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HISTÓRIA DA ÁFRICA
EaD
EaD
EaD UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA
PRESIDENTE DA
REPÚBLICA
Dilma Roussef
MINISTRO DA EDUCAÇÃO
Fernando Haddad
LICENCIATURA EM HISTÓRIA
HISTÓRIA DA ÁFRICA
EDUNEB
Salvador
2012
© UNEB 2012
Nenhuma parte deste material poderá ser reproduzida, transmitida ou gravada, por qualquer meio eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros,
sem a prévia autorização, por escrito, da Coordenação UAB/UNEB.
Depósito Legal na Biblioteca Nacional
Impresso no Brasil 2012
DIRETORA
Maria Nadja Nunes Bittencourt
COORDENADOR EITORIAL
Ricardo Baroud
COORDENAÇÃO UAB/UNEB
COLABORADORES REVISORES
Carla Honorato
SUPERVISÃO DE MATERIAL DIDÁTICO
Flávia Goulart Mota Garcia Rosa
Andréa Santos Tanure
Teresinha Quadros
Flávia Souza dos Santos
Tatiane Nogueira Nunes
NORMALIZAÇÃO
Susane Barros
PROJETO GRÁFICO e CRIAÇÃO
João Victor Souza Dourado
DIAGRAMAÇÃO
Carla Cristiani Honorato de Souza
Teodomiro Araújo
O conteúdo deste Material Didático é de inteira responsabilidade do(s)/da(s) autores (as), por cuja criação assume(m) ampla e total responsabilidade
quanto a titularidade, originalidade do conteúdo intelectual produzido, uso de citações de obras consultadas, referências, imagens e outros elementos
que façam parte desta publicação.
ISBN: 978-85-7887-108-6
CDD: 960
Estamos começando uma nova etapa de trabalho e para auxiliá-lo no desenvolvimento da sua aprendizagem
estruturamos este material didático que atenderá ao Curso de Licenciatura em História na modalidade de educação
à distância (EaD).
O componente curricular que agora lhe apresentamos foi preparado por profissionais habilitados, especialistas da
área, pesquisadores, docentes que tiveram a preocupação em alinhar conhecimento teórico-prático de maneira
contextualizada, fazendo uso de uma linguagem motivacional, capaz de aprofundar o conhecimento prévio dos
envolvidos com a disciplina em questão. Cabe salientar, porém, que esse não deve ser o único material a ser
utilizado na disciplina, além dele, o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), as atividades propostas pelo Professor
Formador e pelo Tutor, as atividades complementares, os horários destinados aos estudos individuais, tudo isso
somado compõe os estudos relacionados a EaD.
É importante também que vocês estejam sempre atentos as caixas de diálogos e ícones específicos que aparecem
durante todo o texto apresentando informações complementares ao conteúdo. A idéia é mediar junto ao leitor, uma
forma de dialogar questões para o aprofundamento dos assuntos, a fim de que o mesmo se torne interlocutor ativo
desse material.
São objetivos dos ícones em destaque:
Sua postura será essencial para o aproveitamento completo desta disciplina. Contamos com seu empenho e
entusiasmo para juntos desenvolvermos uma prática pedagógica significativa.
ÁREA DE AMBIENTAÇÃO
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Telefones: E-mail:
Residência:
Município/Pólo do curso EaD:
Apresentação da disciplina
Ultimamente, você deve ter ouvido falar muito na África, nos interesses políticos e comerciais despertados no governo e
nas empresas brasileiras por este continente. Dependendo de onde você mora, é capaz até de ter conhecidos trabalhando
na África.
Recentemente tivemos uma copa do mundo de futebol na África do Sul e isso expôs ainda mais o continente aos olhos
de todo o globo.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva elegeu as relações com o continente africano como prioritário para as ações diplo-
máticas. Além disso, uma das primeiras leis aprovados no seu primeiro mandato foi a Lei n. 10.639/2003, que obriga
todos os níveis educacionais, entre outras coisas, a incluir em seus currículos o estudo da História e Cultura da África e
de seus descendentes.
A humanidade começou no continente africano, portanto do ponto de vista cronológico é o mais intenso de todos em
relação a história.
A África é um continente rico em beleza e em recursos naturais e humanos.Sua diversidade de povos e culturas milenares
são surpreendente e a diversidade religiosa é fascinante.
Muçulmanos, cristãos das mais variadas denominações, e adeptos das religiões tradicionais africanas convivem, na mesma
cidade, no mesmo bairro, e às vezes na mesma família.
Então, como um continente tão grande, com tanta história, com uma variedade de povos tão grande, pode ser tão pobre
do ponto de vista econômico?
Esse é um dos motivos que torna a História do continente africano instigante. Porém, durante longos períodos a África ficou
esquecida, assim como sua história e todo seu legado de ideias, filosofia, religiosidade e desenvolvimento tecnológico.
Depois de um longo período de descaso, recentemente, retomou-se o interesse pela História da África principalmente para
nós brasileiros.
Os mercados africanos são de grande interesse para as potências mundiais, não só as maiores economias mundiais, mas
também as potências em desenvolvimento – o chamado BRIC (Brasil, Rússia, Índia, China) – e os grandes recursos naturais
do continente atraem cada vez mais empresas para explorá-los.
Diversos programas de pós-graduação têm elaborado e desenvolvido projetos sobre o continente e atividades envolvendo
pesquisadores africanos e brasileiros tomam vulto nas universidades e centros de pesquisa.
Projetos nas áreas de desenvolvimento regional e local, educacionais, Biodiversidade, Sociologia, Antropologia, Língua e
Literatura, Saúde e também na área de História, cada vez mais atraem pesquisadores brasileiros para os diversos países
africanos.
Essa disciplina é reflexo desse novo interesse sobre o continente africano, e também, visa atender a Lei n. 10.639/2003. Ela
visa o início de um instigante caminho rumo à apreensão do conhecimento sobre o continente africano, suas civilizações,
histórias, sua diversidade e beleza.
Este módulo é apenas uma forma de inseri-lo em alguns aspectos da História da África e instigá-lo a buscar temas e as-
suntos em outras fontes para enriquecer seus conhecimentos sobre esse continente lindo e com tantas nuances em sua
diversidade de culturas e histórias.
Esperamos que você, ao final do módulo, aproveite os instrumentos aqui propostos e busque temas para discussão sobre
a História da África e se sinta estimulado a fazer novas viagens, mesmo que virtuais, ao continente africano.
Bons estudos.
O Autor
Anotações
SUMARIO
CAPÍTULO 1 - O CONTINENTE AFRICANO 11
África: continuidades e descontinuidades 16
As matrizes da educação brasileira e um pequeno histórico das reivindicações dos Movimentos 20
Sociais até a promulgação da lei 10.639/2003
A escravidão na África 63
A montagem do tráfico no Atlântico Sul 66
Costa do Ouro e Costa dos Escravos 69
Reino do Kongo e Ndongo 70
Costa Oriental 72
REFERÊNCIAS 74
Anotações
O Continente africano
CAPÍTULO 1
EaD
EaD UNIVERSIDADE
UNIVERSIDADE DO
DO ESTADO
ESTADO DA
DA BAHIA
BAHIA
Anotações
Vamos começar falando um pouco do continente outros fatores, uma diversidade de culturas.
africano e de seus dados geográficos, importância Três quartos do continente africano se encontram
geoestratégica e para a História, afinal a humanidade entre os trópicos de Capricórnio e de Câncer, portanto,
veio de lá. nesta região o clima é quente e úmido com pouca varia-
Ele ocupa cerca de 30 milhões de quilômetros qua- ção durante o ano e invernos secos. Dentro desta mesma
drados, uma área de 20,3% da terra firme do globo ter- região, existe uma infinidade de microclimas,ocasionado
restre. Esses números o colocam como o terceiro maior pelo relevo acidentado do interior.
continente em extensão. É o segundo mais populoso, Os desertos do Saara e Calaari, que se encontram no
com 900 milhões de pessoas, perdendo apenas para a limite desta faixa – o primeiro no Trópico de Câncer e o
Ásia. Falando mais de 1000 línguas diferentes, divididas segundo no Trópico de Capricórnio –, são exemplos des-
em pelo menos quatro famílias linguísticas distintas. sa diversidade, pois não apresentam chuvas regulares,
Além dessa diversidade de línguas faladas, na África se os dias são quentes e secos e as noites frias, clima típico
desenvolveram diversas formas de escrita. de áreas desertas tropicais ou em vias de desertificação
Os hieróglifos egípcios, uma das formas mais antigas como a nossa região de caatinga. Além deles, podemos
da humanidade, não são os únicos, outros sistemas “[...] também falar das várias cadeias de montanhas com pi-
como o meroídico, o núbio antigo, o copta, o tifinagh, cos que chegam à mais de 5800 metros de altura, como
o ge’ez e o bamun. Ideogramas estilizados nsidibi, o Quilimanjaro, que destoa completamente da paisagem
inventado pelos ejagham da Nigéria e do Camarões e do entorno, pois apresenta em todas as épocas do ano
muitas outras tipologias de sinais gráficos [...]”, foram neve em seu cume. Além disso, o clima na microrregião
desenvolvidas e utilizadas em diferentes regiões afri- contendo cadeias de montanhas sofre as influências da
canas, além dessas ainda temos diversas línguas que altitude apresentando temperaturas mais amenas.
foram “[...] vertidas para o alfabeto árabe ou adaptações
do mesmo [...]” (SERRANO; WALDMAN, 2007, p. 93-95)
(grifo dos autores).
REGISTRE SUA IDEIA Procure imagens do Quilimanjaro, veja como ele é imponente e como
nossas ideias pré-concebidas do continente africano ficam abaladas
com a imagem de um pico coberto de neve e animais, como elefantes
Porque se diz que a África é marcada pela oralidade, quando podemos e girafas, passado próximo a ele.
enumerar tantas formas escritas?
A quem interessa esconder essa diversidade de escritas desenvolvidas
no continente africano? Nos extremos nor te e sul do continente, existe
a influência do chamado clima mediterrânico com
Geograficamente o continente africano está limitado temperaturas mais amenas que no resto do continente
pelo oceano Atlântico à oeste; ao norte pelo Mediter- e com invernos úmidos. Apesar de serem pequenas
râneo, o que o torna muito próximo da Europa, sendo essas regiões, elas também apresentam em seu interior
separados no estreito de Gibraltar por menos de 15 qui- interrupções por conta de acidentes geográficos como
lômetros na menor distância entre os dois continentes; os Atlas ao norte e a Cadeia do Cabo, ao sul.
a leste pelo oceano Índico e a noroeste se limita com
a Ásia pelo Mar Vermelho, pela península do Sinai e o
Golfo de Aden. Sua vasta extensão territorial permite uma
variedade climática e de ecossistemas, diversidade onde
os homens aprenderam a conviver, proporcionando, entre
Existe uma polêmica geográfica sobre uma porção de terras de não Pesquise em um atlas, ou mesmo na internet, e tente localizar os
mais de 61.000 km2, a península do Sinai, que liga a África à Àsia e continentes, mares e acidentes geográficos que foram citados no
em cuja região foi construído o Canal de Suez. A polêmica é se essa texto e preencha o Mapa Mudo do Continente Africano abaixo, com
porção de terra, que pertence ao Egito, fica na África ou na Ásia. Com legendas.
a construção do canal de Suez em meados do século XIX, adotou- Faça cópias antes, pois você pode utilizá-lo para outras atividades.
se como divisa entre os dois continentes esse marco artificial, porém
para alguns estudiosos a polêmica continua, considerando o golfo de
Aqaba como marco divisor, portanto incluindo a península na África.
Outra curiosidade é que desde os tempos faraônicos foram feitos
canais de comunicação cortando o Saara com as águas do Rio Nilo
e do Mar Vermelho, fazendo a conexão entre o Mediterrâneo e o Mar
Vermelho. Rica em petróleo, gás natural e o mais importante, em
depósitos subterrâneos de água, essa região foi disputada por Israel e
Egito, ocasionando diversos conflitos, mas desde 1979 foi devolvido
para o Egito como parte das negociações conhecidas como Acordos
de Camp David, de 1978.
Fonte: PACHECO, Felippe Jorge Kopanakis. Cartografia do Projeto ABA. CIEAA/Universidade Estadual de Goias. Disponível em: <http://www.pre.ueg.
br/projetospresee/projetoaba/pdfs/anexo% 20de%20mapas.pdf>. Acesso em: 20 out. 2010.
