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HISTÓRIA DO RN

* História do Rio Grande do Norte (Parte 1 de 5)

ÁGAPE ESTUDOS ACADÊMICOS


História do Rio Grande do Norte:
das Origens do Homem Americano à Síntese Histórica da Cidade do Natal

Compilação: Janildo da Silva Arante


12/7/2009

O Homem, quando chegou ao continente americano, já havia passado por uma longa evolução,
desde o aparecimento do Homo Erectus, que viveu há 1,7 milhões de anos até 200 mil anos atrás

HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE – Observação: Tópicos explorados no


concurso do CFO e CHO/PMRN:
HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE:
l) A Conquista Territorial Portuguesa e a Resistência Potiguar;
2) Nordeste Holandês: Economia Açucareira e Pecuária Norte-Riograndense;
3) Interiorização da Colonização Portuguesa e a Guerra dos Bárbaros:
4) Repercussões dos Movimentos Emancipatórios do Século XIX no Rio Grande do Norte;
5) Formação das Oligarquias: A agroindústria Açucareira e a Cotonicultura;
6) Participação do Rio Grande do Norte no Movimento Republicano;
7) A Revolução de 1930 e o Reordenamento da Política Oligárquica:
8) Demandas Sociais e a Intentona Comunista de 1935;
9) Segunda Guerra Mundial: Presença Norte-Americana e Repercussões Sócio-Culturais;
10) O Populismo e o Surgimento das"Novas Oligarquias";
11) Rio Grande do Norte Atual: Questões Políticas. Sociais e Econômicas.

O ALVORECER

Antes dos Europeus


Antes dos Europeus As Origens do Homem Americano
O Homem, quando chegou ao continente americano, já havia passado por uma longa
evolução, desde o aparecimento do Homo Erectus, que viveu há 1,7 milhões de anos até 200 mil

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anos atrás. Pertencia ao grupo do Homo Sapiens. Não há, até o presente momento, unanimidade
sobre a origem dos primeiros povos que colonizaram a América, mostrando ser assim um problema
complexo. Diversas teorias abordam a questão, sendo a mais aceita aquela que defende terem os
primeiros homens vindos da Ásia, através do Estreito de Bering, atingindo a América do N
orte durante a última Era Glacial. Um grande volume de águas retidas nas geleiras provocou o
abaixamento do nível das águas do mar, fazendo surgir uma ligação terrestre entre a Ásia e
América. Segundo a pesquisadora Betty J. Meggers, "a mais antiga ponte terrestre existiu entre
cerca de 50.000 e 40.000 anos atrás e foi usada por várias espécies de mamíferos do Velho Mundo
(...) Após um intervalo de submergência que durou uns 12.000 anos, a ponte reapareceu entre cerca
de 28.000 e 10.000 anos atrás". Nesse período, contudo, uma camada de gelo surgiu como
obstáculo à passagem humana durante alguns milhares de anos. Acontece que, como esclareceu
Meggers, "no decorrer de alguns milênios, antes que os segmentos de Leste e Oeste se fundissem e
um corredor se abrisse novamente a ponte terrestre foi transitável." Permitindo, assim, a caminhada
humana. Foi aproveitando essa oportunidade que os asiáticos teriam penetrado no continente
americano.

Existem provas de caráter antropológico, etnográfico e lingüístico a favor da teoria asiática,


mas Paul Rivet acreditou que essa não foi a única via de acesso do homem ao continente
americano. Essas provas se restringiram a uma região, a parte setentrional da América do Norte,
segundo Rivet. É justamente por essa razão que ele defende uma origem múltipla: os australianos
teriam invadido a região mais meridional da América do Sul. Para Rivet, portanto, uma das
influências étnicas que podem destacar-se na América é de origem australiana. Sua ação, por
discreta e limitada que tenha sido, loga impor-se pela antropologia, pela lingüística e pela
etnografia". Acredita ainda esse cientista que uma parte da América foi povoada pelos polinésios,
apresentado provas lingüísticas, culturais e tradicionais.
Paul Rivet é de opinião que o Atlântico funcionou como uma barreira intransponível para que
o homem chegasse até ao continente americano e que, "ao contrário, o litoral do ocidente da
América foi permeável a migrações múltiplas, em toda a sua extensão. O Pacífico não se tornou de
forma alguma um obstáculo. Foi, sim, um traço de união entre o mundo asiático, a Oceania e o
Novo Mundo".
A teoria da origem múltipla de Paul Rivet foi defendida por alguns, porém combatida pelos
seus adversários. A verdade é que, apesar do avanço nessa discussão, a questão ainda não foi
totalmente solucionada.
A controvérsia não atinge apenas a via de acesso, mas igualmente a época em que os
primeiros colonos povoaram a América. Para Betty Meggers, "as discordâncias surgem das

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informações esporádicas inconclusivas, da presença do homem do Novo Mundo entre 40.000 e
12.000 anos passados, datação que alguns autoridades aceitam e outras não."
O certo é que o "homem entrou no Novo Mundo enquanto estava ainda subsistindo à base de
plantas e animais selvagens", nas palavras da mesma autora. Esse homem, ao migrar para outras
regiões, caminhou a pé. Teria ocorrido, desse modo, várias migrações.
As primeiras comunidades agrícolas surgiram no México, na América Central, Equador e
Bolívia. Viviam em pequenos bandos. Eram caçadores e coletores. À medida em que avançavam
para o sul, segundo os que acreditam na origem única, asiática, as comunidades foram passando
por mudanças, com o objetivo de se adaptarem ao novo ambiente. Essas adaptações foram
importantes para o desenvolvimento dos diversos grupos.
A agricultura promoveu uma verdadeira revolução. Posteriormente, surgiram grandes
civilizações: Astecas, Maias e Incas.
Migração para as terras Brasileiras
Com relação à presença dos primeiros homens no Brasil, existe também uma grande
controvérsia. A ocupação de terras brasileiras pelo homem ocorreu entre 9.000 e 11.300 anos,
segundo alguns pesquisadores. Outros defendem uma data bem mais remota. Aos poucos é que o
quadro vai se delineando. Constataram-se, pelo menos, duas áreas de influência - a Bacia
Amazônica e outra compreendendo o Planalto Central do Brasil - que foram ocupadas através de
vagas sucessivas, até chegar ao Rio Grande do Norte" por um processo de migração que permitiu
culturas estabelecidas em determinadas áreas fossem substituídas por outras, no decorrer de
milênios e até séculos", de acordo com Tarcísio Medeiros.
Em síntese, o homem primitivo teria seguido o seguinte roteiro: Andes, Planalto do Brasil,
Nordeste e, finalmente, o Rio Grande do Norte.
O centro de dispersão dos tupis, segundo o mesmo autor, aconteceu no "istmo do Panamá.
Desse ponto, um ramo alcançou a foz do Amazonas; do outro rumou para o Nordeste brasileiro; e
um terceiro desceu o Tapajós, o Madeira e iniciou uma migração pelo Xingu acima".
Os Primitivos habitantes do RN
O Rio Grande do Norte foi habitado pelos animais da megafuna na era Cenozóica e, dos
estudos realizados sobre o assunto, é possível chegar a duas conclusões, como disse Tarcísio
Medeiros:
"a) A extinção dos grandes mamíferos processou-se mais recentemente do que se supõe em
partes dessa região."
"b) Que a presença do homem, em comum com esses animais da megafauna no mesmo
território, é mais antiga do que se considera habitualmente".
Exemplo dessa presença humana no Nordeste: Chá do Caboclo (Pernambuco).
Os primitivos habitantes eram formados pelos grupos de caçadores e coletores. Os homens
contemporâneos da megafauna deixaram vestígios que se encontram nos sítios Angicos e Mutamba
II. Diversos estudos arqueológicos foram feitos pelo Museu Câmara Cascudo, tendo à frente o
pesquisador A. F. G. Laroche que, com suas investigações, em Pernambuco e no Rio Grande do
Norte, forneceu importantes subsídios para a pré-história nordestina. Nássaro Souza Nasser e
Elizabeth Mafra Cabral analisaram as inscrições rupestres do Estado, publicando posteriormente
um estudo sobre o assunto. A arqueóloga Gabriela Martín, da Universidade Federal de

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Pernambuco, pesquisou intensamente as inscrições rupestres do Rio Grande do Norte, resultando
em estudos como o intitulado "Amor, Violência e Solidariedade no Testemunho da Arte Rupestre
Brasileira". Participou também do "Projeto Vila Flor", financiado pelo SPAN/Pró-Memória, cujo
objetivo era o "estudo arqueológico e levantamento da documentação histórica da Antiga Missão
Carmelita de Gramació". A mesma pesquisadora recentemente publicou um livro sobre a pré-
história do Nordeste.
Na fase Megalítica, os homens se tornaram sedentários. O pesquisador Nássaro Nasser
descobriu as "Tradições Cerâmicas", chamadas de Papeba e Curimataú. O professor Laroche, por
sua vez, encontrou vestígios de diversas culturas pré-históricas, sendo a mais antiga do sítio
"Mangueira", em Macaíba.
O professor Paulo Tadeu de Souza Albuquerque, coordenador do Laboratório de Arqueologia
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (Larq/UFRN), realizou uma série de pesquisas,
trazendo novas luzes sobre o longínquo passado potiguar. Participou de escavações realizadas na
Fortaleza dos Reis Magos e na antiga catedral, onde encontrou o túmulo de André de Albuquerque
Maranhão.
Alberto Pinheiro de Medeiros, coordenando investigações de alunos da UFRN, enveredou
por outras vertente sobre o tema pesquisado, chegando a sistematizar uma alternativa - descrita no
item sobre as inscrições rupestres, mostrado a seguir que poderia ser acrescida às conclusões já
apresentadas sobre os primeiros habitantes do Rio Grande do Norte.
Os Significados das Inscrições Rupestres
Os primeiros habitantes do Rio Grande do Norte deixaram nas rochas e nas paredes das
cavernas sinais incisos ou pintados. Em alguns sítios, existem apenas inscrições rupestres incisas
(Fazenda Umburana, região do Abernal, município de Serra Negra-RN) e em outros locais
encontram-se, no mesmo painel, inscrições incisas e pinturas (Fazenda Soledade, Apodi-RN).
Na atualidade é praticamente impossível saber quais foram os autores de tais legados. Mesmo
assim, diante desse contexto, ainda se pode tirar algumas conclusões. Em primeiro lugar, é
provável que tenham ocorrido dois estágios culturais. O mais primitivo estaria representado, pelos
desenhos incisos. O outro estágio, mais desenvolvido, estaria caracterizado pelas pinturas que
requeriam uma técnica mais complexa a elaboração de tintas. Para comprovar tal afirmação é
suficiente apontar como exemplo o sítio que existe na Fazenda Flores, no município de Apodi-RN),
onde os traços incisos eram feitos no chão e numa rocha, larga na base e que vai se estreitando à
medida que sobe. Na rocha também há pinturas representando pares de mãos. Outro detalhe: os
incisos estão quase apagados e grosseiramente desenhados. As mãos pintadas, porém, são muito
bem feitas e apresentam grande nitidez Esse sítio poderia ser o testemunho de uma evolução
cultural.
Outra questão que se discute - e esta é universal - seria o significado, ou seja, o que
representariam ser de fato as inscrições rupestres: arte, escrita ou símbolos religiosos.
Existe, em princípio, uma dificuldade: como interpretar o pensamento do homem primitivo
pelas pessoas que vivem no século XX? É possível ao homem contemporâneo penetrar na
mentalidade de um ser nascidos séculos e séculos atrás? Por essa razão torna-se necessário fazer
um esforço para recuar no tempo e se despir da cultura na qual o pesquisador nasceu e vive. Seria
isso possível?
Esse é um problema de difícil solução, que exige muita competência e humildade por parte
do pesquisador. Uma saída, provavelmente, é pesquisar os caracteres daqueles povos que tiveram
sua escrita decifrada. Estudar, por exemplo, os Astecas (México) que possuíam uma escrita
"pintada" e uma fonética. A escrita estava ligada aos sacerdotes, como na Suméria. O significado,

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no dizer de Córdova Ituburu, era determinado pela deformação de certas partes e das cores. Os
sacerdotes daquele povo lidavam com caracteres simbólicos secretos. O conteúdo religioso de
determinados símbolos não invadia a tese da escrita Richard E. Leakey estava certo quando disse
que "as amostras de ocre que parecem em diversos sítios da Europa de 200 mil anos ou mais de
idade, certamente, sugerem ornamentação ritual das pessoas e dos artefatos. Ritual e simbolismo
aludem francamente à competência lingüística".
Tudo leva a crer que as inscrições rupestres que existem no Rio Grande do Norte constituem
de fato uma escrita. Diferente, naturalmente, de que se usa na atualidade. Mas com certeza era um
instrumento de comunicação. Os autores das inscrições possivelmente desenhavam ou pintavam
para transmitir uma mensagem. O seu significado se perdeu no tempo, mas não pode ser
considerado arte, porque tais caracteres não eram produzidos para deleite espiritual, nem para
expressar o belo. A razão disso é muito simples: o homem primitivo, pelas dificuldades que
enfrentava para sobreviver, era prático e rude. Quando sentia fome procurava resolver de imediato
o seu problema. Não tinha condições de praticar uma atividade voltada para o embevecimento
espiritual. Havia sim, grande necessidade de se comunicar.
A reprodução de um objeto através de um desenho é uma tentativa de fazer referência a algo
que impressiona, de mostrar a outro ou a uma comunidade o valor daquele objeto. Traços em
formas de barras ou então círculos ou pontos podem significar elementos de contagem. Mas na
mente do homem primitivo poderiam também ter outra significação qualquer. Uma conclusão pode
ser considerada como certa: eles desenhavam ou pintavam para transmitir uma mensagem. E
naqueles tempos difíceis para a humanidade, a comunicação, certamente, era fundamental para a
sobrevivência de um grupo, de todo o gênero humano...
Etnias Mais Recentes e Áreas Ocupadas
O litoral norte-rio-grandense, na época da descoberta do Brasil, era habitado pelos tupis,
originários do Paraguai e do Paraná. Falavam o abanheenga que, segundo Varnhagen, era uma
língua aglutinativa, porém, com reflexões verbais. Receberam o nome local de potiguares.
Tarcísio Medeiros descreve o tipo físico dos potiguares: "tinham o porte mediano, acima de
1,65 cm, reforçados e bem feitos no físico, olhos pequenos, negros, encavados e erguidos,
amendoados (...), eram mais ou menos baços, claros. Pintavam o corpo com desenhos coloridos
(...), furavam os beiços".
Os tapuias, que moravam no interior, foram descritos da seguinte maneira, por Olavo de
Medeiros Filho: "as mulheres eram, indistintamente, pequenas e mais baixas de estatura que os
homens. Possuíam a mesma cor atrigueirada, sendo muito bonitas de cara, obedecendo cegamente
aos maridos em tudo que fosse razoável".
E, mais adiante, acrescenta: "os tapuias andavam inteiramente nus. Não usavam barbas e
depilavam sistematicamente todos os pêlos surgidos no corpo, inclusive as sobrancelhas (...) Os
tapuais pintavam hediondamente o corpo com tinta extraída do fruto de jenipapo, a fim de
adquirirem um aspecto terrível nos combates".
Tarcísio Medeiros apresenta a seguinte classificação da população nativa, formada por
diversas nações, na época da descoberta do Brasil:
Litoral: potiguares.
Serído: arius, cariris, panatis, curemas, pebas e caicós
Chapada do Apodi: paiacus, cariris, pajéus, pegos, moxoiós e canindés.
Zona Serrana: pacajus, panatis, icós e parins.
Os Europeus
Expansão Européia Pela Via Marítima

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A Europa, no final do século XV, se encontrava presa em seus limites, sentindo a necessidade
de se expandir. O comércio das especiais, monopolizado pelas cidades italianas e desenvolvidas do
Mediterrâneo, prejudicava o restante dos países do continente. A razão era muito simples: os
produtos eram vendidos por um preço muito alto. A necessidade de quebrar esse monopólio passou
a ser uma questão de sobrevivência para uma economia monetária, como narrou Rolando
Mausmier: "o numerário é totalmente insuficiente para as monarquias e para um comércio em
plena expansão". Era preciso, com urgência , encontrar ouro. Como diversas lendas colocassem
grandes tesouros na África e na Ásia, os europeus sonhavam em se apossar dessas fortunas. Era
preciso, também, acabar com os intermediários, e o país que realizasse tal feito obteria lucros
fabulosos.
Além da necessidade de conseguir ouro, a Europa se encontrava apertada entre o mar e seus
inimigos. Em 1453, com a tomada de Constantinopla pelos turcos, o caminho para o oriente se
fechava para os europeus. A situação ficava crítica. Havia uma solução apenas: atingir o Oriente
pela via marítima/
Portugal, por sua posição geográfica, se lançou ao mar mais cedo. Adquirindo experiência
nessas viagens, saía na frente em busca de um caminho marítimo para o Oriente. Seria a salvação
do império lusitano. Havia outro motivo: as condições eram precárias para as atividades agrícolas
em Portugal, razão pela qual a sua população tinha que tirar o alimento do mar. Pescando, os
lusitanos foram se afastando do litoral, atingindo a Terra Nova, rica em bacalhau, salmão etc. Aos
poucos, e como conseqüência dessas empreitadas, os portugueses foram aperfeiçoando os seus
navios. No século XV, as galeotas e as galés de dois mastros haviam sido ultrapassadas, surgindo as
barcas, barinés e as caravelas, que se imortalizaram durante as grandes descobertas.
A expansão marítima, organizada de maneira sistemática pelos lusos, começou com a
conquista de Ceuta, em 1415. Toda viagem através do Oceano Atlântico, naquela época, era uma
perigosa aventura, porque ninguém garantia o retorno. Após a conquista da Ceuta, os navegantes
passaram a receber estímulos, sobretudo do infante D. Henrique que, por essa razão, foi chamado
de "O Navegador". Acontece que a vida desse personagem foi envolvida por uma série de lendas.
Como resultado, a sua personalidade foi exaltada, até ao exagero, por alguns historiadores, quer
portugueses, quer brasileiros.
Pedro Calmon é um deles: "deu-se perdidamente às ciências, casto e austero (...) de
fulgurações de lenda, leitor insaciável, colecionador de tudo o que se escrevera sobre cosmografia e
navegação, transferiu para Vila de Terça Naval, junto de Sagres e do Cabo de São Vicente, o
séquito de matemáticos judeus, cartógrafos catalães, pilotos de várias origens, e outros que para
isto educava e com eles criou um seminário de estudos náuticos chamando-lhe, sem rigor verbal,
Escola de Sagres. Foi na verdade uma escola, mas de obstinado trabalho, em que era aluno e mestre
aquele príncipe letrado".
Tudo porém não passa de uma lenda. O infante D. Henrique não possuía um vasto sobre a
Escola de Sagres jamais existiu, seja qual for o sentido que se queira dar a ela. Nem como uma
escola no significado clássico da palavra, nem como um grupo de especialistas que discutissem
problemas náuticos. Os avanços técnicos ocorridos com os navios portugueses foram conseqüência
da experiência adquirida através de suas inúmeras viagens pelo Atlântico, o que, certamente, não
diminuiu o mérito daqueles viajantes e das conquistas feitas pelo império lusitano.
É preciso também deixar bem clara a causa principal da expansão marítima de Portugal. Para
justificar sua expansão, os portugueses alegaram a defesa do cristianismo. Tinham como divisa "A
propaganda da Igreja de Cristo e a conversão dos infiéis", dando a impressão de que se tratava de

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uma nova cruzada. Acontece que o objetivo era real outro bem diferente: a busca desesperada pelo
ouro.
A conquista da Ceuta demonstrou tal fato. O escritor Georg Friederici narrou com muito
realismo o ataque português contra Ceuta: "entregaram-se, de súbito, a tremenda chacina, não
respeitando a idade, nem sexo, não poupando mulheres nem crianças. Seguiram o saque e a
devastação vandálica: os assaltantes devassavam, remexiam e escavavam. Depredavam os
magníficos prédios preciosos e jóias. Os lusitanos semi-bárbaros arrebentavam as jóias das
mulheres e das moças, arrancado-lhes e cortando-lhes as orelhas e os dedos".
A finalidade da expansão européia era, tão somente, a busca de riquezas. E mais: durante o
processo de colonização no continente americano, portugueses, espanhóis, franceses, holandeses e
ingleses se igualaram no vandalismo. Contrariando, assim, os princípios cristãos que diziam
defender... A evangelização dos gentios se resumia apenas ao trabalho dos missionários. Os
colonos, contudo, procuravam explorar os nativos, realizando às vezes, verdadeiros massacres.
Frei Bartolomeu de Las Casas, considerado o "Apóstolo dos Índios", denunciou as crueldades
dos espanhóis durante a conquista: "faziam apostas sobre quem, de um só golpe de espada, fenderia
um homem pela metade, ou quem, mas habilmente e mais destramente, de um só golpe lhe cortaria
a cabeça, ou ainda sobre quem abriria melhor as entranhas de um só golpe".
Cristóvão Colombo Descobre a América
Antes da unificação da Espanha, o Reino de Aragão, desde o século XII, estava voltado para
o Mediterrâneo: "Mesmo após a criação do Estado Nacional, a coroa espanhola seguiu dupla
orientação: européia e mediterrânea, segundo interesses aragoneses, americana e atlântica,
atendendo às aspirações castelhanas", como registra o livro "História das Sociedades - das
sociedades modernas às sociedades atuais", de Rubim Santos de Aquino e outros autores. Mais
tarde, quando se criou o Estado Nacional, com a expulsão dos muçulmanos, a Espanha não se
preocupou em navegar pelo Ocidente para atingir o Oriente.
Essa política tinha uma série resistência. O seu grande defensor era um estrangeiro, filho de
Gênova, chamado Cristóvão Colombo. E a viagem só se efetivou graças ao apoio de dois grupos
poderosos: o católico, liderado por Luís de Santangel. Colombo, na realidade, não pensava em
descobrir um continente e no entanto foi o que aconteceu. A partir desse momento (1492), a
Espanha teve que valorizar uma política Atlântica, principalmente após as descobertas de minas de
prata e de ouro no continente americano.
As conseqüências do descobrimento ultrapassaram os limites das fronteiras do império
hispânico e se tornaram universais: "a Europa também se transforma graças, sobretudo, ao ouro e à
prata, vindos do novo continente. A exploração das colônias, na América, promove a formação de
grandes riquezas, cujo capital foi aplicado na indústria. Surge, assim, o regime capitalista", como
comentou Alberto Pinheiro de Medeiros, no trabalho "A descoberta da América e as Mudanças",
publicado no seminário "Dois Pontos", em outubro de 1992.
Ambições Ibéricas e a Descoberta do Brasil
As ambições expansionistas da Espanha e Portugal entravam em conflito. Portugal consegue,
com D. João (1418) do Papa Martinho V. a bula Sane Charissimus. Seguem outras bulas: Eti
Suscepti (1442), Romanus Pontifex (1454), Inter Coetera (1456).
Após a descoberta da América por Cristóvão Colombo, a Espanha entra na briga, procurando
obter benefícios da Igreja, graças ao prestígio que desfrutava na Cúria Romana. As bulas iam
saindo, refletindo a maior ou menor influência de uma das duas potências ibéricas, em dado
momento provocando, inclusive, o protesto do teólogo Francisco Vitória.

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Finalmente, Espanha e Portugal chegaram a um acordo. Com o Tratado de Tordesilhas (7 de
junho de 1494), o mundo ficaria dividido entre as duas potências ibéricas.
Descoberto o caminho marítimo para as Índias por Vasco da Gama, D. Manuel prepara uma
grande esquadra que parte rumo ao Oriente. O comando da armada é entregue à Pedro Álvares
Cabral, alcaidemor de Asurara que, segundo Pedro Calmon, "pertencia à melhor gente da beija,
cujo grande feito foi, justamente, a descoberta do Brasil".
Como diz ainda o mesmo autor, a armada "ia defrontar o ignoto, nas paragens do Índico: a
paz ou a guerra. Devia ser forte. Foi preparada com magnificência: não mais para descobrir \, como
a de Vasco da Gama, mas para aliciar ou intimidar o "samorin" de Calecute, nos Estados
opulentos".
Participavam da armada nomes ilustres: Nicolau Coelho, Sancho de Tovar, Péro Escobar,
Pedro de Ataíde, Vasco de Ataíde, o bacharel mestre João etc.
No dia 9 de março de 1500, após missa solene no dia anterior, Cabral e seus companheiros
iniciavam a viagem. Roteiro: ilhas Canárias, São Nicolau. No dia 23, a nau de Vasco de Ataíde
desapareceu. No mês seguinte, no dia 22, os expedicionários avistam um monte que recebeu o
nome de Monte Pascoal.
Nicolau Coelho manteve os primeiros contatos com os nativos. Fotam celebradas duas
missas, ambas por Henrique Coimbra. A primeira, num domingo, dia 26 de abril de 1500, e a
segunda, no dia 1º de maio.
No dia seguinte, a esquadra partia rumo ao Oriente. Estava, oficialmente, descoberto o Brasil.
O acontecimento foi narrado de maneira brilhante na carta de Pero Vaz de Caminha.
A Carta de Pero Vaz de Caminha
A carta de Pero Vaz de Caminha narrando a descoberta do Brasil, já muito estudada, foi
reproduzida na íntegra em alguns livros de História do Brasil. A quase totalidade desses estudos se
caracteriza pela erudição. A Dominus lançou uma edição pioneira para o grande público, sem se
perder em vulgaridade, contando com uma introdução que é um pequeno estudo sobre aquele
documento, escrito por Leonardo Araújo.
A carta foi redigida por uma testemunha ocular do fato, mais do que isso, um eminente
humanista. Não é apenas um relatório narrando as peripécias dos navegantes lusitanos numa
viagem marítima. Fornece subsídios para uma melhor compreensão daquele acontecimento.
A descrição, pela primeira vez, da terra descoberta é, talvez, a parte do texto mais conhecida:
"as saber, primeiramente, de um grande monte, muito alto e redondo: e de outras serras mais ao sul
dele, e de terra chã, com grandes arvoredos; ao qual monte alto o capitão pôs o nome de o Monte
Pascoal e à terra a Terra de Vera Cruz!
Grande observador, descreve os homens da terra com riqueza de detalhes: "A feição deles é
serem pardos, um tanto avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem
coberta alguma (...) Ambos traziam o beiço de baixo furado e metido nele um osso verdadeiro, de
comprimento de uma mão, e da grossura de um fuso de algodão, agudo na ponta como furador (...).
Os cabelos são corredios".
Narra também o contato de homens que possuíam culturas diferentes e que nativos e
portugueses procuravam se entender através de festos, na falta de conhecimento do idioma do
interlocutor. Surgindo, naturalmente, alguns desentendidos: "acenava para a terra e novamente para
as contas e para o colar do capitão (que era de ouro) como se dariam por aquilo".
"Isto tomávamos nós nesse sentido, por assim o desejamos! Mas se ele queria dizer que
levaria as contas e mais o colar, isto não queríamos nós entender, porque lhe havíamos de dar!" E
mais adiante: "Ali por não houve fala ou entendimento com eles, por a barbaria deles ser tamanha

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que se não entenderia nem ouvia ninguém". Lança, portanto, a culpa do não entendimento na
barbaria em que se encontravam os nativos. Essa observação não passam de uma prova a mais do
etnocentrismo europeu. Os brancos eram os "civilizados", os seres superiores; e os donos da terra,
ao contrário, pobres coitados ...
Mas não se pode dizer que o referido documento seja a primeira página da História do Brasil
por uma razão muito simples: a História do Brasil começa quando chegaram nesta terra os
primeiros homens, numa época bem anterior à vinda dos europeus.
A carta de Pero Vaz de Caminha é, no entanto, um relato longo, minucioso, com dados
importantes, fornecendo subsídios não somente para a História do Brasil, mas ao mesmo tempo
para outras ciências, como, por exemplo, a antropologia.
Com ela se encerra a fase pré-histórica do País, começando um novo período: o da história
escrita, entrando a terra descoberta para o clube do mundo dos "civilizados" ... E os portugueses,
certamente, não estavam sozinhos. Portugal teria que enfrentar uma grande concorrência e teve que
lutar muito para ficar de posse definitiva do Brasil.
Tese Ousada: Cabral no Litoral Potiguar
Lenine Pinto, pesquisador norte-rio-grandense, afirma que a expedição de Pedro Álvares
Cabral, que descobriu o Brasil, ao contrário do que se tem dito até hoje, teria pela primeira vez
atingido o Brasil provavelmente na praia de Touros, em abril de 1500.
Klécius Henrique, repórter da TRIBUNA DO NORTE que entrevistou o escritor, escreveu o
seguinte: "Lenine Pinto argumenta que Cabral em sua viagem rumo à Índia teria seguido a volta do
mar numa manobra a partir do Cabo Verde, a oeste, coroneando a corrente subequatorial do
Atlântico que se bifurcava no Cabo de São Roque, numa aproximação dramática do litoral
potiguar, onde teria aportado em 22 de abril de 1500".
Lenine Pinto desenvolveu, entre outros, o seguinte argumento: "João da Nova, em 1501,
quando saiu à procura de Cabral, de Cabo Verde, levou trinta dias para chegar ao cabo de São
Roque. Como Cabral, no mesmo tempo, chegaria ao sul da Bahia?
"A duração da viagem de Cabral, Portugal-Brasil, é muito importante. É preciso, portanto,
saber o tempo que se gastaria para realizar a viagem Portugal-Touros e a viagem Portugal-sul da
Bahia, naquela época.
Lenine diz ainda o seguinte: "Há muitos locais no RN semelhantes aos narrados por Caminha
na carta ao rei D. Manuel". Acontece que fica difícil acreditar que os historiadores não tenham
percebido antes o erro, afirmando que o lugar atingido por Cabral foi o sul da Bahia. A distância é
muito grande. Como explicar tal equívoco?
A tese foi lançada. A dúvida poderá ser dissipada quando Lenine Pinto publicar o seu livro
"Reinvenção do Descobrimento do Brasil".

O Início da colonização
Prioridade Européia
Controvérsias Sobre a Presença Espanhola

A prioridade da descoberta do Brasil continua sendo uma questão polêmica. Para alguns
estudiosos, os espanhóis chegaram primeiro. Varnhagen, por exemplo, defende que Alonso de
Ojeda teria atingido o delta do Açu no Rio Grande do Norte. Outros autores concordam que o
navegador espanhol visitou o Brasil, divergindo apenas do local. "Vinguand discorda e aponta

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como sendo o local correto as proximidades do Cabo de São Roque". Capistrano de Abreu e outros
autores negam que Ojeda tivesse passado pelo Brasil.
A viagem de outro navegante espanhol também é alvo de discussões. Parece que Vicente
Yañez Pinzon teria realmente vindo ao Brasil. Robert Southey chegou a afirmar o seguinte. "A
primeira pessoa que descobriu a costas do Brasil foi Vicente Yañez Pinzon".
Segundo os cronistas, no dia 26 de janeiro de 1500, Pinzon chegou a um lugar que
denominou de Santa Maria de la Consolación. A controvérsia que existe é sobre onde ficaria essa
Santa Maria de La Consolación. Para uns, seria o cabo de Santo Agostinho. Varnhagen indica a
Ponta de Mucuripe. Guanino Alves, que pesquisou a viagem de Vicente Pinzon, discorda e indica a
ponta de Itapajé, no litoral norte do Ceará, como o local certo. O fato é que o navegante hispânico
tomou posse da terra em nome da Espanha. E deu à região visitada o nome de Rostro Hermoso.
Depois, Pinzon se dirigiu para o Norte, chegando até a foz do rio Amazonas, que denominou de
Santa Maria de la Mar Dulce.
Outro navegador espanhol que provavelmente passou pelo Rio Grande do Norte foi Diego de
Lepe e, segundo alguns pesquisadores, teria atingido a enseada do Açu.
Apesar das controvérsias, não se pode negar que os espanhóis antecederam aos portugueses
na descoberta do Brasil, considerando que estiveram no País antes de abril de 1500.
Os Franceses no Rio Grande do Norte
Quando os franceses foram expulsos do Sul do País seguiram rumo ao Norte, mantendo um
ativo comércio com os nativos. Não conseguiram no entanto instalar uma colônia. Chegaram a
contar com um intérprete: "Um castelhano tornado potiguar, beiço furado, tatuado, pintado de
jenipapo e urucu, falando o nheengatu em serviço dos franceses com os quais se foi embora",
narrou Câmara Cascudo. A base deles era o Rio Grande do Norte.
Os franceses passaram a fazer investidas contra a Paraíba, com o apoio dos potiguares. O
ataque mais audacioso se realizou entre 15 a 18 de agosto de 1597. Portanto treze navios, o embate
se deu com a fortaleza de Santa Catarina de Cabedelo, sob o comando do aventureiro Jacques
Riffaul, que desembarcou trezentos e cinqüenta homens. E mais: "Vinte outras naus reforçaram a
investida, esperando a ordem no rio Potengi". Não foi um simples assalto de corsários, mas se
constituiu uma verdadeira batalha. A fortaleza foi defendida por apenas vinte soldados. A artilharia
contava com cinco peças. Os portugueses resistiram ao ataque, forçando os franceses a baterem em
retirada.
Vilma Monteiro analisa a importância dessa vitória: "Determina os novos rumos da conquista
da região Norte. Permite a posse efetiva da Capitania do Rio Grande, seu povoamento e
colonização, com isso abrindo as portas para a expansão civilizadora sobre novos territórios".
Os franceses, diante desse quadro, ameaçavam a Paraíba; após a caída desta, a próxima
conquista seria Pernambuco ...
Foram eles que iniciaram o processo de miscigenação entre europeus e americanos na região.
Dois aventureiros se destacaram: Charles de Voux e Jacques Riffault. Ainda hoje um local guarda
no nome a lembrança de Riffault, no bairro do Alecrim em Natal, onde se ergueu a Base Naval
(Refoles).
A Era Lusitana e o Marco de Posse
A primeira expedição que alcançou terras potiguares foi a de 1501. Essa viagem, iniciada no
dia 10 de maio de 1501, se encontra envolvida em controvérsias. A começar sobre quem a teria
comandado. Alguns nomes são apresentados: D. Nuno Manoel, André Gonçalves, Fernando de
Noronha, Gonçalo Coelho e Gaspar de Lemos - o nome mais aceito. Quem participou também
dessa expedição foi Américo Vespúcio.

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Após sessenta e sete dias de viagem, foi alcançado o Rio Grande à altura do Cabo de São
Roque e, segundo Câmara Cascudo, ali foi plantado o marco de posse mais antigo do País,
registrando-se, na ocasião, contatos entre portugueses e potiguares.
O povo, por causa dos desenhos em forma de cruz no Marco de Posse, acreditou ser ele
milagroso, surgindo assim, um culto. Oswaldo Câmara de Souza disse o seguinte: "O culto popular
chegava às raias do fetichismo, havendo a crença absurda do que um chá preparado com
fragmentos da pedra tinha poderes milagrosos, trazendo alívio e cura às mazelas do corpo e do
espírito".
Nesse período, o governo lusitano, verificando que o litoral brasileiro estava sendo visitado
por corsários, entre eles aventureiros franceses, resolveu enviar expedições militares para defender
sua colônia. Foram as chamadas expedições guarda-costas, sendo consideradas as mais marcantes
aqueles que vieram sob o comando de Cristóvão Jacques, entre 1516 a 1519 e 1526 a 1528. Uma
iniciativa ingênua, considerando a imensa extensão do litoral. É o próprio Cristóvão Jacques que
sugere o início do povoamento como solução para resolver o problema. Eminentes portugueses
aprovaram e defenderam a idéia. D. João III, então envia uma expedição colonizadora chefiada por
Martim Afonso de Souza.
A base estava lançada e em 1532 fundava-se São Vicente, no Sudeste do País, o que era
muito pouco pois o Brasil possuía dimensões continentais. Cristóvão Jacques, entre outras coisas,
sugere que se aplicasse no Brasil um sistema que já vinha sendo feito nas ilhas do Atlântico: o das
Capitanias Hereditárias. Uma, na realidade, já havia sido criada em 1504 por D. Manuel, a de
Fernando de Noronha. D. João III adota oficialmente o sistema no Brasil, criando quatorze
capitanias no período compreendido entre 1934 e 1936. Entre elas, a de João de Barros, no futuro
Rio Grande, como lembra Câmara Cascudo, "começando da Baía da Traição (Acejutibiró, onde há
cajus azedos, segundo Teodoro Sampaio), limite norte da Donatária Itamaracá, pertencente a Pero
Lopes de Souza, até a extrema indefinida".
A capitania possuía cem léguas de extensão. Em 1535, João de Barros, Aires da Cunha e
Fernão Álvares prepararam a maior esquadra particular que havia saído do Tejo até aquele
momento:" Com cinco naus e cinco caravelas, novecentos homens e mais de cem cavalos". O
comando coube a Aires da Cunha. O governo investiu também nessa expedição: "D. João III
emprestara artilharia, munições e armas retiradas do próprio Arsenal Régio", informa Câmara
Cascudo. Por essa razão, muitos eram de opinião que Aires da Cunha pretendia, além de fundar
colônias no Norte do Brasil, atingir o Peru pelo interior... Formando mais uma controvérsia ...
Varnhagen fala de um conflito entre nativos e portugueses à altura do rio Ceará-Mirim,
Câmara Cascudo nega o incidente, afirmando que Varnhagen "arquitetou tal viagem". É taxativo:
"Aires da Cunha nunca esteve no Rio Grande do Norte". Passando pelo litoral potiguar, o
navegante seguiu viagem rumo ao Norte.
A expedição foi um fracasso total com a morte de Aires da Cunha. Os portugueses
conseguiram fundar, ao Norte, o povoado de Nazaré, onde permaneceram três anos. Morreram
setecentos homens. Os expedicionários partiram em busca de melhor sorte. Os resultados, porém,
foram péssimos. Alguns foram jogados nas Antilhas; outros atingiram Porto Rico. E um grupo
formado por São Domingos e João de Barros conseguiu reaver seus filhos que, quando
regressavam de Nazaré, numa tentativa infrutífera, procuravam colonizar o Rio Grande. Foi nessa
oportunidade que teria ocorrido o conflito entre potiguares e lusitanos, mencionado por Varnhagen.
Mesmo fracassando, essa foi, na opinião de Câmara Cascudo, "a primeira tentativa de colonização
no Rio Grande do Norte".
A fundação de Natal

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Disputa Acaba em União Peninsular
O cardeal D. Henrique assumiu o governo português em 1578. O prelado contava sessenta e
seis anos e, como não tinha filhos, criava um problema para a sucessão do trono português. No dia
31 de janeiro de 1580, o governante morreu.
Entre os diversos pretendentes ao trono, três netos de D. Manuel se apresentavam com
maiores possibilidades: D. Antônio, prior do Crato, D. Catarina e Felipe II, rei da Espanha
renunciou a favor de Felipe II. A disputa se reduziu entre D. Antônio, que era filho bastardo do
infante D. Luís, e o monarca espanhol, que era o mais poderoso pois contava com o apoio de
importantes figuras da nobreza e do clero lusitano. Os dois rivais partiram para a disputa armada.
D. Antônio enfrentou as tropas fiéis a Felipe II, chefiados pelo duque de Alba, sendo
posteriormente derrotado.
A crise abalou profundamente Portugal e no dia 28 de junho, como narra Jânio Quadros,
"iniciou-se a tomada de Portugal pelos duque de Alba, enquanto setenta e duas galés sob o
comando do marquês de Santa Cruz, acompanhadas de setenta naus, chalupas e caravelas,
encetavam as operações navais. As cidades, vilas, lugares e povoações caíram uma a uma em poder
dos invasores, a despeito, aqui e ali, dos esforços dos partidários de D. Antônio em contê-los".
D. Felipe não agiu somente pela força das armas, fez praticamente, tudo. Propostas
tentadoras aos membros da nobreza, além do apoio da Companhia de Jesus. Em síntese, ele
comprou o apoio recebido de seus adversários com ouro e também através de seu poderio militar.
Tudo isso porque Felipe II tinha grandes interesses na anexação de Portugal ao reino
espanhol: "O grande palco dos efeitos políticos espanhóis na era filipina havia sido, até aquela data,
o Mediterrâneo, seria através desta unificação que a Espanha passaria a tomar parte na grande era
atlântica inaugurada por Portugal", segundo a "História Geral da Civilização Brasileira", Vol. I. Por
outro lado, os portugueses já participavam das atividades comerciais espanholas. Era importante
para a Espanha a anexação do reino lusitano, justificando assim todo o empenho do monarca
hispânico. Não foi difícil ocupar Portugal. Venceu Felipe II e, em 1581, as cortes de Tomar
aclamaram-se rei de Portugal. Estava efetivada a "União Peninsular", que terminaria apenas no ano
de 1640.
Para o Brasil, esse período foi uma fase altamente positiva. Exemplo: a conquista do Norte e
Nordeste do País.
O Interesse de Filipe II Pelo Rio Grande
Os franceses se fixaram no litoral potiguar sem necessidade de dominar o nativo e,
justamente por essa razão, tiveram a população local como aliada. Escondiam suas naus no rio
Potengi e, de sua base, se lançavam contra os colonos portugueses que se encontravam na Paraíba.
O Rio Grande era, de fato, uma área estratégica. Da região, os franceses podiam se deslocar para o
norte e igualmente para o sul.
Filipe II, ao anexar Portugal e suas colônias, sentiu a situação de abandono em que estava
parte do Nordeste e todo o Norte do Brasil. E o que era pior: a constante ameaça que representava a
permanência dos franceses no Rio Grande. Tendo em vista essa situação, o monarca não perdeu
tempo. Através de duas Cartas Régis (9 - 11 - 1596 e 15 - 03 - 1597), determinou a expulsão do
inimigo e que fosse construída uma fortaleza e ainda, fundada uma cidade. Em síntese: conquistar o
Rio Grande, consolidando tal feito através da colonização. Por essa razão, um fato deve ficar bem
claro: a expulsão dos franceses do Rio Grande foi uma iniciativa de Filipe II, o que significa dizer,
hispânica.
A Expedição de Manuel Mascarenhas Homem

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A conquista do Rio Grande não se apresentava como sendo uma tarefa fácil. E foi por assim
compreender que D. Francisco de Souza, governador-geral do Brasil, determinou que o capitão-
mor de Pernambuco, Manuel Mascarenhas Homem, tomasse todas as providências para que se
organizasse uma grande expedição militar com o objetivo de que as ordens de Filipe II fosse
executadas. Assim foi feito. Uma poderosa expedição foi organizada. Desta, uma parte iria por mar
com uma esquadra formada por sete navios e cinco caravelões, sob o comando de Francisco de
Barros; e outra seguiria caminhando por terra, liderada por Feliciano Coelho, capitão-mor da
Paraíba.
Manuel Mascarenhas Homem assumiu o comando geral, agindo com o máximo de empenho
para que nada faltasse a fim de que os objetivos fossem alcançados: expulsar os franceses, construir
uma fortaleza e fundar uma cidade. Participaram da jornada um grupo de religiosos: os jesuítas
Gaspar de Samperes (autor da planta da futura fortaleza) e Francisco Lemos, e mais dois
franciscanos - Bernadino das Neves, que funcionava como intérprete, e João de São Miguel.
Narra Câmara Cascudo: "Feliciano Coelho partiu por terra com as quatro companhias
pernambucanas e uma paraibana capitaneada por Miguel Álvares Lobo, num total de 178 homens e
90 indígenas guerreiros de Pernambuco e 730 da Paraíba, com seus tuixauas prestigiosos e bravos:
Pedra Verde (Itaobi), Mangue, Cardo-Grande etc. a 17 de dezembro de 1597 o exército marchou.
Mascarenhas viera com as naus".
Acontece que as forças terrestres foram atingidas pela varíola, sendo obrigadas a retroceder,
com exceção de Jerônimo de Albuquerque que se uniu à expedição marítima. Havia uma
justificativa: Jerônimo desfrutava de grande prestígio entre os nativos.
A viagem pelo mar continuou e, no caminho, sete naus franceses fugiram para evitar um
confronto com a esquadra lusitana.
No dia 25 de dezembro, a frota luso-espanhola atingia o rio Potengi. No final do ano de 1997
esse fato completa exatos quatrocentos anos.
A primeira providência dos invasores foi fazer um entricheiramento com varas de mangue
para que pudessem se defender das investidas dos potiguares. Medida acertada, porque não
demorou muito os nativos atacaram com toda violência. Era a guerra que começava. Com o passar
dos dias, os luso-espanhóis começaram a perder terreno no conflito armado. A situação se agravou
a tal ponto que ficou crítica, como narrou Vicente Salvador: "Depois de continuar os assaltos que
puseram os nossos em tanto aperto que esacassamente podiam ir buscar água para beber a uns
poçozinhos que tinham perto da cerca".
O quadro era muito triste: mortos, feridos e doentes. O clima ficava, a cada momento, mais
insustentável. Foi quando, providencialmente, chegou Francisco Dias com reforço, evitando uma
humilhante derrota. Servindo para que os luso-espanhóis pudessem manter a posição onde se
encontravam. Não fosse a chegada de Feliciano Coelho, que partiu da Paraíba com mais soldados,
armas e municões, tudo estaria perdido. A situação, ainda assim, continuava delicada. Era preciso
negociar a paz com urgência.
A Imponente Fortaleza dos Reis Magos
A fortaleza de madeira não foi construída, como pensava Câmara Cascudo, em um "arrecife a
setecentos e cinqüenta metros da barra do Potengi". A razão é muito simples: naquele local, a
construção não suportaria o impacto das águas. O edifício, esclarece Hélio Galvão, foi erguido na
praia.
A planta da fortaleza, apesar de ser contestada por alguns autores, foi feita pelo padre Gaspar
de Samperes. Segundo a arquiteta Jeanne Fonseca Leite, "a concepção 'antropomorfa' dos italianos

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encontrou acolhida por parte do padre Samperes que a introduziu no seu projeto destinado à
construção da Fortaleza dos Reis Magos".
Fortaleza e não forte, Hélio Galvão esclarece a dúvida: "Forte é uma pequena edificação sem
guarda permanente. Fortaleza, ao contrário, é um grande edifício com um contingente de soldados
permanente. A fortaleza, localizada na barra do Potengi, se destaca pela sua beleza e pela sua
imponência. Não poderia ser de maneira alguma um forte'.
Para Hélio Galvão, que pesquisou exaustivamente sobre a Fortaleza, o nome correto seria
Fortaleza da Barra do Rio Grande. O problema não é tão simples. Naquela época se usava de
maneira indiferente mais de um nome para indicar um prédio público. Aquele edifício pode ser
chamado também de Fortaleza dos Reis Magos, o que não pode, certamente é designá-lo por "Forte
dos Reis Magos", que por sinal é a versão popular usada de maneira errada pelos cronistas
tradicionais.
Os trabalhos de construção da fortaleza começaram no dia 6 de janeiro de 1598. Hélio
Galvão explica o seguinte: "O trabalho se desenvolvia entre dificuldades e imprevistos, a ameaça
constante de índios e franceses, a atenção dos homens voltada para a vigilância do acampamento.
Diríamos que Mascarenhas Homem lançou a pedra fundamental e a partir daí ninguém parou. O
material foi chegando, as pedras que vinham de Lisboa lastrando os navios eram guardadas,
acumulava-se cal e os implementos imprescindíveis eram providenciados".
A primeira fortaleza, a de madeira, foi concluída no dia 24 de junho de 1598. E tinha, como
descreveu Câmara Cascudo, "a forma clássica do forte marítimo, afetando o modelo do polígono
estrelado".
Em 1614, o engenheiro-mor do Brasil, Francisco Frias de Mesquita, realizou trabalhos na
fortaleza, fazendo pequenas modificações sem alterar a planta original. A obra foi concluída
somente em 1628.
Paz Firmada e Posse Definitiva da Terra
A capitania se chamava, no início, do Rio Grande, passando a incluir "do Norte" quando
surgiu outra de igual nome, no Sul do País.
Não houve, no Rio Grande, uma conquista. A expedição de Manuel Mascarenhas Homem
estava praticamente derrotada. Os missionários saíram da fortaleza para se transformarem em
embaixadores da paz. Um passo significativo nesse sentido foi dado quando os nativos
conseguiram distinguir os militares e colonos dos sacerdotes. O padre Francisco Pinto foi, na
realidade, o grande e incansável apóstolo. Percorreu o sertão, enfrentou múltiplas vicissitudes. Nos
momentos mais difíceis conseguia reunir novas forças graças à sua fé, operando verdadeiros
milagres na obra de persuasão.
Primeiro, a catequese e, através dela, o padre Francisco Pinto e seus companheiros
missionários procuravam levar os silvícolas para o lado dos portugueses. O padre Pero Rodrigues,
numa carta, transcrita por Hélio Galvão, registra o trabalho árduo e difícil dos religiosos. Os padres
ajudavam ao exército com os acostumados exercícios da Companhia, que eram "a edificação de
todos, pregando, confessando, fazendo amizades e não se negando a nenhum trabalho, de dia e de
noite, como no acudir aos índios nossos amigos, que nos ajudavam na guerra, por adoecerem
gravemente de bexigas e, quando era possível, acudiam a curar e consolar na morte".
No processo de pacificação, os missionários não agiram sozinhos. Contaram com o apoio de
alguns chefes nativos: Mar Grande e Pau Seco, entre outros. Os líderes potiguares foram negociar a
paz com os brancos porque as suas mulheres exigiram o fim das hostilidades. Contribuíram
também com o processo de cristrianização de seus irmãos ao lado dos missionários.

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Não se pode esquecer, igualmente, o desempenho de Jerônimo de Albuquerque que foi de
suma importância. Filho de Jerônimo Santo Arco Verde (Ubirá - Ubi) que, por sua vez, era filha do
chefe nativo Arco Verde. Mestiço, possuía sangue tupi em sua veia; corajoso e hábil, falando o
idioma nativo, desfrutava de grande influência entre os habitantes de todo o Nordeste.
A paz era o anseio das duas facções em luta e as negociações obtiveram êxito. Terminadas as
hostilidades, Manuel Mascarenhas Homem partiu para a Bahia, com o objetivo de relatar os
acontecimentos ao governador, D. Francisco de Souza que, sem demora, determinou que fossem
solenemente celebradas as pazes. Isso aconteceu no dia 11 de junho de 1599, na Paraíba, na
presença de muitas autoridades - Mascarenhas Homem; Feliciano Coelho de Carvalho, ouvidor-
mor geral, e Brás de Almeida; de diversos chefes nativos; do intérprete frei Bernadino das Neves e
do apóstolo dos potiguares, padre Francisco Pinto. As pazes foram finalmente ratificadas e estava
assim assegurada a posse definitiva da terra, ou mais precisamente da Capitania do Rio Grande.
Um presente dado por Felipe II ao império lusitano ...
Dúvidas Históricas: A Cidade do Natal
Expulso o francês, construída uma fortaleza, faltava apenas fundar uma cidade. E esse era,
dos três objetivos, provavelmente o mais fácil de ser executado. Acontece que, graças à destruição
de documentos pelos holandeses, a história da fundação da capital potiguar se perdeu, talvez, para
sempre. A luta dos historiadores norte-rio-grandenses para reconstruir tal acontecimento tem
gerado uma grande controvérsia através dos tempos. As pesquisas começaram a dar bons frutos e a
questão começa agora a ficar mais clara, com alguns problemas solucionados.
Ainda hoje se discute quem teria sido o fundador da Cidade do Natal. Os primeiros cronistas
indicavam o nome de Jerônimo de Albuquerque, alegando que, por sua participação no processo de
pacificação, com sua garra e valentia, teria sido o primeiro capitão-mor do Rio Grande e logo
depois fundado Natal. A informação se baseava muito mais na intuição do que em qualquer base
documental. É, portanto, compreensível que os primeiros historiadores se confundissem. Frei
Vicente Salvador, por exemplo, narra o seguinte: "Feitas as pazes com os potiguares, como fica dito
se começou logo a fazer uma povoação no Rio Grande a uma légua do forte, a que chamam a
Cidade dos Reis, a qual governa também o capitão do forte que El Rei costuma mandar cada três
anos".
Outro historiador, Francisco Adolfo Varnhagen, avança mais nas explicações se valendo de
detalhes: "Feitas as pazes com os índios, passou Jerônimo de Albuquerque a fundar no próprio Rio
Grande uma povoação. E como era para isso imprópria a porção do arrecife ilhada (em preamar)
onde estava o forte, segundo ainda hoje se pode ver, escolheu para isso o primeiro chão elevado e
firme, que se apresenta às margens direitas do rio, obra de meia légua acima de sua perigosa barra
(...). A dita povoação, depois vila e cidade, de cujo nome não conseguiu fazer - se digna por seu
correspondente crescimento, se chamou de Natal em virtude, sem dúvida, de se haver inaugurado o
seu pelourinho ou a igreja matriz a 25 de dezembro desse ano da fundação (1599)".
Vicente de Salvador confundiu a "povoação dos Reis" com a futura capital do Rio Grande do
Norte. Na realidade, durante a construção da fortaleza, Manuel Mascarenhas Homem mandou
erguer algumas casas para abrigar os oficiais que participaram da tentativa de conquista. Com isso,
surgiu uma povoação que se chamou de Santos Reis. Natal seria fundada, posteriormente, e não
tinha nenhuma relação com a povoação que nasceu próxima daquele edifício militar...
Varnhagen vai mais além, descreve a evolução daquele núcleo urbano: "A dita povoação,
depois vila e cidade". Essa afirmação, porém, não é sustentável. Natal como disse Câmara
Cascudo, "nasceu cidade". Não há, desse modo, nenhuma relação com a primitiva povoação que
floresceu nas proximidades da fortaleza. A razão é clara: Felipe III mandou que se fundasse uma

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cidade e não uma povoação... Natal surgiu no local onde floresceu a povoação. Natal nasceu
cidade, porém, sem casas e sem ruas, aumentando a controvérsia.
A Capitania do Rio Grande possuía dois núcleos: uma povoação em decadência e uma cidade
que, na prática, não existia... Mas aos poucos, com o passar do tempo, começava a surgir. Essa
situação provocou muita confusão entre os autores, como demonstram as diversas denominações
que Natal recebeu: "Natal los Reys", "Cidade dos Reis", "Cidade do Natal do Rio Grande" e até o
nome muito estranho de "Cidade de Santiago"...
Afinal, quem fundou Natal?
A primeira versão que contou no início com a quase unanimidade dos historiadores, inclusive
dos pesquisadores da terra, era a que apontava Jerônimo de Albuquerque como fundador da Cidade
do Natal. Essa teoria, que tem entre seus defensores ilustres nomes, como Vicente Lemos, Tavares
de Lyra e Tarcísio Medeiros, em síntese seria a seguinte: Mascarenhas Homem nomeou Jerônimo
de Albuquerque comandante da fortaleza e depois seguiu para a Bahia com a finalidade de prestar
contas da missão que desempenhara, por determinação do governador-geral do Brasil. Veio a seguir
a pacificação dos nativos e, em seguida, a fundação da cidade. Como Jerônimo se destacou no
processo e era o capitão-mor da Capitania do Rio Grande, logo fora ele o fundador de Natal.
Tavares de Lyra chega até a afirmar que "é de presumir". Portanto, não se tratava de fato e, sim, de
uma possibilidade.
Com o avanço das pesquisas, ficou provado que Mascarenhas Homem não designou
Jerônimo de Albuquerque para exercer a função de capitão-mor do Rio Grande e, o que é mais
importante, Jerônimo não se encontrava presente na data da fundação da cidade e portanto não
pode ser considerado como sendo seu fundador ...
Luís Fernandes (1932) defendeu ter sido Manuel Mascarenhas Homem o fundador da Cidade
do Natal. Alegava que, construindo o primeiro edifício (a fortaleza) e ainda as casas que deram
origem à povoação que se formou próxima à fortaleza, seria o verdadeiro padrinho da cidade.
Argumentação falha, considerando que o novo centro urbano não possuía nenhuma relação com
tudo o que existia anterior à data da sua fundação.
José Moreira Brandão Castelo Branco publicou em 1950, na revista Bando, o texto "Quem
fundou Natal", onde defendia a tese de ser João Rodrigues Colaço o provável fundador da capital
potiguar. Posteriormente, esse estudo foi publicado na revista do Instituto Histórico e Geográfico
do Rio Grande do Norte, em 1960, provocando uma polêmica. Câmara Cascudo chegou inclusive a
apoiar a teoria defendida por Castelo Branco (1955). Pouco tempo depois mudou de opinião,
acreditando que o fundador da cidade teria sido outro: "Para mim, o padrinho da Cidade do Natal
foi Mamuel de Mascarenhas Homem, capitão-mor de Pernambuco, comandante da expedição
colonizadora:. E argumenta: "Continuava tão interessado no cumprimento das reais determinações
que fora à Paraíba, em juno desse 1599, assistiu à solenidade do contrato das pazes com os
potiguares, ato possibilitador da criação da Cidade seis meses depois. Acontece que, nessa época,
Mascarenhas Homem estava em Natal onde concedeu, a 9 de janeiro de 1600, data nesta fortaleza
dos REIS MAGOS (...), a primeira sesmaria, à margem esquerda do rio, numa água a que chamam
da Papuna, justamente ao capitão João Rodrigues Colaço, seu subalterno. Não abandonaria funções
de governaça se não tivesse deveres de suma importância, como satisfazer a última parte das
instruções do rei, participando da fundação da cidade. Não outra explicação para a sua presença em
Natal. Tinha sido encarregado da missão e deveria cumpri-la até o final".
Essa teoria se fundamenta nos seguintes pontos:
1 - A presença de Manuel Mascarenha em dois eventos:
a) Solenidade da ratificação da paz com os nativos.

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b) Data da fundação da cidade.
2 - E, ainda, os seguintes argumentos:
a) Doou a primeira sesmaria no Rio Grande do Norte a João Rodrigues Colaço, ato
administrativo que provaria que estava à frente do governo da capitania.
b) Mascarenhas Homem tinha como missão expulsar os franceses, construir uma fortaleza e
fundar uma cidade. Deveria executar objetivos e, assim, teria para cumprir a última missão: a
fundação de Natal.
Manuel Mascarenhas Homem prestigiou os eventos citados como representante do
governador-geral do Brasil e foi representando D. Francisco de Souza que doou a sesmaria a
colaço. É bom lembrar que, como comandante de uma expedição militar, ele não poderia doar
sesmaria ...
Mascarenhas Homem construiu a fortaleza de madeira, lançando os fundamentos da fortaleza
definitiva. Expulsou os franceses, mas não fundou a cidade do Natal porque em dezembro de 1599
já existia um governante, o capitão-mor João Rodrigues Colaço, habilitado legalmente para fundar
a cidade e iniciar o processo de colonização...
Não se pode esquecer, também, que no documento da doação de capitão da fortaleza, D.
Manuel Mascarenhas Homem disse claramente que "por mandato do dito Senhor vim conquistar
este Rio Grande e fazer nele a fortaleza dos Reis Magos". Não afirma que veio fundar uma cidade
e, no entanto, Natal já estava fundada! Chega-se a uma conclusão: Manuel Mascarenhas não
fundou a Cidade do Natal. Falta examinar apenas a teoria que defender ter sido João Rodrigues
Colaço o verdadeiro fundador.
Vicente Lemos foi o primeiro historiador a afirmar que João Rodrigues Colaço teria sido o
homem que exerceu, pela primeira vez, a função de capitão-mor do Rio Grande, numa nota
publicada na revista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, Vol. 6, página
138: A conquista iniciada em princípios de 1598, e na qual tanto distinguiu-se Jerônimo de
Albuquerque, remete no ano seguinte, e, ciente D. Francisco de Souza, governador-geral do Brasil,
de bom êxito da empresa, nomeou capitão-mor do forte a João Rodrigues Colaço, o primeiro que
realmente governou a capitania".
Depois, entretanto, Vicente de Lemos muda de opinião. No seu livro "Capitães Mores e
Governadores do Rio Grande do Norte", declarou que Jerônimo de Albuquerque foi o fundador da
Cidade do Natal.

