Sei sulla pagina 1di 42

UNISALESIANO

Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium


Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em Língua Portuguesa e
Literatura

Alex Sander Belduscho

AS ESTRATÉGIAS DE LEITURA APLICADAS


AOS GÊNEROS DO DISCURSO

LINS – SP
2011
ALEX SANDER BELDUSCHO

AS ESTRATÉGIAS DE LEITURA APLICADAS AOS GÊNEROS DO


DISCURSO.

Monografia apresentada à Banca


Examinadora do Centro Universitário
Católico Salesiano Auxilium, como
requisito parcial para obtenção do título
de especialista em Língua Portuguesa e
Literatura sob a orientação dos
Professores Heloísa Helena Rovery da
Silva e José Antônio Fregonezi.

Lins – SP
2011
ALEX SANDER BELDUSCHO

AS ESTRATÉGIAS DE LEITURA APLICADAS AOS GÊNEROS DO


DISCURSO

Monografia apresentada ao Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium,


para obtenção do título de especialista em Língua Portuguesa e Literatura.

Aprovada em: ___/___/____

Banca Examinadora:

Prof. Dr. José Antônio Fregonezi


Doutor em Linguística pela UNESP/Araraquara/SP
_______________________________________________________________

Profª Ms. Heloisa Helena Rovery da Silva


Mestre em Administração pela CNEC/FACECA-MG
_______________________________________________________________

Lins – SP
2011
Dedico este trabalho a todos aqueles que, de alguma forma,
contribuíram para a minha formação; em especial a minha família, que sempre
me dá forças para sonhar e viver.
AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus, sem O qual não teria a oportunidade de viver e de


sonhar.
A meus pais Valdecir e Vera, que, além de me darem a vida, fizeram
todos os esforços para que eu chegasse onde ainda não estou.
A minha irmã Adriana, sempre irmã e sempre amiga, companheira de
meus sonhos.
A minha esposa Marcela, pessoa sempre atenta e cuidadosa, que
compartilha comigo sonhos e realizações.
A meus filhos Pedro Henrique e Luís Augusto, razões do meu viver,
pequenos seres capazes de me fazer enfrentar grandes lutas.
A toda minha família, avós, tios, padrinhos, primos, sogros, sempre
juntos, sempre unidos, dando força e coragem a mim e me ensinando o
verdadeiro valor da vida.
A minha avó Amália, em especial, que antes do término desta
monografia, foi para junto de Deus, deixando muita saudade e muito dela em
mim.
A meus amigos, por inspirarem-me a caminhar feliz e sonhar em
momentos de alegria.
A todas as amigas da pós-graduação, pessoas muito especiais com
quem passei boas horas de sábados.
A meus professores, todos os que um dia dirigiram a mim uma palavra
de ensinamento; em especial àqueles que o fizeram nesta pós-graduação.
RESUMO

O presente trabalho trata da necessidade de se ensinar aos alunos


estratégias de leitura adequadas aos mais variados gêneros discursivos,
preparando os discentes para os momentos em que se depararem com os
vários textos do cotidiano, desde piadas até artigos de divulgação científica,
passando por todos os gêneros que se possa ler na sociedade. A obra procura
ressaltar a importância de se enfatizar os gêneros do discurso na atividade de
ensino de leitura, na tentativa de fazer crescer o conhecimento textual dos
alunos, aquele responsável pelo reconhecimento das diversas estruturas de
organização de um texto, um dos conhecimentos prévios importantes no
processo de construção/desconstrução dos sentidos. Dessa forma, pretende-se
lançar um questionamento sobre o modo de se trabalhar a interpretação
textual, presente em todas as disciplinas, na sala de aula; cobrando que ela
seja instrumento a preparar o aluno desde cedo para escolher as estratégias
de leitura adequadas aos mais variados gêneros textuais, com os quais se
entra em contato em sociedade; transformando assim práticas que nada
ajudam no processo de compreensão de um texto em atividades com um fim
delimitado, pautado pelo uso de estratégias. Este trabalho com estratégias,
aliás, reforça a ideia de que se deve considerar a leitura como um processo
dialógico, no qual o leitor interage com o texto na busca do seu significado, não
sendo, assim, um mero receptor de informações, sem condições de construir
os sentidos para os textos que lê; além de essa interação mostrar ao aluno seu
papel de co-responsável pelas mais variadas escolhas e atitudes no dia-a-dia
do meio social em que vive.

Palavras-chave: Leitura. Gêneros do discurso. Interação.


ABSTRACT

This work deals with the need to teach students strategies for reading
appropriate to the most varied foodstuffs discursive, preparing the way for the
students to the moments in which they are confronted with the various texts of
their daily routine.Since jokes until articles of dissemination of scientific passing
by all foodstuffs that can be read in society.The work seeks to emphasize the
importance of emphasizing the genera of the speech in the activity of teaching
of reading, in an attempt to make grow the textual knowledge of students,the
one responsible for the recognition of the various structures of the organization
of a text, one of the previous important knowledge in the process of
construction/desconstruction of the senses. This way the aim is to launch a
questioning on the way to work the textuel interpretation, present in all the
disciplines in the classroom; charging that is a tool to prepare the student since
early to choose the strategies in reading appropriate to the most varied textual
genres with which it comes into contact with society; this transforming practices
that do nothing to help in the process of understanding of a text in activities with
a delimited aim, directed by the use of the strategies. This work with strategies,
moreover, reinforces the idea that we must consider the readin as a dialogic
process in which the reader interacts with the text in the search for its meaning,
and, therefore, did not, a merely receiving information without conditions to build
the senses to the texts that reads ; in addition to this interaction shows the
student's role in co-responsible for the most varied choices and attitudes in the
day-to-day social environment in which they live.

Key words: Reading. Genres of speech. Interaction.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................08

CAPÍTULO I – LEITURA: A ARTE DE CONSTRUIR SENTIDOS....................10


1 LEITURA..................................................................................................10
1.1 Definição de leitura...................................................................................10
1.2 Leitura: uma proposta interacionista.........................................................11
1.3 Os conhecimentos prévios na leitura........................................................12
1.3.1 Conhecimento de mundo..........................................................................13
1.3.2 Conhecimento lingüístico..........................................................................13
1.3.3 Conhecimento textual...............................................................................14
1.4 Estratégias de leitura................................................................................14
1.5 A leitura no ambiente escolar...................................................................16

CAPÍTULO II – CONHECIMENTO TEXTUAL: SELECIONANDO


FERRAMENTAS PARA A CONSTRUÇÃO DOS SENTIDOS .........................18
2 GÊNEROS TEXTUAIS.............................................................................18
2.1 Noção de texto..........................................................................................18
2.2 Definição de gêneros textuais...................................................................19
2.3 Tipologia textual........................................................................................21
2.4 Agrupamentos de gêneros........................................................................22
2.5 Gênero e sociedade..................................................................................23
2.6 Contexto de produção...............................................................................25
2.7 Gêneros textuais e escola........................................................................26

CAPÍTULO III – O GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO: DA CONSTRUÇÃO DO


SENTIDO À CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA.................................................28
3 ANÁLISE E LEITURA DO GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO...................28
3.1 O conhecimento textual na construção de sentidos.................................28
3.2 O artigo de opinião....................................................................................29
3.2.1 Contexto de produção...............................................................................29
3.2.2 Conteúdo temático....................................................................................30
3.2.3 Organização geral.....................................................................................30
3.2.4 Marcas linguísticas e discursivas..............................................................31
3.3 Leitura e análise de um artigo de opinião.................................................32
3.4 Relatório do trabalho em sala...................................................................34

