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P a t r í c i a C e r q u e i r a R e i s
Abstract
Resumen
146 A comunicação como estratégia para a participação do cidadão no estado democrático de direito • Patrícia Cerqueira Reis
A possibilidade de participação e controle social no processo de formação do
estado e o exercício da democracia representativa no Brasil tiveram início no
final da década de 1980. A configuração do estado democrático de direito, pre-
vista na Constituição Federal de 1988, representa a terceira geração do direito na
construção dos paradigmas do estado. Embora haja a legitimação do coletivo e
das responsabilidades de todos sobre o bem público e na construção do espaço
público, a prática do exercício da cidadania traz a marca de séculos de domina-
ção econômica, opressão social pelo estado e do poder político das elites.
Adam Smith (The wealth of nations, 1776) estabelece uma forte justificativa
econômica (melhorar sua condição e aumentar seus bens) para a prevalência
do individualismo e, principalmente, agrega a ideia de que, ao agir em busca
de seu próprio interesse econômico, o indivíduo maximiza o bem-estar coleti-
vo. Para ele, o papel do estado torna-se periférico em relação à dinâmica social
fundamental. A ideia de que a sociedade é regulada pela “mão invisível” do
mercado é uma das principais referências da sua teoria.
148 A comunicação como estratégia para a participação do cidadão no estado democrático de direito • Patrícia Cerqueira Reis
Somente após o término da Segunda Guerra Mundial é que os fundamentos
do estado social de direito serão aplicados. Em 1945, vinte e um representantes
de diferentes países se reúnem no México e firmam como primeiro objetivo
da Organização das Nações Unidas (cuja estrutura foi criada por Kelsen) a
redação da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948). Esta consagra
a certeza dos direitos por sua prévia e clara fixação; a segurança dos direitos
pela existência de normas que garantam que eles serão respeitados e a possibi-
lidade dos direitos exigindo a existência de instrumentos necessários ao gozo
disponível para todos os indivíduos (Dallari, 1972, p. 185).
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Para Held (1989), a ordem política se alcança por uma complexa rede de
interdependências entre a ordem política, econômica, as instituições so-
ciais e as atividades que dividem os centros de poder, sendo essas últimas
criadoras de múltiplas pressões às quais se deve ceder. O poder do estado
é um aspecto central dessas estruturas, não se constituindo em sua única
variável (Batista, 2002, p. 3).
Primeiro setor
(governo)
Transferência de suas funções =>
Estado mínimo gestor
• executivo
Representação
• judiciário
política
• legislativo
Democracia representativa
Eleição direta ou concurso
Questões públicas
Sociedade social / cultural / ambiental Grupos de Lobby
interesse
• OSCIPs e ONGs
• Associações,
• Conselhos
Sociedade Civil Participação social
• Centros de Pesquisas
Organizada
• Movimentos Sociais
• Empresas Privadas, etc
152 A comunicação como estratégia para a participação do cidadão no estado democrático de direito • Patrícia Cerqueira Reis
Na dimensão política, o estado democrático de direito se caracterizará pela
criação de mecanismos de acompanhamento social das questões públicas,
como as audiências públicas, o plano diretor e o orçamento participativo. A
divisão de poderes – legislativo, executivo e judiciário – deixa de estar centra-
lizado na representação política e se divide pela sociedade civil organizada. A
institucionalização do lobby legitima a pressão dos diferentes grupos sociais,
levando à redução dos mandatos imperativos (típicos da democracia repre-
sentativa) nos quais há a prevalência dos interesses dos grupos que financiam
as campanhas sobre o interesse dos demais grupos sociais envolvidos com a
questão em pauta. As mudanças trazem ainda modelos de participação, como
plebiscitos (quando o que se escolhe é uma matéria em questão), referendos
(nos quais se vota o texto de uma lei) e ações populares (que correspondem
ao exercício da cidadania direta, podendo qualquer cidadão mover uma ação
popular por danos ao erário, ao meio ambiente, ao patrimônio histórico ou
por moralidade).
