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Teoria geral do controle de

convencionalidade no direito brasileiro

Valerio de Oliveira Mazzuoli

Sumário
1. Introdução. 2. O controle de convencio-
nalidade brasileiro e a teoria da dupla com-
patibilidade vertical material. 3. O respeito à
Constituição e o consequente controle de cons-
titucionalidade. A – A obediência aos direitos
expressos na Constituição. B – A obediência aos
direitos implícitos na Constituição. 4. O respeito
aos tratados internacionais e o controle de con-
vencionalidade (difuso e concentrado) das leis.
A – Os direitos previstos nos tratados de direitos
humanos. B – Os direitos previstos nos tratados
comuns. 5. Conclusão.

1. Introdução
O tema deste ensaio é inédito no Brasil.
Seu aparecimento se deu entre nós a partir
da entrada em vigor da Emenda Consti-
tucional no 45, de 8 de dezembro de 2004.
Valerio de Oliveira Mazzuoli é Doutor sum- Mas até o presente momento – passados
ma cum laude em Direito Internacional pela Fa- mais de quatro anos dessa alteração cons-
culdade de Direito da Universidade Federal do titucional – nenhum jurista pátrio chegou
Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestre em Direito a desenvolvê-lo. Nenhum autor brasileiro
Internacional pela Faculdade de Direito da Uni- (constitucionalista ou internacionalista)
versidade Estadual Paulista (UNESP) – campus percebeu, até o presente momento, a am-
de Franca. Professor de Direito Internacional plitude e a importância dessa nova temá-
Público e Direitos Humanos na Faculdade de
tica, capaz de modificar todo o sistema de
Direito da Universidade Federal de Mato Grosso
(UFMT). Professor Honorário da Faculdade de controle no direito brasileiro. Versamos
Direito e Ciências Políticas da Universidade de ineditamente o assunto no Capítulo II,
Huánuco (Peru). Professor convidado nos cur- Seção II, da nossa Tese de Doutorado da
sos de pós-graduação da Universidade Federal UFRGS,1 cuja síntese vem agora estampada
do Rio Grande do Sul (UFRGS), da Pontifícia nas linhas que seguem.
Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e
da Universidade Estadual de Londrina (UEL). 1
Ver MAZZUOLI, 2008b, p. 201-241.

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A novidade que este estudo apresenta constitucional”, nos termos do art. 5o, § 2o,
diz respeito à possibilidade de se proceder da Constituição, ou se são “equivalentes às
à compatibilização vertical das leis (ou dos emendas constitucionais”, posto que apro-
atos normativos do Poder Público) não só vados pela maioria qualificada prevista
tendo como parâmetro de controle a Consti- no art. 5o, § 3o, da mesma Carta, significa
tuição, mas também os tratados internacionais que podem eles ser paradigma de controle
(notadamente os de direitos humanos, mas das normas infraconstitucionais no Brasil
não só eles) ratificados pelo governo e em (MENDES, 2005, p. 239). Ocorre que os
vigor no país. tratados internacionais comuns (que versam
temas alheios aos direitos humanos) tam-
bém têm status superior ao das leis internas
2. O controle de convencionalidade
(MAZZUOLI, 2009, p. 178-179; 229-230;
brasileiro e a teoria da dupla 332-343). Se bem que, não equiparados às
compatibilidade vertical material normas constitucionais, os instrumentos
É bem sabido que a Emenda Constitucio- convencionais comuns têm status supra-
nal no 45/04, que acrescentou o § 3o ao art. 5o legal no Brasil, posto não poderem ser
da Constituição, trouxe a possibilidade de os revogados por lei interna posterior, como
tratados internacionais de direitos humanos estão a demonstrar vários dispositivos
serem aprovados com um quorum qualifica- da própria legislação infraconstitucional
do, a fim de passarem (desde que ratificados brasileira, entre eles o art. 98 do Código
e em vigor no plano internacional) de um Tributário Nacional (MAZZUOLI, 2009, p.
status materialmente constitucional para a 344-353). Neste último caso, tais tratados
condição (formal) de tratados “equivalentes (comuns) também servem de paradigma ao
às emendas constitucionais”.2 Tal acréscimo controle das normas infraconstitucionais,
constitucional trouxe ao direito brasileiro posto estarem situados acima delas, com
um novo tipo de controle à produção nor- a única diferença (em relação aos tratados
mativa doméstica, até hoje desconhecido de direitos humanos) que não servirão de
entre nós: o controle de convencionalidade das paradigma do controle de convencionalida-
leis. À medida que os tratados de direitos de (expressão reservada aos tratados com
humanos ou são materialmente constitucio- nível constitucional), mas do controle de
nais (art. 5o, § 2o) ou material e formalmente legalidade das normas infraconstitucionais.
constitucionais (art. 5o, § 3o),3 é lícito enten- Isso tudo somado demonstra que, dora-
der que, para além do clássico “controle vante, todas as normas infraconstitucionais
de constitucionalidade”, deve ainda existir que vierem a ser produzidas no país devem,
(doravante) um “controle de convenciona- para a análise de sua compatibilidade com
lidade” das leis, que é a compatibilização o sistema do atual Estado Constitucional
da produção normativa doméstica com os e Humanista de Direito, passar por dois
tratados de direitos humanos ratificados níveis de aprovação: (1) a Constituição e
pelo governo e em vigor no país. os tratados de direitos humanos (material ou
Em outras palavras, se os tratados de formalmente constitucionais) ratificados
direitos humanos têm “status de norma pelo Estado; e (2) os tratados internacionais
comuns também ratificados e em vigor no
2
Para um estudo completo do significado do país. No primeiro caso, tem-se o controle de
art. 5o, § 3o, da Constituição, ver MAZZUOLI, 2005, convencionalidade das leis; e no segundo,
p. 89-109. o seu controle de legalidade.
3
Sobre essa distinção entre tratados materialmente
constitucionais e material e formalmente constitucionais,
Este estudo tem por finalidade analisar
bem como para o seu melhor entendimento, veja-se essa nova teoria, segundo a qual as nor-
o nosso estudo citado na nota anterior. mas domésticas também se sujeitam a um

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controle de convencionalidade (compati- norma”.5 Porém, na perspectiva do Estado
bilidade vertical do direito doméstico com Constitucional e Humanista de Direito, esse
os tratados de direitos humanos em vigor panorama muda, e nem toda norma vigente
no país) e de legalidade (compatibilidade deverá ser tida como válida. Não são poucos
vertical do direito doméstico com os trata- os autores atuais que rechaçam a concepção
dos comuns em vigor no país), para além positivista legalista de vigência e validade
do clássico e já bem conhecido controle de das normas jurídicas (v. infra).6
constitucionalidade. Frise-se que ênfase De nossa parte, também entendemos
especial será dada ao primeiro novo tipo que não se poderá mais confundir vigên-
de controle referido: o controle de conven- cia com validade (e a consequente eficácia)
cionalidade das leis. das normas jurídicas. Devemos seguir, a
A primeira ideia a fixar-se, para o cor- partir de agora, a lição de Ferrajoli (1999,
reto entendimento do que doravante será p. 20-22), que bem diferencia ambas as
exposto, é a de que a compatibilidade da situações.7 Para Ferrajoli (1999, p. 20), a
lei com o texto constitucional não mais identificação da validade de uma norma
lhe garante validade no plano do direito com a sua existência (determinada pelo
interno. Para tal, deve a lei ser compatível fato de se pertencer a certo ordenamento e
com a Constituição e com os tratados inter- estar conforme as normas que regulam sua
nacionais (de direitos humanos e comuns) produção) é fruto “de uma simplificação,
ratificados pelo governo. Caso a norma que deriva, por sua vez, de uma incom-
esteja de acordo com a Constituição, mas preensão da complexidade da legalidade
não com eventual tratado já ratificado e no Estado constitucional de direito que se
em vigor no plano interno, poderá ela ser acaba de ilustrar”. Com efeito, continua
até considerada vigente (pois, repita-se, Ferrajoli (1999, p. 20-21), “o sistema das
está de acordo com o texto constitucional e normas sobre a produção de normas – ha-
não poderia ser de outra forma) – e ainda
continuará perambulando nos compêndios 5
Ver o trecho ao qual aludimos: “Então, e só
então, o dever-ser, como dever-ser ‘objetivo’, é uma
legislativos publicados –, mas não poderá
‘norma válida’ (‘vigente’), vinculando os destinatários.
ser tida como válida, por não ter passado É sempre este o caso quando ao ato de vontade, cujo
imune a um dos limites verticais materiais sentido subjetivo é um dever-ser, é emprestado esse
agora existentes: os tratados internacio- sentido objetivo por uma norma, quando uma norma,
que por isso vale como norma ‘superior’, atribui a
nais em vigor no plano interno. Ou seja, a alguém competência (ou poder) para esse ato”. E
incompatibilidade da produção normativa mais à frente, leciona: “Se, como acima propusemos,
doméstica com os tratados internacionais empregarmos a palavra ‘dever-ser’ num sentido que
em vigor no plano interno (ainda que tudo abranja todas estas significações, podemos exprimir a
vigência (validade) de uma norma dizendo que certa coisa
seja compatível com a Constituição) torna deve ou não deve ser, deve ou não ser feita” [grifos
inválidas4 as normas jurídicas de direito nossos]. (KELSEN, 2006, p. 11).
interno. 6
Cf. FERRAJOLI, 1999, p. 20; GOMES, 2008a, p.
75; GOMES; VIGO, 2008b, p. 19.
Como se sabe, a dogmática positivista 7
A dificuldade de precisão desses conceitos já foi
clássica confundia vigência com a validade objeto dos comentários de Kelsen (2006, p. 235), nestes
da norma jurídica. Kelsen já dizia que termos: “A determinação correta desta relação é um
uma norma vigente é válida e aceitava o dos problemas mais importantes e ao mesmo tempo
mais difíceis de uma teoria jurídica positivista. É ape-
mesmo reverso, de que uma norma válida nas um caso especial da relação entre o dever-ser da
é também vigente: em certo momento fala- norma jurídica e o ser da realidade natural. Com efeito,
va em “uma ‘norma válida’ (‘vigente’)” e, também o ato com o qual é posta uma norma jurídica
positiva é – tal como a eficácia da norma jurídica – um
em outro, na “vigência (validade) de uma
fato da ordem do ser. Uma teoria jurídica positivista é
posta perante a tarefa de encontrar entre os dois extre-
4
Cf., em paralelo, BOBBIO, 1995, p. 137-138. mos, ambos insustentáveis, o meio-termo correto”.

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bitualmente estabelecido, em nossos orde- eventual período de vacatio legis; se não
namentos, com nível constitucional – não se houver vacatio, segue-se a regra do art. 1o
compõe somente de normas formais sobre da LICC da entrada em vigor após quarenta
a competência ou sobre os procedimentos e cinco dias. Então, tendo sido aprovada
de formação das leis”, incluindo também pelo Parlamento e sancionada pelo Pre-
“normas substanciais, como o princípio sidente da República (com promulgação
da igualdade e os direitos fundamentais, e publicação posteriores), a lei é vigente8
que de modo diverso limitam e vinculam (ou seja, existente9) em território nacional
o poder legislativo, excluindo ou impondo- (podendo ter que respeitar, repita-se,
lhe determinados conteúdos”, o que faz eventual período de vacatio legis),10 o que
com que “uma norma – por exemplo, uma não significa que será materialmente válida
lei que viola o princípio constitucional da (e, tampouco, eficaz).11 Perceba-se a própria
igualdade –, por mais que tenha existência
formal ou vigência, possa muito bem ser 8
Perceba-se o conceito de vigência do ordenamento
jurídico formulado por Alf Ross: “O ponto de que
inválida e, como tal, suscetível de anulação partimos é a hipótese de que um sistema de normas
por contrastar com uma norma substancial será vigente se for capaz de servir como um esquema
sobre sua produção”. interpretativo de um conjunto correspondente de ações
Com efeito, a existência de normas in- sociais, de tal maneira que se torne possível para nós
compreender esse conjunto de ações como um todo
válidas, ainda segundo Ferrajoli (Idem, p. coerente de significado e motivação e, dentro de certos
21), “pode ser facilmente explicada distin- limites, predizê-las. Esta capacidade do sistema se
guindo-se duas dimensões da regularidade baseia no fato das normas serem efetivamente acata-
ou legitimidade das normas: a que se pode das porque são sentidas como socialmente obrigatórias.
(…) Conclui-se disso que os fenômenos jurídicos que
chamar ‘vigência’ ou ‘existência’, que faz constituem a contrapartida das normas têm que ser as
referência à forma dos atos normativos e decisões dos tribunais. É aqui que temos que procurar a
que depende da conformidade ou corres- efetividade que constitui a vigência do direito”. Perce-
pondência com as normas formais sobre sua ba-se que, em tal conceito, se está a vincular a vigência
da norma à sua capacidade de ser socialmente obrigatória,
formação; e a ‘validade’ propriamente dita no que se poderia dizer ter Alf Ross estabelecido um
ou, em se tratando de leis, a ‘constituciona- conceito de vigência social do ordenamento jurídico.
lidade’ [e, podemos acrescentar, também a E assim conclui Ross (2000, p. 59): “Em conformidade
com isso, um ordenamento jurídico nacional, conside-
‘convencionalidade’], que, pelo contrário, têm
rado como um sistema vigente de normas, pode ser
que ver com seu significado ou conteúdo e definido como o conjunto de normas que efetivamente
que depende da coerência com as normas operam na mente do juiz, porque ele as sente como
substanciais sobre sua produção”. Nesse socialmente obrigatórias e por isso as acata”.
9
Para nós, existência (formal) e vigência têm o mes-
sentido, a vigência de determinada norma mo significado. Cf., nesse exato sentido, FERRAJOLI,
guardaria relação com a forma dos atos 1999, p. 21.
normativos, enquanto que a sua validade 10
Para um panorama das discussões quanto ao
seria uma questão de coerência ou de com- início de vigência da lei, ver TELLES JUNIOR, 2001,
p. 193-197.
patibilidade das normas produzidas pelo 11
A esse respeito, assim (e corretamente) leciona
direito doméstico com aquelas de caráter Artur Cortez Bonifácio (2008, p. 121): “Válida é a nor-
substancial (a Constituição e/ou os tratados ma de lei ordinária cuja produção e conteúdo material
internacionais em vigor no país) sobre sua se conforma à Constituição [e, para nós, também aos
tratados em vigor no país], à legitimidade conferida
produção (Ibidem, p. 21-22). pelos princípios constitucionais [e internacionais]
Em nosso país, é certo que toda lei vigo- político ou ético-filosóficos. Afora isso, a norma terá
ra formalmente até que não seja revogada uma validade eminentemente formal, de relação de
por outra ou até alcançar o seu termo final pertinência com o sistema jurídico. Vigente é a norma
que existe [perceba-se a equiparação entre vigência e
de vigência (no caso das leis excepcionais existência, como querendo significar a mesma coisa,
ou temporárias). A vigência pressupõe a concepção com a qual também concordamos], em
publicação da lei na imprensa oficial e seu função da qual se pode exigir algum comportamento:

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redação da LICC, segundo a qual (art. 1o): coincidem cronologicamente, uma vez que
“Salvo disposição contrária, a lei começa a a lei que existe (que é vigente) e que também
vigorar em todo o país quarenta e cinco dias é válida (pois de acordo com a Constituição
depois de oficialmente publicada” [grifo e com os tratados – de direitos humanos
nosso]. Portanto, ser vigente é ser existente ou comuns – em vigor no país) já pode ser
no plano legislativo. Lei vigente é aquela aplicada pelo Poder Judiciário, o que não
que já existe,12 por ter sido elaborada pelo significa que possa vir a ter eficácia.15 Não
Parlamento e sancionada pelo Presidente há como dissociar a eficácia das normas à
da República,13 promulgada e publicada realidade social ou à produção de efeitos
no Diário Oficial da União. concretos no seio da vida social. O distancia-
Depois de verificada a existência (vigên- mento (ou inadequação) da eficácia das leis
cia) da lei é que se vai aferir sua validade, com as realidades sociais e com os valores
para, em último lugar, perquirir sobre sua vigentes na sociedade gera a falta de produ-
eficácia (TELLES JUNIOR, 2001, p. 193). Esta ção de efeitos concretos, levando à falta de
última (a eficácia legislativa) está ligada efetividade da norma e ao seu consequente
à realidade social que a norma almeja re- desuso social.
gular; conota também um meio de se dar Deve ser afastada, doravante, a confu-
“aos jurisdicionados a confiança de que o são que ainda faz o positivismo clássico (le-
Estado exige o cumprimento da norma, galista, do modelo kelseniano), que atribui
dispõe para isso de mecanismos e força, validade à lei vigente (KELSEN, 2006, p. 9),
e os tribunais vão aplicá-las” (SCHNAID, desde que tenha seguido o procedimento
2004, p. 62-63).14 Mas vigência e eficácia não formal da sua elaboração. Como explica
Luiz Flávio Gomes (2008, p. 75), o positi-
é a norma promulgada e ainda não derrogada, respei- vismo legalista ainda não compreendia “a
tadas questões como a vacatio legis. É de se perceber complexidade do sistema constitucional e
que toda norma vigente, assim tratada, tem validade
formal; a sua validade material repousará no quantum
humanista de Direito, que conta com uma
de legitimidade que venha a expressar”. pluralidade de fontes normativas hierar-
12
Perceba-se que o próprio Kelsen (2006, p. 11) quicamente distintas (Constituição, Direito
aceita esta assertiva, quando leciona: “Com a pala- Internacional dos Diretos Humanos e Direi-
vra ‘vigência’ designamos a existência específica de
uma norma. Quando descrevemos o sentido ou o
to ordinário). As normas que condicionam
significado de um ato normativo dizemos que, com a produção da legislação ordinária não são
o ato em questão, uma qualquer conduta humana é só formais (maneira de aprovação de uma
preceituada, ordenada, prescrita, exigida, proibida; ou lei, competência para editá-la, quorum de
então consentida, permitida ou facultada”.
13
Em caso de veto do Presidente, pode o Congres- 15
Nesse sentido, ver a posição coincidente de
so derrubá-lo em sessão conjunta e por maioria absoluta Kelsen (2006, p. 12), nestes termos: “Um tribunal que
de votos (CF, art. 66, § 4o), devendo ser novamente aplica uma lei num caso concreto imediatamente
enviado ao Presidente da República, agora para pro- após a sua promulgação – portanto, antes que tenha
mulgação (art. 66, § 5o). Se a lei não for promulgada podido tornar-se eficaz – aplica uma norma jurídica
dentro de quarenta e oito horas pelo Presidente da válida [para nós, uma norma vigente, que poderá não
República, nos casos dos §§ 3o e 5o, o Presidente do ser válida, a depender da conformidade com o texto
Senado a promulgará, e, se este não o fizer em igual constitucional e com os tratados internacionais (de di-
prazo, caberá ao Vice-Presidente do Senado fazê-lo reitos humanos ou comuns) em vigor no país]. Porém,
(art. 66, § 7o). Após a promulgação, a lei é publicada, uma norma jurídica deixará de ser considerada válida
devendo entrar em vigência a partir desse momento, quando permanece duradouramente ineficaz”. De-
se assim dispuser expressamente. Se não o fizer e pois, contudo, Kelsen afirma: “A eficácia é, nesta me-
não houver período de vacatio legis, entrará vigor em dida, condição da vigência, visto ao estabelecimento
quarenta e cinco dias (LICC, art. 1o). de uma norma se ter de seguir a sua eficácia para que
14
O mesmo autor, páginas à frente, conclui: “A efi- ela não perca a sua vigência”. Perceba-se, nesta parte
cácia de uma norma está na sua obrigatoriedade, tanto final, a confusão kelseniana mais uma vez estampada.
para os sujeitos passivos como para os órgãos estatais, Trataremos de esclarecer as diferenças atuais entre
que devem aplicá-la efetivamente”. (Idem, p. 93). vigência, validade e eficácia logo mais à frente.

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aprovação etc.), senão também, e sobretu- vigente), e vigente a que já foi publicada.19 O
do, substanciais (princípio da igualdade, da autor conceitua vigência como “um termo
intervenção mínima, preponderância dos com o qual se demarca o tempo de valida-
direitos fundamentais, respeito ao núcleo de de uma norma” ou, em outros termos,
essencial de cada direito etc.)”. Deve-se como “a norma válida (pertencente ao
afastar, também, os conceitos de “vigên- ordenamento) cuja autoridade já pode ser
cia”, “validade” e “eficácia” do positivismo considerada imunizada, sendo exigíveis os
(legalista) civilista, que confunde a validade comportamentos prescritos”, arrematan-
(formal) com vigência (em sentido amplo). do que uma norma “pode ser válida sem
(DINIZ, 2007, p. 51). ser vigente, embora a norma vigente seja
Doravante, para que uma norma seja sempre válida” (FERRAZ JR., 2003, p. 198).
eficaz, dependerá ela de também ser válida, Não concordamos (também com base em
sendo certo que para ser válida deverá ser FERRAJOLI, 1999, p. 20-22) com essa cons-
ainda vigente. A recíproca, contudo, não é trução segundo a qual uma norma “pode
verdadeira, como pensava o positivismo ser válida sem ser vigente”, e de que “a
clássico, que confundia lei vigente com lei norma vigente seja sempre válida”.20
válida. Em outras palavras, a vigência não Para nós, lei formalmente vigente é aquela
depende da validade, mas esta depende elaborada pelo Parlamento, de acordo com
daquela, assim como a eficácia depende da as regras do processo legislativo estabeleci-
validade16 (trata-se de uma escala de valores das pela Constituição,21 que já tem condições
na qual, em primeiro lugar, encontra-se a de estar em vigor; lei válida é a lei vigente
vigência, depois a validade e, por último, a compatível com o texto constitucional22 e
eficácia).17 Por isso, não aceitamos os concei-
tos de validade e vigência de Tercio Sampaio e, quanto “à segunda condição de validade, cumpre
Ferraz Jr., para quem norma válida é aquela observar que, da correta elaboração das leis, depende não
só a validade delas, mas, também, fundamentalmente, a
que cumpriu o processo de formação ou de própria qualidade de lei, alcançada pela norma jurídica.
produção normativa18 (que, para nós, é a lei De fato, não é lei a norma jurídica que não tenha sido
elaborada em conformidade com o processo instituído
16
Daí a afirmação de Miguel Reale (1994, p. 4), de para a produção delas” [grifos do original].
que, quando se declara “que uma norma jurídica tem 19
Idêntica lição é encontrada em Diniz (2007, p. 51-
eficácia, esta só é jurídica na medida em que pressupõe 52). Nesse caso, a autora nomina a vigência de vigência
a validez [ou validade] da norma que a insere no mun- em sentido estrito, para diferenciar da vigência em
do jurídico, por não estar em contradição com outras sentido amplo, que (segundo ela) se confunde com a
normas do sistema, sob pena de tornar-se inconsis- validade formal. Em outra passagem, a mesma autora
tente”. Em outro momento, contudo, Reale (Idem, p. diz que mesmo a vigência em sentido estrito pode-se
33) coloca a expressão vigência entre parênteses depois confundir com a validade formal, à exceção do caso da
de falar em validade, no seguinte trecho: “A exigência vacatio legis do art. 1o da Lei de Introdução ao Código
trina de validade (vigência) de eficácia (efetividade) e de Civil, pelo qual, embora válida, “a norma não vigorará
fundamento (motivação axiológica) milita em favor da durante aqueles quarenta e cinco dias, só entrando em
compreensão da vida jurídica em termos de modelos vigor posteriormente”. (Idem, p. 52).
jurídicos, desde a instauração da fonte normativa até a 20
Leia-se, a propósito, Luiz Flávio Gomes (2008, p.
sua aplicação, passando pelo momento de interpretação, 75), para quem: “…nem toda lei vigente é válida”.
pois o ato hermenêutico é o laço de comunicação ou 21
Assim também, nestes termos: “Geralmente
de mediação entre validade e eficácia”. admite-se como ponto pacífico que uma lei que foi
17
Cf., por tudo, FERRAJOLI, 1999, p. 20-22. Ver devidamente sancionada e promulgada é, por si
também, GOMES; MOLINA, 2007, para quem: “A mesma, direito vigente, isto é, independentemente de
lei ordinária incompatível com o tratado não possui sua ulterior aplicação nos tribunais” (ROSS, 2000, p.
validade”. 128, grifo nosso).
18
Goffredo Telles Junior (2001, p. 162) elenca duas 22
Ver KELSEN, 2006, p. 218, para quem: “Esta
condições de validade das leis: a) o seu correto domínio; e norma [a Constituição], pressuposta como norma
b) a sua correta elaboração. Quanto à primeira “condição fundamental, fornece não só o fundamento de vali-
de validade, assinale-se que o domínio das leis compreen- dade como o conteúdo de validade das normas dela
de seu domínio geográfico e seu domínio de competência”, deduzidas através de uma operação lógica”.

