades NE/SW e campo aberto
e, no hemisfério norte, apresentam
a SE (Fig. 1). Dois pontos amostrais
direção predominantemente Sul -
foram escolhidos para obtenção dos
Sudoeste (Oliveira et al., 1998).
ângulos de vôo dos lepidoptera, um a
O presente trabalho tem NE e outro a SO. Cada ponto
como objetivos investigar a amostral foi composto por duas
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

duplas de observadores. Avaliou-se o 360 graus ou se a distribuição destes


ângulo da direção de vôo observado é tendenciada para um ou mais
para cada indivíduo em quatro pontos do círculo (Mardia & Jupp,
períodos amostrais de 40 minutos de 200; Batschelet, 1981).
uma manhã (7:45, 8:45, 9:45 e
10:45). Ao longo de cada período foi
avaliado a direção do vento e as
condições de tempo (nublado ou
aberto). Após cada período de Resultados
amostragem de ângulo foi realizado
Foram feitas 122 observações
um censo visual das duas espécies de
de ângulo de vôo de A. monuste (88
borboletas durante 20 minutos.
ponto no SO e 34 ponto no NE) e 89
Todos os indivíduos dentro do campo
observações de A. statira (31 ponto
de visão dos observadores foram
no SO e 58 ponto no NE). A direção
contados.
do vento permaneceu NO durante
todo experimento. O céu
permaneceu nublado no meio da
manhã (8:45-10:25).

Tabela 1- Resultado dos


testes de Rayleight e Rao para os dois
pontos de coleta. Valores
Figura 1. Ângulo de desaparecimento
significativos em negrito.
visual por indivíduo em relação aos
pontos cardeais (note os pontos NE e
Teste Ascia Aphrissa
SO pela rosa dos ventos).
estatístico monuste statira
Para análise dos dados de Ponto
Rayleigh (Z) 1,95 6,75
direcionalidade dos vôos foi utilizado SO
Rayleigh (p) 0,14 8,75x10-4
o programa Oriana v.3 (Kovach,
Rao (U) 241 191,93
2009). As espécies foram analisadas
Rao (p) < 0.01 < 0.01
separadamente. Foi realizado o Teste Ponto
de Rayleigh para determinar se o Rayleigh (Z) 1,89 20,30
NE
vetor médio angular de Rayleigh (p) 0,15 1,52x10-9
deslocamento é significativo (Fisher, Rao (U) 155,88 207,93
1993; Zar, 1998; Mardia & Jupp, Rao (p) < 0.05 < 0.01
2000) e o Teste de Rao para avaliar a
homogeneidade da distribuição
Como os dois pontos de
angular dos dados, ou seja, se os
coleta apresentaram resultados
ângulos de vôo das borboletas são
similares para os dois testes
igualmente distribuídos dentro dos
47
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

estatísticos em ambas as espécies,


(Tabela 1) os dados das duplas foram
analisadas em conjunto. Não houve
um vetor médio dominante para A.
monuste no teste de Rayleigh
(Z=0,904, p=0,405), o qual explica
apenas 0,08% dos deslocamentos
angulares (µ= 161,77°; r= 0,086). Já
em A. statira o vetor médio foi
significativo (Z=23,145; p=8,9x10-¹¹) e
explicou 51% da variação dos dados
(µ= 174,161°; r=0,51). O teste de Rao
mostrou que os ângulos de vôo de
ambas as espécies são diferentes de
um padrão homogêneo (A. monuste,
U=238,72, p<0,01; A. statira,
U=205,79; p<0,01), mostrando uma
unidirecionalidade para A. monuste
(fig. 2A) e uma bidirecionalidade para
A. statira (fig.2B).
A abundância total das duas Figura 2 –Distribuição dos ângulos
espécies foi de 226 (NA. monuste=153; de vôo das duas espécies estudadas.
NA. statira= 73) plotadas em relação aos As linhas perpendiculares identificam
períodos de contagem dessas os pontos cardeais. A linha restante
espécies mostra sua variação durante mostra o ângulo do vetor médio e o
o período matinal e em relação às erro padrão. A) Ascia monuste. B)
condições do tempo (nublado ou de Aphrissa statira.
sol aberto).

Observa-se no gráfico que


abundância das duas espécies variou
ao longo do intervalo de
amostragem, sendo que a A.monuste
apareceu mais vezes no início e fim
da manhã, com uma diminuição no
meio da manhã. Enquanto A.statira
diminuiu ao longo da manhã. (Fig 3).
48
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

statira (S-SE), o que sugere que o


vento não interferiu no seu padrão
de deslocamento. Não parece que o
vento interferiu no padrão
bidirecional de A. monuste.

O padrão de atividade das


borboletas foi diferente dos
resultados obtidos por Oliveira et al.
(1998) com outras Aphrissa no
Panamá. No nosso caso, a maior
Figura 3. Contagem de indivíduos de atividade ocorreu nas primeiras
borboleta migratória (As= Aphrissa horas da manhã, enquanto Oliveira
startira e Am= Ascia monuste) ao et al. (1998) relataram o maior pico
longo de 4 intervalos de tempo (Os de atividade ao meio dia.
horários para os intervalos Considerando a ectotermia das
[INTERVALO$] são 8:45, 9:45, 10:45 e borboletas,. Isto pode estar
11:45, respectivamente). relacionado às condições climáticas
do Semi-Árido, diferentes da floresta
Discussão
tropical. Talvez corroborando com a
Não se evidenciou um padrão afirmação de Oliveira (1990), onde o
direcional em A. monuste como em calor excessivo pode limitar a
A. statira, sendo a primeira com um atividade de vôo de alguns pierídeos,
padrão de deslocamento bidirecional e explicando a relação negativa de A.
e a última unidirecional. O statira ao longo da manhã. A baixa
comportamento bidirecional de A. abundância de A. monuste no meio
monuste provavelmente está da manhã (8:45-10:25) relaciou-se ao
relacionado com a forma da céu nublado. Mais uma vez a
passagem onde os estudos foram ectotermia desses organismos deve
feitos. Como o elemento era explicar o padrão encontrado para A.
claramente linear, os dados mostram monuste.
que as borboletas basicamente
Ao padrão encontrado nesses
usavam esta passagem com uma
Pierídeos, em um estudo inédito em
espécie de corredor. Por outro lado,
área de semi-árido, seria importante
A. statira claramente apresentou um
implementar outras abordagens para
deslocamento S-SE, evidenciando um
melhorar o entendimento do
possível comportamento migratório,
comportamento migratório e de
similar àquele descrito por Oliveira et
orientação destas espécies, tais como
al. (1998) no Panamá. Vale destacar
a utilização de isótopos estáveis (δD
que o vento apresentou uma direção
e δ13C) para verificar migração
(NW) contrária à direcão de vôo de A.
(Hobson et al.,1999) ou
49
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

experimentos testando orientação Leal, I. R., Silva, J.M.C., Tabarelli, M.,


solar e magnética destes no Lacher jr., T. E. 2005. Mudando o
Hemisfério Sul. curso da conservação da
Agradecimentos biodiversidade na Caatinga do
Nordeste do Brasil.
Ao Prof. Márcio Zikán pela Megadiversidade 1:1
orientação, por sua disponibilidade
Kovach, W.L., 2009. Oriana – Circular
para ajudar e, principalmente, pela
Statistics for Windows, v3.
paciência. À Tanagra pelo valioso
Kovach Computing Services,
auxílio com os testes estatísticos. E à
Pentraeth, Wales, U.K.
toda equipe da ESEC-Seridó pela
acomodação. Mardia, K.V., Jupp, P.E., 2000.
Statistics of directional data. 2nd
Referências Edition. John Wiley & Sons,
Batschelet, E., 1981. Circular statistics Chicester.
in biology. Academic Press, Oliveira, E. G., 1990. “Orientação de
London. vôo de lepdópeteros migratórios
Fisher, N.I., 1993. Statistical analysis na região de Carajás, Pará”.
of circular data. Cambridge Dissertação de Mestrado.
University Press, Cambridge. Universidade Estadual de
Campinas, São Paulo.
Hobson, K. A., Wassenaar, L. I.,
Taylor, O. R., 1999. Stable Oliveira, E.G., Srygley, R. B., Dudley,
isotopes (δD and δ13C) are R., 1998. Do Neotropical Migrant
geographic indicators of natal Butterflies Navigate Using A Solar
origins of monarch butterflies in Compass? The Journal of
eastern North America. Oecologia Experimental Biology. 201, 3317–
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Jones, D. S., Macffaden, B. J. 1982. DeVries, P.J. 1987. The utterflies of


Induced magnetization in the Costa Rica and their natural
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plexippus (Insecta, Lepidoptera) press, , Oxford.
The Journal of Experimental Zar, J.H., 1998. Biostatistical Analysis.
Biology 96: 1-9. 4th Edition. Prentice Hall, New
Jersey.
50
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

ESTRATÉGIAS DE VIDA EM DIFERENTES HABITATS E GUILDAS TRÓFICAS DA


COMUNIDADE DE AVES NA CAATINGA, SERRA NEGRA DO NORTE, RN

ADRIANA PELLEGRINI, TANÁGARA FALCÃO, NÍCHOLAS SEBASTIAN E GUSTAVO BRANT

Introdução semi-dependentes, sendo que na


Caatinga, muitas espécies são
O processo de sucessão
residentes (Silva et al. 2003). Assim,
secundária em áreas fragmentadas
as intervenções humanas afetam
pode criar novos habitats devido à
significativamente as espécies de
mudança das condições ambientais e
aves nos diferentes habitats, pois
bióticas, como maior entrada de luz e
transformam florestas primárias em
a introdução de espécies vegetais de
matas secundárias (Marine e Garcia,
sucessão iniciais mais adaptadas a
2005).
estes ambientes. A mudança na
As guildas tróficas são
composição das espécies de fauna
formadas por espécies que utilizam
pode estar associada a estes novos
recursos alimentares similares e
habitats criados após o
podem apresentar competição ou
desmatamento (Paine, 1966).
não (Begon, 2006). Dependendo dos
Atualmente, a Caatinga possui em
caracteres morfológicos e da
torno de 50% de sua vegetação
similaridade filogenática entre as
desmatada e as áreas de sucessão
espécies, as forças ecológicas que
secundária podem manter alta
atuam nas guildas podem ser de filtro
riqueza de espécies, de acordo com a
ambiental ou de competição inter-
hipótese do distúrbio intermediário,
específica (Cooper et al., 2008).
que postula que a diversidade de
espécies será maior em níveis
O presente trabalho teve
intermediários de distúrbio (Osman,
como objetivos: (i) comparar a
2008).
riqueza e abundância de aves em
Ao contrário do que se
dois ambientes de Caatinga: mata
pensava na década de 70, a Caatinga
fechada e capoeira aberta; (ii)
possui fauna própria e conta com
caracterizar as espécies de acordo
aproximadamente 510 espécies, das
com seu status migratório e de
quais 3% são endêmicas (Silva et al.
habitat; (iii) associar características
2003). As espécies de aves da
morfométricas com as guildas desse
Caatinga podem ser classificadas
grupo.
segundo seu status, como residentes
ou migratórias e, também, segundo
sua dependência da floresta, como
independentes (associadas à
vegetações abertas), dependentes ou
51
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Material e Métodos Análises estatísticas

Locais de coleta Para a comparação da riqueza


e abundância nos diferentes locais foi
A amostragem da
realizado um modelo linear
comunidade de aves foi feita em dois
generalizado com distribuição de
habitats localizados na Estação
Poisson para corrigir o viés
Ecológica do Seridó (ESEC) durante a
proveniente do baixo número de
estação chuvosa.
indivíduos coletados na área de
- Capoeira: habitat de sucessão mata. As medidas morfométricas dos
secundária com presença de plantas indivíduos (peso, bico e asa) foram
herbáceas e pequenos arbustos com relacionadas com suas guildas
características de estágios utilizando MANOVA. As espécies
sucessionais iniciais; foram categorizadas, de acordo com
os critérios de Silva et al. (2003), mas
- Mata: características de estágios com adaptações em: (a) migratórias,
sucessionais intermediários ou (b) residentes anuais e (c) residentes
tardios e dominância de plantas temporárias, e também em (d)
lenhosas e arbustos de médio porte. independentes, (e) dependentes ou
(f) semi-dependentes de áreas de
Captura
floresta. A análise e os gráficos foram
As capturas foram feitas com feitos utilizando-se o programa R
quatros redes de neblina em cada 2.10.1 (R core development team
habitat (capoeira e mata). Cada rede 2009)
media 12 x 3m, cinco bolsas, malha
Resultados
19 mm.
Foram capturados 67
As redes permaneceram
indivíduos, pertencentes a 24
abertas das 5:45 h às 12:45h, com
espécies (Tabela 1) e distribuídos em
revisões a cada hora, totalizando sete
12 famílias (Figura 1).
revisões em cada ambiente. Após
cada revisão, os indivíduos O resultado do GLM com
capturados foram identificados por distribuição de Poisson mostrou que
guias de campo (Perlo, 2009). Em há maior riqueza (z= -4,33; gl. 7,1;
seguida foram medidas três p<0,001) e abundância (z= -5,187;
características morfométricas com gl.=7,1; p<0.001) na área aberta
pesolas (peso), paquímetro digital (Figuras 2 e 3). Apesar da diferença
(tamanho do cúlmen exposto) e entre estas duas áreas, muitas
régua (asa) para analisar se há espécies encontradas na mata
relação com as guildas. possuem semi-dependência florestal
(57,1%), ou seja, ela também utilizam
habitats mais abertos. Enquanto a
52
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

maior parte das espécies


encontradas na capoeira (66,7%)
independentes da floresta (Tabela 2).

Tabela 1. Frequência das


espécies identificadas na
comunidade de aves na ESEC do
Seridó.

Espécie Freq. Figura 1 Riqueza de espécies por


Agelaioides fringillarius 7 família na comunidade de aves em
Aratinga cactorum 3 dois habitats (capoeira e mata) ESEC-
Certhiaxis 3 Seridó.
cinnamomeus
Chlorostilbon lucidus 2

12
Coccyzus 3

10
riqueza de espécies
mellocoryphus
8
Columbina picui 3
6
4

Columbina squammata 7
2

Columbina talpacoti 12
0

Coryphospingus 2 cap mata

pileatus habitat

Cyclarhis gujanensis 4
Figura 2. Boxplot da riqueza de
Furnarius leucopus 1
espécies entre os habitas de capoeira
Leptotilla vereaux 1
e mata.
Myiarchus tyrannulus 2
Myiodinastis 1
20

maculatus
15
abundância de espécies

Paruaria dominicana 1
Pitangus sulphuratus 1
10

Sinallaxis frontalis 3
5

Tapera naevia 1
0

Taraba major 1 cap mata

Todirostrum cinereum 2 habitat

Troglodytes musculus 3
Figura 3. Boxplot da abundância das
Turdus amaurochalinus 1
espécies entre os habitats de
Turdus rufiventris 2
capoeira e mata
Volatinia jacarina 1
53
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Tabela 2. Distribuição dos tipos de


migração (%) e dependência da

80
floresta (%) das espécies de aves

60
entre os habitat de capoeira e de
mata.

peso (g)

40
Habit Migração Dependência

20
at floresta
RA RT MI IN SE DEP

0
10 15 20 25
G D MI bico (mm)

Cap 95. 3.3 1.7 66. 30. 3.3 Figura 4 Distribuição das guildas
0 7 0 alimentares da comunidade de aves
Mata 42. 57. 0.0 14. 57. 28.6 em relação as medidas
9 1 3 1 morfométricas de peso e bico. O
RA=Residente anual; RT= residente cruzamento das linhas tracejadas
temporário; MIG= migração; indica as medianas do intervalo de
IND=independente; SEMI=semi- valores de bico e peso. As guildas
dependente; DEP=dependente. tróficas no mesmo quadrante
indicam estrutura fenotípica
As variáveis morfométricas de agrupada. Legenda: ● artrópode; ○
peso, cúlmen exposto e asa foram frugívoro; ▲ granívoro; ∆
relacionadas por meio da MANOVA insentívoro; ■ nectarívoro; □ onívoro.
com as guildas mais representativas Azul: Turdidade; Vermelho:
(onívoros, insentívoros e granívoros) Columbina sp. (Columbidae); Verde:
e teve uma diferença significativa Leptotilla vereaux (Columbidae).
(F=3,12; g.l.= 4; p=0,0167). A Figura 4
ilustra o gráfico de dispersão dos
caracteres de peso e cúlmen exposto
Discussão
(bico) com todas as guildas tróficas
de aves encontradas na amostra. A amostragem de um dia da
comunidade de aves na ESEC
apresentou 24 espécies, sendo que
destas, apenas uma ocorreu
exclusivamente na área de mata. A
maior riqueza e abundância de aves
em áreas de capoeira podem ser
explicadas pela hipótese do distúrbio
intermediário (Osman, 2008). Porém,
para confirmar esta hipótese é
necessário incluir nos tratamentos
um habitat mais degradado que a
54
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

capoeira para testar o gradiente de para as espécies residentes da


distúrbio. Uma possível explicação Caatinga, 60,5% eram dependentes e
para a diferença na riqueza pode semi-dependentes de florestas.
estar associada com a baixa
A diferença das medidas
percentagem de espécies
morfométricas entre as guildas
dependentes de floresta capturadas,
analisadas (onívoro, granívoro e
com 31,6% (Tabela 2) e, assim, um
insentívoro) ilustra que a morfologia
maior esforço amostral poderia
das aves está relacionada com seu
aumentar a riqueza do habitat de
hábito alimentar. A distribuição dos
mata.
caracteres morfométricos
Percebe-se que os indivíduos corresponde a estrutura fenotípica
encontrados na capoeira possuem da comunidade e pode ser de dois
maior percentagem (95%) de tipos: agrupado ou disperso, e estão
residentes anuais, indicando que a relacionados com as respectivas
riqueza encontrada na capoeira está forças ecológicas, de filtro ambiental
associada com as espécies regionais, e competição (Pausas & Verdu 2010).
que continuam na área de caatinga As guildas que apresentaram
mesmo durante a seca. Os enclaves divergência dos caracteres
úmidos encontrados na caatinga são morfométricos foram as insentívora e
importantes para manutenção da onívora. Esta divergência pode estar
riqueza regional (Silva et al. 2003), associada à repulsão fenotípica
mas no caso aqui estudado as devido à competição por recurso
espécies encontradas na capoeira são dentro das guildas, por famílias ou
adaptadas aos períodos da seca espécie.
prolongada.
Por exemplo, a guilda trófica
Os pulsos de chuva que dos onívoros apresentou caracteres
ocorrem na Caatinga podem explicar dispersos, onde as espécies da
a alta ocorrência de espécies família Turdidae estavam mais
residentes temporárias na área de agrupadas (maior bico e tamanho).
mata (57,1%), que utilizam este No entanto, as espécies da família
habitat para reprodução na época da Columbidae apresentaram variação
chuva. As residentes temporárias por gênero, com o gênero Columbina
encontradas na mata estão mais agregado que o gênero Leptolila
relacionadas com as migrações intra- (Figura 4). Quando os caracteres
regionais, onde espécies da Caatinga morfofuncionais são dispersos em
retornam para enclaves de matas espécies mais próximas dentro da
úmidas e semi-úmidas da região linhagem filogenética, maior será a
durante o período da seca (Silva et força ecológica da competição (Webb
al., 2003). O levantamento de Silva e et al. 2002), como foi o caso entre as
colaboradores (2003) encontrou que espécies do gênero Columbidae. Os
55
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

granívoros apresentaram distribuição Cooper, N., Rodríguez, J. & Purvis, A.


agrupada e pode ser que a principal 2008. A common tendency for
força seja o filtro ambiental. As phylogenetic overdispersion in
outras guildas alimentares tiveram mammalian assemblages.
poucas espécies e não pode ser Proceedings in Biological
verificado um padrão. Sciences, 275: 2031-2037.

Concluindo, a riqueza e Marini, M.A, Garcia, F.I. 2005.


abundância de aves na ESEC do Conservação de aves no Brasil.
Seridó apresentaram diferença entre Megadiversidade, 1: 95-102.
os habitats de capoeira e de mata, no
entanto, mais capturas devem Osman, R.W. 2005. Intermediate
complementar estes resultados. disturbance hypothesis.
Outros estudos devem investigar a Encyclopedia of ecology in:
variação de aves em relação a Jorgensen, S.E., Fath, B.D. Oxford
migração e habitat nas estações de Elsevier.
seca e chuva. Por fim, um maior
Paine, R. T. 1966. Food web
esforço amostral é necessário para
complexity and species diversity.
determinar qual a principal força
The American Naturalist, 100:
ecológica que estrutura a
65-75.
comunidade de aves da ESEC.
Pausas, J.G.; Verdu, M. 2010. The
Agradecimentos
jungle of methods for evaluating
Agradecemos ao Mauro phenotypic and phylogenetic
Pichorim pela orientação e por nos structure communities.
mostrar o mundo ecológico das aves. Bioscience, 60:614-625.
Ao Tonny, pela ajuda com o Cyclarhis
Perlo, B.V. 2009. A field guide to the
gujanensis (vulgo bicada que dói) e
birds of Brazil. Oxford University
ao Guiga pela valiosa consultoria
Press. 465 p.
estatística (sempre necessária). E
Agradecemos à equipe da ESEC- Silva, J.M.C., M.A. Souza, A.G.D.
Seridó pela logística. Bieber & C.J. Carlos. 2003. Aves
da Caatinga: status, uso do
habitat e sensitividade. In: I.R.
Referências Leal, M. Tabarelli & J.M.C. Silva
(eds.). Ecologia e conservação da
Begon, M., Townsend, C.R., Harper, Caatinga. Editora Universitária,
J.L. 2007. Ecologia, de indivíduos Universidade Federal de
a ecossistemas. Porto Alegre: Pernambuco, Recife, Brasil. pp.
Artmed. 752p. 237-273.
56
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Webb, C.O., Ackerly, D.D., McPeek,


M.A., Donoghue, M.J. 2002.
Phylogenies and community ecology.
Annual Reviews Ecology S
57
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

ARTRÓPODES SOB ROCHAS AO LONGO DE UM RIO TEMPORÁRIO NO SEMI-ÁRIDO


NORDESTINO: CO-OCORRÊNCIA EXPLICA A ESTRUTURAÇÃO DESSAS COMUNIDADES?

LEIDE AMARA P. SILVA; RICARDO ALMEIDA EMIDIO; EMERSON DE MEDEIROS SOUSA; TONNY
MARQUES DE OLIVERA JÚNIOR E DAVID LUCAS ROHR

Introdução O presente trabalho teve


como objetivo investigar se as
Compreender os fatores que
comunidades de macroartrópodes
determinam como as comunidades
encontradas sob rochas na calha de
são estruturadas é uma das mais
um rio temporário na ESEC – Seridó
importantes questões na ecologia de
são estruturadas por co-ocorrência.
comunidades. As regras de
Ainda, verificou se a riqueza na
estruturação atentam para capturar
comunidade de artrópodes varia de
processos que podem determinar o
acordo com o perímetro das rochas.
conjunto de comunidades locais a
partir de um pool regional de Metodologia
espécies (Carranza et al., 2010).
Área de estudo
Dessa forma, a estruturação envolve
processos ecológicos e históricos que O estudo foi realizado na
conduzem à construção de Estação Ecológica do Seridó - ESEC
comunidades ecológicas ao longo do (6º35’S e 37º15’W), que possui 1.128
tempo (Lavergne et al., 2010). Assim ha, situada no sudeste do Rio Grande
sendo, Cavender-Bares et al. (2009) do Norte, município de Serra Negra
destacam processos baseados no do Norte e pertencente à
nicho, processos históricos (filogenia mesorregião Seridó. A área está
e biogeografia) e processos neutros. presente no domínio da caatinga,
apresentando vegetação secundária,
Uma das formas pela qual a
caracterizada por grande abundância
estrutura de comunidades pode ser
de espécies arbustivas e arbóreas de
detectada é através da co-ocorrência.
pequeno porte, caracterizando um
Comunidades que apresentam uma
processo de regeneração (Bencke et
co-ocorrência não aleatória podem
al., 2006).
indicar que processos ecológicos,
relacionados à teoria do nicho são Delineamento amostral
importantes na determinação de
quais espécies ocorrem em uma Delimitou-se um transecto de
determinada área. Isto pode estar 600 metros onde foram amostradas
relacionado com processos como 28 rochas escolhidas
competição, facilitação e filtro randomicamente a partir de uma
ambiental (Ellwood et al., 2009). tabela de números aleatórios, com
58
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

pontos de amostragem com fixas e colunas equiprováveis (Gotelli,


intervalos mínimos de 10 metros. 2000), no programa EcoSim.
Como critério para escolha das
Resultados
rochas considerou-se uma medida
mínima de perímetro (mínimo de 100 Em 28 unidades amostrais
cm). O perímetro foi obtido por meio observou-se uma riqueza média de
da medição do contorno da marca 4,85 ±1,69 morfotipos, onde foi
formada no solo, antes ocupada pela encontrado um montante de 47
rocha. morfotipos de artrópodes
distribuídos em 10 grupos (Tabela 1),
Registro da riqueza
onde os mais representativas foram
Após remover a rocha, o solo Formicidae (48 registros de 8
exposto foi observado por três morfotipos), Arachinidae (31
pesquisadores simultaneamente, por registros de 17 morfotipos) e
um período de três a cinco minutos Coleoptera (21 registros de 7
para o registro da riqueza dos morfotipos).
macroartrópodes (morfotipos) sob as
As rochas utilizadas no estudo
rochas. A riqueza foi determinada
apresentaram um perímetro médio
pelos morfotipos encontrados tanto
de 152,25 cm (±34,5; Mín=103 e
no solo abaixo da rocha quanto na
Máx=250 cm), onde observou-se que
região da rocha que estava em
a riqueza de macroartrópodes não foi
contato com o solo. Os mofotipos
influenciada pelo perímetro da área
foram coletados nas primeiras vezes
ocupada pela rocha (R²=0,003;
que ocorreram e foram levados ao
F(1,26)=0,1; p=0,75; Figura 1).
laboratório da ESEC – Seridó para
confirmar a identificação.