África: continuidades e
descontinuidades
a formação dessa vegetação dependem das condições Depois de Hegel, que apontou a aistoricidade dos
climáticas, ventos, tempestades úmidas ou de areia, povos ao sul do Saara, as ideias apontadas no parágrafo
humidade relativa, temperaturas médias, para ocorrência acima ficaram mais fortes, destacando duas razões para
ou não de vegetação em um determinado ano ou período isso: a primeira porque a História seria própria do Velho
de alguns anos. Mundo, então os povos “descobertos” recentemente
Dentro dessa faixa compreendida como Sahel, o não podiam ter história; a segunda por considerar que
Saara também se limita com a bacia do Rio Niger, o esses povos não tinham autonomia para realizar grandes
terceiro maior em extensão da África e em menor escala feitos, entrando na história pelas mãos dos europeus.
com a bacia do Rio Senegal. Além desses dois rios, o (KI-ZERBO, 1999, p. 10; HERNANDEZ, 2008, p. 19-20)
Nilo também corta o deserto do Saara, mas na direção Durante algum tempo, talvez um século, essas ideias
sul para o norte. de separação e essas nomenclaturas de África Branca e
O Saara é uma importante baliza regional dentro África Negra vigoraram e tiveram grande prestígio entre
do continente africano, pois para fins de estudos, os os estudiosos de forma geral, porém, elas passaram a
pesquisadores costumam agrupar os povos, países e ser questionadas, primeiro pelos estudiosos oriundos da
as culturas existentes no sul do Saara e nominá-las de própria África e depois pelos novos projetos de pesquisas
subsaarianas e as do norte do Saara são denominadas incluindo pesquisadores de várias partes do mundo.
como setentrionais, ou apenas do norte africano. Essas ideias começaram a ruir, pois foram encon-
Alguns pesquisadores, principalmente europeus e tradas continuidades históricas, ligações estreitas entre
norteamericanos, também denominam as regiões e os povos dessas duas regiões – que antigamente se
povos do norte do Saara como África Branca e os do acreditava separadas pelo Saara – desde o surgimento
sul como África Negra, para evidenciar uma separação, do Homo sapiens sapiens no globo, em novas pesquisas
tanto geográficas como culturais, entre esses povos, arqueológicas e linguísticas.
países e culturas. Essa ideia de descontinuidade tem O processo de desertificação da região começou à
início com os estudos clássicos sobre a antiguidade, cerca de 10 mil anos atrás – mais ou menos no mesmo
nos quais o Mediterrâneo era o elo de ligação entre as período da centralização de vários estados africanos con-
civilizações, portanto, tudo que não estava banhado por forme veremos mais à frente.– um tempo relativamente
ele, não merecia atenção. curto, provocando migrações, ocupações, encontros,
desencontros, miscigenações, incompreensões, com-
As ideias de separação da África pelo Saara ganharam
preensões e adaptações populacionais, tecnológicas e
força, impulsionadas por uma série de discussões sobre
culturais.
as razões das diferenças entre os diversos povos, sobre
a cientificidade do conhecimento histórico, sobre a vali- Além disso, apesar da diversidade de povos e cul-
turas existentes no continente africano, subsiste uma
dade das teorias Darwinistas para explicar os fenômenos
complexidade identitária e cultural ligando povos dos
e evolução das sociedades – ideias promovidas desde
dois lados do deserto. Essa continuidade identitária não
o final do século XVIII, mas consolidadas, sobretudo,
foi levada em conta por essas denominações e ideias
no século XIX quando surgem as teorias de Darwin. de África Branca e África Negra, identidades e culturas
Além disso, o florescimento do positivismo e a rápida compartilhadas por vários povos que se desenvolveram
expansão dos institutos de pesquisa e as sociedades de no interior e nas granjas do Saara, especializando-se na
ciências ajudaram a difundir as ideias de superioridade travessia de homens e mercadorias – e sempre carregan-
dos europeus sobre os outros povos. do junto com os artigos de venda das caravanas ideias,
sabedorias, religiosidades, tecnologias, etc. –, fazendo
a ligação entre as regiões.
Outras formas de construir continuidades é agrupar Para quem preferir veja o documentário:
povos, culturas e países no continente utilizando para CHARLES Darwin. A Voz da Evolução. Londres: Produção: BIO. THE
fins de estudos a depender dos objetivos: a) as bases BIOGRAPHY CHANNEL. Distribuição: Log On. 2009. 1 DVD.
linguísticas nativas faladas ou os idiomas europeus
implantados; b) os recursos minerais existentes; c) as A hipótese da origem única, baseada nas ideias de
tradições de produção agrícola; d) as formas religiosas Darwin – e mais aceita atualmente pelas comprovações
dominantes; e) os limites impostos pelos países euro- arqueológicas, paleológicas, da primatologia, antropolo-
peus responsáveis pela colonização de determinadas gia física e os estudos genéticos recentes –, os Homo
regiões. Também podem ser utilizados outros critérios sapiens teriam surgido no continente africano entre
históricos menos precisos, como os limites de deter- 400.000 e 250.000 anos atrás e migrado para várias
minados impérios anteriores à colonização europeia, partes do mundo, partindo de um epicentro que se acre-
ou os povos vassalos deste ou daquele rei, antes da dita ser o sudoeste africano. De lá eles migraram para
colonização. Ásia e depois foram para Europa, Oceania e Américas.
O continente africano abriga enormes recursos na- Até pouco mais de uma década atrás, os estudiosos
turais, o que sempre despertou a cobiça dos vizinhos. das várias ciências que estudam a evolução humana
Em seu interior, existem jazidas de metais preciosos, acreditavam que somente quando os homens se fixaram
pedras preciosas, gás natural, petróleo, tem uma área no continente europeu, por volta de 30.000 à 40.000
ensolarada enorme, ventos constantes, enfim uma anos atrás, tiveram uma repentina evolução, explicada
infinidade de recursos energéticos a serem explorados. por uma mutação genética afetando principalmente o
Além disso, como já foi dito, sua população é a segunda cérebro, provocando uma mudança de hábitos e formas
maior entre os continentes, perdendo apenas para o de comunicação, facilmente perceptíveis nos vestígios
continente asiático. encontrados na França – Caverna de Chauvet datados
Outra forma de continuidade é a própria História dos de 30.000 a.C e Lascaux 17.000 a.C – e Altamira na
homens na Terra, que nos guarda surpresas. Espanha, com vestígios datados entre 19.000 e 14.000
Segundo Charles Darwin, foi na África que apare- a.C. composto de pinturas e objetos de cotidiano. (NO-
ceram os primeiros homens, teoria contestada durante VOS, 2006)
muito tempo pelos cientistas europeus. Porém, com as descobertas, primeiro do sítio ar-
A teoria de Darwin foi comprovada por diversos queológico de Blombos – composta de objetos de uso
achados arqueológicos do final do século XIX e, também, cotidiano, objetos de artes, uso pessoal e decorativos
muitos do século XX. Mas agora, no século XXI, desco- – na África do Sul, e posteriormente nos montes Tso-
bertas importantes – realizadas desde o final do século dilo, em Botsuana – compostos principalmente de arte
XX, mas datadas e publicadas somente no início do rupestre e objetos de uso religioso –, a comunidade
século XXI – têm demonstrado que além da antiguidade científica começou a reformular essa tese. (MORIN,
do surgimento dos homens, também existiu algo muito 2002; HOMEM, 2006)
mais importante no continente africano para as ciências
que estudam a evolução humana.
Abatido por vários séculos de opressão, esse continente O lugar das populações negras na sociedade brasileira
presenciou gerações de viajantes, de traficantes de escravos, é o lugar da exclusão. Essa forma de não ver essa popu-
de exploradores, de missionários, de procônsules, de sábios lação tem consequências bastante danosas para toda a
de todo tipo, que acabaram por fixar sua imagem no cenário
sociedade, já que uma parcela importante das pessoas
da miséria, da barbárie, da irresponsabilidade e do caos [...]
não é atendida ou têm seus talentos aproveitados. A
Esse filme desarticulado e parcelado, que não é senão a
escola brasileira foi sempre um lugar de reprodução
imagem de nossa ignorância, nós o transformamos por uma
deformação deplorável ou viciosa, na imagem real da história
dessas ideias de exclusão das populações não brancas,
da África tal como efetivamente se desenrolou. (KI-ZERBO,
pois foi criada e cresceu tendo como base a civilização
2010, p. XXXII) judaico-cristã.
Os povos, línguas nativas e tecnologias encontradas
Os debates sobre o surgimento do pensamento ló- aqui no momento de ocupação pelos portugueses – pe-
gico e do desenvolvimento da capacidade cerebral dos ríodo conhecido como colonial –, as variadas e diversas
homens é um bom exemplo de como o continente afri- línguas, populações e conhecimentos para cá trazidas do
cano foi desprezado e desprestigiado pela comunidade continente africano, não são lembrados e considerados
científica, durantes vários séculos. pelos sistemas educacionais, que sempre escolhem o
patrimônio civilizatório europeu e norteamericano como
Os vestígios existentes nos montes Tsodilo, estando
privilegiado, tanto nas metodologias/teorias, como nos
a céu aberto, são conhecidos há séculos pelos explo-
pontos de vistas e práticas adotadas.
radores europeus, mas só recentemente começaram a
ser pesquisados com mais afinco, por equipes multidis-
ciplinares e multinacionais e de forma mais sistemática,
revelando várias formas de religiosidade e cultos muito
mais antigas do que se acreditava até a poucos anos Na África, atualmente são conhecidas mais de 1000 línguas africanas
atrás. divididas em quatro grandes famílias e que antes da chegada dos
portugueses no continente africano, no século XV, estima-se que o
número ainda fosse duas vezes maior.
Existe uma memória viva pulsante em nossa socieda- Agora vamos fazer uma pequena introdução da
de brasileira, conforme enfatizam Deoscoredes M. dos história das lutas pela educação formal das populações
Santos (Mestre Didi) e Juana Elbein dos Santos (1997), negras, somente como subsídios para pesquisas mais
ela está enraizada nas multiplas heranças recebidas aprofundadas que poderão ser feitas partindo das refe-
do continente africano e se amplifica nas experiências rências citadas.
dessas populações no Brasil. As populações negras já haviam percebido a im-
A ancestralidade extravasa a comunidade afro- portância da educação formal para a superação de sua
brasileira e expande, modela, compõe e recompõe situação de desigualdade na sociedade brasileira, desde
diversas manifestações culturais brasileiras, mesmo de o século XIX, época em que alguns estudantes negros
grupos que aparentemente não têm nenhuma ligação pioneiros adentraram nas brechas do sistema educa-
e afinidade com esse patrimônio civilizatório. Desta cional e iniciaram uma trajetória exitosa de estudos, ou
forma, as manifestações culturais também portam essa ainda em iniciativas individuais como a do negro Cosme,
influência civilizatória africana, composta ao longo dos do Quilombo da Fazenda Lagoa Amarela no Maranhão,
anos por todos os grupos e povos para cá trazidos e que criou uma escola para as crianças, em 1838. (CRUZ,
também pelas adaptações e reestruturações promovidas 2005, p. 28)
aqui por eles e seus descendentes. Conforme Gonçalves e Silva (2000, p. 136), existia
Apesar de todas essas nuances, não temos em nosso uma proibição formal de escravizados frequentarem os
sistema educacional a valorização dos componentes bancos escolares, até 1879, quando da Reforma enca-
fundamentais de nossas tradições, culturas, formas de beçada por Leôncio de Carvalho, porém antes disso,
agir e pensar vindos do continente africano. Ele continua associações abolicionistas e republicanas mantinham
distante de nossos cursos, parecendo longe de nossa cursos voltados para os escravizados e libertos a fim
história, mas no entanto, estamos intimamente ligados. de cooptá-los para suas causas.
A implementação da Lei n. 10.639/2003 que obriga A preocupação com a educação das populações
o ensino de História e Cultura Africana e Afro-brasileira negras já constava dos projetos políticos de Perdigão
em todos os níveis de ensino, permitiu aos gestores Malheiros, em meados do século XIX, mas esses projetos
repensar possibilidades de utilização de novos temas, não foram concretizados da forma como foram pensados
materiais, metodologias e ações para o atendimento des- e excluíram as populações negras do convívio escolar.
sa obrigatoriedade legal. Também nos instiga a pensar e (FONSECA, 2001).
transformar nossas aulas, adaptando suportes e técnicas
para conseguir alcançar os objetivos da lei em referência.
As discussões para implantação da Lei n. 10.639/2003
não foram isoladas, elas fazem parte de um conjunto de
lutas pela inclusão das populações negras e de temas
Agostinho Marques Perdigão Malheiro (filho),foi um eminente jurista
e assuntos referentes a História e Cultura pertinentes a que defendeu a abolição. Escreveu A escravidão no Brasil: ensaio
essas populações na educação formal brasileira iniciada histórico-jurídico-social, obra que influenciou os debates sobre o
no século XIX, portanto essas reivindicações são bas- processo de libertação dos escravos no Brasil. Suas preocupações
tante antigas e têm uma história. iam além da simples abolição, compreendendo o escravizado que seria
libertado e o já liberto como pessoas que deveriam ser integrados à
sociedade brasileira de forma efetiva.
<http://www.africaeafricanidades.com/documentos/Educacao_Afro-
Indigena.pdf>
Anotações
O que os europeus
conheciam da África?
CAPÍTULO 2
EaD
EaD UNIVERSIDADE
UNIVERSIDADE DO
DO ESTADO
ESTADO DA
DA BAHIA
BAHIA
Anotações
Como vimos na introdução, a história dos primeiros estada entre os reinos e povos africanos, cobrem
homens na terra começou na África e se espalhou por desde o século XVI até o século XX;
todo globo terrestre. Além disso, vimos também que o • Escritos de africanos e afrodescendentes produ-
Continente Africano está ligado ao continente europeu e zidos nas diversas línguas europeias, produzidos
asiático pelo Mar Mediterrâneo, e que é de longa data os principalmente a partir do início do século XX;
contatos, relações comerciais, intercâmbios, trocas de Agora vamos nos deter em alguns desses grupos de
experiências e tecnologias entre esses três continentes. testemunhos para dar uma ideia geral sobre documentos
Então, porque se diz que na época das grandes nave- antigos servindo de fonte para os estudos da História do
gações – século XV e XVI – os europeus descobriram continente africano, pois as mais recentes, do século XVI
a África? em diante, serão exploradas à frente no texto.
Uma das explicações está no pensamento de Hegel,
já referido anteriormente, sobre a aistoricidade dos po-
Documentos entre os séculos VI a.C. e II a.C.
vos africanos. Outra estaria na forma de hierarquização
dos povos e culturas, promovido pelos precursores do O conjunto de escritos anteriores aos romanos é
racismo científico e só contestadas de forma mais vee- muito importante, pois revelam as chamadas civilizações
mente em meados do século XX por novos estudiosos antigas habitantes do continente africano e cuja pujança
preocupados em desfazer as ideias de inferioridade e fez os fenícios – os maiores comerciantes da antiguidade
submissão dos povos colonizados. – empreenderem várias viagens para montar postos de
Esse é um bom debate, mas a principal desculpa trocas e feitorias no litoral dessas regiões.
utilizada para não se incluir a História da África nos Encontramos algumas informações sobre essas
compêndios escritos nos séculos XIX e XX, foi de que viagens em um texto sobre o pioneirismo da navegação
não existiam documentos escritos e uma historiografia portuguêsa no século XV, publicado nas Memorias de
africana que servisse de base para os enciclopedistas. Litteratura Portugueza, de 1814, de autoria de Antonio
Ribeiro do Santos (1814, p. 327-364).