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com os tratados (de direitos humanos ou vê qualquer processo através do qual a nor-
não) ratificados pelo governo, ou seja, é ma da ordem jurídica estadual ‘contrária ao
a lei que tem sua autoridade respeitada e Direito internacional’ possa ser anulada [o
protegida contra qualquer ataque (porque que não é verdade atualmente e, tampouco,
compatível com a Constituição e com os tra- quando Kelsen escreveu a 2a edição de sua
tados em vigor no país). Daí não ser errôneo Teoria pura do direito, em 1960]”.
dizer que a norma válida é a que respeita o Segundo Luiz Flávio Gomes (2008a,
princípio da hierarquia (SCHNAID, 2004, p. 27) o modelo kelseniano (ou positivista
p. 13). Apenas havendo compatibilidade legalista, ou positivista clássico) de ensino
vertical material com ambas as normas – a do direito “confunde a vigência com a
Constituição e os tratados – é que a norma validade da lei, a democracia formal com
infraconstitucional em questão será vigente a substancial, não ensina a verdadeira
e válida (e, consequentemente, eficaz). Caso função do juiz no Estado constitucional e
contrário, não passando a lei pelo exame garantista de Direito (que se deve posicionar
da compatibilidade vertical material com como garantia dos direitos fundamentais),
os tratados (segunda análise de compa- não desperta nenhum sentido crítico no
tibilidade), a mesma não terá qualquer jurista e, além de tudo, não evidencia com
validade (e eficácia) no plano do direito toda profundidade necessária o sistema de
interno brasileiro, devendo ser rechaçada controle de constitucionalidade das leis”.
pelo juiz no caso concreto. Ainda para Gomes (Idem), o “equívoco
Muito antes de qualquer discussão so- metodológico-científico [do modelo kelse-
bre o tema entre nós, Miguel Reale (1994, niano] decorre do pensamento do Estado
p. 13) já havia alertado – no exato sentido Moderno, da revolução francesa, do código
do que agora acabamos de propor, embora napoleônico, onde reside a origem da con-
sem se referir aos tratados internacionais fusão entre lei e Direito; os direitos e a vida
comuns – “que todas as fontes operam no dos direitos valeriam pelo que está escrito
quadro de validade traçado pela Constitui- (exclusivamente) na lei, quando o correto é
ção de cada país, e já agora nos limites reconhecer que a lei é só o ponto de partida
permitidos por certos valores jurídicos de toda interpretação (que deve sempre ser
transnacionais, universalmente reconhe- conforme a Constituição). Deriva também
cidos como invariantes jurídico-axiológicas, da doutrina positivista legalista (Kelsen,
como a Declaração Universal dos Direitos Schmitt etc.) o entendimento de que toda lei
do Homem”, à qual se pode aditar todos vigente é, automaticamente, lei válida. A lei
os tratados de direitos humanos, tal como pode até ser, na atividade interpretativa, o
acabamos de expor. De qualquer forma, o ponto de chegada, mas sempre que conflita
que pretendeu o professor Reale (Idem) com a Carta Magna ou com o Direito huma-
mostrar é que a validade de certa fonte do nitário internacional perde sua relevância e
direito é auferida pela sua compatibilidade primazia, porque, nesse caso, devem ter inci-
com o texto constitucional e com as normas dência (prioritária) as normas e os princípios
internacionais, as quais ele alberga sob a ru- constitucionais ou internacionais”.
brica dos “valores jurídicos transnacionais, Mais à frente, na mesma obra, o citado
universalmente reconhecidos…”. jurista conclui:
Daí o equívoco, no nosso entender, “De acordo com a lógica positivista
da afirmação de Kelsen (2006, p. 367-368) clássica (Kelsen, Hart etc.), lei vigente
segundo a qual a “norma criada com ‘vio- é lei válida, e mesmo quando incom-
lação’ do Direito internacional permanece patível com a Constituição ela (lei
válida, mesmo do ponto de vista do Direito vigente) continuaria válida até que
internacional”, uma vez que “este não pre- fosse revogada por outra. O esquema

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positivista clássico não transcendia Certo avanço do Supremo Tribunal
o plano da legalidade (e da revoga- Federal relativamente ao tema do conflito
ção). Confundia-se invalidade com entre tratados e normas internas se deu com
revogação da lei e concebia-se uma o voto do Min. Sepúlveda Pertence, em 29
presunção de validade de todas as de março de 2000, no RHC 79.785/RJ, no
leis vigentes. Não se reconhecia a trí- qual entendeu ser possível considerar os
plice dimensão normativa do Direito, tratados de direitos humanos como docu-
composta de normas constitucionais, mentos de caráter supralegal. Mas a tese da
internacionais e infraconstitucionais. supralegalidade dos tratados de direitos
Pouca relevância se dava para os limi- humanos ficou ainda mais clara, no STF,
tes (substanciais) relacionados com o com o voto-vista do Min. Gilmar Mendes,
próprio conteúdo da produção do Di- na sessão plenária do dia 22 de novembro
reito. A revogação de uma lei, diante de 2006, no julgamento do RE 466.343-1/
de tudo quanto foi exposto, é instituto SP, em que se discutia a questão da prisão
coligado com o plano da ‘legalidade’ civil por dívida nos contratos de alienação
e da ‘vigência’. Ou seja: acontece no fiduciária em garantia.24 Apesar de conti-
plano formal e ocorre quando uma nuar entendendo que os tratados interna-
lei nova elimina a anterior do orde- cionais comuns ainda guardam relação de
namento jurídico. A revogação, como paridade normativa com o ordenamento
se vê, exige uma sucessão de leis jurídico doméstico, defendeu o Min. Gilmar
(sendo certo que a posterior revoga Mendes a tese de que os tratados interna-
a anterior expressamente ou quando cionais de direitos humanos estariam num
com ela é incompatível – revogação nível hierárquico intermediário: abaixo da
tácita). A declaração de invalidade Constituição, mas acima de toda a legis-
de uma lei, por seu turno, que não se lação infraconstitucional. Segundo o seu
confunde com sua revogação, é insti- entendimento, “parece mais consistente a
tuto vinculado com a nova pirâmide interpretação que atribui a característica de
normativa do Direito (acima das leis supralegalidade aos tratados e convenções
ordinárias acham-se a CF assim como de direitos humanos”, segundo a qual “os
o DIDH), ou seja, deriva de uma rela- tratados sobre direitos humanos seriam
ção (antinomia ou incoerência) entre infraconstitucionais, porém, diante de seu
a lei e a Constituição ou entre a lei e caráter especial em relação aos demais atos
o Direito Internacional dos Direitos normativos internacionais, também seriam
Humanos e relaciona-se com o plano dotados de um atributo de supralegalidade”.
do conteúdo substancial desta lei”.23 E continua: “Em outros termos, os tratados
(GOMES, 2008a, p. 76-77) sobre direitos humanos não poderiam
afrontar a supremacia da Constituição,
23
Ainda segundo Luiz Flávio Gomes, deve-se mas teriam lugar especial reservado no
admitir, contudo, uma hipótese excepcional, que
ocorre quando a lei é declarada inconstitucional em
seu aspecto formal. Nesse caso, diz ele, “não há como
24
O julgamento do RE 466.343-SP (rel. Min. Cezar
negar que essa declaração de inconstitucionalidade Peluso) foi encerrado na sessão plenária de 03.12.2008,
afeta (desde logo) o plano da validade da norma, mas, data em que se considera extinto no Brasil o instituto
além disso, também o da vigência. Uma lei que não da prisão civil por dívida de depositário infiel. Frise-se
tenha seguido o procedimento legislativo correto, após que a tese da impossibilidade de prisão civil por dívida
a declaração da sua inconstitucionalidade formal (em- por infidelidade depositária, com fulcro nos tratados
bora publicada no Diário Oficial), DEIXA DE POSSUIR internacionais de direitos humanos, foi pioneiramente
VIGÊNCIA. Se é certo que a declaração de inconsti- defendida por Mazzuoli, (2002, especialmente p. 109-
tucionalidade material não toca nesse aspecto forma 181). Antes da publicação deste livro citado o que
(vigência), não se pode dizer a mesma coisa em relação existiam eram apenas pequenos trabalhos (artigos,
à inconstitucionalidade formal”. (Idem, p. 77) comentários, etc.) sem muita amplitude.

120 Revista de Informação Legislativa


ordenamento jurídico. Equipará-los à le- Estados Federados e dos decretos expedi-
gislação ordinária seria subestimar o seu dos pelo governo. Esse entendimento vale,
valor especial no contexto do sistema de na Alemanha, inclusive para os tratados
proteção da pessoa humana”.25 de direitos humanos, o que é criticável,
Ocorre que mesmo essa posição de por permitir a aplicação do brocardo lex
vanguarda do STF, expressa no voto-vista posterior derogat legi priori ao caso de conflito
do Min. Gilmar Mendes acima comentado, entre tratado e lei federal posterior; mas é
ainda é, a nosso ver, insuficiente. No nosso bom fique nítido que, naquele país, tam-
entender, os tratados internacionais comuns bém se encontram correntes doutrinárias
ratificados pelo Estado brasileiro é que se tendentes a atribuir nível constitucional ao
situam num nível hierárquico intermediário, menos à Convenção Europeia de Direitos
estando abaixo da Constituição, mas aci- Humanos.28
ma da legislação infraconstitucional, não Sob esse ponto de vista – de que, em
podendo ser revogados por lei posterior geral, os tratados internacionais têm supe-
(posto não se encontrarem em situação de rioridade hierárquica em relação às demais
paridade normativa com as demais leis normas de estatura infraconstitucional,
nacionais). Quanto aos tratados de direi- quer seja tal superioridade constitucional,
tos humanos, entendemos que os mesmos como no caso dos tratados de direitos hu-
ostentam o status de norma constitucio- manos, quer supralegal, como no caso dos
nal, independentemente do seu eventual demais tratados, chamados de comuns –, é
quorum qualificado de aprovação.26 A um lícito concluir que a produção normativa
resultado similar se pode chegar aplicando estatal deve contar não somente com limites
o princípio – hoje cada vez mais difundido formais (ou procedimentais), senão também
na jurisprudência interna de outros países, e com dois limites verticais materiais, quais
consagrado em sua plenitude pelas instân- sejam: a) a Constituição e os tratados de
cias internacionais – da supremacia do di- direitos humanos alçados ao nível cons-
reito internacional e da prevalência de suas titucional; e b) os tratados internacionais
normas em relação a toda normatividade comuns de estatura supralegal. Assim,
interna, seja ela anterior seja posterior.27 uma determinada lei interna poderá ser até
Na Alemanha, esse é também o critério considerada vigente por estar de acordo com
adotado para a generalidade dos tratados o texto constitucional, mas não será válida
ratificados por aquele país (art. 59 da Lei se estiver em desacordo ou com os tratados
Fundamental: “Os tratados que regulem de direitos humanos (que têm estatura
as relações políticas da Federação ou se constitucional) ou com os demais tratados
referem a matérias da legislação federal dos quais a República Federativa do Brasil é
requerem a aprovação ou a participação, parte (que têm status supralegal).29 Para que
sob a forma de uma lei federal, dos órgãos
competentes na respectiva matéria da le-
28
Ver por tudo, BANK, 2004, p. 721-734. Sobre
o tema, ver ainda GROS ESPIELL, 1989, p. 167-412;
gislação federal”), que passam a prevalecer FACCHIN, 1990. Para um estudo do papel da União
(inclusive com aplicação imediata, se eles Europeia em matéria de direitos humanos, ver RIDE-
contêm direitos individuais) sobre toda a AU, 1997, p. 9-480.
normatividade inferior ao direito federal,
29
Cf. GOMES, 2008a, p. 34. Esse autor, contudo,
não obstante aceitar o status constitucional dos tratados
a exemplo das normas provenientes dos de direitos humanos (cf. Op. cit., p. 32), ainda entende
que a discussão sobre o status hierárquico dos tratados
25
Ver o voto-vista do Min. Gilmar Mendes do internacionais comuns “é uma questão aberta”, uma vez
STF, no RE 466.343-1/SP, rel. Min. Cezar Peluso, julg. tratar-se “de uma zona do Direito (ainda) indefinida”.
03.12.2008, p. 21. (Idem, p. 36). Esse mesmo criminalista cita um caso da
26
Ver por tudo, MAZZUOLI, 2009, p. 748-776. Suprema Corte Mexicana, onde se reconheceu o status
27
Cf. VIGNALI, 1992, p. 420. supralegal dos tratados relativos à matéria tributária

