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O pensamento político tem como uma de suas problemáticas centrais a

fundamentação do poder. Qualquer investigação acerca do Estado perpassa as


questões sobre a legitimação do poder ou a justificação da obediência política. O
indivíduo busca entender os princípios que regem a sua vida enquanto membro de
uma comunidade política que lhe atribui direitos e deveres. Essa relação entre o
indivíduo e sua comunidade política mostra-se complexa e não é tão harmoniosa
de tal forma que possamos descartar a necessidade de uma investigação mais
profunda. Parece-nos que um olhar reflexivo levanta inúmeros pontos de tensão
que podem questionar a própria validade dessa relação. Como podemos, então,
pensar essa relação que interfere tanto na vida do indivíduo, mas que, na maioria
das vezes, não é fruto de uma escolha, apenas da contingência? Ora, nasce-se já
pertencendo a uma comunidade e não é fácil trocá-la, pois há inúmeras barreiras
culturais, burocráticas e pessoais. Modificá-la também não é tarefa fácil. A inércia
dificulta mudanças na estrutura da sociedade, sendo necessária alguma explosão
revolucionária ou algum grau de conserto coletivo para instaurar uma nova ordem
social. O indivíduo sozinho revela-se em desvantagem frente a esse coletivo,
mesmo sendo ele a razão de ser deste (ao menos numa sociedade que enfatize a
importância do indivíduo como a tradição ocidental). O que, então, caracteriza a
relação entre o ente político e o indivíduo? Por que ela se dá? Para que fim?

Para começar, notamos uma grande divergência entre interesses públicos e


privados. Ora, se os interesses particulares de um tivessem validade universal
sobre toda a sociedade, o bem-comum teria um peso inferior, ou, pelo menos, a
vontade particular de um teria precedência sobre a dos outros. A primazia da
vontade de um numa pluralidade de vontades representa um desnível, uma
inequidade. Por que o meu desejo particular seria mais importante que o do
próximo perante a sociedade? Tal patente desigualdade dificilmente seria
justificada numa situação aonde a igualdade entre pessoas é ensejada. Desta
forma, a pluralidade de desejos e vontades precisa ser administrada. O movimento
da configuração política da modernidade parece refletir uma tentativa de
adequação à pluralidade de vontades; da monarquia absolutista, que exprime a
primazia de uma só vontade, à democracia, que representa a multiplicidade.

Hobbes afirma que a liberdade é a ausência de oposição, de interferência nas


atividades do agente (Hobbes,1979). Esse raciocínio foi seguido posteriormente
pelos liberais, como John Locke, Benjamin Constant e J. S. Mill (Berlin,1981),
significando a capacidade de agir segundo a sua vontade sem interferência alheia.
Nesse sentido, o outro será sempre fonte de interferência, porquanto a liberdade
de um constitui obstáculo em potencial à realização da liberdade do outro em
razão da diversidade de interesses. Portanto, se desejamos certa equidade na sua
distribuição e estabilidade social para que não se usufrua liberdade à custa da
liberdade de outros, esta carece de um fiador. O Estado sobrevém como árbitro
das controvérsias.

Uma leitura clássica poderia dizer que essa capacidade do Estado de se impor
sobre os indivíduos, proporcionada pelas suas instituições e agentes, consiste no
poder. Poder de impor uma vontade sobre as outras pela ameaça, direta ou
indireta, de violência ou sanção.

Contudo, como Foucault nos mostra (Foucault,1982), o poder pode ser visto por
outra ótica. O poder é relacional, ou seja, é exercido numa relação entre duas ou
mais partes. Ao dizer que o poder é relacional, concebe-se que este é produto das
desigualdades e desequilíbrios que podem estar presentes em quaisquer relações.
Essas relações de poder são encontradas em toda a estrutura da sociedade, desde
as relações cotidianas entre pessoas até as relações entre os grupos da sociedade
e os aparelhos estatais.

Essa concepção de poder nos mostra que o Estado capturou numerosas relações
de poder, mas não é sua fonte, uma vez que o poder – ao invés de assumir a forma
de lei – mostra-se como relação, não sendo a violência ou a lei, mas uma relação
estratégica de forças que se estabelece e que pode deixar de existir.

Dessa forma, o poder não é possuído, mas algo que é exercido de acordo com um
determinado contexto: ele é um instrumento de diálogo entre os indivíduos.
Partindo da perspectiva foucaultiana, que expande a compreensão deste conceito
para além do contexto do Estado de Direito, podemos pensar esta questão no
contexto organizacional.

Certamente o poder é um elemento que perpassa o cotidiano das organizações, já


que nele configuram-se diversas relações interpessoais: de cooperação, de
competição e, logicamente, de hierarquia.

O poder está contido em diversas relações e não somente naquelas “obviamente”


hierárquicas: entre as pessoas existe uma relação de forças que permeia suas
ações. Mesmo, por exemplo, quando pensamos em condições de mesmo nível
hierárquico, pois, nesses casos, existem outros elementos que definem a
assimetria de forças, como personalidade, capacidade de persuasão etc. Desta
forma, não é entendido como exclusivamente coercitivo ou negativo. O poder é
visto pelo viés da assimetria de forças que surge das relações interpessoais.

Ao vermos o poder não sendo unicamente uma força coercitiva e negativa,


podemos trazer à luz um aspecto importante, que é a sua dimensão ética.
Reconhecer o poder contido nas relações não é constatar que tudo pode ser feito
àquele que está submetido a determinado poder. E, muitas vezes, vemos que é
exatamente isso que acontece no ambiente corporativo, com lideranças
excessivamente arbitrárias, causadoras de constrangimento, assédios etc.

O caso das lideranças é um exemplo importante a ser considerado, pois há uma


clara relação de força e poder entre líder e liderado. O poder do líder serve não
somente para reafirmar sua condição de liderança, aonde a coerção prevalece,
mas pode também ser um meio para alavancar suas equipes, extraindo de cada
um seus potenciais.
E, assim, podemos notar a dimensão ética que perpassa as relações de poder
neste contexto, pois é possível escolher de que forma e com qual propósito tal
força será exercida.

Referências bibliográficas:

BERLIN, Isaiah. Quatro ensaios sobre a liberdade. Brasília: Ed. Universidade de


Brasília, 1981.
HOBBES, Thomas. Leviatã. Tradução de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz da
Silva, São Paulo: Abril Cultural, 1979.
FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Org. Roberto Machado, Rio de Janeito:
Edições Graal, 1982.
FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade: a vontade de saber. Rio de Janeiro:
Edições Graal, 2001.

A microfísica da corrupção

O historiador e filósofo Michel Foucault criou uma teoria a que chamou de “microfísica do
poder”, título de um de seus livros. Com isso, ele demonstra que o poder se exerce de
múltiplas formas e não somente a partir de grandes estruturas, como a máquina do Estado
e outras estruturas sociais historicamente poderosas, como a Igreja, a escola, as forças
armadas, o estamento policial.
Segundo Foucault, há um micropoder que se exerce fortemente também nas relações
sociais distantes do macropoder, em que indivíduos ou microestruturas, como um time de
futebol, uma associação de bairro, etc. exercem poder e praticam a coação.

Esse micropoder pode, por exemplo, afetar uma relação homem/mulher, pai/filho,
patrão/empregado, amigo/amigo. Enfim, as nossas relações diárias são, na constatação
do filósofo, uma teia de pressões e contrapressões entre indivíduos.

Digo isso porque, nos últimos dias, televisões e jornais estão repletos de notícias sobre a
prática da propina, especialmente aquela que é exigida por policiais. O caso de maior
visibilidade deu-se por ocasião do atropelamento do jovem Rafael, filho de Cissa
Guimarães, repercussão causada pelo fato de ser a mãe do rapaz uma artista da Globo.

Numa esquina escura ou clara; lá longe, numa fazenda; dentro de uma repartição e nas
numerosas oportunidades em que nos encontramos com agentes públicos – fiscais,
policiais, guardas de trânsito, funcionários de todos os calibres – quantos de nós,
“cidadãos de bem”, já não oferecemos uma “gratificação” a um desses agentes públicos
para fazerem andar um papel dentro da burocracia, rasgar a nota de multa,
descaracterizar o trabalho escravo lá na fazenda, etc, etc, e mais etc.? Quantos de nós já
não aceitamos participar dessa prática, concordando em oferecer a propina em vez de
denunciá-la?

Essa microfísica da corrupção existe e dela participam muitos que, em público, até
condenam esse histórico desvio de conduta. Participamos todos quando não denunciamos
essas formas de corrupção.

Essas “pequenas” formas de prostituir o Estado e a vida social quase sempre perdem
visibilidade diante das manchetes sobre os grandes assaltos aos cofres públicos, da
macrocorrupção que envolve ministros, parlamentares, lobistas, etc. No entanto, se não
declararmos guerra às formas de corrupção praticada no varejo, não controlaremos jamais
nem estas nem aquelas praticadas no atacado.

A “governamentalidade” em Michel Foucault e


“corrupção”, de Norberto Bobbio
Arnaldo Alves da Conceição

Resumo: o presente trabalho se propõe a realizar uma analise acerca da


corrupção nos estados absolutistas antes do advento da idéia de que o estado
seria o gestor do “bem comum” e dos interesses coletivos. O referido estudo
terá por base fragmentos dos textos do eminente filosofo Michael Foucault, “a
governabilidade” e do notável jurista Norberto Bobbio, “corrupção”, que nos
permitirá teoricamente estabelecer considerações críticas sobre as
proposições citadas. Para tanto se faz necessário estabelecer conceitos a
respeito dos regimes absolutistas, bem como sobre os aspectos da corrupção e
suas variações na sociedade e nas suas formas de governo, verificando a
possibilidade de existência de fatores ligados à corrupção no referido regime
centralizador.

Introdução:

O presente trabalho se propõe a realizar uma analise acerca da corrupção nos


estados absolutistas antes do advento da idéia de que o estado seria o gestor
do “bem comum” e dos interesses coletivos. O referido estudo terá por base
fragmentos dos textos do eminente filosofo Michael Foucault, “A
governabilidade” e do notável jurista Norberto Bobbio, “Corrupção”, que nos
permitirá teoricamente estabelecer considerações críticas sobre as
proposições citadas.

Para tanto se faz necessário estabelecer conceitos a respeito dos regimes


absolutistas, bem como sobre os aspectos da corrupção e suas variações na
sociedade e nas suas formas de governo, verificando a possibilidade de
existência de fatores ligados à corrupção no referido regime centralizador.

Considerações sobre os regimes absolutistas:

A partir do século XV, até a Revolução Francesa (1789) e mesmo entrando no


século XIX (1814-1848), vigorou na Europa o regime político
denominado Absolutismo. Foi a linha de chegada de um processo iniciado na
Idade Média e que representou a derrota da nobreza pela monarquia e a
afirmação do soberano, o Rei, e do Estado nacional. Isso foi possível pelo
cansaço das guerras de religião, pela riqueza provinda das novas descobertas
e o apoio da burguesia, que se unira aos nobres reais em nome da
sobreposição à Igreja católica que por um lado impedia os intentos burgueses,
uma vez que condenava o lucro e a usura, e já não era bem vista pelos reis da
época, daí o interesse mutuo em estabelecer um regime que centralizado que
pudesse estabelecer regras comerciais e Direitos objetivos que separasse o
Estado do poder clerical.

O Absolutismo foi o regime da centralização: os soberanos passaram a


concentrar todos os poderes, ficando os cidadãos excluídos de qualquer
participação e controle na vida pública. Esse poder do soberano se legitimava
em Deus, o Rei nada mais era que o representante do criador supremo aqui na
terra, portanto, as ordens e os ditames do soberano teriam que serem
cumpridos como ordens divinas aos homens comuns. Dessa forma o Rei
representava o Estado, a Igreja e todos os demais poderes da época, daí a
celebre frase de Luis XIV (Rei Sol), “O Estado sou eu”, representando a
similitude da pessoa do soberano e representação do Estado.

Nesta linha, o soberano era supremo. Detinha todo poder dentro da


sociedade, Dele emanava o Direito, as leis, as regras, os limites do Estado
Nacional, portanto toda e qualquer atitude política, cultura etc. eram
legitimadas pelo poder ilimitado e incondicionado do referido soberano.

Este período absolutista se estenderia até a Revolução francesa de 1789 (final


do século XVIII), quando diante das arbitrariedades e atrocidades, oriundas
dos ditames dos déspotas reais, as classes menos favorecidas, chamada de
terceiro Estado unem-se à burguesia para colocar a baixo o regime absolutista
e trazer o pode para o povo, a chamada democratização do poder, pondo fim
assim no regime centralizado na pessoa do soberano.

A corrupção nos Estados Nacionais Absolutistas:


Antes de adentrarmos na discussão acerca da corrupção nos estados nacionais
absolutistas, convém ressaltar e especificar o que se entende por corrupção
de forma genérica.

Entende-se por corrupção o fenômeno pelo qual um funcionário público


presta, mediante favorecimento em seu favor, favores em seu favor ou em
favor de terceiros. A corrupção pode ser definida como utilização do poder ou
autoridade para conseguir obter vantagens, e fazer uso do dinheiro público
para o seu próprio interesse, de um integrante da família ou amigo.

Numa definição ampla, corrupção política significa o uso ilegal - por parte de
governantes, funcionários públicos e agentes privados - do poder político e
financeiro de organismos ou agências governamentais com o objetivo de
transferir renda pública ou privada de maneira criminosa para determinados
indivíduos ou grupos de indivíduos ligados por quaisquer laços de interesse
comum – como, por exemplo, negócios, localidade de moradia, etnia ou de fé
religiosa.

O eminente jurista e filosofo Norberto Bobbio (BOBBIO, 1986), descreve a


corrupção como:

“Fenômeno pelo qual um funcionário público é levado a agir de modo diverso


dos padrões normativos do sistema, favorecendo interesses particulares em
troco de recompensas. Corrupto é, portanto, o comportamento ilegal de quem
desempenha um papel na estrutura estadual. Podemos encontrar três tipos de
corrupção: a prática de recompensa para mudar em seu favor o sentir de um
funcionário público, o nepotismo que é a concessão de empregos ou contratos
públicos, baseando não no mérito, mas sim na parentela e o peculato PR
desvio ou apropriação e destinação de fundos públicos ao uso privado.”

Face ao exposto, compreendemos que para existir corrupção é necessário um


agente público que desempenhe uma determinada função dentro do aparelho
estatal e também que este agente se preste a atender interesses, particulares
ou de terceiros que destoam de suas funções típicas e do respectivo órgão ao
qual presta serviços.

Ao passarmos desta fase conceitual, analisemos os aspectos da corrupção


dentro dos estados absolutistas. Sabemos que no regime absolutista o Estado
se confunde com a pessoa do soberano (Rei) que é a expressão máxima dentro
do território estatal (poder executivo, legislativo e judiciário). Também é
sabido que não há limites ao pode do dito soberano, podendo este agir da
forma que lhe convier, atendendo a interesses coletivos ou a interesses
próprios.

Neste prisma não entendemos haver corrupção nos estados absolutistas, uma
vez que, não interesse público coletivo e social para que o funcionário público
possa dele destoar. Caso algum funcionário designado pelo soberano cometa
ato diverso da ordem real, cometerá crime de “lesa majestade”, isto é,
contra o Rei, Soberano e, por conseguinte contra o Estado, não tendo que se
falar em corrupção e sim, ato ilícito contra a ordem (regime vigente).
Assim sendo, antes da idéia de Estado como agente do interesse coletivo, não
há que se falar em corrupção, se um regime é absoluto e incondicionado.
Todo poder estava com o soberano e todas suas ações estavam legitimadas.
Caso outros agentes, por Ele designados, agisse de forma contrária, não
entendemos ser o caso de corrupção e sim de traição à ordem real soberana.

Já no Estado moderno, que representa os interesses dos mandatários, que são


o povo, a sociedade comum, não se admite a busca de interesses individuais
que fazem uso do Estado para tanto. Estaríamos diante da chamada
corrupção, penalmente punível em nosso ordenamento jurídico e moralmente
reprovável em nosso regime democrático de Direito.

Conclusão:

Em síntese, entendemos as bases dos Estados Nacionais Absolutistas, como um


regime de governo centralizado na pessoa do Rei, também chamado de
soberano. Nele se concentrava todas as decisões jurídicas, políticas e
administrativas que eram legitimadas pelo poder divido investido em referido
líder.

Também ficam notáveis as linhas gerais da corrupção, como ação de referido


agente público, que mediante recompensa ou buscando interesses diversos
dos de sua função, privilegia seus próprios interesses ou a interesses de
terceiros.

Por fim, concluísse a impossibilidade da pratica de corrupção nos Estados


Nacionais Absolutistas, uma vez que, tal regime não possui limites nem
controle, tão pouco tinham que atender a um interesse público, mas tão
somente interesses do soberano ou que este entendesse ser o interesse de seu
Estado.

Bibliografia:

BOBBIO, Norberto. Dicionário de Política, por Norberto Bobbio, Nicola


Matteucci e Gianfranco Pasquino. Trad. João Ferreira et al. Brasília: Ed.
Universidade de Brasília, 2ª ed. 1986.

FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Edições Graal, 6ª ed.


1986.

Foucault, o corpo e o poder


disciplinar
Foucault, el cuerpo y el poder disciplinario

Gláucio Oliveira da Gama*


*Curso de Graduação em Licenciatura em Educação Física glaucio_gama@hotmail.com
Ex-bolsista Faperj
**Prof. Adjunto, DLCS, ICHS, UFRRJ Cláudio Oliveira da Gama*
(Brasil) claudiodagama@hotmail.com
Luiz Celso Pinho**
Resumo
Michel Foucault, ao diagnosticar mecanismos de poder na sociedade, qualifica o poder disciplinar, como
autor dos acontecimentos decorrentes de uma atitude padronizada dos homens na modernidade. Para ele
vivemos a Era dos corpos disciplinados, onde a disciplina produz, para a modelagem e controle dos corpos,
ferramentas que vão nortear todo o processo de construção do poder e normatização das condutas, adotando
caracteres para sua aquisição. Assim em relação aos corpos a noção de beleza exterior se tornou tão
importante que marca a atualidade como a sociedade da aparência, dos rostos e corpos belos e esbeltos, tudo,
graças aos mecanismos exigidos e tidos como verdadeiros pelo poder disciplinar que fazem do uso de
atributos, como veículos de informação, para controlarem a sociedade.
Unitermos: Michel Foucault. Corpo. Poder disciplinar
http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 136 - Septiembre de 2009

1/1

Introdução

Ao afirmar que “em qualquer sociedade, o corpo está preso no interior de poderes muito
apertados, que lhe impõem limitações, proibições ou obrigações” (FOUCAULT, 2004, p. 126),
Foucault já explicita que micropoderes perpassam todo o corpo social, acarretando em
transformações e modificações de condutas nos indivíduos. O corpo social, ao longo dos
séculos, se consolida como algo fabricado, influenciado por uma coação calculada,
esquadrinhado em cada função corpórea, com fins de automatização.

O homem é o principal alvo e objeto do poder, que tem como meta, a tarefa de incorporar
nos corpos características de docilidade. É dócil “um corpo que pode ser submetido, que pode
ser utilizado, que pode ser transformado e aperfeiçoado” (Ibid, p. 126). Suas formas de
modelagens são dadas através do adestramento, sendo utilizado como uma poderosa
ferramenta de controle, que age de forma disciplinadora, considerado como uma das “fórmulas
gerais de dominação” (Ibid, p. 126).

Assim “a disciplina, segundo a genealogia foucaultiana, diz respeito tanto a uma modalidade
de poder que se caracteriza por medir, corrigir, hierarquizar, quanto torna possível um saber
sobre o indivíduo” (PINHO, 1998, p. 189). Sob o olhar da disciplina existem técnicas que
norteiam todos os processos de modelagem.

As técnicas de controle disciplinar

Fórmulas pelas quais o poder se exemplifica:

 Escala. Tem como premissa o trabalho no detalhe, agindo sobre o corpo de


modo infinitesimal, exercendo “sobre ele uma coerção sem folga” (FOUCAULT,
2004, p. 126).
 Objeto. Onde “se faz mais sobre as forças do que sobre os sinais” (Ibid, p.
126).
 Modalidade. Controle do tempo, espaço e movimento: “coerção ininterrupta,
constante, que vela sobre os processos da atividade mais que sobre seu
resultado” (Ibid, p. 126).

A modelagem dos corpos atribui caracteres de docilidade, tornando o corpo útil e produtivo
ao aumentar sua submissão e obediência. Seria, portanto, uma política de coerções, uma
ideologia calculada no detalhe que tem como finalidade o controle e modelagem de atitudes,
gestos e comportamentos.

Ressaltando que este poder coercitivo se aplica na sociedade de diferentes modos, de


formas múltiplas, através “de origens diferentes, de localizações esparsas, que se recordam, se
repelem, ou se imitam, apóiam-se uns sobre os outros, distinguem-se segundo seu campo de
aplicação, entram em convergência e esboçam aos poucos a fachada de um método geral”
(Ibid, p.127).

A disciplina produz, para a modelagem e controle dos corpos, ferramentas que vão nortear
todo o processo de construção do poder e normatização das condutas, adotando caracteres
para sua aquisição: “constrói quadros; prescreve manobras; impõe exercícios; enfim, para
realizar a combinação das forças, organiza ‘táticas’” (Ibid, p. 150). Diante destes processos
progressivos é retirado cada momento do tempo dos indivíduos, perpassando uma escala
gradual e evolutiva em busca do aumento de suas potencialidades, criando assim “uma nova
maneira de gerir o tempo e torná-lo útil, por recorte segmentar, por seriação, por síntese e
totalização” (Ibid, p. 145).

A disciplina “visa não unicamente o aumento de suas habilidades, nem tampouco aprofundar
sua sujeição, mas a formação de uma relação que no mesmo mecanismo o torna tanto mais
obediente quanto é mais útil, e inversamente” (Ibid, p. 127). Portanto, ela fornece subsídios
para o aprimoramento das técnicas, aumentando em grandeza diretamente proporcional suas
utilidades, enraizadas em preceitos de docilidade. Seriam, portanto, para Foucault, “métodos
que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que realizam a sujeição constante
de suas forças e lhes impõem uma relação de docilidade-utilidade” (Ibid, p. 126).

A reprodução das disciplinas

A disciplina aflora nesta modelagem de condutas revelando-se de diversas formas:

1. Princípio da localização imediata ou quadriculamento

O poder disciplinar cria um espaço analítico para “vigiar o comportamento de cada um,
apreciá-lo, sancioná-lo, medir as qualidades ou os méritos” (Ibid, p. 131). Meio para se
conhecer, controlar, vigiar e também, de “articular essa distribuição sobre um aparelho de
produção que tem suas exigências próprias” (Ibid, p. 132), visando a manipulação dos
processos para se atingir o resultado eficaz.

Na busca do melhor rendimento e aumento de produtividade, o poder disciplinar parte para


o controle das atividades, disciplinando o tempo dos indivíduos: “trata-se de constituir um
tempo integralmente útil” (Ibid, p. 137). Criam-se gestos idênticos e repetitivos para aumentar
a precisão dos movimentos, aumenta-se a relação de afinidade entre os corpos e os objetos,
para a busca do ápice, até sua utilização exaustiva: “o máximo de rapidez encontra o máximo
de eficiência” (Ibid, p. 140). A rapidez é ensinada como uma virtude, uma qualidade tão
importante quanto à eficiência.

2. Elementos intercambiáveis com função de esquematizar uma doutrina

Frente a isso o poder disciplinar “individualiza os corpos por uma localização que não os
implanta, mas os distribui e os faz circular numa rede de relações” (Ibid, p. 133). Intenção de
criar um conjunto, com funções que se diferem, mas que se regem do mesmo modo
(homogêneo), e para um objetivo comum.

A grande ferramenta utilizada pelo poder disciplinar para dissipar sua dominação é o
exercício, que dentre algumas de suas características está a de servir “para economizar o
tempo da vida, para acumulá-lo de uma maneira útil, e para exercer o poder sobre os homens
por meio do tempo assim arrumado” (Ibid, p. 146).

A composição das forças surge com uma proposta de constituir um meio produtivo que vai
de certo modo “compor forças para obter um aparelho eficiente” (Ibid, p. 147). Surgindo a idéia
do homem como uma máquina multissegmentar, cuja finalidade é a ação conjunta para a busca
de um melhor rendimento.

Este, portanto, se tornou o “ponto chave” da manipulação das condutas (controle do tempo,
do espaço e das funções corpóreas), cuja função é a de moldar corpos para fins e objetivos de
transformação do homem em “máquina”, tendo como seu combustível o estímulo, para o ápice
e a plenitude de funções, buscando a todo custo a melhoria do desempenho. Tornando o
homem produtivo, o poder disciplinar o tem explorado para fins de dominação.

Conclusão

Na sociedade contemporânea, estamos submetidos a um tipo de poder disciplinar capaz de


gerir todo um grupo social, com interesses que norteiam todo um aparato de ideologias, que
vão moldar e normalizar condutas. O poder age “tomando os corpos dos indivíduos como alvos
e pontos de aplicação, investindo-os e produzindo-os conforme uma ordem moral, social,
política, produtiva e normativa capitalista-burquesa” (PRADO FILHO; TRISOTTO, 2008, p. 117).

Esta sociedade faz uso de “técnicas que são simplesmente denominadas ‘disciplina’. A
disciplina é uma anatomia política do ‘detalhe’, é dispositivo tático de poder, sustentado por
uma racionalidade econômica ou técnica. A disciplina torna-se arte e técnica de compor forças
para obter um aparelho eficiente” (WELLAUSEN, 2007, p. 9-10).

“Essas técnicas que permitem o controle detalhado das operações do corpo, que realizam a
sujeição permanente de suas forças e lhes impõe uma relação de docilidade-utilidade, são o
que Foucault chama de ‘disciplinas’. Estas visam à formação de uma relação que torna o corpo
humano tanto obediente quanto útil, constituindo uma política de coerções que trabalham
sobre o corpo, ‘uma manipulação calculada de seus elementos, de seus gestos, de seus
comportamentos’. Essa política passa a ter domínio sobre o corpo dos outros, para que operem
como se quer, através das técnicas. A disciplina, arte das técnicas para a transformação, tem
por alvo os indivíduos em sua singularidade. E o poder de individualização tem como
instrumento a vigilância permanente, classificatória, permitindo distribuir os indivíduos, julgá-
los, medi-los, localizá-los e, por conseguinte, utilizá-los ao máximo. Desta forma, ‘a disciplina
fabrica corpos submissos e exercitados, corpos ‘dóceis’” (NIEMEYER; KRUSE, 2008, p. 464).

A disciplina ao agir no detalhe, vai agir sobre os corpos nas mais importantes e também
atenuadas incumbências do dia a dia: do simples andar com uma vestimenta característica, ao
controle, especifico, em dietas alimentares. Atualmente, investem nos corpos como “uma
tecnologia política que desestabiliza fronteiras entre o familiar e o estranho nas práticas
corporais contemporâneas” (FRAGA, 2006, p. 63).

Foucault considera o poder capitalista como uma das formas aparentes da disciplina,
exercendo uma vigilância disciplinar sobre o proletário, com o pressuposto de mantê-los sempre
sobre seu domínio, tornando-os passivos e não rebeldes. Este “poder capitalista, possui uma
positividade no sentido de pretender gerir a vida dos indivíduos e das populações para utilizá-
los ao máximo, com um objetivo ao mesmo tempo econômico e político: torná-los úteis e
dóceis, trabalhadores e obedientes.” (MACHADO, 2004, p. 30).

Na proposta de gerir grupos o poder faz uso do controle para otimizar ganhos (resultados):
“máximo de rapidez e eficácia” (Ibid, p. 31), maior ganho em menor tempo.

No que tange a modelagem dos corpos, as técnicas da disciplina visa a criação de “não
apenas corpos padronizados, mas também subjetividades controladas” (MISKOLCI, 2006, p.
682). O controle dos corpos se tornou tão importante na atualidade que se constata através da
aparência física tudo “aquilo que cada um quer mostrar de sua subjetividade” (SANT'ANNA,
2004, p. 20).

A noção de beleza exterior se tornou tão importante que marca a atualidade como a
sociedade da aparência, dos rostos e corpos belos e esbeltos, tudo, graças aos mecanismos
exigidos e tidos como verdadeiros pelo poder disciplinar que fazem do uso de atributos, como
veículos de informação, para controlarem a sociedade.

Referências bibliográficas

 FOUCAULT, M. “Os corpos dóceis”. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 29ª


ed. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004a, p. 125-52.
 FOUCAULT, M. “Os recursos para o bom adestramento”. Vigiar e punir:
nascimento da prisão. 29ª ed. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis, RJ:
Vozes, 2004b, p. 153-72.
 FRAGA, A. B. “Anatomias emergentes e o bug muscular: pedagogias do corpo
no limiar do século XXI”. In: Carmen Lúcia Soares. (Org.). Corpo e História. 3
ed. Campinas: Autores Associados, 2006, v. , p. 61-77.
 MACHADO, R. “Duas filosofias das ciências do homem”. In: Calomeni, T. C. B.
(Org.). Michel Foucault: entre o murmúrio e a palavra. Campos, RJ: Editora
Faculdade de Direito de Campos, 2004, p. 15-37.
 NIEMEYER, F; KRUSE, M. H. L. “Constituindo sujeitos anoréxicos: discursos da
revista Capricho”. Texto contexto - enferm. , Florianópolis, v. 17, n. 3, set.
2008, p. 457-65.
 PINHO, L. C. “As tramas do discurso”. In: Castelo Branco, G.; Baêta Neves, L.
F.. (Org.). Michel Foucault: da arqueologia do saber à estética da
existência. Londrina/Rio de Janeiro: Nau, 1998, v., p. 183-192.
 PRADO FILHO, K. ; TRISOTTO, S. “O corpo problematizado de uma perspectiva
histórico-política”. Maringá: Psicologia em Estudo, v. 13, n. 1, 2008, p. 115-21.
 REVISTA EDUCAÇÃO – Especial Biblioteca do Professor 3: Foucault pensa a
Educação, São Paulo, 1º mar. 2007.
 SANT'ANNA, D. B. “É possível realizar uma história do corpo?”. In: SOARES,
Carmen. (Org.). Corpo e História. Campinas: Autores Associados, 2004, v.1. p.
3-23.
 WELLAUSEN, S. S. “Os dispositivos de poder e o corpo em Vigiar e punir”. In:
Rago, M.; Martins, A. L. (Orgs.). Revista Aulas. Dossiê Foucault. Campinas, SP,
n. 3, dez. 2006/mar. 2007, p. 1-23.

Todo o poder aos ladrões


Olavo de Carvalho
Digesto Econômico, maio/junho de 2009

No tempo dos militares, centenas de políticos passaram pela Comissão


Geral de Investigações (CGI) e tiveram suas carreiras encerradas com
desonra, por delitos de corrupção. Ao mesmo tempo, dos generais e
coronéis que ocuparam altos postos na República, nenhum saiu
milionário. O patrimônio que lhes sobrou é o que teriam adquirido
normalmente com seus soldos do Exército, da Marinha e da
Aeronáutica.

Com a Nova República, tudo mudou. Primeiro, o combate à corrupção


deixou de ser um empreendimento discreto, levado a cabo por
investigadores profissionais: tornou-se ocupação da mídia. Nos
momentos mais intensos das CPIs nos anos 90, deputados e senadores
confessavam que os jornais passavam por cima deles, investigando e
descobrindo tudo antes que Suas Excelências tivessem acabado de
tomar seu café da manhã. Tudo o que os parlamentares tinham a fazer
era dar cunho oficial às sentenças condenatórias lavradas nas redações
de jornais.

Segunda diferença: o partido que mais devotadamente se empenhou


em denunciar corruptos, destruindo as carreiras de todos aqueles que
pudessem se atravessar no seu caminho, e assim tornando viável, por
falta de adversários, a candidatura presidencial de uma nulidade que
de tanto sofrer derrotas já levava o título de “candidato eterno”, foi
também aquele que, ao chegar ao poder, construiu a máquina de
corrupção mais majestosa de todos os tempos, elevando o roubo a
sistema de governo e provando que só conhecia tão bem as vidas e
obras dos ladrões que denunciara por ser muito mais ladrão do que
eles.

Essa transformação foi acompanhada de outra ainda mais temível: o


crescimento endêmico do banditismo e da violência, que hoje atingem
a taxa hedionda de 50 mil brasileiros assassinados por ano.

Completando o quadro, a classe política mais canalha que já se viu


investiu-se da autoridade de educadora da pátria, impondo por toda a
parte suas crenças e valores e destruindo os últimos resíduos de
moralidade tradicional que pudessem subsistir na sociedade brasileira.

Definitivamente, há algo de errado no “combate à corrupção” tal como


empreendido desde o retorno da democracia. Hoje em dia, espetáculos
degradantes em que senhores de meia-idade, seminus, balançam suas
banhas na Parada Gay são tidos como o auge da moralidade, o símbolo
de direitos sacrossantos ante os quais a população, genuflexa, deve
baixar a cabeça e dizer “amém”. O suprassumo da criminalidade reside
em empresários que falharam em cumprir algum artigo de códigos
labirínticos propositadamente calculados para ser de cumprimento
impossível, criminalizando todo mundo de modo que os donos do
poder possam selecionar, da massa universal de culpados, aqueles que
politicamente lhes convém destruir, com a certeza de sempre encontrar
algum delito escondido.

Ao mesmo tempo, juízes bem adestrados no espírito militante invertem


a seu belprazer o sentido das leis, promovendo assassinos e
narcotraficantes ao estatuto de credores morais da sociedade, e
impõem como único princípio jurídico em vigor a “luta de classes”.
Nesse quadro, qualquer acusação de corrupção, vinda da mídia ou do
governo, é suspeita. Não que sempre os fatos alegados sejam falsos.
Mas, por trás do aparente zelo pela moralidade, esconde-se,
invariavelmente, alguma operação mais ilegal e sinistra do que os
medíocres delitos denunciados.

A noção de “corrupção” implica, por definição, a existência de um


quadro jurídico e moral estabelecido, de um consenso claro entre povo,
autoridades e mídia quanto ao que é certo e errado, lícito e ilícito,
decente e indecente. Esse consenso não existe mais. Quando uma elite
de intelectuais iluminados sobe ao poder imbuída de crenças nefastas
que aprenderam de mestres tarados e sadomasoquistas como Michel
Foucault, Alfred Kinsey e Louis Althusser, é claro que essa elite,
fingindo cortejar os valores morais da população, tratará, ao mesmo
tempo, de subvertê-los pouco a pouco de modo que, em breve tempo,
haverá dois sistemas jurídico-morais superpostos: aquele que a
população ingênua acredita ainda estar em vigor, e o novo,
revolucionário e perverso que vai sendo imposto desde cima com
astúcia maquiavélica e sob pretextos enganosos.

Nesse quadro, continuar falando em “corrupção”, dando à palavra o


mesmo sentido que tinha nos tempos da CGI, é colaborar com o crime
organizado em que se transformou o governo da República.

Isso não aconteceria se, junto com a inversão geral dos critérios, não
viesse também um sistemático embotamento moral da população,
manipulada por uma geração inteira de jornalistas que aprenderam na
faculdade a “transformar o mundo” em vez de ater-se ao seu modesto
dever de noticiar os fatos. Quando um país se confia às mãos de uma
elite revolucionária, sem saber que é revolucionária e imaginando que
ela vai simplesmente governá-lo em vez de subvertê-lo de alto a baixo,
a subversão torna-se o novo nome da ordem, e a linguagem dupla
torna-se institucionalizada. Já não se pode combater a corrupção,
porque ela se tornou a alma do sistema, consagrando a inversão de
tudo como norma fundamental do edifício jurídico, ocultando e
protegendo os maiores crimes enquanto se empenha, para camuflá-los,
na busca obsessiva de bodes expiatórios. Sempre que o governo se
sente ameaçado por denúncias escabrosas ou por uma queda nas
pesquisas de opinião, logo aparece algum empresário que não pagou
imposto, algum fazendeiro que reagiu a invasores, algum padre que
expulsou um traveco do altar – e estes são apontados à população
como exemplos máximos do crime e da maldade. Enquanto isso, o
Estado protege terroristas e narcotraficantes, acoberta as atividades
sinistras do Foro de São Paulo e lentamente, obstinadamente, sem
descanso, vai impondo à população o respeito devoto a tudo o que não
presta.

O mais abjeto de tudo, no entanto, é a presteza com que as próprias


classes mais vitimizadas nesse processo – os empresários, as Forças
Armadas, os proprietários rurais, as igrejas cristãs – se acomodam
servilmente à nova situação, inventando os pretextos mais delirantes
para fingir que acreditam nas boas intenções de seus perseguidores.
Quando se torna institucional, a corrupção é ainda algo mais do que
isso: é um veneno que se espalha pelas almas e as induz à cumplicidade
passiva ou à adesão subserviente.

AS VERDADEIRAS RAÍZES DA CORRUPÇÃO


NO BRASIL

Imagem: Mapa Histórico das Capitanias Hereditárias


Autor: Sandro Ari Andrade de Miranda, advogado, mestre em ciências sociais.

I – INTRODUÇÃO

Existem várias formas de manter o poder, mas o mecanismo mais comum é a apropriação dos
modos de produção de ideias, pensamentos, vivências, identidades. É a obstrução dos
mecanismos pelos quais interpretamos o mundo e construímos a nossa história.

Limitar os campos de interpretação, transformando a vida num universo sem crítica, sem
diferença e, principalmente, sem história, é uma estratégia de domínio imposta por aqueles que
não pretendem ver transformações de status.

Vários são os autores da sociologia que tentam desafiar esses processos, desde Marx e
Weber, passando por Gramsci, Foucault, Bourdieu e Habermas. O certo é que o conflito entre
estruturas e a vida efetivamente vivenciada estão no centro da obra destes autores, razão pela
qual sempre buscamos refúgio no conhecimento por eles produzido para interpretar fatos e
condições que envolvem o poder concentrado.

Para Marx, a principal forma poder está na dominação dos modos de produção e reprodução,
motivo pelo qual dá especial atenção à atividade primária da sobrevivência que é a produção
dos meios de vida, num processo que é contínuo, essencialmente histórico, e que não pode ser
analisado no estreito espaço do tempo presente.

Weber, por sua vez, busca aprofundar a análise das formas de dominação, e vai buscá-las no
carisma, na ação tradicional, e na ação racional-legal. Mas o próprio mestre alemão destaca
que estes são tipos ideais. Logo, é possível a existência de outras formas simples ou
combinadas de dominação.

A dominação pelo carisma é comum nas relações políticas, a tradicional, nas relações
religiosas, de assenhoramento e familiares. Já a dominação racional-legal, é aquela derivada
dos mecanismos racionais de poder, incluindo-se, aí, a ciência e o direito.

Já Gramsci segue a tradição marxista, mas se aprofunda na teoria de estado e nos


mecanismos de construção da ideologia. Demonstra que na sociedade moderna o poder de
Estado é limitado pelas organizações da sociedade. Vê na sociedade civil uma força poderosa,
capaz de construir formas de interpretação do mundo através da ideologia. Estado = política +
sociedade civil, uma síntese combinada de consentimento e repressão.

Para Foucault, na sua microfísica, o poder não existe. O que existe são relações de poder. Ele
observa o exercício das relações poder além da verticalidade das estruturas, mas assentadas
no tempo, na vida e no próprio corpo, através da disciplina, criando corpos submissos,
exercitados e dóceis para quem exerce o poder.

Pierre Bourdieu demonstra a existência de estruturas nas nossas próprias formas de sentir,
pensar e agir. O habitus é uma espécie de roupagem incorporada pelos indivíduos, e que é
utilizada nos momentos em que estes se relacionam com o mundo. É uma disposição prática,
automática, costumeira. É uma espécie de lei social incorporada.
Jurgen Habermas, por fim, é herdeiro da Escola de Frankfurt, e retoma importantes elementos
da discussão weberiana sobre racionalidade. Demonstra a existência de uma estrutura
intermediária que faz a mediação entre o estado e o espaço privado do mundo da vida, a
chamada “esfera pública”. A esfera pública surge com a invenção da tipografia e da imprensa,
criando um espaço de diálogo e de construção de consensos.

O aumento na forma de produção de informações transforma a sociedade e cria a necessidade


de maior transparência. Isso não quer dizer que os diálogos estabelecidos na esfera pública
sejam totalmente isentos, razão pela qual existem divergências entre as informações
apresentadas na esfera pública e o mundo efetivamente vivenciado, o mundo da vida.

É por este motivo que Habermas propõe a ação comunicativa em oposição à ação racional
instrumental, na medida em que é possível a construção de diversas formas de tradução do
mundo da vida, através de uma espécie de razão comunicativa, que vai além da concepção
padronizada e única defendida pelo pensamento positivista. O próprio direito sai do “mundo do
dever ser, positivista” e passa a ser concretizado apenas no mundo vivido (mundo do ser).

Este breve extrato de teorias sociológicas demonstra o quão complexas são as relações de
poder e a forma como estas se manifestam. O poder não necessariamente ocupa os espaços
formais e, muitas vezes, está assentado em locais distantes do controle social, onde predomina
a ausência de transparência.

A leitura estática dos fatos, sem elementos de consubstanciação, é prejudicial para qualquer
interpretação séria da realidade e prejudica a nossa visão crítica. E aqui eu me afasto dos
excessos de relativização da realidade, comuns a algumas teorias pós-modernistas, na medida
em que levam a perspectivas excessivamente individualistas do mundo, abdicando da essência
coletiva da organização da sociedade.

Portanto, quando buscamos analisar a preocupação dos meios de comunicação com


determinados assuntos, é necessário observar até que ponto tais órgãos tem uma real
preocupação com a verdade, com a verdadeira informação, ou buscam, simplesmente,
manipular informações com objetivos próprios.

Por que um canal de televisão tenta colocar a culpa da falta d’água em São Paulo na
derrubada de árvores na Amazônia, quando toda a bacia hídrica do Estado Bandeirante nasce
no próprio sudeste? Ou por que determinados grupos de comunicação colocam a corrupção
financeira como pauta de agenda, restringindo o número de réus entregues ao julgamento
dirigido da chamada “opinião pública”, ou eliminando dados factuais e históricos que
comprometeriam a vida dos próprios grupos?

As ciências sociais já nos proporcionam ferramentas suficientes para confrontar as técnicas


adotadas pelos meios de comunicação para formar ideias e concepções de mundo, que vão
desde o materialismo histórico até a análise de símbolos e imagens pelo estruturalismo e pela
semiótica.

Neste ensaio apresentamos pelo menos cinco pontos que devem ser analisados por quem
realmente pretende enfrentar a corrupção e que, curiosamente, não são vistos nas colunas e
boletins das principais empresas de comunicação brasileiras.

Evidentemente, o estudo deve ser focado exclusivamente nos elementos materiais, evitando-se
o generalismo e a rotulagem de pessoas, o que sempre promove distorções e injustiças, posto
que não pretendemos, com o nosso trabalho, apresentar os mesmos resultados da mídia
oligopolista. Ao contrário, o que se pretende demonstrar aqui é que os fatos devem sempre ser
analisados de forma contextualizada, e com fundamentação histórica e crítica.
II – O ESTAMENTO BUROCRÁTICO

A tradição patrimonialista na formação do estado brasileiro é representada nas obras de vários


autores, como Victor Nunes Leal no seu “Coronelismo, Enxada e Voto”, Sérgio Buarque de
Holanda com “Raízes do Brasil”, Caio do Prado Júnior, em diversos livros, e Raymundo Faoro,
no seu notável “Os Donos do Poder”.

Pois é exatamente nesta última obra que Faoro apresenta o conceito de “estamento
burocrático”. Trata-se de uma ideia com forte inspiração weberiana, que serve para traduzir as
relações patrimonialistas de mando e compadrio que ainda se manifestam em diversos setores
da sociedade brasileira.

Conforme Faoro,

“o estamento burocrático desenvolve padrões típicos de conduta ante a mudança interna e no


ajustamento à ordem internacional. Gravitando em órbita própria não atrai, para fundir-se, o
elemento de baixo, vindo de todas as classes. Em lugar de integrar, comanda; não conduz,
mas governa. Incorpora as gerações necessárias ao seu serviço, valorizando pedagógica e
autoritariamente as reservas para seus quadros, cooptando-os, com a marca de seu cunho
tradicional. O brasileiro que se distingue há de ter prestado sua colaboração ao aparelhamento
estatal, não na empresa particular, no êxito dos negócios, nas contribuições à cultura, mas
numa ética confuciana do bom servidor, com carreira administrativa e curriculum
vitae aprovado de cima para baixo”.