As diversas fontes para a História do Neste histórico das navegações pela costa africana,
continente africano na antiguidade Santos fala do Périplo de Hannon, um rei de Cartago,
que empreendeu sua viagem para fundar novas colônias
Podemos, grosso modo, dizer que existem diversos e conhecer os povos das terras desconhecidas e que
tipos de testemunhos escritos sobre a África e que eles deixou seus relatos depositados no templo de Molosh
eram conhecidos de muito tempo pelos europeus, afinal, (GIORDANI, 1985, p. 18), em Cartago, próximo da atual
os primeiros escritos falando do continente africano são cidade de Tunis, na Tunísia.
mais ou menos da mesma época dos primeiros escritos
Hannon, navegando com uma frota de mais de 60
sobre os continentes europeu e asiático.
embarcações pelo Mediterrâneo, passou pelas Colunas
Vejamos as épocas e características principais dessas de Hercules, hoje Estreito de Gilbratar. (KI-ZERBO, 1999,
fontes: p. 108)
• Escritos entre os séculos VI e II a.C., narram na sua Para alguns estudiosos, essa viagem foi bastante
maioria sobre epopeias e excursões pela África; longa chegando até a Ilha do Príncipe, hoje São Tome
• Escritos romanos consistindo principalmente em e Príncipe, ou até mais longe, conseguindo fazer a cir-
relatórios, relatos de viagens e de conquistas, co- cunavegação de todo o continente até o Golfo Arábico.
brindo desde o século I a.C. até o século IV d.C.; Na versão mais curta os barcos de Hannon teriam saído
• Escritos árabes, principalmente sobre o norte da Cartago, passado nas Colunas de Hércules, por Lixo – ou
África, iniciando no século VIII d.C. e indo até o Lixus – e chegou ao máximo até as atuais ilhas Canárias,
século XVII d.C.; fazendo apenas uma viagem pela costa do atual Marro-
• Escritos de europeus consistindo em relatórios de cos. (JABOUILLE, 1995)
administradores coloniais, relatos e impressões
de viagens, crônicas e ensaios descritivos da
José Bonifácio de Andrada e Silva, famoso por ser amigo de O termo África para designar todo continente só foi adotado após
Dom Pedro I e por sua atuação na independência do Brasil, consolidadas as conquistas romanas no século I d.C.. Na antiguidade
era um estudioso de geografia histórica e traduziu uma das eram utilizados vários termos para designar cada uma das partes
versões do Périplo de Hannon, que foi publicada na coleção conhecidas, tais como Lybia, Cirenaica, Tripolitânia, Aethiopia, Núbia,
coordenada em: SOUSA, Alberto (coord.). Os Andradas. Azánia, entre outros.
São Paulo: Typographia Piratininga, 1922.
Detivemo-nos em pormenorizar as fontes antigas, não ter sido explorada em todas as suas dimensões: o Kitab
porque elas são até hoje mencionadas nos livros sobre Wulat Misr wa Qudhatuha, de Kindi [...] (DJAIT, 2010, p. 95)
a História da África, mas estas, quase sempre não são (grifos do autor)
detalhadas.
Uma das explicações para sua farta menção seria a
sua fácil leitura, são todas escritas em línguas europeias
ou já foram publicadas, em sua versão total ou em
excertos, dentro de outras obras de autores em línguas Ta’rikh ou tarikh é uma palavra árabe para se referir tanto
europeias. às memórias ou diários pessoais escritos por viajantes
ou administradores, como compêndios de informações
No próximo item será apresentada uma pequena
sobre um determinado local.
amostragem de textos um pouco mais difíceis de
encontrarmos e de lermos, já que se encontram na sua
grande maioria em árabe. Outros autores também são indicados para o período
entre os séculos IX e XI d.C., como Cadi al-Nu’Man, al-
Documentos escritos em árabe
-Raqiq, Ibn al-Idhari, além dos geógrafos Surat al-Ardh,
Ibn Khordadhbeh, Ya’kub, al-Mas’udi, Ibn Hawkal e al-
A documentação escrita em árabe tem duas carac- -Biruni. (DJAIT, 2010, p. 97)
terísticas muito importantes e diferenciadas. O primeiro Para um período posterior, entre os séculos XII e XV,
grupo é representado pelos escritos de estudiosos são mencionadas as seguintes obras, por Djait (2010):
muçulmanos, africanos, árabes ou mesmo da península
Ibérica, que reportam suas viagens a Geografia ou a [...] o Kamil, de Ibn al-Athir, até o Kitab al-Ibar, de Ibn
História da ocupação e expansão do islamismo partindo Khalduri, passando por Ibn al-Idhari, al-Nuwairi, Ibn Abi
da península Árabe, passando pelo Norte do continente Zar’, al-Dhahabi. Testemunhas de seu tempo, esses homens
africano e chegando até a península Ibérica e sul da realizaram também um esforço de síntese dos acontecimentos
dos séculos anteriores. Nuwairi é tão importante para os
França. Também fazem parte desse primeiro grupo os
Mamelucos como para a conquista do Magreb [...] (DJAIT,
documentos produzidos pelas diversas administrações
2010, p. 100) (grifos no original).
e governos muçulmanos nessas regiões ocupadas.
No segundo grupo, encontramos escritos produzidos
Sobre o segundo grupo de fontes escritas em árabe,
por sábios e/ou estudiosos africanos que aprenderam a
temos poucas informações. São mencionadas em diver-
escrita árabe – ou pela conversão ou por qualquer outra
sos livros a sua existência, porém, em nenhuma delas
razão – e fizeram anotações das tradições antes trans-
é possível encontrar referências que não foram escritas
mitidas oralmente, produzindos compêndios históricos
antes do século XIX.
dos reinos e impérios africanos anteriores à expansão
islâmica e os contatos entre os povos tradicionais e os
grupos islamizados. Algumas línguas africanas, com os
contatos com islã, foram grafadas utilizando o alfabeto
Para uma melhor compreensão da importância dessas fontes, ver o
árabe, produzindo outras linguagens, que também fazem
capítulo:
parte deste grupo de fontes.
Djait (2010) menciona, fazendo parte das fontes DJAIT, H.. As fontes escritas anteriores ao século XV. In: KI-ZERBO,
escritas em árabe por funcionários da administração Joseph. História Geral da África I: Metodologia e Pré-História da
África. 2. ed. rev. Brasília: UNESCO, 2010. p. 77-104.
ou sábios islâmicos, que são importantes reservas de
informações :
Anote as palavras que não conhece em uma folha conforme vai lendo
o texto, sem a preocupação de procurar no primeiro momento, pois
muitas vezes o próprio texto elucida seu significado. Se foi resolvido
com o texto anote a palavra e seu significado, se não foi, procure em
dicionários, na internet, ou outros livros.
SUGESTÃO DE ATIVIDADES 2
Retome o texto e tente fazer um quadro síntese das fontes e períodos
da História da África.
Anotações
As grandes
civilizações
Africanas na
Antiguidade
CAPÍTULO 3
EaD
EaD UNIVERSIDADE
UNIVERSIDADE DO
DO ESTADO
ESTADO DA
DA BAHIA
BAHIA
Anotações
Agora que conhecemos um pouco mais a respeito de falsa identificação depreciou a história dos povos africa-
dos registros e informações existentes que podem servir nos no espírito de muitos, rebaixando-a a uma etno-história,
para escrever a História africana, falaremos um pouco em cuja apreciação das realidades históricas e culturais não
podia ser senão falseada. (M’BOW, 2010, p. XXII)
dos antigos povos, reinos e impérios da África iluminados
por essas diversas fontes, pois apesar de nossa ementa
indicar que devemos estudar a História africana a partir Além disso tudo, as chamadas civilizações antigas
das grandes navegações, não podemos cometer o africanas são o berço de muitas das tecnologias, base
mesmo erro dos estudos que somente dão importância do pensamento e filosofias, das formas de religiosida-
a História do continente africano quando inicia o período de, organização política, padrões comportamentais e
de feitorias e primeiras experiências de colonização mo- alimentares, musicalidades, formas de comunicação e
derna dos europeus na África, no século XV d.C. outras coisas, influentes ainda hoje em várias partes do
Na introdução da sua História Geral da África, Mahtar globo e não só na África. Portanto, vamos estudar um
M’Bow (2010), pesquisador renomado da geografia e pouco desses antigos povos antigos.
história africana, diretor geral da UNESCO durante as
décadas de 1970 e 1980, assim comenta esse esqueci- De que cor eram os egípcios?
mento da História da África como disciplina importante:
O Egito das pirâmides e dos faraós talvez seja a mais
[...] o continente africano quase nunca era considerado como forte lembrança da África que temos na memória, mas
uma entidade histórica. Em contrário, enfatizava-se tudo o não a identificamos como africana, porque será?
que pudesse reforçar a ideia de uma cisão que teria existido, Em primeiro lugar o Egito, por seu rápido e pujante
desde sempre, entre uma “África branca” e uma “África ne-
desenvolvimento tecnológico, político, religioso e social
gra” que se ignoravam reciprocamente. Apresentava-se fre-
marcou toda a região do Mediterrâneo e com isso pro-
quentemente o Saara como um espaço impenetrável que tor-
vocou a cobiça de outros povos. Portanto, com certeza,
naria impossíveis misturas entre etnias e povos, bem como
trocas de bens, crenças, hábitos e ideias entre as sociedades
em toda a história da humanidade, o território egípcio
constituídas de um lado e de outro do deserto. Traçavam-
foi o mais invadido e ocupado por outros povos. Essa
se fronteiras intransponíveis entre as civilizações do antigo sua exuberância e as invasões e ocupações, também
Egito e da Núbia e aquelas dos povos subsaarianos. (M’BOW, provocaram diversas migrações voluntárias e forçadas
2010, p. XXII) de outros povos para seu território.
Por um lado, isso foi benéfico para toda a huma-
Essa visão limitada, criticada por M’Bow, tem como nidade, pois os contatos, mesmo os acontecidos nas
base a ideia de aistoricidade dos povos fora dos domí- guerras e ocupações, levaram a uma troca de tecnologias
nios europeus, já referida anteriormente. Mas também e elementos de cultura, religiosos, padrões culturais e
o professor senegalês aponta outros motivos: alimentares, enfim, estabeleceram modos de vida bas-
tante similares em regiões totalmente diversas.
[...] outro fenômeno que grandes danos causou ao estudo Por outro lado, elas provocaram a descaracterização
objetivo do passado africano foi o aparecimento, com o tráfi- de elementos típicos dos egípcios, como por exemplo, o
co negreiro e a colonização, de estereótipos raciais criadores modo de se pronunciar as palavras em sua própria língua,
de desprezo e incompreensão, tão profundamente consoli- que foi esquecido devido as diversas ocupações e que
dados que corromperam inclusive os próprios conceitos da somente aparecem hoje em cultos religiosos.
historiografia. Desde que foram empregadas as noções de
“brancos” e “negros”, para nomear genericamente os colo-
nizadores, considerados superiores, e os colonizados, os
africanos foram levados a lutar contra uma dupla servidão,
econômica e psicológica. Marcado pela pigmentação de
sua pele, transformado em uma mercadoria entre outras, e
destinado ao trabalho forçado, o africano veio a simbolizar,
na consciência de seus dominadores, uma essência racial
imaginária e ilusoriamente inferior: a de negro. Este processo
BALTHAZAR, Gregori da Silva. Plutarco e a Ocidentalização de Cleópatra. produtividade permitindo uma organização da sociedade
In: NEARCO: Revista Eletrônica de Antiguidade. Rio de Janeiro: UERJ/ de tal forma que pessoas podiam se dedicar integral-
NEA, v. 4, n. 6, 2010. mente à religiosidade, à proteção e administração do
estado. Essa separação, portanto, criava segmentações
Sobre a cor dos egípcios ver:
DIOP, Cheikh Anta .Origem dos antigos egípcios. In: MOKHTAR. Gamal. no interior da sociedade com hierarquia rígida e também
História Geral da África II: África Antiga. 2. ed. rev. Brasília: UNESCO, a criação de formas de garantir o sustendo dessas pes-
2010. p. 1-35. soas, os tributos.
Na base da sociedade estavam os escravos, em
Existe também um autor inglês chamado Martin Bernal, que causou
um verdadeiro furor quando do lançamento da obra Atenas Negra, não quase todo o período faraônico composto por estran-
traduzida para o português, quando afirmou com base em exaustivas geiros – responsáveis pelo trabalho nas grandes obras
pesquisas, que a cultura grego-romana tem suas bases nas culturas –, depois, vinham os camponeses livres – a quem cabia
fenícia e egípcia, e que esta é uma cultura africana e negra. Sustentando produzir para todos e também eventualmente trabalhar
a retomada da visão denominada de modelo antigo, que vigorou até o
nas grandes obras –, a seguir, os artesãos citadinos
século XVIII e foi substituída pela ideia que a civilização grego-romana
é baseada na chamada cultura indoeuropéia, denominada modelo e no topo da pirâmide social estavam os militares, os
ariano, parte autóctone do continente europeu e parte trazida por sacerdotes, os nobres que compunham a burocracia do
migrações da Ásia e Oriente Próximo. estado. Acima de todos, acumulando a chefia dos exér-
citos, dos sacerdotes, do judiciário, e da administração
civil, estava o faraó.
A estrutura de poder e social permaneceu a mesma
durante todo o período faraônico – mesmo com os
períodos de ocupação sudanesa, persa e assíria –, que
É possível ver a discussão sobre a cor dos egípcios de uma forma
bastante lúdica. vai desde a unificação até aproximadamente o século I
Existem dois filmes que trabalham com faraós em tempos diversos. a.C., quando as forças romanas se instalaram no Egito
São indicados para crianças, mas podem ser utilizados também por e iniciaram uma série de modificações, a começar pela
adultos. estrutura religiosa, reformularam o sistema jurídico e
A RAINHA sol: A esposa amada de Tutankhamon. Título Original: La
a administração introduzindo tradições romanas, mas
reine soleil. Philippe Leclerc. Produção: Olivier Zuratas. França/Bélgica/
Hungria: RENZO FILMS; Distribuição: FOCUS: 2007. 1 DVD. também adaptaram formas egípcias para aproximarem o
ASTERIX e Obelix: Missão Cleopatra. Título Original: Astérix & Obélix: estado dos novos súditos romanos. (DONADONI, 2010)
Mission Cléopâtre. Direção: Alain Chabat. Produção Executiva: Pierre No Egito também existia uma forte organização
Grunstein. Fança: Katharina/Ren Productions/ TF1 Films Produticon/
religiosa que incluía o faraó como principal líder. Em
Chez Wam; Distribuição: Pathe Distribuition: 2002. 1 DVD.