Brasília a. 46 n. 181 jan./mar. 2009 121


exista a vigência e a concomitante validade Doravante, é imperioso deixar claras
das leis, necessário será respeitar-se uma quatro situações que podem vir a existir
dupla compatibilidade vertical material, em nosso direito interno, segundo a tese
qual seja, a compatibilidade da lei (1) com que aqui estamos a demonstrar: a) se a lei
a Constituição e os tratados de direitos hu- conflitante é anterior à Constituição, o fenô-
manos em vigor no país e (2) com os demais meno jurídico que surge é o da não-recepção,
instrumentos internacionais ratificados com a consequente invalidade material da
pelo Estado brasileiro. Portanto, a inexis- norma a partir daí; b) se a lei antinômica é
tência de decisão definitiva do Supremo posterior à Constituição, nasce uma incons-
Tribunal Federal, em controle tanto concen- titucionalidade, que pode ser combatida pela
trado quanto difuso de constitucionalidade via do controle difuso de constitucionalida-
(nesse último caso, com a possibilidade de de (caso em que o controle é realizado num
comunicação ao Senado Federal para que processo subjetivo entre partes sub judice)
este – nos termos do art. 52, inc. X, da Cons- ou pela via do controle concentrado (com
tituição – suspenda, no todo ou em parte, a propositura de uma ADIn no STF pelos
os efeitos da lei declarada inconstitucional legitimados do art. 103 da Constituição); c)
pelo STF), mantém a vigência das leis no quando a lei anterior conflita com um tra-
país, as quais, contudo, não permanecerão tado (comum – com status supralegal – ou
válidas se incompatíveis com os tratados de direitos humanos – com status de norma
internacionais (de direitos humanos ou constitucional) ratificado pelo Brasil e já em
comuns) de que o Brasil é parte.30 vigor no país, a mesma é revogada (der-
rogada ou ab-rogada) de forma imediata
(os quais, pelo art. 98 do Código Tributário Nacional,
no Brasil, já têm esse mesmo nível, por expressa dis-
(uma vez que o tratado que lhe é posterior,
posição legal). Eis trecho da explicação do caso (por e a ela também é superior); e d) quando a lei é
Priscyla Costa, in Consultor Jurídico de 15 fev. 2007) ci- posterior ao tratado e incompatível com ele
tado por Luiz Flávio Gomes: “Tratados internacionais (não obstante ser eventualmente compatível
são mais importantes no México de que as leis federais.
com a Constituição), tem-se que tal norma
O entendimento é da Suprema Corte de Justiça do país,
que acolheu o pedido de 14 empresas que se recusavam é inválida (apesar de vigente) e, consequen-
a pagar taxas fixadas por legislações nacionais. (...) As temente, totalmente ineficaz.31
empresas alegaram que com base em algumas dessas
leis federais é que se cobram os direitos alfandegá- é, não pode mais ser aplicada. Sua vigência, entretanto,
rios, contrários ao que determina o Tratado de Livre perdura, até que o Senado Federal elimine tal norma
Comércio da América do Norte, o Nafta, segundo a do ordenamento jurídico (a única exceção reside na
sigla em inglês. O entendimento da Suprema Corte, por declaração de inconstitucionalidade formal, posto que,
seis votos a cinco, foi de que as normas internacionais nesse caso, é a própria vigência da lei que é afetada).
só estão abaixo da Constituição. O ministro Salvador (…) A partir dessa declaração em ação concentrada,
Aguirre afirmou que no mundo globalizado atual há ou quando o tema é discutido em tese pelo Pleno, de
‘mais proximidade’ das normas e que devido a isso a eficácia prática (da lei) já não se pode falar. Ela continua
colaboração e a solidariedade internacionais são cada vigente no plano formal, mas substancialmente perdeu
vez mais necessárias para permitir a convivência, ‘em sua validade (e, na prática, cessou sua eficácia). O efeito
particular o tráfico mercantil’”. (Idem, p. 36). erga omnes da decisão definitiva do STF é indiscutível
30
Segundo Luiz Flávio Gomes (2008a, p. 85-86): em relação ao controle concentrado. (…) Para que não
“Uma vez declarada inválida uma lei (no sistema paire dúvida, logo após a declaração de invalidade de
concentrado), já não pode ser aplicada (perde sua uma lei (pelo Pleno), deveria o STF: (a) comunicar o
eficácia prática). A lei declarada inválida, neste caso, Senado (para o efeito do art. 52, X [no caso apenas da
continua vigente (formalmente), até que o Senado a decisão ter sido em sede de controle difuso]) e, sem-
retire do ordenamento jurídico (CF, art. 52, X), mas pre que possível, (b) emitir uma súmula vinculante
não tem nenhuma validade (já não pode ter nenhuma (recorde-se que a súmula vinculante exige quorum
aplicação concreta, ou seja, cessou sua eficácia). (…) No qualificado de 2/3 dos Ministros do STF)”.
plano sociológico, uma lei vigente e válida pode não ter 31
Ver nesse sentido, o HC 88.420-SP do STF, rel.
eficácia quando não tem incidência prática. Quando, Min. Ricardo Lewandowski; e, ainda, o HC 90.172-SP
entretanto, a lei vigente é declarada inválida pelo STF, do STF, rel. Min. Gilmar Mendes, em que fica expresso
naturalmente perde sua eficácia (jurídica e prática), isto o novo entendimento da Suprema Corte que agora

122 Revista de Informação Legislativa


Do exposto, vê-se que a produção nor- Então, a primeira ideia a fixar-se aqui é
mativa doméstica depende, para sua valida- a de que a produção normativa doméstica
de e consequente eficácia, de estar de acordo deve ser compatível, em primeiro lugar,
tanto com a Constituição como com os tra- com a Constituição do Estado. Contudo,
tados internacionais (de direitos humanos como explica Luiz Flávio Gomes (2008a, p.
ou não) ratificados pelo governo. Mas, para 65), “não se deve observar exclusivamente
a melhor compreensão dessa dupla compa- limites formais, senão também materiais,
tibilidade vertical material, faz-se necessário, que são constituídos, sobretudo, pelos con-
primeiro, entender como se dá (1) o respeito teúdos essenciais de cada direito positiva-
à Constituição (e aos seus direitos expressos do. A lei que conflita com a Constituição é
e implícitos) e (2) aos tratados internacionais inconstitucional e inválida; se se trata de lei
(em matéria de direitos humanos ou não) antinômica anterior à Constituição de 1988
ratificados e em vigor no país. fala-se em não-recepção (ou invalidade); a
O respeito à Constituição faz-se por meio lei que conflita com o DIDH [Direito Inter-
do que se chama de controle de constitucio- nacional dos Direitos Humanos], pouco im-
nalidade das leis; o respeito aos tratados que portando se anterior ou posterior, também
sejam de direitos humanos faz-se pelo até é inválida. Como se vê, qualquer que seja a
agora pouco conhecido (pelo menos no Bra- antinomia entre a lei e as ordens jurídicas
sil) controle de convencionalidade das leis; e o superiores (Constituição ou DIDH), tudo
respeito aos tratados que sejam comuns faz-se se conduz para a invalidade”. E o mesmo
por meio do controle de legalidade das leis, jurista arremata: “Na era do ED [Estado de
conforme abaixo veremos com detalhes. Direito] a produção da legislação ordinária
(da lei) achava-se cercada tão-somente de
limites formais (legitimidade para legislar,
3. O respeito à Constituição
quorum mínimo de aprovação de uma lei,
e o consequente controle de procedimento para sua edição, forma de
constitucionalidade publicação etc.). De acordo com o novo
Primeiramente, para a vigência e valida- paradigma do ECD [Estado Constitucional
de da produção doméstica de um direito, de Direito], a produção legislativa (agora)
faz-se necessária a sua compatibilidade com encontra limites formais e materiais, ou
o texto constitucional em vigor, sob pena de seja, não pode violar o núcleo essencial
incorrer em vício de inconstitucionalidade, de cada direito, não pode fazer restrições
o qual pode ser combatido pela via difusa desarrazoadas aos direitos fundamentais
(de exceção ou defesa) ou pela via concen- etc”.
trada (ou abstrata) de controle, a primeira A compatibilidade das leis com a Cons-
podendo ser realizada por qualquer cida- tituição deve ser aferida em dois âmbitos:
dão (sempre quando se fizer presente um (a) relativamente aos direitos expressos no
caso concreto) em qualquer juízo ou tribunal texto constitucional e (b) também em rela-
do país, e a segunda, por meio de Ação ção aos direitos implícitos na Constituição.
Direta de Inconstitucionalidade perante Vejamos cada um deles.
o Supremo Tribunal Federal, por um dos
da República; II – a Mesa do Senado Federal; III – a
legitimados do art. 103 da Constituição.32 Mesa da Câmara dos Deputados; IV – a Mesa de
Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do
atribui aos tratados de direitos humanos (e somente a Distrito Federal; V – o Governador de Estado ou do
estes, por enquanto) o status de supralegalidade dentro Distrito Federal; VI – o Procurador-Geral da Repúbli-
do ordenamento jurídico brasileiro. ca; VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados
32
Assim dispõe a referida norma: “Art. 103. Podem do Brasil; VIII – partido político com representação no
propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação Congresso Nacional; IX – confederação sindical ou
declaratória de constitucionalidade: I – o Presidente entidade de classe de âmbito nacional”.

Brasília a. 46 n. 181 jan./mar. 2009 123


A – A obediência aos direitos damentais não-individuais (v.g., os sociais, os
expressos na Constituição econômicos e os culturais) e todos os outros de
cunho coletivo. Contudo, a dúvida plantada
Existe dispositivo na Constituição de pelo texto constitucional de 1988, sobre a in-
1988 que demonstra claramente existirem clusão de outros direitos ao rol das chamadas
três vertentes dos direitos e garantias fun- “cláusulas pétreas”, não obteve o necessário
damentais na ordem jurídica brasileira. esclarecimento da doutrina até o momento.
Trata-se do art. 5o, § 2o, da Constituição, Para nós – seguindo-se a lição de Ingo Sarlet
segundo o qual “os direitos e garantias ex- (2006, p. 422-428) –, não é aceitável que os
pressos nesta Constituição [1a vertente] não direitos não-individuais (v.g., um direito tra-
excluem outros decorrentes do regime e dos balhista) e toda a gama de direitos coletivos
princípios por ela adotados [2a vertente], prevista pelo texto constitucional fiquem
ou dos tratados internacionais em que a excluídos da proteção outorgada pela norma
República Federativa do Brasil seja parte [3a do art. 60, § 4o, inc. IV, da Constituição. Uma
vertente]”. Assim, desmembrando esse dis- interpretação sistemática e teleológica da
positivo, o que dele se extrai é que, além dos Constituição, em contraposição à interpre-
direitos expressos na Constituição (primeira tação literal do referido dispositivo, indica
vertente), existem também os direitos nela ser mais que sustentável a tese segundo a
implícitos (segunda vertente), que decorrem qual a Constituição (no art. 60, § 4o, inc. IV)
do regime (primeira subdivisão da segunda disse menos do que pretendia (lex minus
vertente) e dos princípios (segunda subdivi- dixit quam voluit). Ao se ler o citado dispo-
são da segunda vertente) por ela adotados, e sitivo constitucional, deve-se substituir a
os direitos provenientes de tratados (terceira expressão “direitos e garantias individuais”
vertente), que não estão nem expressa nem pela expressão “direitos e garantias funda-
implicitamente previstos na Constituição, mentais”, subtraindo a expressão-espécie para
mas provêm ou podem vir a provir dos ins- inserir a expressão-gênero.
trumentos internacionais de proteção dos Seja como for, o que aqui se pretende
direitos humanos ratificados pelo Brasil. dizer que é a produção normativa domés-
(MAZZUOLI, 2009, p. 751-752) tica, para aferir a validade necessária à sua
A primeira das três vertentes dos direi- posterior eficácia, deve primeiramente ser
tos e garantias fundamentais diz respeito compatível com os direitos expressos no
àqueles direitos expressos na Constituição. texto constitucional, sendo este o primeiro
Efetivamente, são tais direitos os primeiros limite (em verdade, a primeira parte desse
que devem ser respeitados pela produção primeiro limite) vertical material do qual
normativa doméstica, até mesmo pelo prin- estamos a tratar.
cípio segundo o qual as leis devem respeito Contudo, não é neste estudo o lugar de
à sua criadora, que é a Constituição. se dissertar sobre os efeitos do desrespeito
Os direitos e garantias constitucionais (formal ou material) da lei à Constituição,
fazem parte do núcleo intangível da Cons- que enseja o chamado controle de constitu-
tituição, protegidos pelas cláusulas pétreas do cionalidade.33 Apenas cumpre aqui informar
art. 60, § 4o, inc. IV, da Constituição de 1988, que, neste primeiro momento de compa-
segundo o qual “não será objeto de delibera- tibilidade das leis com o Texto Magno, a
ção a proposta de emenda tendente a abolir
(...) os direitos e garantias individuais”. 33
Sobre o tema, ver KELSEN, 2006, p. 300-306. Na
Perceba-se a referência aos “direitos e ga- doutrina brasileira, ver especialmente MENDES, 2005,
rantias individuais” pelo dispositivo citado, o p. 64-94 e p. 146-250, respectivamente; e BARROSO,
2007. Para um estudo clássico do controle jurisdicional
que deixa entrever, a priori, que a respectiva de constitucionalidade no Brasil, ver ainda BITTEN-
cláusula não alcança os demais direitos fun- COURT, 1968.

