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IVAN TEIXEIRA Hermenêutica,

retórica

e poética

nas letras da

América

Portuguesa

HERMENÊUTICAS

o
Este texto origina-se de uma comu-
nicação lida em maio de 2002,
no colóquio internacional “La
France et le monde luso-brésilien:
échanges et représentations (XVIe-
XVIIIe siècles)”, no Centre d’Études
sur les Réformes, l’Humanisme et
l’Âge Classique (CERHAC),
Université Blaise-Pascal, Clermont-
que se conhece hoje por “literatura
colonial brasileira” é invenção do sécu-

lo XIX. Fundados na tradição da


hermenêutica romântica, que procura

homogeneizar o passado para ajustá-lo


aos olhos do presente, os estudiosos

do nascente Império brasileiro criaram

aquela expressão para designar as le-


tras produzidas no Brasil durante os

séculos XVI, XVII e XVIII. Nesse pro-


Ferrand, França. Outra parte foi lida
em março de 2003, na “Faculty cesso de acomodação do passado aos
Lecture Series – Spring 2003”, do
Department of Spanish and
Portuguese, College of Liberal Arts,
interesses do presente, formulou-se um
The University of Texas at Austin,
EUA. programa de desconsideração siste-

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mática pelo conhecimento das normas
específicas de produção textual de cada
um dos períodos que, a partir do sécu-
lo XX, seriam respectivamente deno-
minados de Classicismo, Neoclassicis-
mo/Arcadismo e Barroco.
Até recentemente, a hermenêutica
dominava os estudos das letras produ-
zidas na América Portuguesa. Seu do-
mínio era tão soberano e inquestionável
que se impunha quase como um dado
de natureza, e não como uma institui-
ção cultural. Em nome do princípio
romântico da identidade do homem
consigo mesmo ou da crença em uma
“natureza humana” – que pressupõe a
existência de certos aspectos da condi-
ção do homem que independem de
qualquer relação com a história –, a
hermenêutica tradicional apagava as
diferenças culturais próprias de cada
época. É o que se observa, por exem-
plo, na aplicação do termo literatura à
expressão “literatura colonial brasilei- IVAN TEIXEIRA
é professor de Cultura e
ra”, que, desconsiderando o sentido his- Literatura Brasileira no
Departamento de
tórico do vocábulo, unifica indistinta- Jornalismo e Editoração da
ECA-USP. Atualmente,
mente aquilo que os séculos XVI, XVII desenvolve pesquisa como
professor convidado no
e parcialmente o XVIII concebiam como Departamento de Espanhol
e Português da
diferentes manifestações das letras, com Universidade do Texas, em
Austin (EUA). É autor de,
estrutura, normas e funções específicas entre outros, Mecenato
Pombalino e Poesia
em seus respectivos momentos: poe- Neoclássica: Basílio da
Gama e a Poética do
sia épica, poesia lírica, poesia satírica, Encômio (Edusp).
Organizou uma edição
sermão, história, encômio, narrativa ale- atualizada da Arte Poética,
de Francisco José Freire, a
górica, diálogos, autos, cartas, etc. sair pela Ateliê Editorial.

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Como se sabe, Aristóteles, no primeiro os súditos da coroa portuguesa nascidos no
capítulo da Poética, acusa a falta, em seu Brasil e geralmente formados em Coimbra
tempo, de um termo que unificasse as vá- foram, de um momento para o outro, trans-
rias espécies de mimeses por meio da lin- formados em escritores brasileiros do “pe-
guagem. Hoje, supõe-se que o vocábulo a ríodo colonial”, apesar de todas as evidên-
cuja falta aludia o filósofo seja literatura, cias da filiação deles às poéticas e às práti-
que, nessa acepção, só seria criado no final cas sociais do Antigo Regime peninsular.
do século XVIII na França e na Alemanha, Essa invenção de um presumível passado
quando o termo passou a designar o con- colonial a partir dos valores do Romantis-
junto de todos os textos que imitam ou re- mo – com todas as implicações decorrentes
presentam as paixões por meio da palavra, do culto aparente da dignidade cívica por
com sensibilidade e imaginação. Hoje, a meio da promoção da idéia de sincerida-
teoria crítica acredita que a literatura ins- de emocional e de liberdade expressiva –
taura uma realidade ficcional à medida que resulta da adoção da hermenêutica tradi-
representa um conceito de realidade, vi- cional como instrumento de entendimento
gente no momento da imitação. Nesse sen- das letras.
tido, literatura não seria sequer imitação da Considerando o signo essencialmente
vida nem de paixões, mas de discursos como mediação entre um logos preestabe-
existentes sobre elas. Pode-se dizer tam- lecido e sua cognição pelo leitor, a herme-
bém que a literatura imita práticas sociais nêutica, em sua acepção clássica de ciência
entendidas como encarnação intelectual de da interpretação, toma a obra de arte verbal
discursos, sem deixar de ser ela própria uma como espécie de sintoma ou metáfora do
prática social discursiva, cuja existência é grande significado do mundo, dotado, por
tão real quanto qualquer fenômeno da mes- imanência, de verdade e de sentido auto-
ma categoria ontológica, tal como, diga- suficiente, que se manifestaria aos poucos e
mos, uma proposta de greve, um ritual re- veladamente em cada sopro de criação artís-
ligioso ou uma propaganda política. Con- tica. Como se sabe, na Europa, na segunda
forme essa perspectiva, entender um poe- metade do século XX, houve um grande
ma seria associá-lo corretamente a outros esforço, em dimensão filosófica, pela união
poemas e descobrir sua matriz conceitual, da hermenêutica com a poética e com a re-
isto é, vinculá-lo à poética específica se- tórica, graças, sobretudo, ao trabalho de
gundo a qual foi composto, assim como Hans-George Gadamer e Paul Ricoeur. O
identificar a prática social da qual pretende presente autor pensa, particularmente, em
ser uma versão artística, quer seja em tom ensaios como “Rhetoric and Hermeneutics”,
de justificativa, de denúncia, de paródia, do primeiro, e “Rhetoric-Poetics-Hermen-
de elogio ou de deformação grotesca e as- eutics”, do segundo, ambos de 1960 (Jost e
sim por diante. Michael, 1997, pp. 45-59, 60-72). Apesar
A segunda parte da expressão “literatu- das diferenças entre os dois grandes
ra colonial brasileira” também merece co- hermeneutas, os historiadores da filosofia
mentário. Dominados pela idéia evolutiva mais recentes, inspirados em terminologia
de nação, os primeiros historiadores do do próprio Gadamer, nomeiam os resulta-
Império, identificados com a poética ro- dos dessa perspectiva de “hermenêutica fi-
mântica, procuraram no passado uma ante- losófica”, por oposição à tradição idealista,
cipação que justificasse as conformações denominada “hermenêutica romântica”
do ideário e das práticas sociais do presen- (Madison, 1999, pp. 705-12).
te, projetando na estrutura pretérita da A principal diferença entre a nova her-
América Portuguesa pressupostos do pró- menêutica e a tradicional consiste em que
prio tempo, com seu modo específico de a nova, incorporando noções do relativismo
compreender e organizar a realidade soci- histórico e certas premissas da lingüística
al, assim como de conceber a estruturação saussuriana, não acredita em significados
e a função da obra de arte. Resultou daí que independentes do processo de interpreta-

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ção. Em outros ter-
mos, ao se transfor-
mar em noções cogni-
tivas, a verdade dos
textos necessaria-
mente se deixa conta-
minar pelas contin-
gências histórico-cul-
turais do momento de
interpretação. Em seu
livro capital, Verdade
e Método, publicado
na Alemanha em 1960
e traduzido para o in-
glês em 1975, o mes-
mo Gadamer (1996,
XXXIII) afirma:

“If the principle of


effective history is
made into a universal
element in the structure of understanding, cularizam no momento específico do ato O filósofo
then this thesis undoubtedly implies no cognitivo. Gadamer não limita a herme-
historical relativity, but seeks absolute nêutica a um conjunto de normas para in-
Hans-George
validity – and yet a hermeneutic terpretação de textos verbais. Ao contrá- Gadamer
consciousness exists only under specific rio, amplia seus limites à leitura do mundo,
historical conditions. Tradition, which razão pela qual sua contribuição costuma
consists in part in handing down self- ser aludida como uma possível teoria do
evident traditional material, must have conhecimento. Uma de suas maiores con-
become questionable before it can become tribuições nessa área é a idéia de apropria-
explicitly conscious that appropriating ção ou de aplicação interessada da matéria
tradition is a hermeneutic task”. apreendida. Nesse sentido, explica ele, é
que sua preocupação deve ser entendida
(“Se o princípio de uma história funcional como filosófica, porque se concentra não
se transforma em elemento universal no que no que fazemos ou deveríamos fazer, mas
diz respeito à estrutura do conhecimento, no que acontece conosco independentemen-
então essa tese, sem dúvida, não se relacio- te de nossos desejos e ações (1996, p.
na com a relatividade histórica, procura, ao XXVIII). Todo conhecimento, prossegue,
contrário, o valor absoluto. Todavia, a cons- é interpretação e toda interpretação ocorre
ciência hermenêutica só pode tomar corpo na linguagem, cujo uso é, necessariamen-
sob condições históricas bem definidas. A te, uma aplicação interessada (1996, p. 389).
tradição, que consiste parcialmente em Daí suas preocupações com a retórica e com
transmitir o conhecimento consagrado pelo a poética – que, aqui, se entendem ao mes-
uso, deve ser problematizada antes de se mo tempo como técnicas de cognição e de
tornar explicitamente consciente de que o comunicação de um logos que se institui
costume da apropriação é uma das funções no exato momento de sua apreensão e/ou
da hermenêutica”.) transmissão.
Enquanto na Europa e nos Estados
Como se vê, o hermeneuta acredita nu- Unidos os estudos de interpretação se em-
ma estrutura universal que rege as leis do penhavam em desconstruir a tradição pla-
conhecimento, as quais, todavia, se parti- tônica e restaurar o prestígio da retórica e

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da poética e, por conseqüência da sofística trário, que o poema como um todo facul-
(1), no Brasil, por sugestão talvez do mito tou, por pura contingência de interpretação
modernista e neo-romântico da expressão intelectual, a instituição de um discurso que
espontânea, ambas as disciplinas eram con- veio a se transformar em verdade histórica.
tinuamente fustigadas, em favor de uma Em outros termos, o poema não capta nada,
visão ora estético-sociológica e verista; ora mas institui um discurso que faculta apro-
estético-evolucionista e psicológica; ora priações, as quais, por definição, trazem a
católico-universalista e libertária, culmi- marca de seu tempo ou dos tempos de sua
nando sempre na busca da identidade do leitura.
passado com o presente. Assim, também Tanto no século XIX quanto no século
no século XX, o chamado período colonial XX, a hermenêutica aplicada às letras do
brasileiro foi, basicamente, estudado sob a chamado período colonial possui seu mo-
orientação da hermenêutica tradicional, delo remoto na exegese do Novo Testa-
embora aqui e ali tais estudos reconheçam mento, que, transformando o passado em
o processo de apropriação na interpretação antecipação teleológica do presente, in-
oitocentista das letras da América Portu- terpreta o Velho Testamento como alego-
guesa, sem tomarem consciência de que, ria anunciadora do cristianismo. Da mes-
em rigor, dão continuidade ao mesmo pro- ma forma, a maioria absoluta dos estudos
cesso, evidentemente com mais lucidez e, sobre as letras produzidas pelo código
em alguns casos, com invulgar eficiência europeu na América Portuguesa transfor-
argumentativa. É o que se observa, por ma o passado lusitano em alegoria ante-
exemplo, em um famoso estudo sobre o cipadora da alma nacional brasileira, que
Caramuru, publicado em livro de grandes teria se manifestado com mais nitidez no
e justificadas implicações na cultura brasi- Romantismo e se revelado em sua inteira
leira (Candido, 1976, pp. 69-192). Nesse apoteose na Semana de Arte Moderna de
maravilhoso ensaio, o autor procura legiti- 1922. Essa idéia pode ser particularmen-
mar historicamente a apropriação românti- te exemplificada com o livro A Tradição
ca do poema de Santa Rita Durão, à propor- Afortunada: o Espírito de Nacionalida-
ção que partilha de seus pressupostos, sob de na Crítica Brasileira, cujo autor, de-
o argumento de que a própria estrutura da pois de considerar Gregório de Matos e
obra incorpora a “ambigüidade” do Brasil Tomás Antônio Gonzaga já plenamente
setecentista, dividido entre a condição co- brasileiros pelos “sentimentos e emo-
lonial e a predestinação para a independên- ções”, afirma:
cia política, com a correspondente autono-
mia de pensamento social e de forma lite- “Ao atingir o século XX, como vimos far-
rária. A se confirmar como hipótese de- tamente, o conceito estava formado. O es-
monstrável, a presumível antecipação ou pírito de nacionalidade, tal como foi defi-
conquista de uma essência nacional brasi- nido pela crítica do século anterior, consti-
leira poderá sempre ser interpretada como tui o traço dominante das letras brasileiras
construção histórica do Segundo Reinado, e o alicerce da literatura do século XX. Aqui,
e não necessariamente como conseqüência toda a produção literária é na base do gênio
inevitável da evolução do espírito do povo, brasileiro” (Coutinho, 1968, p. 178).
1 Uma das necessárias conse-
qüências desse ressurgimento surpreendido em germe em Santa Rita
da retórica é a reavaliação dos
sofistas, tal como se vê, por Durão e em outros escritores que partilha- Em estudos de caráter mais univer-
exemplo, em “Les Sophistiques ram da mesma condição histórica. A idéia salista, as conclusões são menos explícitas
Réhabilités”, de Laurent Pernot.
Mais amplos no propósito e mais interessante como matéria de contro- e mais abrangentes. É o que se observa,
mais eficazes nos resultados
vérsia no referido ensaio, defendida com a para retomar o exemplo de grandes ensaís-
são: Negation, Subjectivity and
the History of Rhetoric, de Victor costumeira mestria de seu autor, consiste tas, na interpretação de alguns sermões de
J. Vitanza; e Rhetoric in the
European Tradition, de Thomas exatamente na convicção de que a estrutu- pe. Antônio Vieira como instrumento de
M. Conley; e In Defence of ra de o Caramuru mimetiza uma condição contestação e/ou lamento contra a escravi-
Rhetoric , de Brian Vickers.
Consultar bibliografia. histórica. O presente texto acredita, ao con- dão no Brasil, a partir do exame da enge-

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nhosa analogia vieiriana entre o sofrimen-
to dos negros e os de Cristo (Bosi, 1992, O NACIONAL COMO EFEITO
pp. 119-84). A leitura histórica do mesmo
corpus tem conduzido a conclusões dife- DE CÓPIA
rentes. Pois, como foi demonstrado recen-
temente em textos decisivos sobre o as- Em Imagined Communities: Reflections
sunto, o pensamento retórico, teológico e on the Origin and Spread of Nationalism,
político de Vieira entende não somente a Benedict Anderson, em sintonia com cer-
natureza, mas também a história como ex- tas premissas da lingüística saussuriana e
pressão da vontade divina, que, portanto, com alguns princípios da retórica sofística, Padre Antônio
se particularizaria no escravismo implíci- formulou uma teoria muito influente sobre
Vieira (1608-
to e necessário ao projeto expansionista a idéia de nação e de nacionalismo. Embo-
do Império português na América, enten- ra originário dos estudos de política inter- 97), cujo
dido como projeção do Corpo Místico do nacional, seu conceito teve importantes pensamento
Estado Lusitano em suas ramificações pelo conseqüências na teoria literária recente e
mundo. Longe de insinuar a hipótese de nos estudos culturais. Conforme Anderson,
retórico,
um Vieira abolicionista, infere o presente não há uma essência natural que unifique teológico e
texto, a comparação entre toda a vida dos as pessoas de uma mesma nação. O que
político
escravos nos engenhos da Bahia e os últi- ocorre, segundo ele, é a construção cultural
mos momentos da vida de Cristo seria, de um logos discursivo que institui um si- interpreta a
antes, expressão daquele pensamento uni- mulacro apreendido como verdade natural escravidão no
tário, segundo o qual os negros não servi- ou como essência preexistente ao discurso,
Brasil como
am aos senhores “deste mundo” (enge- como que à espera de assimilação pelos
nhos), mas sim a Deus – o Senhor dos membros da comunidade. A formulação de manifestação
senhores. Da mesma forma, talvez não Anderson (2002, p. 4) é simples e direta: alegórica do
fosse epistemologicamente sustentável
supor que a agudeza da alegoria de Vieira “My point of departure is that nationality,
projeto
pudesse vincular, retrospectivamente, a or, as one might prefer to put it in view of histórico divino
Companhia de Jesus à secular tradição
católica de justificar certos momentos de
violência do cristianismo em nome da
propagação das “verdades” do Evangelho,
porque se tratava, em rigor histórico, de
particularizações da mesma universal bon-
dade de Deus, convertida na prática re-
dentora de busca e/ou punição de almas
desprovidas do privilégio da “graça”.
Todavia, o referido ensaio não hesita em
interpretar alguns fragmentos fortes da
encenação litúrgico-sacramental do ser-
mão de Vieira como conflito psicológico
decorrente de ambivalências circunstan-
ciais da condição biográfica do autor, che-
gando ao extremo teleológico de associar
o pregador jesuíta a Karl Marx, com o
propósito de insinuar o argumento de que
o “espírito” de um já antecipava a vinda
do outro. Ambos, enfim, teriam percebido
que, na dinâmica das desigualdades do
poder, os que mais trabalham são os que
menos partilham do que produzem.