Veja os filmes e anote os principais personagens e como eles são algumas oportunidades os egípcios experimentaram
retratados, tanto do ponto de vista físico como psicológico, nos filmes. o monoteísmo. Alguns pesquisadores da história
Preste, também, atenção nas questões de gênero e poder apontadas das religiões identificam nestas oportunidades e no
nos filmes. Zoroastrismo, os fundamentos de todas as religiões
monoteístas surgidas na antiguidade clássica, já que
O reinado de Cleópatra representa também a proemi- foram anteriores, por exemplo, ao judaísmo base das três
nência das mulheres nas sociedades africanas de uma maiores religiões monoteístas da atualidade: o próprio
forma geral. Além dela, existem muitas outras mulheres judaísmo, o cristianismo e o islamismo.
com participação destacada na história egípcia. Também Toda ocupação – ainda mais as pacíficas – implica
em alguns dos templos mais importantes, as mulheres em adaptações, transformações e adições, porém, com
eram centrais, como as Divinas Esposas, as Divinas a ocupação militar romana, o Antigo Egito se transformou
Adoradoras de Tebas, além das mulheres que funciona- de tal maneira que não mais conseguiu retomar sua vida
vam como oráculos, portanto conselheiras dos faraós. autônoma, pois após os romanos se sucederam outros
Graças a grande fertilidade das terras do vale do Nilo povos na ocupação, como bizantinos, muçulmanos,
e as tecnologias desenvolvidas para a utilização das europeus e recentemente israelenses.
águas, como canais de irrigação e drenagens, manejo
e preparação de fertilizantes, a agricultura alcançava alta
Kush e Axum banhadas pelo Nilo eram frequentes, pois alguns faraós
e parte da nobreza egípcia entre 2.000 a.C. e 1.500 a.C.
Os reinos de Kush e Axum se desenvolveram no eram oriundos desta região.
noroeste africano e tiveram uma grande proeminência
na história, pois influenciaram diversos outros povos,
com suas culturas.
Segundo importantes descobertas arqueológicas,
essa região compete com o sudoeste africano pelo título As proximidades tanto de fronteiras como culturais eram enormes
de berço do Homo sapiens sapiens e disputa com o Egito entre os egípcios e os kushíticas – também podem ser chamados de
a primazia da organização de sociedades complexas por cuxitas ou cuchitas, dependendo da tradição evocada – levando várias
volta de 6.000 a.C., ou seja elas foram organizadas na vezes a invasões de parte a parte, em diversos episódios. Os melhor
documentados foram a submissão de Kush pelo faraó Tutmés I, por
mesma época. volta de 1.500 a.C., e a tomada de poder do Egito por uma dinastia
kushítica, a chamada XXV ou dinastia etíope, por volta de 700 a.C..
Kush
Além dessas existem também outras incursões e invasões. Ver:
Conforme a tradição bíblica, Kush – ou Cuxe, ou
Cuche, ou Cus, a depender da tradição utilizada – foi SHERIF. Nagm-El-Din Mohamed. A Núbia antes de Napata (3100 a 750
povoada primeiramente por Cuche, um dos filhos Can antes da Era Cristã). In: MOKHTAR. Gamal. História Geral da África II:
que por sua vez era filho de Noé, chegando à região após África Antiga. 2. ed. rev. Brasília: UNESCO, 2010, p. 235-272.
o salvamente do dilúvio.
Se existe uma polêmica quanto a cor dos antigos Leclant (2010) fala de um período pouco anterior
egípcios, o mesmo não acontece com Kush e Axum, a dominação da dinastia etíope no Egito: “Na primeira
ambas surgidas na região denominada de Núbia, uma metade do II milênio, a chamada cultura de Kerma cor-
denominação usual na antiguidade para designar a por- respondia ao rico e próspero reino de Kush, mencionado
ção de terras ao Sul do Egito e irrigadas pelo Nilo. Alguns nos textos egípcios” (LECLANT, 2010, p. 273). O período
pesquisadores apresentam esse território com uma também é marcado por imponentes construções e um
extensão maior ou menor, mas sempre sob a influência florescimento das artes de forma geral.
tanto climática como cultural do Nilo. A prosperidade, talvez ocasionada pela exploração
As primeiras organizações sociais centralizadas na do comércio das diversas mercadorias importantes para
região foram contemporâneas do Alto Egito e do Baixo todo o Norte da África e oriente, como ouro, incenso,
Egito e os achados arqueológicos confirmam as intensas óleos e outras especiarias, fez de Kush uma potência e
trocas comerciais e culturais entre essas regiões, porém, a levou a se arriscar nas conquistas bélicas do território
destacando uma identidade própria nas manifestações de seu vizinho ilustre do Norte, fundando a XXV dinastia
artísticas encontradas em Kush desde esse período no trono egípcio, por volta de 710 a.C.. Essa dinastia
inicial, além de também oferecer pistas de um pujante reinou no trono do Egito por cerca de um século.
comércio com outras regiões africanas e asiáticas das Neste período também foram realizadas muitas
quais era vizinha privilegiada. viagens patrocinadas pelos faraós núbios para desbra-
Com a construção de vários fortes para proteção vamento e conhecimento de outras terras.
do Sul do território egípcio – obra da primeira dinastia
unificada por volta de 3.200 a.C. – as relações entre as Vestígios arqueológicos deste período, encontrados no Mé-
regiões se ressente um pouco, porém, as trocas comer- xico, apontam para o contato com viajantes núbios. Uma das
ciais continuam, pois os egípcios necessitavam de vários maiores expressões dessa proximidade são as esculturas
produtos locais, como os minerais, sobretudo o ouro. olmecas representando africanos. Em algumas, é possível
distinguir ornamentos iguais aos utilizados na Núbia. (LOPES;
Outros produtos locais interessavam ao Egito, vinham
ARNAUT, 2005, p. 22-23)
“[...] de Wawat: incenso, marfim, óleos, ébano, peles
de leopardo, penas de avestruz” (M’BOKOLO, 2009, p. Pesquisadores especializados na História e Cultura
78). Também as trocas políticas entre as duas regiões egípcia consideram que após a retirada do poder faraô-
nico, os kushíticas sofreram um retrocesso se afastando faziam todo tipo de móveis e utensílios de madeiras;
cada vez mais da cultura do delta do Nilo, porém, no en- existiam até mesmo fabricantes de instrumentos musi-
tendimento de Sherif (2010), Kush continua assegurando cais. (HAKEN, 2010)
as especificidades africanas próprias de sua cultura, mas Além da irrigação por canais, também eram utilizados
também recebendo influências externas: outros métodos de irrigação desenvolvidos localmente
que se espalharam por toda a região, o kole e saqia,
Na realidade, trata-se de uma cultura africana que ora se o primeiro era acionado pelo homem, enquanto que
firma em sua especificidade ora procura alinhar-se à civili- o segundo por animais, principalmente búfalos, eram
zação egípcia – ela mesma, aliás, africana. De tempos em mecanismos utilizados para elevar a água e ajudar na
tempos, chegam ecos do Mediterrâneo, particularmente após irrigação de terrenos mais altos.
a fundação de Alexandria. (SHERIF, 2010, p. 278)
O desenvolvimento dessa tecnologia gerou facilidades
para o cultivo de novas áreas fazendo aumentar a pro-
Para proteger a nobreza das investidas estrangeiras, dutividade da agricultura. Elikia M’Bokolo (2009) ainda
foi decidido mudar a capital de Kush de Napata para destaca a produção de algodão como muito importante
Méroe, provavelmente no século IV a.C.. A região da matéria prima para o artesanato local. (M’BOKOLO,
nova capital tinha clima mais agradável, áreas propícias 2009, p. 85-86)
à agricultura irrigada e mais centralizada para favorecer
o comércio, tornando “[...] Meroé um intermediário nos
negócios internacionais da Antiguidade” (M’BOKOLO,
2009, p. 85).
O Império de Kush constituiu um entreposto ideal para as ro- Para ter uma ideia de funcionamento de elevação de água utilizando o
kole, chamado no Egito de shaduf, ver o sítio da Expedição Científica de
tas de caravanas entre o mar Vermelho, o Alto Nilo e a savana
Napoleão, Napoleon and the scientif expedition to Egypt:
Nilo-chadiana [...] O comércio exterior dirigia-se principal-
<http://www.lindahall.org/events_exhib/exhibit/exhibits/napoleon/
mente para o Egito e o mundo mediterrânico – mais tarde, conte.shtml>.
talvez, para a Arábia do Sul. A rota comercial mais impor-
tante passava ao longo do Nilo, embora em algumas partes Para ter uma ideia de como funcionava o saqia ver o sítio do Projeto de
atravessasse a savana (entre Méroe e Napata, e entre Napata arqueologia grego-norueguês que tem como finalidade explorar os sítios
e a Baixa Núbia, por exemplo). A “ilha de Méroe” [...] era do antigo Sudão, Medieval SAI Project: <http://medievalsaiproject.
também o ponto de partida para as caravanas que se dirigiam wordpress.com /2011/02/05/saqia-in-old-nubian/>.
à região do mar Vermelho, da Etiópia do norte, do Kordofan e
do Darfur. (HAKEM, 2010, p. 324) Méroe também foi um local importante no desenvol-
vimento de tecnologias revolucionando a arte de fundi-
O reino neste período se estendia: “[...] ao longo do ção, proporcionando a fabricação desde instrumentos
Nilo (bacias de Napata, Dongola e Kerma), [...] incluía o de trabalho até finas peças religiosas, de decoração e
Sudão central e se estendia pelo menos até Sennar, no ornamentação pessoal. Vestígios arqueológicos indicam
Nilo Azul, e Kosti, no Nilo Branco [...] Na direção oeste, que “[...] Méroe passara a uma fase quase industrial de
sua influência deve ter alcançado pelo menos o Kordofan produção.” (KI-ZERBO, 1999, p. 114)
[...]” (SHERIF, 2010, p. 279). A fama de seu povo aguerrido e seu exército bem or-
A produção de gêneros alimentícios era variada e ganizado circulava pelo Mediterrâneo, sendo encontradas
ocupava boa parte da população, apesar da pequena diversas informações de solicitações de proteção contra
faixa agricultável, utilizando as técnicas de irrigação os exércitos egípcios feitas pelos hititas e de Jerusalém
era possível ter uma boa produção de “[...] trigo, cen- que estava na eminência de um ataque dos assírios, no
teio e sobretudo sorgo completados pelas uvas assim mesmo período.
como pelas lentilhas, abóboras, melões e pepinos [...]” Quando Heródoto escreveu suas Histórias (HERÓ-
(M’BOKOLO, 2009, p. 85). Também existia diversos e DOTO, 2006), entre 450 e 430 a.C., Kush já estava
habilidosos artesãos. Nas escavações de cidades e novamente independente e contava com uma estrutura
túmulos foi possível encontrar peças de cerâmica; joias de poder organizada e autônoma, uma pujante rede de
de ouro, prata e pedras semipreciosas; marceneiros comércio, cidades organizadas e uma florescente arte
decorativa. Mas o que mais espantava os visitantes de sociedade se organizava nos mesmos moldes egípcios.
Méroe é que seus governantes eram escolhidos através “[...] o rei era considerado divino. As rainhas desempe-
de uma espécie de eleição entre um grupo de famílias nhavam papel importante na vida do país e, por vezes,
consideradas da nobreza e seus candidatos eram espe- governavam. Os sacerdotes exerciam considerável
cialmente preparados para governar, recebendo desde influência, e os templos contavam ricas propriedades”
muito jovens uma educação diferenciada realizada por (RIAD; DEVISSE, 2010, p. 187).
tutores e supervisionada pelo próprio monarca. Segundo Hakem (2010)
M’Bokolo (2009) observa que existia uma forte li- O importante papel da rainha-mãe nas cerimônias de eleição e
gação entre a integridade do reino e a integridade física coroação de seu filho é mencionado por Taharqa e Anlamani,
do governante, portanto a beleza física e as qualidades de modo a não deixar dúvidas acerca de sua influência decisiva
morais do governante eram além de valorizadas, muito e de seu status específico. Muito importante também era a
necessárias para a prosperidade do reino. Eram reali- sua participação em um complicado sistema de adoção, pelo
zadas “[...] cerimônias rituais reatualizando a coroação qual a rainha-mãe, designada pelo título Senhora de Kush,
do rei e destinadas a rejuvenescer o rei e o seu reino.” adotava a esposa do filho. (HAKEM, 2010, p. 303-304)
(M’BOKOLO, 2009, p. 83)
Quando os nobres meroítas governavam Kush, eles No final do primeiro século, a era cristã Kush
rechaçaram várias tentativas de invasão do território não tinha mais a proeminência de outrora, como no
de seu império pelos persas. Os exércitos kushíticas império romano. Suas fronteiras foram ocupadas
eram bastante eficientes e eles contavam também com por pequenos grupamentos de povos vizinhos, isso
a proteção natural do relevo do deserto. Apesar dos provocou a deterioração primeiro da agricultura e depois
reveses sofridos da arrecadação de impostos. Os Egípcios, principais
[...] os persas consideravam os habitantes de Kush como
compradores de seus produtos, também passavam por
seus súditos. No pedestal da magnífica estátua de Dario
mudanças, provocadas pela ocupação romana. Isso tudo
descoberta em Susa, decorado com os povos do império, levou ao declínio de Kush e ascensão de Axum.
foi-lhes reservado um escudo [...] Pode-se supor que uma
estreita faixa do território núbio tenha permanecido sob seu
controle e que houvesse contingentes cuxitas nos exércitos
de Dario e Xerxes [...] (SHERIF, 2010, p. 282)
A região de Kush foi uma das primeiras do continente africano a
se cristianizar. Existem vestígios arqueológicos que indicam uma
Não se tem muitos documentos sobre a vida cotidiana crescente cristianização desde o século I d.C, mas com forte presença
de Méroe, mas pelas informações que nos chegaram, no século III d.C..
podemos dizer que a sociedade se organizava mais ou
menos da mesma forma que no Egito. A escrita era Para aprofundamento ver:
MICHALOWSKI, K.. A cristianização da Núbia. In: MOKHTAR. Gamal.
parecida com a dos vizinhos do Norte, sendo utilizados
História Geral da África II: África Antiga. 2. ed. rev. Brasília: UNESCO,
os mesmos hieróglifos, porém, ao que parece, eles de- 2010, p. 333-349.
vem ser lidos em outro sentido. A religião também era
muito próxima dos egípcios, porém alguns deuses eram
exclusivos kushíticas.