O “estamento burocrático” utiliza-se do poder do estado para impor sua vontade à conduta
alheia, ora por meio da violência (ditadura militar), ora através das relações de mando senhorial
(república velha), ora das relações de compadrio (nepotismo), ou, ainda, simplesmente por
meio da corrupção.

A origem do poder estamental de determinados setores da burocracia do estado está


assentada no processo de colonização imposto ao nosso território, que deixou uma pesada
herança na organização estatal, incluindo a concessão de privilégios e vantagens a
determinados grupos. A propriedade, por exemplo, foi uma concessão do Governo Português
aos Donatários da Coroa, garantindo, assim, uma predominância das relações de interesse
entre os representantes do poder concedente e seus beneficiários, dentro da lógica daquilo que
Weber chamou de dominação tradicional.

Os traços do patrimonialismo foram mantidos durante todo o período colonial e transpostos


para a organização da República Velha. Da venda de títulos de nobreza, à grilagem de terras
realizada com a anuência da ditadura militar, a organização administrativa do estado foi
fragilizada por um regime de troca de favores, que somente foi encontrar limites em 1988 com
a determinação de acesso exclusivo as carreiras públicas por meio de concurso, conforme
disciplina imposta pela Constituição de 05 de outubro do referido ano.

Todavia, até mesmo a ação moralizadora da nova Carta Constitucional de 1988 encontrou uma
barreira numa medida típica do modelo patrimonialista adotada por alguns constituintes, que foi
a incorporação, com estabilidade, de milhares de empregados públicos que ingressaram na
administração, em todos os níveis, sem concurso público.

Foi a última dilapidação que o movimento chamado “Centrão” provocou na Carta de 1988, e
até hoje, de certa forma, o custo é pago por todos. A base desse era composta por vários
constituintes herdeiros da ditadura militar e alguns outros representantes da tradição
conservadora.
Na prática, apenas quem ingressou na máquina pública depois de 1988 e, especialmente,
depois do Regime Jurídico Único dos servidores (Lei 8.112/1990), teve como exigência o
concurso público. Ainda hoje milhares dos trabalhadores que ingressaram na administração
sem concurso, e sem nenhuma estratégia de profissionalização, e que receberam estabilidade
na carreira por meio de uma manobra tipicamente golpista de alguns constituintes, ocupam
cargos no serviço público em todas as esferas, inclusive com poder de mando.

Assim, não causa estranheza que um dos assuntos de pauta das eleições presidenciais de
2014 tenha sido a construção de um aeroporto nos terrenos que pertenciam ao tio do ex-
candidato e atual Senador pelo PSDB/MG Aécio Neves. Trata-se de uma típica relação de
poder patrimonialista, assentada em laços tradicionais de compadrio.

Também não é estranho que o pivô do escândalo de corrupção na Petrobrás, Paulo Roberto
Costa, seja um funcionário que entrou na estatal em 1978, ou seja, sem concurso público, e
que desde 1995 (início do Governo de Fernando Henrique Cardoso) ocupe cargos de direção
na referida empresa, chegando a dirigir a GASPETRO de 1997 a 2000.

A rigor, o esquema de corrupção do qual Paulo Roberto Costa (vinculado ao Partido


Progressista – PP), existe desde 1997, bem na época dos escândalos de privatização do
Governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Mas dado o nome dos envolvidos, é bem
provável que este seja um problema mais antigo.

Outro pivô do escândalo, Nestor Cerveró, é funcionário da Petrobrás desde 1975, e figura
frente nos cargos de direção da empresa na época do governo de FHC. Já Pedro Barusco,
afirma ter acumulado mais de US$ 100 milhões de reais em propina desde 1996, ou seja,
durante o governo do PSDB.

Já Alberto Yousseff, doleiro ligado a Paulo Roberto Costa, também apareceu em escândalos
da década de noventa no estado do Paraná, notadamente no caso do BANESTADO.

Ou seja, há inequívoco predomínio de um grupo de pessoas que exerce poder e defende os


seus interesses na máquina do estado há muito tempo, ocupando espaços estratégicos na
administração pública, vários dos quais incorporados aos quadros administrativos do estado
pelo movimento do “Centrão” e outros grupos conservadores na Constituinte, e que permitiu a
estabilidade para servidores que ingressaram na administração sem concurso público no
período pré-Constituição/88. Tais vantagens também beneficiaram empregados públicos de
empresas estatais e que hoje são citados em esquemas de corrupção, como Nestor Cerveró e
Paulo Roberto Costa. Trata-se, de fato, do chamado “estamento burocrático”.

A criação do concurso público para acesso aos cargos públicos, imposta pela nova Ordem
Constitucional, permitiu uma democratização do ingresso nestes postos, que passaram a ser
ocupados por pessoas de todos os extratos sociais.

Até então, os cargos na administração pública, pelo menos os de maior envergadura, eram
considerados como postos destinados aos filhos da elite social e econômica, especialmente os
cargos de altos dirigentes do governo, da diplomacia, da advocacia e dos comandos militares.
Assim, este tipo de organização estatal está muito longe da lógica racional-legal weberiana,
mas dentro daquilo que o mestre alemão chama de dominação tradicional.

Em qualquer análise política mais séria, e sem nenhuma ingenuidade, é impossível não
considerar o poder e a influência destes servidores do alto escalão governamental. Todos
possuem grande espaço de decisão ocupado ao longo da sua atuação na máquina
administrativa, espaços estes que permitem um contato permanente com várias empresas.
Estes espaços historicamente foram dotados de pouca transparência, de mecanismos de
controle social, participação ou governança, liberdade permitiu aos agentes responsáveis pelas
negociações e gestão de contratos com valores muito elevados a possibilidade de comprar
apoios, negociar favores, vender vantagens, dentre outras premissas que, curiosamente, são
simplesmente omitidos pelos grandes meios de comunicação.

Desta forma, não há como se falar em corrupção, no Brasil, sem considerar o papel deste
influente extrato de servidores e empregados públicos, e que exercem o papel de um
verdadeiro “estamento burocrático” dentro da administração.

III – A ESCOLA DA MAGISTRATURA

Durante as décadas de 80 e 90 do século passado o movimento estudantil universitário criou


uma série de projetos de cursos populares preparatórios para o vestibular, gratuitos, e
destinados a garantir o acesso de estudantes sem condições financeiras ao ensino superior.

Embora a grande maioria dos estudantes que ministravam os cursos também tenha origem em
grupos menos privilegiados economicamente, as aulas eram atividades de militância e não
remuneradas, e os resultados obtidos permitiram o ingresso de milhares de estudantes das
camadas mais pobres nas universidades públicas.

Trata-se de uma iniciativa importante de um movimento social visando promover a inclusão


social e o combate aos privilégios de grupos dominantes. A universalização do acesso ao
ensino público e laico, bem como aos cargos públicos, é uma condição essencial para a
existência da Democracia, e deveria ser sempre um objetivo do Estado.

Ocorre que esta não foi uma iniciativa seguida por todas as categorias sociais, e muitos setores
da sociedade ainda se utilizam dos espaços privilegiados ocupados para manter determinados
postos no serviço público como núcleos destinados aos filhos da elite econômica e social.

Esta última postura comunga com a tipologia do “estamento burocrático” e com a perpetuação
do patrimonialismo. Distante da realidade da maioria dos brasileiros, está a grande maioria das
Escolas da Magistratura, instrumento que poderia contribuir para garantir o acesso aos cargos
de juízes e que, na prática, funcionam como mecanismo destinado à manutenção de
privilégios.

Se no início, a primeira destas escolas contava com o serviço não remunerado de quadros da
judicatura, hoje todos os juízes-professores são remunerados pelas diversas escolas do gênero
implantadas em todo o país.

Uma das consequências é o elevado valor dos cursos ofertados por estas instituições de
“excelência”, cujo custo ultrapassa a faixa de 12 salários mínimos em média, o que torna os
mesmos proibitivos para a maior parte da população. Pior do que isto: apesar de mantidos por
associações de juízes, os cursos contam pontos nas provas de títulos para os concursos da
magistratura, conforme Resolução nº 75, de 12 de maio de 2009 do Conselho Nacional de
Justiça.

Trata-se de privilégio incomum, e exclusivo das associações representativas de servidores que


compõem a estrutura de um dos Poderes da República. As associações dos magistrados são,
na verdade, o equivalente aos sindicatos de outras categorias, pois representam os interesses
dos referidos profissionais frente ao estado.
Nenhuma outra entidade representativa de categoria profissional ou de servidores públicos
possui um poder tão grande para influenciar nos resultados dos concursos públicos como a dos
magistrados. Senão vejamos: a) as associações de magistrados participam da definição dos
critérios de seleção dos concursos; b) os cursos de formação mantidos pelas associações de
magistrados contam pontos para os títulos dos referidos concursos; c) os magistrados,
notadamente os desembargadores, são responsáveis por firmar as interpretações
jurisprudenciais, numa rara capacidade de estabelecer e ministrar o conteúdo do objeto dos
concursos; e d) muitas das escolas de magistratura funcionam e se utilizam das estruturas
físicas dos próprios Tribunais.

Embora não seja possível afirmar que há intencionalidade na fixação destas vantagens como
mecanismo para diminuir o acesso de determinados grupos sociais ao Poder Judiciário, é
inegável a existência de privilégios em favor das associações de magistrados e daqueles que
ingressam nos cursos mantidos por essas instituições.

Mesmo entendendo que boa parte dos juízes e professores das Escolas atua com sincera
intenção de aperfeiçoar o conhecimento jurídico e de forma honesta, a manutenção dos
privilégios das associações de magistrados não pode ser aceita de forma acrítica, sob o risco
de convalidar a perpetuação de uma situação tipicamente patrimonialista e com duvidosa
constitucionalidade.

IV – O PODER ECONÔMICO E OS PROCESSOS ELEITORAIS

Outra herança inequívoca do patrimonialismo no Brasil é o financiamento privado das


campanhas eleitoras. Uma leitura simples e rápida dos principais escândalos de corrupção do
país, identificaremos sempre a presença de dois fatores: a) o financiamento realizado por
empresas; e b) a participação de servidores e empregados públicos que ocupam cargos de alto
escalão, o chamado “estamento burocrático”, na articulação dos financiamentos.

O tema do financiamento de campanhas eleitorais por empresas é objeto da Ação Direta de


Inconstitucionalidade nº 4650 que tramita no Supremo Tribunal Federal movimentada pelo
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), onde são questionados
dispositivos da atual legislação que disciplina o financiamento de partidos políticos e
campanhas eleitorais por essas empresas (Leis 9.096/1995 e 9.504/1997).

O processo já conta com o voto de seis Ministros favoráveis ao pedido que consideram
inconstitucional o financiamento de campanhas eleitorais por empresas, mas o processo está
suspenso em virtude de pedido de vista feito pelo ministro Gilmar Ferreira Mendes, o que
prejudica a efetiva transformação do financiamento dos processos eleitorais.

Na prática, o financiamento privado de eleições por empresas acaba resultando no domínio do


poder econômico sobre a definição da agenda política. Tal situação, somada às eleições com
listas abertas, resulta em campanhas eleitorais caras e com o predomínio de uma visão
personalista e patrimonialista da coisa pública.

O mandato de um parlamentar, por exemplo, acaba sendo visto como um patrimônio pessoal
do candidato eleito, e não como o resultado de uma luta política de uma coletividade, o que
resulta da colocação de temas de interesse social ou coletivo, como a proteção do meio
ambiente e a defesa dos direitos humanos, dentre outros, em segundo plano.

O financiamento privado de campanhas eleitorais desequilibra a defesa de ideias, coloca o


interesse do capital em primeiro plano em relação à cidadania, e acaba facilitando o exercício
da corrupção.
Uma votação favorável ao pedido da ADI nº 4650 no STF, declarando a inconstitucionalidade
do financiamento empresarial em campanhas eleitorais seria um duro golpe ao abuso do poder
econômico em eleições. É exatamente por isso que é necessário um acompanhamento mais
cuidadoso da população na relação entre a demora no voto do Ministro Gilmar Mendes, e a
tramitação da PEC da “Contra-Reforma Política”. Tal Proposta de Emenda Constitucional é
conduzida pelo atual Presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e conta com o apoio
de partidos de direita, como o DEM e o PSDB, e está sendo acelerada no Congresso Nacional.
Apenas o PT e o PSOL se posicionaram claramente contra o golpismo e caráter patrimonialista
da proposta.

A PEC 352, conhecida como “PEC da Contra-Reforma Política” ou “PEC do Capital”, sustenta
o patrimonialismo do financiamento privado de campanhas e a criação do voto distrital que
enfraquece os partidos e favorece a visão personalista dos mandatos parlamentares. Ou seja,
é uma forma de mudar não mudando, mantendo a influência do poder econômico nas eleições.

V – A ORGIA DAS PRIVATIZAÇÕES

De acordo com a Revista Carta Maior, estudos indicam que 1996 à 2002, no auge das
privatizações do Governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), cerca de US$ 126 bilhões
foram desviados para o exterior pelo esquema do Banco do Estado do Paraná – BANESTADO.
Destes, apenas US$ 2,2 milhões foram repatriados pela Advocacia Geral da União.

Os números do BANESTADO são uma parcela ínfima de todas as denúncias de corrupção que
circularam no Brasil na década de noventa durante a orgia privatista de FHC e Cia.. Com
certeza, nessa época tivemos o ápice da corrupção do país, com a omissão, velada dos órgãos
de controle, e explícita dos meios de comunicação. Muitos dos problemas ainda hoje
enfrentados são frutos de esquemas criados naquela época, inclusive com os mesmos
protagonistas.

O caso dos ataques à Petrobrás é o exemplo mais gritante de todos, na medida em que
falamos de uma organização criminosa que admite atuar no submundo da administração
pública, pelo menos, desde 1997, com fortes indícios de atuação anterior, e com maiores
ramificações.

Já o caso da Ação Penal nº 470, conhecido popularmente como “mensalão”, é mera


continuidade de esquema criado em Minas Gerais, também no governo tucano. Para evitar a
cassação do mandato, e a continuidade do processo no rito sumaríssimo do Supremo Tribunal
Federal, o ex-Governador de Minas Gerais Eduardo Azeredo (PSDB) renunciou ao cargo que
ocupava no Senado.

Alberto Yousseff, transformado em herói pela mídia oligopolista, também era figura presente no
escandaloso caso do BANESTADO. Mas as investigações sobre os esquemas no Banco
Paranaense foram abafadas pelos mesmos grupos de comunicação que hoje cobram
investigações, o que, por si só, é prova flagrante de suspeição das referidas empresas. Aliás, é
a mesma mídia que hoje fecha os olhos para o escândalo do HSBC, banco beneficiado pelo
financiamento do PROER, durante o Governo de FHC, quando adquiriu a parte do capital do
extinto Bamerindus.

Segundo estudos realizados por pesquisadores da CEPAL, cerca de 12,3% do PIB na época,
ou R$ 111,3 bilhões, foram utilizados para cobrir gastos com o PROER, o que incluiu, em
menor monta, a recapitalização do Banco do Brasil, da Caixa Econômica Federal, e de alguns
bancos estaduais em virtudes das cíclicas crises cambiais do Plano Real.
Deve ser destacado que o PROER não foi a primeira operação de salvamento financeiro de
Bancos realizadas no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Antes disso, tivemos o
escândalo envolvendo os Bancos Marka e Fonte-Cindam, que receberam cerca de R$ 1,6
bilhão do Banco Central durante a desvalorização do real. O caso resultou até na prisão do ex-
presidente do Banco Central, Chico Lopes, e do famoso banqueiro de cidadania italiana,
Salvatore Cacciola.

Outro exemplo problemático é o da privatização do sistema de telecomunicações. Além dos


questionamentos sobre os valores e sobre os procedimentos, temos o caso da divulgação de
gravações de conversas telefônicas entre o ex-ministro das Comunicações, Luis Carlos
Mendonça de Barros (PSDB), e presidente do BNDES no governo de FHC, André Lara
Resende, onde ambos articulam o apoio a Previ, fundo previdenciário dos funcionários do
Banco do Brasil, para beneficiar o consórcio do banco Opportunity, vinculado ao tucano Pérsio
Arida. A negociata envolvia o módico valor de R$ 24 bilhões de reais.

Mas o caso mais gritante de todos, e inquestionavelmente o mais representativo da orgia das
privatizações envolve a maior empresa mineradora da América Latina, e uma das maiores do
mundo (a segunda mais lucrativa em escala global), a Companhia Vale do Rio Doce.

Em leilão realizado em 1997, 33% das ações de uma empresa avaliada em R$ 90 bilhões de
reais foram arrematados pelo Consórcio Brasil por apenas R$ 3,3 bilhões de reais, o que
permitiu ao mesmo assumir o controle acionário da empresa estatal. O consórcio vencedor era
formado pela privatizada Companhia Siderúrgica Nacional, pela Bradespar/Bradesco, e pelo
fundo de investimentos do funcionários do Banco do Brasil, o Previ.

Além da onipresença do Previ, envolvida em diversos processos de corrupção, parte dos


recursos utilizados na compra da Vale do Rio Doce foram obtidos por meio de empréstimo
junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), resultando em
indícios de direcionamento do certame.

Resta destacar que, além das negociações de bastidores e da utilização contínua de dinheiro
público nas privatizações, as duas principais justificativas adotadas pelo tucanato para realizar
tais ações não se justificaram.

Primeiro, a dívida pública, que deveria sofrer abatimento com a utilização dos créditos das
vendas, não reduzir, ao contrário, mais do que triplicou nos oito anos de governo tucano, fruto
de uma política fiscal e financeira truculenta e confusa.

Segundo, conforme destaca Aloísio Biondi na ótima obra “O Brasil Privatizado”, o país
arrecadou cerca de R$ 85,2 bilhões de reais com as privatizações, mas perdeu mais de R$
87,6 bilhões de reais com a receita das empresas vendidas que não ingressaram nos cofres
públicos, especialmente da Vale. Assim, o resultado da orgia privatista foi um saldo líquido
negativa de R$ 2,4 bilhões de reais, que foram transferidos do patrimônio público para o capital
financeiro.

VI – O PODER DA MÍDIA OLIGOPOLISTA

A Constituição Federal garante imunidade tributária para livros, jornais, revistas e para o papel
onde estes materiais são impressos. Em tese, o objetivo desta medida é permitir uma
democratização do acesso à informação, à produção científica e à cultura.
Ocorre que o sonho da democratização da informação pela produção de informações por uma
“imprensa livre”, não se consolidou. Nem jornais, nem revistas e, muito menos livros, com raras
exceções, possuem preços acessíveis à maioria da população. Uma das poucas exceções são
as publicações de baixa qualidade destinadas às massas, em tabloides como “Notícias
Populares” e “Diário Gaúcho”, ambas publicações com desenho editorial baseado em notícias
sobre fofocas de televisão, esporte e violência, baseados no marketing de comércio do vazio
informativo e da ideologia dos grupos proprietários dos jornais.

A simples publicação de um Edital ou de aviso de interesse público num jornal de grande


circulação em São Paulo ou Rio de Janeiro chega a custar a bagatela de R$ 10 mil reais,
tornando esses espaços inacessíveis para as organizações da sociedade civil. Por outro lado,
todos os jornais e revistas reservam grande parte do seu espaço para a publicidade. Em
algumas “revistas” temos a impressão de que existe mais espaço publicitário do que material
de comunicação.

Se a situação é grave na mídia impressa, muito pior é o resultado observado no rádio e,


especialmente, na televisão. Curiosamente, ambas as formas de comunicação são derivadas
de concessões públicas.

Os grandes grupos de comunicação também são detentores de excelentes espaços para a


publicidade e, como consequência, são um grande negócio. Em regra, articulam mídia
impressa, radiofônica, televisiva e, mais recentemente, eletrônica, o que permite um domínio
das informações e das rendas publicitárias, inclusive de fontes públicas de patrocínio.

E aqui começa um grande problema. Se rádio e televisão são concessões, ou seja, serviços
públicos, por que não existe nenhum mecanismo de controle público ou social sobre o
financiamento destas empresas? Mais do que isto, qual é o motivo de tamanha resistência das
principais redes de comunicação contra a presença de qualquer tipo de controle sobre as suas
fontes de financiamento?

Talvez a resposta possa ser observada na guerra instaurada pelas Organizações Globo em
relação ao direito de transmissão dos jogos do campeonato de brasileiro, da Copa do Mundo e
das Olimpíadas. Apenas em 2012, a Globo pagou para os 12 maiores clubes do futebol
brasileiro mais de R$ 939 milhões de reais como direitos de transmissão. Este dado foi obtido
com base na publicação dos balanços financeiros dos clubes, pois os contratos firmados pela
Rede Globo com os clubes de futebol gozam de questionável cláusula de confidencialidade.

Ao todo, estima-se que a empresa de comunicação tenha efetuado o pagamento aos clubes da
primeira divisão do campeonato brasileiro em 2012 mais de R$ 1,326 bilhão de reais apenas
em direitos de transmissão do campeonato brasileiro. Não constam neste inventário as
despesas com o custeio da programação e, muito menos, o lucro obtido pela Rede Globo com
um dos principais atrativos da sua grande de comunicação.

Estes dados demonstram que as empresas de comunicação são grandes negócios, e para
exercer as suas atividades se utilizam de concessões públicas sem nenhuma, ou praticamente
nenhuma, retribuição à população.

Diferentemente do que ocorre nas concessões de transporte, energia elétrica, água, telefonia,
dentre outras, não existe transparência nas planilhas de serviços, muito menos espaço para
que cada cidadão ou cidadã, verdadeiros detentores dos direitos das concessões, possa saber
o resultado obtido pelas empresas. Não se verifica o pagamento de outorga, ou ainda o
cumprimento de cláusulas de oferta mínima de conteúdo de produção nacional.

A falta de transparência domina o mercado da comunicação, uma verdadeira “Caixa de


Pandora”, permite vários tipos de vantagens, inclusive a possibilidade de compra de matérias e
de notícias. Nunca poderemos esquecer dos mecanismos utilizados por Assis Chateaubriand,
o “Chatô”, para condicionar os fabricantes de fósforos a patrocinar os seus jornais, através de
uma verdadeira chantagem jornalística por meio de matérias que afirmavam o perigo que
representava a utilização do produto fabricado por estas empresas, matérias que, por sinal,
sumiram dos jornais quando do fechamento dos acordos de publicidade.

Por fim, não podemos esquecer que a mídia representa muito mais do que dinheiro sem
transparência no uso e nas fontes de financiamento, mas grande poder de influência. Vários
dos ocupantes de assentos no Parlamento ou são donos, filhos, ou parentes de donos de
redes de televisão, como Aécio Neves (PSDB), por exemplo, ou funcionários das empresas de
comunicação.

No Rio Grande do Sul, dois dos três Senadores, Ana Amélia Lemos (PP) e Lasier Martins
(PDT), são funcionários da Rede Brasil Sul – RBS, uma das afiliadas da Rede Globo, e o maior
grupo de comunicação do sul do país.

Portanto, é necessário criar mecanismos para diminuir o poder que os meios de comunicação
exercem sobre a população, e o primeiro passo poderia ser dado com a regulação e
transparência do financiamento da mídia.

O segundo, já pensando adiante, poderia se basear na restrição da publicidade pública às


grandes redes, criando-se mecanismos como a divulgação de matérias de utilidade pública nos
referidos meios.

Garantir a transparência do financiamento das redes de comunicação é, sim, um instrumento


fundamental para enfrentar a corrupção econômica e política.

VII – CONSIDERAÇÕES FINAIS

A verdadeira origem da corrupção no Brasil, como vemos, está muito longe do conteúdo dos
noticiários de televisão. Ela se encontra entranhada em processos que são apresentados como
normais, na garantia de privilégios estamentais, na influência do poder econômico nos
processos eleitorais, no monopólio das informações, e na ausência de transparência e de
mecanismos de controle social em determinados setores.

Se nenhum destes problemas for realmente enfrentado pela sociedade, não haverá verdadeiro
combate à corrupção, mas simples demagogia ou golpismo, especialmente a atual prática da
mídia oligopolista brasileira.
O Macro e os Micro poderes: Uma análise da obra de
Maquiavel e Foucault

OBJETIVO GERAL

Compreender as concepções de poder a partir das obras de Maquiavel e Foucault.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

1- Analisar a obra “ O príncipe “de Nicolau Maquiavel tendo em foco sua compreensão de poder
centralizado;

2- Analisar a obra “ A microfísica do Poder” de Michel Foucault tendo em vista sua compreensão
de poder descentralizado;

3- Discorrer sobre o exercício do poder pelos “marginalizados”

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Quem nunca ouviu a expressão " Fulano é Maquiavélico "? Pois é, até mesmo aqueles
que nunca leram uma obra do autor florentino Nicolau Maquiavel já se depararam falando
essa expressão, que implica em algo maligno, diabólico e totalmente anticristão. Mas o que
nos levou a esse senso comum sobre o pensamento daquele que é considerado o pai da
política moderna? Alguns se põe ao lado do escritor italiano, defendendo-o e argumentando
que ele fora muito mal compreendido por seus comentaristas. Por exemplo Rousseau, que
disse em " o contrato social" que o Florentino mesmo se dirigindo aos governantes ,ensinava
ao povo grandes lições de liberdade. Outros pelo contrário, sustentam que suas idéias
acabaram se tornando a inspiração para as maiores ditaduras do mundo moderno, feitas por
homens tiranos e sem escrúpulos, que viram em sua principal obra " O príncipe" ,o alicerce
intelectual para o exercício do poder sobre as massas, com a desculpa de que a ordem no
Estado só se efetivaria com a força de um "Homem proeminente". Portanto, vemos a
capacidade desta obra de gerar nos indivíduos que a lêem os mais contraditórios sentimentos,
do amor ao ódio, da estranheza à admiração .É por causa de toda a repercussão desta obra,
que há mais de quinhentos anos tem suscitado opiniões diversas sobre o assunto, que nos
propomos a debater o pensamento filosófico de Maquiavel. Seu livro mais se parece com um
manual de instruções para um príncipe que deverá seguir a risca seus conselhos para ser bem
sucedido durante o período em que estiver no poder. Devemos entender príncipe como um
termo que se refere a qualquer função que exija
liderança ( governadores, senhores feudais,
reis, condes, duques e presidentes)

[...] O que se poderia dizer de um livro que deixou a muitos perplexos pelos conceitos expostos, que
deixou a muitos revoltados com os ataques deferidos pelo autor contra princípios morais e cristãos
considerados intocáveis, mas que deixou a muitos sumamente satisfeitos pela visão história e política
desse intelecto privilegiado e brilhante? ( Mioranza, 2008. p.9)

Pretendemos também uma análise da obra a partir da visão que o autor tinha acerca
do poder. Veremos que para Maquiavel o poder ou a força nas mãos de um homem era de
extrema importância para o bem comum da sociedade .O autor via a monarquia soberana ou
absolutista como fundamental para um contexto como o seu , visto que as mazelas e a
corrupção do gênero humano precisariam ser extirpadas e então a população deveria ser
reeducada para assim viver a República.

Na visão do autor florentino a política era o meio pelo qual o inferno seria evitado,
ainda que não levasse ninguém ao céu. Sem o auxilio dela o príncipe estaria fadado ao
fracasso. Ele teria de compreender bem a natureza humana e seus vícios, que para Maquiavel
era imutável, para administrar eficazmente seu reino. A história, sempre repetitiva, deveria ser
sua amiga mestra, pois ela lhe ensinaria grandes lições sobre o passado, e poderia prevenir-lhe
de erros no presente para que seu futuro fosse seguro e garantido. Ao apropriar-se dos
grandes acontecimentos passados o príncipe poderia guiar-se de forma mais prudente. Ele
perceberia que o homem é naturalmente anárquico e não quer ser dominado. Entretanto, ele,
o príncipe, deseja governar, logo isto resultaria em caos. O que fazer? Ora, o governante deve
se por diante do povo não como um ditador ou tirano, mas como um fundador do Estado,
ou melhor ainda, uma espécie de salvador transitório de sua sociedade. O que legitima o
poder soberano para Maquiavel é exatamente este caos resultante das vontades opostas, de
dominar e não ser dominado, que se faz necessário como ferramenta educadora.
Para Maquiavel o poder estava relacionado a força e ela era necessária para o Príncipe
conquistar aquilo que ele queria, porém apenas a força ou este tipo de poder não era
suficiente para que ele se mantivesse no governo. O príncipe deveria possuir virtude, não
aquela cristã relacionada a moral, mas aquela virtude contemplada pelos clássicos, capaz de
atrair a atenção e o favor da deusa Fortuna e suas muitas riquezas. A virtude mantém o poder,
por isso o governante deve buscá-la a todo preço. Ele deve criar as instituições necessárias
capazes de facilitar seu domínio. Do mesmo modo deve abrir mão de tudo aquilo que lhe
impeça de manter a ordem. Se for preciso utilizar dos vícios mais vis para este fim, então ele
deverá fazê-lo.

Já em a Micro física do Poder, de Michel Foucault, percebemos que os mecanismos de


poder são exercidos em todos os ângulos do aparelho de Estado. Vale frisar que o Estado é
objeto de nossa pesquisa monográfica. O poder será analisado a partir deste e os debates
devem emanar deste centro. Por exemplo, como o Estado moderno construiu verdades para
justificar suas práticas em relação aos homens governados. Todavia, cabe-nos também o papel
de mostrar que Foucault não cria num monopólio de poder estatal, isto é, o Estado não
detinha o poder absoluto em suas mãos, mas ao lado deste havia uma rede de micro poderes.
Logo, o poder não deve ser visto como algo que flui de um centro, mas a partir dos pólos ou
extremidades. Portanto analisaremos o Estado e o poder a ele atrelado, e neste capítulo, “Os
intelectuais e o Poder “, mais especificamente a visão de Foucault sobre o exercício do poder.

[...] o que é poder? Afinal de contas, foi preciso esperar o séc. XIX para saber o que era exploração, mas
talvez ainda não se saiba o que é poder. E Marx e Freud talvez não sejam suficientes para nos ajudar a
conhecer esta coisa tão enigmática, ao mesmo tempo visível e invisível, presente e oculta, investida em
toda parte, que se chama poder [...](FOUCALT, 2006 p 75)

Para Foucault o poder não deve ser entendido como em termos de


Soberania (proibição ou imposição de uma lei). Muitos entendem ou relacionam
poder a algo extremamente dotado de significado negativo e repressivo. Como também
acreditam que o poder é algo que se possui e que se manipula. Para isso é necessária a
presença de um indivíduo que o tenha em suas mãos e nele o centralize. Entretanto, Foucault
diz que o poder se exerce e que ele não está centralizado nas mãos de um Homem, mas que
funciona como uma maquinaria, não localizada, disseminada por toda a estrutura social. O
poder está em toda parte , pois provém de todos os lugares. Vejamos o que Michel Foucault
diz sobre o assunto no capítulo “ Poder e Corpo” da referida obra analisada.

[...] Eu não estou querendo dizer que o aparelho do Estado não seja importante, mas que me parece
que, entre todas as condições que se deve reunir para não recomeçar a experiência soviética, para que o
processo revolucionário não seja interrompido, uma das primeiras coisas a compreender é que o poder
não está localizado no aparelho de Estado e que nada mudará na sociedade se os mecanismos de poder
que funcionam fora, abaixo, ao lado do aparelho de Estado a um nível muito mais elementar,
quotidiano, não forem modificados.(FOUCAULT, 2006, p 149-150)
No capítulo " Soberania e Disciplina " o autor tentou discernir os mecanismos de
poder. Procurou perceber a ação deste e seus efeitos em suas extremidades, isto é, nas
instituições regionais e locais. Como também procurou estudar o poder pela sua face externa.
Neste aspecto Foucault se opõe a Hobbes, outro pensador absolutista, visto que não enxerga o
Soberano no topo, mas os súditos na base. Os teóricos absolutistas viam o Monarca como a
alma do estado, Foucault vê o povo como tal, não negando assim o poder estatal, mas
atribuindo ao povo uma participação antes não vista. Na verdade o autor não enxerga o poder
como um fenômeno de dominação homogêneo de um indivíduo sobre os outros, mas como
algo que circula e que funciona em cadeia, ou seja, o poder não se aplica aos homens, ele
passa por eles.

Parece complicado determinarmos o que é poder e realmente o é. Foucault não


tentou teorizar o poder, mas simplesmente analisá-lo. Podemos dizer que o poder em si não
existe, mas existem, sim, práticas em que ele se manifesta. O filósofo disse que o poder é a
ação sobre as ações. Poderíamos incorrer em precipitação ao dizermos que isso ocorre sempre
de cima para baixo, como algo que se impõe. Mas não foi isso que Foucault disse. Na verdade
ele se referia a vida em sociedade, onde um individuo também age sobre ações de outros
indivíduos e vice e versa. Por exemplo no trabalho, na família, na igreja, etc. Logo percebemos
o poder como algo que circula ou que se transmite em rede e que não é essencialmente
repressivo, pois produz, suscita coisas, como também se exerce e atua em rede social.
Portanto, na sociedade existem múltiplas sujeições, em que todos nós agimos e sofremos a
ação de um poder imediato que atua diretamente em nós, isto é, em nossos corpos, não
somente vindo do Estado ou de um Soberano.

Nesta mesma perspectiva de manifestação do poder, escreve Michelle Perrot. E


baseado em alguns de seus textos abordaremos o exercício do poder pelos " marginalizados",
isto é, operários, mulheres e prisioneiros. O Poder disciplinar dentro das fábricas européias do
século XIX, por exemplo, acabou por promover as greves operárias. A greve, então, deve ser
vista como uma forma ou mecanismo utilizado pelas massas para reivindicar melhores
condições de trabalho e de vida.

Tantas vezes os trabalhadores levantaram-se contra a modernização das fábricas.


Temiam ser substituídos pelas máquinas, temiam perder o lugar que lhes pertencia a gerações.
Por isso mesmo não foram poucas as vezes que os mesmos quebraram aquelas que
se tornariam um símbolo do poder burguês. Negavam-se a dividir o mesmo espaço com estas
que ameaçavam seu sustento. Principalmente com as grandes máquinas.

Não podemos cometer o pecado de excluirmos as mulheres da história das


reivindicações. Aliás, por muito tempo elas foram silenciadas ou porque não dizermos
excluídas da História Geral. Sempre vista como improdutiva, a mulher fora formada pelo
homem através de um discurso machista. No século XIX , principalmente na França , a mulher
deveria estar reclusa em sua casa, ser uma boa mãe e cuidar bem de seu esposo, que todos os
dias ia buscar o sustento do lar nas fábricas e indústrias modernas. O que podemos dizer de
fato é que a mulher foi e continua sendo vítima da história feita pelos dominantes. Entretanto,
vemos também no século XIX uma mulher francesa que luta, que reivindica, que reclama e ,
logo, exerce poder. Ela, gestora da vida cotidiana, fazedora de trabalhos domésticos, mas
portadora de uma voz e de uma vontade de mudança,. Conseguiu o direito de administrar os
salários de seus maridos. Também se revoltaram contra a modernidade inglesa, quebrando
máquinas de tecelagem e etc. As máquinas não eram, portanto, apenas inimigas dos homens,
isto é, dos maridos, mas também das mulheres, as esposas, que souberam exercer seu poder
em forma de protesto, de luddismo, isto é, a destruição das máquinas industriais , de marchas
etc.

A administração do salário é, sem dúvida, uma difícil conquista das mulheres, resultado de uma luta
cheia de ciladas, onde o patronato, cioso em favorecer o “bom” uso do salário, por vezes estendeu às
mulheres uma mão generosamente compassiva [...](PERROT, 1992 p. 191-192)

E por fim não deveríamos deixar de citar o caso que nos parece ser o “maior”
arquétipo do exercício do poder dessa sociedade contemporânea: a revolução francesa de
1789. No século XVIII vemos a culminação de um processo histórico insustentável de abusos e
exploração dos pobres por parte da nobreza francesa. Por muitos anos o terceiro estado
carregou em suas costas todo o esplendor e ostentação dos membros nobres da corte
francesa. Era seu suor e trabalho que mantinham a vida regalada dos senhores de terras.
Porém, com a crise financeira que a França enfrentava e diversos fatores que propiciaram
revoltas e motins populares, a coroa do rei Luís XVI só poderia rolar pelo chão. É por isso que a
revolução francesa é tão instigante. O povo luta contra o rei, seu algoz maior. Aquele que era
símbolo de poder e favor divino, torna-se aos olhos do povo um grande inimigo.

Quem teria razão nesta grande discussão, Maquiavel ou Foucault? Talvez aos olhos de
Maquiavel, Luís XVI não foi um homem de virtú, fora incapaz de governar seu povo e por não
ganhar sua empatia, fora decapitado. Mas , segundo Foucault, a revolução seria a prova de
que o poder não pertence ao Estado ou a um homem, mas é exercido por todos. O povo é
soberano!

Bibliografia:

FOUCAULT, Michel. A microfísica do poder; organização e tradução Roberto Machado. Rio de


Janeiro, Graal, 22 ed. 2006.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: história da violência nas prisões. Tradução de Raquel
Ramalhete; Petrópoles, . Editora Vozes.26 ed 2002.

MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe. Tradução Ciro Mioranza.São Paulo: Editora Escala.3 ed.
2008

SADEK, Maria Teresa. Nicolau Maquiavel: o cidadão sem fortuna, o intelectual de Virtú;
WEFORT, Francisco C. Os clássicos da Política vol. 1.São Paulo. Editora Atica.2001

NETO, Alfredo Veiga. Foucault e a educação. São Paulo: editora Autêntica. 2 ed. 2005.

PERROT, Michelle. Os excluídos da História: operários, mulheres e


prisioneiros. Tradução Denise Bottmann, Rio de Janeiro, Paz e terra. 2 ed.1992.

Frankcimarks C. de Oliveira

Licenciado em História Pela Faculdade Integrada de Patos

Foucault e o
nascimento da justiça
na Grécia Antiga
Desigualdades sociais são manifestação de relações de poder cristalizadas
Andrei Koerner
08 de Julho de 2016 - 17h35
JUDICIÁRIO E SOCIEDADEMICHEL FOUCAULT
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O volume Aulas sobre a vontade de saber (AVS)[1] traz as aulas do primeiro curso
de Michel Foucault no Collège de France no ano acadêmico de 1970-1971 e faz parte
do projeto de publicação integral de seus cursos, iniciado em 1997 e concluído em
2015. Sua publicação em português mantém nosso público atualizado e assegura a
atenção que sua obra sempre despertou entre nós. O texto tem como base os
manuscritos de preparação das aulas completados por notas de uma ouvinte, pois, ao
contrário dos cursos de outros anos, não há registro gravado das aulas. O volume é
completado por duas monografias: uma sobre Nietzsche e outra sobre o saber de Édipo.
O volume traz relevante material para os pesquisadores interessados nos temas do
direito e da justiça no pensamento de Foucault[2]. O direito não foi objeto das reflexões
de Foucault, mas um foco de análise, dado que “não há discurso judicial em que a
verdade não ronde” (AVS, p. 76). A justiça seria um teatro da verdade e, como tal,
espaço privilegiado para analisar as articulações entre discurso e poder.
Foucault trabalhou as teorias e práticas judiciais modernas e contemporâneas,
sobretudo. Sobre a Antiguidade, havia até a publicação do curso apenas as suas
conferências sobre a Ilíada e a tragédia Édipo-Rei, publicadas no volume La vérité et
les formes juridiques (VFJ)[3], e algumas passagens de seus cursos dos anos oitenta.
Nas conferências, ele contrasta uma passagem da Ilíada, sobre o desafio entre Menelau
e Antíloco, e a tragédia Édipo-Rei para evidenciar as descontinuidades entre a forma
jurídica baseada no juramento-desafio (ao outro e aos deuses) e a baseada no
julgamento assertórico da verdade, que ocorre no quadro do processo judicial da cidade.
O Édipo-rei é analisado como um episódio da história do saber, como ponto de
emergência do inquérito, no qual se dá a formação do sujeito, certos domínios de
objetos, certos tipos de saber.
A análise das práticas judiciárias permite-lhe localizar a emergência de novas formas de
subjetividade e de saber, pois nelas se define a maneira pela qual os homens são
julgados em função dos erros cometidos, se impõe aos indivíduos a reparação das suas
ações e a punição de outras. As formas jurídicas e a sua evolução no campo do direito
penal seriam lugar de origem de um número determinado de formas de verdade (VFJ, p.
541). Ele mostra que as diferenças nas formas jurídicas para o regramento de um
conflito revelam distintas formas de organizar o poder político e as relações com a
verdade e com o perigo. Mas o seu interesse é mais geral, pois, se a instância judicial é
um teatro de produção de verdade, a sua forma condensa as relações entre vontade de
saber, verdade e práticas de poder.
As Aulas sobre a vontade de saber trazem os passos intermediários desse contraste:
a forma de resolução dos conflitos de classe levou à institucionalização de uma medida
comum para as relações econômicas, políticas e sociais na cidade. Foucault apresenta
um conjunto de transformações com as quais ocorre o recentramento das relações entre
os grupos sociais e as formas de produção da verdade. A instituição do jurídico se dá
como um efeito dessas transformações, e, se as suas características são correlativas à
nova ordem, não há comparação possível com a forma de instituição anterior. Ele
apresenta as transformações como uma espécie de análise histórico-estrutural, dado que
ainda não havia elaborado o conjunto de conceitos que definiu como a genealogia do
poder.
A análise serve como contraponto a teses ainda presentes na teoria e história do direito e
no senso comum teórico dos juristas. São os discursos universalistas segundo as quais a
justiça seria uma espécie de virtude natural ou em potência em todo homem, ou seria
expressão da sociabilidade natural do homem, pois “onde há sociedade, há direito”. Ou
discursos evolutivos, que afirmam as formas civilizadas do direito como um
desdobramento imanente e contínuo as mudanças das formas jurídicas desde a
Antiguidade até a formação do direito propriamente dito em Roma. Ou, ainda, as
anacrônicas, que projetam as características do direito atual como critérios para
reconhecer as modalidades de organização social e gestão dos conflitos, cujos requisitos
só seriam alcançados, porém, pelo direito romano, funcionalmente diferenciado da
política.
As formas jurídicas da cidade grega são efeito das lutas na cidade, para as quais
proporcionam uma instituição transitória e contestada. Nelas estão presentes as
condições e as formas de relações do poder através do discurso da verdade, em especial
o sujeito do discurso apofântico: o juiz e a testemunha, que se colocam como terceiros
diante do litígio, tendo por único interesse fazer emergir a verdade. O filósofo grego
define a boa forma de governo como a que realiza a justiça, ou uma medida comum de
igualdade entre os cidadãos. Elabora uma ética segundo a qual a justiça é a disposição
do cidadão-proprietário em agir deliberadamente para realizar a medida comum nas
relações com seus iguais. Disposição de caráter natural em termos de origem e
finalidade, alcançada pelo conhecimento prático e pela educação na cidade.
Esses elementos indicam um possível programa de história externa do direito como
discurso da verdade, e da justiça como forma social que institucionaliza a produção de
saber, as relações de poder e o governo de si e dos outros[4]. Talvez se possa sugerir
como hipótese que, se as desigualdades sociais indecentes são manifestação de relações
de poder cristalizadas em nossa sociedade, essas também sustentam as particularidades
das nossas formas jurídicas, que permitem a manipulação da produção da verdade, o
facciosismo e arbitrariedade no tratamento judicial das demanda dos adversários e dos
“de baixo”, a indiferença com as bases éticas do direito contemporâneo e a
irresponsabilidade política de boa parte de nossos “operadores do direito”.
*Este artigo desenvolve um ponto de resenha a ser publicada com o título
“Notas de leitura” sobre Foucault na Revista Brasileira de Ciências Sociais
_______________________________________________________
[1] Foucault, Michel. (2014). Aulas sobre a vontade de saber: curso no Collège
de France (1970-71). Trad. Rosemary Costhek Abílio. São Paulo, WMF Martins
Fontes. 303 pp.
[2] Ver Fonseca, M. A. d. (2013). Michel Foucault et le Droit. Paris,
L´Harmattan.
[3] Foucault, Michel. ([1973] 1994), La vérité et les formes juridiques”, in
_______, Dits et escrits, Paris, Gallimard, vol. 2, n. 139, pp. 538-646.
[4] Apresentamos um esboço para esse programa em Koerner, A. (2015).
“Direito e Tecnologias de Poder.” Estudos de Sociologia 20(38): 57-73
Andrei Koerner - Professor de ciência política na Unicamp, coordenador do GPD/Ceipoc e
pesquisador do Cedec e do INCT/Ineu. No ano acadêmico de 2015-16 é pesquisador convidado junto ao
Institut des Hautes Etudes de l´Amerique Latine (IHEAL), da Université Sorbonne-Nouvelle, Paris III,
com bolsa da Capes
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As relações de poder em Michel Foucault: reflexões
teóricas

Relations of power in Michel Foucault: theoretical reflections

Isabella Maria nunes FerreirinhaI; Tânia Regina RaitzII

I
Mestranda do Programa Acadêmico de Mestrado em Educação pela Universidade do
Vale do Itajaí (Univali). Administradora pública da rede municipal de ensino.
Endereço: Rua 1451, 187, ap. 804 - Centro - CEP 88330-801, Balneário Camboriú,
SC, Brasil. E-mail: isabellaferreirinha@ibest.com.br
II
Doutora em educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS),
mestre em sociologia política. Professora do Programa Acadêmico de Mestrado em
Educação da Universidade do Vale do Itajaí (Univali). Professora universitária de
graduação e pós-graduação, socióloga da Secretaria de Assistência Social,
Habitação e Trabalho. Endereço: Rua Acelon Pacheco da Costa, 231, bloco B, ap.
407 - CEP 88034-040, Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: floraitz@yahoo.com.br

RESUMO

Este artigo baseia-se em reflexões acerca das relações de poder em obras de Michel
Foucault. Procurou-se percorrer o contexto de sua vida de forma introdutória e os
diferentes modos de poder, perpassando pelas formas de força e disciplina. O
procedimento metodológico foi a pesquisa bibliográfica dos acontecimentos
considerados pelo autor em seu tempo, história e espaço. Diante do triângulo de
Foucault (poder - direito - verdade) e das passagens em que ele se refere ao
aparelho de Estado, este artigo compara o tripé da sociedade (Estado - mercado -
sociedade civil) com o triângulo de Foucault. Constata-se que o poder está por toda
parte e provoca ações ora no campo do direito, ora no da verdade. Deve ser
entendido como uma relação flutuante, não estando em uma instituição nem em
ninguém, enquanto o saber está numa relação de formas e conteúdos.

