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TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL

ACÓRDÃO

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL N° 1-49.2013.6.18.0024 - CLASSE 32 -


JOSÉ DE FREITAS PIAUÍ

Relator: Ministro Henrique Neves da Silva


Recorrentes: Coligação Vitória que o Povo Quer e outro
Advogados: Edson Vieira Araújo e outros
Recorridos: Roberval Sinval de Moura Carvalho e outros
Advogado: Edivaldo da Silva Cunha
Recorrido: Antônio José da Silva
Recorrida: Celsa Maria Gomes da Silva
Recorrido: Celson Bezerra de Carvalho
Recorrida: Cristiane Resende Pessoa
Recorrido: Edson Pereira da Silva
Recorrido: Estevam Nunes Santiago
Recorrido: Gilmar Oliveira Leite
Recorrido: João de Deus Moreira Lima
Recorrido: José Francisco Alves dos Santos
Recorrido: José Luz da Silva
Recorrido: José Pereira dos Santos Sobrinho Filho
Recorrida: Maria Anita Craveiro da Rocha Neta
Recorrido: Ricardo Alves dos Santos
Recorrido: Partido Social Democrata Cristão (PSDC) - Municipal
Recorrido: Partido Republicano Progressista (PRP) - Municipal
Recorrido: Partido Trabalhista Cristão (PTC) - Municipal
Recorrido: Manoel Pereira das Neves

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE


MANDATO ELETIVO. CORRUPÇÃO. FRAUDE.
COEFICIENTE DE GÊNERO.
Não houve violação ao art. 275 do Código Eleitoral,
pois o Tribunal de origem se manifestou sobre matéria
prévia ao mérito da causa, assentando o não cabimento
da ação de impugnação de mandato eletivo com
fundamento na alegação de fraude nos requerimentos de
registro de candidatura.
O conceito da fraude, para fins de cabimento da ação
de impugnação de mandato eletivo (ad. 14, § 10, da
Constituição Federal), é aberto e pode englobar todas as
situações em que a normalidade das eleições e a
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/pi

legitimidade do mandato eletivo são afetadas por ações


fraudulentas, inclusive nos casos de fraude à lei. A
inadmissão da AIME, na espécie, acarretaria violação ao
direito de ação e à inafastabilidade da jurisdição.
Recurso especial provido

Acordam os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, por


unanimidade, em dar provimento ao recurso especial, determinando o retorno
dos autos ao TRE do Piauí para, afastando o argumento de inviabilidade da via
eleita, permitir que a ação de impugnação de mandato eletivo siga seu curso
normal e legal, nos termos do voto do relator.

Brasília, 4 de agosto de 2015.

MINIST4W HENRIUE NEVES DÁ SILVA - RELATOR


REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 3

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO HENRIQUE NEVES DA SILVA:


Senhor Presidente, a Coligação Vitória que o Povo Quer e Arnaldo de Oliveira
Abreu interpuseram recurso especial (fls. 424-442) contra o acórdão do
Tribunal Regional Eleitoral do Piauí (fls. 394-394v) que negou provimento ao
recurso eleitoral, para manter a sentença do Juízo da 24a Zona Eleitoral
daquele estado que julgou extinta, sem resolução do mérito, nos termos do
art. 267, VI, do Código de Processo Civil, a ação de impugnação de mandato
eletivo por fraude eleitoral ajuizada pelos agravantes em desfavor dos
candidatos eleitos e suplentes ao cargo de vereador no Município de José de
Freitas/Pl no pleito de 2012, Antônio da Costa Monteiro, Francisco Xavier da
Rocha, José Luiz de Sousa, Karllos Augusto Sampaio Junior e Roberval Sinval
de Moura Carvalho.

Eis a ementa do acórdão regional (fI. 394):

Recurso. Ação de impugnação de mandato eletivo. Eleições


municipais. Vereador. Sentença primeiro grau. Extinção sem
resolução de mérito. Alegação de fraude. Preenchimento de cotas
por sexo, art. 10, § 31, da lei n° 9.504/97. Hipótese de cabimento.
Art. 14, § 10, da CF/88. Não provimento do recurso.
Eventual ofensa à regra contida no art. 10, § 30, da lei eleitoral,
segundo a qual, para as eleições proporcionais, cada partido ou
coligação deverá preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70%
"para candidaturas de cada sexo", não merece ser configurada como
fraude eleitoral para fins de cabimento de AIME.
2. Recurso conhecido e não provido.

Opostos embargos de declaração, foram eles rejeitados, em


acórdão que recebeu a seguinte ementa (fi. 419):

Embargos de declaração. AIME. Obscuridade. Dúvida. Omissão.


Inexistência. Pretensão. Rejulgamento da causa. Não provimento.
1. A omissão que desafia os declaratórios é aquela referente às
questões, de fato ou de direito, trazidas à apreciação do magistrado,
e não a referente às teses defendidas pela parte, as quais podem
ser rechaçadas implícita ou explicitamente. (ED-RO - embargos de
declaração em recurso ordinário n° 60283 - palmas/to. Relator mm.
Aldir Guimarães Passarinho Junior. Publicação: PSESS - publicado
em sessão, data 14/1212010)
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 4

Os supostos vícios apontados pelo embargante denotam o mero


inconformismo com os fundamentos adotados pelo acórdão
embargado e o propósito de rediscutir matéria já decidida,
providência inviável na via aclaratória, conforme jurisprudência
pacífica do Tribunal Superior Eleitoral.
Mesmo para fins de prequestionamento, é necessário que haja,
no acórdão, algum dos vícios a que se refere o art. 275 do CE.
4. Embargos rejeitados.

O Presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Piauí negou


seguimento ao recurso especial mediante a decisão de fls. 444-445v.

Seguiu-se a interposição de agravo (fis. 447-463), ao qual dei


provimento (fls. 475-484), a fim de determinar a reautuação do feito como
recurso especial.

Nas razões recursais, a Coligação Vitória que o Povo Quer e


Arnaldo de Oliveira Abreu sustentam, em suma, que:

houve violação ao art. 275, § 40, do Código Eleitoral, visto


que, apesar de os embargos de declaração terem sido
conhecidos e rejeitados, o relator na origem consignou que
havia o intuito meramente protelatório. Ademais, houve a
oposição de apenas um recurso de embargos de declaração, o
que não poderia conduzir à imposição da sanção do referido
dispositivo legal;

houve afronta ao art. 275, 1 e II, do Código Eleitoral e aos


arts. 50, XXXV, LV, e LIV, e 93, IX, da Constituição Federal,
pois a Corte de origem não se manifestou a respeito de
questões nucleares para o deslinde da causa, tais como a tese
de cabimento da AIME com fundamento em fraude eleitoral,
decorrente da renúncia de três candidatas e da votação pífia
de duas outras, e em corrupção eleitoral, decorrente da
captação ilícita de sufrágio;

entre as questões não apreciadas pelo Tribunal a quo,


encontram-se a alegação de vício de consentimento na
formalização do requerimento de registro de candidatura, a
apresentação de registro de candidatura de filiada analfabeta e
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 5

a tese de que as outras duas candidatas, cuja votação foi


inexpressiva, apenas foram registradas para o atendimento do
percentual de gênero;

d) desde a inicial, os agravantes identificaram as ilicitudes


hábeis a serem apuradas em sede de AIME, como a
apresentação de requerimentos de registro de candidatura
para o sexo feminino de forma fraudulenta, com base nos
seguintes fatos:

houve vício de consentimento de três filiadas, que


desconheciam o fato de terem sido lançadas candidatas
e, assim, renunciaram a suas candidaturas quando
descobriram a fraude;

apresentação de registro de candidatura de filiada


analfabeta, com as assinaturas constantes daquele
processo da lavra do representante da Coligação Manoel
da Laura;

as únicas duas candidatas restantes da coligação


...: adversária tiveram votação pífia - uma não teve nenhum
voto e a outra teve um único voto -, o que demonstra que
elas não tinham a intenção de concorrer, mas foram
colocadas apenas para permitir o registro de quatorze
candidatos do sexo masculino;

e) a Corte Regional assentou a inadequação da via eleita em


relação à alegação de fraude, mas não identificou em que
consistem os ilícitos, se não se tratam de fraude, e tampouco
qual seria o meio hábil para apurá-los;

f) "o acórdão deveria ter se pronunciado sobre como foi


possível concluir pela inexistência de fraude, para fins de
cabimento de AIME, se alguns dos recorridos tiveram os seus
registros deferidos apenas porque o percentual mínimo de
gênero foi alcançado de forma fraudulenta no pleito de 2012"
(fl.432);
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI

a inobservância do limite legal de candidatos do mesmo


sexo acarreta o indeferimento de todos os registros
apresentados pelo partido ou coligação;

o Tribunal a quo deveria ter se manifestado sobre as


peculiaridades do caso dos autos para que fosse possível a
esta Corte Superior reenquadrar os fatos incontroversos;

não houve pronunciamento sobre o cabimento da AIME nos


casos de candidaturas fictícias, sem compromisso sequer de
fazer campanha e formalizadas apenas para permitir o registro
dos candidatos do sexo masculino;

o Tribunal a quo não se desincumbiu do ônus de se


manifestar acerca do desempenho das candidatas ao cargo de
vereador, em especial se os fatos apurados caracterizam o
instituto do "percentual branco por renúncia e por votos
irrisórios" (f1.433);

houve omissão do acórdão regional quanto à alegação de


que João Lima e Manoel da Laura ofereceram e prometeram
empregos e aposentadoria a algumas candidatas que
renunciaram a suas candidaturas, caracterizando o ilícito
disposto no art. 41-A da Lei n° 9.504/97, bem como a
corrupção prevista no art. 14, § 10, da Constituição Federal;

1) a jurisprudência do TSE é pacífica no sentido de que é


possível a revaloração jurídica dos aspectos delineados na
moldura fática do próprio acórdão recorrido;

m) o art. 262 do Código Eleitoral, de acordo com a


jurisprudência atual do TSE, fixada no RCED n° 884, de
relatoria do Ministro Dias Toifoli, entendeu não mais ser
cabível o ajuizamento do Recurso Contra Expedição
de Diploma nos casos de abuso de poder
(político/econômico/autoridade) ou quando há manifesta
contradição com a prova dos autos;