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that word’s multiple significations, nation- atribuir pretensões de retrato fiel da reali-
ness, as well as nationalism, are cultural dade ao texto de Manuel Antônio, esque-
artefacts (sic) of a particular kind”. cendo que entre aquele romance e os com-
ponentes da realidade empírica da paisa-
(“O meu ponto de partida é que a naciona- gem urbana do Rio joanino havia uma enor-
lidade, ou, como seria possível dizer diante me e visível mediação discursiva. O resul-
da multiplicidade de significados dessa tado do texto, repita-se, convertido em efei-
palavra, tanto a nação-lidade quanto o na- to, gerou uma idéia, logo institucionalizada
cionalismo são artefactos culturais de uma pela crítica como essência captada de uma
espécie particular”.) realidade que jazia para além do signo,
quando, em rigor, teria sido uma espécie de
Esse pressuposto permite, ainda que reflexo do signo literário. Se a premissa
experimentalmente, levantar uma hipótese estiver correta, As Memórias talvez pudes-
reflexiva sobre três grandes narrativas que sem ser estudadas como exemplo de uma
a crítica hermenêutica geralmente interpreta das primeiras propostas de “comunidades
como modelos de captação da presumível imaginadas” do Brasil, no sentido propos-
essência nacional do povo brasileiro, a sa- to por Benedict Anderson (2).
ber: Memórias de um Sargento de Milícias, Em seguida, José de Alencar esforçar-
O Guarani e Macunaíma. se-ia por criar, em O Guarani (1857), um
Até aqui estudadas como romance de simulacro heróico e cavalheiresco do país
costumes urbanos, as Memórias de um e dos valores segundo os quais a comuni-
Sargento de Milícias (1852-53) são, na dade colonial se organizava, sempre enten-
verdade, o primeiro romance voltado para dida como prenunciadora da comunidade
a construção de uma idéia geral das origens imperial: monarquia, escravismo, naciona-
psicossociais do Brasil e dos brasileiros, a lismo e catolicismo, instituições que, no
partir do Rio de Janeiro, capital do Império tempo de Alencar, se apoiavam e se legiti-
português no tempo da ação romanesca e mavam em harmoniosa reciprocidade. Mas
capital do Brasil, na época da composição há uma grande diferença entre os dois ro-
do romance. Evidentemente, essa hipótese mancistas: enquanto Almeida se dedicou à
interpretativa do romance funda-se não só criação de uma imagem descontraída e in-
no pressuposto metonímico de que a parte sinuante da sociedade de que erigia um si-
pode representar o todo, mas também na mulacro, Alencar empenhava-se no ícone
prática cultural de que o centro econômico da austeridade, da fidelidade e da obediên-
e administrativo de um país ou de um Im- cia. Todavia, os resultados das leituras fo-
pério se impõe como cabeça e como a face ram bem diferentes, sobretudo se se consi-
mais visível do suposto corpo unitário do derar a preferência atual por Leonardinho,
Estado. Mas, enfim, o Brasil era ainda par- das Memórias, em desfavor de Peri ou Dom
te do Estado lusitano (braço, perna ou de- Antônio de Mariz. Tal preferência decorre,
dão do pé, que se tornara subitamente talvez, do fato de aquele encarnar o tipo
caput), do qual Manuel Antônio de Almei- psicológico e social que procura se afastar
da, escrevendo pela perspectiva unificadora do rigor absoluto da norma, assim como
do Segundo Reinado, procurou extrair al- evita a celebração dos princípios que a es-
guns traços constitutivos de uma possível tabelecem, ao passo que estes se constro-
“alma nacional brasileira”. Em rigor, o em em sentido oposto.
escritor, muito consciente do que fazia, Ao lado de O Guarani e das Memórias
produziu apenas a versão pessoal de um de um Sargento de Milícias, é possível que
2 Tanto quanto supõe o presente
autor, a leitura recente mais es-
discurso, existente em seu tempo, sobre o Macunaíma (1928), de Mário de Andrade,
timulante das Memórias de um passado da cidade, processo de que dá con- também venha a ser lembrado pela ambi-
Sargento de Milícias é devida a
Mamede Mustafá Jarouche, que ta explicitamente em seu relato. A crítica ção de erigir uma ficção panorâmica, de
fornece subsídios para a pós-romântica, mais nacionalista que o caráter social e formativo, com vistas a
interdiscursividade de seu texto.
Consultar bibliografia. próprio Romantismo, é que se incumbiu de sugerir uma noção de conjunto do Brasil e

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de seu povo. Nisso reside uma das linhas de extrair uma idéia de Brasil, em seus mo-
força do livro. Mas o próprio Mário não mentos mais significativos entenderam as
entendia sua obra dessa maneira. Ao con- essências como resultante de convenções.
trário, partilhava da visão pós-romântica Contrários à idéia de revelação, interpre-
segundo a qual a composição literária deve tam o valor como produto da cultura ou da
ser entendida como exclusiva cópia do real, relação dos homens com as convicções de
sem suspeitar de que este real pode ser in- seu tempo. Mário, supõe-se, acreditava
terpretado como um efeito da cópia. Mais numa essência nacional que, transcenden-
do que os dois romances aqui menciona- do os limites do explicável, nascia natural-
dos, o livro de Mário possui mediações mente com a fundação mítica dos povos.
discursivas bem conhecidas, pois, como se Imaginava-se uma espécie de “Orfeu tan-
sabe, é, basicamente, fundado na interpre- gendo um alaúde”.
tação, paráfrase, interpolação ou livre tra-
dução de lendas e mitos populares. Apesar
da natureza materialista inerente ao pro-
cesso da bricolagem, o livro de Mário pos- O SENTIDO COMO REVELAÇÃO
sui uma forte impregnação idealista, devi-
do, sobretudo, ao discurso auto-explicativo Como já ficou sugerido, o predomínio
produzido pelo autor. Ao se apropriar de da hermenêutica origina-se com o advento
textos míticos, propagou sistematicamen- do Romantismo, que coincide com o projeto
te seu empenho, entendido como “ideal”, de criação de uma cultura nacional, a qual
de busca da essência do nacional por meio deveria resultar da perfeita integração entre
da diversidade costurada de seu livro, pois o indivíduo e a sociedade, a cultura e a na-
fazia crer que as narrativas populares tra- tureza, o universal e o local. Concebido como
zem em si essa imanência semântica, inde- artista especialmente vocacionado para cap-
pendente de qualquer sintaxe ou jogo de tar a inter-relação essencial entre o povo e as
relações culturais geradoras de sentido. manifestações espontâneas da natureza, o
Enfim, dando continuidade ao antigo pro- poeta romântico configura-se como mani-
pósito romântico de construção estética de festação singular do Eu-Absoluto, que pro-
um imaginário genuinamente nacional, jeta em cada indivíduo uma fagulha de sua
Mário de Andrade jamais compreendeu o infinitude, noção que se intensifica e se con-
mundo como um conjunto de representa- solida a partir do idealismo alemão, sobre-
ções decorrentes de convenções retórico- tudo com as idéias dos irmãos Schlegel, cuja
discursivas, pois considerava que as lendas sistematização se difunde pela Europa por
populares refletiam verdadeiramente o es- força do trabalho de Madame de Staël e de
pírito do povo, em vez de apenas erigirem Chateaubriand, assim como de William
uma verdade ficcional – histórica e regio- Wordsworth e Samuel Taylor Coleridge,
nalmente condicionada –, responsável pela dentre outros. Surge daí o conhecido princí-
criação de uma idéia sobre esse povo. Daí pio de que o mergulho na subjetividade se
o seu horror conceitual, tantas vezes decla- configura como o verdadeiro caminho para
rado, ao regionalismo artístico, possivel- o Cosmos, para a Pátria e para as manifesta-
mente porque julgasse mais nobilitante a ções populares da cultura, originárias do con-
noção do absoluto geral do que a do con- tato espontâneo com as formas sensíveis da
creto particular. Enfim, partilhando da idéia natureza.
de escrita como revelação e desconhecen- Os responsáveis diretos pelo contato do
do Saussure (apesar de sua espantosa atua- Brasil com as noções européias do nacio-
lização bibliográfica), Mário jamais pode- nalismo, do naturismo e do subjetivismo
ria conceber a arte como resultado de apli- cósmico dos românticos foram dois auto-
cação de técnicas discursivas. Por outro res de menores proporções na escala dos
lado, tanto Drummond quanto Machado de valores europeus da época: o francês Jean
Assis, de cuja produção também se pode Ferdinand Denis (Paris, 1798 – Paris, 1890)