REGIÃO ESTRATÉGICA
Capitania do Rio Grande
Novas Luzes Sobre a Fundação de Natal
Foi o escritor José Moreira Castelo Branco quem procurou solucionar, de maneira definitiva,
o problema da fundação de Natal. Com base numa exaustiva pesquisa, publicou um estudo
intitulado "Quem Fundou Natal", onde provou que João Rodrigues Colaço foi de fato o primeiro
capitão-mor do Rio Grande. Apresentou dois documentos, encontrados por Serafim Leite. Um
deles é uma carta do provincial Pero Rodrigues, que registrava o trabalho de catequese realizado no
Rio Grande pelos padres Francisco Pinto e Gaspar de Samperes, e diz ainda que "a tudo isso se
achava presente o capitão da fortaleza, João Rodrigues Colaço".
Em seguida, Castelo Branco faz o seguinte comentário: "isto ocorria em março ou abril de
1599, porque a 19 deste último mês, já os ditos padres, a fim de satisfazerem uma exigência do

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príncipe Pau Seco, para melhor garantia e tornar a pacificação mais firme, partiam do forte do Rio
Grande, em vista às aldeias dos potiguares, até chegar às de Capaoba, donde seguiram com destino
à Paraíba".
O segundo documento, atribuído a Gaspar de Samperes, afirma o seguinte: "João Rodrigues
Colaço, o primeiro capitão que foi daquela capitania".
Castelo Branco, apresentando essas provas, constatou ter sido Rodrigues Colaço o primeiro
capitão-mor do Rio Grande e, ainda, através do documento em que dom Manuel Mascarenhas
Homem deu sesmaria a João Rodrigues Colaço, se comprova que esse senhor governava a
capitania em janeiro de 1600. Após examinar tudo isso, Castelo Branco conclui dizendo que "o
primeiro capitão-mor do Rio Grande foi João Rodrigues Colaço, que governava no ano de 1599,
devendo, por isso, ter sido o fundador da Cidade do Natal".
Como Castelo Branco não se posicionou de maneira categórica, usando, inclusive, a
expressão "devendo, por isso, ter sido o fundador", não fechava a questão, deixando o problema em
aberto. É que o autor não dispunha de nenhum documento oficial que confirmasse a sua teoria.
A importância do estudo de Castelo Branco, contudo, é muito grande. Elaborou uma tese,
hoje vitoriosa. Abriu novas perspectivas, trazendo uma contribuição significativa e despertando a
curiosidade de outros historiadores. A sua teoria, portanto, ficou no terreno das possibilidades, ou
seja, uma abordagem perfeitamente válida.
Permitiu, por outro lado, que a versão que defendia sem dom Manuel Mascarenhas Homem o
fundador da Cidade do Natal ganhasse novos adeptos: Hélio Galvão e Luís da Câmara Cascudo.
Tarcísio Medeiros divulgou, pela primeira vez, em fevereiro de 1973, o Alvará de Nomeação
de João Rodrigues Colaço, em seu livro "Aspectos Geopolíticos e Antorpológicos da História do
Rio Grande do Norte". Através desse alvará se constata o seguinte:
1 - João Rodrigues Colaço foi nomeado capitão da Fortaleza, pelo governador geral do
Brasil, dom Francisco de Souza, confirmado, posteriormente, pela metrópole.
2 - Não houve, portanto, interrupção, desde a data de nomeação, pelo governador geral do
Brasil, dom Francisco de Souza, até a designação real, através do alvará de 18 de janeiro de 1600.
Esse alvará era, justamente, o documento oficial que Castelo Branco reclamava e que,
infelizmente, não chegou a conhecer.
O historiador Olavo de Medeiros Filho, em seu livro "Terra Natalense", afirmou o seguinte:
"Quando à transmissão do comando da fortaleza a Jerônimo de Albuquerque, referida por frei
Vicente, não há respaldo documental. Conforme se verifica, através da leitura da Relação de
Ambrósio de Siqueira, de 24 de junho de 1598 até 5 de julho de 1603, houve a presença de um
capitão-mor da fortaleza e da Capitania do Rio Grande, de João Rodrigues Colaço, o qual foi
provido pelo governador geral do Brasil, dom Francisco de Souza".
Essa informação é importante porque deixa claro que João Rodrigues Colaço recebeu o
comando da fortaleza após a sua conclusão e não posteriormente, como se dizia no passado.
Jerônimo de Albuquerque, portanto, não foi designado capitão da fortaleza por Mascarenhas
Homem no dia 24 de junho de 1598.
É possível também concluir que João Rodrigues Colaço foi, inicialmente, designado para
responder pelo comando da fortaleza, por Mascarenhas Homem, e somente depois foi nomeado
capitão-mor da Capitania do Rio Grande, pelo governador geral do Brasil, e, finalmente,
confirmado nessa função, pelo governo metropolitano.
Examinando os documentos encontrados pelo padre Serafim Leite e publicados no livro
"História da Companhia de Jesus no Brasil"; a "Carta de Doacão de Sesmarias a João Rodrigues
Colaço", publicada pela revista do Instituto Histórico e Geográfico no Rio Grande do Norte; a

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 18 de 161


"Relação de Ambrósio de Siqueira", transcrita em parte - um pequeno trecho - por Olavo de
Medeiros Filho, em "Terra Natalenses"; o Alvará de Nomeação de João Rodrigues Colaço,
divulgado por Tarcísio Medeiros em "Aspectos Geopolíticos e Antropológicos da História do Rio
Grande do Norte" e, ainda, "Quem Fundou Natal", de Castelo Branco, fica claro o seguinte" João
Rodrigues Colaço foi nomeado capitão da fortaleza por dom Francisco de Souza, sendo o primeiro
a exercer tal função no Rio Grande, e como continuava governando a capitania, em janeiro de
1600, foi ele, JOÃO RODRIGUES COLAÇO QUEM FUNDOU A CIDADE DO NATAL, NO
DIA 25 DE DEZEMBRO DE 1599.
A Nobre Sobriedade de João Rodrigues Colaço
Era militar. Casado com dona Beatriz de Menezes, filha de Henrique Muniz Teles.
Falando sobre o caráter e a personalidade de Colaço, disse Hélio Galvão: "a nobre sobriedade
de suas respostas sobre alguns temas, revela um homem de caráter marcado, de personalidade
alheia a condicionamentos eventuais".
Olavo de Medeiros Filho informa que "no período de 15 de agosto de 1595 a 15 de março de
1596, era capitão de uma companhia transferida do Recife para a Bahia. A referida companhia,
àquela data, retornou a Pernambuco.
Um fato que ninguém pode negar é que João Rodrigues Colaço pode ser considerado um dos
primeiros provoadores do Rio Grande, nascido na Europa. Por essa razão é que requereu ao
representante do governador geral do Brasil, Manuel Mascarenhas Homem, uma sesmaria, com
2.600 braças, onde possuía inclusive roçados. Tinha, também, escravos da Guiné.
Colaço assumiu o cargo de capitão da fortaleza no dia 24 de junho de 1598, como comprova
a "Relação de Ambrósio Siqueira".
Olavo de Medeiros Filho afirma que no "período de 26 de novembro de 1601 a 6 de março de
1602, nenhuma data e sesmaria foi concedida pelo governo de Rodrigues Colaço". Segundo esse
autor, provavelmente, nessa época, teria acontecido um conflito entre portugueses e nativos,
descrito por Anthony Knivet. O episódio teria acontecido da seguinte maneira: os potiguares, em
grande número, cercaram a Cidade do Natal. Aprisionaram e mataram muitos homens.
Mascarenhas Homem, ao tomar conhecimento do fato, partiu de Pernambuco e surpreendeu o
inimigo que se encontrava, naquele instante, devorando os prisioneiros mortos. Estavam ébrios. E
sem a menor condição para reagir. Foram, então, massacrados. Muitos morreram, sendo
assassinados a pancadas! O saldo da chacina: cinco mil mortos! O chefe Pirajuva (Barnatana de um
Peixe) solicitou e obteve de Manuel Mascarenhas Homem, a paz.
João Rodrigues Colaço, possivelmente, se encontrava ausente da capitania. Não há registro
de nenhum envolvimento de Colaço no acontecimento, antes ou depois do ocorrido.
Frei Vicente do Salvador narra, na sua História do Brasil, um fato interessante, que teria se
passado durante o governo de João Rodrigues Colaço: o bispo de Leiria condenou um homem a
passar três anos no Brasil, "onde tornará rico e honrado". O degredado se casou com uma mulher
portuguesa e reuniu uma pequena fortuna. E, ainda, desfrutava da amizade de Colaço e de sua
esposa.
Não se sabe, até o momento, de outro feito de João Rodrigues Colaço, a não ser a fundação
da Cidade do Natal. Depois de ter concluído o seu governo, voltou para Portugal. Não se tem
outras notícias da sua presença no Brasil. Não se sabe, também, onde e quando morreu. Mas a falta
de maiores dados sobre a vida de Colaço não justifica, de maneira alguma, a retirada do único
momento de glória que ele viveu: ser o verdadeiro fundador da Cidade do Natal.

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 19 de 161


No momento em que Natal se prepara para comemorar os quatrocentos anos de sua
existência, ninguém pode deixar de fazer justiça ao seu humilde, desconhecido, porém, verdadeiro
fundador.Uma Cidade sem Pressa de Crescer
No início não houve uma preocupação voltada para a construção de prédios públicos. A
fortaleza era suficiente. Outro edifício, cuja construção foi iniciada na época da fundação da
cidade, foi o da matriz.
Durante o processo de conquista e de pacificação, a capitania conheceu apenas duas
atividades: a dos soldados, construindo a fortaleza e lutando contra os nativos; e a segunda,
marcada pela atuação dos missionários, ajudando enfermos e buscando a conciliação com os
potiguares.
Entre outros, se destacaram os seguintes religiosos: Francisco das Neves Pinto. Os primeiros
atos missionários foram realizados dentro da própria fortaleza.
Pedro Moura registra a construção de uma igreja, por Martim Soares Moreno, sob a proteção
de Nossa Senhora do Patrocínio. Colheu tal informação em Miliet, por sinal, o único cronista a
falar sobre aquele edifício.
Em 1598, Natal já era freguesia e o seu primeiro vigário, padre Gaspar Gonçalves da Rocha.
Olavo de Medeiros Filho transcreveu, em "Terra Natalense", o seguinte texto de frei Agostinho de
Santa Maria: "foi levantada uma paróquia que se dedicou à Rainha dos Anjos, Maria Santíssima,
com o título de Apresentação, quando seus santíssimos pais, Joaquim e Ana, a foram oferecer no
Templo, sendo de idade de três anos. Na capela-mor se colocou, depois, um grande e formoso
quadro de pintura, em que se vê o mesmo mistério da Senhora historiada".
O primeiro documento que registra a matriz, em Natal, data de 1614, quando diz que a igreja
não tinha portas. A igreja matriz teria sido concluída em 1619. Foi, entretanto, destruída pelos
holandeses.
As datas concedidas no Rio Grande, como disse Olavo de Medeiros Filho, "no período de
1600 a 1614, acham-se discriminadas no "Traslado do Auto da Repartição das Terras da Capitania".
A cidade não crescia, "andava", ou seja, se arrastava lentamente, rumo ao futuro. Conta Luís
da Câmara Cascudo que "os trinta e quatro anos de cidade, 1599 - 1633, foram lentos, difíceis e
paupérrimos. Interessava ao rei o forte, a situação territorial. Raríssimas mulheres brancas. Cidade
apenas no nome".
Havia, entretanto, uma coisa positiva. A pescaria que, segundo as testemunhas da época, era
da melhor qualidade. Abastecia a população local e exportava para os Estados vizinhos, Paraíba e
Pernambuco.
A maneira de viver da população, naquela época, foi descrita por Câmara Cascudo: "os
moradores viviam espalhados nos sítios ao redor, plantando roças, caçando, colhendo frutos nos
tabuleiros, pouca criação de gado que se desenvolveria vertiginosamente a ponto de ter 20.000
cabeças em 1633, e as pescarias, de anzol, rede e curral. Havia o sal, colhido nas marinhas do outro
lado do rio, Igapó, Aldeia Velha, antigas malocas dos potiguares. O peixe salgado e seco foi um dos
produtos mais rapidamente divulgado, com mercados abundantes e fáceis".
Era, de fato, um lento caminhar. A cidade não tinha pressa em crescer. Para complicar, dentro
em breve deveria de passar por sua fase mais difícil: o período de invasão holandesa, quando teve
prédios e documentos destruídos, retardando, mais ainda, o seu desenvolvimento. Domínio
Holandês
Domínio Holandês
De João R. Colaço à Invasão Holandesa

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Esta é uma fase das mais obscuras da História do Rio Grande do Norte, por uma razão muito
simples: "nos arquivos do Estado não se encontrava nenhum documento anterior à conquista
holandesa. Nesse período, que se estende 1633 a 1654, foram todos destruídos", como narra
Tavares de Lyra.
Fica difícil inclusive de se estabelecer a data da posse de alguns governantes. Atualmente foi
desfeita a dúvida sobre quem teria sido o primeiro capitão-mor do Rio Grande do Norte: João
Rodrigues Colaço, fundador da Cidade do Natal.
A primeira casa que serviu de sede da administração da capitania foi a Fortaleza da Barra do
Rio Grande ou, como é mais conhecida, Fortaleza dos Reis Magos. Falando sobre esse fato, disse
Luís da Câmara Cascudo: "era a residência do capitão-mor, sendo administrativa, comando militar,
quartel e refúgio dos raros moradores. Os soldados moravam dentro do forte e qualquer comoção
geral levava os colonos, às carreiras, para as muralhas imponentes que garantiam o avanço no
setentrião do Brasil".
Foi nessa fortaleza que moraram e governaram a Capitania do Rio Grande, os capitães-
mores, até a invasão holandesa.
Alguns historiadores elaboram listas, procurando estabelecer, por ordem cronológica, os
sucessores de João Rodrigues Colaço.
Vicente Lemos escreveu um clássico sobre o assunto: "Capitães-Mores e Governadores do
Rio Grande do Norte". Acontece, entretanto, que permaneceram algumas dúvidas.
Varnhagen, Tavares de Lyra, Vicente Lemos e Câmara Cascudo classificam como sendo os
primeiros governantes da Capitania do Rio Grande: Manuel Mascarenhas Homem (comandante da
expedição que tentaria a conquista), Jerônimo de Albuquerque, João Rodrigues Colaço e
novamente Jerônimo de Albuquerque. Equívoco que, felizmente, já foi devidamente esclarecido: o
primeiro capitão-mor do Rio Grande do Norte foi Colaço. Manuel Mascarenhas Homem não
governou o Rio Grande, apenas foi o capitão da conquista que, por sinal, não houve, porque a posse
foi efetivada através de um processo de pacificação...
A lista dos governantes do Rio Grande do Norte começa, portanto, com João Rodrigues
Colaço, sendo que Jerônimo de Albuquerque governou apenas uma só vez!
Os sucessores desses dois foram os seguintes: Lourenço Peixoto Cirne, Francisco Caldeira de
Castelo Branco, Estevão Soares de Albergaria, Ambrósio Machado de Carvalho. Como sucessor
desse último, era apontado, por alguns, Bernardo da Mota. Hoje, o equívoco foi corrigido: o
sucessor de Ambrósio Machado de Carvalho foi, na realidade, André Pereira Temudo, que foi
nomeado a 18 de março de 1621.
Tavares de Lyra pergunta: "Quem substituiu Francisco Gomes de Melo?", para depois, com
base no que escreveu Domingos da Veira, ele mesmo responder: "a ordem de sucessão foi esta:
Francisco Gomes de Melo, Bernardo da Mota, Porto Carreiro".
Câmara Cascudo, escrevendo em 1961, confirma Tavares de Lyra. Depois de Francisco
Gomes de Melo, os sucessores foram: Bernardo da Mota e Cipriano Porto Carreiro.
Quando os holandeses atacaram o Rio Grande, Pero Mendes de Gouveia governa a
capitania.Os Holandeses no Brasil: A Bahia
A primeira tentativa de implantar uma colônia no Brasil, pelos neerlandeses, foi na Bahia. Os
armadores holandeses conheciam o Brasil, mantendo relações amistosas com os portugueses,
durante os reinados de João III, D. Sebastião e o cardeal D. Henrique. Com a anexação de Portugal
e suas colônias pela Espanha, a situação mudou. Felipe IV, inimigo dos Países Baixos, determinou
"o confisco dos navios flamengos que estivessem nos portos de seus novos domínios, europeus,
africanos, asiáticos e americanos".

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 21 de 161


Fugitivos da Bahia contaram na Holanda como seria fácil conquistar Salvador, devido à
precariedade do sistema montado para defender a colônia. Um deles, Francisco Duchs, chegou a
participar do ataque que resultou na capitulação da Bahia, em 1625. Guilherme Usselinex, porém,
foi quem "propôs e defendeu a idéia da formação de uma nova companhia, semelhante à Oriental,
que na Índia havia adquirido tantos lucros e vantagens", como disse Varnhagen.
O sonho de dominar o Brasil era antigo, porém, como desfrutavam de lucros com a
participação no comércio, durante o governo português deixaram de lado tal idéia. Agora, a
situação era diferente. Os espanhóis se apresentavam como inimigos. Deviam, portanto, aproveitar
a oportunidade para se apossarem do Brasil foi a criação da Companhia Privilegiada das Índias
Ocidentais, pela Carta Patente de 3 de junho de 1621.
A companhia decidiu atacar a Bahia, mas precisamente Salvador, capital da colônia, que,
segundo eles, arrecadava 8.000 florins anuais....
E, como narra Varnhagen, "equipou-se uma grande armada de que foi nomeado almirante
Jacob Willekens, vice-almirante o bravo e venturoso Pieter Pieterzoon Heyn, e comandante das
tropas e governador das futuras conquistas Johan Van Dorth. Consatava a expedição de vinte e três
iates, armados com quinhentos e nove bocas de fogo, tripulados de mil e seiscentos marinheiros e
guarnecidos de mil e setecentos homens de desembarque".
A notícia de que a Holanda iria atacar a Bahia chegou ao Brasil. O governador geral, Diogo
de Mendonça Furtado, procurou tomar todas as providências, porém, encontrou dificuldades, até
mesmo má vontade, como era o caso do bispo D. Marcos Teixeira.
A 8 de maio de 1624 os holandeses chegaram a Salvador e, após dois dias de luta,
dominavam a cidade. Preso Diogo de Mendonça Furtado, Johan Van Dorth passou a governar. Os
batavos, contudo, não foram felizes. O povo que havia abandonado a cidade, passado o susto,
procurou reagir, crescendo a figura de D. Marcos Teixeira, apesar de sua idade bastante avançada.
Esgotado, não suportou as vicissitudes e veio a falecer.
Os holandeses, entretanto, tiveram também suas baixas. Cedo perderam o cel. Van Dorth. O
seu substituto, Albert Schenteu, também morreu, sendo sucessor Wielen Schauten. Matias de
Albuquerque, em Pernambuco, assumiu o governo da colônia e enviou para a Bahia um reforço,
sob o comando de Francisco Nunes Marinho.
A metrópole mandou uma esquadra, chefiada por D. Francisco de Moura. A armada, depois
de passar por Pernambuco, foi para a Bahia, onde realizou o cerco de Salvador. Era preciso,
contudo, muito mais.
Filipe II, diante da repercussão negativa pela grande derrota, cuja conseqüência foi a perda da
Bahia, resolveu tomar uma decisão mais firme e, então, enviou ao Brasil a maior expedição militar
que atingiu o continente americano até aquele momento, com mais de 12.000 homens e 70 navios,
ficando conhecida na História como "Jornada dos Vassalos". D. Fadrique de Toledo Osório assumiu
o comando. Da expedição participaram não somente militares das duas nacionalidades, Espanha e
Portugal, como figurar ilustres.
No dia 22 de março de 1625, a armada atingiu a Bahia e a 01 de maio Salvador estava
libertada.
Os holandeses, contudo, não desistiram de se apossar definitivamente do Brasil... Os
Holandeses no Brasil: O Nordeste
A Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais resolveu fazer nova investida contra a
colônia luso-espanhola. O alvo, agora, seria Pernambuco, com mais de 130 engenhos, cuja safra
ultrapassava as mil toneladas, fazendo de Pernambuco "a principal e mais rica região produtora de

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açúcar do mundo". No aspecto militar, o Nordeste brasileiro estava desguarnecido e, assim, não
tinha condições de resistir a um ataque de uma grande esquadra.
A notícia sobre uma nova invasão holandesa ao Brasil se espalhava, rápida, pela Europa.
Matias de Albuquerque, que se encontrava em Madri, foi nomeado "Governador e Comandante
Supremo do Nordeste". O governador geral Diogo Luís de Oliveira recebeu instruções da
metrópole para reforçar e melhorar o sistema de defesa da Bahia e Pernambuco.
Matias de Albuquerque partiu para o Nordeste brasileiro com poucos soldados, um reforço
verdadeiramente ridículo diante da grande ameaça. Ao chegar em Pernambuco constatou que, para
fazer frente aos holandeses, contava apenas com tropas que, na sua maioria, eram integradas por
homens inexperientes... Não precisava, portanto, ser vidente ou estrategista militar para prever que,
em caso de uma invasão em grande escala, haveria de se repetir exatamente o que aconteceu em
Salvador.
No dia 15 de fevereiro de 1630, uma poderosa esquadra holandesa, com mais de 50 navios e
7.000 homens, sob a chefia de Hendrick Cornelizon Loncg, atacou Recife com toda sua força.
Resistência heróica, porém, ineficaz e, assim, a 3 de março, caíram Olinda e Recife. Mas Matias de
Albuquerque não desistiu e, adotando a tática de guerrilha, concentrou suas forças no Arraial do
Bom Jesus. Os colonos levaram uma grande vantagem: conheciam a terra e atiravam desse fator o
máximo que podiam, impedindo, ou melhor, retardando a vitória dos flamengos.
A 20 de abril de 1632 ocorre um fato que vai mudar o destino da guerra: a deserção, para o
lado dos invasores, de Domingo Fernandes Calabar. Profundo conhecedor da região, passou a
fornecer as informações que os neerlandeses precisavam e, dentro em breve, ampliaram o seu
domínio, destruindo inclusive o Arraial do Bom Jesus.
A guerra trazia enormes prejuízos. A Companhia das Índias Ocidentais resolveu enviar o
conde Jos'r Maurício de Nassau Siegen, com amplos poderes para pacificar a população e
promover o desenvolvimento da colônia, para enfim adquirir os tão sonhados lucros. Começava
outra fase da dominação holandesa.
O conde de Nassau veio com o título de "Governador Capitão General e Almirante de Terra e
Mar". Vinha, portanto, para administrar e consolidar a conquista. Chegou no dia 23 de janeiro de
1637 no Recife. E se apaixonou pelo País dos mais belos do mundo.
O conde de Nassau era, no dizer de Jânio Quadros, uma "figura do renascimento, amigo e
protetor de letrados e artistas e comprazendo-se na sua companhia, seria ainda um administrador
capaz, culto, enérgico e generoso".
Nassau, apesar de ter feito uma grande administração, contudo, não se encontra isento de
críticas. Hélio Viana apresentou, de maneira objetiva, o outro lado da personalidade do governante
holandês: "interesseiramente protegeu os judeus, que para isso pagavam-lhe uma contribuição, a
ponto de suscitar reclamações. E teve motivos inconfessáveis para amparar os calvinistas, pois uma
de suas amantes no Brasil foi exatamente a filha do respectivo pastor. Quanto aos católicos, se por
interesse político durante algum tempo permitiu seu culto, não tardou a persegui-los, expulsando do
território ocupado".
Trouxe consigo artistas, (Frans Jasz Post) e cientistas (Jorge Marograv e Wielen Piso),
ganhando fama de mecenas.
Entre seus feitos podem ser citados os seguintes: apoio os senhores de engenho, tomando
medidas que asseguravam uma melhor produção de açúcar; reformulou a administração pública;
procurou acalmar os ânimos dos portugueses; proibiu que se cobrasse juros de 18% ao ano, além de
promover diversão para o povo.

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Na área militar, realizou algumas conquistas (Alagoas, Ceará, Sergipe), porém sofreu um
grande revés na Bahia. O governo espanhol, satisfeito com essa grande vitória, resolveu premiar os
que nela se destacaram; Bagnuolo foi feito príncipe de Nápoles, a D. Antônio Felipe Camarão foi
entregue uma comenda, a dos Moinhos de Soure etc.
A derrota de Nassau despertou Madri que organizou uma grande esquadra, sob o comando do
Conde da Torre, D. Fernando Mascarenhas, para socorrer a colônia.
No dia 12 de janeiro de 1640, ocorreu o primeiro combate entre a esquadra do Conde da
Torre e a holandesa, comandada pelo almirante Corweliszoon Loos e, após alguns combates - sem
que houvesse uma batalha decisiva -, o Conde da Torre desembarcou em Touros, Rio Grande do
Norte, mais de mil homens "sob comando do Mestre de Campo Luís Barbalho Bezerra, destemido
cabo de guerra que iria agora - numa travessia de centenas de léguas, em busca da Bahia, por
trilhas desconhecidas, em território ocupado por conquistadores desalmados e bárbaras gentes, sem
recurso de qualquer natureza, forçado pela necessidade e estimulado pelo patriotismo a escrever
uma das páginas mais gloriosas da história da luta com os invasores", segundo conta Tavares de
Lyra.
Na altura do Potengi, Gartsmanm combate os comandados de Luís Barbalho Bezerra. É
derrotado e preso sendo levado como prisioneiro para a Bahia.
Informa Tavares de Lyra: "A 15 de fevereiro de 1641, chega a notícia da restauração de
Portugal". Com D. João IV assumindo o trono de Portugal, estava desfeita a "União Peninsular"...
Em 1642, Portugal assinou uma trégua com a Holanda. A 18 de abril desse ano, Nassau foi
notificado que deveria voltar à Europa em 1643. Recebeu muitas homenagens, partindo somente
em 1644. A Insurreição Pernambucana
Alguns colonos estava descontentes com o domínio holandês, ainda na administração de
Nassau. Devido ao regime, muito duro, imposto pela Companhia das Índias Ocidentais. Por outro
lado, após a trégua com a Holanda, Portugal almejava a devolução de suas colônias, porém, a
Holanda não concordava. Gerando, assim, um clima de hostilidade entre os dois impérios. Diante
do impasse, o governo português começou, secretamente, a fomentar a revolta nas terras ocupadas.
Em 1642, André Vidal de Negreiros e João Fernandes Vieira já confabulavam, animados com
a restauração do Maranhão. Não estavam sozinhos. O governador geral Antônio Teles da Silva
enviou em 1644, experientes militares, liderados por Antônio Dias Cardoso, para Pernambuco, para
que atuassem como instrutores. Ainda nesse ano, André Negreiros e João Fernandes, juntos
elaboravam um plano para iniciar a reação contra os holandeses, tudo feito secretamente porque a
trégua entre Holanda e Portugal não permitia se agisse às claras. Dentro desse contexto, em 1644,
Henrique Dias e seu batalhão negro seguiam da Bahia para Pernambuco, como se estivessem
fugindo. E, logo depois, D. Antônio Felipe Camarão, com seus nativos, segue o mesmo rumo,
oficialmente perseguindo os fugitivos ...
Em 15 de maio de 1645, João Fernandes Vieira e Antônio Cavalcanti, na várzea de
Capibaribe. Assumiam um compromisso para lutar "em nome da liberdade divina". Pouco dias
depois, ou seja, 23 de maio, os dois juntamente com outras personalidade (16), assinavam um
documento onde demonstravam sua disposição de lutar pela "restauração de nossa pátria".
A insurreição começou no dia 3 de junho de 1645, na várzea do Capibaribe. Em agosto, os
comandados de João Fernandes Vieira ultrapassavam mil homens!
Entre as batalhas que obtiveram maior significação podem ser apontadas: a de Tabocas, em
1645, quando os revoltosos venceram os batavos do coronel Hans e do capitão Blauer. E as duas
batalhas de Guararapes. A primeira, em 19 de abril de 1648, com os revoltosos sendo chefiados
pelo mestre-de-campo general Francisco Barreto e, ainda, as tropas de André Vidal, de Henrique

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Dias, de Antônio Felipe Camarão e de Vieira. Os holandeses tinham no tenente-general Sigismundo
von Schoppe seu principal líder. A vitória sorriu para os coloniais. A segunda, que se realizou em
18 de fevereiro de 1649, foi mais uma derrota dos neerlandes. Era, praticamente, o fim do domínio
holandês no Brasil.
A Holanda passava por uma crise, estando envolvida na "Guerra de Navegação" contra os
ingleses, forçando desviar a atenção e recursos que seriam destinados ao Brasil. A Inglaterra,
interessada na destruição de sua rival, passou a ajudar a colônia portuguesa em sua luta contra os
batavos. Através do "Ato de Navegação", de Cromwell, ficaram os holandeses sem liberdade de
ação no mar, onde até aí haviam gozado de inegável supremacia', como disse Hélio Vianna.
A expulsão dos holandeses foi, sobretudo, uma grande vitória dos portugueses, mestiços e,
também, uma bela participação de negros e nativos. Fez nascer, ou pelo menos reforçou, o
sentimento nativista, nacionalista. Demonstrou toda a força de um novo tipo que estava nascendo:
o brasileiro, e lançava as bases de uma futura nação independente: o Brasil. A Preparação Para
Conquistar o RN
A Fortaleza da Barra do Rio Grande, pela sua beleza, impunha respeito. Os holandeses
sabiam da importância de cunho estratégico daquele edifício militar. Possuíam, ao mesmo tempo,
um certo temor. Começar, então, a recolher o maior número de informações para elaborar um plano
eficaz para capturá-la.
A 19 de julho de 1625, o capitão Uzel Johannes de Laet fez um reconhecimento, encontrando
no Rio Grande um engenho e muito gado.
Em 1630, Adriano Verbo vinha com a "missão especial de ver, ouvir e cantar", como resumiu
Câmara Cascudo. Mesmo com essas informações, os flamengos não se arriscaram a armar uma
esquadra e tentar se apossar da fortaleza.
No outro ano, o nativo Marcial, fugitivo dos portugueses, se apresentou ao Conselho Político
do Brasil Holandês. Objetivo: realizar uma aliança com os batavos. Fornecendo, naturalmente,
preciosos dados aos flamengos. O Conselho Político, contudo, foi prudente... Enviou Elbert
Simient e Joost Closte ao Rio Grande, em 1631, para adquirir maior conhecimento da região.
Foi nessa expedição que os batavos conseguiram, por sua sorte, importante dados que se
encontravam em poder dos portugueses e que facilitaram, posteriormente, a conquista do Ceará. Os
documentos se encontravam com um português chamado João Pereira, que foi morto.
Massacres no Rio Grande do Norte
Tentativas de Conquista
O Fracasso do Primeiro Assalto
Após tantos estudos, os holandeses decidiram, finalmente, realizar a conquista do Rio
Grande.
Narra Câmara Cascudo: "A 21 de dezembro de 1631 partiram do Recife quatorze navios, com
dez companhias de soldados veteranos. Dois conselheiros da Companhia assumiram a direção
suprema, Servaes Carpenter e Van Der Haghen. As tropas eram comandadas pelo Tenente-Coronel
Hartman Godefrid Van Steyn-Gallefels. Combinaram desembarcar em Ponta Negra, três léguas ao
sul de Natal, marchando sobre a cidade".
O capitão-mor Cipriano Pita Carneiro reagiu, ordenando que seus liderados abrissem fogo
contra os invasores. Os holandeses, contudo, desistiram de realizar a conquista. Depois, passaram
por Genipabu, agindo como verdadeiros salteadores, legando duzentas cabeças de gado...
Fracassou, assim, a primeira tentativa dos flamengos para dominar o Rio Grande.
A Rendição e a Tomada da Fortaleza

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Ao que parece, os holandeses temiam encontrar uma fonte resistência por parte dos
defensores da fortaleza. Precisavam conquistar o Rio Grande, sobretudo porque a captura desta
capitania significava a solução para o abastecimento de carne bovina para os batavos. Richshoffer,
quando esteve em Genipabu, não escondeu o seu entusiasmo: "consumimos mais carne fresca do
que no decurso de todo o ano anterior"...
Em 1632, não se realizou nenhum ataque.
Por que a tomada da fortaleza foi tão fácil?
A Fortaleza da Barra do Rio Grande estava apenas com um efetivo de oitenta homens, sendo
seu capitão-mor Pero Mendes de Gouveia, que lutou como um bravo, mas cometeu um erro que lhe
seria fatal: abandonou as dunas próximas da fortaleza. Essas dunas deveriam ser defendidas. Caso
contrário, se os inimigos colocassem ali sua artilharia, transformariam aquele edifício num alvo
fácil de ser atingido. Foi exatamente o que aconteceu.
O capitão-mor Pero Mendes Gouveia agiu como se acreditasse que as muralhas da fortaleza
fossem inexpugnáveis... Erro tático, que o levou para uma derrota inglória...
Os holandeses, ao contrário dos lusitanos, agiram como verdadeiros profissionais da guerra,
segundo interpretação de Hélio Galvão: "A operação foi pré-traçada, dentro do quadro militar
rígido: uma operação combinada".
No dia 5 de dezembro de 1633, partiu do Recife a esquadra sob o comando do almirante Jean
Cornelis Sem Lichtard. Comandava as tropas o tenente-coronel Baltazar Bijma.
Afirma Câmara Cascudo: "Todo o dia 9 é de artilharia. Os holandeses montam as peças de 12
libras e os morteiros lança-granadas erguem trincheiras com cestões e sobem os canhões para os
morros, a cavaleiro do forte. De lá atiram, quase de pontaria, desmontando as peças portuguesas.
Assim 10, com trocas de descargas, gritos, toque de cornetas e granadas. Dia 11 foi a mesma
tarefa".
Tenente-coronel Bijma intimou o capitão-mor Pero Mendes Gouveia para que se rendesse,
através de uma carta. Resposta de Gouveia: "V. Excia. deve saber que este forte foi confinado à
minha guarda por S.M. Católica e só a ela ou alguém de sua ordem o posso entregar". Atitude
heróica, porém inútil. A artilharia flamega, montada nas dunas próximas da fortaleza falava mais
alto...
Segunda-feira, dia 12 hasteada a bandeira branca pelos sitiados. O capitão-mor Gouveia
estava gravemente ferido. Por essa razão, não participou das negociações para a entrega da
fortaleza ao inimigo. Enfermo, não possuía mais o comando. Fala-se, inclusive, em traição... Na
realidade, as negociações da rendição foram realizadas por pessoas estranhas, como registra Hélio
Galvão: 'Sargento Pinheiro Coelho, foragido de uma prisão na Bahia; Simão Pita Ortigueira, preso
na fortaleza, condenado à morte; Domingos Fernandes Calabar, que viera na expedição".
Caía a Fortaleza da Barra do Rio Grande. Começava, a partir daquela data, o domínio
holandês no Rio Grande do Norte.
Os Massacres
A Destruição na Capela de Cunhaú
Segundo Câmara Cascudo, "o engenho Cunhaú foi construído na sesmaria dada por Jerônimo
de Albuquerque em 2 de maio de 1604 aos seus filhos Antônio e Matias. Constava de 500
quadradas na várzea de Cunhaú e mais duas léguas em Canguaretama".
No início do século, o engenho exportava açúcar para Recife. Possuía um fortim, sob o
comando do capitão Álvaro Fragoso de Albuquerque. Foi construído por marinheiros de
Dunquerque.
Esse fortim foi atacado, vencido e destruído pelo coronel Artichofski, em outubro de 1634.

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A Companhia confiscou o engenho de Antônio Albuquerque Maranhão.
Depois, o engenho passou por várias mãos.
No dia 15 de julho de 1645, sábado, Jacob Rabbi apareceu em companhia dos janduís,
liderados por Jererera, no engenho de Cunhaú. A simples presença dos tapuias e de potiguares
causou pânico na população.
Jacob Rabbi trazia instruções de Paul Linge. Publicou um documento, convidando a
população para, no domingo, comparecer à capela para participar de uma reunião, quando seriam
transmitidas determinações do Conselho Supremo.
A capelinha tinha como padroeira Nossa Senhora das Candeias.
A maioria do povo atendeu ao convite, lotando o templo. Tiveram, entretanto, que deixar suas
armas do lado de fora.
O padre André de Soveral, paulista de São Vicente, missionário e tupinólogo, começou a
celebrar a missa, considerando que a reunião seria realizada após o ato religioso. Possuía entre 70 e
90 anos. Era muito querido pelos seus paroquianos.
Os nativos se aproximaram da capela. Fecharam as portas. Os fiéis compreenderam o que iria
acontecer. Tarde demais. Quando o padre André Soveral elevou a hóstia, era o sinal combinado,
começou o massacre. As vítimas mal tiveram tempo de pedir perdão de seus pecados. Gritos,
súplicas, gemidos.
Alguns tapuias procuraram atingir o sacerdote, André Soveral, então, disse:
- "Aquele que tocar no padre ou nas imagens do altar terá os braços e as pernas paralisados!"
Os tapuias recuaram, porém Jererera acertou um golpe violento no sacerdote, que caiu. Ainda
conseguiu se erguer, mas por pouco tempo, tombando sem vida. Morreram, ao todo sessenta e nove
pessoas.
A notícia se espalhou, provocando revolta. Iniciando, pouco depois, a fase das represálias.
Em outubro de 1645, apareceu o capitão João Barbosa Pinto, matando holandês, com fúria
selvagem. Em janeiro de 1646, Felipe Camarão e o capitão Paulo da Cunha só não fizeram o
mesmo porque não encontraram inimigo para matar.
Após a expulsão dos holandeses, em 1645, a capela foi reconstruída pela família
Albuquerque Maranhão, conforme registrou Fernando Távora.
Torturas Lendárias de Uruaçu
Nenhum massacre tinha ocorrido após o de Cunhaú e não havia, igualmente, sinais de algum
levante próximo ao Rio Grande.
Acontece que, no dia 2 de outubro de 1645, chegou de Recife o conselheiro Bullestraten. E se
reuniu, secretamente, com Gatdtzman. Tudo indica que trazia ordens para executar os portugueses.
Pelo menos, os acontecimentos futuros levaram a pensar em tal hipótese.
No dia seguinte, 3 de outubro de 1645, os colonos que se encontravam no Castelo Ceulen
foram levados para Uruaçu: Antônio Vilela, Cid, seu filho, Antônio Vilela Júnior, João Lostau
Navarro, Francisco de Bastos, José do Porto, Diogo Pereira, Estevão Machado de Miranda,
Francisco Mendes Pereira, Vicente de Souza Pereira, João da Silveira, Simão Correia e o padre
Ambrósio Francisco Ferro, que exercia as funções de vigário de Natal.
Ao chegar em Uruaçu, a tropa formou um quadrado e, no interior desse quadrado, ficaram o
sacerdote mais os colonos. Foi dada a seguinte ordem: que eles se despissem e se ajoelhassem. Os
portugueses compreenderam, então, o que iria acontecer. O padre Ambrósio Ferro, com
tranqüilidade, deu a absolvição.
O pastor Astetten fez uma exortação para que os prisioneiros abjurassem a fé católica.
Obteve, entretanto, uma resposta negativa de todos, numa atitude firme e corajosa dos portugueses.

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Os colonos se despediram uns dos outros, praticando atos de devoção. Isso irritou profundamente o
pastor e seus companheiros. Começaram a torturar as vítimas com tanto ódio, que somente o
fanatismo religioso poderia explicar tal insanidade. Não ficam satisfeitos. Jacob Rabbi chamou os
nativos para que eles completassem o massacre. Fizeram corpos em pedaços. Arrancaram olhos,
línguas, etc.
Esse foi apenas o primeiro ato. O segundo não demoraria muito tempo.
Os holandeses se dirigiram até o arraial, afirmando que chegaram ordens do Supremo
Conselho, determinado que eles deveria assinar alguns documentos. Os homens se despediram de
seus familiares, chorando, porque sabiam que iriam caminhar para a morte. Durante o caminho,
rezavam. Os pressentimentos se realizaram.
Os cronistas fizeram relatos minuciosos. Narram, entre outros detalhes, o seguinte:
"Antônio Baracho foi amarrado a uma árvore e arrancam-lhe, quando ainda estava vivo, a
língua.
Abriram o corpo de Matias Moreira e tiraram o seu coração. Antes de morrer, ele disse:
"Louvado seja o Santíssimo Sacramento".
Espatifaram, com o pau, a cabeça de uma criança, filha de Antônio Vilela.
A filha de Francisco Dias teve o seu corpo partido em duas partes.
A mulher de Manuel Rodrigues Moura, depois que o marido morreu, teve cortado os pés e as
mãos. A vítima sobreviveu, ainda, três dias ao lado do marido morto.
Os nativos procuraram salvar oito rapazes. Os holandeses ofereceram uma oportunidade para
que os jovens conseguissem a liberdade: eles teriam que passar para o lado dos holandeses. João
Martins deu a seguinte resposta: "não me desamparará Deus dessa maneira, a minha Pátria e o meu
rei. Matai-me logo, pois tenho inveja da morte e da glória dos meus companheiros".
Uma moça, muito bonita, foi vendida aos nativos, ou melhor, trocada por um cão de raça.
Dois jovens, Manuel Álvares e Antônio Bernardes, com várias feridas, puxaram suas armas
brancas, investindo contra os tapuias, matando alguns inimigos antes de morrer.
Uma menina, de nome Adriana, ao saber que seus pais seriam mortos, se recolheu a uma
casa, chorando, em seguida. Foi quando a Virgem Santíssima apareceu, procurando consolar aquela
criança. E prometeu que seus pais seriam vingados".
Pouco tempo depois, Camarão foi até o Rio Grande, punindo, com energia, os batavos.
"D. Beatriz, esposa de Joris Gardtzman, comandante do Castelo Ceulen, por piedade crista,
levou as viúvas dos portugueses que tinham falecido em Uruaçu, para Natal.
Durante a noite, Gardtzman e sua mulher, juntamente com outros holandeses, ouviram uma
música, belíssima vindo do local onde ocorreu o morticínio".
Não se discute, até hoje, a veracidade dessas informações. Diferem apenas em alguns
detalhes. No essencial, ou seja, que os holandeses promoveram dois grandes massacres, liderados
por Jacob Rabbi, com a participação dos janduís, constituem um fato indiscutível. Com relação aos
dois últimos itens é que, de uma maneira geral, existem dúvidas, colocando, ambos no plano das
lendas, fruto do espírito religioso e da ingenuidade do povo daquela época.
Na atualidade, contudo, é preciso ir além dos simples relatos para fazer uma análise de toda a
problemática.
Uma Pequena Análise Sobre as Ações Cruéis
Os massacres que os flamengos promoveram no Rio Grande do Norte não constituem um
caso isolado da colonização européia (ingleses, franceses, espanhóis, portugueses e holandeses),
nas terras americanas. Herbert Aptheker, resumiu numa palavra de ação inglesa, com relação aos
nativos: GENOCÍDIO!

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Frei Bartolomeu de Las Casas, como lembra Eduardo Bueno, chamou os espanhóis de "sujos
ladrões", "tiranos cruéis" e "sangrentos destruidores".
Georgi Friederici, em texto citado anteriormente no fascículo I desta coleção, descreve com
realismo como foi feita a conquista de Ceuta pelos portugueses.
Os conquistadores não respeitavam nada, interessados apenas em conseguir ouro e, na falta
desse metal, qualquer mercadoria que desse lucro... Tudo dentro da filosofia mercantilista.
Os europeus se julgavam detentores da "civilização" nas terras incultas da América, agiram
como se fossem verdadeiros bárbaros...
No caso específico do Rio Grande, porém, ocorreram determinadas circunstâncias, que
merecerem algumas observações.
Em primeiro lugar, os flamengos resolveram eliminar duas coisas ao mesmo tempo: os
portugueses e a religião católica. O morticínio de Cunhaú, por exemplo, foi realizado dentro de
uma capela, durante uma missa, justamente na hora em que o celebrante erguia a hóstia, numa
demonstração clara de desmoralização da religião das vítimas.
Em Uruaçu não havia um templo católico. Existe, entretanto, a presença de um pastor que
pretendia os católicos para a sua doutrina. A recusa firme dos colonos em mudar de crença,
provocou nos holandeses um ódio insano, inclusive do pastor que, de maneira incompreensível,
participou do processo de tortura. Fizeram coisas terríveis com o vigário Ambrósio Francisco
Ferro, quando ele ainda estava vivo. Somente um ódio muito grande justificaria tal atitude.
Provocado pelo fanatismo religioso.
Outro aspecto, que não é possível esquecer: os holandeses só iniciavam o massacre quando
estavam certos de que as vítimas não tinham a menor chance de reagir. Apareciam com promessas
de paz para, desarmadas as vítimas, praticarem a violência.
Não foi igualmente uma luta de um povo dominado contra seu opressor. Não a iniciativa
partiu do dominador para eliminar o povo subjugado. Os janduís receberam ordem para matar.
Agiram como soldados. Dentro de um contexto onde a violência fazia parte do existir. Os batavos,
sem dúvida, contrariaram os seus princípios, ou seja, "não matar", que dizer, massacrar! E até a
maneira de viver de pessoas CIVILIZADAS ...
A Igreja Católica do Rio Grande do Norte iniciou, recentemente, um processo para a
canonizar os mártires de Cunhaú e Uruaçu.
A questão deve ser colocada da seguinte maneira: as vítimas foram sacrificadas porque não
renunciaram à sua fé ou, na realidade, porque defenderam a causa lusitana? Eliminar o português
teria sido um problema político. Acontece que matar mulheres e crianças inocentes, sem nenhum
envolvimento político, não é justificável, a não ser pelo ódio do grupo dominador ao catolicismo.
Estava tudo preparado. Os tapuias só entrariam em cena caso os colonos não aceitassem
passar para o lado flamengo e renegassem a fé dos dominadores. Foi, ao mesmo tempo, uma
demonstração de patriotismo e, sobretudo, de fé. Quando tomaram consciência de que seriam
mortos, pronunciaram frases como, por exemplo, "LOUVADO SEJA O SANTÍSSIMO
SACRAMENTO".
Não se pode, também, colocar Jacob Rabbi como o único responsável. Após o morticínio de
Cunhaú, ele deveria ter sido afastado de suas funções. Não foi, entretanto, demitido, por uma razão
muito simples: os holandeses precisavam de Rabbi e da presença dos janduís para, pelo terror,
assegurar o domínio do Rio Grande. Os holandeses optaram, portanto, pela violência. Antes dos
massacres, vieram ordens de Recife. A conclusão é clara: o governo holandês, localizado no Recife,
é o responsável pelos massacres na Capitania do Rio Grande!
O Fim de Jacob Rabbi e do Morticínio

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Existe uma unanimidade entre os historiadores sobre o caráter violento e desnecessário dos
massacres promovidos pelos batavos, e seus aliados janduís, na Capitania do Rio Grande.
A execução dessas matanças foram comandadas, como já foi demonstrado, pelo judeu-
alemão Jacob Rabbi, que veio para o Brasil com o conde João Maurício de Nassau, em 1637,
originário de Waldeck.
Para Câmara Cascudo, ele era violento e astuto, cruel e sem escrúpulo, saqueador e mandante
de assassinatos, é a figura mais sinistra e repelente do domínio holandês no Nordeste brasileiro,
denegrida e acusada por todos os historiadores do seu tempo".
Olavo de Medeiros Filho completa o perfil de Jacob Rabbi, afirmando que o judeu-alemão
possuía "certa cultura, poliglota (pelo menos falava os idiomas alemão, holandês, português, tupi e
taraiui). De sua pena deixou uma crônica famosa, ou relação de viagem contendo preciosas
informações sobre a geografia da capitania, bem como sobre a etnografia dos tapuias".
Câmara Cascudo chama a atenção para outro aspecto: "todos os assaltos, saques, tropelias,
morticínios dos janduís rendiam gado, roupa, jóias, ao amigo Rabbi". Como resultado, o judeu
conseguiu acumular uma pequena fortuna.
Jacob Rabbi permaneceu durante quatro anos vivendo entre os selvagens. Com o passar do
tempo, crescia a afinidade entre o europeu e os tapuias, Rabbi foi assimilando os costumes nativos.
Passava por um processo de indianização. De fato, na interpretação de Câmara Cascudo, "o sórdido
e desconfiado europeu inteligente e branco, que era por dentro um cariri autêntico, desde o
temperamento aos costumes diários".
Rabbi vivia com uma nativa, de nome Domingas, num sítio de sua propriedade, chamado
"Ceará". Segundo Olavo de Medeiros Filho, "o sítio corresponde atualmente à localização
denominada Araça, ribeira do Ceará-Mirim entre Massagana e Estivas, e mesmo ao norte da cidade
de Extremoz".
No massacre de Uruaçu, foi morto João Lostau Navarro, sogro de Gardtzman que, revoltado,
decidiu se vingar, afirmando "que o mundo nada perderia se desembaraçassem de semelhante
canalha". Chegou, inclusive, a entrar em contato com dois homens para que matassem Jacob Rabbi.
Primeiro foi com Wilhelm Jansen, que colocou uma série de dificuldades. A outra pessoa foi
Roeloff Baron, que concordou em realizar a sinistra missão, caso recebesse ordens do Alto
Conselho Secreto. Nesses contatos, portanto, Gardtzman não conseguiu efetivar seu intento. Mas
não desistiu de eliminar Rabbi.
Mais adiante, convidou o seu desafeto para uma reunião, com a finalidade de promover um
entendimento e esquecer as mágoas passadas. O judeu-alemão aceitou, finalmente, participar de
uma ceia que aconteceria na casa de Dirk Mulden Van Mel, a qual, segundo Câmara Cascudo,
estava localizada nas proximidades de Refoles. Olavo Medeiros afirma que a casa de Muller "fica à
margem direita do então chamado riacho Guajaí (água dos caranguejos), entre os distritos de Igapó
e Santo Antônio do Potengi. Dista cerca de 10,5 km da matriz".
Ainda participaram desse encontro outros militares: Wilhelm Becke, Roulox Baro, Jacob de
Bolan, Denys Baltesen, Johannes Hoeck, Wilhelm Tenberghe etc.
Após a realização da conferência ente os dois desafetos, Gardtzman saiu primeiro. Pouco
depois é que Rabbi saiu. E não demorou muito tempo para que se ouvissem dois disparos de fuzil.
Caía, mortalmente ferido, Jacob Rabbi. A vítima recebeu, além dos tiros, golpes de sabre que
deformaram partes do cadáver.
Ficou provado, mais, uma vez, que a violência provoca violência, Jacob Rabbi, que praticou
assaltos e crimes, sendo um dos responsáveis, pelos massacres de Cunhaú e Uruaçu, morreu como
conseqüência do ódio, tendo seu corpo deformado por golpes de sabre. Olavo Medeiros descreve a

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situação em que o corpo foi encontrado: "Um dos tiros penetra-lhe do lado esquerdo do corpo,
fazendo-lhe um ferimento muito profundo, em que Muller pudera introduzir até o fim dos seus
dedos. A outra bala varara-lhe o lado direito das costelas falsas. Seis golpes de armas branca
haviam-lhe deformado o rosto, a cabeça e o braço direito. Um dos olhos do cadáver estava aberto;
as suas algibeiras achavam-se voltadas e esvaziadas. Faltava-lhe um anel de ouro, que ainda trazia
no dedo quando se retirara da casa de Muller".
O crime ocorreu na noite de 4 de abril de 1646.
Jacob Rabbi foi sepultado no lugar onde morreu. Gardtzman, ao ser informado do crime,
cinicamente disse:
- "Antes ele do que eu".
Apesar de ter negado se o mandante do crime, ficou provado que houve um acordo entre
Gardtzman e Bolan para matar e depois roubar os bens de Jacob Rabbi.
Domingas foi despojada, totalmente, dos bens de seu companheiro.
Os janduís, decepcionados, voltaram para o sertão. Não houve mais morticínio na Capitania
do Rio Grande.
O Brasão Holandês do Rio Grande
O conde Maurício de Nassau, e, 1639, deu a cada capitania o seu brasão. O do Rio Grande foi
descrito por Barléu desta maneira: "A província Rio Grande tinha por armas um rio, em cujas
margens pisava ave. Havia, ainda, uma estrela de prata, na parte superior e o mote: velociter".
Para alguns autores, a ema foi escolhida para ilustrar o brasão, porque essa ave existia em
grande número na referida região. Câmara Cascudo, contudo, discorda e afirma: "a ema nunca foi
em tempo algum característica da fauna norte-rio-grandenses e especialmente no domínio holandês
". Mais um argumento apresentado por Câmara Cascudo" "caso Nassau desejasse colocar algo
característico da capitania, teria, naturalmente, escolhido o gado, uma das razões para a conquista
da região". E aponta outro motivo para a escolha da ema: uma homenagem de Nassau a um grande
chefe cariri, Janduí, amigo dos holandeses, desenvolvendo uma argumentação convincente: "Janduí
é o chefe das tropas fiéis, prontas, irresistíveis (...) Janduí é nome tupi, corrução de NHANDU, uma
pequena e por autonomia, o corredor, o que corre muito. Daí o lema, VELOCITER", num estudo
publicado na regista do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.
Câmara Cascudo chegou a dizer o seguinte: "sem Janduí a companhia não sustinha o Rio
Grande duas semanas. Natural, portanto, que Nassau prestasse uma homenagem ao fiel amigo. E,
ainda, os janduís eram notáveis pela rapidez com que se deslocavam. Justificando, assim, o mote
"VELOCITER". Razão, portanto, tem Câmara Cascudo quando concluiu que "Janduí é a ema do
brasão holandês no Rio Grande do Norte".
O Governo Holandês no RN
As se apossarem do Rio Grande, os holandeses mudaram o nome da fortaleza para Castelo
Ceulen. Natal passou a se chamar Amsterdã (ou Nova Amsterdã). Logo após a conquista, Joris
Gardtzman assumiu o governo sozinho.
Em 1637 foram criadas as Câmaras dos Escabinos, presididas pelo esculteto, cargo que
correspondia ao de prefeito, na atualidade. Havia ainda os curadores autonomia.
O Rio Grande não possuía autonomia administrativa, "dependia da justificação da Paraíba
onde residia um diretor".
Durante o domínio holandês, nada foi feito que dignificasse um governo. Havia somente duas
preocupações: dominar e explorar economicamente a região. Isso significa dizer eliminar qualquer
resistência, que política, quer religiosa, para assegurar a exploração econômica. Subjugar pelas
armas para garantir o fornecimento de carne bovina e de farinha. Nesse aspecto, a administração

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batava, no Rio Grande, obteve êxito, garantindo o alimento necessário para que os invasores
pudessem ser mantidos em Recife. Caso contrário, eles teriam duas opções: abandonar Pernambuco
ou morrer de fome...
Como mostra Tarcísio Medeiros, "a mestiçagem continuou no período holandês: a dos bugres
com portugueses ou holandeses, que produzia, no dizer de um cronista flamengo "belos tipos de
mulheres e homens. Do contato de mulheres brasileiras, tanto com portugueses como com
neerlandeses, nascem muitos bastardos, entre os quais não raro se encontram formosos e delicados
tipos quer de homens, quer de mulheres". Tarcísio Medeiros transcreveu essa última parte do texto
do livro de "História do Brasil", vol. 2. De Ernani Silva Bruno. E cita o testemunho de Gilberto
Freyre: "Seriam tais louros, em alguns casos, restos de normandos ou de flamengos do século
XVI".
Em 1654 termina, para a felicidade dos que ainda restavam da população, o domínio
holandês no Rio Grande. Quando o capitão Francisco de Figueirora, comandando 850 soldados,.
Vinha reassumir o governo da capitania, o Rio Grande era apenas abandono e ruínas, inclusive a
capital que praticamente foi destruída.
O Potiguar Antonio Felipe Camarão
Existe uma controvérsia na historiografia norte-rio-grandense a respeito de um chefe nativo,
dos potiguares, chamado Poti (Potiguaçu), que ao receber o batismo, passou a se chamar Antônio
Felipe Camarão.
Para alguns historiadores, em lugar de um tuixaua, teriam existido dois com o mesmo nome
Poti, sendo que o primeiro participou das negociações de paz entre portugueses e potiguares na
Capitania do Rio Grande. E o outro, filho dele, se destacou com brilhantismo durante a guerra
contra os holandeses.
Olavo de Medeiros Filho, no seu mais recente livro "Aconteceu na Capitania do Rio Grande",
divulgou parte de uma carta escrita por Felipe Camarão, que diz o seguinte: "mi Padre fue ator de
loss pazes tan desseadas que mi nacion, y gente hizieron com los portugueses".
Antonio Felipe Camarão, ao dizer que seu pai foi o autor das pazes, comprovou a existência
de dois chefes potiguares, com o mesmo nome, seu pai e ele.
Segundo o grupo de pesquisadores, o pai seria norte-rio-grandense e o filho teria nascido em
terras pernambucanas.
Essa tese, entretanto, não apresenta uma sólida argumentação. A grande prova, apresentada
pelos defensores dessa teoria, é, a existência, na Torre do Tombo, em Lisboa, de um depoimento
prestado por Antonio Felipe Camarão, num processo instaurado pela Inquisição de Lisboa contra o
padre Manuel de Moraes, quando o chefe potiguar afirmou que morava na aldeia de Meratibi.
O historiador pernambucano Mário Mello colocou a aldeia de Meraribi (Miritiba) nas terras
de sua família.
Ingenuidade ou simples coincidência?
Pedro Moura constata, através "de uma carta de doação e sesmaria, passada por Ordem do
Capitão do Rio Grande na Cidade de Natal, em 28 de fevereiro de 1706, SEBASTIÃO NUNES
COLLARES, mais de três léguas de terra de rio abaixo anexados com s que os religiosos
Carmelitas já tinham obtido anteriormente. Esta fazenda do Carmo está situada à margem da
estrada real que vai da cidade de Assu à cidade de Mossoró, na ribeira do Panema, cujo rio corre e
deságua em território exclusivamente rio-grandense do Norte, com o mesmo leito que tinha,
quando nasceu, viveu e morreu Potyguaçu.
Após transcrever esse texto, Pedro Moura fez o seguinte comentário: "Foi nessa ribeira do
Panema, no seu afluente Meiritupe, que se encontrava a aldeia Meretipe ou Meretibe, aonde residia

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DOM ANTÔNIO FELIPE CAMARÃO, como diz ele no seu depoimento, no processo do padre
MANOEL DE MORAES e foi desse SERTÃO DONDE DESCEU, trazendo consigo todos os
índios que lhe eram sujeitos, como todas as suas mulheres e filhos, como diz Calado. Meretibe ou
Merebiti, aldeia de potiguares, jamais pertenceu à Capitania de Pernambuco e sim à do Rio Grande.
Estava ao lado do rio do mesmo nome, descoberto por GEDEÃO MORRIS, com mais outro dois
rios, oo lwypanim e Wararacury, quando lá esteve em 1641".

DOS BÁRBAROS A 1917


O Governador dos Índios
Tradição de Bravura Vai de Pai Para Filho
A simples existência de uma aldeia com o nome de Meratibi, em Pernambuco, não significa
que essa aldeia tenha sido a povoação à qual dom Antônio Felipe Camarão se referiu em seu
testemunho. E mesmo que o historiador pernambucano estivesse certo, a palavra que se encontras
no documento citado é "residia" e, claro, existe uma diferença entre "residir" e "nascer". Esse
documento, portanto, não prova que o chefe potiguar tenha efetivamente nascido em Pernambuco...

Meratibi é o nome de uma aldeia pernambucana com grafia semelhante à de outra aldeia
potiguar chamada de Merebiti ou Meretibi. O escritor Mário Mello aproveitou essa semelhança
para forjar a sua teoria de que Felipe Camarão teria nascido em Pernambuco.
Outro aspecto que se deve destacar: Luís da Câmara Cascudo provou que existe no Rio
Grande do Norte uma tradição popular sobre dom Antônio Felipe Camarão entre pessoas iletradas,
no interior e na época em que ele realizou a pesquisa, na década de trinta. As mulheres que foram
consultadas desconheciam totalmente a controvérsia sobre Felipe Camarão. Disse Câmara
Cascudo: "Essa tradição popular da naturalidade de Camarão é um ponto de referência de singular
força argumentadora. Nenhum outro Estado disputante de seu berço pode empregar as mesmas
armas. Essa tradição oral só existe no Rio Grande do Norte, onde dom Antônio Felipe Camarão é
tido como conterrâneo".
Caso Felipe Camarão tenha morado realmente na Mirituba pernambucana - Pedro Moura
provou que não -, ele já havia nascido e se encontrava na idade adulta, dirigindo o seu povo. Foi
assim que ele deixou o Rio Grande para lutar contra os holandeses em Pernambuco.
Falta ainda comentar outro argumento a favor da tese pernambucana. Em uma carta,
Henrique Dias disse o seguinte: "Meus senhores Olandeses, meu Camarada o Camarão não está
aqui, porém eu respondo por ambos. Vossas Mercês, saibam que Pernambuco é sua pátria e minha,
e que já não podemos sofrer tanta ausência d'ella! Aqui havemos de deitar vossas mercês fora
d'ella".
A questão é fácil de explicar. Com a palavra, novamente, Pedro Moura: "De fato, Camarão
nasceu nesta província, isto é, na circunscrição naquele tempo criada por D. Diogo de Menezes,
Capitania do Rio Grande do Estado do Brasil", sujeita a um só governo geral, como parte
integrante de uma província militar - Pernambuco".
"Da mesma maneira frei Calado chamou "índios brasileiros, índios da terra, índios
pernambucanos", os nossos índios, indistintamente, nascido na província limitar de Pernambuco,
fossem eles tabajaras, fossem potyguares, fossem cahetés".
Em síntese, a "pátria pernambucana" não significava apenas Pernambuco, porém uma área
bem mais ampla que incluía inclusive o Rio Grande. E Antônio Felipe Camarão, ao dizer que
lutava pela pátria pernambucana, estaria também se referindo ao seu pequeno Rio Grande.