Análise de dados

Para testar a relação entre o


perímetro da área ocupada pelas
rochas e a riqueza de morfotipos dos
macroinvertebrados fez-se uma
regressão linear simples, no
programa Systat 12. Para investigar
se a co-ocorrência entre os Figura 1. Regressão entre riqueza de
morfotipos de artrópodes difere do morfotipos com o perímetro da área
acaso, dessa forma indicando ocupada pela rocha.
estruturação de comunidades Também foi constatado que a
utilizou-se um modelo nulo, através comunidade de macroartrópodes
da comparação do C-score observado não é estruturada por processos de
e do esperado ao acaso, com linhas
59
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

co-ocorrência (C-score Aranha7 1


observado=4,16; p=0,54; Figura 2). Aranha16 1
Aranha14 1
Aranha4 1
Aranha8 1
Aranha3 1
Aranha18 1
Aranha2 1
Aranha11 1
Coleoptera6 7
Coleoptera2 7
Figura 2. Distribuição de freqüência Coleoptera5 2
de C-scores obtidos através de 5000 Coleoptera Coleoptera3 2
aleatorizações. A seta representa o Coleoptera1 1
valor do C-score observado (4,16) a Coleoptera7 1
partir dos dados de co-ocorrência, Coleoptera4 1
indicando que esse não é diferente Tisanura2 7
do esperado ao acaso. Tysanoptera
Tisanura1 4
Tabela 1. Riqueza dos morfotipos de Isoptera1 3
Isoptera
macroartrópodes agrupados em Isoptera2 2
ordens encontrados na área de Ortoptera1 2
estudo. Ortoptera 3 1
Ortoptera
Ortoptera4 1
Ordem Morfotipos Riqueza Ortoptera2 1
Formicidae2 20 Hemiptera3 2
Formicidae1 14 Hemiptera Hemiptera1 1
Formicidae6 6 Hemiptera2 1
Formicidae8 3 Blattodea2 1
Formicidae Blattodea
Formicidae3 2 Blattodea1 1
Formicidae7 1 Dermaptera Dermaptera1 1
Formicidae5 1 Diplopoda Diplopoda1 1
Formicidae4 1
Aranha 10 7
Aranha1 5 Discussão
Aranha12 2 A ausência de relação entre
Aranha17 2 perímetro da rocha com a riqueza de
Arachinidae
Aranha6 2 morfotipos é um resultado
Aranha9 2 inesperado, uma vez que a Teoria da
Aranha15 1 Biogeografia de Ilhas afirma que
Aranha13 1 áreas maiores comportam maior
60
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

número de espécies (MacArthur & disponibilidade desse recurso


Wilson, 1967). Isso pode ter ocorrido, facilitaria co-ocorrência aleatória
pois diversos fatores não avaliados baseada na diluição de competição.
possivelmente influenciam a riqueza,
Outra possibilidade para
tais como temperatura, umidade e
explicar a co-ocorrência aleatória
granulometria do solo. No entanto,
seria que o habitat onde os
este não foi o objetivo principal deste
organismos foram encontrados foi
estudo e por isso o desenho amostral
recentemente disponibilizado para
não foi propriamente elaborado para
sua ocupação, pois, apesar das
responder esta questão.
coletas terem sido realizadas no final
Os resultados obtidos do período chuvoso, o córrego onde
demonstraram que as comunidades foram encontrados havia secado há
de macroartrópodes não são pouco tempo. Dessa forma não
estruturadas por co-ocorrência, houve tempo suficiente para a
porém duas hipóteses podem estruturação, sendo a ocorrência de
explicar os padrões observados: alta uma espécie determinada apenas
disponibilidade de potenciais locais pela colonização estocástica do
para ocupação por esses organismos habitat.
e tempo para estruturação dessas
A partir da publicação de
comunidades.
Hubbell (2001) processos neutros
A disponibilidade de habitats têm ganhado força na estruturação
para os diversos organismos de comunidades. Nessa teoria neutra
encontrados na área de estudo pode a presença ou ausência de espécies
explicar a ausência de competição em uma determinada área é
entre eles, baseado nos mecanismos determinada unicamente por
propostos pela teoria da distribuição dispersão, extinção e especiação,
livre ideal, uma vez que uma maior considerando a equivalência
disponibilidade de recursos promove ecológica entre indivíduos e,
a distribuição homogênea de consequentemente, entre espécies.
organismos co-específicos dentro de Em alguns casos, como no presente
uma determinada área (Alcock, estudo, que avaliam estruturação em
2001). Esse argumento adotado ao menores escalas, esses fatores
nível de ecologia de indivíduos pode podem ser adaptados para dispersão,
ser extrapolado para níveis mortalidade e natalidade
superiores, tal como ecologia de estocásticas. Esse cenário possibilita
comunidades. Nessa abordagem, que as comunidades de
diversas espécies podem convergir macroartrópodes em escala local,
para o mesmo tipo de nicho, nesse como sob rochas, sejam explicadas
caso a ocupação de substrato abaixo por modelos neutros.
de rochas. Portanto, uma grande
61
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Agradecimentos Cavender-Bares, J., Kozak, K.H., Fine,


P.V.A., Kembel, S.W., 2009. The
Ao professor Alexandre
merging of community ecology
Vasconcellos pelo auxílio na
and phylogenetic biology. Ecology
identificação dos morfotipos e pelas
Letters 12, 693–715.
sugestões. A Gustavo Brant pela
Ellwood, M.D., Manica, A., Foster, W.
consultoria no uso do EcoSim. Aos
A., 2009. Stochastic and
que fazem parte da ESEC – Seridó.
deterministic processes jointly
Referências structure tropical arthropod
communities. Ecology Letters 12,
Alcock, J., 2001. Animal behavior: an 277-284.
evolutionary approach. Sinauer Gotelli, N.J., 2000. Null model
Associates, Inc, 7 ed, 488. analysis of species co-ocorrence
patterns. Ecology 81, 2606-2621.
Bencke, G.A., Maurício, G.N.,
Hubbell, S.P., 2001. The unified
Develey, P.F., Goerck, J. M. 2006.
neutral theory of biodiversity and
Áreas importantes para
biogeography. Priceton university
conservação de aves no Brasil.
press, Princeton.
Parte I – Estados do domínio da
Lavergne, S., Mouquet, N., Thuiller,
mata atlântica. SAVE Brasil, São
W., Ronce, O., 2010. Biodiversity
Paulo.
and Climate Change: Integrating
Carranza, A., Arim, M., Scarabino, F., Evolutionary and Ecological
Defeo, O. 2010. Coexistence Responses of Species and
patterns of benthic gastropods on Communities. Annual Review of
the Uruguayan shelf. Oikos 119, Ecology Evolution and Systematics
1312–1318. 41, 321-350.
MacArthur, R.H., Wilson, E.O., 1967.
The theory of island biogeography.
Priceton university press, Pr
62
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

orientação III
Projetos com
63
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

DIVERSIDADE DA EPIFAUNA DE ARTRÓPODES DO SOLO SOB DUAS ESPÉCIES DE


ÁRVORES DA CAATINGA

NÍCHOLAS SEBASTIAN, SILVANA MASCIADRI, LAURA MARTINA FERNANDÉZ, BRUNO GAZOLA

Introdução espécie característica e endêmica da


Caatinga, ocorrendo em boa parte do
A macrofauna de solo é
nordeste Brasileiro (Leite et al. 2009),
composta em grande parte por
bem como a Croton sonderianus
artrópodes que habitam o solo da
(Marmeleiro), uma das espécies
floresta e cumprem um papel
vegetais mais bem distribuídas nos
ecológico fundamental na
levantamentos já realizados na
decomposição (Gonzalez & Seastedt,
Caatinga (Santana 2009).
2001). Quando a serrapilheira
depositada no solo é estruturalmente O presente trabalho teve
mais complexa, a abundância de como objetivo investigar se existem
artrópodes tende a ser maior diferenças na diversidade da
(Bultman & Uetz, 1984). Contudo, epifauna da serrapilheria sob as
quando disponível em maiores copas de P. pyramidalis e de C.
quantidades, a qualidade da sonderianus.
serrapilheira (composição de
nutrientes) pode influenciar mais
fortemente a macrofauna do solo Material e Métodos
(Coûteaux et al., 1995). Tanto a
complexidade quanto a qualidade da O trabalho foi desenvolvido
serrapilheira são influenciadas pela na Estação Ecológica do Seridó (ESEC-
riqueza de espécies vegetais do Seridó), no córrego da “Trilha da
ambiente. Caveira”. A ESEC se localiza no
município de Serra negra do Norte,
Na Caatinga, a disponibilidade Rio Grande do Norte, Brasil. Essa
da serrapilheira é geralmente escassa Unidade de Conservação está
e está relacionada à sazonalidade do inserida na Caatinga e possui uma
ambiente, fator que determina área de 1.166,38 ha. O clima do local
diferenças marcantes nas condições é semi-árido com temperaturas
de temperatura e umidade ao longo médias anuais variando entre 22 e 33
do tempo (Leal, 2003). graus e índices pluviométricos
médios de 497 mm por ano (Santana
A Caatinga possui uma
et al. 2009).
fisionomia vegetal diversificada
composta de espécies herbáceas, A área escolhida para o
arbustivas e arbóreas. A Poncianella estudo é dominada por indivíduos de
pyramidalis (Catingueira) é uma
64
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

C. sonderianus com a presença de Resultados


indivíduos de P. pyramidalis
A espécie C. sonderianus
associados. Foram amostrados dez
apresentou uma riqueza da epifauna
indivíduos de cada espécie ao longo
significativamente maior do que P.
de um transecto de 100 metros. A
pyramidalis (F = 5,89; p = 0,029; R2 =
cada dez metros um indivíduo de
0,49) (Fig. 1). Porém, a necromassa
cada espécie era escolhido. A escolha
da serrapiheira nas duas espécies não
teve como critério a não influência de
explicou significativamente a riqueza
outras espécies vegetais
da epifauna (F = 0,41; p = 0,53). Foi
apresentando as copas sobrepostas.
encontrada uma interação
Para cada indivíduo, quatro parcelas
significativa entre as espécies de
de 25x25 cm foram dispostas sob a
árvores e a temperatura
sua copa dentro de um raio de um
influenciando a riqueza de epifauna
metro a partir do caule da planta. A
(F = 5,89; p = 0,029) (Fig. 2). Em C.
serrapilheira dentro dessas parcelas
sonderianus a riqueza foi
foi coletada e reunida em uma
positivamente relacionada com a
amostra. Também foram medidas a
temperatura (F = 5,89; p = 0,029)
temperatura superficial do solo e o
enquanto que em P. pyramidalis esta
peso da serrapilheira. No laboratório
relação foi negativa (F = 3,488; p =
cada amostra foi triada em busca de
0,029)
artrópodes por cinco minutos. Todos
os organismos coletados foram
morfotipados.

Para testar o efeito do tipo de


planta, temperatura e peso da liteira
sobre a riqueza e abundância da
epifauna do solo, foi utilizado um
Moldelo Linear Geral (GLM). A
riqueza e abundância de artrópodes
de solo foram incluídas como
variáveis dependentes. Temperatura
e peso da biomassa coletada foram
incluídos como as variáveis Figura 1. Quadrados mínimos das
independentes. A espécie de árvore medias e variâncias de riqueza da
foi incluídas no modelo como um epifauna entre os tratamentos,
tratamento. A análise foi rodada no Catingueira -C e Marmeleiro -M.
programa Systat.
65
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

detritívora da macrofauna (Monteiro


et al. 2005).

Além disso, a fisionomia


vegetal predominante na área
estudada é composta por C.
sonderianus. As folhas desta espécie,
quando descartadas, secam e se
retorcem de tal forma que
apresentam reentrâncias e
dobramentos. Essa conformação tem
o potencial de oferecer microhabitats
Figura 2. Interação entre a riqueza da
e produzir condições microclimas
epifauna dos tratamentos,
favoráveis para a epifauna do solo.
Catingueira -C e Marmeleiro –M com
Dessa forma, diante de condições
a temperatura do solo.
ambientais adversas, a epifauna pode
A análise de variância procurar por lugares favoráveis para
mostrou que a abundância da se proteger, possivelmente
epifauna não foi influenciada pelas contribuindo para aumentar a
árvores (F = 0,107 ; p = 0,748) e nem riqueza da epifauna local. Por sua
por nenhuma das variáveis vez, as folhas da P. pyramidalis, são
mensuradas. As interações também menores e permanecem planas
não foram significativas com o peso quando secas no solo, oferecendo
de serrapilheira (F = 0,01 ; p = 0,92) um tipo de serrapilheira menos
ou com a temperatura do solo (F = complexa estruturalmente.
3,468 ; p = 0,084).
O fato do peso da
serrapilheira não influenciar na
diversidade da epifauna do solo
Discussão corrobora com o que foi sugerido por
A maior riqueza de epifauna Leal (2003), que afirma que a liteira é
em C. sonderianus pode ser explicada escassa na Caatinga e sustenta uma
por outros fatores não mensurados fauna de solo pouco representativa.
neste trabalho. Os indivíduos dessa Essa tendência se deve ao fato de
espécie possuem um baixo conteúdo que na área estudada a riqueza de
de compostos secundários e espécies vegetais é baixa e dominada
estruturais na folha que as tornam por C. sonderianus. Por isso, não há
mais facilmente utilizáveis pelos uma grande diversidade de
decompositores (Santana, 2005). Por estruturas presentes na liteira que
outro lado, os indivíduos de P. possa favorecer a alta diversidade de
pyramidalis produzem taninos que grupos de artrópodes.
podem desencorajar a ação
66
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Agradecimentos Leite A. V., Machado, I. C. 2009.


Biologia reprodutiva da
Agradecemos a Guilherme
“catingueira” (Caesalpinia
Mazzochio pelo apoio nas análises
pyramidalis Tul.,Leguminosae-
estatísticas e a Gindomar Santana
caesalpinioideae), uma espécie
pela ajuda em campo. Agradecemos
endêmica da Caatinga. Rev. Brasil.
também a toda equipe da ESEC –
Bot., V.32, n.1, p.79-88
Seridó por todo suporte dado ao
Monteiro, J. M., Neto, E. M. F. L.,
curso.
Amorim, E. L. C., Strattmann, R. R.,
Referências Araújo, E. L. & Albuquerque, U. P.
2005. Teor de Taninos em Três
Bultman, T. L. & Uetz, G.W. 1984. Espécies Medicinais Arbóreas
Effect of Structure and Nutritional Simpátricas da Caatinga. R.
Quality of Litter on Abundances of Árvore, Viçosa-MG, v.29, n.6,
Litter-dwelling Arthropods. p.999-1005.
American Midland Naturalist, Santana, J. A. 2005. Estrutura
Vol.111, Issue 1, pp. 165-172. fitossociológica, produção de
Coûteaux, M. M., Bottner, P., Berg, B. serapilheira e ciclagem de
1995. Litter Decomposition, nutrientes em uma área de
Climate and Litter Quality. Tree, Caatinga no Seridó do Rio Grande
vol.10, nº2, 63-66. do Norte. Tese (Doutorado em
González, G., Seastedt, T. R. 2001. Agronomia) – UFPB/CCA-Areia.
Soil fauna and plant litter 184 p.
decomposition in tropical and Santana, J. A. 2009. Padrão de
subalpine forests. Ecology, 82(4), Distribuição e Estrutura diamétrica
pp. 955-964. de Croton sonderianus Muell. Arg.
Leal, I. R. 2003. Diversidade de (Marmeleiro) na Caatinga da
formigas em diferentes unidades Estação Ecológica do Seridó.
de paisagem da caatinga. In: Leal, Revista Verde, v.4, n.3, p. 85 – 90.
I. R., Tabarelli, M., Silva, J. M. C.
2003. Ecologia e Conservação da
Caatinga. Recife : Editora
Universitária da UFPE. pp. 452-
453.
67
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

AVALIAÇÃO DO GRAU DE ASSIMETRIA EM TRÊS ESPÉCIES DE AVES DA FAMÍLIA


COLUMBIDAE NA ESEC-SERIDÓ, NORDESTE DO BRASIL

TONNY MARQUES; ELIANA FARIA DE OLIVEIRA; ANA CLÉZIA SIMPLÍCIO DE MORAIS; LEONARDO
EMMANUEL FERNANDES DE CARVALHO

Introdução capacidade de fuga, o sucesso na busca


do alimento que está relacionada mais
A simetria dos organismos é um
fortemente com aves insetívoras e com
padrão determinado geneticamente
o sucesso reprodutivo (Moller, 1995;
durante as mudanças ocorrentes no
Hovorka & Robertson, 2000). Neste
desenvolvimento ontogenético e
último caso, a simetria está associada a
evolutivo, sendo este padrão
ornamentos sexuais, onde os níveis de
dominante na natureza (Ribeiro, 2009).
AF de tais características morfológicas
O fenômeno populacional da são geralmente maiores do que outras
assimetria flutuante (AF) pode ser características do corpo (Goddard &
definido como um desvio aleatório da Lawes, 2000). Estes altos níveis de AF
simetria bilateral perfeita de uma em ornamentos sexuais refletem na
característica morfológica (Goddard & preferência da fêmea por machos mais
Lawes, 2000). Neste caso, diferenças simétricos.
médias entre os lados esquerdo e
Tendo em vista as influências da
direito tem uma média zero e os dados
AF sobre diversos aspectos do fitness
são distribuídos normalmente.
em aves, o objetivo deste estudo foi
Situações de estresse, causadas avaliar se a variação entre medidas das
por nutrição inadequada devido à falta asas (direita e esquerda) de três
de cuidado parental, por exemplo, espécies de aves da família Columbidae
pode levar a um aumento no nível de (Columbina squammata (Lesson, 1831),
assimetria (Björklund, 1996). Dessa Columbina talpacoti (Temminck, 1811),
forma, um alto nível de assimetria pode Columbina minuta (Linnaeus, 1766))
ser um indicador de pobres condições está relacionada a uma variável de
de alimentação durante o crescimento medida do fitness (peso).
(Björklund, 1996). Assim, espera-se que
o peso possa ser uma medida indireta
do sucesso do indivíduo. Material e Métodos

A assimetria flutuante em asas O estudo foi desenvolvido na


de aves exerce um papel importante Estação Ecológica do Seridó ESEC (UTM
sobre o desempenho aerodinâmico do 0692935, 9273445), localizada no
vôo (Jurd, 2004) e a diversos aspectos município de Serra Negra do Norte, RN.
do fitness do indivíduo, tais como: a A Unidade de Conservação encontra-se
68
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

no domínio da caatinga (Silva et al., quadrado. A partir da relação da área


2003). fotografada com a área do quadrado do
papel milímetrado, foi calculado a área
As espécies estudadas foram: (i)
real de cada asa.
C. squamata, conhecida popularmente
como fogo-apagou, mede cerca de 19 Para definir a assimetria
cm e possui como característica mais flutuante do comprimento da asa flat e
marcante o padrão escamoso de suas da área das asas de cada individuo, foi
penas que ajuda na sua camuflagem; utilizada a equação: AFi=(D-E)/[(D+E)/2]
(ii) C. talpacoti, conhecida como (Anciães & Marini, 2000). Após definida
rolinha-roxa, é uma ave que disputa a AF de cada indivíduo, foi realizada
alimentos e defende territórios usando uma regressão simples para verificar a
uma das asas para dar forte pancadas relação entre AF de cada medida (área
no oponente; e (iii) C. minuta, da asa e comprimento da asa flat) com
conhecida popularmente como rolinha- o peso da ave. Foi utilizada uma Power
de-asa-canela, que vivem em casais a Analysis para os resultados que
maior parte do tempo (Sigrist, 2009). apresentaram uma tendência a
assimetria, com a finalidade de definir
Para captura das aves, redes de
o número de indivíduos necessários
neblina foram instaladas em áreas de
para evidenciar essa variação. Todas as
capoeira no dia 24 de junho às
análises estatísticas foram feitas com o
4h15min. Foram realizadas visitas
programa STATISTICA V7.
periódicas às redes num intervalo de
uma hora entre as amostragens, com
término às 17h15 min. Durante a
Resultados
coleta, apenas indivíduos adultos foram
retirados da rede e colocados em sacos O grau de assimetria da área da
de pano para transporte até o asa de C. squamata não foi
laboratório. significativamente relacionado ao peso
(F1,8=0,0213; p=0,8875;R2=0,0026
Uma vez identificadas às
Figura 1). Essa mesma relação não
espécies, medidas de peso (pesola de
significativa também foi encontrada
50 e 100 gramas) e comprimento das
para AF do comprimento da asa flat
asas (régua de 30 cm) flat, foram
(F1,8=0,1832 ; p=0,6799; R2=0,0223
aferidas a asa esquerda e direita de
Figura 2).
cada indivíduo. Além disso, foram
retiradas fotografias das asas dos
espécimes para calcular a área da asa
através do programa Adobe Acrobat
Professional. Para tanto, foi utilizada a
ferramenta de medição de área e feita
uma estimativa em centímetros
69
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

entanto, houve uma tendência de que


quanto maior a assimetria do
comprimento das asas flat, menor o
peso dos indivíduos. A Power Analysis
indicou que para obter uma relação
significativa seria necessário amostrar
no mínimo 99 indivíduos.

Figura 1. Relação da AF da área da asa


de C. squamata com o peso.

Figura 3. Relação da AF da área da asa


de C. talpacoti com o peso.

Figura 2. Relação da AF do
comprimento da asa flat de C.
squammata com o peso.

O grau de assimetria da área da


asa e do comprimento da asa flat de C.
minuta não foram significativamente
relacionados ao peso (F1,8=0,0605;
p=0,2849; R2=0,0071 F1,8=0,6418; Figura 4. Relação da AF do
2
p=0,2849, R =0,0742 respectivamente). comprimento da asa flat de C. talpacoti
Essas relações não significativas com o peso.
seguiram um padrão similar aos
gráficos das Figuras 1 e 2.
Discussão
Para C. talpacoti, o grau de
assimetria da área da asa e do A assimetria flutuante das
comprimento da asa flat não foram medidas avaliadas (área da asa e
significativamente relacionados ao peso comprimento da asa flat) entre as
(F1,8= 0,9013; p=0,6799; R2=0,1012 espécies da família Columbidae, no
F1,8=1,3136; p=0,2849, R2=0,1410 geral, não está relacionada ao peso. No
respectivamente; Figura 3 e 4). No
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

entanto, C. talpacoti apresentou uma poucos caracteres métricos, ausência


tendência da AF do comprimento da de uma amostragem temporal e da
asa flat responder positivamente ao diferenciação sexual. Tais lacunas
peso, ou seja, quanto maior a podem aumentar o erro dessa medida
assimetria do comprimento da asa, (Almeida, 2003).
menor o peso dos indivíduos,
corroborando com os estudos de
Moller (1995). Isso pode indicar ainda Agradecimentos
que o comprimento da asa flat é uma
medida que detecta melhor as Agradecemos aos professores e colegas
variações de assimetria do que a área do PPG em Ecologia da UFRN, em
da asa. especial ao professor Mauro Pichorin
pela orientação. Ao Guilherme
Situações de estresse são Mazzochini pela consultoria estatística
frequentes no ambiente de caatinga, concedida ao grupo, e aos funcionários
principalmente devido à baixa da ESEC-Seridó pelo apoio durante todo
disponibilidade de recursos (Lorenzon o curso de campo.
& Matrangolo, 2005). Algumas espécies
respondem melhor a tais condições
adversas, podendo adquirir uma maior
Referências
estabilidade no seu desenvolvimento
(Nijhout & Davidowitz, 2003). Dessa Almeida, R. C. V. 2003. Assimetria
forma, nossos resultados sugerem que flutuante em esqueleto de aves
a C. talpacoti apresentou uma Passeriformes do estado de Minas
tendência de maior sensibilidade aos Gerais: aspectos metodológicos e
estressores ambientais afetando a sua implicações sobre a utilização de
simetria. Além disso, questões coleções osteológicas como objeto
comportamentais, tais como o de estudos de variação temporal de
frequente uso de uma das asas por comunidades. Dissertação do
disputa de alimento e defesa de Programa de Zoologia de
território (Sigrist, 2009), podem refletir Vertebrados da PUC-MG. 59p.
na lateralização do uso da asa e,
Anciães, M. & Marini, M. Â. 2000.The
consequentemente, na sua simetria
effects of fragmentation on
morfológica.
fluctuating asymmetry in passerine
O fato das medidas de AF para birds of Brazilian tropical forests.
as espécies estudadas não estarem Journal of Applied Ecology, 37: 1013-
relacionadas ao peso podem refletir em 1028.
falhas da metodologia utilizada,
Björklund, M. 1996. The effect of male
considerando os seguintes aspectos:
presence on the nestling growth and
baixo número de indivíduos
amostrados por espécie, utilização de
71
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

fluctuating asymmetry in the blu tit. Nijhout, H. .F. & Davidowitz, G. 2003.
The Condor, 98: 172-175. Developmental perspectives on
phenotypic instability, canalization
Goddard, K. W. & Lawes, M. J. 2000
and fluctuating asymmetry. In:
Ornament size and symmetry: is the
Developmental Instability Causes
tail a reliable signal of male quality
and Consequences.(M. Polak,ed).
in the red-collared widowbird? The
New York: Oxford.
Auk, 117: 366-372.
Ribeiro, E. M. S. 2009. Mudança de
Hovorka, M. D. & Robertson, R .J. 2000.
simetria, diminuição na área e
Food stress, netling growth, and
assimetria floral alteram a visitação
fluctuating asymmetry.Can.
em Oxalis psoraleoides
Jour.Zoology, 78: 453-459.
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Ambiente. Universidade Federal de
Pernambuco, Fundação de Apoio ao
Desenvolvimento da UFPE,
Conservation International do Brasil,
Fundação Biodiversitas, EMBRAPA
Semi-Árido.
72
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

INFLUÊNCIA DO HEMIPARASITO Phorodendrum sp. (ERVA DE PASSARINHO) NA


DISPERSÃO DE SEMENTES DE Combretum leprosum (MUFUMBO)

ADRIANA PELLEGRINI, PHOEVE MACARIO, LUCAS VIEGAS E GUILHERME MAZZOCHINI

Introdução prejudicar o sucesso reprodutivo da


planta-mãe.
A dispersão de sementes é um
Plantas parasitas podem exercer
fator determinante para o crescimento
efeitos negativos em seus hospedeiros,
das populações vegetais e a
reduzindo sua produtividade e sucesso
distribuição dos indivíduos adultos
reprodutivo, alterando as taxas
(Nathan et al., 2000). A distância que a
fotossintéticas e qualidade dos frutos
semente é capaz de atingir,
ou sementes (Silva & del Rio 1996).
independente do mecanismo de
Phoradendron é um gênero de plantas
dispersão, irá influenciar na
hemiparasitas (que realizam
sobrevivência dos propágulos (Janzen,
fotossíntese) com ampla distribuição,
1970). De acordo com hipótese de
ocorrendo nas Américas do Norte e Sul.
escape (modelo Janzen-Connell), a
Na Caatinga, plantas desse gênero
sobrevivência dos propágulos aumenta
parasitam diversas espécies e, na área
com distância da dispersão da semente,
na Estação Ecológica do Seridó, está
devido à maior competição intra-
freqüentemente associada com C.
específica e predação próximas à
leprosum.
planta-mãe (Harms et al., 2000). Sendo
O objetivo deste trabalho foi
assim, a dispersão das sementes está
avaliar a influência do hemiparasito
diretamente relacionada ao sucesso
Phorodendrum sp. (erva de passarinho)
reprodutivo da planta-mãe.
na dispersão de sementes de C.
A Combretum leprosum é uma
leprosum (mufumbo). Foi previsto que
espécie lenhosa endêmica do domínio
frutos provenientes de galhos
Caatinga, conhecida popularmente
parasitados teriam alas e sementes
como “mufumbo”, sendo uma árvore
morfologicamente alteradas,
comum na região do Seridó (Amorim et
prejudicando sua dispersão pelo vento.
al. 2005). Seus frutos apresentam
estruturas especializadas para se Métodos
deslocarem no ar (frutos alados e
Local e coleta
leves). São dispersas pelo vento
(anemocoria) que determinam a Os indivíduos encontrados ao
distância onde a semente irá cair. longo da trilha para a lagoa do Junco
Portanto, alterações nestas estruturas (ESEC-Seridó) foram selecionados para
podem afetar negativamente a a coleta dos frutos do C. leprosum.
dispersão dos frutos e, assim,

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Foram escolhidos quatro Análises estatísticas


indivíduos parasitados e cinco não
Para testar deslocamento,
parasitados por Phoradendron sp. Nos
largura, comprimento e massa dos
indivíduos não-parasitados, controle
frutos entre os tratamentos (C, CP, P)
(C), cinco frutos maduros foram
foi utilizado o modelo de efeito misto
coletados. Nos indivíduos parasitados
ajustando modelos com os tratamentos
foram coletados cinco frutos de galhos
e modelos somente com interceptos
parasitados (P) e cinco de galhos não
(modelo nulo). Para testar a
parasitados (CP) do mesmo indivíduo.
significância dos tratamentos foram
Ao todo 90 frutos foram utilizados no
realizados testes de razão de
experimento.
verossimilhança, sendo a diferença do
Experimento log da verossimilhança comparada em
uma tabela de χ2. Para analisar a
Cada fruto foi solto cinco vezes
influência das medidas morfométricas
de um mesmo ponto a 1,45m do solo.
no deslocamento dos frutos foi
Abaixo desse ponto projetou-se uma
realizada uma regressão múltipla. As
corrente de vento unidirecional e
análises foram feitas no programa R
horizontal ao solo (dois ventiladores a
2.10.1 (R core development team
0,8m do solo) (Figura 1). Obteve-se o
2009).
deslocamento linear de cada
lançamento a partir do ponto de
soltura e realizou-se uma média para o
deslocamento de cada fruto. As
variáveis independentes ao Resultados
deslocamento (variável dependente)
foram: largura e comprimento dos Muitos frutos não
frutos e massa da semente. desenvolveram semente, com
insucesso de 58% para o controle (C),
28% para os galhos sem parasito (CP), e
50% para os galhos com parasito (P).
Assim, foram utilizados nas análises
apenas os frutos com sementes.
O deslocamento foi diferente
entre os tratamentos, com menor
Figura 1. Experimento do deslocamento médio para os galhos
deslocamento dos frutos do C. parasitados (χ2=19,6; g.l.=2; p< 0,001)
leprosum com o vento. (Figura 2).

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Figura 2. Diferença do deslocamento


(m) entre os tratamentos de galhos
parasitados (P), galhos não parasitados
(CP) e controle (C). Figura 3. Diferença da largura dos
frutos (mm) entre os tratamentos de
A variável morfométrica de galhos parasitados (P), galhos não
comprimento do fruto foi retirada da parasitados (CP) e controle (C).
análise, pois estava correlacionada com
a largura do fruto (r = 0,66). O
resultado demonstrou que somente a
largura do fruto diferenciou entre os
tratamentos (χ2 = 20,6; g.l.= 2 ; p <
0,001), enquanto o massa das
sementes não diferiu (χ2 = 4,64; g.l. = 2;
p = 0,098) (Figura 3).

O resultado do modelo da regressão


múltipla demonstrou que somente a
variável largura do fruto estava
relacionada com o seu deslocamento (F
= 4,71; g.l. = 1,30; p = 0,038) e que a Figura 4. Relação da largura do fruto
variável massa da semente não teve (mm) de C. leprosum com a distância
influência (F = 1,56; g.l. = 1,30; p = percorrida (m) pelo fruto
0,22) (Figura 4). A proporção explicada (deslocamento).
pelo modelo (R2) foi igual a 0,17.
Quando a massa da semente foi
retirada do modelo, a largura da Discussão
semente deixou de explicar o
O parasitismo por
deslocamento dos frutos.
Phoradendrum sp. pode estar
Provavelmente a massa da semente
influenciando negativamente o sucesso
proporciona maior estabilidade do vôo
reprodutivo dos indivíduos de C.
dos frutos.
leprosum. Apesar do parasitismo não

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

ter influenciado a qualidade da estrutura da comunidade vegetal da


semente (massa), ele afetou Caatinga, alterando o balanço das
negativamente a largura dos frutos interações entre as espécies onde
que, com alas menores, tiveram menor indivíduos parasitados podem ter suas
deslocamento. Assim, as sementes de capacidades competitivas diminuídas
C. leprosum nos galhos parasitados (Reid et al. 1994). Os resultados deste
atingiram menores distâncias nos estudo demonstraram que o
testes experimentais. Dessa forma, Phoradendrun sp. também pode afetar
eventos de dispersão de longas a capacidade de dispersão de C.
distâncias podem não ocorrer nos leprosum e, assim, afetar os padrões de
frutos dos galhos parasitados, recrutamento e manutenção de sua
prejudicando a manutenção das população.
populações por diminuição do fluxo
gênico entre populações distantes (Cain
et al., 2000). Agradecimentos
Os padrões de sobrevivência das Agradecemos ao Irmão e Núbia
sementes/plântulas estão diretamente pela disponibilização do ventilador e ao
relacionados com diversos fatores, restante da equipe da ESEC- Seridó pelo
como a qualidade do microhabitat, a apoio logístico.
competição intra e interespecífica e a
herbivoria na plântula (Nathan et al., Referências
2004). Por outro lado, o parasitismo
Amorim, I. L. De; Sampaio, E. V. S. B
pode afetar indiretamente a
& Araújo, E. De Lima. 2005. Flora
sobrevivência dos propágulos, por
e estrutura da vegetação
diminuir a largura dos frutos alados
arbustivo-arbória de uma área de
que, por sua vez, reduz a distância de
Caatinga do seridó, RN, Brasil.
deslocamento dos frutos. Isto pode
Acta botanica brasilica, 19: 615-
causar menor probabilidade de
623.
sobrevivência das plântulas por se
estabelecerem mais próximas à planta- Cain, M.L., Milligan, B.G. & Strand, A.E.
mãe. 2000. Long-distance seed
dispersal in plant populations.
Os parasitas de plantas afetam o
American Journal of Botany, 87:
comportamento e a diversidade de
1217–1227.
herbívoros, polinizadores e dispersores,
principalmente quando há uma seleção Harms, K.E., Wright, S.J., Calderón, O.,
e preferência da planta hospedeira Hernández, A., Herre, E.A. 2000.
(Press & Phoenix, 2005). Esses efeitos Pervasive density-dependent
negativos da Phoradendron sp. sobre recruitment enhances seedling
seus hospedeiros podem ter diversity in a tropical forest.
importantes consequências na Nature, 404: 493–495.