CONCLUSÃO....................................................................................................37

REFERÊNCIAS.................................................................................................39
8

INTRODUÇÃO

O tema gêneros textuais torna-se necessário à medida que se percebe a


necessidade de aumentar o conhecimento textual e, automaticamente, o
conhecimento prévio dos leitores, para que num processo de compreensão
leitora possa-se ter êxito e conseguir um entendimento do que se lê.
O objetivo geral do trabalho em questão é propor a interpretação de
textos, a partir de estratégias de leitura, selecionadas conforme a necessidade
de determinado gênero do discurso. Os objetivos específicos da pesquisa
foram demonstrar os gêneros do discurso e as estratégias de leitura; identificar
a funcionalidade presente em um estudo através dos gêneros discursivos;
verificar a importância de estratégias de leitura para a compreensão de textos e
propor um trabalho de interpretação textual a partir de estratégias próprias a
gêneros específicos.
Inicialmente levantou-se o seguinte questionamento: em que medida o
conhecimento dos gêneros textuais auxilia os alunos na escolha de estratégias
de leitura?
Para solucionar tal questionamento, foi escolhido o método de estudo de
caso. Através de tal modelo, foram feitas observações e análises sobre a
realidade da interpretação textual na escola, para, em seguida, propor-se a
importância de um trabalho com as estratégias de leitura adequadas aos
gêneros.
O primeiro capítulo deste trabalho trata do processo de leitura,
enfatizando o caráter interacionista nele presente. Ressalta a importância de se
considerar os conhecimentos prévios do aluno, assim como de lançar mão de
estratégias para fazê-los compreender, de fato, aquilo que leem. Cita o
discurso de autores como Marcuschi, Fregonezi, Solé, Koch, Elias e Kleiman.
O segundo capítulo centra-se na questão dos gêneros do discurso. Ele
situa o leitor acerca da importância de se considerar o texto como unidade de
estudo; define gêneros textuais, tipologias e agrupamentos de texto; faz uma
reflexão de como os gêneros do discurso são usados na escola e na
sociedade; além de tematizar a importância das condições de produção de um
texto. São elencados nesse capítulo autores como Platão, Fiorin, Marcuschi,
Bakhtin, Schneuwly, Dolz, Koch e Elias.
9

Por fim, o terceiro capítulo apresenta características discursivas do


gênero artigo de opinião, bem como sua funcionalidade no meio social. O
parágrafo em questão confirma a importância do conhecimento textual na
construção da compreensão leitora. Foi analisado nesse capítulo um texto do
gênero em discussão e relatada uma experiência de leitura do texto em sala de
aula.
Assim, o presente trabalho contribui para uma visão interacionista da
atividade leitora, procurando enfatizar a importância dos conhecimentos prévios
da leitura, em especial, o conhecimento dos gêneros do discurso. Além disso,
procura salientar que a compreensão é fruto de um processo de construção de
sentidos entre os mais diversos sujeitos do ato de ler.
10

CAPÍTULO I

LEITURA: A ARTE DE CONSTRUIR SENTIDOS

1 LEITURA

1.1 Definição de leitura

Não há dúvida de que ler é pré-requisito para se viver com dignidade em


uma sociedade. É comum ver pessoas admitirem as dificuldades do mundo por
não terem leitura. Mesmo havendo a consciência da importância da leitura para
o desenvolvimento do ser humano, o que se percebe é que se faz urgente um
ensino voltado para a compreensão, uma vez que esta não é alcançada por
grande parte das pessoas. Marcuschi (2008, p.230) aponta:

O resultado da avaliação internacional de leitura feita pelo teste PISA


[sigla inglesa para Programa Internacional de Avaliação de
Estudantes] em 41 países... o Brasil ficou entre os últimos cinco
países com uma nota média de 4 pontos numa escala de 1 a 8.

O ato de ler precisa ser definido com clareza, uma vez que ainda há, por
parte da grande maioria dos profissionais da linguagem, uma ideia equivocada
a respeito de tal atividade. O que se costuma ver é que a leitura é tida como
decodificação. Nessa linha de pensamento, saber decodificar equivale a saber
ler. Assim, há professores das séries iniciais que, ao perceberem que seus
alunos decodificam, acreditam que os mesmos já sabem ler. Porém há que se
considerar a complexidade envolta no processo de leitura. Ler é mais que
saber reconhecer formas lingüísticas, embora seja necessário decodificar para
realizar a leitura.
A esse respeito, Fregonezi (2003, p. 5 e 6) afirma que “a leitura
constitui-se, portanto, de dois tipos de informações: as informações advindas
do código, presentes no código lingüístico e as informações presentes no
11

mundo do leitor”. O autor considera, portanto, importante as informações


advindas do código, mas inclui a necessidade de se considerar o conhecimento
do leitor.
Para Marcuschi (2008, p. 228), “ler é um ato de produção e apropriação
de sentido que nunca é definitivo e completo”. O linguísta fala em produção de
sentido, o que evidencia afirmar que ler é construir o sentido do texto ao longo
do processo de leitura e, assim, entender os textos com os quais se depara no
dia-a-dia.
Ainda sobre o assunto, Solé (1998, p. 18) diz “poder ler, isto é,
compreender e interpretar textos escritos de diversos tipos com diferentes
intenções e objetivos...”, reforçando a ideia de que decodificar é apenas uma
etapa no processo da leitura e que ler tem como sinônimo o verbo
compreender.
Koch; Elias (2009a, p. 11), por sua vez, contribuem, afirmando:

A leitura é, pois, uma atividade interativa altamente complexa de


produção de sentidos, que se realiza evidentemente com base nos
elementos lingüísticos presentes na superfície textual e na sua forma
de organização, mas requer a mobilização de um vasto conjunto de
saberes no interior do evento comunicativo.

Dessa forma, só é possível dizer que uma pessoa sabe ler quando a
mesma é capaz de entender aquilo que decodifica. Nessa perspectiva, ler é um
processo complexo, fruto da interação entre autor-texto-leitor. Portanto, embora
seja difícil definir com exatidão o que vem a ser leitura, é possível associá-la à
construção de sentidos dos textos, à compreensão e ao entendimento dos
mesmos.

1.2 Leitura: uma proposta interacionista

Nas definições vistas até o momento, percebe-se a importância da


interação entre o autor, o leitor e o texto para a realização da leitura. Como já
dito, nessa perspectiva interacionista, a compreensão é fruto da relação entre
autor-texto-leitor; e ler pode ser entendido como um grande diálogo na busca
pela interpretação.
Marcuschi (2008, p.231) diz que “compreender é uma atividade
12

colaborativa que se dá na interação entre autor-texto-leitor ou falante-texto-


ouvinte...”. Koch; Elias (2009a) lembram que a leitura é uma atividade que
valoriza as experiências e os conhecimentos do leitor, o que permite afirmar
que o leitor participa ativamente da construção de sentido dos textos com os
quais se depara.
Dessa forma, não é possível conceber uma atividade tão rica como uma
simples busca de informações; como se o leitor se dirigisse ao texto e
buscasse o que quisesse sem deixar nele as suas marcas ou sem dar
significados a ele. Ou ainda pior, se não possuísse já uma experiência de vida
e de leitura que o preparasse para esse diálogo com o texto.
Kleiman (1984, p.13) lembra que “o leitor utiliza na leitura o que ele já
sabe, o conhecimento adquirido ao longo de sua vida” e enumera esses
conhecimentos: textual, lingüístico e de mundo. Dessa forma, quanto mais
desses conhecimentos se tem, mais há possibilidade de compreensão.
Já Marcuschi (2008, p.242) afirma que:

Os efeitos de sentido são produzidos pelos leitores ou ouvintes na


relação com os textos, de modo que as compreensões daí
decorrentes são fruto do trabalho conjunto entre produtores e
receptores em situações reais de uso da língua. O sentido não está
no leitor, nem no texto, nem no autor, mas se dá como um efeito das
relações entre eles e das atividades desenvolvidas.

Desse modo, a leitura é uma atividade interativa na medida em que para


um texto ter significado ele precisa de um leitor já prenhe de conhecimentos,
um leitor que interaja com o texto lido e construa o sentido dele.

1.3 Os conhecimentos prévios na leitura

Foi falado no tópico anterior, sobre a importância da relação autor-texto-


leitor no processo de compreensão. Koch; Elias (2009a, p. 21) a esse respeito,
afirmam que “a leitura e a produção de sentido são atividades orientadas por
nossa bagagem sociocognitiva: conhecimentos prévios da língua e das coisas
do mundo (lugares sociais, crenças, valores, vivências)”.
Para Kleiman (1984) o leitor traz consigo um repertório, o qual será
usado na construção de sentido do texto. Esses conhecimentos ativados pelo
13

leitor no momento da leitura são chamados de prévios. A autora especifica,


ainda, esses conhecimentos, classificando-os em conhecimento de mundo,
conhecimento lingüístico e conhecimento textual.

1.3.1 Conhecimento de mundo

O conhecimento de mundo pode ser também identificado por


conhecimento enciclopédico. É aquele que o falante constrói ao longo da vida,
seja formal ou informalmente, a respeito das coisas que o cercam. Kleiman
(1984, p. 21) afirma que esse conhecimento abrange desde “o domínio que um
físico tem sobre sua especialidade até o conhecimento de fatos como ‘o gato é
um mamífero’, ‘Angola está na África’...”
Todo texto refere-se a algum assunto e, portanto, quanto mais se sabe
de antemão sobre o tema tratado, mais se tem chance de entender o dito no
texto. Um exemplo de insucesso na compreensão por falta desse
conhecimento é a relação de um leigo em medicina com um texto que utilize
conhecimento muito específico da área. Sua falta de conhecimento sobre o
assunto tratado, possivelmente, prejudicará sua compreensão.