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REspe no 1-49.2013.6.18.0024/PI 7

a interpretação restritiva das hipóteses de fraude para fins


de cabimento da AIME acaba por violar o art. 14, § 10, da
Constituição Federal, pois a razão de ser do preceito é permitir
a apuração de toda e qualquer forma de fraude;

a conduta fraudulenta da coligação recorrida permitiu o


cumprimento fictício do art. 10, § 30, da Lei n° 9.504/97, com o
único propósito de simular a observância da cota de 30% de
candidaturas do sexo feminino;

deve haver uma interpretação sistemática do art. 14, §§ 90 e


10, da Constituição Federal, cujo vetor axiológico consiste em
elidir atuações ilícitas abusivas e fraudulentas, repudiando atos
que representem depreciação à norma;

proibir a apuração da fraude por meio da AIME seria


incentivar o sentimento de impunidade do candidato que
comete o ilícito, pois não haveria outro meio judicial hábil para
se coibir tal prática, haja vista que a Ação de Investigação
Judicial Eleitoral (AIJE) e o Recurso Contra Expedição de
Diploma (RCED) não se prestam para esse fim;

o Tribunal Superior Eleitoral deve se debruçar sobre tema


inédito - o cabimento da AIME para tratar de fraude no
momento da formação fraudulenta de coligação que disputou
eleições proporcionais;

Ao final, requerem o seguinte:

seja afastada a aplicação do artigo 275, § 40, do CE, uma


vez que os embargos de declaração opostos na origem não
são protelatórios;

aplicando-se o disposto no artigo 249, § 21, CPC, em


homenagem aos princípios da celeridade e economia
processuais, seja dado provimento ao recurso para,
reconhecendo a violação aos dispositivos legais antes
mencionados e as divergências jurisprudenciais, reformar o
REspe no 1-49.2013.6.18.0024/PI

acórdão recorrido a fim de anular o registro da chapa completa


de vereadores da coligação, tendo em vista que foi registrada
por meio de fraude em razão de vício de consentimento e de
vontade;

caso assim não se entenda, requerem seja anulado o


acórdão recorrido, para que, assentando-se o cabimento da
presente ação, seja apreciado o tema de fundo apresentado
perante a Justiça Eleitoral do Piauí;

caso se verifique que não há elementos nos autos


suficientes para decidir o mérito da causa em seu favor da
recorrente, seja então provido o recurso para, nos temos da
fundamentação deduzida, cassar o acórdão regional proferido
nos embargos de declaração, determinando ao e. TRE/PI que
se pronuncie sobre todas as questões nele suscitadas, como
forma de garantir a entrega plena e eficaz da prestação
jurisdicional, pois houve violação direta ao ad. 275 do Código
Eleitoral, bem como contrariedade à Constituição Federal.

Não foram ofertadas contrarrazões, conforme certidão de


fI. 466.

A Procuradoria-Geral Eleitoral opinou pelo desprovimento do


apelo, no parecer de fls. 471- 473, argumentando que:

não há relevância na discussão acerca da tese de afronta


ao ad. 275, § 40, porquanto o recurso especial não foi
considerado intempestivo;

não houve afronta aos arts. 275, 1 e II, do Código Eleitoral e


50
XXXV, LV, LIV, e 93, IX, da Constituição Federal, pois,
"com efeito, o Tribunal a quo examinou todos os pontos que
entendeu suficientes para formação de sua convicção,
inexistindo, portanto, obscuridade, contradição ou omissão no
acórdão embargado" (fi. 472);
REspe no 1-49.2013.6.18.0024/PI

o órgão julgador não é obrigado a fazer referência pontual


às teses levantadas pelas partes, bastando que os
fundamentos utilizados sejam suficientes para embasar sua
decisão;

o TRE/PI julgou bem ao confirmar a decisão de primeiro


grau, pois eventual ofensa ao § 30 do art. 10 da Lei n° 9.504/97
não configura hipótese apta a ser apurada por meio de AIME;

"o conceito de fraude de que trata o art. 14, § 10, da CF188


possui caráter mais restritivo, relativo àquela fraude tendente a
comprometer o processo de votação e a legitimidade do pleito.
Não é o caso que se verifica nos autos, em que a fraude teria
sido perpetrada para o cumprimento de cota mínima por sexo,
com o fim de possibilitar o registro de candidatos de uma
coligação" (fI. 473);

não há nos autos elementos probatórios que comprovam a


fraude em relação ao consentimento das candidatas;

conclusão diversa demandaria o revolvimento do conjunto


probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula 7
do STJ.

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO HENRIQUE NEVES DA SILVA


(relator): Senhor Presidente, o recurso especial eleitoral é tempestivo. O
acórdão regional foi publicado no DJe de 11.2.2014, terça-feira, conforme
certidão à fI. 419, e o apelo foi apresentado em 14.2.2014, sexta-feira (fi. 424),
por procurador devidamente habilitado nos autos (certidão à fI. 35).

Os recorrentes alegam que o acórdão recorrido violou o


art. 275, § 40, do Código Eleitoral, pois o relator na origem considerou
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/Pi 10

manifestamente protelatórios os primeiros embargos de declaração opostos


com a finalidade de prequestionar a matéria objeto do recurso especial.

Afirmam, ademais, que não houve reconhecimento do caráter


procrastinatório na parte dispositiva do voto condutor e no acórdão, atinentes
ao julgamento dos embargos de declaração e que estes foram conhecidos e
rejeitados, circunstância que seria impeditiva da aplicação da sanção constante
do sobredito dispositivo legal.