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Janzen, D.H. 1970. Herbivores and the Press, M.C. & Phoenix, G.K. 2005
number of tree species in tropical Impacts of parasitic plants on
forests. American Naturalist, 104: natural communities. The New
501–528. phytologist, 166: 737-51.

Nathan, R., Safriel, U.N., Noy-Meir, I., Reid N; Yan Z., Fittler J. 1994. impact of
Schiller, G. 2000. Spatiotemporal mistletoes (Amyema miquelii) on
variation in seed dispersal and host (Eucalyptus blakelyi and
recruitment near and far from Pinus Eucalyptus melliodora) survival and
halepensis trees. Ecology, 81: 2156– growth in temperate Autralia. Forest
2169. ecology management 70: 55-65.

Nathan, R., Casagrandi, R. 2004. A Silva, A. & del Rio, C. M. 2008. Effects of
simple mechanistic model of seed the Mistletoe Tristerix aphyllus
dispersal, predation and plant (Loranthaceae) on the
establishment: Janzen-Connell and Reproduction of Its Cactus Host
beyond. Journal of Ecology, 92: 733– Echinopsis chilensis. Oikos, 75,
746 437-442.

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

EFEITO DA FLORIVORIA SOBRE A TAXA DE VISITAÇÃO DOS POLINIZADORES EM


Ipomoea nil (Convolvulaceae)

TANÁGARA FALCÃO, GUSTAVO BRANT, RICARDO EMÍDIO E HONARA MORGANA

Introdução Existem evidências que


variações naturais no tamanho e
As plantas estão sujeitas às
quantidade de flores, produção de
pressões seletivas exercidas por
néctar e de pólen afetam a atratividade
herbívoros e polinizadores, e ambos
destas em relação aos polinizadores
afetam seu fitness. Os herbívoros
(Galen, 1989). Danos causados por
reconhecidamente o reduzem,
herbivoria na corola também reduzem
enquanto que os polinizadores o
essa atratividade (Karban & Strauss,
aumentam (Strauss et al., 1996;
1993). No entanto, muitos estudos tem
Agrawal, 1999). E, consequentemente,
evidenciado que, para alguns grupos de
a evolução de caracteres florais deve
polinizadores, o tamanho da pétala é
relacionar a planta, o polinizador e o
uma pista mais importante do que a
herbívoro (Strauss, 1997). No entanto,
quantidade de flores, sendo
a maioria dos estudos sobre o tema
considerada um dos principais fatores
frequentemente relacionam a evolução
de atratividade (Conner & Rush, 1999;
dos caracteres florais nas angiospermas
Lehtila & Strauss, 1996).
aos polinizadores (Stebbin, 1970;
Herrera, 1995; Johnson & Steiner, O presente estudo teve como
2000; Sargent, 2004). objetivo avaliar se a herbivoria floral
diminui as taxas de visitação dos
A maioria das flores apresenta
polinizadores em Ipomoea nil (falta
características morfológicas radiais ou
autor) (Convolvulacea) em uma área de
bilaterais. Nas angiospermas, as flores
Caatinga do Rio Grande do Norte.
de simetria radial são denominadas de
actinomorfas, enquanto que as de
simetria bilateral são chamadas de
Material e Métodos
zigomorfas. Desvios da simetria vêm
sendo usados de forma crescente como Área de estudo
uma ferramenta útil para inferir a
saúde ou a qualidade de um organismo O estudo foi desenvolvido em
ou população, avaliando e dando área aberta com vasta cobertura de
indícios da interferência de fatores gramíneas e alta abundância de
ambientais ou genéticos na Ipomoea nil, próximo às dependências
estabilidade do desenvolvimento do da Sede da Estação Ecológica do Seridó
organismo (Palmer 1996). (ESEC-Seridó), localizada no Município

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de Serra Negra do Norte (6°15’S e da figura 1 foi desenvolvido no


37°16’O) no Rio Grande do Norte. Microsoft Excel 2007.

Coleta de dados

Quatro blocos, cada um Resultados


contendo seis flores sem dano
Foram registradas 2.498
aparente, foram selecionados. Para
visitações, sendo 1.384 nas flores
simular o efeito da herbivoria, dentro
controle e 1.114 nas flores com
de cada bloco foram selecionados
tratamento de herbivoria simulada. As
aleatoriamente três flores para o corte
frequências observadas em cada série
parcial de uma das pétalas, e outras
temporal se encontram na figura 1.
três flores permaneceram intactas
para serem utilizadas como tratamento
controle.

Quatro observadores utilizaram 200


Controle
Frequência Observada
simultaneamente o método “janela de 150
observação”. Cada janela de 100 Tratam
observação teve duração de 10 ento
50
minutos, e 3 de intervalo, com um total 0
de 10 séries e um esforço amostral de 1 3 5 7 9
6,6 horas. Amostras no tempo

Análise dos dados Fig. 1 Frequência observada de


visitações por série temporal.
Para testar se indícios de
herbivoria diminuem a frequência de
visitação de polinizadores, realizou-se
O teste-t pareado mostrou que
um teste-t pareado e 10.000
o efeito simulado de herbivoria não
simulaçoes de Monte Carlo, utilizando a
afetou a frequência de visitas dos
média das diferenças esperada ao
polinizadores entre os tratamentos (t=
acaso comparada com a média das
1.82, gl= 3, p= 0,08. Fig. 2). Da mesma
diferenças observada. Por fim, para
forma, as 10.000 simulações de Monte
analisar o poder do teste-t e obter
Carlo reforçam que o padrão
estimativas quanto ao número de
encontrado não é diferente do
amostras necessários para que se possa
esperado ao acaso (p = 0,073). A partir
demonstrar a ocorrência do padrão
da análise de poder do teste T-pareado,
esperado, realizamos uma análise de
obtivemos o número estimado de
poder do teste T-pareado.
amostras igual a nove (nove amostras =
Todas as análises foram feitas 0,807, para alpha=0.005).
utilizando-se o programa R 2.10.1 (R
core development team 2009). Gráfico

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

coletados seria a ANOVA de medidas


repetidas, pois o método de coleta
consistiu na observação das mesmas
amostras ao longo do tempo. No
entanto este fator não foi incluído no
modelo experimental. Além disso, a
realização do teste se mostrou inviável
devido às limitações impostas pela
quantidade de graus de liberdade
Fig. 2 Comparação das frequências de
requeridos por ele. (ii) Durante a
visitação de polinizadores entre as
realização do experimento, alguns
flores controle e as com o tratamento
tratamentos foram comprometidos. Em
de herbivoria simulada(t= 1.8252, gl= 3,
alguns casos, flores exoerimentais
p= 0,08273338)
foram ocupadas por polinizadores, que
ficaram nas flores por até três séries
consecutivas. Com o crescente
Discussão aumento da temperatura, algumas
Resultados estatísticos não flores murcharam e ficaram
significativos podem sugerir que, de indisponíveis aos polinizadores. Esses
fato, o padrão analisado não existe ou dois fatos causaram um
o estudo não foi capaz de detecta-lo. desbalanceamento no experimento,
Sob o ponto de vista biológico, sinais e podendo ter enviesado os resultados.
tendências observadas, apesar de não Por último e mais importante, o
significativos estatisticamente, podem número de réplicas foi muito baixo
ser indicativos da ocorrência de (quatro), impedindo um entendimento
padrões na natureza. Esses padrões, conclusivo sobre a preferência ou não
em sua maioria são difíceis de dos polinizadores.
mensurar e demonstrar, devido ao Não obstante, a não detecção
caráter altamente variável e da diminuição das taxas de visitação
imprevisível dos organismos biológicos. dos polinizadores nas flores com
Logo, a não significância dos herbivoria simulada pode realmente
resultados obtidos a partir das análises representar o fato de que tal padrão
realizadas neste trabalho pode não existe. Alguns estudos demonstram
realmente representar a ausência do que a herbivoria nas flores pode
efeito negativo da herbivoria nas flores diminuir as taxas de visitação dos
sobre as taxas de visitação dos polinizadores devido aos desvios na
polinizadores. No entanto, algumas simetria floral, que podem ser
considerações precisam ser levadas em utilizados para inferir a saúde ou a
conta: (i) teste estatístico mais qualidade do recurso. Por exemplo,
adequado para a análise dos dados plantas que possuem flores mais
simétricas produzem maiores
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

quantidades de néctar (Krupnick et al., sistema de polinização, sobretudo por


1999). Ou ainda, de acordo com a apresentar flores diárias e de fácil
hipótese da informação ótima, flores acesso a diversos tipos de
simétricas têm maior poder polinizadores.
informativo, e os polinizadores podem
Em síntese, nossos resultados
utilizar caracteres florais como pistas
não permitem concluir se a florivoria
para o reconhecimento do recurso
realmente afeta a taxa de visitação de
(Neal et al., 1998).
Ipomea nil. Por esse motivo, os autores
No entanto, polinizadores com recomendam que novos experimentos
maior poder discriminativo tendem a com essa espécie sejam realizados,
ocorrer em comunidades onde a incluindo um número mínimo de
diversidade de recursos é alta e a réplicas igual ao sugerida pelo
disponibilidade é previsível, o que resultado da análise de poder.
favorece a ocorrência de sistemas de
polinização especializados, enquanto
sistemas de polinização generalizados Agradecimentos
são favorecidos quando a presença do
polinizador mais efetivo é imprevisível Ao professor Dr. Márcio Zikán
(Stebbin, 1970). (Boss), pela orientação, e pela água e
biscoitos cedidos; Ao Guiga, pelos
Ipomoea nil é uma espécie estimados (e imprescindíveis)
ruderal, autogâmica facultativa, conselhos estatísticos e à toda Equipe
polinizada principalmente por técnica da ESEC-Seridó, especialmente
polinizadores não-específicos, Núbia, cuja comida lembra a casa da
pertencente à família Convolvulacea. Vovó.
Suas flores são efêmeras, com duração
de apenas um dia , e possuem grande
diversidade de polinizadores
Referências
dependendo do lugar em que ocorram
(Maimoni-Rodella & Yanp 2004). Agrawal, A. A. 1999. Induced responses
to herbivory in wild radish: effects
Como a Caatinga é um ambiente
on several herbivores and plant
marcado pela sazonalidade e
fitness. Ecology 80:1713-1723.
disponibilidade de recursos florais em
pulsos, a grande diversidade de Conner, J. K. & Rush, S. 1996. Effects of
polinizadores fica restrita apenas à flower size and number on pollinator
estação chuvosa. De forma visitation to wild radish, Raphanus
complementar, a biologia e as raphanistrum. Oecologia 105:509–
características da flor dessa espécie 516.
podem ser indicativos de uma possível
Galen, C., T. E. Dawson, & Stanton, M.
tendência ao generalismo em seu
L. 1989. Carpels as leaves meeting

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81
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

the carbon cost of reproduction in weeds. Planta Daninha, Viçosa-MG


an alpine buttercup. Oecologia 25:35-42.
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Neal, P. R; Dafni, A. & Giurfa,M. 1998.
Herrera, C.M. 1995. Floral traits and Floral symmetry and its role in plant-
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Floral Biology. Chapman e Hall, New
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radish, Raphanus raphanistrum. and female plant fitness. American
Oecologia 111:396–403. Naturalist 147:1098–1107.

Lehtila, k. & Strauss, S. Y. 1999. Effects Strauss, S. Y. 1997. Floral characters link
of foliar herbivory on male and herbivores, pollinators and plant
female reproductive traits in wild fitness. Ecology 78:1640-1645.
radish Raphanus raphanistrum.
Ecology 80:116-124.

Maimoni-Rodella, R. C. S. & Yanp,


Yanagizawa. 2007. Floral biology and
breeding system of three Ipomoea

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Nasutitermes corniger (Isoptera, Termitidae) CONSTROI NINHOS POLICÁLICOS NO


SEMI-ÁRIDO NORDESTINO?

PEDRO DE F. CAPISTRANO; EMERSON DE MEDEIROS SOUSA; LEIDE AMARA P. SILVA E DAVID LUCAS
ROHR

Introdução colônia, implicando em um menor


gasto de energia para a captura de
Os térmitas são invertebrados
recursos e ainda como mecanismo de
dominantes nos solos tropicais e
reprodução, com a formação de
apresentam grande importância
“brotos” derivados no ninho principal
ecológica, principalmente devido às
(Vasconcellos et al., 2005)
modificações que podem causar no
ambiente, desde alterações na Conhecer como o policalismo
paisagem até modificações nas ocorre em áreas urbanas é de
propriedades físicas e químicas do solo, fundamental importância para a
além de apresentarem significativos elaboração de planos de prevenção e
efeitos no processo de decomposição e controle de infestações de térmitas
ciclagem de nutrientes (Holt et al., (Vasconcellos et al., 2005).
2000).
Há ocorrência de construção de
Os térmitas constroem ninhos ninhos policálicos em Floresta
para abrigar a colônia, podendo causar Atlântica, porém ainda não há registro
alterações na estrutura dos de estudos em áreas de Caatinga.
ecossistemas (Vasconcellos et al., Nesse ecossistema é possível registrar a
2008). Esses ninhos, quando ocorrência de uma espécie de
pertencentes a uma mesma colônia e distribuição bastante representativa,
interligados entre si, indicam a Nasutitermes corniger, que ocorre
ocorrência de policalismo. Essa ligação desde o México até a Argentina
pode ocorrer por vias aéreas ou (Vasconcellos et al., 2005).
subterrâneas, as quais permitem o
Sendo assim, o presente estudo
fluxo contínuo ou temporário dos
tem como objetivo investigar a
indivíduos dentro da colônia (Noirot et
existência de ninhos policálicos de N.
al., 2000).
corniger em uma área de caatinga do
Alguns fatores podem estar Seridó (ESEC - Seridó).
relacionados à formação de ninhos
policálicos, como por exemplo, a
manutenção dos níveis ótimos de
temperatura e do dióxido de carbono
dentro dos ninhos, a manutenção e
expanção do território de forrageio da

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Metodologia avaliando a agressão e o nível de injúria


como descrito por Vasconcellos et al.,
Área de estudo
(2005). Nesses métodos foram
O estudo foi realizado na utilizados apenas a casta dos operários,
Estação Ecológica do Seridó - ESEC pois estes se agridem utilizando suas
(6º35’S e 37º15’W), que possui 1.128 mandíbulas o que facilita a análise das
ha, situada no estado do Rio Grande do injúrias.
Norte, município de Serra Negra do
Bioensaios agonísticos
Norte e pertencente à mesorregião
Seridó. A precipitação anual média é de Os bioensaios de agressividade
497 mm. A área de caatinga, apresenta foram realizados utilizando-se 10
vegetação secundária, caracterizada indivíduos acondicionados em placas
por grande abundância de espécies de Petri (arenas). Foram realizadas
arbustivas e arbóreas de pequeno duas categorias de bioensaios, um
porte, caracterizando um processo de Controle, na qual os 10 indivíduos em
regeneração (Bencke et al., 2006). cada placa pertenciam ao mesmo ninho
(N1 x N1, N2 x N2, N3 x N3, N5x N5 e
Delineamento experimental
N7 x N7) e uma categoria Tratamento,
Inicialmente foi realizado um onde cada arena continha cinco
levantamento de todos os ninhos de N. indivíduos do ninho N1 e os outros
corniger que se encontravam próximos cinco dos demais ninhos testados (N2,
à sede da ESEC – Seridó. Em seguida, foi N3, N5 e N7). Para cada categoria
escolhido, dentre esses ninhos, aquele foram realizadas cinco repetições. As
de maior volume que foi considerado placas foram deixadas por 30min em
como ninho principal (N1). A partir ambiente escuro e após esse intervalo,
deste, foram amostrados outros seis todos os indivíduos sobreviventes eram
ninhos localizados a diferentes mortos com álcool 70% e levados ao
distâncias do N1 (N2 = 6,7m; N3 = estereomicroscópio para análise da
19,9m; N4 = 16,5m; N5 = 76,0m; N6 = presença ou ausência de injúrias nas
89,5m e dois, N7 e N8 distante 567m antenas, cabeça, abdômen e pernas.
aproximadamente). Após isso, foram Para cada arena foi gerado um “score”
coletados indivíduos de cada um dos que seria a razão entre o número de
ninhos mais distantes. Os ninhos 4 e 6 injúrias sofridas por cada indivíduo em
não tiveram indivíduos coletados pois relação ao total de indivíduos na arena,
localizavam-se próximos aos ninhos 3 e o valor obtido foi representado em
7 respectivamente, sendo considerados porcentagem de injúrias por placa.
a mesma distância em relação a N1.
Análise de dados
Para testar se os ninhos
Para normalização dos dados
coletados eram policálicos, foram
oriundos da análise das injúrias,
realizados ensaios agonísticos,

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utilizamos a fórmula abaixo (Gotelli, Discussão


2004): Y=Arcoseno √Y
Os resultados indicam a
Em seguida foi realizado um teste existência de ninhos policálicos de N.
ANOVA one-way e um teste Tukey corniger em um fragmento de caatinga,
post-hoc. O programa utilizado foi o o que nunca havia sido registrado para
Systat 12. esta espécie neste ambiente.

Resultados Uma provável consequência


desse tipo de construção seria a
A ANOVA mostrou que houve
diminuição da diversidade genética
diferença significativa na taxa de
dentro da população local, resultante
agressividade entre os tratamentos
do processo de endogamia nos ninhos
testados (F=83,84; g.l.=8, p<0,001),
adjacentes. Tais ninhos podem conter
mostrando a presença de
reprodutores secundários que, na
comportamento agonístico entre os
verdade, são filhos e filhas dos reis e
indivíduos de N. corniger dos
rainhas existentes no ninho principal
diferentes ninhos. Porém, o teste de
(Atkinson et al., 1997).
Tukey pareado mostrou significância
entre o tratamento 7 x 1 e os demais Outra consequência da presença
(Fig. 1). Estes resultados indicam que os de ninhos policálicos seria a queda da
ninhos N1, N2, N3 e N5 pertencem a diversidade de térmitas em escala local,
mesma colônia enquanto o ninho N7 atribuída ao fato de que uma maior
faz parte de outra. distribuição espacial dos ninhos de uma
mesma colônia, permitiria uma maior
ocupação e defesa dos recursos
disponíveis na área, dificulta o
estabelecimento de novas colônias da
mesma, ou de outras espécies xilófagas
de térmitas.

É importante salientar que a


compreensão do policalísmo em N.
corniger permite elaborar um plano de
manejo eficiente no controle desse tipo
de praga em áreas urbanas
Figura 1 - Média de Índices de Dano por
(Vasconcellos, 2005).
interação agonística entre ninhos de N.
corniger. A seta representa o Em suma, o conhecimento de tal
tratamento significativo para a característica para uma espécie tão
presença de agonismo entre os comum quanto esta, indica que estudos
operários. futuros devem ter o cuidado de
mensurar a abundância de colônias

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policálicas a fim de não superestimar o Holt, J. A. & Lepage, M. 2000. Termites


resultado. Cuidado esse que se and soil properties. In: Abe, T.,
estende a outras espécies construtoras Bignell, D. E., Higashi, M., eds.
de ninhos policálicos (Roisin et al., Termites, evolution, sociality,
1986). symbiosis, ecology. Dordrecht,
Kluwer Academic. p.389-407.
Agradecimentos
Noirot, C. & Darlington, J. P. E. C. 2000.
Os mais sinceros agradecimentos ao
Termite nests: architecture,
professor Alexandre Vasconcellos pela
regulation and defence. pp. 121-139,
orientação neste trabalho e aos que
In: Abe, T., Bignell, D. E. & Higashi,
fazem parte da ESEC – Seridó.
M. eds. Termites: evolution, sociality,
Referências symbioses, ecology. Kluwer
Academic Publishers, Dordrecht.
Atkinson, L. & Adams, E. S. 1997. The
origins and relatedness of multiple Roisin, Y & Pasteels, J. M., 1986.
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termite Nasutitermes corniger. Proc. termites: Polycalism and polygyny in
R. Soc. Lond. B 264, 1131-1136 Nasutitermes polygynus and N.
Costalis. Insectes Sociaux 33, 149-
Bencke, G. A., Maurício, G. N., Develey, 167.
P. F. & Goerck, J. M. (orgs.). 2006.
Vasconcellos, A. & Bandeira, A.G. 2005.
Áreas Importantes para a
Populational and Reproductive
Conservação das Aves no Brasil.
Status of a Polycalic Colony of.
Parte I – Estados do Domínio da
Sociobiology. 47, 2005.
Mata Atlântica. São Paulo: SAVE
Brasil, p. 139. Vasconcellos, A., Bandeira, A. G.,
Almeida, W. O. & Moura, F. M. S.
Gotelli, J. N. & Ellison, A. M. 2011.
2008. Térmitas construtores de
Princípios de estatística em ecologia.
ninhos conspícuos em duas áreas de
Artmed. pp. 248-249.
Mata Atlântica com diferentes níveis
de perturbação antrópica.
Neotropical Entomology 37, 15-19.

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Projetos sem orientação I

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A RIQUEZA DE FORMIGAS É MENOR NA COPA DE ÁRVORES DA CAATINGA QUE NO


SOLO?

LAURA MARTINA FERNÁNDEZ, GUILHERME MAZZOCHINI, LEIDE AMARA P. SILVA E PEDRO DE FARIAS
CAPISTRANO

Introdução do solo (Kaspari & Yanoviak, 2001). Isso


se deve porque as formigas da copa
O crescimento populacional de
alimentam-se mais frequentemente de
muitas espécies é limitado pela
alimentos ricos em carboidratos e
capacidade dos indivíduos em captarem
pobres em proteínas, como exudatos
os recursos essenciais disponíveis no
de homóptero ou néctar de nectários
ambiente, um processo chamado de
extra-florais (Davidson 1997). Por isso,
controle base-topo (Power 1992). De
pode se esperar que a densidade de
forma geral, a qualidade de um recurso
espécies que habitam a copa seja
está ligada à quantidade relativa de
menor que as que habitam o solo.
carbono e nitrogênio (razão C:N)
(Begon et al., 2006). Quanto menor Na Caatinga, ainda se conhece
essa razão, melhor a qualidade do pouco sobre a diversidade de formigas
recurso, pois a maioria dos organismos que habitam a copa das árvores, sendo
terrestres é limitada por nitrogênio a maioria focada na comunidade de
(White, 1978). Portanto, locais com a formigas de solo (Leal, 2003). Em
razão C:N alta possivelmente terão uma florestas tropicais, estima-se que a
densidade de espécies baixa por causa razão C:N esteja em torno de 40:1, um
de fatores como competição por valor nutricional de baixa qualidade
recursos. (Begon et al., 2006). Na Caatinga, essa
razão na vegetação pode ser ainda
As formigas (Hymenoptera:
maior que em florestas tropicais, pois
Formicidae) são um grupo muito
muitos estudos indicam que em locais
diverso, ocorrendo em uma diversidade
com a pluviosidade baixa, o conteúdo
muito grande de ambientes (Hölldobler
de carbono nas folhas é maior (Fonseca
& Wilson, 1990). Nas florestas tropicais,
et al., 2001). Este aumento da razão
as formigas podem ser divididas entre
C:N resultaria ainda em uma maior
aquelas que ocorrem mais
limitação de nitrogênio na copa das
frequentemente no solo e ali nidificam,
árvores.
e aquelas que habitam
predominantemente as copas das Esse estudo teve como objetivo,
árvores (Davidson, 1997). Um estudo testar a hipótese de que a limitação de
demonstrou que as formigas que recursos pode controlar o crescimento
habitam a copa das árvores são mais de populações e, consequentemente, o
limitadas em nitrogênio que as formigas número de espécies de formigas na

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copa das árvores. Nossa previsão é que iscas contendo sardinha (proteína) e
o número de espécies de formigas que cuscuz (carboidrato) distantes um
ocorrem no solo é maior que o número metro do tronco e quatro iscas nas
de espécies de formigas que ocorrem bifurcações dos galhos secundários. As
na copa das árvores. iscas foram deixadas nos pontos de
amostragem por 20 minutos. Após esse
período as quatro amostragens das
Material e Métodos formigas encontradas no solo, para
cada local, foram integradas em uma
Área de estudo bandeja e as formigas encontradas
foram acondicionadas em recipientes
O estudo foi realizado na
plásticos contendo álcool 70%. No
Estação Ecológica do Seridó - ESEC
laboratório, as formigas foram
(6º35’S e 37º15’W), que possui 1.128
identificadas ao nível de gênero. O
ha, situada no sudeste do Rio Grande
mesmo foi feito para as amostragens
do Norte, município de Serra Negra do
das formigas encontradas na copa das
Norte e pertencente à mesorregião
árvores.
Seridó. A área está presente no
domínio do bioma Caatinga, Análise de dados
apresentando vegetação secundária,
caracterizada por grande abundância Para testar a hipótese de que a
de espécies arbustivas e arbóreas de riqueza seria menor na copa em
pequeno porte, característica de uma comparação com o solo, foi realizado
caatinga em processo de regeneração um teste-t pareado.
(Bencke et al., 2006). O clima
dominante é semi-árido com
temperaturas médias anuais variando Resultados
entre 22 e 33 graus e índices
Foram encontrados seis
pluviométricos médios de 497 mm por
morfotipos de formigas pertencentes a
ano (Ibama 2004).
cinco gêneros (Figura 1). Os gêneros
mais frequentes neste estudo foram
Camponotus, Solenopsis e Pheidole.
Delineamento amostral
Os resultados indicam que
Foram escolhidas 12 árvores de
houve uma diferença significativa na
três espécies, Poinceianella pyramidalis
riqueza de formigas encontradas no
(Caatingueira), Mimosa tenuiflora
solo e na copa de árvores (t=9, g.l.=11,
(Jurema preta) e Commiphora
p<0,001; Figura 2). No solo houve em
leptophloeos (Amburana). O tamanho
média 2,25 espécies a mais que na copa
mínimo foi estabelecido em 30 cm de
das árvores (Figura 2).
circunferência à altura do solo. Em
cada árvore, foram depositadas quatro

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Discussão

A baixa riqueza de formigas


encontrada na copa de árvores da área
de Caatinga amostrada pode ser
explicada por múltiplos fatores. Entre
eles, uma alta limitação de proteínas
(fonte de nitrogênio) na copa das
árvores pode limitar a riqueza desses
organismos nesse estrato (Kaspari &
Figura 3. Frequência total dos Yanoviak, 2001). Essa limitação pode
morfotipos de formigas no solo e na estar impedindo a ocorrência de
copa de árvores nos 12 locais diversas espécies nesse estrato. Além
amostrados. disso, as folhas das árvores da Caatinga
estão presentes somente em um
período específico, resultando em uma
taxa fotossintética muito baixa,
gerando também uma limitação da
fonte de carbono na copa das árvores.
Estas condições criam um ambiente
pouco atrativo para organismos
herbívoros e consumidores de seiva.

Adicionalmente, pode haver


uma limitação de locais para as
formigas nidificarem na copa das
árvores. O solo provavelmente possui
uma maior complexidade estrutural,
Figura 4. Número de espécies de como a presença de rochas, troncos
formigas encontrado no solo e na copa caídos, serapilheira, entre outros
das árvores. A ligação entre os pontos micro-habitats. Isso proporciona uma
representam os pares de amostras na maior quantidade de locais para as
copa e no solo e a espessura das linhas formigas nidificarem e habitarem o
indica a frequência do resultado solo.
observado.
Interessantemente, a mudança
Dos cinco gêneros encontrados, de espécies entre as copas foi
somente dois ocorreram na copa praticamente nula. Esse resultado
(Camponotus e Solenopsis), sendo que contrasta com outro estudo que
nenhum gênero foi exclusivo desse encontrou uma alta diversidade beta na
estrato. copa das árvores em uma floresta
tropical no Borneo (Brühl et al., 1998).