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Henrique Dias, ao dizer "pátria", não estava se referindo exclusivamente à Capitania de
Pernambuco, porque ele não pretendia expulsar os holandeses apenas de uma capitania, mas de
todo o Nordeste.
A conclusão que se extraia de tudo o que foi dito é o seguinte: existiram realmente dois
chefes potiguares, pai e filho, que possuíam o mesmo nome - Poti. O filho foi quem partiu do Rio
Grande para lutar contra os holandeses, em Pernambuco. O que não se comprova é que ambos
nasceram no Rio Grande do Norte.
As controvérsias não terminam aqui. Antes se imaginava que havia só um Poti. Agora,
provado que existiam dois, não fica fácil esclarecer os fatos em que ambos se envolveram. Quem
fez tal empreendimento, foi o pai ou o filho? É preciso realizar, urgentemente, uma investigação
séria sobre o problema.
Dom Antônio Felipe Camarão nasceu, provavelmente, na Aldeia Velha, no ano de 1580.
Com relação ao seu batismo, Nestor Lima aponta para o dia 13 de junho de 1612 e parece
estar certo. Naquele dia, ao se tornar cristão, o potiguar tomou o nome de Antônio Felipe Camarão.
O primeiro nome teria sido uma homenagem ao santo do dia, Santo Antônio. O segundo nome seria
uma homenagem a Felipe IV, rei da Espanha. E, finalmente, Camarão, que é tradução portuguesa
do seu nome primitivo em tupi: Poti.
No dia seguinte ao do seu batizado, Felipe cassou com uma de suas mulheres que, na pia
batismal, recebeu o nome de Clara. As solenidades do batizado e do casamento foram realizadas
em grande estilo na Capela de São Miguel de Guajerú.
Antonio Soares, no "Dicionário Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte", transcreve
a opinião de D. Domingas do Loreto: "Na guerra da restauração de Pernambuco, ostentou D. Clara,
mulher do governador dos índios. D. Antônio Felipe Camarão, o seu insigne valor com os mais
ilustres realces: porque, armada de espada e broquel, e montada em um cavalo, foi vista nos
conflitos mais arriscados ao lado do seu marido, com admiração do holandez e aplauso dos
nossos".
D. Antônio Felipe Camarão, além de grande guerreiro, foi igualmente hábil estrategista. Sua
maior vitória foi contra o general Arcizewski, que sentiu humilhado ao perder para um chefe
nativo. São suas as seguintes palavras, transcritas por Antônio Soares, no "Dicionário Histórico e
Geográfico do Rio Grande do Norte" : "Há mais de quarenta anos - disse o general - que não milito
na Polônia, Alemanha e Flandres, ocupando sem interrupção postos honrosos, mas só o índio
brasileiro Camarão veio abater-me o orgulho".
O valente chefe potiguar, pelo seu desempenho contra os inimigos, recebeu diversas
honrarias: o título de "Dom", dado por Felipe IV; Brasão de Armas; "Capitão Mor e Governador de
Todos os índios do Brasil", e as comendas "Cavaleiro da Ordem de Cristo" e dos "Moinhos de
Saure".
Dom Antonio Felipe Camarão morreu, segundo alguns autores, a 24 de agosto de 1648,
sendo sepultado na Várzea, em Pernambuco.
A Guerra dos Bárbaros
Um Prenúncio de Forte Tempestade
Após a expulsão dos holandeses, a Capitania do Rio Grande apresentava o seguinte quadro,
descrito por Câmara Cascudo: "a Capitania ficou devastada. A população quase desapareceu.
Plantios, gado, destruídos. Os flamengos tinham incendiado as casas principais, queimando livros
de registro".
Antônio Vaz Gondim assimiu o governo, tomando medidas para reorganizar a capitania,
partindo praticamente do nada. Reconstruindo edifícios )Fortaleza e Matriz), organizando a defesa

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da cidade, mas, sobretudo, iniciando uma política de povoamento. Lançou os fundamentos de uma
infra-estrutura para que fosse possível efetivamente governar a capitania.
Nuvens negras, contudo, começavam a se acumular no horizonte, num prenúncio de
tempestade...
Os colonos que viviam no interior, sem recursos para a aquisição de escravos africanos,
capturavam nativos. Mais do que isso, os sesmeiros provocavam os naturais da terra para que eles
lutassem contra os seus vizinhos, ou, então contra os brancos, que assim promoveriam a chamada
"guerra justa", obtendo maior número de escravos. As vítimas tinham duas opções: submeter-se,
sofrendo todo o tipo de humilhação, ou recebelar-se.
A situação se agravou porque, como disse Tavares de Lyra, os holandeses voltaram ao
Nordeste com um único objetivo: levantar os silvícolas do Rio Grande do Norte contra os
portugueses. Os holandeses que se casaram com as viúvas lusitanas pleiteavam os bens de suas
esposas ...
Tavares de Lyra chama a atenção para o fato e acrescenta: "dada a situação esta consulta faz
entrever, é provável que mais tarde, quando ainda se arrastavam na Europa as negociações para
ajustes internacionais, os ex-dominadores mantivessem insidiosamente as ferramentas de agitação
na colônia, para deles tirar partido, assim como que incitassem a virem para o Brasil fazer causa
comum com os revoltados".
Os portugueses cobiçavam as terras dos silvícolas, procurando se apossar delas, através do
extermínio ou empurrando os nativos para o interior. Irritando, dessa maneira, os tapuias e os
potiguares.
Tarcísio Medeiros é mais taxativo: "Essa forma de expansão sem respeito aos bens dos
índios, que ainda eram preados para o eito escravo, concorreu para os primeiros atritos, o correr de
sangue de uma guerra que, por espaço de cinqüenta anos, chamada "Guerra dos Bárbaros", o Rio
Grande, mal nascido, só conheceu violências, extorsões, vilipêndio e rapinagem".
Ambição dos Colonos Revolta os Índios
Não foi uma guerra comum.
Os nativos, diante das constantes provocações dos colonos, revoltaram-se. As tribos às vezes
se aliavam e, em outras oportunidades, lutavam sozinhas. Não houve, entretanto, nenhuma
confederação. Muito menos um comando único, ao qual todos obedecessem. Tratava-se muito mais
der uma reação contra as perseguições dos brancos que, inclusive, tinham interesse em manter
acesso o fogo da revolta: com a manutenção do conflito, aos poucos, os naturais da terra seriam
exterminados.
Em 1685, os janduís já demonstravam descontentamento. Em 1687, a situação se agravou,
sendo descrita por Câmara Cascudo da seguinte maneira: "Os indígenas corriam incendiando,
matando o gado e os vaqueiros e plantadores do sertão (...). Mais de cem homens mortos".
O capitão-mor Pascoal Gonçalves de Carvalho, desesperado, pediu ajuda aos seus colegas de
Pernambuco e Paraíba, além do Senado da Câmara de Olinda.
A situação era crítica de fato. Os silvícolas avançavam rumo à capital. Atingiram Ceará-
Mirim, próximo de Natal. Para se defenderem, os colonos construíram casas-fortes e paliçadas.
Alguns reforços foram enviados para a capitania, como o terço dos paulistas e,
posteriormente, Domingos Jorge Velho. Não conseguiram terminar a guerra, apesar de seus
esforços. É que a solução para o conflito dependia muito mais de visão administrativa, habilidades
e espírito de justiça do que força e armas. O que mantinha a guerra era, sem dúvida, a ambição e a
crueldade de determinados colonos que almejavam a todo preço as terras que pertenciam aos
nativos... Mesmo que, para isso, fosse preciso exterminar os verdadeiros donos das terras! Mas os

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portugueses e seus descendentes necessitavam da proteção dos soldados para atingir tais
objetivos... Acontece que, por falta de recursos, os soldados não estavam sendo pagos. Passando
fome, desertavam. E mais, como disse Cascudo, as tropas "estavam obstruídas pela displicência,
indiferença, descaso, ignorância, os pecados dos desinteresse que a distância multiplica".
A guerra, portanto, continuava variando de intensidade. E continuaria sempre, caso não fosse
enviado para o Rio Grande do Norte um líder que desejasse acabar com o conflito, lutando contra
os interesses dos oportunistas e dos aventureiros, devendo se impor pela energia e, sobretudo, por
seu espírito de justiça!
Fim do Conflito e Paz com os Nativos
Em 1695, Bernardo Vieira de Melo assumiu o governo da capitania. Veio com objetivo de
pacificar os nativos. Todo o seu trabalho foi desenvolvido nesse sentido. Fundou o Arraial de Nossa
Senhora dos Prazeres, em 24 de abril de 1696. Permaneceu dois meses na região, tomando todas as
medidas que fossem necessárias para manter a paz entre os colonos e os nativos. Enfrentou mil e
uma dificuldade. Que deveriam ser mantidos pela população local. Sobre a sua atuação, disse
Tarcísio Medeiros: "Bernardo Vieira de Melo, com atitudes firmes e demonstrações de suas forças,
somente usou desses recursos para fazer-se respeitar e, ao mesmo, atrair e agradar os silvícolas,
criando, desta forma, um clima de confiança que permitiu o diálogo entre as partes e o ajuste de
condições capazes de satisfazer a todos".
Diante de sua atuação, o Senado da Câmara de Natal pediu a prorrogação do mandato de
Bernardo Vieira de Melo. A solicitação foi aceita. O capitão-mor, contudo, além de enfrentar uma
série de vicissitudes, sofreu alguns aborrecimentos com a rebeldia e os desmandos de Moraes
Navarro que, finalmente, foi forçado a entregar os nativos que estavam presos, sob pena de ser
excomungado pelo bispo D. Frei Francisco de Lima. Navarro teve que se retirar da região,
vencendo a causa o capitão-mor do Rio Grande.
Bernardo Vieira de Melo conseguiu mais duas conquistas: que fosse dada "a cada Missão
uma légua de terra em quadrado, medida e demarcada", e que a Capitania do Rio Grande passasse
da jurisdição da Bahia para Pernambuco, fato que ocorreu em 11 de janeiro de 1701.
E foi graças ao seu esforço, energia e persistência que Vieira de Melo conseguiu pacificar os
nativos.
Feitos e Sonhos de Vieira de Melo
Nasceu em Muriboca (hoje Jaboatão), no Estado de Pernambuco, sendo filho de Bernardo
Vieira de Melo. Em primeira núpcias, casou-se com D. Maria de Barros, com a qual não teve
filhos. Casou-se, pela segunda vez, com D. Catarina Leitão, tendo quatro filhos.
Antonio Soares considera Bernardo Vieira de Melo um homem "enérgico, justiceiro, operoso,
patriota". Como Bernardo Vieira de Melo se envolveu em acontecimentos trágicos, contrariando
interesses e, ainda, defendeu idéias perigosas, como a proclamação de uma república para o Brasil,
foi duramente criticado, sendo preso e morrendo na prisão.
O que não se pode negar é que foi um grande soldado.
Exerceu as seguintes funções, antes de governar a Capitania do Rio Grande: Capitão do Rio
Grande: Capitão de Infantaria das Ordenanças, Capitão de Cavalos e Tenente-Coronel. Distinguiu-
se na luta contra o Quilombo de Palmares.
Foi também um bom administrador. Ocupou os cargos de capitão-mor do Rio Grande,
quando pacificou a região que vivia num clima de permanente hostilidade entre os nativos e os
colonos portugueses. Homem inteligente, compreendeu logo que os silvícolas se rebelavam porque
eram provocados pelos brancos. E adotou como lema, conforme relata Tarcísio Medeiros, "não
combater o nativo de forma desumana". Coerente com esse princípio, não promoveu nenhuma

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guerra contra o gentio. Evitou, com energia, que os nativos fossem provocados, porque a ameaça
era realmente a ambição dos portugueses que desejavam as terras dos selvagens... Agiu, portanto,
sem derramar sangue.
A luta era, porém, árdua e difícil. Cansado, pediu substituto no dia 5 de junho de 1700.
Bernardo Vieira de Melo foi um homem de princípios rígidos, que não permitia o menor
deslize. Ao saber que seu filho, segundo informações maldosas, estava sendo traído pela esposa,
agiu rápido e precipitadamente. Mandou matar o possível amante de D. Ana Tereza, capitão-mor e
morgado de cabo, João Paes Barreto. Pouco depois, D. Ana Tereza foi assassinada...
Vieira de Melo também ousou sonhar com uma república independente de Portugal, como
esclarece Tarcísio Medeiros: "Líder da corrente emancipacionista que no Senado da Câmara de
Olinda propões a instituição de uma república à moda de Veneza, livre da tutela portuguesa".
Possuindo tais idéias, foi acusado, justamente com seu filho André, do crime de inconfidente e de
lesa-majestade. Não suportando a perseguição, os dois, pai e filho, se apresentaram às autoridades.
Foram levados para Lisboa, ficando na prisão de Limoeiro, onde vieram a falecer. O fim trágico
desses dois homens foi narrado, por Tarcísio Medeiros, da seguinte maneira: "Bernardo, numa
noite muito fria, acendera no quarto um fogareiro de carvão e pela manhã foi encontrado morto,
sufocado pelas emanações de gás carbônico. Quanto ao filho André, morria logo depois de um
ataque cardíaco, quando se entretinha a jogar com outros presos".
Administração e Economia
O Poder Executivo na Fase Colonial
O poder Executivo era exercido pelo capitão-mor (de 1598 até 1821), com exceção de
período sob a dominação holandesa. Como disse Tarcísio Medeiros, "a sua ação exercia-se mais
imediatamente na manutenção da ordem pública, na inspeção das tropas e fortalezas, na proteção
devida às autoridades outras da capitania, às quais podiam representar, ficando todos os seus atos
sujeitos à devassa, quando deixassem o governo".
Era nomeado através de um documento chamado Carta-Patente, menos o primeiro, João
Rodrigues Colaço, designado inicialmente pelo governador geral do Brasil e confirmado no cargo
posteriormente por um Alvará Régio.
O cargo recebeu várias denominações "Capitão-Mor do Rio Grande (até 1739), "Capitão-Mor
co Rio Grande do Norte", para diferenciar de outra capitania, na região meridional do Brasil, Rio
Grande do Sul, cuja colonização foi consolidada pelo Tratado de Madri. Em 1797, mais um nome
"Governador e Capitão-Mor do Rio Grande do Norte" e, finalmente, de 1811 até o último, em
1816, nova mudança para Governador do Rio Grande do Norte.
Além do Executivo, havia o Provedor da Fazenda que recebia os impostos.
A administração municipal estava entregue ao Senado da Câmara, funcionando no consistório
da Matriz de Nossa Senhora da Apresentação. Presidida por um juiz ordinário. Durante o império,
foi transformado em Câmara Municipal (25/03/1824).
Até 1770, seis de seus membros substituíam o capitão-mor, por sua morte ou qualquer outro
impedimento.
A partir daquela data, o capitão-mor passou a ser substituído por uma junta, formada pelos
seguintes membros; vereador mais velho, comandante da fortaleza e o juiz ouvidor.
A capitania tinha apenas um município: Natal. Depois, surgiram São José do Mipibu, Arês,
Vila Flor, Vila do Príncipe, Vila Nova e Vila do Regente.
Estrutura do Poder Judiciário
A autoridade máxima da comarca era o ouvidor. Primeiro, nomeado pelos donatários das
capitanias, e depois, pelo próprio rei.

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Ivoncísio Meira de Medeiros, entretanto, esclarece o seguinte: nunca tivemos, nessa fase, um
Ouvidor ou um Juiz de fora. Quando se pensou na nomeação de um Juiz de fora para esta capitania,
o Senado da Câmara fez ver ao Conselho Ultramarino, em Lisboa, a inconveniência dessa
Nomeação". (...)
"Uma organização judiciária autônoma somente conquistamos em 18 de março de 1818,
quando, por força de alvará de D. João VI, passamos a constituir uma comarca, com sede em Natal
e independente da Paraíba".
Além dessas duas autoridades citadas, havia outras, que eram as seguintes: juiz ordinário,
almotacé (ou almotacel, inspetor encarregado da aplicação exata dos pesos e medidas e da taxação
dos gêneros alimentícios), juiz da vintena e, ainda, alcaides, escrivãs dos almotacés etc.
O Pelourinho e Seus Significados
Falando sobre o Pelourinho, disse Câmara Cascudo: "Símbolo de sua autonomia e jurisdição
municipal, atesta a presença da justiça permanente e os direitos da população governar-se por
intermédio de seus eleitos".
E mais adiante acrescenta o seguinte "O Pelourinho é a imagem originária da Independência
Municipalista, a liberdade administrativa dos conselhos, a soberania democrática expressa na letra
dos forais". Pelourinho é lembrado, por alguns, como o lugar onde os criminosos eram punidos
publicamente, sobretudo, os escravos. Era, dessa maneira, a deformação do significado do
Pelourinho. Câmara Cascudo explica o porquê dessa mudança: "Depois é que com a predominância
dos reis, usurpando pela força as liberdades do município, o Pelourinho, encimado pela coroa Real,
dizia ser uma testemunha da onipotência arbitrária do monarca".
O Pelourinho da cidade ficava na atual praça André de Albuquerque, em frente ao Senado da
Câmara e cadeia, informa Câmara Cascudo.
Não se sabe a data no qual o Pelourinho foi erigido. Em 1695 já se colocava editais ou
bandos no Pelourinho, costume que se tornou tradição até, possivelmente, em 1806.
Nas comemorações da Independência do Brasil, o Pelourinho foi derrubado porque, na
opinião dos manifestantes, certamente representava o símbolo da opressão imperial.
Atualmente, depois de mudar de lugar algumas vezes, o Pelourinho se encontra na sede do
Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.
Ciclos Econômicos e Períodos de Seca
O primeiro ciclo econômico do Rio Grande do Norte, foi, como ocorreu com o Brasil de
forma geral, o do "pau-brasil". Além dos portugueses, outros europeus se beneficiaram da extração
dessa madeira cobiçada. Principalmente os franceses, que entraram em contato com os nativos e,
contando com a amizade dos potiguares, exploraram e contrabandearam o pau-brasil para a Europa.
Expulso o francês, o desenvolvimento se arrastava de maneira muito lenta. Predominou, no
início da colonização portuguesa, o interesse militar: a defesa da região e a expansão rumo ao
Norte.
Em 1615, havia apenas o engenho de Cunhaú funcionando. A capitania apresentava uma
situação melhor em 1630: "iniciava-se a produção açucareira e o ciclo do gado progredia:, ressaltou
Câmara Cascudo. Começava o povoamento do sertão, seguindo-se a expansão da criação de gado
rumo aos vales do Açu e Apodi e, igualmente, à região do Seridó, Istvam Lázio A'rbocz analisa
esse processo: "o ciclo do gado promoveu o desenvolvimento e o povoamento, embora de maneira
muito esparsa, de toda a Capitania do Rio Grande do Norte - condicionada pela própria atividade
econômica básica (...) A atividade agrícola desenvolvia-se mediocremente à sombra dos "currais",
voltada para o abastecimento das populações locais".

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O ciclo do gado criou uma maneira de viver própria, ou seja, uma cultura especial caracteriza
pelo "individualismo do seu participante", segundo Câmara Cascudo. Continua o mesmo autor:
"Dá-lhe a noção imediata de independência, de improvisação, de autonomia, de livre arbítrio, de
arrojo pessoal".
No século XVIII, a economia se baseava, principalmente, em duas fontes: a agricultura e a
indústria pastoril. A cultura da mandioca chegou a produzir cerca de 56.400 alqueires de farinha.
Por outro lado, a indústria pastoril cresceu bastante. Como lembra Tarcísio, "além de fornecer gado
às feiras da Paraiba e Pernambuco, os criadores de Mossoró ou Açu nas oficinas" exploravam a
indústria de carne seca.
Garibaldi Dantas, em um estudo realizado no início do século XX, trata da dependência da
agricultura da "boa ou má distribuição do regime pluviométrico". Essa afirmação é perfeitamente
válida para os séculos anteriores. Dois fatores, portanto, influenciavam a produção agrícola: a seca
e os açudes. O primeiro fator, a seca, foi definido por Garibaldi Dantas da seguinte maneira: "As
secas são fenômenos climatológicos caracterizados pela deficiência, a irregularidade ou má
distribuição das precipitações pluviáticas".
A seca, ao contrário do que possa imaginar, "vêm de datas antiquíssimas na nossa cronologia
histórica". A primeira que se tem notícia data de 1600, em pleno século XVII. A seca atinge, e
muito, a pecuária, desorganização a criação de gado.
No século XVII foram registradas cerca de quatro secas (1600, 1614, 1691, 1692) e no
período seguinte o fenômeno se repetiu em número bem maior, num total de vinte e uma: 1710,
1711, 1723, 1724, 1726, 1727 etc.
Segundo D. José Adelino Dantas, "foi nesse século que se verificou a mais longa e mais
calamitosa de todas as secas do Nordeste, abrangendo cinco anos consecutivos, de 1723 a 1727,
inclusive".
O gado bovino apresenta semelhança com a raça "Garaneza", provavelmente introduzida no
Estado pelos franceses, e "Cacacú, possivelmente vinda do Ceará. O fato é que o gado se
apresentava com uma grande fecundidade. Como comprova Garibaldi Dantas: "cinco anos após
uma seca, o criador vê recompor-se rebanhos por ela destruídos".
Conjuntura da Época Gera Várias Rebeliões
A existência do "pacto colonial, que desde o descobrimento regulamentava as relações
"colônia-metrópole, vai ser responsável por uma série de rebeliões no período compreendido entre
1680 e 1817. Estão incluídas as Revoluções de Beckmam (Maranhão/1684), Guerra dos Emboabas
(região da descoberta do ouro/1709), Guerra dos Mascate (Permanbuco/1710), Revolta de Felipe
dos Santos (Vila Rica/1720), Conjuração Mineira (Vila Rica 1789), Conjuração Baiana
(Bahia/1798) e finalmente Revolução Pernambucana (Nordeste/1817).
Esses movimentos representaram no seu conjunto, apesar das particularidades locais de cada
um deles, uma resposta à metrópole que, através do rígido sistema da exclusividade comercial,
sufocava economicamente a colônia.
Para o Nordeste brasileiro, o mais significativo desses movimentos foi a rebelião de 1817
que, tendo se iniciado em Pernambuco, estendeu-se por quase toda região.
O Movimento em Pernambuco
Como as demais rebeliões da época, a de 1817 teve entre suas causas principais a rivalidade
entre portugueses e brasileiros. Afirma-se que os brasileiros nunca alcançavam postos elevados nas
milícias, que eram sempre comandadas por portugueses. Mas nesse contexto, o quadro econômico
não pode ser esquecido. Secas constantes, queda no mercado internacional do preço do açúcar e do
algodão levaram a uma recessão econômica de grande significado. Os abusivos impostos, cobrados

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pela metrópole para manter a corte portuguesa que ainda se encontrava no Brasil, completou o
panorama do qual a revolução deflagraria.
Informado de que se tramava no Recife um movimento de caráter nativista, e também sobre o
nome dos envolvidos na conspiração, o então governador, capitão-general Caetano Pinto de
Miranda Montenegro, ordenou a prisão de todos os comprometidos. A prisão dos civis foi efetuada
quase sem reação. Porém, ao receber a ordem de prisão, o capitão José Barros Lima. "O Leão
Coroado", reagiu ferindo mortalmente o enviado ao governo que tentava detê-lo.
Iniciou-se, assim, o movimento que tratou de organizar um governo provisório, no qual havia
representantes de quase todos os segmentos da sociedade. Faziam parte do grupo; Domingos José
Martins, o representante do comércio; José Luís Mendonça, pela magistratura; Domingos Teotônio
Jorge, escolhido o comandante em armas pelos militares; o padre João Ribeiro, pelo clero; Manuel
Correia de Araújo, pelos agricultores, e como secretário do interior foi nomeado o padre
Miguelinho. Para conselheiros foram escolhidos o ouvidor (autoridade judiciária) Antônio Carlos
Ribeiro de Andrada; o dicionarista Antonio de Morais Silva, e o comerciante Gervásio Pires
Ferreira. Para autoridades eclesiástica, o deão Luís Ferreira.
Uma nova "Lei orgânica" foi adotada pelo governo, que vigoraria até a elaboração de uma
Carta Constitucional. Dentre outras providências, a nova lei determinava:
forma republicana de governo;
liberdade de imprensa e religião;
manutenção do direito de propriedade e da escravidão.
A reação foi organizada por D. Marcos de Noronha e Brito, que contou com o apoio de
comerciantes portugueses do Recife e de alguns rebeldes mais moderados que temiam o caráter
socialista do movimento. Recife foi bloqueada e, em maio de 1817, já estavam presos os
revoltados, depois de violenta repressão.
O fim do movimento não apagou definitivamente a chama revolucionária no Nordeste. Ela
voltaria a aparecer em 1824, na "Confederação do Equador".
Adesão de André de Albuquerque Maranhão
A Capitania do Rio Grande do Norte, à época da revolução, era governada por José Inácio
Borges que, ao ser informado do movimento pernambucano, preparou-se para resistir. Tratou de
entrar em contato com o comandante de Divisão do Sul, André de Albuquerque Maranhão, que se
encontrava em Goianinha. Chegaram a conferenciar por cerca de duas horas sobre a segurança da
capitania frente aos acontecimentos de Pernambuco. No retorno a Natal, o governador pernoitou no
Engenho Belém, próximo à atual cidade de Nísia Floresta. Ao amanhecer, José Inácio Borges viu
que o engenho estava cercado pelas tropas sob o comando do próprio André de Albuquerque, que
aderira ao movimento. Preso, o agora ex-governador José Inácio Borges foi enviado a Recife.
André de Albuquerque Maranhão entra solenemente em Natal com sua tropa no dia 28 de
março, dando início ao governo revolucionário, cuja sede seria o Edifício das Provedorias da
Fazenda ou Real Erário, onde atualmente funciona o memorial Câmara Cascudo.
Da junta governamental faziam parte Antônio Germano Cavalcanti de Albuquerque , capitão
de infantaria; coronel de milícias Antonio da Rocha Bezerra e o padre Feliciano José Dornelas,
vigário de freguesia.

* História do Rio Grande do Norte (Parte 2 de 5)

INDEPENDÊNCIA DO BRASIL
Insucesso da Revolução

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Monarquistas Vencem André de Albuquerque
Nada foi feito pelo governo revolucionário. A promessa de aumento de soldo aos soldados não é
cumprida. A ação se limitou a arrancar a Coroa Real da Câmara em Extremoz, o que foi feito por
Rego Barros.
"Uma fase triste e cinzenta. No Palácio da Rua Grande que teria seu nome, André trabalha ou vive
junto do Padre João Damasceno. Nenhuma irradiação; nenhuma popularidade; nenhuma conquista;
nenhuma vibração...", narra Câmara Cascudo.
A reação monarquista, no Rio Grande do Norte, parte da residência do alfaiate Manuel da Costa
Bandeira. É de lá que surgem os contra-revolucionários, depois das noves badaladas do sino da
Igreja, o sinal pré-determinado para o ataque. Chegando ao Palácio, encontraram o chefe
revolucionário só, sem guarda, sem defesa. Após um breve tumulto, André de Albuquerque tem a
virilha atravessada por uma espada. Ferido mortalmente, é conduzido prisioneiro para a fortaleza
onde, na madrugada de 26 de abril de 1817, falece, sem socorros médicos ou qualquer tipo de
assistência. Seu corpo foi arrastado pelas ruas da cidade , como se fosse um mendigo: "Amarram-
no a um pau, com cordas e oito soldados carregam o corpo para a cidade", descreve Cascudo.
Morte inglória para um homem da estatura de André de Albuquerque. Quando o corpo passava pela
Ribeira, foi envolvido por uma esteira dada por Ritinha Coelho. Albuquerque foi encarado como
um traidor da monarquia, por essa razão, o povo gritava:
- Morreu Pai André!
- Viva dom João!
André de Albuquerque foi sepultado na única igreja existente na cidade.
É importante salientar que, em recente restauração realizada na Igreja de Nossa Senhora da
Apresentação, foram encontrados os restos mortais identificados como sendo os do chefe
revolucionário de 1817.
No mesmo dia do sepultamento de André de Albuquerque, foi organizado um governo interino, que
permaneceu no comando do Rio Grande do Norte até o regresso de José Inácio Borges. Estava
encerrada, de maneira melancólica, a participação do Rio Grande no movimento revolucionário de
1817.
Os Atos de Inácio Borges
Em 1816, o sargento-mor de Infantaria José Inácio Borges foi nomeado governador do Rio Grande
do Norte. Não fazia quatro anos que exercia o poder quando, em Recife, explodiu a Revolução
Pernambucana de 1817. Procurou tomar todas as providências necessárias para evitar que as tropas
revolucionárias invadissem o Rio Grande do Norte pelas fronteiras com a Paraíba. Foi
pessoalmente falar com André de Albuquerque, coronel das Ordenanças do Distrito Sul. Aconteceu,
então, o inesperado: André de Albuquerque se uniu às tropas invasoras e prendeu o governador no
Engenho Belém.
Algumas pessoas criticaram José Inácio Borges por ter abandonado a capital. O mesmo aconteceu
com alguns historiadores, como, por exemplo, Tavares de Lyra que, depois de lembrar que Borges
desfrutava da amizade de André de Albuquerque Maranhão, visitando seus engenhos, onde era por
sinal bem recebido, disse o seguinte "acoimadó" de vacilante e dúbio, sendo certo que, num
momento dado, ele se tornou realmente inexplicável. A sua ida ao Engenho Belém não tem
justificativa: foi um ato, senão criminoso, pelo menos imprudente e leviano, ante a iminência de
uma sublevação. Ela importou no abandono da capital quando mais necessária se fazia a presença
do supremo representante do poder público, a fim de organizar a resistência e dar coesão aos
elementos de defesa de sua autoridade, vigiando pela manutenção da ordem e da segurança que,
ainda mesmo que não estivessem ameaçadas internamente, corriam sério perigo nas fronteiras".
Ao contrário da interpretação de Tavares de Lyra, a ida do governante ao interior, dar ordens ao
responsável pela defesa das fronteiras, pessoalmente, é perfeitamente compreensível. Natal não
apresentava sinais de que iria explodir num movimento revolucionário... A ameaça se encontrava
justamente numa invasão vinda da Paraíba! A sua atitude foi, portanto, correta. Jamais poderia

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 41 de 161


imaginar que seria preso pelo seu amigo! Deve ter ficado profundamente decepcionado, porque, na
justificativa em que explica sua atitude, chamou André de Albuquerque Maranhão de "infame e
traidor". O próprio Tavares de Lyra reconhece que José Borges condenou de pronto a revolução e
tomou todas as medidas necessárias para combater o levante realizado em Pernambuco. Mesmo
assim, o historiador potiguar vai mais longe, insinuando uma provável cumplicidade por parte do
governador em relação ao movimento... Reconhece, entretanto, que não existem documentos que
comprovem tal dubiedade de comportamento.
O fato é que José Borges foi um grande administrador. Vencida a Revolução Pernambucana de
1817, reassumiu o governo e não aproveitou da situação para praticar qualquer ato de vingança. Ao
contrário, agiu com prudência, procurando diminuir o grau de envolvimento dos participantes no
levante. Tavares de Lyra reconhece tal fato.
As propriedades dos Albuquerque foram depredadas, porém, João Borges não teve nenhuma
participação nesses atos que, segundo Câmara Cascudo, são "exibições eternas de partidarismo
interesseiros e desonesto". E mais: conseguiu tornar a Capitania do Rio Grande do Norte autônoma
administrativamente, deixando de ser dependente de Pernambuco. Ao criar a Ouvidoria da
Comarca, libertou-a da tutela da Paraíba e, como disse Tarcísio Medeiros, conseguiu "formar o
primeiro Corpo de Tropa de Linha, composto de uma companhia de artilharia e duas infantarias
(22/01/1820), bem assim à instalação da cada de Inspeção de Algodão e a Junta da Fazenda, esta
em 01 de outubro de 1821".
Ainda quando administrava o Rio Grande do Norte, foi promovido a tenente-coronel e, depois, a
coronel de Artilharia.
Deixando o governo, foi senador por Pernambuco. Reformou-se como marechal de campo após a
Abdicação de D. Pedro I. Foi, ainda, designado ministro da Fazenda, participando, assim, do
primeiro gabinete da Regência Provisória, ensina Tarcísio Medeiros.
José Borges morreu no dia 6 de dezembro de 1838, em Pernambuco.
A Causa da Independência
Considerações Sobre a Emancipação do Brasil
O quadro realmente impressiona. A tarde declinava, eram aproximadamente dezesseis horas. Às
margens de um pequeno rio, chamado do "Ipiranga", na província de São Paulo, D. Pedro empunha
a espada e gruta: "Independência ou morte!".
O gesto do príncipe, para alguns estudiosos, sintetiza todo o processo da emancipação política do
Brasil. Marcaria o momento em que D. Pedro decidiu lutar para livrar o Brasil da tutela portuguesa.
Naquela data, no entanto, o Brasil já se encontrava independente. Existem dois documentos que
comprovam esse fato. O primeiro, tem a data de 4 de agosto de 1822. É um "Manifesto às Nações
Amigas", escrito por José Bonifácio e diz o seguinte: "proclama à face do universo a sua
independência política". Apesar dessa afirmação, o que se pretendia deixar claro perante os outros
países é que o Brasil não se deixaria recolonizar por Portugal. Por essa razão, o mesmo documento
afirma que "o Brasil continuava integrando o Reino Unido de Portugal, Brasil e Algaves".
Era um prenúncio do que estava para acontecer. A verdadeira Declaração da Independência do
Brasil pode ser considerada a circular dirigida às nações amigas, com a data de 14 de agosto de
1822, que dizia, de maneira clara, o seguinte: "tendo o Brasil que se considera tão livre como o
Reino de Portugal, sacudido o jogo da sujeição e inferioridade com que o Reino irmão o pretendia
escravizar e PASSANDO A PROCLAMAR SOLENEMENTE A SUA INDEPENDÊNCIA". A
afirmação dispensa qualquer comentário. O país assumia, naquele instante, sua autonomia política.
Outra parte do texto diz o seguinte: "O Brasil não reconhece mais o Congresso de Lisboa, nem as
ordens do seu executivo". Ou seja, não reconhecendo o poder executivo e, igualmente, o legislativo
de Portugal, o Brasil se considerava, de fato e de direito, uma nação independente!
Gesto Simbólico e Contexto Especial
O movimento da separação política no Brasil assume características próprias, principalmente
quando comparado às demais nações sul-americanas. Enquanto países como a Argentina, Colômbia

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 42 de 161


ou Bolívia celebram heróis populares, no Brasil é o representante da dinastia reinante que, por
circunstâncias especiais, vai participar do processo de emancipação. O Brasil se torna, após a
independência, um império monárquico, diferentemente de seus vizinhos que se transformaram em
repúblicas.
Na história dessa separação, há ainda uma forte tendência para valorizar os acontecimentos do dia
7 de setembro de 1822 como sendo os mais significativos. Entretanto, uma moderna abordagem
mostra que a independência do Brasil foi um longo processo, elaborado desde os abusos do sistema
colonial, que originou rebeliões, e continuou com a chegada da Corte Portuguesa ao País,
fortificando-se com a resolução do Príncipe regente de permanecer em terras brasileiras.
Sabe-se, hoje, que a independência do Brasil resultou da disputa entre comerciantes portugueses,
que vinham perdendo os seus privilégios fiscais, e brasileiros, que pretendiam para si esses mesmos
privilégios. Nesse contexto, o 7 de setembro deve ser visto como um gesto simbólico.
Repercussões no Rio Grande do Norte
O Rio Grande do Norte, por Alvará Régio de 18 de março de 1818, se libertara legalmente da
dependência da Paraíba.
Reassumindo o governo do Rio Grande do Norte, depois dos acontecimentos de 1817, José Inácio
Borges era considerado simpatizante da causa da independência. Foi nessa época que o conflito
entre separatistas e recolonizadores começou a ganhar vulto. É bem verdade que essas divergências
eram mais dirigidas aos indivíduos do que às duas ideologias.
Com o afastamento de José Inácio Borges do governo, foi formada uma Junta Constitucional
Provisória, composta por sete membros, e eleita no dia 3 de dezembro de 1821.
A citada junta era presidida pelo coronel Joaquim José do Rego Barros, ligado ao movimento de
1817, ainda sendo os demais membros da lista simpatizantes da causa separatista.
A junta teve que enfrentar todo tipo de dificuldades, inclusive a falta de material para expediente e
cadeiras. Os pedidos de ajuda eram sistematicamente negados, sob a alegação de que a junta
deveria ser composta por cinco membros e não por sete. Sem outra alternativa, os dois menos
votados foram afastados do governo.
Um baixo-assinado com cerca de 50 assinaturas, tendo à frente o capitão Joaquim Torquato Soares
Raposo da Câmara, solicitava a criação de uma nova junta, afirmando que a então governante era
ilegal e insustentável.
A reação da junta não se fez esperar, determinou a prisão não só do primeiro signatário da lista,
mas também do ouvidor. Temendo mais agitação, o presidente da Câmara convocou novas eleições.
Foi escolhido um governo temporário, eleito e empossado no mesmo dia. Finalmente no dia 18 de
março, tomou posse a Junta de Governo Provisório, que permaneceu no poder até 24 de janeiro de
1824. No dia de 2 de dezembro de 1822, chega ao Rio Grande do Norte a notícia da separação
política. A 22 de janeiro de 1823, a junta promove , com grande pompa, as comemorações que o
fato merecia. No entanto, a coroação do primeiro imperador brasileiro, no dia 01 de dezembro de
1822, não foi comemorada, permaneceu ignorada pela população local, que passou a integrar o
império brasileiro.
Os Rebeldes do Equador
A Insubordinação de Pernambuco
D. Pedro I dissolveu, em 1823, a Assembléia Constituinte, que tinha como objetivo elaborar a
primeira Constituição do nascente império brasileiro.
A medida provocou descontentamento em todo o País. Como disse Rocha Pompo, "em
Pernambuco, onde eram vivas as tradições de protesto contra o despotismo, assumiu atitudes de
resistência formal pelas armas".
O que fez explodir o movimento em Pernambuco foi, sobretudo, uma questão interna. A junta que
governava, renunciou, sendo eleito um novo governo cujo chefe era Manuel de Carvalho Pais de
Andrade. Mas havia um governante nomeado pelo imperador: o morgado do cabo Francisco Pais
Barreto, futuro marquês do Recife. Houve, então, o impasse. Carvalho Pais de Andrade não

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entregou o cargo ao seu sucessor indicado por D. Pedro I. Representante de algumas
municipalidades, reunidos em Recife, apoiaram Carvalho Pais de Andrade. A guarnição de Recife
ficou dividida: uma parte ficou com País de Andrade e a outra, com Pais Barreto. A facção que
defendia o morgado do cabo prendeu Manuel de Carvalho e se retirou para o sul, com a finalidade
de unir-se a um grupo de correligionários. Aproveitando o clima de antagonismo entre os dois
grupos, frei Joaquim do Amor Divino Rabelo e Caneca, através das páginas do "Tifis
Pernambucano", defendeu o separatismo.
Uma divisão naval, comandada por John Taylor, bloqueou Recife, impedindo um conflito armado.
Mal Raylor saiu, Manuel Pais de Andrade, no dia 2 de julho de 1824, lançou uma proclamação
rompendo com o governo imperial. O movimento marchava para a formação de uma nação
independente. São mantidos contatos com outras províncias: Piauí, Ceará, Paraíba, Alagoas e Rio
Grande do Norte. Era o Nordeste que se levantava contra o absolutismo de D. Pedro I e alguns
líderes iam mais adiante, desejando a proclamação de uma república!
A bandeira desenhada pelos rebeldes, que por sinal nunca foi utilizada em combate, trazia quatro
palavras que sintetizavam o pensamento dos: revoltosos religião, independência, união, liberdade e
confederação. A primeira se justifica pela presença dos sacerdotes frei Joaquim do Amor Divino
Rabelo e Caneca, padre João Batista da Fonseca etc. A segunda, independência, dizia respeito ao
governo imperial, portanto, brasileiro. O termo união se referia aos estados nordestinos e nortistas,
que deveriam estar juntos para vencer as tropas imperiais. Mais do que nunca a coesão era
necessária e, uma vez criada a confederação, a liberdade seria estabelecida em seu território. A
última palavra, confederação, significava que seus membros manteriam autonomia!
A Confederação do Equador, contudo, não deu certo. As tropas imperiais dominaram o movimento.
A 01 de dezembro de 1824, jurava-se a Constituição outorgada de 1824. O levante estava
totalmente vencido. E a ordem imperial restabelecida em todo o Nordeste e Norte do Brasil.
Sem Choque de Armas no RN
Manuel Teixeira Barbosa assumiu o governo no Rio Grande do Norte numa hora difícil.
Inquietação em todo o País. Conta Câmara Cascudo que "Pais de Andrade apoiava-se na Tradição
de 1817, esta polarizava simpatias por todo o Nordeste".
"No Rio Grande do Norte, os homens de 1817 eram queridos e admirados. Mas estavam divididos,
uns para o lado do imperador e outros para a aceitação de um governo popular".
Pais de Andrade enviou Januário Alexandrino para manter contatos na escuna "Maria Zeferina", em
março de 1824. Ele vinha oficialmente, como médico, para divulgar um tipo de vacina. Porém, sua
missão real era divulgar o movimento revolucionário pernambucano. Levava, inclusive, oficiais
para o Ceará e Pará.
O clima hostil que havia entre os dois grupos, a favor ou contra o imperador, crescia num
prenúncio de violência.
Teixeira Barbosa, inseguro, passou a dar expediente no Quartel da Tropa de Linha, esperando,
ansioso, pelo seu substituto. Tomás de Araújo que, segundo se dizia, simpatizava com a causa
pernambucana, retardava, ao máximo, assumir o governo. Ambos tinham consciência da
tempestade que se aproximava. Tomás de Araújo foi nomeado presidente da província em 25 de
novembro de 1823 e assumiu o governo em 5 de maio de 1824.
Na Paraíba, o presidente Felipe Neri Ferreira encontrou uma série de resistência ao seu nome,
sendo Félix Antônio Ferreira de Albuquerque aclamado presidente. Era o retrato da crise política
que reinava no Nordeste.
As facções em luta, na Paraíba e em Pernambuco, procuravam o apoio do Rio Grande do Norte.
Pais de Andrade enviou, inclusive, correspondência para o governante potiguar. Tomás de Araújo
agiu com cautela, preocupado em evitar uma guerra civil em sua província, atitude que não foi
compreendida por alguns historiadores. Enviou, entretanto, uma delegação (padre Francisco da
Costa Seixas, José Joaquim Germiniano de Morais Navarro e José Joaquim Bezerra Carnaúba) que
fez algumas exigências ao vice-presidente da Paraíba, Alexandre de Seixas Machado: "intimar-lhe

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a eleição de novos conselhos de governo, posse ao mais votado, anistia e volta aos seus empregos
de todos comprometidos, além das garantias naturais de segurança pessoal e propriedade",
sintetizou Câmara Cascudo.
Alexandre de Seixas Machado, como resposta, mandou tropas para as fronteiras que se limitavam
com o Rio Grande do Norte.
A delegação potiguar, depois de visitar a Paraíba, foi para Pernambuco, sendo que José Joaquim
Bezerra Caranúba foi substituído por José Joaquim Fernando Barros. Essa delegação assinou, com
o governo Pernambuco, uma concordata,. Em 3 de agosto de 1824, pela qual as duas províncias se
uniram "numa liga fraternal ofensiva e defensiva", devendo entrar em vigor quando fosse assinada
pelos governantes das duas províncias. Tomás de Araújo, ao que parece, não assinou o referido
documento. Mais uma atitude do presidente entendida como dúbia... Pode ser compreendida,
contudo, como uma prova de que não apoiava o movimento.
Tomás de Araújo enviou tropas para a região sul, sob o comando de Miguel Ferreira Cabral que,
pouco depois, recebeu ordem para regressar. Havia a notícia de que uma força paraibana iria
combater os norte-rio-grandenses. A situação ficou muito confusa. Tomás de Araújo mandou o
tenente José Domingues Bezerra de Sá para observar o que estava acontecendo. Na volta, Bezerra
de Sá informou que a tropa de Cabral estava reforçada com voluntários, oriundos de S. José de
Mipibu, que eram grandes entusiastas da Confederação do Equador. Segundo Bezerra de Sá, o
objetivo era "levantar a bandeira republicana em Natal". Os expedicionários, vindo do sul,
portanto, eram rebeldes, adeptos da Confederação do Equador... Diante de um possível confronto,
Vicente Ferreira Nobre e Joaquim José da Costa são designados para defender a cidade do Natal.
Câmara Cascudo narrou os acontecimentos seguintes: "Ferreira Nobte e Costa ocupam os arredores
da cidade e não permitem que o emissário do presidente leve carta sua ao alferes. Cabral na tarde
de 5 de setembro. O presidente foi em pessoa suplicar os dois que permitissem a entrada da força
de Cabral. Permitiram, depois de muito rogados, com a condição dos voluntários acamparem fora
da cidade". Uma situação crítica. Ferreira Nobre e Costa, praticamente, assumem o poder ou, pelo
menos, ignoram a autoridade de Tomás de Araújo. Ao que parece, eles acreditavam que o
presidente estava do lado dos rebeldes ou, no mínimo, simpatizava com a causa da Confederação
do Equador...
Apesar dessa circunstância, o esforço de Tomás de Araújo para evitar um conflito armado, nos
arredores de Natal, foi imenso e mesmo sem conseguir que suas determinações fossem aceitas
pelos chefes militares, conseguiu que o pior não acontecesse, como demonstrou Jayme da Nóbrega:
"Tomás de Araújo evitou o choque de armas, às portas de Natal, entre as tropas da guarnição, de 1 e
2 linhas, comandadas respectivamente pelo Capitão Vicente Ferreira Nobre e Sargento-mor
Joaquim José da Costa, de um lado, e uma força de 50 soldados da mesma guarnição que fora
enviada ao litoral sul e voltava engrossada com voluntários rebeldes de São José de Mipibu (...) sob
o comando do Alferes Miguel Ferreira Cabral, de outro lado".
"Conseguiu Tomás de Araújo em pessoa convencer os indisciplinados comandantes Nobre e Costa
de que pacificamente deveria passar pelo posto militar a tropa de Cabral e acampar fora o grupo de
moços voluntários revoltosos. Estes depois fugiram".
Os historiadores viram em Tomás de Araújo um velho fraco, que não estava à altura dos
acontecimentos. A verdade, porém, é que caso Tomás de Araújo tentasse se impor aos militares pela
força, teria sido preso ou, então, morto. E a conseqüência teria sido a guerra civil! Tomás de
Araújo, para evitar o derramamento de sangue, através de um gesto heróico, preferiu se sacrificar,
suportando humilhações para obter um bem maior: poupar o povo e a cidade das vicissitudes de um
conflito armado. Seu intento se realizou. Esse fato tem que ser reconhecido pela historiografia
potiguar.
Tomás de Araújo, pedindo demissão, entregou o governo ao presidente da Câmara, Lourenço José
de Moraes Navarro, que dirigiu os destinos da província até 20 de janeiro de 1825. Navarro, por
sua vez, passou o governo ao seu substituto legal, Manuel Teixeira Barbosa.

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A conclusão à qual se pode chegar é que, na realidade, o Rio Grande do Norte foi envolvido pelo
movimento revolucionário pernambucano sem sofrer, contudo, maiores conseqüências.
O Patriarca Seridoense Tomás de A. Pereira
Nasceu em Acari, no ano de 1765. Era um homem alto e, segundo Jayme da Nóbrega Santa Rosa,
"de olhos azuis, madrugador ativo, generoso, humano, isto é, compreensivo, fazendeiro de amplas
propriedades".
Sobre sua figura foi projetada uma imagem de homem bom, porém, sem cultura. Jayme da
Nóbrega combate, com fundamento, tal versão, afirmando que possuía "regular instrução" e que
mantinha "assídua correspondência com seus amigos. As suas cartas eram ditadas a secretários, um
dos quais era o seu neto Manuel Lopes de Araújo Cananéia. Registra a tradição oral que, ao mesmo
tempo, às vezes, ditava quatro, cinco cartas. Deduz-se da leitura de algumas dessas missivas que
foram conhecidas, e de documentos políticos impressos, que Tomás de Araújo se dedicava, nas
ocasiões próprias, à leitura de livros". Jayme da Nóbrega vai mais além, chegando, inclusive, a
fazer uma análise dos termos empregados por Tomás de Araújo.
O patriarca seridoense também conhecia a doutrina cristã a ponto de fazer preleções. Jayme da
Nóbrega acrescenta outros traços da sua personalidade: "astúcia, habilidade, bom senso, memória,
espírito de discernimento e capacidade de decisão. E ainda desmente a versão de que Tomás de
Araújo simpatizasse com os ideais da Confederação do Equador.
Câmara Cascudo afirmou que não podia compreender como o imperador escolhera um homem
idoso para administrar uma província que vivia uma situação dramática, caótica. Mais uma vez
Jayme da Nóbrega desmente, de maneira firme, a lenda: "Em 1824 começava devagar um processo
de glaucoma. Quando à idade, estava então com 59 anos, de excelente saúde e boa disposição (...).
Depois que Tomás de Araújo deixou a presidência, viveu com boa saúde 23 anos".
A imagem que os autores construíram, tendo por base as declaração do próprio Tomás de Araújo,
no Auto de Vereação, teria como objetivo apenas justificar o seu pedido de demissão do cargo de
presidente da província. Os historiadores não compreenderam essa verdade. A velhice começa, na
realidade, aos 65 anos e não aos 50... Confundiram paciência, capacidade de esperar para poder
agir corretamente, com inabilidade. É bom repetir: Tomás de Araújo, impediu que os combates se
desenrolassem na terra potiguar, sim. Os ânimos estavam muito exaltados. Evitar o derramamento
de sangue entre irmãos é tarefa muito mais relevante do que solucionar um conflito entre facções
adversárias, através do sacrifício de muitas vidas! Tomás de Araújo agiu nesse sentido de maneira
consciente: "temendo que se alçasse a guerra civil e caísse nesta Província a indelével nódoa de
sangue brasileiro de que até hoje isenta, propus e afiancei em nome de todos os feitos praticados de
parte a parte, tornado réu de culpa ao que traísse essa proposição, e sendo por todos aceita e
aplaudida em alta voz, mandei que entrasse só a Tropa de I linha, abarracando-se a outra força, ao
que obedeceram".
Tomás de Araújo foi criticado, acusado de estar na "corda bamba", procurando agradar os dois
grupos em luta. Outro engano. Ele era monarquista. Disse isso claramente: "Jamais se deixaria
levar da impetuosa corrente de opiniões republicanas, anárquica e subversivas da obediência e boa
ordem". Palavras que retratam perfeitamente o pensamento de um monarquista. Não ficou indeciso,
ao contrário, procurou combater a violência com a astúcia de um sertanejo experiente no comando
de pessoas...
Governou como se estivesse administrando uma de suas fazendas, determinando tarefas, por sinal,
pouco comuns, para seus subordinados. Mandou, por exemplo, que os soldados trabalhassem na
agricultura, para abastecer o quartel de alimentos... Combateu a prostituição, fazendo com que as
mulheres tivessem uma missão diária: fiar algodão.
Honeste, "fiscalizou pessoalmente o Erário, impedindo que houvesse abusos", disse Jayme da
Nóbrega Santa Rosa.

ESCRAVISMO E REPÚBLICA

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Confederação do Equador
A Penitência de Tomás de Araújo Pereira
Era rigoroso no castigo aos seus familiares, usando a palmatória e uma pequena prisão, a "cafua".
Manoel Dantas conta algo curioso, que pode ser até uma anedota, contudo, diz muito da
personalidade de Tomás de Araújo: estava velho, quase cego. Pediu a seu neto padre, que se
chamava também Tomás, que o ouvisse em confissão. O jovem sacerdote relutou, porém, o velho
patriarca não admitiu a recusa e tanto fez que terminou se confessando ao seu neto. Após a
confissão, como penitência, o padre Tomás determinou que o avô ficasse preso meia hora na
"cafua". Cumpriu a penitência. Depois, chamou um pedreiro e mandou demolir o cubículo... Outros
"casos" são contados sem que se possa distinguir os que são verdadeiros daqueles que fazem parte
do folclore do sertão seridoense...
Ao deixar o governo, a situação política continuava difícil. Mesmo assim, não recebeu nenhuma
garantia de vida. Saiu de Natal rumo a Acari e, numa determinada região onde corria o risco de
vida, viajou escondido dentro de um barril, que foi levado na cabeça de seu fiel escravo, "Pai
Benguela".
Em Acari, na Fazenda Mulungu, elaborou sua defesa, com o objetivo de excluir qualquer dúvida
sobre sua participação nos episódios relacionados com a Confederação do Equador.
Tomás de Araújo passou o governo à Câmara no dia 8 de setembro de 1824, sendo o novo
administrador o presidente da Câmara, Lourenço José de Moraes Navarro, que dirigiu os destinos
da província até 20 de janeiro de 1825, quando o sonho da Confederação do Equador estava
totalmente destruído.
ESCRAVISMO E ABOLICIONISMO
O Inescrupuloso Comércio Humano
O negro foi trazido da África para o Brasil porque, segundo Thales de Azevedo, "os portugueses
necessitavam de divisas para o seu comércio internacional e não havendo encontrado ouro no
Brasil, levavam ferro produzido para Portugal, por escravos no Congo e na Costa do Ouro para
trocar esses escravos pelo precioso metal que ali existia. Os comerciantes europeus, por sua vez,
estabeleciam-se em feitorias na África, protegidos por seus governos e de comum acordo com os
potentados negros, para negociar suas manufaturas pelos produtos regionais. Assim, provocaram ou
estimulavam as lutas tribais que, desorganizando a ordem social e a economia, lhes permitiam
apoderar-se do comércio regional, ao mesmo tempo em que obtinham escravos para vender. Por
esse jogo complexo e inescrupuloso, diretamente encorajava-se o ganancioso comércio humano, o
qual também enriquecia os traficantes no Brasil".
As regiões africanas que mais forneceram escravos para o Brasil foram o litoral e o Golfo da
Guiné. No século XVI, vinham da Guiné; no século XVII, DE Angola, e no século seguinte, da
Costa da Mina.

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Do outro lado do Atlântico, no Brasil, os três maiores centros que receberam os pretos oriundos da
África eram Bahia, Pernambuco e Rio de Janeiro.
Escravatura Modela Perfil Brasileiro
Os negros, maltratados, se submetiam ou se rebelavam, fugindo para o mato, formando quilombos.
Às vezes, se refugiavam em comunidades "fechadas", não permitindo pessoas brancas no seu
convívio.
A grande lavoura exigia um grande número de braços. Foi preciso, portanto, buscar o negro na sua
terra. Segundo Jaime Pinsky, houve "uma grande multiplicidade de grupos negros trazidos ao
Brasil pelos traficantes portuguesas ou ingleses, que se tornaram os mais expressivos já no século
XVII".
Para Décio Freitas, "vicejou no Brasil a formação mais importante do mundo. Nenhum outro país
teve sua história tão modelada e condicionada pelo escravismo em todos os aspectos, econômico,
social, cultural. Pode-se dizer que a escravutura delineou o perfil histórico do Brasil e produziu a
matriz da sua configuração social".
Lei Áurea: Apenas uma Etapa Vencida
O movimento abolicionista no Brasil representou um sentimento, defendido por aqueles que
desejavam mudanças ou, então, por pessoas que agiam impulsionadas pelo cristianismo.
Pode ser analisado sob dois aspectos: o seu significado na época da libertação dos escravos (1888)
e como é visto na atualidade.
A assinatura da Lei Áurea, pela princesa Isabel, foi aclamada pela multidão, numa verdadeira
apoteose. Discursos. Aplausos. O dia 13 de maio foi apontado como sendo o ponto culminante de
um movimento liderado por jovens idealistas que pensavam que, libertando o negro, a obra estava
completa. Os abolicionistas esqueceram que tinham apenas vencido uma etapa. O passo mais
importante estaria por vir, aquele em que o negro deixaria de ser "peça", para transformar-se em
cidadão, podendo lutar pelos seus direitos e, inclusive, participar do processo político. Era preciso
que o negro, antes de alcançar a sua liberdade, tivesse sido preparado para agir como cidadão, Mas
nada foi feito nesse sentido, quer pelo governo, que por qualquer grupo de abolicionista. A falha foi
exatamente essa. O movimento abolicionista, portanto, não foi uma farsa e, sim, errou por não
compreender o que deveria ser feito após a destruição do sistema escravista.
O fato é que não foi tomada nenhuma providência para que o negro, uma vez livre, pudesse inserir-
se na sociedade, com os mesmos direitos dos brancos... Resultado: nos primeiros momentos após a
Lei Áurea, os africanos e seus descendentes no Brasil viveram momentos de grandes dificuldades.
Por essa razão, alguns estudiosos, hoje, afirmam que a abolição da escravidão no Brasil foi uma
verdadeira farsa. Sem nenhuma repercussão histórica. Mais uma vez, estão enganados. Em
primeiro lugar, foram liberados mais de 700 mil escravos. E como mostrou Caio Prado Júnior, esse
número de pretos representava, para a população branca, "uma ameaça tremenda; ainda mais

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 48 de 161


porque eles se concentravam em maioria nos agrupamentos numerosos das fazendas e grandes
propriedades isoladas no interior e desprovidos de qualquer defesa eficaz".
Com a abolição, o negro deixou de ser "peça" e passou a ser gente, pessoa humana. Ainda
discriminado, perseguido, rejeitado. A grande maioria, levando uma vida realmente miserável. Sem
perceber ainda o que representava a libertação de um povo. Teria que ser assim, considerando que o
africano era discriminado, apontado como ser inferior, incapaz de qualquer ascensão social. É
necessário ainda que pensemos no seguinte: não se muda a mentalidade de um indivíduo ou de uma
sociedade, independente de cor ou ideologia, através de decretos. Rodos processo de mudança é
lento e o novo é, quase sempre, rejeitado pela maioria. Naquela época, qualquer tipo de
transformação ocorria muito devagar, a não ser quando imposta por uma revolução. O negro foi
libertado, porém, continua sendo odiado ou, pelo menos, desprezado pela elite.
A abolição, contudo, foi o primeiro passo dado pelo negro no Brasil para ascender socialmente
como povo.
A abolição acabou, no mesmo instante, com duas classes sociais: a do senhor de escravos e a dos
escravos. De acordo com Décio Freitas, "a substituição de um modo de produção por outro
configura uma revolução social. Todos admitem que esta foi a mudança social mais importante
ocorrida desde a colonização".
Mão-de-obra Escrava e Comunidades Negras
O Rio Grande do Norte se abastecia de escravos em dois centros: Pernambuco e Maranhão. De
Pernambuco os negros eram enviados para a região açucareira potiguar, sobretudo a partir de 1845,
quando a indústria do açúcar foi ativada nos municípios de São Gonçalo, Ceará-Mirim, São José de
Mipibu, Papari, Goianinha e Canguaretama.
Os negros comprados no Maranhão chegavam ao Rio Grande do Norte via Ceará, sendo
desembarcados em Areia Branca, atendendo às necessidades da indústria salineira de Açu,
Mossoró, Macau e Areia Branca.
O negro, portanto, atuava principalmente em dois tipos de trabalho: nas indústrias açucareira e
salineira, e em menor quantidade nas fazendas de gado.
Alguns negros, contudo, não suportavam a vida miserável que levavam. Fugiam, penetrando no
interior, e formando comunidades "fechadas", que se isolavam da sociedade dos brancos, mantendo
somente um contato estritamente necessário, como aconteceu em Coqueiros, Sibaúma, Zumbi,
Negros do Riacho, Capoeira dos Negros etc.
Essas comunidades, provavelmente, não se originaram de quilombos.
Exemplo: Capoeira dos Negros. Os habitantes desse local, conta o Sr. Severino Paulino da Silva,
um de seus descendentes, vieram de Açu, talvez por causa de uma grande seca. Faziam parte de
uma família formada pelo casal Joaquim e sua senhora, Caiada, e seus filhos, todos negros. O casal
vendeu doze cavalos não adultyos para comprar a propriedade. O Sr. Carrias, antigo dono da

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Capoeira, enganou seu Joaquim entregando uma procuração em lugar do documento de venda.
Quando o Sr. Joaquim morreu, o Sr. Carrias reuniu os filhos do falecido e disse a verdade, exigindo
mais cem mil réis para passar o documento legal da venda do sítio. Os filhos do Sr. Joaquim
pagaram a quantia exigida, assegurando a posse definitiva da terra.
Os bisavós do Sr. Severino Paulino da Silva foram, portanto, o núcleo original da população de
Capoeira dos Negros.
A área inicial da comunidade era de 36 quilômetros, conforme informa o Sr. Nobre. Nos dias
atuais, a área de Capoeira dos Negros diminuiu muito, porque alguns de seus moradores venderam
suas partes. Em Capoeira, nos dias de hoje, há dois grupos distintos, um de pessoas com cor de pele
mais escura e outro com a pele mais clara, fruto de uma miscigenação. Por essa razão, o
antropólogo Raimundo Teixeira, do Museu Câmara Cascudo, já falecido, dividiu Capoeira em duas
partes: uma que ele chamou de "Capoeira Branca", e outra que ele denominou de "Capoeira
Negra".
A comunidade costuma se reunir na sede do Bangu Futebol Clube. Nesse local se realizam também
reuniões do Sindicato e da Emater que, segundo informações obtidas in loco, financia a compra de
instrumentos agrícolas (enxada, foice, máquinas etc.).
Os agricultores compram as sementes através de um intermediário, geralmente uma pessoa fora do
grupo, para posteriormente vender sua produção a esse mesmo intermediário. Produzem mandioca,
feijão e milho. Vendem seus produtores nas feiras de Macaíba, no sábado, e na de Bom Jesus, no
domingo.
A religião predominante é a católica, ocorrendo, entretanto, um sincretismo com crendices
populares, oriundas de cultos africanos e nativos, conforme afirma Josenira F. Holanda.
Uma tradição muito antiga da comunidade é a "Dança do Pau Furado", hoje sem continuadores,
lembrada pelos mais velhos, mas com tendência ao desaparecimento.
O Pioneirismo da Abolição Mossoroense
Disse Câmara Cascudo: "a idéia da abolição encontrou adeptos entusiastas e adversários com
antipatia pessoal aos propagandistas e não ao pensamento de restituir ao negro o estado de
liberdade". Esse clima de hostilidade entre os grupos antagônicos, a favor ou contra, foi provocado,
certamente, pelo entusiasmo dos jovens, com ativa participação em comícios públicos. Havia
também um clima de aventura.
O macauense Joaquim Honório da Silveira viajou para o Ceará, numa jangada, para levar "uma
petição de Habeas Corpus em favor dos escravos que estavam prisioneiros na Fortaleza, sendo
condecorado com uma medalha de prata pelo "Clube do Cupim", narrou Pedro Moura.
Uma das características do movimento foi a participação entusiástica dos padres na campanha: "Pe.
Pedro Soares de Freitas, Pe. João Cavalcanti de Brito (Natal), Pe. Antônio Joaquim (Mossoró), Pe.
Amaro Theat Castor Brasil (Caicó), entre outros.

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Macaíba contava, em 1869, com uma sociedade que lutava pela libertação dos escravos. Mas foi
em Mossoró que se iniciou uma campanha sistemática, com forte influência cearense. A
"Libertadora Mossoroense" foi fundada em 6 de janeiro de 1883, libertando seus escravos no dia 30
de setembro de 1883.
Damasceno de Menezes mostra a ascendência cearense no acontecimento: "Do Estado vizinho,
Mossoró recebera relevante contingente de homens de alta formação cívica, e cedo a sociedade
local participara do espírito libertador pelas influências de intercâmbio cultural e comercial que
desde os seus primórdios se entrelaçaram à vida das comunidades do Oeste Potiguar".
O mesmo autor mostra que não houve, naquele trinta de setembro, um ato subversivo, porque não
feriu nenhum dispositivo legal. Os escravos foram libertados através da entrega das Cartas de
Liberdade. Isso acontecia de várias maneiras. A diferença é que, em Mossoró, no dia trinta de
setembro de 1883, as cartas foram entregues na mesma data, em solenidade pública, libertando
todos os escravos que ainda existiam no município. Segundo Damasceno de Menezes,
"juridicamente houve abolicionismo em Mossoró. Sim, comemorou-se o civismo de um povo. O
cristianismo houve por bem abalar os corações magnânimos do grande povo potiguar, o dar-se a
extinção antecipada do elemento servil em a terra de Santa Luzia, para exemplo, memória e prova
de altruísmo de uma geração que diante da justiça e pelo amor, pela prova de alto espírito
compreensivo se tornou imortal".
Mas após o trinta de setembro, foi fundado o "Clube dos Spartacus", cujo primeiro presidente foi
um ex-escravo, de nome Rafael. O objetivo dessa associação era promover a fuga de escravos de
outros municípios para Mossoró... Essa concepção, na realidade, era subversiva, porque contrariava
a legislação vigente no País. Mossoró era, assim, na prática, um município livre. Libertou seus
escravos de maneira legal, porém acabou com a instituição da escravidão em suas terras. Dentro
dessa perspectiva, houve abolicionismo em Mossoró.
O exemplo dessa cidade passou a ser seguido por outras comunidades do interior. Açu libertou seus
escravos em 24 de junho de 1885. Depois foi a vez de Carnaúba (30/03/1887) e, logo a seguir,
Triunfo ( 25/05/1887). Natal não possuía mais escravos em fevereiro de 1888.
Natal teve sua Guarda Negra, criação do Partido Conservador e instrumento de combate às idéias
republicanas. Segundo os conservadores, os negros, por gratidão deveriam defender a monarquia...
Em Natal, a Guarda Negra recebeu o nome de Clube da Guarda Negra. O seu presidente foi
Malaquias Maciel Pinheiro. Instalada a 10 de fevereiro de 1889, com muita festa, essa organização,
na apuração de Câmara Cascudo, nada fez de bom ou mal...
O Combate do Poeta Segundo Wanderley
Manoel Segundo Wanderley nasceu em Natal, em 6 de abril de 1860. Filho de Dr. Luiz Lins
Wanderley e D. Francisca Carolina Lins Wanderley.