Axum
As artes também tinham um caráter próprio e peculiar
e seu apogeu se encontra no período próximo ao século A região de Axum – ou Aksum –, segundo os achados
I d.C., conforme atestam as diversas e suntuosas cons- arqueológicos, também é muito antiga, talvez da mesma
truções datadas deste período. Também é desta época a época que o Egito e Kush. Sua área abrangia o que atu-
reconstrução de Napata destruída pelos romanos. almente corresponde à Etiópia e parte do território atual
Também em Méroe reinaram as mulheres. Atribui-se da Erritréia. Segundo M’Bokolo (2009),
a Amanirenas a liderança do exército e a assinatura de Axum é, sem a mínima dúvida, o primeiro Estado africano a
paz com os romanos no primeiro século da era cristã. respeito do qual possuímos fontes muito variadas e comple-
Elas ocupavam papel de destaque nos governos e a mentares, mesmo se a sua interpretação não deixa de susci-
tar intermináveis interrogações e discussões. É, além disso, formar a população peculiar da Etiópia e de todo o Chifre
notável que as mais ricas destas fontes sejam de origem in- da África – também chamado de península Somáli e/ou
terna. (M’BOKOLO, 2009, p. 86) Corno da África, por se assemelhar a um chifre de rino-
ceronte –, é a designação geográfica para o Noroeste do
Entre o conjunto de documentos nos respaldando continente onde ficam localizados hoje, além da Etiópia,
para o estudo de Axum podemos dizer que são signi- a Eritréia, a Somália e o Djiboti. (ZI-ZERBO, 1999).
ficativas fontes de informações: os escritos egípcios, Nos textos gregos de três séculos a.C., já apareciam
relatos de sábios da antiguidade, as variadas e pontuais informações sobre os soberanos axumitas e o comércio
informações das diversas tradições bíblicas, os escritos de seus principais portos com as regiões mediterrâneas
romanos, também algumas fontes árabes e o conjunto e também com o oriente, além disso, nos escritos dos
mais importante são as fontes produzidas pela própria romanos do século I a.C. ao século III d.C., Axum já
sociedade local, algumas escritas em Grego e outras na aparece como importante império comercial.
língua própria dos axumitas, o Gueze ou Geês.
Outra peculiaridade é a longevidade da autonomia e
independência de Axum, permanecendo desde o século
I a.C. – alguns autores como Cheikh Anta Diop (2010)
Segundo alguns arqueólogos, entre eles Tufnell (1959), desde o século
destacam essa independência desde o século X a.C. –
III a.C. existem evidências de objetos não circulares cunhados pelos
até nossos dias com administração política, militar e soberanos da região que podem ter sido utilizados como moedas.
jurídica autônomos de sua região realizada por nativos
sem interferências mais sérias. Ver:
CONTENSON, H. De.. A cultura pré-axumita. In: MOKHTAR. Gamal.
História Geral da África II: África Antiga. 2. ed. rev. Brasília: UNESCO,
2010, p. 351-374.
Anotações
CAPÍTULO 4
EaD
EaD UNIVERSIDADE
UNIVERSIDADE DO
DO ESTADO
ESTADO DA
DA BAHIA
BAHIA
Anotações
Concluimos o item anterior falando da tradição de De acordo com os ensinamentos islâmicos, Deus
serem os etíopes os primeiros convertidos ao islamismo sempre quis que suas mensagens fossem espalhadas
no continente africano, porém, foi na África ao Norte por toda a humanidade, mas os hebreus se desviaram
do Saara que essa religião teve sua maior influência e desse princípio, por diversos motivos e se proclamaram
expansão, mas ela também teve uma grande importância único povo escolhido.
ao Sul do Saara, principalmente na região do Sahel onde Deus, então, enviou Jesus para restaurar a universa-
surgiram grandes reinos e impérios. Vamos agora fazer lidade do monoteísmo e acrescentar novos paradigmas
uma pequena introdução do islamismo e sua expansão à fé, porém os cristãos empolgados com os novos en-
no Norte da África e Península Ibérica. sinamentos do profeta Jesus proclamaram-no filho de
Conforme a tradição do Islã, Maomé – cujo nome era Deus, desviando-se dos princípios do monoteísmo de
Abulqasim Muhammad ibn Abdala ibn Abd al-Mutalib ibn um só Deus, indivisível. Muhammad, por sua vez, veio
Hashim – foi o último dos profetas, portanto, ele não é para reestabelecer o monoteísmo universalista, utilizando
o fundador do islamismo e sim o continuador de uma todos os meios para isso.
tradição monoteísta antiga muito anterior ao nascimento Filho de uma família tradicional de Meca, o profeta
do profeta. Atualmente, os pesquisadores preferem ao ficou órfão muito cedo e foi criado primeiro pelo avô e
se referir ao profeta escrever Muhammad ao invés de depois pelo tio. Sua família tinha destaque, pois era en-
Maomé, por uma questão de respeito a forma como a carregada de fornecer aos peregrinos, que vinham visitar
maioria dos fieis se refere à ele. a Pedra Negra do santuário de Caaba, a água do poço
sagrado de Zamzam. Além disso, a tradição destaca que
eles eram descendentes diretos de Abraão.
Cedo, ele teve contato com os ensinamentos do
Existem peculiaridades na transliteração de palavras em árabe para as monoteísmo, porém, como boa parte dos habitantes
línguas europeias que permitem a grafia de diversas formas diferentes de Meca, se dedicou ao comércio e somente perto dos
para o mesmo nome ou palavra. Para aquelas que designam nomes de quarenta anos, quando meditava em uma caverna do
objetos, acidentes geográficos ou pessoas de uma forma mais geral
Monte Hira, recebeu as primeiras revelações do anjo
não existe nenhum problema mais sério, porém, quando se designa
coisas ligadas à religião as formas podem causar desconfortos e até Gabriel, conforme a tradição islãmica. Os ensinamentos
ofensas graves. recebidos só foram reunidos em um único livro após a
Desde as cruzadas existem diversas formas em línguas europeias de morte do profeta, nominado Alcorão.
escrever o nome do profeta e referir-se a ele, mas muitas delas são
corruptelas bastante ofensivas, já que Muhammad representava o
inimigo contra o qual se estava lutando.
nando a troca de várias mercadorias entre os impérios do Em contrapartida, os soberanos tinham que garantir
Norte e Noroeste do continente africano, para o comércio a infraestrutura necessária, tais como: mercados nas
mediterrâneo e também para os mercados do oriente. grandes cidades, segurança nas estradas, além de ga-
Com a expansão islâmica no norte do continente rantias extras, como por exemplo, permitir que grupos
africano e sul da Península Ibérica, o comércio cresce específicos de comerciantes pudessem cultuar seus
ainda mais nas rotas transsaarianas, principalmente pela próprios deuses ou erigir locais de culto.
inclusão de novos produtos vindos do norte e a sede As atividades comerciais pouco ou nada melhoravam
cada vez maior pelo ouro e escravos vindo do sul. a vida cotidiana das populações em geral, porém, os
Segundo M’Bokolo (2009) podemos dividir os pro- detentores do poder eram beneficiados tanto com seus
dutos circulantes nestas rotas naqueles destinados ao lucros como também com a utilização de bens que os
comércio exterior e os destinados ao comércio interre- distinguia do restante da população, pois principalmente
gional. o comércio internacional era constituído de mercadorias
O ‘comércio exterior’ é aquele que, sucedendo às antigas
de luxo.
‘rotas dos carros’, ligava os países sudaneses aos da ba- Criticando os estudos que veem no comércio transa-
cia mediterrânica, Magreb, Tripolitânia e Cirenaica, Egito. As ariano o motivo principal da formação e fortalecimento
grandes cidades mediterrânicas como Túnis, Cairo, Fez e de muitos dos reinos e impérios surgidos no interior do
Tlemcen, constituíam o terminus norte das pistas comerciais continente africano, M’Bokolo (2009) afirma que:
que, para o sul, levavam às cidades sudanesas – Awdaghost, A economia de trocas encontrou, nos países sudaneses,
Walata, Tombuctu, Gao, Tadmekka, Agadés – onde os comer- relações estreitas, que não eram de causalidade simples e
ciantes importadores redistribuíam os produtos nas redes do unilateral, mas de caráter dialético, com o fenômeno estatal
‘comércio inter-regional’. (M’BOKOLO, 2009, p. 129) (grifos e com processos muito amplos de mudança social. A in-
do autor). trodução relativamente precoce do Islã também moldou mais
ou menos profundamente as sociedades e os sistemas políti-
Os produtos vindos do norte incluídos neste comér- cos oeste-africanos. (M’BOKOLO, 2009, p. 132)
cio de exportação eram: cauris – conchas coloridas
utilizadas como moeda em algumas regiões; trigo, Porém, é inegável que o comércio também foi um dos
frutos, passas e tâmara – esta última considerada a fatores relevantes propiciadores da criação e desenvol-
fruta dos príncipes –; cavalos, muito procurados para vimento de importantes cidades e até reinos. Vejamos
formar cavalarias dos exércitos reais; tecidos, sedas, então alguns desses estados influenciados tanto pelo
brocados – sedas ou outros tecidos finos bordados grande comércio, como pelo islamismo na região do
em ouro e prata –, barretes dourados, lã e até mesmo oeste africano.
tecidos de algodão; metais, cobre, ferro, prata, estanho e
chumbo; escravos, turcos, árabes e outros, empregados
sobretudo nos palácios; perfumes, drogas e livros. Ouro
e escravos eram os principais produtos exportados do
sul, mas também iam para o norte especiarias, couros
e peles, marfim, nozes de cola e tecidos, principalmente
os decorados. (M’BOKOLO, 2009, p. 129-130)
No comércio interregional os produtos trazidos do
norte para o sul eram: sal, tecidos, cobre, pérolas, cauris,
tâmaras, gado, cavalos e burros e peixes secos. Do sul
para o norte iam: sal marinho, o marfim, as pimentas e
noz de cola. (M’BOKOLO, 2009, p. 131) Figura 2 – Principais Rotas Transsarianas – Século XIV.
Os negócios eram controlados pelas burocracias
Fonte: PACHECO, Felippe Jorge Kopanakis. Cartografia do Projeto ABA.
estatais e desde pequenos reinos até os grandes im- CIEAA/Universidade Estadual de Goiás. disponível em: <http://www.pre.
périos lucravam com o rendimento dessas atividades ueg.br/projetospresee/projetoaba/pdfs/anexo %20de%20mapas. pdf>.
mercantis, através de impostos ou com o monopólio Acesso em: 20 out. 2010.
de alguns produtos.
Ghana, Mali e Songhai A região também foi bastante explorada logo depois
da ocupação muçulmana ou por conta da intenção de
A região oeste e centro oeste do continente, corres- fazer novas conquistas ou apenas para explorar novas
pondente à uma grande porção de terras já com vege- regiões e povos com os quais se poderia pelejar futu-
tação de savanas e cursos de água perene à sudoeste ramente ou mesmo para explorar as potencialidades
do deserto do Saara – também denominada de Sudão comerciais.
ocidental –, já era conhecida dos egípicios e do império
bizantino como uma região bastante rica, principalmente Ghana
de ouro e sal. Portanto, sempre chamou a atenção das
civilizações surgidas no vale do Nilo e também às me- O império do Ghana sempre chamou a atenção para
diterrânicas. (ZAYED; DEVISSE, 2010, p. 97). si graças ao ouro. Sua posição geográfica favorável ao
Conforme pesquisas arqueológicas, os grupos popu- norte do Niger e do Senegal ligava a região produtora
lacionais da região conheciam a agricultura e a pecuária de gado e de produtos agrícolas à região saariana. Era
desde muito antes de Cristo. também o final de uma rota de caravanas conhecida
Vestígios arqueológicos que indicam a presença de um grupo desde a pré-história como rota dos carros e tudo isso
de negros produtor de gêneros alimentícios pelo menos contribuiu para Gana se tornar um importante entreposto
desde -1400 a -1300 (talvez antes) foram descobertos em comercial e um reino bastante conhecido e rico. (KI-
quatro regiões principais de Gana: no leste dos montes Ban- -ZERBO, 1999, p. 133-134)
da, nas terras altas ao redor de Kintampo, nos sítios fluviais
As origens de Gana se perdem no tempo longo da
espalhados pelas vastas matas da bacia interior do Volta e
memória, “[...] teria sido fundado antes do ano 400 P.C.
nas planícies de Acra, no extremo sul. (WAI-ANDAH, 2010,
É curioso notar que este início coincidiria [...], no tempo,
p. 670)
com o fim do reino de Méroe.” (GIORDANI, 1985, p. 102)
do século X d.C. dominando um “[...] um verdadeiro comercial. “[...] Al Bakri não se esquece de mencionar
império que se estendia do Tagant ao Alto Níger e do a cozinha deliciosa preparada pelas mulheres e a graça
Senegal a Tombuctu [...]” (KI-ZERBO, 1999, p. 135). proverbial das raparigas da terra, de que celebra as quali-
Estavam nos domínios ou pagavam tributos aos prín- dades com lirismo e precisão.” (KI-ZERBO, 1999, p. 136)
cipes de Ghana “[...] Reinos negros do Sul, com Tekrur, O Império de Gana começa seu crescimento a partir
o Sosso, e a leste os países do delta central nigeriano. do século VIII d.C.. Procurando as razões principais de
Principados berberes como os de Walata e Awdaghost”. sua centralização e instalação da nobreza no poder,
(KI-ZERBO, 1999, p. 135) Posnansky afirma:
Podemos ver que vários povos faziam parte do [...] vamos encontrá-las na posse de preciosas riquezas min-
reino de Ghana, somando “[...] contribuições de tribos erais –cobre, ferro e ouro(para respeitar a provável ordem
de origem muito diversas: negros indígenas [nativos] de exploração) –, no controle do comércio do sal e, provav-
fugindo do deserto ou da floresta equatorial isalubre; elmente, em sua localização numa área onde antes se de-
senvolvia um modo de vida agrícola, como evidenciado no
brancos líbios, semitas, berberes, ouros e, ainda peuls
contexto de Tichitt. (POSNANSKY, 2010b, p. 819)
[...]” (AZIZ, 1978, p. 242).