1.3.2 Conhecimento lingüístico

Segundo Kleiman (1984, p. 13), “trata-se de um conhecimento implícito,


não verbalizado, nem verbalizável na grande maioria das vezes, que faz com
que falemos português como falantes nativos”. São os conhecimentos
referentes ao uso da língua. Dessa forma, é necessário possuir esse tipo de
conhecimento para que haja o entendimento e a compreensão.
Há vários termos da língua que assumem significações distintas
dependendo das relações que estabelecem com outros termos. Perceber o
valor semântico de conectores como mas, portanto, pois, quando, entre outros,
pode auxiliar na compreensão de algumas sentenças. Numa frase como
cheguei cedo ao cinema e não consegui lugar para sentar, o falante precisa
saber que o conectivo e assume por vezes a função de adversativo; só então
conseguirá entender efetivamente a frase.
14

1.3.3 Conhecimento textual

Refere-se ao que se sabe sobre as estruturas textuais, sejam as


sequências tipológicas narração, descrição, dissertação, exposição e injunção;
sejam os mais variados gêneros do discurso.
Sobre este tipo de conhecimento, Kleiman (1984, p. 20), diz:

Quanto mais conhecimento textual o leitor tiver, quanto maior a sua


exposição a todo tipo de texto, mais fácil será sua compreensão,
pois [...] o conhecimento de estruturas textuais e de tipos de discurso
determinará, em grande medida, suas expectativas em relação aos
textos, expectativas estas que exercem um papel considerável na
compreensão.

Assim, um leitor assíduo de notícias, antes mesmo de ler uma delas, já


começa um processo de compreensão, uma vez que conhece o gênero e sabe
do que o mesmo costuma tratar.
Conhecer um grande número de gêneros do discurso faz com que o
leitor esteja preparado para lê-los com autonomia. Ao se deparar com uma
piada, por exemplo, se ele souber que se trata de uma pequena narrativa com
o objetivo de fazê-lo rir, já criará a expectativa acerca do humor que o texto
pode lhe proporcionar. O mesmo com todos os demais gêneros do discurso.

1.4 Estratégias de leitura

Se ler é uma atividade dialógica na medida em que exige do leitor mais


que a retirada de informações do texto, então se faz necessário pensar em
ações que deem ao leitor um caminho para se chegar à compreensão. É
preciso ensinar o leitor a utilizar estratégias de leitura, as quais não só o
envolvem no ato de ler, como também vão dando um norte ao mesmo,
orientando-o no processo de construção de sentido do texto.
Sobre o processo de leitura, Koch; Elias (2009a, p.39) afirmam:

Dizer que o processamento textual é estratégico significa que os


leitores, diante de um texto, realizam simultaneamente vários passos
interpretativos finalisticamente orientados, efetivos, eficientes,
flexíveis e extremamente rápidos.
15

As estratégias de leitura são um meio importante na busca dessa


construção de sentidos, “são uma capacidade cognitiva de ordem mais
elevada, intimamente relacionada à metacognição e que permite controlar e
regular a atuação inteligente” (SOLÉ, 1998, p. 69). Importa considerar que ela
regula as atividades das pessoas, à medida que sua aplicação permite
selecionar, avaliar, persistir ou abandonar certas ações para conseguir a meta
a que se propõe o leitor.
É importante trazer novamente Koch; Elias (2009a, p. 18) que afirmam:

Na atividade de leitores ativos, estabelecemos relações entre nossos


conhecimentos anteriormente constituídos e as novas informações
contidas no texto, fazemos inferências, comparações, formulamos
perguntas relacionadas com o seu conteúdo. Mais ainda:
processamos, criticamos, contrastamos e avaliamos as informações
que nos são apresentadas, produzindo sentido para o que lemos.
Em outras palavras, agimos estrategicamente, o que nos permite
dirigir e autorregular nosso próprio processo de leitura.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN’s) apontam quatro


estratégias sem as quais não se pode haver proficiência em leitura: seleção,
antecipação, inferência e verificação. O documento diz ainda que “o uso
dessas estratégias que possibilita controlar o que vai sendo lido, permitindo
tomar decisões diante de dificuldades de compreensão, avançar na busca de
esclarecimentos, validar no texto suposições feitas”.
Interessante se faz comentar que todo leitor proficiente realiza esse
procedimento no momento da leitura automaticamente. Solé (1998) diz que o
leitor experiente utiliza as estratégias de forma inconsciente. O ideal é
exatamente fazer com que os alunos consigam apreenderem as estratégias, a
fim de usá-las de modo automático, atingindo assim um estado estratégico.
A autora considera as estratégias um procedimento e, por isso, ressalta
a necessidade de ensiná-las. Elas “não amadurecem, nem se desenvolvem,
nem emergem, nem aparecem. Ensinam-se – ou não se ensinam – e se
aprendem – ou não se aprendem” (SOLÉ, 1998, p. 70). A mesma autora
adverte para o fato de não tratá-las como técnicas precisas, receitas infalíveis
ou habilidades específicas, por se tratarem de “procedimentos de ordem
elevada que envolvem o cognitivo e o metacognitivo” (SOLÉ, 1998, p. 70).
Assim, faz-se necessário o ensino de estratégias de compreensão
16

leitora na escola, pois as mesmas não só orientam as ações para a


interpretação textual como também reforçam o sentido de co-responsabilidade
entre autor-texto-leitor na busca pelo sentido. Mais que isso, assimilando
estratégias, os alunos terão condições de usá-las nos mais diversos gêneros
textuais com os quais se depararem, já que elas não estão sujeitas de forma
exclusiva a um tipo de conteúdo ou a um gênero textual, podendo adaptar-se a
diferentes situações de leitura. (SOLÉ, 1998)

1.5 A leitura no ambiente escolar

Mesmo diante de informações como as expostas até aqui, o que se vê é


uma prática ainda retrógrada no que se refere ao trabalho com a leitura. Livros
didáticos continuam formulando exercícios baseados numa concepção de
leitura como decodificação. Marcuschi (2008, p. 270) ilustra a situação: “ainda
continua muito presente nos LDs [livros didáticos] atuais a atividade de leitura
superficial.” O autor atenta para o fato de as perguntas presentes nos livros não
incentivarem a compreensão. Ele sugere que se observe se as perguntas têm
um caráter crítico, se consideram o aspecto multimodal dos textos e se dão
conta da atividade solidária desenvolvida na leitura de textos em situações da
vida diária.
Um estudo do mesmo autor aponta que 70% das perguntas dos livros
didáticos analisados tratam de questões que não estimulam o raciocínio lógico
do leitor, deixando a este a tarefa de identificar informações explícitas no texto.
Apenas 10% instigam o leitor a interagir efetivamente com o texto, pensando e
usando seu conhecimento prévio. Assim, o professor que segue o livro didático
sem uma postura crítica corre o risco de não ensinar seus alunos a lerem.
O papel da escola não é outro senão ensinar os alunos a compreender.
Tendo esse instrumento, o estudante será capaz de, autonomamente, aprender
os mais diversos conteúdos. Parafraseando Solé (1998), a escola tem que se
ocupar com o ensino de estratégias adequadas para a compreensão de textos.
Tem também o papel de ensinar a leitura aos alunos, considerando que o
mesmo já possui conhecimentos prévios capazes de sustentar sua
compreensão.
Torna-se necessário, então, ensinar ao aluno os conhecimentos
17

necessários à compreensão: o conhecimento de mundo, o lingüístico e o


textual. Dentre esses conhecimentos prévios, é interessante notar como o
conhecimento textual, o de vários gêneros discursivos, pode auxiliar num
caminho estratégico, uma vez que cada gênero costuma se constituir a partir
de determinados assuntos e estilos lingüísticos.
18

CAPÍTULO II

CONHECIMENTO TEXTUAL: SELECIONANDO FERRAMENTAS PARA A


CONSTRUÇÃO DOS SENTIDOS

2 GÊNEROS TEXTUAIS

2.1 Noção de texto

Dentro dos estudos contemporâneos da linguagem, é possível


reconhecer que não há como se comunicar senão através de textos. Eles são
as formas de se concretizar os vários discursos nascidos para a interação entre
os enunciadores. Mas nem sempre é fácil definir com exatidão o que vem a ser
um texto. Uma possibilidade de definição seria a de que “um texto é, pois, um
todo organizado de sentido, delimitado por dois brancos e produzido por um
sujeito num dado espaço e num dado tempo.” (FIORIN; SAVIOLI, 2004, p. 18).
Para Marcuschi (2008, p.72):

O texto pode ser tido como um tecido estruturado, uma entidade


significativa, uma entidade de comunicação e um artefato
sociohistórico. De certo modo, pode-se afirmar que o texto é uma
(re)construção do mundo e não uma simples refração ou reflexo.