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Estudou em Natal e em Recife e, em 1880, partiu para Salvador, onde se formou em Medicina, no
ano de 1886. Nesse mesmo ano, ele se casou com Raimunda Amália da Motta Bittencourt.
Na concepção de Cláudio Augusto Pinto Galvão, "por influência de Castro Alves, abraçou o
"condoreirismo", a terceira geração do romantismo brasileiro, sentiu a indicação dos caminhos da
forma, que não eram outros, senão a forma e a temática do próprio estilo, tão populares ainda,
àquele momento".
O livro "Poesias", de Segundo Wanderley, teve três edições, dias editadas em Fortaleza (1910 e
1928) e a última, pela tipografia Galhardo, em Natal, no ano de 1915. A primeira edição traz um
estudo de Gotardo Neto que analisa os dois poetas, o baiano Castro Alves e o potiguar Segundo
Wanderley, chegando a dizer que "no gênero patriótico, as duas individualidades se completam
admiravelmente".
Segundo Wanderley foi considerado o maior poeta do Rio Grande do Norte de sua época.
Não foi apenas um grande poeta. Exerceu ainda diversas atividades: médico, foi também professor
de Atheneu Norte-Rio-Grandense e dramaturgo. Mas seu maior destaque foi, sem dúvida, como
poeta. Gotardo Neto, falando sobre a poesia de Segundo Wanderley, afirmou: "Falar do espólio
intelectual de Segundo Wanderley é lançar uma vista sobre a poesia legítima de minha terra".
"Ele dominou e comoveu tanto o coração patrício que, mesmo o eclipse da morte não ensombrou
sequer a grandiosidade das suas conquistas".
"Elas perduram e perdurarão, alacres e soberanas, como o espírito altaneiro do poeta desaparecido".
Na época em que morou em Salvador, predominou na mente de Segundo Wanderley a preocupação
pelo destino do negro, combatendo a escravidão. E é justamente esse aspecto que Cláudio Augusto
Pinto Galvão salienta em seu estudo, publicado na revista "História UFRN". Em um dos versos
citados, segundo Wanderley chega a dizer:
"Uma idéia – Abolição
Seu verbo - é mais que espada
Seu braço forte é a enxada
Do túmulo da escravidão".
Uma de suas poesias mais conhecidas entretanto, é provavelmente "O Naufrágio do Solimões", que
começa assim:
"Tristeza! Funda tristeza
Nos enluta os corações;
Já nada resta das águias,
Dos bravos do ‘Solimões’
O mar, esse negro abismo,
Que não respeita o heroísmo,
Nem sabe o que seja o lar,

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Rolando, sobre as glaucas entranhas
Para os heróis sepultar".
Rômulo C. Wanderley cita suas peças teatrais: "Amar e Ciúme", 1901; "A Providência", 1904,
"Brasileiros e portugueses", 1905. Escreveu ainda a fantasia "Entre o céu e a Terra", em
homenagem à memória do aeronauta Augusto Severo.
Apesar do seu talento, Segundo Wanderley foi duramente criticado, sobretudo por causa da forte
influência que recebeu do poeta baiano Castro Alves. Na defesa do poeta, argumenta Cláudio
Galvão: "Muito se comentou no princípio do século, sobre a influência de Castro Alves na poesia
de Segundo Wanderley, como se consistisse em demérito ao discípulo, guardar as marcas do
mestre".
Cláudio Galvão destaca também um aspecto muito importante: "Segundo Wanderley foi o único
poeta norte-rio-grandense a ter participação ativa no movimento abolicionista".
Segundo Wanderley morreu em Natal, no dia 14 de janeiro de 1909.
Proclamação da República
Palavras Iniciais Sobre o Contexto da Época
O Brasil vivenciou a sua primeira experiência republicana quando D. Pedro I abdicou o trono do
Brasil, em favor do seu filho, a 7 de abril de 1831. Sendo o herdeiro ainda de menor idade, a
solução constitucional encontrada foi a escolha de uma regência exercida por três membros, sob a
presidência do mais velho. Dessa forma, iniciou-se no País o Período Regencial, composto por
muitas características republicanas, como o aparecimento dos primeiros políticos, eleições para a
escolha dos regentes e, principalmente, a suspensão do poder moderador do imperador, que era o
grande entrave ao exercício da democracia. A 23 de julho de 1840, com a vitória da campanha pela
antecipação da maioridade do imperador, é encerrado o Período Regencial que, apesar de
conturbado por uma série de revoluções internas, foi exatamente rico para a História Política.
A propaganda republicana vai aparecer no Brasil, de maneira sistemática, a partir de 1880. Os
jornais, os clubes e o P.R. (Partido Republicano) vão ser os responsáveis pela divulgação das idéias
que determinaram a queda da monarquia no Brasil..
Foi praticamente nula a participação do povo, principalmente das classes mais desfavorecidas e da
classe média. Os republicanos aproveitaram a insatisfação popular, pelas péssimas condições em
que viviam os menos afortunados, para atrair o povo, engrossando assim as fileiras do movimento
republicano.
Instala-se, nesse contexto, no dia 15 de novembro de 1889, um regime que poderia ter acontecido
em 1822, com a separação política de Portugal, ou com a abdicação em 1831. Entretanto, os
partidários da república sustentaram, sempre a idéia de que foi o longo período monarquista que
deu condições para que o Brasil conservasse a sua integridade territorial, não se fragmentando em
vários países, a exemplo da parte espanhola da América.

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Campanha Republicana No Rio Grande do Norte
No Rio Grande do Norte é através de um documento, enviado ao Clube Republicano do Rio de
Janeiro, em 30 de novembro de 1817, que aconteceu a primeira adesão coletiva às idéias
republicanas. Os signatários desse documento eram fazendeiros, comerciantes, senhores de
engenho, além de três vice-presidentes da província. Foram eles: Antônio Basílio, Ribeiro Dantas,
Manuel Januário Bezerra Montenegro E Estevão José Barbosa de Moura.
A reação ao movimento republicano no Rio Grande do Norte era representada pelos partidos
Liberal e Conservador. Não havia, entretanto, unidade ideológica entre esses dois partidos. Ao
contrário as divergências internas eram muito acentuadas o que, de certa maneira, iria facilitar o
desenvolvimento da campanha pela substituição do regime monárquico no Brasil. O jornal "A
Gazeta de Natal" faria a contrapropaganda pelo partido Conservador, enquanto que a dos liberais
era mantida pelo "Correio de Natal".
A reunião que marcou a fundação do Partido Republicano aconteceu na residência de João Avelino,
situada na Praça Bom Jesus, no bairro da Ribeira, Natal, em 27 de janeiro de 1889, com a
participação de Pedro Velho de Albuquerque Maranhão, que passou a liderar a campanha.
A ata do nascimento do Partido Republicano registra a primeira diretoria, composta por Pedro
Velho, presidente; Hermógenes Tinoco, vice-presidente; João Avelino, primeiro secretário; João
Ferreira Nobre, segundo secretário; e Manuel Onofre Pinheiro, tesoureiro.
Teria sido em 1851, através do Jornal "Jaguarari", dirigido por Manuel Brandão, o início oficial da
propaganda republicana no Rio Grande do Norte. Seguiu-se, em 1873, a revista "Eco Miguelinho",
de Joaquim Fagundes José Teófilo. O movimento cresce e adquire uma maior organização no
período entre 1857 e 1875, com a participação de Joaquim Teodoro Cisneiro de Albuquerque.
Ampliando-se ainda mais o ideário republicano wuando, em 1886, Janúncio Nóbrega e Manuel
Sabino da Costa fundam um núcleo republicano em Caicó.
Nasce, em seguida, o jornal "A República", órgão oficial do partido recentemente fundado.
Início do Governo Republicano em Natal
Foi um telegrama assinado por José Leão Ferreira Souto, dirigido ao Partido Republicano, que
trouxe a notícia da vitória da campanha republicana pela mudança do regime, para o Rio Grande do
Norte. Os monarquistas se inteiraram da novidade também por telegrama, esse assinado por
Umbelino Ferreira Gouveia, datado de 16 de novembro de 1889.
A proclamação da República não foi comemorada, nem despertou reações. Supõe-se que o povo
norte-rio-grandense, como os demais brasileiros, não teve consciência da mudança que se operava.
Aqui, também, o povo foi "arrastado" para a causa republicana.
Os liberais ainda tentaram fazer Antonio Basílio Ribeiro Dantas permanecer à frente do governo da
província. Porém a designação de Pedro Velho, chefe do Partido Republicano, que chegou a Natal
assinada por Aristides Lobo, acabou com as pretensões liberais. Pedro Velho foi aclamado

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governador do Estado, mas governou por poucos dias. No dia 30 de novembro, o Dr. Adolfo
Afonso da Silva Gordo era nomeado governador, pelo governo provisório do novo regime. Apesar
da frustração, o chefe republicano no Rio Grande do Norte aceitou a nova nomeação.
A designação de Adolfo Gordo (paulista de Piracicaba) ensejou passeatas de protestos, muitos
telegramas e alguns boatos de conspiração e discursos muito inflamados.
Posteriormente, Pedro Velho foi eleito deputado federal pelo Rio Grande do Norte com expressiva
votação. Finalmente, no dia 28 de fevereiro de 1892, Pedro Velho de Albuquerque Maranhão foi
eleito governador, pelo Congresso Estadual, administrando até 25 de março de 1886.
As Especialidades de Pedro Velho
Luís da Câmara Cascudo afirma que Pedro Velho era um "orador esplêndido, claro, empolgador,
espalhando uma vibração incontida de movimento e de sedução, jornalista magnífico, cultura
literária disciplinada, oportuna, justa e certa na citação inflável, memória de estatística, gesto largo,
teatral, majestoso, impressionador, voz quente, plástica, apta a qualquer desejo de queixa ou de
estertor, vocabulário rico, luzidio, vestindo de novo a velha idéia aposentada pelo uso, mímica
insubstituível, escolhida com requintes de conhecedor, todos os detalhes que a inteligência e a
vontade podem dar a um homem, Pedro Velho conseguira ou findara possuindo".
Pedro Velho nasceu em Natal, na rua Chile, no dia 27/11/1856. Filho de Amaro Barreto de
Albuquerque Maranhão e de D. Feliciana Maria da Silva e Albuquerque.
Aprendeu as primeiras letras com o professor Antonio Ferreira de Oliveira. Começou seus estudos
secundários no Ginásio Pernambucano, de Recife e, depois, na Bahia concluiria os referidos
estudos, no Colégio Abílio. Iniciou o curso de Medicina em Salvador, porém, teve que se afastar da
faculdade por problemas de saúde. Voltando a estudar obteve grau em bacharel em ciências
médicas, defendeu a tese sobre "Condições Patogênicas das Palpitações do Coração e dos Meios de
Combatê-los:, no dia 4 de abril de 1881.
Casou-se com D. Petronilha Florinda Pedrosa, em 27 de abril de 1881.
Pedro Velho, então, regressou ao Rio Grande do Norte, fixando residência em São José de Mipubu,
onde passou pouco tempo, explorando uma farmácia. Foi, posteriormente, morar em Natal
definitivamente, na rua Visconde do Rio Branco, nº 55.
Como médico, destacou-se nas especialidades de cardiologia, ginecologia e obstetrícia.
Professor, fundou o Ginásio Rio-Grandense (1882 a 1884) e ensinou História Geral e do Brasil no
Atheneu Norte-Rio-Grandese. Tavares de Lyra ressalta que "foi na última fase do movimento em
favor da emancipação dos escravos que iniciou triunfalmente a sua carreira política, tornando-se o
chefe intimerato da propaganda, que fazia pela imprensa, em companhia de abnegados
correligionários, e pela tribuna, em excursões sucessivas aos lugares do interior, emancipado, às
vezes, de chofre, ao efeito de sua palavra inspirada e fulgurante".

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Líder político, teve uma grande atuação. Fundou o partido republicano e, para divulgar suas idéias,
o jornal "A República". Foi o primeiro governador do Rio Grande do Norte na fase republicana.
Quando se pensou em fazer Pedro Velho senador, houve um problema: ele não tinha idade... Foi
então eleito deputado para a Constituinte. Perdeu o mandato porque foi eleito, posteriormente,
governador, administrando o Estado de 28 de fevereiro de 1892 até 25 de março de 1896. Nesse
ano, com a morte de Junqueira Alves, abriu-se uma vaga na Câmara de Deputados, possibilitando
que Pedro Velho continuasse na luta política. Foi reconduzido à Câmara de Deputados,
comprovando sua extraordinária liderança. Por essa razão, José Augusto de Medeiros, afirmou:
"Pedro Velho era um condutor de homens, era um chefe". E mais: "por 18 anos consecutivos, desde
a proclamação da República até o dia de sua morte, o chefe invencível das hostes republicanas no
Rio Grande do Norte. Nunca houve em qualquer época da história daquele Estado da Federação,
um homem que gozasse de tanto prestígio".
Pedro Velho, pouco dias antes de morrer, recebeu um documento, assinado por todos os presidentes
das intendência do Rio Grande do Norte, inclusive o capital, cujas palavras iniciais eram as
seguintes: "É a voz do povo do Rio Grande do Norte, pelo órgão das suas municipalidades, que
vem trazer a V. Excia, nesta modesta mensagem, as mais afetuosas expressões do seu aplauso".
"Numa data que, preciosa para a família, tornou-se pela força natural das coisas, preciosa para o
Estado inteiro, partem de todos os extremos do Estado, de Natal a S. Miguel e de Macau a Jardim,
os votos de nosso afeto com as homenagens da nossa admiração". A sua liderança se estendeu
além-fronteiras do Rio Grande do Norte, com políticos de outras terras vindo até Pedro Velho, para
pedir conselhos: Quintino Bocayuva, Manoel Vitorino etc. Rui Barnosa, quando ouviu Pedro Velho
fazer uma saudação de improviso, comentou: "admirável orador".
Pedro Velho morreu no dia 9 de dezembro de 1907, quando estava no vapor Brasil, em Recife.
Constituição Federal Fixa Independência
No período compreendido entre a proclamação da República a 15 de novembro de 1888 e a
revolução de 3 de outubro de 1930, o Brasil viveu o que os historiadores convencionaram chamar
de "Primeira República" ou "República Velha".
As então "Províncias do Império" passaram à condição de Estado da Federação, que na época eram
vinte. A Lei Maior do País passou a ser a Constituição federal de 1891, tendo cada Estado a sua
Constituição.
Dentre as determinações constitucionais estavam: a independência entre os três poderes -
Executivo, Legislativo e Judiciário -; presidente eleito pelo voto direto para um mandato de quatro
anos, sendo eleitores os maiores de 21 anos, do sexo masculino e alfabetizados. Houve ainda a
separação entre a Igreja e o Estado.

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 56 de 161


História do Rio Grande do Norte (Parte 3 de 5)
Professor Janildo Arantes - desde 16 de agosto de 2009: * História do Rio Grande do Norte (Parte 3
de 5):

* História do Rio Grande do Norte (Parte 3 de 5)


LÍDERES E OLIGARQUIAS
Durante a República Velha
Inauguração do Sistema Oligárquico
Durante a Primeira República (1889/1930), a exemplo das demais unidades da Federação do
Rio Grande do Norte conheceu o sistema de oligarquias.
Coube ao fundador do Partido Republicano, Pedro Velho de Albuquerque Maranhão,
inaugurar o sistema oligárquico no Estado. A base econômica dessa primeira oligarquia, caracteriza
como "personalista que evoluiu, mais tarde, para uma oligarquia tribal", segundo Mariz (1980), foi
o açúcar.
A marca registrada do governo de Pedro Velho foi manter sempre os interesses da sua
oligarquia, antecedendo aos do partido. Prova dessa tendência foi o empenho do nosso primeiro
oligarca em indicar o seu irmão Augusto Severo de Albuquerque Maranhão para disputar a sua
vaga, na Câmara Federal, aberta quando veio assumir o governo. Apesar da oposição de outros
chefes políticos, Augusto Severo foi eleito a 2 de maio de 1892, Entretanto, essa eleição não foi
homologada, sendo posteriormente anulada em todo o País. Finalmente, no novo pleito realizado a
23 de abril de 1883, onde mais uma vez Pedro Velho impôs a candidatura do seu irmão, Augusto
Severo de Albuquerque Maranhão foi eleito para a Câmara Federal. Pedro Velho conseguiu ainda
nomear seu outro irmão, Alberto Maranhão, secretário da sua administração.
O substituto de Pedro Velho no governo foi o desembargador Joaquim Ferreira Chaves que,
mesmo não pertencendo à família Albuquerque Maranhão, era ligado por estreitos laços de
amizade aos membros da primeira oligarquia estadual.
Por volta de 1920, o eixo econ
ômico do Estado se desloca do litoral (açúcar e sal) para o interior (exportação de algodão e
pecuária). É nesse contexto que aparece a segunda oligarquia, liderada por José Augusto Bezerra de
Medeiros, com bases políticas no Seridó, onde predominava a atividade econômica de plantação e
exportação do algodão.
A segunda oligarquia é interrompida no governo de Juvenal Lamartine, quando eclode a
revolução de 3 de outubro de 1930, que modificou significativamente o panorama do País.

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 57 de 161


Indústria Incipiente e Sistema Financeiro
No Rio Grande do Norte, o setor industrial era insignificante. Mesmo no contexto regional,
ocupava o sétimo lugar. Em número de indústrias, estávamos apenas acima do Maranhão e do
Piauí.
Os setores de alimentação e têxtil predominavam na incipiente atividade industrial.
Quanto ao setor financeiro, o primeiro estabelecimento bancário só apareceu no Rio Grande
do Norte no governo de Augusto Tavares de Lyra, em 1909. Era o Banco de Natal que,
futuramente, daria origem ao Bandern. Quase todo o Nordeste já possuía agência do Banco do
Brasil, mas o Rio Grande do Norte só foi inaugurar a sua primeira agência no dia 14 de abril de
1917. No setor financeiro ainda devem ser lembradas as iniciativas de Juvenal Lamartine,
responsável pela criação de bancos rurais e de caixas em algumas cidades do interior, como Acari,
Caicó, Macau etc. Ulisses de Góis e Jovino dos Anjos foram responsáveis pelo aparecimento de
cooperativas, com o objetivo de facilitar o crédito.
A Passagem da Coluna Prestes no Estado
Na República Velha, foram freqüentes os protestos de militares e civis contra as fraudes
eleitorais, que a inexistência do voto secreto ensejava. Movimentos como "Os 18 do Forte de
Copacabana", no Rio de Janeiro, em 1922; a rebelião gaúcha de 1923, e a paulista, de 1924,
atestam a insatisfação do povo contra o processo eleitoral vigente.
Foi no governo do presidente Artur Bernardes, que praticamente cumpriu o seu mandato sob
"Estado de Sítio:, com as garantias constitucionais suspensas, que se organizou a "Coluna Prestes".
O principal objetivo dos comandados de Luís Carlos Prestes e Miguel Costa era percorrer o
Brasil, levantando o povo contra o que consideravam "autoritarismo do presidente".
Os rebeldes entraram no Estado pela zona Oeste. Governava o Rio Grande do Norte o Dr.
José Augusto Bezerra de Medeiros (1924/1927), que procurou imediatamente se comunicar com o
presidente, recebendo a promessa de que seriam tomadas providências para melhorar a segurança
do Estado. Enquanto isso, o governo mobilizava civis e militares para fazer frente aos
revolucionários.
A 26 de janeiro de 1926, o primeiro contingente da polícia militar, sob o comando do tenente
João Machado, seguiu para a zona oeste. Algumas cidades do Seridó, temendo uma invasão pelo
sul do Estado, colocaram em alerta suas forças policiais.
Os combates entre rebeldes e as forças policiais do Rio Grande do Norte ocorreram quase
totalmente na região oeste. Pela cidade de Luiz Gomes, os integrantes da coluna Prestes seguiram
para a Paraíba.
Coube ao governador Juvenal Lamartine recolher as armas que haviam sido distribuídas.
A passagem da Coluna Prestes é o último acontecimento significativo da República Velha no
Rio Grande do Norte.

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 58 de 161


Duas Administrações de Alberto Maranhão
Alberto Frederico de Albuquerque Maranhão nasceu em Macaíba, no dia 2 de outubro de
1872, filho de Amaro Barreto de Albuquerque Maranhão e D. Feliciana Pedroza de Albuquerque
Maranhão.
Os seus estudos iniciais foram realizados, primeiro, em Macaíba e, depois, em Natal. Mais
tarde, foi para Recife, onde se formou em Direito pela Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais de
Pernambuco, no dia 8 de dezembro de 1892, com 20 anos.
Alberto Maranhão se casou com D. Inês Barreto. Teve seis filhos: Paula, Laura, Judite,
Juvino, Cleanto e Caio.
Segundo Meira Pires, "sua educação esmerada, sua formação moral, sua cultura, seu invulgar
espírito (...) um largo pendor diplomático pois sabia solucionar, com finura e habilidade
exemplares, as mais difíceis questões".
Participou, com brilhantismo, do "Congresso Literário", que mantinha o jornal "A Tribuna".
Com outros companheiros, fundou o "Grêmio Polymathico". Dirigiu o jornal "A República", onde,
como afirma Meira Pires, "teve o ensejo de reafirmar o seu invencível valor de jornalista e homem
de letras escrevendo, sem assinar, crônicas, tópicos e editoriais".
Exerceu a função de promotor público em Macaíba. Ocupou o cargo de secretário de Estado
na administração de Pedro Velho.
A 14 de junho de 1899, foi eleito governador do Estado, dirigindo os destinos do Rio Grande
do Norte no período de 1900 a 1904.
Durante sua administração, aprovou a lei nº 145, de 6 de agosto de 1900, pela qual "é o
governador autorizado a premiar livros de ciência e literatura produzidos por filhos domicialiados
no Rio Grande do Norte, ou naturais de outros Estados quando neste tenham fixa e definitiva a sua
residência". Essa lei promoveu o desenvolvimento cultural do Estado, constituindo-se em fato
inédito no País.
No dia 24 de março de 1904, o governador inaugurou o Teatro Carlos Gomes (hoje Alberto
Maranhão), com sua renda destinada para ajudar aos flagelados, vítimas da seca, que se
encontravam em Natal.
Concluída sua administração, foi eleito deputado federal, e durante o exercício de seu
mandato fez parte da Comissão de Diplomacia.
Em 1908 voltava a assumir o governo do Estado, realizando uma profícua administração:
fundou o Conservatório de Música; o Hospital Juvino Barreto (hoje Onofre Lopes); o Derby Clube
(para incentivar o hipismo), e construiu a Casa de Detenção e o Asilo de Mendicidade. Implantou a
luz elétrica em Natal e, posteriormente, os bondes elétricos. Inaugurou a Escola Normal, em 3 de
maio de 1908. Reconstruiu o Teatro Carlos Gomes, que atualmente tem o seu nome, dando-lhe as
feições atuais e que foi entregue ao público no dia 19 de julho de 1912.

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Alberto Maranhão estendeu sua ação também ao interior, como mostrar Itamar de Souza: "em
São José de Mipibu, ele mandou as águas de uma fonte natural e permanente para o abastecimento
d’água daquela cidade. Em Macaíba, sua terra natal, construiu o cais de atracação, melhorando
assim o transporte fluvial entre aquela cidade e a capital do Estado. Em Macau, mandou fazer um
aterro, numa extensão de quatro quilômetros, ligando esta cidade à estrada do sertão, à margem do
rio Assu".
"Para facilitar o deslocamento de pessoas e produtos entre o sertão e as cidades portuárias,
ele construiu três mil quilômetros de estradas carroçáveis em direção às cidades de Canguaretama e
Natal".
O segundo governo de Alberto Maranhão surpreendeu pelo dinamismo, sendo considerado,
por unanimidade, como a melhor administração durante a República Velha. Nem tudo, porém, foi
positivo na segunda administração do oligarca potiguar que procurou, abertamente, imortalizar os
membros de sua família. O município de Vila Flor teve o seu nome mudado para "Pedro Velho".
Além dessa homenagem, mandou fazer um busto do irmão que foi colocado na "square Pedro
Velho". Fazendo uma crítica ao ilustre político potiguar, disse Itamar de Souza: "Este segundo
governo de Alberto Maranhão teve três características básicas: primeiro, procurou imortalizar os
membros da oligarquia aponto seus nomes em municípios, repartições públicas, monumentos e
praças; segundo, monopolizou importantes setores da economia estadual, favorecendo, assim, os
amigos e correligionários, em detrimento do erário público; e, terceiro, realizou uma grande e
inovadora administração com o dinheiro tomado emprestado no estrangeiro".
Alberto Maranhão, após deixar o governo, em 31 de dezembro de 1913, foi deputado federal,
representando o seu Estado nessa função, de 1927 até 1929.
Abandonado a vida política, saiu do Rio Grande do Norte e foi morar com a família em
Parati, no Rio de Janeiro.
Em 1918, publicou dois trabalhos: "Na Câmara e na Imprensa" e "Quatro discursos
históricos".
Faleceu no dia 01 de fevereiro de 1944, em Angra dos Reis, sendo sepultado no outro dia, em
Parati.
As Lutas sem Trégua de José da Penha
José da Penha Alves de Souza nasceu a 13 de maio de 1875, na cidade de Angicos. Foram
seus pais: José Félix Alves de Souza e Maria Inácia Alves de Souza.
Em 1880, José da Penha foi para Fortaleza, onde estudou no Colégio Militar. Depois, seguiu
para o Rio de Janeiro, onde, seguindo Aluízio Alves, fez toda a carreira militar; praça a 2 de agosto
de 1890, alferes a 3 de novembro de 1894, tenente a 8 de outubro de 1898 e capitão a 2 de agosto
de 1911". Desde jovem, participava de polêmicas, conseguindo se destacar mesmo quando seus
adversários eram do nível de um Medeiros e Albuquerque ou de um José Veríssimo.

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 60 de 161


Nasceu, ao que parece, para debater. Discutir. Liderar. "Seu ardente ideal republicano,
impregnado da proteção de Benjamim Constant, o gosto pelo estudo da História dos Povos, a
vivência jornalística conduzindo-o à análise dos fatos diários, principalmente os de formação da
República emergente, participação militar característica dos primórdios do novo regime, o espírito
polêmico, fariam inevitavelmente do jovem pensador-militar um líder político", relata Aluízio
Alves.
Não sabia silenciar diante da injustiça.
Na análise de Câmara Cascudo, "o nome de José da Penha Alves de Souza evoca o
movimento da luta, o choque de idéias, a controvérsia agitação, sonoridade (...). Nasceu armado
cavaleiro, de couraça e elmo, com bandeiras e montante, jurando combater o bom combate. Toda a
sua vida e uma série de guerrilhas, de batalhas, de agonias, de sofrimentos, provocados, resistidos
com altivez, destemor e sobranceria invulgares".
José da Penha assistiu, no dia 3 de janeiro de 1904, atos de violência praticados por policiais
na cidade de Fortaleza. Revoltado, escreveu um artigo, no outro dia, demonstrando seu protesto.
Militar, foi preso, sendo submetido ao Conselho de Guerra. Foi absolvido. Sua esposa Altina
Santos, não suportando o sofrimento, suicidou-se com o revólver do marido.
José da Penha resolveu seguir para o Rio Grande do Norte para lutar contra a oligarquia
Maranhão, que dominava o Estado, como sintetiza Aluízio Alves: "de Pedro Velho o governo foi
para Ferreira Chaves, deste para Alberto Maranhão, irmão de Pedro Velho, indo em seguida para o
genro, Tavares de Lyra, Antonio de Souza preparou a volta de Alberto Maranhão, que, por sua vez,
fez retornar Ferreira Chaves, sucedido, num segundo mandato, por Antonio de Souza, todos eles,
nos intervalos, guindados à representação do Congresso Nacional, e Tavares de Lyra e Ferreira
Chaves a ministérios".
Foi para mudar essa situação que José da Penha investiu contra a liderança de Alberto
Maranhão. Procurou o apoio de um juiz de Caicó, José Augusto, que também combatia a oligarquia
Maranhão. Mas José Augusto também não era favorável ao candidato escolhido pela oposição,
argumentado a João da Penha: "se o candidato da oposição fosse o senhor, nestas circunstâncias, eu
o apoiaria (...) O que se pretende é destrui-la para montar uma oligarquia nacional, com o filho do
presidente da República, que nem sequer conhece o Rio Grande do Norte".
Estava certo o Dr. José Augusto. José da Penha, na realidade, combateu o que poderia ser
uma imposição de uma oligarquia Ferreira Chaves, contra uma imposição do próprio José da
Penha. E o que é pior, ele pretendia impor uma pessoa totalmente estranha ao Rio Grande do Norte,
o tenente Leônidas Hermes da Fonseca, que, por sinal, apresentava apenas uma qualidade: era filho
do presidente da República... O capitão José da Penha teria, sem dúvida, muito mais chance de
vitória caso ele próprio fosse o candidato. Mas é possível que o seu pensamento fosse realmente o

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 61 de 161


de derrotar a oligarquia Maranhão: "O meu coração tem a dureza daquelas pedras. E com este
rochedo de carne, hei de esmagar a oligarquia dominante".
José da Penha promovia, assim, a primeira campanha popular da história do Rio Grande do
Norte. Sendo também o primeiro a falar diretamente com o povo. Fazendo uma campanha popular,
conclamando a população para derrubar uma oligarquia que possuía figuras ilustres, de grande
valor, como Alberto Maranhão.
Aluízio relata: "a campanha incendiou os ânimos de todo o Estado. não foi um movimento
restrito à capital, sempre mais sensível a rebeliões populares. Não. As cidades do interior recebiam
José da Penha e seus caravaneiros com o povo nas ruas - homens, mulheres, crianças -,aclamando-
os, cantando o hino da campanha, desfraldando bandeiras".
A campanha se desenrolar num clima tenso, propício para que se cometesse violência. Com
ameaça de proibição de comícios da oposição.
José da Penha empolgava com sua oratória que, na opinião de Câmara Cascudo, "era calorosa
e acre, irritada, vergostante, panfletária, satírica:.
No dia 20 de julho de 1913, ocorreu um tiroteio que durou quarenta minutos. A casa em que
José da Penha estava hospedado foi cercada pelo Batalhão de Segurança, desde a véspera. No
tiroteio, D. Leontina, companheira de José da Penha, foi ferida. Os seus adeptos foram presos e
logo depois soltos.
A primeira campanha popular terminaria de maneira melancólica. José da Penha foi
abandonado pelo seu próprio candidato que, na realidade, jamais assumiu a candidatura... Falando
sobre o assunto, Aluízio Alves considera que "a repercussão na imprensa do Rio, as versões
espalhadas de que partira de José da Penha e de seus amigos, o tiroteio, o incitamento à greve, dias
antes, a fábrica de tecidos, fundada por Juvino Barreto, na Ribeira, foram os últimos atos
necessários para desvendar o mistério: a primeira campanha popular do Rio Grande do Norte não
tinha candidato".
Joaquim Ferreira Chaves partiu, então, sozinho para a eleição, que se realizou no dia 14 de
setembro de 1913.
E, em 27 de setembro de 1913, José da Penha inicia a sua viagem de volta para o Ceará, via
Recife. No Ceará, ele havia sido eleito deputado estadual.
Pouco depois, Franco Rabelo convocou José da Penha para combater os adeptos do padre
Cícero. No dia 2 de fevereiro de 1914, partiu com duzentos homens para combater mais de mil
guerreiros. Armados e treinados pelo governo federal. Ao se despedir do povo de Fortaleza,
vaticinou: "Vou porque não posso faltar. É só voltarei vitorioso ou morto".
E foi o que aconteceu. Morreu combatendo. Suas tropas, contudo, venceram os jagunços, na
batalha de Miguel Calmon, no dia 22 de fevereiro de 1914.
A Questão de Grossos

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Limite e Charqueada Criam problema
No século XVIII, o Ceará e o Rio Grande do Norte ainda não tinham seus limites
demarcados.
Mossoró e Açu, quando fundaram as suas primeiras charqueadas, se tornaram rivais das
"oficinas" cearenses. Medidas são tomadas para acabar com as charqueadas do Rio Grande do
Norte, inclusive fechando os portos de Açu e de Mossoró. As carnes secas só poderiam ser
fabricadas no Ceará. Para fabricá-las, porém, era necessários o uso do sal produzido no Rio Grande
do Norte...
A Câmara de Aracati sugere estender seus limites, penetrando em território potiguar. O
pedido foi indeferido, com a ressalva de que as vilas limítrofes deveriam concordar com tal
medida, caso contrário, a reivindicação seria levada para a decisão real. Caso as vilas limítrofes
nada obstassem, seria realizada a demarcação. Aquirás (Ceará) e Açu (RN) protestaram.
Contrariando o que ficou determinado, o ouvidor substituto, Manoel Leocárdio Rademarker,
mandou dar posse dos terrenos em litígio à vila de Aracati, ignorando os protestos.
Estava criado o problema.
O território limítrofe continuou sem ser demarcado. O Ceará, porém, não desistiu. Em 1894,
volta ao assunto, impetrando uma ação no Supremo Tribunal, alegando "conflito de jurisdição",
que se transformou posteriormente em "ação de limites".
A 13 de julho de 1901, a Assembléia Estadual do Ceará elevou Grossos à condição de Vila,
em uma área pertencente ao Rio Grande do Norte: Tibau. Grossos etc. Em seguira, o presidente do
Ceará, Pedro Augusto Borges, sancionou aquela resolução...
Rui Barbosa Defende o Rio Grande do Norte
O governador potiguar, Alberto Maranhão, protestou. Os norte-rio-grandenses que moravam
na área disputada, reagiram... Os dois governos (Ceará e Rio Grande do Norte) mandaram tropas
para o local. Prevaleceu, entretanto, o bom sendo e o conflito armado foi evitado...
A controvérsia foi levada para uma decisão através do arbitramento, sendo o resultado
favorável ao Ceará.
Pedro Velho convidou Rui Barbosa para defender a causa do Rio Grande do Norte. Narra
Nestor Lima: "Assumindo o patrocínio por parte do Rio Grande do Norte, ele formulou uma
memória exaustiva do assunto, encarando-o sob todos aspectos, chegando às conclusões magistrais
da obra em que se demonstrou, com a clarividência dos axiomas, a verdade em favor do bom
direito ao Rio Grande do Norte". Foi uma brilhante defesa. Como resultado, o jurista Augusto
Petrônio, através de três acórdãos (30/09/1908, 02/01/1915 e 17/07/1920) deu ganho de causa ao
Rio Grande do Norte, definitivamente.
Tavares de Lyra, uma "Relíquia Nacional"

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Augusto Tavares de Lyra se entusiasmou, ficou totalmente empolgado com a defesa da causa
do Rio Grande do Norte, na questão de limites com o Ceará, na chamada 'Questão de Grossos".
Foi, na realidade, incansável. Publicou dois estudos, reunidos em volume, que forneceram
importantes subsídios para que Rui Barbosa elaborasse as suas "Razões Finais".
Augusto Tavares de Lyra nasceu no dia 25/12/1872, em Macaíba. Filho do coronel Feliciano
Pereira e de D. Maria Rosalina.
A respeito desse ilustre filho de Macaíba, Carlos Tavares de Lyra escreveu: "sóbrio no trajar,
de gestos cometidos, palavra fácil, de limite suave; argumentador seguro, de prodigiosa memória,
capaz de citar fatos e episódios com surpreendente precisão de pormenores, impressionou,
certamente, a todos que tiveram a fortuna de ouvi-lo; no Parlamento Nacional, no plenário do
Tribunal de Contas, na cátedra de professor, na tribuna ,de conferencista (...) Homem raro,
raríssimo, pelo saber, pelas virtudes, pela coerência, pela compostura moral, social, política, de 85
anos lúcidos de vida dedicados à pátria, à cultura, à família (...). Viveu uma grande e gloriosa vida;
uma vida em linha reta, limpa e clara".
Augusto Tavares de Lyra fez o curso de Humanidades, em Recife. Em 1892, era bacharel em
Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito de Recife. Escolheu advogar em Natal, onde
exerceu mais duas profissões: a de jornalista, sendo redator político do jornal "A República", e a de
professor de História Geral e do Brasil, no Atheneu Norte-rio-grandense, de 1892 a 1894. A partir
dessa data, surgiu no cenário nacional, elegendo-se deputado federal, cargo que exerceu até o ano
de 1904. Foi nesse período que ele se empolgou com a defesa do seu Estado, na questão de limites
contra o Ceará. Pesquisando, começou a se interessar pela História e Geografia do Brasil e do Rio
Grande do Norte. Em 1902 já tinha publicado "Questão de Limites entre os Estados do Ceará e do
Rio Grande do Norte". Dois anos mais tarde publicou "Apontamentos sobre a questão de limites
entre o Ceará e o Rio Grande do Norte".
Em 1904, uma nova experiência: governador do Estado, fazendo uma grande administração,
concluída em 1906. O conselheiro Afonso Pena, impressionado pela inteligência do orador,
resolveu convidá-lo para ser o futuro ministro de Justiça e Interior. Tavares de Lyra aceitou o
convite, exercendo tal função com eficiência até 1909. Lançou, em 1907, "Algumas notas sobre a
História do Rio Grande do Norte".
Após a morte do presidente Afonso Pena, Tavares de Lyra abandonou momentaneamente a
vida pública.
Em 1910 foi eleito senador da República, deixando a função em 1914 para assumir o
ministério da Viação e Obras Públicas, até 1918. Foi na presidência de Venceslau Brás que exerceu
por duas vezes, interinamente, a pasta da Fazenda. Nessa época, publicou "Domínio Holandês no
Brasil especialmente no Rio Grande do Norte" (1915). Alguns anos depois, em 1921, lançou
"História do Rio Grande do Norte", sua obra mais importante.

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No dia 26 de outubro de 1918 foi nomeado ministro do Tribunal de Contas, tomando posse
do cargo em novembro. Em 1940, se aposentou, justamente quando estava na presidência daquele
Tribunal.
O decreto de 11 de janeiro de 1952, publicado no Diário Oficial, mandava "inscrever o nome
do ministro Augusto Tavares de Lyra no referido "Livro do Mérito", como merecedor dessa alta
distinção, conforme parecer da competente Comissão".
O presidente Getúlio Vargas considerou Augusto Tavares de Lyra como "uma relíquia
nacional", no discurso que pronunciou no salão de honra do Palácio do Catete, em cerimônia
realizada no dia 15 de agosto de 1953, que oficializou a inscrição do nome do eminente potiguar no
Livro do Mérito. Recebeu congratulações de expressivas instituições de todo o País.
O Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro mandou cunhar medalha de ouro, alusiva aos 80
anos de vida do ministro Tavares de Lyra. Esse Instituto dedicou ao ilustre potiguar uma edição
especial de sua revista. O Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte seguiu o
exemplo, dedicando o vol. LII de sua revista 1a memória do ministro Augusto Tavares de Lyra, em
1959.
Tavares de Lyra faleceu na capital federal no dia 21 de dezembro de 1958.
Coronéis, Cangaceiros e Fanáticos
Opções do Sertanejo Abandonado e Pobre
O sertão brasileiro, mais particularmente o interior do Nordeste, passava por uma crise social
sem precedentes durante o final do século XIX e o início do século XX. O sertanejo se sentia
abandonado pelas autoridades, isolado da civilização, e sofria com uma infra-estrutura que
beneficiava os grandes proprietários das fazendas, os "coronéis", que se tornaram os donos do
sertão. A vida girava em torno desses "coronéis". Eles protegiam e perseguiam, mandava e
desmandavam. Na política, cometiam todo tipo de fraude para beneficiar seus candidatos. Em seus
territórios, dependendo da maior ou menor liderança, nada se fazia sem a sua determinação. Os
humildes, portanto, estavam sob o seu domínio.
Os coronéis cometiam arbitrariedades e suas vítimas não tinham a quem recorrer. "A situação
dos pobres do campo no fim do século XX, e mesmo em pleno século XX, não se diferenciava
daquela de 1856. Era mais do que natural, era legítimo, que esses homens sem terra, sem bens,
garantias, buscassem uma "saída" nos grupos de cangaceiros, beatos e conselheiros, sonhando a
conquista de uma vida melhor. E muitas vezes lutando por ela a seu modo, de armas nas mãos",
comentou Rui Facó.
Coronéis, cangaceiros e fanáticos fazem parte de uma mesma realidade. Os coronéis
organizavam grupos armados para, através deles, exercerem o poder. Esses homens armados
antecederam o cangaço. No instante em que se libertaram do jugo dos coronéis e passaram a fazer
justiça pelas próprias mãos, se transformaram em cangaceiros.

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Os cangaceiros foram imediatamente classificados de "bandidos", pelas autoridades e pela
elite sertaneja. Na realidade, eles estavam fora da lei, porque não se enquadravam dentro nas regras
vigentes na região: obediência total aos grandes proprietários. Alguns fazendeiros de menor
prestígio, para fugir dos desmandos dos "coronéis", faziam aliança com cangaceiros...
Os coronéis podem cometer todo tipo de violência, tomar terras, cometer assassinatos, sem
problemas, porque representavam a sociedade, uma comunidade machista, a lei, o poder.
As oligarquias se auto-intitulavam defensores dos bons costumes, contrárias, portanto, à ação
dos "bandidos". O que elas defendiam, na realidade, eram seus bens, uma situação que lhes dava
somente privilégios. Por outro lado, os homens humildes do sertão, rudes, sem instrução, ofendidos
e humilhados, pensando em vingança, não podiam agir de outra maneira, a não ser através da
violência. O cangaço foi, num certo sentido, um levante contra o absolutismo dos coronéis, e filho
da miséria que reinava numa estrutura latifundiária obsoleta e injusta.
O pequeno agricultou, o trabalhador do campo, sonhava com um mundo diferente, onde não
houvesse seca, com rios perenes e onde, sobretudo, ninguém passasse fome e houvesse o império
da justiça... Era o mundo que os "beatos" e místicos prometiam para seus adeptos. Os trabalhadores
rurais queriam dialogar com Deus, mas não sabiam como agir em busca do caminho que levasse,
todos eles, para o Paraíso. Faltavam, entretanto, sacerdotes. Na ausência dos padres, homens
simples, analfabetos ou não, impressionados com a realidade em que viviam, apelavam para o
sobrenatural, rezavam e chegavam a imaginar a si próprios enviados de Deus, para livrar o povo do
pecado e da miséria, através da oração e de sacrifícios... Para eles somente assim os nordestinos
poderiam atingir a felicidade eterna!
Os dois maiores místicos foram: padre Cícero Romão Batista e Antonio Conselheiro, ambos
cearenses! O primeiro exerceu uma grande influência em todo o Nordeste e ainda hoje mantém
adeptos no Rio Grande do Norte.
Diferente dos demais, o padre Cícero possuía uma grande cultura e era profundo conhecedor
do sertão. Acontece que sua fama de "milagreiro" despertou uma reação negativa na própria Igreja
Católica.
O padre Cícero é a própria síntese do sertão nordestino: não foi apenas um fazedor de
milagre. Foi muito mais. Com o passar do tempo, cresceu o seu poder, exercendo grande influência
política. Passou a ser um "coronel". Conviveu com cangaceiros. Teve, inclusive, um encontro com
Lampião, dando-lhe a patente de capitão. O que muitos não podiam compreender era a sua opção
pelos pobres, provocando um conflito com a ala conservadora da Igreja. Sobre ele, ponderou Neri
Feitosa: "Propôs-se a si mesmo ou recebeu de Deus a missão de levantar o ânimo do nordestino
humilhado e sofredor, injustificado em seus direitos, embaraçados na saída do túnel de suas
desditas".

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Como chefe político, sofreu também oposição daqueles que seguiram orientação contrária à
sua maneira de agir.
O Nordeste, naquela época, era uma região onde predominava a miséria, ignorância e a
violência.
Diante desse quadro, é compreensível que o homem rude, não fazendo parte dos protegidos
dos coronéis, optasse pelo cangaço para fugir da prepotência dos policiais ou procurasse seguir os
beatos, para se redimir de seus pecados e conseguir, através da oração e do sacrifício, atingir a
felicidade eterna...
Os cronistas urbanos, quase sempre combatiam a ação dos assaltantes, enquanto os
cantadores, geralmente exaltavam os cangaceiros e também os místicos.

VIOLÊNCIA E MISTICISMO

A Arma Era a Lei


Os Reis do Sertão e do Cangaço
Lampião é apresentado, de uma maneira geral, como sendo um homem cruel, dos mais
violentos. Mas os cantadores, com seus versos e suas violas, procuravam geralmente justificar as
atitudes frias e violentas do "Rei do Cangaço":
"Por que no ano vinte, seu pai fora assassinado

da rua da Mata Grande,duas léguas arredado...

"Lampião desde desse dia jurou vingar-se também,

dizendo: foi inimigo, mato, não pergunto a quem...


Só respeito neste mundo Padre Cisso e mais ninguém".

Antonio Silvino, diferentemente de Lampião, encarnava a figura do justiceiro protetor.


Humilde, ocupava o lugar das autoridades que falhavam pela ausência ou pela opressão. Não
possuía a fama de perverso que acompanhou Lampião até sua morte. "A exaltação dos cantadores
pelas façanhas de Antonio Silvino chegou ao delírio", disse Câmara Cascudo que, comprovar sua
afirmação, apresenta uma prova:
"Cai uma banda do céu,
seca uma parte do mar,
o purgatório resfria,
vê-se o Diabo com medo,

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o céu Deus manda trancar!".
"Admira todo o mundo
quando eu passo em um lugar.
Os matos afastam os ramos,
deixa o vento de soprar,
se perfilam os passarinhos.
Os montes dizem aos caminhos:
- Deixai Silvino passar! ..."
Antonio Silvino dominou o sertão do Nordeste durante vinte anos, obtendo títulos como "O
Rei do Sertão" e "Governador do Sertão".
Em 19 de fevereiro de 1937, Antonio Silvino recebeu o indulto do governo federal.
Diferente foi o destino de Lampião. Agressivo, não perdoava os seus inimigos. Foi, contudo,
uma vítima da sociedade. Não era apenas um bandido e, sim, um grande líder, guerrilheiro infernal,
estrategicamente notável, e sabia lutar muito bem contra a polícia.
E esse homem foi derrotado pelos mossoroenses!
Lampião Deixa Rastro de Destruição no RN
No dia 10 de junho de 1927, Lampião penetrou com seu bando em Luiz Gomes, no Rio
Grande do Norte. O objetivo dessa marcha era atacar Mossoró. No seu caminho, deixou um rastro
de destruição. Seqüestrou pessoas apenas para pedir resgate. Transformou fazendas em ruínas.
Como disse Raul Fernandes: "O prazer era destruir:.
Em "Caiçara dos Tomás" houve um confronto com os soldados comandados pelo tenente
Napoleão de Carvalho Angra, com a derrota dos policiais.
Onde chegava, o bando ameaçava e exigia, sempre dinheiro e jóias.
Uma parte do grupo de Lampião tentou atacar Apodi. A população, contudo, estava
preparada. Quando os bandidos se aproximaram da cidade, o tenente Juventino Cabral, á frente de
policiais e civis, ordenou que abrissem fogo. Os salteadores resolveram não se arriscar. Recuaram.
Em Dix-sept Rosado, praticamente sem ninguém, o bando de Lampião praticou diversos atos
de vandalismo. Raul Fernandes transcreveu no seu livro "A Marcha de Lampião", a descrição feita
por uma testemunha dos acontecimentos: "Demônios entregues aos maiores desatinos, quebrando
portas, espaldeirando quem encontravam, exigindo dinheiro, roubando tudo, numa fúria diabólica.
A palavra de ordem era matar e roubar".
O ataque a Mossoró estava próximo.
Rodolfo Fernandes e a Defesa de Mossoró
Poucas pessoas acreditavam que Lampião tivesse a ousadia de atacar Mossoró. Um absurdo,
diziam praticamente todos, ou seja, a maioria da população da "Capital Oeste".

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O governador do Estado, José Augusto, encontrava dificuldades em organizar a defesa contra
uma possível investida do "Rei do Cangaço".
O prefeito de Mossoró, coronel Rodolfo Fernandes, contudo, acreditava nessa possibilidade.
Ele tinha consciência de que a situação da cidade era, na realidade, crítica. O tenente Laurentino de
Morais, enviado pelo governo estadual, constatou que a força policial estava composta somente por
vinte e dois soldados... Era preciso tomar medidas urgentes.
Rodolfo Fernandes enviou um emissário até Fortaleza (Alfredo Fernandes) para conseguir
ajuda do governador Moreira da Rocha. A missão fracassou. Apesar de não ter atingido seu
objetivo, Alfredo Fernandes adquiriu armas e munições na capital cearense, que foram de grande
utilidade quando surgiu a hora de defender Mossoró.
O prefeito armou civis e lançou um manifesto, publicado por Raul Fernandes, e que termina
com as seguintes palavras: "A Prefeitura está devidamente autorizada a criar uma Guarda
Municipal para garantir na cidade, que hoje mesmo entrará em ação. Acresce que recebemos armas
suficientes do Estado e compradas pelo comércio desta praça, que ficam à disposição do Governo
Municipal".
Com o tempo passava e o ataque não ocorria, tudo fazia crer que o tão falado ataque jamais
aconteceria. Era o que pensavam também os governadores de três Estados: Rio Grande do Norte,
Ceará e Paraíba.
Dia 12 de junho. O prefeito, incansável, promoveu uma reunião. Era mais uma tentativa de
Rodolfo Fernandes para alertar o povo da cidade. Esforço inútil. O grosso da população continuava
não acreditando num possível ataque de Lampião. Houve, inclusive, neste dia, uma partida de
futebol entre dois grandes clubes rivais: Humaitá x Ipiranga.
Notícias alarmantes, infelizmente, chegavam a Mossoró: o bando de Lampião se encontrava
em São Sebastião. O delegado tenente Laurentino de Morais, integrado ao grupo do prefeito, tinha,
entretanto, tomado algumas medidas: havia criado várias trincheiras.
De repente, os sinos das igrejas começaram a tocar. Era o alarme. Não havia mais dúvida, o
ataque de Lampião iria se realizar!
O pânico tomou conta da cidade. Alguns procuraram fugir de carro, outros de trem, e
determinadas pessoas, desorientadas, não sabiam como agir. A ordem expedida era muito clara:
toda pessoa que não tivesse uma arma deveria abandonar a cidade. A razão para tal medida era que
a cidade vazia facilitaria a defesa, na opinião do prefeito. Ele estava certo, como provaria o
desenrolar dos acontecimentos. No tumulto, dois homens se destacaram: o prefeito Rodolfo
Fernandes e Vicente Sabóia.
O governador José Augusto foi, no mínimo, indeciso. Falhou como governante.
Possivelmente porque não acreditasse no ataque de Lampião ao município de Mossoró. O

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Governador, por falta de medidas urgentes e rápidas, possibilitou que um grupo de cangaceiros
passeasse pelo Estado, matando, roubando, levando o terror a todas as comunidades interioranas...
Certamente não adianta discutir, nos dias atuais, se o governador poderia ter evitado a ação
de Lampião no Rio Grande do Norte, inclusive o ataque a Mossoró. O fato é que medidas
importantes deixaram de ser tomadas e Lampião agiu como previra o prefeito Rodolfo Fernandes.
Outro aspecto a considerar é que houve tempo para preparar uma defesa, com distribuição de
tropas em pontos estratégicos, com concentração de forças em Mossoró e em Caicó.
Mossoró Resiste às Investidas de Lampião
Lampião mandou um ultimato ao prefeito de Mossoró, exigindo quatrocentos contos para
evitar a invasão e posterior saque da cidade. A carta onde ele pedia o resgate foi escrita por Antonio
Gurgel do Amaral e entregue por Pedro José.
Rodolfo Fernandes respondeu dizendo que não podia enviar a importância exigida: "Estamos
dispostos a recebê-los na altura em que desejarem. Nossa situação oferece absoluta confiança e
inteira segurança".
Lampião não se conformou e enviou um bilhete com novas ameaças. Rodolfo Fernandes
respondeu com altivez, reafirmando que não dispunha do valor pedido. Concluiu dizendo que
"Estamos dispostos a acarretar com tudo o que o sr. queira fazer contra nós. A cidade acha-se
firmemente inabalável na sua defesa, confiando na mesma".
O ataque começou às dezesseis horas. Dentro de pouco tempo, o tiroteio atingiu o auge. A
resistência, porém, continuou. O ataque contra a cidadela do prefeito fracassou. Os cangaceiros
tentaram completar o certo. O pessoal da Estação impediu que isso acontecesse. Após muito
tiroteio, a vitória sorriu para os mossoroenses.
Um grande feito, do qual todo norte-rio-grandense deve orgulhar-se.
Por que Lampião Atacou Mossoró?
O ataque de Lampião a Mossoró foi reconhecido por todos, inclusive pelo próprio "Rei do
Cangaço", como sendo de seu maior erro. Como explicar tal falha de um homem tão experiente? O
ataque foi idealizado pelo cangaceiro potiguar Massilon Leite Benevides, que conhecia muito bem
a região. O objetivo, como disse Aglae Lima de Oliveira: "saquear as instalações do Banco do
Brasil, a indústria e o comércio e as residências, para obter boa colheita", ou então, receber de
quinhentos a quatrocentos contos de réis, uma quantia expressiva na época.
Massilon apostou na indiferença da população que não acreditava num ataque de Lampião.
Nesse ponto ele acertou. O que jamais poderia imaginar é que, naquela cidade, havia um prefeito
com a clarividência de Rodolfo Fernandes e que os homens daquela terra procurassem corrigir o
seu próprio equívoco, lutando com bravura até conseguir a vitória.
O Sertanista Rodolfo Fernandes de Oliveira
Nasceu em Portalegre, no dia 24 de maio de 1872.

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"Ainda adolescente iniciou-se no comércio, em Pau dos Ferros. Emigrou para o Amazonas
durante o primeiro ciclo da borracha (...). Chefiou grupos de seringueiros. Dois anos depois,
regressou, passando a morar em Macau. Trabalhou para a Companhia do Comércio durante cerca
de dois anos, construindo salinas. Fixou-se em Mossoró. Em 1900, consorciou-se com Isaura
Fernandes Pessoa, tendo quatro filhos - José, Julieta, Paulo e Raul. Na firma Tertuliano Fernandes
& Cia., também construiu salinas e substituiu o corta-vento para puxar água pelo motor a óleo,
determinando maior aproveitamento das marés. Em 1918, estabeleceu-se por conta própria na
indústria salineira. Eleito prefeito, de 1926 a 1918, levantou a planta da cidade. Arborizou-a iniciou
o calçamento. Projetou avenidas. Fez várias praças e jardins", Registrou Raul Fernandes.
Foi o grande líder da resistência contra Lampião e seu bando. Sobre esse tema, afirma
Raimundo Nonato: "divergindo de muitos, cedo se apercebeu da existência do perigo e tomou a
iniciativa da organização da defesa da cidade com a presteza e energia que a situação reclamava".
"Não perdeu tempo com palavras e tergiversações, mobilizou os elementos necessários para a
luta, planejou a resistência, conclamou o povo e advertiu as autoridades da iminência do perigo.
(...) Esse espírito de previdência do atilado sertanista foi a salvação da cidade, dias depois,
defendida corajosamente, pela sua população civil em armas que se aportou com valentia, destemor
e a serenidade que lhe assegurou a vitória final".
Em um aviso dirigido à população de Mossoró, com o objetivo de tranqüilizar a todos,
Rodolfo Fernandes de Oliveira descreve as medidas tomadas pelo governo do Estado. Essa
afirmação visava realmente dar a impressão que a prefeitura estava pronta, em termos militares,
para enfrentar um ataque de um bando de criminoso fortemente armados. Não estava. Mas tinha
que tomar tal posição para não semear a intranqüilidade e o pavor.
A certeza de que Mossoró seria atacada por Lampião se baseava em informações recebidas
pelo prefeito. Joaquim Felício de Moura, comerciante de Mossoró, foi avisado por Antonio Pereira
de Lima, na localidade de Misericórdia, que Lampião pretendia assaltar a cidade. Pediu, inclusive,
que levasse a notícia ao coronel Rodolfo Fernandes, Argemiro Liberato, da Paraíba, escreveu uma
carta ao prefeito revelando as pretensões de Lampião em invadir Mossoró.
O empenho do coronel Rodolfo Fernandes em defender a cidade foi tão intenso que ele se
descuidou dos negócios particulares, inclusive de si mesmo e de sua saúde. Por essa razão, não
chegou a terminar o seu mandato. Morreu no dia 11 de outubro de 1927 no Rio de Janeiro.
O Cangaceiro Potiguar Jesuíno Brilhante
Jesuíno Alves de Melo Calado nasceu no sítio Tuiuiú, no município de Patu, Rio Grande do
Norte, em 1844.
Filho de José Alves de Melo Calado e D. Alexandrina Brilhante de Alencar.
Para Câmara Cascudo, ele "foi o cangaceiro gentil-homem, o bandoleiro romântico, espécie
matuta de Robin Hood, adorado pela população pobre, defensor dos fracos, dos velhos oprimidos,

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 71 de 161


das moças ultrajadas, das crianças agredidas (...) Baixo, espadaúdo, ruivo, de olhos azuis, meio
fanhoso, ficava tartamudo quando zangado. Homem claro, desempenado, cavaleiro maravilhoso,
atirador incomparável de pistola e clavinote, jogava bem a faca e sua força física garantia-lhe
sucesso na hora do "corpo a corpo". Era ainda bom nadador, vaqueiro afamado, derrubador e
laçador de gado.
Sua pontaria infalível causava assombro, especialmente porque Jesuíno, ambidestro, atirava
com qualquer das mãos.
Casou com D. Maria, tendo cinco filhos dessa união.
Envolvido com uma questão de família, Jesuíno matou o negro Honorato Limão, no dia 25 de
dezembro de 1871. Foi sua primeira vítima.
Como lembra Tarcísio Medeiros, era "irredutível em questão de honra". O autor, em seguida,
cita um texto de Raimundo Nonato, que narra um episódio, onde Jesuíno Brilhante se hospedou em
uma casa. O marido estava ausente. Um bandido, de nome Montezuma, procurou se aproveitar da
situação para perseguir a proprietária da casa. Jesuíno, revoltado, matou o malfeitor. Outro caso:
assassinou um escravo, José, porque tentou violentar uma mulher.
Segundo Cascudo, "ficaram famosos os assaltos à cadeia de Pombal(PE) para libertar seu
irmão Lucas (1874) e, no ano de 1876, à cidade de Martins (RN). Cercado pela polícia local,
Jesuíno e seus dez companheiros abriram passagem através de casas, rompendo as paredes,
cantando a antiga "Curujinha".
Câmara Cascudo afirma ainda que Jesuíno "nunca exigiu dinheiro ou matou para roubar".
A imaginação popular acrescentou à biografia do cangaceiro centenas de batalhas, das quais
Jesuíno Brilhante teria participado sem que tivesse levado um só tiro...
Em dezembro de 1879, na região das Águas do Riacho de Porcos, Brejos da Cruz, na Paraíba,
Jesuíno foi atingido no braço e no peito, sendo levado, agonizante, por seus amigos. Morreu no
lugar chamado "Palha", onde foi sepultado.
Em 1883, o Dr. Francisco Pinheiro de Almeida visitou o túmulo do bandido e levou a caveira
do cangaceiro para sua casa, em Mossoró. Após sua morte, a caveira de Jesuíno foi levada para o
Grupo Escolar "30 de Setembro". No ano de 1924, a caveira foi transferida para a Escola Normal.
A Estrutura Política do Coronelismo
Os grandes inimigos dos cangaceiros eram as "volantes" (polícia) e os grandes proprietários
das fazendas, conhecidos pela denominação genérica de "coronéis".
Para João Camillo de Oliveira Torres, o coronelismo é a "estrutura política por intermédio da
qual os chefes de clãs rurais e grande latifundiários assumiram o controle da ação política". E
acrescenta: "a distribuição de postos da Guarda Nacional, que exercia mais funções de "ordem
honorífica" do que, propriamente, de corpo de tropa, obedecia ao critério de posição social e
política dos indivíduos".

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O coronel é, portanto, o chefe político, quase sempre o grande latifundiário, exercendo um
verdadeiro monopólio da terra. E "o monopólio da terra, abrigando em seu seio uma economia
voltada essencialmente para a exportação de alguns produtos, entravou brutalmente o crescimento
das forças produtivas", analisa Rui Facó.
O mesmo autor acredita ainda que foi "o monopólio da terra que nos reduziu ao mais
lamentável atraso cultural, como isolamento, ou melhor, o encarceramento em massa das
populações rurais na interlândia a que chamamos sertão, estagnada por quatro séculos.
Analfabetismo quase generalizado. Ignorância completa do mundo exterior, mesmo o exterior ao
serão, ainda que nos limites do Brasil".
É nesse cenários que os coronéis reinavam.
O coronel, para exercer sua influência em sua região, tinha que ser "homem macho", capaz
de matar ou mandar matar qualquer pessoa que contrariasse os seus interesses...
Contava também com um grande número de protegidos, seus ä filhados"...
Maria Isaura Pereira de Queirós registra as intermináveis lutas de família, que deixaram um
rastro de sangue nas terras nordestinas. Cita exemplos: os Cunha e os Pereira, no Ceará.
O fato é que não se pode analisar o fenômeno do coronelismo somente como uma forma do
poder privado, sem qualquer relação com o cangaço e com o fanatismo religioso. É igualmente um
"compromisso" do poder público. Resultado em fenômenos como mandonismo, filhotismo,
falseamento de votos e na "desorganização dos serviços públicos", como mostra João Camilo de
Oliveira Torres. Do compromisso resulta a "reciprocidade", ou seja, o coronel, na sua área de ação,
recebe ajuda do poder público (nomeações de funcionários públicos), facilitando, por sua vez, a
atuação do governo.
Em síntese, esse é o contexto do coronelismo no Nordeste nos primeiros tempos da
República.
Theodorico Bezerra: de Cabo a "Major"
Nasceu em Santa Cruz, Rio Grande do Norte, sendo filho de José Pedro Bezerra e Anna
Bezerra.
Fez os primeiros estudos em sua terra. Em 1917 foi estudar em Natal, no colégio Santo
Antonio. Após dois anos de estudos voltou para Santa Cruz, por causa da situação financeira
precária de sua família.
Em 1915 exercia o comércio, como ambulante. Nascimento Bezerra informa que "em
princípio compra e vende tudo, mas o negócio de couro é que tem maior expressão. Parou suas
atividades quando foi servir o exército, mais precisamente no 21º Batalhão de Caçadores, onde
permaneceu de 1923 até 1924, quando chegou até o posto de cabo. Por essa razão, ficou conhecido
pela alcunha de "cabo". O título de "major" apareceu depois, quando militava na política.

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Saindo do exército, comprou, juntamente com um amigo, um caminhão. Depois, vendeu sua
parte e comprou, em Natal, o "Hotel dos Leões". Aos poucos, foi comprando outros, como afirma
Raimundo Alves de Souza:"o internacional", Avenida e "Palace Hotel", até fixar-se definitivamente
no ramo com o arrendamento do "Grande Hotel", em 1939.
Theodorico Bezerra, apesar de suas inúmeras atividades, ficou conhecido sobretudo como
algo que na realidade nunca deixou de ser: um coronel, do tipo definido por Maria Bezerra: "é um
coronel que emerge e se modela no trânsito entre o novo apogeu do coronelismo e seu rápido
declínio. Projeta o perfil de um "novo coronel" despido das características anteriores de
truculência, jaguncismo, desacato às autoridades constituídas que lhe estorvassem os propósitos
particulares vestindo-o de uma roupagem de corte mais ajustado ao figurino da época que
transcorre: pacifismo, moradores desarmados, colaboração às instituições governamentais.
Um dos traços fundamentais da personalidade de Theodorico Bezerra é o seu dinamismo.
Sempre procurou diversificar suas atividades, sendo vencedor em todas elas. Como fazendeiro,
chegou a criar um verdadeiro império: Irapuru, sua maior fazenda. Como comerciante, se tornou
sócio de uma agência de carros; proprietário de uma farmácia; dono de uma casa de fogos.
Chegando inclusive a fazer parte da diretoria da Associação Alves de Souza. Como político, foi um
grande líder, com uma importante participação na vida partidária do Rio Grande do Norte. Entrou
para a política sob a influência do interventor Fernandes Dantas. No dia 23 de maio de 1945
ingressou no Partido Social Democrático. No ano de 1947, foi eleito deputado estadual. Venceu as
eleições para governador.
O primeiro projeto de Theodorico Bezerra na Assembléia Legislativa foi a criação do
município de São José de Campestre, que se transformou em lei. Foi também membro da Comissão
do Comércio, Indústria, Agricultura e Obras Públicas.
No dia 3 de fevereiro de 1949, assumiu o comando do PSD. Em 1950 foi eleito deputado
federal. No ano de 1960 apoiou Aluízio Alves e monsenhor Walfredo Gurgel para governador e
vice, respectivamente. Grande campanha, cujo desenrolar será estudado mais adiante, em outro
fascículo. Dois anos mais tarde o "major", acostumado a vencer, obteve sua primeira derrota na
política; não conseguiu se eleger senador da República. Ficou muito frustado, como se pode
constatar, através dessa declaração, citada por Raimundo Alves de Souza: "Fiz tudo para ter o padre
como companheiro de disputa das vagas no Senado. Desejava ver dois pessedistas vitoriosos.
Porém esqueci que tem mais capelas, igrejas e santuários que diretórios do PSD. E o padre teve
mais votos do que eu". Pouco tempo depois, assumiu o cargo de vice-governador, na vaga deixada
por monsenhor Gurgel, eleito senador. Assumiu também a presidência da Assembléia Legislativa
do Rio Grande do Norte.
Como político, é claro, possuía uma visão coronelística. Tudo era válido, contando que
levasse à vitória: "ameaça, suborno, pedido humilde, favores, traições, tudo".