Palavras -chave: Foucault; poder; força; disciplina.

ABSTRACT

This article presents a theoretical essay based on reflections about the relations of
power in some of Michel Foucault's works. The authors examined the context of
Foucault's life and the different forms of power, bypassing the forms of force and
discipline. The methodological procedure consisted of a bibliographic research of
the events considered by the author in their time, history and space. Given
Foucault's triangle (power - right - truth) and the passages in which he refers to the
state apparatus, this article compares the society triad (state - market - civil
society) to Foucault's triangle. The article shows that power can be found
everywhere, causing actions that sometimes are in the field of law or in the field of
truth. Power must be understood as a floating relationship, not the privilege of one
institution or person, while knowledge is found in a relationship of form and
content.

Keywords: Foucault; power; strength; discipline.

1. introdução

Este artigo analisa o poder visto por Paul-Michel Foucault. Michel Foucault ou
simplesmente Foucault, comumente conhecido, é de nacionalidade francesa, nasceu
na cidade de Poitiers, em 15 de outubro de 1926, e faleceu em 26 de junho de
1984, aos 57 anos, de Aids.1 Foucault veio de família tradicional de médicos, e
romper com essa tradição lhe custou muito, e acabou se graduando em história,
filosofia e psicologia.

Michel Foucault foi considerado um filósofo contemporâneo dos mais polêmicos,


pois possuía um olhar crítico de si mesmo. Foi aluno do filósofo Jean Hyppolite,
orientador em sua tese sobre a obra de Hegel. Devido às suas tentativas de
suicídio, aproximou-se da psicologia e psiquiatria e produziu diversas obras sobre
esse tema. Os seus estudos e pensamento envolvem, principalmente, o biopoder e
a sociedade disciplinar. Para tanto, o filósofo percorreu três técnicas independentes,
mas sucessivas e incorporadas umas pelas outras: do discurso, do poder e da
subjetivação. Acreditava ser possível a luta contra padrões de pensamentos e
comportamentos, mas impossível se livrar das relações de poder.

Foucault trata principalmente do tema poder, que para ele não está localizado em
uma instituição, e nem tampouco como algo que se cede, por contratos jurídicos ou
políticos. O poder em Foucault reprime, mas também produz efeitos de saber e
verdade.

Trata-se (...) de captar o poder em suas extremidades, em suas últimas


ramificações (...) captar o poder nas suas formas e instituições mais regionais e
locais, principalmente no ponto em que ultrapassando as regras de direito que o
organizam e delimitam (...) Em outras palavras, captar o poder na extremidade
cada vez menos jurídica de seu exercício. (Foucault, 1979:182)

Foucault acreditava que os acontecimentos deveriam ser considerados em seu


tempo, história e espaço. De acordo com Veiga-Neto (2003:43), sua obra pode ser
dividida em três fases cronometodológicas: arqueológica, genealógica e ética. Para
cada uma dessas fases elaborou perguntas fundamentais: que posso saber; que
posso fazer; e quem eu sou? Veiga-Neto (2003) cita também a obra de Miguel
Morey para melhor entender as três fases: ser-saber (saber); ser-poder (ação de
uns com os outros); e ser-consigo (ação de cada um consigo próprio).
Caracterizamos a pesquisa bibliográfica por meio da análise de descrição, nas obras
de Foucault: Microfísica do poder (1979); Em defesa da sociedade (1999); e Vigiar
e punir (2008). A obra de Veiga-Neto, com o exemplar Foucault e a
educação (2003), também será revista como forma de contribuição de seus
pressupostos e ainda a obra de Edgardo Castro, Vocabulário de Foucault - um
percurso pelos seus temas, conceitos e autores (2009), com tradução de Ingrid
Muller Xavier e revisão técnica de Alfredo Veiga-Neto e Walter Omar Kohan. Como
objeto principal, analisaremos as relações de poder e seus dispositivos no
pensamento de Michel Foucault.

2. Relações de poder no pensamento de Michel Foucault

É preciso, antes de qualquer coisa, conhecer a etimologia da palavra poder, que


vem do latim vulgar potere, substituído ao latim clássico posse, que vem a ser a
contração de potis esse, "ser capaz"; "autoridade". Dessa forma, na prática, a
etimologia da palavra poder torna sempre uma palavra ou ação que exprime força,
persuasão, controle, regulação etc.

De acordo com o dicionário de filosofia, a palavra poder, na esfera social, seja pelo
indivíduo ou instituição, se define como "a capacidade de este conseguir algo, quer
seja por direito, por controle ou por influência. O poder é a capacidade de se
mobilizar forças econômicas, sociais ou políticas para obter certo resultado (...)"
(Blackburn, 1997:301). Muito embora, de acordo com o autor, esse poder possa
ser exercido de forma consciente ou não, e/ou, frequentemente, exercido de forma
deliberada.

No dicionário de política, encontramos a definição de poder mais elástica. Ainda que


exista a preocupação de colocá-lo em esferas distintas: poder social, poder político,
poder constituinte, poder moderador, poder potencial, poder coordenador, entre
outros. Ainda assim, o que se vê é a palavra poder associada ao cerne da
autoridade. Podem-se encontrar definições do tipo: "É poder social a capacidade
que um pai tem para dar ordens a seus filhos ou a capacidade de um governo de
dar ordens aos cidadãos" (Bobbio, 2000:933).

E ainda, "o poder evoca a ideia de força, capacidade de governar e de se fazer


obedecer, império" (Souza, Garcia e Carvalho, 1998:417).

Por fim, em um dicionário comum da língua portuguesa o significado de poder é


apreciado em 18 sinônimos, com destaque para: "ter a faculdade ou o direito, de:
poder determinar algo"; "dispor de força ou autoridade"; "direito de deliberar, agir
ou mandar" (Ferreira, 2001:577). Nesse momento introdutório, é importante
destacar o pensamento de Foucault em relação ao poder.

Ele estudou o poder não para criar uma teoria de poder, mas para identificar os
sujeitos atuando sobre os outros sujeitos.

No que se refere ao poder, direito e verdade, sob a análise de Foucault, existe um


triângulo em que cada item mencionado (poder, direito e verdade) se encontra nos
seus vértices. Nesse triângulo, o filósofo vem demonstrar o poder como direito,
pelas formas que a sociedade se coloca e se movimenta, ou seja, se há o rei, há
também os súditos, se há leis que operam, há também os que a determinam e os
que devem obediência. O poder como verdade vem se instituir, ora pelos discursos
a que lhe é obrigada a produzir, ora pelos movimentos dos quais se tornam
vitimados pela própria organização que a acomete e, por vezes, sem a devida
consciência e reflexão,

para assinalar simplesmente, não o próprio mecanismo da relação entre poder,


direito e verdade, mas a intensidade da relação e sua constância, digamos isto:
somos forçados a produzir a verdade pelo poder que exige essa verdade e que
necessita dela para funcionar, temos de dizer a verdade, somos coagidos, somos
condenados a confessar a verdade ou encontrá-la. (Foucault, 1999:29)

Nessa perspectiva, pode-se entender a partir do autor por poder uma ação sobre
ações. Foucault discorre que as relações de poder postas, seja pelas instituições,
escolas, prisões, quartéis, foram marcadas pela disciplina: "mas a disciplina traz
consigo uma maneira específica de punir, que é apenas um modelo reduzido do
tribunal" (Foucault, 2008:149). É pela disciplina que as relações de poder se
tornam mais facilmente observáveis, pois é por meio da disciplina que estabelecem
as relações: opressor-oprimido, mandante-mandatário, persuasivo-persuadido, e
tantas quantas forem as relações que exprimam comando e comandados. Diante do
triângulo demonstrado por Foucault, poder - direito - verdade, e das passagens em
que ele remete ao aparelho de Estado, a figura, por meio de recurso analógico,
compara-o ao triângulo do tripé da sociedade, Estado - mercado - sociedade civil.

A partir dessa demonstração figurativa, seria possível fazer ligação de seus


vértices? Estado - poder; mercado - direito; sociedade civil - verdade.

Parece que não, a analogia proposta aqui quer identificar que as relações de poder,
direito e verdade, entre os setores mencionados, são tão complexas, tácitas,
intrínsecas e interdependentes que, por vezes, encontram-se discursos de verdades
e direitos desenhados pelo interesse individual, o que pode ser chamado de relação
de força, "(...) tais forças estão distribuídas difusamente por todo tecido social"
(Veiga-Neto, 2003:73).
Entretanto, para melhor entender a figura dos triângulos apresentados, a analogia
exposta entende que dentro do triângulo apresentado por

Foucault existem diversas ações que perfazem o poder, o direito e a verdade, ações
essas que são transportadas para aquelas que permeiam a tríplice

Estado-mercado-sociedade civil. Assim, pode-se concluir que a harmonia das


relações de poder-direito, poder-verdade, estado, mercado e sociedade civil é
essencial para que as políticas e ações sejam fundamentadas nos princípios éticos.

Diante dos papéis possíveis que a sociedade pode apresentar, Foucault (1999) nos
apresenta duas tecnologias de poder, divididas em duas séries:

▼ série corpo - organismo/disciplina/instituições, que são os mecanismos


disciplinares;

▼ série população - processos biológicos (que são os mecanismos


regulamentares)/Estado.

Uma técnica que é centrada no corpo, produz efeitos individualizantes, manipula o


corpo como foco de forças que é preciso tornar úteis e dóceis ao mesmo tempo. E,
de outro lado, temos uma tecnologia que, por sua vez, é centrada não no corpo,
mas na vida; uma tecnologia que agrupa os efeitos de massas próprios de uma
população. (Foucault, 1999:297)

De acordo com Foucault a modernidade trouxe duas novidades fortemente


interligadas: poder disciplinar, no âmbito dos indivíduos; e sociedade estatal, no
âmbito do coletivo. O poder disciplinar surgiu em substituição ao poder pastoral (no
campo religioso), poder esse exercido verticalmente por um pastor que depende do
seu rebanho e vice-versa. No poder pastoral, o pastor deve conhecer
individualmente cada membro do seu rebanho, se sacrificar por eles e salvá-los,
como denominado por Veiga-Neto (2003:81): "vertical, sacrificial e salvacionista;
individualizante e detalhista".

No campo político, a sociedade estatal veio em substituição ao poder de soberania,


vem da lógica pastoral, embora não possa ser salvacionista, nem piedoso e nem
mesmo individualizante. Assim, o poder de soberania tem um déficit em relação ao
poder pastoral. Daí surge o poder disciplinar para preencher essa lacuna, com
efeitos individualizantes, vigilante, a fim de preencheros espaços vazios do campo
político. Como destacado por Veiga-Neto (2003:83), em muitos momentos ocorreu
a "a invasão do poder pastoral no plano político do corpo social". Ou seja, o caráter
individualizante do poder pastoral deveria ser abarcado pela sociedade estatal e
essa contradição pode ser bem identificada no estado de bem-estar social.

A partir disso, podemos observar as transformações do Estado e suas formas de


produção e/ou regulação. O estado de bem-estar social surgiu da movimentação
histórica em que houve urgência de o Estado provir necessidades básicas para a
sociedade, visto que o liberalismo não deu conta de suprir tais necessidades. A
economia capitalista entra na década de 1970 em profunda crise histórica,
parecendo haver um consenso entre as correntes conservadoras e progressistas em
relação ao seu caráter: trata-se de uma crise de Estado. Essa passagem de Estado
tutelar, assistencial (Estado produtor) a Estado de livre iniciativa (Estado regulador)
coaduna com a questão levantada por Foucault (1979:281), em relação à arte de
governar: "como introduzir a economia - isto é, a maneira de gerir corretamente os
indivíduos, os bens, as riquezas no interior da família - ao nível da gestão de um
Estado".
Governar um Estado significará, portanto, estabelecer a economia ao nível geral do
Estado, isto é, ter em relação aos habitantes, às riquezas, aos comportamentos
individuais e coletivos, uma forma de vigilância, de controle tão atenta quanto à do
pai de família. (Foucault, 1979:281).

Adiante, Foucault (1979:289) vem colocar a população não só como força do


soberano, mas como sujeito das necessidades e aspirações, consciente daquilo que
se quer, e inconsciente em relação ao que se quer que ela faça. "O interesse
individual - como consciência de cada indivíduo constituinte da população - e o
interesse geral - como interesse da população (...)". Dessa forma, governar e
programar políticas públicas perpassa pelas necessidades e aspirações da
sociedade, identificadas não só pelo aspecto quantitativo de demanda mas,
principalmente, pelo aspecto qualitativo para garantir a sua sustentabilidade.

3. Governamentabilidade pelo pensamento de Michel Foucault

No primeiro momento procurou-se investigar a etimologia da palavra


governamentabilidade, diferente da palavra poder, o que foi bastante difícil.
No Dicionário Houaiss da língua portuguesa não há sinônimo para a palavra, tem-se
a palavra governabilidade com tais significados: 1) "qualidade do que é
governável"; 2) "situação em que as instituições funcionam bem, existe
tranquilidade política e suficiente estabilidade financeira para que o governo possa
governar".

Dando sequência à pesquisa da palavra, buscou-se a definição de governabilidade


no Dicionário de política, de Bobbio (2000), que na verdade levanta a discussão
acerca do que vem a ser não governabilidade. De acordo com o dicionário,
governabilidade seria o oposto de não governabilidade, e esta última carregada de
implicações pessimistas. Adiante, Bobbio (2000) perpassa pelas duas faces do
conceito de não governabilidade que vem a ser: a) a incapacidade dos
governantes; b) as exigências excessivas dos cidadãos.

Bobbio (2000) enfatiza que tanto governabilidade quanto não governabilidade não
são "fenômenos completos", mas são instituídos de relações complexas de um
sistema político. À frente, o dicionário perfaz três hipóteses de não governabilidade:

▼ a não-governabilidade como crise fiscal do Estado - que se refere à sobrecarga


de problemas aos quais o Estado deve responder com a expansão de seus serviços
e intervenção. Nessa hipótese valorizam-se o crescimento do papel do Estado na
economia e a falta de sua legitimidade, uma vez que o Estado não consegue prover
tais soluções. As soluções encontradas para essa hipótese são de cunho neoliberal,
em que o Estado deve ser mínimo e, portanto, suas receitas podem ser
minimizadas;

▼ a não governabilidade como problema de natureza política - nessa hipótese não


se considera somente o problema de acumulação, distribuição e redistribuição de
recursos, bens e serviços, mas sim autonomia, complexidade, coesão e legitimidade
das instituições, o que Bobbio (2000) intitula como a "crise da democracia". Nessa
hipótese o autor diz que o crescimento da participação política deve ser
acompanhado pela institucionalização, ou seja, sociedade e Estado devem caminhar
juntos para que haja aceitação e legitimidade de seus atos administrativos e
políticos;
▼ a não governabilidade como crise da racionalidade - que se refere ao que Bobbio
(2000) chama de "princípio organizador", que é constituído de duas faces:
afirmação de um domínio não político de classe e pelo desenvolvimento na
instituição do mercado. Nesse sentido, o Estado deve proteger a propriedade
privada e ao mesmo tempo cumprir com suas funções sociais.

Na verdade, Bobbio (2000) apresenta tais hipóteses a fim de sofrerem


fundamentos de pesquisa, sobretudo no que diz respeito às suas considerações
pelas reflexões críticas a cada hipótese. Dessa forma, o autor critica a falta de
estrutura para transformar a primeira e a segunda hipóteses válidas, pois acredita
serem teses que poderiam ser facilmente falsificáveis. Quanto à terceira hipótese,
embora Bobbio (2000) considere ser uma hipótese de verificação empírica, ainda
assim considera a hipótese de grau elevado no quesito abstração.

Passado o momento de introdução à governabilidade, o que interessa neste artigo é


o entendimento da governamentabilidade visto por Foucault (1979), que dá uma
abordagem à última palavra e os aferimentos em torno da mesma, conceitos e
ações. Percebe-se adiante que a complexidade da não governabilidade tanto quanto
o conceito inacabado posto por Bobbio (2000) serão percorridos pelo pensamento
de Foucault.

No livro Vocabulário de Foucault (Castro, 2009), a palavra governamentabilidade


toma o espaço de seis páginas e tem por referência algumas das obras de Foucault,
mas para efeito da reflexão aqui presente atém-se à obraMicrofísica do
poder (Foucoult, 1979), no capítulo XVII, que se refere ao curso do Collège de
France,2 de 1o de fevereiro de 1978, em que o autor coloca a
governamentabilidade como objeto de estudo em relação às formas de governar.

No momento introdutório, Foucault coloca as questões do problema da população e


a questão de governo, em que faz deferência à relação de segurança, população e
governo. No caso em particular, do capítulo referido, e no caso aqui específico de
abordagem, o objeto principal é o governo.

Foucault decorre pelo principado, em particular a obra de Maquiavel, O príncipe,3 no


sentido do modo de se comportar, de exercer o poder, de ser aceito pelos súditos.
Dessa forma, Foucault (1979:277-278) traz à tona a temática acerca do governo
dos estados pelos príncipes que seria: "(...) como se governar, como ser
governado, como ser o melhor governante possível etc.".

Maquiavel, em princípio, como coloca Foucault, foi reverenciado por seus


contemporâneos, para depois ser abominado e sofrer uma enorme literatura
contrária à sua obra, daí o termo pejorativo e negativo de "maquiavélico". É preciso
levar em consideração que O príncipe, de Maquiavel, foi um postulado do
comportamento do príncipe e dos que o cercavam, no sentido de reproduzir o
comportamento e não escrever um tratado, um manual "maquiavélico".

Como bem colocado por Foucault, O príncipe deve ser analisado não pela função de
censura, mas pela positividade dos conceitos e estratégias. No primeiro momento,
Foucault (1979:279) coloca a relação de singularidade, exterioridade e
transcendência do príncipe em relação ao principado, ou seja, o príncipe "recebe
seu principado por herança, por aquisição, por conquista, mas não faz parte dele,
lhe é exterior; os laços que o unem ao principado são de violência, de tradição,
estabelecidos por tratado com a cumplicidade ou aliança de outros príncipes".

Foucault (1979:283) discorre que a constituição de governamentalidade implica


analisar as formas de racionalidade, de procedimentos técnicos, de formas de
instrumentalização, "o essencial é, portanto, este conjunto de coisas e homens; o
território e a propriedade são apenas variáveis". Quando Foucault (1979:282) se
refere ao conjunto de coisas e homens, se refere à essência do ser perante as suas
necessidades, interações e bem-estar; as propriedades, riquezas, recursos são as
variáveis pertinentes de cada território e que dão suporte ao suprimento das
necessidades do ser e o bem-estar da população.

Estas coisas, de que o governo deve se encarregar, são os homens, os recursos, os


meios de subsistência, o território e suas fronteiras, com suas qualidades, clima,
seca, fertilidade etc.; os homens em suas relações com outras coisas que são os
costumes, os hábitos, as formas de agir e pensar etc.

Passada a época do principado, com as características de multiplicidade iniciada no


século XVI, que introduziu a ideia de Estado, tal como se tem hoje, Foucault coloca
como principais movimentos de constituição desse Estado: o movimento de
concentração estatal; dispersão e dissidência religiosa.

No livro Microfísica do poder (1979), Foucault parte sua análise e reflexão sobre
governamentabilidade a partir de duas obras de G. de La Perrière (Le miroir
politique, contenant diverses manières de gouverner et policer lês republiques, de
1555)4 e de François de la Mothe Le Vayer (Loeconomie du prince, 1653).5 Algumas
abordagens reflexivas sobre essas obras já foram aqui ressaltadas anteriormente,
nesse momento interessam as três formas de governo postas por Le Vayer: o
governo de si (a moral); o governo da família e da casa (economia); e o governo
do Estado (a política).

Esmiuçando essas três formas de governo, Foucault quer responder à questão


postulada por Rousseau:6 como introduzir a questão da economia ao nível geral do
Estado, ou seja, o controle atento de um pai a riquezas, recursos, comportamentos
individuais e coletivos, para que a convivência seja assegurada e legitimada de
forma conveniente e em prol do bem comum.

Foucault aborda a questão da continuidade da arte de governar: ascendente e


descendente. Na continuidade ascendente, Foucault (1979:281) coloca que "aquele
que quer poder governar o Estado deve primeiro saber se governar, governar a sua
família, seus bens, seu patrimônio". A continuidade descendente é no sentido de
que "quando o Estado é bem governado, os pais de família sabem governar suas
famílias, seus bens, seu patrimônio e por sua vez os indivíduos se comportam como
devem". As duas linhas de continuidade fecham o cerco para a arte de bem
governar, ou melhor, uma sociedade em que "todos" conseguem se governar e
governar outrem; torna-se uma sociedade livre dos preceitos negativos imbricados
nos interesses individuais colocados à frente dos coletivos, na sobreposição do
espaço privado ao espaço público. Essas linhas de continuidade de Foucault vêm
chamar atenção para a linha central entre o governo de si (a moral) e o governo de
Estado (a política), é o governo da família (a economia), que permitirá que o
equilíbrio desse triângulo, moral - economia - política, possa ser encaminhado ao
bem da sociedade.

4. Poder e disciplina no pensamento de Michel Foucault

Na introdução deste artigo cita-se o trabalho de Foucault em fases metodológicas:


arqueologia, genealogia e ética. A fase arqueológica se refere ao procedimento
vertical de investigar os discursos descontínuos, a fim de entender como e em
seguida por quê. Nessa fase, o todo não deve ser considerado modelo prévio,
necessário, principalmente, para encontrar os discursos e partes esquecidas ou
ínfimas.

Na fase da genealogia, parafraseando Veiga-Neto (2003:58), "buscar as


homogeneidades básicas que estão no fundo de determinada episteme".

Ou mesmo como colocado por Foucault (1979:15) "a genealogia é cinza; ela é
meticulosa e pacientemente documentária. Ela trabalha com pergaminhos
embaralhados, riscados, várias vezes reescritos". Nesse sentido, é procurar as
particularidades que formam o conhecimento, as percepções e o saber.

A fase ética em Foucault se refere à subjetivação, ou melhor, à constituição dos


sujeitos e, dessa forma, o autor acreditava entender o conhecimento e suas
relações pela multiplicidade e por diversas dimensões. As referências às fases
metodológicas de Foucault se fizeram presentes agora, em virtude do assunto que
se inicia nesse momento. Ao estudar as instituições, Foucault já havia passado pela
fase arqueológica que se constitui da análise do discurso e do saber. Nessa nova
etapa (das instituições), o autor buscou encontrar as partes "cinzentas" no
mecanismo panoptismo, para melhor entender as instituições e, por conseguinte,
os sujeitos (fase ética).

Os estudos de Michel Foucault estiveram relacionados às instituições, quartéis,


fábricas, prisões, hospitais psiquiátricos e escolas, "instituições de sequestro", 7 em
que o autor perpassa pela sociedade disciplinar. A política que conduz tais
instituições, Foucault afirma ser a "continuação da guerra por outros meios". 8 "A
disciplina procede em primeiro lugar à distribuição dos indivíduos no espaço"
(Foucault, 2008:121). Entretanto, a organização espacial, horários, escala
hierárquica, tudo leva a essas instituições a prescrição de comportamentos
humanos estabelecidos e homogêneos, assim como descreve Foucault (2008:121):

A minúcia dos regulamentos, o olhar esmiuçante das inspeções, o controle das


mínimas parcelas da vida e do corpo darão, em breve, no quadro da escola, do
quartel, do hospital ou da oficina, um conteúdo laicizado, uma racionalidade
econômica ou técnica a esse cálculo místico do ínfimo e do infinito.

É importante destacar que para Foucault (2008:119) corpos dóceis são corpos
maleáveis e moldáveis, o que significa que, por um lado, a disciplina se submete ao
corpo num ganho de força pela sua utilidade; e, por outro lado, perde força pela
sua sujeição à obediência política, como explicita o autor "(...) se a exploração
econômica separa a força e o produto do trabalho, digamos que a coerção
disciplinar estabelece no corpo o elo coercitivo entre uma aptidão aumentada e
uma dominação acentuada".

O autor analisa essas instituições a partir do dispositivo panóptico, de vigilância e


invisibilidade, que se baseia em três elementos arquitetônicos: espaço fechado,
divisão em celas e torre central. Desse modo, da torre é possível enxergar as celas,
muito embora das celas não seja possível enxergar quem está na torre e nem
tampouco em outras celas. Assim destaca Foucault (2008:169): "o panóptico
funciona como uma espécie de laboratório de poder. Graças a seus mecanismos de
observação, ganha eficácia e em capacidade de penetração no comportamento dos
homens (...)".

O panoptismo é, portanto, um dispositivo invertido do espetáculo, shows, circo,


poucos assistem ao que acontece com a multidão. Segundo Foucault (2008:167):
"o panóptico é uma máquina maravilhosa que, a partir dos desejos mais diversos,
fabrica efeitos homogêneos de poder". Foucault (1979:12) explica que os
"discursos de verdade" da sociedade, por meio de sua linguagem, comportamento e
valores, são relações constituídas de poder e, portanto, aprisionam os sujeitos,
como destaca em seu texto.

Cada sociedade tem seu regime de verdade, sua "política geral" de verdade, isto é,
os tipos de discurso que aceita e faz funcionar como verdadeiros..., os meios pelo
qual cada um deles é sancionado, as técnicas e procedimentos valorizados na
aquisição da verdade; o status daqueles que estão encarregados de dizer o que
conta como verdadeiro.

Para tanto, Foucault vê na linguagem uma forma já constituída na sociedade, e por


esse motivo, os discursos já circulam por muito tempo: "(...) analisando os próprios
discursos, vemos se desfazerem os laços aparentemente tão fortes entre as
palavras e as coisas, e destacar um conjunto de regras, próprias da prática
discursiva" (Foucault, 1985:56).

De acordo com Foucault, as técnicas e práticas que induzem ao comportamento da


internalização de movimentos sem questionamentos são chamadas de tecnologias
do eu. As tecnologias de poder como produtoras da subjetividade, a análise
arqueológica e a análise genealógica são alguns dos aspectos que podem ser
utilizados para analisar a construção histórica de uma visão mecanicista e
reducionista da sociedade.

5. O aparelho institucional no pensamento de Michel Foucault

Michel Foucault, quando fez a análise das instituições sobre a ideia do panoptismo,
trouxe as escolas, quartéis e hospitais como modelos do aparelhamento disciplinar,
como já visto.

Nesse sentido, Foucault (2008:125) perpassa em primeiro lugar pela distribuição


dos corpos no espaço, "o espaço escolar se desdobra; a classe torna-se
homogênea, ela agora só se compõe de elementos individuais que vêm se colocar
uns ao lado dos outros sob o olhar do mestre (...)". Em segundo lugar, pelo
controle das atividades, seja na rigidez do cumprimento de horários; seja na
penetração do tempo nos corpos, a fim de prevalecerem os efeitos de poder; seja
pela eficiência, rapidez e utilidade dadas pelos corpos disciplinados; seja na
articulação corpo-objeto, no que se refere à manipulação do corpo ao objeto e na
engrenagem de um e outro; seja, por fim, pela utilização exaustiva, que importa
extrair do tempo sempre mais tempos disponíveis e dessa forma tornar cada
instante mais forças úteis.

A ordenação por fileiras, a colocação de cada aluno em suas tarefas e provas, o


alinhamento de classes por idade, a classificação de conteúdos, as questões
classificadas e tratadas por ordem de dificuldade potencializam resultados,
comportamentos e valores de mais valia.

As análises de Foucault das instituições não são uma crítica pura, mas trazem
reflexões aos sistemas instituídos no interior delas, à medida que ocorre sua
progressão histórica. A ordem disciplinar, como vista, perfaz uma forma de instituir
ordem e alçar eficiência e utilidade econômica.

Mais tarde, na fase ética de Foucault, que trata da subjetivação e constituição do


sujeito, o autor faz análise a partir dessa fase genealógica aqui percorrida. É nesse
sentido que Foucault discorre sobre a produção das individualidades que a disciplina
produz a partir do controle de corpos, constituída de quatro espécies: 1) celular -
pelo jogo de repartição espacial; 2) orgânica - pela codificação das atividades; 3)
genética - pela acumulação do tempo; 4) combinatória - pela composição de forças.
"O exercício da disciplina supõe um dispositivo que obrigue pelo jogo do olhar; um
aparelho onde as técnicas que permitem ver induzam a efeitos de poder, e onde,
em troca, os meios de coerção tornem claramente visíveis aqueles sobre quem se
aplicam (...)" (Foucault, 2008:143).

No livro Vigiar e punir (2008), Foucault vem retratar, além da ordem disciplinar, os
dispositivos que a fazem ganhar força, pela ordenação espacial, sanção
normalizadora e o exame.

Na ordenação espacial, esgotou-se neste artigo a partir do quadro panóptico. As


sanções normalizadoras se referem à imposição de ordem, escala hierárquica,
dispositivos de comando e à previsão de comportamentos aceitáveis e eficientes.
Quanto ao exame, Foucault (2008:154) insurge:

O exame combina as técnicas da hierarquia que vigia e as da sanção que


normaliza. É um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar,
classificar e punir. (...). É por isso que, em todos os dispositivos de disciplina, o
exame é altamente ritualizado. Nele vêm-se reunir a cerimônia do poder e a forma
da experiência, a demonstração da força e o estabelecimento da verdade.

Para Foucault, entretanto, o exame acaba por transformar a formação do saber a


certa forma de exercício do poder, a considerar por três premissas:

▼ o exame inverte a economia da visibilidade no exercício do poder - o poder é o


que se vê, se mostra, se manifesta, a sua força está no movimento com o qual se
exibe. O poder disciplinar, ao contrário, é exercido com invisibilidade. Na disciplina
são os súditos que devem ser vistos. "O exame é a técnica pela qual, o poder em
vez de emitir os sinais de seu poderio, em vez de impor sua marca a seus súditos,
capta-os num mecanismo de objetivação" (Foucault, 2008:156). Dessa forma, o
exame torna-se um instrumento de objetivação do exercício do poder e do poder
disciplinar, como um ritual que traz à mostra a justificativa das relações tácitas do
poder;

▼ o exame faz também a individualidade entrar num campo documentário - o


exame coloca os indivíduos num campo de vigilância, em que os documentos
escritos captam, classificam, qualificam, quantificam e fixam os resultados
desenvolvidos. "Daí a formação de uma série de códigos da individualidade
disciplinar que permitem transcrever, homogeneizando-os; os traços individuais
estabelecidos pelo exame (...) marcam (esses códigos) o momento de uma
primeira 'formalização' do individual dentro de relações do poder" (Foucault,
2008:158). A acumulação documentária facilita a correlação de elementos,
gêneros, categorias, fixação de normas, médias, entre tantas outras formas de
classificação de indivíduos em si e entre si, e também de sua distribuição numa
população;

▼ o exame, cercado de todas as suas técnicas documentárias, faz de cada


indivíduo um caso - "um caso que ao mesmo tempo constitui um objeto para o
conhecimento e uma tomada para o poder" (Foucault, 2008:159). Esse caso não
deve ser visto como um caso acometido por circunstâncias que o qualificam, mas
pelo modo como o indivíduo é descrito, mensurado, comparado a outro e em sua
própria individualidade. No entanto, o exame torna-se a modalidade que personifica
o indivíduo, dando-o o status que o configura, através das medidas, notas, desvios
que os tornam um "caso".

Foucault (2008:160) coloca o exame no centro dos processos que constituem o


indivíduo "como efeito e objeto de poder, como efeito e objeto de saber". Portanto,
o caminho para a individualização acaba por ser regido pelo percurso disciplinar e
pelos exames que qualificam e classificam os sujeitos.

Os rituais nos quais os indivíduos estão sujeitos corporificam e fabricam a


individualidade celular, orgânica, genética e combinatória, entre o aparelho
institucional e entre as sanções normalizadoras em que estão inseridos.

6. Considerações finais

A importância do exercício de formulação deste artigo nos proporcionou um


mergulho ao pensamento de Foucault, e beber de sua fonte é desmistificar
conceitos que por vezes carregamos.

Este artigo, em virtude do espaço limítrofe, apresentou um fragmento da obra de


Foucault, atendo-se principalmente ao que se refere às relações de poder, à
governamentabilidade, à sociedade disciplinar e ao exame. O formato apresentado
aqui teve como objeto principal as relações de poder, e dessa forma procurou
averiguar as formas de poder, sua etimologia e suas principais configurações. Pode-
se identificar que o poder se encontra por toda parte.

O poder não é só do Estado ou da soberania. O poder são as ações sobre as ações.


O poder provoca ações que ora se encontram no campo do direito, ora no campo da
verdade.

O poder deve ser entendido como uma relação flutuante, não está numa instituição
e nem em ninguém, já o saber se encontra numa relação de formas e conteúdos.
Assim, para estabelecer o poder é preciso força, ao passo que para estabelecer o
saber bastaria apreender ou ensinar. Assim, do entrecruzamento de um e de outro,
poder e saber, é que se dá a constituição do sujeito.

A imposição de força sobre o corpo acaba por aferir a sujeição de utilidade


econômica, atividades codificadas e aptidões formadas, e também a sujeição de
obediência política, aceitação das regras e normas sem a capacidade de reflexão
crítica.

Assim como nos alertou Veiga-Neto, estudar Foucault não é submergir ao seu
pensamento eloquente e encontrar verdades absolutas em seus discursos. Estudar
Foucault é abrir um novo canal de pensamento, é colocar do avesso os conceitos,
os pré-conceitos, a normalidade, a anormalidade, os pesos, os contrapesos, as
certezas e seus contrários. Estudar Foucault é encontrar-se e encontrar um novo e
diferente modo de colocar em discurso e prática os juízos de valores, que tão
facilmente aplicamos ao dia a dia.

Referências
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1997. [ Links ]

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VEIGA-NETO, Alfredo. Foucault e a educação. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.


[ Links ]

As verdadeiras raízes da corrupção no Brasil


(por Sandro Ari Andrade de Miranda)