Percebe-se, pois, a complexidade da definição desse termo, uma vez


que tudo pode ser um texto, desde que contenha sentido, organização lógica e
que se enquadre num contexto comunicativo e interacional, também
significativos. Em outras palavras, tudo aquilo que possa ser lido.
Ainda sobre estas formas de interação, é possível afirmar que são um
produto da sociedade e, portanto, se manifestam de diversas formas, de
acordo com o contexto sócio-comunicativo em que se inserem os
interlocutores. Os estudos contemporâneos da linguagem colocam o texto no
centro de toda questão que envolve a língua e o elege como objeto de estudo
19

da ciência da língua, a linguística.


O texto é tido como unidade básica de comunicação, sem o qual seria
impossível haver qualquer tipo de interação. A necessidade de se escrever
uma declaração, por exemplo, faz com que se escreva um texto do gênero
declaração e não outro; bem como a iniciativa de participar de uma conversa
espontânea, o desejo de escrever um conto ou ainda a realização de um
debate.

2.2 Definição de gêneros textuais

Pode-se dizer que os inúmeros textos produzidos para interação dos


interlocutores encaixam-se de certa forma em determinado gênero. Assim, os
usuários da língua podem ler ou escrever uma carta pessoal, um artigo de
opinião, uma crônica ou qualquer outro gênero, dependendo do contexto
comunicativo em que se encontre.
Já foi o tempo em que o professor pedia a um aluno que produzisse um
texto. Produzir um texto é algo tão complexo como defini-lo, o que se viu
acima. Todas as pessoas são produtoras de textos, mas ao fazê-lo, se valem
de certas formas de expressão, os gêneros. Assim, pedir a uma pessoa que
escreva uma fábula ou um artigo de opinião já dá a ela uma noção do que, de
fato, ela terá de fazer. Da mesma forma, dizer ao aluno que se lerá um
determinado gênero, já cria no mesmo uma expectativa acerca do texto a ser
lido.
A expressão gênero não é nova e é utilizada por diversas áreas do
conhecimento. Na esfera da linguagem, o termo remonta a Platão há vinte e
cinco séculos. Tradicionalmente, o termo esteve ligado à retórica e à literatura.
Porém, ultimamente, no campo da linguagem, seu significado vem mudando:
“essa noção encontrou, provavelmente pela primeira vez, uma extensão
considerável na obra de Bakhtin”, (DOLZ; SCHNEUWLY, 2004, p. 25), sendo
adotada, na área dos estudos da linguagem, para se referir a todo e qualquer
texto.
O mesmo Bakhtin (1992) afirma que cada esfera de troca social elabora
enunciados relativamente estáveis em cuja constituição entram elementos
referentes ao conteúdo temático, composição e estilo.
20

Segundo Marcuschi (2008), a noção de gênero refere-se a uma


categoria distintiva de discurso de qualquer tipo, falado ou escrito, com ou sem
aspirações literárias. Ressalta-se o valor distintivo do gênero, uma vez que
cada qual possui características próprias, capazes de assegurar sua
identidade. Assim quem escreve uma biografia, não estará fazendo um
editorial. Quem necessita ler uma receita, não procurará um conto.
Fábulas e relatos de experiências vividas são exemplos de dois textos
diferentes, dois gêneros distintos. Cada um com suas particularidades. O
mesmo acontece com uma receita médica e uma monografia de final de curso.
De acordo com Marcuschi (2008), há a produção de textos similares na
estrutura, os quais circulam em ambientes próprios.
Porém, dizer similares na estrutura não é sinônimo de querer modelar o
discurso dos enunciadores. Não se pode conceber os gêneros como modelos
estanques nem como estruturas rígidas; eles são formas culturais e cognitivas
de ação social e, portanto, entidades dinâmicas.
Esse dinamismo social que marca o uso dos gêneros do discurso
sustenta o que o próprio Bakhtin (1992) já dissera com a expressão
“relativamente estáveis”. O que garante a identidade de um gênero é um
conjunto de fatores como seu estilo, seu tema, sua estrutura, sua finalidade,
entre outros. Portanto, cabe aos enunciadores e aos leitores apreenderem suas
características mais evidentes para utilizá-los em seu dia-a-dia.
Quanto ao uso dos gêneros, Marcuschi (2008, p. 154) considera:

É impossível não se comunicar verbalmente por algum gênero,


assim como é impossível não se comunicar verbalmente por algum
texto. Isso porque toda a manifestação verbal se dá sempre por meio
de textos realizados em algum gênero.

De acordo com Dolz; Schneuwly (2004), o gênero é um instrumento;


uma ferramenta, uma vez que um sujeito age discursivamente numa situação
definida para conquistar algo. É, pois, condição necessária à comunicação e
interação como salienta Bakhtin (1992, p. 302):

Se não existissem os gêneros do discurso e se não os


dominássemos; se tivéssemos de criá-los pela primeira vez no
processo da fala; se tivéssemos de construir cada um de nossos
enunciados, a comunicação verbal seria quase impossível
21

2.3 Tipologia textual

É preciso saber diferenciar o gênero textual do tipo textual. Este, nas


palavras de Marcuschi (2005, p.22) designa “uma espécie de construção
definida pela natureza lingüística de sua composição (aspectos lexicais,
sintáticos, tempos verbais, relações lógicas). Em geral, os tipos textuais
abrangem cerca de meia dúzia de categorias conhecidas como: narração,
argumentação, exposição, descrição, injunção”.
Os tipos textuais, como diz Marcuschi (2005), constituem sequências
lingüísticas, mas não textos.. O autor diz que a expressão “tipo de texto”,
embora muito usada nos livros didáticos e no dia-a-dia é equivocadamente
empregada e não designa um tipo, mas um gênero. Segundo ele, quando se
fala que a carta é um tipo de texto não muito usado na atualidade, se quer dizer
a carta é um gênero não muito usado.
Dizer que um texto é narrativo é incorrer num erro muito comum entre as
pessoas, pois ele não será formado apenas por sequências narrativas, além de
ser possível identificar uma variedade de gêneros em que predomine essa
sequência, como fábulas, contos, crônicas, romances, histórias em quadrinhos,
filmes, além de outros.
Dessa forma, um gênero costuma ser constituído por mais de um tipo
textual, podendo haver a predominância de um deles. A esse respeito
Marcuschi (2008) diz que é possível notar que uma grande heterogeneidade
tipológica nos gêneros textuais.
É importante mostrar ao aluno essa diversidade de tipos dentro dos
gêneros, além de como os gêneros costumam ser constituídos e qual tipo
textual predomina em determinados gêneros discursivos. Faz-se necessário
fazer o aluno apreender o funcionamento das tipologias textuais para que
possam aumentar seu conhecimento textual, fazendo crescer, assim, seus
conhecimentos prévios e sua chance de interpretação de textos.
Koch; Elias (2009b, p. 63) afirma sobre esse assunto:

A par da familiarização com os gêneros, é possível levar o aluno a


depreender, entre determinadas sequências ou tipos textuais –
narrativas, descritivas, expositivas, etc. - um conjunto de
características comuns, em termos de estruturação, seleção lexical,
uso de tempos verbais, advérbios (de tempo, lugar, modo, etc.) e
22

outros elementos dêiticos, que permitem reconhecê-las como


pertencentes à determinada classe.