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Em sua fazenda Irapuru, recebia os visitantes com grandes festas. Possuía duas bandas, uma
integrada por homens e outra composta totalmente por mulheres.
Certa vez, recebeu uma turma de alunos e professores de uma escola do município de Natal,
soltando foguetões e com desfile de duas bandas. Uma moça, ao sair do ônibus, descascava uma
laranja para comer. Theodorico viu e ordenou que a estudante guardasse a laranja porque, caso
contrário, não teria fome na hora do almaço. E foi servido realmente um grande banquete, farto em
alimento e bebidas...
Theodorico Bezerra, inteligente e trabalhador, sabendo tirar proveito da influência que
desfrutava na política, conseguiu somar uma grande fortuna. Em suas fazendas chegou a produzir,
às vezes, mil quilos de algodão. Possuiu ainda duas usinas de beneficiamento de algodão; três
fábricas de óleo, e uma refinaria de óleo, informa Maria do Nascimento Bezerra. Em Natal, dirigiu
o Grande Hotel, que teve um papel de destaque durante a Segunda Guerra Mundial, considerado
como sendo o melhor da cidade. Sobre Theodorico Bezerra, nesse período, Clyde Smith Junior fez
a seguinte observação: "um norte-rio-grandense simpatizante dos alemães, mas interessado
principalmente em dinheiro"... Foi dono da Rádio Trairi e do Jornal do Comércio de Natal.
Quanto morreu, já não desfrutava do prestígio de outrora.
Fanáticos da Serra de João do Vale
Luís da Câmara Cascudo pediu, em um de seus artigos, "licença para contar uma história que
nunca foi contada". Esse estudo foi publicado pela primeira vez no Jornal do Comércio, do Rio de
Janeiro, em 9 de fevereiro de 1941 e transcrito, posteriormente, na revista do Instituto Histórico e
Geográfico do Rio Grande do Norte.
Tema do artigo: os fanáticos da Serra de João do Vale. Mais tarde, Tarcísio Medeiros abordou
o assunto em seu livro "Aspectos Geográficos e Antropológicos da História do Rio Grande do
Norte".
É, portanto, uma história pouco conhecida.
O local em que tudo aconteceu foi a Serra de João do Vale, que fica no município de Augusto
Severo. Possui tal denominação porque herdou o nome do seu primitivo proprietário, João do Vale
Bezerra.
Joaquim Ramalho do Nascimento, que seria um dos chefes dos fanáticos, nasceu no sítio
"Cajueiro", em 1862, filho de Manuel Ramalho do Nascimento e de dona Isabel Maria da
Conceição.
Luís da Câmara Cascudo traçou o perfil de Joaquim Ramalho, com as seguintes palavras:
"Gordo, lento, apático, amarelo, foi menino sujeito às cismas, meditações longas, olhar parado,
acompanhando um pensamento misterioso. Com poucos anos, afirma-se a tendência mística, nas
orações sem fim, passos tirmoados, braços para o firmamento, rezando missas, impondo
penitências".

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Joaquim Ramalho cresceu e, adulto, se casou, passando a morar na Vila do Triufo.
Continuou, entretanto, com o mesmo comportamento estranho, rezando sempre.
No final de 1894, morreu o vigário de Triunfo, padre Manuel Bezerra Cavalcante, com
oitenta anos, sendo chorado por toda a comunidade.
No ano de 1898, Joaquim Ramalho teve um ataque, assim descrito por Câmara Cascudo:
"Bruscamente parou, nauseante, gorgulhando vômitos e caiu de bruços, pesadamente". Durante a
crise, começou a cantar. Quando recobrou os sentidos, não se lembrava de nada. O fenômeno se
repetiu nas outras tardes seguintes. A notícia se espalhou rapidamente, crescendo o número de
curiosos, todos querendo assistir à cena. Estava nascendo mais um líder místico no sertão
nordestino. Como Joaquim Ramalho tinha lido Allan Kardec, acreditou que estava sendo possuído
pelo espírito do velho vigário. Dentro em breve, segundo o beato, o espírito de outro sacerdote
passou a se encarnar nele: padre Manuel Fernandes, vigário de Macau.
À medida que o arraial crescia, tudo se desorganizava nos arredores. As pessoas
abandonavam o trabalho para seguir o beato, ao mesmo tempo em que aumentava a devassidão.
Um mestiço, de nome Sabino José de Oliveira, de acólito de Joaquim Ramalho subiu de
categoria quando recebeu o espírito de um padre italiano, chamado Brito de Maria da Conceição.
Nessa altura dos acontecimentos, "a moral desceu à quota zero" na palavras de Câmara
Cascudo.
Começaram, então, a surgir reclamações. O coronel Luiz Pereira Tito Jácome denunciou o
movimento ao governador do Estado, desembargador Joaquim Ferreira Chaves que, recebendo
várias queixas, nomeou o tenente do Batalhão de Segurança, Francisco Justino de Oliveira
Cascudo, para acabar com a festa.
Os dois místicos foram presos em "Pitombeira". Não houve nenhuma reação. Joaquim
Ramalho disse apenas que "Deus foi preso, quando mais eu...".
Sabino caiu no chão, como se estivesse sendo possuído por um espírito. O tenente,
inteligente, percebeu a "farsa", e bateu nele com a espada. Sabino se ergueu rápido, dizendo:
"Pronto seu tenente, o espírito já saiu, Voou na ponta da espada...
"Joaquim e Sabino foram presos e levados para a cadeia de Triunfo. E desmoralizados
perante seus adeptos, por causa das declarações que eles prestaram à polícia. O processo policial,
contudo, não deu em nada. Os dois beatos foram colocados em liberdade.
Joaquim Ramalho, ao sair da prisão, voltou a trabalhar na agricultura. Morreu no seu sítio
"Malhada Redonda", com idade avançada, picado por uma cascavel. Nunca mais recebeu
"espírito"... O outro não se sabe como terminou. Uma coisa é certa: ficou totalmente curado...
A Revolução de 1930
Impasse na Política Café com Leite

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Foram principalmente os motivos de origem política e econômica que determinaram a
eclosão do movimento revolucionário de 1930 no Brasil.
A crise do sistema capitalista mundial a parti de outubro de 1929, que atingiu as nossas
exportações de café, funcionou como determinante de ordem econômica. Quando o presidente
Washington Luís transferiu ao Instituto do Café do Estado de São Paulo a responsabilidade para
solucionar o impasse surgido no setor exportador do principal produto brasileiro, perdeu o apoio
dos cafeicultores, que lhe conferiam sustentáculo político.
O rompimento da política "café com leite", que determinava a alternância de um presidente
paulista e um mineiro frente ao governo do País, teria sido a causa política.
A comprovação de fraude eleitoral na escolha de Júlio Prestes para a Presidência da
República, o assassinato de João Pessoa, vice-presidente derrotado, funcionaram como causas
imediatas do movimento revolucionário que marca o início da Segunda República no Brasil.
Um Marco na História Brasileira
A revolução de 30 foi, na realidade, um marco na história brasileira. Com ele terminou a
República Velha.
Questionam historiadores e sociólogos quanto à natureza do movimento de outubro de 1930.
Alguns consideram que pode ser chamado de "revolução", pois teria sido responsável pelo
desmoronamento da ultrapassada estrutura política das Primeira República. Outros negam essa
denominação alegando que as mudanças advindas em 1930 não teriam alterado radicalmente o
País.
É também questionado o caráter "burguês" do movimento. As críticas são justificadas, na
alegação de que não houve uma oposição significativa entre o setor agrário-exportador e a
burguesia industrial que, naquela época, não tinha força suficiente para liderar qualquer
movimento. Além do mais, a "Aliança Liberal" não poderia, na sua totalidade, ser apresentada
como porta-voz da burguesia industrial, pois era uma realidade a presença de elementos
extremamente "conservadores" em suas fileiras.
O que se pode concluir é que, em 1930, forças heterogêneas se somaram e preparam o
cenário para a ação que de certa maneira viria alterar, a ambiência política da época.

História do Rio Grande do Norte (Parte 4 de 5)


IDEOLOGIAS EM CONFLITO
Regime de Exceção
Elogios e Críticas à Era Vargas
Certos depoimentos daqueles que participaram, direta ou indiretamente, dos episódios que
marcaram a Revolução de 1930 no Brasil são marcados pela emoção, pelo grau de simpatia ou de
rejeição. Sobretudo à figura do seu principal líder, Getúlio Vargas. Algumas críticas, por outro lado,
estão marcadas por um forte conteúdo ideológico.

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Os elogios e as críticas confirmaram que a Revolução de 1930 se constituiu num marco da
historiografia brasileira. Quando o vendaval de paixões passar - o que parece que já está ocorrendo
-, será possível ter uma idéia mais clara do conjunto de suas realizações, sua contribuição maior ou
menor para o engrandecimento do País.
Enquanto isso, algumas conclusões, a priori, são definitivas. Como a de Boris Fausto de que
"a Revolução de 1930 põe fim à hegemonia da burguesia do café, desenlace inscrito na própria
forma de inserção do Brasil no sistema capitalista (...). No ataque ao predomínio da burguesia
cafeeira, revelando traços específicos, que não podem ser reduzidos simplesmente ao protesto das
classes médias (...) Vitoriosa a revolução, abre-se uma espécie de vazio do poder, por força do
colapso político da burguesia do café e da incapacidade das demais frações de classe para assumi-
lo, em caráter exclusivo. O Estado de compromisso é a resposta para esta situação. Na
descontinuidade de outubro de 1930, o Brasil começa a trilhar enfim o caminho da maioridade
política. Paradoxalmente, na mesma época em que tanto se insistia nos caminhos originais
autenticamente brasileiros para a solução dos problemas nacionais, iniciava-se o processo de
efetiva constituição sobre a nacionalização do trabalho; salário mínimo; sindicalização", disse Cruz
Costa.
Houve, naturalmente, algumas distorções na polícia trabalhista. Mas não se pode negar, por
causa disso, o grande valor da legislação trabalhista, considerada, como
todos sabem, "uma das mais avançadas do mundo". Afirmou ainda Cruz Costa que "a legislação
trabalhista de Vargas antecipou-se no tempo aos conflitos que iriam dar aos operários a consciência
política de seu papel numa sociedade em processo de industrialização".
Vargas pode não ter sido o criador do Estado brasileiro, porém, usou um regime de exceção
para consolidar o Estado Nacional brasileiro. Antes de 37, cada Estado praticamente se constituía
numa unidade autônoma, com um governo federal muito frágil. São Paulo, por exemplo, tinha sua
Força Pública (polícia) um verdadeiro exército que contou, inclusive, "com uma missão instrutora
composta de oficiais franceses", informa Cruz Costa.
O lado negra "Era Vargas" foi, sem dúvida, o caráter fascista de sua administração durante o
período em que agiu como ditador.
Os Tenentes de Juarez Távora no NE
A propagação do ideário de 1930 chegou ao Nordeste quando o coronel Maurício Cardoso foi
nomeado para comandar o 22º BC, sediado na então cidade da Paraíba, capital do Estado do
mesmo nome. Como ele vieram três oficiais: Jurandir Mamede, Agildo Barata Ribeiro e Juraci
Magaljães. Esses homens eram conhecidos como sendo os "tenentes" de Juarez.
Não é possível uma apreciação do movimento de 1930 no Nordeste sem uma referência a
Juarez Távora. Na época, ele estava detido na Fortaleza de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, por
determinação da polícia de Washington Luís. Conseguindo, mesmo prisioneiro, entrar em contato

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com Luís Carlos Prestes, chefe do Partido Comunista, foi incentivado a fugir para comandar o
movimento no Nordeste. Távora fugiu, conseguindo chegar até a Paraíba. A sua fuga foi
considerada quase impossível de se realizar, na ocasião.
A Paraíba que depois tornou-se a cidade de João Pessoa, e a capital pernambucana, Recife, se
tornaram os centros de divulgação no Nordeste. A primeira, por concentrar um grande contingente
militar, e Recife, pela sua importância política e econômica na região nordestina,
A data escolhida para o início da revolução foi 3 de outubro. A hora estabelecida seria 17h30.
Contam Antonio Augusto Faria e Edgard Luiz de Barros que "em Pernambuco, Juarez Távora
se atrasou um dia para atacar Recife; mas a população tomou prédios e depósitos de armas,
facilitando a ação dos rebeldes, que logo tomaram também a Paraíba. Enviando tropas para
dominar a Bahia, sob o comando de Juraci Magalhães, e o Pará, com Landy Salles, Juartez e os
"tenentes" em poucos dias controlavam todo o Norte e o Nordeste".
Aliança Liberal e Dias de Pânico em Natal
Juvenal Lamartine governa o Rio Grande do Norte. Além de uma extrema dependência em
relação ao poder central, o seu governo se caracterizou pela intolerância política para com os seus
adversários. Nesse contexto, João Café Filho fazia oposição. Perseguido, fugiu para a Paraíba. E se
integrou ao movimento promovido pela "Aliança Liberal", que defendia a candidatura de Getúlio
Vargas para presidente da República e João Pessoa para vice.
Os candidatos da oposição ao governo Washington Luís, Getúlio e João Pessoa, foram
derrotados no Rio Grande do Norte. Afirmam os historiadores que a derrota foi causada pelo apoio
dado por Juvenal Lamartine ao paulista Júlio Prestes.
Os adeptos da "Aliança Liberal" no Rio Grande do Norte formavam, na realidade, um
pequeno grupo que recebeu o apoio do coronel Dinarte Mariz no Seridó.
Juvenal Lamartine, ao tomar conhecimento do início da revolução, abandonou o Estado, na
noite de 5 de outubro de 1930.
O maior Luiz Tavares Guerreiro, à frente do 29º BC, partiu da Paraíba e chegou a Natal no
dia 6, sem encontrar qualquer tipo de resistência. Natal viveu dias de pânico, assim descritos por
Tarcísio Medeiros: "tropas de desocupados, aventureiros, que atemorizaram as famílias natalenses,
obrigando os incautos, nos comícios das praças, ajoelhar quando era cantado o hino a João Pessoa:
"João Pessoa, João Pessoa, bravo filho do sertão. Toda a pátria espera um dia a sua ressurreição... '
Ai daquele que não obedecesse!".
Para governar o Rio Grande do Norte foi formado um triunvirato composto por Luiz Tavares
Guerreiro, capitão Abelardo Torres da Silva e o tenente Júlio Perouse Pontes.
A junta procurou manter a ordem durante o período que governou, de 6 a 12 de outubro de
1930. Após essa data, o Estado passou a ser governado pelos dois civis (o primeiro e o último) e
três militares.

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 79 de 161


O Rio Grande do Norte voltaria a ser governado por interventores após a decretação do
Estado Novo, em 1937.
Os Interventores no Rio Grande do Norte
Com a nomeação dos interventores, começou a fase institucional da Revolução de 30 no Rio
Grande do Norte.
Marlene Mariz define o sistema instaurado da seguinte maneira: "Os interventores eram o
próprio instrumento de controle do poder central em cada Estado. Representam o empenho
deliberado de alterar as relações Estado/União, transformação esta desejada pelos tenentes e,
especificamente, por todos os revolucionários nortistas".
O Rio Grande do Norte contou com cerca de cinco interventores: Irine Jofily (apoiado por
Café Filho), Aluísio de Andrade Moura, Hercolino Cascardo, Bertino Dutra da Silva e, finalmente
Mário Leopoldo Câmara.
Irineu Jofily encontrou dificuldades para implantar os ideais revolucionários no Estado
porque os oligarcas estavam ainda muito fortes. O sistema oligárquico não permitia que medidas
contrárias aos seus interesses fossem implantadas. Por essa razão, Jofily pediu demissão.
Aluísio Moura iniciou a fase de administradores militares.
Juarez Távora, que comandava a Delegacia do Norte, designou dois militares para
"assessorar" o novo interventor: os tenentes Ernesto Geisel, para a Secretaria Geral e diretor do
Departamento de Segurança Pública, e Paulo Cordeiro de Melo, para o Comando do Regimento
Policial. Existe apenas uma explicação para justificar essas duas nomeações: falta de confiança de
Juarez Távora em Aluísio Moura...
Com o objetivo de afastar Café Filho e seus adeptos da administração, os cafeístas foram
acusados, pelo interventor, de comunistas que conspiravam contra o governo. Como resultado,
todos foram presos. Pedro Dias Guimarães, que exercia a função de prefeito de Natal, e ainda
Edgar Siqueira, José Anselmo e Sandoval Wanderley. Depois, o interventor, alegando que tudo que
se dizia dos cafeístas era falso, mandou libertar a todos...
Cresceu o descontentamento dos setores ligados à Revolução de 30, por causa do apoio dado
ao grupo que se encontrava no poder antes de 1930, por essa razão, Aluísio Moura foi substituído
por outro militar: o comandante Hercolino Cascardo.
O Rio Grande do Norte se encontrava nessa época, numa situação difícil. Cascardo, contudo,
procurou desenvolver o Estado, atuando sobre os produtos que sustentavam sua economia: cultura
do algodão e indústria salineira. Outro aspecto importante é que ele procurou governar sem se
envolver nos conflitos locais, escolhendo seus auxiliares entre os mais capazes. Sentindo-se
desprestigiado perante o governo provisório, pediu exoneração do cargo, apesar do apoio de Café
Filho e de seus correligionários.

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O novo interventor, Bertino Dutra da Silva, encontra o Rio Grande do Norte numa situação
muito dedicada. As forças políticas tradicionais continuavam sendo um obstáculo para que os
ideais revolucionários se instalassem no Estado.
Em 1932 explodiu a Revolução Constitucional, liderada por São Paulo e que, segundo
alguns, possuía um caráter separatista. Foi fundada no Rio Grande do Norte a "União Democrática
Norte-rio-grandense", comandada pelo monsenhor João da Matha e por Gentil Ferreira de Souza,
apoiando o movimento a favor da constitucionalização do País. Como afirma Marlene Mariz, "os
coronéis potiguares chegaram até enviar seus capangas para lutar ao lado dos paulistas contra o
governo provisório e o regime de exceção".
As forças conservadoras não ficaram apenas nesta ação. Visando a eleição da Constituinte
Nacional de 1933, fundaram o "Partido Popular", chefiado por Dr. José Augusto Bezerra de
Medeiros, líder seridoense.
O interventor Bertino Dutra reagiu e fundou o 'Partido Social Nacionalista do Rio Grande do
Norte".
A campanha se desenvolveu num clima de agitação, com atitudes que caracterizavam um
grande radicalismo.
A 3 de maio de 1933, realizou-se a eleição para a Constituinte Nacional, com a vitória da
oposição que conseguiu eleger três candidatos: Alberto Roseli, Francisco Martins Veras e José
Ferreira de Souza, Kerginaldo Cavalcanti de Albuquerque foi o único eleito pela situação.
Café Filho, o homem forte do governo, era o alvo preferido da oposição, sendo inclusive
baleado pelo capitão do exército Everardo Vasconcelos após uma discussão entre os dois.
Derrotado, Bertino Dutra passou o cargo ao seu substituto legal, tenente Sérgio Marinho.
O novo interventor, Mário Leopoldo da Câmara, foi designado para executar a missão de
pacificar o Rio Grande do Norte, formando uma aliança com o Partido Popular, o mais forte do
Estado.
Entretanto, apesar de sua eficiência como administrador, Mário Câmara permitiu que
crescesse o clima de agitação e de violência. João Medeiros Filho, no programa "Memória Viva",
da TV Universitária, traçou o seu perfil: "Mário Câmara era um administrador honesto. Depois, foi
envolvido pelos políticos profissionais, fincando alucinado pelo poder. Daí a violência que
caracterizou o final do seu governo".
Em vez de se unir às forças tradicionais, terminou fazendo uma aliança com Café Filho, com
o fim de derrubar o Partido Popular.
O Rio Grande do Norte viveu, então, um clima de agitação nunca antes experimentado em
sua história, incluindo assassinatos, espancamentos etc.
Em síntese, como administrador, Mário Câmara fez várias obras (construir 43 prédios
escolares, abriu estradas etc.), porém "com esse homem caiu sobre a terra potiguar a maldição

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terrível da desunião política, que fez desencadear a mais torpe campanha eleitoral de 1934", afirma
Tarcísio Medeiros.
Como uma conseqüência desse clima de agitação, se pode apontar a intentona comunista de
1935.
Ao se fazer um balanço sobre a Revolução de 30 no Rio Grande do Norte, cujas diretrizes
deveriam ser executadas pelos interventores, fica muito claro que as oligarquias, com o seu sistema
político consolidado, evitaram que mudanças maiores de operassem no Estado, gerando um
confronto num clima de agitação e violência entre os partidários da Revolução de 30 e os oligarcas.
João Café Filho se destacou na luta para destruir as velhas estruturas, mas não reunia força
suficiente para conseguir realizar os seus propósitos.
Por outro lado, os conservadores possuíam grandes líderes, alguns detentores de vasto saber,
como, por exemplo, José Augusto de Medeiros, o grande arquiteto da resistência das forças
tradicionais.
A massa popular queria mudança, porém, iletrada, não sabia que rumo tomar, praticando, às
vezes, atos de violência como sinal de protesto.
Segundo Marlene Mariz, "a Revolução trouxe efeitos para o Rio Grande do Norte no tocante
a mudanças no comportamento do operariado, com sindicatos organizados e amparados pelas leis
trabalhistras, que vão marcar o início do populismo", graças à atuação de Café Filho.
João Café Filho: Do Sindicato ao Catete
João Café Filho foi o grande líder da Revolução de 30 no Rio Grande do Norte.
Nasceu no dia 3 de fevereiro de 1899, na rua do Triunfo, Ribeira, em Natal. Filho de João
Fernandes Campos Café e de Florência Amélia Campos Café.
Os seus estudos iniciais foram realizados nas escolas de Amália Benevides, Edilbertina
Ataíde e Áurea Magalhães, para um pouco mais tarde ingressar sucessivamente nos seguintes
estabelecimentos de ensino: Colégio Americano, Grupo Escolar Augusto Severo, Escola Normal e
Atheneu Norte-Rio-Grandense.
Mesmo sem concluir curso superior, exerceu a advocacia como provisionado, tendo feito
exames no Tribunal de Justiça em Natal.
Na juventude, foi atleta de poucos recursos, conseguindo, entretanto, jogar na posição de
goleiro no Alecrim Futebol Clube, uma das agremiações esportivas mais tradicionais do Estado.
Mas teve uma importante atuação como integrante da diretoria do próprio Alecrim, e igualmente do
Centro Esportivo Natalense.
Muito cedo, com apenas quinze anos, começou a sua vida de jornalista, quando publicou "O
Bonde" e "A Gazeta", ambos manuscritos. Depois fundou e dirigiu o "Jornal de Natal". Nesse
jornal, começou a abordar a questão social do Estado.
Adulto, Café se casou com D. Jandira Carvalho de Oliveira Café.

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Em 1923, liderou as primeiras graves que ocorreram no Rio Grande do Norte. Por essa razão,
a polícia cercou o quarteirão onde sua casa se localizava e o jornal que dirigia. Conseguiu fugir.
Depois, partiu para Recife e, logo em seguida para Bezerros, onde foi nomeado secretário da
prefeitura. Fundou o jornal "Correio de Bezerros" e o Clube Social e Esportivo Palameira. Voltando
para Recife, em 1925, dirigiu mais um jornal, "A Noite", quando entrevistou Antonio Silvino na
Penitenciária de Recife. Ainda na capital pernambucana, redigiu um documento "concitando os
subalternos do Exército a desobedecerem as ordens recebidas" e participar da Coluna Prestes.
Como conseqüência, foi processado e condenado pelo Supremo Tribunal Federal. Fugiu para
Itabuna, na Bahia. Após um certo tempo, regressou a Natal, onde foi preso.
Em 1928, foi eleito vereador. Uma façanha, porque, naquela época, era difícil alguém da
oposição vencer. O "sistema eleitoral" vigente pode ser ilustrado com um exemplo, contado pelo
próprio Café Filho: "A oposição elegeu a maioria da Câmara Municipal. O Governo do Estado, em
represália pela derrota sofrida, mandou queimar as atas eleitorais. O atentado foi executado pelo
chefe político local, seguindo as instruções dos chefes das oligarquias. Destruídas as atas, o
situacionismo procedeu a "eleição" dos seus próprios vereadores, a bico de pena"...
A oligarquia não deixava Café Filho em paz. Sendo mais uma vez perseguido, fugiu
novamente para Recife e viajou para o Rio de Janeiro, onde se integrou à campanha política a favor
da Aliança Liberal. Depois foi enviado para a Paraíba com o objetivo de divulgar o movimento.
Recebido por João Pessoa, voltou a atuar como jornalista, reeditando o "Jornal da Noite". Atuante,
percorreu toda a Paraíba fazendo campanha pela Aliança Liberal.
No dia 2 de outubro de 1930, entrou no Rio Grande do Norte em plena efervescência
revolucionária. As tropas paraibanas invadiram o Rio Grande do Norte sem encontrar resistência.
Nas negociações para compor o governo, se pretendia eleger o desembargador Silvino Bezerra
Neto, irmão de José Augusto, líder das oligarquias e, portanto, adversário das idéias
revolucionárias... João Café Filho, sempre vigilante, impediu que tal designação fosse feita. E o
governo provisório foi entregue a uma Junta Militar.
O povo, insatisfeito, pedia medidas radicais. Para acalmar a população, sobretudo a
natalense, Café Filho foi designado chefe de Polícia. Mais tarde, afastado do cargo, voltou a
assumir a Chefia da Polícia durante a administração do interventor federal comandante Bertino
Dutra. Foi nessa segunda gestão que Café Filho criou a Guarda Civil e a Guarda Nortuna.
Em 1933 e anos seguintes exerceu as funções de Inspetor do Trabalho, no Rio de Janeiro.
Foi eleito deputado federal em 1935, porém, não concluiu seu mandato por causa da
decretação do Estado Novo em 1937. Perseguido por fazer oposição ao governo Vargas, conseguiu
asilo na Argentina.
Em 1945, de volta ao Brasil, fundou o Partido Social Progressista no Rio Grande do Norte. A
conselho de Adhemar de Barros, registrou o partido com o nome de Partido Republicano

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Progressista. Justificativa de Adhemar: "poderia atrair, pela identidade fonética, os antigos
partidários e eleitores do Partido Republicano Paulista, os 'perrepistas' de antes de 1930". Como
não conseguiu os objetivos desejados, posteriormente o partido voltou a ser chamado pela
denominação original.
João Café Filho foi eleito novamente deputado federal em 1945. Essa foi a sua fase mais
dinâmica, segundo ele próprio: "Exerci, em minha atividade parlamentar, no Palácio Tiradentes, o
período de maior vitalidade e energia de minha vida".
Um feito de Café Filho: com um discurso apenas provocou a exoneração de Correia e Castro,
ministro da Fazenda do governo Dutra.
Em 1950 Café Filho se elegeu vice-presidente da República, juntamente com Getúlio Vargas,
que assimiu a presidência da República, juntamente com Getúlio Vargas, que assumiu a presidência
do País.
Após o suicídio de Getúlio Vargas, a 24 de agosto de 1954, passou a exercer a função de
presidente do Brasil. De acordo com suas palavras, foi "o único momento que me tocou
verdadeiramente, que me confortou, que foi pleno e sem contrastes em esplendor e confiança".
Porém, não chegou a concluir o seu mandato, inicialmente por causa de uma crise
cardiovascular, e depois foi 'impedido', afastado da presidência. Falava-se em "golpe" e em "contra-
golpe".
Nereu Ramos, então, assumiu o governo. A complicação não se resumia ao afastamento de
Café Filho. Havia outro impasse. Juscelino Kubitschek de Oliveira, eleito presidente através do
voto popular, estava ameaçado de não tomar posse...
Fora do poder, João Café Filho foi nomeado ministro do Tribunal de Contas do Rio de
Janeiro.
Posteriormente, escreveu suas memórias sob o título "Do Sindicato ao Catete", em dois
volumes.
Faleceu no dia 11 de fevereiro de 1970 no Rio de Janeiro.
O Rio Grande do Norte prestou uma homenagem ao único norte-rio-grandense que chegou a
ser presidente da República, inaugurando a Casa Café Augusto, e onde se encontra atualmente um
grande acervo sobre o ilustre jornalista e político potiguar.
A Intentona Comunista
Um Contexto de Agudos Conflitos Sociais
A Intentona Comunista de 1935 não foi um episódio isolado que ocorreu apenas no Rio
Grande do Norte. Ela surgiu dentro de um contexto internacional e, ao mesmo tempo, brasileiro.
Na "História do Povo Brasileiro" se encontra a descrição do cenário no qual a Intentona se
realizou: "Naquela época de agudos conflitos sociais, a democracia clássica se imobiliza, enleada
em impedimentos formais, enquanto os ditadores de esquerda e de direita, vencidos os impecilhos

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internos preparavam-se para o inevitável confronto mundial (...) O Brasil tornou-se, assim, o
grande centro de competições entre os idealistas totalitários, na América Latina, no interregno
liberal de 1934 a 1937.
A Constituição de 1934, que havia escolhido Getúlio Vargas para presidente da República por
via indireta, ensejou a formação de partidos políticos. Entre as organizações partidárias nascidas na
ocasião estava a "Aliança Nacional Libertadora", de orientação comunista, cujo presidente de honra
era Luís Carlos prestes, filiado ao PC (Partido Comunista) desde 1928. A "Aliança Nacional
Libertadora' encarregou-se organizar greves e manifestações públicas onde pediam o candelamento
da dívida imperialista, nacionalização de empresas estrangeiras e o fim do latifúndio, entre outras
reivindicações. Objetivam também: impor o vasto programa da ANL (Aliança Nacional
Libertadora); a queda do governo Vargas; o fim do fascismo; a defesa da pequena propriedade;
jornada de oito horas de trabalho; aposentadoria, e defesa do salário mínimo.
Foi a ANL que inspirou o movimento comunista que eclodiu em novembro de 1935 na cidade
de Natal e que ficou conhecido como sendo a Intentona Comunista.
O fato é que, como disse Tarcísio Medeiros, "foi nesse ambiente que o interregno liberal, de
1934 a 1937, foi dominando o Brasil, no qual as correntes democráticas perdiam o controle das
massas e das ruas, envolvidas nas competições pessoais e nas tricas de campanário".
Ação Armada e o Domínio de Natal
As raízes do movimento comunista de 1935 no Rio Grande do Norte possuíram, sem dúvida
alguma, causas locais e que podem ser apontadas como resquícios da campanha eleitoral de 1934,
quando predominou um clima de violência.
Mário Leopoldo Pereira da Câmara, apesar do mérito de algumas realizações efetuadas
durante sua administração, foi responsável pela implantação de um clima favorável ao
aparecimento de movimentos armados.
O substituto de Mário Câmara, Rafael Fernandes Gurjão, continuou perseguindo seus
adversários políticos, a exemplo de seu antecessor. Rafael Gurjão contribuiu com o aumento do
número dos descontentes, engrossando o grupo dos revoltosos. Chegou, inclusive, a extinguir a
Guarda Civil, um órgão completamente descomprometido com a política, só porque havia sido
criada por Café Filho, inimigo político do novo governante... Dentro desse contexto, as
divergências arrastaram para o movimento pessoas que desconheciam a ideologia comunista, mas
viam na ação armada uma maneira de derrubar o governo...
A Intentona Comunista foi iniciada na noite de 23 de novembro de 1935, ocasião em que no
Teatro Carlos Gomes - hoje Alberto Maranhão - estava acontecendo uma solenidade de colação de
grau do Colégio Marista. O governador Rafael Fernandes Gurjão e o secretário geral do Estado,
Aldo Fernandes, abrigaram-se na residência de Xavier Miranda, nas proximidades do teatro, e
depois foram para o Consulado da Itália, sob os cuidados do cônsul Guilherme Letieri. O prefeito

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Gentil Ferreira, também presente à solenidade, foi para o Consulado do Chile, sob a proteção do
cônsul Carlos Lamas.
Coube ao maior Luís Júlio, da Polícia Militar e ao coronel Pinto Soares, do 21º BC, a
organização da resistência. Os combates estenderam-se por várias horas, até acabar a munição,
quando as forças legais se renderam. As comunicações telefônicas foram cortadas, resistindo
apenas a estação telegráfica de Macaíba, através da qual os legalistas pediram socorro à capital
federal.
Durante os combates, o quartel da polícia militar resistiu, lutando contra um inimigo "muitas
vezes superior em número", relata João Medeiros Filho. A resistência durou várias horas,
terminando quando os policiais gastaram a última bala. Os legalistas fugiram pelo Rio Potengi.
Os rebeldes dominaram Natal e, no dia 25 de novembro de 1935, organizaram um Comitê
popular Revolucionário, composto por Lauro Cortês, ex-diretor da Casa de Detenção, como
ministro de Abastecimento e Quintino de Barros, 3º sargento, músico do 21º BC, como ministro da
Defesa. O comitê se instalou na Vila Cinanto, até então residência oficial do governador.
Durante a vigência do governo revolucionário, a população da Cidade do Natal atravessou
momento de grandes dificuldades, principalmente para a aquisição de gêneros alimentícios, uma
vez que os rebeldes saquearam muitos armazéns e lojas que abasteciam a cidade. Entre os
estabelecimentos saqueados figuram os seguintes: M. Martins & Cia.m Viana & Cia., M. Alves
Afonso etc. O comércio de diversas cidades do interior também não escapou. Por onde os rebeldes
passavam, implantavam o pânico.
No tempo em que os comunistas estiveram no poder, circulou um jornal intitulado
"Liberdade", que publicou as seguintes palavras, transcritas por João Medeiros Filho: "Enfim, pelo
esforço invencível do povo, legitimamente representado por Soldados, Marinheiros, Operários e
Camponeses, inaugura-se no Brasil a era da Liberdade, sonhada por tantos mártires, centralizados e
corporificados na figura legendária de Luís Carlos Prestes, o "Cavaleiro da Esperança".
Versões Sobre os Combates no Interior
Ao tomar conhecimento do que estava acontecendo na capital potiguar, Dinarte Mariz entrou
em contato com o governador da Paraíba, Argemiro de Figueiredo que, atendendo ao apelo do líder
seridoense, ordenou que policiais paraibanos penetrassem no Rio Grande do Norte rumo a Natal.
O primeiro encontro entre comunistas e sertanejos foi em Serra Caiada, com vitória para os
legalistas.
Para alguns historiadores, o principal combate entre as duas facções teria ocorrido na Serra
do Doutor, entre as cidade de Santa Cruz e Currais Novos, João Medeiros Filho, por exemplo,
descreve que "os sertanejos que numa ação fulminante rechaçaram o inimigo, abrindo caminho
para Natal onde chegaram no dia 27, já encontrando a cidade ocupada pelas tropas da polícia
paraíba".

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Aluízio Alves, entretanto, no depoimento que prestou à TV Universitária, disse que não
ocorreu nenhuma batalha na Serra do Doutor. E justificou, afirmando que quando os comunistas
saíram de Natal já tinham conhecimento do fracasso do movimento no Rio de Janeiro e em Recife.
Estavam, portanto, fugindo. "Essa história de guerra na Serra do Doutor é uma imagem colorida de
uma guerra que não houve", argumenta Aluízio.
O testemunho de Enoch Garcia ao mesmo programa da TV Universitária, "Memória Viva",
confirma o entrevero, mas não os personagens de outros relatos: "Todo mundo queria que Dinarte
tivesse tomado parte na Serra do Doutor. Ele não tomou parte na Serra do Doutor, como eu não
tomei, como Humberto Gama não tomou. Lá, tomaram parte esses oficiais dos quais eu já falei:
Pedro Siciliano, José Epaminondas, Genésio Cabral, Antônio de Castro... e, inclusive muitos civis".

AVIAÇÃO E SEGUNDA GUERRA


Intentona Não se Sustenta
Tiroteio e Fuga dos Combatentes
Dinarte Mariz, segundo Enoch Garcia, telefonou para o governador da Paraíba, Argemiro de
Figueiredo, que prometeu e efetivamente enviou tropas paraibanas para o Rio Grande do Norte
para combater os revoltosos da Intentona Comunista.
Enoch recebeu o seguinte telegrama de Florêncio Luciano: "Enoch, eu não sei o que
aconteceu, mas o nosso povo reagiu em cima da Serra, e o esbandalho foi grande. Até agora está
correndo gente deles e gente nossa...".
Conclusão: aconteceu realmente um tiroteio, provocando a debandada de ambas as facções.
Entre os revolucionários, muitos eram reservistas e nada tinham com a ideologia comunista. Na
primeira oportunidade, largaram as armas e fugiram... Os integrantes do outro lado eram sertanejos,
em sua maioria homens simples, pequenos agricultores ou trabalhadores rurais que não estavam
dispostos a participar de conflito algum. Aos primeiros anos, fugiram.
Portanto, houve realmente um confronto na Serra do Doutor, interior do Rio Grande do
Norte,. Porém, sem as dimensões que se pretendeu dar. De qualquer maneira, o fato marcou o final
da Intentona Comunista de 35 no Rio Grande do Norte.
Repressão Violenta e Prisões Injustas
A repressão após a Intentona Comunista foi violenta. O chefe da Polícia do governo Rafael
Fernandes, João Medeiros Filho, reconheceu que houve "excesso"...
Segundo Aluízio Alves, "Rafael Fernandes e Aldo Fernandes se empenharam para não
misturar a polícia estadual com a reação da revolução (...) Houve muitas pressões injustas, na
época, apesar de toda a resistência, sobretudo de Aldo Fernandes, que se incompatibilizou muito
com o Partido Popular, por conta de suas atitudes corretíssima, digníssima, distinguindo as
responsabilidades da revolução, da participação eventual emocional do Marismo e do Caféismo".

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Êxito Momentâneo Não Assegurou Poder
O levante de 35, que explodiu no Rio Grande do Norte, teve um cunho comunista, como
prova a criação de um Comitê Popular Revolucionário e ainda o editorial do órgão oficial da
Intentona, "A Liberdade", exaltando o líder comunista Luís Carlos Prestes, chamado de "Cavaleiro
da Esperança". Outros fatores que contribuíram para o êxito momentâneo do movimento: muitos
funcionários públicos, descontentes com as demissões e perseguições políticas - incluindo os
militares -, se engajaram na luta pensando que se tratava de um levante contra o governador.
Alguns soldados, reservistas, participaram apenas para cumprir ordens, sem saber ao certo o que
estava acontecendo. Além do mais, faltou um líder que reunisse as massas e, ao mesmo tempo,
esclarecesse o povo para conseguir sua adesão consciente. Resultado: as camadas mais humildes
ficaram desorientadas, praticando desordens. E alguns oportunistas se aproveitaram do momento
para saquear e roubar. Não houve, igualmente, uma maior sintonia entre os chefes militares e os
líderes civis. O que determinou que o movimento acabasse caindo num vazio...
O principal obstáculo a um levante de esquerda não estava na capital e sim no interior. As
oligarquias que dominavam o Estado não aceitariam nenhum governo que contrariasse os seus
interesses, como aconteceu anteriormente com a Revolução de 30.
Os revolucionários contavam com a vitória do movimento no Rio de Janeiro e em Recife.
Como o fracasso do levante nesses dois centros urbanos, eles perderam a confiança, procurando
fugir. Abandonaram a capital sem nenhuma resistência. Na realidade, não tinham a menor
possibilidade de permanecer no poder por um período maior. Além das diversões internas, qualquer
resistência seria esmagada pelas forças paraibanas e pernambucanas, que certamente seriam
enviadas para o Rio Grande do Norte com o objetivo de destruir a rebelião.
A Epopéia da Aviação
Os Hidroaviões Aterrissam no Potengi
A localização da Cidade do Natal fez com que seu nome ocupasse uma posição de relevo na
história da aviação mundial. Sobretudo nos tempos iniciais ou, mais precisamente, no período
compreendido entre 1922 e 1937, que se divide em duas fases: a dos hidroaviões e as dos aviões.
Os hidroaviões desciam nas águas do Rio Potengi e, posteriormente, os aviões pousavam num
campo em terra firme.
Os portugueses Sacadura Cabral e Gago Cointinho inauguraram a primeira fase com o "raid"
África-Natal, cobrindo uma distância de 1.890 milhas. Por causa de dificuldades, os lusitanos
desceram em Fernando de Noronha, passando por Natal e indo até Recife.
No dia 21 de dezembro de 1922, o brasileiro Euclides Pinto Martins e o norte-americano
Walter Hinton chegava a Natal, fazendo o "Sampaio Correia II" amerissar nas águas do Rio
Potengi. Estavam realizando o "raid" Nova Iorque-Rio de Janeiro.

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Após essas façanhas, a capital norte-rio-grandense passou a receber grande número de
aviadores famosos, que com suas aventuras escreviam a história da aviação. Todos eles foram
recebidos como verdadeiros heróis.
Os natalenses acompanharam a ação dos pioneiros com muito interesse.
Exemplo: a 24 de fevereiro de 1927, Natal recebeu com manifestações de júbilo o marquês
De Pinedo, italiano que juntamente com Carlo Del Prete e Victale Zachetti chegaram à cidade
viajando no "Santa Maria". De Pinedo, além de percorrer as principais ruas natalenses em carro
aberto, participou de um almoço em sua homenagem. No discurso de agradecimento, o marquês
sentenciou: "Natal será a mais extraordinária estação da aviação mundial".
No mesmo ano, chegou ao Rio Grande do Norte a esquadrilha do exército norte-americano -
a primeira esquadrilha a baixar no Rio Potengi - sob o comando do major Herbert Dangue e
integrada pelos hidroaviões "Santo Antonio", "São Luís" e "São Francisco".
Nessa época, a França tinha planos de abrir rotas aéreas comerciais estabelecendo uma linha
Europa-América do Sul, que não se concretizou. Mas a partir de 1924, revela Clyde Smith Junior,
"empresas particulares assumiram a tarefa de executar esse projeto".
A Lignes Latéroère procurou estender sua ação até o Brasil. Essa companhia enviou Paul
Vachet a Natal, num Breguet, um biplano que foi forçado a aterrissar na praia da Redinha porque
Natal não contava ainda com um local apropriado.
O Breguet pilotado por Paul Vachet foi, portanto, o primeiro aeroplano - ou seja, avião que
pousava em terra e não nas água, como os anteriores - a aterrissar no Rio Grande do Norte.
Iniciando, assim, uma nova fase na história da aviação em terras potiguares.
3Nasce o Aeroporto de Parnamirim
Paul Vachet foi enviado a Natal pela Lignes Latécoère para estabelecer aqui uma base dentro
da rota Brasil-Dakar. E para isso precisava de um campo de pouso.
Vachet procurou, então, um terreno apropriado para construir um aeroporto. Segundo Câmara
Cascudo, "um oficial do Exército, o coronel Luís Tavares levava para Parnamirim o batalhão sob o
seu comando para exercícios militares. Em 1927, indicou-o como campo de pouso para os aviões
da Latércoère. Feita uma limpeza sumária no mato ralo e nivelamento provisório, inaugurando-o,
às 23h45 de 14 de outubro de 1927, o "Numgesser-et-Coli", um monomotor Breguet-19, pilotado
por Dieu Coster e Le Brix, concluindo com êxito o roteiro Saint Louis do Senegal-Natal.
Clyde Smith Junior informa que "esse foi o primeiro vôo transatlântico em sentido leste-oeste
(...) Essa façanha marcou o início do serviço aéreo entre Paris e Buenos Aires".
Juvenal Lamartine e o Aéro Clube
O Rio Grande do Norte não poderia ficar apenas recebendo aviões. Era preciso participar de
uma maneira mais ativa. Juvenal Lamartine, consciente do problema, apresentou um projeto na

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Câmara Federal para criar um aviódromo em Natal. A 29 de dezembro de 1928, era fundado o Aéro
Clube.
Tarcísio Medeiros descreve o evento: "Participaram das festividades, numa revoada de
Parnamirim a Natal, um "Beu-Vird", pilotado pelo diretor-técnico, comandante Djalma Petit,
trazendo a bordo o Sr. Fernando Pedroza, e um aparelho da Générale Aéropostale (C.G.A), pilotado
por Depecker. Na ocasião, foi batizado o primeiro aeroplano do "club", com o nome de Natal".
A diretoria do Aéro Clube era formada por Juvenal Lamartine, presidente; Dioclécio Duarte,
vice-presidente, e Adauto Câmara, primeiro secretário.
A sede estava situada no bairro do Tirol., onde ainda hoje se encontra, apesar de ter passado
por sérias crises. E de acordo com Tarcísio Medeiros, possuía um "pequeno campo de pouso ao
lado do poente da sede social'".
Esquadrilha Balbo e Coluna Capitolina
No dia 6 de janeiro de 1931, chegava a Natal a esquadrilha da força aérea italiana,
comandada pelo general Ítalo Balbo. Composta inicialmente por doze aviões, apenas dez
conseguiram atingir Natal.
Poucos dias antes, ou seja, em 1º de janeiro do mesmo ano, o navio italiano "Lanzeroto
Malocell", sob o comando do capitão-de-fragata Carlos Alberto Coraggio, trazia a Coluna
Capitolina, doada pelo chefe do governo italiano, Benito Mussolini. A peça havia sido encontrada
nas ruínas de Roma e foi oferecida ao povo natalense para comemorar o "raid" Roma-Natal,
realizado pelos aviadores Del Prete e Ferrarin.
Nessa data, governava o Rio Grande do Norte o interventor federal Irineu Joffily.
Participaram da comissão de recepção o prefeito Dias Guimarães e João Café Filho.
Em uma das faces da Coluna Capitolina há uma mensagem em italiano que foi traduzida para
o português no livro "Aspectos Geopolíticos e Antropológicos da História do Rio Grande do
Norte", de Tarcísio Medeiros: "Trazida de uma só lance sobre asas velozes além de toda distância
tentada por Carlos Del Prete e Arturo Ferrerin, a Itália aqui chegou a 5 de julho de 1928. O oceano
não mais divide e sim une as agentes latinas de Itália e Brasil".
A Viagem Inédita de Jean Mermoz
Um dos aviadores que marcou presença em Natal durante essa época foi o francês Jean
Mermoz.
No dia 13 de maio de 1930, Jean Mermoz realizou a sua primeira travessia. Partindo de São
Luís do Senegal, chegou a Natal vencendo uma distância de 3.100 quilômetros.
Passou alguns dias na capital potiguar planejando uma viagem de regresso, o que seria um
fato inédito.
O aviador francês voltou a Natal em abril do ano de 1933, pensando ainda em realizar o seu
sonho: a viagem Natal-Dakar. Fez muitas amizades no Rio Grande do Norte. Um de seus amigos,

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Eudes de Carvalho, revelou que o francês "adquiriu, com o tempo, apego à terra e à gente potiguar
e previu o futuro de Parnamirim como base aérea de destaque mundial".
Jean Mermoz, finalmente, conseguiu concretizar sua antiga aspiração. Partindo de Natal num
trimotor, o "Arc-en-Ciel", pousou em Dakar, sendo o primeiro a realizar tal façanha.
O piloto francês participou de outras atividades em ação militar, recebendo as medalhas
"Cruz da Guerra' e "Levante".
Tarcísio Medeiros narra outro feito de Mermoz: "bateu, entre 11 e 12 de abril de 1930, o
"record" mundial de permanência no ar, em circuito fechado, cobrindo 4.343 quilômetros em 30
horas e 30 minutos, em Laté-28 com flutuadores, no qual voou para Natal".
Jean Mermoz desapareceu nas águas do Oceano Atlântico a bordo do seu "Croix-de Sud", em
dezembro de 1936.
Concorrência Européia nos Céus Natalenses
Depois da França, a Aleamha entrou em cena. A Lufthansa estendeu sua ação comercial até
Natal durante 1933. No outro ano, informa Clyde Smith Junior, "as linhas aéras francesas e alemãs
entraram em um acordo que exercia uma cooperação técnica e uma cidisão de itinerário. Em torno
de 1937, elas concordaram em associar suas receitas relativas ao trecho África-Natal e, em 1939, a
Air France (antiga Lignes Latécoère) e a Condor (Lufthansa) tornaram seus bilhetes permutáveis na
África do Sul".
A Itália também esteve presente em Natal através da Linee Aeree Transcontinentali Italiane -
Ala Litoria (LATI). A empresa foi organizada pelo governo italiano e, posteriormente, foi acusada
pelos adversários, durante a guerra, de estar a serviço das "Tropas do Eixo".
A Inglaterra e os Estados Unidos não participaram desse esforço inicial, em rotas que
envolveram Natal no processo de desenvolvimento da aviação.
Somente durante o início da Segunda Guerra Mundial é que a companhia norte-americana
Pan American manteve uma rota que passava por Natal.
O Grande Projeto de Augusto Severo
Augusto Severo nasceu na cidade de Macaíba, no dia 11 de janeiro de 1864, filho de Amaro
Barreto de Albuquerque Maranhão e D. Feliciana Maria da Silva de Albuquerque Maranhão.
Entre seus irmãos, os que mais se destacaram foram Pedro Velho e Alberto Maranhão.
O biógrafo Augusto Fernandes traçou em poucas palavras a personalidade de Augusto
Severo: "físico avantajado era o espelho fiel de espírito vigoroso. Figura simpática, sabendo o que
dizia e trazendo-o desembaraçadamente, com os olhos mansos, o sorriso fácil e os gestos
aristocratas, conquistava sem dificuldade as pessoas mais esquivas".
Iniciou os estudos na terra onde nasceu, Macaíba, e depois continuou a sua vida de estudante
em duas outras cidades: Natal e Salvador. Fez o curso de humanidades com brilhantismo.

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Entrou posteriormente para a Escola Politécnica, no Rio de Janeiro. Quando cursava o
segundo ano, adoeceu e teve que voltar para Natal.
Exerceu, então, a função de professor de Matemática no Ginásio Norte-Riograndense, escola
da qual chegou a ser vice-diretor.
Quando o Ginásio fechou, em 1883, foi forçado a se dedicar ao comércio, trabalhando como
guarda-livros da loja "Guararapes".
Idealista participou ao lado de Pedro Velho da campanha abolicionista.
Com relação às suas preocupações como homem de ciência, Augusto Severo se dedicou
primeiro em descobrir o modo-contínuo. Depois, abandonou essa pesquisa. Pensou também em
estudar o "mais" pesado que o ar". Desistiu. Os seus interesses começavam a se voltar para outra
direção: "agora, todos os seus estudos e esforços buscava descobrir um meio para dar estabilidade e
segura dirigibilidade aos balões. Imaginou e desenhou, então, o "Potiguarânis", que não chegou a
ser realizado, mas influiu na construção, mais tarde, do Bartolomeu de Gusmão, realmente o seu
primeiro dirigível".
Continuando seus estudos, chegou ao "PAX', considerado pelos técnicos como um importante
avanço na conquista do espaço.
Criou também o "tubo motor de reação", que dizem ter sido usado pela torpedeira "A
Turbina", que pertencia à marinha inglesa. Segundo Augusto Fernandes, a "Turbina" chegou a
atingir uma velocidade de 37 milhas.
É ainda Augusto Fernandes que fala sobre outra criação do cientista norte-rio-grandense:
inventou "o sistema de hélice introduzida no interior de um tubo, que atravessa o navio seguindo o
grande eixo, permitindo-lhe marchar avante e a ré".
Em 1893, Augusto Severo substituiu o irmão Pedro Velho no Congresso.
Em 19 de outubro de 1901, Santos Dumont, com o dirigível 'Santos Dumont nº 6", realizou
um grande feito, pelo qual recebeu o prêmio "Deutsc" . Depois de levantar vôo de Saint-Cloud,
para assombro do povo de Paris, contornou a Torre Eiffel.
Anterior a essa data, houve um movimento no Brasil para prestar uma homenagem ao
aeronauta brasileiro. No Congresso Nacional, o deputado federal Bueno de Paiva propôs, no dia 17
de julho de 1901, um voto de louvor a Santos Dumont, por ter encontrado "a solução do secular
problema" da dirigibilidade e estabilidade. Acontece que Augusto Severo, um profundo conhecedor
da questão, sabia que tal solução não havia sido encontrada e protestou contra a inverdade. Mas,
reconhecendo a importância do aeronauta, propôs que fosse inserido em ata um voto de louvor a
Alberto Santos Dumont e ainda concedido ao ilustre brasileiro, como prêmio o valor de
100:000$000, importância que ele precisava para continuar suas experiências. O discurso de
Augusto Severo foi simplesmente brilhante. Ao conclui-lo foi, além de muito aplaudido, abraçado
pelos deputados presentes.

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Augusto Severo, após licenciar-se da Câmara Federal, partiu para Paris com a finalidade de
fazer, igualmente, experiência no campo da aeronáutica.
Augusto Fernandes, numa síntese, demonstra toda a importância de Severo: "os balcões de
Dumont, como os de seus antecessores, sob o ponto de vista científico, não possuíam as
características necessárias de ESTABILIDADE e, portanto, perfeita NAVEGABILIDADE. Esta
conquista pertence, exclusivamente, a Augusto Severo".
Ele não se tornou, como chegaram a comentar em Paris, um rival de Santos Dumont, E sim,
afirma Augusto Fernandes, "um concorrente sério, competente, leal, para Dumont. E sim, afirma
Augusto Fernandes, "um concorrente sério, competente, leal, para Dumont ou qualquer outro que
tentasse as mesmas experiências".
Paralelamente às suas experiências, Augusto Severo, com sua simpátia contagiante de
verdadeiro aristocrata, fez sucesso na sociedade parisiense e européia, conseguindo a amizade de
grandes personalidades da época, como Zola e Paul Rousseau. Chegou inclusive a receber uma
carta da princesa Wiszniewska, presidente d fundadora da "Aliança Universal das Mulheres pela
Paz e pela Educação".
Finalmente, o grande projeto de Augusto Severo estava pronto: o "PAX"! Revistas da França
e da Inglaterra abriram suas páginas para falar sobre a experiência que estava prestes a acontecer.
Era a glória!
Na construção do PAX, Severo contou com a importante ajuda do mecânico George Sachet.
Na madrugada do dia 12 de maio de 1902, Augusto Severo e George Sachet realizavam, para
o povo de Paris, o tão almejado vôo. Quando o PAX se encontrava aproximadamente a 400 metros
de altura, um clarão e, depois, uma explosão. Era o fim do sonho. Morreram ambos, Severo e
Sachet.
Um texto e "A Notícia", no jornal do Rio de Janeiro (23/6/1902), narrando o enterro de
Augusto Severo, poetizou: "não acredito haja alguém, lá fora, que possa em pleno dia - um dia
rútilo de sol pelas ruas apinhadas de gente e passando, entretanto, silencioso, recolhido, sem um
rumor, como se as mais vastas praças fossem pequenas câmaras mortuárias, em que se anda nas
pontas dos pés, com um respeito religioso (...). Que dia esplêndido de glória! Glória triste - mas,
apesar de tudo, glória!".
Natal na Segunda Guerra Mundial
Os Aliados e as Forças do Eixo
Quando Adolf Hitler invadiu a Polônia, alegando que a Alemanha necessitava de "espaço
vital", estava iniciando o Segundo Conflito Mundial. De um lado, estavam os "Aliados": França,
Inglaterra e Estados Unidos. Do lado oposto, Itália, Alemanha e Japão formavam as "Forças do
Eixo". Os dois grupos lutaram (com a posterior entrada de outras nações, inclusive os Estados

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Unidos da América) durante o período entre 1939-1945, levando o mundo a uma devastação que
até então nenhuma outra guerra tinha provocado.
Após a sua entrada no conflito, os norte-americanos procuram uma aproximação com o
Brasil, porque necessitavam instalar ou melhorar as bases aéreas do Nordeste brasileiro.
Havia uma grande preocupação dos norte-americanos em demonstrar aos brasileiros que a
sua presença naquela região do País era apenas para ganhar a guerra. Nada de conquista territorial.
Em Natal, contudo, havia adeptos das "Forças do Eixo". Em outubro de 1942, ocorreu um
fato tragicômico: a Rádio Educadora de Natal colocou no ar uma marcha militar alemã e, logo em
seguida, o hino nacional alemão. A transmissão provocou protesto de grande parte da população e a
emissora foi fechada, sendo reaberta dois dias depois.
Apesar de oficialmente neutro, o Brasil vai aos poucos se aproximando da causa dos
"Aliados", e se afastando das "Forças do Eixo". Essa situação se reflete em Natal, com a maioria da
população torcendo pela vitória dos "Aliados".
Em dezembro de 1941, chega a Natal o Esquadrão de Patrulhamento da Marinha dos Estados
Unidos, como nove aeronaves e o avião auxiliar "Clemson". Pouco depois, chegavam os fuzileiros
navais. Em 1942 eram duzentos homens.
O almirante Ary parreiras, enviado para construir a Base Naval do Natal, demonstra, na
opinião de Cascudo, "força realizados, obstinação, ditadura da honestidade, mítica do sacrifício
silencioso, discreto e diário".
Os norte-americanos, por sua vez, constróem "Parnamirim Field", uma verdadeira megabase,
durante o período de guerra.
Em termos de forças terrestres, desde 12 de junho de 1941, Natal contava com o 16 RI,
criado aproveitando os efetivos do 29 BC e do II BC de Minas Gerais.
Segundo Tarcísio Medeiros, "no dia 11 de outubro, o general Gustavo Cordeiro de Farias
assumia o comando da 2ª Brigada de Infantaria (...) A aviação unificada desde 18 de janeiro com a
criação do Ministério da Aeronáutica, possuindo o campo de Parnamirim, estabeleceu a sede da 2ª
Zona Aérea, cujo comando, confiado ao brigadeiro Eduardo Gomes, impulsionou o primeiro grupo
de aviões que partia, policiando os ares (...) e os comboios marítimos, num serviço assíduo de
cobertura e vigilância".
O Brasil Entra na Guerra
No último dia da Terceira Conferência de Ministros Estrangeiros, em 28 de janeiro de 1941,
realizada no Rio de Janeiro, o Brasil rompeu as relações com as Forças do Eixo.
Passando alguns meses, no dia 22 de agosto de 1942, o Brasil declarou guerra à Alemanha e à
Itália.
O avanço das "Tropas do Eixo", lideradas por Rommel, no continente africano, colocou em
perigo a navegação do Atlântico, da costa brasileira, como também de todo o continente americano.

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Teria sido por causa desse risco que o Brasil cedeu bases militares no litoral do Nordeste para
servir de apoio às operações militares que seriam desenvolvidas na África. E entrou na guerra.
Natal, por sinal, já vivia um clima de guerra, inclusive com blecautes diários. Contava
também com os serviços da Cruz Vermelha, Legião Brasileira de Assistência, Defesa Civil, e ainda
abrigos antiaéreos familiares e públicos.
Numa síntese, disse Câmara Cascudo: "Ao redor do campo, Natal, tabuleiros e praias, foi
organizada e dispostas a defesa militar, munições, matérias-primas em tonelagem astronômica.
Exército, Marinha, Aeronáutica, ergueram as barreiras defensivas, diárias e contínuas.
Dois Presidentes na "Conferência de Natal"
Quando o presidente dos Estados Unidos Franklin Delano Roosevelt se encontrava em
Marrocos, solicitou ao almirante Jonas Ingram para marcar um encontro com Getúlio Vargas,
presidente do Brasil, na Cidade do Natal.
Acertada a reunião, todas as providências foram tomadas em sigilo.
O presidente Getúlio Vargas chegou em Natal no dia 27 de janeiro de 1943, acompanhado de
sua comitiva. Ficou alojado no Dstróier Jouett. Na manhã do outro dia, dois aviões trouxeram o
presidente dos Estados Unidos, Roosevelt, e sua comitiva.
As autoridades brasileiras sediadas em Natal não foram informadas das ilustres presenças e a
segurança dos dois americanos, causando um mal-estar.
O governante potiguar Rafael Fernandes foi convidado para comparecer à base sozinho.
Chegando lá é que soube da novidade. Depois, Getúlio Vargas e Roosevelt, acompanhados de
Rafael Fernandes, cumpriram um programa de inspeções: base de hidroaviões, Parnamirim e os
quartéis brasileiros do exército e da aeronáutica.
À noite, Vargas e Roosevelt participaram da "Conferência de Natal" que, segundo Clyde
Smith Junior, "girou em torno de interesses mútuos e laços de amizades entre seus países, a
prevenção de um possível e perigoso ataque dirigido de Dakar para o hemisfério ocidental, e o
apoio do Brasil aos objetivos de guerra de Roosevelt. No dia seguinte, Roosevelt. No dia seguinte.
Roosevelt voou para Trinidad e Vargas voltou ao Rio acompanhado pelo almirante Ingram e pelo
general Wash".
Ao que parece, Roosevelt teria "pedido" ao presidente Vargas, o envio de tropas brasileiras
para o "front" na Europa e o estadista gaúcho "concordou".
A reunião, portanto, não foi apenas um encontro cordial de amigos para conversar futilidades.
Nela, ficou acertado o envio de tropas brasileiras para o "front".
Influência Americana e Mudança dos Costumes
A presença norte-americana em Natal mudou os hábitos de uma pequena cidade nordestina.
Lenine Pinto relata que "dos bares vazava a música das Wurlitzers, das lojas o burburinho de
consumidores ávidos e, quando as ruas esvaziavam-se, acendiam-se os salões de bailes, fluíam

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fantasias (...) Naquele tempo as festas sucediam-se freneticamente, dançava-se freneticamente,
amava-se freneticamente".
A Cidade do Natal modificou-se de maneira muito significativa com a presença do grande
número de militares estrangeiros aqui sediados. Do entrosamento entre americanos e jovens
natalenses resultaram alguns casamentos. O drama das jovens, não só natalenses, mas nordestinas
que não tiveram os seus romances com jovens americanos referendados pelo casamento, é descrito
pelo poeta Mauro Mota no seu "Boletim Sentimental da Guerra no Recife", através dos versos:
"Meninas, tristes meninas,
de mão em mão hoje andais.
Sois autênticas heroínas
da guerra, sem ter rivais.
Lutastes na frente interna
com bravura e destemor.
À vitória aliada destes
o sangue do vosso amor.
Ingênuas meninas grávidas,
o que é que fôstes fazer?
Apertai bem os vestidos
pra família não saber.
Que os indiscretos vizinhos
vos percam também de vista.
Saístes do pediatra
para o ginecologista".
Surgiram associações recreativas como, por exemplo, os "Clubes 50". Tanto o Aéro Clube
como igualmente o "Clube Hípico", foram alugados com o objetivo de realizar bailes. A finalidade
principal, certamente, era promover uma maior integração dos militares norte-americanos com a
população natalense. Houve, por causa disso, uma invasão de ritmos estrangeiros: "rumba",
"conga", "bolero".
As moças passaram a agir com mais autonomia e, conforme relata Lenine Pinto, "tendo
incorporado modos e modismos americanos, algumas aproveitaram para alongar o passo:
começaram a fumar (por ser o Chesterfield um cigarro "fraquinho", era a desculpa); a bebericar
"Cube Libre" (com a Coca-Cola inocentando a mistura de rum) e a pegar os primeiros "foguinhos".
Natal perdia aos poucos suas características de cidade pequena, com seus habitantes levando
uma vida modesta e tranqüila. Tomando inclusive um aspecto cosmopolita, com a passagem, pela
cidade, de pessoas de outras nacionalidades, com direito a figuras importantes: D. Francis J.
Spellman (arcebispo de Nova York), Bernard (príncipe da Holanda), Higinio Morringo (presidente

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do Paraguai), Sra. Franklin D. Roosevelt (esposa do presidente dos Estados Unidos), Sr. Noel
Cherles (embaixador do Reino Unido no Brasil) etc.
Os preços aumentaram por causa da injeção de dólares na economia local.
A influência norte-americana se fez sentir também na linguagem, com a introdução de
algumas palavras e expressões inglesas, exemplificadas por Clyde Smith Junior: "change money"
(troque dinheiro), "drink beer" (beba cerveja), "give me a cigarrette" (dê-me um cigarro),
"blackout" (blecaute) etc.
Outro fato lembrado pelo mesmos autor: "de uma cidade pequena e desconhecida, passou a
ser conhecida por milhões de americanos e outros aliados".
Durante a guerra. Natal cresceu muito, aumentando consideravelmente a sua população.