De fato, a matéria foi apenas ventilada na argumentação do


voto, sem que fosse reconhecida expressamente, na parte dispositiva, a
imposição da penalidade prescrita no referido dispositivo legal, conforme se vê
no trecho abaixo (fI. 42 lv):

1...]
Desse modo, entendo aplicável o art. 275, § 4°, do Código Eleitoral,
cujo teor é o seguinte: «Os embargos de declaração suspendem o
prazo para a interposição de outros recursos, salvo se
manifestamente protelatórios e assim declarados na decisão que os
rejeitar"
E ... ]

A esse respeito, este Tribunal já decidiu que "a mera menção


de intuito procrastinatório dos embargos de declaração nas razões do voto não
atrai a incidência do art. 275, § 40 do Código Eleitoral, para o qual é necessário
que o caráter protelatório tenha sido expressamente declarado e conste da
conclusão do voto, com expressa alusão ao citado dispositivo legar' (REspe
no 36.038, rei. Mm. Arnaldo Versiani, rei, designado Mm. Henrique Neves,
DJede 15.9.2011).

Ademais, o entendimento deste Tribunal Superior é pacífico no


sentido de que "não são protelatórios os embargos de declaração que tenham
por objetivo pre questionar matéria de direito tida como relevante". (REspe
no 13225-64, rei. Mm. Gilson Dipp, DJede 18.6.2012.)

No mesmo sentido: REspe no 1564-59, rei. Mm. Nancy


Andrighi, DJE de 30.8.2011; REspe 4818-84, rei. Mm. Nancy Andrighi, DJe
de 12.8.2011; REspe n° 19.752, rei. Min. Sepúlveda Pertence, DJ
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 11

de 28.10.2005; AgR-AgR-REspe no 23.570, rei. Mm. Carlos Velloso, PSESS


em 21.10.2004.

Todavia, como bem apontou a douta Procuradoria-Geral


Eleitoral, a questão não tem maior relevo, pois o recurso especial não foi
considerado intempestivo pelo Presidente do Tribunal de origem.

Os recorrentes apontam, ainda, ofensa ao art. 275, 1 e II, do


Código Eleitoral, sob o argumento de que o Tribunal a quo não se desincumbiu
do ônus de se manifestar acerca de todas as questões suscitadas nos
embargos de declaração, notadamente a respeito de como foi possível concluir
pela inexistência de fraude, para fins de cabimento da ação de impugnação de
mandato eletivo.

Alegam que a Corte Regional Eleitoral ignorou circunstancias


relevantes para o deslinde da causa, tais como a existência de vício de
consentimento na formalização do requerimento de registro de candidatura, a
apresentação de registro de candidatura de filiada analfabeta e a votação
inexpressiva de outras duas candidatas, apenas registradas com objetivo de
preencher os percentuais de gênero.

Porém, observo que o Tribunal de origem assentou que o


conceito de fraude, para os fins de cabimento da ação de impugnação de
mandato eletivo, é restrito a atos tendentes a afetar a vontade do eleitor, o que
não seria o caso do eventual descumprimento do percentual de gênero
previsto no art. 10, § 30, da Lei n° 9.504/97.

A manifestação do Tribunal a quo se limitou ao cabimento da


ação, de acordo com os parâmetros considerados acertados para a
interpretação mais estrita do vocábulo "fraude", o qual não abarcaria os ilícitos
narrados na petição inicial.

Em outros termos, o TRE/Pl não assentou a inexistência de


fraude, apenas reafirmou que os fatos narrados na inicial não poderiam ser
apurados em sede de ação de impugnação de mandato eletivo. Por essa razão
é que se revelou prescindível a análise da questão sob a perspectiva
propug nada pelos recorrentes.
REspe no 1-49.2013.6.18.0024/PI 12

Assim, se a matéria foi apreciada, ainda que contrariamente às


teses suscitadas pela parte, não há falar em nulidade do acórdão com
fundamento na alegada violação ao art. 275 do Código Eleitoral.

Ressalto que, conforme o entendimento consolidado deste


Tribunal Superior, "a omissão apta a ser suprida pelos declaratórios é aquela
advinda do próprio julgamento e prejudicial à compreensão da causa, não
aquela deduzida com o fito de provocar o rejulgamento da demanda ou
modificar o entendimento manifestado pelo julgador" (ED-AgR-Al n° 10.804,
reI. Mm. Marcelo Ribeiro, DJede 1. 2.2011).

Ademais, de acordo com posição sedimentada no Superior


Tribunal de Justiça, "a omissão relevante para a nulidade do acórdão
embargado ocorre somente nas hipóteses em que o Tribunal se nega a
enfrentar questão jurídica relevante ao deslinde da controvérsia, ou quando
não entrega o provimento judicial pleiteado pela parte. Não constitui omissão
relevante a referente à questão de fato ou de direito, que foi solucionada
segundo a visão pessoal do julgador ou conforme pontos de vista legais
e doutrinários distintos dos apresentados pelo embargante" (ED-AgR-CC
n°111.614, rei. Min. NancyAndrighi, Segunda Seção, DJe 29.6.2011).

No mais, os recorrentes alegam que a interpretação restritiva


do vocábulo fraude, na forma em que constou do acórdão recorrido, viola o
art. 14, § 10, da Constituição Federal, na medida em que retira o único
instrumento processual cabível para defender a lisura do pleito na espécie.