2.4 Agrupamentos de gêneros

Como se viu até aqui, os gêneros do discurso apresentam


características que lhes dão identidade própria, marcas distintivas. Porém,
Dolz; Schneuwly (2004, p. 120) afirmam que “os gêneros podem ser agrupados
em função de um certo número de regularidades lingüísticas e de
transferências possíveis”.
Esses agrupamentos levam em conta aspectos como os domínios
sociais de comunicação e as capacidades de linguagem dominantes em cada
gênero. Dessa forma, os autores tentam uma sistematização, propondo a
existência de cinco agrupamentos.
Um deles é o Narrar, agrupamento de gêneros cujo domínio social de
comunicação é a cultura ficcional. A capacidade de linguagem dominante
nesses textos é a mimeses da ação através da criação de intriga. São
exemplos de gêneros desse agrupamento a fábula, o conto maravilhoso, a
lenda, a novela fantástica, entre outros.
Um segundo agrupamento é o Relatar, o qual abarca os gêneros
pertencentes ao domínio social da documentação e memorização de ações
humanas. Esses textos exploram a representação pelo discurso de
experiências vividas, situadas no tempo. Notícias, relatos de experiências
vividas, testemunhos e reportagens são alguns exemplos dos gêneros do
agrupamento em questão.
Outro grupo é o Argumentar, agrupamento de gêneros do domínio da
discussão de problemas sociais controversos. Nesses textos, a capacidade de
linguagem dominante é a sustentação, refutação e negociação de tomadas de
posição. Exemplos de gêneros desse agrupamento são cartas do leitor, debate
regrado, artigo de opinião, carta de reclamação, entre outros.
Um outro agrupamento é o Expor, composto por gêneros destinados à
transmissão e construção de saberes. A capacidade de linguagem dominante
nesses textos é a apresentação textual de diferentes formas dos saberes.
Alguns exemplos desse agrupamento são os seminários, as conferências, os
relatórios científicos.
23

Por fim, Descrever ações, agrupamento de gêneros do domínio social


das instruções e das prescrições. Nesse grupo, a principal capacidade de
linguagem é a regulação mútua de comportamentos. Instruções de montagem,
receitas, regulamentos, regras de jogo e instruções de uso são alguns
exemplos desse agrupamento.
Por fim, interessante se faz comentar que esses agrupamentos não são
estanques. Não se pode classificar um gênero de forma absoluta num deles.
Pode-se, sim, definir gêneros que possam ser protótipos para cada
agrupamento.

2.5 Gêneros e sociedade

Falou-se há pouco da semelhança existente entre determinados textos


que os fazem receber a mesma denominação quanto ao gênero. Marcuschi
(2008) chama a atenção para o fato de que todos os que escrevem uma
monografia de final de curso, por exemplo, fazem mais ou menos a mesma
coisa; assim como resenhas, notícias, telefonemas, tirinhas, entre outros.
Discorrendo sobre os gêneros textuais, Koch; Elias (2009b, p. 54) assim
se expressam:
Essas práticas comunicativas, de tão comuns, propiciam-nos a
construção de um “modelo” sobre o que são, como se definem, em
que situação devemos produzi-las, a quem devem ser endereçadas,
que conteúdo é esperado nessas produções e em que estilo fazê-lo.

De certa forma, os enunciadores possuem o que Koch; Elias (2009b)


chamam de “competência metagenética”, e que diz respeito ao conhecimento
dos gêneros textuais, sua caracterização e função. Essa competência orienta a
compreensão sobre os gêneros textuais. Tudo isso fruto do contato dos
falantes/ouvintes com a sociedade em que vivem e com os gêneros nela
veiculados.
Dominar os gêneros textuais torna-se imprescindível para a interação,
uma vez que ela só se torna viável, como já dito acima, através dos gêneros.
Marcuschi (2008) diz que dominar um gênero textual é dominar uma forma de
realizar linguisticamente objetivos específicos em situações sociais
particulares. Apropriar-se dos gêneros do discurso é um mecanismo essencial
24

na sociedade, uma vez que insere o indivíduo nas atividades comunicativas


humanas.
Assim, parafraseando Bakhtin (1992), todas as atividades humanas
estão relacionadas ao uso da língua; dessa forma, não se pode tratar o gênero
de discurso independentemente de sua realidade social e de sua relação com
as atividades humanas.
Os gêneros nascem, assim, da necessidade que determinadas esferas
de interação apresentam para a realização da comunicação. Um exemplo atual
é o surgimento de vários gêneros novos oriundos do meio tecnológico, como o
e-mail, por exemplo. Esse gênero é fruto da necessidade social de interação;
assim como todos os outros.
Tratando das transformações que a sociedade aplica ao uso dos
gêneros, Bakhtin (1992) faz uma distinção entre gêneros primários e
secundários. O autor diz que os primeiros são constituídos em situações de
comunicação ligadas a esferas sociais cotidianas de relação humana; os
segundos são relacionados a outras esferas, públicas e mais complexas, de
interação social. Estes últimos se formam a partir dos gêneros primários,
absorvendo-os e transmutando-os.
Essa distinção mostra como os gêneros do discurso são atrelados às
atividades humanas, como eles se deixam transformar de acordo com os
propósitos comunicativos dos enunciadores. Sobre isso, Marcuschi (2008, p.
159) afirma: “As distinções entre um gênero e outro não são
predominantemente lingüísticas e sim funcionais”; o que quer dizer que eles
estão amarrados aos usos reais da linguagem, à sua prática diária e social, à
sua finalidade comunicativa.
Há que se considerar, ainda, o caráter de controle social e de exercício
de poder presente no domínio dos gêneros textuais. Quanto a isso, Marcuschi
(2008, p. 161) salienta: “se prestam aos mais variados tipos de controle social e
até mesmo ao exercício de poder”. Os gêneros são uma forma de inserção
social; o indivíduo é um ser sociável à medida que domina formas de
expressão e de interpretação, no caso, os gêneros. Conhecer um gênero
significa poder entendê-lo e através dele se expressar.
De acordo com Dolz; Schneuwly (2004), os gêneros são instrumentos,
no sentido de que um sujeito os utiliza para conquistar algo. Assim, quanto
25

maior o número de gêneros que uma pessoa domina, maior a possibilidade de


sucesso nas relações interacionais e de leitura. Uma pessoa com um repertório
parco quanto aos gêneros do discurso, provavelmente, apresentará dificuldade
de expressão e consequentemente terá dificuldade no relacionamento social,
seja no ambiente profissional, familiar ou nos círculos de amigos.
Portanto, sintetizando as ideias dos teóricos acima, pode-se dizer com
segurança que os gêneros textuais constituem uma questão social, uma vez
que dizem respeito ao funcionamento da sociedade e que regulam toda e
qualquer forma de interação entre as pessoas.

2.6 Contexto de produção

Todo gênero está envolto por um contexto de produção, circulação e


recepção. Na verdade, este contexto acaba determinando o gênero, uma vez
que cada um possui suas especificidades acerca desse processo. Por contexto
de produção, circulação e recepção, entende-se tudo o que envolve o texto no
percurso feito, desde sua produção até sua recepção.
Na produção de um texto, um autor tem em mente um leitor, o qual
receberá seu texto. O autor deve ter uma finalidade com essa produção. Tudo
isso ocorre num ambiente, num lugar discursivo. Por sua vez, o leitor também
será próprio de um domínio discursivo e terá os seus objetivos de leitura.
Dolz; Schneuwly (2004, p. 25) afirmam que

Cada esfera de troca social elabora tipos relativamente estáveis de


enunciados; três elementos os caracterizam: conteúdos temático,
estilo e construção composicional; a escolha ; a escolha de um
gênero se determina pela esfera, as necessidades temáticas, o
conjunto dos participantes e a intenção do locutor.

Como lembra Marcuschi (2008, p.150) “cada gênero textual tem um


propósito bastante claro que o determina e lhe dá uma esfera de circulação”. O
enunciador escreverá determinado gênero de acordo com sua finalidade ao
fazê-lo; seja convencer, informar, divertir; enfim, o objetivo de produção de um
texto orienta a escolha do gênero textual que melhor materialize o discurso do
enunciador.
26

2.7 Gêneros textuais e escola

Como visto até aqui, os textos são o centro da comunicação humana.


Esses textos sempre aparecem em forma de algum gênero; o que valida a
ideia de que, no processo de interação pela língua, o conhecimento e o
domínio dos gêneros são imprescindíveis a todo enunciador em potencial, tanto
para se expressar, como também para compreender os textos que lê.
Dessa forma, cabe à escola o papel de apresentar os gêneros textuais
aos alunos, ensinando-os. Dolz; Schneuwly (2004) lembram que não se pode
supor que os alunos aprendam naturalmente os diversos gêneros escritos e
orais de uso diário. É preciso, pois, ensinar os gêneros aos alunos para que
estes possam se instrumentalizar para agirem discursivamente.
Um ensino a partir de gêneros textuais torna-se interessante na medida
em que eles são uma espécie de ponto de referência para os alunos.
(MARCUSCHI, 2008) Um professor que pede uma produção textual e já
antecipa o gênero cobrado, ajuda o aluno a seguir um caminho já percorrido
por muitos outros de sua sociedade, dá um parâmetro ao aluno, contextualiza a
produção a ser feita. No momento da leitura, se o aluno soube que gênero será
trabalhado, já criará expectativas acerca do que será lido.
Sobre isso, Antunes (2009, p.60) afirma:

Com o estudo dos gêneros, as dificuldades de produção e de


recepção dos textos seriam mais facilmente atenuadas e,
progressivamente, superadas. A familiaridade dos alunos com a
diversidade dos gêneros os deixaria aptos a perceberem e a
internalizarem as regularidades típicas de cada um desses gêneros,
além de favorecer a capacidade de alterar os modelos e criar outros
novos.