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e o português Almeida Garrett (Porto, 1799 “Enfin, une nation nouvelle réclamait
À esquerda, – Lisboa, 1854). Como se sabe, o operoso l’histoire de sa littérature; j’ai essayé d’en
historiador francês, orientado por diretriz tracer les traits principaux: en indiquant le
Résumé de de caráter antropológico, demonstrou vivo chemin que doit prendre la poésie dans le
L’Histoire interesse pelas supostas culturas primiti- Nouveau-Monde, j’ai pensé qu’il était
vas de colônias européias na África, na Índia convenable de faire connaître rapidement
Littéraire du
e na América, tendo residido no Brasil en- le caractère poétique des races diverses
Portugal (1826), tre 1816 e 1820. Em rigor, o seu interesse […]”.
de Ferdinand pelo Brasil deve ser entendido como de-
corrência de seus estudos sobre Portugal, (“Enfim, uma nova nação necessitava da
Denis. Em pois o seu Résumé de L’Histoire Littéraire história de sua literatura; neste ensaio, ten-
apêndice ao du Brésil apresenta-se como suplemento tei delinear as principais diretrizes: ao indi-
volume, encontra- do Résumé de L’Histoire Littéraire du car o caminho que a poesia deveria tomar
Portugal (1826), sem dúvida fundamental no Novo Mundo, supus que fosse recomen-
se o Résumé de à sua concepção de povo aplicado ao estu- dável apresentar rapidamente as caracte-
L’Histoire do da nação portuguesa. Seu projeto de rísticas poéticas de diferentes povos...”).
difusão das convicções européias no Novo
Littéraire du
Mundo traduz-se claramente na orientação Ainda no discurso preliminar, ele des-
Brésil. À direita, pedagógica que se impôs como escritor, taca poetas como frei José de Santa Rita
Parnaso Lusitano, evidente já no “Discours Préliminaire” à Durão e José Basílio da Gama, pela incor-
parte portuguesa de seu livro. Referindo-se poração, às respectivas obras, do tema do
de Almeida ao Brasil, ele diz o seguinte (1826, pp. índio e da paisagem do Brasil, entendendo
Garret, 1826 XVIII-XIX): isso como antecipação de impulso nacio-

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nal, que se manifesta sempre como reflexo História da Poesia e Língua Portuguesa”,
do desejo de autoconhecimento, condição apresentado como introdução ao primeiro
básica para a criação da identidade de um volume do Parnaso Português, também de
povo (1826, p. VI). Entre longas citações e Paris e publicado igualmente em 1826 (4).
surtos de entusiasmos pela singularidade Embora mais longas, as críticas de Denis
pitoresca das passagens poéticas de supos- não apresentam o mesmo nível de inte-
ta cor local, Denis (1826, pp. 534-67), na gração estilística com os textos apreciados.
abordagem específica desses autores, pro- Mas, quanto ao roteiro traçado, ambos são
cura produzir no leitor o efeito de que eles uniformes, embora em Garrett se encontre
já sentiam e já escreviam como homens do o rol de sugestões que parece ter produzido
século XIX, faltando-lhes, contudo, alguns mais efeito nos futuros escritores brasilei-
pormenores de sensibilidade e de expres- ros. Ao condenar, por exemplo, o bucolismo
são, cuja ausência o crítico censura. neoclássico de Gonzaga, o poeta português
No capítulo dos líricos, não procede de enumera algumas propriedades adequadas
outra forma, interpretando sempre o passa- ao que julga ser o espírito nacional da nas-
do como antecipação teleológica do pre- cente literatura, que, vista a posteriori, pa-
sente. Seu método é exemplar no tratamen- rece ter funcionado como verdadeiro pro-
to dispensado à Marília de Dirceu, de To- grama ao que viria, de fato, se constituir como
más Antônio Gonzaga, em cujas liras lou- a literatura romântica brasileira por exce-
va o que identifica como sensibilidade ro- lência, mais ou menos entre os decênios de
mântica e condena o que considera próprio 1830 e 1860 (1826, pp. XLVI-XLVII):
do tempo do poeta e que, de acordo com
ele, seria inadequado ao espírito nacional “Oh! E quanto não perdeu a poesia nesse
brasileiro em formação (1826, pp. 570-1): fatal erro! Se essa amável, se essa ingênua
Marília fosse, como a Virgínia de Saint-
“Le poésies de Gonzaga se distinguent Pierre, sentar-se à sombra das palmeiras, e,
surtout par la naïveté, par la grâce de enquanto lhe revoavam em torno o cardeal
l’expression, par le charme attaché aux soberbo com a púrpura dos reis, o sabiá
plaints sincères d’un coeur aimant. Il faut terno e melodioso, – que saltasse pelos
reprocher à Gonzaga l’emploi continuel montes espessos a cotia fugaz como a lebre
d’images puisées dans la mythologie, et de da Europa, ou grave passeasse pela orla da
ces formes de poésie pastorale répandues ribeira o tatu escamoso – ela se entretivesse
par Fontenelle: tout cela ne convenait guère em tecer para o seu amigo e seu cantor uma
à um poète brésilien habitant des pays où la grinalda não de rosas, não de jasmim, po-
nature étale le plus de splendeur et de rém dos roxos martírios, das alvas flores
majesté”. dos lustrosos bagos do cafezeiro; que pin-
tura, se a desenhara com sua natural graça
(“Distinguem-se as poesias de Gonzaga, o ingênuo pincel de Gonzaga!”.
antes de tudo, pela ingenuidade, pela graça
de expressão, pelo encanto inerente aos O magistério de Garrett e o de Denis
queixumes sinceros do coração enamora- manifestam-se de forma decisiva em boa
do. Mas deve-se exprobrar em Gonzaga o parte do Romantismo brasileiro, podendo
reiterado emprego de metáforas sugeridas ser flagrado como sugestão temática e for-
pela mitologia, e de formas da poesia pas- mal tanto em Gonçalves Dias quanto em José
toril difundidas por Fontenelle: tudo isso de Alencar. Antes disso, consolidara-se
pouco convém ao poeta brasileiro, habi- como construção artística e como conceito
tante de regiões onde a natureza mais os- crítico no famoso Grupo de Paris, liderado
tenta esplendor e majestade”) (3). por Gonçalves de Magalhães e do qual fize-
3 Tradução de Guilhermino
ram parte Manuel de Araújo Porto Alegre, César (1978, pp. 66-7).
Esses serão os mesmos argumentos de Francisco Sales Torres Homem e João Ma- 4 A coleção consta de seis to-
Almeida Garrett, em seu “Bosquejo da nuel Pereira da Silva, pouco importantes mos.