I – INTRODUÇÃO
Existem várias formas de manter o poder, mas o mecanismo mais comum é a apropriação
dos modos de produção de ideias, pensamentos, vivências, identidades. É a obstrução
dos mecanismos pelos quais interpretamos o mundo e construímos a nossa história.
Limitar os campos de interpretação, transformando a vida num universo sem crítica, sem
diferença e, principalmente, sem história, é uma estratégia de domínio imposta por aqueles
que não pretendem ver transformações de status.
Vários são os autores da sociologia que tentam desafiar esses processos, desde Marx e
Weber, passando por Gramsci, Foucault, Bourdieu e Habermas. O certo é que o conflito
entre estruturas e a vida efetivamente vivenciada estão no centro da obra destes autores,
razão pela qual sempre buscamos refúgio no conhecimento por eles produzido para
interpretar fatos e condições que envolvem o poder concentrado.
Para Marx, a principal forma poder está na dominação dos modos de produção e
reprodução, motivo pelo qual dá especial atenção à atividade primária da sobrevivência
que é a produção dos meios de vida, num processo que é contínuo, essencialmente
histórico, e que não pode ser analisado no estreito espaço do tempo presente.
Weber, por sua vez, busca aprofundar a análise das formas de dominação, e vai buscá-las
no carisma, na ação tradicional, e na ação racional-legal. Mas o próprio mestre alemão
destaca que estes são tipos ideais. Logo, é possível a existência de outras formas simples
ou combinadas de dominação.
A dominação pelo carisma é comum nas relações políticas, a tradicional, nas relações
religiosas, de assenhoramento e familiares. Já a dominação racional-legal, é aquela
derivada dos mecanismos racionais de poder, incluindo-se, aí, a ciência e o direito.
Já Gramsci segue a tradição marxista, mas se aprofunda na teoria de estado e nos
mecanismos de construção da ideologia. Demonstra que na sociedade moderna o poder
de Estado é limitado pelas organizações da sociedade. Vê na sociedade civil uma força
poderosa, capaz de construir formas de interpretação do mundo através da ideologia.
Estado = política + sociedade civil, uma síntese combinada de consentimento e repressão.
Para Foucault, na sua microfísica, o poder não existe. O que existe são relações de poder.
Ele observa o exercício das relações poder além da verticalidade das estruturas, mas
assentadas no tempo, na vida e no próprio corpo, através da disciplina, criando corpos
submissos, exercitados e dóceis para quem exerce o poder.
Pierre Bourdieu demonstra a existência de estruturas nas nossas próprias formas de
sentir, pensar e agir. O habitus é uma espécie de roupagem incorporada pelos indivíduos, e
que é utilizada nos momentos em que estes se relacionam com o mundo. É uma
disposição prática, automática, costumeira. É uma espécie de lei social incorporada.
Jurgen Habermas, por fim, é herdeiro da Escola de Frankfurt, e retoma importantes
elementos da discussão weberiana sobre racionalidade. Demonstra a existência de uma
estrutura intermediária que faz a mediação entre o estado e o espaço privado do mundo
da vida, a chamada “esfera pública”. A esfera pública surge com a invenção da tipografia e
da imprensa, criando um espaço de diálogo e de construção de consensos.
O aumento na forma de produção de informações transforma a sociedade e cria a
necessidade de maior transparência. Isso não quer dizer que os diálogos estabelecidos na
esfera pública sejam totalmente isentos, razão pela qual existem divergências entre as
informações apresentadas na esfera pública e o mundo efetivamente vivenciado, o mundo
da vida.
É por este motivo que Habermas propõe a ação comunicativa em oposição à ação racional
instrumental, na medida em que é possível a construção de diversas formas de tradução
do mundo da vida, através de uma espécie de razão comunicativa, que vai além da
concepção padronizada e única defendida pelo pensamento positivista. O próprio direito
sai do “mundo do dever ser, positivista” e passa a ser concretizado apenas no mundo vivido
(mundo do ser).
Este breve extrato de teorias sociológicas demonstra o quão complexas são as relações
de poder e a forma como estas se manifestam. O poder não necessariamente ocupa os
espaços formais e, muitas vezes, está assentado em locais distantes do controle social,
onde predomina a ausência de transparência.
A leitura estática dos fatos, sem elementos de consubstanciação, é prejudicial para
qualquer interpretação séria da realidade e prejudica a nossa visão crítica. E aqui eu me
afasto dos excessos de relativização da realidade, comuns a algumas teorias pós-
modernistas, na medida em que levam a perspectivas excessivamente individualistas do
mundo, abdicando da essência coletiva da organização da sociedade.
Portanto, quando buscamos analisar a preocupação dos meios de comunicação com
determinados assuntos, é necessário observar até que ponto tais órgãos tem uma real
preocupação com a verdade, com a verdadeira informação, ou buscam, simplesmente,
manipular informações com objetivos próprios.
Por que um canal de televisão tenta colocar a culpa da falta d’água em São Paulo na
derrubada de árvores na Amazônia, quando toda a bacia hídrica do Estado Bandeirante
nasce no próprio sudeste? Ou por que determinados grupos de comunicação colocam a
corrupção financeira como pauta de agenda, restringindo o número de réus entregues ao
julgamento dirigido da chamada “opinião pública”, ou eliminando dados factuais e históricos
que comprometeriam a vida dos próprios grupos?
As ciências sociais já nos proporcionam ferramentas suficientes para confrontar as
técnicas adotadas pelos meios de comunicação para formar ideias e concepções de
mundo, que vão desde o materialismo histórico até a análise de símbolos e imagens pelo
estruturalismo e pela semiótica.
Neste ensaio apresentamos pelo menos cinco pontos que devem ser analisados por quem
realmente pretende enfrentar a corrupção e que, curiosamente, não são vistos nas colunas
e boletins das principais empresas de comunicação brasileiras.
Evidentemente, o estudo deve ser focado exclusivamente nos elementos materiais,
evitando-se o generalismo e a rotulagem de pessoas, o que sempre promove distorções e
injustiças, posto que não pretendemos, com o nosso trabalho, apresentar os mesmos
resultados da mídia oligopolista. Ao contrário, o que se pretende demonstrar aqui é que os
fatos devem sempre ser analisados de forma contextualizada, e com fundamentação
histórica e crítica.
II – O ESTAMENTO BUROCRÁTICO
A tradição patrimonialista na formação do estado brasileiro é representada nas obras de
vários autores, como Victor Nunes Leal no seu “Coronelismo, Enxada e Voto”, Sérgio
Buarque de Holanda com “Raízes do Brasil”, Caio do Prado Júnior, em diversos livros, e
Raymundo Faoro, no seu notável “Os Donos do Poder”.
Pois é exatamente nesta última obra que Faoro apresenta o conceito de “estamento
burocrático”. Trata-se de uma ideia com forte inspiração weberiana, que serve para traduzir
as relações patrimonialistas de mando e compadrio que ainda se manifestam em diversos
setores da sociedade brasileira.
Conforme Faoro,
“o estamento burocrático desenvolve padrões típicos de conduta ante a mudança interna e no
ajustamento à ordem internacional. Gravitando em órbita própria não atrai, para fundir-se, o
elemento de baixo, vindo de todas as classes. Em lugar de integrar, comanda; não conduz, mas
governa. Incorpora as gerações necessárias ao seu serviço, valorizando pedagógica e
autoritariamente as reservas para seus quadros, cooptando-os, com a marca de seu cunho
tradicional. O brasileiro que se distingue há de ter prestado sua colaboração ao aparelhamento
estatal, não na empresa particular, no êxito dos negócios, nas contribuições à cultura, mas numa
ética confuciana do bom servidor, com carreira administrativa e curriculum vitae aprovado de cima
para baixo”.
O “estamento burocrático” utiliza-se do poder do estado para impor sua vontade à conduta
alheia, ora por meio da violência (ditadura militar), ora através das relações de mando
senhorial (república velha), ora das relações de compadrio (nepotismo), ou, ainda,
simplesmente por meio da corrupção.
A origem do poder estamental de determinados setores da burocracia do estado está
assentada no processo de colonização imposto ao nosso território, que deixou uma
pesada herança na organização estatal, incluindo a concessão de privilégios e vantagens
a determinados grupos. A propriedade, por exemplo, foi uma concessão do Governo
Português aos Donatários da Coroa, garantindo, assim, uma predominância das relações
de interesse entre os representantes do poder concedente e seus beneficiários, dentro da
lógica daquilo que Weber chamou de dominação tradicional.
Os traços do patrimonialismo foram mantidos durante todo o período colonial e transpostos
para a organização da República Velha. Da venda de títulos de nobreza, à grilagem de
terras realizada com a anuência da ditadura militar, a organização administrativa do estado
foi fragilizada por um regime de troca de favores, que somente foi encontrar limites em
1988 com a determinação de acesso exclusivo as carreiras públicas por meio de concurso,
conforme disciplina imposta pela Constituição de 05 de outubro do referido ano.
Todavia, até mesmo a ação moralizadora da nova Carta Constitucional de 1988 encontrou
uma barreira numa medida típica do modelo patrimonialista adotada por alguns
constituintes, que foi a incorporação, com estabilidade, de milhares de empregados
públicos que ingressaram na administração, em todos os níveis, sem concurso público.
Foi a última dilapidação que o movimento chamado “Centrão” provocou na Carta de 1988,
e até hoje, de certa forma, o custo é pago por todos. A base desse era composta por
vários constituintes herdeiros da ditadura militar e alguns outros representantes da tradição
conservadora.
Na prática, apenas quem ingressou na máquina pública depois de 1988 e, especialmente,
depois do Regime Jurídico Único dos servidores (Lei 8.112/1990), teve como exigência o
concurso público. Ainda hoje milhares dos trabalhadores que ingressaram na
administração sem concurso, e sem nenhuma estratégia de profissionalização, e que
receberam estabilidade na carreira por meio de uma manobra tipicamente golpista de
alguns constituintes, ocupam cargos no serviço público em todas as esferas, inclusive com
poder de mando.
Assim, não causa estranheza que um dos assuntos de pauta das eleições presidenciais de
2014 tenha sido a construção de um aeroporto nos terrenos que pertenciam ao tio do ex-
candidato e atual Senador pelo PSDB/MG Aécio Neves. Trata-se de uma típica relação de
poder patrimonialista, assentada em laços tradicionais de compadrio.
Também não é estranho que o pivô do escândalo de corrupção na Petrobrás, Paulo
Roberto Costa, seja um funcionário que entrou na estatal em 1978, ou seja, sem concurso
público, e que desde 1995 (início do Governo de Fernando Henrique Cardoso) ocupe
cargos de direção na referida empresa, chegando a dirigir a GASPETRO de 1997 a 2000.
A rigor, o esquema de corrupção do qual Paulo Roberto Costa (vinculado ao Partido
Progressista – PP), existe desde 1997, bem na época dos escândalos de privatização do
Governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Mas dado o nome dos envolvidos, é
bem provável que este seja um problema mais antigo.
Outro pivô do escândalo, Nestor Cerveró, é funcionário da Petrobrás desde 1975, e figura
frente nos cargos de direção da empresa na época do governo de FHC. Já Pedro Barusco,
afirma ter acumulado mais de US$ 100 milhões de reais em propina desde 1996, ou seja,
durante o governo do PSDB.
Já Alberto Yousseff, doleiro ligado a Paulo Roberto Costa, também apareceu em
escândalos da década de noventa no estado do Paraná, notadamente no caso do
BANESTADO.
Ou seja, há inequívoco predomínio de um grupo de pessoas que exerce poder e defende
os seus interesses na máquina do estado há muito tempo, ocupando espaços estratégicos
na administração pública, vários dos quais incorporados aos quadros administrativos do
estado pelo movimento do “Centrão” e outros grupos conservadores na Constituinte, e que
permitiu a estabilidade para servidores que ingressaram na administração sem concurso
público no período pré-Constituição/88. Tais vantagens também beneficiaram empregados
públicos de empresas estatais e que hoje são citados em esquemas de corrupção, como
Nestor Cerveró e Paulo Roberto Costa. Trata-se, de fato, do chamado “estamento
burocrático”.
A criação do concurso público para acesso aos cargos públicos, imposta pela nova Ordem
Constitucional, permitiu uma democratização do ingresso nestes postos, que passaram a
ser ocupados por pessoas de todos os extratos sociais.
Até então, os cargos na administração pública, pelo menos os de maior envergadura, eram
considerados como postos destinados aos filhos da elite social e econômica,
especialmente os cargos de altos dirigentes do governo, da diplomacia, da advocacia e
dos comandos militares. Assim, este tipo de organização estatal está muito longe da lógica
racional-legal weberiana, mas dentro daquilo que o mestre alemão chama de dominação
tradicional.
Em qualquer análise política mais séria, e sem nenhuma ingenuidade, é impossível não
considerar o poder e a influência destes servidores do alto escalão governamental. Todos
possuem grande espaço de decisão ocupado ao longo da sua atuação na máquina
administrativa, espaços estes que permitem um contato permanente com várias empresas.
Estes espaços historicamente foram dotados de pouca transparência, de mecanismos de
controle social, participação ou governança, liberdade permitiu aos agentes responsáveis
pelas negociações e gestão de contratos com valores muito elevados a possibilidade de
comprar apoios, negociar favores, vender vantagens, dentre outras premissas que,
curiosamente, são simplesmente omitidos pelos grandes meios de comunicação.
Desta forma, não há como se falar em corrupção, no Brasil, sem considerar o papel deste
influente extrato de servidores e empregados públicos, e que exercem o papel de um
verdadeiro “estamento burocrático” dentro da administração.
III – A ESCOLA DA MAGISTRATURA
Durante as décadas de 80 e 90 do século passado o movimento estudantil universitário
criou uma série de projetos de cursos populares preparatórios para o vestibular, gratuitos,
e destinados a garantir o acesso de estudantes sem condições financeiras ao ensino
superior.
Embora a grande maioria dos estudantes que ministravam os cursos também tenha
origem em grupos menos privilegiados economicamente, as aulas eram atividades de
militância e não remuneradas, e os resultados obtidos permitiram o ingresso de milhares
de estudantes das camadas mais pobres nas universidades públicas.
Trata-se de uma iniciativa importante de um movimento social visando promover a
inclusão social e o combate aos privilégios de grupos dominantes. A universalização do
acesso ao ensino público e laico, bem como aos cargos públicos, é uma condição
essencial para a existência da Democracia, e deveria ser sempre um objetivo do Estado.
Ocorre que esta não foi uma iniciativa seguida por todas as categorias sociais, e muitos
setores da sociedade ainda se utilizam dos espaços privilegiados ocupados para manter
determinados postos no serviço público como núcleos destinados aos filhos da elite
econômica e social.
Esta última postura comunga com a tipologia do “estamento burocrático” e com a
perpetuação do patrimonialismo. Distante da realidade da maioria dos brasileiros, está a
grande maioria das Escolas da Magistratura, instrumento que poderia contribuir para
garantir o acesso aos cargos de juízes e que, na prática, funcionam como mecanismo
destinado à manutenção de privilégios.
Se no início, a primeira destas escolas contava com o serviço não remunerado de quadros
da judicatura, hoje todos os juízes-professores são remunerados pelas diversas escolas do
gênero implantadas em todo o país.
Uma das consequências é o elevado valor dos cursos ofertados por estas instituições de
“excelência”, cujo custo ultrapassa a faixa de 12 salários mínimos em média, o que torna os
mesmos proibitivos para a maior parte da população. Pior do que isto: apesar de mantidos
por associações de juízes, os cursos contam pontos nas provas de títulos para os
concursos da magistratura, conforme Resolução nº 75, de 12 de maio de 2009 do
Conselho Nacional de Justiça.
Trata-se de privilégio incomum, e exclusivo das associações representativas de servidores
que compõem a estrutura de um dos Poderes da República. As associações dos
magistrados são, na verdade, o equivalente aos sindicatos de outras categorias, pois
representam os interesses dos referidos profissionais frente ao estado.
Nenhuma outra entidade representativa de categoria profissional ou de servidores públicos
possui um poder tão grande para influenciar nos resultados dos concursos públicos como
a dos magistrados. Senão vejamos: a) as associações de magistrados participam da
definição dos critérios de seleção dos concursos; b) os cursos de formação mantidos pelas
associações de magistrados contam pontos para os títulos dos referidos concursos; c) os
magistrados, notadamente os desembargadores, são responsáveis por firmar as
interpretações jurisprudenciais, numa rara capacidade de estabelecer e ministrar o
conteúdo do objeto dos concursos; e d) muitas das escolas de magistratura funcionam e
se utilizam das estruturas físicas dos próprios Tribunais.
Embora não seja possível afirmar que há intencionalidade na fixação destas vantagens
como mecanismo para diminuir o acesso de determinados grupos sociais ao Poder
Judiciário, é inegável a existência de privilégios em favor das associações de magistrados
e daqueles que ingressam nos cursos mantidos por essas instituições.
Mesmo entendendo que boa parte dos juízes e professores das Escolas atua com sincera
intenção de aperfeiçoar o conhecimento jurídico e de forma honesta, a manutenção dos
privilégios das associações de magistrados não pode ser aceita de forma acrítica, sob o
risco de convalidar a perpetuação de uma situação tipicamente patrimonialista e com
duvidosa constitucionalidade.
IV – O PODER ECONÔMICO E OS PROCESSOS ELEITORAIS
Outra herança inequívoca do patrimonialismo no Brasil é o financiamento privado das
campanhas eleitoras. Uma leitura simples e rápida dos principais escândalos de corrupção
do país, identificaremos sempre a presença de dois fatores: a) o financiamento realizado
por empresas; e b) a participação de servidores e empregados públicos que ocupam
cargos de alto escalão, o chamado “estamento burocrático”, na articulação dos
financiamentos.
O tema do financiamento de campanhas eleitorais por empresas é objeto da Ação Direta
de Inconstitucionalidade nº 4650 que tramita no Supremo Tribunal Federal movimentada
pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), onde são questionados
dispositivos da atual legislação que disciplina o financiamento de partidos políticos e
campanhas eleitorais por essas empresas (Leis 9.096/1995 e 9.504/1997).
O processo já conta com o voto de seis Ministros favoráveis ao pedido que consideram
inconstitucional o financiamento de campanhas eleitorais por empresas, mas o processo
está suspenso em virtude de pedido de vista feito pelo ministro Gilmar Ferreira Mendes, o
que prejudica a efetiva transformação do financiamento dos processos eleitorais.
Na prática, o financiamento privado de eleições por empresas acaba resultando no
domínio do poder econômico sobre a definição da agenda política. Tal situação, somada
às eleições com listas abertas, resulta em campanhas eleitorais caras e com o predomínio
de uma visão personalista e patrimonialista da coisa pública.
O mandato de um parlamentar, por exemplo, acaba sendo visto como um patrimônio
pessoal do candidato eleito, e não como o resultado de uma luta política de uma
coletividade, o que resulta da colocação de temas de interesse social ou coletivo, como a
proteção do meio ambiente e a defesa dos direitos humanos, dentre outros, em segundo
plano.
O financiamento privado de campanhas eleitorais desequilibra a defesa de ideias, coloca o
interesse do capital em primeiro plano em relação à cidadania, e acaba facilitando o
exercício da corrupção.
Uma votação favorável ao pedido da ADI nº 4650 no STF, declarando a
inconstitucionalidade do financiamento empresarial em campanhas eleitorais seria um duro
golpe ao abuso do poder econômico em eleições. É exatamente por isso que é necessário
um acompanhamento mais cuidadoso da população na relação entre a demora no voto do
Ministro Gilmar Mendes, e a tramitação da PEC da “Contra-Reforma Política”. Tal Proposta
de Emenda Constitucional é conduzida pelo atual Presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), e conta com o apoio de partidos de direita, como o DEM e o PSDB, e está
sendo acelerada no Congresso Nacional. Apenas o PT e o PSOL se posicionaram
claramente contra o golpismo e caráter patrimonialista da proposta.
A PEC 352, conhecida como “PEC da Contra-Reforma Política” ou “PEC do Capital”, sustenta
o patrimonialismo do financiamento privado de campanhas e a criação do voto distrital que
enfraquece os partidos e favorece a visão personalista dos mandatos parlamentares. Ou
seja, é uma forma de mudar não mudando, mantendo a influência do poder econômico nas
eleições.
V – A ORGIA DAS PRIVATIZAÇÕES
De acordo com a Revista Carta Maior, estudos indicam que 1996 à 2002, no auge das
privatizações do Governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), cerca de US$ 126
bilhões foram desviados para o exterior pelo esquema do Banco do Estado do Paraná –
BANESTADO. Destes, apenas US$ 2,2 milhões foram repatriados pela Advocacia Geral
da União.
Os números do BANESTADO são uma parcela ínfima de todas as denúncias de corrupção
que circularam no Brasil na década de noventa durante a orgia privatista de FHC e Cia..
Com certeza, nessa época tivemos o ápice da corrupção do país, com a omissão, velada
dos órgãos de controle, e explícita dos meios de comunicação. Muitos dos problemas
ainda hoje enfrentados são frutos de esquemas criados naquela época, inclusive com os
mesmos protagonistas.
O caso dos ataques à Petrobrás é o exemplo mais gritante de todos, na medida em que
falamos de uma organização criminosa que admite atuar no submundo da administração
pública, pelo menos, desde 1997, com fortes indícios de atuação anterior, e com maiores
ramificações.
Já o caso da Ação Penal nº 470, conhecido popularmente como “mensalão”, é mera
continuidade de esquema criado em Minas Gerais, também no governo tucano. Para evitar
a cassação do mandato, e a continuidade do processo no rito sumaríssimo do Supremo
Tribunal Federal, o ex-Governador de Minas Gerais Eduardo Azeredo (PSDB) renunciou
ao cargo que ocupava no Senado.
Alberto Yousseff, transformado em herói pela mídia oligopolista, também era figura
presente no escandaloso caso do BANESTADO. Mas as investigações sobre os
esquemas no Banco Paranaense foram abafadas pelos mesmos grupos de comunicação
que hoje cobram investigações, o que, por si só, é prova flagrante de suspeição das
referidas empresas. Aliás, é a mesma mídia que hoje fecha os olhos para o escândalo do
HSBC, banco beneficiado pelo financiamento do PROER, durante o Governo de FHC,
quando adquiriu a parte do capital do extinto Bamerindus.
Segundo estudos realizados por pesquisadores da CEPAL, cerca de 12,3% do PIB na
época, ou R$ 111,3 bilhões, foram utilizados para cobrir gastos com o PROER, o que
incluiu, em menor monta, a recapitalização do Banco do Brasil, da Caixa Econômica
Federal, e de alguns bancos estaduais em virtudes das cíclicas crises cambiais do Plano
Real.
Deve ser destacado que o PROER não foi a primeira operação de salvamento financeiro
de Bancos realizadas no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Antes disso,
tivemos o escândalo envolvendo os Bancos Marka e Fonte-Cindam, que receberam cerca
de R$ 1,6 bilhão do Banco Central durante a desvalorização do real. O caso resultou até
na prisão do ex-presidente do Banco Central, Chico Lopes, e do famoso banqueiro de
cidadania italiana, Salvatore Cacciola.
Outro exemplo problemático é o da privatização do sistema de telecomunicações. Além
dos questionamentos sobre os valores e sobre os procedimentos, temos o caso da
divulgação de gravações de conversas telefônicas entre o ex-ministro das Comunicações,
Luis Carlos Mendonça de Barros (PSDB), e presidente do BNDES no governo de FHC,
André Lara Resende, onde ambos articulam o apoio a Previ, fundo previdenciário dos
funcionários do Banco do Brasil, para beneficiar o consórcio do banco Opportunity,
vinculado ao tucano Pérsio Arida. A negociata envolvia o módico valor de R$ 24 bilhões de
reais.
Mas o caso mais gritante de todos, e inquestionavelmente o mais representativo da orgia
das privatizações envolve a maior empresa mineradora da América Latina, e uma das
maiores do mundo (a segunda mais lucrativa em escala global), a Companhia Vale do Rio
Doce.
Em leilão realizado em 1997, 33% das ações de uma empresa avaliada em R$ 90 bilhões
de reais foram arrematados pelo Consórcio Brasil por apenas R$ 3,3 bilhões de reais, o
que permitiu ao mesmo assumir o controle acionário da empresa estatal. O consórcio
vencedor era formado pela privatizada Companhia Siderúrgica Nacional, pela
Bradespar/Bradesco, e pelo fundo de investimentos do funcionários do Banco do Brasil, o
Previ.
Além da onipresença do Previ, envolvida em diversos processos de corrupção, parte dos
recursos utilizados na compra da Vale do Rio Doce foram obtidos por meio de empréstimo
junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), resultando
em indícios de direcionamento do certame.
Resta destacar que, além das negociações de bastidores e da utilização contínua de
dinheiro público nas privatizações, as duas principais justificativas adotadas pelo tucanato
para realizar tais ações não se justificaram.
Primeiro, a dívida pública, que deveria sofrer abatimento com a utilização dos créditos das
vendas, não reduzir, ao contrário, mais do que triplicou nos oito anos de governo tucano,
fruto de uma política fiscal e financeira truculenta e confusa.
Segundo, conforme destaca Aloísio Biondi na ótima obra “O Brasil Privatizado”, o país
arrecadou cerca de R$ 85,2 bilhões de reais com as privatizações, mas perdeu mais de R$
87,6 bilhões de reais com a receita das empresas vendidas que não ingressaram nos
cofres públicos, especialmente da Vale. Assim, o resultado da orgia privatista foi um saldo
líquido negativa de R$ 2,4 bilhões de reais, que foram transferidos do patrimônio público
para o capital financeiro.
VI – O PODER DA MÍDIA OLIGOPOLISTA
A Constituição Federal garante imunidade tributária para livros, jornais, revistas e para o
papel onde estes materiais são impressos. Em tese, o objetivo desta medida é permitir
uma democratização do acesso à informação, à produção científica e à cultura.
Ocorre que o sonho da democratização da informação pela produção de informações por
uma “imprensa livre”, não se consolidou. Nem jornais, nem revistas e, muito menos livros,
com raras exceções, possuem preços acessíveis à maioria da população. Uma das
poucas exceções são as publicações de baixa qualidade destinadas às massas, em
tabloides como “Notícias Populares” e “Diário Gaúcho”, ambas publicações com desenho
editorial baseado em notícias sobre fofocas de televisão, esporte e violência, baseados no
marketing de comércio do vazio informativo e da ideologia dos grupos proprietários dos
jornais.
A simples publicação de um Edital ou de aviso de interesse público num jornal de grande
circulação em São Paulo ou Rio de Janeiro chega a custar a bagatela de R$ 10 mil reais,
tornando esses espaços inacessíveis para as organizações da sociedade civil. Por outro
lado, todos os jornais e revistas reservam grande parte do seu espaço para a publicidade.
Em algumas “revistas” temos a impressão de que existe mais espaço publicitário do que
material de comunicação.
Se a situação é grave na mídia impressa, muito pior é o resultado observado no rádio e,
especialmente, na televisão. Curiosamente, ambas as formas de comunicação são
derivadas de concessões públicas.
Os grandes grupos de comunicação também são detentores de excelentes espaços para a
publicidade e, como consequência, são um grande negócio. Em regra, articulam mídia
impressa, radiofônica, televisiva e, mais recentemente, eletrônica, o que permite um
domínio das informações e das rendas publicitárias, inclusive de fontes públicas de
patrocínio.
E aqui começa um grande problema. Se rádio e televisão são concessões, ou seja,
serviços públicos, por que não existe nenhum mecanismo de controle público ou social
sobre o financiamento destas empresas? Mais do que isto, qual é o motivo de tamanha
resistência das principais redes de comunicação contra a presença de qualquer tipo de
controle sobre as suas fontes de financiamento?
Talvez a resposta possa ser observada na guerra instaurada pelas Organizações Globo
em relação ao direito de transmissão dos jogos do campeonato de brasileiro, da Copa do
Mundo e das Olimpíadas. Apenas em 2012, a Globo pagou para os 12 maiores clubes do
futebol brasileiro mais de R$ 939 milhões de reais como direitos de transmissão. Este
dado foi obtido com base na publicação dos balanços financeiros dos clubes, pois os
contratos firmados pela Rede Globo com os clubes de futebol gozam de questionável
cláusula de confidencialidade.
Ao todo, estima-se que a empresa de comunicação tenha efetuado o pagamento aos
clubes da primeira divisão do campeonato brasileiro em 2012 mais de R$ 1,326 bilhão de
reais apenas em direitos de transmissão do campeonato brasileiro. Não constam neste
inventário as despesas com o custeio da programação e, muito menos, o lucro obtido pela
Rede Globo com um dos principais atrativos da sua grande de comunicação.
Estes dados demonstram que as empresas de comunicação são grandes negócios, e para
exercer as suas atividades se utilizam de concessões públicas sem nenhuma, ou
praticamente nenhuma, retribuição à população.
Diferentemente do que ocorre nas concessões de transporte, energia elétrica, água,
telefonia, dentre outras, não existe transparência nas planilhas de serviços, muito menos
espaço para que cada cidadão ou cidadã, verdadeiros detentores dos direitos das
concessões, possa saber o resultado obtido pelas empresas. Não se verifica o pagamento
de outorga, ou ainda o cumprimento de cláusulas de oferta mínima de conteúdo de
produção nacional.
A falta de transparência domina o mercado da comunicação, uma verdadeira “Caixa de
Pandora”, permite vários tipos de vantagens, inclusive a possibilidade de compra de
matérias e de notícias. Nunca poderemos esquecer dos mecanismos utilizados por Assis
Chateaubriand, o “Chatô”, para condicionar os fabricantes de fósforos a patrocinar os seus
jornais, através de uma verdadeira chantagem jornalística por meio de matérias que
afirmavam o perigo que representava a utilização do produto fabricado por estas
empresas, matérias que, por sinal, sumiram dos jornais quando do fechamento dos
acordos de publicidade.
Por fim, não podemos esquecer que a mídia representa muito mais do que dinheiro sem
transparência no uso e nas fontes de financiamento, mas grande poder de influência.
Vários dos ocupantes de assentos no Parlamento ou são donos, filhos, ou parentes de
donos de redes de televisão, como Aécio Neves (PSDB), por exemplo, ou funcionários das
empresas de comunicação.
No Rio Grande do Sul, dois dos três Senadores, Ana Amélia Lemos (PP) e Lasier Martins
(PDT), são funcionários da Rede Brasil Sul – RBS, uma das afiliadas da Rede Globo, e o
maior grupo de comunicação do sul do país.
Portanto, é necessário criar mecanismos para diminuir o poder que os meios de
comunicação exercem sobre a população, e o primeiro passo poderia ser dado com a
regulação e transparência do financiamento da mídia.
O segundo, já pensando adiante, poderia se basear na restrição da publicidade pública às
grandes redes, criando-se mecanismos como a divulgação de matérias de utilidade pública
nos referidos meios.
Garantir a transparência do financiamento das redes de comunicação é, sim, um
instrumento fundamental para enfrentar a corrupção econômica e política.
VII – CONSIDERAÇÕES FINAIS
A verdadeira origem da corrupção no Brasil, como vemos, está muito longe do conteúdo
dos noticiários de televisão. Ela se encontra entranhada em processos que são
apresentados como normais, na garantia de privilégios estamentais, na influência do poder
econômico nos processos eleitorais, no monopólio das informações, e na ausência de
transparência e de mecanismos de controle social em determinados setores.
Se nenhum destes problemas for realmente enfrentado pela sociedade, não haverá
verdadeiro combate à corrupção, mas simples demagogia ou golpismo, especialmente a
atual prática da mídia oligopolista brasileira.
.oOo.
O Sul21 reserva este espaço para seus leitores. Envie sua
colaboração para o e-mail op@sul21.com.br, com nome e profissão.
Sandro Ari Andrade de Miranda é advogado, mestre em ciências sociais.
Micropoderes
1. Segundo Michel Foucault, há uma rede de micropoderes, de poderes centrífugos,
locais, familiares e regionais, com uma variedade de conflitos, dotados de
articulações horizontais, mas onde também surge uma articulação vertical,
uma integração institucional dos poderes múltiplos tendente para um centro
político, para um poder centrípeto.

2. A sua teoria dos micropoderes, esboçada em L'Archéologie du Savoir, 1969,


alcançou estruturação na obra Surveiller et Punir, de 1975. Entre esses vários
micropoderes, importa salientar os chamados poderes difusos que actuam pela
persuasão e pela sedução. É o caso do poder dos meios de comunicação social,
dos mass media, dos suportes da difusão da comunicação, como é a imprensa, o rádio
e a televisão, a quem já chamam o quarto poder. A actividade de todos estes grupos
não se processa no vazio, mas antes dentro de um quadro estrutural e de acordo com
certas regras do jogo. Há, com efeito, uma estrutura de rede (network structure),
uma relação de relações, uma rede de micropoderes, um macrocosmos de
macrocosmos sociais. Há um poder político, um campo concentrado, uma governação
que trata de coordenar o processo de ajustamento entre os grupos, procurando um
ponto de equilíbrio entre as tensões.

3. Neste sentido, o Estado é perspectivado, não como uma coisa, mas como um
processo relacional, entre a sociedade civil, ou comunidade, e o aparelho de poder,
como o mero quadro estrutural de um jogo entre forças centrífugas e centrípetas,
que constituiriam uma rede de micropoderes, locais, regionais, familiares,
económicos e culturais, toda uma miríade de poderes periféricos, não
necessariamente hierarquizáveis como corpos intermediários, que se justaporiam, de
forma complexa, pelo que a soberania, na prática, seria divisível e, sobre o mesmo
espaço e as mesmas pessoas, não teria que haver o centralismo e o
concentracionarismo de uma única governação. O político é uma invenção marcada
por uma estratégia que globaliza várias micro-estratégias, onde há uma especial
forma de poder, o poder político, a síntese emergente, integrante de vários
micropoderes, onde uma multiplicidade de actores actua numa determinada
unidade, em quadros estruturais, em circuitos institucionalizados.

Retirado de Respublica, JAM

Publicado por Zé Rodrigo às 12:35:00 da tarde

Categorias temáticas: Para uma História das Ideias Políticas (de A a Z)


Evolução histórica do crime de corrupção
Amanda Malicia
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1
O presente artigo busca demonstrar a evolução histórica do crime de corrupção
desde suas primeiras aparições na antiguidade até os dias atuais.
SUMÁRIO: 1.Introdução; 2. Evolução histórica do crime de corrupção; e 3.
Bibliografia.

1. INTRODUÇÃO

A sociedade brasileira vive há muito tempo conformada com a prática da


corrupção passiva no setor público, todos crêem mais na impunidade, determinada por
um sistema maculado de velhos tempos, do que propriamente na justiça.

Aqui, no Brasil, terra de povo humilde, simples, alegre, a corrupção gerou até,
pode-se dizer, uma subcultura, uma etnia, muito se ouve falar na “lei de Gerson”, ou
no velho e bom “jeitinho brasileiro”, “cafezinho”, “cerveja”, “groja” etc. Com efeito, esse
delito passou a fazer parte do cotidiano do brasileiro.

Por outro lado, a corrupção é um dos grandes problemas do mundo


globalizado, ameaçando ao bom governo e a política idônea, desencoraja os
investimentos e mitiga o desenvolvimento econômico e humano.

Dos anos oitenta e noventa até os dias atuais, houve enxurradas de


denúncias e escândalos, desmascarando pessoas poderosas, políticos, envolvidos em
corrupção. Esse fenômeno é consequência, justamente da globalização, do
desenvolvimento tecnológico mundial; tal revelação trouxe luz aos olhos do povo, de
fatos que outrora eram tolerados, hoje são repugnados e vistos como violações de
direitos.

Desta feita, o povo passou a exigir atitudes do governo, emanar opiniões, a


participar do controle e fiscalizar a administração pública.

Assim sendo, estando absorvida no crime de corrupção passiva, a proposta


do presente artigo é por meio de incursões ao universo da corrupção, abordá-la desde
suas primeiras aparições na história até os dias atuais.

O panorama que envolve o tema, tão comentado pelos brasileiros atualmente,


principalmente pelo crise que assola nossa pais, e que de determinada maneira se
agrava por conta de reflexos da corrupção, não se esgota nos estudos aqui
apresentados e desenvolvidos, mas a verdadeira intenção é refletir, e mensurar a
extensão, que tal delito abrange e afeta. Como também, buscar a verdade
intimamente, através de uma auto-análise, se a ganância e a corrupção, são males
inerentes ao ser humano.

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO CRIME DE CORRUPÇÃO

2.1 Prólogo

Está enganado quem pensa, que esse mal que ataca e corrói a
administração pública, seja pertinente somente aos dias atuais. Desde remotas eras,
os povos o repudiam e combatem, na Grécia já era punido, em Roma um fragmento
da Lei das XII Tábuas cominava a pena de morte ao juiz corrompido. Mais tarde a Lex
Iulia repetundarum abrandou a punição, cominando multa, quatro vezes da soma
havida, e pena corporal.

No direito bárbaro, a corrupção também era um crime apenado, embora


se confundisse com a concussão e outros delitos contra o poder e a ordem pública.
Ademais, na Idade Média, considerava-se a corrupção dos funcionários em geral e a
dos juízes em particular, sob o nome de baratteria.

Em síntese, a corrupção é um delito conhecido pelo ser humano, desde


a antiguidade até os tempos atuais; que a seguir será demonstrada sua trajetória
desde seu surgimento.

2.2 Da Babilônia à Idade Média

Em acordo com os ensinamentos do Professor Edmundo Oliveira, o crime de


corrupção só vem a ser tratado especificamente no Direito Grego e, somente será
tipificado no Direito Romano. Não existem referências exclusivas dele no Código de
Hamurabi. No Egito somente alguns papiros permitiram a reconstrução dos costumes
de seu povo, por esse motivo, não se conhece nenhuma obra jurídica, certamente
vigoraram leis e houve codificações, mas permanecem desconhecidas.

No entanto, há indícios de que a corrupção era punida, pois diante de estudos


dos citados papiros, concluiu-se que o Faraó presidia o Poder Judiciário, auxiliado
pelos vizeres, uma espécie de juiz delegado, e ele prestava o juramento de punir os
corruptos, os desleais e os falsos.

Da mesma forma, os hititas e os hebreus não possuíam regras exatas para a


corrupção, mas “entre as passagens da Bíblia que aludem à corrupção no antigo
direito hebreu, podem ser citados: os capítulos 3 e 6 do Gênesis, o Salmo 51 (52 dos
hebreus), a Epístola de São Paulo aos Romanos, 1,18; 3,9 a 12”.

A história do Direito Grego divide-se em três épocas: a arcaica, a clássica e a


helenística. Sabe-se pouco do direito nas duas primeiras épocas, entretanto, a fase
clássica é marcada pela aparição da cidade (estado), a chamada pólis e, a última é
subscrita pela morte de Alexandre o Grande, a divisão do maior império conquistado,
surgindo então, devido à presença de várias etnias, uma pluralidade de juízes e
tribunais.
Como informa Gaudemet, citado por Edmundo Oliveira, o crime de corrupção
que perturbava o funcionamento regular da justiça, se apresentava, como crime
próprio do funcionário público contra a administração pública, em três tipos: peculato,
corrupção e abuso de autoridade. No entanto, mais tarde surge um crime específico
de corrupção de juízes, dito suborno e, contra esse as leis aplicavam penas
gravíssimas, inclusive a de morte.

Finalmente foi no Direito Romano, que o crime de corrupção teve um


tratamento pormenorizado, com o objetivo de evitar a decadência moral, caso que
implicou o desenvolvimento das leis penais contra a corrupção, de cunho preventivo,
chegando, em determinada época, a constituir-se em crime de lesa-majestade.

Houve também a ampliação do conceito de funcionário público, atingindo o


ápice no Digesto, codificação que após a reforma de Justiniano, passou a ter força de
lei.

Barataria era a expressão que significava corrupção no Direito Medieval, o


Código Visigótico, elaborado entre os anos de 649 à 672, foi a consolidação das leis
romanas fundidas com os costumes visigóticos. Em 1256, o Rei Afonso X reuniu as
leis antigas, dando forma à Las Siete Partadas, em que se apresentavam vários tipos
de barataria.

O Direito Francês admitiu a variante romana para punir a corrupção, quer no


âmbito civil ou criminal, estipulando penas que variavam de suspensão, banimento ou
até mesmo a pena de morte.

Ademais, foi em Portugal, a partir do século XV que surgiram as Ordenações:


a Afonsina, a Manoelina, a Sebastiânica e por fim a Filipina, iniciada por Filipe I e
promulgada por Filipe II de Portugal no ano de 1603. O crime de corrupção contido no
título LXXI do Livro V, obviamente com forte influência do Direito Romano, as penas
poderiam chegar, desde a perda do cargo e pagamento de multa, até a pena de morte.

Enfim, no período medieval, o direito era deliberativo na aplicação da pena de


morte, executadas de formas cruéis como o uso da fogueira, o afogamento, o
soterramento, a mutilação, o enforcamento, uso da guilhotina, dentre outros, com o
escopo específico de intimidação.

A propriedade pública do Direito Penal é exclusiva, exercido em defesa do


Estado e da religião. O arbítrio judiciário, ainda assim, gera cerca da justiça penal uma
expectativa de insegurança, dubiedade e funesto pavor, conforme pensamento de
Julio Fabbrini Mirabete.

2.3 O Iluminismo

No decorrer do Iluminismo que se consagra o denominado Período


Humanitário do Direito Penal, iniciado por Cesar Bonesana, Marquês de Beccari,
nascido em Florença, em 1738, filósofo determinado pelos princípios inculcados por
Rousseau e Montesquieu, publicou a obra Dei delliti e delle pene (Dos delitos e das
penas). Um pequeno livro que promoveu a reforma das leis penais, tornando-se
símbolo do movimento liberal acerca do desumano quadro penal, então vigente.
Inspirado na concepção do Contrato Social de Rousseau propõe uma nova
motivação para a justiça penal, que deve ser útil e política, porém, ser sempre limitada
pela lei moral, a fim de evitar o arbítrio da legislação anterior.

As ideias iluministas refletiram em toda Europa, até no Brasil, principalmente


após a Independência do país. Os princípios pregados em sua obra, básicos do Direito
Penal moderno, muitos dos quais, foram adotados pela Declaração dos Direitos do
Homem, da Revolução Francesa.

2.4 Da Colônia à Independência do Brasil

No período colonial, estiveram em vigor no Brasil as Ordenações Afonsinas


(até 1512) e Manuelinas (até 1569), sendo substituídas pelo Código de São Sebastião
(até 1603), passando então, para as Ordenações Filipinas, que traziam em sua
essência o direito penal dos tempos medievais.

As Ordenações Afonsinas foram consideradas um verdadeiro e completo


código, abarcando quase todas as matérias da administração de um Estado, porém,
para a legislação brasileira o que interessou foi naquilo que influenciou na elaboração
das Ordenações Manuelinas, estas sim que foram a legislação do início do regime
colonial brasileiro.

Com a formação dos primeiros núcleos de colonização, nos sistemas de


capitanias hereditárias como poder político, ensejaram o aparecimento de inúmeros
pólos geradores de corrupção.

O livre arbítrio, a ambição, o espírito de aventura e a distância da metrópole,


desobrigavam os homens portugueses das limitações jurídicas e morais, havendo
muitos abusos e injustiças. Ao passo que isso acontecia, propagavam-se os casos de
corrupção, tal era a avidez com que as pessoas aqui chegavam para enriquecer,
atraídas pela fama de abundância da nova colônia.

Já as Ordenações Filipinas, em seu livro V, previam várias situações de


punição à corrupção tanto dos funcionários como dos agentes do reino. No entanto,
não havia limites para a descrição do fato criminoso e da pena a ser aplicada,
revelando a cautela do legislador em salvaguardar a coroa de qualquer eventual
prejuízo, através da intimidação pelas penas graves e cruéis impostas, ficando a
critério do juiz a decisão.

Proclamada a Independência, previa a Constituição de 1824 que se


elaborasse nova legislação penal, fundada nas sólidas bases da justiça e da equidade
e, em 16-12-1830, era sancionado o Código Criminal do Império.

2.5 Código Penal de 1830

O Código Criminal do Império foi projetado pelo jurista Bernardo Pereira de


Vasconcelos, embasado pelas premissas da própria constituição que o determinou,
princípio da irretroatividade da lei penal, princípio da igualdade de todos perante a lei
e, ainda o princípio da intranscendência.
Após debates na Câmara e no Senado, foi sancionado em 16-12-1830 e
entrou em vigor em 08-01-1831, mesmo assim, ainda seguiram várias alterações,
inclusive no que se referia aos escravos, diante de sua emancipação em 13-05-1888.

Os crimes de corrupção na época (peita, suborno e concussão), foram


previstos no Título V - Dos crimes contra a boa Ordem, e Administração Pública. Na
secção II, os artigos 130, 131 e 132 tratavam da “peita”:

Art. 130. Receber dinheiro, ou outro algum donativo; ou


aceitar promessa directa, e indirectamente para praticar, ou
deixar de praticar algum acto de officio contra, ou segundo a
lei.

Penas - de perda do emprego com inhabilidade para


outro qualquer; de multa igual ao tresdobro da peita; e
de prisão por tres a nove mezes.

A pena de prisão não terá lugar, quando o acto, em


vista do qual se recebeu, ou aceitou a peita, se não tiver
effectuado.

Art. 131. Nas mesmas penas incorrerá o Juiz de Direito,


de Facto, ou Arbitro, que por peita der sentença, posto que
justa seja.

Se a sentença fôr injusta, a prisão será de seis mezes


a dous annos; e se fôr criminal condemnatoria, soffrerá o
peitado a mesma pena, que tiver imposto, ao que condemnára,
menos a de morte, quando o condemnado a não tiver soffrido;
caso, em que se imporá ao réo a de prisão perpetua.

Em todos estes casos a sentença, dada por peita, será


nulla.

Art. 132. O que der, ou prometter peita, será punido com


as mesmas penas impostas ao peitado na conformidade dos
artigos antecedentes, menos a de perda do emprego, quando o
tiver; e todo o acto, em que intervir a peita, será nullo.

A secção III, nos artigos 133 e 134, usa-se a expressão “suborno”:

Art. 133. Deixar-se corromper por influencia, ou peditorio


de alguem, para obrar o que não dever, ou deixar de obrar o
que dever.
Decidir-se por dadiva, ou promessa, a eleger, ou propôr
alguem para algum emprego, ainda que para elle tenha as
qualidades requeridas.

Penas - as mesmas estabelecidas para os casos da peita.

Art. 134. Todas as disposições dos artigos cento e trinta,


cento trinta e um, e cento trinta e dous, relativas aos peitados,
e peitantes, se observarão a respeito dos subornados e
subornadores.

A “concussão” está prevista na secção IV, nos artigos 135 e 136:

Art. 135. Julgar-se-ha commettido este crime:

1º Pelo empregado publico, encarregado da arrecadação,


cobrança, ou administração de quaesquer rendas, ou dinheiros
publicos, ou da distribuição de algum imposto, que directa, ou
indirectamente exigir, ou fizer pagar aos contribuintes, o que
souber não deverem.

Penas - de suspensão do emprego por seis mezes a dous


annos.

No caso, em que o empregado publico se aproprie o que


assim tiver exigido, ou o exija para esse fim.

Penas - de perda do emprego; prisão por dous mezes a


quatro annos, e de multa de cinco a vinte por cento do que tiver
exigido, ou feito pagar.

2º Pelo que, para cobrar impostos, ou direitos legitimos,


empregar voluntariamente contra os contribuintes meios mais
gravosos, do que os prescriptos nas leis; ou lhes fizer soffrer
injustas vexações.

Penas - de suspensão do emprego por seis a dezoito


mezes; e as mais, em que incorrer pela vexação que tiver
praticado.

O que para commetter algum destes delictos, usar de


força armada, além das penas estabelecidas, soffrerá mais a
de prisão por tres mezes a dous annos.

3º Pelo que, tendo de fazer algum pagamento em razão


do seu officio, exigir por si, ou por outrem, ou consentir que
outrem exija de quem o deve receber algum premio,
gratificação, desconto, ou emolumento não determinado por lei.
Penas - de perda do emprego; prisão por dous mezes a
quatro annos, e de multa de cinco a vinte por cento do valor
exigido, que restituirá se o tiver recebido.

4º Pelo que deixar de fazer pagamento, como, e quando


dever por desempenho do seu officio, a não ser por motivo
justo.

Penas - de suspensão do emprego por um a tres mezes, e


de multa de cinco a vinte por cento do que individamente deixar
de pagar.

5º Pelo que, para cumprir o seu dever, exigir directa, ou


indirectamente gratificação, emolumento, ou premio não
determinado por lei.

Penas - perda do emprego; prisão por dous mezes a


quatro annos, e de multa de cinco a vinte por cento do valor
exigido, que restituirá, se o tiver recebido.

O que em qualquer dos casos mencionados nos numeros


primeiro e segundo se figurar munido de ordem superior, que
não tenha.

Penas - de prisão por seis mezes a um anno, além das


mais estabelecidas, em que incorrer.

"Art. 136. As pessoas particulares, encarregadas por


arrendamento, ou por outro qualquer titulo, de cobrar, e
administrar rendas, ou direitos, que commetterem algum dos
crimes referidos no artigo antecedente, incorrerão nas mesmas
penas, como se fossem empregados públicos.

Embora, tendo a reputação de ser um código avançado e merecedor de


elogios na época, nota-se que as garantias ainda não eram o ponto forte dos
dispositivos legais, uma vez que a interpretação orientava-se pelo subjetivismo e, pela
terminologia aberta contida em cada um dos artigos, no tocante aos crimes de
corrupção.

A vigência deste código penal perdurou até a proclamação da


República, em 1890.

2.6 Código Penal de 1890

O Código Penal de 1890 foi elaborado por Baptista Pereira como


conseqüência da Proclamação da República, sendo sua proposta apresentada no
prazo de três meses. Logo, foi ele alvo de duras críticas pelas falhas que apresentava
devido à celeridade de sua promulgação, vindo a sofrer várias modificações por leis.
Diante do inconveniente resultado pelo Código Penal de 1890 e, em virtude
da edição de inúmeras leis extravagantes, tornou-se complexa a aplicação sistemática
do código.

Assim, foi solicitado que fossem todas reunidas na Consolidação das Leis
Penais, pelo Decreto no. 22.213, de 14-12-1932, com vigência até 31-12-1941.

2.7 Código Penal de 1940

Em 01-01-1942 entrou em vigor o Código Penal de 1940 (Decreto-lei nº. 2.848


de 07-12-1940), que ainda é nossa legislação penal fundamental. Na vigência da
Constituição de 1937 e, sob o projeto de Alcântara Machado, nasce uma legislação
autoritária do Estado Novo, inovando ao incluir diversos tipos penais não existentes
nas legislações anteriores.

A nova Lei Penal, também foi alvo de muitas críticas, pois muitos a viam como
autoritária, principalmente com relação ao sistema de penas e medidas de segurança,
porque com a adoção do sistema duplo binário, as medidas de segurança acabaram
por se tornar sem definição de tempo.

Todavia, esse caráter não se perpetuou, em razão das modificações na Parte


Geral deste Código, que vieram com as leis 6.416 de 1977 e a 7.209 de 1984, adotou-
se uma nova dogmática, tendo como oriente, o princípio da culpabilidade em todo seu
projeto.

Inovador tratamento foi dado às matérias com a teoria limitada à


culpabilidade, perfilhada no erro do tipo disposto no artigo 20, que exclui o dolo, mas
pune por culpa e, no erro sobre a ilicitude do fato contido no artigo 21, que isenta de
pena quando inevitável, porém, se evitável, permite-se a diminuição da pena.

No que tange a Parte Especial, que trata dos crimes em espécie,


principalmente dos crimes contra a administração pública, que interessa falar, também
sofreu inúmeras modificações, da legislação extrapenal, ao longo do tempo.

Foram acrescentados artigos ao texto do Código com a finalidade de


abranger situações novas criadas pela criminalidade moderna, que atingiam bens e
valores da administração pública, inclusive de ações praticadas por funcionários
públicos.