Ressaltando um dos principais centros de trocas e
posto de reabastecimento do reino ganense, Awdaghost,
baseado nos escritos de Ibn Khaldun e Al Bakri, Ki-Zerbo
(1999) exalta a prosperidade desse oásis, contando com
criação de carneiros e bois, muito mel e afirmando que Existem hipóteses para explicar a formação de nobrezas nos
os habitantes possuíam muitos bens. estados centralizados nas sociedades surgidas no continente
africano, que talvez também expliquem o surgimento das
Awdaghost tinha um mercado repleto de mercadorias linhagens dominantes dentro do estado centralizado de uma
e muito animado, onde se pagava tudo com ouro em forma geral. Pelo menos duas são as mais usuais:
pó., A cidade vivia:
a) Ideia da Natureza Sagrada do Chefe. Nela a sociedade
[...] a formigar de transações, rodeada de hortas [sic] em
atribuía ao chefe algum tipo de poder mágico que beneficiaria
que abundavam os pepinos, e palmeiras e grande quantidade
a todos, assim o chefe político/administrativo era antes
de figueiras, estabelecia uma cortina de protecção contra o um chefe religioso. Essa crença inicial faz com que seja
calor do deserto e a sua importância como centro islâmico centralizado o poder nas mãos de um pequeno grupo;
dotado de uma mesquita-catedral e de numerosas mesquitas
mais pequenas [sic] [...] (KI-ZERBO, 1999, p. 135-6) b) Teoria do Chefe Guerreiro. Nesta teoria o grupo com
melhor tecnologia militar incorpora o grupo mais fraco seu
vizinho, que fica dependente do antigo agressor para sua
Não se sabe ao certo onde era a capital do Ghana no proteção contra a invasão de outros grupos e assim acontece
período de maior apogeu, ou as capitais. Pelas informa- uma expansão do território;
ções dos cronistas árabes e escavações recentes, po-
demos dizer que a capital era composta de dois grandes c) Teoria do Chefe Comercial. Nesta hipótese a formação da
nobreza dirigente está associada à ideia da acumulação de
bairros, um comercial, onde a população muçulmana era riquezas proporcionada pelas atividades comerciais. O grupo
predominante, composto de casas de pedras, mesquitas, destacado nesta atividade consegue riquezas possibilitando
poços e hortas. (AZIZ, 1978) o controle da produção de novas mercadorias e assim por
diante.
O outro é afastado deste centro comercial, onde
moravam o rei e sua corte. Este bairro – ou cidade – A primeira hipótese, de chefe sagrado, para a História da
era cercado por Bosques Sagrados abrigando locais de África leva a ideia de difusionismo, ou seja, os estados
diversos cultos e cerimônias. Nestes bosques também africanos teriam copiado o que ocorria no Egito. A segunda
estavam localizados os túmulos reais, compostos de traz em sua base a ideia de surgimento e desenvolvimento
autóctone de certas tecnologias, principalmente a fundição
uma câmara subterrânea onde o soberano era sepultado
de metais. A terceira traz também a idéia de desenvolvimento
com diversos servidores, principalmente os cozinheiros de tecnologias no seio da própria comunidade, como: formas
e copeiros do palácio. (KI-ZERBO, 1999) de cálculos, conhecimento de meios de transportes, rotas
As mulheres não foram esquecidas da observação e outras línguas, e outras coisas importantes nas trocas
comerciais.
atenta dos escritores árabes que estiveram no centro
comunidade de comerciantes de Meca proclamada por durante os doze anos que se seguiram.” (MUNANGA;
um ativo comerciante, Maomé. Por isso: GOMES, 2006, p. 45)
[...] o islã apresentava (e apresenta) um conjunto de Além dessas consequências econômicas, esta fa-
preceitos morais e práticos estreitamente ligados às mosa peregrinação também abriu os olhos do mundo
atividades comerciais. Este código moral ajudava a sancionar mediterrâneo para a pujança do Mali. Quando passou
e controlar as relações comerciais e oferecia, aos membros pelo Egito, Kango Mussa adquiriu várias obras de arte,
dos diferentes grupos étnicos, uma ideologia unificadora obras jurídicas e filosóficas, além de mercadores de
que atuava em favor da segurança e do crédito, duas
todo o mundo mediterrâneo terem presenciado seus
das condições essenciais para a existência de relações
feitos colocando literamente o Mali no Mapa. Nos mapas
comerciais entre parceiros comerciais distantes entre si.
genoveses e venezianos a partir daí o Mali – chamado
(HRBEK, 2010, p. 88)
de Melli – foi incluído, com destaque para suas riquezas,
principalmente o ouro.
O segundo grupo a se converter era o dos chefes
Segundo Aziz (1978, p. 267) quando Ibn Battuta “[...]
políticos e suas cortes. Diferente das conversões de
visita o Sudão em 1352, é sensibilizado pela ordem,
comerciantes que tiveram pouco espaço nas crônicas
segurança, boa administração das finanças e etiqueta
árabes que chegaram até nós, as conversões dos chefes
da corte do Mali.” A explicação parece estar na forma
de clãs, dos reis ou de importantes figuras nas suas
como a educação era tratada pelos soberanos maline-
cortes foram retratadas com destaque. Os motivos da
ses. Existem notícias de investimentos de Sundjata na
conversão eram muito mais ligados à política interna
construção de escolas.
e as conjunturas econômicas que propriamente à um
fervor religioso. Kango Mussa,na volta de sua peregrinação a Meca, ao
passar por Tombuctu “[...] ali deixou o seu amigo o poeta
No plano interno, o islã oferecia ao soberano o
Es-Sahili com a soma de 40 mil meticais de ouro para
amálgama para sedimentar sua dominação entre grupos
poder restaurar ou construir os edifícios destinados ao
heterogêneos, que antes da conversão, tinham costumes
culto e às coisas do espírito.” (M’BOKOLO, 2009, p. 147).
totalmente variados e adoravam deuses diversos. Com a
conversão dos chefes regionais, se criava uma nobreza M’Bokolo (2009, p. 148) utilizando o testemunho
minimamente coesa em alguns aspectos. Além disso, deixado por Mahmud Kati, o primeiro historiador negro da
os muçulmanos traziam para a administração conheci- cidade que escreveu no século XVI, fala da urbanização
mentos pouco difundidos na nobreza até então, como crescente do Mali: “[...] encontrar-se-iam em Tombuctu
por exemplo, a escrita. (HRBEK, 2010, p. 90-100) [...] 26 oficinas de alfaiates empregando entre 1.300 a
2.600 aprendizes; 150 a 180 escolas, das quais uma
No plano externo, a conversão garantia uma estabili-
das mais importantes acolhia mais de 120 alunos [e
dade territorial importante para manter os limites e evitar
que a população da cidade era] da ordem de 70 mil a
invasões, além de propiciar novos contatos comerciais
80 mil habitantes.”
importantes para manter a entrada de mercadorias e
assegurar mercados para as exportações. Outro fator
importante é que esses contatos também sedimentavam
alianças políticas externas essenciais para manter o pres-
tígio do governante além de garantir proteção no caso Ki-Zerbo (1999, p. 189) calcula a população da cidade de Tombuctu
de necessidades futuras. (HRBEK, 2010, p. 90-100) em 100.000 habitantes, utilizando como base um recenseamento
realizado por jovens estudantes citado no Tarick el-Fettach, escrito no
São relatadas várias viagens a Meca de dirigentes século XVI d.C.. Ele ainda destaca como grandes cidades recenseadas
do Mali – principal sinal externo da conversão –, desde na mesma operação Gao e Cano, porém não fala da população das
o início do século XII, mas a mais impressionante foi a duas. Para a cidade de Gao foram contadas “[...] 7626 casas, sem
realizada por Kango Mussa – ou Kanku Mussa –, entre incluir as cubatas construídas de palha [...]”.
1324 e 1325, que “[...] passa por Ualata, Tuat (Adrar)
e Cairo. Todas as crônicas árabes falam desta incrível e A administração do império se organizava com a
mirífica peregrinação, onde o rei de Mali distribui mãos cobrança dos impostos dos produtos agrícolas e da
cheias de ouro à sua passagem” (AZIZ, 1978, p. 266). Foi pecuária “[...] em tributos, na requisição de pepitas de
tanto ouro “[...] que o valor do precioso metal despencou
ouro, em taxas aduaneiras e despojos de guerra.” (KI- e outras de um tirano opressor. Após vencer os desafios,
-ZERBO, 1999, p. 178). Também são citadas taxas sobre os dois irmãos se separam. Fará Maka Bate desaparece
mercadorias importadas e exportadas. das histórias, mas Za el-Ayamen é proclamado rei pelo
O ouro que tinha sido o signo do esplendor do povo songai. (GIORDANI, 1985; AZIZ, 1978)
Mali também era o motivo das cobiças externas e das Os Dia reinaram por várias dinastias, perfazendo
disputas internas pelo seu controle. Assim, o império cinco séculos. Quando transferiram a capital do império
sofreu investidas externas por parte de vários povos, para Gao, na primeira década do século XI d.C., cidade
mas principalmente dos tuaregues que invadiram por retomada dos berberes e antiga vassala do império do
diversas vezes cidades importantes como Tombuctu. Mali, já haviam reinado 14 soberanos desta dinastia,
Foi também questionada em diversas oportunidades a segundo Aziz (1978).
forma de sucessão que algumas vezes foi matrilinear, Giordani (1978), citando Ibn Haukal, que escreveu
outras patrilinear e outras o poder foi tomado à força, em fins do século IX, assevera a amizade entre o rei de
além disso, vários reinos vassalos também questiona- Ghana e os dirigentes do Gao. Porém, em momentos
ram a legitimidade das taxas cobradas. As invasões, os posteriores, eles passam de amigos à tributários, pri-
questionamentos dos vassalos, a perda de controle das meiro de Ghana e depois do Império do Mali.
rotas comerciais e as intrigas palacianas enfraqueceram Na volta da peregrinação de Kango Mussa, em 1336
o império que foi perdendo, à partir do final do século – existem controvérsias sobre se pacificamente ou por
XVI, cada vez mais a proeminência na região. imposição –, os dois filhos de Dia Assibai, chamados Ali
Kolen e Solimão Nar, são levados para serem educados
Songhai na faustosa corte de Kango Mussa. Após onze anos
os dois irmãos conseguem fugir, reúnem um exército e
Os songhais ocupam a região desde tempos imemo- derrotam o governador imposto pelo imperador do Mali,
riais, mas seu reino, deve ter sido organizado entre os conquistando nova independência para o Songhai. As
séculos V e VII d.C. (KI-ZERBO, 1999; GIORDANI, 1978). lendas de criação do império se recriam, e novamente
Sua base foi o pequeno reino de Kukia, “[...] fundado por dois irmãos chegam de fora para recriar o império. (AZIZ,
uma população de camponeses, caçadores e pescado- 1978; GIORDANI; 1985; KI-ZERBO, 1999)
res.” (MUNANGA; GOMES, 2006, p. 46) Segundo Aziz (1978, p. 279) após a recriação do
Segundo Aziz (1978) os songai são formados por império os soberanos iniciam um movimento de volta
três distintos povos: populações oriundas do Norte, aos costumes tradicionais negligenciando cada vez mais
provavelmente da região do Volta ligados a agricultura; a religião islâmica e trazendo de volta práticas ances-
as populações ocupantes de tempos mais remotos, os trais, como por exemplo, a utilização de “[...] epítetos
pescadores Sorko e os caçadores Gow, todos encontra- bárbaros a seus nomes como ‘pequeno cavalo barbado’,
ram-se nas margens orientais do rio Níger. ou ‘pantera-crocodilo’, nomes que cheiram a mato e a
Sobre o Império Songhai, também conhecido como animalismo.”
Gao, depois do século IX, observa Aziz (1978, p. 269) A convivência com outras culturas é pacífica neste
“[...] as fontes são abundantes: narrações de Ibn Khal- período, conforme relatado por El-Bekri sobre Kaukau
dun, de Leon, o Africano, de Usmane dan Fodio, de que na prática eram duas cidades, uma onde os peque-
Mohammed Bello, de El-Mucheli, crônicas sudanesas nos e grandes negócios eram a tônica e habitada pelos
e o Tarikh as-Sudan e o Tarikh al-Fattah [...]” (grifos comerciantes – judeus, berberes e principalmente mu-
do autor). Além dessas, ainda temos os relatos de Ibn çulmanos – e outra onde o rei e sua corte viviam. (AZIZ,
Battuta que também passou pela região. 1978; ALMOULOUD, 2003;)
São conhecidas algumas lendas sobre a criação do O império Songhai começa sua expansão com Ali Ber,
Songhai. Todas falando dos dois irmãos Za el-Ayamen e também conhecido como Sonni Ali, que governou entre
Fará Maka Bate, fundadores da dinastia Dia, que teriam 1464 e 1492. Grande guerreiro tomou várias cidades
vindo do norte para livrar a população de perigos emi- do antigo império do Mali ocupadas por outros povos,
nentes, algumas falando sobre um dragão de maldades, como Tombuctu ocupada pelos tuaregues desde 1435.
outras de um demônio manifestado em um grande peixe (GIORDANI, 1985, p. 110).