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pelos padrões atuais, mas de decisiva parti- [1910], pp. 7-28). O presente ensaio consi-
cipação na consolidação do ideário teuto- dera que a maior funcionalidade da poesia
franco-lusitano, responsável pela constru- do primeiro sobre a do segundo se deve a
ção daquilo que viria a se chamar de expres- outros motivos, e não ao suposto indianismo
são da “alma nacional” brasileira. de Basílio. Todavia, se Machado vê no
Assim, a diretriz daqueles escritores indianismo e na cor local a solução para o
europeus para a formação da literatura bra- ponto de partida da criação de uma literatu-
sileira possui dupla face: uma voltada para ra nacional, não admite nem um nem outro
o futuro, sugerindo soluções de temas, de como ponto de chegada. Julga-os suficien-
formas e de sensibilidade para uma nova tes às necessidades históricas do Roman-
arte que estava por vir e que, de fato, veio; tismo dos anos 40, 50 e 60, razão pela qual
outra voltada para o passado da América vê em Gonçalves Dias e em Alencar as
Portuguesa, ajustando-o aos valores da máximas conquistas do que chama de “ins-
Regência e do Segundo Reinado brasilei- tinto de nacionalidade” da literatura brasi-
ro, de tal forma que fossem apagadas as leira. Mas pensa que, a partir dos anos 70,
diferenças e superdimensionadas as supos- os escritores deveriam abandonar as suges-
tas semelhanças, com o propósito de forjar tões exteriores da paisagem e se dedicar à
retrospectivamente uma (in)verossímil busca de “certo sentimento íntimo, que o
identidade nacional. Em outros termos, a torne homem do seu tempo e do seu país,
crítica romântica, formada sob orientação ainda quando trate de assuntos remotos no
de Garrett e Denis, acreditando em signifi- tempo e no espaço”.
cados imanentes e independentes de sua Um crítico atual teve a excelente idéia de
forma e função histórica, passou a enten- perguntar o que seria o tal “sentimento ínti-
der o passado colonial como antecipação mo” de que fala Machado de Assis (Schwarz,
teleológica das convicções e necessidades 1999, pp. 151-45). Embora a pergunta seja
do Império bragantino no Brasil, empenha- ótima, a resposta parece discutível. Sem
do na criação de uma literatura que refletis- considerar com precisão o tempo de
se a imagem de seus súditos, caracteriza- enunciação do texto machadiano, o grande
dos então como o nascente povo brasileiro. crítico entende que Machado, ao reivindicar
Assim, desconsideraram a função política a incorporação do “sentimento íntimo” como
do pastoralismo no século XVIII, interpre- condição básica para a maturidade da litera-
tando-o exclusivamente como deformação tura brasileira, “pensava no seu próprio pro-
de espíritos afastados da verdadeira essên- grama de trabalho, que pouco depois resul-
cia dos povos, por restaurarem práticas li- taria nas primeiras obras-primas da literatu-
terárias da Antigüidade, incompatíveis com ra brasileira em formação”. Em seguida,
o país tropical em formação. descreve, com a usual competência de seus
Guiados pela primeira geração de intér- textos, o que considera ser a essência do
pretes da América Portuguesa, os historia- diferencial qualitativo de Machado, ou seja,
dores mais recentes do Romantismo brasi- a invenção do “narrador volúvel”, que, re-
leiro repetiriam à exaustão os pressupostos presentando as classes dominantes do Se-
teleológicos do Grupo de Paris, tal como se gundo Reinado, viveria elegantemente as
observa nas bases da arqueologia crítica contradições de um país que ansiava por
representada por Joaquim Norberto de imitar a modernização européia, mas reluta-
Sousa Silva, Santiago Nunes Ribeiro ou va em abrir mão do trabalho escravo. Se isso
Francisco Adolfo Varnhagen. O próprio vale como hipótese crítica para a descrição
Machado de Assis, em seu famoso estudo dos romances escritos a partir de Brás Cu-
“Literatura Brasileira: Instinto de Nacio- bas (março de 1880), não satisfaz como
nalidade”, de 1873, repetiria o estereótipo definição do “sentimento íntimo” preconi-
da excelência do indianismo sobre o zado por Machado em 1873.
bucolismo como argumento para sobrele- Conforme os pressupostos do presente
var Basílio em desfavor de Gonzaga (Assis texto, o misterioso conceito machadiano

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deve ser entendido como: 1) abandono es- que falo foram aqui bem-vindas e festeja-
tratégico da cor local, entendida como ín- das, como hóspedes, mas não se aliaram à
dice de Romantismo tardio; 2) incorpora- família nem tomaram o governo da casa”.
ção da “análise das paixões e caracteres”,
tomada como índice de Romantismo com- Evidentemente, o parágrafo é um alerta
patível com o momento específico do au- contra a hipótese do Realismo francês, que,
tor. Em outros termos, seu projeto de reno- tendo já se aclimatado em Portugal, ronda-
vação do romance, nos anos 70, consistia va as letras brasileiras. Curiosamente, o
em substituir a descrição da paisagem ex- parágrafo deixa ver, ainda, que os leitores
terna pela construção da interioridade do estavam à frente dos escritores. De fato, a
indivíduo, sempre conforme o modelo do essa altura, Machado tremia diante das
Romantismo literário, com todas suas im- transformações do romance europeu, por-
plicações de legitimação artística da poéti- que seus modelos mais próximos eram, e
ca cultural do Segundo Reinado: monar- continuariam sendo até o fim da década,
quia, escravismo, catolicismo, família pa- Alencar, Alexandre Herculano e Almeida
triarcal, dignidade aparente, incorporação Garrett. Em outros termos, o Machado de
de certos aspectos da língua do povo, sem 1873 é diferente do Machado de 1880,
jamais desrespeitar o decoro da linguagem porque outro era o seu repertório. Enfim,
e das cenas sancionadas pelas classes do- não se considera aqui o escritor como uma
minantes, etc. possível entidade psicológica em evolução
No mesmo ensaio “Literatura Brasi- do elementar para o complexo, do provin-
leira: Instinto de Nacionalidade”, ao tra- ciano para o moderno, do nacional para o
tar especificamente do romance de seu internacional, mas como um intelecto que
tempo, afirma Machado de Assis ([1910], incorpora discursos exteriores diferentes
pp. 17-8): em diferentes momentos de sua vida.
O “sentimento íntimo” machadiano,
“As tendências morais do romance brasi- portanto, deve ser entendido como adequa-
leiro são geralmente boas. […] o tom geral ção do escritor ao romance romântico de
é bom. Os livros de certa escola francesa, construção da interioridade do indivíduo,
ainda que muito lidos entre nós, não conta- porque ali estaria, conforme os pressupos-
minaram a literatura brasileira, nem sinto tos do idealismo romântico, a alma do povo,
nela tendências para adotar as suas doutri- que, em termos sociais, se traduzia nos
nas, o que é já notável mérito. As obras de valores do Império bragantino no Brasil.

Machado de
Assis e José de
Alencar, em
1873, ano em
que Machado
escreveu o
ensaio
“Literatura
Brasileira:
Instinto de
Nacionalidade”