Ainda, quanto a ensinar gêneros textuais na escola, Koch; Elias (2009b,


p. 74) dizem que cabe a esta instituição:

Possibilitar ao aluno o domínio do gênero, primeiramente, para


melhor conhecê-lo, produzi-lo na escola ou fora dela; para
desenvolver capacidades que ultrapassam o gênero e são
transferíveis para outros gêneros próximos ou distantes.

Ao aprender um gênero, o aluno perceberá as características peculiares


a este gênero de discurso e provavelmente não terá problemas na escrita ou
27

na leitura do mesmo. Quando lhe for pedido um outro gênero textual, ele terá
de perceber que, assim como o primeiro, o segundo gênero também terá suas
especificidades. E assim, a cada novo gênero com o qual o aluno entrar em
contato, conseguirá respeitar suas particularidades no que tange à escrita e à
leitura.
Interessante também é lembrar que ao centrar o ensino de língua nos
gêneros textuais, não se deixa de ensinar a gramática, uma vez que cada
gênero tem suas características quanto aos usos de linguagem e essas
características devem ser ensinadas juntamente com os gêneros. Trata-se de
privilegiar aquilo que, de fato, terá um valor significativo, como lembra Antunes
(2009, p.58) “Na perspectiva dos gêneros, ainda, as regras gramaticais
ganhariam seu caráter de funcionalidade, uma vez que seriam exploradas de
acordo com as particularidades de cada gênero”.
Fazer o aluno pensar por gêneros é instrumentalizá-lo tanto para a
produção como para a recepção de textos. No que se refere à recepção,
cumpre observar que ao apreender um gênero, o aluno estará enriquecendo
seu conhecimento textual, um de seus conhecimentos prévios; e assim, se
preparando para a interação com os textos e sua futura compreensão.
28

CAPÍTULO III

O GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO: DA CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS


À CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA

3 ANÁLISE E LEITURA DO GÊNERO ARTIGO DE OPINIÃO

3.1 O conhecimento textual na construção dos sentidos

Nos dois capítulos anteriores, tratou-se de aspectos importantes no


estudo da leitura e também dos gêneros do discurso. Como se pode ver, um
dos conhecimentos prévios da leitura é o chamado conhecimento textual, o
qual compreende tudo o que o leitor sabe a respeito do gênero com o qual se
depara no momento da leitura. Quando o leitor sabe de antemão o gênero que
lerá, cria expectativas acerca do conteúdo a que estará exposto.
Como já foi citado no capítulo destinado à leitura, Kleiman (1984)
defende a ideia de que quanto maior o conhecimento textual, maior a chance
de compreensão, já que o conhecimento das estruturas textuais e dos tipos de
discurso determina a expectativa do leitor em relação aos textos.
Dessa forma, ao se dizer para o aluno que ele lerá uma fábula, cria-se
uma expectativa de leitura; a qual será diferente de quando se ler para o
mesmo aluno uma propaganda ou uma notícia.
Importa, aqui, considerar a interação como fator relevante na construção
do sentido do texto. O profissional da leitura ativa os conhecimentos prévios do
aluno e neste caso o conhecimento textual. Sobre isso, Solé (1998, p.75)
afirma: “... é uma ‘construção conjunta’, parece claro que, embora o aluno seja
o protagonista, o professor também desempenhará um papel de destaque”.
As considerações feitas até então permitem aceitar a ideia de que
conhecer bem um gênero discursivo é condição necessária para uma leitura
eficaz. Pode-se dizer que a compreensão de um texto começa antes da leitura
do mesmo. Pensando assim, parece coerente um trabalho no sentido de
29

aumentar o conhecimento textual dos alunos, para que os mesmos possam


estar mais bem preparados em uma atividade de leitura; para que possam
estar preparados para interagir com o texto, criando expectativas acerca dos
mesmos.

3.2 O artigo de opinião

Pensando no que foi exposto até aqui, pode-se considerar o gênero


artigo de opinião para uma análise do que foi exposto até o presente momento.
Bräkling (2000, p. 226) apresenta o gênero:

O artigo de opinião é um gênero de discurso em que se busca


convencer o outro de uma determinada ideia, influenciá-lo,
transformar os seus valores por meio de um processo de
argumentação a favor de uma determinada posição assumida pelo
produtor e de refutação de possíveis opiniões divergentes. É um
processo que prevê uma operação constante de sustentação das
afirmações realizadas, por meio da apresentação de dados
consistentes, que possam convencer o interlocutor.

Pela definição acima, fica claro o motivo de se trabalhar com o gênero


na escola. A mesma obra afirma que o ensino-aprendizagem da produção do
artigo de opinião justifica-se pela sua relevância sociodiscursiva, dada sua
importância como um dos instrumentos para a promoção da efetiva
participação social do aluno-cidadão. O gênero é trabalhado pela escola “com o
objetivo de formar leitores críticos e construtores dos diversos textos que
circulam na sociedade” (CUNHA, 2005, p. 166)

3.2.1 Contexto de produção

Quanto à autoria, Rangel; Gagliardi; Amaral (2010, p. 19) trazem a


seguinte afirmação “é assinado por um articulista que, jornalista profissional ou
não, normalmente é autoridade no assunto ou uma ‘personalidade’ cujas
posições sobre questões debatidas publicamente interessam a muitos”.
Esse articulista tem como destinatário todo aquele que quer saber o que
se pensa a respeito de determinado assunto polêmico. É o leitor de jornais,
revistas e da internet, suportes mais utilizados para a circulação do gênero
30

artigo de opinião.
Ao escrever um texto desse gênero, o autor tem como objetivo
demonstrar seu ponto de vista a respeito de determinado assunto controverso,
tentando convencer o leitor de que sua opinião é válida. Rangel; Gagliardi;
Amaral (2010, p.20) lembram que “o articulista, ao escrever, assume posição
própria nesse debate, procurando justificá-la”.

3.2.2 Conteúdo temático

No que se refere à temática, Rangel; Gagliardi; Amaral (2010, p. 17)


trazem: “Referem-se, em geral, a problemas que demandam soluções mais ou
menos consensuais, decisões a serem tomadas, rumos a serem seguidos,
valores a serem discutidos e/ou relembrados”. Os mesmos autores afirmam
que são questões polêmicas, as quais estão em aberto, em processo de ampla
discussão social.
O tema de um texto desse gênero sempre será controverso. O que está
em jogo é, exatamente, defender um ou outro ponto de vista. Assim, temas
como a transposição das águas do Rio São Francisco, a questão fundiária no
Brasil ou o apoio à redução da maioridade penal para 16 anos são exemplos
do que pode servir de conteúdo ao gênero.

3.2.3 Organização geral

Os artigos de opinião constituem-se de um título e de parágrafos. Sobre


a estrutura dos parágrafos, Takazaki (2004, p. 104) diz:

Os artigos de opinião costumam conter uma apresentação que


justifica a abordagem do assunto ou contextualiza o texto; a tese que
pode ser declarada ou deduzida pelo leitor a partir dos argumentos,
contra-argumentos e contextualização apresentada; os argumentos
em favor da tese e a conclusão que reforça a tese defendida.

Importante lembrar que o gênero dá ao autor a liberdade de como fazer,


por exemplo, a apresentação do assunto; sendo possível recorrer a trechos
expositivos, narrativos ou mesmo argumentativos para iniciar o artigo.
Essa possibilidade de usar várias tipologias permeia todo o texto. Sobre
31

o gênero, Rodrigues (2000, p. 215) afirma que

Uma de suas características é a heterogeneidade genérica, isto é, na


sua configuração composicional encontram-se, muitas vezes, mais
ou menos marcados, fragmentos de outros gêneros, por exemplo,
relatos, que funcionam no todo do gênero como estratégias
discursivas de sustentação da argumentação.