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Isso pode estar ocorrendo devido às primary rain forest in Sabah, Borneo.
condições climáticas desfavoráveis da Journal of Tropical Ecology, 14: 285-
Caatinga, ainda mais críticas na copa 297.
das árvores, como altas temperaturas e Davidson, D.W. 1997. The role of
umidade escassa. Isso pode explicar a resource imbalances in the
ocorrência quase que exclusiva de evolutionary ecology of tropical
Camponotus na copa, pois é um gênero arboreal ants. Biological Journal of
com a maioria das espécies generalistas the Linnean Society, 61:153-181.
(Leal, 2003), que habita Fonseca, C.R., Overton, J.B., Collins, B.,
preferencialmente o solo mas, & Westoby, M. 2000. Shifts in trait-
possivelmente, sobe nas copas para combinations along rainfall and
forragear. phosphorous gradients. Journal of
Ecology, 88: 964-977.
Em conclusão, a limitação por
Hölldobler, B. & Wilson, E.O. 1990. The
nutrientes, o estresse ambiental e a ants. Cambridge: Belknap Press.
pouca disponibilidade de locais para
nidificar proporcionam pouca Ibama. 2004. Plano de Manejo da ESEC
vantagem para as formigas da Caatinga do Seridó.
se especializarem para habitar a copa Kaspari M. & Yanoviak S.P. 2001. Bait
das árvores. use in tropical litter and canopy
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Agradecimentos nutrient limitation. Biotropica, 33:
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Ao professor Alexandre
Vasconcellos pelo auxílio na Leal, I.R. 2003. Diversidade de formigas.
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equipe da ESEC – Seridó. J.M.C. 2003. Ecologia e conservação
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Bencke, G.A., Mauricio, G.N., Develey,
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Brühl, C.A., Gunsalam, G. & Linsenmair,


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(Hymenoptera, Formicidae) in

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RIQUEZA E ABUNDÂNCIA DE ARANHAS RELACIONADAS À COMPLEXIDADE ESTRUTURAL


DE Croton sonderianus Muell. Arg.

NÍCHOLAS SEBASTIAN, ELIANA FARIA, LUCAS VIEGAS, BRUNO GAZOLA

Introdução está associada a altura da planta


(Santana, 2009).
A complexidade estrutural dos
habitats pode exercer uma influência O presente estudo teve como
determinante na dinâmica, distribuição objetivos: (i) Testar se a riqueza e a
e organização das comunidades abundância de aranhas estão
animais em sistemas naturais (Souza et relacionadas com a complexidade
al., 2010). Grupos que habitam copas estrutural de C. sonderianus e; (ii)
de árvores são influenciados pela Testar se a composição de aranhas está
arquitetura desses ambientes relacionada com o desenvolvimento
(Robinson, 1981). Em habitats onde o ontogenético de C. sonderianus.
grau de complexidade está relacionado
com o seu estágio de desenvolvimento,
existe uma influencia maior sobre a Material e Métodos
estruturação das comunidades de
animais que os habitam (Ferreira et al., O estudo foi desenvolvido na
2007). Estação Ecológica do Seridó – ESEC
(UTM 0692935, 9273445), localizada no
Como habitantes das copas, as município de Serra Negra do Norte, RN.
aranhas são bons organismos para A Unidade de Conservação encontra-se
estudos ecológicos, pois representam inserido no domínio da caatinga (Silva
um grupo cosmopolita, megadiverso e et al., 2003).
de tamanho reduzido, o que facilita sua
coleta (Foelix, 2011). Para a escolha dos indivíduos de
Consequentemente a estrutura do Croton sonderianus, nos quais foram
habitat pode ser utilizada para predizer amostradas espécimes de Araneae,
a organização da comunidade de procedeu-se pela escolha de 18 pontos
aranhas (Halaj et al, 1998). aleatorizados dentre 40. Tais pontos
estavam distribuídos a cada 10 metros
Croton sonderianus Muell. Arg. ao longo de um curso d’água
(marmeleiro), arbusto colonizador, temporário. Em cada um dos 18 pontos
indicativo de áreas antropizadas na foi traçado um transecto de 10 m
Caatinga, apresenta elevada densidade perpendicular ao percurso do corpo
(1.112 ind.ha-1) na Estação Ecológica do d’água, em direção a sua margem
Seridó (Santana, 2009). Em C. esquerda e direita. Uma parcela de 3 x
sonderianus, a sua fase ontogenética 3 m foi estabelecida em cada ponto, na
qual foram contados os indivíduos de C.
91
92
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

sonderianus, sorteando-se um para O teste de correlação de


amostragem de aranhas. Para o Pearson indicou que o número de
indivíduo sorteado de C. sonderianus ramos na planta e o DAS são medidas
mensurou-se o diâmetro ao nível do que apresentam colinearidade (R2 =
solo-(DAS) e altura. 0,76; p = 0,001). Por isso, na regressão
múltipla, excluímos as medidas de
Foi utilizado o método do
ramificação da planta do modelo.
guarda-chuva entomológico para coleta
de Araneae, com esforço de 1 minuto O modelo explicou bem a
para captura dos espécimes presentes variação da riqueza (R² = 0,38; F = 4,6; p
na superfície do guarda chuva = 0.03; Fig. 1) e abundância de aranhas
entomológico. A triagem e identificação (R² = 0,66; F = 15; p = 0,0001; Fig. 2).
das aranhas foi realizada com auxílio do
microscópio estereoscópico em
laboratório.

Foi testada a correlação entre


DAS e altura, através do teste de
correlação de Pearson. A relação entre
a complexidade estrutural (DAS e
altura) e a riqueza e abundância de
Araneae foi realizada através da
regressão múltipla. Para analisar se a
composição de aranhas está
relacionada com o desenvolvimento Figura 1. Variação da riqueza de
ontogenético de C. sonderianus, aranhas em relação à altura e DAS
utilizou-se uma análise de (Diâmetro a Altura do Solo) da planta.
Escalonamento Multidimensional Não-
Métrico (NMDS) e regressão linear. Os
dados foram trabalhados no SYSTAT 12
e PAST.

Resultados

Foram encontrados 172 de


aranhas no total das amostras,
pertencentes a 27 morfotipos. A
abundância de aranhas variou de 2 a 17
indivíduos e a riqueza de 2 a 8 espécies
por amostra.

92
93
Fitted Model Plot
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Figura 2. Variação da abundância de


20
aranhas em relação à altura e DAS
15 (Diâmetro a Altura do Solo) da planta.
ABUNDANCIA

10

5
A análise de Escalonamento
Multidimensional Não-Métrico não
separou os grupos de aranhas de
75
6,

80 acordo com o desenvolvimento


75
4,

AL 60
TU 40 ontogenético da planta (R² = 0,11; F =
75

RA
2,

20
DAS 2; p = 0,18; Fig. 3).
75

0
0,

Figura 3. Gráfico da Análise de Escalonamento Não-métrico relacionando o


desenvolvimento ontogenético da planta e os grupos de aranhas. Os valores
associados corresponde a altura da planta em.metros.

93
94
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Discussão maior riqueza de espécies de aranhas,


mas não necessariamente pode
O padrão de colinearidade entre
segregar grupos distintos que ocupam
as ramificações na planta e o DAS se
plantas em diferentes estágios de vida.
mostrou significativo devido ao fato de
que plantas menores brotam do solo Nossos resultados sugerem que
em feixes. Dessa forma, indivíduos a complexidade estrutural do habitat
pequenos que apresentavam muitos pode representar um papel importante
feixes acabam por apresentar um no processo de estruturação das
mesmo número de feixes que comunidades de aranhas, ampliando a
indivíduos adultos. riqueza e abundância desse grupo.
Novos estudos precisam ser
A altura e o DAS de C.
desenvolvidos para investigar quais
sonderianus determinam a fase de
outras variáveis podem estar
desenvolvimento da planta (Santana,
explicando melhor a diversidade desse
2009). Plantas maiores são
grupo em ambientes de Caatinga.
estruturalmente mais complexas. Por
isso, podem oferecer uma maior
disponibilidade de habitats, abrigos
Agradecimentos
contra intempéries do sistema e
recursos alimentares para as aranhas Os autores agradecem a
que as habitam. Alexandre Vasconcellos pelas valiosas
contribuições nas análises e no
Esse padrão corrobora Halaj et
amadurecimento da idéia.
al. (1998), que afirmam que a variação
Agradecemos também a Guilherme
da riqueza e abundância de aranhas
Mazzochio pelo constante apoio nas
varia positivamente em função da
análises estatísticas. Agradecemos
complexidade estrutural do habitat.
também aos funcionários e dirigentes
Contudo, a fase ontogenética da da ESEC pelo carinho e acolhimento
planta não foi determinante para o durantes todos os dias deste estudo.
agrupamento das aranhas que ocupam
sua copa. Apesar de se esperar que a
complexidade estrutural relacionada Referências
com a fase ontogenética da planta
possa favorecer a uma maior riqueza, Ferreira, R. S., Pereira, S. R., Faria, R. R.,
essa relação não foi encontrada nesse Pacheco, M. L. A. F., Silva, N. S. S.,
estudo. Robinson (1981) demonstrou Voltollini, J. C. 2007. Colonização de
que as aranhas usam o habitat de Macro e Micro-habitats por Aranhas
acordo com a diversidade da Construtoras de Teias, na Região do
arquitetura do ambiente. Esse padrão Pantanal Miranda, Miranda/MS.
de segregação, relacionado a Ensaios e ci., Campo Grande, v.11, n.
complexidade estrutural, favorece uma 2, p.7-11.

94
95
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Foelix, R.F. 2011. Biology of Spiders. Santana, J. A. S. 2009. Padrão de


New York, Oxford University Press, distribuição e estrutura diamétrica
3sd edition, 428p. de Croton sonderianus na Caatinga
da Estação Ecológica do Seridó.
Halaj, J., Ross, D.W., Moldenke, A.R.
Revista Verde 4:85-90.
1998. Habitat Structure and Prey
Availability as Predictors of the Silva, R.A., Santos, A.M.M., Tabarelli, M.
Abundance and Community Riqueza e diversidade de plantas
Organization of Spiders in Western lenhosas em cinco unidades de
Oregon Forest. The Journal of paisagem da caatinga 2003. In: I.R.
Arachnology 26:203-220. Leal, M. Tabarelli & J.M.C. Silva
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Langellotto, G.A. & R.F. Denno. 2004.
Caatinga. Editora Universitária,
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Universidade Federal de
enemies to complex-structured
Pernambuco, Recife, Brasil. pp. 237-
habitats: a meta-analytical synthesis.
273.
Oecologia 139:1–10.
Souza, T. G., Brescovit, A. D., Feres, D.
Robinson, J. V. 1981. The Effect of
C. R., G. Q. Romero. 2010.
Architectural Variation in Habitat on
Bromeliads as biodiversity amplifiers
a Spider Community: An
and habitat segregation of spider
Experimental Field Study. Ecology,
communities in a Neotropical
62(1), pp. 73-80.
rainforest. Journal of Arachnology,
38(2):270-279.

95
96
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

EFEITO DA FLORIVORIA SOBRE AS TAXAS DE VISITAÇÃO DE TRÊS ESPÉCIES DE


HYMENOPTERA EM Ipomoea nil (CONVOLVULACEA)

ANA CLÉZIA SIMPLÍCIO DE MORAIS, PHOEVE MACARIO, TANÁGARA FALCÃO, DAVID LUCAS ROHR,

Introdução No domínio Caatinga existe uma


predominância de espécies de plantas
As plantas dependem de vetores
com flores entomófilas (visitadas por
polínicos para garantir seu sucesso
insetos) (Leal et al., 2006). Ipomoea é
reprodutivo. O processo de coevolução
um gênero de planta da familia
das angiospermas e seus polinizadores
Convolvulacea, que apresenta em sua
se traduz em atributos para
maioria, espécies que utilizam
atratividade de polinizadores e
polinização pelo vento ou por
fecundação (Soares et al., 2009).
polinizadores não-específicos. A
Diversos fatores afetam a atratividade
espécie Ipomoea nil é relativamente
das plantas aos polinizadores: tamanho
abundante em áreas abertas da ESEC-
e quantidade das flores, quantidade de
Seridó e é uma espécie ruderal que
néctar e pólen e o odor (Galen, 1989).
apresenta grande diversidade de
Por outro lado, a pressão seletiva polinizadores dependendo do lugar em
exercida por herbívoros pode afetar o que ocorre (Maimoni-Rodella & Yanp,
fitness da planta de forma que 2004).
consomem as flores e seus gametas, ou
Assim sendo, o presente estudo
indireta, através da alteração das
teve como objetivo avaliar se a
características florais que influenciam
herbivoria na flor diminui as taxas de
as taxas de visitação de polinizadores
visitação de três espécies de
(Strauss et al., 1996; Agrawal, 1999;
Hymenoptera em Ipomoea nil
Souza, 2009). Dessa forma, a evolução
(Convolvulaceae) numa área de
de caracteres florais deve relacionar a
Caatinga do Rio Grande do Norte.
planta, o polinizador e o herbívoro
(Strauss, 1997).
Material e Métodos
Existem evidências, para alguns
grupos de polinizadores, que o Área de Estudo
tamanho da pétala e a simetria são,
O estudo foi desenvolvido na
muitas vezes, uma pista mais
Estação Ecológica do Seridó (ESEC-
importante do que a quantidade de
Seridó), Serra Negra do Norte, Rio
flores. Logo, essa característica é um
Grande do Norte, Brasil. Apresenta
dos principais fatores de atratividade
área de 1.166,38 ha e está situada no
(Conner & Rush ,1994; Lehtila &
domínio da Caatinga (Benck et al,
Strauss, 1996).
2006).

96
97
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Coleta de Dados considerada visitada a flor na qual os


polinizadores efetivamente entrassem
A área amostral escolhida para a
na sua corola.
coleta de dados foi uma parcela onde
as flores de Ipomoea nil ocorriam em Análise dos Dados
grande abundância, numa área próxima
Para cada espécie de
à sede da ESEC. Três espécies de
Hymenoptera, foi calculada a
Hymenoptera foram escolhidos
frequência de visitação somando-se o
previamente para acompanhar suas
número de visitas para os dois
taxas de visitação nas flores de
tratamentos (controle, herbivorada)
Ipomoea nil.
nas 18 janelas de observação. Para
Na área, quatro observadores verificar se existe preferência por flores
seguiram transectos paralelos onde sadias ou herbivoradas, foi calculada a
realizavam suas observações. Para diferença média de visitação entre as
simular o efeito da herbivoria, cada flores herbivoradas (tratamento) e as
observador sorteou duas flores sadias (controle). Os dados foram
aleatoriamente para serem danificadas testados através de um teste - t
e outras duas permaneciam intactas. O pareado por meio do software
corte nas danificadas removia uma estatístico R versão 2.11.1.
porção da área foliar, como ilustra a
Resultados
figura 1 abaixo.
A freqüência de visitas, ou seja,
o número total de visitas registradas
somando todas as réplicas do controle
e do tratamento para as três espécies
de Hymenoptera podem ser
observadas na tabela 1 abaixo.

Figura 1. Ilustração do corte realizado


nas flores danificadas para simulação
de herbivoria.

Para verificar as taxas de


visitação, foram feitas 18 janelas de
observação com cinco minutos de
duração por observador. Neste
intervalo foi anotado o número de
visitas feitas por cada uma das três
espécies (hymenoptera 1, 2 e 3). Só foi

97
98
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Tabela1. Freqüência da visita de A


Vespinha
polinizadores em Ipomoea nil

5
encontrada durante o estudo.

4
Número de visitas

Número de visitas
Contro Tratamen Tot

3
Espécies
le to al

2
Hymenopt

1
era 1 (A. 76 58 134
mellifera)

0
C T
Hymenopt Tratamento

era 2 35 18 53 B
Apis
(Vespidae)

7
Hymenopt
6
era 3 438 390 828
5
Número de visitas

(Apoidae)
4
3
2

O teste-t pareado para as


1

espécies de Hymenoptera 1 e
0

Hymenoptera 2 mostrou que o efeito


C T
simulado de herbivoria afetou a Tratamento
freqüência de visitas dos polinizadores C
Arapua
entre os tratamentos (t=2,4005, gl=26,
p=0,0238; t=2,081, gl=34, p=0,0451 Fig.
1 A e B, respectivamente). Já para a
20

espécie de Hymenoptera 3, o teste t


Número de visitas

15

pareado não demonstrou diferença


significativa na freqüência de visitação
10

entre os tratamentos (t=1,7255, gl=68,


p=0,0889; Fig.1 C)
5
0

C T

Tratamento

Figura 1. Box plot da frequência de


visita floral das espécies de
Hymenoptera 1 (A), Hymenoptera 2 (B)
e Hymenoptera 3 (C) nos tratamentos.

98
99
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Discussão A flor de I. nil é considerada


promíscua, uma vez que possui
Avaliando o resultado da
características que facilitam o acesso ao
freqüência de visitas florais entre os
néctar, como a simetria radial da corola
tratamentos das três espécies de
e a disposição dos estames e do
Hymenoptera, observamos que houve
estigma, favorecendo uma grande
uma preferência por flores não
quantidade de polinizadores. Maimoni-
herbivoradas nas espécies de
Rodella e Yanp (2007) encontraram
Hymenoptera 1(Apis mellifera) e
cerca de 19 espécies polinizadoras para
Hymenoptera 2 (Vespidade). Já
a espécie, sendo que os hymenópteros
Hymenoptera 3 (Apoidae), conhecido
foram responsáveis por
popularmente como arapuá,
aproximadamente 70% das visitações.
apresentou um comportamento
De acordo com a “Hipótese da
generalista, não demonstrando
Informação Ótima” (Neal et al., 1998),
preferência entre flores herbivoradas e
desvios na assimetria poderiam
não herbivoradas.
acarretar no não reconhecimento da
Existem evidências de que flor pelos polinizadores, o que poderia
abelhas respondem a vários estímulos explicar a preferência por flores
visuais, sendo relatada a sua intactas dos hymenópteras 1 e 2.
preferência por flores simétricas e
A preferência por flores não
maiores (Ribeiro, 2009), podendo ser
herbivoradas é uma padrão geral que
sensíveis a pequenos desvios na
pode variar muito entre os tipos de
simetria floral (Soares et al. 2009).
polinizadores de acordo com outros
Dessa forma, a maior freqüência de
fatores não relacionados
visitas realizadas em plantas não
necessariamente à assimetria floral
herbivoradas pela Apis mellifera
(Souza, 2009; Ribeiro, 2009). Odor,
(Hymenoptero 1), pode ser devido à
quantidade de néctar e pólen e padrão
sensibilidade em perceber a assimetria
de coloração são fatores que devem ser
floral como um indicativo de má
integrados na determinação da taxa de
qualidade do recurso. Ainda é possível
visitação dos polinizadores (Ribeiro
especular que o período chuvoso em
2009). Considerando tais ressalvas, os
que o experimento foi realizado pode
efeitos da herbivoria sobre a taxa de
contribuir com uma maior oferta de
visitação observados neste estudo
recursos, levando a uma maior
podem não representar o principal
seletividade por parte dos
fator influenciando a visita de
polinizadores nesse período. O que não
polinizadores. Existem estudos que
ocorreria provavelmente nos períodos
identificam, por exemplo, padrões
de seca, onde a oferta de recurso é
idiossincráticos na preferência de Apis
baixa e um comportamento mais
mellifera por flores herbivoradas
generalista pode ser mais evidente.
(Ribeiro, 2009; Soares, 2009). Isso pode
ser um indicativo de que outros fatores
99
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

(coloração, odor, quantidade de néctar pollinator visitation to wild radish,


e pólen) podem atuar sobre a Raphanus raphanistrum. Oecologia
preferência de polinizadores. 105:509–516.
Galen, C., T. E. Dawson, & Stanton, M.
No entanto, a herbivoria pode,
L. 1989. Carpels as leaves meeting
ainda, provocar alterações nestes
the carbon cost of reproduction in
fatores e influenciar indiretamente a
an alpine buttercup. Oecologia
taxa de visitação de polinizadores.
95:187–193.
Dessa forma, sugere-se que outras
Leal, I.R.; Tabarelli, M.; Silva, J.M.C.
medidas para a taxa de visitação
(Eds) 2003. Ecologia e conservação
associadas ao efeito da herbivoria
da caatinga. Ed. Universitária da
(além de relações com assimetria floral)
UFPE, 822.
sejam realizadas, fornecendo um
Lehtila, k. & Strauss, S. Y. 1999. Effects
cenário mais real das prováveis causas
of foliar herbivory on male and
que restringem a visita de
female reproductive traits in wild
polinizadores.
radish Raphanus raphanistrum.
Ecology 80:116-124.
Maimoni-Rodella, R. C. S. & Yanp,
Agradecimentos Yanagizawa. 2007. Floral biology
and breeding system of three
Ao Guiga, pelos estimados e
Ipomoea weeds. Planta Daninha,
sempre presentes conselhos
Viçosa-MG 25:35-42.
estatísticos. Aos professores
Neal, P. R; Dafni, A. & Giurfa,M. 1998.
orientadores presentes nesta edição da
Floral symmetry and its role in
aula de campo pelo grande apoio. E à
plant-pollinator systems:
toda equipe técnica da ESEC-Seridó, em
terminology, distribution and
especial à Núbia, pelas delícias que
hypothesis. Annu. Rev. Ecol. Syst.
preparou com tanta dedicação.
29:345-373.
Referências Ribeiro, E.M.S. 2009. Mudança de
simetria, diminuição na área e
Agrawal, A. A. 1999. Induced responses
assimetria floral alteram a visitação
to herbivory in wild radish: effects
em Oxalis psoraleoides
on several herbivores and plant
(Oxalidaceae)?In: Leal, I.R.;
fitness. Ecology 80:1713-1723.
Almeida, W. R.; Aguiar, A. V.
Bencke, G.A., Maurício, G.N., Develev,
Ecologia da caatinga: curso de
P.F., Goerck, J.M. 2006. Áreas
campo 2009.
importantes para conservação de
Soares, S. M.; Ribeiro, E.; Mendes, M.
aves no Brasil. Parte 1-Estados do
G. F.; Sobrinho, M.S. 2009.
domínio da mata atlântica. Save
Tamanho e simetria floral
Brasil, São Paulo.
influencia a preferência de
Conner, J. K. & Rush, S. 1996. Effects of
visitantes em Zornia diphilla
flower size and number on

100
101
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

(Fabaceae)? In:Leal, I.R.; Almeida, Souza, Analice. 2009. Existe correlação


W. R.; Aguiar, A. V. Ecologia da entre florivoria e tamanho da flor
caatinga: curso de campo 2009. em espécies herbáceo-arbustivas
Strauss, S. Y. 1997. Floral characters link de uma área de caatinga no
herbivores, pollinators and plant município de Parnamirim, PE?In:
fitness. Ecology 78:1640-1645. Leal, I.R.; Almeida, W. R.; Aguiar, A.
Strauss, S. Y., J. K. Conner, and S. Rush. V. Ecologia da caatinga: curso de
1996. Foliar herbivory affects floral campo 2009.
characters and plant attractiveness
to pollinators: implications for
male and female plant fitness.
American Naturalist 147:1098–
1107.

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

RELAÇÃO ENTRE A ESTRUTURA E RIQUEZA DA VEGETAÇÃO LENHOSA E RIQUEZA DE


AVES NA SERRA VERDE DA ESTAÇÃO ECOLÓGICA DO SERIDÓ, RN

ADRIANA PELLEGRINI, TONNY MARQUES, EMERSON SOUSA, RICARDO EMIDIO,

Introdução naturais, surgindo como principais


sítios de conservação da
As aves, por estarem presentes
biodiversidade. (Silva, 2010). A
em todos os biomas e ocuparem uma
caatinga é a vegetação predominante
grande diversidade de nichos
na região Nordeste, cobrindo 54,53 %
ecológicos, são consideradas boas
dos 1.548.672 km2 da área da região
indicadoras de biodiversidade dos
(IBGE, 2005). Diversos autores afirmam
ecossistemas (Vielliard, 2000; Vielliard
que o domínio da caatinga possui
et al., 2010). De modo complementar,
relativamente baixo número de
as condições de clima, solo e as
espécies (Duque, 1980; Silva, 1993)
múltiplas formas de relevo que se
mas, no seu conjunto, a estrutura é
traduzem em diferentes paisagens,
bastante variada.
explicam a razão de a comunidade
Entre as espécies de aves
vegetal possuir tamanha variabilidade
residentes na Caatinga, 284 (60,5%) são
(Santana & Souto, 2006). Aspectos da
dependentes ou semi-dependentes
fisionomia da comunidade vegetal, tais
dessa vegetação, mostrando sua
como o estrato e porte são
importância na manutenção de quase
características associadas à composição
dois terços das espécies de aves do
da comunidade de aves (Fleishman et
Brasil (Silva, 2003). Assim, o
al., 2003). Apesar das aves serem
levantamento da riqueza de aves pode
classificadas conforme sua
indicar a efetividade das Unidades de
dependência florestal (Silva et al.,
Conservação de Uso Integral, e
2006), há diferenças nas fisionomias
identificar características vegetais que
entre os habitats que podem explicar a
têm mais atrativos para a comunidade
presença ou ausência de espécies de
de aves torna-se importante para
aves localmente (McArthur, ).
futuras estratégias conservacionistas.
As intervenções humanas
afetam significativamente as espécies Material e Métodos
de aves nos diferentes habitats, pois
desmatam florestas primárias que são Área de estudo
transformadas posteriormente em
O trabalho foi desenvolvido na
matas secundárias (Marine e Garcia,
Serra Verde, região localizada na
2005). As Unidades de Conservação
Estação Ecológica (ESEC) do Seridó e
têm um papel importante na mitigação
possui o pico de 394 metros ao nível do
dos efeitos negativos dos ambientes
mar.

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Coleta de dados

Entre 6:00 e 11:00 h percorreu-


se uma distância de 3000 metros ao
longo de uma trilha pré-existente, e
marcou-se 10 pontos de 300 em 300
metros (Figura 1). Em cada ponto,
registravam-se as espécies da avifauna,
utilizando o método do “ponto de
escuta”, com janela de cinco minutos e
anotava-se a hora da observação. Em Figura 1. Mapa com a localização dos
cada ponto também era feito o pontos amostrais na trilha da Serra
levantamento das espécies lenhosas e Verde (ponto 1 mais baixo e ponto 6
medidos o diâmetro a altura do solo mais alto).
(DAS) de cinco árvores de maior altura,
que estavam acima do estrato superior
da floresta. Para isso uma parcela Resultados
circular com raio de 5m tendo o
observador de aves no centro foi Foram encontradas oito
utilizada. A análise estatística utilizada espécies lenhosas e 47 espécies de aves
foi a regressão linear múltipla, onde a (Tab. 1 e 2).
riqueza de aves foi a variável
dependente e o DAS, a riqueza das Tabela 1. Espécies e famílias de
lenhosas e hora foram as variáveis lenhosas amostradas na Serra Verde
independentes. Como a riqueza de Nome científico Familia
aves varia pouco entre 50-1000m de Anadenanthera FabMimosoideae
altitude (Blake & Loiselle, 2000), a colubrina
altitude não foi incluída como uma Aspidosperma pyrifollum Apocynaceae
variável independente. As análises Bauhinia chellantha FabMimosoideae
foram feitas no programa R 2.10.1 (R Caesalpinia pyramidalIis FabCaesalpiniacea
core development team 2009). e
Combretum leprosum Combretaceae
Croton sonderianus Euphorbiaceae
Mimosa tenuiflora FabMimosoideae

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Tabela 2. Espécies e famílias de aves Volatina jacarina Emberezidae


amostradas na Serra Verde Procacicus solitarius Icteridae
Icterus cayanensis Icteridae
Nome científico Família
Icterus jamacaii Icteridae
Leptotilla vereauxi Columbidae Gnorimopsar chopi Icteridae
Aratinga cactorum Psitacidae Euphonia chlorotica Fringilidae
Coccyzus melacoryphus Cuculidae
Crotophaga ani Cuculidae A curva cumulativa demonstra
Glaucidium brasilianum Strigidae que o esforço amostral não alcançou o
Hydropsalis hirundinaceus Caprimulgidae limite de saturação de amostragem das
Chlorostilbon lucidus Trochilidae espécies, o qual não é adicionado mais
Nystalus maculatus Bucconidae nenhuma espécie nova (Figura 2).
Picumnus limae Picidae
Veniliornis passerinus Picidae
Formicivora melanogaster Thamnophilidae
Lepidocolaptes
Dendrocolaptidae
angustirostris
Synallaxis frontalis Furnariidae
Certhiaxis cinnamomeus Furnariidae
Pseudoseisura cristata Furnariidae
Todirostrum cinerium Rhynchocyclidae
Hemitriccus
margaritaceiventer Rhynchocyclidae
Figura 2. Curva cumulativa nos 10
Elaenia spectabillis Tyranidae
pontos amostrados (pi). Barras pretas
Euscarthmus meloryphus Tyranidae
são espécies avistadas pela primeira
Myiophobus fasciatus Tyranidae
vez e barras brancas são espécies
Myiodynastes maculatus Tyranidae
repetidas.
Phaeomyias murina Tyranidae
Empidonomus varius Tyranidae O resultado da regressão
Tyrannus melancholicus Tyranidae múltipla foi significativo apenas para a
Casiornis fuscus Tyranidae variável DAS (t= -2,66; g.l.= 6,3; p=
Myiarchus tyrannulus Tyranidae 0,038), enquanto as variáveis de
Cyclarhis gujanensis Vireonidae riqueza de plantas lenhosas (t= -1,330,
Hylophiolus g.l.= 6,3, p= 0,23) e hora de observação
Vireonidae
amaurocephalus (t= -0,121, g.l.= 6,3, p= 0,91) não
Cyanocorax cyanopogon Corvidae influenciaram a riqueza de aves (Figura
Troglodytes musculus Trogloditidae 3). A proporção explicada pelo modelo
Polioptila plumbea Polioptilidae (R2) foi igual a 0,50.
Turdus rufiventris Turdidae
Lanio pileatus Thraupidae
Paroaria dominicana Thraupidae

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ambiente, sendo a forma mais fácil e

4
aceita (Vielliard, 2000). Assim, a
conservação de aves da Serra Verde
2
Parciais | Riqueza de aves

devem ser incorporadas ao Plano de


0

Manejo da ESEC.