Em 1991, através do Decreto 325 de 01/11/1991, disciplinou a comunicação


ao Ministério Público do crime funcional contra a ordem tributária, com relação ao
enriquecimento ilícito de agentes públicos.

De forma inclusive preventiva, em 1993 a Lei 8.666 de 1993, tipifica condutas


criminosas relacionadas à licitação e contratos da Administração Pública; nesse
mesmo ano, o Decreto 978, supriu as exigências com relação à transparência por
parte dos servidores e agentes públicos.

Mister salientar, o Decreto 4.410 de 2002, o qual promulgou a Convenção


Interamericana Contra a Corrupção de 29 de março de 1966, reconhecendo que a
corrupção arruína a legalidade das instituições públicas, atentando contra a sociedade,
a ordem moral e a justiça, bem como contra o desenvolvimento integral da
humanidade.
A Lei 10.467 de 2002 tratou de incluir um capítulo no Código Penal sobre os
crimes praticados por particular contra a Administração Pública Estrangeira.

Nesse passo, o problema da corrupção levou a ONU a compor a Convenção


das Nações Unidas contra a Corrupção (UNCAC), firmada em 09 de dezembro de
2003, no México, data que passou a ser o Dia Internacional contra a Corrupção; no
Brasil, a UNCAC passou a vigorar em 14/12/2005, após ratificação.

Não se pode olvidar que existe uma preocupação mundial, acerca da


corrupção, e a legislação brasileira vem desempenhando papel prestimoso, no que se
refere ao combate à corrupção, meios e instrumentos para destruí-la, estão sendo
postos freqüentemente no ordenamento pátrio.

2.8 Crime de Corrupção na Atualidade

Em tempos presente, vigora ainda o Código Penal de 1940, mantendo o crime


de corrupção passiva na mesma posição e status de outrora.

Por sua vez, nas últimas décadas houve muitas mudanças sociais e
transformações tecnológicas com destaque na esfera da informatização, lado a lado, a
globalização obteve um crescimento avultoso, fatores conclusivos de uma
criminalidade com novo caráter.

Resultaram desta mutação socioeconômica, no âmbito da Administração


Pública, novos delitos, tais como redes criminosas, abuso de poder, escutas ilegais,
lavagem de dinheiro, espionagem política, que passaram a figurar ao lado do crime
primitivo de corrupção, revelando a complexidade do fenômeno.

Assim sendo, os fatores geradores da corrupção são múltiplos, listar a todos é


tarefa impossível, tendo em vista que a sua natureza é ilegal e secreta, pois, os
agentes nela envolvidos não registram seus atos e nem os valores desviados.

A princípio a teoria da causa da corrupção era de que, decorria de falha moral


por parte do agente público. Atualmente, estudiosos determinam várias motivações,
dentre as quais as seguintes: intervenção estatal excessiva, má governança das
instituições públicas, excesso de regulamentação e normas, centralização de decisões
burocráticas e o excesso de poder discricionário de burocratas e políticos.

Convém destacar, que o sujeito passivo deste delito é a Administração


Pública, no entanto, as conseqüências recaem de uma forma geral sobre os cidadãos,
afligindo efetivamente os direitos humanos e a dignidade da pessoa, podendo atingir
os peculiares fundamentos da democracia.

Em linhas gerais, pode-se concluir que a corrupção é um fenômeno


difuso, dinâmico, normalmente relacionado ao crime organizado, que atua na
clandestinidade e, corrói a estrutura do poder estatal, ameaçando diretamente a
sociedade e a Democracia.
3. BIBLIOGRAFIA

[1] OLIVEIRA, Edmundo. Crimes de Corrupção. 2.ed. Rio de Janeiro:


Forense, 1994.

[2] NUNES, Antonio Carlo Ozório. Corrupção, Ética e Moralidade


Administrativa. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2008.

[3] BRASIL. Leis. Disponível em:


<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LIM/LIM-16-12-1830.htm

[4] MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal: Parte Geral. v.I.
24.ed. São Paulo: Atlas, 2007

[5] HABIB, Sergio. Brasil: Quinhentos anos de corrupção. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris Editor (SAFE), 1994



Autor

Amanda Malicia

Estudante de direito na Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Textos publicados pela autora


UMA BREVE HISTÓRIA DA CORRUPÇÃO NA ANTIGUIDADE

A corrupção ativa e passiva não é um “privilégio” da geração atual. É antiga e sem data
certa de nascimento ou de naturalidade. O antigo império romano, por exemplo, está
recheado de exemplos que nos mostram o quanto tal crime era praticado, de modo que
não somente o governo como a própria população se adaptaram a essa realidade - que,
por sinal, acompanhou o nascimento, apogeu e declínio do grande império.

Rogamos a atenção dos leitores para os casos que iremos dispor logo abaixo, os quais só
reforçam a ideia de que o amor pelo dinheiro e pela vida fácil acompanha a humanidade
há milênios.

Em outra ocasião falamos que a divisão setorial e hierárquica na administração pública,


mais ou menos como o concebemos hoje tem origem na antiga Grécia, mais precisamente
na Atenas clássica. Roma “modernizou” tal prática e pretendeu manter um serviço
público eficiente, suficientemente capaz de atender à demanda social-administrativa do
governo.

Embora alguns imperadores não tenham medido esforços no sentido de combater a


corrupção (foi lá, por exemplo, que surgiram os livros contábeis e a obrigação do governo
prestar contas de suas receitas e gastos, bem como foi na velha Roma que surgiram os
diários oficiais, cuja finalidade - dentre outras - era controlar os gastos e as atitudes
tirânicas dos governadores), o que se viu no vasto Império foi o crescente número de
casos de corrupção, cujos protagonistas iam do mais baixo ao mais alto escalão.

Os militares, a quem cabia o dever legal de prender eventuais criminosos, encabeçavam,


ao lado da elite imperial, a relação dos grandes protagonistas dessa mazela. Nos campos,
por exemplo, eles exigiam que os povoados lhes garantissem certa quantia, de sorte que
o montante fosse pago continuamente, como se fosse uma gratificação institucional.

Eram os mesmos militares que exigiam, ainda, uma espécie de dízimo de tudo o que era
produzido no campo. Assim, os trabalhadores eram obrigados a levar para celeiros
públicos parte do trigo colhido para o sustento familiar.

O corporativismo entre os próprios militares era algo notório: para desfrutar de uma
“folga”, de um repouso, bastava o subordinado comprar tal direito, ofertando ao seu
chefe o que este julgasse suficiente para o caso em questão.

Atribui-se principalmente à corrupção o fato de haver – em tempos de paz - considerável


baixa no quadro de efetivos nos vários regimentos, pois, em vez de estar em serviço no
horário de serviço, o soldado “dava” uma escapulida, a fim de praticar atos alheios a sua
tarefa militar, dentre as quais namorar e praticar roubos. Isto mesmo: o dinheiro obtido
nos roubos era utilizado, em boa parte, para comprar o próprio chefe.

Tornou-se, assim, um ciclo vicioso, tão vicioso que ao perceber que um soldado estava
enriquecendo, seus superiores ordenavam-lhe várias tarefas, pois sabiam que, para se
livrar de tais obrigações, o soldado lhes pagaria maior quantia pelo repouso, pelo não
cumprimento das exigências então impostas.

A corrupção era uma prática comum, tão comum que (sem exageros) acabou se tornando
um modismo, algo natural, algo esperado por quem adentrasse ou precisasse do serviço
público. O funcionário romano – pasmem – estava tão habituado ao referido crime que,
para praticar um simples ato institucional, exigia algo de quem estivesse precisando do
serviço público. Houve, inclusive, tabelamento de preços dos atos sujeitos à corrupção.

Ao ingressar no serviço público, o recém-servidor deveria (por costume) dar uma gorjeta
ao seu chefe imediato. Era uma espécie de aviso de como a coisa funcionava.

Os governadores das províncias eram os mais agraciados com o corrompido sistema. Não
hesitavam ao oferecerem vultosas propinas aos inspetores imperais, que, por sua vez,
também não pensavam duas vezes e acabavam recebendo o fruto da corrupção.

Um desses govarnadores (após ser processado por crime de corrupção - uma raridade),
em uma carta endereçada à amante, exclama: “Alegria1 Alegria! Venho a ti livre de
minhas dívidas, depois de colocar à venda a metade de meus administrados”.
Sêneca, abordando o tema, diz que pilhar as províncias como governador era “o caminho
senatorial para o enriquecimento”. Do ponto de vista financeiro, era preferível ser
governador ao cargo de senador. O poder central, na maioria das vezes, fazia vistas
grossas, desde, é claro, que recebesse a parte que lhe tocava.

A realidade visível ganhou espaço na literatura, e os poetas eróticos revelavam, em seus


escritos, o esperado desejo feminino de contemplar seu marido deixar o lar por
determinado tempo para enriquecer em uma província mais distante.

Cícero, famoso romano por sua erudição, depois de um ano como governador de
província, voltou para casa milionário. E não escondeu sua façanha. Ele, que se tornou
senador não pelo fato de ascender de família tradicional, mas pela enorme capacidade
oratória (o que engradecia o Senado), representa, na atualidade, aqueles que, tendo um
histórico de pobreza em sua vida juvenil, não pensam mais do que uma vez e sacam os
cofres públicos, movidos por razões alheias à ética social e constitucional.

Uma breve história da corrupção na


antiguidade
EM ANTIGUIDADE, ARTIGO, CORRUPÇÃO, CURIOSIDADES, ESTUDOS, HISTÓRIA, RESUMOS - AS 19:37 -
SEM COMENTÁRIOS
A corrupção ativa e passiva não é um “privilégio” da geração atual. É antiga e
sem data certa de nascimento ou de naturalidade. O antigo império romano,
por exemplo, está recheado de exemplos que nos mostram o quanto tal crime
era praticado, de modo que não somente o governo como a própria população
se adaptaram a essa realidade - que, por sinal, acompanhou o nascimento,
apogeu e declínio do grande império.

Rogamos a atenção dos leitores para os casos que iremos dispor logo abaixo, os quais só
reforçam a ideia de que o amor pelo dinheiro e pela vida fácil acompanha a humanidade há
milênios.

Em outra ocasião falamos que a divisão setorial e hierárquica na administração pública, mais
ou menos como o concebemos hoje tem origem na antiga Grécia, mais precisamente na
Atenas clássica. Roma “modernizou” tal prática e pretendeu manter um serviço público
eficiente, suficientemente capaz de atender à demanda social-administrativa do governo.
Embora alguns imperadores não tenham medido esforços no sentido de combater a corrupção
(foi lá, por exemplo, que surgiram os livros contábeis e a obrigação do governo prestar contas
de suas receitas e gastos, bem como foi na velha Roma que surgiram os diários oficiais, cuja
finalidade - dentre outras - era controlar os gastos e as atitudes tirânicas dos governadores), o
que se viu no vasto Império foi o crescente número de casos de corrupção, cujos protagonistas
iam do mais baixo ao mais alto escalão.

Os militares, a quem cabia o dever legal de prender eventuais criminosos, encabeçavam, ao


lado da elite imperial, a relação dos grandes protagonistas dessa mazela. Nos campos, por
exemplo, eles exigiam que os povoados lhes garantissem certa quantia, de sorte que o
montante fosse pago continuamente, como se fosse uma gratificação institucional.

Eram os mesmos militares que exigiam, ainda, uma espécie de dízimo de tudo o que era
produzido no campo. Assim, os trabalhadores eram obrigados a levar para celeiros públicos
parte do trigo colhido para o sustento familiar.

O corporativismo entre os próprios militares era algo notório: para desfrutar de uma “folga”, de
um repouso, bastava o subordinado comprar tal direito, ofertando ao seu chefe o que este
julgasse suficiente para o caso em questão.

Atribui-se principalmente à corrupção o fato de haver – em tempos de paz - considerável baixa


no quadro de efetivos nos vários regimentos, pois, em vez de estar em serviço no horário de
serviço, o soldado “dava” uma escapulida, a fim de praticar atos alheios a sua tarefa militar,
dentre as quais namorar e praticar roubos. Isto mesmo: o dinheiro obtido nos roubos era
utilizado, em boa parte, para comprar o próprio chefe.
Tornou-se, assim, um ciclo vicioso, tão vicioso que ao perceber que um soldado estava
enriquecendo, seus superiores ordenavam-lhe várias tarefas, pois sabiam que, para se livrar de
tais obrigações, o soldado lhes pagaria maior quantia pelo repouso, pelo não cumprimento das
exigências então impostas.

A corrupção era uma prática comum, tão comum que (sem exageros) acabou se tornando um
modismo, algo natural, algo esperado por quem adentrasse ou precisasse do serviço público.
O funcionário romano – pasmem – estava tão habituado ao referido crime que, para praticar
um simples ato institucional, exigia algo de quem estivesse precisando do serviço público.
Houve, inclusive, tabelamento de preços dos atos sujeitos à corrupção.

Ao ingressar no serviço público, o recém-servidor deveria (por costume) dar uma gorjeta ao seu
chefe imediato. Era uma espécie de aviso de como a coisa funcionava.

Os governadores das províncias eram os mais agraciados com o corrompido sistema. Não
hesitavam ao oferecerem vultosas propinas aos inspetores imperais, que, por sua vez, também
não pensavam duas vezes e acabavam recebendo o fruto da corrupção.

Um desses govarnadores (após ser processado por crime de corrupção - uma raridade), em
uma carta endereçada à amante, exclama: “Alegria1 Alegria! Venho a ti livre de minhas dívidas,
depois de colocar à venda a metade de meus administrados”.

Sêneca, abordando o tema, diz que pilhar as províncias como governador era “o caminho
senatorial para o enriquecimento”. Do ponto de vista financeiro, era preferível ser governador
ao cargo de senador. O poder central, na maioria das vezes, fazia vistas grossas, desde, é
claro, que recebesse a parte que lhe tocava.

A realidade visível ganhou espaço na literatura, e os poetas eróticos revelavam, em seus


escritos, o esperado desejo feminino de contemplar seu marido deixar o lar por determinado
tempo para enriquecer em uma província mais distante.

Cícero, famoso romano por sua erudição, depois de um ano como governador de província,
voltou para casa milionário. E não escondeu sua façanha. Ele, que se tornou senador não pelo
fato de ascender de família tradicional, mas pela enorme capacidade oratória (o que
engradecia o Senado), representa, na atualidade, aqueles que, tendo um histórico de pobreza
em sua vida juvenil, não pensam mais do que uma vez e sacam os cofres públicos, movidos
por razões alheias à ética social e constitucional.

Um texto de Robério Fernandes, bases do livro "A história da vida privada", volume 1.

CORRUPÇÃO
“[Do lat. corruptione.] Substantivo feminino. 1. Ato ou efeito de corromper;
decomposição, putrefação. 2.Fig. Devassidão, depravação, perversão. 3. Fig. Suborno,
peita. [Var.: corrução; sin. ger.: corrompimento.] (Dicionário Aurélio)”.
“Pela justiça o rei estabelece a terra, mas o amigo de subornos a transtorna”.
Provérbios 29:4

“Melhor é o pouco, com justiça, do que grandes rendas, com injustiça”. Provérbios
16:8

Solidário às idéias do professor Cláudio Weber Abramo, Diretor da ONG Transparência


Brasil, sou contrário à opinião daqueles que afirmam que o combate à corrupção é
uma causa perdida, porque a tendência ao desvio de recursos públicos seria um dos
componentes da natureza humana.
Na antiguidade, a corrupção referia-se aos costumes. Esperava-se que os cidadãos
fossem austeros, que comprovassem que colocavam a coisa pública acima do interesse
privado.
Na Roma antiga, foi a corrupção que matou a forma republicana. De acordo com o
professor Renato Janine Ribeiro (USP), a corrupção grega ou romana é o cerne da
liberdade moderna. A corrupção moderna diz respeito à apropriação privada de
fundos públicos, refere-se diretamente ao dinheiro, ou ao tesouro público; A
corrupção perde a importância central, torna-se uma espécie de furto (um roubo sem
violência). O professor Janine afirma que também existe uma corrupção pós-moderna,
sendo essa cometida por pessoas honestas. São pessoas de bem, que não usam o
dinheiro para o próprio bolso, mas sabem que seu partido perderá a eleição se não
tiver um caixa 2, por exemplo.
Acredito que no Brasil (e em qualquer sociedade) a corrupção possui causas bem
definidas, exigindo-se apenas medidas de ordem prática no campo gerencial.
Potencialmente, a corrupção ocorre em qualquer interação entre um agente público e
um agente privado, tais interações possuem causas também variadas.
No Brasil, uma das principais origens da corrupção é a facilidade que os governantes
têm para nomear pessoas para cargos de confiança. Isso tem efeitos graves sobre
licitações, porque as pessoas que são indicadas para gerir o Estado são nomeadas
arbitrariamente, segundo a vontade dos próprios dirigentes públicos. Nosso Presidente
da República nomeia, direta ou indiretamente, cerca de 30.000 (trinta mil) pessoas, no
governo de São Paulo e no distrito Federal são 20.000 (vinte mil) pessoas. A farra
também está presente na quantidade imensa de assessores de deputados e senadores,
que são nada mais que cabos eleitorais pagos com nosso dinheiro – dinheiro do
contribuinte utilizado para o exercício de atividades de interesse particular.
Na Grã-Bretanha, o primeiro ministro nomeia apenas cerca de 300 (trezentas) pessoas.
O chanceler alemão e o presidente francês nomeiam cerca de 500 (quinhentas)
pessoas. Nos Estados Unidos, o presidente nomeia exatamente 9.051 (Nove mil e
cinqüenta e uma) pessoas, sendo a metade indicada para cargos virtuais (honoríficos),
nos quais o indicado não recebe salário ou detém qualquer tipo de poder.
Nossos chefes do Executivo não reinam e jamais governam, os cargos mais
importantes pertencem aos partidos que os ajudaram a Elegê-los. Isso contribui para
que o Legislativo não tenha função. Inseridos de maneira determinante, direta e
indiretamente, na Administração Pública, os “legisladores” fazem um pacto de não
tomar nenhuma atitude contrária ao governante ou que impeçam a aprovação de
iniciativas do Executivo (Na Câmara Municipal de Porto Alegre, na Legislatura passada,
80% das iniciativas do prefeito José Fogaça foram aprovadas pelos vereadores).
Uma das conseqüências desse mecanismo perverso é o enfraquecimento do
parlamento, perdendo as suas funções. Isso afasta dele as melhores pessoas, as
pessoas íntegras não vão querer macular seus nomes. Destarte, os ímprobos destroem
a credibilidade das instituições e, muitas vezes de maneira cínica e arrogante,
gerenciam a máquina pública como se fosse extensão do patrimônio pessoal.
Outro facilitador da corrupção em nosso país é a não regulamentação do direito ao
acesso às informações sobre o funcionamento do Poder Público. Faltam mecanismos
que possibilitam o efetivo acesso à informação (Princípio da Publicidade - artigo 37,
caput, CR/88).
A dificuldade do próprio Estado para se auto-fiscalizar corrobora significativamente
para os autos índices de corrupção em nosso país. A principal causa desse problema
refere-se à aplicação das leis. A Administração Pública, em todas as áreas, deverá estar
equipada com instrumentos precisos, que determinem a qualidade da informação
presente em cada decisão. Um exemplo preciso, em minha opinião, refere-se a
Compras ou Contratações de Obras Públicas que, normalmente, representam um
antro de corrupção e ineficiência que se caracteriza pela incompatibilidade entre a
necessidade ou utilidade pública do objeto da compra ou serviço, os termos do edital e
a efetiva qualidade após a entrega e recebimento (A fiscalização é precária e, às vezes,
tendenciosa).
A corrupção possui causas objetivas, e os caminhos para combatê-la são conhecidos.
Precisamos fazer um diagnóstico dos problemas. Normalmente, as causas são
extremamente simples, quase sempre de natureza gerencial. Deveria ocorrer um
levantamento sistemático das principais áreas de risco, com adoção de medidas que
possibilitam prevenir, identificar e punir os responsáveis.
O uso de ferramentas tecnológicas corrobora de modo significativo para reduzir os
índices de corrupção. Um bom exemplo é a utilização de câmeras fotográficas nos
sinais de trânsito, que possibilita a prova efetiva do ato de infração, reduzindo-se
drasticamente o índice de possibilidades de ocorrências de prevaricação.
A política brasileira, nas últimas décadas, produziu respostas institucionais e meios que
visam o combate à corrupção: Lei 8666/93 (Licitações e Contratos), Lei Complementar
n° 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal); As Instituições de Controle sofreram
modificações estruturais e de amplitude (Alterações no Tribunal de Contas da União –
TCU, criação da Controladoria Geral da União (CGU); Exige-se, atualmente, a prestação
de contas a todos os gestores de recursos públicos.
Entretanto, os Controles Institucionais, as ferramentas tecnológicas e outros métodos
preventivos ou corretivos para que sejam realmente eficazes exigem que todos os
envolvidos sejam, indubitável, e essencialmente, honestos.

“Não torcerás a justiça, nem farás acepção de pessoas. Não tomarás subornos, pois o
soborno cega os olhos dos sábios, e perverte as palavras dos justos. Segue a justiça, e
só a justiça, para que vivas e possuas a terra que o Senhor teu Deus te dá”.
Deuteronômio 16:19-20

Fonte das Idéias Principais: Jornal Estado de Minas, Caderno Pensar Brasil, 10 de
outubro de 2009.

UMA BREVE HISTÓRIA DA CORRUPÇÃO DA IGREJA ANTIGA E


MEDIEVAL Publicado Em 19:32 0 Comentários É lógico que a Igreja se
corrompeu em parte e nalguns momentos de sua longuíssima história, mas a
corrupção por si só não pode desmerecer toda a instituição: precisamos
entender bem quais foram as principais fontes dessa corrupção e, com base
nelas, verificar se o problema está na própria instituição e naquilo em que ela
se baseia ou na influência de poderes externos. A proposta do breve estudo
que segue é vislumbrar essas fontes - tire as suas próprias conclusões. A
riqueza e o poder da Igreja: o cristianismo nasceu de modo espetacularmente
explosivo. Um andarilho hebreu, que perambulou três anos numa região de
poucos quilômetros quadrados, promoveu uma rapidíssima e incontrolável
revolução que, em pouco tempo, tomou todo o Mediterrâneo, embora
duramente repelida pelas autoridades políticas e religiosas tradicionais.
Finalmente, cerca de três séculos depois da ressurreição de Seu fundador e
mais exemplar praticante o cristianismo fez o Império Romano curvar-se.
Constantino acreditava ter vencido de seu concorrente para o trono do maior
império do mundo, Mexênico, por intermédio do Deus dos cristãos e, uma vez
oficializando a nova religião, concedeu privilégios e riquezas para a
instituição que representava-O, afim de obter favor de Iavé – e é claro que os
cristãos aceitaram esse apoio imperial, já que padeciam há trezentos anos de
miséria e perseguição. A Igreja se encontrou numa posição de grande poder.
Uma vez que o Império Romano dividiu-se em Império Romano Ocidental e
Império Romano Oriental, tendo o imperador habitando na capital Oriental, o
Ocidente acabou tendo como a mais potente liderança o bispo de Roma.
Quando o Império Romano Ocidental caiu, por advento das invasões bárbaras,
476 d.C., o poder do imperador fora dissolvido e a aristocracia romana fugira
para o campo, afim de proteger-se com seus exércitos particulares. A cidade
de Roma, reduzida há poucas dezenas de milhares, via-se sem proteção e,
então, com apoio do povo, aflito, o Bispo de Roma preencheu esse vazio,
protegendo, com os recursos da Igreja, a população dos frequentes ataques. A
Igreja Ocidental, Católica Romana, logo tornou-se a potência política máxima
da Europa Ocidental, gozando de grande prestígio e riqueza, primeiramente
conquistados de modo inocente, mas ampliados com base, inclusive, em
corrupção. A riqueza e o poder da Igreja Ocidental só acresceram com suas
iniciativas nas áreas de educação e produção de alimento: diante da destruição
do conhecimento antigo da parte dos bárbaros, a Igreja fundou as instituições
de ensino para preservar e acrescentar ao conhecimento que restara –Carlos
Magno, século VII, fundou as primeiras escolas com o intuito de divulgar a
cultura greco-romana, Fonte: Grandes Guerras, Guerras Medievais, Aventuras
na História nº8-, e, mediante a fome que alastrara principalmente nas
primeiras décadas de caos pós-queda, começou a financiar e controlar as
maiores plantações da Europa. Mais adentro na Idade Média alguns mosteiros
cristãos também tornaram-se assombrosamente ricos, embora as origens dessa
riqueza sejam, de modo geral, lícitas: as comunidades clericais eram
autossuficientes e produziam mais do que consumiam, o que deu início a um
potente comércio de excedentes, principalmente de lã de ovelha, tido como
mais uma forma de sustento para financiar a manutenção das estruturas, a
fundação de novos mosteiros, a construção de hospitais, alojamentos, a
distribuição de alimento e tratamento aos pobres, a preservação e reprodução
dos livros das grandes bibliotecas... Fontes: Os Cristãos, Tim Dowley; Uma
Breve História do Cristianismo, Geoffrey Blainey. A Igreja e a violência:
como já foi dito, o povo de Roma, diante da queda do Império Ocidental,
ficou sem proteção mediante os invasores, e a Igreja, grande potência restante,
ouvindo os clamores civis, tomou os rumos bélicos para defender-se e
defende-los. É lógico que, uma vez tomada a iniciativa militar, a Igreja nunca
mais perdeu o poderoso braço que o exército representa, sempre mais e mais
alimentado conforme a corrupção se alastrou. Dentro da questão militar,
temos, ainda, as Cruzadas da Idade Média. Diz-se que a Igreja usou de força
militar para aumentar seu território e riquezas, porém, na realidade, segundo
se lê no livro Os Cristãos, de Tim Dowley, o Islã, desde seu surgimento, no
século VII, iniciou um movimento militar de conquista política e religiosa em
terras cristãs e após 400 anos de vitórias, isso sem forte intervenção da Igreja,
já tinha em mãos dois terços do mundo cristão, que via-se em perigo de
extinção. Cidades importantíssimas da cristandade já haviam sido perdidas,
como Jerusalém, onde Cristo fora crucificado e ressuscitara, Alexandria e
Antioquia, duas das maiores fortalezas teológicas da cristandade. No final das
contas, as Cruzadas só foram conclamadas pelo Papa Urbano II quando a
maior cidade cristã do mundo, Constantinopla, se via terrivelmente ameaçada
pelos árabes e alguns séculos depois de uma incursão muçulmana ter
marchado até o centro da França – um dos precedentes foi a Batalha de
Poitiers, em 732 d.C., quando os sarracenos marcharam até o coração francês,
um dos mais sólidos bastiões do mundo cristão, sendo rechaçados por Carlos
Martelo, avô de Carlos Magno. Com base nessas informações, após uma
leitura do livro As Grandes Batalhas da História, Volume 1, editora Larousse,
constatamos que, a princípio, as Cruzadas se deram como modo de o mundo
cristão continuar existindo politicamente, uma forma de resistência e
revanche, retomando aquilo que fora perdido. O fato é que as críticas severas
às Cruzadas são frutos, principalmente, da mentalidade atual, sendo que,
segundo o livro Uma Breve História do Cristianismo, de Geoffrey Blainey,
nos séculos passados esse movimento cristão era visto como legítimo. É claro
que, como sempre, a corrupção não demorou a se instalar e os excessos de
violência encolerizaram as marchas cruzadas. Sobre a Inquisição, outro
assunto polêmico, devemos reconhecer o vil comportamento da Igreja,
corrompida, porém, à princípio, a proposta da Inquisição era aliviar os juízos,
não ampliá-los: os governos seculares costumavam tratar de julgar com as
próprias mãos aqueles que ofendiam a fé cristã, mas o faziam de modo
tendencioso, parcial e severo, exigindo a interferência da Igreja, que
requisitou o direito de erguer um tribunal para analisar de modo mais
criterioso os crimes – a verdade é que poucas pessoas chegaram a morrer por
advento desse famoso tribunal. O caso mais famoso da inquisição foi o de
Galileu Galilei (1564-1642), que é pregado como sendo “o juízo da Igreja
sobre a razão”, porém, na realidade, a história foi bem diferente: Galileu,
como já dito, era cristão fervoroso, incrustando a fé em Deus na sua ciência,
como ele mesmo dissera: "A Matemática é o alfabeto que Deus usou para
escrever o Universo”. A questão é que, embora Nicolau Copérnico (1473-
1543), clérigo cristão, tenha sugerido o Heliocentrismo, a ciência do período
de Galileu era fundamentalmente aristotélica, concebendo a Terra como o
centro do Universo, Geocentrismo, e, sendo assim, a maioria das autoridades
científicas seculares e cristãs discordaram do grande astrônomo. O problema é
que Galileu não somente era persistente, mas, também, desrespeitoso,
desferindo ofensas às autoridades seculares e cristãs por se fecharem a novas
possibilidades, o que o levou a ser encaminhado para o Tribunal da Santa
Inquisição, já que ofendera o próprio papa, que o condenou à prisão
domiciliar, obrigando-o a ficar o restante de sua vida morando nas mansões de
seus amigos íntimos. Outra questão que devemos observar é que Galileu
tentou impor seu pensamento, mediante uma tradição de séculos, o que,
também por prevenção, não querendo lançar fora ideias já bem conhecidas por
uma novidade questionável, fez as autoridades em questão resistirem. Fonte:
Por que a Ciência não Consegue Enterrar Deus, John Lennox. Outro aspecto
histórico que manchou o nome da Igreja é a escravidão. É verdade que os
espanhóis e portugueses que primeiro desbravaram a América eram cristãos
por consequência lógica de terem vindo da Europa, mas suas atitudes não
caracterizavam vontades da Igreja em si, bem mais preocupada em alcançar e
catequizar os nativos do que em destroça-los. A verdade é que os únicos
defensores dos ameríndios e negros da América Colonial eram os missionários
cristãos, com monges hostilizando abertamente a prática da escravidão, em
concordância com a Igreja de Roma, cujo líder, Papa Paulo III, em 1537 d.C.,
lançou uma bula –Sublimis Deus- contra a escravidão. Mais tarde, o
protestante William Wilberforce (1759-1833) iniciou um forte movimento
antiescravagista, que resultou na abolição do tráfico de escravos. Fontes: Uma
Breve História do Cristianismo, Geoffrey Blainey; Apolgética Cristã, Israel
Belo de Azevedo. Vimos anteriormente que os primeiros cristãos
colecionaram simpatizantes por seu respeito às pessoas das mais diversas
etnias, culturas e religiões, mas não foi mencionado o fato de os cristãos
revolucionarem no bom trato aos escravos e às mulheres, sendo que ambos,
segundo o pensamento romano, não eram cidadãos, não mereciam crédito e,
tampouco, respeito, sendo considerados inferiores aos homens livres –para os
judeus as mulheres eram tidas de modo semelhante. Geoffrey Blainey, em seu
livro, Uma Breve História do Cristianismo, faz questão de lembrar de Paulo,
quando o mesmo afirma que “diante de Cristão não há judeu nem grego,
escravo nem livre, macho nem fêmea”. Esse aspecto da fé cristã se caracteriza
ao vermos o já citado William Wilberforce, homem branco, lutando pela
liberdade dos negros, ou quando vemos Martin Luther King Jr. (1929-1968),
um pastor negro que deu a vida, literalmente, na luta contra o racismo. E para
os críticos de plantão, que insistem em tachar Adolf Hitler (1889-1945), líder
do partido nazista e um dos maiores assassinos da história, de cristão, sendo
que o mesmo disse que “ou se é cristão, ou se é alemão” –Uma Breve História
do Cristianismo, Geoffrey Blainey-, lembrando que Hitler, embora de berço
cristão, odiava o cristianismo, formulando o nazismo como uma religião neo-
pagã, lembro da família cristã Ten Boom que durante a Segunda Guerra
refugiou em sua casa judeus perseguidos, salvando a vida de mais de 800
deles e, com isso, perdendo quatro de seus membros; ou, ainda, Martin
Niemöller (1892-1984), pastor luterano declaradamente antinazista. Posso
fechar esse tópico lembrando de figuras como Francisco de Assis (1182-
1226), que abriu mão de uma vida de confortos para viver entre os pobres,
ajudando-os e evangelizando-os –certa vez pretendeu ir ao Oriente Médio para
evangelizar e converter os muçulmanos antes de os cruzados chegarem para
massacrá-los-, sua amiga Clara de Assis (1194-1253), que também fugiu da
riqueza para dedicar-se à simplicidade cristã, Telêmaco, monge do século V
que morreu no Coliseu de Roma ao interferir numa luta de gladiadores, e
William Carey (1761-1834), um sapateiro inglês, protestante, que dedicou a
sua vida para viver entre os indianos. Fontes: Uma Breve História do
Cristianismo, Geoffrey Blainey; Os Cristãos, Tim Dolwey; Apologética
Cristã, Israel Belo de Azevedo. A proibição da Bíblia pela Igreja: quando o
barbarismo tomou a Europa, destruindo os grandes centros culturais de Roma,
como suas bibliotecas, museus e teatros, e levando centenas de milhares de
colonos analfabetos das tribos invasoras para as terras mediterrâneas, quase
ninguém tinha condições de tomar o Texto Sagrado e usufruir de suas
mensagens. Diante de povos de raiz pagã e massivamente analfabetos, a
Igreja, à princípio, achou saudável o acesso à Bíblia apenas ao clero e aos
nobres, que conseguiam pagar por uma cópia manuscrita do volumoso livro,
entendendo que era melhor deixar aqueles que já se viam doutrinados nas
veredas cristãs e que saberiam ler corretamente o texto do que permiti-lo aos
pagãos que, dando os primeiros passos no aprendizado da leitura, certamente
compreenderiam mal a Palavra do Altíssimo. Essa iniciativa, em parte lícita,
porém, deu origem ao monopólio teológico e científico de que a Igreja viria a
usufruir no cerne da Idade Média, culminando em seus conhecidos abusos de
poder. Para o povo comum, já apresentado com seu analfabetismo, as imagens
e esculturas que foram sendo colocadas nas igrejas cristãs serviam, de modo
eficiente, como ilustrações das mensagens cristãs sobre Cristo e os mártires,
levando-os ao conhecimento daquilo que, doutra forma, não conseguiriam ter
acesso por serem desletrados. É claro que, com o passar do tempo, esses
memoriais cristãos, que também serviram para atrair os pagãos,
profundamente embasados no culto à esculturas de ídolos, acabaram
extrapolando a barreira da doutrina e memória e passaram a tornar-se objetos
de culto. Coisa semelhante aconteceu com o culto aos mortos: no início da Era
Cristã era comum os cristãos se reunirem para culto nas catacumbas, onde
estavam sepultados seus mártires, coisa que, com o tempo, fora se
aprofundando com a antiteológica adoração aos mortos, principalmente
quando concebiam os túmulos dos apóstolos e dos Pais da Igreja. Fonte:
Curso Vida Nova de Teologia básica - Vol. 4 - Panorama da história da igreja.
Poder centralizado: embora já citada anteriormente, essa questão merece um
tópico específico. Vejamos: com a queda de Roma o poder se viu
fragmentado, não havia uma liderança para a sociedade Ocidental. A Igreja,
então como poder máximo no Ocidente, tomou as rédeas da situação, fazendo-
o com o apoio do povo, porém, mediante uma sociedade profundamente pagã,
houve uma certa imposição da verdade cristã, como forma de proteger a única
real força romana que restara na Europa Ocidental, procurando preservar a
cultura e a religião tradicional – o que só se intensificara com o levante de um
colosso árabe alguns séculos depois da queda da capital do Império.
Corrupção: sabemos que toda a Europa Medieval, quase sem exceção, era
cristã, porém também sabemos que nem todos os cristãos são Igreja, isso do
ponto de vista teológico. Ao longo da história muitos cristãos que não eram
Igreja cometeram atrocidades em seu nome. A questão que fica, no final das
contas, é: o quanto a Igreja corrompeu a si mesma e o quanto o mundo secular
se infiltrou em suas portas e a corrompeu? Sabe-se que num mundo em
desordem, fome e ignorância, fazer parte da mais poderosa instituição,
detentora do conhecimento preservado e das grandes plantações e criações,
era algo muito atraente, isso tudo além do prestígio político. Por isso não
demorou para a Igreja se ver infiltrada de aproveitadores gananciosos e
corruptos. Já falei sobre o enriquecimento de alguns mosteiros, que vendiam
os excessos de sua produção, o que podia atrair aqueles que procuravam uma
boa vida. A corrupção moral da Igreja, não somente em termos de corrupção
financeira, também se fortaleceu com a ideia dos mosteiros que, ao mesmo
tempo em que promoviam um ambiente de santificação, distante do mundo
profano, isolaram seres humanos cheios de desejos em ambientes fechados,
com seus instintos aprisionados, o que não demorou para levar muitos ao
homossexualismo e a pedofilia. O que segue, com base no livro Os Cristãos,
Tim Dowley, é uma mostra de quando o mundo secular dominou e corrompeu
a Igreja: enquanto a Igreja Oriental prosseguia sob o domínio do Império
Romano Oriental, a Igreja Romana, no Ocidente, reinava sozinha, ambiente
propício para abusos. No início da Idade Média os reinos bárbaros eram
muitos e desunidos, porém, com o tempo, alguns começaram a se unir e somar
forças, como aconteceu com o reino dos Francos, cujo grande líder foi Carlos
Magno, promotor de uma grande reforma na Igreja e o primeiro dos reis
seculares que obteve poder suficiente para exigir o controle absoluto sobre a
Igreja que se encontrava em suas áreas de domínio, tornando-se uma
autoridade eclesiástica superior ao papa em seu reino –mesmo nunca tendo
feito parte do clero. Nessa época o Papa Leão III, difamado por má conduta,
foi destituído do poder por aristocratas romanos e padecia de contínuas
ameaças de morte, porém o grande Carlos o salvou, preservando sua
autoridade papal, porém com a condição de se submeter ao controle do rei
franco. Verifique as incoerências: um rei secular se torna líder espiritual de
seu povo e passa a controlar os passos do próprio papa, utilizando-o como
uma ferramenta política, obrigando uma igreja corrupta a se corromper ainda
mais. Com o tempo o poder papal passou a sofrer interferências cada vez
maiores dos poderes seculares, que viam na Igreja uma fonte de poder ou uma
inimiga. Um detalhe interessante é que os poderes seculares conseguiram
interferir de tal forma na Igreja que, com imensa pressão, uma família de
nobres romanos conseguiu colocar um rapaz de 18 como papa, João XII, a fim
de angariar mais poder para si. Nesse caos alguns papas também foram
assassinados, como Leão V, João X e Estêvão VIII. O tal de João XII, que não
tinha nenhuma aspiração eclesial, moveu-se por interesse e fez com que a
Igreja caísse ainda mais nas mãos do mundo secular, por exemplo: quando o
rei alemão Oto I conseguiu vencer os magiares, exigiu o titulo de imperador
do Sacro Império Romano e João XII logo lhe ofereceu, com o intuito de que
esse poderoso rei lhe salvasse das garras de seus inimigos italianos. Nessa
época o imperador do Sacro Império dominava o papado, escolhendo ou
retirando os papas que lhe convinham segundo seus interesses - fica evidente
que a Igreja era uma ferramenta totalmente secular nessa altura, pois o
imperador era superior aos papas e escolhia, como lhe parecia melhor, quem
ocuparia o cargo papal. Tudo se resumia, por fim, em poder, controle,
riquezas. A Igreja se corrompeu, mas o mundo secular a subjugou e depravou
ainda mais. Não tardou e a Igreja se levantou numa espécie de reforma. Um
dos papas reformadores foi Gregório VII, que reclamou para si o poder
absoluto sobre tudo e todos, pois revitalizou a ideia de ser sucessor do
apóstolo Pedro. Dessa forma, Gregório comprou briga com os principados
seculares. O imperador romano-germânico, então, levantou-se em oposição,
mas logo foi excomungado pelo papa e perdeu muito prestígio, implorando o
perdão papal, que lhe foi concedido, mas, uma vez perdoado, tomou o
controle da Igreja Alemã e, ignorando outra excomunhão, expulsou Gregório
de Roma e o exilou no sul da Itália. Aproximadamente um século depois de
Gregório, outro papa soberbo tomou o poder, Inocêncio III, considerando-se o
monarca papal de toda a Europa Ocidental. Depois de tomar uma série de
medidas, Inocêncio subjugou os grandes príncipes europeus. Nesse clima
totalmente depravado é que são lançadas as Cruzadas, ao lado disso a Igreja
começou a cobrar altos dízimos. O jogo político prosseguiu. Falemos, então,
de Bonifácio VIII (1294-1303 d.C.), o papa que colocou as pretensões papais
no limite, almejando um poder que exacerbava as suas condições. Com esse
espírito, Bonifácio desafiou o rei Filipe IV, da França, questionando de quem
era o poder da igreja galicana. Filipe não temeu e tratou, pela força militar, de
desafiar, prender e humilhar o papa. Tal rei, agora com o domínio sobre a
Igreja, procurou eleger o francês Clemente V como papa e transferiu a sede
papal de Roma para Avignon, onde, rodeada pela França, seria mais
cuidadosamente vigiada e orientada pelo rei francês. A Igreja, agora sob o
domínio francês, foi usada pelo rei como arma para assegurar o domínio da
França como potência máxima da Europa na época, o que prejudicou os
cristãos de outras nações. Pulando o Cisma do Ocidente, vamos para os papas
da Renascença, no século XV: adequando-se às novas visões de mundo e
doutrinados pelas ideologias da época, vários papas secularizados, sem fervor
religioso, tomaram o poder. Pio II, Inocêncio VIII, Alexandre VI, Júlio II e
Leão X eram homens talentosos, bem educados, afinados com as novidades
do mundo, mas pouco religiosos. Foi no cenário que se construiu a partir disso
que a Reforma Protestante tomou forma. Encerro esse tópico aqui,
questionando-o novamente: a culpa da corrupção da Igreja é de Cristo,
somente da Igreja ou também do poder secular, do homem corrompido?! A
desonestidade da oposição: existe uma coisa nessa história de que os
protestantes devem se envergonhar e pedir perdão: o exagero. É lógico que os
reformadores estavam eufóricos com a Reforma e extrapolaram um pouco em
suas atitudes, mas isso não justifica o exagero de suas acusações contra a
Igreja Medieval, criando uma imagem terrível para o cristianismo que perdura
até hoje. Henrique VIII (1491-1547) decidiu se desvencilhar do poder romano,
afim de justificar seu anseio por divorciar-se de Catarina de Aragão.
Enfurecido com a postura do papa e incentivado por Thomas Cromwell, ele
começou a atacar frontalmente os mosteiros ingleses, que eram considerados
os pilares centrais da tradição católica, mas, ainda, eram atrativos pelo fato de
que detinham muitas terras e riquezas que o rei poderia confiscar. Henrique,
então, num único golpe, conseguiu fazer transbordarem os cofres ingleses e
derrubar os centro do poder católico inglês: Thomas tratou de nomear uma
comissão pata investigar os mosteiros e em pouco tempo conseguiu reunir
pilhas de relatórios sobre corrupção financeira, espiritual e sexual, que,
entregues à Coroa, obrigaram os mosteiros menores a entregar tudo o que
tinham ao rei - não tardou e os mosteiros maiores também o fizeram. Com as
riquezas Henrique comprou o apoio da nobreza e formou a igreja inglesa, a
Anglicana, da qual ele era o líder máximo. O detalhe é que nem todos os
mosteiros destruídos eram corruptos: muitos relatórios eram questionáveis,
duvidosos, e fizeram com que muitas instituições excelentes e valorosas
fossem irremediavelmente destruídas, com suas terras e comunidades
arrasadas e dispersas, fazendo a Inglaterra perder um inestimável patrimônio
espiritual, cultural e arquitetônico. O Iluminismo foi outro grande destruidor
de mosteiros, o século XVIII foi terrível para a Igreja Católica. Começamos
com Maria Teresa, arquiduquesa da Áustria, que tratou de limitar os
privilégios clericais. Seu filho, José II seguiu o exemplo da mãe, levando a
política iluminista mais a sério: confiscou bens monásticos sem o
conhecimento do papa e aboliu todas as casas monásticas que não tinham uma
função "útil", ou seja, que fossem voltadas à vida espiritual. Essa postura
levou ao fechamento de cerca de 400 mosteiros no império e uma perda de
aproximadamente 40.000 monges e monjas. A Igreja da Áustria, porém,
sofreu pouco se comparada à Igreja da França revolucionária. Antes da
Revolução há pouca evidência de que a Igreja francesa era demasiado
corrupta e, tampouco, que estava em declínio, porém os franceses já
começavam a frequentar menos as igrejas, estimulados por "livres-
pensadores" céticos. O monstro foi crescendo, adormecido, e quando a
Revolução estourou em 1789 um intenso movimento anticlerical se alastrou
com violência. Não demorou e o governo francês confiscou e vendeu as terras
da Igreja e atacou todas as ordens religiosas mendicantes e contemplativas. Os
mosteiros que tinham algum fim "útil" puderam persistir, mas mais nenhum
cidadão poderia fazer votos monásticos, ou seja, esperava-se que todos os
monges morressem de velhice e os mosteiros sucumbiriam. A brutalidade
contra a Igreja aumentou, conforme a Revolução se intensificou, fazendo
fugirem do país algo entre 30 e 40 mil monges - dos que ficaram, milhares
foram assassinados. Em 1795 a liberdade da Igreja começou a retornar e os
católicos franceses puderam voltar a ir à missa, que reiniciou em residências
particulares e ministrada por sacerdotes vestidos com roupas leigas. Mas isso
durou pouco, o Diretório francês logo retomou a política antirreligiosa e a
impôs aos países sob o domínio da França: Itália, Suíça, Renânia e Bélgica. A
República Cisalpina, norte da Itália, dissolveu seus mosteiros e a República
Romana proibiu-os, porém o catolicismo ainda tinha forças: levantes
populares se consumaram na Bélgica, Suíça e Roma, pedindo o retorno da
religião. - Detalhe para os movimentos populares pedindo a religião
católica. A Espanha, em 1820, também tentou derrubar a Igreja Católica,
fechando os seus mosteiros e expulsando as suas ordens religiosas. Enquanto
isso, na Rússia, Nicolau I fechou cerca de 500 mosteiros. Fonte: Os Cristãos,
Tim Dowley. Como podemos perceber, na História Humana, por ser humana,
existem maldades e falhas em toda a instituição e pessoa, mas não podemos
desprezar o todo, apenas porque alguns em determinados períodos não
possuíam caráter ou mal compreenderam aquilo que afirmavam seguir.
Analisemos a Bíblia. Natanael Pedro Castoldi Álbum:

Leia mais em: http://entreomalhoeabigorna.blogspot.com.br/2013/07/uma-


breve-historia-da-corrupcao-da.html

Parábola da Corrupção: Nietzsche e a


Décadence
António Bento · quarta, 3 de dezembro de 2014 · UBI
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«Esta liberalidade moral é um dos melhores sinais do nosso tempo. Se nos


deparamos com casos em que ela forçosamente falta acreditamos estar diante
de uma doença (o caso de Carlyle em Inglaterra, o caso de Ibsen na Noruega, o
caso do pessimismo de Schopenhauer em toda a Europa). Se existe algo que nos
reconcilia com a nossa época é a grande dose de imoralidade que esta permite,
sem que por isso se pense menos bem dela. Muito pelo contrário! O que faz a
superioridade da cultura sobre a incultura? Por exemplo, do Renascimento
sobre a Idade Média? – Apenas uma pequena coisa: a grande quantidade de
imoralidade que se lhe concede. Daqui se segue que todos os picos da evolução
humana devam surgir, aos olhos do fanático moral, necessariamente como
um non plus ultra da corrupção. Basta pensar no julgamento de Savonarola
sobre Florença, no julgamento de Platão sobre a Atenas de Péricles, no
julgamento de Rousseau sobre a sociedade de Voltaire, no julgamento dos
alemães contra Goethe.»
A Vontade de Poder, §
430

Estas são palavras de Friedrich Nietzsche, num texto amaldiçoado pelas


circunstâncias que ditaram a sua publicação após a morte do autor: a
entrega/depósito/venda dos manuscritos de A Vontade de Poder nos círculos
anti-semitas alemães por sua irmã e “testamenteira”, Elisabeth Förster-
Nietzsche. A posição de Nietzsche neste assunto é digna de um resumo: o que
efectivamente move o moralista que em todas as épocas condena fanaticamente
a corrupção como “escândalo dos escândalos” não são os instintos morais, mas
os instintos de decadência traduzidos em fórmulas de moral. Digamos que toda
a incerteza dos instintos se lhe apresenta inevitavelmente como «corrupção».
Todavia, na genealogia dos valores morais efectuada pelo filósofo alemão não é
a corrupção que é a maldição do homem, mas o amolecimento e o moralismo:
«Os grandes momentos de cultura foram sempre, do ponto de vista moral,
épocas de corrupção» (VP, § 31). Nietzsche distingue quatro sinais ou sintomas
de corrupção: 1. a superstição; 2. o laxismo; 3. o refinamento da crueldade; 4. a
corrupção dos costumes por suborno e por traição.