A tese ou opinião pode ou não estar explícita, como afirma Takazaki


(2004). Os argumentos vêm a seguir e sua ordem pode revelar, como diz
Bräkling (2000, p. 227), maior ou menor força locucional. Sobre esse aspecto,
Cunha (2005, p. 175) afirma que “o artigo de opinião utiliza os argumentos
numa ordem que vai do menos para o mais forte.”
Por fim a conclusão finaliza o texto, geralmente reafirmando o que se
defendeu durante todo o percurso argumentativo.
Reconhecer a estrutura de um gênero é fator relevante para a
compreensão de textos. A esse respeito, Fregonezi (2003, p.86) diz: “O
conhecimento dos tipos, das estruturas, da organização de cada tipo de texto é
um componente que atua no processo de compreensão”.

3.2.4 Marcas lingüísticas e enunciativas

Sobre as marcas lingüísticas do gênero, Bräkling (2000, p. 227)


considera relevante

A organização do discurso quase sempre em 3ª pessoa; o uso do


presente do indicativo- ou do subjuntivo- na apresentação da
questão, dos argumentos e contra-argumentos; a possibilidade de
uso do pretérito em uma explicação ou apresentação de dados; a
presença de citações de palavras alheias; a articulação coesiva por
operadores argumentativos.

Ainda no que se refere à linguagem, percebe-se o caráter dialógico e


polifônico envolto nos artigos. Rangel; Gagliardi; Amaral (2010, p. 20) afirmam:

Ao escrever seu artigo, o articulista toma determinado


acontecimento, ou o que já foi dito a seu respeito, como objeto de
crítica, de questionamento e até de concordância. Ele apresenta seu
ponto de vista inserindo na história e no contexto do debate de que
pretende participar. Por isso mesmo, tende a incorporar a seu
discurso a fala dos participantes que já se pronunciaram a respeito
do assunto, principalmente os mais marcantes.
32

Possuindo todas as informações ou parte significativa delas, o leitor de


um artigo de opinião, ao ler um texto desse gênero, não terá dificuldades de
entendê-lo. Antes, o que ocorrerá é uma construção do sentido, uma interação
entre texto e leitor. Este utilizará desse seu conhecimento textual, o
conhecimento acerca do gênero artigo de opinião, num estado estratégico para
buscar o entendimento do texto.

3.3 Leitura e análise de um artigo de opinião

A título de exemplificação, segue uma proposta de trabalho com um


texto do gênero artigo de opinião.

Fumante não é excluído. É vítima


Jussara Fiterman
Muito me surpreendeu o artigo publicado na edição de 14 de outubro, de
autoria de um estudante de Jornalismo que compara a legislação antifumo ao
nazismo, considerando-a um ataque à privacidade humana. Esta comparação
demonstra um completo desconhecimento do que foi o Holocausto e das
atrocidades infligidas pelos nazistas. Além disto, em poucas linhas o jovem
estudante vai contra pesquisadores, cientistas, médicos e cidadãos do mundo
inteiro que lutam incessantemente para evitar as mais de 5 milhões de mortes
ao ano relacionadas ao tabagismo. Número este que deve crescer para 8
milhões em 2030, de acordo com a Organização Mundial da Saúde.
Ao contrário do que afirma o artigo, os fumantes têm, sim, sua
privacidade preservada. Lamentavelmente para eles, têm o direito de consumir
o único produto legal que causa a morte da metade de seus usuários regulares.
Para isso, só precisam respeitar o mesmo direito à privacidade dos não
fumantes, não impondo a eles que respirem as mesmas substâncias que
optam por inalar, e que em alguns casos saem da ponta do cigarro em
concentrações ainda maiores. A lei, no entanto, vai além: busca proteger este
indivíduo. Para se ter uma ideia, na Itália, em 2005, um ano após o banimento
do tabaco de locais públicos, um estudo revelou que a frequência do tabagismo
caiu 4% nos homens, as vendas de cigarros diminuíram 5,5% e o número de
infartos foi reduzido em 11% nas pessoas com idade entre 35 e 64 anos.
33

Somente este último dado, se transportado para a realidade no Brasil,


equivaleria a 5 mil casos de infarto do miocárdio evitados em um ano. E se
nenhum desses dados pode convencer o jovem autor do artigo de que os
malefícios do cigarro não são apenas alegações, mas resultados de pesquisas,
que tal saber que 90% dos pacientes com câncer no pulmão são fumantes?
Por fim, às vésperas do Dia do Médico, em 18 de outubro, gostaria de
parabenizar os quase 300 mil profissionais brasileiros destacando um estudo
realizado em 2005, por importante instituto de pesquisa. “Confiança nas
Instituições” apresentou os médicos com um índice de 81% de confiabilidade
pela população, superando Igreja Católica (71%) e Forças Armadas (69%),
além de jornais, rádios, televisão, engenheiros, publicitários, advogados e
tantos outros igualmente importantes para o desenvolvimento da nação.
Portanto, antes de conferir aos médicos uma “habitual incapacidade de curar
doenças”, como faz o caro estudante, aconselho-o a informar-se, ler, pesquisar
e atualizar-se.
Nossa posição não é contra o fumante — para nós, uma vítima fisgada
ainda na juventude pela indústria do tabaco em suas ardilosas, agressivas e
enganosas propagandas —, mas contra o tabaco, pois também conhecemos a
fundo os danos que provocam nos pulmões de suas vítimas, muitas das quais
assistimos.
Ao suposto direito individual “para fumar” que postulam algumas
organizações, há em contraposição um direito fundamental de “não fumar”, que
apenas se manifesta no âmbito das liberdades reais quando o Estado intervém
no domínio econômico, para restringir o nocivo efeito da publicidade e da
influência da indústria sobre o indivíduo.
A saúde é nosso bem mais precioso e, para nós, médicos, é também um
objetivo de vida, de luta e superação.
Zero Hora, 18/10/2009.

O texto pertence ao gênero “artigo de opinião”. Foi escrito por uma


médica, Jussara Fiterman, para os leitores do jornal Zero Hora, suporte que o
publicou. A autora teve como objetivo mostrar sua opinião favorável a respeito
da lei antifumo, tentando desbancar um outro artigo, veiculado no mesmo
jornal, contrário à lei. Quis ainda convencer o leitor de que o tabaco é
34

altamente prejudicial ao ser humano e que os fumantes são vítimas do mesmo.


Como exposto acima, trata-se de um tema polêmico, uma vez que há
aqueles contrários à lei e os favoráveis a ela. Isso fica bem delimitado nas
vozes do estudante de jornalismo citado no texto e da autora, Jussara
Fiterman.
No que se refere à estrutura organizativa do texto, o título, “Fumante não
é excluído, é vítima”, já sintetiza a posição da autora acerca do assunto. No
início do artigo, há uma contextualização que remete o leitor à polêmica lei
antifumo. Já nas primeiras linhas, é possível perceber o posicionamento
favorável da autora sobre a lei. A seguir, ela lança mão de argumentos, os
quais tentam mostrar o porquê da escolha. No final, reafirma sua posição.
Quanto às marcas lingüísticas e enunciativas, a autora escolhe a
primeira pessoa do singular para contrastar seu discurso com o discurso do
estudante de jornalismo. Já aí se percebe o caráter dialógico do gênero em
questão: o texto é uma resposta a outro texto. Expressões como “Muito me
surpreendeu o artigo publicado na edição de 14 de outubro, de autoria de um
estudante de Jornalismo...”; “Ao contrário do que afirma o artigo...”; “Nossa
posição não é contra o fumante (...), mas contra o tabaco...” deixam claro esse
diálogo intertextual.
Ainda no que se refere à linguagem, pode-se considerar a importância
dos operadores argumentativos para a coesão textual. Expressões como “além
disto”; “ao contrário do que...”; “somente este último dado”; “por fim” ilustram
como um texto do gênero artigo de opinião é construído.

3.4 Relatório do trabalho em sala

A experiência relatada foi realizada com vinte alunos do primeiro ano do


ensino médio, na Escola Estadual Comunidade Nossa Senhora Aparecida,
município de Promissão. O trabalho com o gênero artigo de opinião foi
desenvolvido durante um mês, de 01 a 30 de junho; a atividade em questão foi
realizada nos dias 15 e 16.
Num primeiro momento, os alunos foram convidados a emitir suas
opiniões sobre o tema do tabagismo e da lei anti-fumo; foram ainda
questionados sobre o que pensavam a respeito das pessoas que são usuárias
35

de tais produtos e se poderiam tornar-se um dia fumantes.