A riqueza de espécies vegetais


-2

lenhosas na Serra Verde foi pequena,


com apenas sete espécies, e esse fato
-4

-10 -5 0 5 10 15 20 pode estar relacionado com o estágio


Parciais | DAS (cm)
sucessional da Serra ou as atividades
Figura 3. Relação da riqueza de aves antrópicas, como o uso da área por
amostradas na Serra Verde com o caprinos selvagens. As áreas com
diâmetro a altura do solo (DAS) das vegetação de menor porte (menor
espécies de lenhosas da Serra Verde diâmetros das árvores de maior altura)
(ESEC-Seridó). tiveram maior riqueza de aves e estão
relacionadas com áreas abertas.
Muitos estudos suportam a hipótese de
que a composição da avifauna é mais
Discussão
relacionada com a estrutura
A riqueza de aves amostradas (fisionomia) do que com a composição
em apenas uma manhã foi alta, pois da vegetação (florística) (Fleishman et
representou 46% da lista total das al., 2006). Os resultados deste estudo
espécies encontradas na Serra Verde da indicam que, na Serra Verde, a
ESEC (Plano de Manejo, 2004). De comunidade de aves está mais
modo complementar, 18 novas relacionada com a estrutura da
espécies que não pertenciam à lista vegetação.
oficial foram identificadas. Mas,
As espécies de aves da Caatinga
levando em consideração a curva
podem ser classificadas segundo sua
cumulativa, há ainda
dependência da floresta e, no caso da
mais espécies que não foram
amostragem na Serra Verde, 50% das
amostradas no dia, pois a curva não
espécies foram classificadas com
estabilizou mesmo com a adição dos
independentes de ambientes florestais
novos registros de aves.
(Silva et al., 2003). Pode ser que este
Mesmo com resultado parcial,
fato explique a maior riqueza destas
este resultado pode ser um indicativo
nas áreas abertas e sugere que as
de que a conservação e proteção das
espécies de aves residentes da Caatinga
áreas de vegetação da Caatinga na
estejam associadas às áreas abertas,
ESEC estejam atraindo novas espécies
com estrutura vegetal em estágios
de aves. A comunidade de aves é um
iniciais de sucessão (menores
indicador de biodiversidade do
diâmetros). Como a ESEC possui esta

105
106
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

fisionomia vegetal, pode-se encontrar a sensitividade. In: I.R. Leal, M.


riqueza de aves associada a este tipo de Tabarelli & J.M.C. Silva (eds.).
vegetação. Ecologia e conservação da
Caatinga. Editora Universitária,
Agradecimentos
Universidade Federal de
Agradecemos ao Mauro Pernambuco, Recife, Brasil. pp.
Pichorim por suas valiosas idéias ao 237-273.
nosso projeto livre e empréstimo do Silva, W.R., P, M.A., Gabriel, V.A. 2010.
seu Ipod. Agradecemos a equipe da A avifauna como promotora da
ESEC- Seridó pelo apoio logístico e aos restauração ecológica. In: Von
colegas pela discussão. Matter, S., Straube, F.C., Accordi,
I.A. Piacentini, V.Q., Cândido, J.F.
Referências Ornitologia e Conservação,
ciência aplicada, técnicas de
IBGE. 2005. Mapa de biomas e
pesquisa e levantamento.
vegetação. Instituto Brasileiro de
Technical Books. 516 p.
Geografia e Estatística. Disponível
em: http://www.ibge.gov.br. Vielliard, J.M.E. 2000. Bird community
Acesso em 26 de junho de 2011. as an indicator of biodiversity:
results from quantitative surveys
Fleishman, E. Mcdonal, N., Mac Nally,
in Brazil. Academia Brasileira de
R., Murphy, D.D., Walter, J., Floyd,
Ciência. 72: 323- 330.
T. 2003. Effects of floristics,
physiognomy and non-native Vielliard, J.M.E., Almeida, M.E.C., dos
vegetation on riparian bird Anjos, L., Silva, W.R. 2010.
communities in a Mojave Desert Levantamento quantitativo por
watershed. Journal of Animal pontos de escuta e o Índice
Ecology. 72: 484-490. Pontual de Abundância (IPA) In:
Von Matter, S., Straube, F.C.,
Marini, M.A, Garcia, F.I. 2005.
Accordi, I.A. Piacentini, V.Q.,
Conservação de aves no Brasil.
Cândido, J.F. Ornitologia e
Megadiversidade, 1: 95-102.
Conservação, ciência aplicada,
Santana, J.A.S., Souto, J.S. 2006. técnicas de pesquisa e
Diversidade e estrutura levantamento. Technical Books.
fitosociológica da Caatinga na 516 p.
Estação Ecológica do Seridó, RN.
Biologia e ciências da terra. 6: 231-
242.

Silva, J.M.C., M.A. Souza, A.G.D. Bieber


& C.J. Carlos. 2003. Aves da
Caatinga: status, uso do habitat e

106
107
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

EFEITO DE TRILHA SOBRE A COMUNIDADE DE FORMIGAS EM UM FRAGMENTO DE


CAATINGA NO SERIDÓ

LEONARDO EMMANUEL CARVALHO, GUSTAVO BRANT, HONARA MORGANA, SILVANA MASCIADRI

Introdução avaliar respostas biológicas ambientais,


decorrentes de mudanças do ambiente
A caatinga é reconhecida como
abiótico, visto que a complexidade da
um domínio formado por um mosaico
vegetação, o grau de perturbação do
de arbustos espinhosos de florestas
hábitat e a disponibilidade de recursos
sazonalmente secas, com um sistema
afetam fortemente a estrutura das
de chuva extremamente irregular ano a
comunidades desses organismos. Vale
ano, o que resulta em secas severas
ressaltar a importância das formigas
periódicas. Apesar das condições
como um dos principais componentes
extremas, o bioma apresenta mais de
bióticos de ambientes estruturalmente
2.000 espécies entre plantas e animais,
complexos. Outra vantagem para se
incluindo registros de endemismo. É
trabalhar com esse grupo é a facilidade
importante destacar que as porções
de coleta e fácil identificação (Whitford
arbóreas desse bioma se concentram
e Barness, 2008).
em manchas de solos ricos em
O manejo de trilhas em
nutrientes. (Leal et al. 2005).
unidades de conservação é um grande
Nos trópicos, onde se concentra desafio para seus gestores, criando um
a maior parte da biodiversidade do conflito entre o uso e impacto
planeta, os processos mais ambiental das mesmas. Por um lado, a
correlacionados à perda dessa educação ambiental e a pesquisa são
biodiversidade são a destruição e duas atividades fundamentais, que as
fragmentação de habitat. Estes acabam áreas protegidas têm que atingir para o
criando mosaicos de áreas conservadas, cumprimento dos seus objetivos de
vegetação secundária e porções conservação. Por outro, muitas destas
manejadas, que tem como uma das ações podem provocar alterações não
suas principais consequências o desejadas e contraditórias a estes
aumento do efeito de borda. O estudo objetivos.
do impacto das bordas é importante
A construção de trilhas implica
para compreender as diversas
abrir caminho através de um ambiente
mudanças estruturais de comunidades
natural. Portanto, vários fatores devem
naturais frente a distúrbios, em sua
ser considerados na hora de fazer e
maioria antrópicos (Cavalcanti e Rodal,
manter uma trilha em uma área
2010).
protegida. A forma e a dimensão das
Dentre os grupos animais, as trilhas, o tipo de solo, de dossel das
formigas são bons indicadores para florestas, a contenção da erosão e

107
108
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

compactação do solo, são alguns dos solução de mel diluído. Dois


fatores relevantes no desenho de guardanapos com a isca de sardinha e
trilhas. dois com a isca de mel foram dispostos
em cada ponto amostral, que
Na Estação Ecológica do Seridó
constituíam um bloco. Os guardanapos
(ESEC) existem várias trilhas de
permaneceram 45 minutos em cada
visitação e pesquisa, mas não se sabe
ponto, sendo em seguida recolhidos
se as mesmas causam impacto
juntamente com as formigas atraídas
significativo sobre as condições
pela isca e guardados em recipientes de
ambientais, como temperatura,
plástico, que foram levados para
compactação e erosão do solo, ou nas
posterior triagem do material em
comunidades biológicas.
laboratório. Em cada unidade amostral
Os objetivos deste trabalho são: foram medidas temperatura do solo
1-Avaliar se a temperatura e a através de um termômetro específico
compactação do solo são afetadas pela para solos. Para medir a compactação
abertura de trilhas na ESEC; e 2- se as do solo, utilizou-se um facão, solto na
comunidades de formigas são afetadas altura do peito, para amostrar a
pela abertura de trilhas. profundidade de perfuração
(Vasconcellos, 2011, comunicação
pessoal). Em cada ponto realizou-se
Material e Métodos três solturas para o cálculo da média. O
grau de compactação foi medido
O trabalho foi desenvolvido em
através do inverso da profundidade
uma área de Caatinga, na Estação
média perfurada pelo facão.
Ecológica do Seridó, localizada no
Município de Serra Negra do Norte Para testar se a presença da
(6°15’S e 37°16’O). trilha afeta a temperatura, a
compactação do solo, e a riqueza e
Para a coleta de dados foi
abundância de formigas, foi realizada
marcado um percurso de 100 metros,
uma ANOVA One-Way em Bloco, e em
contados a partir do início da “Trilha da
seguida, foi feito um teste de Tukey
Caveira”. Oito pontos com no mínimo 5
para comparar os tratamentos.
metros de distância foram sorteados
aleatoriamente. Em cada ponto foram
definidos três níveis de distância em Resultados
relação ao centro da trilha
(tratamentos): 0 m, 5 m e 10 m. Ao Foram amostrados 1245
todo foram 24 unidades amostrais (três indivíduos de apenas sete espécies de
níveis por oito réplicas). formigas. A grande maioria dos
indivíduos pertencia à espécie
Para amostrar a fauna de Camponotus sp., representando 93% da
formigas, foram utilizados dois tipos de abundância total amostrada (Figura 1).
iscas, sardinha com cuscuz e uma
108
109
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Em relação à temperatura do
solo, o teste de ANOVA mostrou que os
tratamento diferem entre si (Figura 3;
R² = 0,725; F2,14 = 1,07; p = 0,04). No
entanto, o teste de Tukey foi apenas
marginalmente significativo, indicando
que o padrão encontrado não é muito
consistente (trilha-5 m, p = 0,09; trilha
– 10 m, p = 0,053).
Figura 1: Abundância total de formigas 35
por morfotipo.

Temperatura do solo (C)


Nossos resultados demonstram 30
que a compactação do solo diminui
com o distanciamento da trilha (Figura
2), existindo evidências de uma rápida 25
diminuição da compactação do solo em
apenas 5 metros da trilha (R² = 0,85;
F2,14= 8,32; p = 0,004). O teste Tukey 20
Trilha 5m 10m
confirmou essa tendência, Tratamento
demonstrando que os tratamentos com Figura 3: Temperatura do solo em
5 e 10 m de distância não diferiram diferentes tratamentos: 10 m, 5 m e no
entre si (p = 0,74), mas os dois diferem centro da trilha.
em relação à trilha (trilha-5m, p= 0,01;
Ao contrário das variáveis
trilha-10 m, p = 0,001).
abióticas, a comunidade de formigas
6 não respondeu de forma diferenciada
entre os tratamentos (Figuras 4 e 5). A
5
abundância de formigas não variou
Compactação do Solo

4 entre os tratamentos (R2=0,66;


F2,14=0,998; p=0,393). Da mesma forma,
3
a riqueza de espécies de formigas
2 encontradas nos tratamentos não foi
diferente (R2=0,49; F2,14=0,72; p=0,5).
1

0
Trilha 5m 10m
Tratamento
Figura 2: Compactação do solo em
diferentes tratamentos: 10 m, 5 m e no
centro da trilha.

109
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

medida que os pontos foram


150
adentrando a mata. O mesmo ocorreu
com o grau de compactação do solo. A
temperatura do solo é afetada
100
fortemente pela densidade,
Abundância

complexidade estrutural e funcional da


vegetação. Com uma maior presença
50
de áreas vegetadas, a radiação solar é
absorvida diminuindo a
evapotranspiração e atenuando o
0
Trilha 5m 10m efeito térmico no solo (Begon, et al.
Tratamento 2006).
Figura 4: Abundância de formigas em
diferentes tratamentos: 10 m, 5 m e no Com relação à compactação do
centro da trilha. R² = 0,66; F2,14 = solo, a relação decresce com o
0,998; p = 0,393. gradiente de distância em relação à
trilha da Caveira. Isto pode ser
5
explicado pelo maior grau de pisoteios
que a trilha sofre pelas atividades
4
humanas. Vale destacar que na
3
caatinga a intensa atividade pecuária
Riqueza

extensiva pode promover um maior


2
grau de compactação do solo, fazendo
com que o mesmo altere suas
1
propriedades estruturais, aumentando
o seu nível de erosão e reduzindo sua
0
aeração e trocas catiônicas,
Trilha 5m 10m
Tratamento imprescindível para a manutenção da
fauna edáfica (Sobral et al, 2007).
Figura 5: Riqueza de formigas em
diferentes tratamentos: 10 m, 5 m e no No entanto, os resultados não
centro da trilha. R² = 0,66; F2,14 = apontaram um efeito da trilha sobre a
comunidade de formigas da mata no
0,998; p = 0,393.
entorno da trilha da Caveira. A baixa
complexidade estrutural da vegetação
pode limitar a diversidade de grupos de
Discussão
formigas por apresentar uma menor
As variáveis ambientais da quantidade de microhábitats e permitir
temperatura do solo e grau de um número maior de interações
compactação foram influenciadas pela competitivas entre os grupos (Leal,
presença da trilha. Os valores da 2003), o que pode explicar a
temperatura foram diminuindo à

110
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

dominância de uma única espécie que Referências


foi encontrada em nossos resultados.
Begon, M., Townsend, C.R., Harper, J.L.
O gênero Camponotus sp. foi o 2006. Pp 1-746. Ecology from
mais abundante na região, refletindo o individuos and ecosystems.
seu hábito generalista e de ampla
Cavalcanti, A.D.C, RODAL, M.J.N. Efeito
distribuição em áreas antropizadas. A
de borda e dinâmica de plantas
dominância de apenas essa espécie
lenhosas em áreas de caatinga
confirma que esse fragmento sofreu
em carnaubais RN. Revista
um impacto significativo em um
Caatinga, Mossoró, v. 23, n. 2, p.
momento pretérito e que a vegetação
41-50
seja de crescimento secundário.
Leal, I.R. Diversidade de formigas em
O estudo de comunidades de
diferentes unidades de paisagem
formigas afetadas pela abertura de
da Caatinga. In: Ecologia e
trilhas é de crucial importância para
Conservação da Caatinga. Eds:
políticas de manejo e conservação de
Leal, I.R., Tabarelli, M, Silva,
áreas da caatinga, visto que a abertura
J.M.C. Editora Universitária UFPE.
de trilhas pode atuar na
2003.
desestruturação de comunidades
vegetais e animais e reduzir os serviços Leal, I.R., Silva, J.M.C, Tabarelli, M.,
ecossistêmicos que o domínio da Lacher JR., T.E. Mudando o curso
Caatinga oferece para a população que da conservação da biodiversidade
deles se beneficiam. da Caatinga no Nordeste do
Brasil. Megadiversidade, vol. 1,
nº. 1, p.139-147,jul 2005.
Agradecimentos
Sobral, I.S, Santana, R.K.O, Gomes, L.J.,
Agradecemos os professores Alexandre
Costa, M., Ribeiro, G.T., Santos,
Vasconcellos, Márcio Zikan, Gindomar
J.R. 2007. Avaliação dos impactos
Santana e Mauro Pichorim pela
ambientais no Parque Nacional
dedicação em campo e contribuições
Serra de Itabaiana-SE. Caminhos
teóricas. Agradecemos também a
da Geografia. 8:102-110
Guilherme Mazzochini pelo constante
apoio nas análises estatísticas. Whitford, W.G, Barness, G.,
Agradecemos também aos funcionários Steinberger, Y. 2008. Effects of
e dirigentes da ESEC pelo acolhimento three species of Chihuahuan
e dedicação ao grupo de pós- Desert ants on annual plants and
graduandos durante todos os dias soil properties. Journal of Arid
deste estudo. Environments. 72:392-400.

111
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Projetos sem orientação II

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RIQUEZA E ABUNDÂNCIA DE HERBÁCEAS SOB O DOSSEL DE LENHOSA EXÓTICA


(Prosopis juliflora) E LENHOSA NATIVA (Mimosa hostilis) NA CAATINGA, ESEC- SERIDÓ

BRUNO GAZOLA DE FARIA & LEONARDO EMMANUEL FERNANDES DE CARVALHO

Introdução pela captação de recursos abaixo do


solo (Casper & Jackson, 1997). Essa
Variação em aspectos da
intensa competição é direcionada pela
competição e facilitação pode
capacidade das raízes serem mais
determinar a sobrevivência das plantas
profundas ou mais ramificadas e
nas comunidades nas quais estão
conseguirem captar uma maior
inseridas (Grime, 1977). Os efeitos
quantidade de nutrientes do solo.
competitivos podem ser separados em
Algumas herbáceas, nesse caso,
dois componentes: uma resposta
conseguem levar vantagem sobre as
competitiva e uma habilidade de efeito
lenhosas em seus estágios de plântula,
competitivo. O primeiro componente
impedindo o desenvolvimento das
pode ser medido pela capacidade de
plantas arbóreas até que alguma
uma espécie superar as suas vizinhas,
perturbação ocorra no ambiente
seja por uma maior eficiência na
(Brown & Archer, 1999).
captação de recursos, ou por meio de
um crescimento mais rápido. Já o As interações positivas possuem
segundo se refere à capacidade de uma um efeito de expandir o nicho realizado
espécie de inibir ativamente o das espécies (Bruno et al, 2003). Com
crescimento e sobrevivência de suas relação a esse processo, os mecanismos
vizinhas. Muitos dos experimentos que se tornam mais evidentes quando há
observam esse tipo de efeito uma intensa pressão abiótica. É a
competitivo entre plantas são chamada hipótese do gradiente de
realizados em ambiente controlado stress (HGS). Em ambientes áridos e
(Peltzer & Köchy, 2001). com pouca pluviosidade como a
caatinga é espera-se que as interações
As plantas podem competir por
positivas aumentem à medida que as
luz e por nutrientes (Tilman, 1985).
condições se tornem mais severas ou
Com relação ao primeiro tipo de
haja um aumento na pressão de
competição (acima do solo), plantas de
pastagem. Sob condições estressantes
porte maior diminuem a capacidade
as plantas tendem a amortecer os
fotossintética de plantas menores por
efeitos do ambiente umas sobre as
causa do efeito do sombreamento. Esse
outras e, dessa forma, mecanismos de
efeito competitivo é muito freqüente
facilitação são encontrados (Maestre et
entre lenhosas e herbáceas. No
al., 2009).
entanto, herbáceas e gramíneas
também competem com as lenhosas

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

As árvores apresentam algumas Material e Métodos


vantagens para as plantas herbáceas
O estudo foi desenvolvido na
em ambientes onde há alternância de
Estação Ecológica do Seridó – ESEC
períodos secos e chuvosos e existe uma
(UTM 0692935, 9273445), localizada no
forte pressão de herbivoria. Nos
município de Serra Negra do Norte, RN.
períodos secos as plantas lenhosas
A Unidade de Conservação encontra-se
permitem a sobrevivência de herbáceas
na Caatinga, o único exclusivamente
com raízes rasas, melhorando as
brasileiro (Silva et al., 2003). O clima é
condições de fertilidade do solo pela
semi-árido, com temperatura média
liberação de nitrogênio e matéria
entre 21-28 graus Celsius, e
orgânica (Kahi et al., 2009).
precipitação anual entre 500-1000 mm
A espécie Prosopis juliflora é da concentrada entre os meses de
família Leguminosae, subfamília fevereiro e maio (INPE, 2001).
Mimosidae e conhecida popularmente
Duas áreas na ESEC foram
como algaroba. Esta espécie foi
escolhidas para amostragem: uma
introduzida no Rio Grande do Norte em
contendo predominantemente a
1946, com sementes originadas do
espécie Prosopis juliflora e outra
Peru, em 1948 originadas do Sudão
ausente desta apresentando vários
(Oliveira et al., 1999) e tem a
indivíduos de Mimosa hostilis e outras
capacidade de fixar nitrogênio e
espécies nativas de lenhosas. Ambas as
melhorar solos pobres em nutrientes
áreas estão inseridas num mosaico com
co-ocorrendo com herbáceas. A espécie
áreas abertas predominantemente
Mimosa hostilis é nativa da região da
compostas por herbáceas.
caatinga e é da mesma subfamília da
algaroba. Conhecida como jurema- Em cada uma das áreas de
preta, esta espécie também co-ocorre ocorrência da P. juliflora e M. hostilis
com herbáceas e apresenta caráter foi percorrido um transecto de 40m,
pioneiro, sendo uma das primeiras a amostrando um indivíduo mais próximo
colonizar ambientes degradados. (Prosopis juliflora e Mimosa hostilis) a
cada 3,30m (ponto), aproximadamente,
Diante do exposto o presente
e alternando a cada ponto a direção
trabalho apresenta como objetivos: 1-
(esquerda ou direita) para procura do
Avaliar se existe diferença na riqueza e
espécime. Em cada indivíduo lenhoso
abundância de herbáceas crescendo
amostrado foi medido o diâmetro do
sob a Prosopis juliflora e Mimosa
caule à altura do solo (DAS) e
hostilis; 2- Avaliar se o tamanho das
estabelecido um raio de um metro ao
plantas lenhosas influencia na riqueza e
redor do caule rente ao solo. Na área
abundância das herbáceas.
delimitada pela circunferência, foi
medida a riqueza e abundância de
herbáceas, utilizando caracteres

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

morfológicos visíveis a olho nu, como A variação da riqueza de


disposição dos ramos, folhas, flores e herbáceas foi significativa (R²= 0,759;
frutos. Um indivíduo de cada morfotipo g.l= 1; e p< 0,000) entre P. juliflora
de herbácea foi coletado e identificado (média= 3) e M. hostilis (média=5,833).
(P1, P2, P3...Pn).

Os dados foram analisados de


forma a obter abundância e riqueza
totais de herbáceas para P. juliflora e
M. hostilis (tratamentos). Também foi
analisada a variação de abundância e
riqueza explicada pela possível
influência das referidas espécies de
lenhosas. A variação do DAS de
lenhosas (como covariante) também foi
analisado em relação à riqueza e à
abundância de herbáceas. Todas as
análises acima utilizaram o teste de
ANCOVA no módulo GLM (General
Linear Model) e foram realizadas no Figura 01. Variação média da riqueza de
programa Systat 12.0. herbáceas entre os tratamentos (P.
Resultados juliflora e M. hostilis).

Foram amostrados 24 Em relação à abundância, a


indivíduos, 12 de cada espécie lenhosa. variação não foi significativa (R²= 0,308
A abundância total de herbáceas sob P. e p= 0,240). E o DAS não apresentou
juliflora foi de 721 indivíduos, e para M. relação significativa com a riqueza (p=
hostilis de 545 indivíduos. Foram 0,831) e com a abundância (p= 0,252).
encontrados 12 morfotipos diferentes
sob as espécies de P. juliflora, enquanto
sob M. hostilis 11 morfotipos de
herbáceas foram identificados. Houve
apenas um morfotipo em comum entre
as duas áreas amostradas (riqueza
total= 22 morfotipos). Contudo, a maior
riqueza de herbáceas encontrada por
indivíduo lenhoso ocorreu em M.
hostilis.

115
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Figura 02. Abundância por morfotipo em P. juliflora e M. hostilis.

Discussão (2009), encontrou diferença


significativa nas concentrações de
Na distribuição de riqueza de
carbono, nitrogênio total e fósforo no
herbáceas sob P. juliflora observa-se
solo entre as espécies de lenhosas, com
que a maioria dos morfotipos é
as menores concentrações sob a P.
relativamente rara em relação a um
juliflora. Tal fato é uma evidência para
morfotipo dominante (P10= 677
relacionar os nutrientes como recurso
indivíduos), o qual também é o único
que pode estar funcionando como um
em comum entre aqueles presentes
fator limitante, determinando a
sob M. hostilis, onde a distribuição da
composição de herbáceas e as relações
riqueza é mais homogênea. Tais
competitivas entre as mesmas nas
diferenças na composição e dominância
áreas contempladas nesse estudo.
de herbáceas podem estar relacionadas
a diferentes condições e recursos A respeito da herbácea
existentes sob a P. juliflora e M. hostilis, dominante (P10) em P. juliflora,
as quais funcionariam como filtros também presente em M. hostilis, pode-
ambientais na colonização de se inferir sobre capacidade competitiva
determinadas espécies de herbáceas, superior dessa espécie. Porém, isto
bem como influenciariam nas relações pode estar aliado ao efeito alelopático
competitivas entre as mesmas. da P. julifora sobre as outras espécies,
exceto ou com menos intensidade
Em um estudo envolvendo o
sobre a referida herbácea dominante.
efeito do dossel de P. juliflora e outras
Tal efeito foi testado em outro estudo,
lenhosas sobre plantas herbáceas em
através de extrato solúvel em água de
uma área de savana e colaboradores

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

diversas estruturas da P. juliflora No estudo Kahi et al. (2009), a


(flores, frutos, folhas, sementes, raízes, maior abundância de herbáceas ocorre
caules) e do solo sob influência da em áreas abertas, seguida pelo dossel
espécie sobre a germinação e da espécie nativa, com menos
crescimento de diversas espécies de indivíduos sob a P. juliflora. Apesar da
plantas, encontrando efeitos inibitórios diferença não ter sido significativa na
significativos, mas não afetando todas abundância de herbáceas neste estudo,
as espécies testadas da mesma forma o maior número de indivíduos sobre P.
(Noor et al., 1995). Portanto, pode juliflora do que em M. hostilis, pode ser
estar ocorrendo um efeito de explicado pela facilitação da primeira
facilitação da P. juliflora sobre o sobre um morfotipo, considerando que
morfotipo P10. este representou aproximadamente
94% da abundância sob P. Juliflora.
Como a composição de
herbáceas difere quase completamente As diferenças na influência de
entre P. juliflora e M. hostilis, outros plantas lenhosas exóticas e nativas
fatores como a intensidade de radiação sobre a comunidade de herbáceas da
luminosa e umidade relativa do ar Estação Ecológica do Seridó-ESEC se
podem estar relacionados com os tornam aparentemente evidentes com
morfotipos que se estabeleceram sob o presente e breve estudo. Mas
as lenhosas. A área de P. juliflora necessita-se investigação mais
formava um dossel mais fechado, aprofundada das possíveis variáveis
portanto mais sombreado, favorecendo bióticas e abióticas que estão
a uma condição menos intensa de determinando a estruturação da
evapotranspiração do que na área de comunidade de herbáceas sobre
M. hostilis, onde o dossel é mais exóticas e nativas. O esclarecimento
aberto. desta questão pode contribuir um
plano de manejo da P. Juliflora
Os fatores acima discutidos
(algaroba) na unidade de conservação.
podem explicar em parte a menor
riqueza de herbáceas sobre a P. juliflora
em relação a M. hostilis. As áreas
vizinhas a M. hostilis, composta de Agradecimentos
áreas abertas de herbáceas e áreas com
Agradecemos aos professores e colegas
outras lenhosas nativas que possuem
do PPG em Ecologia da UFRN.
herbáceas sob dossel, podem contribuir
como fonte de populações de
herbáceas para a M. hostilis (dreno),
Referências
permitindo a existência de maior
riqueza sob seu dossel (Pulliam, 1988). Bruno, J. F., Stachowicz, J. J. & Bertness,
M. D. 2003. Inclusion of
facilitation into ecological theory.

117
118
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Trends in Ecology and Evolution, Noor, M., Salam, U & Khan, M. A. 1995.
18 (3): 119-125. Allelopathic effects of Prosopis
Casper, B. B. & Jackson, R. B. 1997. juliflora Swartz. Journal of Arid
Plant Competition Underground. Environments, 31: 83–90.
Rev. Ecol. Syst., 28:545–70. Oliveira, M. R. D., Rodrigues, J. M. E.,
Grime, J.P. 1977. Evidence for existence Filho, O. C., Medeiros, J. T. N. D.
of 3 primary strategies in plants 1999. Estudo das Condições de
and its relevance to ecological Cultivo da Algaroba e Jurema
and evolutionary theory. The Preta e Determinação do Poder
American Naturalist, 111: 1169– Calorífico. Revista de Ciência &
1194 Tecnologia, 14: 93-104.
Kahi, C. H., Ngugi, R. K., Mureithi, S. M. Peltzer, D.A., Köchy, M. Competitive
& Ng’ethe, J. C. 2009. The canopy effects of grasses and woody
effects of Prosopis juliflora (dc.) plants in mixed-grass prairie.
and Acacia tortilis (hayne) trees Journal of Ecology, 89:519-527.
on herbaceous plants species and Pulliam, H. R. 1988. Sources, Sinks and
soil physico-chemical properties Population Regulation. The
in Njemps Flats, Kenya. Tropical American Naturalist, 132 (5): 652-
and Subtropical Agroecosystems, 661.
10: 441 – 449. Tilman, D. The Resource-ratio
Maestre, F. T., Callaway, R. M., hypothesis of plant succession.
Valladares, F. & Lortie, C. J. 2009. The America Naturalist, 125:827-
Refining the stress-gradient 852.
hypothesis for competition and
facilitation in plant communities.
Journal of Ecology.