Antes da descrição deste quatro sinais, dá-se ao leitor o quadro da «décadence»


em que a «corrupção» aparece e opera. Toma a palavra “o cabeça de dinamite”:
«O fenómeno da décadence é necessário para o desenvolvimento e para o
progresso da vida, e não temos meios para suprimir esse fenómeno. Antes pelo
contrário: a razão exige que lhe devolvamos os seus direitos. Tudo o que se
considerou como remédio contra a degenerescência foram apenas paliativos
contra alguns dos seus efeitos. Não se suprime a caducidade através das
instituições. Nem a doença. E também não o vício. A decadência: o vício – o
carácter vicioso; a enfermidade – o estado enfermiço; o crime – a criminalidade;
o celibato – a esterilidade; o histerismo – a fraqueza da vontade… Toda a luta
moral contra o vício, o luxo, o crime, e mesmo contra a doença, aparece como
uma ingenuidade, como uma coisa supérflua: - não há emenda/reforma (contra
o remorso). Em si mesma a décadence não é algo que se deva combater: ela é
absolutamente necessária, e própria de cada época e de cada povo. Os métodos
de tratamento, psicológicos e morais, não mudam a marcha da décadence, nem
a entravam, porque são fisiologicamente iguais a zero» (VP, §§ 72 e 73).

Nietzsche não procura julgar se a corrupção é «boa» ou «má», mas pergunta-se


de que é que ela é um sintoma. Para Nietzsche a corrupção é um determinado
estado que uma sociedade experimenta necessariamente de tempos a tempos. O
filósofo chama a esta «superstição» que emerge com a corrupção um «pensar
livre de segunda ordem». Assim que a superstição ganha força e intervém no
conjunto da sociedade a fé nos antigos valores morais passa para segundo lugar,
de modo que uma sociedade supersticiosa é forçosamente aquela em que já há
muitos indivíduos e em que a apetência pelo individual e o primado do
indivíduo sobre o rebanho se tornam potencialmente a regra: «O indivíduo
necessita de uma legislação própria, de uma arte e de uma astúcia para a
autoconservação, auto-elevação e auto-redenção» (Para Além do Bem e do Mal,
§ 262). Comparado com o «homem religioso», o «homem supersticioso» é
muito mais «pessoa», afirma Nietzsche, isto é, este torna-se mais independente
e quer afirmar sem entraves o seu «direito de indivíduo». Sob esta perspectiva,
o cinismo dos corruptos não é mais do que um irónico sinal de distância face a
tudo o que é geral, abstracto, colectivo, face, enfim, ao que ele chama «génio da
espécie». Em segundo lugar, nos tempos corruptos acusa-se de «laxismo» a
sociedade onde a corrupção ganha terreno. Todavia, a substituição das antigas
virtudes bélicas e cívicas pelas novas comodidades da vida sob a forma de
paixões privadas não é um mal em si mesmo e, muito menos, um amolecimento
da sociedade: «É mesmo provável que, nas condições de corrupção, o poder e a
violência da energia de um povo sejam agora maiores que nunca e que o
indivíduo gaste agra mais do que outrora teria podido fazer – é que então não
era suficientemente rico» (A Gaia Ciência, § 23). Em terceiro lugar, nas épocas
de corrupção, como bem viu Benjamin Constant, o comércio e toda a sorte de
tráfico sobrepõem-se à mera força bruta da guerra: «O comércio não é mais do
que uma homenagem prestada à força do possuidor pelo aspirante à posse. É
uma tentativa de obter de bom grado aquilo que já se não pretende conquistar
pela violência. Um homem que fosse sempre o mais forte jamais teria a ideia do
comércio. A experiência demonstra-lhe que a guerra o expõe a diversas
resistências e perigos, levando-o a recorrer ao comércio, ou seja, a um meio
mais suave e seguro de comprometer o interesse do outro naquilo que convém
ao seu próprio interesse. A guerra nasce do impulso, o comércio do cálculo» (A
liberdade dos antigos comparada à liberdade dos modernos, pp. 10-11).

Todavia, contrariando a ingénua ideia liberal de que o «esprit de commerce»


suplanta definitivamente o «esprit de conquête», para Nietzsche as épocas de
corrupção não são mais doces nem mais brandas do que as épocas de guerra,
antes se tornam mais e mais refinadas no uso político que dão à crueldade. É
precisamente nessas épocas que é criada a maldade; é nelas que o prazer na
maldade cresce e frutifica. Por conseguinte, as épocas de corrupção são
necessariamente épocas trágicas: «O modo de ferir e de torturar os outros com
palavras e olhares atinge o seu máximo desenvolvimento em épocas de
corrupção. Os homens da corrupção mostram-se espirituosos e caluniadores.
Eles sabem que existe outro género de assassinato além daquele que exige o
punhal ou o golpe de mão. Eles sabem que tudo o que é bem dito é acreditado»
(ibidem). Em quarto lugar, nas épocas de corrupção a venalidade, a prática do
suborno e a traição atingem o auge, pois o amor do indivíduo ao seu ego é agora
muito mais poderoso do que o amor à pátria ou à comunidade, envelhecidas,
desgastadas, empurradas para o declínio e a morte. Daí que nelas se viva apenas
para o presente imediato e que os indivíduos que aí operam se deixem
corromper apenas “por hoje”, relegando e procrastinado o exercício da antiga
virtude para o futuro. «Corrupção» – ajuíza Nietzsche em jeito de conclusão –
«não passa de uma palavra injuriosa para os outonos de um povo» (ibidem).

Estes «outonos de um povo» são necessariamente cruéis, não igualitários,


elitistas, neles reinando o desprezo pela multidão e o horror ao conformismo.
Todavia, a corrupção, como «expressão da anarquia que ameaça os instintos e
abala o edifício das paixões que aspiram à vida tem uma aparência
completamente diferente, conforme os tipos de vida em que se mostra» (Para
Além do Bem e do Mal, § 258). A corrupção permite diferenciar os organismos
em função do modo como estes respondem às tentações que as exigências da
vida oferecem aos homens. Como escreveu George Orwell em 1984 a respeito do
seu herói capturado no inferno transparente do Big Brother: «Tudo quanto
sugerisse corrupção enchia-o sempre de uma louca esperança: – “Odeio a
pureza, odeio a virtude! Só desejo que não haja no mundo uma única alma
virtuosa. Quero toda a gente corrupta até à medula”» (1984, pp. 130-131).
- See more at: http://www.urbi.ubi.pt/pag/13313#sthash.hEUbGNYd.dpuf

Causas estruturais da corrupção no Brasil

A corrupção é o tema central do debate


político contemporâneo no Brasil. O caso de
corrupção no PT[1] obteve tamanho espaço
na mídia brasileira como, até então,
somente durante o processo de
Impeachment de Fernando Collor de Melo
havia acontecido. O governo Lula está,
desde então, mergulhado em sua maior
crise: tanto o Ministro da Casa Civil, José
Dirceu, como o presidente do partido, José
Genoíno, e o Ministro da Fazenda, Antonio
Palocci tiveram de renunciar a seus cargos. Embora a maioria dos acusadores esteja envolvida
em corrupção (o que lhe confere uma baixa confiabilidade), poucas provas concretas tenham
sido apresentadas e o caso, na realidade, envolva o PT e não diretamente o governo Lula, foi
intencionalmente difundida uma imagem de que esse governo seria o mais corrupto da
história do Brasil. Nas intenções da discussão vigente, portanto, é possível visualizar uma
tentativa por parte da oposição e da mídia conservadora de desestabilizar politicamente o
governo Lula, com o objetivo de impedir sua reeleição em 2006.
A novidade no atual debate contemporâneo brasileiro é que, agora, não somente os partidos
conservadores, como já é de antigo conhecimento, estão envolvidos em corrupção, mas
mesmo o PT, que, até então, era considerado isento desse problema. Com o envolvimento do
PT se fala de uma “democratização” da corrupção no Brasil, ou seja, agora todos foram
atingidos, o que explica a satisfação de políticos corruptos com a atual situação, pois o PT se
beneficiou por muito tempo da sua tradição de ter governado sem corrupção. O contexto no
Brasil nos remete aos seguintes questionamentos, que procuraremos abordar no presente
texto: 1) por que a corrupção está tão profundamente arraigada no Brasil? 2) quais são as
razões para isso? Como foi possível que também o PT tenha sido atingido pela corrupção?
Metodologicamente iniciamos com a análise do conceito de corrupção e o seu entendimento
no Brasil, para, em seguida, apresentar o sistema político brasileiro na relação com o tema e,
finalmente, centrar nossa abordagem em aspectos da cultura política brasileira, com o objetivo
de compreender o contexto atual do debate sobre a corrupção no Brasil.

1. O conceito de corrupção

Existem no Brasil muitas palavras para caracterizar a corrupção: cervejinha, molhar a mão,
lubrificar, lambileda, mata-bicho, jabaculê, jabá, capilê, conto-do-paco, conto-do-vigário,
jeitinho, mamata, negociata, por fora, taxa de urgência, propina, rolo, esquema, peita,
falcatrua, maracutaia, etc. A quantidade de palavras disponíveis parece ser maior no Brasil e
em países onde a corrupção é visualizada cotidianamente. Originalmente, a palavra corrupção
provém do latim Corruptione e significa corrompimento, decomposição, devassidão,
depravação, suborno, perversão, peita. A corrupção, entretanto, dependendo do contexto,
nem sempre assume uma conotação negativa. Ela constitui, por exemplo, a base para o
desenvolvimento da linguagem: a língua portuguesa resultou de um “corrompimento”, da
modificação do latim, cuja variante brasileira é ainda mais dinâmica e viva (mais corrompida,
portanto) do que o português de Portugal. Na linguagem política contemporânea, no entanto,
a corrupção sempre assume uma conotação negativa, o que, visto numa perspectiva histórica,
não foi sempre assim. Historicamente, a corrupção esteve associada ao conceito de legalidade,
ou seja, corrupto era caracterizados aquele que não seguia as leis existentes. Mesmo
determinados termos extremamente negativos que atualmente são usados para designar
formas de corrupção, como a peita, o nepotismo e o peculato, não tinham essa conotação até
há poucas décadas atrás: a peita estava instituída como um pacto entre os fidalgos e a plebe
nos regimes monárquicos para garantir o pagamento de tributos do povo aos nobres; o
nepotismo era reconhecido como um princípio de autoridade da Igreja na Idade Média,
segundo o qual os parentes mais próximos do Papa tinham privilégios sociais aceitos pela
sociedade da época; o termo peculato, originalmente, indica que o gado constituía a base
da riqueza de determinados grupos sociais privilegiados e, posteriormente, a expressão
“receber o boi” passou a ser usada para designar “troca de favores”, pois o gado servia como
uma forma de moeda em certas regiões rurais. O termo peculato, atualmente utilizado para
caracterizar favorecimento ilícito com o uso de dinheiro público, continua com essa referência
histórica de que para ter acesso a determinados privilégios é necessário um favor em forma de
contrapartida.

No Brasil se associa a esse contexto histórico a assim chamada Lei de Gérson, ou seja, o
comportamento de querer “tirar vantagem em tudo”, pressupondo que os sujeitos aguardam
o máximo possível de benefícios, visando exclusivamente o beneficio próprio. Esse tipo de
comportamento, contudo, se adapta perfeitamente ao “espírito capitalista”, como pré-
condição esperada dos seres humanos numa sociedade centrada nos valores da economia de
mercado. Adam Smith, por exemplo, caracterizava esse comportamento como a melhor forma
de contribuir com o progresso social (Smith, 1990).

É claro que a corrupção é mais antiga que o capitalismo, mas ela encontra neste modo de
produção condições ideais para sua continuidade. Através da instituição da dominação forçada
do capital sobre o trabalho[2], a qual permite aos capitalistas a apropriação privada da mais
valia gerada pelo trabalho de outros seres humanos, uma das formas mais básicas de
corrupção passou a ser reconhecida legalmente na sociedade capitalista. Nesse sentido, a
forma moderna da corrupção precisa ser compreendida no contexto da injustiça fundamental
presente em todas as sociedades de classes: a injustiça no acesso aos meios de produção, que
constitui a origem da desigualdade social e está em frontal contradição com os ideais de
democratização, justiça social e solidariedade entre os seres humanos. É por isso que,
historicamente, a corrupção é proporcionalmente maior em sociedades com maior injustiça
social: onde o contraste entre ricos e pobres é maior. A ausência e a dificuldade no acesso a
bens e serviços facilita a privatização de setores públicos e sua transformação em mercadoria,
tendo como resultado o seu uso/abuso em benefício privado. Nesse contexto, por exemplo,
bens e serviços públicos passam a ser usados como mercadorias em troca de votos em
períodos eleitorais e parlamentares votam a favor de determinadas leis se houver a
possibilidade de, com isso, aumentar recursos no orçamento para as regiões onde se
concentra o maior número de seus eleitores (através das famosas “Emendas Parlamentares”).

A corrupção é um fenômeno mundial e, de acordo com a declaração final do IV Fórum Global


de Combate à Corrupção, realizado de 7 a 10 de junho de 2005 em Brasília, ela impõe
“ameaças à democracia, ao crescimento econômico e ao Estado de Direito”. De acordo com
esse entendimento, o IPC (Índice de Percepção da Corrupção)[3] serve de parâmetro
internacional para investimentos do Banco Mundial, supostamente para impedir que os
créditos internacionais sejam utilizados de forma indevida por governos corruptos e para
comprometer governos a tomar medidas de combate à corrupção. Por outro lado, essa forma
de proceder vem sendo usada como argumentação para justificar o subdesenvolvimento de
países pobres. Nos países mais pobres, especialmente na África, há uma ampla aceitação da
tese de que a corrupção origina o subdesenvolvimento, como se a existência da estrutura
social injusta nestes países fosse meramente o resultado de “maus governos”. Com essa linha
de argumentação são omitidas as causas estruturais e históricas da corrupção, por um lado, e,
por outro, a responsabilidade dos países colonizadores (os quais continuam sendo
beneficiados através da dependência e subordinação de muitos países pobres) passa a ser
transferida à população oprimida ou a seus governos, como se estes fossem os “culpados pelo
seu subdesenvolvimento”.

A percepção do tamanho da corrupção e da sua amplitude, entretanto, está pouco vinculada à


existência do IPC, se comparada à importância dos meios de comunicação, do acesso a
informações, da transparência de governos e, não por último, do próprio combate à
corrupção. Governos que tomam medidas efetivas de combate à corrupção contribuem de
forma decisiva para que a opinião pública se ocupe desta temática e identifique ações
corruptas como um problema. No Brasil, historicamente, a maioria dos casos de corrupção se
tornaram públicos somente em função de conflitos privados. Por isso, o país está confrontado
com uma situação completamente nova, pois, no governo Lula, as denúncias de corrupção
resultaram de um confronto político: políticos subornados foram à imprensa apresentando-se
como “vítimas” à opinião pública, com o objetivo de atacar o PT, reforçar a oposição e impedir
a reeleição de Lula. Isso explica a satisfação de políticos de direita no país, alguns deles (como
Jorge Bornhausen[4]) acreditam inclusive, terem a oportunidade de, finalmente, poderem
“acabar com essa raça” (referindo-se ao PT). A corrupção segue servindo de instrumento
político na campanha eleitoral, coerente com a estratégia das elites brasileiras corruptas de
apresentá-la à sociedade como um “problema endógeno da cultura brasileira”. A naturalização
da corrupção, ou seja, a tentativa de apresentá-la como sendo algo natural e óbvio (utilizando
expressões típicas de que “ela sempre existiu”, “todos são corruptos e corrompíveis”,
“precisamos saber conviver com a corrupção, assim como convivemos com as estações do
ano”), reduz a possibilidade de combater efetivamente ações corruptas, embora estas sejam
construídas por seres humanos e, por isso mesmo, poderiam ser justamente controladas e
modificadas pela ação humana.

2. O sistema político brasileiro

No debate teórico sobre a corrupção no Brasil podem ser visualizadas, no mínimo, duas
grandes correntes de pensamento: a) alguns cientistas políticos partem do pressuposto de que
a corrupção brasileira é uma herança do patrimonialismo ibérico; b) outros autores
apresentam a ausência de uma história feudal no país como um elemento importante para
descrever a falta de separação entre as esferas públicas e privadas, o que seria similar ao
patrimonialismo oriental. Em nosso entendimento, entretanto, o desenvolvimento do Brasil
está marcado por um processo de modernização e de manutenção do patrimonialismo, ambos
ocorrendo ao mesmo tempo. Isso significa que continua existindo uma estrutura de
dependência[5] do país em consonância com a manutenção do status quo das elites no país.
Por isso, pode-se falar de uma modernização conservadora no Brasil, pois não se trata de uma
nova ordem e sim de mudanças pontuais que, em última instância, contribuem para a
consolidação da estrutura social injusta e desigual. O conceito de “modernização”, portanto, é
constantemente influenciado por elementos econômicos, sociais, políticos e culturais que
constituem a base de um debate acerca de diferentes processos de modernização possíveis ao
país, diante dos quais os diferentes atores políticos estão confrontados. O desigual acesso aos
meios de produção, desde os tempos da colonização, constitui a base do patrimonialismo
brasileiro, uma corrupção original que se expressa no âmbito político e que pode ser
encontrada de forma semelhante também em outros países latino-americanos. Uma
importante particularidade de todo o continente sul-americano é a coexistência entre modos
de produção pré-capitalistas e semi-capitalistas, embora o capitalismo tenha se desenvolvido
como predominante e sobre ele se concentre prioritariamente a maioria dos estudos e
análises críticas. Por isso, particularmente no Brasil, é possível constatar um desenvolvimento
capitalista de forma desigual e dependente, com um acesso à modernidade sem que tenha
havido uma ruptura com o seu passado patrimonialista.

Nesse sentido, não há um Estado de Direito consolidado no Brasil, e muito menos se poderia
falar da existência de um Estado de bem-estar social. O Estado neopatrimonial surgido em
decorrência do desenvolvimento desigual e dependente do país serve prioritariamente aos
interesses de grandes proprietários de terras, empresários e outros representantes do capital.
Trata-se, portanto, de um Estado autoritário e centralizado. Nós defendemos a tese de que
quanto mais autoritário e centralizado estiver organizado o poder, maior será a probabilidade
de se confundir o interesse público (res publica) com interesses privados. Muitos crimes no
Brasil surgem no interior da própria estrutura do Estado e estão com ela conectados, de forma
que a criminalidade muitas vezes é incentivada por estruturas estatais (especialmente no
interior de setores da polícia e do Poder Judiciário). A maioria dos políticos é eleita como
representante de poderosos interesses na sociedade e concorre visualizando a possibilidade
de ter acesso a benefícios da estrutura do Estado. Inclusive criminosos se candidatam em
eleições com a finalidade de serem protegidos pela imunidade parlamentar, constituindo a
assim chamada “bancada do crime” que, de acordo com Francisco Weffort, já chegou a atingir
10% do Congresso Nacional.

A falta de transparência, a exclusão da maioria da população das decisões políticas mais


importantes, a baixa participação política da sociedade civil e a impunidade com relação à
corrupção são as conseqüências do sistema político brasileiro, constituindo um ciclo vicioso
que facilita ações corruptas. Soma-se a isso a tendência de crescente profissionalização da
política, o que aumenta o custo das campanhas eleitorais e a dependência de candidatos de
empresários dispostos a “investir em seu futuro”. Também não devemos subestimar que o
interesse de obter um cargo público como troca de favor em governos aumenta
significativamente em tempos de altas taxas de desemprego. Somente no governo federal
brasileiro há em torno de 25 mil cargos de confiança que podem ser “trocados” dependendo
do resultado de cada eleição. Especialmente o sistema eleitoral brasileiro contribui para que a
corrupção seja vista como parte integrante da política. A ausência de limites no financiamento
privado de campanhas eleitorais aumenta a probabilidade de um futuro beneficiamento de
empresas com dinheiro público e o fato da maioria dos partidos políticos não terem um
programa político claramente definido os transforma em instrumentos políticos a serviço de
grandes empresários. O voto na pessoa (motivado por critérios e influências pessoais), a
ausência de fidelidade partidária, a constante troca de partidos e a constituição de alianças
políticas antes das eleições são fatores que aumentam significativamente a tendência de
transformar votos em mercadorias. Soma-se a isso o sigilo bancário que facilita a “lavagem de
dinheiro” e as concessões de meios de comunicação a políticos, aumentando o potencial de
manipulação da opinião pública. A experiência política brasileira demonstra claramente que a
tão propalada democracia representativa não é democrática nem representativa, pois não
existe a soberania popular, não há a responsabilidade dos eleitos com relação aos eleitos, e
inexistem mecanismos de controle dos eleitos após as eleições, um contexto no qual o
combate efetivo à corrupção se torna realmente muito difícil.

3. A cultura política

Mesmo que a corrupção no Brasil esteja principalmente relacionada ao sistema político e ao


modelo de desenvolvimento econômico, é possível visualizar uma linha de continuidade entre
a vida cotidiana e a corrupção. Essa percepção vem sendo constantemente estimulada por
parte de jornalistas e políticos conservadores, os quais apresentam a corrupção como uma
espécie de “lei da natureza”. Roberto Pompeu de Toledo escreveu em 1994 na Revista Veja:
“Hoje sabemos, sem sombra de dúvida, que a corrupção faz parte de nosso sistema de poder
tanto quanto o arroz e o feijão de nossas refeições”. Adib Jatene, Ministro da Saúde no
governo Collor, afirmou em 1992: “Quem faz o Orçamento da República são as empreiteiras”.
Maria Helena Guinle, socialite carioca, em uma entrevista concedida à Revista Interview, se
referia a Collor como sendo uma “uma pessoa fascinante”, que “se veste bem, sabe falar” e
que, como presidente, “só nos orgulhava”. Mesmo após todas as provas terem sido
apresentadas e o ex-presidente ter sido afastado do cargo através do processo de
Impeachment, Guinle não deixou de defender Collor, desta vez com a seguinte argumentação:
“Deslizes acontecem a vida inteira. No momento em que você ocupa um cargo que te favoreça
de alguma forma, acho até um pouco de burrice não aproveitar a situação”. Mário Amato, ex-
presidente da FIESP (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), disse,
categoricamente, que “somos todos corruptos”. Essas declarações demonstram que há uma
relativa tolerância com a corrupção no Brasil ou, no mínimo, uma atitude de compreensão
para com os corruptos, o que acaba apoiando-os e reforçando-os em suas atitudes.

Um dos elementos culturais mais importantes da corrupção no Brasil é o acima referido


patrimonialismo. A cultura patrimonialista concebe as estruturas públicas como áreas
privadas, o que está estreitamente imbricado com a história de desenvolvimento do Brasil,
marcada pela apropriação privada e pela dependência. No período colonial os 10% mais ricos
possuíam dois terços da riqueza do país. Naquele período sequer se falava da existência de
uma ética geral, pois a ética ficava restrita ao âmbito familiar. Atualmente os 10% mais ricos
possuem 50% das riquezas geradas no país. Será que isso poderia ser interpretado como um
sinal de que há mais de 500 anos o país está no caminho errado? De acordo com a opinião
hegemônica da elite brasileira, porém, os grandes problemas sociais do Brasil há séculos, como
a fome, a concentração de riquezas, a crescente desigualdade social, a privatização do setor
público e, não por último, a corrupção, jamais foram encarados como obstáculos ao
desenvolvimento do país. Segundo as elites, trata-se de “promover mudanças para que tudo
fique como está”. Diretamente relacionados à concepção patrimonialista da cultura política
das elites brasileiras se situam os fenômenos do coronelismo e clientelismo, os quais
constituem a base histórica do populismo e do assistencialismo no país. O coronelismo está
baseado no poder político de grandes proprietários rurais (os coronéis), exercido através da
estrutura de dependência da propriedade da terra sobre os trabalhadores rurais. Amizade e
parentesco assumem uma importância decisiva nas relações sociais predominantes nas
fazendas, assim como a subordinação dos oprimidos em forma de fidelidade e
reconhecimento em troca de proteção patriarcal e do acesso a determinados “privilégios”. O
clientelismo é a versão urbana do coronelismo, uma vez que a maioria dos proprietários rurais
era também advogado ou médico, tratando seus eleitores, tradicionalmente, como “clientes”.
Tanto o coronelismo como o clientelismo estão, historicamente, fortemente vinculados ao
desenvolvimento brasileiro, pois a assim chamada economia de mercado foi, originalmente,
controlada pelos proprietários de terra. Em seus territórios de influência os coronéis foram
constituindo pequenos “reinos de poder” nos quais sentiam orgulho ao mostrar “seu povo”
publicamente, como símbolo do seu poder local e regional. Apesar da “modernização”
capitalista do país ficou conservado um equilíbrio na distribuição de poder entre os grandes
proprietários industriais e rurais na maioria dos Estados da federação. O presidente Getúlio
Vargas, como liderança rural carismática e populista, foi quem melhor soube se adaptar a essa
realidade. Com sua estratégia de combinar interesses do povo com os dos grandes
proprietários rurais e industriais, Getúlio governou o Brasil por 15 anos. Para evitar maiores
conflitos políticos com o povo, o getulismo ficou marcado pela manipulação da classe
trabalhadora, instituindo importantes políticas sociais e extinguindo a autonomia das
organizações sociais e populares existentes no período. O getulismo é a base do populismo e
do assistencialismo no Brasil, propondo concessões sociais para conservar o poder ou, em
outras palavras, a política de “entregar os anéis para poder seguir conservando os dedos”.

Um outro elemento importante da cultura política brasileira é a tendência de não encarar


determinados crimes (como, por exemplo, o contrabando e a corrupção) como problemas se o
seu objetivo é visto como positivo ou justificável. Assim, a corrupção passa a ser tolerada e
pessoas corruptas são, tendencialmente, encaradas como espertas ao invés de serem
caracterizadas como criminosas, o que também está fortemente relacionado à forma
sensacionalista como os escândalos de corrupção geralmente são apresentados à opinião
pública. Essa forma de encarar determinadas situações é comumente chamada de “jeitinho
brasileiro”, como sendo a “criatividade de encontrar uma saída para tudo”. De acordo com
pesquisas de opinião, no entanto, a maioria do povo brasileiro condena a corrupção: 83%
afirma, por exemplo, que jamais venderia seu voto; ao mesmo tempo, porém, 73% dos
entrevistados acredita que seus compatriotas o fariam, um sinal evidente da predominância da
idéia de que a maioria das pessoas no país seja corrupta. Também as justificativas de caráter
pessoal assumem uma importância central no debate sobre a corrupção no Brasil. A referência
à amizade é geralmente mais forte do que à idéia de responsabilidade política dos eleitos.
Trata-se de um acordo de reciprocidade, do reconhecimento da idéia de que os seres humanos
dependeriam uns dos outros e, por isso, a confiança e a lealdade deveriam ser vistas como os
valores mais importantes para a convivência. A confiança é, muitas vezes, caracterizada como
o cimento das relações interpessoais, assim como a solidariedade e a predisposição à ajuda,
valores que, muitas vezes, são corrompidos ao servirem de base à justificação de atitudes
corruptas. Nessa lógica, instituições públicas passam a ser utilizadas com a finalidade de
retribuir favores pessoais e boas relações são usadas como instrumento de intermediação para
obter benefícios e privilégios, já que estão baseadas na intimidade, na confiança mútua, numa
maior facilidade de comunicação e acesso a pessoas em cargos importantes. Nessa concepção,
a corrupção, assim como a vida, são encaradas como um intercâmbio, como um constante
processo de “trocas” entre pessoas. Nessa perspectiva, vale a pena investir em boas relações
com políticos e funcionários públicos, o que, obviamente, tem seu preço político: concessões
econômicas são trocadas por concessões políticas e as dificuldades inerentes à concessão dos
benefícios esperados aumentam proporcionalmente o preço político na relação de “troca”.

O PT pagou um preço político alto. Trata-se, acima de tudo, de poder e governabilidade. Ao


invés de constituir alianças políticas com vistas à implementação de reformas sociais previstas
em seu programa, o PT constituiu alianças com o objetivo de alcançar poder. O meio se
transformou em fim e os pragmáticos do partido, aparentemente, posam como vitoriosos na
disputa interna sobre os rumos do PT. Em nosso entendimento, isso não pode ser
caracterizado como traição, pois não partimos do pressuposto de que Lula ou o PT tenham
sido modificados ou cooptados pelo “aparelho de poder do Estado”. O contrário é mais
provável: não por ter poder no governo, mas exatamente para obter poder, para poder
governar, é que o PT está abandonando seu programa. Esse processo de abandono
programático está em curso desde o início da década de 1990 e, gradativamente, foi
constituindo uma estratégia política para a maioria da direção do partido, tendo seu auge na
eleição de Lula em 2002: progressivamente, o partido abriu suas portas para filiações em
massa, integrando novos membros sem qualquer relação com a tradição do PT; abriu espaço
para a filiação de parlamentares, que começaram a ver no PT melhores chances individuais
para se eleger; introduziu as eleições diretas para a direção partidária em todas as suas
instâncias, reduzindo a importância do debate interno; aumentou os investimentos
em marketing e profissionalização da estrutura partidária; e, não por último, reduziu
drasticamente a formação política e o debate programático (Pont, 2003). Como no
presidencialismo há a tendência de um presidente com minoria parlamentar se ver obrigado a
construir alianças com outros partidos para poder governar, os acordos políticos representam
um importante meio para alcançar maior governabilidade. Considerando que a maioria dos
partidos no Brasil conquista votos, normalmente, de forma corrupta no período eleitoral,
supostamente com o objetivo de aumentar seu poder político, é muito provável que os
acordos políticos entre partidos e parlamentares também sejam marcados pela corrupção.
Isso, porém, não pode, de forma alguma, servir de justificativa ao PT, pois, na maioria das
situações em que o partido governou até hoje, ele não pôde contar com uma maioria
parlamentar. Mas não era somente por contar com uma minoria parlamentar que o PT
priorizava a mobilização da sociedade civil com vistas à implementação de reformas sociais em
benefício da maioria da população. A mobilização social constituía o elemento central da sua
estratégia de construção de hegemonia política, baseada na compreensão de que o poder
precisa ser conquistado num processo de contra-hegemonia, no qual a participação e a auto-
organização dos trabalhadores permitem o avanço na tomada de consciência política da
população.

Essa é a mudança fundamental do PT com o governo Lula, o qual não se dispõe a avançar na
democracia participativa (seguindo a exitosa experiência do partido com o Orçamento
Participativo), correndo o risco constante de degenerar politicamente e eticamente ao se
adaptar à lógica corrupta da democracia representativa brasileira. Para o Brasil esse processo
de degeneração representa um enorme retrocesso na história de democratização do país, pois
o PT incorporava, até então, como único partido programático existente, a grande esperança
de transformações sociais, as quais poderiam ser conduzidas de forma democrática (de baixo
para cima) através de uma crescente mobilização social. A degeneração política do PT, através
da sua adaptação cada vez maior à tradição historicamente autoritária, populista e fisiologista
da política brasileira, é profundamente lamentável porque desta forma o partido abandona
seu papel de protagonista e de portador de esperanças em transformações sociais construído
duramente nas últimas décadas. E a degeneração ética do PT, que também está em curso,
contribui decisivamente para uma maior naturalização da corrupção, o que dificulta ainda mais
a construção de medidas efetivas de combatê-la.

Referências bibliográficas:

Córdova, Armando/Michelena, Hector Silva. Die wirtschaftliche Struktur Lateinamerikas. Drei


Strudien zur politischen Ökonomie der Unterentwicklung. Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1971.
Córdova, Armando. Strukturelle Heterogenität und wirtschaftliches Wachstum. Frankfurt am
Main: Suhrkamp, 1973.

Marx, Karl. Der Bürgerkrieg in Frankreich. MEW, Band 17. Berlin: Dietz Verlag, 1971.

Pont, Raul. Hoffnung für Brasilien. Beteiligungshaushalt und Weltsozialforum in Porto Alegre.
Entwicklung der PT und Lulas Wahlsieg. Köln: Neuer ISP Verlag, 2003.

Smith, Adam. Untersuchung über Wesen und Ursachen des Reichtums der Völker. Band I.
Düsseldorf: Verlag Wirtschaft und Finanzen, 1990.

por ANTÔNIO INÁCIO ANDRIOLI

Brasil Corrupção: a origem desse


mal e quais as perspectivas?
E o que você tem a ver com isso?
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12

Publicado por José Herval Sampaio Júnior

há 3 meses

135 visualizações

Por Herval Sampaio e Joyce Morais


O procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da
força-tarefa da Operação Lava Jato, declarou recentemente que
a corrupção no nosso país é "histórica, endêmica, sistemática e
se arrasta ao longo das últimas décadas". O que então a
história brasileira nos diz sobre a corrupção?
É bem verdade que o desejo de usufruir de benefícios, as
facilidades proporcionadas pelo poder e o bem-estar em
alcançar interesses próprios fazem com que o ser humano
muitas vezes ultrapasse o limite da ética, da honestidade e da
legalidade. E o pior, às vezes, esse ultrapassar do limite para se
atingir aos objetivos não republicanos perdeu o bom senso que
se tinha antes em relação a cerimônia dos atos ilícitos.
Hodiernamente, se age como se fosse normal.

A possibilidade de ser corrompido em decorrência da


satisfação de desejos pessoais existe para qualquer ser
humano. Por isso, datar a origem da corrupção é atrelá-la à
história do homem, uma vez que até mesmo os textos bíblicos
fazem menção de sua ocorrência na Idade Antiga.

Alguns historiadores atribuem a origem da corrupção no Brasil


à época da colonização pelos portugueses, que subornaram,
escravizaram, mataram os povos nativos e contrabandearam os
tesouros brasileiros. No período escravagista o comércio de
escravos foi proibido, mas as autoridades e funcionários
públicos faziam vistas grossas, afinal todos eles lucravam com
o tráfico.

Com a instauração da República, outras formas de corrupção


surgiram, como a eleitoral, através do voto de cabresto,
existente até hoje de forma contemporizada. E falando nela, a
corrupção eleitoral é apenas uma das formas através da qual se
concretiza esse mal, mas é talvez a mais nefasta, já que a partir
dela temos o círculo vicioso e pernicioso para se manter no
poder.

Sem dúvida, ela foi intensificada nos últimos 20 anos pelos


fenômenos do capitalismo e da globalização em que o ter
sempre é mais valorizado que o ser, e o individualismo é
estimulado em detrimento do bem da coletividade, como bem
nos ensina Augusto Cury em seus livros. Ela se sustenta pelo
clientelismo na figura das grandes empresas, pelo nepotismo e
oligarquismo, principalmente pelo interior do país.

Nessa perspectiva histórica, percebemos que o Brasil foi


colonizado, não para ser desenvolvido e povoado, mas apenas
ser explorado e continua até hoje, mudando-se somente a
forma. Ao passo que os Estados Unidos, por exemplo, foi
colonizado por ingleses que fugidos das perseguições religiosas
objetivavam transformar a região num lugar próspero para
viver e comercializar.

Enquanto franceses executaram seu próprio rei, Luís XVI, na


guilhotina em praça pública e demonstraram que nenhum
governante está acima da Nação, os brasileiros são um povo
sem grandes revoltas anotadas em sua história, um povo sem
muito patriotismo, talvez porque um país tão jovem, grande e
diversificado culturalmente não conseguiu ainda formar sua
própria identidade a fim de que seu povo possa se nela
reconhecer e defender.

A corrupção assim, não é um problema recente, mas se tornou


cada vez mais prejudicial, por isso, pouco ou nada importa a
sua origem. O essencial mesmo é lutar pelo seu fim! Essa
batalha deve ser um compromisso de todo cidadão, pois quem
rouba ou deixa roubar apenas contribui para perpetuá-la.

Hoje, nesse momento de instabilidade política no país, muitas


dúvidas e uma certeza: a necessidade do combate à corrupção,
aos desvios de recursos públicos, à sua má aplicação e à todas
as formas de suborno. Como disse Marques de Maricá (1773-
1848) “um povo corrompido não pode tolerar governo que
não seja corruptor”, então está na hora de deixarmos de ser
um povo explorado, oprimido, roubado, massacrado, ou seja,
deixar de sermos espectadores para sermos autores da nossa
história e começar a escrever um novo caminho para o nosso
país.
E esse caminho só depende da mudança individual de cada um
de nós, pois o problema em nosso país é a chamada
transferência de responsabilidade, em que sempre buscamos o
outro para apontar aonde se encontra a culpa e esta
sinceramente está desde a nossa origem em cada um de nós e
quem não concorda com essa assertiva, sinceramente, mais
uma vez continua a saga de achar que o problema não é seu.

Realmente, o problema não é só seu, é nosso e, por


conseguinte, nós é que temos de resolver, e nós significa todos,
cada um, evidentemente, como se diz, no seu quadrado, e
quando começarmos a resolver esse problema interno e nos
parece que já demos um grande passo, as mudanças em todos
os sentidos começarão a aparecer.

Vamos todos juntos mudar a cara do nosso país quanto a esse


mal que nos assola desde o começo, sem qualquer paixão
partidária ou pessoal, pois a verdadeira paixão, ou melhor,
amor deve ser à nossa pátria, que não aguenta mais chorar ao
longo de todos esses anos, pois se fizermos uma breve análise
de custo e benefício, estamos com déficit e este tem que ser
extirpado para que as futuras gerações deixem de chorar como
nós, sendo o sorriso a marca desse país, que com certeza tem
jeito, mas para isso temos que nos tocar de nossa
responsabilidade!

José Herval Sampaio Júnio

A corrupção no contexto nacional –


Do surgimento aos dias atuais – Por
Henrique Gualberto Bruggemann
 Colunas e Artigos
 Hot Empório

Por Henrique Gualberto Bruggemann – 21/07/2015


Sob o prisma da política, entende-se que a corrupção resulta das regras
estabelecidas pelo jogo político, sem muitas relações com a moralidade do
indivíduo em si. Aqui, as causas da corrupção política ocorrer em grande escala
são imputadas à fraqueza das leis e das instituições políticas e à ausência de
preocupação e consciência em relação às coisas públicas.

O grande responsável por esta separação entre a visão, entre o mundo, da ética e
da moral individual para a visão e para o mundo político foi Nicolau Maquiavel.

Modernamente, não há um conceito fechado de corrupção. Entretanto, reputa-se


interessante aquele apresentado por Klitgaard:

A literatura sobre a corrupção contém diversas definições úteis. Uma definição


amplamente citada de “corrupção” é: Comportamento que se desvia dos deveres
formais de uma função pública devido a interesses privados (pessoais, familiares,
de grupo fechado) de natureza pecuniária ou para melhorar o status; ou que viola
regras contra o exercício de certos tipos de comportamentos ligados a interesses
privados[1].

Assim, o conceito de corrupção não se satisfaz com aquele do delito na forma


ativa e na forma passiva positivado em nosso Código Penal, bem como com
aquelas condutas tipificadas na chamada Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº
8.429/92). Muito mais do que o tipo penal, a corrupção se faz presente em
qualquer ato que escapa dos deveres inerentes à função pública, visando atender
um interesse privado.

Voltando-se a lupa especialmente para o Brasil, no tocante à nossa herança


corrupta, repara-se que, de fato, temos uma herança maldita, que foi firmada em
nossa colonização e não se desgarrara até os dias atuais. ‘Sempre foi assim e
nada mudará’ é o mantra.

É importante a pesquisa sobre o nosso passado, nossa formação ética, para que
possamos, da melhor maneira possível, vislumbrar nosso futuro.