Em seguida, o professor disse a eles que leriam um texto intitulado
“Fumante não é excluído. É vítima.” Os alunos tiveram que levantar hipóteses
sobre o conteúdo do texto. Em seguida, o professor questionou qual poderia
ser o possível gênero discursivo do texto. Houve alunos que perceberam, já no
título, uma opinião e arriscaram que se tratava de um artigo de opinião,
inclusive por se tratar de um assunto que envolve polêmica. Houve, porém,
quem não tenha percebido que se tratava de tal gênero.
O professor confirmou, então, que se tratava de um artigo de opinião e
perguntou se essa informação alterava as expectativas. Aqueles que não
reconheceram já no título o artigo, disseram que suas expectativas mudaram.
Começou-se então a leitura do texto. Após o primeiro parágrafo, o
professor questionou os alunos sobre suas expectativas de leitura: se estavam
sendo confirmadas ou não. Uma parte dos alunos disse ter confirmadas suas
expectativas, uma vez que o título estava dando pistas do que se trataria. Eles
ainda acrescentaram que em seguida a autora defenderia sua tese usando
argumentos, o que foi ratificado na continuidade da leitura.
Não esperavam o argumento que se referia à credibilidade dos médicos,
mas entenderam a importância dele, uma vez que a opinião veiculada era de
uma médica. Perceberam que a posição social de quem escreve um texto
interfere na significação do mesmo, uma vez que cada discurso é carregado de
ideologia.
Por fim, aqueles que já conheciam alguns artigos de opinião, esperavam
que a autora reafirmasse sua postura antitabaco, já expressa no início do texto,
o que ocorreu no final, quando a autora termina defendendo a necessidade de
cuidados com a saúde.
A ideia de se trabalhar com estratégias, ativando os conhecimentos
prévios dos alunos, garantiu a interação e fez com que eles estivessem, a todo
momento, construindo o sentido do texto. Essa atividade não pode ser vista
como algo isolado, mas sim como um trabalho que serve de base para todas
as atividades de leituras em que estiverem envolvidos. Como afirma Solé
(1998, p. 70):
Ao ensinar estratégias de compreensão leitora, entre os alunos deve
predominar a construção e o uso de procedimentos de tipo geral,
36

que possam ser transferidos sem maiores dificuldades para


situações de leitura múltiplas e variadas.
37

CONCLUSÃO

Esta monografia procurou explicitar a importância de um trabalho


interacionista com a leitura, privilegiando o ensino de estratégias de leitura
adequadas aos gêneros do discurso, para uma melhor interpretação de textos,
por parte dos alunos e das pessoas de um modo geral.
O trabalho foi complexo, requereu a leitura de vários textos que tratavam
de tão precioso assunto e o contato com os mais variados alunos, porém,
deixou claro que um trabalho cooperativo no campo da construção de sentidos
pode ser bem mais eficiente que inúmeras perguntas a serem respondidas
sobre textos, como se vê usualmente em escolas públicas e particulares.
Durante as atividades com os alunos, percebeu-se o quanto a interação
é importante no processo de construção do conhecimento, e mais
especificamente, no processo de construção de sentidos de um texto. A
participação dos alunos, levantando hipóteses a partir dos títulos, confirmando
ou não depois de saberem o gênero a ser lido, corrigindo suas expectativas de
leitura, redirecionando suas hipóteses, envolveu-os no processo de leitura dos
textos, e no caso desta pesquisa, do artigo de opinião a eles apresentado.
Isso possibilitou, em muitos casos, uma compreensão efetiva, um
entendimento eficaz. Ao longo da atividade, os alunos mostraram-se atentos e
obrigados a raciocinar, não cumprindo com um papel de simples expectadores,
meros recipientes em que se deposita algo.
As atividades baseadas em estratégias de leitura possibilitaram a
ativação de conhecimentos prévios, sem os quais é impossível chegar à
compreensão de um texto. Essas atividades fizeram com que os alunos
percebessem que o que eles trazem consigo é imprescindível para a
compreensão leitora, daí a importância de se ler cada vez mais. Dentro desses
conhecimentos prévios, priorizou-se a ativação do conhecimento textual do
aluno: de quanto ele conhece sobre o gênero a ser lido. Isso para propor-lhe a
seleção de estratégias apropriadas a esse gênero textual, uma vez que, como
se sabe, não se lê notícias da mesma forma como se lê fábulas; assim como
um pedreiro não se prepara da mesma forma para fazer uma calçada ou para
rebocar o teto.
Importante lembrar que uma vez que os alunos conseguiram organizar
38

estratégias para ajudá-los na compreensão de um determinado gênero


discursivo, no caso deste trabalho, o gênero artigo de opinião, terão de
pesquisar e descobrir quais as melhores estratégias para os variados gêneros,
com os quais se depararão ao longo da vida. Essa transferência, possível
como se viu no interior desta monografia, pode fazer com que os alunos, mais
que entender textos, pensem em estratégias para enfrentar os diferentes
desafios que os cerca.
Os resultados corresponderam às expectativas: os alunos foram sujeitos
no processo de construção/desconstrução dos sentidos. Mostraram o quanto
um trabalho com estratégias de leitura pode não só deixar a aula menos
monótona, mas também, transformá-la no espaço ideal para aprendizagem e
compreensão. Além disso, a prática descrita neste trabalho pode incentivá-los
a construírem também o mundo em que vivemos, sendo sujeitos, interagindo a
todo momento e escolhendo estratégias para cada situação.
Quanto ao questionamento que motivou esse trabalho: saber em que
medida o conhecimento dos gêneros auxilia na escolha de estratégias, pode-se
perceber que ensinar por gêneros é dar ao aluno o preparo de que precisa para
enfrentar os inúmeros textos com os quais se depara no cotidiano e, mais
importante, instigá-lo a aprender gêneros desconhecidos para poder
compreender todos os textos que até ele chegarem.
O trabalho representou, portanto, uma oportunidade de expandir o
debate acerca de um assunto que está no centro de toda e qualquer disciplina:
a leitura. Tentou-se elucidar a importância da interação entre leitor e texto e a
seleção de estratégias apropriadas aos mais diferentes gêneros do discurso.
Faz-se necessária a continuidade desse assunto para que, cada vez mais, se
possa aperfeiçoar uma atividade responsável pela construção de sentidos e
dos textos que circulam na sociedade.
39

REFERÊNCIAS

ANTUNES, I. Lingua, texto e ensino: outra escola possível. São Paulo:


Parábola, 2009.

BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.

BRAKLING, K. L.; Trabalhando com artigo de opinião: re-visitando o eu no


exercício da (re) significação da palavra do outro. In: ROJO, R. (org.). A prática
da linguagem em sala de aula: praticando os PCNs. São Paulo: Educ;
Campinas: Mercado de Letras, 2000.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares


Nacionais: Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998.

CUNHA, D. A. C.; O funcionamento dialógico em notícias e artigos de opinião.


In: DIONÍSIO, A. P.; MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. (Org.). Gêneros
textuais e ensino. 4. ed. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

DOLZ, J.; SCHNEUWLY, B. Gêneros orais e escritos na escola. Campinas:


Mercado de Letras, 2004.

FIORIN, J. L.; SAVIOLI, F. P. Lições de texto: leitura e redação. 4. ed. São


Paulo: Ática, 2004.

FITERMAN, J. Fumante não é excluído. É vítima. Zero Hora. Porto Alegre, 18


out. 2009.

FREGONEZI, D. E. O professor, a escola e a leitura. Londrina: Edições


Humanidades, 2003.

KLEIMAN, A. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. Campinas: Pontes,


1984.

KOCH, I. V.; ELIAS, V. M. Ler e compreender: os sentidos do texto. 3. ed. São


Paulo: Contexto, 2009a.
40

______. Ler e escrever: estratégias de produção textual. São Paulo: Contexto,


2009b.

MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão.


3. ed. São Paulo: Parábola, 2008.

______. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. In: DIONÍSIO, A. P.;


MACHADO, A. R.; BEZERRA, M. A. (Org.). Gêneros textuais e ensino. 4. ed.
Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

RANGEL, E. O.; GAGLIARDI, E.; AMARAL, H. Pontos de vista: caderno do


professor. São Paulo: Cenpec, 2010.

RODRIGUES, R. H.; O artigo jornalístico e o ensino da produção escrita. In:


ROJO, R. (org.). A prática da linguagem em sala de aula: praticando os
PCNs. São Paulo: Educ; Campinas: Mercado de Letras, 2000.

SOLÉ, I. Estratégias de leitura. Tradução Cláudia Schilling. Porto Alegre:


Artmed, 1998.

TAKAZAKI, H. H. Língua Portuguesa: ensino médio. São Paulo: IBEP, 2004.

Potrebbero piacerti anche