118
119
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

EVIDÊNCIA DE DIRECIONALIDADE DO VÔO EM BORBOLETAS LIBERADAS EM MATRIZ


AQUÁTICA NA ESEC-SERIDÓ

TANÁGARA IRINA DE SIQUEIRA NEVES FALCÃO, PEDRO DE FARIAS CAPISTRANO, LAURA MARTINA
FERNÁNDEZ

Introdução matriz cada vez maiores, tornando


estudos sobre comportamento de
A ecologia de paisagem é uma
dispersão dos organismos essenciais
área de estudo que relaciona a
para sua conservação (Saunders et al.,
heterogeneidade espacial com
1991).
processos ecológicos (Wu, 2008). A
paisagem é um importante fator que Esse estudo teve como objetivo
afeta a movimentação dos organismos investigar se existe direcionalidade no
entre manchas de recursos (Taylor et vôo de Phoebis sennae e de Ascia
al., 1993). As áreas de habitat monuste, quando liberadas em uma
apresentam recursos e condições matriz fluida completamente inóspita.
necessárias para a sobrevivência e Nossa hipótese é que elas não
reprodução dos indivíduos, enquanto a apresentam direcionalidade, voando
área ao redor chamada de matriz, não para a mancha de habitat mais próxima,
apresenta tais características (Ricketts, minimizando o gasto energético.
2001). Isto poderia facilitar ou impedir
Material e Métodos
o movimento dependendo de como os
organismos percebem e se Área do estudo
movimentam através de porções da
paisagem (Wiens, 2001). O estudo foi realizado na
Estação Ecológica do Seridó - ESEC
Existem dois tipos de (6º35’S e 37º15’W) presente no
movimentos através da paisagem: o domínio da Caatinga. A área possui
movimento rotineiro associado com a 1.128 ha e esta situada no sudeste do
exploração de recursos (ex. forrageio e Rio Grande do Norte, município de
procura de parceiros) normalmente Serra Negra do Norte, pertencente à
dentro do próprio habitat. O outro mesorregião Seridó (IBAMA, 2004). A
movimento, chamado “especial”, por área apresenta vegetação secundária,
sua vez é rápido e direcionado, e tem caracterizada por grande abundância
objetivo de deslocamento, ocorrendo de espécies arbustivas e arbóreas de
principalmente na matriz (Van Dyck & pequeno porte (Bencke et al., 2006).
Baguette, 2005).
O experimento foi realizado no
A fragmentação de habitats dia 27 de junho de 2011 das 09h30min
naturais causada pela atividade às 11h00min no açude “Campos II” (CII)
humana crescente provoca áreas de (UTM 24S0696877 / 9272418). O açude

119
120
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

é de caráter permanente, possui porte sennae. A direção do vento foi noroeste


médio e 11 m de profundidade. durante todo o experimento.

Delineamento experimental Os resultados mostraram que


houve direcionalidade no vôo de P.
Foram coletados indivíduos de
sennae sendo que seu vetor médio (µ=
duas espécies, Phoebis sennae e Ascia
323,113°; Concentração= 1,106)
monuste. A coleta foi realizada
representava significativamente o
manualmente com auxilio de redes
conjunto dos dados, de acordo com o
entomológicas e as borboletas
teste de Rayleigh (Z=4,07;
acondicionadas numa armadilha. As
p=0,014)(Fig.1a). Entretanto, em A.
espécies foram transportadas em barco
monuste não ocorreu o mesmo, seu
até o centro do açude, representando
vetor médio (µ= 301,591°;
uma matriz completamente inóspita
Concentração= 0,916) não foi
para estes indivíduos. As espécies
significativo para o mesmo teste,
foram liberadas alternadamente
apesar de mostrar uma tendência
mediante uso de pontos cardinais
(Z=2,78 ;p=0,06) (Fig.1b).
aleatórios (Norte, Sul, Leste e Oeste).
Os indivíduos eram seguidos No teste de Rao a distribuição
visualmente até perdê-los de vista, ate uniforme dos ângulos foi rejeitada
cair na agua ou ate perder-se dentro da apenas para P. sennae mostrando que
mata, momento em que o ângulo final para esta espécie os ângulos de vôo
de vôo de cada indivíduo era registrado estão significativamente agrupados
com bússola. Além disso, estimou-se a (U=170; p<0,05). Enquanto A. monuste
direção do vento. novamente apresentou uma tendência,
mas que não foi significativa (U=145;
Analise dos dados
0,5>p>0,1).
Para testar a hipótese de
ausência de direcionalidade no ângulo
de vôo nas espécies P. sennae e A.
monuste, foi realizado o teste de
Rayleigh (Zar, 1998; Mardia & Jupp,
2000), e o teste de Rao para verificar se
os dados são distribuídos
uniformemente (Mardia & Jupp, 2000).
Para tal, foi utilizado o software Oriana
3 (Kovach, 2009).

Resultados

Foram liberadas 31 borboletas no total,


sendo 16 Ascia monunte e 15 Phoebis

120
121
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

A) A distribuição dos ângulos no


sentido noroeste para ambas as
espécies é, aparentemente, um efeito
da direção do vento, embora tal padrão
para A. monuste não tenha sido
estatisticamente significativo. Uma
possível explicação para essa
direcionalidade encontrada para P.
Sennae é a evidência de que a espécie é
capaz de compensar essa deriva eólica,
voando na direção do vento como
forma de reduzir o gasto energético,
B)
retornando à direção preferencial sob
) condições de vento reduzido,
especialmente em matrizes fluidas
(Srygley, 2001a). O fato é mais evidente
para as fêmeas da espécie, que tendem
a compensar mais devido ao alto custo
energético da reprodução (Srygley,
2001b).

Existem evidências de mudanças


sistemáticas na direção do vôo de P.
Fig.5 – Ângulo final da direção do vôo sennae ao longo do dia. No período da
de duas borboletas a partir do açude da manhã, a direcionalidade é mais oeste,
ESEC-Seridó, em junho de 2011. A) enquanto na parte da tarde, é mais ao
Phoebis sennae e B) Ascia monuste. As sul. Tal padrão vem sendo atribuído à
linhas pontilhadas representam a mecanismos endógenos e inatos da
freqüencia de indivíduos. E a seta espécie (Srygley & Oliveira, 2001). No
representa o vetor médio. entanto, a realização do experimento
se deu na parte da manhã, o que pode
ter influenciado o resultado.

Discussão Para P. sennae, a


direcionalidade pode ter sido
Borboletas com hábitos
influenciada tanto pela direção do
migratórios usam vários mecanismos
vento, quanto por seus mecanismos
que facilitam a orientação e a
intrínsecos de orientação. Mas, uma
navegação. Dentre esses mecanismos
vez que o objetivo do estudo foi apenas
estão a posição de sol, polarização da
detectar padrões de direcionalidade
luz e a deriva eólica.
nas espécies estudadas, apenas a
direção final foi levada em

121
122
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

consideração, o que tornou impossível hospitalidade e especialmente ao


evidenciar a existência de Soldado Irmão e Seu Geraldo,
compensação do vento ou mudança na imprescindíveis para a realização do
trajetória de vôo para a espécie. estudo.
Estudos com tais objetivos precisam
Referências
levar em consideração as trajetórias
totais percorridas por indivíduo. Bencke, G.A., Mauricio, G.N., Develey,
P.F. & Goerck, J.M. (orgs.). 2006.
Os poucos estudos sobre o
Áreas importantes para a
comportamento de A. Monuste tornam
Conservacao de aves no Brasil. Parte
difícil a interpretação dos resultados
1 – Estados do Dominio da Mata
obtidos. A não direcionalidade
Atlántica. São Paulo: SAVE Brasil, p.
apresentada pode representar uma
139.
evidência de que a espécie não possui
mecanismos intrínsecos de orientação Ibama. 2004. Plano de Manejo da ESEC
e navegação, ou ainda, não apresenta do Seridó.
padrões conspícuos de migração na Mardia, K.V., Jupp, P.E., 2000. Statistics
região da Caatinga. Não existem of directional data. 2nd Edition. John
evidências de compensação do vento, Wiley & Sons, Chicester.
tampouco de orientação solar para a
espécie. Kovach, W.L., 2009. Oriana – Circular
Statistics for Windows, v3. Kovach
Estudos futuros sobre os Computing Services, Pentraeth, Wales,
padrões migratórios dessas espécies U.K.
devem incorporar a mensuração das
trajetórias totais percorridas, bem Ricketts, T.H. 2001. The Matrix Matters:
como mudanças na trajetória de acordo Effective Isolation in Fragmented
com as mudanças do vento, para que Landscapes. The American naturalist.
se possam obter informações Vol. 158, no. 1.
conclusivas sobre a orientação e
Saunders, D. A., Hobbs, R.J and
navegação dessas espécies.
Margules C.R. 1991. Biological
Especialmente na Caatinga, onde a
consequences of ecosystem
migração de várias espécies é atribuída
fragmentation: a review. Conservation
à fuga da estação seca.
Biology 5:18–32.

Srygley, R. B. 2001a. Compensation for


Agradecimentos fluctuations in crosswind drift without
stationary landmarks in butterflies
Ao professor Márcio Zikán pelo auxílio migrating over seas. Animal Behavior
teórico e ajuda nas coletas. 61:191-203.
Agradecemos também a gerência e a
equipe da ESEC – Seridó, pela

122
123
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Srygley, R. B. 2001b. Sexual differences Van Dyck, H.& Baguette, M. 2005.


in tailwind drift compensation in Dispersal behaviour in fragmented
Phoebis sennae butterflies landscapes: Routine or special
(Lepidoptera: Pieridae) migrationg over movements? Basic and Applied Ecology
seas. Behavioral Ecology 12: 607-611. 6 535—545.

Srygley, R. B. & Oliveira, E. G. 2001. Sun Wiens, J.A. (2001) The landscape
compass and wind drift compensation context of dispersal. Dispersal (eds J.
in migrating butterflies. Journal of Clobert, E. Danchin, A.A. Dhondt & J.D.
navigation 54: 405-417. Nichols), pp. 96–109. Oxford University
Press, New York.
Taylor, P.D., Fahrig, L., Henein, K. &
Merriam, G. (1993) Connectivity is a Wu J. 2008. Landscape ecology. In:
vital element of landscape structure. Encyclopedia of ecology. Ed. Elsevier.
Oikos, 68, 571–573. Vol. 3. pp 1727-2615. 4122.

Zar, J.H., 1998. Biostatistical Analysis.


4th Edition. Prentice Hall, New Jersey.

123
124
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

NA BORDA OU NA MATA DA CAATINGA, ONDE HÁ MAIS HERVIBORIA?


ESTUDO DE CASO PARA Croton sonderianus Müll. Arg. (EUPHORBIACEAE)

SILVANA MASCIADRI

Introdução muito comum para a Caatinga


(Marinho et al., 2009), e ocorre tanto
A fragmentação de florestas traz
nas áreas de borda (aberta) quanto nas
consigo mudanças nas condições
áreas de mata (fechada). O Objetivo
ambientais das manchas de mata (Silva
deste estudo é estimar a herbivoria
et al., 2009). A criação de fragmentos
sobre as folhas de C. sonderianus em
aumenta as áreas de exposição
árvores nas áreas de borda, abertas e
(bordas), por conta de um aumento no
ensolaradas, e nas árvores dentro da
perímetro das manchas em relação à
mata fechada. A hipótese deste
área. As bordas apresentam maior
trabalho é que as árvores na borda
exposição às variáveis abióticas como o
apresentam maior herbivoria que as
vento, a insolação e consequentemente
árvores dentro da mata.
apresentam uma menor umidade. Isto
determina mudanças na estrutura e Metodologia
composição da comunidade. Aliás,
Em primeiro lugar, se realizou
mudam também os processos
uma recorrida de campo dentro da
ecológicos que ali ocorrem como a
ESEC (Seridó), para estabelecer as
polinização, ou a herbivoria, entre
fontes de variação entre os indivíduos
outros (Silva, 2009). Estas mudanças
de C. sonderianus relacionadas à idade,
diretas ou indiretas são conhecidas
e à distribuição dos indivíduos. A área
como efeito de borda (Benedet et al.,
de estudo foi escolhida na porção final
2006). Mas para a Caatinga, tem se
da ESEC, onde se localizam as trilhas à
postulado que não existe tal efeito, por
Lagoa dos Juncos e ao experimento de
ser uma formação aberta. Santos e
sucessão realizado na Estação. Os
Santos (2008), não encontraram
pontos de amostragem se distribuíram
diferenças quanto ao DAS, altura,
a cada 100 m ao longo de transectos
riqueza, abundância e densidade de
que atravessaram áreas de mata e
árvores/arbustos, numa formação
áreas abertas, correspondendo aos
vegetal de Caatinga no Estado de
tratamentos. Em total, a área
Paraíba.
percorrida atingiu 2800 m (Fig. 1).
Entretanto, na ESEC do RN
(Seridó), apresenta-se o ‘marmeleiro’
Croton sonderianus Müll. Arg.
(Euphorbiaceae), que é uma espécie

124
125
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011
trilha 10 para estimação da herbivoria. As
categorias estabelecidas foram 6
M 100 m (Tabela 1). Na Figura 3 se ilustram duas
M M
folhas do marmeleiro com sinais de
herbivoria.
L. Juncos

Tabela 1. Categorias definidas para


estimação do grau de herbivoria das
Figura 1. Esquema da área de estudo na
folhas do ‘marmeleiro’ na ESEC, Seridó.
ESEC (Seridó), onde se localizaram os
pontos de amostramento cada 100 m, Categorias 1 2 3 4 5 6
sob os transectos dipostos através das % 2- 10- 25- 50- 75-
trilhas. M: mancha demata. Herbivoria 10 25 50 75 100

Em cada ponto de amostragem


localizava- se o ‘marmeleiro’ mas perto, As análises dos dados foram um
e no caso da mata a árvore devia se ANOVA uma via no SYSTAT, para testar
afastar pelo menos 5 m da borda para diferenças entre as folhas herbivoradas
evitar tal efeito (Fig. 2). Em total, 15 do ‘marmeleiro’ nos tratamentos
árvores (réplicas) foram amostradas dentro e fora da mata, e uma análise de
para cada tratamento (borda e mata). agrupamento no PAST (Indice de Bray
Curtis), para observar se existe um
>5 m
padrão de similaridade entre a
M
herbivoria sob o ‘marmeleiro’ dentro e
fora da mata.

Resultados
100 m

Dos 30 pontos amostrados, só


13 pontos apresentaram árvores de
Figura 2. Esquema de amostragem do
marmeleiro para ambientes de borda,
marmeleiro mais perto sob o transecto e
por tanto as análises foram feitas com
cada 100 m, na ESEC (Seridó). M: mancha
de mata
28 réplicas, correspondendo a 15
árvores na mata e 13 na borda. Na
As árvores escolhidas Figura 4 se apresenta a distribuição das
apresentaram uma altura entre 2 e 3 folhas herbivoradas para as árvores
m. Em cada árvore, eram escolhidas 25 amostradas nas áreas de borda
folhas imediatamente embaixo do (abertas) e de mata (abertas), sendo a
ápice, e repartidas entre o número de herbivoria sob o marmeleiro bem maior
galhos presentes no árvore, afim de nas áreas de mata que nas de borda.
controlar o comprimento destas. Logo
se colocavam dentro de uma sacola
para ser embaralhadas e logo escolher

125
126
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F15
F14
F13
F12
F11
F10
Árvores em áreas Abertas e Fechadas

F9
F8
F7
F6
F5
F4
F3
F2
F1
A14
A13
A12
A11
A10
A9
A7
A6
A5
A4
A3
A2
A1

0 5 10 15 20 25 30 35 40
Herbivoria
Figura 5. Médias e desvio padrão das
Figura 4. Distribução da soma de categorias somadas de herbivoria sob
categorias de folhas herbivoradas nas os marmeleiros. Embaixo: gráfico do
árvores de mata de borda, aberta (A) e resultado do ANOVA uma via, onde se
de mata, fechada (F), na ESEC, Seridó. observa uma maior herbivoria na mata
fechada.
A análise de variância mostrou
uma diferença muito significativa entre No dendograma se observa que
a herbivoria na borda e na mata, e um a herbivoria é similar entre os
bom ajuste do modelo aos dados (R2= marmeleiros de borda (aberta), e difere
0,807, F2, 28=48,405, p < 0,001). Mas dos marmeleiros da mata (fechada),
contrariamente à hipótese prevista formando dois grupos. Porém algumas
neste trabalho, a herbivoria sob o árvores de áreas de borda
marmeleiro foi muito maior dentro da apresentaram uma herbivoria similar às
mata que nas bordas (Fig. 5). árvores de mata (Fig. 6).

Discussão

O fato de que a herbivoria foi


significativamente maior nas áreas
abertas pode se dever a que C.
sonderianus é uma espécie de áreas de
borda, e apresenta características
adaptadas a condições de

126
127
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Similarity
Porém, estes resultados são

0,72

0,76

0,84

0,88

0,92

0,96
0,8
F2
F13
contrastantes com o trabalho de Silva
F15
F3
F11
et al. (2009), na Caatinga
F6
F10
F12
(Pernambuco), onde não encontraram
A4
F1 diferenças entre borda e mata, na
F8
A2
F14 herbivoria de insetos sob Croton sp.
F4
F9
A5
F7
F5
Neste trabalho também se
A6
A11
A14
procuraram herbívoros nas plantas,
A9
A10
A1
mas o único registrado foi uma larva de
A13
A7
A12
Lepidoptera numa árvore de um ponto
A3
de mata fechada. É provável também
que os herbívoros estejam mais
protegidos na mata, quanto ao sol e a
Figura 6. Análise de agrupamento
predadores, do que em áreas de borda,
(Índice de Bray Curtis)
e habitam principalmente nestas áreas.
ensolaramento como a presença de Futuros estudos serão necessários para
tricomas. Embora os tricomas são uma determinar a fauna e a especificidade
proteção das plantas à insolação e à dos herbívoros no ‘marmeleiro’.
evapotranspiração, estas podem afetar
Por outro lado, parecem estar
a palatabilidade para os herbívoros.
implicados processos de sucessão nas
Durante o trabalho de campo, foi
matas amostradas. C. sonderianus se
possível observar que as folhas nas
comporta como uma espécie pioneira
áreas de borda, ensolaradas,
que habita bem lugares ensolarados.
apresentam maior pilosidade e são
Em estadios de sucessão posterior
mais coriáceas que as folhas da mata
poderia diminuir sua proporção na
(folhas com menor pilosidade e mais
mata, já que parece receber uma
macias). Isto poderia estar
pressão de herbivoria maior. Foi
determinando uma maior herbivoria
observado durante este trabalho, que
sob os marmeleiros dentro da mata
matas mais diversas apresentam uma
sendo que a pilosidade menor, também
menor abundância de ‘marmeleiros’.
como a menor insolação dentro da
Portanto, parece ser que
mata permitiriam melhores condições
posteriormente seria suplantado por
para os herbívoros. Além disso, outras
outras espécies, mudando a
observações feitas durante o trabalho
composição da comunidade a uma
mostram que não há herbivoria em
mata com diversidade quanto a riqueza
indivíduos jovens de marmeleiro, os
e proporção das espécies.
quais apresentam uma muito maior
quantidade de tricomas, mas se
apresentam afecções por vírus.

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Agradecimentos Silva, E.A.E.S, 2009. Existe efeito de


borda sobre a comunidade de
Aos professores, pela fantástica
plântulas na caatinga? In: In:
organização, pela sua ótima disposição
Leal, I., de Almeida, W.R.,
para que os alunos aproveitaram ao
Aguiar, V.A. (Orgs.), Ecologia da
máximo a disciplina de campo,
Caatinga, curso de camp.
fundamental para a formação do
Editora Universitária UFPE, pp.
pesquisador. Ao pessoal da ESEC, por
187-197.
todo seu apoio, essencial para
Silva, E.A.E.S, Souza, A., Demétrio, K. de
desenvolver os trabalhos num clima
M., Leão, T., Sobrinho, M.S.,
confortável e muito bem alimentados!
2009. Criação de bordas na
Referências Caatinga aumenta a herbivoria
em Croton sp. (Euphorbiaceae)?
Benedet, S., Ganade, G., Larocca J., In: Leal, I., de Almeida, W.R.,
2006. Changes in plant Aguiar, V.A. (Orgs.), Ecologia da
community diversity and Caatinga, curso de camp.
composition across an edge Editora Universitária UFPE, pp.
between Araucaria forest and 149-156.
pasture in South Brazil. Revista
Brasileira de Botânica, 29 (1),
79-91.
Marinho, L.A., Rocha E.S., Paulo Filho
A.L., Ferreira, A.C., 2009. Pode
a herbivoria estimular a queda
de folhas em marmeleiro
(Croton sonderianus) durante a
estação chuvosa na caatinga?
Ecologia de Campo Caatinga,
Programa de Pós-Graduação em
Ecologia, UFRN, Natal, pp. 32-
34.
Santos , A.M., Santos, B., 2008. Are the
vegetation structure and
composition of the shrubby
Caatinga free from edge
influence? Acta Botânica
Brasílica, 22(4): 1077-1084.

128
129
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

RIQUEZA DE ARANHAS AO LONGO DE UM GRADIENTE ALTITUDINAL NA SERRA VERDE,


ESEC-SERIDÓ, RN

ELIANA FARIA DE OLIVEIRA; NÍCHOLAS SEBASTIAN & PHOEVE MACARIO

Introdução altitude (Stevens, 1992). Deste modo,


espécies que habitam regiões
Fatores abióticos e/ou bióticos montanhosas apresentam um maior
influenciam os padrões de distribuição intervalo de distribuição ao longo do
das espécies em muitos tipos de gradiente altitudinal em relação às
habitats e em gradientes geográficos, espécies de baixada que, em geral,
como latitude, profundidade e altitude ocupam menor faixa de ocorrência do
(Lomolino et al., 2006). Em geral, a gradiente.
riqueza de espécies diminui ao longo de
gradientes com condições climáticas e Levando em consideração o
físicas extremas, como em desertos, exposto acima, este estudo pretendeu
grandes latitudes ou regiões identificar os padrões de distribuições e
montanhosas (Navas, 1999). riqueza de aranhas ao longo de um
gradiente altitudinal da Serra Verde,
O declínio da riqueza de ESEC-Seridó, e testar se (i) A riqueza de
espécies com aumento da altitude é espécies de aranhas está relacionada
considerado um padrão geral (Rahbek, com a altitude? (ii) A riqueza de
1995, 2005). Inúmeros estudos com espécies de aranhas está relacionada
vertebrados e invertebrados com variáveis abióticas? (iii) Existe
corroboram a existência deste padrão suporte para o Efeito Rapoport?
(e.g. Chatzaki et al., 2005; Almeida-
Neto et al., 2006; Beketov, 2009; Wang
et al., 2011). Material e Métodos
Outro padrão relacionado ao O estudo foi realizado ao longo
gradiente altitudinal foi apontado por de um gradiente altitudinal da Serra
Stevens (1992), que observou uma Verde, localizada na Estação Ecológica
correlação positiva entre a altitude e a do Seridó (ESEC-Seridó), município de
amplitude altitudinal das espécies. Este Serra Negra do Norte, Rio Grande do
padrão, inicialmente observado para o Norte. A altitude média do relevo
gradiente latitudinal e chamado de observado na ESEC-Seridó é de 200
Regra do Rapoport (Stevens, 1989), metros e, ao norte, na denominada
sustenta que a amplitude de Serra Verde, alcança um valor extremo
distribuição das espécies aumenta do de 386 metros ao nível do mar (IBAMA,
equador aos pólos, ocorrendo o mesmo 2004).
das áreas de baixada às de elevada

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130
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Os protocolos de amostragem
foram aplicados em sete transectos
perpendiculares a trilha principal da
Serra Verde. Os transectos distavam 20
metros de altitude um do outro, sendo
o primeiro ponto localizado a 230
metros do nível do mar e o último a
350 metros, perfazendo um gradiente
altitudinal de 120 metros.

Cada um dos transectos


Figura 1. Delineamento amostral
continha 20 metros de comprimento,
destacando os sete transectos e os seis
sendo demarcados 10 pontos amostrais
pontos amostrais em cada transecto.
para o lado direito da trilha principal e
outros 10 pontos para o lado esquerdo.
Foram sorteados três pontos de cada
lado, totalizando seis unidades Foram medidas três variáveis
amostrais para aplicação dos abióticas: temperatura do solo,
protocolos de coleta. espessura da serrapilheira e
compactação do solo. A temperatura
As coletas de aranhas foram foi medida com um termômetro digital,
realizadas com armadilhas de queda enquanto a espessura da serrapilheira
(pitfall) e guarda-chuva entomológico. foi aferida com uma régua milimetrada
Em cada transecto, três armadilhas de de 30 centímetros. A compactação do
queda foram colocadas em três dos seis solo foi estimada soltando-se um facão,
pontos sorteados. Nos outros três na altura do peito, em direção ao solo e
pontos foram escolhidas três árvores medindo o quanto o facão penetrou no
para a amostragem com o guarda- solo com uma régua milimetrada de 30
chuva entomológico. As armadilhas de centímetros.
queda foram colocadas sempre do lado
oposto de onde foram tomadas as Foram realizadas duas análises
amostras com o guarda-chuva de regressão linear para testar se (i) a
entomológico (Figura 1). altitude influencia a riqueza de aranhas
e se (ii) existe suporte para o Efeito
Os indivíduos coletados foram Rapoport. Para esta última análise, foi
morfotipados com o auxílio de um necessário construir um banco de
microscópio estereoscópico e dados com o intervalo de distribuição
conservados em álcool 70%. altitudinal de cada espécie, bem como
sua altitude média de ocorrência.

Foi realizada também uma


regressão linear múltipla entre a
riqueza de aranhas e as variáveis

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131
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

abióticas ao longo do gradiente


altitudinal. Por último, foi feito uma
análise de cluster para verificar quão
próximo os pontos de coleta estão em
relação à composição de espécies
presentes em cada um deles. Para
construir o dendograma foi utilizado
um algoritmo de grupo pareado com a
medida de similaridade de Bray-Curtis.
As análises estatísticas foram realizadas
no programa SYSTAT 12.0 e no PAST
2.09 (análise de cluster).
Figura 2. Relação entre altitude e
riqueza de espécies de aranhas.
Resultados Não houve relação entre a
Ao longo do gradiente riqueza de aranhas e as variáveis
altitudinal, foram encontrados 22 abióticas (F=3,449; p=0,168). Também
morfotipos de aranhas. Destes, 19 não foi encontrado suporte para o
foram coletados através do uso de Efeito Rapoport (F=0; p=0,99).
guarda-chuva entomológico e três com A Figura 3 apresenta o
as armadilhas de queda. dendograma de similaridade da
A riqueza de aranhas ao longo composição de aranhas entre as
do gradiente altitudinal variou de cinco altitudes amostradas.
a oito espécies, sendo a riqueza média
igual a seis ± 1,15 espécies (média ±
desvio padrão).

A altitude não influenciou


significantemente a riqueza de aranhas
(F=2; p=0,216; Figura 2). No entanto,
houve uma tendência do número de
espécies de aranhas diminuir com o
aumento da altitude.

Figura 3. Dendograma de similaridade


da composição de aranhas entre as
altitudes amostradas.
131
132
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Discussão variáveis abióticas analisadas. A


temperatura do solo, espessura da
O presente estudo mostrou uma
serrapilheira e compactação do solo
tendência da diminuição da riqueza de
não foram variáveis relevantes para a
aranhas com o aumento da altitude,
riqueza de aranhas. Almeida-Neto et al.
embora esta relação não tenha sido
(2006) encontraram efeito positivo
estatisticamente significativa. Alguns
entre a temperatura e umidade do solo
estudos encontraram esse padrão para
e a densidade de opilião (Arachnida) ao
Araneae (Chatzaki et al., 2005) e
longo de um gradiente altitudinal.
Arachnida (Almeida-Neto et al., 2006).
Outros fatores abióticos, que não
Uma das possíveis explicações para a
foram avaliados, podem estar
não ocorrência desse padrão pode
influenciando a riqueza de aranhas ao
estar relacionado com o delineamento
longo do gradiente altitudinal
amostral. Talvez, se a amplitude
estudado.
altitudinal e o número de amostras
fossem maiores (apenas 120 metros e As espécies de aranhas da Serra
sete amostras), esse padrão teria sido Verde não demonstraram suporte para
evidenciado para as aranhas da Serra o Efeito Rapoport. Ou seja, as espécies
Verde. de aranhas que habitam as regiões de
altitude elevada não apresentaram um
A composição de aranhas entre
maior intervalo de distribuição ao longo
as altitudes amostradas não
do gradiente altitudinal em relação às
apresentou um padrão de similaridade
espécies de baixada. Embora muitos
ao longo do gradiente. Regiões de
estudos corroborem a existência deste
baixada e de altitudes mais elevadas
padrão (Chatzaki et al., 2005; Almeida-
apresentaram uma composição similar.
Neto et al., 2006; Beketov, 2009),
A substituição de espécies, através de
outros sugerem que o Efeito Rapoport
um complexo padrão de mudança da
não é um padrão geral (Bernal & Lynch,
composição de espécies ao longo do
2008).
gradiente altitudinal, ocorre,
principalmente, pela presença de Apesar deste estudo não ter
espécies exclusivas de diferentes encontrado nenhuma relação da
categorias altitudinais (Poynton, 2003). riqueza de espécies de aranha com a
No entanto, esse padrão não foi altitude e variáveis abióticas, assim
encontrado na Serra Verde. como para o Efeito Rapoport, outros
fatores podem estar influenciando o
De modo geral, os padrões
padrão encontrado. Processos
biogeográficos resultam da interação
históricos, evolutivos e até mesmo
entre fatores abióticos e/ou bióticos
estocásticos também são responsáveis
(Lomolino et al., 2006). Contudo, uma
pela formação dos padrões
relação não significativa foi encontrada
biogeográficos (Lomolino et al., 2006).
entre a riqueza de aranhas e as
Assim, a busca por explicações causais

132
133
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

e padrões gerais de distribuição de distribution of ground spiders


espécies ao longo de gradientes (Araneae, Gnaphosidae) along the
geográficos e ambientais é um longo altitudinal gradient of Crete, Greece:
desafio para biogeógrafos e ecólogos species richness, activity and
(Almeida-Neto et al., 2006). altitudinal range. Journal of
Biogeography, 32: 813–831.