Sustentam que a interpretação a respeito do cabimento da


AIME fundada em alegação de fraude deve ser orientada pelos valores
constantes do § 90 do referido dispositivo constitucional, sob pena de se
incentivar a impunidade que atua na formação fraudulenta de coligação que
disputou eleições proporcionais.

Quanto à matéria de fundo, registro que o caso em exame trata


da extinção, nos termos do art. 267 do Código de Processo Civil, de ação de
impugnação de mandato eletivo, na qual se narrou conduta supostamente
fraudulenta, atribuída aos recorridos, de adulteração dos requerimentos de
registro de candidatura e falsificação de assinaturas de eleitoras.
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 13

Concluiu o Tribunal Regional Eleitoral do Piauí que a questão


controvertida não se enquadraria no conceito de fraude para fins do
ajuizamento da ação de impugnação de mandato eletivo, por não estar
relacionada diretamente ao processo de votação.

Tal entendimento está de acordo com a jurisprudência desta


Corte, no sentido de que a fraude a ser apurada em ação de impugnação de
mandato eletivo diz respeito ao processo de votação, nela não se inserindo
questões alusivas à inelegibilidade ou a outros vícios passíveis de atingir, de
forma fraudulenta, o processo eleitoral.

Destaco os seguintes julgados deste Tribunal a respeito do


tema:

Ação de impugnação de mandato eletivo. Art. 14, § 10, da


Constituição Federal. Decisão regional. Improcedência. Recurso
ordinário. Fraude. Conceito relativo ao processo de votação.
Precedentes da Casa. Abuso do poder econômico. Insuficiência.
Provas. Exigência. Potencialidade. Influência. Pleito.
Conforme iterativa jurisprudência da Casa, a fraude a ser apurada
em ação de impugnação de mandato eletivo diz respeito ao processo
de votação, nela não se inserindo eventual fraude na transferência
de domicílio eleitoral.
Para a configuração do abuso de poder, é necessário que o fato
tenha potencialidade para influenciar o resultado do pleito.
Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgR-RO n° 896, rei. Min. Caputo Bastos, DJ de 2.6.2006).

Ação de impugnação de mandato eletivo. Fraude. Inelegibilidade.


- Não é cabível a ação de impugnação de mandato eletivo para, a
pretexto de fraude, argüir questões relativas a inelegibilidade.
Agravo regimental não provido.
(AgR-REspe n° 1604-21, rei. Mm. Arnaldo Versiani, DJe
de 3.2.2012.)

No mesmo sentido, cito: AgR-RO n° 888, rei. Mm. Caputo


Bastos, DJ de 25.11.2005; AgR-REspe n° 24.806, rei. Mm. Luiz Carlos
Madeira, DJ de 5.8.2005; AI n° 4.661, rei. Mm. Fernando Neves,
DJ de 6.8.2004; eAl n°3.009, rei. Mm. Fernando Neves, DJ de 16.11.2001.

Não obstante a sólida jurisprudência supracitada, penso, com a


mais respeitosa vênia, que a controvérsia tratada nos presentes autos, atinente
REspe no 1-49.2013.6.18.0024/PI 14

à suposta adulteração de documento e falsificação de assinaturas para o


preenchimento de candidaturas do gênero feminino, merece outra solução.

Como é cediço, este Tribunal Superior no julgamento do


Recurso Contra Expedição de Diploma n° 8-84, relator Ministro Dias Toffoli,
assentou, por maioria, a inconstitucionalidade do inciso IV do art. 262 do
Código Eleitoral e conheceu desse recurso contra expedição de diploma como
ação de impugnação de mandato eletivo, declinando da competência para o
Tribunal Regional Eleitoral do Piauí.

Já naquela oportunidade, consignei que:

[..] na ação de impugnação de mandato eletivo, para mim, no


conceito fraude, inclui-se todo e qualquer tipo de abuso, corrupção,
abuso de poder político ou econômico, seja qual for. Penso que a
Constituição não quis limitá-la somente àquelas hipóteses. A
interpretação do artigo 10, a meu ver, deve passar também pelo
§ 90,
ou seja, normalidade e legitimidade das eleições.

Na mesma linha, ao votar no AgR-REspe n° 330-48, de minha


relatoria, registrei que:

[..] tenho entendimento pessoal de que o conceito de fraude


estampado na Constituição Federal deve ser interpretado de forma a
garantir a maior eficácia à norma, não se restringindo somente às
manobras que permitam manipular o voto do eleitor no momento do
pleito.
A fraude cometida no curso da campanha ele itoral pelo candidato ou
partido político, compreendendo-se nesse conceito a obtenção de
resultado proibido por lei mediante ações que aparentemente lícitas,
no meu entender, também matéria que pode ser examinada no bojo
da ação de impugnação de mandato eletivo.

Penso que o termo fraude, estampado no art. 14, § 10, da


Constituição Federal, encerra conceito aberto, a englobar todas as situações
de fraude - inclusive a de fraude à lei - que possam afetar a normalidade das
eleições e a legitimidade do mandato obtido.