As obras clássicas de Sérgio Buarque de Holanda – Raízes do Brasil – e de


Gilberto Freyre – Casa-Grande & Senzala – bem retratam todo esse
desenvolvimento da cultura nacional, as características de nossos colonizadores.

Não se discute que no Brasil colonial a corrupção esteve bem presente por meio
de familismo, clientelismo, patronagem e amizade, todos estes acima dos
interesses públicos do novo país. Foi assim que passamos nossos primeiros anos,
nossas primeiras décadas. Nossos colonizadores tinham caráter aventureiro, com
hábitos individualistas, avessos ao trabalho, com gosto pela luxúria e grande
desejo pelo desfrute de bens.

Os péssimos padrões morais da Metrópole, aliado à grandeza de nosso território, a


situação geográfica complicada, a lentidão das comunicações e a ausência de
controle político, financeiro e jurídico por parte de Portugal, fez fermentar, por aqui,
valores negativos

Assim nasceu a corrupção nacional. A partir de nosso descobrimento, foi formada


uma sociedade com antivalores políticos e sociais, que, tal como nossos
colonizadores, estavam mesmo preocupados com seu âmbito privado e não com o
público. O prestígio fazia com que fossem recebidos benefícios e privilégios. Todos
corriam atrás dos cargos públicos, pois ali seria possível obter rendas lícitas e
ilícitas e pouco trabalhar.

Entretanto, o momento hoje é outro. Não podemos ficar amarrados a um passado


distante, deixemos para os historiadores essas questões. Tudo muda, por quais
motivos a mentalidade de nosso posso não haveria de mudar? Esse é o
pensamento de Simon:

Penso, todavia, que se deve agir com redobrada prudência quando se trata de
justificar mazelas atuais, pelo passado histórico colonial. Quando nada pela
singela razão de que, daqui a pouco mais de uma década, estaremos celebrando o
bicentenário da Independência do Brasil. Convenhamos: um espaço de duzentos
anos é tempo mais que suficiente para que um Estado Nacional se livre das
deformações surgidas na distante fase colonial.

Então, no lugar de se jogar a culpa no colo dos antepassados, o presente trabalho


pretende demonstrar que a corrupção é fenômeno comum em todos os países. E
em vez de se pensar que o pensamento do caboclo de que “se a farinha é pouca,
meu pirão primeiro” não pode ser invertido, pretende-se uma reflexão acerca da
mudança no pensamento da população, em sua incursão nos assuntos da nação,
na efetivação de direitos e garantias fundamentais, valorização da democracia,
como aspectos que podem nos conduzir a um país com menos corrupção.

Esqueça-se o passado por um momento. Abra-se a mente coletiva não para se


cobrar punição rigorosa aos corruptos mas sim para aprender a participar das
coisas do Estado, brigar por mais direitos!
Notas e Referências:

[1] Roberto Klitgard. A corrupção sob controle.

Corrupção no Brasil tem origem no


período colonial, diz historiadora
Mariana Della Barba
Da BBC Brasil em São Paulo
Atualizado em 4 de novembro, 2012 - 07:54 (Brasília) 09:54 GMT

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Cerimônia de beija-mão na corte de D.João VI, em que os súditos faziam pedidos ao monarca
O motorista que oferece uma cerveja para o guarda não multá-lo. O fiscal
que cobra uma "ajuda" do comerciante. O ministro que compra apoio
político. A corrupção está enraizada em vários setores da sociedade
brasileira. E nada disso é recente, segunda a historiadora Denise Moura,
que diz que a prática chegou junto com as caravelas portuguesas.
"Quando Portugal começou a colonização, a coroa não queria abrir mão do Brasil, mas
também não estava disposta a viver aqui. Então, delegou a outras pessoas a função de
ocupar a terra e de organizar as instituições aqui", afirma a historiadora.

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 Brasil
"Só que como convencer um fidalgo português a vir para cá sem lhe oferecer vantagens?
A coroa então era permissiva, deixava que trabalhassem aqui sem vigilância. Se não,
ninguém viria."
Assim, a um oceano de distância da metrópole, criou-se um clima propício à corrupção,
em que o poder e a pessoa se confundiam e eram vistos como uma coisa só, de acordo
com Denise, que é professora de História do Brasil na Unesp.
No entanto, a historiadora deixa claro que a corrupção não é uma exclusividade do Brasil,
é só uma peculiaridade da formação dessa característica no país.
"Temos enraizado uma tradição muito forte de poder relacionado ao indivíduo que o
detém", avalia Denise. "E isso até hoje interfere na maneira como vemos os direitos e
deveres desse tipo de funcionário."
Propina
"A coroa então era permissiva, deixava que trabalhassem aqui sem
vigilância. Se não, ninguém viria"
Denise Moura, historiadora
No Brasil colônia, assim como hoje, a corrupção permeava diversos níveis do
funcionalismo público, segundo a pesquisadora. Na época, atingia desde o governador,
passando por ouvidores, tabeliães e oficiais de justiça, chegando até o funcionário mais
baixo da Câmara, que era uma espécie de fiscal de assuntos cotidiano.
A historiadora conta que documentos mostram esse funcionário protegendo ou
favorecendo um vendedor mediante propina.
Se a corrupção encontrou um terreno fértil nas instituições políticas do litoral, a situação
era ainda mais grave na colonização de regiões como Minas Gerais, Goiás e o sul do país.
Ainda mais longe dos olhos da coroa, esses locais só eram acessíveis após meses de
caminhada - o que exigia ainda mais incentivos para os "fidalgos-desbravadores".
"A coroa portuguesa estimulava pessoas e dizia: 'vão para o interior e podem mandar à
vontade por lá', na tentativa de garantir a soberania do império com alguém morando no
local", diz Denise.
A escravidão, segundo a historiadora, também contribuiu para o desenvolvimento da
corrupção no país. Isso porque era a única relação de trabalho existente, deixando o
trabalho livre sem qualquer tipo de norma para regê-lo.
Essa realidade criava um ambiente vulnerável, em que não era claro, por exemplo, os
deveres de um guarda municipal - abrindo, de novo, possibilidade de suborno e outros
tipos de corrupção.

História da corrupção no mundo


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Muitas pessoas estão cada vez mais incomodadas com os casos de corrupção
ocorridos no Brasil atualmente, e por conta disto, muitas delas também pensam
que a corrupção não ocorre em nenhum outro lugar do mundo e que ela não
tem origens em outros lugares que não sejam aqui.

Mas a verdade é que infelizmente desde que a humanidade começou a se


organizar como sociedade estruturada e com sistemas de poder bem definidos,
a corrupção se faz presente em seu seio.

Portanto, nas próximas linhas, nós vamos mostrar em detalhes a verdadeira


História da corrupção no mundo, dando uma noção sobre suas origens e
mostrando casos mais notórios ocorridos no mundo.

Roma antiga

Foi na Grécia clássica que as formas de divisão setorial e hierárquica da


administração pública surgiram, e foi com base nelas que todas as formas que
conhecemos hoje tomaram corpo.

No entanto, foi na Roma antiga que estas formas acabaram sendo


envenenadas pela corrupção, que obrigou os imperadores romanos a criar
formas e mecanismos que permitissem aplacar seus danosos efeitos.

Um bom exemplo disto foi a implementação dos livros contábeis, além da


obrigação dos governos de prestarem contas sobre seus gastos e também
sobre as suas receitas (numa prática que é observada até os dias de hoje em
muitas sociedades).

Infelizmente, apesar destas medidas importantes e interessantes, o fato é que


a corrupção se fazia presente em todos os níveis, gerando prejuízos
grandiosos para a sociedade.
Para que se tenha uma vaga ideia do que ocorria, militares costumavam cobrar
dos camponeses uma quantia para lhes garantir “proteção” (vale lembrar que
esta proteção já estava garantida pela própria finalidade da criação do exército
romano).

Pois foi por conta desta corrupção arraigada e generalizada em todos os


principais setores do Império Romano, que, segundo muitos historiadores, esta
grandiosa sociedade acabou ruindo de dentro pra fora.

Corrupção na sociedade portuguesa

A origem da corrupção no Brasil, para muitos historiadores, tem suas origens


na sociedade portuguesa, que ainda hoje apresenta traços corruptos (em
menor escala do que em outros tempos).

A corrupção na sociedade portuguesa, especialmente nos tempos do Brasil


Colônia, era realmente muito intensa e estava presente em todos os níveis,
sendo que ela realmente se mostrava mais forte dentro da corte lusa.

Havia os chamados “amigos do rei”, que eram membros da corte que


simplesmente não faziam nada de útil, mas que, em troca de favores (muitas
vezes banais), ganhavam títulos e terras, especialmente na imensa colônia na
América do Sul.

O modelo português, com, entre outras coisas, cartórios notariais que criam
muita burocracia para quem deseja oferecer dificuldades para depois vender
facilidades acabou ficando no Brasil até os dias de hoje, dando forma ao
famoso “jeitinho brasileiro”.
A União Soviética

E por fim, nós podemos citar um caso mais recente historicamente falando, que
é o da União Soviética, que acabou dando origens à imensa corrupção
presente na sociedade russa nos dias de hoje.

Por conta da imensa máquina burocrática criada pelo modelo socialista


soviético, com diversas células instaladas pelo imenso território russo, era
prática comum o desvio de dinheiro público, e também a cobrança de propinas
para supostas facilidades serem vendidas ao sofrido povo

“Quanto mais corrupto o Estado, mais numerosas são as leis.”


– Tácito, Anais do Império Romano
Públio (Caio) Cornélio Tácito (em latim Publius (Gaius) Cornelius Tacitus) ou
simplesmente Tácito, (55 — 120) foi um historiador, orador e político romano. Ocupou
os cargos de questor, pretor (88), cônsul (97) e procônsul da Ásia (aproximadamente
110-113). É considerado um dos maiores historiadores da Antiguidade.
MUSEU BRITÂNICO, LONDRES

Arremessador de discos, escultura de


mármore, cópia romana de original grego, autor
desconhecido, s/d

Em Olímpia, a corrupção já manchava os


Jogos
Na Grécia antiga as competições esportivas tinham um caráter sagrado, mas desde essa
época eram disputadas por atletas profissionais e patrocinados, que muitas vezes
recorriam a métodos escusos para vencer
por Violaine Vanoyeke

Tudo o que faz a glória e a vergonha do esporte no século XXI já existia na Grécia antiga:
treinamento intensivo, dietas, transferências de clubes, profissionalismo,
semiprofissionalismo, amadorismo e doping.

O dinheiro, claro, também estava presente. Desde que os Jogos Olímpicos passaram a ser
organizados oficialmente, os atletas foram remunerados. Quando se tornaram disputas entre
as cidades, nas quais o prestígio nacional ou local estava em jogo, as autoridades passaram
a patrocinar seus representantes. Mantinham colégios de atletas e, quando não conseguiam
formar nenhum campeão, compravam um no estrangeiro.

Em Atenas, em 580 a.C., Sólon promulgou uma lei que estipulava um prêmio de 500
dracmas para cada cidadão que vencesse as Olimpíadas. Como um carneiro valia
aproximadamente uma dracma, essa quantia era considerável. Sem contar que os campeões
adquiriam status e privilégios, como a dispensa de pagar impostos.

Inicialmente reinava uma louvável concorrência entre amadores desinteressados. Com o


tempo, porém, a ambição das cidades fez com que as autoridades passassem a pressionar
seus atletas a vencer. Os esportistas começaram então a treinar em tempo integral e a se
especializar em uma modalidade para aumentar suas chances de sucesso, contrariando o
ideal do atleta homérico, que deveria ser um homem completo.

Reunidos em diferentes corporações de acordo com a modalidade que praticavam, todos os


esportistas seguiam uma dieta específica. Os lutadores eram submetidos a uma perigosa
superalimentação. Já o corredor Astilo de Crotona, pelo contrário, preconizava uma dieta
mais leve. Treinadores famosos, como Ico de Tarento no século IV a.C., prescreviam
tratamentos científicos e
médicos para os competidores.
REPRODUÇÃO
Seguindo o exemplo de
Atenas, outras cidades
começaram a oferecer aos
seus campeões a soma
considerável de 5 talentos (um
talento valia 6 mil dracmas). O
atleta laureado era sustentado
pelo resto da vida pela cidade
e podia receber uma renda
mensal de até 200 dracmas.

Os valores das premiações


trans-formaram o espírito dos
jogos. Os próprios atletas se
vendiam a quem pagasse Representação artística moderna da cidade de Olímpia, onde eram realizados os
mais. O cretense Sotades, que jogos na Antiguidade (gravura, autor desconhecido, 1891)
venceu a corrida
de daulichos (4.700 metros)
nos 99º Jogos Olímpicos (384 a.C.), aceitou correr pela cidade de Éfeso quatro anos mais
tarde. Os cretenses o puniram e o exilaram. Astilo de Crotona, cidade habituada a conquistar
a maior parte dos prêmios olímpicos, ganhou, em 488 a.C., a corrida do estádio (cerca de
200 metros) e o diaulos (prova de 400 metros) e se apresentou nos jogos seguintes como
cidadão de Siracusa.

Diante do desenvolvimento do profissionalismo, as escolas de esporte e os ginásios


multiplicaram-se nas cidades. Os pedótribas (professores de educação física) recrutavam
garotos a partir dos 12 anos. Esses treinadores particulares, às vezes ex-atletas, eram cada
vez mais bem remunerados. Dessa forma, Hippomachos cobrava 100 dracmas por aula.

Os atletas eram cuidadosamente selecionados e estavam dispostos a tudo para conquistar o


título de periodonico, o vencedor dos Jogos Olímpicos. Assim, em 388 a.C., durante a 98ª
Olimpíada, constatou-se o primeiro caso de corrupção: o boxeador Eupolos comprou três
adversários, entre os quais o detentor do título. O senado de Olímpia impôs uma multa aos
quatro homens e, com a quantia obtida, mandou erigir seis estátuas de bronze de Zeus, que
foram dispostas no bosque sagrado de Altis. Em 332 a.C., um atleta ateniense, Calipo,
também subornou seus adversários. Como se recusaram a pagar a multa, todos os
atenienses foram excluídos dos jogos.

Origens Existem várias lendas sobre o nascimento dos Jogos Olímpicos, mas nenhuma
explica suas verdadeiras origens. Sabe-se apenas que as competições tinham um caráter
sagrado. A cidade de Olímpia, onde eram realizados os Jogos, era considerada um local
mítico, que conferia imortalidade aos vencedores, por isso acredita-se que as Olimpíadas
nasceram como competições que acompanhavam os funerais dos heróis. Os jogos fúnebres
com os quais Aquiles honrou Pátroclo na Ilíada reuniram arqueiros, lançadores de dardos,
corredores e lutadores. Os Jogos Olímpicos, portanto, teriam sido originalmente jogos
funerários celebrados em honra de Pélope, rei mítico da região do Peloponeso, antes de
serem consagrados a Zeus.

Se, de acordo com uma das lendas, o rei Ifitos de Élida fundou os jogos em 884 a.C., as
Olimpíadas passaram a ser contadas oficialmente só a partir de 776 a.C., quando havia
apenas uma prova: a corrida do estádio (cerca de 200 metros), que era disputada ao pé do
monte Kronion.

Naquela época, participavam dos Jogos apenas os habitantes de Pisa e de Élis, cidades da
região de Élida, onde ficava Olímpia. Mais tarde, as cidades da região do Peloponeso, entre
as quais Esparta, começaram a enviar seus atletas para Élida. O primeiro espartano sagrou-
se vencedor em 720 a.C. Logo, 5 ou 6 milhões de gregos assistiam aos jogos. No final do
século V a.C., o sofista Hípias de Élis publicou uma lista de campeões. Atualmente, graças à
lista do papiro de Oxirrinco, são conhecidos 921 dos 4.237 vencedores.

Durante os Jogos era proclamada uma trégua geral, e todos os combates entre gregos
deviam cessar. Nenhum exército podia pisar o solo de Olímpia. Também era proibido impedir
os atletas de participar das provas. Os Jogos se transformavam então no símbolo da luta
entre as cidades pela via pacífica.

Assim como hoje, os Jogos Olímpicos eram inaugurados por uma grande cerimônia de
abertura, quando os atletas chegavam a Olímpia, vindos de Élis, ao fim de dois dias de
caminhada. Sob as árvores do bosque sagrado de Altis eram expostas as estátuas dos
vencedores anteriores, de bronze, mármore e ouro.

Inicialmente, o festival durava apenas um dia. A festa foi crescendo, e, em 520 a.C., o
programa dos Jogos Olímpicos já tinha adquirido sua forma definitiva. O primeiro dia era
dedicado às cerimônias; o segundo, às provas eliminatórias de corrida a pé: a prova do
estádio (cerca de 200 metros), o diaulos (prova de dois estádios, cerca de 400 metros) e
o daulichos (a corrida de longa distância, de cerca de 4.700 metros). Quarenta mil
espectadores acomodavam-se nas arquibancadas para assistir às competições.

MUSEU BRITÂNICO, LONDRES

Atleta recebe “medalha” olímpica. O símbolo da


vitória podia ser uma coroa de louros ou, como
nesta imagem, uma fita de lã que era colocada
no pescoço do vencedor. Pintura de cálice
O terceiro dia era reservado ao pentatlo, série de cinco ateniense do século V a.C., autor
desconhecido.
provas, cada uma de uma modalidade diferente:
lançamento de disco, lançamento de dardo, salto em
distância, corrida do estádio e luta grega. Ganhava o
pentatlo quem vencesse três das cinco provas.

No quarto dia era a vez das competições de luta grega, pugilato (ancestral do boxe) e
pancrácio, a prova mais mortífera, em que tudo era permitido, com exceção de golpes nos
olhos. No quinto dia eram realizadas as finais das corridas a pé, e o sexto dia era dominado
pelas corridas de cavalos, que incluíam tanto as provas em que um jóquei montava o animal
quanto as competições de carros – bigas, quando eram puxados por dois cavalos, e
quadrigas, movidos por quatro animais.

No sétimo dia, realizavam-se as cerimônias de encerramento. Um cortejo descia do Altis,


formado pelos juízes, pelos vencedores das provas, pelas autoridades de Élis e de Olímpia e
pelas delegações, seguidos pelas estátuas dos deuses carregadas ao som de flautas e
cânticos. O arauto anunciava o nome, a pátria e o desempenho dos vencedores diante de
uma estátua de Zeus. Os juízes lhes entregavam uma coroa de ramos entrançados da
oliveira silvestre trazida por Hércules do país dos Hiperbóreos. Hecatombes (sacrifício de 100
animais) eram oferecidas a Zeus. Um banquete reunia os membros do senado, os
vencedores e as personalidades. Os olimpionicos (participantes dos jogos) ofereciam
sacrifícios.

Decadência A história dos Jogos Olímpicos acompanhou a evolução política da Grécia


antiga. Depois de viver seu auge na primeira metade do século V a.C., quando a aliança
entre Esparta e Atenas contra os persas (481-479 a.C.) deu certa unidade ao mundo grego,
o festival começou a entrar em decadência no momento em que as duas cidades-Estado
passaram a se enfrentar na Guerra do Peloponeso (431-404 a.C.), o que culminou com a
expulsão de Esparta dos jogos em 420 a.C.

Desse momento em diante, MUSEU ARQUEOLÓGICO NACIONAL, ATENAS


Olímpia se tornou alvo das
guerras entre as cidades
gregas, o que fez com que em
365 a.C. os habitantes de Élis
interrompessem a cronologia
tradicional nos 104º Jogos
Olímpicos. No século III a.C.,
Olímpia foi conquistada pelos
romanos, que começaram a
participar dos jogos. No século
I d.C., até imperadores como
Tibério e Nero estiveram entre
os competidores. Este último,
aliás, mandou jogar as
estátuas dos antigos campeões A luta greco-romana era uma das modalidades que já faziam parte das
em latrinas para apagá-los da competições da Antiguidade. Jovens lutando, relevo de mármore, autor
desconhecido, séc. V a.C.
história.

O último vencedor conhecido foi um príncipe armênio de origem persa, Varazdates (373 ou
369). Logo depois, em 393, o imperador Teodósio aboliu os jogos, em um esforço para
acabar com todas as celebrações pagãs e fazer do cristianismo a religião oficial do Império
Romano. Em 395, Alarico e os godos devastaram Olímpia. Em 426, o imperador bizantino
Teodósio II mandou incendiar os templos, e, por volta de 550, um terremoto destruiu a
cidade. Era o fim dos Jogos Olímpicos da Antiguidade.

Entenda: qual a origem da corrupção na


sociedade?
Corrupção está relacionada a origem das primeiras civilizações. Mas, tal
prática foi intensificada após o capitalismo

Por Katharyne Bezerra em 29/03/2016


Salvo em Curiosidades

De acordo com um dicionário online, corrupção é “ação ou efeito de


corromper; decomposição, putrefação” ou “depravação, desmoralização,
devassidão”, sendo ainda vista como formas de “sedução e suborno”. É, portanto,
uma forma de se conseguir algo fácil, mas que para a realidade é ilícito, proibido
contra lei, antiético ou imoral.
A verdade é que a corrupção é um problema crônico, inclusive no Brasil e seu
surgimento está intimamente relacionado à criação das primeiras civilizações.
Porém é fato que essa prática foi intensificada após o surgimento do capitalismo,
sistema econômico que proporciona maiores desigualdades e fortalece a ideia de
quanto mais, melhor.

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O surgimento da corrupção no Brasil


Em Terras Canarinhas existe um princípio conhecido como lei de Gerson, o qual
se refere a forma como um indivíduo age para conseguir obter vantagens em tudo
que é feito ou produzido. Uma maneira negativa de conseguir benefícios para si
mesmo em detrimento dos direitos dos outros. E esse tipo de lei está entre as
relações brasileiras há séculos, mais precisamente desde a chegada dos
portugueses.

No século XVI, as caravanas portuguesas desembarcaram em terras até então


desconhecidas pelos europeus, mas muito bem habitadas por índios. De acordo
com historiadores, a corrupção começa a datar quando os funcionários públicos
da Coroa Portuguesa faziam vista grossa aos produtos naturais que eram
comercializados de forma ilegal, como o pau-Brasil.
Foto: Depositphotos

Passou ainda pelo período escravocrata do Brasil e mesmo que em 1850, o


comércio de negros tivesse sido proibido, continuou em vigor acobertando os
senhores de terras que continuavam, mesmo que de forme ilegal usurpando a
força de trabalho dos africanos de graça. Incrivelmente, em 1888, com a abolição
da escravatura, o comércio e escravos persistiu, através de subornos e
favorecendo os mais ricos.

A corrupção esteve presente à todo o momento, da independência a instauração


da República. Passando pelo voto de cabresto, pelo golpe de Getúlio Vargas e a
instalação de sua ditadura. Perpassa aos dias de hoje, com políticos, instituições
privadas, órgãos ligados ao governo etc.

A corrupção nossa de cada dia


Engana-se que o ato de corromper-se está ligado apenas a um jogo político,
partidário ou institucional. A lei de Gerson, por exemplo, pode ser aplicada a
qualquer cidadão que visa os seus interesses próprios em detrimento do bem
comum. Todos que tentam se beneficiar, burlando regras e leis pode ser
considerado um corrupto e para receber tão indicação não é preciso ocupar uma
cadeira no sistema político brasileiro.

Como a corrupção está enraizada no povo brasileiro, atos considerados simples


podem ser formas de se corromper. Por exemplo, usar carteirinha de estudante
falsa, aceitar troco errado só pelo fato de ter vindo um dinheiro a mais, tentar
corromper policial por infração de trânsito, comprar a carteira de motorista,
sonegar impostos e até furar fila. Estes, são só algumas de outras tantas práticas
corruptas que estão atrelada à humanidade, a qual permite ser corrompida pela
sociedade.

Os principais casos de corrupção no mundo


A corrupção não é um fenômeno que assola exclusivamente o Brasil. Conheça
os principais escândalos de corrupção ao redor do mundo

Por Nayla Georgia em 06/04/2016


Salvo em Curiosidades

Nos últimos anos, o Brasil vem demonstrando reações mais participativas no


combate à corrupção que assola a política. Embora o país esteja realmente
precisando de mais atenção quanto a isso, é importante entender que não estamos
sozinhos e essa prática tão incorreta está por todo lugar. Mas você conhece os
escândalos mais notáveis de corrupção pelo mundo? Preparamos um top 5 dos
casos principais na história.

5 principais casos de corrupção no Planeta

Foto: Depositphotos

5. BAE System
Acusada de pagar comissão para agentes públicos em troca de contratos, a
empresa BAE System era tida como uma das maiores agências de segurança do
continente europeu. O caso foi um escândalo gigantesco, envolvendo corrupção
entre os Estados Unidos da América e a Arábia Saudita. Cerca de 448 milhões de
dólares foram desviados, valor que chega perto dos 1,4 bilhões de reais.

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4. KBR/Halliburton
A empresa KBR/Halliburton era considerada uma das grandes empresas de
energia na América do Norte. Ela foi acusada de subornar agentes públicos da
Nigéria em troca de contratos que valiam mais de cinco bilhões de dólares. É
estimado que o valor do desvio nesse escândalo de corrupção chegue a US$ 579
milhões, que em reais é aproximadamente R$1,8 bilhões.

3. Siemens
Tido como um dos casos de corrupção mais notáveis da atualidade, o caso da
Siemens repercutiu por todo o mundo, inclusive nas terras tupiniquins, que
infelizmente não continuou o processo. A empresa europeia foi acusada de pagar
propina a agentes públicos, desviando recursos que deveriam ter outros fins.
Apenas nos Estados Unidos a Siemens chegou a pagar mais de um bilhão de
dólares em propina.

2. Petrobras
Um dos casos de corrupção de maior repercussão no Brasil, o escândalo da
Petrobras teve seu início com a Operação Lava Jato, iniciada em 2014. É possível
que R$ 21 bilhões tenham sido desviados dos cofres públicos brasileiros.
1. Banestado
Descoberto em 2003, o caso de Banestado é até hoje o maior escândalo
de corrupção no Brasil e no mundo. O banco foi acusado de enviar remessas
ilegais de dinheiro para contas de laranja no exterior. Aproximadamente R$ 30
bilhões foram desviados à época.

QUANTO A CORRUPÇÃO
Por Douglas Barraqui

O debate em torno da corrupção está tão latente atualmente no Brasil que na


qualidade de historiador e, acima de tudo cidadão, resolvi me pronunciar. Algumas
pessoas, ditas honestas, integras, pseudo moralistas e demagogas, estão polarizando
esse debate a um grau tão específico que acabam olhando somente para o próprio
umbigo. Não vamos ser hipócritas ao ponto de achar que nessa história, na história
desse país, a corrupção tem cor (vermelha, branca ou azul) ou mesmo direção
(esquerda, centro e direita). No Brasil corrupção tem tons de cinza e é ambidestra.

Andam repetindo por ai, feito papagaio de piratas, a fala de uma mídia tendenciosa,
capciosa, controladora e totalmente parcial, que “nunca se roubou tanto”. Não sejamos
justiceiros e afoitos ao ponto de agirmos pela precipitação da emoção e da indignação.
Nessa novela, tão antiga quanto às da Rede Globo, existem atores, os coadjuvantes,
vilões, mocinhos e mocinhas e, aquilo que considero como mais importante, os
bastidores. Precisamos entender os bastidores, caso contrário vai continuar “o sujo
falando do mal lavado”.

A corrupção é algo histórico e estrutural

Lula, Dilma, Dirceu e outros tantos, toda corja corrupta desse país, se assim for
provado por meio de processo legal - tenho dito - devem ir para a cadeia. Portanto,
não estou aqui para falar por este ou por aquele partido. Estou aqui para dizer que
corrupção é tão antiga no Brasil quando o conto-da-carochinha. Que esta, está tão
impregnada em nossa sociedade que as pessoas, em um pisca de olhos, conseguem
confundir o público com o privado.
Primeira coisa a fazer é olhar para o passado, para a história do nosso país. A
corrupção vem sido escrita errada e por linhas tortas desde a carta de Pero Vaz de
Caminha, quando este encerra a carta pedindo ao rei D. Manuel de Portugal um
emprego para um sobrinho, um “rapaz competente e cumpridor dos deveres” segundo
o próprio Caminha.

Durante o Segundo Reinado (1840-1889) Irineu Evangelista de Souza, o Barão de


Mauá, obteve junto ao governo a concessão e a licença para exploração de cabo
submarino para rede de telégrafo que ligaria o Brasil a Europa. A efetiva ligação do
Brasil à Europa pelo telégrafo ocorreu em 1874, com a instalação do cabo submarino
ligando Pernambuco a Portugal, realizada pela empresa The Western Telegraph
Company Limited, organizada pelo barão de Mauá que, assim que recebeu a
concessão, tratou de transferi-la para capitalistas ingleses. Na inauguração desse
cabo transatlântico, o governo imperial, em reconhecimento aos serviços prestados
por Mauá, "fê-lo visconde, como o fizera barão ao inaugurar-se a primeira estrada de
ferro". Ainda no Império, outro empresário brasileiro, que havia recebido a concessão
para a rede de iluminação a gás da cidade do Rio de Janeiro, assim como fez Mauá,
transferiu a concessão para uma companhia inglesa em troca de 120 mil libras.

Na República, proclamada em 1889, não havia de ser diferente. O chamado “voto do


cabresto” foi a marca registrada do período. Os grandes latifundiários, conhecidos
como coronéis, impunham por meio da intimidação, força das armas e da violência de
seus jagunços, o voto desejado aos seus empregados e pessoas sobre sua
influência. A compra de voto por favores, mantimentos e mesmo por um par de
sapatos era muito comum. No dia da votação o pobre coitado do indivíduo ganhava
um pé, após a apuração das urnas, ganharia o outro pé, mas somente se o candidato
do coronel vencer as eleições.

No pleito eleitoral de 1950 um caso pitoresco tornou-se muito famoso e entrou para o
anedotário da política do país, foi a caixinha do Adhemar. Político de São Paulo,
Adhemar de Barros era conhecido pelo lema “rouba, mas faz!”. A tal caixinha era um
meio de arrecadar dinheiro em troca de favores. A caixinha envolvia políticos,
empresários, bicheiros, entre outros que desejavam algum benefício político. Adhemar
chegou a agadanhar com sua caixinha o montante de 2,4 milhões de dólares que ele
guardava para gastos pessoais em sua própria casa em um cofre. O tal cofre de
Adhemar de Barros foi roubado, em 18 de julho de 1969, pelos guerrilheiros da
Vanguarda Armada Revolucionária Palmares (VAR- Palmares) que na época tinha
como cabeças o ex ministro do meio ambiente Carlos Minc e atual presidenta Dilma
Rousseff.

Essas empreiteiras investigadas pela operação lava jato começaram os namoricos


com o poder público ainda no governo JK. Na construção de Brasília as empreiteiras
receberam favorecimentos e houve superfaturamento de muitas obras. A lua de meu
foi na ditadura com as chamadas obras faraônicas como a ponte Rio Niteroi, a trans
amazônica e a usina de Itaipu. A pouca vergonha só foi descoberta agora no governo
PT, e com envolvimento de petistas, não poderia ser diferente.

A corrupção está impregnada


Portanto, meu caro amigo leitor, a corrupção no Brasil é histórica, estrutural, está
impregnada na sociedade e na cultura de uma maneira quase que generalizada.
Sejamos, portanto, justos; não é algo exclusivo do governo PT e não é monopólio de
criminosos do colarinho branco.

Quando furamos uma fila; achamos uma carteira no banheiro pegamos o dinheiro e
jogamos a carteira no lixo; quando cortamos um sinal vermelho; quando escapamos
da blitz graças ao aviso do grupo de whatsapp, quando recebemos o troco a mais e
ficamos quietos; sempre quando fazemos valer o velho jargão “jeitinho brasileiro”
estamos sendo tão corruptos quanto Dirceu, Delúbio, Genoino e toda corja de
mensaleiros.

A verdade é que somos incondicionalmente todos éticos, moralistas e probos quando


algo não nos convém, a exemplo da alta da gasolina, alta dos impostos, a Petrobras e
seus escândalos de corrupção. E quando nos convém somos pioneiros em esconder,
surrupiar, manipular, escorchar, afanar, rapinar, escamotear e, também, a nos safar.

Repito: a corrupção não é algo exclusivo deste ou daquele partido. A corrupção faz
morada em sua casa, no dia a dia, nas pequenas e grandes atitudes. Quando você,
pai, promete um brinquedo, um celular, ou aquele jogo de vídeo game se a seu filho se
ele passar de ano; parabéns, você está comprando o seu filho. Ele vai crescer
acreditando em um mundo onde se pode conquistar as coisas em troca de
favorecimentos, proventos e privilégios; e a política será a parte mais trágica desse
enredo.

Devemos começar pelas nossas crianças

A “negociata é um bom negocio para o qual não me convidaram”, disse uma vez o
Barão de Itararé. Ele estava fazendo referência à diluição da ética no sentido
aristotélico do termo corrupção. Todos querem mudança, todos aparentam ter raiva da
corrupção, apontam para este e aquele partido e se fazem de justiceiros afoitos.

Então, tenhamos a convicção de que, se queremos mudar a história de nosso país,


teremos que começar pelas nossas crianças e dentro de nossos lares e, em extensão,
nas escolas. É fundamental ensinar as nossas crianças, desde a tenra idade, a linha
tênue e a sutil diferença entre mentir e dizer a verdade, entre a honestidade e a
desonestidade, este é um princípio.

Um Brasil sem corrupção depende, inexoravelmente, da honestidade de seus


cidadãos. Eu tenho um sonho, quero um dia poder reescrever o velho axioma de Lima
Barreto: “O Brasil não tem povo, tem público”.

CORRUPÇÃO
Corrupção – do latim: corruptio, onis. Segundo o dicionário Larousse: ação ou
efeito de corromper-se; degradação de costumes; ação de seduzir por dinheiro,
presentes, etc., levando alguém a afastar-se da retidão; SUBORNO.
A história da humanidade fervilha em torno deste assunto. Desde os primórdios da
existência humana o homem tem-se corrompido. O primeiro caso de corrupção
relatado na história encontra-se no relato bíblico. O casal edênico foi criado para
viver em harmonia com o seu criador. Deus criou um código de ética para que o
casal seguisse e assim, mostrar que eram verdadeiramente fiéis a Deus. O código
era a árvore que ficava no meio do jardim, dela, o casal não poderia aproximar-se,
muito menos comer do seu fruto. Mas, a serpente muito sagaz, estando em cima
da árvore proibida disse à mulher (que se aproximou da árvore mesmo sabendo
que a norma do jardim não lhe dava direito a tal atitude): É assim que Deus disse:
não comereis de toda árvore do jardim? Respondeu-lhe a mulher: apenas desta
não podemos comer, pois se dela comermos, morreremos. Então a serpente disse
à mulher: é certo que não morrereis (Gênesis, 3: 1-4). O restante da história todos
conhecemos.
O casal foi corrompido. Depois deste episódio, a humanidade nunca mais
conseguiu viver sem corromper-se. Todos nós sabemos das abominações
cometidas por grandes imperadores e reis da antigüidade em nome da ganância,
homens corruptos, como Ciro, Ulisses, Alexandre, o grande, Nero, Júlio César,
Teodósio - último imperador romano, Carlos Magno, Luiís-o-piedoso, Carlos VII da
França, Frederico II da Alemanha, Luís XIII, D. João de Portugal, seu filho D.
Pedro, no Brasil, entre outros da atualidade. Também conhecemos através dos
registros históricos, tamanha corrupção cometida já na nossa era pelos políticos,
que a cada década, estão mais escancarados, audaciosos, sínicos.
O mais recente escândalo de corrupção é do nosso presidente do senado Renan
Calheiros. Com certeza o nosso senado é mais corrupto que o senado de Roma
na época dos Césares. O nosso país está submerso em um mar de corrupção,
seja esta oriunda do poder legislativo, judiciário ou executivo, não importa, esses
poderes parecem conspirar contra as leis e os bons costumes, contra a moral,
contra a ética, contra a população brasileira. Vivemos num país desacreditado
moralmente, onde os nossos representantes, eleitos pela população, parecem ter
esquecido o voto de confiança que fazem ao chegar ao poder. Nossa situação está
cada vez mais vergonhosa. São raras as exceções de se encontrar um político
realmente honesto. A que ponto chegamos!

O DILEMA ÉTICO
Por que será que a ética é uma prática tão complicada de se adotar? Adotamos a
justificativa que John Maxwell julga ser o problema. Para ele, há três razões para
não se seguir as normas éticas:
1. Agimos de acordo com nossa conveniência Um dilema ético pode ser definido
como uma escolha indesejável ou desagradável relacionada com um princípio ou
uma prática moral.

2. Nunca jogamos para perder Muita gente acredita que adotar uma postura ética
pode limitar suas alternativas, suas oportunidades e a própria capacidade de ser
bem-sucedida. Poucas pessoas se sentem confortáveis com a idéia de serem
desonestas, mas ninguém gosta de sair perdendo.
3. Relativizamos nossas escolhas Diante de situações em que não é possível
identificar um ganho imediato, muita gente escolhe fazer aquilo que parece certo
naquele momento, de acordo com as circunstâncias. Essa idéia da relatividade
ganhou legitimidade em 1966 com a publicação de um livro intitulado: ética
circunstancial do Dr. Joseph Fletcher (sacerdote anglicano). Fletcher formulou um
sistema ético que legitimaria a maior parte das mentiras convencionais, ou seja, o
certo é determinado pela situação, e o amor pode justificar tudo – mentiras,
trapaças, roubos, e até assassinatos. Desde então, a ética circunstancial tornou-se
a norma de comportamento social. Esse jeito de pensar tem influenciado milhões
de pessoas; muita gente a considera até essencial. Isso gera o caos completo.
Cada um segue seu próprio padrão ético, que muda de acordo com a conveniência
da situação.
O pior é que esta postura é incentivada. Por tanto, vale tudo. Qualquer padrão que
se queira usar, está tudo bem. Como as coisas mudaram. Enquanto no passado,
nossas decisões eram baseadas na ética, hoje, é nossa ética que se baseia nas
decisões que tomamos. “Se é bom para mim, então é válido.” Será que algum dia
esta tendência se reverterá? Um de nossos problemas é que a ética nunca é
tratada como uma questão de negócio, social ou política. É sempre uma questão
pessoal.

O CARÁTER FAZ A DIFERENÇA


Apenas alguém de caráter pode causar impacto sobre outros. O caráter é o
segredo de uma vida de integridade e excelência ética. Não podemos deixar de
levar em consideração que caráter é uma opção.
No século XIX, a escritora George Eliot disse o seguinte sobre caráter: “Seja
honesto, nunca se envergonhe de fazer a coisa certa, tome suas decisões com isto
em mente e não transija.” As pessoas pobres de caráter tendem a culpar as
escolhas que fazem ou as circunstâncias. Pessoas éticas fazem boas escolhas,
não importam quais sejam as circunstâncias.
Talvez a melhor frase para a ocasião, seja a frase de Confúcio: “saber o que é
certo e não fazê-lo é o pior tipo de covardia.” Há também aquelas pessoas que
preferem ser omissas na hora de tomar uma decisão de ordem ética. No entanto, é
importante lembrar que tal omissão não deixa de ser uma forma de decisão. No
mundo atual, as pessoas parecem ter perdido seus princípios, tudo está
relativizado.
É a mesma coisa que aconteceu com a verdade. Cada um tem a sua verdade, não
existe verdade absoluta, tudo é relativo. Edward T. Lyman afirma o seguinte: “Um
princípio, em especial, o princípio moral, não pode jamais ser como um cata-vento,
girando para cá e para lá ao sabor dos ventos da conveniência. Um princípio moral
é uma bússola, sempre apontando para a mesma direção, sem erro.” Um dos
fatores mais fortes para não seguir as normas éticas é o poder.
Os mais recentes escândalos de corrupção do nosso país envolvem o uso do
poder, ou melhor, o abuso do poder e posição por parte dos políticos. Infelizmente
para muitos, ter poder é como beber água salgada: quanto mais se bebe, mais
sede dá. O poder é como um rio poderoso. Conforme segue seu curso, é um
exemplo de beleza. Mas quando invade suas margens, provocam grande
destruição.
Sabiamente o ex-presidente americano Harry Truman afirmou: “Se um homem
pode aceitar ocupar uma posição de poder com a consciência de que aquela
posição é temporária, ele se sai bem. Mas quando pensa que é a razão de ser do
poder, esta pode ser sua ruína.”
Todos somos suscetíveis a algum tipo de tentação para comprometer nossos
valores, cabe a cada um de nós escolher manter-se fiéis a eles ou não. A raiz
deste mal está na cobiça que nada mais é do que o amor fora de proporção, fora
do equilíbrio e fora do lugar. Significa colocar nossa devoção em “coisas” –
dinheiro, sucesso, fama – e transformá-las no centro de nossa existência, crendo
que são o fundamento sobre o qual construímos a felicidade. As coisas se tornam
mais importantes do que as pessoas e suas necessidades. A religião é para
mística o que a divulgação é para a ciência – Henri Bergson

Por: Francilene Nascimento – Adm. RH

A corrupção e as suas raízes sociológicas no Brasil


Tiago Carneiro da Silva
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Quanto à corrupção no Brasil, ainda se banaliza a perversidade das suas
consequências, ignora-se as a origem do problema e abstrai-se da busca pela
solução. Importa revisar a formação da identidade do brasileiro, a fim de
demonstrar o limbo entre o lícito e o ilícito que se revela na figura do "jeitinho".
INTRODUÇÃO.
A Corrupção é um fenômeno recorrente no dia-a-dia do brasileiro, seja
discutindo, denunciando ou perpetuando. Vivencia-se nos dias atuais uma presença
tão latente de subterfúgios criminosos no cerne da estrutura burocrática do Estado
que, em verdade, banaliza-se a perversidade das suas consequências, ignora-se as a
origem do problema e abstrai-se da busca pela solução.

"O núcleo da corrupção radica (...) no "mercadejar com o cargo" a vulnerar


para além do óbice legal à percepção de qualquer vantagem extrínseca atinente ao
desempenho do cargo, a objetividade decisional do Estado, fulcral à consecução do
bem comum" (BIDINO, MELO, SANTOS; 2009, pág. 166). A corrupção, porém, vai
muito além de uma tipificação penal, da transposição da licitude para a ilicitude, e deita
suas raízes na história da vida em sociedade, revelando-se das mais diversas formas
de acordo com a cultura de cada povo.

No Brasil, de um lado o Estado institui respostas improfícuas e meramente


ornamentais para a Corrupção, negligenciando a complexidade desta prática,
ignorando o que está além do seu caráter delituoso e, de outro lado, os cidadãos
simplificam a corrupção à caricatura da figura política de hábitos escusos, mas
diferentemente do que se comumente pensa, a Corrupção "não é um fenômeno
circunscrito a uma elite política perversa e sem ética, mas revela valores fortemente
arraigados na população brasileira" (ALMEIDA, 2007, pág. 109), situação que exige
soluções mais eficientes do que as previstas em nosso ordenamento jurídico.

Ao se concentrar nas pessoas e não perceber que há algo maior e mais


complexo, revela-se o raciocínio simplista de fazer da moral pessoal ou da falta dela, a
grande responsável pela corrupção. Para além da moralidade individual existem
estruturas de ação que permitem ou mesmo fazem com que os agentes públicos
cometam atos corruptos (MARTINS, 2008, pág. 115).

Encontramos na história da humanidade, em sociedades das mais diversas,


manifestações de repúdio e combate à Corrupção. Na Lei das XII Tábuas já era
presente a reprimenda ao corrompimento dos juízes. Antônio Pagliaro e José da Costa
Jr. recordam que "a lei mosaica punia o juiz corrupto com a flagelação, e a grega, com
a morte" e apontam exemplos esdrúxulos de punições na Antiguidade, como quando
"Cambises mandou esfolar vivo um juiz corrupto, utilizando sua própria pele para
recobrir a cadeira que iria ser ocupada por seu sucessor" ou mesmo quando "Dario fez
pregar numa cruz um juiz julgado corrupto" (PAGLIARO; DA COSTA JR; 2009, pág
99). Poder-se-ia elencar inúmeras posturas adotadas por outros ordenamentos
jurídicos, desde as mais primitivas às mais "civilizadas", desde a antiguidade à
modernidade, para enfrentar a degeneração do Estado pela via da corrupção dos seus
agentes. Mas, ainda que seja possível com a ajuda de outros povos e outros tempos
compreender melhor o fenômeno da Corrupção e a lidar com a sua periculosidade,
apresentamos as nossas peculiaridades, que não devem ser por nós desprezadas,
para que sirvam de insumo à nossa própria – e, consequentemente, mais eficaz -
resposta à Corrupção.