124 Revista de Informação Legislativa


falta de validade normativa daquelas e sua A legislação infraconstitucional, quan-
expulsão do ordenamento jurídico con- do da primeira compatibilidade vertical
tribui para o diálogo das fontes, na medida material (compatibilidade da norma com
em que se retira da “conversa” normativa a Constituição), deverá observar, além
a lei que não tem argumentos válidos que dos direitos expressos na Constituição,
a autorizem a continuar no diálogo (pois também os direitos que nela se encontram
ela é inconstitucional e, portanto, inválida). implícitos. Tais direitos implícitos, não
Assim, retira-se da lei a possibilidade de obstante de difícil visualização apriorísti-
continuar “conversando” e “dialogando” ca, também limitam a produção do direito
com as outras fontes jurídicas, autorizando- neste desdobramento da primeira etapa da
se a participação nessa “conversa” apenas compatibilização vertical material.
fontes válidas e eficazes. Os direitos implícitos no texto consti-
Somente a declaração de inconstitucio- tucional, também chamados de direitos
nalidade formal afeta (desde logo) o plano decorrentes, provêm ou podem vir a provir
de vigência da norma (e, consequentemente, do regime ou dos princípios adotados pela
os da validade e eficácia), como já se falou an- Constituição. E, aqui, teríamos então mais
teriormente.34 Salvo essa hipótese excepcio- uma subdivisão: (a) a obediência ao direito
nal, quando se trata do caso de declaração implícito proveniente do regime adotado
de inconstitucionalidade do “programa pela Carta; e (b) a obediência ao direito
abstrato de aplicação” da norma, a mesma implícito decorrente dos princípios consti-
continua vigente, mas será inválida (porque tucionais por ela adotados.
inconstitucional), deixando de contar com Deve-se perquirir, neste momento, se
qualquer incidência concreta.35 não está o princípio internacional pro ho-
mine a integrar os princípios adotados pela
B – A obediência aos direitos Constituição. Segundo entendemos, quer
implícitos na Constituição no plano do direito interno, quer no plano
Nos termos do citado art. 5o, § 2o, segun- internacional, o princípio internacional pro
da parte, os direitos implícitos são aqueles homine pode ser considerado um princípio
que provêm ou podem vir a provir “do re- geral de direito. Seu conteúdo expansivo atri-
gime e dos princípios por ela [Constituição] bui primazia à norma que, no caso concreto,
adotados”. Trata-se – segundo os autores mais proteja os interesses da pessoa em
constitucionalistas – de direitos de difícil causa. Em outras palavras, por meio dele
caracterização a priori.36 fica assegurada ao ser humano a aplicação
da norma mais protetiva e mais garanti-
34
Cf. GOMES, 2008a, p. 77. dora dos seus direitos, encontrada como
35
Não é outra a lição de Luiz Flávio Gomes (2008a, resultado do “diálogo” travado entre as
p. 77), nestes termos: “…toda norma, que tem como fontes no quadro de uma situação jurídica
fonte um texto legal, conta com seu ‘programa abstrato
de aplicação’. Mas isso não se confunde com o seu
real. Esse exercício, capaz de encontrar um
programa concreto de incidência. Quando uma lei é princípio geral que albergue os elementos
julgada inconstitucional (totalmente inconstitucional) normativos antitéticos, é papel que compete
seu ‘programa normativo’ desaparece, ou seja, passa a ao aplicador do direito.37
não contar com nenhuma incidência concreta. O § 1o do
art. 2o da Lei no 8.072/90 proibia a progressão de regime 37
Cf. DINIZ, 2005, p. 58-59. Sobre os princípios ge-
nos crimes hediondos. Esse era o programa abstrato rais de direito, assim leciona Diniz: “Os princípios gerais
da norma. Depois de declarada pelo STF a invalidade de direito são normas de valor genérico que orientam
(inconstitucionalidade) do dispositivo legal citado (HC a aplicação jurídica, por isso se impõem com validez
82.959), nenhuma incidência prática (eficácia) podia ter normativa onde houver inconsistência de normas. Es-
tal norma (mesmo antes da Lei no 11.464/07)”. ses princípios gerais de direito têm natureza múltipla,
36
Ver FERREIRA FILHO, 1995, p. 88; SILVA, pois são: a) decorrentes das normas do ordenamento
2006, p. 194. jurídico, ou seja, da análise dos subsistemas normativos.

Brasília a. 46 n. 181 jan./mar. 2009 125


Antes de verificarmos a consagração (LOPES, 2001, p. 92). De qualquer forma, a
do princípio internacional pro homine partir dessa abertura, ao menos no plano
pelo texto constitucional brasileiro, duas do desejável, o texto constitucional passou
palavras devem ser ditas sobre alguns a consagrar valores e princípios até então
dos princípios regentes do nosso sistema inexistentes no sistema jurídico nacional.
constitucional.38 No direito interno, o princípio inter-
Primeiramente, é necessário dizer que a nacional pro homine compõe-se de dois
Constituição brasileira de 1988 representou conhecidos princípios jurídicos de proteção
a abertura do sistema jurídico nacional à de direitos: o da dignidade da pessoa humana
consagração dos direitos humanos, rom- e o da prevalência dos direitos humanos.
pendo com a lógica totalitária que imperava O princípio constitucional da dignidade
no Brasil até então, implementando o valor da pessoa humana é o primeiro pilar (junto
dos direitos humanos à redemocratização com a prevalência dos direitos humanos) da
do Estado. Assim, logo depois de 1988, pa- primazia da norma mais favorável (HENDER-
receu “haver um consenso sobre o valor po- SON, 2004, p. 92-96). Por dignidade da pessoa
sitivo da democracia e sobre o valor positivo humana pode-se considerar, segundo Maria
dos direitos humanos”, não obstante, na Garcia (2004, p. 211), a “compreensão do
prática, ser ele “mais aparente do que real” ser humano na sua integridade física e psí-
quica, como autodeterminação consciente,
Princípios e normas não funcionam separadamente, garantida moral e juridicamente”.39
ambos têm caráter prescritivo. Atuam os princípios,
diante das normas como fundamento de atuação do
Trata-se de um bem soberano e essen-
sistema normativo e como fundamento criteriológico, cial a todos os direitos fundamentais do
isto é, como limite da atividade jurisdicional; b) deri- homem, que atrai todos os demais valores
vados das idéias políticas, sociais e jurídicas vigentes, constitucionais para si. Considerando ser a
ou melhor, devem corresponder aos subconjuntos
axiológico e fático que compõem o sistema jurídico,
constituindo um ponto de união entre consenso social, cial feição. Se a Constituição é o fundamento superior
valores predominantes, aspirações de uma sociedade da unidade de um sistema jurídico, e a observância dos
com o sistema jurídico, apresentando uma certa conexão seus valores e princípios são os fatores possibilitadores
com a ideologia imperante que condiciona até sua dog- do equilíbrio constitucional, infere-se por transitividade
mática: daí serem princípios informadores; de maneira que os princípios são fatores decisivos à manutenção do
que a supracitada relação entre norma e princípio é sistema de direito. O direito não é, pois, um conjunto de
lógico-valorativa. Apóiam-se estas valorações em cri- regras tomadas aleatoriamente: estas têm uma conexão
térios de valor objetivo; e c) reconhecidos pelas nações de sentidos, uma lógica, uma coerência e uma adequa-
civilizadas [sobre esse conceito de ‘nações civilizadas’ ção de valores e princípios que o alimentam, e lhe dão
e as críticas que lhe faz a doutrina contemporânea, ver a sua dinamicidade e consistência, fazendo-o subsistir.
MAZZUOLI, 2009, p. 110-111] se tiverem substractum Quando existe um hiato entre esses fatores, é possível a
comum a todos os povos ou a alguns deles em dadas implantação de uma nova estrutura política no Estado,
épocas históricas, não como pretendem os jusnatura- refratária dos valores e princípios dissociados da com-
listas, que neles vislumbram princípios jurídicos de preensão do tecido social. Os princípios, dessa forma,
validade absolutamente geral”. (Idem, p. 59). são disposições nas quais se radicam a origem dos
38
Para um panorama geral dos valores e princí- enunciados normativos; são pontos de partida para a as-
pios constitucionais fundamentais da Constituição similação do sistema jurídico e seus desígnios de justiça.
brasileira, ver BONIFÁCIO, 2008, p. 131-180. Merece Ostentam um maior grau de indeterminação, abstração
destaque, contudo, a seguinte passagem: “Os princípios e um baixo grau de concretização, apresentando-se
passaram, com efeito, ao grau de norma constitucional, como Standards, padrões de observância obrigatória
modelando e conduzindo a interpretação e aplicação no sistema de direito”. (Idem, p. 133-134).
das demais normas e atos normativos, conferindo 39
Aceito o conceito exposto, diz Artur Cortez Bo-
a fundamentação material imprescindível à ordem nifácio (2008, p. 174), “importa reforçar um conteúdo
jurídica. De sua força normativa decorre o seu caráter ético que é anterior e inerente ao ser humano, e que
diretivo e a eficácia derrogatória e invalidatória das faz da dignidade da pessoa humana um supravalor,
demais normas para além de sua função informadora. um predicado da personalidade, ao lado de um com-
O conjunto desses predicados confere aos princípios ponente normativo, jurídico-constitucional e de direito
um caráter de fonte das fontes do direito, disposições internacional público, a reclamar a sua concretização
normativas que qualificam o sistema, dando-lhe espe- internamente e no espaço público internacional”.

126 Revista de Informação Legislativa


Constituição uma ordem sistêmica de valo- mas, sobretudo, plantada na consciência do
res, que são sopesados pelo legislador cons- reconhecimento de que todos são iguais”
tituinte na medida e para o fim de preservar (BONIFÁCIO, 2008, p. 175).41
sua força normativa, pode-se afirmar que o Dessa forma, com base na própria Car-
texto constitucional brasileiro erigiu a digni- ta da República de 1988, é de se entender
dade da pessoa humana a valor fundante da que, em se tratando de direitos humanos
ordem normativa doméstica, impacto certo provenientes de tratados internacionais
do movimento expansionista dos direitos em que a República Federativa do Brasil
humanos iniciado no período pós-Segunda seja parte, há de ser sempre aplicado, no
Guerra e em plena desenvoltura até hoje caso de conflito entre o produto normativo
(GONZÁLEZ PEREZ, 1986, p. 200-203). convencional e a Lei Magna Fundamental,
Daí a consideração de ser este princípio um o princípio (de hermenêutica internacional)
princípio aberto, que chama para si toda a pro homine, expressamente assegurado pelo
gama dos direitos fundamentais, servindo, art. 4o, II, da Constituição.
ainda, de parâmetro à interpretação de todo Não se pode esquecer a lição de Peter
o sistema constitucional.40 Por isso, pode-se Häberle (2003), para quem se tem que
dizer que os direitos fundamentais são con- caracterizar a Constituição como um “sis-
ditio sine qua non do Estado Constitucional tema de valores”, impedindo-se entender
e Humanista de Direito, ocupando o grau os “valores” no sentido de um firmamento
superior da ordem jurídica. abstrato de valores. Segundo Häberle (2003,
A Lei Fundamental alemã (Grundgesetz) p. 9-10), os valores não são “impuestos des-
deu ao princípio da dignidade humana de fuera, o por encima, de la Constitución
significado tão importante, que o colocou y el ordenamiento jurídico. No imponen
no topo da Constituição, em seu primeiro ninguna pretensión de validez apriorística,
artigo. Segundo esse dispositivo, inserido que esté por encima del espacio y el tiempo.
no capítulo primeiro da Carta alemã, inti- Ello contradiría el espíritu de la Constitu-
tulado Os Direitos Fundamentais, “a digni- ción, que es una amplia ordenación de la
dade do homem é inviolável”, estando os vida del presente, que debe fundarse en la
Poderes Públicos “obrigados a respeitá-la e ‘singular índole’ de este presente y coordi-
a protegê-la” (art. 1, no 1). Assim estatuindo, nar las fuerzas vitales de una época a fin de
passa a dignidade humana a ser declarada lograr una unidad. Si se impusiera un reino
como o pressuposto último e o fundamento de valores desde arriba, se desconocería
mais ético da realização da missão constitu- también el valor intrínseco y la autonomía
cional. Esse fundamento ético é “anterior de lo jurídico”. Em outras palavras, como
ao direito e à sua positivação na ordem leciona Bidart Campos (1995, p. 277), num
jurídica, representado no valor do homem sistema de normas “que comparten una
em si e na sua existência, esta afirmada com misma jerarquía jamás puede interpretar-
autonomia e respeito à natureza humana, se en el sentido de que unas deroguem,
cancelem, neutralicen, excluyan o dejen
40
Como anota Artur Cortez Bonifácio (2008, p. sin efecto a otras, porque todas se integran
174-175), o princípio da dignidade da pessoa humana coherentemente, y deben mantener su sig-
“é um dos princípios de maior grau de indetermi-
nação e também uma das fontes mais recorridas da
Constituição, especialmente por: justificar as ações do 41
Ainda segundo Bonifácio (Idem): “Mais do que
Estado Democrático de Direito em favor dos direitos isso, a dignidade da pessoa humana é o valor que con-
fundamentais, consolidando um encadeamento lógi- duz ao caráter universal dos direitos fundamentais,
co-jurídico de um modelo de democracia voltada para o elo e o sentido de toda uma construção dogmática
a justiça social; conferir um sentido unitário à Consti- histórica que vem ganhando força e efetividade nos
tuição; ou realizar uma ponderação de valores tendo processos de afirmação do constitucionalismo e do di-
em conta as normas e valores constitucionais”. reito internacional público recente”. (Idem, p. 175).