IBAMA. 2004. Plano de Manejo da ESEC


Agradecimentos
do Seridó.
Somos gratos aos professores e colegas
Lomolino, M. V.; Riddle, B. R. & Brown,
do PPG em Ecologia da UFRN, pelo bom
J. H. 2006. Biogeography. 3rd ed.
convívio e ensinamentos transmitidos.
Sinauer Associates, Inc. USA, 845p.
Agradecemos ao colega Guilherme
Mazzochini pelo auxílio nas análises Navas, C. A. 1999. Biodiversidade de
estatísticas. Aos funcionários da ESEC- anfibios y reptiles en el Páramo: Una
Seridó pelo apoio durante todo o curso visión ecofisiológica. Revista de la
de campo. Academia Colombiana de Ciencias
Exactas, Físicas y Naturales, 23: 465-
474.
Referências
Poynton, J. C. 2003. Altitudinal species
Almeida-Neto, M.; Machado, G.; Pinto- turnover in southern Tanzania
da-Rocha, R. & Giaretta, A. A. 2006. shown by anurans: some
Harvestman (Arachnida: Opiliones) zoogeographical considerations.
species distribution along three Systematics and Biodiversity, 1(1):
Neotropical elevational gradients: an 117-126.
alternative rescue effect to explain
Rahbek, C. 1995. The elevational
Rapoport’s rule? Journal of
gradient of species richness: a
Biogeography, 33: 361-375.
uniform pattern? Ecography, 18:
Beketov, M. A. 2009. The Rapoport 200-205.
effect is detected in a riversystem
Rahbek, C. 2005. The role of spatial
and is based on nested organization.
scale and the perception of large-
Global Ecology and Biogeography,
scale species-richness patterns.
18: 498-506.
Ecology Letters, 8: 224-239.
Bernal, M. H. & Lynch, J. D. 2008.
Stevens, G. C. 1989. The latitudinal
Review and analysis of altitudinal
gradient in geographical range: how
distribution of the Andean anurans
so many species coexist in the
in Colombia. Zootaxa, 1826: 1-25.
tropics. American Naturalist, 133:
Chatzaki, M.; Lymberakis, P.; Markakis, 240-256.
G. & Mylonas, M. 2005. The

133
134
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Stevens, G. C. 1992. The elevational Wang, J.; Soininen, J.; Zhang, Y.; Wang,
gradient in altitudinal range: an B.; Yang, X. & Shen, J. 2011.
extension of Rapoport’s latitudinal Contrasting patterns in elevational
rule to altitude. American Naturalist, diversity between microorganisms
140: 893-911. and macroorganisms. Journal of
Biogeography, 38: 595-603.

134
135
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

HERBIVORIA DE ESPÉCIES LENHOSAS E ÁREA ESPECÍFICA FOLIAR (SLA): UM TESTE


PILOTO EM CAATINGA DO RIO GRANDE DO NORTE

GUSTAVO BRANT, LUCAS VIEGAS E DAVID LUCAS

Introdução A Caatinga abrange condições


extremas de estresse hídrico (altas
A herbivoria é um processo temperaturas, escassez de água,
relevante para a biodiversidade, sazonalidade e imprevisibilidade das
produtividade e estabilidade chuvas). Considerando o Seridó, um núcleo
escossistêmica. Muitos estudos exploram de desertificação do nordeste, composto
como as características foliares estão por vegetação de porte reduzido e esparso
relacionados às estratégias anti-herbivoria (Santana 2002), entender o impacto da
(Coley et al. 1985, Coley & Barone 1996, herbivoria e as características
Westoby 1998, Wright et al., 2001, Dubey morfofuncionais que estão relacionadas ao
et al., 2011). dano foliar torna-se um ponto importante
Segundo Coley & Barone (1996) para a conservação e o manejo desse
estratégias anti-herbivoria são ecossistema, sobretudo devido a escassez
representadas pelos hard traits: sob a de informações existentes sobre a flora
forma de defesa química (e.g., compostos desse ambiente (Amorim et al., 2005).
secundários), mecânica (e.g., tricomas, Neste sentido, o presente estudo
ceras, maior C:N) e fenológica (e.g., teve como principais objetivos: (i) testar se
duração de crescimento, tamanho do
existe uma relação entre o SLA e a taxa de
período reprodutivo). As hard traits herbivoria de espécies lenhosas da
correspondem às soft traits, mais simples Caatinga e (ii) gerar uma primeira visão
de serem identificadas, como o SLA (área geral sobre a herbivoria de espécies
especifica foliar), peso úmido e peso seco. lenhosas da ESEC.
As características morfofuncionais
Material e Métodos
das folhas possibilitam uma ponte entre
processos fisiológicos e ecossistêmicos, Área de Estudo
exemplificando diferentes estratégias de
vida (Dubey et al., 2011). Essas estratégias As coletas foram realizadas na
podem funcionar como preditoras de como Estação Ecológica do Seridó (ESEC),
os herbívoros exercem pressões evolutivas especificamente ao longo da “trilha da
caveira” e da “trilha do junco”. A “trilha da
sobre as plantas (Coley & Barone, 1996).
caveira” é circundada por vegetação de
Em uma “corrida armamentista”, porte médio e com a presença de muitas
naturalmente existem trade-offs, entre a espécies de início de sucessão. A “trilha do
rápida produção de biomassa e a eficiente junco” possui várias matas com porte e
conservação de nutrientes. Desta forma, riqueza de espécies distintas. Algumas
herbívoros preferem plantas com alto SLA, áreas possuem uma vegetação bem
baixo peso seco e alta quantidade de água adensada enquanto outras possuem matas
nas folhas (Dubey et al., 2011). mais abertas.

135
136
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Coleta de dados pesadas através de uma balança de alta


precisão. A partir da área foliar e do peso
Foram amostradas todas as seco, calculou-se a SLA utilizando a
espécies vegetais lenhosas encontradas seguinte fórmula (Westoby, 1998):
que continham mais de cinco indivíduos SLA= área foliar / peso seco
adultos. Para estimar o grau de herbivoria
das espécies foram coletados três galhos Análises estatísticas
de cada um dos cinco indivíduos,
representando os três estratos da copa da Para testar se o SLA influencia o
árvore: inferior, médio e superior. De cada grau de herbivoria das espécies foi
galho foram sorteadas três folhas, realizada uma regressão linear simples,
somando nove folhas por indivíduo. No utilizando o log do SLA como variável
total, foram coletadas 45 folhas de cada independente e o índice de dano foliar das
espécie. espécies como variável dependente. Para
comparar se a taxa de herbivoria difere
Como estimativa de herbivoria entre as espécies estudadas foi realizada
cada uma das folhas foi classificada nas uma ANOVA. As análises foram realizadas
seguintes categorias de dano foliar: 1-0%; no programa R.
2-1-6%; 3-6-12%; 4- 12-25%; 5- 25-50%; 6-
50-100%. A partir dessas categorias foi Resultados
calculado o índice de dano foliar para cada Foram amostradas folhas de 17
espécie (Benítez-Malvido et al. 2005): ID = espécies lenhosas ocorrentes na ESEC. O
Σ ni*Ci/N SLA das espécies, em escala logarítmica,
ni= quantas vezes na categoria i; variou de 3,7 até 5,8 (Figura 1). Ziziphus
Ci= categoria i de dano foliar juazeiro foi a espécie com maior SLA,
N= número de amostas totais entretanto, não houve grandes variações
entre as espécies amostradas (Figura 1).
Para se medir a área específica
foliar (SLA), coletou-se um galho do estrato
superior da copa de cada indivíduo (folhas
Morfo sp. 4
expostas ao sol). De cada galho foram C. flexuosa
T. formosa
selecionadas três folhas maduras com o P. deversifolium
Morfo sp. 3
mínimo de dano foliar possível (Westoby, C. leprosum
Espécies

E. pungens
1998). No total foram analisadas 15 folhas Morfo sp. 1
Morfo sp. 5
de cada espécie (três folhas/ indivíduo). Morfo sp. 2
A. pyrifolium
Para calcular a área foliar foram C. pyramidalis
L. ferrea
utilizadas fotografias das folhas analisadas C. sonderianus
J. moliissinea
no programa LAFORE (Lehsten, 2002). B. cheilantha
Z. juazeiro
Todas as imagens foram tiradas com um
0 1 2 3 4 5 6 7
tripé e a partir de uma altura padronizada,
Log (SLA)
assegurando assim a precisão das medidas.
Figura 1: Área específica foliar (SLA) para 17
Depois de serem fotografadas, as folhas espécies lenhosas amostradas na ESEC. Valores
foram colocadas na estufa a 80 °C, durante apresentados em escala logarítmica.
aproximadamente 18 horas. Estando
completamente secas as folhas foram

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137
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011
As espécies estudadas Figura 3: Relação entre o o log (SLA) e o índice
apresentaram diferenças no índice de dano de dano foliar para 17 espécies amostradas na
foliar, variando de 1,3 até 4,2 (p=0,001). ESEC.
Como as variâncias não eram homogenias,
ao invés da ANOVA, utilizou-se 1000
simulações de Monte Carlo para testar a Discussão
significância das diferenças. A espécie
A área específica foliar (SLA) é uma
Eritroxylum pungens apresentou o menor
característica morfofuncional das plantas
índice de herbivoria enquanto Combretum
que está ligada ao retorno em fotossíntese
leprosum o maior (Figura 2).
por unidade de biomassa investida na folha
(Westoby, 1998). A partir desta ótica,
existe um trade-off entre fotossíntese e
E. pungens
Morfo sp. 5 defesa foliar, ou seja, uma folha não pode
P. deversifolium
L. ferrea investir ao mesmo tempo em superfície
J. moliissinea
C. pyramidalis fotossintetizante e em biomassa (maior
C. flexuosa
grossura, pelos, ceras, lignina, ente
Espécies

Morfo sp. 4
A. pyrifolium
Z. juazeiro fatores). Partindo de uma mesma
Morfo sp. 3
Morfo sp. 2 quantidade de biomassa, quanto maior for
B. cheilantha
Morfo sp. 1 a superfície foliar, mais fina a folha tem
C. sonderianus
T. formosa que ser. Desta forma, o SLA é uma
C. leprosum
característica intimamente associada com
0 1 2 3 4 5 as estratégias ecológicas das espécies,
Índice de dano Foliar estando correlacionada com a taxa de
Figura 2: Índice de dado foliar para 17
crescimento potencial, o tempo de vida das
espécies lenhosas amostradas na ESEC.
folhas e a resistência a herbívoros
O resultado da regressão linear (Westoby, 1998; Dubey et al., 2011).
simples demonstrou que o SLA não afeta a
Como a Caatinga é uma formação
herbivoria das espécies (R²<0,1; F1,15 = 0,12;
vegetacional situada em uma região
p = 0,91). O gráfico confirma que não existe
semiárida, sua vegetação apresenta
qualquer relação entre o SLA e o índice de
deciduidade marcante devido aos longos
dano foliar, existido espécies com um
períodos de seca sazonal (Leal et al., 2003).
mesmo valor de SLA e taxas de herbivoria
Muitas espécies lenhosas apresentam
extremamente contrastantes (Figura 3).
redução da superfície foliar, substituição
de folhas por espinhos, folhas compostas
com folíolos reduzidos e em alguns casos
4,5
entrecasca com potencial fotossintetizante
4,0
(Queiroz, 2009). Essas características são
Índice de dano foliar

3,5
estratégias relacionadas à ambientes
3,0
secos, nos quais, a eficiência no uso da
2,5
água é fundamental. Na Caatinga, as
2,0
restrições abióticas parecem ser uma força
1,5
importante na estruturação das
1,0
3,5 4,0 4,5 5,0 5,5 6,0 comunidades ecológicas, filtrando as
Log (SLA) espécies que conseguem lidar com tais

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138
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011
condições (“Filtro ambiental”). O “filtro tiveram média inferior a categoria 2 (entre
ambiental” imposto pela região na qual a 1 – 6 % de dano foliar) (Figura 2). Esses
Caatinga se desenvolve pode ser uma resultados demonstram que a herbivoria é
explicação para a baixa amplitude de SLA uma pressão que afeta de forma
encontrada no estudo, uma vez que significativa quase todas as espécies
espécies com folhas grandes perderiam avaliadas e estão de acordo com as
muita água e não seriam capazes de estimativas de Coley & Barone (1996), que
manter seu balanço hídrico nessa região. sugerem que as florestas tropicais secas
são mais afetadas pela herbivoria que as
Nas florestas tropicais, os insetos florestas tropicais úmidas. Além disso,
parecem ser os grandes responsáveis pela estudos demonstram que 10% de dano
herbivoria das plantas, exercendo assim foliar já é suficiente para gerar diminuição
grande pressão evolutiva para o
no sucesso reprodutivo de uma espécie,
desenvolvimento de defesas químicas, caso ela não apresente algum mecanismo
mecânicas ou fenológicas (Coley & Barone, de compensação (Strauss & Agrawal,
1996). Uma estratégia alternativa que 1999). Na Caatinga, a deciduidade das
também pode evoluir em resposta a vegetação pode contribuir para uma taxa
pressão dos herbívoros é a tolerância ou a maior de herbivoria, uma vez que folhas
compensação (Strauss & Agrawal, 1999). decíduas geralmente apresentam poucas
Neste caso, as plantas possuem a defesas contra herbívoros (Coley & Barone,
habilidade de manter ou aumentar seu 1996).
sucesso reprodutivo na presença de
herbívoros. Esse processo pode ocorrer Nossos resultados mostram
através de uma resposta induzida pelo claramente que o SLA não é um fator
herbívoro, que acaba gerando o aumento importante para explicar a herbivoria das
na taxa fotossintética, o armazenamento plantas, pelo menos para as espécies
de carbono nas raízes, aumento da taxa de lenhosas avaliadas. Este padrão, apesar de
crescimento, entre outras formas de contrário à nossa expectativa, está de
compensação (Strauss & Agrawak, 1999). acordo com outros estudos, nos quais,
outros fatores são melhores preditores da
De uma maneira geral as pressões intensidade de herbivoria que as
exercidas pelos herbívoros são mais características morfológicas das folhas
intensas nos ambientes tropicais que nos (Diaz et al., 2001; Ruhnke et al., 2009). Um
ambientes temperados, promovendo uma ponto importante a ser levado em
maior diversidade de defesas por parte das consideração é o estágio ontogênico das
plantas e enfatizando a importância dos folhas. De uma maneira geral, nos trópicos,
aspectos evolutivos na relação herbivoro- a grande intensidade de predação ocorre
planta para estes ambientes (Coley & nas folhas jovens, pois estas possuem
Barone, 1996). No presente estudo, maior quantidade de nutrientes, sendo
encontrou-se uma herbivoria foliar assim, mais palatáveis para os herbívoros
bastante representativa, uma vez que a (Coley & Barone, 1996). Um bom exemplo
maioria das espécies apresentou uma taxa dessa situação é a P. Pyramidalis, que
média variando entre as categorias 2-3 possui folhas altamente palatáveis quando
(entre 1-12% de dano foliar), algumas jovens e pouco palatáveis quando adultas
chegaram a ter média entre as categorias 4 (Dantas et al., 2009 ). As defesas químicas
e 5 (entre 12-50% de dano foliar) e poucas

138
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011
também precisamos ser consideradas, uma Coley, P.D. e Barone, J.A. 1996. Herbivory
vez que as mesmas contribuem para uma and plant defenses in Tropical Forests.
baixa taxa de herbivoria mas não afetam Annu. Rev. Ecol. Syst. 27: 305–35.
de maneira muito significativa o SLA das
plantas (não pesam tanto quanto camadas Coley, P.D., Bryant, J.P., Chapin, F.S. 1985.
Resource Avaibility and Plant Antiherbivory
de lignina ou ceras).
Defense. Science, New Series. 230(4728):
Em resumo, o presente estudo 895-899.
demonstrou que as espécies lenhosas da
ESEC variam muito em relação a taxa de Dantas, B. F., Lopes, A P., Silva, F. F. S.,
herbivoria mas não muito em relação ao Lúcio, A A, Batista, P. F., Pires, M. M. M. L.,
SLA. Isso provavelmente ocorre porque as Aragão, C. A, 2009. Taxas de crescimento
plantas da Caatinga estão limitadas por um de mudas de Catingueira submetidas a
“filtro ambiental” que restringe a diferentes estratos e sombreamentos.
amplitude na qual suas folhas podem Revista Árvore 33:413-423
variar. O SLA não parece ser um fator Diaz, S., Noy-Meir, I., Cabido, M. 2001. Can
importante para explicar a herbivoria das grazing response of herbaceous plants be
espécies, evidenciando a complexidade das predicted from simple vegetative traits?
relações herbivoro-planta existente na Journal of Applied Ecology 38:497-508
Caatinga. A grande diversidade de defesas
anti-herbivoria dos ambientes tropicais, Dubey, P., Sharma, G.P., Raghubanshi,
variando de defesas mecânicas (que A.S., Singh, J.S. 2011. Leaf traits and
afetam negativamente o SLA) até defesas herbivory as indicators of ecosystem
químicas (que não afetam de forma function. CURRENT SCIENCE, 100(3): 313-
significativa o SLA), a história de vida e 320.
outras características funcionais das
Leal, M. Tabarelli & J.M.C. Silva (eds.).
plantas precisam ser avaliadas em conjunto
Ecologia e conservação da Caatinga.
para explicar e prever a herbivoria das
Editora Universitária, Universidade Federal
espécies na Caatinga.
de Pernambuco, Recife, Brasil. pp. 237-273.
Agradecimentos
Lehsen, V. (2002) Lafrore – Leaf area for
Os autores agradecem Alexandre everyone. URL: http://www.uni-
Vasconcellos e Guilherme Mazzochio pelo oldenburg.de/landeco/Download/Software
constante apoio nas análises estatísticas e /Laforem/Lafore.html.
discussões. Além disso, agradecemos
também a hospitalidade e o apoio logístico Ruhnke, H., Shadler, M., Klotz, S., Matthies,
para a realização do presente estudo por D., Brandl, R. 2009. Variability in leaf traits,
parte da equipe da ESEC. insect herbivory and herbivore
performance within and among individuals
Referências of four broad-leaved tree species. Basic
Amorim, I.S., Sampaio, E.V.S.B., Araújo, E.L. and Applied Ecology. 10:726-736
2005. Flora e estrutura da vegetação Santana, J.A.S. e Souto, J.S. 2006.
arbustivo-arbórea de uma área de caatinga Diversidade e Estrutura Fitossociológica da
do Seridó, RN, Brasil. Acta bot. bras. 19(3): Caatinga na Estação Ecológica do Seridó-
615-623.

139
140
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011
RN. REVISTA DE BIOLOGIA E CIÊNCIAS DA Wright, I.J., Reich, P.B. e Westoby, M.
TERRA. 6(2): 232-242. 2001. Strategy shifts in leaf physiology,
structure and nutrient content between
Strauss, S. Y., Agrawaw, A. A., The ecology species of high- and low-rainfall and high-
and evolution of plant tolerance to and low-nutrient habitats. Functional
herbivory. TREE 14:179-185 Ecology. 15: 423–434.
Westoby, M. 1998. A leaf-height-seed (LHS)
plant ecology strategy scheme. Plant and
Soil. 199: 213–227.

140
141
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

PADRÃO DE PREDAÇÃO DE OVOS DEPENDENTE DA DENSIDADE DE ÁRVORES LENHOSAS:


ASPECTOS DE ESTRATÉGIAS ANTI-PREDATÓRIAS DE AVES NIDIFICANTES EM SOLO
RICARDO ALMEIDA EMIDIO, EMERSON DE MEDEIROS SOUSA, TONNY MARQUES DE OLIVEIRA JUNIOR

Introdução de predação, não se espera uma tomada


de decisão via tentativa-e-erro, uma vez
A teoria da corrida armamentista que o número de tentativas reprodutivas é
afirma que presas e predadores correm limitado (Giraldeau, 2008).
continuamente para apresentar
adaptações e contra-adaptações a fim de Diante deste contexto teórico,
reduzir a predação, e, simultaneamente, utilizou-se espécies que nidificam no solo
subjugar presas. Porém, predadores e como modelo de estudo, uma vez que o
presas não apresentam adaptações ninho experimental é constituído apenas
superiores (Krebs & Davis, 1996). por uma área destina a deposição de ovos,
sem estrutura construída. O objetivo do
A predação de ovos é uma das estudo foi observar o padrão de predação
principais forças que resultam no insucesso de ovos dependente da densidade de
reprodutivo em aves (Barbini & Passamani, árvores lenhosas, variável indicadora da
2003). qualidade do habitat para nidificação. A
Em contrapartida, as aves nossa hipótese é que a probabilidade de
apresentam um conjunto multidimensional predação de ninhos será maior em áreas
de estratégias comportamentais com menor densidade de árvores lenhosas.
destinadas para o investimento parental, Material e Métodos
moduladas por seleção natural, que
resultam no aumento do sucesso O estudo foi realizado na zona de
reprodutivo. Neste conjunto, determinadas amortecimento da Estação Ecológica do
estratégias comportamentais estão Seridó (ESEC- Seridó - 6º35’S e 37º15’W),
presentes: i. a defesa de ninho contra Unidade de Conservação representante da
potenciais predadores e ou competidores Caatinga. A ESEC – Seridó é caracterizada
(Lima, 2009), ii. comportamentos de por possuir uma vegetação secundária,
simulação para desviar a atenção do com predominância de espécies arbustivas
potencial predador para o ninho (Pichorim, e arbóreas de pequeno porte que é o
2002), iii. construção de ninhos crípticos indica um processo de regeneração de
(Lima, 2009) ou em regiões de difícil acesso caatinga (Bencke et al., 2006).
para predadores (Alcock 2001).
Dentro da área de estudo, foram
O foco deste estudo foi identificar depositados 20 ninhos experimentais com
de forma experimental se a escolha de dois ovos na altura do solo distantes a
habitat influencia o sucesso reprodutivo. cinco metros do lago. Os ninhos eram
Assumindo que habitats são naturalmente equidistantes a 100 metros. A cada
heterogêneos, acredita-se que a escolha do depósito de ninho eram registrados: i. o
habitat para a reprodução é uma das ponto de GPS com datum SAD69 ii. a
principais tomadas de decisão que densidade de árvores lenhosas com altura
determinam o sucesso reprodutivo. mínima de 1,2 metros em uma área
Portanto, devido à potencialidade do risco

141
142
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011
circular de 78,5 m², tendo o ninho como o

1.0
como centro do raio.

0.8
Probabilidade de predação
Após um período de 24 horas,

0.6
registrou-se a proporção de predação dos
ninhos experimentais.

0.4
0.2
Para não ter influência da escolha
do ovo predado mediante a massa, testou-

0.0
se previamente a ocorrência de diferença
0 5 10 15 20 25
significativa no peso entre o conjunto de Densidade de árvores lenhosas
potenciais ovos a serem utilizados no
Figura 1 – Probabilidade de predação de
experimento. Para tanto, amostrou-se a
ninho mediante a disponibilidade de
massa de cinco ovos de três bandejas
árvores lenhosas a um raio de 5 metros do
contendo 15 ovos, totalizando 45 ovos do
ninho.
universo amostral. Os resultados
mostraram que o peso dos ovos não diferiu Discussão
significativamente (𝑥1 = 61,37± 4,67g; 𝑥2
= 62,08 ± 4,68g; 𝑥3 = 63,88 ± 4,1g; F(2,11) = A escolha de bons locais de
0,37; P =0,69). Para testar a hipótese do nidificação tem sido alvo de diversos
estudo, utilizou-se a regressão logística, a estudos que tentam identificar pressões
densidade de árvores lenhosas atuou como ambientais que modulam estas estratégias
variável independente enquanto que a comportamentais. Arango-Vélez & Kattan
proporção de predação de ninho atuou (1997) testaram na Costa Rica se o efeito
como variável dependente. de fragmentação (fragmentos menores e
maiores do que 100 ha) era responsável
Resultados pela maior predação. Os autores
observaram que o efeito de fragmentação
Ao revisitar os ninhos
não foi responsável por tal fato, apesar de
experimentais após um período de 24
apresentar esta tendência. As espécies de
horas, observou-se que 10% dos ovos
mamíferos residentes em fragmentos
foram predados. No conjunto de ovos
menores são menores em tamanho
predados, a regressão logística mostrou
corpóreo e mais abundantes,
uma probabilidade de 60% na predação de
proporcionando uma maior possibilidade
ovos em áreas com baixa densidade de
de encontro predador-ovo, e, portanto,
árvores lenhosas (gl = 1; χ²= 14,91; P =
sendo responsável pelo maior efeito de
0,051 – Figura 1).
predação.

França & Marini (2009) observaram


que no Cerrado, um ambiente com amplas
variações sazonais, assim como a Caatinga,
o efeito de borda na predação de ninhos é
nulo. Em outro ecossistema, Barbini &
Passamani (2003) observaram padrões
similares da ausência de efeito de borda na
predação de ninhos na Mata Atlântica.

142
143
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011
Ainda no Cerrado, porém em desenvolvido um mecanismo de imagem
escalas menores, Borges & Marini (2010) de busca eficiente ao longo da estação
revelaram que ambientes com reprodutiva.
perturbações antropogênicas (lixos dentro
de matas) atuam como drenos. A No nosso estudo ocorreram dois
densidade de predadores nativos e diferentes padrões de predação de ninhos:
invasores (animais domésticos) e os encontramos tanto ovos quebrados (ovos
parasitas de ninho resultam numa baixa quebrados em grandes lascas) quanto
taxa de sucesso reprodutivo comparado perfurados (pequenas cavidades na casca
com a avifauna habitante de ambiente de do ovo), que indicam quais possíveis
floresta (9,3% de sobrevivência da prole predadores tenham visitado os ninhos
em ambientes com lixo e 19,5% de (Arango-Vélez & Kattan 1997, França &
sobrevivência em ambientes sem lixo). Marini 2010).