DOIS GOVERNOS POPULARES


O Populismo no RN
Forte Característica: O Carisma do Líder
Os teóricos se dividem quando procuram conceituar o que seja populismo. Na realidade, os
líderes políticos brasileiros classificados com o rótulo de "populista" apresentam uma grande
diversidade na maneira de agir. Não se pode dizer que líder populista é aquele que busca o apoio
popular, porque todos, da direita, do centro ou da esquerda, fazem promessas demagógicas com o
objetivo de conquistar o voto das camadas mais humildes, prometendo atender as reivindicações
populares...
Mas a característica principal dos líderes populistas é o carisma. Alguns chegavam a levar
multidões ao delírio, criando um clima favorável ao fanatismo. De uma madeira geral, não
entravam em confronto com as oligarquias, recebendo inclusive o apoio de algumas famílias
tradicionais. Em algumas regiões, o populismo ganhou como aliada a burguesia industrial,
sobretudo nos centros urbanos, onde esse segmento da sociedade começava a surgir com bastante
força.
O populismo surge, quase sempre, quando existe uma forte crise na oligarquia, forçando-a
fazer concessões pois para sobreviver precisa de um governo que atenda, ao mesmo tempo aos
interesses das três classes: conservadora, média e popular... A roupagem é popular, porém, o poder
permanece nas mãos da elite. Às vezes, contudo, se volta para a esquerda, tomando um caráter
mais radical, no sentido de promover reformas em favor do povo.
Não existe, portanto, uma política populista única e sim diretrizes, variando o seu conteúdo
de acordo com a formação ideológica e cultura de cada líder.
Oposições Vitoriosas nos Anos 60
Nos anos 60, o Brasil, passava por uma série crise política, agravada pelo conflito ideológico
esquerda versus direita, com radicalismo de ambas as partes. Dentro desse contexto, se destacava o

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antagonismo entre as forças nacionais ("comunistas") e as forças conservadoras ("entreguistas"),
com a participação ativa de políticos operários e estudantes.
Como conseqüência da crise que abalava o País. Quadros renunciou, entregando o cargo de
presidente da República a João Goulart, em agosto de 1961. Goulart, em agosto de 1961. Goulart
tomou posse em 7 de setembro e governou, em regime parlamentarista, até ser deposto pelo golpe
militar em 1964.
As constantes crises políticas vividas pelo País refletiam e deixavam profundas marcas na
região nordestina. Apesar do crescimento de sua produção industrial, a participação do Nordeste no
produto total do País caía para 15,5% ! Índice menor do que o de outras regiões.
Como conseqüência do processo de industrialização, cresceram os centros urbanos, e, ao
mesmo tempo, aumentava o êxodo rural, com o deslocamento de grande número de famílias para
as grandes cidades.
Um dos fatores que contribuíram para o êxito do populismo no Rio Grande do Norte foi a
atuação da Igreja Católica, com a instalação dos sindicatos rurais e com o Movimento de Educação
de Base.
As campanhas de educação popular contribuíram também para acelerar o processo de
politização das camadas mais humildes. Exemplos: a "Campanha de Pé no Chão Também se
Aprende a Ler", em Natal, e ao Movimento de Cultura Popular" em Recife, ambas em 1960.
Foi sobretudo no processo político que o descontentamento popular se refletiu no Nordeste,
com grandes vitórias conquistadas pela oposição durante o período compreendido entre 1956 a
1962. No Rio Grande do Norte, em 1960, Aluízio Alves se elegeu governador e, no mesmo ano,
Djalma Maranhão chegou à prefeitura de Natal, também pela oposição.
A campanha política de 1960 se desenrolou num clima de muita agitação. O governo Dinarte
Maris deixou um testamento político que desorganizou, completamente, as finanças do Estado.
O povo norte-rio-grandense estava asfixiado, aspirava por se livrar daquela situação,
recebendo com entusiasmo a mensagem oposicionistas que prometia reformular os processos
administrativos, dinamizar a administração pública e criar as condições básicas para iniciar a
industrialização, começando, dessa maneira, o desenvolvimento do Estado. Essa proposta de
governo era defendida por um jovem e dinâmico político: Aluízio Alves . Uma vez candidato,
rapidamente assumiu a liderança do seu grupo, organizando uma coligação partidária com a
denominação de "Cruzada da Esperança", formada pelo PSD, PTB, PCB, PRP, PTN e dissidentes
da UDN. Para vice-governador foi indicado o monsenhor Walfredo Gurgel, uma das mais
expressivas lideranças do PSD seridoense. Para a prefeitura da Cidade do Natal, dois líderes
representantes da esquerda: Djalma Maranhão, para titular, e Luiz Gonzaga, para vice-prefeito.
A nível nacional, a Cruzada da Esperança dividia-se. PSD, PTB e PTN apoiavam o marechal
Lott para presidente da República, um homem honesto, nacionalista, porém, sem nenhuma aptidão

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política. Aluízio Alves e a dissidência da UDN apoiavam Jânio Quadros. Para vice-presidente, os
candidatos eram João Goulart, com apoio do PSD, PTB e PTN, e Milton Campos, apoiado por
Aluízio.
Djalma Maranhão, um homem da classe média sem nenhuma ligação com qualquer grupo
econômico forte, de mãos limpas, partiu para a sua campanha com muita garra.
Sua atuação vai se caracterizar, principalmente, por dois aspectos. Primeiro, um caráter
nitidamente ideológico. Nacionalista, desencadeava uma luta aberta contra o imperialismo.
Segundo, a participação direta e espontânea do povo, em seus segmentos mais pobres.
Dentro dessa linha de ação, foram criados os Comitês Nacionalistas, cuja importância foi
salientada por Moacyr de Góes: "a organização da campanha se fez em função dos Comitês
Nacionalistas. A mobilização origina-se do Comitê, para o Comitê e pelo Comitê. Entre janeiro e
fins de setembro, foram organizados e funcionaram 240 Comitês Nacionalistas também conhecidos
como Comitês Populares ou Comitês de Rua. Esse número ganha maior expressão quando situado
numa cidade de 160 mil habitantes, à época, tendo tido um comparecimento eleitoral de pouco
mais de 36 mil votantes".
A mobilização foi, portanto, muito grande. Crescia de importância porque não se fazia apenas
a exaltação da personalidade do candidato Djalma Maranhão, mas ao mesmo tempo eram
discutidos temas locais, regionais e nacionais. Paralelamente à campanha política propriamente
dita, se realizava também um verdadeiro trabalho de politização das massas. Claro, uma vez
politizado, o eleitor se integrava na luta nacionalista e antimperialista.
A sua campanha fugia, e muito, das tradicionais campanhas políticas, cuja base era o ataque
pessoal, tão comum no Rio Grande do Norte e no restante do Brasil.
A campanha de Aluízio Alves foi radicalmente diversa da realizada por Djalma Maranhão
quanto à metodologia de ação empregada. Bem mais sofisticada. Utilizando inclusive uma empresa
publicitária. Empregando, de maneira racional e inteligente, os meios de comunicação de massa
(rádio e jornal). Usando slogans, como "Fome ou Libertação?". "mendicância ou trabalho?", ou
ainda "Miséria ou Industrialização?", colocava diante do eleitor o caos em que se encontrava o
Estado, sugerindo uma mudança radical através da vitória da oposição. Esse triunfo marcaria o
início de um processo de desenvolvimento no Estado do Rio Grande do Norte.
A "Tribuna do Norte", jornal de Aluízio Alves, produzia cerca de 5 mil exemplares diários,
uma tiragem, bem maior do que "A Folha da Tarde", de Djalma Maranhão. Como disse Agnelo
Alves, irmão de Aluízio Alves, e também jornalista, "foi o jornal que sedimentou a imagem de
Aluízio, levando diariamente, durante dez anos, seu nome a todo o Estado".
A 'Tribuna do Norte' serviu para influenciar determinados segmentos da sociedade, como
intelectuais, estudantes e grande parte do funcionalismo público federal, estadual e municipal.
Contribuiu igualmente para a tomada de decisão de muitos indecisos. Com suas manchetes,

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notícias, fotos e editoriais, traçava um quadro inteiramente favorável aos candidatos da Cruzada da
Esperança.
A situação caótica em que se encontrava o Estado foi uma importante causa da vitória desta
coligação partidária.
A liderança carismática de Aluízio Alves empolgou o povo. Ciente de seu magnetismo
pessoal, ele procurava por todos os meios manter o contato direto e pessoal com os eleitores. O
seus comícios e as suas passeatas impressionavam pelo número de participantes e pelo entusiasmo.
Velhos, moços, crianças, mulheres de todas as idades, agitando nas mãos bandeiras e ramos verdes,
cantando as músicas da campanha e gritando "Aluízio, Aluízio, Aluízio". Um espetáculo nunca
visto no Rio Grande do Norte, suplantando, portanto, a campanha de José da Penha, o primeiro
líder popular da história política do Estado.
Enfim, Aluízio Alves aparecia como um "homem comum", simples, pobre, de resistência
física extraordinária, passando noites inteiras acordado, em virtude de vigílias, lutando e sofrendo
sempre ao lado do povo. Nesse aspecto, certamente, se aproximavam os dois líderes populistas:
Djalma Maranhão e Aluízio Alves. Ambos se apresentavam como pessoas pobres, da classe média,
sem dinheiro, lutando contra a máquina lubrificada, manipulada pelos poderosos.
Havia, entretanto, uma grande diferença com relação ao posicionamento ideológico. Um da
esquerda, o outro do centro. Para Djalma Maranhão, "o nacionalismo é ainda um movimento, uma
revolução em marcha, para se transformar, no futuro, no mais poderoso partido de toda a História
do Brasil".
Aluízio Alves definia o seu nacionalismo de outra maneira: "o nosso nacionalismo é, por
isso, pragmático, e se despe de qualquer sentido ideológico de classe. Ele assenta no esforço
capitalista, o esforço público, no esforço misto. Os seus dois objetivos são: primeiro, entregar a
instrumentos brasileiros que representam a iniciativa privada e pública o comando da economia,
estabelecendo mecanismo através do qual o enriquecimento nacional não se acumula nas mãos de
poucos e antes alcance seu legítimo usufrutuário, que é o povo; segundo, criar no Nordeste parcela
significativa e ponderável de um grande mercado interno que funcione para si e apenas
secundariamente para o mercado externo".
"Tal nacionalismo não é anti coisa alguma. Nem anticapitalista nem antisocialista. Ele se
situa fora da área do debate ideológico para inserir-se corretamente na área em que o nacionalismo
deve, por natureza colocar-se para colher o apoio de toda a Nação".
As Prioridades de Djalma Maranhão
O primeiro problema grave enfrentando por Djalma Maranhão foi, sem dúvida, o déficit
orçamentário. O prefeito encarou o problema como sendo um grande desafio para seu governo. Em
primeiro lugar, integridade. Em segundo lugar, tomou medidas para solucionar a crise: Código
Tributário do Município. Cadastro Fiscal da Prefeitura e aumento de alíquota do imposto de

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Indústria e Profissões. Conseguiu reverter o quadro e, no lugar de déficit, apresentou um superávit
de Cr$ 19,770.826,00!
Djalma Maranhão promoveu uma série de iniciativas que marcaram o dinamismo de sua
administração: Galeria de Arte, Palácio dos Esportes, Estação Rodoviária, construção de galerias
pluvias, etc.
Na área cultural, realizou o "I Seminário de Estudos dos Problemas de Educação e Cultura do
Município de Natal", quando diversos temas forma tratados com objetividade por eminentes
especialistas: Luís da Câmara Cascudo, João Wilson Melo, Pe. Manoel Barbosa, Ivamar Furtado,
Max Cunha Azevedo, Chicuta Nolasco Fernandes, Newton Navarro, entre outros.
Mas o que imortalizou o governo de Djalma Maranhão foi, sem dúvida, a "Campanha de Pé
no Chão Também se Aprende a Ler", coordenada pelo professor Moacyr de Góes, secretário de
Educação.
O objetivo da campanha era a erradicação do analfabetismo na Cidade do Natal. A situação,
nesse setor, impressionava. Segundo Moacyr de Góes, "o índice de analfabetismo na população
acima de 14 anos, era o mais alto do Nordeste (59,97%) e, em Natal. O Censo de 1960 revelava a
existência de 60.254 adultos".
A campanha nasceu da aspiração popular
Consultando as pessoas residentes nos bairros periféricos, Djalma Maranhão descobriu que a
necessidade número um, reclamada por todos, era uma só "escolas para crianças que, sem poder
adquirir farda ou sapatos, não podiam freqüentar os grupos escolares construídos pelo governo do
Estado. As crianças sem estudos, sem divertimentos, sem boa alimentação, sem roupas, na miséria,
eram as futuras prostitutas e os futuros marginais. Elas precisavam, portanto, aprender a ler e a
escrever para, prosseguindo nos estudos, pudessem ascender socialmente.
A escola deveria, fornece tudo: o professor, a carteira, o material escolar e, inclusive, a
merenda. A educação, portanto, seria o único caminho pelo qual os meninos pobres poderiam
mudar de "status", sair da miséria.
Djalma Maranhão, ligado desde suas origens, às reivindicações populares, compreendeu de
imediato a dramaticidade daquela necessidade. Aceitou o desafio. Designou o professor Moacyr de
Góes para planejar, organizar e executar a campanha para erradicar o analfabetismo em Natal.
Uma diretora de Acampamento, ao observar que seus alunos chegavam atrasados às aulas,
teve uma idéia: antes do início das aulas, promovia uma minipartida de futebol. Assim,
diariamente, os meninos jogavam sua partidazinha de futebol. Criando, ao mesmo tempo, o hábito
de acordar cedo para chegar na escola na hora certa.
Em abril de 1961, através de uma carta, Djalma Maranhão mostrava o porquê da campanha:
"Há momentos decisivos na vida dos povos. É a hora em que a História marfa as suas
encruzilhadas. Acreditamos que o povo brasileiro vive um desses momentos. Na sua luta contra o

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subdesenvolvimento ele precisa se erguer do solo e ganhar a sua independência de ação. E só
poderá fazer isso se for alfabetizado e tiver uma educação mínima que o faça afirmativo na
sociedade. Acreditamos que chegamos nessa encruzilhada: ou o povo se alfabetiza ou se
escraviza.".
Após apresentar dados estatísticos sobre o analfabetismo em Natal, dizia o que estava
fazendo: "o número de 'Escolinhas' já está em 205. Mas são precisas 1.878 para erradicar o
analfabetismo da Cidade. Presentemente estamos ensinando a ler até debaixo de palhas, pois nas
Rocas construímos cinco pavilhões de 8 metros por 30, cobertos de palhas de coqueiros, com piso
de barro batido, onde estudam cerca de 1.200 crianças e 300 adultos. Bem justificado é o nosso
slogan: "DE PÉ NO CHÃO TAMBÉM SE APRENDER A LER.
Para realizar tal obra, o prefeito solicita ajuda da população: "Por outro lado, a Prefeitura,
sozinha, não está capacitada financeiramente para arcar com todos os ônus da educação popular na
cidade. Precisamos, assim, da ajuda de todos. Precisamos da sua ajuda".
Para concluir, afirma Djalma Maranhão: "Queremos ser soldados da campanha de um
amanhã melhor para o povo, através da educação. Nessa mensagem queremos recordar a você. De
Natal subdesenvolvido, no Nordeste subdesenvolvido, clamamos para todo o Brasil: precisamos
nos dar as mãos, numa grande força, para alfabetizar o povo e oferecer-lhe a educação necessária
ao desenvolvimento do País".
A campanha cresceu de maneira extraordinária passando por várias fases. A das "escolinhas
municipais", que funcionavam em salas cedidas por particulares. Depois, os "Acampamentos
Escolares", escolas rústicas com piso de barro batido e cobertas por palhas de coqueiros. Para os
adultos que não queiram estudar nos "acampamentos", o ensino era feita na casa do analfabeto,
onde se reunia um grupo não superior a seis pessoas. Os professores eram recrutados entre meninos
e meninas do Grupo Escola Isabel Gondim, que se apresentavam para ensinar sem receber salário.
Um fato de grande importância foi sem dúvida a construção do Centro de Formação de
Professores, cuja direção, foi entregue à professora Margarida de Jesus Cortês. O "Centro" passou a
ser o cérebro da campanha.
Atendemos a uma necessidade da população mais carente, da periferia da cidade, foi criada a
"Campanha de Pé no Chão Também se Aprende uma Profissão".
Simultaneamente, o governo do Estado adotou o médico Paulo Freire, em iniciativa pioneira
de alfabetização em 40 horas.
Três Séculos em Apenas Três Anos
O governo Aluízio Alves pretendia revolucionar a administração pública, inovando,
modernizando através de uma ação dinâmica, construindo as condições básicas para o
desenvolvimento do Rio Grande do Norte.

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Aluízio Alves tinha consciência, portanto, da verdadeira situação em que se encontrava o
Estado: uma região atrasada, subdesenvolvida e totalmente despreparada para construir o seu
desenvolvimento industrial. Além dessa conjuntura geral, o funcionalismo e os fornecedores do
governo estavam sem receber pagamento há sete meses.
O governador procurou melhorar o nível dos funcionários, através de cursos, criando
gratificações e dando promoções aos que participassem desses treinamentos. Essa política era
básica para um governo que tinha pressa. Isso, contudo, não era suficiente para modernizar o
processo administrativo. A máquina burocrática, arcaica e ultrapassada, não oferecia condições
para atender a demanda de tantas iniciativas. Para suplantar tais obstáculos, o governo não vacilou
em criar novas entidades, como a Companhia de Serviços Elétricos do Rio Grande do Norte
(Cosern), Companhia Telefônica do Rio Grande do Norte (Telern), Serviço Cooperativo de
Educação (Secern) etc.
Para iniciar o processo de desenvolvimento era necessário, sobretudo energia farta e barata.,
facilidade de comunicação com os grandes centros urbanos e boas estradas.
Na criação da Companhia Hidroelétrica de São Francisco (Chesf), para trazer energia elétrica
de Paulo Afonso para o Nordeste, foram excluídos os Estados do Rio Grande do Norte, Paraíba e
Ceará, sob a alegação da exploração econômica pela distância superior a 500 quilômetros.
Deputado federal em 1947, Aluízio Alves lutou durante 13 anos para mudar essa situação, só vindo
a conseguir a inserção dos três Estados em 1960. Em em 1963, como governador do RN, criou,
pela lei 2.721, de 14 de setembro de 1961, a Cosern - Companhia de Serviços Elétricos do Rio
Grande do Norte, que implantou a energia de Paulo Afonso no território norte-rio-grandense,
iniciando uma grande obra de infra-estrutura para o desenvolvimento industrial e, mais tarde, agro-
industrial. Resultado: diversas cidades passaram a contar com a energia de Paulo Afonso (Taipu,
Currais Novos, Acari, etc.). O custo total do plano de eletrificação atingiu a cifra de Cr$ 2.283
milhões. Para que se possa ter uma idéia do significado da obra realizada, é suficiente dizer que,
em 1960, 14% da população se beneficiava dos serviços elétricos. Em 1965, 39% da população
recebiam os benefícios da energia elétrica.
No campo das telecomunicações, o governo investiu cerca de Cr$ 1,3 bilhões, devendo
salientar que 90% desse capital saiu dos cofres estaduais e o restante foi completado pelas
prefeituras municipais.
A 3 de setembro de 1963, foi criado a Telern. Era uma iniciativa pioneira, das mais
importantes que, juntamente com o plano de eletrificação e com a construção de estradas (365,6
Km de estradas construídas de 1961 a 1964, num investimento total de Cr$ 7.476.933.146,00),
criavam aquelas condições mínimas que possibilitariam um desenvolvimento maior do Rio Grande
do Norte.

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A educação, contudo, se constituía num dos problemas mais graves do Estado. Por essa
razão, passou a ser uma das prioridades do novo governo.
Nessa área, a situação era caótica, como demonstram os dados divulgados na época: "mais de
65% de analfabetos; podendo-se afirmar que cerca de 80% da população ativa apenas sabia assinar
o nome; das 250.655 crianças em idade escolar, as escolas estaduais só podiam atender a 55 mil,
enquanto as municipais apenas 27 mil e as particulares não abrigavam mais de 28 mil, num total
deprimente de 110 mil matrículas. O déficit de mais de 140 mil crianças sem escola, sem nenhuma
possibilidade de aprender a ler e a escrever, representava mais da metade da população escolar. O
Estado contava tão somente com 1.020 salas de aula, ocupando 826 prédios, dos quais só 660
portavam diploma, e entre os restantes incluíam-se diaristas sem habilitação para o magistério e
sem estabilidade funcional, reduzindo-se a apenas 2.121 professores".
Para mudar esse quadro, o governo elaborou diversos projetos que, para sua execução, contou
com recursos da Aliança para o Progresso, da Sudene, do MEC e, ainda, do governo do Estado.
Para administrar os recursos recebidos, foi criado um órgão estruturado de maneira moderna e
dinâmica, a Secern, cujo diretor executivo era o secretário de Educação, o jornalista Calazans
Fernandes.
O governo lançou, então, o plano de "FAZER EM 3 ANOS O QUE NÃO SE FEZ EM TRÊS
SÉCULOS".
A grande meta "seria" alfabetizar 100 mil pessoas acima da idade escolar primária". O
governo almejava ainda a extensão da escolaridade a todas as crianças do Estado e a construção de
mil salas de aulas.
Para educar o maior número de pessoas no menor espaço de tempo foi lançada a Experiência
de Angicos, quando foi adotado o método do professor Paulo Freire. O resultado da experiência foi
considerado altamente positivo: "A batalha durou 40 dias como estava prevista. Encerrou-se a
experiência pioneira, como resultados que despertaram a atenção de todo o Brasil: aproveitamento
de 70% na alfabetização e 80% na conscientização cívica".
Em 1965, cresceu o número de professores, ou seja, 61% a mais do que em 1960!
Para atender a demanda sempre crescente de alunos e acabar com o déficit de edifícios
escolares, o executivo estadual agiu da seguinte maneira:
a) recuperou velhos prédios;
b) construiu novos edifícios;
c) cursos de 1º grau passaram a funcionar em prédios de grupos escolares.
No ensino de primeiro grau, foram construídas 253 salas de aula em sessenta e sete escolas,
num total superior a 30 mil metros quadrados de área coberta.
No ensino secundário, o governo construiu três edifícios, onde funcionam o Instituto Padre
Miguelinho, Instituto Presidente Kennedy - onde hoje está instalado um Curso de Licentiatura

História do RN – Tribuna do Norte – Janildo da Silva Arante – Página 104 de 161


Plena, preparando professores para o Ensino Fundamental - e o Centro Educacional Winton
Churchil.
A capacidade de matrícula, de 1960 até 1965, aumentou cerca de 63%.
Nessa área de atuação, até o final de governo, foi investida uma importância no valor de Cr$
6.329.654.000,00.
No ensino superior, foi criada a Faculdade de Jornalismo, instalado o Instituto Juvenal
Lamartine de Pesquisas Sociais e, ainda, adquirida a Faculdade de Filosofia. Foi criada também a
Fundação José Augusto, que abrigou em seu seio, além das instituições já citadas, outras como a
Biblioteca Pública, Centro de Estudos Afro-Asiásticos, Centro de Cultural Hispânica e Escola de
Arte Infantil Cândido Portinari, fazendo com que essa fundação se transformasse numa verdadeira
secretaria para assuntos culturais.
Na cultura, o governo aplicou Cr$ 1.201.945.000,00.
Aluízio Alves adotou uma política de bem-estar social da maior importância. Investiu no
campo da saúde, assistência social, habitação popular e abastecimento de água. Ampliou os
serviços de abastecimento de água em Natal, Mossoró e Caicó, implantando o sistema de Angicos e
Santana do Matos. Instalou o serviço de mini-abastecimento em 30 municípios. Em Natal, no ano
de 1965, com relação ao serviço de água, os prédios atingidos por esse benefício chegavam à casa
dos 100%! O sistema de esgoto, na capital, atingia, em 1960, apenas 10% dos edifícios e em 1965,
quando Aluízio deixou o governo, o índice já alcançava 75% dos edifícios.
No interior, a cidade de Touros, na época, com 2.200 habitantes, foi a primeira cidade do
Brasil a ser totalmente saneada.
A Telern (Companhia Telefônica do Rio Grande do Norte) promoveu a interligação, pelo
sistema interurbano, de várias cidades do Estado (Caicó, Currais Novos, Cerro Corá, Macau,
Mossoró e Areia Branca) com Natal. Ligando, pelo mesmo sistema, o Rio Grande do Norte com
outros Estados do País.
No turismo, o Rio Grande do Norte não possuía nenhum hotel de grande porte. O governo
construiu o Hotel Reis Magos, o primeiro de categoria internacional.
O poder público estadual criou ainda a Codern (Companhia de Desenvolvimento do Rio
Grande do Norte) para planejar o desenvolvimento, orientando os investimentos que modificaram a
estrutura econômica do Rio Grande do Norte.
Aluízio Alves construiu durante o seu governo cerca de 1.300 obras durante 1.825 dias.
Por ter criado as condições para que o Estado pudesse se desenvolver, pela modernização que
implantou, o governo de Aluízio Alves foi considerado por alguns como verdadeiramente
revolucionário.
Teve, entretanto, seus críticos. A oposição acusava o governo de perseguir funcionários e não
aceitava a maneira como conduziu o movimento militar de 1964.

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Aluízio Alves, falando sobre o assunto, disse: "Lutei. Sofri injustiças. Cometi
involuntariamente outras. Despertei amor e gerei ódios. Conquistei o povo, perdi amigos e ganhei
inimigos".
A Precocidade de Aluízio Alves
Aluízio Alves nasceu na cidade de Angicos, no dia 11 de agosto de 1921.
Foi um menino precoce, iniciando sua carreira de jornalista ainda criança. Fundou o jornal
"O Clarim", que era datilografado e possuía apenas um exemplar, passando de casa em casa. O
jornal, segundo Aluízio, era "por mim mesmo desenhado em vermelho, e por mim todo ele escrito:
desde o editorial às notas de aniversários, notícias de festas, entrevistas etc., às vezes, jornalista e
datilógrafo de dois dedos, levada o dia inteiro, até sem almoço, entrava pela noite, sob o protesto da
minha mãe. Tudo era compensado pelas alegrias do domingo: o jornal ia passando de casa em casa,
com os comentários dos vizinhos, leitores de toda a cidade".
Mais adiante, duas outras iniciativas, ambas no campo do jornalismo: o jornal "A Palavra" e a
revista "Potiguarânia". Dirigiu também o jornal "O Estudante".
O Partido Popular, quando criou "A Razão" , designou Aluízio para trabalhar como repórter.
O jornal pertencia a Dinarte Mariz e seu diretor era Eloy de Souza.
Após a vitória do Partido Popular, que consegue eleger três deputados, e a situação apenas
um, Aluízio Alves escreveu um artigo com o título "Três a Um", quando chamou o interventor
Bertino Dutra de "apêndice podre da Marinha brasileira", Diante da ofensa, a Marinha mandou
prender Aluízio. Foi criado, então, o impasse: o autor do artigo era menor, contava apenas 13 anos
de idade... Como solução, o jornal foi fechado. Na administração de Mário Câmara, a publicação
voltou a circular.
O jornalista-mirim enfrentou outro problema semelhante. O major Abelardo de Castro deu
uma entrevista criticando a situação que havia no Rio Grande do Norte. Essa entrevista foi
publicada no "Diário de Pernambuco". Como o jornal da oposição se encontrava fechado, a
entrevista foi impressa em forma de boletim. Na noite seguinte, Aluízio, com outras pessoas,
pregavam com grude os boletins nas paredes das casas, edifícios públicos etc. Quando Aluízio
estava colando as folhas atrás da catedral velha, foi preso. Mas não podia ser preso por causa da
idade. O chefe da Polícia, capitão da Marinha, Paulo Mário, chamou o pai do menino, aconselhou,
ameaçou, porém o jovem rebelde foi colocado em liberdade.
Aluízio, repórter de "A Razão", junto à Assembléia Legislativa", viveu momentos difíceis
nessa fase: "lá às seis horas da manhã para "A Razão", escrevia várias matérias. Quinze para as oito
e eu ia para o colégio e ficava até onze horas. Às onze horas voltava para a "A Razão" para
escrever e fazer a revisão da matéria. Uma hora da tarde voltava para o colégio, até aí sem comer,
sem almoçar, ficava no colégio até três e meia da tarde. Quando saía às três e meia da tarde.
Quando saía às três e meia da tarde, eu ia para o jornal, assistia ao final do jornal".

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Aluízio Alves começou a se interessar por política no ano de 1932, com onze anos de idade,
quando, após a derrubada do prefeito de Angicos, João Cavalcanti, seu pai, Manoel Alves, foi eleito
prefeito.
Nesse ano, ocorria uma terrível seca e os flagelados da região procuraram seu "Nezinho", que
convocou os comerciantes para colaborar: recebendo e distribuindo gêneros alimentícios, estava ali
presente o menino Aluízio Alves.
Outro acontecimento vai marcar a carreira precoce do político Aluízio Alves: durante a
revolução Constitucional de 32, ele se encontrava em Ceará Mirim. Nessa cidade só havia um
rádio, na casa de Waldemar de Sá. O menino Alves ouvia os discursos dos líderes do movimento,
repetindo para os presentes.
Aluízio, indo para o Ceará, estudou no Ginásio São Luiz. Ocorreu então o seguinte fato: um
motorista de ambulância dirigia em alta velocidade para salvar um doente. A ambulância virou, o
motorista morreu, porém, o doente sobreviveu. O acontecimento emocionou a cidade de Fortaleza.
Aluízio foi escolhido para fazer a oração, durante uma homenagem prestada pelos estudantes aos
familiares da vítima do acidente. Seu discurso emocionou a todos os presentes. A partir daquele
momento passou a ser o orador oficial do ginásio!
Em 1940, em Angicos, a Paróquia organizou a festa de Cristo Rei. Estiveram presentes o
governador Rafael Fernandes e Aldo Fernandes. Na oportunidade, Aluízio pronunciou uma
conferência sobre a Paróquia de Angicos. Como resultado, o menino-conferencista foi convidado
por Aldo Fernandes para trabalhar no jornal "A República", quando se tornou repórter e editor do
referido órgão de imprensa, na época, dirigido por Edgar Barbosa.
Em 1942, uma grande seca. Natal foi invadida pelos flagelados. Aldo Fernandes chamou
Aluízio, dizendo que queria fazer uma reunião com as principais autoridades da cidade. Aluízio,
então, escreveu um artigo inti-tulado 'Convocação à família natalense", sendo designado para
organizar o trabalho de assistência aos flagelados. Dentro de três dias. 8 mil pessoas estava
abrigadas. Terminada a seca, Aluízio Alves organizou a volta dos retirantes, fazendo com que cada
um levasse instrumento de trabalho, além de recursos para recomeçar a vida, inclusive, comida
para um mês. Aconteceu que, no final, ficaram 60 menores de ambos os sexos. Aluízio Alves
sugeriu, então, criar um Serviço de Assistência ao Menor. Aprovada a idéia, Aluízio Alves foi para
Recife e, naquela cidade, entrou em contato com as autoridades que tratavam do problema.
Foi fundado o "Abrigo Melo Matos", com Orígenes Monte assumindo a direção.
Incansável, Aluízio Alves, com ajuda da Legião Brasileira de Assistência, criou o Instituto
Padre João Maria e, com auxílio da prefeitura, organizou o Abrigo Juvino Barreto. Ambos foram
inaugurados no dia 19 de abril de 1943.

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História do Rio Grande do Norte (Parte 5 de 5)
CRISE DE 1964 E POSTERIOR PAZ
Marcos Empreendedores
Preocupações Sociais, Jornalismo e Política
Depois de criar o Instituto Padre João Maria e organizar o Abrigo Juvino Barreto, em 1943,
Aluízio Alves partiu para uma iniciativa maior: criou a Escola de Serviço Social.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o jornalista realizou o grande feito de entrevistar, com
ajuda de um intérprete, Eleanor Roosevelt, que veio a Natal em campanha para eleger seu marido,
Delano Roosevelt, presidente dos Estados Unidos.
Nesse período, Aluízio Alves tinha dois programas radiofônicos. Aos domingos, levava ao ar
"Glórias do Brasil", com o objetivo de mobilizar a opinião pública a favor dos aliados. O outro,
chamado 'Ave Maria', era diário e começava às 6 horas.
O Serviço de Proteção ao Menor se estendeu ao interior e, com a ajuda dos bispos de Caicó e
de Mossoró, chegou a reunir mais de 10.000 menores, em regime de semi-internato.
No governo do interventor general Dantas, Aluízio Alves foi o diretor do SERAS, instituição
por ele organizada.
Aos 23 anos, Aluízio foi eleito deputado federal, sendo o mais moço da Assembleia Nacional
Constituinte, em 1946, causando sensação no Rio de Janeiro, por ser apenas não o mais jovem, mas
também o único deputado que era estudante. O artigo da Constituição de 1946 sobre assistência aos
menores e à maternidade é de sua autoria.
Reeleito deputado federal nos anos de 1950, 1954 e 1958, foi o responsável pela criação do
programa de Crédito de Emergência, para o período de seca no Nordeste. E no ano de 1960 foi
eleito governador, por maioria absoluta.
Deixando o governo, continuou fazendo política, conseguindo expressivos resultados. Elegeu
o seu sucessor, monsenhor Walfredo Gurgel, com 54%
dos votos, e seu irmão, Agnelo Alves, chegava à prefeitura de Natal, com 61% dos votos.
Com o golpe militar de 1964, os partidos (PSD, UDN, etc) foram extintos. Em seu lugar
foram criados dois novos partidos: ARENA e PMDB.
Aluízio Alves voltou à Câmara Federal em 1966, quando obteve 60.000 votos.
Em 1969, a grande frustração: foi cassado pelo Ato Institucional nº 5. Afastado oficialmente
da vida política, reagiu, fazendo com que seus aliados mais fiéis se transferissem para o MDB.
Em 1970, Odilon Ribeiro Coutinho perdeu a eleição para o Senado. O vitorioso foi Dinarte
Mariz. Henrique Alves, filho de Aluízio, foi eleito deputado federal, com grande votação.
Um marco na vida de Aluízio Alves, em sua profissão de jornalista, foi quando fundou,
juntamente com Carlos Lacerda, o jornal "Tribuna da Imprensa", no Rio de Janeiro. Lacerda

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assumiu a direção e Aluízio, o cargo de redator-chefe. Quando Carlos Lacerda partiu para o exílio,
depois da eleição de Juscelino Kubistchek, Aluízio assumiu a direção geral do órgão de imprensa.
Outra importante iniciativa nessa área é a fundação, no dia 24 de março de 1950, em Natal,
da "Tribuna do Norte", empresa em que seu fundador exerceu a direção. Posteriormente, adquiriu a
Rádio Cabugi. Surgia, assim, o Sistema Cabugi de Comunicações que, na atualidade, é formado
pela Tribuna do Norte, TV Cabugi, Rádio Cabugi AM, Rádio Difusa de Mossoró, Rádio Cabugi do
Seridó e líder FM, de Parnamirim.
Cassado de seus direitos políticos, Aluízio Alves investiu em sua carreira de empresário,
fundando, no Rio de Janeiro, a Editora Nosso Tempo. É assim que ele resume a sua atuação como
empreendedor: "diretor industrial de um grupo empresarial, construindo no Rio Grande do Norte a
primeira indústria de cartonagem: uma grande indústria de confecções, a Sparta; a primeira e até
agora única fábrica de tecidos, a Seridó, depois, Coteminas; o Hotel Ducal Palace, na época, entre
os três melhores do Nordeste. No Sul, era presidente de indústrias e de duas grandes empresas
comerciais do mesmo grupo, com mais de 100 lojas em São Paulo, Rio e Minas".
Como escritor, Aluízio Alves publicou alguns livros, entre eles "Angicos" (em 1997 foi
lançada a 2ª edição, pela Fundação José Augusto), "A Primeira Campanha Popular do Rio Grande
do Norte", "Sem ódio e sem medo". A verdade que não é secreta etc.
No dia 16 de agosto de 1992, Aluízio Alves tomou posse na Academia Norte-Rio-Grandense
de Letras, em solenidade realizada após 17 anos de eleição no Salão dos Grandes Atos, da
Fundação José Augusto. Foi saudado pelo acadêmico Mário Moacyr Porto, que encerrou o seu
discurso com as seguintes palavras: "Ingressai nesta casa de homens de letras, senho acadêmico
Aluízio Alves, pela porta larga do talento. Não se aplica à V. Excia, o apelido de imortal por
adulação estatutária, mas de quem alcançará, pelos seus feitos, um lugar destacado na admiração
dos pós-terros. Sede bem-vindo".
Aluízio, num longo discurso, lembrou importantes fases de sua vida na suas diversas facetas:
jornalista, político e escritor. E suas grandes amizades, como, por exemplo, a de Hélio Galvão.
Confessou que "jamais foi minha ambição pessoal chegar à Academia".
Concluido, disse: "E por isso, diante de todos, posso repetir, quando 72 anos tentam
inutilmente reduzir-me o ânimo, e apagar, na noite das vicissitudes, a chama da esperança, uma
palavra que, numa hora difícil se tornou meu apelo e meu caminho: "a luta continua".
Aluízio Alves foi também ministro de Estado por duas vezes: ministro de Administração do
governo de José Sarney e, por sete meses, ocupou como titular o Ministério da Integração
Regional, no governo Itamar Franco, quando elaborou o Projeto de Transposição das águas do São
Francisco, beneficiando os Estados do Ceará, Rio Grande do Norte e da Paraíba.
O Golpe de 1964
Deposição de João Goulart

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No final de 1963 já se delineava uma crise no Brasil. O governo João Goulart reforçava sua
linha de governo de caráter nacionalista e reformista, fazendo com que as forças conservadoras se
aglutinassem para derrubá-lo. San Tiago Dantas procurou unificar os grupos esquerdistas numa
frente única, sem sucesso. A cada dia que passava, o radicalismo aumentava.
Um decreto que obteve grande repercussão foi o que autorizava a SUPRA (Superintendência
da Reforma Agrária) "para concluir convênio destinado a delimitar as áreas marginais às estradas e
açudes, com fins de expropriação, para distribuições de terras".
O tempo passava e esquerdistas e direitistas se acusavam, mutuamente, dizendo abertamente
que estavam se preparando para um conflito armado.
Em janeiro de 1964, o deputado federal Leonel Brizola denunciava: "não existe ninguém no
poder do País, neste momento". Era uma verdade. O presidente João Goulart tinha perdido o
comando, não podendo evitar o rumo dos acontecimentos.
Resolveu, então, partir para a extrema esquerda, precipitando os acontecimentos. A situação
se agravou quando da realização de um comício, promovido pelo governo, que se realizou no dia
13 de março de 1964, na praça Cristiano Otôni, na Guanabara. Como a praça se localizava na
fronteira da Estação D. Pedro II, da Central do Brasil, ficou conhecido como sendo o "Comício da
Central".
O governo pretendia demonstrar força, fazendo com que seus ministros comparecessem.
Alguns governadores se fizeram presentes: Miguel Arraes, de Pernambuco; Seixas Dória, de
Sergipe; Badger Silveira, do Rio de Janeiro. O presidente da República, na ocasião, assinou dois
decretos. Um encampava as refinarias de petróleo particulares e o outro tratava da desapropriação
de terras.
O conflito caminhava para o desenlace. Os distúrbios, nas ruas, começavam a surgir. A
disciplina na Marinha foi quebrada. A crise também atingia as forças armadas.
Em São Paulo foi realizada a "Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade", que contava
com um grande número de senhoras da sociedade, autoridades civis e o apoio do clero.
Marinheiros e fuzileiros se rebelaram e o destacamento destinado a prendê-los aderiu ao
movimento.
A essa altura dos acontecimentos, ninguém mais podia evitar. A crise haveria de terminar
num conflito armado. Não poderia vir da esquerda, que estava com o governo. A reação deveria
partir da extrema direita, que pretendia acabar com o "comunismo no Brasil". E comunista, para as
classes conservadoras, era qualquer pessoa que se apresentasse como sendo de esquerda;
defendesse o nacionalismo, combatendo o "entreguismo" contra, portanto o capitalismo
internacional... Por causa desses equívocos, muita injustiça foi cometida!
No dia 31 de março de 1964 eclodiu o movimento militar para derrubar o governo João
Goulart.

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Sem condições de resistir ao golpe planejado pelos altos chefes militares, com o apoio de
parcelas da sociedade, em 1º de abril de 1964, o presidente João Goulart partiu de Brasília para o
Rio Grande do Sul e, logo em seguida, viajou para o Uruguai como exilado político. Ranieri
Mazzilli, presidente da Câmara Federal, foi provisoriamente empossado presidente da República.
O movimento militar de 64 se consolidou com a promulgação do Ato Institucional e a posse
do marechal Humberto de Alencar Castelo Branco como presidente.
Confronto e Rede de Investigação no RN
A radicalização entre esquerda e direita atingiu também o Rio Grande do Norte.
A causa esquerdista, no Estado era defendida por Djalma Maranhão e seus correligionários e,
ainda, por grande parte dos estudantes e de operários. Essas forças defendiam os ideais do
nacionalismo e lutavam contra a direita.
Quando a crise ideológico-militar explodiu no Sul, o prefeito Djalma Maranhão, de imediato,
ficou solidário com João Goulart. Foi mais além, transformou o prédio da prefeitura como sendo "o
quartel-general da legalidade e da resistência".
O governador Aluízio Alves divulgou uma nota, onde dizia que o governo "pede ao povo que
se conserve calmo, evitando atos ou manifestações que aprofundem as divisões desta hora em que
todos os esforços devem ser feitos para a restauração da paz e preservação da democracia".
Começou, então, a fase de investigações com a Comissão Geral de Investigações instalada
pelos militares e mais duas comissões criadas pelo Ato Institucional nº 2.
No dia 1º de abril, Djalma Maranhão publicou uma nota oficial, do governo municipal do
Natal, concluindo com as seguintes palavras: "a legalidade é Jango!".
No dia 2 de abril foram presos, o prefeito Djalma Maranhão e o seu vice. Luís Gonzaga dos
Santos. Foram levados para o QG da Guarnição Militar de Natal. Depois, foi comunicado aos
vereadores que os dois, sendo comunistas, não poderiam exercer os seus mandatos. Como a
comunicação foi verbal, a Mesa da Câmara solicitou ao comando militar que fosse enviado um
ofício, para dar um caráter administrativo à questão. A Câmara Municipal ficou reunida, esperando
a comunicação oficial, que chegou por volta das 22 horas. Os vereadores declararam o
"impeachemet" de Djalma Maranhão e de Luís Gonzaga dos Santos. O vereador Raimundo Elpídio
assumiu, em caráter interino, a função de prefeito. Mais tarde, os vereadores elegeram, em
definitivo, o almirante Tertius César Pires de Lima Rebelo como prefeito e Raimundo Elpídio,
vice-prefeito.
Os vitoriosos consolidaram o movimento no Rio Grande do Norte, porém, deixando
profundas marcas no seio da família potiguar, como demonstra o desabafo da escritora Mailde
Pinto Galvão: "Por uma suspeita absolutamente infundada e sem sentido, invadiam as residências,
prendiam pessoas e expunham as famílias ao vexame das investigações na vida pessoal e
profissional. Perdia-se a privacidade, o direito de defesa e a estabilidade nos empregos".

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Para José Wellington Germano, "na verdade, não foi esboçada nenhuma tentativa concreta de
resistência. As forças principais trataram logo de ocupar, na manhã do dia 1º de abril, os principais
pontos da cidade, cercado alguns sindicatos, e na noite do mesmo dia, intervindo e dissolvendo
uma assembleia de estudantes que se realizava no restaurante universitário da Av. Deodoro;
também foi desfeito o QG da legalidade pelas próprias forças militares que penetraram no edifício
da prefeitura".
O mesmo autor ainda informa que os sindicatos marítimos de Areia Branca e Macau entraram
em greve, a Federação dos Trabalhadores Rurais colocou à disposição do presidente da República
cerca de cinquenta mil camponeses e a União Estadual de Estudantes lançou um manifesto.
O prefeito Raimundo Elpídio da Silva, no dia 3 de abril de 1964, exonerou o professor
Moacyr de Góes da função de secretário de Educação. A função foi assumida, posteriormente, pelo
capitão-de-corveta Tomaz Edson Goulart do Amarante.
No dia 7 de abril, foi realizada a "Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade", para
comemorar a vitória do golpe militar.
O novo governo municipal demitiu vários funcionários, considerados perigosos: "Omar
Pimenta, da diretoria do Ensino Municipal; Mailde Pinto, da diretoria de Documentação e Cultura;
a professora Maria da Conceição Pinto de Góes e, ainda, o professor Geniberto Campos,
respectivamente dos cargos de diretor e vice-diretor do Ginásio Municipal", narrou José Wellington
Germano.
Uma grande preocupação dos novos detentores do poder foi a de eliminar livros que, para
eles, continham ensinamentos de uma ideologia marxista. Para realizar tal missão, invadiram
bibliotecas, destruindo muitos volumes.
E como sempre acontece nesses casos, alguns militares, por excesso de zero ou por
ignorância, cometeram arbitrariedade. Exemplo: quando invadiram a casa do professor Moacyr de
Góes, colocaram uma metralhadora na cabeça da mãe do ex-secretário de Educação, já bastante
idosa e que merecia, portanto, maior respeito".
Vários inquéritos militares foram instaurados, dos quais resultaram diversas prisões: Hélio
Xavier de Vasconcelos, Omar Fernandes Pimenta, Moacyr de Góes, Vulpiano Cavalcanti de
Araújo, Eider Toscano de Moura, Danilo Bessa, Marcos José de Castro Guerra, Carlos Alberto de
Lima, Luiz Ignácio Maranhão Filho, etc.
Nas prisões, houve uma série de torturas. Como disse Moacyr de Góes, "é fácil implantar o
terror numa cela. Fácil e covarde. Basta que os carcereiros empreguem a força bruta no
espancamento dos prisioneiros em sucessivos interrogatórios. Ou então que aos mesmos
carcereiros seja permitido criar condições tais de insegurança para os prisioneiros que estes sintam
o real risco de não sair do cárcere com vida".
O Jogo Claro de Djalma Maranhão

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Djalma Maranhão nasceu em Natal, no dia 27 de novembro de 1915. Filho de Luís Inácio de
Albuquerque Maranhão e de dona Salomé de Carvalho Maranhão, teve os seguintes filhos:
Lamarck (falecido), Marcos e Ana Maria.
Djalma Maranhão foi um homem simples, inteligente e que sabia exatamente o que queria da
vida. Não transigia nas suas idéias. Amaca os mais humildes e lutava para atender às reivindicações
das classes menos favorecidas. Nacionalista, denunciava, gritava, protestava. Expressava sua
ideologia de maneira clara e inequívoca, acreditando na vitória do socialismo, convicto de que
"somente a dialética marxista-leninista libertará as massas da opressão e da fome através da
socialização dos meios de produção e da entrega da terra aos camponeses".
Como não se acomodava às intrigas políticas, nem concordava ou se adaptava a qualquer tipo
de corrupção, foi expulso de alguns partidos.
Militante comunista, quando era cabo do exército participou da Intentona Comunista de 35,
sendo preso. É o próprio Djalma Maranhão que diz: "Andei pelos presídios políticos e pelos
campos de concentração, martirizado pelos esbirros de Felinto Müller e de Getúlio Vargas".
Em 1946, foi expulso do partido comunista, porque denunciou os diretores do partido como
desonestos. Foi eliminado, quando se encontrava ausente de plenário, sem que pudesse se defender.
A acusação feita por Djalma Maranhão foi escrita.
Era de fato um homem temperamental. Às vezes, contudo, sabia se conter. Exemplo: durante
a campanha de 1960 para prefeito de Natal, Djalma Maranhão entrou irado na sala de redação da
"Folha da Tarde" com um exemplar na mão. Perguntou, então, quem tinha escrito a manchete de
seu jornal, que dizia o seguinte: "Lott - Jango - Walfredo - Maranhão - Gonzaga. Vote do primeiro
do sexto". Ao saber que o autor da manchete foi Moacyr de Góes, de conteve e disse: "A manchete
está certa. É assim mesmo. Não vamos ficar em cima do muro. Jogo claro. Honrar as alianças".
Mantinha cordiais relações com a Igreja. Certo dia, uma funcionária criticou as pessoas que
trabalhavam para a Arquidiocese. Djalma Maranhão sorriu e disse: "Deixe o padre fazer o trabalho
dele. E nós faremos o nosso".
Na campanha "De Pé no Chão Também se Aprende a Ler" trabalhavam cristãos (católicos e
protestantes), espíritas e marxistas. Por essa razão, o professor Moacyr de Góes chamou o
movimento de uma "frente".
Profundamente humano. Intransigente contra a falsidade e a desonestidade, admitia o erro,
desde que fosse cometido por alguém que desejasse acertar.
Para ele, governar era realizar. Nas suas administrações como prefeito de Natal, procurou
deixar uma marca de dinamismo.
Nas eleições de 31/10/1954, foi eleito deputado estadual pelo Partido Social Progressista,
obtendo ótima votação em Natal. Como legislador, teve um grande desempenho, sendo inclusive
autor do projeto que deu autonomia ao município de Natal.

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Em 1955, Djalma Maranhão apoiou Dinarte Mariz para governador, na coligação PSP-UND.
Mariz derrotou Jocelyn Vilar, do PSD. Como conseqüência do acordo dessas eleições, Djalma
Maranhão foi designado prefeito da Cidade do Natal, cuja posse ocorreu no dia 1/2/1956.
De acordo com Moacyr de Góes, "nessa primeira administração de Djalma Maranhão, a
Prefeitura vai implantar o programa municipal de ensino, através das escolinhas de alfabetização e
do Ginásio Municipal de Natal".
No ano de 1959, Djalma Maranhão rompeu com Dinarte Mariz. Suplente, assumiu o cargo de
deputado federal, onde se destacou como membro atuante da Frente Parlamentar Nacionalista.
Em 1960, se candidatou a prefeito, participando da coligação "Cruzada da Esperança",
juntamente com Aluízio Alves, candidato ao governo do Estado.
Vitorioso, no dia 5/11/60 Djalma Maranhão assumiu novamente a Prefeitura de Natal, sendo
dessa vez através do voto. Foi, portanto, o primeiro prefeito natalense eleito diretamente pelo povo,
obtendo 66% dos voto.
Em sua segunda administração, Djalma Maranhão demonstrou toda a sua capacidade de
trabalho e de liderança política. Aos poucos conquistou a confiança e o respeito da classe média,
aumentando seu prestígio junto das classes populares.
Djalma Maranhão não foi apenas um político. Atuou, igualmente, como jornalista. Segundo
Leonardo Arruda Câmara, "a imprensa foi a grande vocação. Revisor, repórter esportivo, repórter
político, redator, secretário de redação, editorialista, diretor e proprietário de jornais, percorreu na
carreira de jornalista todos os postos e funções. Fundou o "Monitor Comercial", o "Diário de
Natal" e a "Folha da Tarde".
"Foi diretor e proprietário do "Jornal de Natal".
Como escritor, publicou "O Brasil e a Luta Anti-Imperialista", pelo Departamento de
Imprensa Nacional, edição da Frente Parlamentar Nacionalista, no Rio de Janeiro, em 1960, e
"Cascudo", Mestre do Folclore Brasileiro", lançado em 1963. Tem também uma obra póstuma:
"Carta de um Exilado".
Com o golpe militar de 1964, Djalma Maranhão foi preso. Libertado, posteriormente, através
de um "habeas corpus", concedido pelo Supremo Tribunal Federal, conseguiu se asilar na
Embaixada do Uruguai, indo morar naquele país, onde veio a faleceu, no dia 30 de julho de 1971.
No último livro produzido pelo antropólogo Darcy Ribeiro, "O povo Brasileiro - A formação
e o sentido do Brasil", publicado em 1997, o escrito refere-se à morte e ao apego de Djalma
Maranhão ao Brasil, sem contudo citar seu nome. "Pude sentir, no exílio, como é difícil para um
brasileiro viver fora do Brasil. Nosso país tem tanta seiva de singularidade que torna extremamente
difícil aceitar e desfrutar do convívio com outros povos. O prefeito de Natal morreu em
Montevidéu de pura tristeza. Nunca quis aprender espanhol, nem o suficiente para comprar uma
caixa de fósforo", relata Darcy Ribeiro.

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Segundo Leonardo Arruda Câmara, Djalma Maranhão "foi sepultado em Natal no Cemitério
do Alecrim, graças à interferência do senador Dinarte Mariz, acompanhado de grande multidão no
maior enterro já realizado em nossa capital que atestou o quanto ele era amado e querido por sua
gente".
Pausa no Radicalismo
Uma Obra Para o Bem da Coletividade
O processo político no Rio Grande do Norte sempre se caracterizou pelo radicalismo. Houve,
entretanto, um período de paz e tranqüilidade na terra potiguar, implantado por um homem
inteligente, justo e honesto: monsenhor Walfredo Gurgel. Ele buscou a paz com tenacidade. Ao
traçar as diretrizes de sua administração, disse: "sou homem que pretende governar com a
simplicidade da minha formação e do meu temperamento. Desejo e espero o convívio cordial de
todos os que me cercam e a todos darei o exemplo de tolerância e de compreensão".
Deixou bem claro que não aceitaria apoio em troca de benefícios: "não procurarei
adversários. Não buscarei adesões. Não transacionarei apoio. Mas não recusarei ajuda nobre e
espontânea à administração que estou iniciando porque não tenho o direito de repelir aqueles que se
disponham a trabalhar pelo Rio Grande do Norte. Não perseguirei adversários. Não procurarei ferir
ninguém. Numa palavra: desejo que haja respeito ao governo e o governo respeitará a todos,
aliados ou adversários".
Cumpriu com a palavra. Jamais se afastou desses princípios. Outra característica do seu
governo, talvez a maior, foi a austeridade. "Quando aos critérios administrativos, o meu governo
será de austeridade, de contenção de despesas supérfluas", afirmou.
Fugiu sempre da ostentação. Por essa razão, não admitiu no seu governo que se colocasse nas
placas, que anunciavam as obras públicas, o nome de qualquer autoridade. Como disse Bianor
Medeiros, "o governo para ele não era o seu nome, mas a obra que surgia para o bem da
coletividade".
A principal obra do seu governo foi, na realidade, a ponte rodo-ferroviária de Igapó. Procurou
melhorar as rodovias, pensando na circulação das riquezas do Estado.
Na área da agricultura, segundo Bianor Medeiros, "construiu parques, armazéns e atacou o
setor através da melhoria dos rebanhos e forragens".
O Hospital Walfredo Gurgel, foi obra da sua administração. E, ainda, a construção do prédio
da Telern, no centro da cidade. Fundou a Biblioteca Câmara Cascudo, além de diversas escolas.
Não se pode esquecer o grande desenvolvimento que te o Banco do Rio Grande do Norte
durante sua administração, inaugurando diversas agências na capital e em várias cidades do interior
(Caicó, Ceará-Mirim, Mossoró, etc).
Mas a grande contribuição do seu governo foi, sem dívida, a construção de um clima de paz,
evitando qualquer tipo de antagonismo que pudesse gerar ódio, sendo por essa razão respeitado

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pela posição. Bianor Medeiros declarou que Monsenhor Walfredo Gurgel "nunca cometeu ou
permitiu uma violência, nem a mais leve injustiça contra os seus mais rancorosos adversários; com
estes sempre foi de uma exemplar generosidade, quando os via em situação difícil".
Exemplos do Monsenhor Walfredo Gurgel
Nasceu no dia 2 de dezembro de 1908, na cidade de Caicó, Rio Grande do Norte. Filho de
Pedro Gurgel do Amaral e Oliveira e dona Joaquina Dantas Gurgel.
Perdeu o pai aos dez anos. Tempos difíceis, e o menino Walfredo, para ajudar a família,
vendia banana. Continuou. Entretanto, seus estudos no Grupo Escolar Senador Guerra, onde fez o
curso primário.
Queria ser padre, porém, havia uma dificuldade: sua mãe, viúva e pobre, não podia financiar
sua estadia no seminário. D. José Pereira Alves, bispo diocesano, contornou a situação. E assim,
"em 3 de fevereiro de 1922, ingressava no Seminário de São Pedro o menino caicoense que, após 4
anos, concluía o curso de Seminário Menor".
"Aluno laureado, ao lado do Santo gênio, padre Monte, foi contemplado com uma bolsa de
estudos para, em Roma, cursar Filosofia e Teologia". Concluindo esses dois cursos, "doutorou-se, a
seguir, em Direito Canônico, pela universidade Gregoriana, ordenando-se padre no dia 15 de
outubro de 1931, na Capela do Pontifício Colégio Pio-Americano".
Voltou ao Brasil no dia 14 de agosto de 1932. Foi recebido com grandes festas, inclusive um
banquete, ao qual compareceram figuras expressivas da região. O ágape foi realizado na
Intendência de sua cidade.
O novo sacerdote, inteligente e culto, assumiu o cargo de reitor do Seminário de São Pedro,
além de lecionar algumas disciplinas, como Teologia.
A exemplo de grande número de intelectuais católicos de sua época, ingressou na Ação
Integralista Brasileira.
Mais tarde, foi designado vigário de Acari, Freguesia de Nossa Senhora da Guia e, depois,
vigário de Caicó.
Homem dinâmico, participou, ao lado de outros seridoenses, de luta pela criação da Diocese
de Caicó. Essa causa se tornou vitoriosa, com D. José de Medeiros Delgado nomeado bispo de
Caicó. Walfredo Gurgel assumiu a função de vigário-geral.
Professor e sacerdote, Walfredo Gurgel se preocupou muito com a educação dos jovens do
Seridó. Batalhou então, pela construção de uma escola, a nível de primeiro grau, para os meninos.
Em 1942, o seu sonho se realizava, com a inauguração do Ginásio Diocesano. Assumiu a sua
direção e o ensino de algumas disciplinas. Incansável, fazia praticamente tudo, como narra o seu
biógrafo, Bianor Medeiros: "contador, administrador da obra em andamento e, ainda, sobrava-lhe
tempo para treinar os times de futebol, de vôlei e assistir aos ensaios da banda de música, que
organizava e que tinha, com regente, o querido e estimado mestre Bedé".

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Sendo um líder, era natural que um dia, mais cedo ou mais tarde, ele ingressasse na vida
política. Seguindo o mesmo caminho de um José Augusto de Medeiros e de um Dinarte de
Medeiros Mariz... Convidado por Georgino Avelino, foi para o Partido Social Democrático, PSD.
Dez parte do Diretório Regional do seu partido. Nessa legenda, conseguiu se eleger deputado
federal na Constituinte, ao lado de Dioclécio Duarte, José Varela e Mota Neto na sua legenda.
Continuando sua carreira política, Walfredo Gurgel conseguiu se eleger vice-governador do
Estado, com Aluízio Alves, governador. Presidiu, nessa função, a Assembléia Legislativa Estadual.
Não chegou a concluir o seu mandato, porque após outra vitória nas urnas, chegou ao Senado da
República, com grande votação.
Sofreu críticas de alguns de seus adversários, que não compreenderam nem perdoavam o seu
êxito. Foi forçado a ir na tribuna do Senado, algumas vezes, para defender seus correligionários:
"Lamento mais uma vez, ser compelido a ocupar a tribuna do Senado para tratar de assuntos
regionais, mas às vezes, somos levados a isso - quando há tantos problemas de ordem nacional que
exigem a nossa palavra, que exigem o nosso esforço e a nossa inteligência (...) A todos estimo,
porque, mesmo sendo adversários políticos, são meu amigos pessoais, meus companheiros nesta
Casa, onde defendemos os interesses do povo e devemos trabalhar, incessantemente, pela felicidade
e grandeza de nossa pátria".
Com essa postura, conseguiu se impor ao respeito de todos.
Definia a política como algo transitório, que não justificava a intriga e o ódio. O importante
era conservar as amizades, porque elas sim deveriam ser duradouras. Disse Bianor Medeiros: "A
cada resposta que dava, a qualquer esclarecimento que prestava, a cada aparte que recebia, sempre
se erguia como verdadeiro estadista, diplomata, sereno e seguro".
Este era o perfil do senador Walfredo Gurgel.
Aconteceu, entretanto, que o povo do Rio Grande do Norte convocou Walfredo Gurgel para
mais uma missão: governar o Estado. O seu vice foi Clóvis Mota. Nessa nova missão, continuou
agindo com a mesma serenidade e honradez.
Após deixar o governo, realizou uma viagem de 45 dias ao continente europeu, visitando
vários países: Portugal, Alemanha, Espanha, Áustria, Inglaterra, etc.
No dia 3 de outubro de 1971, foi constatado que Walfredo Gurgel sofria de câncer no pulmão,
durante um exame que fez no Instituto de Radiologia de Natal. Logo a seguir, agravou o seu estado
de saúde, falecendo no dia 3 de novembro de 1971, em Natal.
Sobre o velório e a partida do corpo para Caicó, Bianor Medeiros, seu biógrafo, narrou os
acontecimento da seguinte maneira: "Velado pelo povo o corpo do Monsenhor Walfredo Gurgel
permaneceu na câmara-ardente armada no saguão do primeiro andar do Palácio do Governo
durante toda a noite até às seis horas da manhã de ontem, quando foi transladado para a Catedral
Metropolitana".