Brasília a. 46 n. 181 jan./mar. 2009 127


nificado y su alcance en armonía recíproca y sem violação de qualquer dos seus precei-
en compatibilidad dentro del conjunto”. tos. A contrario sensu, não basta a norma
O outro princípio a complementar a ga- infraconstitucional ser compatível com a
rantia pro homine é o da prevalência dos di- Constituição e incompatível com um tra-
reitos humanos, consagrado expressamente tado ratificado pelo Brasil (seja de direitos
pelo art. 4o, inc. II, da Constituição brasileira humanos, que tem a mesma hierarquia
de 1988. Esse princípio faz comunicar a do texto constitucional, seja um tratado
ordem jurídica internacional com a ordem comum, cujo status é de norma supralegal),
interna, estabelecendo um critério herme- pois, nesse caso, operar-se-á de imediato a
nêutico de solução de antinomias que é a terminação da validade da norma (que, no
consagração do próprio princípio da norma entanto, continuará vigente, por não ter sido
mais favorável, a determinar que, em caso expressamente revogada por outro diplo-
de conflito entre a ordem internacional e a ma congênere de direito interno).
ordem interna, a “prevalência” – ou seja, a A compatibilidade do direito doméstico
norma que terá primazia – deve ser sempre com os tratados internacionais de direi-
do ordenamento que melhor proteja os tos humanos em vigor no país faz-se por
direitos humanos.42 meio do controle de convencionalidade, que é
Percebe-se, portanto, que o princípio complementar e coadjuvante do conhecido
internacional pro homine tem autorização controle de constitucionalidade.43 A expres-
constitucional para ser aplicado entre nós são “controle de convencionalidade” ainda é
como resultado do diálogo entre fontes in- pouco conhecida no Brasil, não tendo sido
ternacionais (tratados de direitos humanos) objeto de qualquer estudo entre nós até o
e de direito interno. presente momento. O controle de conven-
cionalidade tem por finalidade compatibili-
4. O respeito aos tratados internacionais zar verticalmente as normas domésticas (as
e os controles de convencionalidade espécies de leis, lato sensu, vigentes no país)
com os tratados internacionais de direitos
(difuso e concentrado) e de legalidade
humanos ratificados pelo Estado e em vigor
das normas infraconstitucionais no território nacional.
Como já se falou anteriormente, não Nesse sentido, entende-se que o controle
basta que a norma de direito doméstico de convencionalidade deve ser exercido pe-
seja compatível apenas com a Constituição los órgãos da justiça nacional relativamente
Federal, devendo também estar apta para aos tratados aos quais o país se encontra
integrar a ordem jurídica internacional vinculado. Trata-se de adaptar ou conformar
os atos ou leis internas aos compromissos
42
Como leciona Artur Cortez Bonifácio (2008, internacionais assumidos pelo Estado, que
p. 201), o art. 4o da Constituição “pontua um elo
entre o direito constitucional internacional e o que o Constituinte brasileiro tratou de assegurar,
direito internacional e deve ser interpretado sob diante da fragilidade das instituições democráticas
a ótica consensual que aproxima os sistemas, mas do Estado brasileiro recém-saído do arbítrio”. Daí se
devemos admitir uma leve prevalência em favor entender, com Otto Bachof (1994, p. 2), que um Estado
do direito internacional público”, posto que nele até poderá desrespeitar tais princípios, ou mesmo
temos “a declaração de vários princípios de direito fazer passar também por “direito” as prescrições e os
internacional geral, verdadeiras normas de jus cogens, atos estaduais que os desrespeitem, podendo impor a
tais como o princípio da independência nacional, a observância destes pela força, porém “um tal direito
prevalência dos direitos humanos, a autodetermina- aparente nunca terá o suporte do consenso da maioria
ção dos povos, a não-intervenção, a igualdade entre dos seus cidadãos e não pode, por conseguinte, reivin-
os Estados, a defesa da paz, a solução pacífica dos dicar a obrigatoriedade que o legitimaria”.
conflitos, o repúdio ao terrorismo, a concessão de 43
Para um paralelo entre os controles de conven-
asilo político e a integração” e, assim sendo, todos cionalidade e de constitucionalidade na França, ver
eles compõem “um conjunto normativo e axiológico SILVA IRARRAZAVAL, 2006, p. 201-219.

128 Revista de Informação Legislativa


criam para este deveres no plano interna- nacional. Tal controle passa, doravante, a
cional com reflexos práticos no plano do seu ter também caráter difuso, a exemplo do
direito interno.44 Doravante, não somente controle difuso de constitucionalidade,
os tribunais internos devem realizar o con- pelo qual qualquer juiz ou tribunal pode-se
trole de convencionalidade (para além do manifestar a respeito. À medida que os tra-
clássico controle de constitucionalidade), tados forem sendo incorporados ao direito
mas também os tribunais internacionais (ou pátrio, os tribunais locais – estando tais
supranacionais)45 criados por convenções tratados em vigor no plano internacional –
entre Estados, em que estes (os Estados) se podem, desde já e independentemente de
comprometem, no pleno e livre exercício qualquer condição ulterior, compatibilizar
de sua soberania, a cumprir tudo o que ali as leis domésticas com o conteúdo dos
fora decidido e a dar sequência, no plano do tratados (de direitos humanos ou comuns)
seu direito interno, ao cumprimento de suas vigentes no país.48 Em outras palavras, os
obrigações estabelecidas na sentença, sob tratados internacionais incorporados ao
pena de responsabilidade internacional.46 direito brasileiro passam a ter eficácia pa-
O fato de serem os tratados internacionais ralisante (para além de derrogatória) das
(notadamente os de direitos humanos) ime- demais espécies normativas domésticas,
diatamente aplicáveis no âmbito doméstico cabendo ao juiz coordenar essas fontes
garante a legitimidade dos controles de (internacionais e internas) e escutar o que
convencionalidade e de legalidade das leis elas dizem. (JAYME, 1995, p. 259) Mas,
e dos atos normativos do Poder Público.47 também, pode ainda existir o controle de
Para realizar o controle de convencio- convencionalidade concentrado no Supremo
nalidade ou de legalidade das normas Tribunal Federal, como abaixo se dirá, na
infraconstitucionais, os tribunais locais hipótese dos tratados de direitos humanos
não requerem qualquer autorização inter- (e somente destes) aprovados pelo rito do
art. 5o, § 3o, da Constituição (MENDES,
44
Ver assim, a lição de Alcalá (2007, p. 87): “Los 2005, p. 239) (uma vez ratificados pelo Pre-
órganos que ejercen jurisdicción constitucional e inter- sidente, após esta aprovação qualificada).
pretan el texto constitucional, Tribunal Constitucional,
Tal demonstra que, de agora em diante, os
Corte Suprema de Justicia y Cortes de Apelaciones,
deben realizar sus mejores esfuerzos en armonizar el parâmetros de controle concentrado (de
derecho interno con el derecho internacional de los constitucionalidade/convencionalidade)
derechos humanos. Asimismo, ellos tienen el deber de no Brasil são a Constituição e os tratados
aplicar preferentemente el derecho internacional sobre
las normas de derecho interno, ello exige desarrollar 48
A esse respeito, assim se expressou o Juiz Sergio
un control de convencionalidad sobre los preceptos García Ramírez, no seu voto citado: “Si existe esa
legales y administrativos en los casos respectivos, conexión clara y rotunda – o al menos suficiente, in-
como ya lo ha sostenido la Corte Interamericana de teligible, que no naufrague en la duda o la diversidad
Derechos Humanos en el caso Almonacid”. de interpretaciones –, y en tal virtud los instrumentos
45
Para um estudo do papel dos três mais impor- internacionales son inmediatamente aplicables en el
tantes tribunais internacionais existentes (Corte Inter- ámbito interno, los tribunales nacionales pueden y
nacional de Justiça, Corte Interamericana de Direitos deben llevar a cabo su propio ‘control de conven-
Humanos e Corte Europeia de Direitos Humanos), no cionalidad’. Así lo han hecho diversos órganos de la
que tange aos direitos humanos, ver respectivamente, justicia interna, despejando el horizonte que se hallaba
GOY, 2002; TIGROUDJA, 2003; MAZZUOLI, 2008a, ensombrecido, inaugurando una nueva etapa de me-
p. 239-296; MARGUÉNAUD, 2005. jor protección de los seres humanos y acreditando la
46
Sobre o tema da responsabilidade internacional idea – que he reiterado – de que la gran batalla por los
dos Estados por violação dos direitos humanos, ver derechos humanos se ganará en el ámbito interno, del
RAMOS, 2004. que es coadyuvante o complemento, pero no sustituto,
47
Cf. Corte Interamericana de Direitos Humanos, el internacional”. (Corte Interamericana de Direitos
Caso Trabajadores Cesados del Congreso v. Peru, de 24 de Humanos, Caso Trabajadores Cesados del Congreso v.
novembro de 2006, voto apartado do Juiz Sergio García Peru, de 24 de novembro de 2006, voto apartado do
Ramírez, parágrafos 1-13. Juiz Sergio García Ramírez, parágrafo 11).

Brasília a. 46 n. 181 jan./mar. 2009 129


internacionais de direitos humanos ratificados têm de ter as leis relativamente aos direitos
pelo governo e em vigor no país. expressos nos tratados de direitos humanos
Assim, é bom deixar claro que o controle ratificados pelo Brasil.
de convencionalidade difuso existe entre São de fácil visualização os direitos
nós desde a promulgação da Constituição, expressos nos tratados dos quais a Repúbli-
em 5 de outubro de 1988, e desde a entrada ca Federativa do Brasil é parte. Todos se
em vigor dos tratados de direitos humanos encontram publicados no Diário Oficial da
ratificados pelo Brasil após esse período, União desde sua promulgação pelo Presi-
não obstante jamais qualquer doutrina no dente da República, após ratificados e após
Brasil ter feito referência a esta termino- terem sido seus instrumentos respecivos
logia. Já o controle de convencionalidade depositados no Secretariado das Nações
concentrado, este sim, nascera apenas em 8 Unidas ONU.49
de dezembro de 2004, com a promulgação A falta de compatibilização do direito in-
da Emenda Constitucional no 45. fraconstitucional com os direitos previstos
Enfim, essa compatibilidade do direito nos tratados de que o Brasil é parte invalida a
doméstico com os tratados em vigor no produção normativa doméstica, fazendo-a
Brasil, da mesma forma que no caso da cessar de operar no mundo jurídico. Frise-
compatibilidade com a Constituição, tam- se que tais normas domésticas infraconsti-
bém deve ser realizada, simultaneamente, tucionais, que não passaram incólumes à
em dois âmbitos: (1) relativamente aos segunda etapa da primeira compatibiliza-
direitos previstos nos tratados de direitos ção vertical material, deixam de ser válidas
humanos pelo Brasil ratificados e (2) em no plano jurídico, mas ainda continuam
relação àqueles direitos previstos nos trata- vigentes nesse mesmo plano, uma vez que
dos comuns em vigor no país, tratados estes sobreviveram ao primeiro momento da
que se encontram abaixo da Constituição, primeira compatibilidade vertical material
mas acima de toda a normatividade infra- (a compatibilidade com a Constituição).
constitucional. Vejamos, então, cada qual Por isso, a partir de agora, dever-se-á ter
das duas hipóteses. em conta que nem toda lei vigente é uma
lei válida (FERRAJOLI, 1999, p. 20-22), e o
A – Os direitos previstos nos tratados juiz estará obrigado a deixar de aplicar a lei
de direitos humanos inválida (contrária a um direito previsto em
Como se disse, deve haver dupla com- tratado de direitos humanos em vigor no
patibilidade vertical material para que a país), não obstante ainda vigente (porque
produção do direito doméstico seja vigente de acordo com a Constituição).
e válida dentro da ordem jurídica brasileira. Esse exercício que o juiz doravante
A primeira compatibilidade vertical se des- deverá fazer na aplicação (ou inaplicação)
dobra em duas: a da Constituição e a dos de uma lei infraconstitucional deverá
tratados de direitos humanos ratificados basear-se no diálogo das fontes já estudado,
pelo Brasil. A compatibilidade com a Cons- uma vez que, para se chegar à justiça da
tituição (com seus direitos expressos e im- decisão, deverá o magistrado compreender
plícitos) já estudamos. Resta agora verificar a lógica (logos) da dupla (dia) compatibi-
a compatibilidade das leis com os tratados lidade vertical material, a fim de dar ao
de direitos humanos em vigor no país. Esta caso concreto a melhor solução. Essa tese
segunda parte da primeira compatibilidade foi aceita pelo Min. Celso de Mello em
vertical material diz respeito somente aos antológico voto (HC 87.585-8/TO) lido no
tratados de direitos humanos, sem a qual ne- plenário do Supremo Tribunal Federal no
nhuma lei na pós-modernidade sobrevive.
Versaremos, aqui, a compatibilidade que 49
Ver o art. 102 da Carta das Nações Unidas.