Em um local com menor pressão De acordo com a forma de


sazonal, Pichorim (2002) estudou a biologia predação de ovos encontrados no presente
reprodutiva do bacurau-tesoura-gigante estudo, podemos sugerir que tanto
mamíferos quanto aves foram os principais
(Macropsalis forcipata) no Paraná. Tal
autor observou que estes animais faziam predadores de ovos mediante os
posturas em clareiras rodeadas de experimentos de Arango-Vélez & Kattan
vegetações secundárias e, dentre os 17 (1997) e França & Marini (2010). Na nossa
ninhos acompanhados, ocorreu uma área de estudo, encontramos 50% (N=2) de
probabilidade de eclosão do ovo superior a ovos quebrados e 50% (N=2) de ovos
perfurados. Segundo os resultados de
90%.
Arango-Vélez & Kattan (1997), os ovos
Em períodos de escassez de quebrados são característicos da forma de
recursos na Caatinga, há uma maior forrageio do timbú (Didelphis albiventris)
probabilidade de insucesso regido pela (ver tabela 4, pg 141), enquanto que ovos
maior motivação de predadores em busca perfurados ou em formas de V são
de potenciais presas? Tal sugestão pode característicos de forrageio de aves (França
ser evidenciada pela taxa de predação & Marini 2010). França & Marini (2010)
diária de 10% (N=4) observada no presente observaram uma maior taxa de predação
estudo. Comparando com outros estudos, de ovos por aves no bioma Cerrado.
Pichorim (2002) observou uma taxa de
insucesso reprodutivo diário do ovo de Entre a ESSEC-Seridó e sua área de
3,3%. Nossos dados também são amortecimento é encontrada uma grande
corroborados com os achados de Borges & biodiversidade de potenciais predadores
Marnini (2010), que observaram um de ovos, o que possibilita um aumento na
probabilidade de encontro entre predador-
padrão de predação de ovos no Cerrado
linearmente maior de acordo com o ovos. Dentre estes predadores são
período da estação reprodutiva. O período encontrados répteis como jiboia (Boa
de estudo do nosso trabalho correspondeu constrictor) e teiú (Tupinambis merianeae).
ao término da estação reprodutiva de aves Dentre as aves são encontradas ema (Rhea
na Caatinga, corroborando, deste modo, americana), anu preto (Crotophaga ani),
gavião carijó (Rupornis magnirostris), socó
com os argumentos de Borges & Marnini
(2010). Portanto, predadores podem ter (Butorides striata), savacu (Nycticorax

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144
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011
nycticorax) e garça branca (Ardea alba). Arango-Vélez, N & Kattan GH. 1997. Efects
Dentre os mamíferos, são encontrados of forest fragmentation on
guaxinim (Nasua nasua), timbú (Didelphis experimental nest predation in andean
albiventris), cuícas (Micoureus sp.), raposa cloud forest. Biological Conservation
(Cerdocyon thous) além de gatos do mato 81:137-143
(Leopardus tigrinus) e vermelho (Puma
Barbini IS & Passamani M (2003).Pequenos
yagouaroundi).
mamíferos e a predação de ninhos
Ninhos no solo são mais propensos artificiais no Museu de Biologia Prof.
a predação do que ninhos arbóreos Mello Leitão (ES).Natureza on line
(Arango-Vélez & Kattan 1997). Portanto, 1(2):56-61
nossos resultados sugerem que seleção de
habitats com maior densidade de árvores Bencke, G. A., G. N. Maurício, P. F. Develey
lenhosas faz parte de uma estratégia & J. M. Goerck (orgs.). 2006. Áreas
comportamental com maior possibilidade importantes para a conservação das
de sucesso reprodutivo, uma vez que aves no brasil. parte i – estados do
nestas áreas os ovos ficam menos expostos domínio da Mata Atlântica. São Paulo:
a visualização de potenciais predadores SAVE Brasil, p. 139.
comparados com áreas abertas. Borges, FJA & Marii MA (2010). Birds
Sugere-se para trabalhos futuros nesting survival in disturbed and
mais dias de coleta para confirmar os protected Neotropical savannas.
resultados encontrados no presente biodiversity COnservaion 19: 223-236
estudo e a construção de um desenho França LC & Marini MA 2009. Teste do
experimental que possibilite o registro de efeito de borda na predação de ninhos
quais animais predaram ovos, a fim de naturais e artificiais no Cerrado.
apresentar resultados direcionados às Zoologia 26(2):241-250
estratégias de vida de cada espécie de
predador. Krebs JR, Danis NB 1996. Introdução à
ecologia comportamental. Ed. Atheneu
Agradecimentos São Paulo.
Aos Professores orientadores pelo Lima SL 2009. Predators and the breeding
comprometimento em ajudar-nos com este bird: behavioral and reproductive
trabalho a qualquer hora da noite, aos flexibility under the risk of predation.
gestores da ESEC – Seridó e ao Guilherme Biological Reviews 84: 485–513.
Mazzochini pela assessoria estatística.
Pichorim, M 2002. Biologia reprodutiva do
Referências bacurau-tesoura-gigante (Macropsalis
Alcock, J. (2001). Animal Behavior: an forcipata, Caprimulgidae) no morro
Evolutionary Aproach. Sunderland, Anhangava, Paraná, Sul do Brasil.
Sinauer. Ararajuba 10(2):149-165

144
145
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

REDE DE INTERAÇÕES ENTRE PLANTAS NA CAATINGA DA ESTAÇÃO ECOLÓGICA DO


SERIDÓ

GUILHERME GERHARDT MAZZOCHINI e ADRIANA PELLEGRINI MANHÃES

Introdução Na última década, tem havido


um grande interesse e avanço no
As interações positivas entre
desenvolvimento das análises de
plantas ocorrem em diversos
interações entre organismos de níveis
ecossistemas terrestres e tem se
tróficos diferentes em uma perspectiva
demonstrado um importante processo
de rede (Bascompte et al., 2003). Foi
para a manutenção da diversidade nas
proposto que as redes mutualísticas
comunidades (Bruno et al., 2003). Em
exibem estrutura aninhada, ou seja, as
ambientes áridos e semi-árido, por
espécies com poucas interações
exemplo, a regeneração de muitas
(especialistas) interagem somente com
espécies ocorre exclusivamente abaixo
um subconjunto das espécies com mais
da copa de indivíduos adultos de
interações (generalistas) (Bascompte et
plantas (Callaway, 2007). No entanto, o
al., 2003). Essa estrutura de rede
efeito facilitador das espécies não é
aninhada pode tornar a comunidade
igual para todas as espécies de
mais resistente contra extinções
regenerantes, sendo que algumas
aleatórias e perda de habitat (Fortuna
podem exercer um efeito negativo
& Bascompte, 2006).
enquanto outras podem exercer um
Em ambientes áridos e semi-
efeito positivo em um mesmo
áridos, o principal mecanismo
ambiente (Maestre et al., 2009).
responsável pelas interações positivas
Adicionalmente, as interações entre
entre plantas é o sombreamento de
indivíduos podem se modificar ao longo
indivíduos adultos favorecendo o
da ontogenia dos regenerantes, sendo
estabelecimento de regenerantes
a facilitação mais evidente nos estágios
(Callaway, 2007). Por isso, a análise
iniciais do estabelecimento e a
dessas interações como redes de
competição mais evidente em estágios
interação entre plantas (ou redes de
mais avançado do desenvolvimento
facilitação) foi proposta para entender
(Miriti, 2006). Todos esses fatores
esta estrutura de forma mais completa
evidenciam a complexidade das
(Verdú & Valiente-Banuet, 2008). Para
interações entre plantas e a
as redes de interações entre plantas
necessidade de se utilizar técnicas
em sete localidades do México foi
alternativas de análises para
encontrada estrutura aninhada, onde
compreender tal complexidade, com a
muitas espécies ocorrem abaixo de
integração de todas as espécies e
algumas espécies facilitadoras mais
interações entre elas.
generalistas (Verdú & Valiente-Banuet,
145
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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

2008). Posteriormente, foi lado, se a abundância não contribuir


demonstrado que a estrutura dessas para explicar a ocorrência de interação
redes é determinada pela abundância entre as espécies, evidencia que outros
das espécies, com maior probabilidade processos (como diferenças de nichos)
de interagirem entre si, e também, pela podem estar atuando.
distância filogenética entre as espécies,
quanto mais distante forem os pares de Material e Métodos
espécies interagindo, maior a
Área de estudo
probabilidade da interação (Verdú &
O trabalho foi desenvolvido na
Valiente-Banuet, 2011). Esses
área de Caatinga com solo do tipo
resultados indicam que algumas
“organossolo” localizada na Estação
espécies facilitadoras dão maior
Ecológica (ESEC) do Seridó. Essa
estabilidade para a estrutura da
Caatinga é caracterizada por uma
comunidade e promovem a
vegetação arbórea-arbustiva-herbácea,
diversidade.
com agrupamentos de árvores e
O primeiro objetivo deste
arbustos espaçados por uma matriz de
estudo foi testar a hipótese de que a
herbáceas dominadas por gramíneas.
rede de interações entre plantas da
Caatinga exibe uma estrutura Coleta de dados
aninhada. É estimado que 50% da Foi feito uma parcela de 126 m
caatinga esta sob efeitos antrópicos e de comprimento e 10 m de largura,
em torno de 15% da área do paralela à trilha que segue para a Lagoa
ecossistema pode estar em processo de do Junco, totalizando 1260 m2. No
desertificação (Leal et al., 2005), o que interior dessa parcela, as plantas
torna esse bioma particularmente arbóreas foram categorizadas em
suscetível à perda de espécies. A facilitadoras, plantas adultas com mais
identificação de espécies facilitadoras de 2 m de altura e mais de 0,8 m2 de
generalistas pode contribuir para copa, e facilitadas, indivíduos não
desenvolver técnicas de manejo que maduros crescendo abaixo da copa de
aumentam a resiliência da caatinga uma facilitadora. As facilitadas foram
frente à desertificação. O segundo divididas em plântulas, com altura
objetivo foi investigar como a mínima de 0,2 m e máxima de 1,3 m, e
abundância dos adultos e dos jovens, as plantas com altura maior
regenerantes influencia na ocorrência que 1,3 m. Abaixo da copa de cada
das interações. Um efeito forte da planta facilitadora foram registradas as
abundância na ocorrência de espécies facilitadas separadamente
interações indica que processos para as classes de plântulas e jovens.
neutros podem estar atuando, onde a Dessa forma, foram obtidas duas
probabilidade de interação é matrizes (uma para plântulas e uma
determinada majoritariamente pela para jovens) de presença e ausência da
abundância das espécies. Por outro ocorrência de cada espécie de facilitada

146
147
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

abaixo da copa de cada facilitadora. jovens), e 3) matriz AF, obtida


Adicionalmente, foram medidos os multiplicando as matriz A e F. Os
diâmetros do maior e menor eixo da valores de cada célula da matriz foram
copa das facilitadoras para obter uma divididos pela soma total das células,
estimativa de sua área de sombra onde a soma das probabilidades das
fornecida. A abundância das facilitadas três matrizes é 1. Por fim, foi
foi obtida somando-se a frequência de construída uma matriz de interações
ocorrência abaixo de cada facilitadora. equiprováveis (matriz N = 1/ n° sp.
facilitadoras* n° sp. facilitadas por
Análises estatísticas
rede).
Para testar a hipótese de que as
redes de facilitação apresentam Cada matriz de probabilidade é
estrutura aninhada, foi calculado o um modelo com distribuição
índice de aninhamento Nestedness multinomial das probabilidades de
based on Overlap and Decreasing Fill interação, onde cada célula possui uma
(NODF) (Almeida-Neto et al., 2008) distribuição binomial (Vázquez et al.,
utilizando a função nestednodf do 2009). A verossimilhança de cada
pacote vegan do R. A significância do modelo foi calculada utilizando a
índice foi comparada com valores de função dmultinom do pacote stats do
NODF obtidos de redes geradas por um R, e a comparação dos modelos foram
modelo nulo utilizando o algoritmo feitas comparando-se os valores de
“swap”, que mantém as linhas, colunas Akaike Information Criterion (AIC)
e o número de interações das redes onde, AIC = -2*LL+2*k, sendo LL o valor
fixas. Nesse método, a matriz original é do log da verossimilhança e k o número
modificada em passos seqüenciais, de parâmetros utilizados para estimar o
onde a cada passo a matriz aleatória é modelo. Valores baixos de AIC
pouco modificada em relação à matriz significam melhor ajuste do modelo e
original. Por isso, foram utilizadas 1.000 um modelo só é considerado melhor se
matrizes nulas obtidas após 10.000 tiver valor de AIC menor que 2 em
passos. comparação à outros modelos. Para
facilitar a comparação, foi calculado
Para analisar a influência da
também o valor de ΔAIC, que é a
abundância das espécies facilitadoras e
subtração dos valores de AIC de cada
facilitadas na probabilidade de
modelo pelo AIC do modelo com o
interação, foram geradas três matrizes
melhor ajuste (o ΔAIC do melhor
de probabilidades: 1) matriz A, onde a
modelo é 0). Todas as análises foram
probabilidade de interação é uma
realizadas no programa R 2.13.1 (R
função do total da área coberta pelas
Core Development Team, 2009).
facilitadoras (adultas), 2) matriz F, onde
a probabilidade de interação é uma
função da frequência de ocorrência das
espécies facilitadas (plântulas ou

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

Resultados também, porém, o ajuste é muito


pequeno quando comparado com a
Foram encontradas oito
matriz N (Tabela 1.b). Nesse caso, as
espécies de facilitadoras e 14 espécies
abundâncias dos adultos facilitadores
de facilitadas. Comparando o valor de
ou de jovens facilitados não são bons
NODF observado com os valores de
preditores da ocorrência de interações
matrizes aleatórias, a rede de interação
entre as espécies.
de adultos e plântulas não possui
estrutura aninhada (NODFobs = 57,7; p = Tabela 1. Valores de AIC e ∆ AIC das
0.46; Figura 1a). A rede de interações matrizes de probabilidades para a rede
de adultos com os jovens também não de interações de adultos com plântulas
apresentou estrutura aninhada (NODF (a) com jovens (b)
= 59; p = 0,067; Figura 1b), sendo o
valor observado marginalmente (a) AIC ΔAIC
significativo quando comparado com Plântulas
valores aleatórios. Matriz F 118,24 0
Matriz N 129,29 11,05
A matriz F foi a matriz que teve Matriz AF 148,26 30,02
melhor ajuste para predizer a Matriz A 157,31 39,07
ocorrência das interações na rede com
as plântulas (Tabela 1.a). Ou seja, (b) Jovens
quando mais abundante for uma Matriz F 115.96 0
plântula facilitada, maior a Matriz N 116.45 0,49
probabilidade de interagir com as Matriz A 138.86 22,9
espécies facilitadoras. Na rede de Matriz AF 157.31 41,35
interações de adultos com jovens a
matriz F foi a que teve melhor ajuste

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Figura 1. Rede de interações entre as facilitadoras (colunas) com as facilitadas (linhas).


a) Rede de interação de adultos e plântulas (> 20 e < 130 cm). b) Rede de interação de
adultos e jovens (> 130 cm). Os quadrados preenchidos indicam a ocorrência da
interação. Os nomes das espécies estão abreviados com as três primeiras letras do
gênero e epíteto específico e estão escritos por extenso na Tabela 2.

Tabela 2. Espécies presentes da rede de interações, somatório da área da copa de


todas as adultas facilitadoras e frequência facilitadas plântulas (P) e jovens (J).

Abreviaçã Área
o Espécie (m2) Freq. P Freq. J
CniPhy Cnidoscolus phyllacanthus 512.08 - 1
MimTen Mimosa tenuiflora 509.19 7 7
AspPyr Aspidosperma pyrifolium 241.34 19 6
EriPon Erythroxylum pungens 73.98 2 5
JatMol Jatropha mollissima 62.27 19 10
HanImp Handroanthus impetiginosa 62.20 1 -
CapFle Capparis flexuosa 17.22 4 8
PipSti Piptadenia stipulacea - 12 18
ZizJoa Ziziphus joazeiro - 1 -
PitDiv Pithecellobium diversifolium - - 2
SponTub Spondias tuberosa - - 1
ComLep Morfotipo 1 - 1 5
OpAsp Morfotipo 2 - 1 -

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Discussão onde um subconjunto de espécie


A rede de interações entre interage mais freqüentemente entre si
plantas da caatinga da ESEC não possui do que outro subconjunto (Fortuna et
estrutura aninhada, diferente do que al., 2010).
foi observado para sete localidades no
México (Verdu & Valiente-Banuet, As estruturas das redes de
2008). Além disso, a abundância de interações podem ser afetadas por
plantas facilitadas estava relacionada diversos fatores, incluindo processos
com o número de interações somente neutros e processos relacionados com
na rede de adultos interagindo com as características dos indivíduos
plântulas. Esses resultados dão luz ao (Rezende et al., 2007). Aplicando o
papel das interações interespecíficas na método de Vázquez et al. (2009) para
estrutura e na estabilidade da avaliar a contribuição relativa da
comunidade de plantas lenhosas da abundância de facilitadoras e
caatinga da ESEC-Seridó, como será facilitadas, ficou evidente que existem
discutido abaixo. outros fatores, além da abundância das
A estrutura não aninhada das espécies determinando a ocorrência
redes indica que espécies com poucas das interações entre as espécies.
interações não necessariamente Somente na rede de adultos com
interagem com as espécies com mais plântulas, as espécies facilitadas mais
interações, indicando que as interações abundantes interagiam mais com as
podem ser espécie-específica espécies facilitadoras. Porém, na rede
(Callaway, 1998). Provavelmente de adultos com jovens esse padrão
algumas espécies proporcionam um deixou de existir (Tabela 1). Isso
ambiente mais propício para a demonstra que as características
regeneração de espécies que não funcionais das espécies podem estar
recrutam sob a copa de outras, devido explicando parte das interações (Verdu
à estrutura da copa das facilitadoras. & Valiente-Banuet, 2011). Por
De fato, o sombreamento sob a copa exemplo, a espécie J. mollissima,
de espécies como H. impetiginosa, E. característica de áreas abertas, foi
pungens e A. pyrifolium é maior, o que muito freqüente nesse estudo e, no
pode proporcionar melhores condições entanto, não haviam indivíduos jovens
para o recrutamento de espécies dessa espécie sob a copa de espécies
menos resistentes à seca e com a copa mais densa como H.
luminosidade. Por outro lado, espécies impetiginosa e A. pyrifolium.
como M. tenuiflora e C. phyllacanthus, Em resumo, os resultados
não proporcionam um sombreamento obtidos evidenciam certo grau de
tão intenso, o que pode permitir a dependência de algumas espécies em
regeneração de espécies tolerantes à regenerar sob a copa de espécies que
luz sob suas copas. Isto sugere que proporcionam um microclima mais
essa rede pode ter estrutura modular, favorável, de acordo com suas

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características funcionais (mais ou Bascompte, J., Jordano, P., Melian, C.J.


menos luz e umidade). Dessa forma, a & Olesen, J.M., 2003. The nested
diversidade da regeneração da caatinga assembly of plant-animal
da ESEC não é mantida por algumas mutualistic networks. Proceedings
poucas espécies mais abundantes. A of the National Academy of
consequência desse tipo de estrutura Sciences 100: 9383–9387.
(modular) pode ser menor estabilidade Bruno, J.F., Stachowicz, J.J. & Bertness,
frente à perda de habitat, pois M.D. 2003., Inclusion of facilitation
espécies pouco frequentes são mais into ecological theory. Trends in
propensas à extinção. A perda dessas
Ecology and Evolution 18: 119–125.
espécies pode diminuir o
estabelecimento de outras que Callaway, R.M., 1998. Are positive
necessitam do ambiente sombreado de interactions species−specific? Oikos
suas copas. São necessários estudos 82: 202–207.
para identificar as espécies lenhosas Callaway, R.M. 2007. Positive
mais propensas à extinção por Interactions and Interdependence
desmatamento ou desertificação para in Plant Communities. Springer,
predizer os efeitos desses fatores na Dordrecht.
estabilidade e estrutura da Caatinga.
Fortuna, M.A. & Bascompte, J., 2006.
Mais coletas de dados e a análise do
Habitat loss and the structure of
aninhamento e modularidade das redes
plant–animal mutualistic networks.
utilizando matrizes de frequências de
Ecology Letters 9: 281–286.
interações poderão elucidar novos
mecanismos das interações entre Leal, I.R., Silva, J.M.C., Tabarelli, M. &
plantas nesse ecossistema. Lacher Jr, T.E., 2005. Mudando o
curso da conservação na Caatinga
Agradecimentos do Nordeste Brasileiro.
Megadiversidade 1: 139-146.
Agradecemos à Silvana e ao Jorge pela
ajuda na identificação das plantas e Miriti, M.N., 2006. Ontogenetic shift
também à equipe da ESEC pelo apoio from facilitation to competition in a
logístico. desert shrub. Journal of Ecology 94:
973–979.
Referências
R Development Core Team. 2011. R: A
Almeida-Neto, M., Gumarães, P., language and environment for
Gumarães, P.R., Loyola, R.D. & statistical computing. R Foundation
Ulrich, W., 2008. A consistent for Statistical Computing, Vienna,
metric for nestedness analysis in Austria.
ecological systems: reconciling
Rezende, E. L., Jordano, P. &
concept and measurement. Oikos
Bascompte, J., 2007. Effects of
117: 1227–1239.
phenotypic complementarity and

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152
Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

phylogeny on the nested structure Verdú, M. & Valiente-Banuet, A., 2008.


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1919–1929. facilitation networks prevents
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doi:10.1029/2007GL029695 structure of plant facilitation

Vázquez, D. P., Chacoff, N.P. & Cagnolo, networks. Oikos 000: doi:
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mutualistic networks. Ecology 90:
2039–2046.

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INFLUÊNCIA DE UM GRADIENTE DE UMIDADE NA CO-OCORRÊNCIA DE ARANHAS E


FORMIGAS EM ÁREA DE CAATINGA DO RN

LEIDE AMARA PEREIRA DA SILVA, ANA CLÉZIA SIMPLÍCIO DE MORAIS, HONARA MORGANA DA SILVA

Introdução de espécies (Gotelli, 2000), uma vez


que essa é uma das formas pelas quais
A estruturação de comunidades
a estrutura de comunidades pode ser
pode ser explicada por diversas vias.
detectada.
Abordagens baseadas em processos de
nicho assumem que as interações Diante disso, o presente estudo
ecológicas relacionadas à co-existência teve como objetivo analisar se há
de espécies atuam fortemente na influência do gradiente de umidade na
estrutura de comunidades (Kembel & co-ocorrência de aranhas e formigas
Hubbell, 2006). Abordagens baseadas em uma área de Caatinga.
em processos históricos (filogenia e
biogeografia) trazem a perspectiva de
que as relações filogenéticas entre as Metodologia
espécies coexistentes ajudam na
compreensão de como as comunidades Área de estudo
são estruturadas (Pavoine et al., 2011).
O estudo foi realizado na
Ainda, processos neutros têm sugerido
Estação Ecológica do Seridó - ESEC
que as propriedades das comunidades
(6°35’S e 37°15’W), que possui 1.128
sejam estruturadas estocasticamente
ha, situada no sudeste do Rio Grande
pela combinação de deriva ecológica,
do Norte, município de Serra Negra do
migração e especiação (Beeravolu et
Norte e pertencente à mesorregião
al., 2009).
Seridó. A área está presente no
A fauna de artrópodos tem sido domínio da caatinga, apresentando
ressaltada como de fundamental vegetação secundária, caracterizada
importância para o funcionamento dos por grande abundância de espécies
processos ecológicos que estruturam arbustivas e arbóreas de pequeno
ecossistemas terrestres, especialmente porte, caracterizando um processo de
nos trópicos (Wilson, 1987). regeneração (Bencke et al., 2006).
Todavia, afirmar se
Delineamento amostral
comunidades são estruturadas por
forças determinísticas ou neutras Delimitou-se um transecto de
requer o uso de modelos teóricos 50 metros perpendicular a um riacho
aliados a amostragens e experimentos, com água corrente, onde foram
a fim de se encontrar padrões de amostrados 10 pontos com distância de
estruturação (Ellwood et al., 2009). Os 5 metros entre eles. Em cada ponto de
modelos nulos são um caminho eficaz coleta, duas parcelas de 50 cm x 50 cm
para testar padrões de co-ocorrência eram delimitados, sendo um distante

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1m a direita do transecto e o outro 1m Para investigar se a co-


a esquerda, totalizando assim uma ocorrência entre os morfotipos de
amostragem de 20 parcelas de aranhas e formigas diferia do acaso,
serrapilheira. O local foi escolhido utilizou-se um modelo nulo através da
objetivando contemplar uma variação comparação do C-score observado e
do gradiente de umidade do solo dos valores de C-score esperados ao
(menos úmido quanto mais distante do acaso, com linhas fixas e colunas
riacho). Em cada parcela foi feita coleta equiprováveis (Gotelli, 2000), no
da serrapilheira para triagem de programa EcoSim.
aranhas e formigas, a qual foi colocada
em sacos plásticos numerados para
posterior triagem dos morfotipos em Resultados
laboratório. Ainda utilizou-se o método
de guarda-chuva entomológico, onde Nos 10 pontos de coleta, a partir
em cada um dos 10 pontos do de amostragens por meio das duas
transecto a árvore mais próxima foi metodologias de coleta (serrapilheira e
escolhida e teve amostrada a fauna de guarda-chuva entomológico), foram
formigas e aranhas que caiu em uma identificados 10 morfotipos de formigas
badeja sob sua copa, após 20 batidas e 20 de aranhas. A riqueza média por
no caule. Os animais foram, então, parcela foi de 3±1,7 e 1,7±0,9 para
acondicionados em frascos com álcool aranhas e formigas, respectivamente.
70% e em seguida levados ao
A regressão linear confirmou o
laboratório para identificação dos
gradiente de umidade no decorrer do
morfotipos.
transecto perpendicular ao riacho, a
Ainda em campo cada parcela partir da sua margem (R²=0,437;
teve uma amostra de solo coletada , a F1,8=6,211; p=0,037) (Figura 1).
fim de medir a umidade do solo . Em
laboratório as amostras foram pesadas ,
secas em estufa a ̴70 °C por 24h, e
pesadas novamente para verificar o
quanto de água haviam perdido. Esse
procedimento gerou uma medida
indireta de umidade.

Análise de dados

Para testar a relação entre a


distância percorrida pelo transecto a Figura 6. Regressão entre distância da
partir da margem do rio com a umidade margem do rio até o último ponto
do solo fez-se uma regressão linear amostrado e umidade do solo.
simples, no programa Systat 12.

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A aplicação dos dados de estruturação dessas comunidades de


riqueza ao modelo nulo gerou o C-score aranhas e formigas.
observado (1,80) e uma freqüência de
Contudo, apesar da co-
valores de C-score esperados ao acaso,
ocorrência encontrada ocorrer
mostrando que a co-ocorrência entre
meramente ao acaso, de acordo com o
morfotipos de aranhas e formigas não é
modelo nulo, pode ser que haja um
diferente do esperado ao acaso
efeito indireto do gradiente de
(observado <= esperado, p = 0,88)
umidade sobre o padrão observado.
(Figura 2).
Mudanças nas características
ambientais afetam a capacidade dos
organismos em se dispersar, podendo
haver extinção de determinados
morfotipos ao longo do gradiente,
havendo, então, um efeito direto sobre
a “seleção” dos morfotipos capazes de
habitar ambientes com características
específicas. Isso pode explicar a alta
substituição de morfotipos de aranhas
Figura 7. Distribuição de freqüência de
e formigas no decorrer do gradiente,
valores de C-score obtidos através de diminuindo então a chance de co-
5000 aleatorizações. A seta representa ocorrerem e resultando no padrão
o valor do C-score observado (1,80) a encontrado, em que a co-ocorrência
partir dos dados de co-ocorrência, não é diferente do que se espera ao
indicando que esse não é diferente do acaso. A substituição dos morfotipos foi
esperado ao acaso. constantemente observada no decorrer
Discussão dos pontos amostrados.

A co-ocorrência encontrada Além da umidade influenciando


entre os morfotipos de aranhas e na distribuição dos organismos, outras
formigas não foi diferente do esperado variáveis podem também compor o
ao acaso, ou seja, as comunidades, conjunto das características favoráveis
dentro do contexto estudado, ou não para a presença de
possivelmente são estruturadas determinados morfotipos de aranhas e
estocasticamente. Padrão esse formigas ao longo do gradiente, tais
explicado por processos neutros, como: temperatura, luminosidade,
determinados por dispersão, extinção e abertura da copa, biomassa e estrutura
especiação (Hubbell 2001). Sendo da serrapilheira, tipo de solo, entre
assim, não é possível afirmar que o outras. Assim, requerimentos abióticos
gradiente de umidade pode estar e características do microhabitat
influenciando diretamente na (Pelochová & Storch, 2008) podem
estar exercendo uma influencia

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marcante sobre os organismos Referências


encontrados ao longo do gradiente.
Bencke, G.A., Maurício, G.N., Develey,
Em geral, artrópodes menos P.F., Goerck, J.M. 2006. Áreas
tolerantes a condições ambientais importantes para conservação de
adversas são mais bem sucedidos em aves no Brasil. Parte I – Estados do
ambientes com maior quantidade de domínio da mata atlântica. SAVE
serrapilheira, pois esta intercepta luz Brasil, São Paulo.
em maior proporção, reduzindo a
Beeravolu, C.R.; Couterona, P.;
amplitude térmica do solo, além de
Pélissier, R.; Munoz, F. 2009.
possibilitar refúgio contra predadores
Studying ecological communities
(Varjão et al., 2010). Esse fato evidencia
from a neutral standpoint: A review
ainda mais a substituição de morfotipos
of models’ structure and parameter
à medida que as características
estimation. Ecological Modelling
ambientais e físicas vão se modificando
220, 2603–2610.
no gradiente.
Ellwood, M.D.F.; Manica, A.; Foster,
Ainda, um padrão de co-
W.A. 2009. Stochastic and
ocorrência diferente do esperado ao
deterministic processes jointly
acaso talvez pudesse ter sido
structure tropical arthropod
observado caso uma maior
communities. Ecology Letters 12,
amostragem tivesse sido realizada
277–284.
dentro de cada parcela do gradiente de
umidade, por exemplo, próximo ao Gotelli, N.J., 2000. Null model analysis
riacho, em uma distância média e of species co-ocorrence patterns.
distante do riacho. Através de uma Ecology 81, 2606-2621.
amostragem maior em cada parcela do
gradiente provavelmente haveria uma Hubbell, S.P., 2001. The unified neutral
menor taxa de substituição dos theory of biodiversity and
morfotipos e, conseqüentemente, eles biogeography. Priceton university
teriam maior chance de co-ocorrer. press, Princeton.

Kembel, S.W.; Hubbell, S.P. 2006. The


Phylogenetic Structure Of A
Agradecimentos Neotropical Forest Tree Community.
Ecology 87, 86–99.
Ao professor Alexandre
Vasconcellos pelas sugestões. A Tonny Pavoine, S.; Vela, E.; Gachet, S.G; Belair,
Marques pelo auxílio no uso do EcoSim. G.; Bonsall, M.B. 2011. Linking
Aos que fazem parte da ESEC – Seridó. patterns in phylogeny, traits, abiotic
variables and space: a novel
approach to linking environmental
filtering and plant community

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Curso de Campo Ecologia da Caatinga, PPG Ecologia, UFRN, 2011

assembly. Journal of Ecology 99, Wilson, E.O. 1987. The little thing that
165–175. run the world: the importance and
conservation of invertebrates.
Pelochová, J.; Storch, D. 2008.
Conservation Biology 1, 344-346.
Ecological Niche. Evolutionary
Ecology 2, 1088-1097.

Varjão, S.L.S.; Benati, K.R.; Peres, M.C.L.


2010. Efeitos da variação temporal
na estrutura da serrapilheira sobre a
abundância de aranhas (Arachnida:
Araneae) num fragmento de Mata
Atlântica (Salvador, Bahia). Revista
Biociências 16, 1-10.

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