Alguns pesquisadores consideram Sonni Ali como o No período da regência de Daud, entre 1549 até 1583,
protetor das tradições dos povos negros, tendo lutado o sultão do Marrocos faz várias tentativas de controle
contra a expansão do islamismo no oeste africano e tam- das minas de sal de Teghazza, pertencentes ao império
bém tomando atitudes de grande desagrado ao mundo Songhai, primeiro pacificamente e depois em excursões
muçulmano, como por exemplo, as ações relatadas por militares e mais uma vez o império é enfraquecido pelos
Giordani (1985, p. 110): “[...] em Tombuctu executou problemas de sucessão após a morte do askiya Daud,
os ulemas, sábios muçulmanos, que se opunham a ele em 1583 d.C.
e encarcerou os letrados.” Com os problemas internos de sucessão, a falta de
Por volta da década de 1470 d.C., os domínios de coesão das diversas províncias e as incursões militares
Sonni Ali se extendiam por grande parte do sul do Daomé, do Marrocos utilizando equipamentos modernos de ar-
a região do Gurmah, o Homberi, no recôncavo do Níger, tilharia como canhões e mosquetes, o Império Songhai
partes dos territórios do Mossi e parte do território começa a se desintegrar. Após a invasão de Tombuctu,
Yatenga. Porém, o rei mossi Nasserê não se conforma Djennê e Gao pelo exército de mercenários do Sultão de
com a perda de seus domínios e arquiteta uma reviravolta Marrocos o “[...] Sudão está submerso em uma maré
promovendo “[...] verdadeiramente uma emigração de barbárie.” (AZIZ, 1978, p. 310)
gigantesca das tribos Mossi [...]” (AZIZ, 1978, p. 282). Mesmo com a resistência da população local liderada
Com a morte de Sonni Ali ocorre uma disputa de por descendentes dos askiya não foi possível retomar
poder provocada principalmente pelas contradições o poder e toda a região passa a ser regida pelo Sultão
entre as regras tradicionais sucessórias com as novas de Marrocos, mas sem muito sucesso nas diversas
regras islâmicas. Com a instabilidade provocada pelos tentativas de unificação e restauração da unidade do
questionamentos sobre a legitimidade do novo soberano, antigo império.
sobe ao poder Mohammed Turi, um antigo general de
Sonni Ali, que reorganiza o reino em províncias com certa
autonomia, criando o Império do Tekrur, regido por uma REGISTRE SUA IDEIA
nova dinastia proclamada de askiya.
O novo imperador retoma o diálogo com os muçulma- Anote as principais características dos diversos reinos citados nesta
nos, incorporando vários conselheiros ulemás, fazendo parte e tente fazer um quadro com suas semelhanças e diferenças.
sua peregrinação pessoal à Meca onde é proclamado
califa da região do Sudão.
Depois disso ele empreende várias campanhas de
conquistas ampliando seus domínios e produzindo uma
mercadoria bastante requisitada naquele momento na
região do Mediterrâneo: escravos. Em 1501 o askiya Mo-
hammed Turi entra triunfante na antiga capital do Império
Mali, estendendo seus domínios também para Maussa
de Gobir, Katsena e Kano. (DRAMANI-ISSIFOU, 2010)
A migração de diversos povos começou a minar o
império dos askiyas por dentro desde aquela empreen-
dida pelos mossi no último quartel do século XV d.C..
Havia uma diversidade de culturas, costumes, línguas e
organizações sociais dentro do império.
Conviviam nas cidades populações trazendo culturas
tradicionais africanas, com grupos berberes, judeus e
muçulmanos – e dentro desse último grupo havia fac-
ções divergentes. No campo, a maioria da população
era songai sustentando suas tradições ou praticando
um islamismo de fachada.
SUGESTÃO DE ATIVIDADE 2:
Como está a elaboração de seu glossário?
Anote as palavras que não conhece em uma folha conforme vai lendo
o texto, sem a preocupação de procurar no primeiro momento, pois
muitas vezes o próprio texto elucida seu significado. Se for resolvido
com o texto, anote a palavra e seu significado, se não foi, procure em
dicionários, na internet, ou outros livros.
SUGESTÃO DE ATIVIDADE 3:
Procurar na internet ou em livros didáticos imagens das regiões e
estados tratados até aqui. Faça uma legenda no Mapa Mudo dos reinos
estudados até o momento e se for possível, também, seus limites.
Você está fazendo seu banco de imagens?
Anotações
O Tráfico escravo no
Atlântico Sul
CAPÍTULO 5
EaD
EaD UNIVERSIDADE
UNIVERSIDADE DO
DO ESTADO
ESTADO DA
DA BAHIA
BAHIA
Anotações
Até aqui apresentamos reinos e impérios que pouco Alguns pesquisadores adotam o termo escravidão
contato tiveram com os povos europeus após a domina- somente para o processo de tráfico organizado de pes-
ção romana, porém, chegou o momento de estudarmos soas para fora do continente africano, que podemos
um pouco dos povos, reinos e impérios construídos na dizer que se inicia com a consolidação das conquistas
época das grandes navegações e que tiveram grande muçulmanas no final do século IX d.C. e toma corpo com
importância para nossa História, pois a partir desta época os europeus em meados do século XVI d.C.. (INIKORI,
o continente africano passou a ser o maior fornecedor 2010)
de mão de obra para o desenvolvimento mundial e par- Outros pesquisadores argumentam que a escravidão
ticularmente para as Américas através da escravização no continente africano é bastante antiga e que era uma
de um grande contingente de pessoas. prática comum para vários povos africanos desde muitos
A escravidão é um fenômeno da humanidade e to- séculos antes do início do período chamado de grandes
dos os grupos humanos conheceram alguma forma de navegações europeias, no século XVI d.C..
escravização. Segundo Lovejoy (2002, p. 29) a “[...] O périplo do Mar da Eritréia, escrito no século I a.C.,
escravidão foi um importante fenômeno da história, da cita os escravos como mercadoria valiosa nas trocas
antiguidade clássica à época muito recente.” comerciais do Mar Vermelho, no período da História
Segundo Souza (2003, p. 12), a “[...] história da hu- Antiga europeia. A tradição bíblica indica que os hebreus
manidade, por muitos séculos, testemunhou a presença foram escravos durante muito tempo dos egípcios. Além
da escravidão na vida social de diferentes povos, desde disso, estudos recentes, assevera Souza (2003, p. 12-
a Antiguidade Clássica.” 13), indicam que os egípcios já organizavam expedições
Para João Reis (1987), citando Evsey Domar, sempre militares com fins de obtenção de mão-de-obra compul-
que exista uma “[...] situação de abundância de terras sória, desde pelo menos 2680 a.C..
e escassez de mão-de-obra se verifica uma tendência A principal diferença entre os dois argumentos se
ao aparecimento do trabalho forçado” ( DOMAR apud refere às formas de escravidão surgidas no interior das
REIS, 1987, p. 8). sociedades africanas tradicionais e sua comparação com
As conquistas do Império Romano geravam prisio- novas formas de escravização surgidas com o grande
neiros de guerra que eram vendidos como escravos. tráfico de escravos para exportação, principalmente entre
Havia também, na antiguidade, regiões fornecedoras os séculos XVI e XVIII d.C..
de escravos para todos os grandes impérios, como por Também é discutida a violência ou brandura na escra-
exemplo, a Europa Oriental de onde eram exportados vidão no continente africano, servindo esse ponto para
grandes contingentes de cativos. Os eslavos, cujo nome diferenciações e classificações de acordo com o grau
deu origem a palavra escravo em diversas línguas euro- de brandura ou violência empregado contra os escravi-
peias, eram exportados para reinos africanos e da Ásia. zados ou para sua obtenção. Além disso, as formas de
(INIKORI, 2010, p. 91-92) utilização, propriedade, funções e autonomia do cativo
também indicam diferenças entre as formas tradicionais,
e mais tarde também sobre as implantadas no mundo
muçulmano, após o século XI, e com o tráfico Atlântico
no século XVI.
Existe um pequeno artigo muito instigante que é o resumo de um
debate sobre as correlações entre a escravidão antiga e a moderna, Trabalharemos um pouco sobre a escravidão na
que traz importantes discussões sobre o conceito de escravidão. África, suas principais características e como ela vai se
transformar ao longo do tempo.
Ver:
CARDOSO, Ciro Flamarion; REDE, Marcelo; ARAÚJO,
Sônia Regina Rebel. Escravidão antiga e moderna. Revista A escravidão na África
Tempo. v. 3, n. 6, dez. 1998. Disponivel em: <www.historia.
uff.br/tempo/artigos_dossie/artg6-1.pdf>.
Existe uma infinidade de formas de exploração com-
pulsória de pessoas surgidas nas diversas regiões da
No continente africano, a escravidão é um assunto África que levariam a uma enorme lista de classificação
muito pesquisado e polêmico. se pensarmos os diversos critérios para estabelecer as
várias tipologias que poderiam ser utilizadas como, por se torna um estrangeiro, ou seja, perdia as prerrogativas
exemplo: quanto à propriedade, as formas de utilização, “[...] de direito e privilégios de uma determinada socie-
as formas de transferência, tratamento dispensado, for- dade [...]” (LOVEJOY, 2002, p. 31).
mas de reprodução, formas de conquista de liberdade, Existiam outras circunstâncias em que as pessoas
etc.. podiam se tornar escravos, além das punições judiciais
Para evitarmos grandes e exaustivas listas e clas- e penhora por dívidas. Alguns grupos, em momentos
sificações – e também as discussões sobre elas – uti- de fome, podiam vender alguns de seus membros para
lizaremos a definição de João Reis (1987, p. 6), para grupos vizinhos.
quem o escravo é “[...] alguém que é propriedade de [...] Esse tipo de comércio muitas vezes garantia não apenas a
outro – que pode ser pessoa, grupo social, instituição sobrevivência de grupos inteiros, mas também das mulheres
ou cargo político –, e cuja propriedade é reconhecida e crianças e homens que eram transformados em escravos
pelas leis e costumes.” nos grupos receptores. (REIS, 1987, p. 7)
novo grupo, fator essencial para garantir uma adesão Além delas, o indivíduo escravizado, por exemplo, no
às normas e mecanismos de funcionamento do grupo, Brasil onde vigorou a escravidão de caráter mercantil,
assim como garantiam uma adaptação “[...] mais rápida passava a ser um simples objeto passível de compra e
e facilmente às estruturas de parentesco da linhagem do venda – era um bem móvel –, além disso, o escravizado
senhor.” (REIS, 1987, p. 8) perdia a autonomia sobre seus atos e decisões, ou seja,
O poder sobre um grande número pessoas está deveria seguir as ordens de outro; passava também a
associado, no continente africano, ao prestígio social ser dependentes de outra pessoa, já que não respondiam
e político. Vários grupos consideravam os escravos por seus atos socialmente e juridicamente.
como filhos do senhor, por extensão das regras acima O estágio atual das pesquisas sobre a escravidão
descritas e alguns pesquisadores acreditam que essa na África procura desvendar, além de outros assuntos,
característica proporcionou uma escravidão mais amena os processos que levaram às mudanças nas formas de
e ligada à pessoalidade. escravização acontecidas no continente africano e nas
No entanto, algumas tarefas mais pesadas e degra- transformações ocorridas permitindo a compreensão das
dantes podiam ser destinadas aos escravos liberando o modificações de uma escravidão do tipo predominan-
senhor e seus parentes cosanguíneos desses encargos, temente doméstico ou de linhagem para a escravização
assim como o senhor podia interferir na vida pessoal do em larga escala. Um dos principais pontos debatidos é
escravizado, como na escolha do par para casamento, como a influência de culturas externas – islâmicas e eu-
escolha da profissão ou atividade exercida pelo escra- ropeias – interferiram nestas mudanças e de que forma.
vizado, entre outras coisas.
Em resumo, as principais características da escra-
vidão doméstica ou de linhagem para João Reis (1987)
eram:
Para uma discussão mais aprofundada sobre a escravidão na África,
[...] a escravidão funcionava como um mecanismo de re-
ver:
produção demográfica para o indivíduo ou grupo escravista
(era importante aumentar o número de membros da linhagem SILVA, Alberto da Costa e. A manilha e o Libambo: a África e a
através da aquisição externa e reprodução interna de escra- escravidão (1500-1700). Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2002.
vos; estes serviam como uma medida de prestígio social e
poder político, bem como mercadoria que podia ser eventual- Para Lovejoy (2002) o mundo islâmico foi herdeiro
mente trocada por outra); mulheres e crianças eram preferi- de uma difundida tradição de escravidão presente na
das em razão da lógica da reprodução e da fácil assimilação antiguidade mediterrânica, porém, os muçulmanos
às estruturas de parentesco. (REIS, 1987, p. 10) reinterpretaram e resignificaram esta instituição à luz
de seus preceitos religiosos. Inicialmente os escravos
Lovejoy (2002) apresenta as principais características eram os prisioneiros das guerras santas, portanto não
da escravidão, informando que, de uma forma geral, ela necessariamente negros.
traz: Escravos vinham de todas as novas regiões de
[...] a idéia de que os escravos eram uma propriedade; que conquistas muçulmanas, Norte da Península Ibérica,
eles eram estrangeiros, alienados pela origem ou dos quais, estepes da Rússia, Ásia e também da África. Assim como
por sanções judiciais ou outras, se retirara a herança social nas comunidades tradicionais africanas, as mulheres e
que lhes coubera ao nascer; que a coerção podia ser usada crianças eram as preferidas, tinham mais oportunidades
à vontade; que a sua força de trabalho estava à completa de inserção na sociedade islâmica, pois na “[...] tradi-
disposição de um senhor; que eles não tinham o direito à sua ção islâmica, a escravidão era vista como um meio de
própria sexualidade e, por extensão, à suas próprias capaci- converter os não-muçulmanos” (LOVEJOY, 2002, p. 49).
dades reprodutivas; e que a condição de escravo era herdada,
Em alguns grupos muçulmanos a conversão era o
a não ser que fosse tomada alguma medida para modificar
essa situação [...] (LOVEJOY, 2002, p. 29-30)
primeiro passo para a liberdade. Os convertidos tinham
tratamento melhor que os não convertidos, assim como
eram destinadas tarefas mais degradantes e perigosas
Excetuando a transformação de livre para escravo aos não convertidos.
como sanções judiciais, todas as outras características
acima parecem refletir a escravidão ampliada.