Nessa linha, reporto-me ao seguinte trecho do voto do


eminente Ministro Ayres Britto, relator do REspe n° 28.040, cujo acórdão foi
publicado no DJ em 11.7.2008, no qual Sua Excelência assentou:
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 15

Explico. Por todo o conjunto normativo em que versou o tema


fundamental dos "Direitos Políticos" (arts. 14, 15 e 16), a
Constituição fez perpassar a mais clara preocupação com a tutela da
soberania do eleitor, da autenticidade do regime representativo e da
lisura do processo eleitoral. Por isso que chegou a iniciar formulação
regratória do instituto da inelegibilidade, sem deixar de requestar o
aporte de lei complementar federal para o explícito fim de proteger "a
probidade administrativa" e "a moralidade para o exercício do
mandato, considerada a vida pregressa do candidato (..)". Ainda
mais, lei complementar de finalidade já antecipada e consistente na
proteção da "normalidade" e da "legitimidade das eleições contra "a
influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função,
cargo ou emprego na administração direta ou indireta" (§ 90 do
art. 14). Sendo certo que essa parte final é sinônima perfeita de
abuso de poder político.
Sucede que, ao abrir o parágrafo subsequente (o de n. 10) para
nele positivar os pressupostos da ação de impugnação de mandato
eletivo, a Magna Carta Federal tornou a mencionar, literalmente, o
"abuso do poder econômico" Não o fazendo, porém, quanto ao
abuso do poder político. Em lugar de/e, usou dos substantivos
"corrupção" e "fraude", de maneira a suscitar a seguinte e natural
pergunta: qual a razão dessa falta de explicitude quanto ao abuso no
exercício de função, cargo ou emprego públicos (abuso de poder
político, então)?
Bem, a explicação não me parece difícil. É que, para melhor
cumprir os seus eminentes fins tutelares, a Constituição preferiu falar
de corrupção naquele sentido coloquial (não tecnicamente penal) de
"conspurca ção", "degeneração", "putrefação", "degradação",
"depravação", enfim. No caso, conspurca ção ou degeneração ou
putrefação ou degradação ou depravação do processo eleitoral em
si, com seus perniciosos e concretos efeitos de cunho
ético-isonômico-democráticos. Atenta a nossa Lei Fundamental para
o mais abran gente raio de alcance material do termo "corrupção", se
comparado com o abuso do poder político; pois se toda corrupção do
detentor do mandato eletivo, agindo ele nessa qualidade, não deixa
de ser um abuso do poder político, a recíproca não é verdadeira.
Basta lembrar, por hipótese, o cometimento de autoritarismo ou
truculência, que, sendo um nítido abuso do poder político, nem por
isso implica ato de corrupção. A o menos para fins eleitorais.
Daqui se infere que o propósito da Lei Republicana, ao sacar do
substantivo "corrupção", não foi excluir o abuso no exercício de
função, cargo ou emprego públicos enquanto pressuposto do manejo
da AIME. Bem ao contrário, o intento da Lei Maior foi detectar do
modo mais eficaz possível a abusividade de tal exercício para fins
eleitorais. Alargando, então, e nunca estreitando, as possibilidades
de uso da única ação eleitoral de expressa nominação constitucional.
Em síntese, a palavra "corrupção", tanto quanto o vocábulo
"fraude", ambos estão ali no parágrafo 10 do art. 14 da Magna
Carta sob o deliberado intuito de se fazer de uma acepção
prosaica um lídimo instituto de Direito Constitucional-eleitoral.
Não propriamente de Direito Constitucional-penal, renove-se o juízo.
Com o que se afasta o paradoxo de supor que a Constituição-cidadã
REspe no 1-49.2013.6.18.0024/PI 16

incorreu no lapsus mentis de não considerar o abuso do poder


político - logo ele - como pressuposto de ajuizamento da A/ME
[grifou-se].

Realmente, o cabimento da ação de impugnação de mandato


eletivo deve ser admitido como instrumento processual de salvaguarda da
legitimidade e da normalidade das eleições contra toda sorte de abuso,
corrupção ou fraude, não cabendo impor limitações ao texto constitucional que
não estejam previstas na própria Constituição Federal.

Nessa linha, cumpre destacar que essa compreensão do


conceito de fraude para efeito do cabimento da ação de impugnação de
mandato eletivo não encerra, em si, interpretação extensiva, mas o mero
reconhecimento de que onde o constituinte não distinguiu, não cabe ao
legislador ordinário ou ao intérprete distinguir para efeito de reduzir o alcance
do comando constitucional.

Ademais, a interpretação do dispositivo constitucional também


deve considerar a existência das demais regras e princípios contidos no corpo
da Constituição, de forma a permitir a harmonização das hipóteses de
cabimento da AIME com os fins lídimos de eleições que reflitam a vontade
popular, livres de quaisquer influências ilegítimas, tal como consta do § 90 do
art. 14 da Constituição Federal, autêntico vetor interpretativo no que toca às
ações eleitorais.

Nesse aspecto, as alegações de fraude à lei, nas quais se


aponta que determinada regra foi atendida a partir de suposto engodo
praticado pela agremiação política, não podem ter a sua análise extirpada do
âmbito da ação de impugnação de mandato eletivo.

Recorde-se, por oportuno, a clássica lição de Pontes de


Miranda, no sentido de que "a fraude à lei consiste, portanto, em se praticar o
ato de tal maneira que eventualmente possa ser aplicada outra regra jurídica e
deixar de ser aplicada a regra jurídica fraudada. Aquela não incidiu, porque
incidiu essa; a fraude à lei põe diante do juiz o suporte fá fico, de modo tal que
pode o juiz errar. A fraude à lei é infração à lei, confiando o infrator em que o
juiz erre. 0 juiz aplica a sanção, por ser seu dever de respeitar a incidência da
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 17

lei (=de não errar)" (Tratado de Direito Privado, Ed. Bookseller, ia ed., 1999,
vol. 1, pág.98).