130 Revista de Informação Legislativa


dia 12 de março de 2008, ao reconhecer dos direitos humanos e o direito interno. Dá
o valor constitucional dos tratados de mostras, também, de que tais problemas
direitos humanos na ordem jurídica bra- devem ser encarados não como uma via de
sileira, independentemente da aprovação mão única, mas como uma rota de várias
legislativa qualificada (pelo § 3o do art. 5o vias possíveis. Essa nova convepção jurí-
da Constituição). Ficou ali assentado, pelo dica atribui à força expansiva dos direitos
Min. Celso de Mello, que as fontes internas humanos um especial realce: o de servir
e internacionais devem “dialogar” entre si a ao direito como instrumento da paz. Esse
fim de resolver a questão antinômica entre valor paz, reconhecido pela força expansi-
o tratado e a lei interna brasileira. Nas suas va dos princípios em geral e, em especial,
palavras: “Posta a questão nesses termos, dos direitos humanos, é sempre anterior às
a controvérsia jurídica remeter-se-á ao normas jurídicas que o absorvem, além de
exame do conflito entre as fontes internas e sempre mais amplo que elas.
internacionais (ou, mais adequadamente, ao Como se percebe, a aplicação desse cri-
diálogo entre essas mesmas fontes), de modo a tério não exclui mutuamente uma ou outra
se permitir que, tratando-se de convenções ordem jurídica, mas antes as complementa,
internacionais de direitos humanos, estas fazendo com que a produção do direito
guardem primazia hierárquica em face da doméstico também “escute” o diálogo en-
legislação comum do Estado brasileiro, tre a Constituição e os tratados de direitos
sempre que se registre situação de antino- humanos, que se encontram em mesmo pé
mia entre o direito interno nacional e as de igualdade que ela. Em outras palavras,
cláusulas decorrentes de referidos tratados a Constituição não exclui a aplicação dos
internacionais” [grifo nosso].50 tratados e nem estes excluem a aplicação
O que se nota com clareza meridiana no dela, mas ambas as normas (Constituição e
voto do ilustre Ministro é que o seu novo tratados) se unem para servir de obstáculo
entendimento – que revogara sua própria à produção normativa doméstica infra-
orientação anterior, que era no sentido de constitucional que viole os preceitos ou a
atribuir aos tratados de direitos humanos Constituição ou dos tratados de direitos
status de lei ordinária (v. HC 77.631-5/SC, humanos em que a República Federativa
DJU 158-E, de 19.08.1998, Seção I, p. 35) – do Brasil é parte. As normas infraconsti-
aceita agora a tese do “diálogo das fontes” tucionais, doravante, para serem vigentes
e a aplicação do princípio internacional pro e válidas, deverão submeter-se a esse novo
homine. Referido princípio é um dos mais exame de compatibilidade vertical mate-
notáveis frutos da pós-modernidade jurí- rial, solução esta mais fluida (e, portanto,
dica, que representa a fluidez e a dinâmica capaz de melhor favorecer a “evolução do
que devem existir no âmago da questão direito”51) e mais consentânea com os dita-
relativa aos conflitos normativos. mes da pós-modernidade jurídica.
É alentador perceber o avanço da Por meio dessa solução que se acaba de
jurisprudência brasileira no que tange à expor, repita-se, não será a Constituição
aplicação do diálogo das fontes e do princípio que excluirá a aplicação de um tratado ou
internacional pro homine. Tudo isto somado vice-versa, mas ambas essas supernormas
nos leva a concluir que a recente jurispru- (Constituição e tratados) é que se vão unir
dência brasileira dá mostras de que já aceita em prol da construção de um direito in-
as soluções pós-modernas para o problema fraconstitucional compatível com ambas,
das antinomias entre o direito internacional sendo certo que a incompatibilidade desse
mesmo direito infraconstitucional com ape-
Ver STF, HC 87.585-8, do Tocantins, Voto-vista do
50

Min. Celso de Mello, de 12 mar. 2008, p. 19. 51


CARNELUTTI, 2006a, p. 188.

Brasília a. 46 n. 181 jan./mar. 2009 131


nas uma das supernormas já o invalida por trole de constitucionalidade (para nós, de
completo. Com isto, possibilita-se a criação convencionalidade…), tanto na via incidente
de um Estado Constitucional e Humanista (controle difuso) como na via direta (controle
de Direito em que todo o direito doméstico concentrado). Os demais tratados (de direitos
guarde total compatibilidade tanto com a humanos ou não) que forem incorporados
Constituição quanto com os tratados inter- sem a aprovação qualificada não valeriam
nacionais de direitos humanos ratificados como paradigma de compatibilização
pelo Estado, chegando-se, assim, a uma vertical, caso em que o conflito de normas
ordem jurídica interna perfeita, que tem seria resolvido pela aplicação dos critérios
no valor dos direitos humanos sua maior clássicos de solução de antinomias (segun-
racionalidade, principiologia e sentido. do o autor, “pelo modo de apreciação da
No que tange ao respeito que deve ter o colidência entre lei especial e lei geral”).
direito doméstico aos tratados de direitos Contrariamente a essa posição, da qual
humanos, surge, ainda, uma questão a ser também outros autores já divergiram,53
versada. Trata-se daquela relativa aos tra- podemos lançar algumas observações.
tados de direitos humanos aprovados por A primeira delas é a de que se sabe que
três quintos dos votos dos membros de cada não é necessária a aprovação dos tratados
Casa do Congresso Nacional, em dois turnos de direitos humanos pelo quorum qualifica-
de votação, tal como estabelece o art. 5o, § 3o, do do art. 5o, § 3o, da Constituição, para que
da Constituição de 1988. Nesse caso, ter-se-á tais instrumentos tenham nível de normas
no direito brasileiro o controle de conven- constitucionais. O que o art. 5o, § 3o, do
cionalidade concentrado, como passaremos a texto constitucional fez foi tão-somente
expor. Antes disso, porém, merece ser citada atribuir “equivalência de emenda” a tais
– para fins de críticas – a lição de José Afonso tratados, e não o status de normas consti-
da Silva, para quem somente haverá incons- tucionais que eles já detêm pelo art. 5o, §
titucionalidade (inconvencionalidade…) se as 2o, da Constituição. Portanto, dizer que os
normas infraconstitucionais “violarem as tratados são “equivalentes às emendas” não
normas internacionais acolhidas na forma é a mesma coisa que dizer que eles “têm
daquele § 3o”, ficando então “sujeitas ao status de norma constitucional”.54 Sem re-
sistema de controle de constitucionalidade tomar essa discussão, a qual não tem lugar
na via incidente [controle difuso] como na neste estudo, importa dizer que, uma vez
via direta [controle concentrado]”. Quanto aprovado determinado tratado de direitos
às demais normas que não forem acolhidas humanos pelo quorum qualificado do art.
pelo art. 5o, § 3o, segundo o mesmo José 5o, § 3o, da Constituição, tal tratado será
Afonso da Silva, elas “ingressam no orde- formalmente constitucional, o que significa
namento interno no nível da lei ordinária, que ele passa a ser paradigma de controle
e eventual conflito com as demais normas da legislação infraconstitucional.55 Assim,
infraconstitucionais se resolverá pelo modo à medida que esses tratados passam a ser
de apreciação da colidência entre lei especial equivalentes às emendas constitucionais, fica
e lei geral [que são os clássicos critérios de autorizada a propositura (no STF) de todas
solução de antinomias]”.52 as ações constitucionais existentes para ga-
No raciocínio do professor José Afonso rantir a estabilidade da Constituição e das
da Silva (2006b, p. 183), apenas os tratados
de direitos humanos acolhidos na forma
53
Ver as críticas de BONIFÁCIO, 2008, p. 211-214,
a esse pensamento de José Afonso da Silva, mas com
do art. 5o, § 3o, seriam paradigma de con- fundamentos diferentes dos nossos.
54
Ver explicação detalhada em MAZZUOLI, 2009,
52
Ver, por tudo, SILVA, 2006, p. 179. Cf. repetição p. 764-774. Ver ainda, MAZZUOLI, 2005, p. 89-109.
da mesma lição em SILVA, 2006b, p. 183. 55
Cf. BARROSO, 2008, p. 207.

132 Revista de Informação Legislativa


normas a ela equiparadas, a exemplo dos lei infraconstitucional é compatível com a
tratados de direitos humanos formalmente Constituição, que silencia a respeito de
constitucionais. determinado assunto), mas sim diante do
Em outras palavras, o que se está aqui controle de convencionalidade das leis, o qual
a defender é o seguinte: quando o texto se operacionaliza tomando-se por emprés-
constitucional (no art. 102, inc. I, alínea a) timo uma ação do controle concentrado
diz competir precipuamente ao Supremo de constitucionalidade (v.g., uma ADIn ou
Tribunal Federal a “guarda da Constitui- uma ADPF), na medida em que o tratado-
ção”, cabendo-lhe julgar originariamente paradigma em causa é equivalente a uma
as ações diretas de inconstitucionalidade norma constitucional.
(ADIn) de lei ou ato normativo federal ou Ora, se a Constituição possibilita sejam
estadual ou a ação declaratória de cons- os tratados de direitos humanos alçados ao
titucionalidade (ADECON) de lei ou ato patamar constitucional, com equivalência de
normativo federal, está autorizando que os emenda, por questão de lógica deve também
legitimados próprios para a propositura de garantir-lhes os meios que garante a qual-
tais ações (constantes do art. 103 da Carta) quer norma constitucional ou emenda de
ingressem com essas medidas sempre se protegerem contra investidas não autori-
que a Constituição ou quaisquer normas a zadas do direito infraconstitucional. Nesse
ela equivalentes (v.g., os tratados de direi- sentido, é plenamente possível defender a
tos humanos internalizados com quorum possibilidade de ADIn (para eivar a norma
qualificado) estiverem sendo violadas por infraconstitucional de inconvencionalidade),
quaisquer normas infraconstitucionais. A de ADECON (para garantir à norma in-
partir da Emenda Constitucional 45/04, é fraconstitucional a compatibilidade vertical
necessário entender que a expressão “guar- com um tratado de direitos humanos for-
da da Constituição”, utilizada pelo art. 102, malmente constitucional), ou até mesmo
inc. I, alínea a, alberga, além do texto da de ADPF (Arguição de Descumprimento de
Constituição propriamente dito, também Preceito Fundamental) para exigir o cum-
as normas constitucionais por equiparação. primento de um “preceito fundamental”
Assim, ainda que a Constituição silencie a encontrado em tratado de direitos humanos
respeito de um determinado direito, mas formalmente constitucional.
estando esse mesmo direito previsto em Então, pode-se dizer que os tratados
tratado de direitos humanos constituciona- de direitos humanos internalizados pelo
lizado pelo rito do art. 5o, § 3o, passa a caber, rito qualificado do art. 5o, § 3o, da Consti-
no Supremo Tribunal Federal, o controle tuição passam a servir de meio de controle
concentrado de constitucionalidade (v.g., concentrado (agora de convencionalidade)
uma ADIn) para compatibilizar a norma da produção normativa doméstica, para
infraconstitucional com os preceitos do além de servirem como paradigma para o
tratado constitucionalizado.56 controle difuso.
A rigor, não se estaria, aqui, diante de Quanto aos tratados de direitos huma-
controle de constitucionalidade propria- nos não internalizados pelo quorum qualifi-
mente dito (porque, no exemplo dado, a cado, passam eles a ser paradigma apenas
do controle difuso de constitucionalidade/
56
Ver, nesse exato sentido, MENDES, 2005, p.
239, que diz: “Independentemente de qualquer outra convencionalidade. Portanto, para nós –
discussão sobre o tema, afigura-se inequívoco que o contrariamente ao que pensa o ilustrado
Tratado de Direitos Humanos que vier a ser subme- José Afonso da Silva (2006b. p. 179, 2006a, p.
tido a esse procedimento especial de aprovação [nos
183) –, não se pode dizer que as antinomias
termos do § 3o do art. 5o da Constituição] configurará,
para todos os efeitos, parâmetro de controle das nor- entre os tratados de direitos humanos não
mas infraconstitucionais”. incorporados pelo referido rito qualificado

Brasília a. 46 n. 181 jan./mar. 2009 133


e as normas infraconstitucionais somente venção Americana sobre Direitos Huma-
poderão ser resolvidas “pelo modo de nos) que possibilitam a intercomunicação
apreciação da colidência entre lei especial e a retroalimentação entre o direito inter-
e lei geral”. Os tratados internacionais de nacional dos direitos humanos e o direito
direitos humanos ratificados pelo Brasil interno. Na medida em que tais tratados se
– independentemente de aprovação com internalizam no Brasil com nível de normas
quorum qualificado – têm nível de normas constitucionais (materiais ou formais), tais
constitucionais e servem de paradigma ao “cláusulas de diálogo” passam a também
controle de constitucionalidade/conven- deter o mesmo status normativo no direito
cionalidade, sendo a única diferença a de interno, garantindo o diálogo das fontes no
que os tratados aprovados pela maioria sistema jurídico interno como garantia de
qualificada do § 3o do art. 5o da Consti- índole e nível constitucionais.
tuição servirão de paradigma ao controle Pode-se então dizer que o critério dia-
concentrado (para além, evidentemente, do lógico58 de solução de antinomias entre
difuso), enquanto que os demais (tratados o sistema internacional de proteção dos
de direitos humanos não internalizados direitos humanos e a ordem interna (que
com aprovação congressual qualificada) Erik Jayme (1995, p. 259) chamou de diálogo
apenas servirão de padrão interpretativo ao das fontes) passa a ficar constitucionalizado
controle difuso (via de exceção ou defesa) de em nosso país à medida que os tratados
constitucionalidade/convencionalidade. de direitos humanos são ratificados pelo
Em suma, todos os tratados que formam governo, independentemente de quorum
o corpus juris convencional dos direitos qualificado de aprovação e de promulgação
humanos de que um Estado é parte devem executiva suplementar. E nem se diga, por
servir de paradigma ao controle de consti- absoluta aberratio juris, que a internalização
tucionalidade/convencionalidade, com as das “cláusulas de diálogo” dos tratados de
especificações que se fez acima: a) tratados direitos humanos (e, consequentemente, do
de direitos humanos internalizados com qu- diálogo das fontes) dá-se em patamar inferior
orum qualificado são paradigma do contro- à nossa ordem constitucional e, por isso,
le concentrado (para além, obviamente, do não poderia ter aplicação imediata. Reco-
controle difuso), cabendo ADIn no Supremo nhecer a superioridade da ordem interna
Tribunal Federal a fim de nulificar a norma sobre o direito internacional dos direitos
infraconstitucional incompatível com o humanos, dando prevalência àquela, mes-
respectivo tratado equivalente à emenda mo quando protege menos o ser humano su-
constitucional; b) tratados de direitos hu- jeito de direitos, é admitir “a desvinculação
manos que têm apenas “status de norma [do Estado] do movimento internacional de
constitucional” (não sendo “equivalentes às direitos humanos reconhecidos regional e
emendas constitucionais”, posto que não universalmente”. (WEIS, 1999, p. 34)
aprovados pela maioria qualificada do art. A integração do método dialógico de
5o, § 3o, da Constituição) são paradigma Erik Jayme no Brasil passa a ter caráter
apenas do controle difuso de constitucio- de norma de ordre public nacional, para
nalidade/convencionalidade. além do caráter internacional também
Como já se demonstrou em outro lugar, reconhecido de jus cogens, à medida que
os tratados contemporâneos de direitos os tratados de direitos humanos que
humanos já preveem certas “cláusulas de consagram as chamadas “cláusulas de di-
diálogo” 57 (v.g., o art. 29, alínea b, da Con- álogo” são normas aceitas e reconhecidas
57
A expressão é de nossa autoria. Sobre tais 58
Para a nossa concepção de dialógica jurídica, em
“cláusulas de diálogo”, ver MAZZUOLI, 2008b, p. oposição à conhecida dialética jurídica, ver MAZZUOLI,
124-139. 2008b, p. 142-144.