A cidadania ativa
A soberania popular pode ocorrer: pela democracia direta, a qual pressupõe que
o povo, reunido em assembleia, toma decisões diretas sobre as políticas que lhe
dizem respeito; pela democracia semidireta, que utiliza técnicas de intervenção
do povo nas decisões do estado; ou pela democracia indireta, compreendendo a
eleição de representantes, a qual pode se dar pela “monarquia eletiva” (deno-
minação francesa), cujo chefe de estado é eleito pelo sufrágio universal (Brasil,
Estados Unidos e França) ou pela “oligarquia eletiva”, em que a classe política
é formada pelos parlamentares (Inglaterra) (Batista, 2002).
Noberto Bobbio (1986) conclui que, quanto maior a democracia, mais se exige
que a democracia representativa seja substituída pela democracia direta, sem,
contudo, entender esta última como a participação de todos os cidadãos em
todas as decisões relacionadas com eles, o que reduziria, fatalmente, todos os
interesses humanos ao interesses da pólis, acarretando a completa eliminação
da esfera privada na esfera pública (Batista, 2002, p. 3).
Tal ideal nos remete ao conceito de cidadania moderna, que traz um forte
vínculo com a dinâmica política, na qual o cidadão é reconhecido como mem-
bro completo de uma sociedade de iguais. Para isso, torna-se necessário que
os indivíduos tenham cada vez mais acesso aos direitos de cidadania – civis,
políticos e sociais – previstos no paradigma do estado democrático de direito.
Porém, a estrutura democrática com a qual nos confrontamos é frágil e a sim-
O consumidor cidadão
No final dos anos 1990 e início da década de 2000, com o aumento da conscientiza-
ção sobre questões públicas como meio ambiente, direitos humanos, segurança,
entre tantas outras, o poder exercido pelo consumidor passa a ocupar a dimensão
do exercício de cidadania. A diferenciação do indivíduo em seus grupos vai, ago-
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ra, além do acúmulo de bens. Autores como Néstor García Canclini (2005), Jesús
Martín-Barbero (2002), Manuel Castells (1999) e Pierre Lévy (2002) consideram
que o exercício da cidadania também se manifesta na forma como o indivíduo
consome produtos, serviços, bens simbólicos, culturais, entretenimento etc.
Por fim, é na dimensão das instituições públicas estatais que a prática comu-
nicativa, como mecanismo de exercício de cidadania, acesso à informação,
democratização e participação dos processos de problematização e de deci-
são sobre as políticas públicas se torna prioritária para a implementação do
estado democrático de direito.
Ana Lúcia Novelli (2006) utiliza os conceitos de Bauman sobre liquidez, leveza
e inconstância do ambiente contemporâneo para explicar as novas exigências
do consumidor cidadão por transparência, agilidade, eficiência e profissiona-
156 A comunicação como estratégia para a participação do cidadão no estado democrático de direito • Patrícia Cerqueira Reis
lismo e que suscitam diferentes modelos de cidadania, de representatividade
e de participação. Todo esse processo de transformação implica utilizar di-
versos instrumentos de comunicação para a atuação direta ou indireta do ci-
dadão que pode ser informado, consultado, deliberado, regulado ou agente
executor. Com isso, a comunicação passa a ser compreendida como estratégia
de informação, consulta e participação ativa (fóruns, conselhos, plebiscitos,
referendos, audiências públicas, pesquisas de opinião, contratos de cogestão
com entidades do terceiro setor etc). Múltiplos mecanismos são adotados na
tentativa de ampliar a capacidade de gestão (governança), de articulação e de
legitimação (governabilidade). Assim, diferentes princípios ou premissas aca-
bam por serem desenvolvidos para que haja uma efetiva mobilização social e
intercâmbio entre os atores sociais dos três setores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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