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"Em fila dupla o povo subiu até o saguão do Palácio para ver o monsenhor pela última vez e
rezar pela sua alma, entregue a Deus. A fila muitas vezes chegava até a Ulisses Caldas, e não rara
vezes dava volta pela praça Sete de Setembro.
"Todos os ex-secretários do governo do monsenhor estavam presentes. Na praça Sete de
Setembro, o povo permanecia silencioso, triste, enquanto algumas pessoas rezavam e outras
choravam (...) Exatamente às 5h50, o caixão fechado (...) A pé, acompanhado por uma multidão
enorme, o corpo é trasladado para a Catedral Metropolitana. Nas calçadas do próprio Palácio e da
Praça André de Albuquerque, o povo se comprime (...) A missa foi celebrada por doze padres, à
frente o arcebispo Dom Nivaldo Monte. Eram exatamente 6h05. Silêncio profundo na igreja,
somente quebrado por soluços de pessoas (muitas) que choravam".
"Após a missa teve lutar a encomendação do corpo por Dom Nivaldo Monte, coadjuvado por
todos os vigários que concelebravam a missa. Às 7 horas o corpo é levado pelos auxiliares do
monsenhor Walfredo Gurgel até o carro fúnebre, já a esta altura a multidão era muito maior. O
povo chorava nas calçadas. Todos queriam ainda tocar no caixão. Todos queriam ver o monsenhor
pela última vez".
"Dezenas de carros foram acompanhando o cortejo, que foi precedido por um carro da rádio-
patrulha que, de sirena aberta, abria passagem para o féretro. Muitas pessoas foram até Macaíba, de
onde voltaram após o último adeus. E o corpo no monsenhor seguiu para ser sepultado na sua
cidade natal: Caicó".
CRISE DE 1964 E POSTERIOR PAZ
Preocupações Sociais, Jornalismo e Política
Depois de criar o Instituto Padre João Maria e organizar o Abrigo Juvino Barreto, em 1943,
Aluízio Alves partiu para uma iniciativa maior: criou a Escola de Serviço Social.
Durante a Segunda Guerra Mundial, o jornalista realizou o grande feito de entrevistar, com
ajuda de um intérprete, Eleanor Roosevelt, que veio a Natal em campanha para eleger seu marido,
Delano Roosevelt, presidente dos Estados Unidos.
Nesse período, Aluízio Alves tinha dois programas radiofônicos. Aos domingos, levava ao ar
"Glórias do Brasil", com o objetivo de mobilizar a opinião pública a favor dos aliados. O outro,
chamado 'Ave Maria', era diário e começava às 6 horas.
O Serviço de Proteção ao Menor se estendeu ao interior e, com a ajuda dos bispos de Caicó e
de Mossoró, chegou a reunir mais de 10.000 menores, em regime de semi-internato.
No governo do interventor general Dantas, Aluízio Alves foi o diretor do SERAS, instituição
por ele organizada.
Aos 23 anos, Aluízio foi eleito deputado federal, sendo o mais moço da Assembléia Nacional
Constituinte, em 1946, causando sensação no Rio de Janeiro, por ser apenas não o mais jovem, mas

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também o único deputado que era estudante. O artigo da Constituição de 1946 sobre assistência aos
menores e à maternidade é de sua autoria.
Reeleito deputado federal nos anos de 1950, 1954 e 1958, foi o responsável pela criação do
programa de Crédito de Emergência, para o período de seca no Nordeste. E no ano de 1960 foi
eleito governador, por maioria absoluta.
Deixando o governo, continuou fazendo política, conseguindo expressivos resultados. Elegeu
o seu sucessor, monsenhor Walfredo Gurgel, com 54% dos votos, e seu irmão, Agnelo Alves,
chegava à prefeitura de Natal, com 61% dos votos.
Com o golpe militar de 1964, os partidos (PSD, UDN, etc) foram extintos. Em seu lugar
foram criados dois novos partidos: ARENA e PMDB.
Aluízio Alves voltou à Câmara Federal em 1966, quando obteve 60.000 votos.
Em 1969, a grande frustração: foi cassado pelo Ato Institucional nº 5. Afastado oficialmente
da vida política, reagiu, fazendo com que seus aliados mais fiéis se transferissem para o MDB.
Em 1970, Odilon Ribeiro Coutinho perdeu a eleição para o Senado. O vitorioso foi Dinarte
Mariz. Henrique Alves, filho de Aluízio, foi eleito deputado federal, com grande votação.
Um marco na vida de Aluízio Alves, em sua profissão de jornalista, foi quando fundou,
juntamente com Carlos Lacerda, o jornal "Tribuna da Imprensa", no Rio de Janeiro. Lacerda
assumiu a direção e Aluízio, o cargo de redator-chefe. Quando Carlos Lacerda partiu para o exílio,
depois da eleição de Juscelino Kubistchek, Aluízio assumiu a direção geral do órgão de imprensa.
Outra importante iniciativa nessa área é a fundação, no dia 24 de março de 1950, em Natal,
da "Tribuna do Norte", empresa em que seu fundador exerceu a direção. Posteriormente, adquiriu a
Rádio Cabugi. Surgia, assim, o Sistema Cabugi de Comunicações que, na atualidade, é formado
pela Tribuna do Norte, TV Cabugi, Rádio Cabugi AM, Rádio Difusa de Mossoró, Rádio Cabugi do
Seridó e líder FM, de Parnamirim.
Cassado de seus direitos políticos, Aluízio Alves investiu em sua carreira de empresário,
fundando, no Rio de Janeiro, a Editora Nosso Tempo. É assim que ele resume a sua atuação como
empreendedor: "diretor industrial de um grupo empresarial, construindo no Rio Grande do Norte a
primeira indústria de cartonagem: uma grande indústria de confecções, a Sparta; a primeira e até
agora única fábrica de tecidos, a Seridó, depois, Coteminas; o Hotel Ducal Palace, na época, entre
os três melhores do Nordeste. No Sul, era presidente de indústrias e de duas grandes empresas
comerciais do mesmo grupo, com mais de 100 lojas em São Paulo, Rio e Minas".
Como escritor, Aluízio Alves publicou alguns livros, entre eles "Angicos" (em 1997 foi
lançada a 2ª edição, pela Fundação José Augusto), "A Primeira Campanha Popular do Rio Grande
do Norte", "Sem ódio e sem medo". A verdade que não é secreta etc.
No dia 16 de agosto de 1992, Aluízio Alves tomou posse na Academia Norte-Rio-Grandense
de Letras, em solenidade realizada após 17 anos de eleição no Salão dos Grandes Atos, da

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Fundação José Augusto. Foi saudado pelo acadêmico Mário Moacyr Porto, que encerrou o seu
discurso com as seguintes palavras: "Ingressai nesta casa de homens de letras, senho acadêmico
Aluízio Alves, pela porta larga do talento. Não se aplica à V. Excia, o apelido de imortal por
adulação estatutária, mas de quem alcançará, pelos seus feitos, um lugar destacado na admiração
dos pós-terros. Sede bem-vindo".
Aluízio, num longo discurso, lembrou importantes fases de sua vida na suas diversas facetas:
jornalista, político e escritor. E suas grandes amizades, como, por exemplo, a de Hélio Galvão.
Confessou que "jamais foi minha ambição pessoal chegar à Academia".
Concluido, disse: "E por isso, diante de todos, posso repetir, quando 72 anos tentam
inutilmente reduzir-me o ânimo, e apagar, na noite das vicissitudes, a chama da esperança, uma
palavra que, numa hora difícil se tornou meu apelo e meu caminho: "a luta continua".
Aluízio Alves foi também ministro de Estado por duas vezes: ministro de Administração do
governo de José Sarney e, por sete meses, ocupou como titular o Ministério da Integração
Regional, no governo Itamar Franco, quando elaborou o Projeto de Transposição das águas do São
Francisco, beneficiando os Estados do Ceará, Rio Grande do Norte e da Paraíba.
O Golpe de 1964
Deposição de João Goulart
No final de 1963 já se delineava uma crise no Brasil. O governo João Goulart reforçava sua
linha de governo de caráter nacionalista e reformista, fazendo com que as forças conservadoras se
aglutinassem para derrubá-lo. San Tiago Dantas procurou unificar os grupos esquerdistas numa
frente única, sem sucesso. A cada dia que passava, o radicalismo aumentava.
Um decreto que obteve grande repercussão foi o que autorizava a SUPRA (Superintendência
da Reforma Agrária) "para concluir convênio destinado a delimitar as áreas marginais às estradas e
açudes, com fins de expropriação, para distribuições de terras".
O tempo passava e esquerdistas e direitistas se acusavam, mutuamente, dizendo abertamente
que estavam se preparando para um conflito armado.
Em janeiro de 1964, o deputado federal Leonel Brizola denunciava: "não existe ninguém no
poder do País, neste momento". Era uma verdade. O presidente João Goulart tinha perdido o
comando, não podendo evitar o rumo dos acontecimentos.
Resolveu, então, partir para a extrema esquerda, precipitando os acontecimentos. A situação
se agravou quando da realização de um comício, promovido pelo governo, que se realizou no dia
13 de março de 1964, na praça Cristiano Otôni, na Guanabara. Como a praça se localizava na
fronteira da Estação D. Pedro II, da Central do Brasil, ficou conhecido como sendo o "Comício da
Central".
O governo pretendia demonstrar força, fazendo com que seus ministros comparecessem.
Alguns governadores se fizeram presentes: Miguel Arraes, de Pernambuco; Seixas Dória, de

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Sergipe; Badger Silveira, do Rio de Janeiro. O presidente da República, na ocasião, assinou dois
decretos. Um encampava as refinarias de petróleo particulares e o outro tratava da desapropriação
de terras.
O conflito caminhava para o desenlace. Os distúrbios, nas ruas, começavam a surgir. A
disciplina na Marinha foi quebrada. A crise também atingia as forças armadas.
Em São Paulo foi realizada a "Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade", que contava
com um grande número de senhoras da sociedade, autoridades civis e o apoio do clero.
Marinheiros e fuzileiros se rebelaram e o destacamento destinado a prendê-los aderiu ao
movimento.
A essa altura dos acontecimentos, ninguém mais podia evitar. A crise haveria de terminar
num conflito armado. Não poderia vir da esquerda, que estava com o governo. A reação deveria
partir da extrema direita, que pretendia acabar com o "comunismo no Brasil". E comunista, para as
classes conservadoras, era qualquer pessoa que se apresentasse como sendo de esquerda;
defendesse o nacionalismo, combatendo o "entreguismo" contra, portanto o capitalismo
internacional... Por causa desses equívocos, muita injustiça foi cometida!
No dia 31 de março de 1964 eclodiu o movimento militar para derrubar o governo João
Goulart.
Sem condições de resistir ao golpe planejado pelos altos chefes militares, com o apoio de
parcelas da sociedade, em 1º de abril de 1964, o presidente João Goulart partiu de Brasília para o
Rio Grande do Sul e, logo em seguida, viajou para o Uruguai como exilado político. Ranieri
Mazzilli, presidente da Câmara Federal, foi provisoriamente empossado presidente da República.
O movimento militar de 64 se consolidou com a promulgação do Ato Institucional e a posse
do marechal Humberto de Alencar Castelo Branco como presidente.
Confronto e Rede de Investigação no RN
A radicalização entre esquerda e direita atingiu também o Rio Grande do Norte.
A causa esquerdista, no Estado era defendida por Djalma Maranhão e seus correligionários e,
ainda, por grande parte dos estudantes e de operários. Essas forças defendiam os ideais do
nacionalismo e lutavam contra a direita.
Quando a crise ideológico-militar explodiu no Sul, o prefeito Djalma Maranhão, de imediato,
ficou solidário com João Goulart. Foi mais além, transformou o prédio da prefeitura como sendo "o
quartel-general da legalidade e da resistência".
O governador Aluízio Alves divulgou uma nota, onde dizia que o governo "pede ao povo que
se conserve calmo, evitando atos ou manifestações que aprofundem as divisões desta hora em que
todos os esforços devem ser feitos para a restauração da paz e preservação da democracia".
Começou, então, a fase de investigações com a Comissão Geral de Investigações instalada
pelos militares e mais duas comissões criadas pelo Ato Institucional nº 2.

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No dia 1º de abril, Djalma Maranhão publicou uma nota oficial, do governo municipal do
Natal, concluindo com as seguintes palavras: "a legalidade é Jango!".
No dia 2 de abril foram presos, o prefeito Djalma Maranhão e o seu vice. Luís Gonzaga dos
Santos. Foram levados para o QG da Guarnição Militar de Natal. Depois, foi comunicado aos
vereadores que os dois, sendo comunistas, não poderiam exercer os seus mandatos. Como a
comunicação foi verbal, a Mesa da Câmara solicitou ao comando militar que fosse enviado um
ofício, para dar um caráter administrativo à questão. A Câmara Municipal ficou reunida, esperando
a comunicação oficial, que chegou por volta das 22 horas. Os vereadores declararam o
"impeachemet" de Djalma Maranhão e de Luís Gonzaga dos Santos. O vereador Raimundo Elpídio
assumiu, em caráter interino, a função de prefeito. Mais tarde, os vereadores elegeram, em
definitivo, o almirante Tertius César Pires de Lima Rebelo como prefeito e Raimundo Elpídio,
vice-prefeito.
Os vitoriosos consolidaram o movimento no Rio Grande do Norte, porém, deixando
profundas marcas no seio da família potiguar, como demonstra o desabafo da escritora Mailde
Pinto Galvão: "Por uma suspeita absolutamente infundada e sem sentido, invadiam as residências,
prendiam pessoas e expunham as famílias ao vexame das investigações na vida pessoal e
profissional. Perdia-se a privacidade, o direito de defesa e a estabilidade nos empregos".
Para José Wellington Germano, "na verdade, não foi esboçada nenhuma tentativa concreta de
resistência. As forças principais trataram logo de ocupar, na manhã do dia 1º de abril, os principais
pontos da cidade, cercado alguns sindicatos, e na noite do mesmo dia, intervindo e dissolvendo
uma assembléia de estudantes que se realizava no restaurante universitário da Av. Deodoro;
também foi desfeito o QG da legalidade pelas próprias forças militares que penetraram no edifício
da prefeitura".
O mesmo autor ainda informa que os sindicatos marítimos de Areia Branca e Macau entraram
em greve, a Federação dos Trabalhadores Rurais colocou à disposição do presidente da República
cerca de cinqüenta mil camponeses e a União Estadual de Estudantes lançou um manifesto.
O prefeito Raimundo Elpídio da Silva, no dia 3 de abril de 1964, exonerou o professor
Moacyr de Góes da função de secretário de Educação. A função foi assumida, posteriormente, pelo
capitão-de-corveta Tomaz Edson Goulart do Amarante.
No dia 7 de abril, foi realizada a "Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade", para
comemorar a vitória do golpe militar.
O novo governo municipal demitiu vários funcionários, considerados perigosos: "Omar
Pimenta, da diretoria do Ensino Municipal; Mailde Pinto, da diretoria de Documentação e Cultura;
a professora Maria da Conceição Pinto de Góes e, ainda, o professor Geniberto Campos,
respectivamente dos cargos de diretor e vice-diretor do Ginásio Municipal", narrou José Wellington
Germano.

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Uma grande preocupação dos novos detentores do poder foi a de eliminar livros que, para
eles, continham ensinamentos de uma ideologia marxista. Para realizar tal missão, invadiram
bibliotecas, destruindo muitos volumes.
E como sempre acontece nesses casos, alguns militares, por excesso de zero ou por
ignorância, cometeram arbitrariedade. Exemplo: quando invadiram a casa do professor Moacyr de
Góes, colocaram uma metralhadora na cabeça da mãe do ex-secretário de Educação, já bastante
idosa e que merecia, portanto, maior respeito".
O Jogo Claro de Djalma Maranhão
Djalma Maranhão nasceu em Natal, no dia 27 de novembro de 1915. Filho de Luís Inácio de
Albuquerque Maranhão e de dona Salomé de Carvalho Maranhão, teve os seguintes filhos:
Lamarck (falecido), Marcos e Ana Maria.
Djalma Maranhão foi um homem simples, inteligente e que sabia exatamente o que queria da
vida. Não transigia nas suas idéias. Amaca os mais humildes e lutava para atender às reivindicações
das classes menos favorecidas. Nacionalista, denunciava, gritava, protestava. Expressava sua
ideologia de maneira clara e inequívoca, acreditando na vitória do socialismo, convicto de que
"somente a dialética marxista-leninista libertará as massas da opressão e da fome através da
socialização dos meios de produção e da entrega da terra aos camponeses".
Como não se acomodava às intrigas políticas, nem concordava ou se adaptava a qualquer tipo
de corrupção, foi expulso de alguns partidos.
Militante comunista, quando era cabo do exército participou da Intentona Comunista de 35,
sendo preso. É o próprio Djalma Maranhão que diz: "Andei pelos presídios políticos e pelos
campos de concentração, martirizado pelos esbirros de Felinto Müller e de Getúlio Vargas".
Em 1946, foi expulso do partido comunista, porque denunciou os diretores do partido como
desonestos. Foi eliminado, quando se encontrava ausente de plenário, sem que pudesse se defender.
A acusação feita por Djalma Maranhão foi escrita.
Era de fato um homem temperamental. Às vezes, contudo, sabia se conter. Exemplo: durante
a campanha de 1960 para prefeito de Natal, Djalma Maranhão entrou irado na sala de redação da
"Folha da Tarde" com um exemplar na mão. Perguntou, então, quem tinha escrito a manchete de
seu jornal, que dizia o seguinte: "Lott - Jango - Walfredo - Maranhão - Gonzaga. Vote do primeiro
do sexto". Ao saber que o autor da manchete foi Moacyr de Góes, de conteve e disse: "A manchete
está certa. É assim mesmo. Não vamos ficar em cima do muro. Jogo claro. Honrar as alianças".
Mantinha cordiais relações com a Igreja. Certo dia, uma funcionária criticou as pessoas que
trabalhavam para a Arquidiocese. Djalma Maranhão sorriu e disse: "Deixe o padre fazer o trabalho
dele. E nós faremos o nosso".

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Na campanha "De Pé no Chão Também se Aprende a Ler" trabalhavam cristãos (católicos e
protestantes), espíritas e marxistas. Por essa razão, o professor Moacyr de Góes chamou o
movimento de uma "frente".
Profundamente humano. Intransigente contra a falsidade e a desonestidade, admitia o erro,
desde que fosse cometido por alguém que desejasse acertar.
Para ele, governar era realizar. Nas suas administrações como prefeito de Natal, procurou
deixar uma marca de dinamismo.
Nas eleições de 31/10/1954, foi eleito deputado estadual pelo Partido Social Progressista,
obtendo ótima votação em Natal. Como legislador, teve um grande desempenho, sendo inclusive
autor do projeto que deu autonomia ao município de Natal.
Em 1955, Djalma Maranhão apoiou Dinarte Mariz para governador, na coligação PSP-UND.
Mariz derrotou Jocelyn Vilar, do PSD. Como conseqüência do acordo dessas eleições, Djalma
Maranhão foi designado prefeito da Cidade do Natal, cuja posse ocorreu no dia 1/2/1956.
De acordo com Moacyr de Góes, "nessa primeira administração de Djalma Maranhão, a
Prefeitura vai implantar o programa municipal de ensino, através das escolinhas de alfabetização e
do Ginásio Municipal de Natal".
No ano de 1959, Djalma Maranhão rompeu com Dinarte Mariz. Suplente, assumiu o cargo de
deputado federal, onde se destacou como membro atuante da Frente Parlamentar Nacionalista.
Em 1960, se candidatou a prefeito, participando da coligação "Cruzada da Esperança",
juntamente com Aluízio Alves, candidato ao governo do Estado.
Vitorioso, no dia 5/11/60 Djalma Maranhão assumiu novamente a Prefeitura de Natal, sendo
dessa vez através do voto. Foi, portanto, o primeiro prefeito natalense eleito diretamente pelo povo,
obtendo 66% dos voto.
Em sua segunda administração, Djalma Maranhão demonstrou toda a sua capacidade de
trabalho e de liderança política. Aos poucos conquistou a confiança e o respeito da classe média,
aumentando seu prestígio junto das classes populares.
Djalma Maranhão não foi apenas um político. Atuou, igualmente, como jornalista. Segundo
Leonardo Arruda Câmara, "a imprensa foi a grande vocação. Revisor, repórter esportivo, repórter
político, redator, secretário de redação, editorialista, diretor e proprietário de jornais, percorreu na
carreira de jornalista todos os postos e funções. Fundou o "Monitor Comercial", o "Diário de
Natal" e a "Folha da Tarde".
"Foi diretor e proprietário do "Jornal de Natal".
Como escritor, publicou "O Brasil e a Luta Anti-Imperialista", pelo Departamento de
Imprensa Nacional, edição da Frente Parlamentar Nacionalista, no Rio de Janeiro, em 1960, e
"Cascudo", Mestre do Folclore Brasileiro", lançado em 1963. Tem também uma obra póstuma:
"Carta de um Exilado".

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Com o golpe militar de 1964, Djalma Maranhão foi preso. Libertado, posteriormente, através
de um "habeas corpus", concedido pelo Supremo Tribunal Federal, conseguiu se asilar na
Embaixada do Uruguai, indo morar naquele país, onde veio a faleceu, no dia 30 de julho de 1971.
No último livro produzido pelo antropólogo Darcy Ribeiro, "O povo Brasileiro - A formação
e o sentido do Brasil", publicado em 1997, o escrito refere-se à morte e ao apego de Djalma
Maranhão ao Brasil, sem contudo citar seu nome. "Pude sentir, no exílio, como é difícil para um
brasileiro viver fora do Brasil. Nosso país tem tanta seiva de singularidade que torna extremamente
difícil aceitar e desfrutar do convívio com outros povos. O prefeito de Natal morreu em
Montevidéu de pura tristeza. Nunca quis aprender espanhol, nem o suficiente para comprar uma
caixa de fósforo", relata Darcy Ribeiro.
Segundo Leonardo Arruda Câmara, Djalma Maranhão "foi sepultado em Natal no Cemitério
do Alecrim, graças à interferência do senador Dinarte Mariz, acompanhado de grande multidão no
maior enterro já realizado em nossa capital que atestou o quanto ele era amado e querido por sua
gente".
Pausa no Radicalismo
Uma Obra Para o Bem da Coletividade
O processo político no Rio Grande do Norte sempre se caracterizou pelo radicalismo. Houve,
entretanto, um período de paz e tranqüilidade na terra potiguar, implantado por um homem
inteligente, justo e honesto: monsenhor Walfredo Gurgel. Ele buscou a paz com tenacidade. Ao
traçar as diretrizes de sua administração, disse: "sou homem que pretende governar com a
simplicidade da minha formação e do meu temperamento. Desejo e espero o convívio cordial de
todos os que me cercam e a todos darei o exemplo de tolerância e de compreensão".
Deixou bem claro que não aceitaria apoio em troca de benefícios: "não procurarei
adversários. Não buscarei adesões. Não transacionarei apoio. Mas não recusarei ajuda nobre e
espontânea à administração que estou iniciando porque não tenho o direito de repelir aqueles que se
disponham a trabalhar pelo Rio Grande do Norte. Não perseguirei adversários. Não procurarei ferir
ninguém. Numa palavra: desejo que haja respeito ao governo e o governo respeitará a todos,
aliados ou adversários".
Cumpriu com a palavra. Jamais se afastou desses princípios. Outra característica do seu
governo, talvez a maior, foi a austeridade. "Quando aos critérios administrativos, o meu governo
será de austeridade, de contenção de despesas supérfluas", afirmou.
Fugiu sempre da ostentação. Por essa razão, não admitiu no seu governo que se colocasse nas
placas, que anunciavam as obras públicas, o nome de qualquer autoridade. Como disse Bianor
Medeiros, "o governo para ele não era o seu nome, mas a obra que surgia para o bem da
coletividade".

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A principal obra do seu governo foi, na realidade, a ponte rodo-ferroviária de Igapó. Procurou
melhorar as rodovias, pensando na circulação das riquezas do Estado.
Na área da agricultura, segundo Bianor Medeiros, "construiu parques, armazéns e atacou o
setor através da melhoria dos rebanhos e forragens".
O Hospital Walfredo Gurgel, foi obra da sua administração. E, ainda, a construção do prédio
da Telern, no centro da cidade. Fundou a Biblioteca Câmara Cascudo, além de diversas escolas.
Não se pode esquecer o grande desenvolvimento que te o Banco do Rio Grande do Norte
durante sua administração, inaugurando diversas agências na capital e em várias cidades do interior
(Caicó, Ceará-Mirim, Mossoró, etc).
Mas a grande contribuição do seu governo foi, sem dívida, a construção de um clima de paz,
evitando qualquer tipo de antagonismo que pudesse gerar ódio, sendo por essa razão respeitado
pela posição. Bianor Medeiros declarou que Monsenhor Walfredo Gurgel "nunca cometeu ou
permitiu uma violência, nem a mais leve injustiça contra os seus mais rancorosos adversários; com
estes sempre foi de uma exemplar generosidade, quando os via em situação difícil".
Exemplos do Monsenhor Walfredo Gurgel
Nasceu no dia 2 de dezembro de 1908, na cidade de Caicó, Rio Grande do Norte. Filho de
Pedro Gurgel do Amaral e Oliveira e dona Joaquina Dantas Gurgel.
Perdeu o pai aos dez anos. Tempos difíceis, e o menino Walfredo, para ajudar a família,
vendia banana. Continuou. Entretanto, seus estudos no Grupo Escolar Senador Guerra, onde fez o
curso primário.
Queria ser padre, porém, havia uma dificuldade: sua mãe, viúva e pobre, não podia financiar
sua estadia no seminário. D. José Pereira Alves, bispo diocesano, contornou a situação. E assim,
"em 3 de fevereiro de 1922, ingressava no Seminário de São Pedro o menino caicoense que, após 4
anos, concluía o curso de Seminário Menor".
"Aluno laureado, ao lado do Santo gênio, padre Monte, foi contemplado com uma bolsa de
estudos para, em Roma, cursar Filosofia e Teologia". Concluindo esses dois cursos, "doutorou-se, a
seguir, em Direito Canônico, pela universidade Gregoriana, ordenando-se padre no dia 15 de
outubro de 1931, na Capela do Pontifício Colégio Pio-Americano".
Voltou ao Brasil no dia 14 de agosto de 1932. Foi recebido com grandes festas, inclusive um
banquete, ao qual compareceram figuras expressivas da região. O ágape foi realizado na
Intendência de sua cidade.
O novo sacerdote, inteligente e culto, assumiu o cargo de reitor do Seminário de São Pedro,
além de lecionar algumas disciplinas, como Teologia.
A exemplo de grande número de intelectuais católicos de sua época, ingressou na Ação
Integralista Brasileira.

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Mais tarde, foi designado vigário de Acari, Freguesia de Nossa Senhora da Guia e, depois,
vigário de Caicó.
Homem dinâmico, participou, ao lado de outros seridoenses, de luta pela criação da Diocese
de Caicó. Essa causa se tornou vitoriosa, com D. José de Medeiros Delgado nomeado bispo de
Caicó. Walfredo Gurgel assumiu a função de vigário-geral.
Professor e sacerdote, Walfredo Gurgel se preocupou muito com a educação dos jovens do
Seridó. Batalhou então, pela construção de uma escola, a nível de primeiro grau, para os meninos.
Em 1942, o seu sonho se realizava, com a inauguração do Ginásio Diocesano. Assumiu a sua
direção e o ensino de algumas disciplinas. Incansável, fazia praticamente tudo, como narra o seu
biógrafo, Bianor Medeiros: "contador, administrador da obra em andamento e, ainda, sobrava-lhe
tempo para treinar os times de futebol, de vôlei e assistir aos ensaios da banda de música, que
organizava e que tinha, com regente, o querido e estimado mestre Bedé".
Sendo um líder, era natural que um dia, mais cedo ou mais tarde, ele ingressasse na vida
política. Seguindo o mesmo caminho de um José Augusto de Medeiros e de um Dinarte de
Medeiros Mariz... Convidado por Georgino Avelino, foi para o Partido Social Democrático, PSD.
Dez parte do Diretório Regional do seu partido. Nessa legenda, conseguiu se eleger deputado
federal na Constituinte, ao lado de Dioclécio Duarte, José Varela e Mota Neto na sua legenda.
Continuando sua carreira política, Walfredo Gurgel conseguiu se eleger vice-governador do
Estado, com Aluízio Alves, governador. Presidiu, nessa função, a Assembléia Legislativa Estadual.
Não chegou a concluir o seu mandato, porque após outra vitória nas urnas, chegou ao Senado da
República, com grande votação.
Sofreu críticas de alguns de seus adversários, que não compreenderam nem perdoavam o seu
êxito. Foi forçado a ir na tribuna do Senado, algumas vezes, para defender seus correligionários:
"Lamento mais uma vez, ser compelido a ocupar a tribuna do Senado para tratar de assuntos
regionais, mas às vezes, somos levados a isso - quando há tantos problemas de ordem nacional que
exigem a nossa palavra, que exigem o nosso esforço e a nossa inteligência (...) A todos estimo,
porque, mesmo sendo adversários políticos, são meu amigos pessoais, meus companheiros nesta
Casa, onde defendemos os interesses do povo e devemos trabalhar, incessantemente, pela felicidade
e grandeza de nossa pátria".
Com essa postura, conseguiu se impor ao respeito de todos.
Definia a política como algo transitório, que não justificava a intriga e o ódio. O importante
era conservar as amizades, porque elas sim deveriam ser duradouras. Disse Bianor Medeiros: "A
cada resposta que dava, a qualquer esclarecimento que prestava, a cada aparte que recebia, sempre
se erguia como verdadeiro estadista, diplomata, sereno e seguro".
Este era o perfil do senador Walfredo Gurgel.

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Aconteceu, entretanto, que o povo do Rio Grande do Norte convocou Walfredo Gurgel para
mais uma missão: governar o Estado. O seu vice foi Clóvis Mota. Nessa nova missão, continuou
agindo com a mesma serenidade e honradez.
Após deixar o governo, realizou uma viagem de 45 dias ao continente europeu, visitando
vários países: Portugal, Alemanha, Espanha, Áustria, Inglaterra, etc.
No dia 3 de outubro de 1971, foi constatado que Walfredo Gurgel sofria de câncer no pulmão,
durante um exame que fez no Instituto de Radiologia de Natal. Logo a seguir, agravou o seu estado
de saúde, falecendo no dia 3 de novembro de 1971, em Natal.
Sobre o velório e a partida do corpo para Caicó, Bianor Medeiros, seu biógrafo, narrou os
acontecimento da seguinte maneira: "Velado pelo povo o corpo do Monsenhor Walfredo Gurgel
permaneceu na câmara-ardente armada no saguão do primeiro andar do Palácio do Governo
durante toda a noite até às seis horas da manhã de ontem, quando foi transladado para a Catedral
Metropolitana".
"Em fila dupla o povo subiu até o saguão do Palácio para ver o monsenhor pela última vez e
rezar pela sua alma, entregue a Deus. A fila muitas vezes chegava até a Ulisses Caldas, e não rara
vezes dava volta pela praça Sete de Setembro.
"Todos os ex-secretários do governo do monsenhor estavam presentes. Na praça Sete de
Setembro, o povo permanecia silencioso, triste, enquanto algumas pessoas rezavam e outras
choravam (...) Exatamente às 5h50, o caixão fechado (...) A pé, acompanhado por uma multidão
enorme, o corpo é trasladado para a Catedral Metropolitana. Nas calçadas do próprio Palácio e da
Praça André de Albuquerque, o povo se comprime (...) A missa foi celebrada por doze padres, à
frente o arcebispo Dom Nivaldo Monte. Eram exatamente 6h05. Silêncio profundo na igreja,
somente quebrado por soluços de pessoas (muitas) que choravam".
"Após a missa teve lutar a encomendação do corpo por Dom Nivaldo Monte, coadjuvado por
todos os vigários que concelebravam a missa. Às 7 horas o corpo é levado pelos auxiliares do
monsenhor Walfredo Gurgel até o carro fúnebre, já a esta altura a multidão era muito maior. O
povo chorava nas calçadas. Todos queriam ainda tocar no caixão. Todos queriam ver o monsenhor
pela última vez".
"Dezenas de carros foram acompanhando o cortejo, que foi precedido por um carro da rádio-
patrulha que, de sirena aberta, abria passagem para o féretro. Muitas pessoas foram até Macaíba, de
onde voltaram após o último adeus. E o corpo no monsenhor seguiu para ser sepultado na sua
cidade natal: Caicó".
EDUCAÇÃO E CULTURA
A Tradição e a Renovação
Evolução do Ensino e das Escolas no RN

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As ordens religiosas, sobretudo a dos jesuítas, foram as instituições que primeiro se
dedicaram ao ensino no Brasil.
No Rio Grande do Norte, o processo educativo começou quando foram instaladas as vilas,
que ficaram sob a administração dos missionários, inclusive com a tarefa da instrução civil e
religiosa.
As meninas foram excluídas do ensino.
Quando as missões religiosas foram extintas, o missionário foi substituído pelo mestre-escola
nas sete vilas que existiam no Rio Grande do Norte.
Em 1827, surgiram as primeiras escolas primárias. Foram duas: uma pertencia a dona
Francisca Josefa Câmara e a outra, a Francisco Pinheiro Teixeira.
As primeiras escolas do interior surgiram dez anos depois: São José de Mipibu, Princesa,
Goianinha, Arês, Touros, Mossoró, Acari, Apodi.
Em 1834, o ensino primário foi desmembrado do secundário, e os governos provinciais
passaram a manter os cursos chamados de "Humanidades" ou "Aulas Maiores".
Basílio Quaresma Torreão fundou o Ateneu que passou a funcionar no dia 3 de fevereiro de
1834. Basílio Quaresma escolheu o nome da escola, da versão portuguesa de Athénaion. Como
explicou Câmara Cascudo, "no Ateneu de Atenas os poetas liam os poemas e os historiadores o
relato das jornais pelas terras estranhas e misteriosas".
O Ateneu passou a funcionar numa dependência do Quartel do Batalhão de Linha, porque o
prédio estava desocupado. Foi extinto em 1852. O presidente da Província, Antônio Bernardo de
Passos, fez a escola voltar a funcionar em 1856, mas só se considerou a partir de 1º de março de
1859, quando o presidente Nunes Gonçalves instalou-a num edifício novo.
No dia 11 de março de 1954, reinstalou-se o Ateneu em um prédio moderno, em forma de X,
com um ginásio coberto, para a prática de esportes e de educação física, graças aos esforços do
professor Severino Bezerra de Melo, diretor do Departamento de Educação, e do interesse do
governador Sylvio Pedrosa, em cujo governo a obra foi concluída. O nome foi modificado para
Instituto de Educação porque se pretendia, de fato, fazer funcionar um instituto de Educação,
inclusive com um Grupo Escolar Modelo. Essa proposta não foi concretizada na sua totalidade. O
Ateneu absorveu tudo. Conforme Chicuta Nolasca Fernandes, "a Escola Normal ocupou uma
perninha do X, exatamente onde nem sequer havia sanitários. "Por essa razão, ela desabafou: "A
Escola Normal era uma hóspede indesejável no Ateneu". E numa entrevista com Sylvio Pedrosa fez
reivindicações. Como conseqüência dessa conferência, o governo construiu outro edifício,
destinado à Escola Normal, Escola de Aplicação e Jardim Modelo, formando um novo Instituto de
Educação.
O ensino que visava preparar professores, para lecionar no ensino primário, teve um começo
dos mais difíceis. A primeira Escola Normal, criada pelo presidente João Capistrano Bandeira de

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Melo Filho, foi inaugurada no dia 1º de março de 1874, funcionando numa dependência do Ateneu,
sendo extinta pelo presidente José Nicolau Tolentino de Carvalho.
Foram criadas, outras duas escolas normais. Ambas, entretanto, não chegaram a funcionar. A
quarta Escola Normal foi a que frutificou, segundo Câmara Cascudo. Fundada em 24/4/1908, como
a primeira, anexada ao Ateneu até 1910.
A 2 de janeiro de 1911, iniciou os seus trabalhos no prédio do Grupo Escola Augusto Severo.
Em março de 1966, no governo Aluízio Alves, a Escola Normal, após ser "hóspede" do
Instituto de Educação e funcionar na praça Pedro Velho, foi transferida para novas instalações, em
Lagoa Nova, com linhas arquitetônicas modernas, passando a se chamar Instituto Presidente
Kennedy. Inaugurado quando o senador norte-americano Roberto Kennedy veio a Natal.
Revolução no ensino primário, em Natal, foi realizado pela Campanha 'De Pé no Chão
Também se Aprende a Ler", na administração Djalma Maranhão (61/64).
Em 1962, Djlama Maranhão fundou o Centro de Formação de Professores, com o Ginásio
Normal e o Pedagógico.
Na administração do prefeito Tertius César Pires Rebello, o Centro passou a se chamar
Instituto Municipal de Educação,
O ensino normal teve seu grande momento em 1966, quando o professor Alberto Pinheiro de
Medeiros, diretor do IME, idealizou uma semana do normalista, promovida em conjunto pelas
Escolas Normais de Natal. Contou, de imediato, com o apoio da professora Chicuta Nolasco
Fernandes, diretora do Instituto Presidente Kennedy.
Participaram do evento o Instituto Municipal de Educação, Instituto Presidente Kennedy,
Instituto Nossa Senhora Auxiliadora e o Colégio Imaculada Conceição. A 1ª Semana do Normalista
Conjunta , ocorreu no período de 10 a 14 de outubro de 1966. Houve desfile, conferências, debates
e jogos. Foi encerrada, solenemente, com um festival artístico, no Teatro Alberto Maranhão.
Circulou um jornal. "O normalista", que publicou trabalhos das alunas.
Voltando a falar sobre o Ateneu, é preciso dizer que o nome Instituto de Educação teve curta
duração. Passou, pouco depois, a se chamar Colégio Estadual do Rio Grande do Norte, porém, no
dia 3 de fevereiro de 1959, durante o governo de Dinarte Mariz, recebeu a denominação de Colégio
Estadual do Ateneu Norte-Rio-Grandense.
Desde os primeiros tempos, o Ateneu se tornou um centro de cultura, como disse Tarcísio
Medeiros: "em derredor da vida docente e discente do Ateneu, pode-se dizer sem susto, criou-se e
expandiu-se a cultura potiguar. Os alunos graduados por ele formaram instituições outras que
existem até hoje. Criaram centros literários, jornais e associações nos quais imprimiram culto de
moral e civismo".
Após a proclamação da República, o ensino progredia, abrindo, inclusive, novas
oportunidades às pessoas do sexo feminino. Em 1903, as primeiras mulheres prestam exames de

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Humanidades, no Ateneu. Algumas mulheres se destacaram na vida intelectual potiguar: Isabel
Gondim, Dionísia Gonçalves Pinto (Nísia Floresta) e Auta de Sousa.
O século XX marca o aparecimento de outras escolas. Em Natal: Colégio da Imaculada
Conceição (1901), Colégio Diocesano Santo Antônio (1903), Colégio Nossa Senhora das Neves
(1932). No interior: Colégio Coração de Maria (Mossoró - 1912), Colégio Santa Terezinha do
Menino Jesus (Caicó - 1952), Colégio Santa Águida (Ceará-Mirim - 1937), Colégio Nossa Senhora
das Vitórias (Açu - 1927), etc.
A 10 de setembro de 1914, foi criada a Escola Doméstica, a primeira do Brasil na sua
especialidade, sendo um de seus fundadores, Henrique Castriciano de Sousa e contava no seu corpo
docente com professoras francesas, inglesas, norte-americanas e suíças. O corpo discente era
formado também por alunas vindas de outros Estados, porém, a maioria das alunas eram jovens de
famílias interioranas, filhas de fazendeiros, comerciantes e criadores.
Em 24 de junho de 1917, surgiu uma instituição que desempenhou grande influência na
formação moral e cívica da juventude natalense: "Associação dos Escoteiros do Alecrim", fundada
por um grupo de idealistas (Luís Soares Correia de Araújo, Elói de Souza, Meira e Sá, Henrique
Castriciano, Moisés Soares e Monteiro Chaves).
O ensino fundamental começou a ser ministrado no século XX, com a fundação da Escola do
Comércio de Natal, no dia 8 de dezembro de 1919. E, sob a inspiração do segundo bispo de Natal.
D. Antônio dos Santos Cabral, foi instalada a Escola Feminina de Comércio, que teve uma
experiência efêmera. Depois, surgiu outra, que funcionou no Colégio Imaculada Conceição, em
1932. Três anos depois, Mossoró instalava uma escola de comércio. No ano de 1940, o Colégio
Nossa Senhora das Neves ganhava a sua.
O crescimento do ensino nessa área culminou com a criação de duas escolas de nível
superior. Em Natal, foi fundada a Faculdade de Ciências Econômicas e Contábeis (1957). Um
pouco depois, 1961, a União Caixeiral de Mossoró fundou a Faculdade de Ciências Econômicas.
O primeiro estabelecimento de ensino superior, entretanto, foi fundado em 1923, pelo decreto
nº 192: Faculdade de Farmácia, que conseguiu formar apenas dois alunos. Álvaro Torres Navarro e
José de Almeida Júnior, fechando logo depois. Um de seus professores, contudo, Varela Miranda,
criou um produto que ainda hoje é comercializado com o nome de "Sanarina".
Após 1934, o ensino secundário passou por algumas transformações, até chegar o ensino de
primeiro grau e de segundo grau.
Nessa época, somente os estudantes filhos de pais ricos ou que pertenciam a uma família que
tivesse bons recursos financeiros poderiam estudar em faculdades, em outras capitais do Nordeste
ou mesmo do Sul do País.

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Acontece que Natal passou por grande mudanças, devido à Segunda Guerra Mundial,
possibilitando, como disse Itamar de Souza, "às elites locais um intercâmbio como personagem de
uma cultura, mais cosmopolita. (...) A guerra desprovincializou Natal".
Outro fator importante: o movimento operário cresceu no País, com os deputados federais
debatendo na Câmara questões sociais, com reflexos no Rio Grande do Norte. Cresceu, em Natal, o
prestígio de Café Filho nas classes mais humildes, José Augusto de Medeiros, adversário político
de João Café Filho, eleito governador do Estado, criou a 1º de maio de 1925, numa solenidade
realizada no Teatro Carlos Gomes (hoje Alberto Maranhão), a primeira universidade popular do
Rio Grande do Norte. As aulas eram administradas através de conferências, sendo assistidas por
grande número de operários.
Surgiram, posteriormente, as universidades populares de Goianinha e a de Touros, ambas em
1925.
Em 1944, por iniciativa de D. Marcolino Dantas, o curso de Filosofia dos padres salesianos,
que era ministrado em Jaboatão (PE), foi transferido para Natal. Tratava-se, como disse Itamar de
Souza, "do Instituto Filosófico São João Bosco, destinado a formar os clérigos salesianos em
filosofia, ciências e letras". Esse instituto funcionou até 1959.
Atualmente, no Colégio Santo Antônio (Marista) funcionava o Curso Superior de Ciências
Religiosas, do Instituto de Humanidades Marcelino Champagnat, pertencente à Universidade
Católica do Paraná. O curso é dirigido pelo irmão Inácio Ferreira Dantas.
A Escola de Serviço Social foi fundada em 1945
Câmara Cascudo fundou a universidade popular, sendo instalada no dia 1º de maio de 1948,
na sede do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.
Com a multiplicação das escolas de nível superior, começava a se formar a base da futura
universidade federal: Faculdade de Medicina (1955), Escola de Auxiliar de Enfermagem (1955),
Faculdade de Filosofia (1955), Escola de Engenharia (1957).
Dr. Onofre Lopes, após grandes esforços, conseguiu ver seu sonho realizado: a universidade
estadual foi criada pela lei 2.307, de 25/06/1958, no governo de Dinarte Mariz. Dr. Onofre Lopes
da Silva foi o seu primeiro reitor. Incansável, iniciou a luta pela federalização. Essa aspiração se
concretizou pela lei no 3.849, em 18/12/1960, assinada pelo presidente da República, Juscelino
Kubitschek de Oliveira.
Como conseqüência de um verdadeiro "boom" universitário no Brasil, a Universidade
Federal do Rio Grande do Norte passou por um período de expansão, ocorrido sobretudo nos anos
compreendidos entre 1971 e 1979, nas administrações de Genário Alves Fonsêca (1971 a 1975) e
de Domingos Gomes de Lima (1976 a 1979).

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Com Genário Alves Fonseca, em 1972, foi implantada a TV Universitária . Em 1974,
algumas unidades foram transferidas para o campus e foram, também, criados novos cursos de
graduação: Arquitetura, Engenharia Elétrica, Química, etc.
No ano de 1973, a universidade partia para conquistar o interior, com a instalação do Núcleo
Avançado de Caicó. Depois, viram os campi de Currais Novos, Macau e Santa Cruz.
Anteriormente, a universidade tinha criado o CRUTAC, que prestou grandes serviços à
comunidade norte-rio-grandense, com alunos estagiando e atuando em diversas áreas.
A administração do professor Gomes de Lima foi sintetizada da seguinte maneira por Itamar
de Souza: "Este foi o quadriênio de maior dinamismo da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. A capacidade de trabalho do Magnífico Reitor, professor Domingos Gomes de Lima,
transformou a vida universitária em todos os setores".
Em síntese, a Universidade Federal do Rio Grande do Norte não apenas substituiu o papel
exercido antes pelo Ateneu, como foi mais além, dando uma efetiva contribuição ao
desenvolvimento do Estado.
Na Zona Oeste, foi instalada a Universidade Regional do Rio Grande do Norte que também
se expandiu, desenvolvendo um papel de relevo naquela região.
O Instituto Presidente Kennedy, no governo de José Agripino, quando Marcos Guerra exercia
as funções de secretário de Educação, foi redimensionado, através de uma proposta com o objetivo
de formar um novo professor. Passou, então, a ofertar um convênio entre a Universidade Regional
do Rio Grande do Norte, que legalmente oferta o curso, Secretaria de Educação do Estado,
contando com a assessoria do professor Michel Brault (Programa de Cooperação Técnica Brasil-
França). Mantém o 1º Grau como escola laboratório.
A primeira diretora, a partir da execução desse projeto, foi a professora Eleika Bezerra
Guerreiro, contando com a consultora pedagógica Maria Isaura Pinheiro, com larga experiência na
formação de professores.
Os professores-alunos pertencem ao Estado e a alguns municípios.
O diretor atual é o professor e psiquiatra Quinho Chaves.
O sistema cooperativista de ensino foi implantado em Natal, no ano de 1993, quando
começou a funcionar o Colégio Cooperativista Independente, fundado por funcionários do Banco
do Brasil.
Outra escola que funcionava nesse sistema é o Colégio Cooperativista Freinet, fundado em
1996. Para Eleika Bezerra Guerreiro, uma das fundadoras do Freinet, "trata-se de garantir aos pais
a opção de um ensino de qualidade a preços acessíveis. Com isto estaremos contribuindo para a
diminuição de um grave problema social".
Poetas, Escritores e Intelectuais

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A vida intelectual, no Rio Grande do Norte, estava ligada ao jornalismo político. E a
"modinha", no dizer de Câmara Cascudo, representava a "exteriorização literária".
O mesmo autor descreve o contexto da época: "os poetas ficavam na classe populesca dos
improvisados ou dos modinheiros, versos eram musicados e cantados nas serenatas, acompanhados
pelos vilões sonoros".
Alguns poetas que se destacaram na época foram Miguel Vieira de Melo (1821-1856),
Gustavo da Silva (1832-1856), Rafael Aracanjo da Fonseca (1811-1882), etc.
O primeiro jornal do Rio Grande do Norte, o "Nordeste", foi fundado pelo padre Francisco
Brito Guerra, em 1832.
Depois, João Manuel de Carvalho, fundou o primeiro órgão de imprensa de caráter literário,
chamado 'O Recreio'.
Outros jornais foram surgindo com maior ou menor duração, revelando para a comunidade
diversos jornalistas e intelectuais: Joaquim Fagundes (1857-1877) e José Teófilo (1852-1879), por
exemplo.
Na década 1870 - 1880, os bailes, que eram mensais, se transformaram em locais onde as
pessoas cantavam e declamavam poesias.
Merece destaque uma potiguar que passou vinte e oito anos na Europa e se tornou célebre
pela sua luta a favor do soerguimento da mulher, sendo igualmente, uma grande escritora. Dionísia
Gonçalves Pinto, mais conhecida pelo seu pseudônimo Nísia Floresta, nasceu no sítio Floresta, em
Papari (hoje Nísia Floresta, em sua homenagem), no dia 12 de outubro de 1810, falecendo na
França, em Rouen, a 24 de abril de 1885. A sua bibliografia é ampla: "Daciz ou a Jovem Completa"
(Rio, 1847), "Itineraire d'un voyage en Allemagne" (Paris, 1857), "A Mulher" (Londres, 1856), etc.
Falando sobre Nísia Floresta, Maria Eugênia M. Montenegro classificou-a como "ilustre
pensadora e idealista, a autodidata, a revolucionária, a enfermeira, a jornalista e abolicionista e
republicana, que pregava a igualdade das províncias e das casas. "(Revista Brasília, no LXX, abril -
maio de 1996).
Constância Lima Duarte publicou, em 1995, um livro sobre a vida e obra de Nísia Floresta,
onde constata "que a história de Nísia Floresta não se limita às primeiras páginas onde apresento
dados específicos referentes a sua vida e obra. Nem termina realmente ao final da análise do último
texto. Se cada um deles introduz dados, revela traços de sua personalidade, de suas lutas, de suas
obsessões, de seus conflitos, a figura de Nísia Floresta Brasileira Augusta fica por ainda se compor,
a partir de tudo isso que aí está, e de tudo o mais, que teima em se manter oculto aos nossos olhos".
Luís Carlos Lins Wanderley é o autor de "Mistério de um Homem", em dois volumes. É
apontado por alguns como sendo o primeiro romance escrito no Rio Grande do Norte.
Isabel Urbana de Albuquerque Gondim nasceu, provavelmente, em 1839, também em Papari.
Foi professora, poetisa e a primeira historiadora do Estado. Escreveu várias obras, como 'Sedição

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de 1817, na Capitania do ora Estado do Rio Grande do Norte"(1919), "O Sacrifício do Amor"
(1919), "Lira Singela" (1933), etc.
No movimento abolicionista, brilhou Segundo Wanderley.
Vem, depois, a geração do Oásis que, como disse Câmara Cascudo, "nasceu literalmente com
o advento republicano". Dessa fase se destacaram dois irmãos: "Henrique Castriciano e Auta de
Souza.
Henrique Castriciano, bacharel em Direito, muito viajado, e possuidor de uma grande cultura,
chegou a ser vice-governador do Estado. Como disse Romulo Wanderley, foi "jornalista, escritor,
crítico, impões-se aos seus contemporâneos pelo talento, pela cultura e pela inspiração poética".
São seus os seguintes versos:
"Ah! Como é triste o aboio! Ah, como é triste o canto sem palavras - tão vago - a saudade
exprimindo.
Das selvas do sertão, no mês de junho rindo.
Pelos olhos azuis das crianças, enquanto
No tamarinho verde, asas abertas, trina
À beira dos currais, o galo de campina!
Auta de Souza, poetisa, escreveu apenas um livro, "Horto", com várias edições.
A poesia "Meu Pai", começa assim:
"Desce, meu Pai, a noite baixou mansa
Nem uma nuvem se vê mais no céu:
Aninham-se aqui no peito meu,
Onde, chorando, a negra dor descansa".
Os primeiros teatros de Natal foram barracões de palha, construídos no local onde hoje é a
praça Gonçalves Lêdo. Todos os três foram destruídos pelo fogo.
Os grupos de amadores, contudo, não desanimam. "Representavam em teatrinhos
improvisados", disse Câmara Cascudo.
O comerciante João Crisóstomos de Oliveira fundou o Teatro de Santa Cruz, localizado na
atual João Pessoa, em 1880. Não dava lucro. Os amadores se apresentavam de graça. Falando sobre
a importância desse teatro, Câmara Cascudo fez o seguinte comentário: "De 1880 em diante o
Santa Cruz reúne todas demonstrações literárias da terra. Com a abolição aí se funda a Libertadora
Natalense. Com a República, aí discursaram os tribunos, Olinto Meira, Braz de Melo, Nascimento
de Castro, Augusto Severo, Pedro Velho. Nas cisões políticas, aí acampam os oposicionistas com o
Clube Republicano 15 de novembro. Ali a companhia de José de Lima Penante recebeu aplausos e
deixou saudades".
No dia 17 de abril de 1894, caiu a cobertura do teatro que desapareceu nesse momento.

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O século XX é a frase da Oficina Literária, onde se destacaram Francisco Cavalcanti, Jorge
Fernandes, Clementino Câmara.
Um grande poeta dessa geração foi Manoel Virgílio Ferreira Itajubá, que nasceu em Natal,
escrevendo versos como os que se seguem:
"Vi-te. Era noite. A lua decorada
Brilhava nas paragens luminosas
E a noite estava toda embalsamada,
Porque exalavam no canteiro as rosas".
No dia 29/3/1902, foi fundado o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte,
por um grupo de intelectuais, entre eles, Vicente Lemos, autor do clássico "Capitães Mores e
Governadores do Rio Grande do Norte". Faziam parte do instituto Luís Fernandes, Manoel Dantas,.
Pedro Soares e tantos outros. O instituto publica, ainda hoje, uma revista. O seu atual presidente é o
advogado Enélio Lima Petrovich.
O Teatro Carlos Gomes foi inaugurado em 1904, no primeiro governo de Alberto Maranhão.
O ilustre político, não satisfeito, ao assumir o governo pela segunda vez, promoveu grandes
reformas no teatro que hoje tem o seu nome. Câmara Cascudo descreveu que "nasceu outro teatro,
amplo, confortável, arejado, moderno".
No início do século, o coronel Francisco Justino de Oliveira Cascudo fundou "A Imprensa"
(1914-1926), que teria brilhante trajetória. O Centro Polimático (1920-1924) lançou uma revista
que publicava importantes estudos, que segundo Humberto Hermenegildo de Araújo, foi "de valor
fundamental para a compreensão do processo de criação de uma consciência, digamos "potiguar".
"Apareceu também uma revista feminina, chamada Via Láctea (1914-1915), onde se destacaram
Palmira e Carolina Wanderley.
Foi uma época de grande efervescência literária, onde brilharam nomes como Nascimento
Fernandes, Anfilóquio Câmra, Armando Seabra, Jayme Wanderley. Segundo Humberto
Hermenegildo de Araújo, "publicaram-se, naquela década, alguns títulos que ainda hoje são de
fundamental importância para a compreensão do início da nossa vida literária: "Alma patrícia"
(1921) e "Joio" (1924), ambos de Luís da Câmara Cascudo; "Poetas Rio-Grandenses do Norte"
(1922), de Ezequiel Wanderley", "Versos" (1927), de Lourival Açucena'e "Terra Natal" (1927), de
Ferreira Itajubá".
Câmara Cascudo, atendendo a um apelo da Federação das Academias de Letras, com um
grupo de amigos e intelectuais, fundou a Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, em
14/11/1936, na sede do Instituto de Música, sendo eleito Henrique Castriciano, presidente. Entre os
fundadores da academia, podem ser citados os seguintes intelectuais: Adauto Câmara, Otto de Brito
Guerra, H. Castriciano, Edgar Barbosa, Antonio Soares de Araújo, Nestor dos Santos Lima,
Januário Cicco, Floriano Cavalcanti, Lu;is Gonzaga do Monte.

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O atual presidente dessa academia é o advogado Diógenes da Cunha Lima.
A partir do século XX, surgiram vários jornais, em diversos municípios do Rio Grande do
Norte. Em Açu: "O Alphabeto" (1917), "A Cidade" (1901 a 1908), "Jornal do Sertão" (1928), "O
Vale (1937). Em Caicó: "A Folha" (1928), "Jornal de Caicó" (1930), "O Seridó" (1900-1901), "A
Verdade" (1933). Em Macau: "Folha Nova" (1913), "Gazeta de Macau" (1909), "O Imparcial"
(1918), "O Nacionalista" (1959), "A Voz de Macau" (1951). Em Mossoró: "Jornal do Oeste"
(1948), "A Palavra" (1926), "O Trabalho" (1926), "Desfile" (1946).
A "Coleção Mossoroense" tem editada uma série muito grande de livros, prestando, assim,
uma efetiva colaboração ao desenvolvimento cultural do Estado. Publicou "Notas e Documentos
para a História de Mossoró", de Luís da Câmara Cascudo; "Lampião em Mossoró", de Raimundo
Nonato; "Um possível caso de telegonia entre os nossos indígenas", de Jerônimo Vingt Rosado
Maia, etc.
De Açu, brilha Maria Eugênia Montenegro. Natural de Lavras (MG), se integrou no
movimento literário potiguar. Publicou livros de poesias ("Azul Solitário') e, inclusive, um de
ficção filosófica ("Alfar, A que Está Só").
Pertence às academias de letras de vários Estados e à do Rio Grande do Norte.
De Macau, Edinor Avelino, jornalista, colaborou em diversos jornais da capital ("A
Imprensa", "A República", "A Opinião" e "Democrata") e em outros do interior: "Folha Nova"
(Macau), "A Cidade" (Açu), "O mossoroense" (Mossoró).
No poema "Macau", considerado como sendo sua obra-prima, escreveu:
"A minha terra, calma e boa, trago-a nas cismas de saudade em que ando atento,
contemplando-a com os olhos cheios d'água.
nos grandes vôos do meu pensamento.
É das mais ricas terras pequeninas.
Apraz-me repetir, quando converso;
possui alvas e esplêndidas salinas,
as melhores salinas do universo".
De Ceará-Mirim, três nomes. Nilo Pereira, que tece, entretanto, uma grande atuação em
Pernambuco, onde foi diretor da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal de Pernambuco,
com extensa bibliografia, podendo se citados: "O destino das Faculdades de Filosofia na
Universidade" (Natal, 1957), "Humanismo de Luiz de Camões" (Recife, 1957) e "Evocação do
Ceará-Mirim" (Recife 1959), etc.
José Sanderson Deodato Fernandes de Negreiros, poeta, jornalista, quando foi eleito para a
Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, era o mais jovem daquela instituição. Trabalhou na
"Tribuna do Norte", "Diário de Natal", sendo também, redator e repórter de duas revista do Sul do
País, "Manchete" e "Visão".

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Autor de "Ritmo da Busca" (1956) e "Lances Exatos" (1966), é também de sua autoria a
poesia "O gesto":
Despe o corpo, tatuado de
relâmpagos. Ensarilhas ventos
ao som da ternura e apunhalas
o horizonte. Mas dentro de ti,
o coração canta, além.
do remoto mar das tapeçarias.
Deitaste o pão e água em minha
solidão, e amo-te por me teres
amado pelo próprio amor
desprotegida, ó incendiária do repouso".
Edgar Barbosa, formado em Direito, no Recife, em 1932, trabalhou em vários jornais: "A
República", "O Debate", "A Ordem", etc. Foi fundador da Faculdade de Filosofia e seu primeiro
diretor. Escreveu, entre outros livros: "História de uma campanha (1936), "Três Ensaios" (Recife,
1960), "Imagens do Tempo" (Natal, 1966).
De Nova Cruz, Diógenes da Cunha Lima Filho, poeta, advogado, professor, ex-reitor da
UFRN, ex-presidente da Educação e Cultural do Estado, publicou "Lua Quatro Vezes Sol" (1967),
"Tradição e Cultura de Massa" (1973), "Câmara Cascudo, um homem feliz", etc.
Em "Memórias das Águas", diz Diógenes da Cunha Lima:
"O espectro do rio foge
Quando dorme o Potengi.
Sua memória lavada
Em muitas águas desliza
Das nascentes do verão".
De São Vicente, D. José Adelino Dantas, com grande atuação no Seridó. Foi bispo de Caicó,
nomeado pelo papa Pio XII, em 1952. Colaborou no jornal "A Ordem". Depois, foi nomeado bispo
de Garanhuns (PE) e, a seguir, de Rui Barbosa, na Bahia.
Pertenceu à Academia Norte-Rio-Grandense de Letras, tendo publicado "A Formação do
Seminarista"(1947), "Homens e Fatos do Seridó Antigo" (1962), "O Coronel de Milícias Caetano
Dantas" (S/Data).
Falando sobre D. Adelino Dantas, disse Sanderson Negreiros: "pesquisador que se debruça
sobre o documento faz isso com amor e sabedoria, com calor humano e absoluta sinceridade de
propósitos".
Em abril de 1963, o governo Aluízio Alves inaugurou a Fundação José Augusto que
funcionou inicialmente "como faculdade para os cursos de Jornalismo, Sociologia e Política e

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Escola Superior de Administração, além de manter o Instituto Juvenal Lamartine de Pesquisas
Sociais e a Gráfica Manibu. Somente a partir de 1968, com a mudança do Estatuto, é que a
Fundação passa a fazer o trabalho de fomento à cultura potiguar, exercendo um papel semelhante
ao de uma Secretaria de Cultura estadual".
"Presente na vida cultural do Estado, desde a edição de livros, promoção de eventos, até a
preservação do patrimônio histórico, a Fundação José Augusto também detém a guarda e
manutenção de importantes prédios e instituições, como o Forte dos Reis Magos e o Memorial
Câmara Cascudo, a Biblioteca Pública Câmara Cascudo, Museu Café Filho e o de Arte Sacra".
"O teatro Alberto Maranhão, onde funciona uma Escola de Danças, o Instituto de Música
Waldermar de Almeida, com mais de 500 alunos matriculados, são outras entidades geridas pela
Fundação José Augusto, presidida pela segunda vez pelo jornalista Woden Madruga (a primeira
gestão ocorreu de 1987 a 1990)".
"Uma Orquestra Sinfônica em plena atividade, que realiza concertos oficiais, populares e
educativos mensais, sempre trazendo ao Estado renomados solistas, um coral (Canto do Povo),
com reconhecimento nacional e no exterior, tendo representado o Brasil em 1995 em temporada na
Alemanha, França e Itália, onde se apresentou para o papa João Paulo II, são outros dos orgulhos
da Fundação José Augusto".
"Na atual administração, vários projetos de sucesso têm sido desenvolvidos, como o Projeto
Seis e Meia, que é apresentado todas as terças-feiras, às 18h30, no Teatro Alberto Maranhão,
sempre com um cantor local e um nacional. Esse projeto, que tem uma média de público, por
sessão de 620 pessoas, é no estilo do extinto Projeto Pexinguinha, que foi realizado em todo o País
na década de 70. Por ele já passaram artistas como Paulinho da Viola, Leila Pinheiro, Jamelão e
Sivuca, entre tantos outros.
"Na luta para revitalizar os grupos e artistas populares, foram dadas indumentárias,
instrumentos, oportunidades de apresentação em Natal e fora do estado, e criado o Projeto Chico
Traíra, que edita e distribui com os autores de jovens e contemporâneos. Edita ainda o jornal
cultural "O Galo", mensalmente, promovendo Salões de Artes Plásticas e de Humor e dando apoio
às atividades teatrais, seja através da apresentação do teatro brasileiro, como Amir Haddad".
(Documento fornecido pela Asssessoria de Imprensa da Fundação José Augusto - 1997).