ção dessa valiosa mercadoria. A toda essa cadeia, os obtenção de cativos na África, segundo Lovejoy (2002):
especialistas, geralmente, se referem como “tráfico de O tipo mais comum de violência era a guerra, na qual os pri-
escravos” ou somente tráfico. Vamos ver como se forma sioneiros eram escravizados. Variações na organização de tal
esse circuito. violência – incluindo ataques cujo objetivo era adquirir escra-
Para abastecer o mercado mundial de mercadorias vos, banditismo e sequestro – indicam que a escravização
violenta pode ser vista como inserida em uma sucessão con-
antes muito caras e destinadas para uma elite, embora,
tínua da ação política em larga escala, na qual a escravização
no século XV e XVI se tornavam mais baratas, foram
pode ser apenas um subproduto da guerra e não a sua causa,
feitos maciços investimentos em toda cadeia produtiva
ou como uma atividade criminal em pequena escala, na qual
de artigos como, por exemplo: os tropicais, como o
escravizar é o único objetivo da ação. (LOVEJOY, 2002, p. 33)
açúcar e o fumo; os industriais, como os metalúrgicos
e os tecidos; e até mesmo os mais raros e caros, como
o ouro ou os cativos. Após a violência da captura se juntavam a ela outras,
como: a violência da retirada de sua comunidade; a
Muitas vezes, a busca por maiores lucros provocava
violência do deslocamento, momento da primeira via-
a ampliação da produção de um determinado artigo,
gem para o centro comercial; a violência do momento
porém isso dependia do avanço da fabricação de outros
da primeira venda; a violência de um segundo – muitas
setores – ou para seu próprio aumento de produção, ou
vezes até de um terceiro deslocamento, e até mais que
ainda, um determinado gênero era utilizado como moeda
isso –; violência do depósito em algum ponto do litoral;
de troca no mercado, portanto, dependia de outras mer-
violência da passagem do Atlântico; violência de nova
cadorias. Assim o mercado se tornou interdependente.
compra; violência de novo deslocamento; etc. Toda
A produção e distribuição desses gêneros necessi- a cadeia envolvendo a comercialização de escravos
tavam da criação ou ampliação de uma rede comercial também era violenta, como a produção desses cativos.
envolvendo diversas etapas e uma divisão mundial des-
A cadeia produtiva dessa rica mercadoria era bas-
sas etapas de produção e comercialização. A escravidão
tante complexa e envolvia várias etapas dentro e fora
era um elo dentro desse sistema mundial de produção/
do continente africano e só pode ser montada graças à
comercialização.
união de interesses internos e externos, o envolvimento
Porém, como produzir escravos? de pessoas ricas e poderosas para garantir algumas
Uma das formas seria a reprodução através do au- dessas etapas mais trabalhosas e que dependiam de
mento vegetativo da população de escravos utilizando investimentos maciços e a contribuição de estados cen-
as uniões entre escravos, mas isso, parece ter sido tralizados para ajudar na organização de todo o sistema.
inviável, sobretudo pela própria forma de organização e Não devemos esquecer que o principal móvel para
dos mecanismos de valorização da criança cativa dentro os europeus procurarem outras rotas comerciais foram
do sistema de escravidão doméstica. as especiarias e o ouro, portanto, as mercadorias que
Por outro lado, as necessidades do mercado para antes circulavam pelas rotas do Mediterrâneo agora
exportação eram prementes, valorizando indivíduos começaram a circular por outros caminhos e algumas
adultos com idade e condições físicas necessárias para que tinham uma presença apenas marginal nas transa-
serem utilizados como mão-de-obra, imediatamente, em ções, passaram a ser essenciais para movimentar todo
diversos trabalhos produtivos, ou seja, homens jovens o ciclo. Com isso, o eixo do comércio mundial muda
e fortes.. do Mediterrâneo para o Atlântico, devido ao volume de
A melhor opção encontrada no momento de organiza- metais preciosos e aos novos hábitos de consumo, es-
ção da escravização ampliada foi a utilização de jovens tabelecidos pela produção de novas mercadorias vindas
já capturados nas guerras. Porém, isso só foi possível das Américas e também das feitorias africanas.
durante o período inicial do tráfico, eram necessários Quase todos os estados europeus queriam participar
outros instrumentos para atender a demanda sempre desse rico comércio, principalmente, o de escravos. Des-
crescente por mão-de-obra compulsória. Fomentar no- ta forma, franceses, ingleses, holandeses, espanhóis e
vas guerras ou estimular a produção de outras formas portugueses, que foram os precursores nas navegações
de captura, foram as soluções encontradas. atlânticas, disputavam o privilégio de estabelecer feitorias
A violência estava associada a todas as formas de no litoral africano, com prerrogativa para os portugueses
no qual conchas chamadas nzimbu, coletadas na região da mento das regiões, os soberanos passam a dar mais
ilha de Luanda, serviam de unidade básica. O estreitamento importância a costa. Além disso, a produção de cativos
das relações com os portugueses intensificou o comércio re- passou a ser uma atividade muito lucrativa, gerando cada
gional e o internacional e aumentou a importância dos com-
vez mais conflitos internos.
erciantes, muitos deles não congoleses. (VAINFAS; SOUZA,
1998)
A região próxima do Delta do Níger era densamente
Os negócios eram realizados em pequenas feitorias povoada. Não existiam grandes reinos ou impérios e sim
quase sempre protegidas por um pequeno forte, o que um conjunto de Cidade-Estados com uma abrangência
permitia que os navios permanecessem somente o regional pequena e sem uma liderança muito clara de
tempo de descarrega-los e recarrega–los com as novas uma delas no início dos contatos com os portugueses.
mercadorias. Mas os negócios dependiam de uma enor- Segundo Lovejoy (2002, p. 158), na região da Costa
me quantidade de “[...] intermediários, de intérpretes, dos Escravos e Costa do Ouro existiam pelo menos cinco
de feiticeiros, de intervenientes de toda a espécie se estados envolvidos nas atividades comerciais: Acuamu,
refastelava naquele chavascal em que a cupidez e a ma- Huedá, Aladá, Caomé e Oió. Todos tinham em comum
nha disputavam o terreno à devassidão e à crueldade.” o monopólio dos soberanos nas negociações em geral,
(KI-ZERBO, 1999, p. 270-271) sobretudo, nos metais preciosos, sal, tecidos e couros,
Falaremos agora um pouco mais sobre regiões im- noz de cola e peixe seco. Com a intensificação do co-
portantes para a consolidação do tráfico escravo. mércio de cativos, os mandatários também tomaram
para si esse monopólio.
Costa do Ouro e Costa dos Escravos
O comércio de cativos era abastecido nas disputas
internas das Cidade-Estados pelo controle do comércio
A Costa do Ouro, também chamada de Costa da e também das áreas de exportação dos cativos, onde
Mina, é uma pequena região do Golfo da Guiné, primei- cobravam impostos dos europeus por cabeça exportada.
ramente ocupada pelos portugueses onde construíram Os europeus se beneficiavam duplamente, pois, estabe-
pelo menos quatro fortificações – Castelo São Jorge da leciam acordos de exportação com vários governantes
Mina, Forte Santo Antônio do Axim, Forte São Francisco garantindo de todos os lados um grande número de
Xavier e Forte de São Sebastião –, mas que sofreu várias escravizados.
invasões de outros europeus. Segundo Albuquerque e Fraga Filho (2006):
As fortalezas e feitorias facilitavam os negócios pro- A avidez por escravos reorganizou de tal maneira o mapa
porcionando um local de referência para os comerciantes político africano que alguns reinos experimentaram o apogeu
nos séculos XVII e XVIII graças ao tráfico negreiro. Foi o caso
africanos que detinham o conhecimento das redes de
dos reinos de Daomé, Sadra, Achanti e Oió. Até o século
distribuição mercantil interioranas possibilitando também
XVI, Oió era apenas uma cidade-estado iorubana que tinha
aos portugueses o acesso aos novos produtos e ofe-
na agricultura e na tecelagem as suas principais atividades.
recendo aos negociantes internos artigos nunca vistos, Dedicava-se especialmente à fabricação de tecidos, os
ou de difícil acesso. famosos panos-da-costa que viriam a ser tão apreciados
Como foi dito acima, o comércio interno via cabota- pelos negros na Bahia. Mas as atividades agrícolas e
gem foi o mais lucrativo para os portugueses no primeiro artesanais perderam importância diante do tráfico. No final do
instante, e os escravos entraram como moeda de troca século XVI, as cidades iorubanas participavam tão ativamente
neste tipo de negócios entre portos africanos, porém, desse comércio que a região do golfo de Benim passou a
com as necessidades de mão-de-obra para atender a ser conhecida como Costa dos Escravos. (ALBUQUERQUE;
cadeia produtiva açucareira. Os traficantes começaram FRAGA, 2006, p. 26)
a ver grandes possibilidades de lucro nas operações
transatlânticas. O comércio na região foi grande e intenso e como
A presença das feitorias europeias no litoral, redire- vimos, algumas das Cidade-Estados se tornaram reinos
cionou os vetores do poder regional. Antes os poderosos pujantes graças ao tráfico de escravos, principalmente
da região não davam importância ao litoral e as maiores Oió e Benim, enquanto que as menores viram seus
cidades ficavam no interior dos estados, porém, com o habitantes diminuírem ao ponto de não mais conseguir
crescimento comercial no litoral e o rápido enriqueci- sobreviver.
inimigos bem poderosos: as febres, a escassez de comida, tornaram-se dependentes dos europeus.
os insetos, a estiagem e a frustração diante da inexistência
Outras consequências foram provocadas pelo co-
de prata e ouro nas proximidades. (ALBUQUERQUE; FRAGA,
mércio de cativos:
2006, p. 33)
[...] Além da dimensão econômica, o tráfico dos escravos
provocou igualmente interações significativas entre os povos
Os portugueses conseguiram fazer de seu forte e da África, Europa, das Américas, e do Oceano Índico, do
feitoria uma capitania e concluíram que as minas de mundo Árabe-Muçulmano e da Ásia, que transformaram pro-
prata eram inatingíveis pela forte resistência local a seus funda e duravelmente suas culturas, seus conhecimentos,
avanços se concentrando no tráfico de escravos. Com suas crenças, e seus comportamentos. O processo de inter-
o tempo, Ndongo, Angola, tornou-se o maior porto ex- culturalidade que começou com o tráfico, continua ainda hoje
portador de escravizados para as colônias portuguesas a transformar a humanidade. (UNESCO, 2006)
e espanholas nas Américas.
O tráfico de escravos foi muito longo e contínuo, no
Costa Oriental continente africano, o que acarretou certamente muitos
problemas sentidos até hoje neste continente como a
Os portugueses também se aventuraram na Costa falta de braços para tocar a agricultura, a pecuária e
Oriental da África onde encontraram portos bastante outras formas de produção de bens de consumo, a falta
movimentados e o comércio dominado por muçulmanos. de pessoas para pensar soluções para os problemas
Apesar do encantamento com a arquitetura das cidades concretos vividos pelas comunidades. Além, é claro,
do litoral como Zamzibar, Sofala e Moçambique, os por- dos problemas psicológicos causados pela perda de
tugueses pretendiam atingir os locais de produção dos pessoas de uma determinada comunidade e até mesmo
metais preciosos encontrados na costa oriental. o deslocamento de comunidades inteiras.
Os comerciantes islâmicos não aceitaram sem lutas
a entrada de novos concorrentes e foi difícil aos portu-
gueses fazer os primeiros contatos diretos com os man- REGISTRE SUA IDEIA
datários do interior em busca dos contratos comerciais
e também da cristianização de novos povos, pois eles
tinham notícias tanto da antiga cristianização de partes Tente escrever sobre as principais características dos reinos africanos
importantes da região oriental africana, como também que ajudaram no tráfico.
da nova expansão islâmica pretendida naquele momento.
Após vários embates com os muçulmanos, no final Outro aspecto pouco explorado é que havia uma
do século XVI alguns dos importantes centros comerciais resistência à escravidão na própria África. Apesar de
orientais já estavam sob domínio dos portugueses como: termos acesso a poucos trabalhos sobre esse tema, ele
[...] Quiloa, Mombaça, Massapa, Melinde e Moçambique. Es- esta sendo paulatinamente explorado. Curto (2005, p.
sas disputas desestabilizaram redes comerciais milenares. 67) acevera que para os estudos tomando como base
A cobrança de tributos, os saques, incêndios e as rebeliões Angola “[...] que a resistência à escravidão, especialmen-
contra os lusitanos, além das investidas dos holandeses e te a fuga, possui um passado tão longo quanto agudo.”
ingleses, ameaçavam a prosperidade da atividade mercantil.
Em Moçambique existiram as aringas que abrigavam
(ALBUQUERQUE; FRAGA, 2006, p. 34)
os escravizados fugidos em comunidades semelhantes
aos quilombos brasileiros. Além dessas resistências,
A procura por metais preciosos foi infrutífera, mas o
digamos mais individuais, vários reis e chefes tribais se
comércio de escravos fez fortuna para muitos traficantes
africanos e estrangeiros instalados na costa oriental afri- insurgiram contra o tráfico de escravos, alguns reinos
cana, assim como para os instalados na costa ocidental. fomentaram lutas ferozes contra os europeus até o final
Como consequência, podemos dizer que diversos reinos do século XIX. Portanto devemos ficar atentos também
tiveram sugado de seus domínios pessoas que poderiam para as resistências dos dois lados do Atlântico.
produzir e garantir impostos futuramente aos soberanos,
na pior das hipóteses. Além disso, os próprios reinos e
impérios que se beneficiaram do tráfico, em longo prazo,
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SUGESTÃO DE ATIVIDADE 2:
Como está a elaboração do seu glossário?
AZIZ, Philippe. Os impérios negros da Idade Média. Rio
Anote as palavras que não conhece em uma folha conforme vai lendo
o texto, sem a preocupação de procurar no primeiro momento, pois
de Janeiro: Otto Pierre Editores, 1978.
muitas vezes o próprio texto elucida seu significado. Se foi resolvido
com o texto, anote a palavra e seu significado, se não foi, procure em
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