134 Revista de Informação Legislativa


pela sociedade internacional dos Estados ção em que se encontram tais instrumentos
em seu conjunto, como normas das quais (comuns) no nosso direito interno.
nenhuma derrogação é permitida e que só A compatibilização das normas in-
podem ser modificadas por outras da mes- fraconstitucionais com os tratados in-
ma natureza, fazendo eco à regra do art. 53 ternacionais comuns faz-se por meio do
da Convenção de Viena sobre o Direito dos chamado controle de legalidade. Não se
Tratados de 1969. trata de controle de convencionalidade pelo
Tudo o que acima foi dito, relativamente fato de se reservar esta última expressão à
ao respeito que deve ter o direito doméstico compatibilidade vertical que devem ter as
aos direitos expressos nos tratados de direi- normas infraconstitucionais com os trata-
tos humanos em que o Brasil é parte, para dos de direitos humanos, que têm índole e
que só assim possam ser vigentes e válidos nível constitucionais. No caso dos tratados
na ordem jurídica interna, também deve ser internacionais comuns, estes estão abaixo da
aplicado em relação aos direitos implícitos Constituição, mas acima das leis internas.
nesses mesmos tratados de direitos huma- Assim, eles passam a servir de paradigma
nos. Os chamados direitos implícitos são de legalidade das normas domésticas, as
encontrados, assim como na Constituição, quais também serão inválidas se violarem
também nos tratados internacionais. Não suas disposições.
obstante serem direitos de difícil caracteri- Infelizmente, não há na Constituição
zação (e enumeração) apriorística, o certo brasileira de 1988 qualquer menção ao
é que eles também compõem os direitos nível hierárquico dos tratados internacio-
previstos nos tratados no âmbito do segun- nais comuns. Os únicos dispositivos que
do momento da primeira compatibilização existem no texto constitucional de 1988 a
vertical material, sendo um desdobramento consagrar uma prevalência hierárquica a
dos direitos expressos pelos quais também tratado internacional são os §§ 2o e 3o do
tem que passar o direito doméstico para art. 5o, aos quais já nos referimos. De resto,
que, somente assim, este sobreviva. a Constituição brasileira fica no silêncio,
não obstante consagrar a declaração de
B – Os direitos previstos nos tratados comuns inconstitucionalidade de tratados (art. 102,
Para que a produção do direito domésti- inc. III, alínea b). Pelo fato de não existir
co crie norma jurídica hábil a valer no plano na Constituição qualquer menção expres-
do direito interno, será necessária, para sa sobre o grau hierárquico dos tratados
além da primeira compatibilização vertical internacionais comuns, a outra solução
material – (a) da Constituição e (b) dos trata- não se pode chegar senão atribuir valor
dos de direitos humanos dos quais o Brasil infraconstitucional (mas supralegal) a tais
é parte –, uma segunda conformidade verti- instrumentos. Assim, em relação aos trata-
cal, dessa vez da norma infraconstitucional dos comuns, o entendimento passa a ser o
com os tratados internacionais comuns em de que a lei interna não sucumbe ao tratado
vigor no país. Esta segunda conformidade por ser ele posterior ou especial em relação a
das leis com os tratados comuns deve exis- ela (pela aplicação daqueles critérios clássi-
tir pelo fato de estarem tais instrumentos cos de solução de antinomias), mas sim em
internacionais alçados ao nível supralegal decorrência do status de supralegalidade
no direito brasileiro.59 Norma supralegal é desses tratados no plano doméstico. Nessa
aquela que está acima das leis e abaixo da ordem de ideias, a lei posterior seria inválida
Constituição. Trata-se, justamente, da posi- (e, consequentemente, ineficaz) em relação
ao tratado internacional, que não obstante
59
Para detalhes, ver MAZZUOLI, 2009, p. 339- anterior é hierarquicamente superior a ela.
343. (PEREIRA, 2001, p. 121-123)

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São vários os dispositivos da legislação em detrimento do próprio tratado) quando
brasileira que garantem a autenticidade da a norma interna for mais benéfica aos direitos
afirmação de estarem os tratados comuns da pessoa em causa, em consagração ao
alçados ao nível supralegal no Brasil. To- princípio internacional pro homine. Nesse
memos como exemplo o art. 98 do Código caso, parece certo que os critérios tradicio-
Tributário Nacional, que assim dispõe: nais de solução de antinomias (o hierárquico,
“Os tratados e as convenções interna- o da especialidade e o cronológico) não têm
cionais revogam ou modificam a legis- aptidão para resolver os conflitos entre
lação tributária interna, e serão obser- normas internacionais de direitos humanos
vados pela que lhes sobrevenha”.60 e as normas de direito interno veiculado-
Na redação do art. 98 do CTN, os trata- ras de direitos fundamentais, devendo os
dos em matéria tributária revogam ou modifi- mesmos ser resolvidos pela aplicação do
cam a legislação tributária interna, mas não diálogo das fontes, quando o juiz “escuta”
poderão ser revogados por legislação tribu- o que as fontes (internacionais e internas)
tária posterior, devendo ser observados por dizem e as “coordena” para aplicá-las (com
aquela (legislação tributária) que lhes sobre- coerência) ao caso concreto (JAYME, 1995,
venha. A disposição versa sobre tratados em p. 259). E esta “conversa” entre as fontes
matéria tributária, que são tratados comuns, internacionais de direitos humanos e as
salvo o evidente caso de o instrumento in- fontes internas sobre direitos fundamentais
ternacional em matéria tributária ampliar é veiculada por meio dos próprios “vasos
uma garantia do contribuinte, quando então comunicantes” (ou cláusulas de diálogo) pre-
poderão (mas esta hipótese é excepcional) vistos tanto nas normas internacionais (v.g.,
ser considerados como tratados veiculado- o art. 29, alínea b, da Convenção Americana
res de direitos fundamentais. sobre Direitos Humanos) quanto nas nor-
De qualquer forma, o certo é que os tra- mas internas (v.g., o art. 5o, § 2o, c/c art. 4,
tados internacionais ratificados e em vigor inc. II, ambos da Constituição de 1988).
no Brasil têm hierarquia superior às leis (se- Portanto, de volta ao caso dos tratados
jam elas ordinárias ou complementares): a) comuns, pensamos que os conflitos entre
os tratados de direitos humanos têm nível eles e as normas infraconstitucionais do
de normas constitucionais (podendo ser direito interno devem ser resolvidos pelo
apenas materialmente constitucionais – art. 5o, critério hierárquico.61 Dessa forma, havendo
§ 2o – ou material e formalmente constitucio- conflito entre tratados comuns (que têm
nais – art. 5o, § 3o); e b) os tratados comuns nível supralegal no Brasil) e leis internas,
têm nível supralegal por estarem abaixo da os juízes e tribunais nacionais deverão
Constituição, mas acima de toda a legisla- recusar-se a aplicar a norma infraconstitu-
ção infraconstitucional. cional violadora do tratado enquanto este
O problema que visualizamos, em rela- vincular o Estado.62 Eis aqui a aplicação do
ção aos tratados comuns, diz respeito à falta controle de legalidade das normas de direito
de “cláusulas de diálogo” em seus textos, doméstico em relação aos tratados interna-
à diferença do que ocorre com os tratados cionais comuns.
de direitos humanos, que sempre trazem A solução para esse caso é encontrada
dispositivos no sentido de não excluir a no art. 27 da Convenção de Viena sobre o
aplicação do direito doméstico (ainda que
61
Muitos autores que versaram a teoria geral do
Para uma análise detalhada deste dispositivo, no
60 direito não cuidaram desse problema quando do es-
que tange à questão das isenções de tributos estaduais tudo da hierarquia das fontes jurídicas. Assim, com
e municipais pela via dos tratados, ver MAZZUOLI, nenhuma palavra sequer a esse respeito, CARNELUT-
2009, p. 350-353. Cf., ainda, MAZZUOLI, 2007, p. TI, 2006, p. 162-167.
583-590. 62
Cf. PEREIRA; QUADROS, 2006, p. 123.

136 Revista de Informação Legislativa


Direito dos Tratados de 1969, segundo o Pode-se também concluir que, doravan-
qual uma parte “não pode invocar as dispo- te, a produção normativa doméstica conta
sições de seu direito interno para justificar com um duplo limite vertical material: a)
o inadimplemento de um tratado”. 63 O a Constituição e os tratados de direitos
“direito interno” referido pela Convenção humanos (1o limite) e b) os tratados inter-
de Viena de 1969 é, evidentemente, todo o nacionais comuns (2o limite) em vigor no
direito interno (inclusive a Constituição) do país. No caso do primeiro limite, no que
Estado (PEREIRA, 2001, p. 120). Contudo, toca aos tratados de direitos humanos, es-
à medida que se entende que os tratados tes podem ter sido ou não aprovados com
comuns cedem ante a Constituição, tal dis- o quorum qualificado que o art. 5o, § 3o, da
positivo passa a ser interpretado como os Constituição prevê. Caso não tenham sido
temperamentos que o Direito Constitucio- aprovados com essa maioria qualificada,
nal lhe impõe.64 seus status serão de norma (apenas) mate-
rialmente constitucional, o que lhes garante
serem paradigma de controle somente
5. Conclusão
difuso de convencionalidade; caso tenham
O que se pode concluir, ao fim e ao cabo sido aprovados (e entrado em vigor no
desta exposição teórica, é que o direito bra- plano interno, após sua ratificação) pela
sileiro está integrado com um novo tipo de sistemática do art. 5o, § 3o, tais tratados
controle das normas infraconstitucionais, servirão também de paradigma do controle
que é o controle de convencionalidade das leis, concentrado (para além, é claro, do difuso) de
tema que antes da Emenda Constitucional convencionalidade.
no 45/2004 era totalmente desconhecido Os tratados de direitos humanos para-
entre nós. digma do controle concentrado autorizam
que os legitimados para a Ação Direita de
63
Não cabe aqui um estudo deste dispositivo. Para Inconstitucionalidade (ADIn) previstos
tal, ver MAZZUOLI, 2009, p. 225-230. no art. 103 da Constituição proponham
64
Sobre tais temperamentos já escrevemos em
outra obra: “…a regra do art. 27 da Convenção de
tal medida no STF como meio de retirar
Viena continua a valer em sua inteireza, não podendo a validade de norma interna (ainda que
uma parte em um tratado internacional invocar as compatível com a Constituição) que viole um
disposições de seu Direito interno (qualquer delas, tratado internacional de direitos humanos
inclusive as normas da Constituição) para justificar
o inadimplemento desse tratado. (…) A Constituição
em vigor no país.
brasileira de 1988 aceita esta construção, ainda que Quanto aos tratados internacionais co-
por fundamentos diferentes, no que tange ao Direito muns, temos como certo que eles servem
Internacional convencional particular que versa so- de paradigma de controle de legalidade das
bre direitos humanos (art. 5o, §§ 2o e 3o). Quanto aos
demais tratados, pensamos que eles cedem perante
normas infraconstitucionais, de sorte que a
a Constituição, por força do preceito constitucional incompatibilidade destas com os preceitos
que sujeita os tratados à fiscalização de sua consti- contidos naqueles invalida a disposição
tucionalidade (art. 102, inc. III, alínea b). Somente legislativa em causa em benefício da apli-
na falta desse comando constitucional é que a regra
pacta sunt servanda, bem como o já referido art. 27 da
cação do tratado.
Convenção de Viena, imporia a prevalência de todos os
tratados internacionais sobre a Constituição. Pelo fato
de a Constituição brasileira consagrar a declaração de
inconstitucionalidade de tratados, e dado que não há Referências
no nosso texto constitucional menção expressa sobre
o grau hierárquico a ser atribuído aos tratados inter- ALCALÁ, Humberto Nogueira. Reforma constitucio-
nacionais comuns, parece não restar outra saída senão nal de 2005 y control de constitucionalidad de tratados
atribuir valor infraconstitucional a tais tratados, ainda internacionales. Estudios Constitucionales. Universidad
que supralegal”. (MAZZUOLI, 2009, p. 226-229). de Talda, año 5, n. 1, 2007.

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