Do mesmo modo, o respeitado doutrinador lembra que na


fraude à lei "usa-se irregularmente a autonomia privada", enquanto no abuso
de direito "exerce-se, irregularmente, o direito" (ob. cit. pág. 96).

Nessa linha, José Jairo Gomes argumenta que "haverá abuso


sempre que, em um contexto amplo, o poder - não importa a sua natureza -
for manejado com vistas à concretização de ações irrazoáveis, anormais,
inusitadas ou mesmo injustificáveis diante das circunstâncias que se
apresentarem e, sobretudo, ante os princípios agasalhados no ordenamento
jurídico. Por conta do abuso, ultrapassa-se o padrão normal de
comportamento, realizando-se condutas que não guardam relação lógica com
o que normalmente ocorreria ou se esperaria que ocorresse. A análise da
razoabilidade da conduta e a ponderação de seus motivos e finalidades
oferecem importantes vetores para a apreciação e o julgamento do evento"
(Direito Eleitoral, 2008, Ed. DeI Rey, pág. 233).

No presente feito - em que se discute suposta adulteração do


conteúdo dos requerimentos de registro de candidatura, inclusive por meio da
suposta falsificação de assinaturas de eleitoras, conduta em tese subsumível
ao tipo descrito no art. 350 do Código Eleitoral -, tenho que a interpretação da
expressão "fraude" deve considerar tal circunstância, bem como o comando
constitucional de eleições hígidas (art. 14, §§ 90 e 10, da Constituição Federal)
e os meios processuais disponíveis no ordenamento jurídico para a garantia de
tal desiderato.

Nesse ponto, é importante destacar que a hipótese dos autos


não contempla mera aferição da observância ou não dos percentuais de
gênero das candidaturas previstas na legislação eleitoral, o que é, em si,
matéria a ser aferida no momento da impugnação ou da análise do
Demonstrativo de Regularidade dos Atos Partidários - DRAP, conforme é
pacífico na jurisprudência deste Tribunal.

O que se narra na presente ação - cuja veracidade deve ser


oportunamente verificada - é a existência de candidaturas fictícias lançadas
REspe no 1-49.2013.6.18.00241P1 18

apenas para atender os patamares exigidos pela legislação eleitoral. A análise


de tais questões - inclusive no que tange ao eventual oferecimento de valores
e vantagens para que as candidatas renunciassem - é matéria que,
evidentemente, não pode ser aferida, nem mesmo apontada no início do
processo de registro de candidaturas, pois os fatos que apontariam para a
caracterização da alegada fraude teriam ocorrido também em período posterior
ao do registro das candidatas.

Assim, por certo não se pode exigir que os temas que


envolvem ações ou omissões praticadas ou incorridas no curso da campanha
eleitoral sejam objeto de impugnação ao pedido de registro de candidatura ou
ao DRAP.

Por outro lado, não há como impedir que tais temas sejam
levados ao conhecimento e julgamento pela Justiça Eleitoral, com a
observância do devido processo legal e das garantias da defesa, sob pena de
manifesta contrariedade ao direito de ação e à inafastabilidade da jurisdição,
insculpida no inciso XXXV do art. 50 da Constituição Federal.

Por fim, há que se recordar a lição de Miguel Reale no sentido


de que as normas valem em razão da realidade de que participam, adquirindo
novos sentidos ou significados, mesmo quando mantidas inalteradas em suas
estruturas formais1.

As antigas fraudes eleitorais estão sendo substancialmente


eliminadas pela adoção dos mecanismos de votação e cadastramento
eletrônico, sendo detectadas, porém, novas formas de se obter fins ilícitos por
meio de processos legítimos ou por meio da prática de atos puramente
fraudulentos.

Desse modo, a interpretação a ser dada ao vocábulo


constitucional não pode prescindir a necessidade de seu conceito se adequar
aos fatos da vida, de modo a garantir a própria forma normativa da
Constituição.

1
Reale, Miguel; Filosofia do Direito, 1982, p. 594
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 19

Afinal, como adverte a doutrina, o intérprete deve levar em


conta, especialmente quando dedicado ao estudo das normas constitucionais,
não apenas o texto em si, mas as circunstâncias, os dados da realidade, as
peculiaridades do caso posto em julgamento.

Somente a partir de tais condicionantes, dessa operação de ir


e vir entre texto e realidade, é que se desvela o verdadeiro sentido da norma.
Em suma, é impossível cindir radicalmente os planos fático e jurídico,
pretendendo que o texto revele um sentido em si mesmo.

Tratando da força normativa da Constituição e da necessidade


de se interpretar a partir de certo contexto fático, preconiza Hesse:

[..],a interpretação tem significado decisivo para a consolidação e


preseivação da força normativa da Constituição. A interpretação
constitucional está submetida ao princípio da ótima concretização da
norma (Gebot optimaler Verwirklichung der Norm). Evidentemente,
esse princípio não pode ser aplicado com base nos meios fornecidos
pela subsunção lógica e pela construção conceitual. Se o direito e,
sobretudo, a Constituição, têm a sua eficácia condicionada
pelos fatos concretos da vida, não se afigura possível que a
interpretação faça deles tabula rasa. Ele há de contemplar essas
condicionantes, correlacionando-as com as proposições normativas
da Constituição. A interpretação adequada é aquela que
consegue concretizar, de forma excelente, o sentido (Sinn) da
proposição normativa dentro das condições reais dominantes
numa determinada situação2 (grifou-se).