Importa, portanto, revisar a formação do Brasil e da própria identidade do


brasileiro, a fim de revelar no âmago destes os principais elementos formadores da
cultura da Corrupção e do limbo entre o lícito e o ilícito que se revela na figura do
"Jeitinho". Para tanto, cumpre recorrer, principalmente, à obra "Raízes do Brasil", de
Sérgio Buarque de Holanda, que trouxe, nos idos dos anos 1930, uma nova
interpretação sobre o ser brasileiro, através de uma análise histórica do país,
permeada de conceitos sociológicos em detrimento dos conceitos raciais até então
largamente manejados pelos pensadores brasileiros, trazendo dessa forma uma
contribuição inestimável para a redescoberta do nosso perfil psicológico.

A CHEGADA DOS AVENTUREIROS.


Orientado pela obra "A Ética protestante e o Espírito do capitalismo", de Max
Weber, e em sua metodologia do tipo ideal, Sérgio Buarque de Holanda elege duas
figuras, dois tipos sócio-psicológicos, que, apesar de não possuírem existência fora do
mundo das ideias em seu estado puro, ajudam a pensar e compreender um fenômeno
histórico vivenciado pela contraposição e mescla dos tipos, que são encarnados na
figura do trabalhador e do aventureiro.

Existe uma ética do trabalho, como existe uma ética da aventura. Assim, o
indivíduo do tipo trabalhador só atribuirá valor moral positivo às ações que sente
ânimo de praticar e, inversamente, terá por imorais e detestáveis as qualidades
próprias do aventureiro – audácia, imprevidência, irresponsabilidade, instabilidade,
vagabundagem (...). Por outro lado, as energias e esforços que se dirigem a uma
recompensa imediata são enaltecidos pelos aventureiros; as energias que visam à
estabilidade, à paz, à segurança pessoal e os esforços sem perspectiva de rápido
proveito material passam, ao contrário, por viciosos e desprezíveis para eles. Nada
lhes parece mais estúpido e mesquinho do que o ideal do trabalhador. (HOLANDA,
1995, pág. 44)

Enquadrando os portugueses em um perfil de maior predominância do tipo


aventureiro, Sérgio Buarque constata que a colonização portuguesa não foi marcada
por processos metódicos e racionais de dominação, sendo, em verdade, muito mais
paltada pela plasticidade social - calcada na ausência de um orgulho de raça entre os
portugueses, que ao tempo já eram um povo de mestiços -, refletida na pouca
interferência da rotina dos nativos e no esforço em se adaptar ao ambiente que
encontraram na América, ao invés de se sobrepor à cultura local pelas vias do
planejamento e da abstração. Foi o português, portanto, o colonizador que seguiu a
ética da compensação imediata, que buscava a "riqueza da ousadia e não a riqueza
do trabalho" (HOLANDA, 1995, pág 49), realizando na América uma colonização
prática, concreta e pouco espirituosa, que pudesse "extrair do solo grandes benefícios,
sem grandes sacrifícios" (HOLANDA, 1995,pág. 53).

Na dominação portuguesa da América, ao contrário do que se verifica na


espanhola, não houve um intento racionalista de interferência sobre a paisagem.
Percebe-se, ao revés, nos traços das construções portuguesas sinais do improviso, do
abandono e do desleixo, exacerbando a incapacidade de intervenção sobre a natureza
do aventureiro e sua propensão a harmonizar-se a ela.

Como bem assevera o professor George Avelino Filho,

“a ausência de projeto, de dedicação permanente, e a busca da riqueza fácil,


expressivas no tipo aventureiro, deram à colonização portuguesa um nítido aspecto de
exploração comercial; de "feitorização muito mais do que de colonização", que se
exprime não apenas na ocupação restrita ao litoral, de fácil comunicação com a
metrópole, como também no predomínio inconteste do rural sobre o urbano”. (FILHO,
1988).

Entre a artificialidade das cidades e a naturalidade da vida rural, o desprezo


do aventureiro pelo esforço constante e planejado beneficiou o ruralismo. A dilatação
do domínio rural na colônia, associada à insignificante manifestação urbana, propiciou
àquele uma auto-suficiência bastante latente e seus padrões de conformação iriam,
posteriormente, ser espelhados na formação das estruturas sociais para além daquele
espaço.

O HOMEM CORDIAL E O PATRIMONIALISMO.


No domínio rural, cristalizou-se aquilo que seria o pilar mais nítido da
sociedade colonial, a marca indelével deste momento histórico, oriunda do seio das
relações familiares: a autoridade exercida pela figura patriarcal, que estabelecia uma
coesão hierárquica e inflexível dos constituintes e dependentes da família. A solidez
de tal estrutura, cultivada em grandes propriedades monocultoras, fechadas para o
além dos seus territórios, quase como feudos, foi essencial para se consolidar o
patriarcalismo de tal modo nos indivíduos-atores da dinâmica social naquele espaço
rural que levou estes a, nos mínimos contatos com o mundo externo aos domínios dos
seus patriarcas, alastrar o ambiente doméstico para além dele, através da nociva
confusão entre o público e o privado e a disseminação do patrimonialismo na
sociedade brasileira. Além disso, conforme Avelino Filho, havia ainda outro fator que
agravava esta situação:

“A quase inexistência de uma mão-de-obra livre e de um grupo social


intermediário entre senhores e escravos dificultava o surgimento de uma visão de
mundo alternativa e mais afeita ao processo de "desencantamento" pelo qual passou o
mundo europeu. Desta forma, a vida doméstica e familiar oferecia: o parâmetro para
qualquer tipo de contato. Isto significou o predomínio de relações humanas mais
simples e diretas, que manifestavam horror a qualquer, forma de distância social e
procuravam sempre uma maior aproximação - uma maior intimidade - com a pessoa
ou objeto, de maneira a torná-los mais familiares, mais concretos e mais acessíveis”.
(FILHO, 1988)

O domínio rural serviu, assim, de laboratório para a introjeção dos valores


ínsitos à família patriarcal nos indivíduos constituintes desse espaço de vivência
colonial, que, postos – no exercício da sociabilidade - em um habitat para além do
aquário no qual foram domesticados, mostraram-se incapazes de filtrar e tolher a
espontaneidade dos seus hábitos, a fim de adequá-los aos arquétipos formais da
burocracia estatal.

Tem-se, então, as condições mais férteis para a construção da cordialidade


na colônia. O homem cordial é exatamente o produto de um processo de socialização
daquele indivíduo subjugado aos valores da família patriarcal que não tem a
capacidade de mensurar com uma exatidão segura os limites entre o público e o
privado. Sua ética é pautada pelo personalismo, que confronta a impessoalidade, a
abstração, a racionalidade e a coletividade pela cooperação. O homem cordial
caracteriza-se por ser um perfil psicológico impróprio à civilidade, negando as suas
formalidades. Para ele, não é nítida a necessidade do ritualismo e do artificialismo
como instrumento a ser compreendido por todos que desejam a socialização em um
universo distinto do doméstico. A cordialidade compreende, paradoxalmente, uma
forma de sociabilidade, mas que em seu substrato não se permite uma formalização
que omita sua espontaneidade característica.

Essa concepção cordial da socialização é um empecilho para a instituição de


um Estado burocratizado, que exige a adoção de regras impessoais e precisas e que
se legitima a partir de princípios abstratos e racionais. Para o sucesso da burocracia
estatal, torna-se necessário romper com a mentalidade doméstica do homem cordial.
"Caso contrário, repete-se um roteiro conhecido: a apropriação do impessoal pelo
pessoal, do abstrato pelo concreto, do objetivo pelo subjetivo, do coletivo pelo
particular, do público pelo privado" (FILHO, 1988)

Pode-se concluir, ainda, que o homem cordial está indisposto para a


modernidade, tendo em vista que o paradigma do mundo moderno pretende um
desenvolvimento que "se traduza indefectivelmente pela completa racionalização da
vida coletiva e individual" (SANTOS, 2009, pág. 50), proposta que se traduz como
inibidora do caráter eminentemente emocional da cordialidade. O homem cordial,
deve-se registrar, não tem seu perfil psicológico restrito a sentimentos positivos de
benevolência ou concórdia, como se poderia equivocadamente presumir pela
terminologia adotada. O que comove a cordialidade, em verdade, é o íntimo originado
na esfera do privado, que se personifica em manifestações que vão além de qualquer
maniqueísmo. O homem cordial, portanto, é capaz de exprimir com a mesma
autenticidade o amor e o ódio, a amizade e a inimizade, o rancor e o perdão.
Pelo viés do patrimonialismo, o homem cordial está muito próximo das portas
da corrupção e, logicamente, do desgaste da proposta burocratizante do Estado
Moderno. "Patrimonialismo e corrupção são ideias afins, e isso signifia que quanto
mais alguém acha correto e defende valores patrimonialistas, mais tenderá a ser
tolerante com a corrupção e práticas correlatas". (ALMEIDA, 2007, pág. 109)

A temática do “patrimonialismo” encontra sua matriz teórica na obra de Max


Weber, que estatui aquela como desdobramento de uma dominação tradicional, que é
exercida, via de regra, por uma autoridade, a qual está legitimada pela tradição, pelo
costume rigidamente sedimentado. O conceito trabalhado por Sérgio Buarque, além
de outros autores, não segue perfeitamente a gênese weberiana do conceito, mas
podemos partir desta para a compreensão daquele.

Na primeira compreensão, o patrimonialismo tem como marca a origem na


entidade familiar de caráter patriarcal, projetada sobre uma escala tão extensa de
circunscrição territorial que necessitou se sofisticar e racionalizar a própria
administração, a fim de regular seus bens e o corpo demográfico adjunto àquele
território. O que ocorre é que a administração política nada mais é do que extensão do
poder senhorial, que imprime à coisa pública o mesmo tratamento que dá ao
patrimônio privado. Em raízes do Brasil (2008), Sérgio Buarque, ao traçar o perfil do
homem cordial, descreve exaustivamente a inépcia deste no que tange à
discriminação entre o público e o privado. O funcionário patrimonial entende que a
gestão política é indistinta dos seus assuntos particulares e que sobre ela pode
exercer seu subjetivismo e auferir benefícios de toda sorte a partir da sua função.
Todavia, para Sérgio Buarque, o Estado, longe de ser um prolongamento ou uma
gradação da família, é, em verdade, uma oposição a ela, uma descontinuidade. Para o
sucesso da proposta estatal, torna-se necessário a desconstituição dos valores
familiares e não a depuração destes. O dilema da modernidade para o homem cordial
está entre a putrefação da família ou a corrupção do Estado. O patrimonialismo aqui
não é extensão da "casa" para as "ruas", mas antes a negação das "ruas", pela
afirmação da "casa".

A dificuldade de compreensão do fenômeno da corrupção no Brasil se


desdobra ainda na complexa figura do "jeitinho", que se traduz em sensíveis formas de
se obter benefícios de ordem pessoal através do desvirtuamento de instrumentos
estatais e se assimila até mesmo à licitude na mentalidade cordial. O "jeitinho"
estimula o exercício de subjetivismos e favoritismos, em detrimento da objetividade e
da impessoalidade exigível dos atos governamentais.

“Ele [o jeitinho] funciona como uma estratégia de navegação social. Diante de um


Estado muito burocratizado, que com frequência opera segundo leis contraditórias e
rígidas, (...) o jeitinho permite que se tenha acesso a direitos que de outra forma
jamais se alcançariam. É um recurso ao alcance dos que têm as habildiades e o
conhecimento necessários para "dar um jeitinho". Há ainda as situações em que tudo
está previsto para funcionar, porém nada funciona (...). O jeitinho viria em socorro das
vítimas dessa ineficiência, permitindo (...) que seus hábeis operadores tenham acesso
a determinados direitos.

Por fim, (...) o jeitinho possibilita a quebra das relações hierárquicas que
caracterizam a sociedade brasileira. Como todos conhecem e podem recorrer a seus
códigos e procedimentos, ele permite que pessoas dos mais diferentes grupos sociais
alcancem seus objetivos. Em situações hierárquicas, apenas determinados indivíduos
podem quebrar as regras gerais. O jeitinho democratiza de forma radical essa
possibildiade. (ALMEIDA, 2007, pág. 70)
Tais consequências da prática do "jeitinho", tanto podem ser observadas de
um ponto de vista positivo, quanto podem levar à constatação de que ela nada mais é
do que a porta de acesso à corrupção, senão ela própria eufemizada e, sob esta
óptica, mais perigosa, tendo em vista a ampla absorção e a tolerância do "jeitinho"
pelos hábitos nacionais.

A BUROCRATIZAÇÃO DA COLÔNIA.
Com o declínio do sistema de capitanias hereditárias no Brasil, iniciou-se, em
1549, o processo de centralização da colônia com a instalação do Governo-Geral,
sendo Tomé de Souza o primeiro Governador-Geral, que trouxe consigo o
desembargador Pedro Borges para exercer a função de Ouvidor-Geral, dando início à
estruturação do Judiciário no país. A partir desse processo de centralização da
Colônia, as Ordenações do Reino tomaram força e, consequentemente, iniciou-se a
profissionalização e burocratização do Direito e dos seus agentes. Ao lançar mão
dessa sofisticação do aparato administrativo na colônia, Portugal tinha como objetivo
impedir que se formasse aqui uma organização política que buscasse privilegiar os
interesses locais. Porém, o que efetivamente ocorreu "foi a interpenetração das duas
formas supostamente hostis de organização humana: a burocracia e as relações
sociais de parentesco”.(CRISTIANI, 2006, pág. 296)

A elite local não tardou a confabular uma aproximação de seus interesses aos
dos magistrados vindos da metrópole, que, tão logo chegaram à colônia, despertaram
para a conveniência dos possíveis acordos a serem realizados com aqueles. De fato,
o que se sucedeu foi um ciclo de trocas de favores pessoais entre a elite dominante na
Colônia e os agentes jurídicos. Se estes não atenderam à aspiração da metrópole em
manter um Judiciário afastado da população, tampouco se preocuparam em assistir às
necessidades de toda a Colônia. Depositaram seus esforços, em geral, na promoção
dos próprios interesses e, necessariamente, dos interesses daqueles que lhes
ajudariam a promover suas ambições pessoais.

De um lado,encontrava-se uma elite local com esquemas formados de


corrupção e manutenção do statuquo. Do outro lado, magistrados dispostos a tudo a
frm de garantirem privilégios para si epara os seus. A cooptação desses magistrados,
por essas razões, não foi uma empresa difícil. Antes foi um encontro de interesses, de
troca de favores recíprocos. (CRISTIANI, 2006, pág. 297)

A partir dessa dinâmica da disposição e transposição dos interesses e do


poder, os magistrados passaram a figurar, além de dominadores dos meios de
produção intelectual, também como grandes proprietários rurais, combinação que lhes
proporcionou status e riqueza suficiente para que se assumissem o posto de maior
vetor na formação da opinião pública. Paradoxalmente os mesmos magistrados que
deixaram como legado o patrimonialismo, dilatando a penumbra que separa os
interesses coletivos e os interesses individuais, se imbuíram de iniciar a instalação de
uma administração burocrática na Colônia.

Desde já, pode-se notar o nosso simulacro de Estado, que, como princípio
regulatório da Modernidade, ao ser estranho àqueles a que se impõe, revela-se como
défice desta, sendo incapaz de imprimir plenamente suas promessas de civilidade ao
homem cordial. Essa incompatibilidade apenas veio a se acentuar com o decorrer da
nossa história.
O DESTERRO DA CORDIALIDADE (OU DA CIVILIDADE?)
No século XVIII, era comum as famílias da elite colonial enviarem seus filhos
para estudar na Europa, tendo em vista que a primeira escola de ensino superior no
Brasil só foi instalada com a chegada da família real em 1808. Nas universidades
europeias, inseridas num contexto pós Revolução Francesa, eles entraram em contato
direto com ideais liberais e democráticos, bem como racionalistas e individualistas
provenientes do Iluminismo. Ao retornarem para o Brasil, providenciaram a inserção
desses valores na esfera política da colônia. Ocorre que, como acentua Sérgio
Buarque, ao citar Bentham, a maior premissa do pensamento liberal-democrático se
realiza na felicidade para o maior número de pessoas, ideia que, evidentemente, não
se coaduna com uma sociedade onde a base emocional dita a lógica da convivência
entre os homens. Esse contraste entre a disposição do homem cordial e a proposição
de civilidade do Estado, gerou um conflito, onde aquela prevalecerá sobre esta, e que
o professor Dr. Leopoldo Waizbort, explana da seguinte forma:

Há uma incompatibilidade de raiz entre a dimensão psicogenética que é posta a


descoberto por Sérgio Buarque e uma estrutura social de caráter democrático.
Dessarte, a imposição de uma tal estrutura aparece em total descompasso e
inadequação com a psicogênese – (...) àquela forma de convívio humano de base
emocional, amplamente tematizada ao longo de Raízes do Brasil. Nesse sentido,
haveria uma base psicogenética que torna inadequada e imprópria uma determinada
formação sociogenética; esta seria, no caso em pauta, uma estrutura estranha, uma
aberração, imposta e não gestada organicamente e afim ao domínio psicogenético.
Essa vetorialização divergente de estrutura da personalidade e estrutura social tem
como resultado tamanha tensão, que necessariamente um dos vetores há de sucumbir
ao outro; no caso, uma tal estrutura da sociedade sucumbe à estrutura da
personalidade: a democracia é, entre nós, necessariamente um mal-entendido.
(WAIZBORT, 2010)

O supracitado professor recorda que, na primeira edição de Raízes do Brasil,


Sérgio Buarque recorre à uma citação de Nietzsche, que, em termos abstratos, se
aplicaria e explanaria perfeitamente toda esta questão da cogência entre os princípios
norteadores da modernidade proposta pelo Poder na Colônia e os valores
culturamente construídos no seio da sociedade cordial, ou seja, "da assunção de um
dever abstrato e geral às custas de um dever próprio, individual, específico, concreto –
vital".(WAIZBORT, 2010). Dizia o filósofo alemão, em sua obra, O anticristo (2008),
que:

A virtude deve ser nossa invenção; deve surgir de nossa necessidade pessoal e
em nossa defesa. Em qualquer outro caso é fonte de perigo. Tudo que não pertence à
vida representa uma ameaça a ela; uma virtude nascida simplesmente do respeito ao
conceito de “virtude”, como Kant a desejava, é perniciosa. A “virtude”, o “dever”, o
“bem em si”, a bondade fundamentada na impessoalidade ou na noção de validez
universal – são todas quimeras, e nelas apenas encontra-se a expressão da
decadência, o último colapso vital, o espírito chinês de Konigsberg. Exatamente o
contrário é exigido pelas mais profundas leis da autopreservação e do crescimento:
que cada homem crie sua própria virtude, seu próprio imperativo categórico. Uma
nação se reduz a ruínas quando confunde seu dever com o conceito universal de
dever. Nada conduz a um desastre mais cabal e pungente que todo dever “impessoal”,
todo sacrifício ao Moloch da abstração. (NIETSZCHE, 2008, pág 11)
Assim, "o imperativo categórico do nosso povo é o nosso personalismo. (...)
Ao invés de negá-lo, contestá-lo ou ignorá-lo, devemos afirmá-lo, nele mergulhar e
nele encontrar o princípio que oriente a nossa cristalização social, cultural e política"
(WAIZBORT, 2010). Do contrário, estamos fadados ao gradual e sofrível desgaste do
nosso tecido social.

Para ser mais enfático com relação à debilidade dos pilares do Estado
implementado sobre um terreno ao qual não se encaixam, podemos fazer alusão a
uma sutil metáfora de Boaventura Sousa Santos:

os espelhos da sociedade (...) são conjuntos de instituições, normatividades,


ideologias que estabelecem correspondências e hierarquias entre campos
infinitamente castos de práticas sociais. São essas correspondências e hierarquias
que permitem reiterar identificações até ao ponto de estas se transformarem em
identidade. A ciência, o direito, a educação, a informação, a religião e a tradição estão
entre os mais importantes espelhos das sociedades contemporâneas. O que eles
reflectem é o que as sociedades são. (...)

porque são eles próprios processos sociais, têm vida própria e as contingências
dessa vida podem alterar profundamente a sua funcionalidade enquanto espelhos. (...)
Quanto maior é o uso de um dado espelho e quanto mais importante é esse uso,
maior é a probabilidade de que ele adquira vida própria. Quando isto acontece, em vez
de a sociedade se ver reflectida no espelho, é o espelho a pretender que a sociedade
o reflicta. De objecto do olhar, passa a ser, ele próprio, olhar. Um olhar imperial e
imperscrutável, porque se, por um lado, a sociedade deixa de se reconhecer nele, por
outro não entende sequer o que o espelho pretende reconhecer nela. (...)

Quando isto acontece, a sociedade entra numa crise que podemos designar
como crise da consciência especular: de um lado, o olhar da sociedade à beira do
terror de não ver reflectida nenhuma imagem que reconheça como sua; do outro lado,
o olhar monumental, tão fixo quanto opaco, do espelho (...) que parece atrair o olhar
da sociedade, não para que este veja, mas para que seja vigiado (SANTOS, pág.
47;48).

Encontra-se desterrado, portanto, o homem cordial que não se vê no espelho


da democracia, mas é oprimido por este a fingir seu reflexo. Na ausência de um chão
que seja propriamente seu, porém, ele não se mostra inerte e, insistentemente,
mantém seus velhos hábitos em ação. E, por ter seus valores muito mais maduros do
que os da civilidade no Brasil, mostra-se mais propício à vitória do que ela, ao fim da
batalha. A derrota da civilidade é a consolidação do personalismo e sua resistência
será tolhida pelas manifestações do patrimonialismo, do "jeitinho" e da corrupção.

CONCLUSÃO
Se a civilidade moderna pretende vencer a guerra contra a cordialidade,
deverá se desdobrar para reverter o fluxo de uma história antiga, deverá reconhecer a
fragilidade de suas armas e, principalmente, da insuficiência do Direito para combater
a corrupção. Por fim, deverá reconhecer que não é capaz de cumprir todas as suas
promessas utilizando-se sempre dos mesmos recursos.
O fenômeno da Corrupção pode ser encontrado em qualquer lugar, em
qualquer sociedade, mas, como visto, é um elemento fruto de processos sociais
complexos que se deram no decorrer da história do país e, portanto, apresenta
peculiaridades a serem obervadas. Trata-se de fenômeno que resulta da equação de
características bem consolidadas do perfil nacional.

No atual cenário do país, porém, já não é possível visualizar uma


homogeneidade tão clara entre os brasileiros. As divisões, sejam elas de classe, de
escolaridade, de região, desenvolveram múltiplas faces para os cidadãos e, portanto,
a cordialidade já não se mostra tão aparente. Apesar disso, ela ainda tem forte
predominância nos atos e nos pensamentos de grande parte da população brasileira.
Suas consequências são bastante visíveis, sejam elas benéficas ou prejudiciais.

Neste último caso, o país clama por soluções imediatas, que os tradicionais
métodos repressivos jurídicos de combate à corrupção não são capazes de oferecer, o
que evidencia a necessidade premente de se buscar estratégias preventivas que
exigem do Poder Público uma ação no sentido de identificar atividades potencialmente
corruptas e considerá-las antecipadamente para que seja possível reduzir ou mesmo
eliminar as causas do dano.

REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Alberto Carlos – A Cabeça do Brasileiro, 1 edição, Rio de Janeiro,
Ed. Record, 2007.

BIDINO, Cláudio; MELO, Thaís de; SANTOS, Cláudia Cruz dos - A corrupção,
Coimbra, Ed. Coimbra, 2009.

DECCA, Edgar Salvadori - Ensaios de nacionalidade:


cordialidade, cidadania e desterro na obra de Sérgio Buarque de Holanda, 2006
(http://www.ufjf.br/locus/files/2010/02/82.pdf – acessado em 08 de Setemrbo de 2012);

FILHO, George Avelino – Cordialidade e Civilidade em Raízes do Brasil,


1988- (http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_12/rbcs12_01.htm -
acessado em 13 de Setembro de 2012);

HOLANDA, Sérgio Buarque – Raízes do Brasil, 26 edição, São Paulo, Ed.


Companhia das Letras, 1995.

MARTINS, José Antônio - Corrupção, São Paulo, Ed. Globo, 2008.

NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm – O Anticristo, 1 edição, São Paulo, ed.


L&PM, 2008.

SILVEIRA, Daniel Barile da – Patrimonialismo e a Formação do Estado


Brasileiro: uma releitura do pensamento de Sérgio Buarque de Holanda, Raymundo
Faoro e Oliveira Vianna
(http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/Daniel%20Barile%20da%20Silveira.
pdf - acessado em 02 de Setembro de 2012);
CRISTIANI, Carlos Valentim – O Direito no Brasil Colonia In: WOLKMER,
Antônio Carlos Fundamentos de História do Direito, 3 edição, 2006, Ed. Del Rey, Belo
Horizonte

WAIZBORT, Leopoldo - O Mal-entendido da democracia. Sergio Buarque de


Hollanda, Raizes do Brasil,1936, 2010 (http://www.scielo.br/pdf/rbcsoc/v26n76/03.pdf -
acessado em 13 de Setembro de 2012)


Autor

Tiago Carneiro da Silva

Filósofo define elementos


da “corrupção pós-
moderna” (JC)
12/07/2011UncategorizedCorrupção, Filosofia, Política
JC e-mail 4298, de 12 de Julho de 2011.

Renato Janine Ribeiro avalia as práticas políticas brasileiras e questiona: é


possível governar com ética?

Uma das conferências da 63ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o


Progresso da Ciência (SBPC) realizada na manhã desta segunda-feira (11), foi
proferida por Renato Janine Ribeiro, filósofo e professor da Universidade de
São Paulo (USP). Na ocasião, ele falou sobre “a corrupção como ameaça à
vida republicana”, avaliando as dificuldades da política contemporânea em lidar
com a ética.

O professor foi apresentado por Aldo Malavasi, secretário geral da SBPC e seu
companheiro de docência na USP. Malavasi iniciou os trabalhos elogiando a
capacidade argumentativa de Janine Ribeiro: “você não hesita em suas falas”.
O palestrante esmiuçou a etimologia de “corrupção”. O ponto de partida da
palavra seria a filosofia natural do mundo antigo que, grosso modo, definia o
termo como morte do corpo, degeneração das células. Por extensão, os
antigos consideravam o espaço da política também como um corpo que
poderia apodrecer e perder a vitalidade social; ou seja, perder as virtudes
exigidas aos homens no espaço público.

Para os romanos, cuja forma de governança era a república, ou “governo para


o bem comum”, a maior corrupção seria o retorno ao mundo privado ou o
desvirtuamento da atenção dos homens para longe das decisões públicas. A
segunda forma de definir a ação foi feita como referência à política moderna,
cujos Estados são sustentados a custas de impostos e encargos da própria
população e as decisões, ainda que políticas, são tomadas com base em um
orçamento comum. De modo que a corrupção moderna, então, teria relação
direta com o furto ao patrimônio público. “O corrupto moderno não estaria
apenas prejudicando os cofres públicos, mas provocando problemas diretos
aos indivíduos, danificando as ações de políticas públicas, o laço social. Assim
a sociedade não se sustenta mais”, explicou o professor.

A terceira classificação atribuída pelo professor foi a “corrupção pós- moderna”,


digna dos tempos “fluidos” da contemporaneidade. Segundo Janine Ribeiro,
esta não envolve diretamente o furto e nem somente beneficia os atores com
dinheiro ou valores. Ocorre, sim, troca de favores, de cargos, favorecimento em
prestação de serviço, negociações internas, com a iniciativa privada ou até
mesmo entre movimentos sociais, além da formação de caixas extras para os
partidos políticos, teoricamente representantes diretos do mundo da
governança. Assim, a essência de que “um favor paga outro” torna-se
fundamental para a “corrupção pós-moderna”. “Às vezes os sujeitos são
pessoalmente honestos, mas colaboram para a corrupção maior e a realizam
em seu dia-a-dia”, completou.

Partido dos Trabalhadores – O exemplo dado e discutido pelo professor Janine


Ribeiro e pelos participantes da conferência foi o da trajetória do Partido dos
Trabalhadores (PT) em seus quase nove anos de governo. “O PT, que sempre
foi o partido ético brasileiro por excelência, no governo age diferente. Embora
pouco tenha sido provado, existem fortes acusações sustentadas até mesmo
pelo Supremo Tribunal Federal. O PT sempre fez comissões éticas internas,
por que agora não faz mais?”, questionou.

O caso do “mensalão”, para o professor, é emblemático de como, para se


manter no poder, determinado grupo político é capaz de ferir os próprios
valores éticos. Ele alertou que, mesmo que se tenha simpatia por qualquer
partido político ou até mesmo por gestões institucionais, não se deve ignorar as
ações de corrupção. “A honestidade deveria ser um valor maior, não uma
exceção”, avaliou. Por último, Janine Ribeiro lançou um questionamento ao
público: “é possível governar sem corrupção?”
(Ascom da UFG)
A Pré História da Igreja
16. abril 2012 · 1 comment · Categories: Destaque · Tags: Antigo
testamento, mesopotamia, sumerios

A Humanidade Inicial
Temos que pensar que a Pré-História da Igreja Católica começa com a criação do
Universo e do Homem. Precisamos relembrar um pouco para reconstruir esta História:

Segundo a Bíblia, Adão e Eva que tinham uma ligação direta com Deus, mas que
transgredindo o pedido de Deus deram origem ao Pecado Original.

Leia na Bíblia: Génesis 1,1 – 3, 24

Por causa do pecado, o Homem perdeu o Paraíso, mas continuou uma História que
dececionava Deus. Como por exemplo o assassinato de Abel por seu irmão Caim. Aqui
temos a corrupção Humana que estendeu por toda a terra a ponto de Deus desejar
destruir a Humanidade com o Dilúvio. Mas, segundo a Bíblia, a Misericórdia de Deus vê
toda a Humanidade e reconhece dentro dela um homem Justo e Fiel chamado Noé.
Vendo-o, Deus decidiu refazer um plano criador. Começando uma nova Humanidade.

Deus começa uma nova Humanidade com Noé e os seus filhos, uma Humanidade Noética
que substituiu a Adâmica.

Depois do Dilúvio, a Humanidade Noética foi para o Ocidente no que denominamos


Mesopotâmia: terras férteis entre os rios Tigre e Eufrates. Neste local nasceram as
primeiras cidades (cidades-estado) há mais de 5000 mil anos atrás fazendo com que
surgisse a mais antiga civilização conhecida: os Sumérios.

Paramos por aqui para entender esta civilização :


Os sumérios eram politeístas, isto é, acreditavam na existência de vários deuses. As
divindades sumérias eram ligadas à natureza (sol, chuva, vento, trovão) e tambem os
sentimentos ( Ódio amor, tristteza, felicidade) Os templos sumérios eram chamados de
Zigurates. O formato era semelhante a uma pirâmide.

Os sumérios viviam em cidades-estados, isto é, cidades independentes na sua


administração e foram construídas nos arredores dos templos religiosos. Dentre as
cidades- estado mais importantes estão Eridu, Kish, Lagash, Uruk, Ur e Nuppur.

Os sumérios destacaram-se na elaboração de projetos e construção de um complexo e


desenvolvido sistema de controlo das águas do Tigre e Eufrates. Construíram barragens,
sistemas de drenagem do solo, canais de irrigação e diques. A armazenagem da água era
muito importante para a sobrevivência das cidades sumérias.

Mas a maior de todas as contribuições dos sumérios foi a criação do sistema da escrita
cuneiforme, por volta de 4000 a.C, onde os sinais representavam ideias e objetos. Para
registar tal escrita usavam placas de argila. Muito do que sabemos desta cultura devemos
a estes registos feitos nessas tábuas de argila.

Como o território dos sumérios era muito fértil, eles sofreram inúmeras invasões e por volta
de 1950 a.C. eles foram dominados e derrotados pelos amoritas e elamitas.

Mas podemos agora voltar à História Bíblia onde falávamos da Humanidade Noética. Esta
Humanidade que formou os sumérios e que viveu em politeísmo, mas que desejou chegar
aos céus. Veja este facto que foi narrado na Bíblia:

Gn. 11,3-4
“E disseram uns aos outros: «Vamos fazer tijolos e cozê-los no fogo!» Utilizaram tijolos em
vez de pedras, e betume em vez de argamassa. Disseram: «Vamos construir uma cidade
e uma torre que chegue até ao céu, para ficarmos famosos e não nos dispersarmos pela
superfície da Terra».

Esta construção é o que nós chamamos de zigurate e esta cidade é citada na Bíblia como
Babel. Nesta realidade, uma Humanidade Babélica veio substituir a anterior, onde todos os
Homens tinham apenas uma língua e empregavam as mesmas palavras.

Aqui vemos as três etapas da Humanidade Inicial:

Humanidade Adâmica que gerou uma Noética e depois uma Babélica. Mas depois desta
Humanidade começa a História da Salvação que constitui o plano de Deus a favor de cada
um de nós.
As "Leis de Eshnunna" são duas tábuas encontradas no Iraque. Foram escritas durante
oreinado de Dadusha. Consistem em 60 artigos, escritos em língua acádica (a mesma
do"Código de Hamurabi"). A maior parte das penas é pecuniária, isto é, evita-se a pena
demorte na maioria dos casos. Apenas em 5 artigos a pena capital aparece, sendo
aplicadapara crimes de natureza sexual, para assaltos e também roubos.

Algumas leis:

5. Se um barqueiro é negligente e deixa afundar o barco, ele responderá por


tudoaquilo que deixou afundar.

22. Se um cidadão que não tem o menor crédito sobre outro conserva, noentanto,
como penhor, o escravo desse cidadão, o proprietário do escravoprestará juramento
diante de deus: "Tu não tens o menor crédito sobre mim";então o dinheiro
correspondente ao valor do escravo deverá ser pago por aqueleque com ele está.

27. Se um homem toma por mulher a filha de um cidadão sem pedirconsentimento


dos pais da moça, e não concluiu um contrato de comunhão ecasamento com eles, a
mulher não será sua esposa legítima, mesmo que elahabite um ano na sua casa.

36. Se um cidadão dá os seus bens em depósito a um estalajadeiro, e se a parededa


casa não está furada, o batente da porta não está partido, a janela não estáarrancada,
e se os bens que ele deu em depósito se perdem, o estalajadeiro deveindenizá-lo.


56. Se um cão for considerado perigoso, e se as autoridades da Porta preveniramo
proprietário do animal, mas o cachorro morder um cidadão causando a mortedeste, o
proprietário do cão deve pagar dois terços de uma mina de prata.Era um corpo legal
da cidade mesopotâmia de Eshnunna, e trazia aproximadamente 60artigos, sendo uma
mistura entre direito penal e civil, que futuramente seria a basedo Código de
Hamurabi.

Código de Hamurabi (1700 aC)

O monólito com o Código deHamurábi.O

Código de Hamurabi

, o qual pode ser escrito Hamurábi ou Hammurabi, representaconjunto de leis escritas,


sendo um dos exemplos mais bem preservados desse
tipode texto oriundo da Mesopotâmia. Acredita-
se que foi escrito pelo rei Hamurábi,aproximadamente em 1700 a.C.. Foi encontrado
por uma expedição francesa em 1901na região da antiga Mesopotâmiacorrespondente
a cidade de Susa, atual Irã.É um monumento monolítico talhado em rocha de diorito,
sobre o qual se dispõem 46colunas de escrita cuneiforme acádica, com 282 leis em
3600 linhas. A numeração vaiaté 282, mas a cláusula 13 foi excluída por superstições
da época. A peça tem 2,25 m dealtura, 1,50 metro de circunferência na parte superior
e 1,90 na base.

A sociedade era dividida em três classes, que também pesavam na aplicação do


código:

Awilum: Homens livres, proprietários de terras, que não dependiam do palácio edo
templo;

Muskênum: Camada intermediária, funcionários públicos, que tinham certasregalias


no uso de terras.

Wardum: Escravos, que podiam ser comprados e vendidos até que


conseguissemcomprar sua liberdade.Pontos principais do código de Hamurabi:

lei de talião (olho por olho, dente por dente)

falso testemunho

roubo e receptação

estupro

família

escravos

ajuda de fugitivosExemplo de uma disposição contida no código:

Art. 25 § 227 - "Se um construtor edificou uma casa para um Awilum, mas não
reforçouseu trabalho, e a casa que construiu caiu e causou a morte do dono da casa,
esseconstrutor será morto".

O objetivo deste código era homogeneizar o reino juridicamente e garantir uma


culturacomum. No seu epílogo, Hamurabi afirma que elaborou o conjunto de leis "para
que oforte não prejudique o mais fraco, a fim de proteger as viúvas e os órfãos" e
"pararesolver todas as disputas e sanar quaisquer ofensas".

Durante as diferentes invasões da Babilônia, o código foi deslocado para a cidadede


Susa (no Irã atual) por volta de 1200 a.C.. Foi nessa cidade que ele foi descoberto,em
dezembro de 1901, pela expedição dirigida por Jacques de Morgan. O abade Jean-
Vincent Scheil traduziu a totalidade do código após o retorno a Paris, onde hoje
elepode ser admirado no Museu do Louvre, na sala 3 do Departamento de
AntiguidadesOrientais.Durante o governo de Hamurabi, no primeiro império
babilônico, organizou-se um dosmais conhecido sistema de leis escritas da
antiguidade: O Código de Hamurábi. Outroscódigos, (Código de Ur-Nammu), haviam
surgido entre os sumérios que viveram entre4.000 anos a.C. a 1900 a.C. na
Mesopotâmia. No entanto, o Código de Hamurabi foi oque chegou até nós de forma
mais completa - os sumérios viviam em pequenascomunidades autônomas, o que
dificultou o conhecimento desses registros.Hamurábi, ou “Khammu-rabi” em
babilônico, foi o sexto rei da Suméria (região doatual Iraque) por volta de 1750a.C. e
também ele quem uniu os semitas e sumériosfundando o império babilônico.O Código
de Hamurábi ficava inicialmente no templo de Sippar (uma das cidades maisantigas da
Mesopotâmia), sendo que diversas cópias suas foram distribuídas pelo reinode
Hamurábi. No topo do monolito (monumento construído a partir de um só bloco
derocha) encontra-se uma representação de Hamurábi em frente ao deus sumeriano
dosol Shamash.Seu código trata de temas cotidianos e abrange matérias de ordem,
civil, penal e administrativa como, por exemplo, o direito da mulher de escolher outro
marido caso oseu seja feito prisioneiro de guerra e não tenha como prover a casa, ou a
obrigação dohomem de prover o sustento dos filhos mesmo que se separe de sua
mulher..

Caso de corrupção na FIFA em 2015


Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

o ou seção é sobre um evento atual. A informação apresentada pode mudar rapidamente.

Editado pela última vez em 11 de janeiro de 2017.

o não possui uma seção introdutória ou ela está malformatada (desde janeiro de 2016).
de-nos a melhorar este artigo com uma seção introdutória de qualidade e de acordo com o livro de estilo.

Hotel onde ocorreram as prisões em 27 de maio de 2015.

Em 2015, o Ministério Público Federal dos Estados Unidos divulgou casos de corrupção
por parte de funcionários e associados ligados à Federação Internacional de Futebol, o
órgão executivo do futebol, futsal e futebol de praia.
Em maio de 2015, 14 pessoas foram acusadas em uma investigação pelo Federal Bureau
of Investigation (FBI) e pelo Internal Revenue Service por fraude
eletrônica, extorsão e lavagem de dinheiro. O Procurador-Geral dos Estados
Unidos anunciou, simultaneamente, a retirada do selo dos indiciamentos e as confissões
de culpa por quatro executivos de futebol e duas corporações.
A investigação focava-se principalmente em torno de funcionários das instâncias
continentais do futebol, como a Confederação Sul-Americana de Futebol (CONMEBOL) e
a Confederação de Futebol da América do Norte, Central e Caribe (CONCACAF), e
executivos ligados ao marketing esportivo. Os executivos de marketing esportivo eram
titulares de mídia e direitos de marketing para as competições internacionais de alto nível,
incluindo as eliminatórias da Copa do Mundo FIFA e torneios continentais como a Copa
Ouro da CONCACAF e a Copa América. O presidente da CONCACAF Jeffrey Webb, que
presidia também a Associação de Futebol das Ilhas Cayman, foi preso durante a
investigação, assim como dois membros do comitê da FIFA: Eduardo Li, presidente
da Federação Costarriquenha de Futebol, Eugenio Figueredo, antigo membro
da Associação Uruguaia de Futebol e o ex-presidente da CONMEBOL Nicolás Leoz. A
investigação durou vários anos, quando o ex-presidente da CONCACAF, Jack Warner, foi
preso em julho de 2013.[1][2]
No total, sete funcionários da FIFA foram presos no Hotel Baur au Lac, em Zurique em 27
de maio de 2015. Eles estavam se preparando para participar do 65º Congresso da FIFA,
onde ocorreu a eleição para presidente da FIFA.[3] Eles serão extraditados para os Estados
Unidos sob suspeita de receber 150 milhões de dólares em subornos.[3] Houve também
prisões simultâneas na sede da CONCACAF em Miami[4] e, mais tarde, mais dois homens
se entregaram à polícia para detenção.[5][6] Duas outras detenções de oficiais da FIFA no
hotel ocorreram em dezembro de 2015.[7] O caso desencadeou prisões
na Austrália,[8]Colômbia,[9] Costa Rica,[10] Alemanha[11] e Suíça.[12]

Índice
[esconder]

 1Alegações
 2Indiciamentos
o 2.1Pessoas
o 2.2Corporações
 3Ver também
 4Referências

Alegações[editar | editar código-fonte]


Em 2013, o ex-presidente da FIFA João Havelange e o presidente da Confederação
Brasileira de Futebol Ricardo Teixeira foram ambos acusados de ter recebido subornos. O
membro do comitê executivo da FIFA Manilal Fernando sancionou que ambos receberiam
uma proibição vitalícia para suborno e corrupção.[13][14]
O FBI alegou a utilização de suborno, fraude e lavagem de dinheiro para corromper a
emissão de meios de comunicação social e direitos de marketing para os jogos da FIFA
nas Américas, estimados em US$ 150 milhões,[2] incluindo pelo menos US$ 110 milhões
para a escolha dos Estados Unidos como sede da Copa América Centenário.[15] Além
disso, a acusação também alega que o suborno foi usado em uma tentativa de influenciar
contratos de patrocínio de uniformes, o processo de seleção para a Copa do Mundo FIFA
de 2010 e a eleição presidencial da FIFA de 2011.[2] Especificamente, um anônimo de uma
empresa de materiais esportivos – identificado em várias fontes como a Nike Inc.[16][17][18] –
teria pago pelo menos US$ 40 milhões em subornos para tornar-se o único fornecedor de
jogos de calçados, acessórios e equipamentos para a Seleção Brasileira de Futebol.[16]
Em 2011, o executivo de futebol americano e oficial da CONCACAF Chuck Blazer se
declarou culpado de dez acusações criminais, incluindo lavagem de dinheiro e crimes
envolvendo o imposto de renda. A declaração de culpa de Blazer foi feita para evitar uma
acusação mais grave de extorsão, que levaria a uma potencial pena de prisão de 20 anos.
Blazer, mais tarde, fez gravações secretas de reuniões com os oficiais da FIFA, e
supostamente carregava um dispositivo de gravação escondido em um chaveiro durante
os Jogos Olímpicos de Verão de 2012, em Londres. Ele originalmente tinha sido abordado
por agentes dos Internal Revenue Service e do FBI que tinham montado alegações
específicas de seu envolvimento em suborno durante o processo de licitação para os
países sedes das Copas do Mundo FIFA desde o início dos anos 1990. A acusação contra
Blazer foi revelada em 27 de maio, o mesmo dia em que as prisões foram feitas em
Zurique.[19][20]

Indiciamentos[editar | editar código-fonte]


Um total de 18 pessoas e duas empresas foram indiciadas, incluindo nove funcionários da
FIFA e cinco empresários.[21][2]

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