UM POUCO SOBRE CULTURA NO RN


Mestres de Ontem e de Hoje
Riqueza Intelectual Norte-rio-grandense
No governo do monsenhor Walfredo Gurgel, a Fundação José Augusto promoveu o "Prêmio
Nacional Luís da Câmara Cascudo", cujo vencedor, foi o escritor Américo De Oliveira Costa

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(profundo conhecedor da literatura francesa), com o trabalho "Viagem ao Universo de Câmara
Cascudo", que foi editado pela própria FGA, em 1969, na gestão de Hilma Melo.
No final dos anos 60 surgiu um movimento literário, provocando um impacto no Rio Grande
do Norte e também no Brasil: o lançamento simultâneo em Natal e no Rio de Janeiro do
Poema/Processo. Segundo Álvaro de Sá, "o Poema/ Processou criou muito e radicalmente". Por
essa razão, entrou em conflito com a tradição, cometendo algumas injustiças. Moacyr Cirne, um
dos fundadores do movimento, reconhece que "não soubemos enfrentar a questão cascudeana".
Mas o inimigo não seria Cascudo e sim "toda uma estrutura política, econômica e ideológica
conservadora, reacionária, castradora". O movimento encontrou, na realidade, uma resistência
muito forte, Nei Leandro de Castro chegou a dizer, num grande desabafo, que "o poema/processo
me faz passar oito ou dez anos sem escrever poesia, pode desencanto, por desalento". Nei Leandro
de Castro foi premiado em 1996, pela revista Playboy, com o conto "Nossa semelhança com os
deuses". É também romancista, escreveu o livro "Ojuara" (As Pelejas de Ojuara).
Entre os poetas ,que se destacaram na vida literária potiguar e que faleceram numa época não
muito distante, podem ser citados:
- Myriam Coeli, natural de Manaus, porém, norte-rio-grandense de São José de Mipibu por
opção. Segundo Carlos Guimarães, a poetisa conseguiu fazer a "interação exata entre a idéia e a
forma". Seu livro de estréia, "Imagem Virtual" (1961), foi escrito em parceria com seu marido,
Celso da Silveira que, como ela, também fazia versos, além de atuar como jornalista. Outros
trabalhos de Myriam Coeli são "Vivência sobre Vivência" e "Cantigas de Amigos" (1980).
- Zila da Costa Mamede, nasceu na vizinha Paraíba, em Nova Palmeira, vindo para Natal no
ano de 1935. Seu primeiro livro, "Rosa de Pedra", é de 1953. Publicou, ainda, "Salinas" (1958),
"Navegos" (1978) etc. Assim Zila Mamede cantou a rua Trairi, onde morou:
"Meu chão se muda em novos alicerces,
sob as pedreiras rasgam-se meus passos;
e a velha grama (posto de lirismo)
afoga-se nos sulcos das enxadas".
Ex-diretora da Biblioteca Central da UFRN, Zila Mamede escreveu "Luís da Câmara
Cascudo: 50 anos de vida intelectual - 1918 a 1968", pela Fundação José Augusto, 1970.
- Esmeraldo Siqueira foi, como disse Romulo Wanderley, um "crítico, ora impiedoso, ora
humano, poeta de profunda sensibilidade e apurado gosto na forma de seus versos". Entre outros
livros, escreveu "Caminhos Sonoros" (1950) e "Poemas" (1950).
Nos dias atuais um novo livro: "poço, festim, mosaico".
- Outro poetisa de grande força é Diva Cunha, autora de obras como "Canto de Página"
(1986), onde diz:
"desta janela

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ela é menos velha
que vista palmo a palmo
é luz de luz dourada
é verde ainda que tarde”.
Falando sobre a poetisa, disse Vicente Serejo: "Diva, que tem nas mãos os grãos da poesia,
plantados no tempo e germinando nos invernos da alma".
- Paulo de Tarso Correia de Melo é um autor premiado. Recebeu em 1991 dois prêmios:
Prêmio Estadual de Poesia Auta de Souza, com "Natal: secreta biografia" e o Prêmio Municipal de
poesia Othoniel Menezes, com a publicação do livro "Folhetim Cordial da Guerra em Natal e
Cordial Folhetim da Guerra em Parnamirim". Em sua poesia, sem qualquer vislumbre de
pedantismo, transparece a marca da sólida formação acadêmica de que é portador. Daí a
propriedade da apreciação: "A poesia de Paulo de Tarso foi caracterizada como sendo
intencionalmente textual e oralizante, marcada pela tentativa de integração do ancestral ao regional
e pelo aproveitamento do falar cotidiano".
- Luís Carlos Guimarães escreveu sete livros, entre os quais podem ser citados: "O Aprendiz
e a canção" (1961), "O sal da palavra" (1961) e o último, "O fruto maduro", quando segundo
Hildeberto Barbosa Filho, "como que se refaz e se repensa no âmbito mesmo da sua particular
textualidade".
Na "Elegia para Zila Mamede", ele presta uma homenagem à sua amiga:
"Sabias que morrerias no mar
Assim seria, disseste sem medo
em canção e alegia. Acreditar
só acreditamos quando tão cedo
Partiste: a morte - como anunciada-
boiava à deriva no corpo morto
e pela luz da manhã revelada
lançou a âncora no último porto".
A poesia visual continua seu caminhar, através dos trabalhos de Jota Medeiros, Anchieta
Fernandes, Franklin Capistrano, além de outros.
Ao contrário do que muita gente imagina, o Rio Grande do Norte teve e tem ficcionistas,
como, por exemplo Antônio José de Melo e Souza, mais conhecido pelo seu pseudônimo Polycarpo
Feitosa. Como intelectual, ele foi escritor, jornalista, poeta, historiador, contista e romancista. A sua
atuação maior, contudo, foi como contista e romancista. Alguns de seus livros: "Flor do Sertão"
(1928), "Gizinha" (1930) e "Alma Bravia" (1934).

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Eulício Farias de Lacerda, paraibano, fixou residência em Natal desde 1952. Escreveu contos
e romances: "O Rio da Noite Verde" (Prêmio Câmara Cascudo, 1972, editado em 1973), "As Filhas
do Arco-Íris" (1980) e "Os desertados da chuva" (1981) são marco de sua carreira de escritor.
Newton Navarro, além de ser artista plástico de grande talento e poeta, escreveu um livro de
contos, "O Solitário Vento do Verão" (1961), e um de crônicas, "Do outro lado do rio, entre os
morros".
Manoel Onofre Júnior, contista e autor de diversos livros: "Serra Nova" (1964), "Chão dos
Simples" (1985), "A Primeira Feira de José" (1973). Escreveu, também, "Estudos Norte-
Riograndenses" (1978).
Falando sobre o autor, disse Edgar Barbosa: "Pessoas, paisagens, costumes, as coisas que
você guardou além do tempo e da distância, saem do espaço físico para o mundo colorido da
verdade: a literatura não ordena mais do que isso ao verdadeiro escritor. Assim, você vem
construindo uma "saga" na melhor concepção que lhe imprimiram Guimarães Rosa e Mário
Palmério".
Alberto Pinheiro de Medeiros, "Destaque Especial", no VII Concurso Nacional de Contos
(1995), com a 'Missa no Santuário da Virgem Maria", obra publicada na antologia "Contos do
Brasil Contemporâneo", no vol. XXI. 1995.
O seu último trabalho premiado foi o conto "Matar o presidente?", publicado na antologia
"Contos do Brasil Contemporâneo", vol. XXIII, 1997. Recebeu, nesse ano, a láurea "Stella
Brasiliense", indicado pelo Conselho Editorial na revista Brasília. É verbete da Enciclopédia da
Literatura Brasileira Contemporânea", vol. VI, 1995, Rio de Janeiro, organizada pelo jornalista e
escritor Reis de Souza.
José Melquíades de Marcelo escreveu o romance "Juca Porfiro" (1997) além de biografias,
como a do "Padre Francisco de Brito Guerra, um senador do Império" (1968). Após curso de
especialização em Literatura e Lingüística, nos Estados Unidos, a Mulher e o Cachorro" (1960).
Para Veríssimo de Melo, o autor é "um homem de cultura clássica, lúcido e de ágil inteligência".
Iaperi Araújo, autor do livro "Canções da Terra" (1965), quando reuniu cerca de dez contos,
prestando homenagem aos "homens que lutam na gleba queimada, para toda uma população, fixa
na terra, amando o amargo chão, que o sol crêma com violência".
Além de Newton Navarro e Iaperi Araújo, outros nomes surgiram no mundo das artes
plásticas: Dorian Gray Caldas, Tomé Filgueira, Túlio Fernandes, Carlos José, Socorro Trindade,
Maria Márcia de Medeiros Dantas e Márcia Tresse.
No campo da História, desaparecidos grandes pesquisadores, como Vicente Lemos, Tavares
de Lyra, Câmara Cascudo, Hélio Galvão, continuam produzindo Tarcísio Medeiros ("Proto História
do Rio Grande do Norte" - 1985), Olavo de Medeiros Filho ("Aconteceu na Capitania do Rio
Grande" - 1997), João Wilson Mendes Melo (Introdução ao Estudo da História"1984), Hélio

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Dantas ("José Pacheco Dantas" - 1978), Cláudio Pinto Galvão ("Osvaldo de Souza, o canto do
Nordeste" - 1988), todos do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.
Um núcleo sólido de pesquisadores surgiu no Departamento de História da UFRN. A
pesquisa foi incentivada, sobretudo, a partir da fundação de uma revista, "História UFRN", em
1987, quando o Curso de História comemorava trinta anos de existência. Faziam parte desse grupo,
Denine Monteiro Takeya ("Um Outro Nordeste, o algodão na economia do Rio Grande do Norte" -
1985), Sebastião Fernandes Gurgel Filho (Ensaios Literários e Políticos"- 1988), Zélia Pinheiro de
Medeiros (co-autora de "Roteiro para o Estudo da História do Rio Grande do Norte" - S/data),
Geraldo Batista ("Moleque de Acari" - 1993), Marlene da Silva Mariz ("A Revolução de 1930 no
Rio Grande do Norte, 1930 - 1934" - 1984), Clyde Smith Júnior ("Trampolim para Vitória" - 1993)
etc.
A verdade é que a Universidade Federal do Rio Grande do Norte, nas diversas áreas de
atuação, tem contribuído para o desenvolvimento sócio-cultural-científico e econômico do Estado.
O seu atual reitor é o professor Ivonildo Rego.
Recentemente foi inaugurada, em Natal, a Universidade Potiguar, com impressionante
crescimento, desfrutando de grande credibilidade na sociedade norte-rio-grandense. O seu primeiro
e atual reitor é o professor Mizael Araújo Barreto. No último vestibular, realizado em novembro de
1997, aprovou cerca de 2.250 candidatos.
Nas artes cênicas, Jesiel Figueiredo procurou soerguer o teatro, encenando peças infantis e
dramas clássicos, obtendo grande sucesso. Chegou, inclusive, a fazer funcionar um teatro, no bairro
do Alecrim, com o seu nome.
Na atualidade, um dramaturgo ganhou importância: Racine Santos.
O bailarino e coreógrafo Roosevelte Pimenta, no Ballet Municipal, vem se tornando
conhecido pelo seu talento, promovendo grandes e belos espetáculos, e, ainda, conseguindo
descobrir novos valores.
Por outro lado, Corpovivo Companhia de Dança se encontra numa ótima fase, trazendo a
professora Kelli Griffin para dar aulas de dança. A Companhia foi convidada para se apresentar na
cidade de Salvador, durante a Oficina Nacional de Dança Contemporânea.
Entre os intelectuais, da época contemporânea, podem ser citados: Moacyr de Góes ("Sem
paisagem" - 1991), João Medeiros Filho ("82 horas de Subversão" - 1980), Alvamar Furtado de
Mendonça ("José da Penha, um romântico da República - 1970), Francisco das Chagas Pereira
("Eloy de Souza" - 1982), Jayme da Nóbrega Santa Rosa ("Acari - Fundação, História,
Desenvolvimento - 1974), Bianor Medeiros ("Monsenhor Walfredo Gurgel - um símbolo" - 1976),
Lenine Pinto ("Natal, USA" - 1995), Antonio Soares Filho ("Antídio de Azevedo" = 1978), Edinor
Avelino ("Síntese" - 1968), José Wellington Germano ("Lendo e Aprendendo" - 1992), Nilo Pereira
("Imagens do Ceará-Mirim" - 1969), José Lacerda Felipe ("Aspectos Naturais do Seridó" - 1978),

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D. Nivaldo Monte ("Se todos os homens... conhecessem o dom de Deus" - 1963), Jurandir Navarro
("Antologia do Padre Monte") etc.
Literatura Rompe as Fronteiras
Em 1964, Veríssimo de Melo publicava o estudo "Dois Poetas do Nordeste", da Coleção
"Aspectos", do Ministério da Educação e Cultura, abordando o trabalho de Jorge Fernandes e
Ascenço Ferreira.
Manuel Bandeira ficou entusiasmado com a poesia de Jorge Fernandes a ponto de dizer o
seguinte: "Jorge Fernandes falou em muitos dos seus poemas com um timbre que é só dele: falou
de coisas do Brasil com o sabor que é só dele; aquele seu livro deve estar na biblioteca de todos os
brasileiros". Outro admirador do poeta potiguar foi Mário de Andrade que fez o seguinte
comentário: "Você é original, é incontestável e é de uma originalidade natural nada procurada".
Jorge Fernandes provocou um escândalo em Natal, porque foi o primeiro poeta potiguar a
desprezar rima, cultivando os versos livres.
Em 1979, os poetas potiguares João Batista de Morais Neto, Franklin Jorge, Vicente
Vitoriano e Carlos Humberto Dantas tiveram seus poemas traduzidos pelo crítico e tradutor Gilbert
Chaudanne e publicados na revista francesa Prisme.
Outros intelectuais do Rio Grande do Norte obtiveram êxito nos concursos literários,
promovidos anualmente pelo Grupo Brasília de Comunicação, tiveram seus trabalhos em
antologias e, ainda, alguns viram suas crônicas publicadas no Anuário do Clube Literário de
Brasília.
Entre os intelectuais que tiveram suas obras incluídas em antologias editadas pelo Grupo
Brasília de Comunicação, podem ser citados: Adalzirene Nunes de Carvalho (Mossoró), Emídio
Lopes de Araújo (Natal), Fábia Maria Diógenes (Natal).
A poeta Marize Castro teve recentemente o seu poema "Vinho", traduzido por Steven F.
White, para a revista The American Voice:
"Se o queres seco para molhar a garganta
eu o quero suave para reinventar
essa chama se o queres branco
para velar a virgem eu o quero
vermelho do porto
para aportar as paixões
que me dividem".
Nivaldete Ferreira, paraibana, radicada em Natal, teve o conto "O Descanso das Sílabas" e o
livro "psilinha Cosmo de Caramelo" premiados em concurso promovidos pela União Brasileira de
Escritores, com sede no Rio de Janeiro.
A Prosa Animada de Câmara Cascudo

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Segundo Diógenes da Cunha Lima, Câmara Cascudo foi um "escritor, folclorista, etnógrafo,
antropologista cultural, crítico, sociólogo, orador, conferencista". Possuindo, "sobretudo, o dom da
prosa, animada, viva, cintilante, com a faculdade rara, feliz, de espalhar bom humor e irradiar
simpatia em torno de si".
Luís da Câmara Cascudo nasceu no dia 30 de dezembro de 1898, no bairro da Ribeira, Natal,
Filho do coronel Francisco Justino de Oliveira Cascudo e de dona Ana da Câmara Cascudo.
Estudou no Externato Sagrado Coração de Jesus, colégio feminino, dirigido por duas irmãs,
Guilhermina e Maria Emília de Andrade.
Teve dois professores particulares, Pedro Alexandrino, ensinando Literatura Clássica, e
Francisco Ivo Cavalcanti, lecionando Conhecimentos Gerais.
O pai, discordando da educação feminina que recebia, colocou o filho no Colégio Santo
Antônio.
Foi menino rico, pois, como ele mesmo disse, "meu pai e seus amigos enchiam-me de
presentes, trazidos do sul ou mandados vir da Europa (...) Mas, brincava sozinho. "Esse fato
marcou o menino de tal maneira que, quando adulto, não esqueceu: "falar só, abstração, timidez -
repulsa ao grupo, silêncio pelo isolamento, intensidade de vida, interior suprindo a distância da
convivência menina. Lia muito, mais do que apreciava os jogos materiais. Ficava horas e horas
imóvel, num caldeirão de braços com o livro na perna, viajando na imaginação. Deveria ser
introvertido, ensimesmado, caladão. Foi ao contrário"- sou extrovertido, palrador, derramado".
Apesar de rico, foi um menino triste: "Fui menino magro, pálido, enfermiço. Cercado de
dietas e restrições clínicas. Proibiram-me movimentação na lúdica infantil".
Ao crescer, Câmara Cascudo, era um jovem elegante, com roupas confeccionadas pelo Joca
Lira. E fazia compras nas melhores lojas: Paris em Natal, Natal Modelo e A Chilena. Era um rapaz
muito estimado pelas moças natalenses. E se dizia, inclusive, que ele possuía duas namoradas com
o mesmo nome: Alzira...
Apaixonou-se, entretanto, por uma moça de dezesseis anos, Dália, filha do desembargador
Teotônio Freire e de dona Sinhá Freire. Com ela se casou, no dia 21 de abril de 1929. Teve dois
filhos: Fernando Luís e Ana Maria Cascudo.
Menino rico, rapaz elegante, adulto pobre, sendo obrigado a trabalhar para viver. Exerceu
várias funções públicas: professor, chegando a ser diretor do Ateneu Norte-Rio-Grandense.
Exerceu os cargos de secretário do Tribunal de Justiça e consultor jurídico do Estado. Em 1951,
ingressou na Universidade Federal do Rio Grande do Norte como professor de Direito
Internacional Público.
Em 1948, recebeu o título de "Historiador da Cidade do Natal", das mãos do prefeito Sylvio
Pedroza.

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Ingressou no jornalismo, escrevendo a seção "Bric-à-Brac", no jornal de seu pai, "A
Imprensa". Assinou uma crônica diária, em "A República", que o tornou famoso:: "Acta Diurna"
(foram escritas, ao lado cerca de 3.200 crônicas).
Colaborou em vários órgãos de imprensa de Recife: Jornal do Comércio, Diário de
Pernambuco, Diário da Manhã, e, também, em outros jornais do país.
Câmara Cascudo foi, como disse Luiz Gonzaga de Melo, "um dos maiores divulgadores da
ideologia da Ação Integralista Brasileira", chegando, inclusive, a ser o chefe desse movimento no
Rio Grande do Norte. Toda a divulgação, feita por Cascudo, foi através da imprensa. Ele se tornou
um assíduo colaborador do semanário "A Ofensiva" e, ainda, das revistas "Anauê" e "Panorama".
Em artigo publicado na revista "A Ofensiva" (31-05-1934). Câmara Cascudo faz um
questionamento de uma impressionante atualidade: "para a burguesia liberal, governar é arrecadar
impostos. Que importa o sofrimento dos homens? Que importa o desenvolvimento constante de
classe exploradas ao lado de um pequeno grupo de exploradores? Que importa o acorrentamento da
nação ao capitalismo estrangeiro?
Musicólogo, como esclarece Gumercindo Saraiva, "não é somente aquele que executa
melodia, compõe peças ou estuda acústica e teoria musical". E, sim, igualmente aquele "que se
dedica em torno da musicologia, abordando qualquer dos aspectos dessa ciência, o biógrafo, o
historiador este sim é um musicológo".
Gumercinco Saraiva faz uma afirmação que demonstra todo o prestígio de Câmara Cascudo
em sua cidade natal: "Nada fazia na província em sentido de cultura sem primeiro ouvi-lo".
Desfrutando esse prestígio quando possuía apenas 39 anos. Gumercindo Saraiva disse ainda o
seguinte: "Sua orientação nos setores artísticos, contribuindo com ensinamentos sábios, trouxeram
novos horizontes para a cultura musical do Estado". Alguns títulos de crônicas de Cascudo
comprovam sua atuação como musicólogo: "Prelúdio sobre Bach", "Modinhas e modinheiros de
Natal", "Da canção brasileira", "A cantoria sertaneja", etc.
Câmara Cascudo fundou a Sociedade de Cultura Musical, presidiu o Instituto de Música do
Rio Grande do Norte e dirigiu a revista "Som".
Câmara Cascudo é considerado ainda hoje como sendo um dos maiores folcloristas do
mundo, o maior do Brasil. A sua obra mais importante, nessa área, chama-se "Dicionário do
Folclore Brasileiro" (1954). Outros livros de Cascudo sobre o folclore: "Geografia dos Mitos
Brasileiros" (Prêmio João Ribeiro, da Academia Brasileira de Letras, 1948), "Folclore do Brasil"
(1976), etc.
Renato Almeida, escrevendo sobre o mundo folclórico de Câmara Cascudo, disse que "não
limita aos livros que tem publicado, numa imensa bibliografia, todo o seu cabedal de
conhecimentos. Tem a arte difícil de conversar e ouvi-lo é um encanto continuado. A ele podemos

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aplicar em tudo quanto se refere ao folclore, aquele dístico do já desaparecido jornal
cinematográfico Pathé - tudo vê, tudo sabe, tudo informa".
Como historiador, Cascudo escreveu uma obra definitiva, "História do Rio Grande do Norte"
(1995) e, ainda, o livro que até o presente não foi suplantado: "História da Cidade do Natal" (1947).
No campo da etnografia, escreveu um livro completo: "Jangada" (1957). Outros livros:
"Nomes da Terra" (1968), "História da Alimentação no Brasil" (3 vols- Iº vol. (1967), "Rede de
Dormir" (1959), "O Tempo e Eu" (1968) etc. Escreveu, ao todo, 150 livros.
Recebeu diversas condecorações: "Comendador da Ordem de Cristo" (Portugal),
"Comendador da Ordem dos Cisneiros" (Espanha), "Comendador da Ordem de São Gregório"
(Santa Sé), "Oficial da Ordem da Coroa" (Itália), "Medalha Nina Rodrigues" (S. Paulo), "Medalha
da Campanha do Atlântico Sul" (Aeronáutica) etc.
Distinções recebidas: "Prêmio Nacional de Cultura" (1970), concedido pela Fundação
Cultural do Distrito Federal; "Troféu Juca Pato", dado pela União Brasileira de Escritores (1976);
"Prêmio Henning Albert Boilesen" (1973); "Doutor Honoris Causa", da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte, etc.
Câmara Cascudo pertenceu a diversas instituições culturais: Academia Nacional de Filosofia,
Sociedade Brasileira de Antropologia e Enologia, Sociedade de Folk-lore do México, Sociedade de
Geografia de Lisboa, Societé des Americanistas de Paris, entre outras.
Luís da Câmara Cascudo morreu em Natal, no dia 30 de julho de 1986.
Sabedoria e Arte Conservadas Pelo Povo
Segundo Cascudo, "esse nome FOLK-LORE foi criado por um arqueólogo inglês, William
John Thoms (1803-1885), propondo a denominação num artigo com esse título, publicado na
revista Rhe Athenaeum, de Londres, a 22 de agosto de 1846, com o pseudônimo de Ambrose
Mertor". Folk-Lore seria "the lore of the people", a sabedoria do povo. Tornou-se universal e
comum.
Mas o que vem a ser, na realidade, folclore?
É o próprio Cascudo quem responde: "Todos os países do mundo, raça, grupos humanos,
famílias, classes, profissionais, possuem um patrimônio de tradições que se transmite oralmente e é
defendido e conservado pelo costume. Esse patrimônio é milenar e contemporâneo. Cresce com os
conhecimentos diários desde que se integram nos hábitos grupais, domésticos ou nacionais. Esse
patrimônio é o FOLCLORE".
O folclore potiguar é uma conseqüência de tradições portuguesas, nativas e africanas. Com o
passar do tempo essas tradições se misturaram, provocando uma danças.
Uma dessas tradições mais antigas é a vaquejada, cuja origem é desconhecida.
Hoje, a vaquejada se transformou num esporte, praticado pelos filhos dos fazendeiros,
juntamente com seus vaqueiros. É a festa popular, com distribuição de valiosos prêmios.

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A vaquejada tem por principal objetivo derrubar o touro, puxando o animal pela cauda. Dois
cavaleiros correm, de maneira paralela, um procurar levar o boi numa determinada direção, o outro
tenta derrubá-lo. Quando o objetivo é alcançado, aplausos. Caso contrário, vaias....
As festas populares mais conhecidas do Rio Grande do Norte pertencem ao ciclo junino
(Santo Antônio, São João e São Pedro) e aquelas que fazem parte do ciclo natalino.
Nos festejos de São João, comemorados com mais intensidade, predominam iguarias de
milho: canjica, pamonha, milho assado, etc.
Com fogueiras, fogos, adivinhações, bandeiras de papel, iluminação com muitas lâmpadas,
com destaque para a dança chamada quadrilha. Essa festa, antigamente, era realizada nas fazendas.
Atualmente, a quadrilha foi transportada para a cidade, quando se realizam os "arraiás" em ruas
interditadas especialmente para os festejos juninos.
Campina Grande, na Paraíba, se transformou num grande centro de festas juninas do
Nordeste, atraindo milhares de turistas, inclusive, potiguares.
Do ciclo natalino, se destaca uma festa bem tradicional que durante os anos vinte
monopolizava as atenções da cidade do Natal, como mostra o testemunho de João de Amorim
Guimarães: a festa dos Santos Reis.
Narra o poeta e cronista: "Desde a tarde da véspera começava a chegar gente. Iniciavam-se os
"terços", respondidos por todos e repetidos a noite inteira (...) Na hora da missa às nove horas da
manhã, a praia estava apinhada de devotos, ricos e pobres, pretos e brancos, abstêmios e bêbados.
"Depois da missa a festa continuava. Orquestra sem conta, tocando em bailes improvisados;
cantores anônimos deliciando o povo, acompanhados de violões dengosos, sentimentalizando,
cantando, chorando, nos sons deliciosos do instrumento que soube sempre seduzir o coração e
almal...
"Ali almoçava-se, bebia-se, deliciava-se o espírito e o coração, o dia todo, tudo dentro do
respeito e da consideração recíproca, de um povo feliz, que se compreendia e se estimava...".
Pertencente ainda ao ciclo natalino existem alguns folguedos populares. Um dos mais
conhecidos é o Boi Calemba (Bumba meu Boi), que se exibe no período que vai de novembro até o
início de janeiro.
As primeiras exibições datam do século XVIII.
Segundo Deífilo Gurgel, o Boi Calemba se diferencia dos outros brasileiros e não tem
enredo, por ter se descaracterizado, "limitando-se o brinquedo hoje, pelo menos em Natal e em São
Gonçalo, quase só as danças e cantigas".
Do elenco se destaca o Mestre que, quase sempre, é o dono do espetáculo. De;ífilo Gurgel
conta que "os antigos Mestres de Boi Calembra de Ceará-Mirim e São José de Mipibu vinham a
Natal contratar seus espetáculos empunhando uma espada desembainhada", porque a espada
simbolizava o poder.

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Outro personagens: os Galantes são em número de quatro a oito. As duas damas são, na
realidade, dois meninos vestidos de mulher. Os mascarados possuem os seguintes nomes: Mateus,
Birico e Catirina.
Entre as figuras, podem ser citadas: Burrinha, Bode, Cheque, Gigante e sua mulher Dra.
Maria Zidora da Conceição Pia.
Como disse Deífilo Gurgel, "O Boi é a figura central do folguedo. É o último que se
apresenta. Depois que ele sai de cena, cantam-se as despedidas".
Já o Pastoril tem por objetivo louvar o menino Jesus, representando a visita que os pastores
fizeram ao estábulo de Belém. É formado por várias jornadas, com dois grupos de pastoras: o
cordão azul e o cordão vermelho, ambos possuem os seguintes personagens: Diana Mestra,
Contramestra, Cigana, etc.
Antigamente, o Pastoril era representado diante de um presépio, com imagens de santos.
Renato Almeida, citado por Câmara Cascudo, diz o seguinte: "O que tem maior significado
no pastoril é constituírem as pastoras o elemento básico na função coro, tomado como personagem.
Ele é que tem o papel dramático".
O Fandango não existiu em Portugal, porém, as músicas receberam influência européia, cujos
temas, como diz Câmara Cascudo, foram organizados "anonimamente no Brasil". Consta de vinte e
quatro jornadas. Os personagens vestem "fardas" da marinha. É a história da "Náu Catarineta",
justificando, assim, a presença de um barco. Alguns personagens do elenco: Capitão, Piloto,
Imediato, Médico, etc.
A Chegança, que em Portugal era dança, ao chegar no Brasil se transformou em um auto.
Como disse Câmara Cascudo, "a chegança é representada com cenas marítimas, culminando pela
abordagem dos mouros, que são vencidos e batizados".
Em 1745, a Chegança foi proibida por D. João V, em Portugal, por ser considerado indecente.
Segundo Câmara Cascudo, essa dança não tem nenhuma relação com o auto brasileiro que "é
dividido em partes e não há acompanhamento musical ao canto que decorre ritmado pelos
tambores, caixas-de-guerra, em rufos incessantes".
Os Congos ou Congadas, pelo nome, denunciam influência africana. No enredo, lutas de
africanos, buscando sua autonomia contra os portugueses. Não foi, contudo, importado da África.
Surgiu no Brasil, invenção dos escravos negros. Principais personagens: Rei Cariongo, Príncipe
Sueno, Secretário-Sala, Rainha Jinga e o Embaixador.
Encontram-se, na atualidade, em decadência. Segundo Tarcísio Medeiros, "em Caicó e
Jardim do Seridó, entretanto, conservam, por ocasião das festas à Nossa Senhora do Rosário".
Os Caboclinhos se apresentam durante o carnaval. Não chega a ser um auto. Os seus
integrantes fazem, apenas, coreografia, fantasiados de nativos. Como afirma Tarcísio Medeiros,
eles "desfilam pelas ruas ao som do batuque dos seus tambores, gaitas e chocalhos, dançando em

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cordões que evoluem de acordo com as cenas representadas pelo caçador ferido, manifestações de
feitiçaria do Pajé e o culto dos deus Tupan, carregado num andor, tudo sob as ordens do Cacique,
que imprime sua vontade por meio do toque de um búzio".
Bambelô é uma dança, com o grupo formando um círculo, e no interior da "roda", dançam
um ou dois dançarinos. É, ainda, Tarcísio Medeiros, quem diz que o "cantar", geralmente, é
improvisado; o refrão ou segue a estrofe ou se intercala nela. Poeticamente, apenas, o refrão é fixo,
constituindo o caracterizado do coco".
Em Alagoas a dança é conhecida pelo nome de "Coco".
Em Natal, duas sociedades continuam dançando o Bambelô: Araruna e Asa Branca.
Deífilo Gurgel Turismo e Folclore
Após o falecimento de Luís da Câmara Cascudo, um homem continua pesquisando o folclore
do Rio Grande do Norte: "Deífilo Gurgel. Desde muito tempo que o professor Deífilio Gurgel vem
publicando livros sobre as tradições populares do Estado.
Recentemente terminou uma viagem que durou um ano, depois de ter percorrido 1.500 km,
com o objetivo de publicar um livro, com 240 páginas, com o apoio do Programa Municipal de
Financiamento à Cultura, e terá o seguinte título: "Introdução ao Estudo do Folclore". Na opinião
do autor, o livro será uma "antologia ou mini-enciclopédia do folclore potiguar".
Deífilo Gurgel lamenta o desinteresse da população pelo folclore. Ele, porém, não desiste.
Sonha em construir uma vila, com o nome de Chico Santeiro, para promover "um intercâmbio
entre o folclore e turismo, na esteira do potencial de Natal em ambas as áreas".

ECONOMIA E HISTÓRIA
Dois Séculos
Século XIX: Novas Atividades Produtivas
No século XIX, além da predominância da criação de gado, houve também a expansão das
culturas do algodão e da cana-de-açúcar e, ainda, cresceram as atividades extrativas, sal, marinho e
cera de carnaúba.
Na segunda metade desse século, a criação de gado foi prejudicada por duas secas: a de
1844/45 e 1877/79.
A cana-de-açúcar passou a ser a principal atividade econômica, chegando a produzir, em
1860, cerca de 4.176.570 quilos. Depois, entretanto, começou a decadência.
A indústria salineira, que se deu bem no princípio do século. pouco depois entrou em
declínio, porém, posteriormente, conseguiu uma notável recuperação, nas regiões de Mossoró,
Macau e Areia Branca.
No final do século XIX, outro produto atingiu um grande desenvolvimento: a cera de
carnaúba.

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A indústria têxtil apresentou, desde o começo, 1870, um lento desenvolvimento, graças a uma
dupla concorrência : a da indústria têxtil do Sudeste e a do Estado de Pernambuco. Denise Rakeya
aponta outro fator, ou seja, "a estrutura do mercado consumidor. Com exceção daquela parte da
população localizada nos núcleos urbanos, a maior parte não poderia, de fato, constituir esse
mercado".
A indústria têxtil vai se configurar como uma realidade a partir de 1877, quando "o
presidente da província contratou com Amaro Barreto de Albuquerque Maranhão a instalação de
uma fábrica de fios e de tecidos em Natal, e a inauguração ocorreu no ano de 1888. Em 1904,
passou a funcionar outro estabelecimento industrial, a Fábrica de Óleos e Farelos de Algodão", já,
portanto, no século XX.
Dois Séculos
Avanços e Recuos no Século XX
Devido à importância do algodão, o governo criou o Serviço Estadual do Algodão e pouco
depois (1927), o Serviço de Classificação do Algodão.
A Inspertoria Federal de Obras Contra as Secas, criada em 1909, em parceria com o governo
estadual, construiu "várias estradas no RN - entre as quais se destacava a que ligava Natal ao
Seridó - que posteriormente viriam completar o quando de integração de Natal com as zonas
algodoeiras do Estado", afirmam Marconi Gomes da Silva, Márcia Maria Bezerra e Geraldo Gurgel
de Azevedo.
A baixa qualidade do algodão potiguar, em algumas regiões, foi combatida pelo governo
através de estações experimentais e de campos de demonstração, visando uma melhor participação
no comércio internacional. Como resultado, a cotonicultura atingiu uma posição hegemônica no
começo do século XX. Com a concorrência dos paulistas, a situação começou a mudar. Em 1940, a
produção paulista atingiu praticamente o triplo da produção nacional.
A exportação do sal marinho, contudo, cresceu muito. De 7.115 toneladas, nos anos de
1851/55, pulou para cerca de 92.902 toneladas no período 1905/1909. Com destaque para Macau e
Areia Branca.
O mesmo não ocorreu com a indústria açucareira. A explicação é muito simples: enquanto a
indústria salineira melhorou sua tecnologia de produção, a do açúcar permaneceu praticamente com
os velhos bangüês. A modernização dessa indústria foi muito lenta. Em 1942, o Rio Grande do
Norte contava apenas com três usinas!
O rebanho potiguar, durante os períodos de 1950/54 e 1975/79, cresceu 265%! Desse
rebanho, a criação bovina aumentou de tal maneira que suplantou, em muito, as criações se suínos,
caprinos e ovinos, como demonstra Dominique Simone Colombert.
No período compreendido entre 1950 a 1970, entretanto, houve, nas fazendas com menos de
cem hectares, uma diminuição do rebanho.

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Petróleo e Luta por Uma Refinaria
Um fator importante na economia atual do Rio Grande do Norte é o petróleo, responsável por
uma posição de destaque dentro do País. Por essa razão, as autoridades estaduais, unidas a
determinados setores, lançaram uma campanha pela construção de uma refinaria de petróleo no
Estado, criando o "Movimento S. O. S. Refinaria no Rio Grande do Norte".
A existência do petróleo foi confirmada em 1974, com a abertura do poço pioneiro. Apesar da
importância da Bacia Potiguar, "o Rio Grande do Norte, na sua condição de exportador de energia
primária, é duplamente penalizado, na medida em que se restringe a oportunidade de potencializar
o seu desenvolvimento, via verticalização industrial da sua produção mineral e, ao mesmo tempo,
vê reduzidas as transferências, constitucionais de recursos da União, por ter sua renda per capita
aumentada pela agregação do valor do petróleo extraído do seu sub-solo".
"Adicionalmente, por força de um dispositivo constitucional que isenta o petróleo da
cobrança do ICMS nas operações de transferência interestadual, o Rio Grande do Norte se vê
financiando o desenvolvimento de Estados ricos e industrializados, na medida em que deixa de
arrecadar cerca de US$ 65 milhões em impostos, por ano, valor que deve entrar como uma variável
de custo, favorável ao RN, no estudo de viabilidade ora em execução pela Petrobrás" (Movimento
SOS Refinaria no Rio Grande do Norte).
A campanha, infelizmente, não obteve nenhum resultado.
A Zona Homogênia Mossoroense é apontada pelos técnicos, como sendo uma região
privilegiada para se instalar uma refinaria.
O investimento da Petrobrás para o Rio Grande do Norte, em 1996, incluindo impostos,
constou de aproximadamente 500 milhões de dólares.
O Rio Grande do Norte é o maior produtor nacional de petróleo em terra e o segundo no mar.
Produção total diária de 100 mil barris. É o segundo produtor de gás natural do Nordeste, com 75
milhões de metros cúbicos/ano.
A Potencialidade do Turismo
Outro setor importante na atualidade é o turismo. Apesar da construção de uma rede de
hotéis, inclusive dois de cinco estrelas, na Via Costeira, o turismo sofre por falta de uma infra-
estrutura. Natal ainda não se preparou adequadamente para receber um grande número de
visitantes. Muitos turistas deixam de conhecer belos recantos, havendo uma concentração nos
passeios de bugres nas duas de Jenipabu e no Carnatal, no final do ano.
Surgem, entretanto, grande esperanças, num futuro próximo.
A Secretaria Estadual de Turismo, no início de 1997, organizou uma grande festa que abriu a
VI BNTM (Brazil National Tourism Mart), na Vila Folia, com a presença do governador Garibaldi
Alves Filho e mais de dois mil participantes.

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No Pavilhão Parque das Dunas do Centro de Convenções foram armados os estantes do
evento. Na oportunidade, foi apresentada a maquete da ampliação do aeroporto Augusto Severo,
com mudanças que vão transformá-lo num dos mais modernos do País. Também há planos para a
construção de um segundo aeroporto na região da Grande Natal.
Projeto Hídrico e Pólo Industrial
O governo Garibaldi Alves Filho desenvolveu um projeto hídrico muito importante para a
economia do Rio Grande do Norte.
O objetivo é interligar as principais bacias, numa garantia de distribuição de água de boa
qualidade para consumo da população e, ainda, que seja a garantia de irrigação para uma vasta
região do território potiguar.
O canal do Pataxó promove a transposição das águas da Barragem Armando Ribeiro
Gonçalves para o rio Pataxó, significando 2.500 hectares de área irrigada, etapa já concluída no
final de 1955.
A barragem Gargalheiras ampliará a sua capacidade de armazenamento de água, sendo esse
acontecimento de grande importância para uma região que está incluída na área mais seca do
Nordeste.
Com a construção da adutora do sertão Cabugi, as águas do reservatório Armando Ribeiro
Gonçalves vão abastecer oito cidades (Angicos, Fernando Pedrosa, Lages, Pedro Avelino, Pedra
Preta, Jardim de Angicos, Caiçara do Rio dos Ventos, Riachuelo) e, ainda, 21 comunidades rurais.
Serão, também, aproveitadas as águas da Lagoa do Bonfim, sendo atendidos outros
municípios: Monte Alegre, Lagoa de Pedra, Lagoa Salgada, até Santa Cruz.
O sistema conta ainda com as seguintes adutoras: a de Mossoró, Serra do Mel, Jardim do
Seridó, Serra de Sant’ana e Meio Oeste. O programa engloba 670 quilômetros de adutoras e é o
maior do Brasil.
Outro grande projeto, que trará grandes investimentos produtivos para o Estado, é o
"Pologás-sal", uma das grandes bandeiras levantadas pelo governador Garibaldi Alves, que
inclusive já assinou um protocolo para a sua instalação. A obra conta com apoio do governo
federal. Segundo o ministro das Minas e Energia, o "Pologás-sal é irreversível".
Comércio Exterior e Outros Números
O comércio exterior do Rio Grande do Norte apresentou, um crescimento de 1,84% no
primeiro semestre de 1997, em relação ao mesmo período do ano anterior.
As exportações somaram US$ 45,2 milhões, sendo o maior índice dos dez últimos anos,
liderando o setor de frutas tropicais, com 32,6% de todo o produto comercializado para o exterior.
O PIB per capita vem evoluindo positivamente no Rio Grande do Norte, como demonstram
os números: em 1980, era de 1.246,06, o Nordeste tinha 1.649,32 e o Brasil 3.553,07. Em 1996, o
Rio Grande do Norte apresentava 3.013.60, o Nordeste 2.578 e o Brasil 4.752,08.

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Com uma produção de 4 milhões de toneladas/ano, o Rio Grande do Norte é o maior
produtor de sal marinho do País.
No setor de gás natural, a posição do Estado é muito boa: é o segundo, com uma produção de
75 milhões de metros cúbicos.
Na agricultura, o Rio Grande do Norte ocupa o segundo lugar, como pólo de fruticultura
irrigada do Nordeste.
Os maiores importadores dos produtos potiguares, no primeiro semestre de 1997 foram os
seguintes: Estados Unidos (US$ 13.4 milhões), Nigéria (US$ 5,2 milhões), Reino Unido (US$ 4,8
milhões).
História do RN - Uma Síntese
Da Pré-História ao Final do 2º Milênio
O homem primitivo, nascido em terras potiguares antes da vinda dos europeus, é bem mais
antigo do que se imaginava.
Antes de chegar ao Nordeste, teria vindo possivelmente da Ásia, através do Estreito de
Bering ou por outras vias. O fato é que, com o passar do tempo, atingiu as terras que formariam, no
futuro, o Rio Grande do Norte.
Esses povos desenvolveram culturas, procurando se comunicar, inventaram um tipo de
escrita, conhecida pelo nome de inscrição rupestre, uma linguagem formada por traços, círculos,
pontos e até pinturas.
A coloniza européia, no Nordeste brasileiro, foi conseqüência da expansão do imperialismo
europeu. Nesta região, tentaram se fixar franceses, espanhóis, holandês e portugueses.
Filipe II, da Espanha, ao anexar Portugal e suas colônias, procurou de imediato se apossar de
todo o Nordeste e da região Norte. Mandou expulsar os franceses da Capitania do Rio Grande,
construir uma fortaleza (a Fortaleza da Barra do Rio Grande ou, como é mais conhecida, Fortaleza
dos Reis Magos) e fundar uma cidade.
A expedição armada, comandada por Mascarenhas Homem, fracassou, porém, Jerônimo de
Albuquerque, os jesuítas e os líderes nativos conseguiram, através de navegações, a pacificação da
região.
Expulsos os franceses, construída a fortaleza no dia 25 de dezembro de 1599, João Rodrigues
Colaço fundou Natal, que deveria funcionar como núcleo inicial de colonização se desenrolasse de
maneira lenta.
Os holandeses tentaram conquistar o Nordeste, primeiro, procurando se apossar da capital da
colônia (1624/1625). Sonhavam com 8.000 florins que a Bahia arrecadava anualmente. E, a partir
daquela capitania, conquistar todo o País. Foi, contudo, um sonho que se desmoronou, por sinal
bem rápido.

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O fracasso foi total, mas a idéia de tomar o Brasil da Espanha continuava, pois não admitiam
a derrota que sofreram para seu grande rival... E fizeram uma segunda tentativa. Escolheram,
agora, a terra do açúcar, Pernambuco!
Conseguem o seu objetivo, se apossando de Pernambuco e, ainda, avançam, conquistando
todo o Nordeste.
O conde de Nassau, figura invulgar, procurou não apenas explorar as terras sob seu domínio,
como desejava a Companhia Privilegiada das Índias Ocidentais, e sim agir como se fosse um
"mecenas". Incentivou a arte, a ciência e a cultura. Mostrou-se, ao mesmo tempo, hábil político e
bom administrador.
O Rio Grande possuía um vasto rebanho de gado bovino, necessário para abastecer os
invasores. Era urgente, portanto, a sua conquista, após muita pesquisa - porque a fortaleza da Barra
do Rio Grande (Reis Magos) aparecia como um grande obstáculo. Mas, ao contrário, a tomada da
fortaleza foi bem mais fácil do que eles esperavam. Aqui, os holandeses agiram de uma maneira
bem diferente: nenhuma preocupação pela arte, ciência, cultura. A capitania foi transformada numa
fornecedora de carne bovina para Pernambuco.
No Rio Grande, o conflito se agravou por causa do fanatismo religioso, provocando dois
grandes massacres: o de Cunhaú e o de Uruaçu.
Apesar da violência, a tradição indicava os holandeses como sendo os autores de obras
importantes, como a fortaleza dos Reis Magos ou, então, a ponte (antiga) de Igapó, construída
muito depois de sua expulsão... Existe apenas uma explicação para tudo isso: uma resistência, pelo
menos a nível de subconsciente, contra a colonização lusitana.
O último ato dos batavos, no Rio Grande, foi mais violência. Vencidos, obrigados a deixar a
capitania, lançaram fogo, destruindo o que podiam, inclusive, documentos.
Após os flamengos, a capitania conheceu outro momento de grande violência: "A Guerra dos
Bárbaros". Provocada pelos brancos, que desejavam tomar a terra dos seus legítimos donos, ou
seja, dos nativos. A violência gerou violência. Bernardo Vieira de Melo, compreendendo essa
verdade, agiu com competência e justiça, conseguindo aplicar a região sob o seu comando.
Essas duas guerras, contra os holandeses e dos "Bárbaros", foram responsáveis pelo atraso,
ou seja, impediram o desenvolvimento natural do Rio Grande do Norte.
No século XVIII, a economia tinha por base apenas a agricultura e a indústria pastoril.
A Revolução de 1817, em Recife, teve reflexos no Estado. José Inácio Borges, que governava
a capitania, procurou reagir, sendo preso por André de Albuquerque. O movimento não contou com
o apoio popular. A reação monarquista veio logo a seguir, triunfando. André de Albuquerque,
ferido, foi levado preso para a fortaleza, onde faleceu.

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A independência do Brasil foi outro acontecimento que não conseguiu entusiasmar o povo.
Houve apenas uma festa para comemorar a emancipação política do País, no dia 22 de janeiro de
1823.
A Confederação do Equador, no Rio Grande do Norte, se caracterizou pela atuação de Tomás
de Araújo Pereira, para evitar que ocorressem conflitos armados no Estado. Sofreu, chegando a se
humilhar, porém, conseguiu o seu intento.
A escravidão representava, no final do século XIX, o atraso, identificada com a decadente
monarquia.
O abolicionismo, ao contrário, representava o novo e para muitos fazia parte dos ideais
republicanos. Foi, contudo, a princesa Isabel quem decretou o fim da escravidão, no dia 13 de maio
de 1888.
A grande falha do abolicionismo, no Brasil, foi a de não ter lutado pela integração do negro
na sociedade, após a sua libertação. Como resultado, os africanos e seus descendentes passaram por
grande dificuldades. Alguns se deslocaram para regiões distantes das cidades, formando
comunidades fechadas, como em Capoeira dos Negros.
A libertação dos escravos, no Rio Grande do Norte, foi defendida por grupos de jovens e
intelectuais, que fundavam, em seus municípios, associações que batalhavam pela emancipação do
negro.
Mossoró foi a primeira cidade que libertou seus escravos, no dia 30 de setembro de 1883.
A Proclamação da República, a exemplo de outros acontecimentos, não despertou grande
entusiasmo no povo potiguar. Teve caráter meramente adesista.
No novo regime, predominavam os interesses da oligarquia Albuquerque Maranhão. Contra
ela, se insurgiu José da Penha Alves de Souza, promovendo a primeira campanha popular do Rio
Grande do Norte. Patrocinou a candidatura do tenente Leônidas Hermes da Fonseca, que não
conhecia e nem desejava governar o Estado... Abandonado pelo seu candidato, José da Penha
voltou para o Ceará, onde chegou a ser eleito deputado estadual.
Quando o eixo econômico passou do litoral (açúcar-sal) para o sertão (algodão-pecuária),
apareceu uma nova oligarquia, liderada por José Augusto Bezerra de Medeiros, cujo domínio
terminou com a Revolução de 1930.
O regime político, apodrecido pelas fraudes, corrupção, provocou o descontentamento de
grupos militares e civis. Dentro desse contexto, Luís Carlos Prestes e Miguel Costa percorreram o
País com uma tropa, a "Coluna Prestes", protestando contra o autoritarismo do presidente Artur
Bernardes. A "Coluna Prestes" entrou no Rio Grande do Norte pela Zona Oeste, travando combates
com a polícia, durante o governo de José Augusto Bezerra de Medeiros.
A ‘Questão de Grossos" começou no século XVIII, quando Rio Grande do Norte e Ceará não
tinham definido suas fronteiras. O Ceará precisava do sal potiguar para poder fabricar suas carnes

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de sol. A Câmara de Aracati (Ceará) pretendeu além das de seu Estado, penetrando em terras do
Rio Grande do Norte. Era a chamada "Questão de Grossos".
Em 1901, a Assembléia Estadual do Ceará elevou Grossos à condição de vila, incluindo no
seu território uma vasta área do Rio Grande do Norte. Alberto Maranhão, governador do RN,
protestou. Era iminente um conflito armado entre os dois Estados. Para evitar o agravamento da
crise, a controvérsia foi levada para uma decisão, através do arbitramento. Na primeira fase, o
resultado foi favorável ao Ceará. Pedro Velho, então, convidou Rui Barbosa para defender a causa
potiguar. Essa defesa também contou com a participação de Augusto Tavares de Lyra. Como
resultado, o jurista Augusto Petronio, através de três acórdãos, deu ganho de causa em definitivo ao
Rio Grande do Norte, em 1920. A "Questão de Grossos" estava encerrada.
A República foi ingrata com o sertão, que continuou abandonado, isolado dos grandes centros
urbanos, com a maioria de sua população na ignorância e na miséria.
No sertão dos coronéis, os mais humildes tinham três opções: viver eternamente agregado às
famílias dos coronéis; integrar-se ao cangaço, ou penetrar no mundo místico, cujo fiéis terminavam
enfrentando os coronéis e se transformavam em grupos de "fanáticos".
Lampião levou pânico ao interior nordestino, chegando a invadir Mossoró, sendo derrotado
pelo povo daquela cidade, sob a liderança do coronel Rodolfo Fernandes.
O cangaceiro, no sertão, era um misto de bandido e de justiceiro, único a fazer frente ao
absolutismo dos coronéis.
Jesuíno Brilhante é o representante potiguar típico do cangaço.
Os grandes místicos do Nordeste foram: padre Cícero e Antônio Conselheiro.
Os fanáticos da Serra de João do Vale, liderados por Joaquim Ramalho e Sabino José de
Oliveira, foram os místicos mais conhecidos da história do Rio Grande do Norte. O fim deles,
porém, foi melancólico, derrotados pelo tenente Francisco de Oliveira Cascudo.
A Revolução de 30 irrompeu no Brasil para modificar a estrutura política existente no País.
Governava o Estado, Juvenal Lamartine, muito dependente do poder central, e teve, segundo seus
adversários, uma preocupação básica: perseguir seus inimigos... Com a Revolução de 30, perdeu o
governo, caindo sem resistir.
A Revolução de 30, no Rio Grande do Norte, significa, sobretudo, a atuação de João Café
Filho. Foi um lutador, procurando isntalar no seu Estado os ideais revolucionários. Encontrando
sempre a resistência das oligarquias, lideradas por José Augusto de Medeiros.
A Revolução de 30 enfrentou momentos difíceis, por causa da oposição das classes
conservadoras, representadas pelo Partido Popular. O governo central orientou Mário Câmara para
fazer uma composição de forças, com o Partido Popular. O interventor, entretanto, não conseguiu
efetivar tal aliança. Em vez de pacificação, cresceu o clima de agitação, fazendo com que o final da
administração se transformasse no período de maior violência ocorrido até aquele momento.

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A classe operária, contudo, começou a se organizar, se unindo em torno dos sindicatos.
Cinco anos depois de ter ocorrido a Revolução de 30, surgiu outro movimento armado, a
Intentona Comunista. Gerado, em parte, pelo descontentamento provocado pelo governo de Mário
Câmara, e que foi liderada por um grupo de comunistas. Vitoriosa a rebelião, uma grande agitação
dominou Natal, com estabelecimentos comerciais assaltados e, ainda, com assassinatos.
A resistência maior foi feita pela polícia, sob o comando do major Luís Júlio e do coronel
Pinto Soares. Surgiu um mito, transformado em herói: o soldado Luiz Gonzaga.
Foi instalado o "Comitê Popular Revolucionário" no dia 25 de novembro de 1935. Circulou o
jornal "Liberdade".
Com o fracasso da Intentona, no Recife e Rio de Janeiro, os rebeldes abandonaram Natal,
seguindo o rumo do Seridó. Na Serra do Doutor houve o encontro dos fugitivos com forças
sertanejas, com a debandada de ambas as facções... Terminava, assim, a Intertona Comunista. A
repressão foi violenta,
Mas o destino de Natal não seria, apenas, a de ser palco de violência. A sua localização
geográfica fazia com que a cidade fosse predestinada para ocupar um lugar de destaque na história
da aviação, desde os primórdios, na época dos hidroaviões, quando grandes aeronautas passaram
por Natal: marquês De Pinedo, Paul Vachet, Jean Mermoz, etc.
O primeiro aeroplano que aterrissou no Estado foi um Breguet, pilotado por Paul Vachet.
Em 1927, o coronel Luís Tavares Guerreiro indicou a Vachet um local apropriado para
construir um aeroporto, que aeroporto, que servisse de pouso para os aviões da Lignes Latércoère.
Aprovado, nasceu assim o Aeroporto de Parnamirim. Foi inaugurado por um "Numgesser-e-Coli",
pilotado por Dieu Domé Costes e José le Brix, concluindo, com êxito, o roteiro Saint Louis do
Senegal-Natal.
Graças ao empenho de Juvenal Lamartine, no dia 29 de dezembro de 1928 foi fundado o
Aéro Clube.
Em 1º de janeiro de 1931, o navio italizano "Lazeroto Malocello", comandado pelo capitão
de fragata Carlo Alberto Coraggio, chegava a Natal, trazendo a Coluna Capitolina, ofertada pelo
chefe do governo italiano Benito Mussolini, para comemorar o "raid" Roma-Natal, feito pelos
aviadores Del Prete e Ferrarin.
Cinco dias depois, Natal recebeu a visita da esquadrilha da Força Aérea italiana, comandada
pelo general Balbo. Governava o Rio Grande do Norte, Irineu Joffily.
Natal iria ficar mais famosa ainda durante a Segunda Guerra Mundial. Os norte-americanos,
nesse período, construíram uma megabase, que desempenhou um papel tão significativo no grande
conflito que se tornou conhecida pelo nome de "O Trampolim da Vitória".
Em Natal, ocorreu a reunião entre o presidente do Brasil, Getúlio Vargas e o presidente dos
Estados Unidos, Franklin D. Roosevelt, na chamada "Conferência de Natal" (28-1-1943).

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A cidade cresceu, multiplicou sua população, foi visitada por personalidades ilustres de
diversos países, e, sobretudo com o progresso, a população mudou de hábitos.
Para uma maior integração dos militares americanos com os natalenses, foram realizados,
inúmeros bailes. Como conseqüência, houve uma invasão de ritmos estrangeiros: rumba, conga e
boleros.
Natal, assim, perdeu definitivamente seu jeito de cidade provinciana.
O populismo se impôs, no Rio Grande do Norte, durante os anos 60, através de dois grandes
líderes políticos: Aluízio Alves e Djalma Maranhão. O primeiro, oriundo do Partido Popular, se
apresentava como sendo do Centro, iniciando o processo de modernização do Estado. O segundo
nacionalista radical, homem de esquerda.
O golpe militar de 64 se caracterizou, no Rio Grande do Norte, apenas pelas perseguições a
jovens e intelectuais da terra, como Moacyr de Góes, Djalma Maranhão, Mailde Pintou e outros.
Luís Maranhão, ao que parece, foi morto pelas forças da repressão. Djalma Maranhão, exilado,
com saudade do seu povo, morreu no Uruguai. Aluízio Alves, Garibaldi Alves e Agnelo Alves
tiveram seus direitos políticos cassados pelo AI5
Na história educacional do Estado, um colégio se destacou: Ateneu, que se transformou num
centro cultural de grande importância.
A "Campanha de Pé no Chão Também se Aprende a Ler" provocou uma verdadeira revolução
no processo educacional do Rio Grande do Norte, nos anos 60, liderada por Djalma Maranhão,
Moacyr de Góes e Margarida de Jesus Cortez.
O ensino "normal" passou por uma série de vicissitudes até o funcionamento do Instituto
Presidente Kennedy. Inaugurado, por sua vez, com grandes festas, no governo de Aluízio Alves.
Recentemente, foi redimensionado, ministrando o curso de 3º grau, visando a formação de um
novo professor, cotando com a assessoria do professor Michel Brault.
A cultura no Rio Grande do Norte apresenta páginas brilhantes. Desde a fundação do seu
primeiro jornal, "O Natalense", em 1832, pelo padre Francisco de Brito Guerra, até o presente
momento, a imprensa escrita ocupou um lugar de destaque.
No século XIX apareceu o primeiro romance, "Mistério de um Homem", de Luís Carlos Lins
Wanderley.
Nomes femininos que brilharam no século XIX e início do século XX: Isabel Gondim, Auta
de Souza e Nísia Floresta.
Ferreira Itajubá é considerado o grande poeta do século XIX. A partir dessa época, surgiram
grandes poetas até os dias atuais.
No dia 29-3-1902 foi fundado o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.
Luís da Câmara Cascudo, no dia 14-11-1936, fundou a Academia Norte-Rio-Grandense de Letras.

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O movimento cultural cresceu muito e jornais se multiplicaram em praticamente todos os
municípios do Estado.
Na atualidade, algumas instituições têm contribuído para o desenvolvimento cultural do
Estado: Fundação José Augusto, "Coleção Mossoroense" e Universidade Federal do Rio Grande do
Norte.
O estado conta, até o presente momento, com duas antologias, reunindo os poetas do Rio
Grande do Norte: a primeira, organizada por Ezequiel Wanderley, foi publicada em 1922 sob o
título "Poetas do Rio Grande do Norte" e a segunda, escrita por Rômulo Chaves Wanderley, que
publicou, em 1965, o "Panorama da Poesia Norte-Rio-Grandense".
Novas antologias estão sendo preparadas. Uma delas organizada por Constância Lima
Duarte, juntamente com a poetisa Diva Cunha.
A economia do Estado teve um lento caminhar, prejudicada por períodos de longas estiagens.
Teve alguns ciclos: gado, cana-de-açúcar, algodão, sal, etc.
A partir de 1974, com a abertura do poço pioneiro, o petróleo começou a crescer na economia
estadual. Fala-se, agora, no "Polo-gás-sal", que caso venha a se tornar realidade, trará grandes
benefícios para o Rio Grande do Norte.
O turismo é apontado pelos especialistas como um setor que tende a crescer, pela
potencialidade que a terra potiguar possui.
Foi construída uma rede de hotéis na Via Costeira e recentemente a Secretaria Estadual de
Turismo organizou uma grande festa que abriu a VI BNTM (Brazil National Tourism Mart).
Durante o evento, mais de 2.000 participantes freqüentaram os estandes dos nove Estados, armados
no Pavilhão Parque das Dunas, do Centro de Convenções, em Ponta Negra.
O Rio Grande do Norte se encontra incluído no polígono das secas.
O governo Garibaldi Alves elegeu a irrigação como uma das metas prioritárias de sua
administração. O seu projeto é interligar as principais bacias, como uma maneira de levar água de
boa qualidade para a população, incluída nas comunidades atingidas pela seca, com a irrigação de
uma vasta área do território potiguar.

Natal-RN: Síntese histórica e dados geográficos


A Cidade do Natal, Capital do Estado do Rio Grande do Norte, situa-se na Região Nordeste
do Brasil. Tem uma área de 172 quilômetros quadrados e uma população estimada de 750 mil
habitantes.
Está localizada abaixo da linha equatorial e a trinta e um metros acima do nível do
mar. É o ponto das Américas mais próximo da África e da Europa.
Limita-se a norte e a leste com o Oceano Atlântico e é banhada pelo Rio Potengi; o que
lhe proporciona um clima seco e agradavelmente ensolarado, com ventos que sopram
constantemente do oceano.
A excepcional posição geográfica de Natal, associado a outros fatores, torna-a uma das

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cidades brasileiras mais procuradas pelos turistas.
Essa construção em pedras maciças e formato estrelar, eregido em 6 de janeiro de 1958,
é o local exato da fundação da Cidade e o seu mais importante monumento histórico.
O gentílico de Natal é natalense e o do Rio Grande do Norte é norte-riograndense ou
potiguar.
O nome da Cidade provém da data de sua fundação - oficialmente 25 de dezembro de 1599.
Entretanto, esse não é o seu nome original - mas sim, Cidade dos Reis Magos - nome igualmente
dado à fortaleza edificada pelos colonizadores portugueses, na Foz do Rio Potengi, para
combaterem os invasores holandeses, no final do século XVI.
Em 1630, haviam apenas trinta casas de taipa em Natal. Sob o domínio holandês - de 1633 a
1654 -, a cidade recebeu o nome de Nova Amsterdã. Com a expulsão dos invasores, foi governada
por uma sucessão de comandantes portugueses, até 1822, quando o Brasil obteve sua
independência.
A partir das primeiras décadas do século XVIII, teve inicio a expansão da cidade em direção
à Ribeira.
Em 1757, já existiam cento e dezoito casas em Natal; igrejas, cadeia, erário, praça e
pelourinho faziam parte do cenário urbano. Natal media oitocentos e oitenta metros de
comprimento por cento e dez de largura.
No inicio do século XIX, a população estava em torno de setecentos habitantes. O bairro da
Ribeira iniciava sua vocação comercial. As grandes transformações sociais, políticas e culturais
ocorridas na Colônia com a instalação da corte portuguesa no Brasil a partir de 1808, repercutiam
na Província.
Natal também ganhava alguns exemplares arquitetônicos no estilo neoclássico, trazido pela
Missão Artística ao Brasil, alguns dos quais ainda existentes na Cidade.
De 1822 a 1889, a Província do Rio Grande do Norte foi governada por presidentes. Desde
então, vem tendo governo e legislatura própria.
O século XX trouxe consigo o progresso decorrente da Revolução Industrial. Natal
antecipou-se ao Movimento Modernista Nacional, com a criação do primeiro Plano Urbanístico da
Cidade.
A Resolução nº 15 de 30/12/1901, criou a Cidade Nova, compreendendo os bairros do Tirol e
Petrópolis. O plano foi traçado pelo arquiteto Antônio Polidrelli. A instalação da Comissão das
Obras do Porto, em 1902, impulsionou o povoamento da Ribeira.
Há alguns epítetos conferidos à Cidade, em diferentes momentos históricos, tais como:
· "Trampolim da Vitória" - Por ocasião da Segunda Guerra Mundial, devido a sua
privilegiada posição geográfica, Natal foi escolhida pelos militares americanos para
instalação de uma base aérea. Com o desfecho da guerra, a cidade passou a ser conhecida
como o "Trampolim da Vitoria".
Esse fato contribuiu para a evolução urbana de Natal. A cidade cresceu, novos bairros foram

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criados e largas avenidas foram abertas, seguindo o "Plano de Sistematização para
Expansão Urbana de Natal", elaborado pelo arquiteto italiano Giacomo Palumbo, a convite
do prefeito Omar O'Grady, em 1929.
· "Cidade Espacial do Brasil" - por ter sido a primeira cidade brasileira a lançar
foguetes, diretamente da Base Espacial de Barreira do Inferno;
· "Cidade do Sol" - por ser banhada pelos raios solares durante quase todos os dias do
ano.

Natal continua seu ritmo de crescimento e desenvolvimento. A implantação da Via Costeira


permitiu a instalação de uma ampla rede de confortáveis hotéis. O incremento ao turismo elevou a
Cidade à condição de Polo Turístico Nacional.

In: https://professorjanildoarantes.blogspot.com.br/2016/02/professor-janildo-arantes-desde-
16-de_12.html(Acesso em 17 de dezembro de 2017).
In: https://professorjanildoarantes.blogspot.com.br/2009/09/rio-grande-do-norte.html(Acesso
em 17 de dezembro de 2017)
In: https://professorjanildoarantes.blogspot.com.br/2010/01/historia-do-rio-grande-do-norte-
i.html (Acesso em 17 de dezembro de 2017).
In: https://professorjanildoarantes.blogspot.com.br/2010/01/historia-do-rio-grande-do-norte-
ii.html (Acesso em 17 de dezembro de 2017)
In: https://professorjanildoarantes.blogspot.com.br/search?q=Hist
%C3%B3ria+do+Rio+Grande+do+Norte(Acesso em 17 de dezembro de 2017)

In: https://professorjanildoarantes.blogspot.com.br/2010/01/historia-do-rio-grande-do-norte-
iv.html?spref=bl (Acesso em 17 de dezembro de 2017)

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