Assim, no presente caso, os fatos apontados pelos recorrentes


não podem ser considerados, a priori, como insuficientes para configurar
hipótese de cabimento da ação de impugnação de mandato eletivo.

Essa conclusão, por óbvio, não implica juízo sobre o mérito


acerca da alegada falsidade documental, que deve inclusive ser livremente
aquilatada a partir da influência que a conduta - se considerada como
comprovada - teve sobre o resultado do pleito.

Em outras palavras, não cabe neste instante nenhuma


consideração sobre o mérito da demanda, sob pena, inclusive, de supressão

2
HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Editora Sérgio Antonio
Fabris: Porto Alegre, 1991, p. 22.
t\ -
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 20

de instância. Aqui, agora, cabe apenas viabilizar a respectiva apreciação pelo


juízo competente, de acordo com as premissas do devido processo legal.

De igual forma, não cabe neste momento decidir os temas


relativos à alegada corrupção, cuja matéria poderá vir a ser objeto de futura
análise.

Por essas razões, voto no sentido de dar provimento ao


recurso especial interposto pela Coligação Vitória que o Povo Quer e por
Arnaldo de Oliveira Abreu, determinando o retorno dos autos ao Tribunal
Regional Eleitoral do Piauí para, afastando o argumento de inviabilidade
da via eleita, permitir que a ação de impugnação de mandato eletivo siga
seu curso normal e legal.

ESCLARECIMENTO

A SENHORA MINISTRA LUCIANA LÓSSIO: Senhor


Presidente, eu destaco, apenas por curiosidade, que aquele outro processo
que eu pedi vista, também era do estado do Piauí.

O SENHOR MINISTRO HENRIQUE NEVES DA SILVA


(relator): É a mesma coisa, eles são irmãos.

A SENHORA MINISTRA LUCIANA LÓSSIO: É uma prática


reiterada que foi adotada nas eleições do estado do Piauí. Se não admitirmos
que a Justiça Eleitoral tenha conhecimento na Ação de Impugnação de
Mandato Eletivo, essa fraude não chegará à apreciação da Justiça, porque na
impugnação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP), tal
fraude ainda não é do conhecimento de ninguém, ou seja, esse tipo ardil ficará
impune.

O SENHOR MINISTRO HENRIQUE NEVES DA SILVA


(relator): Isso consta do meu voto, que dispõe o seguinte: se atendeu ou não o
percentual - ou seja, a conta numérica, se os 30% estão presentes ou não -,
isso é matéria para se decidir no DRAP, se o número de candidatos equivale
REspe n° 1-49.2013.6.18.0024/PI 21

ou não equivale. Mas depois que pedir o registro, se eventualmente


cometeram atos' ou existiram omissões que podem caracterizar fraude, isso é
matéria que pode ser tratada na Ação de Impugnação de Mandato Eletivo.

A SENHORA MINISTRA LUCIANA LÓSSIO: Daí a absoluta


necessidade de darmos uma interpretação mais ampla em relação ao conceito
de fraude.
REspe no 1-49.2013.6.18.0024/PI 22

EXTRATO DA ATA

REspe no 1-49.2013.6.1 8.0024/PI. Relator: Ministro Henrique


Neves da Silva. Recorrentes: Coligação Vitória Que O Povo Quer e outro
(Advogados: Edson Vieira Araújo e outros). Recorridos: Roberval Sinval de
Moura Carvalho e outros (Advogado: Edivaldo da Silva Cunha). Recorrido:
Antônio José da Silva. Recorrida: Celsa Maria Gomes da Silva. Recorrido:
Celson Bezerra de Carvalho. Recorrida: Cristiane Resende Pessoa. Recorrido:
Edson Pereira da Silva. Recorrido: Estevam Nunes Santiago. Recorrido: Gilmar
Oliveira Leite. Recorrido: João de Deus Moreira Lima. Recorrido: José
Francisco Alves dos Santos. Recorrido: José Luz da Silva. Recorrido: José
Pereira dos Santos Sobrinho Filho. Recorrida: Maria Anita Craveiro da Rocha
Neta. Recorrido: Ricardo Alves dos Santos. Recorrido: Partido Social
Democrata Cristão (PSDC) - Municipal. Recorrido: Partido Republicano
Progressista (PRP) - Municipal. Recorrido: Partido Trabalhista Cristão (PTC) -
Municipal. Recorrido: Manoel Pereira das Neves.

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, deu provimento ao


recurso especial, determinando o retorno dos autos ao TRE do Piauí para,
afastando o argumento de inviabilidade da via eleita, permitir que a ação de
impugnação de mandato eletivo siga seu curso normal e legal, nos termos do
voto do relator.

Presidência do Ministro Dias Toifoli. Presentes as Ministras


Maria Thereza de Assis Moura e Luciana Lóssio, os Ministros Gilmar Mendes,
Luiz Fux, João Otávio de Noronha e Henrique Neves da Silva, e o
Vice-Procurador-Geral Eleitoral, Eugênio José Guilherme de Aragão.
Registrada a presença da Dra. Liliane Silva Souza, advogada dos recorrentes.

SESSÃO DE 4.8.2015.

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