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Daí a opção de Machado pelo romance de discursive systems as problems that have
“análise de paixões e caracteres” – espécie to be explained”.
de que, segundo ele, havia poucos exem-
plos que pudessem “satisfazer à crítica” no (“Para escrever uma história da literatura
Brasil. Enfim, em vez de tomar o ensaio de aberta e, ainda assim, funcional, temos de
Machado como “programa” para o que ele abandonar toda a pretensão por uma estru-
faria no futuro remoto, talvez fosse mais tura ou um modelo racional apriorístico e,
plausível tomá-lo como justificativa para o em seu lugar, oferecer uma explicação ra-
que fizera até 1873 e como profissão de fé cional para as ocorrências contingentes tais
para o que faria no futuro próximo. Pelo como as interferências de ruptura que dis-
menos, essa é a conclusão a que conduz a cutimos. Esse modelo está prestes a surgir,
análise das formas, da matéria e da crono- mas apenas como construção hipotética
logia dos romances de então: Ressurreição para responder teoricamente aos problemas
(1872), A Mão e a Luva (74), Helena (76) de compreensão histórica. Em termos de
e Iaiá Garcia (78). Isso sem contar, dentre organização, evitaremos com muita ênfase
outros escritos esquecidos pelos jornais, os os paradigmas das ciências sociais para nos
contos de Histórias da Meia Noite (73) e as aproximar o máximo possível da física
poesias indianistas de Americanas (75). experimental. Os modelos da ciência soci-
Nesse particular, seria interessante no- al têm sido usados com considerável su-
tar que os famosos estudos de Ao Vencedor cesso na história literária, particularmente
as Batatas (Schwarz, 1977) excluem de suas por colegas brasileiros da escola de Anto-
agudas reflexões justamente Ressurreição, nio Candido em São Paulo, mas eles redu-
o romance machadiano dos anos 70 mais zem, quando não ignoram, a consideração
radicalmente voltado para a construção devida ao espaço da experiência. Se in-
daquilo que o próprio artista, enquanto teó- vertermos a indagação e desviarmos nosso
rico, entendia por “sentimento íntimo” ou interesse da teoria para a prática na elabo-
“análise dos caracteres e das paixões”. ração da história literária, será possível
Enfim, Mario J. Valdés (2002, p. 69), da considerar tais interferências nos sistemas
Universidade de Toronto, escreve: discursivos como problemas que exigem
explicação”).
“In order to write an open and yet effective
literary history, we must abandon all Enfim, para ampliar a discussão da ma-
pretension of an a priori rational model or téria, além da prática artística integral do
structure and in its place offer rational escritor no período em questão, seria ne-
explanation for contingent events such as cessário levar em conta os pressupostos
the disruptive interferences we discussed. teóricos adotados por Machado de Assis na
A model will emerge but only as the polêmica estabelecida por ele diante do
construct of theoretical response to the “escândalo” de O Crime do Padre Amaro
problems of historical explanation. In terms (1875) e de O Primo Basílio (1878), na
of organization we shift markedly from the célebre crítica contra o Realismo e em de-
paradigms of the social sciences and come fesa da literatura romântica, publicada por
much closer to experimental physics. Soci- ocasião do lançamento do segundo desses
al science models have been used in literary livros – polêmica a que o escritor portu-
history with some success, especially by guês, aliás, não respondeu. Sem dúvida, os
Brazilian colleagues from the school of primeiros romances de Eça de Queirós e
5 A julgar pelo que conhece o
presente autor, os melhores es- Antonio Candido in São Paulo, but they suas profundas implicações para o futuro
tudos sobre a conflituosa rela-
ção de Machado de Assis com
reduce, if not dismiss, the consideration of da literatura de língua portuguesa produzi-
o surgimento de Eça de Queirós the space of experience. If we invert the ram completo desnorteamento em Macha-
são: “Quando Eça Escandali-
zava Machado” (Magalhães inquiry and move our attention from theory do de Assis (5). Isso já em 1878. Num pri-
Júnior, 1981, pp. 232-48) e to practice in the writing of literary history, meiro momento, ele procurou traduzir essa
“Apresentação” (Franchetti,
2001, pp. 9-44). we can look at these interferences in the sensação em termos de defesa estética da

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forma romanesca tradicional. Depois, op- gio, conforme os autores se afastem ou se
tou por renovar seu repertório, de onde aproximem da captação sincera de uma
resultou o compromisso com a “forma li- suposta essência da nacionalidade, razão
vre de um Sterne ou de um Xavier de pela qual não deixa, também, de ler o pas-
Maistre” (Assis, 1881, p. 5). Pela própria sado pela perspectiva do presente, como se
explicação intelectual do artista, portanto, o momento da enunciação crítica fosse a
a “volubilidade” de seus grandes narrado- culminância perfeita para a qual tudo con-
res, além de reflexo elaborado da realidade verge com a força irrefreável das grandes
Página
social do Segundo Reinado, poderia tam- verdades essenciais. Assim, com Antonio
bém ser entendida como apropriação de Candido, consolida-se em definitivo a vo- de rosto de
uma longa e conhecida tradição discursiva. cação hermenêutica e teleológica da crítica Formação
Depois do ensaio de Machado, na déca- brasileira iniciada com Denis e Garrett. Não
falta nele, também, a condenação explícita
da Literatura
da 1880, quando se tratou de sistematizar
os juízos críticos em histórias literárias da retórica como exercício que dissolve a Brasileira,
coesas e completas, os princípios da nacio- possível comunhão do espírito com as pa- primeira
nalidade e o surgimento de uma suposta lavras e as coisas.
sensibilidade compatível com as disposi- Da mesma forma, a crítica de vanguar- edição, de
ções do povo em surgimento continuaram da brasileira – representada, como se sabe, 1959
norteando os estudiosos, independentemen-
te do alcance de suas formulações ou da
qualidade de suas sínteses. É o que se ob-
serva tanto no pertinaz esforço científico
de Sílvio Romero, cuja História da Litera-
tura Brasileira é de 1888, quanto na tenta-
tiva de José Veríssimo, que, apesar do fla-
grante princípio nacionalista, procurou
ocultá-lo sob o aparente critério estético
como medida de valor literário, em sua
História de 1916.
Como se sabe, em 1959, Antonio Can-
dido publicou a mais inteligente, a mais
estimulante e a mais bem escrita das sínte-
ses culturais da literatura brasileira de to-
dos os tempos. Concebido por um crítico
dotado de invulgar talento artístico na dis-
posição e elocução da matéria, esse livro
continuará oferecendo sugestões mesmo
para aqueles que não concordam inteira-
mente com suas idéias ou pressupostos.
Apesar das reconhecidas qualidades de sua
Formação da Literatura Brasileira: Mo-
mentos Decisivos – em que a crítica
estilística se mescla com a historiografia
estrutural das mentalidades, indo muito
além do mal atribuído sociologismo –, a
obra mantém a visão teleológica de que há
um sentido imanente na história, a qual se
orienta inexoravelmente para o ponto óti-
mo da conquista vitoriosa da alma nacio-
nal. Essa premissa leva o admirável crítico
a adotar o mesmo padrão de censura e elo-

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por grandes poetas e excelentes ensaístas – (“Curiosamente, as novas histórias lite-
partilha do princípio teleológico-evolucio- rárias adotam com freqüência o mesmo
nista do ideário romântico, segundo o qual modelo narrativo teleológico e desenvol-
as letras caminham sempre do primitivo vimentista usado pelos Estados-nação:
para o sofisticado, do pior para o melhor, isto é, elas partem igualmente do princí-
do retrógrado para o progressista, do con- pio de que há, em funcionamento, um
servador para o revolucionário. Assim processo implicitamente natural conce-
como os primeiros críticos do século XIX bido com propósito e finalidade, em que
se empenharam na invenção, por recortes a literatura se acha diretamente relacio-
seletivos e mutilações programáticas, de nada ao ‘fim’ ou telos específico da legiti-
um passado colonial imposto à posteridade mação cultural”.)
como antecipação necessária da literatura
de seu tempo, a vanguarda concretista de Enfim, toda a visão hermenêutica de
São Paulo vem promovendo operações re- natureza romântica pode ser resumida na
troativas da mesma natureza epistemo- fórmula poundiana do “make it new”, por
lógica, isto é, tem efetuado incisões seleti- meio da qual o poeta, ensaísta e modelo da
vas com o propósito de instaurar uma vanguarda internacional promoveu inúme-
genealogia nobilitante para os próprios ras retomadas parciais do passado, com o
experimentos. Isso se observa, por exem- propósito de compor uma espécie de anto-
plo, na leitura concretista de Gregório de logia ideal dos supostos melhores momen-
Matos, de Sousândrade, de Pedro Kilkerry tos da literatura mundial. Como é sabido, o
e até do recente João Cabral de Melo Neto, projeto de Ezra Pound era acabar com a
cujos pressupostos teóricos em quase nada idéia de museu e promover uma presumível
coincidem com a concepção e a prática da funcionalidade poética, que pressupunha a
poesia concreta, não obstante a crença e noção de que toda a história literária existia
divulgação em sentido contrário. O presente para culminar no gosto vanguardista de sua
ensaio julga que a leitura integral de “Poe- geração. Seria ocioso enumerar as conhe-
sia e Composição: a Inspiração e o Traba- cidas contribuições do chamado “paideuma
lho de Arte” (Neto, 1998, pp. 51-70) (6), poundiano” para o século XX, com parti-
um dos raros textos teóricos de João Cabral, culares conseqüências na produção de poe-
torna evidente a diferença conceitual entre sia em países como o Brasil, mas já é tempo
ambos os projetos (7). de reconhecer a identidade de seu método
Linda Hutcheon e o já mencionado com a hermenêutica romântica, em favor
Mario J. Valdés, ambos da Universidade de um rigoroso enquadramento crítico. Uma
6 Publicado inicialmente no no 7 de Toronto, publicaram recentemente um de suas seleções mais controvertidas (e
da Revista de Poesia Brasileira,
então dirigida por um dos líde- volume coletivo com ensaios que discutem talvez das mais acertadas) consistiu em
res da chamada “Geração de
45”, Péricles Eugênio da Silva a inadequação, no século XXI, do modelo eleger a tradução de Arthur Golding de As
Ramos (São Paulo, abril de nacional e teleológico. Trata-se de Metamorfoses de Ovídio para o inglês
1956). O título original do
ensaio era “Teoria da Compo- Rethinking Literary History: a Dialogue on (1567), como “the most beautiful book in
sição – A Inspiração e o Traba-
lho de Arte”.
Theory (8). No ensaio de abertura, the language”. Geralmente, afirma-se que
“Rethinkig the National Model”, afirma o livro mais influente na obra de Shakes-
7 Sabe-se que João Cabral abre
Agrestes (1985, pp. 9-10) com Linda Hutcheon (2002, p. 5): peare foram As Metamorfoses, lidas na tra-
um poema-dedicatória a
Augusto de Campos. Se por um dução de Golding, o que lhe confere incon-
lado o texto revela compreensí- “Interestingly, the new literary histories fundível relevo histórico. Todavia, estudos
vel apreço pelo tipo de leitor,
tradutor, teórico e poeta que often adopt the exact developmental, recentes questionam a apropriação
sempre foi Augusto de Campos,
faz questão de manifestar a di-
teleological narrative model used by poundiana do texto de Golding, como se
ferença de concepção existen- nation-states: that is, they too assume an pode ver pelo seguinte trecho de John
te entre a poesia de ambos.
implicitly natural process at work which Frederick Nims (2000, pp. XIII-XIV), que,
8 Consultar bibliografia. Além
dos editores, colaboram: is shaped by purpose and design, wherein em acurado trabalho acadêmico, acaba de
Stephen Greenblatt, Marshall literature is directly related to the specific recolocar em circulação a tradução quinhen-
Brown, Walter D. Mignolo e
Homi Bhabha. ‘end’ or telos of cultural legitimation”. tista de Ovídio:

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“But how carefully had Pound read
Golding? He seems to have looked at the O SENTIDO COMO CONSTRUÇÃO
pages of Professor Rouse’s editon of 1904,
seen that the language was livelier than Todavia, em oposição ao consenso
much translator’s English, found a few hermenêutico, nos últimos anos, vem se
bright passages, and exalted his discovery destacando no Brasil a análise retórico-
into lifelong enthusiasm. There are signs poética da produção dos séculos XVI, XVII
of imperfect reading in the passages he e XVIII. Essa nova perspectiva baseia-se
quotes. […] My own opinion is that while no esforço de reconstrução das normas de
Golding’s work is not ‘beautiful’– if that produção de sentido próprias da época dos
word has any critical utility – it has other textos estudados. Ao contrário da herme-
claims on our attention”. nêutica romântica, o método retórico-poé-
tico enfrenta o sentido artístico de um texto
(“Mas teria Pound lido Golding com o de- como contingência histórica, entendendo-
vido cuidado? Parece que ele deu uma olha- o como resultado de operações lógicas de
da nas páginas da edição do Professor sistemas convencionais, cujo funcionamen-
Rouse, de 1904, percebeu que a linguagem to pretende conhecer e classificar. Como o
era mais viva do que a média do inglês de significado não vem da natureza nem de
tradutor, encontrou algumas passagens bri- sistemas fixos e eternos, mas de relações
lhantes e erigiu a descoberta em motivo de estabelecidas pela cultura e por suas instá-
entusiasmo de toda sua vida. Há sinais de veis convenções, a história e o momento
leitura incorreta nas passagens citadas por particular de enunciação apresentam-se
ele. […] Em minha opinião, embora o tra- como os responsáveis pela semantização dos
balho de Golding não seja ‘belo’ – se é que enunciados e de suas respectivas variações.
essa palavra possui algum valor crítico – A julgar pelo que conhece o autor do
merece nossa atenção por outras razões”.) presente ensaio, o primeiro exemplo siste-
mático de recusa da hermenêutica român-
Depois de refutar a modernização do tica em favor de uma leitura histórica das
passado como categoria crítica adequada letras na América Portuguesa encontra-se
ao estudo dele mesmo, o estudioso esfor- em A Sátira e o Engenho: Gregório de
ça-se por propiciar um enquadramento his- Matos e a Bahia do Século XVII (Hansen,
tórico de Arthur Golding que, por sua vez, 1989). Tanto quanto é possível supor, o
teria se apropriado da antigüidade latina passo decisivo dessa postura inicia-se na
para produzir um Ovídio elizabetano, em reconstituição dos “sistemas retóricos e
processo – conclui o presente ensaio – se- teológico-políticos” implícitos na base da
melhante ao proposto pelo próprio Pound sátira seiscentista. A releitura da biografia
no século XX. Como se vê, a recusa da do licenciado Manuel Pereira Rabelo, Vida
modernização do passado como categoria do Excelente Poeta Lírico, o Doutor
crítica da história não contraria o conceito Gregório de Matos e Guerra, que circulou
de literatura como apropriação discursiva em manuscritos na Bahia da primeira me-
por excelência. Ao contrário, ao reforçar a tade do século XVIII, demonstrou que a
idéia de arte como representação de discur- tradição romântica entendeu o texto do li-
sos, o conceito aqui esboçado questiona, cenciado como representação “fiel” de uma
por exemplo, a raiz da idéia de plágio e/ou entidade empírica, dela extraindo um con-
de originalidade posta em voga pela longa junto de propriedades humanas, psicológi-
tradição da hermenêutica romântica. cas, sociais e literárias, visto que o proce-
Shakespeare, suposto responsável pela “in- dimento hermenêutico supõe que o texto é
venção do humano”, jamais concebeu um sempre mediação sígnica entre um simula-
enredo próprio; como se sabe, todas as suas cro representante e uma essência represen-
peças partiram de textos consagrados em tada. Resultou daí a orientação triádica da
seu tempo. leitura canônica de Gregório de Matos:

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psicologismo + nacionalismo + transgres- do gênero epidítico ou demonstrativo
são. Por essa perspectiva, a sátira gregoria- (Hansen, 1989, p. 23), que, ao produzir uma
na seria expressão ressentida de um desajus- personagem eficaz, também expunha seu
tado ou de um canalha genial; de um insatis- autor à admiração do público, já não se diria
feito contra o sistema opressivo da máquina do século XIX ou do XX, mas com certeza
mercante internacional; de um precursor da do tempo de D. João V (1706-50). Como se
pluralidade do caráter nacional brasileiro; sabe, a época áurea do estilo agudo e enge-
ou de um antecipador das experiências lin- nhoso na América Portuguesa inicia-se mais
güísticas da vanguarda oswaldiana, do ou menos com a ascensão de D. João IV, em
concretismo e do tropicalismo baiano 1640, estendendo-se até o final do reinado
(Hansen, 1989, pp. 13-22). de D. João V, período a que hoje se dá o
A Sátira e o Engenho, em evidente pos- nome de Barroco.
tura renovadora, discordou dessas e de Assim, o que a tradição romântico-na-
outras interpretações de caráter hermenêu- cionalista interpretava como expressão de
Capa de tico e teleológico, esforçando-se por en- singularidade e de desvio, o autor de A
tender historicamente a biografia de Rabelo. Sátira e o Engenho passou a entender como
A Sátira e o A partir desse pressuposto, a hipótese mais aplicação da generalidade e da norma, so-
Engenho, de verossímil que se apresentou ao autor des- bretudo, porque os retratos do tempo, sen-
se livro foi ler a biografia de Rabelo como do cópia de cópia, atenuavam a espécie em
João Adolfo
um retrato composto retoricamente por tó- favor do gênero, retoricamente concebido
Hansen picas epidíticas destinadas a inventar uma (Hansen,1989, p. 16). Por esse pressupos-
(São Paulo, personagem emblemática, caracterizada pela to, os vínculos do retrato de Pereira Rabelo
força do engenho e pela penetração da agu- com uma suposta matriz empírica e huma-
Companhia das deza. Ao analisar o texto como encomiástico, na tornam-se improváveis, quando se cons-
Letras, 1989) o retrato foi decodificado por meio de regras tata que foi produzido após a morte de
Gregório, tendo-se fundado exclusivamente
na tradição oral da Bahia seiscentista e
setecentista. Depois dessa leitura, a famo-
sa biografia deixou de ser interpretada como
documento sobre um homem, para ser lida
como uma ficção verossímil, dotada da
mesma condição ontológica das obras atri-
buídas ao retratado:

“Linguagem é consciência prática e, pelo


critério pragmático deste trabalho, os poe-
mas são o material e o produto de uma inter-
venção presente, esta, que neles sedimenta
um efeito particular de sentido deslocando
outras sedimentações particulares. Fazen-
do-o, reorienta o sentido das posições
discursivas neles dramatizadas, encenando
a sua intervenção nas práticas discursivas
do século XVII, ao mesmo tempo em que
encena a contradição do lugar institucional
da análise. Não é análise ‘mais verdadeira’,
por isso, nem sequer ‘verdadeira’, mas ou-
tra, cuja particularidade é a de propor os
poemas conforme regras discursivas de seu
tempo e, simultaneamente, a de criticar po-
sições críticas ‘expressivas’ e ‘representati-

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vas’, que obliteram a historicidade da práti- valores) do texto no percurso da história de
ca satírica quando a efetuam como exterior sua recepção.
à sua própria história, ora como ‘reflexo’
realista, ora como ‘ressentimento’ e ‘oposi-
ção’ expressivos” (Hansen, 1989, p. 15).
LEITURAS DE O URAGUAY
Assim, A Sátira e o Engenho demonstra
que a crítica romântica e pós-romântica, ao Em perspectiva semelhante, O Uraguay
desconsiderar a mediação retórica dos tex- – um dos mais relevantes textos do chama-
tos da América Portuguesa, deixou de os do período colonial – talvez pudesse ser
ler como ficção para os interpretar como lido à luz da poética cultural da Ilustração
expressão da psicologia dos autores, en- portuguesa (historicamente considerada),
tendendo-os como parcelas da alma na- donde resultaria a compreensão de sua es-
cional, que, em contínuas encarnações trutura como uma espécie de oração inter-
evolutivas, acabaram – como se viu acima calada no grande discurso político e pu-
– por se identificar com o presente dos in- blicitário instaurado por Sebastião José de
térpretes, momento em que, pela dinâmica Carvalho e Melo, enquanto ministro de Es-
de uma interpretação interessada, assumem tado de D. José I (1750-77). Nesse sentido,
gradativamente a forma do Estado nacio- o poema de José Basílio da Gama poderia
nal, de onde se estilhaçam as mais variadas ser entendido como uma dentre as inúmeras
interpretações “anacrônicas”. peças artísticas (poesia, pintura, estatuária,
Em oposição à hermenêutica românti- gravura), e livros históricos e doutrinários
ca, que procura homogeneizar o passado produzidos pelo governo pombalino –, que
pelos critérios do presente, a crítica de ori- teria propiciado um mecenato formalmente
entação retórico-poética recusa a idéia de constituído (9). Essa leitura necessariamen-
valor absoluto, procurando descobrir os te deslocaria o universo específico de refe-
mecanismos segundo os quais se constrói a rência de O Uraguay do Brasil para Portu-
idéia de valor, de belo, de bem e de verda- gal, entendendo-o, não mais como antecipa-
de. Os poemas não sobrevivem no vazio ção da sensibilidade romântica, mas como
metafísico. O projeto, portanto, possui ní- encômio alegórico da ação portuguesa na
tida orientação arqueológica, segundo a América, sem deixar de considerá-lo como
qual a estrutura, a função e o valor das obras precioso objeto de apropriação retrospecti-
deverão ser reconstituídos segundo sua va de românticos, pós-românticos e neo-
“normatividade inicial”, como produção românticos (10).
cultural específica de sua época, e não como Depois de entender O Uraguay como
objetos passivos que se deixam unificar parte do discurso cultural instaurado pelo
transistoricamente pelo olhar uniformi- conde de Oeiras, em sua fase de ascensão
zador do presente. Essa perspectiva de hierárquica e de consolidação política, uma
“reconstituição de verossímeis históricos” leitura assim considerada filiaria o poema
9 Dentre tais produções se con-
pressupõe, portanto, o entendimento do a uma doutrina poética específica, pois até tam: Relação Abreviada
texto conforme a perspectiva do autor estu- hoje só se fala vagamente de suas relações (1757); Dedução Cronológi-
ca (1767); Origem Infecta da
dado, numa tentativa de restauração, tam- com os princípios da chamada arte neo- Relaxação da Moral dos De-
nominados Jesuítas (1772);
bém, do horizonte de expectativa do públi- clássica e com as idéias gerais do Ilumi- Compêndio Histórico do Esta-
co a quem se dirigia. Consiste, portanto, no nismo europeu, sem jamais se ter estabele- do da Universidade de
Coimbra (1772); e O Desertor,
entendimento dos textos conforme a poéti- cido uma conexão doutrinária bem defini- poema herói-cômico de José
Inácio da Silva Alvarenga
ca do tempo, concebida como parte do dis- da. Assim, tais vínculos, requeridos por esse (1774).
curso sociocultural dominante no momen- tipo de leitura, seriam estabelecidos, so- 10 Idéias abertas sobre as diver-
to de enunciação, e não conforme as diver- bretudo, com a Arte Poética ou Regras da sas hipóteses de leitura de O
Uraguay e uma surpreendente
sas hipóteses de leituras ao longo das varia- Verdadeira Poesia, de Francisco José análise do poema encontram-
ções do tempo, que, certamente, deverão Freire, cuja segunda edição foi patrocinada se em “Basílio da Gama e a
Ilustração”, de Sérgio Paulo
ser consideradas no exame do valor (ou dos por Sebastião José de Carvalho e Melo, em Rouanet (2001).

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1759 – logo depois alçado à condição de e o deste não se confunde com o de Homero,
conde de Oeiras. Na dedicatória da obra, o de Basílio diferencia-se de seus antece-
Freire propusera o ascendente estadista dentes por se inscrever no discurso doutri-
como inevitável matéria de poesia para os nário da ilustração portuguesa, cuja poéti-
novos poetas do tempo, afirmando que sua ca foi sistematizada por Freire (1759, vol.
À esquerda, Arte não só compendiava os “sólidos prin- II, Livro III, p. 165), que o define da se-
primeira edição cípios” para a “verdadeira poesia”, como guinte maneira:
também oferecia “o verdadeiro Assunto aos
de O Uraguay
seus versos”. Uma década depois, no mes- “A epopéia é a imitação de uma ação herói-
(1769), mo ano em que o conde receberia o título ca, perfeita e de justa grandeza, feita em
patrocinada de marquês, saiu O Uraguay, que a leitura verso heróico por modo misto, de maneira
pretendida entenderia como uma possível que cause uma singular admiração e prazer
pelo marquês de resposta à ênfase da convocação de Fran- e, ao mesmo tempo, excite os ânimos a amar
Pombal. cisco José Freire. É nessa poética, por exem- as virtudes e as grandes empresas”.
plo, que se deveriam procurar os princípios
À direita,
segundo os quais o poeta concebe a idéia Pela lógica do poema, a dissolução do
primeira edição de herói e de epopéia, entendidos confor- domínio jesuítico sobre os índios guaranis,
de O Desertor me a funcionalidade poética do século num período de franca laicização do Esta-
XVIII. Logo, parece pouco estimulante a do, e a restituição deles à condição de súdi-
(1774),
tentativa de retomada da velha discussão tos da Coroa portuguesa apresentavam-se
também sobre a suposta inadequação de O Uraguay como ações suficientemente heróicas para
patrocinada a um conceito abstrato e universal de epo- o epos setecentista, concebido, obviamen-
péia, pois é inevitável que os gêneros lite- te, conforme os padrões utilitários do des-
pelo marquês de rários também se transformem. Assim como potismo esclarecido (11).
Pombal o epos de Camões não é o mesmo de Virgílio A leitura afirmaria, ainda, que, em

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nome da perspectiva teleológica da for-
mação de uma literatura brasileira ou de DESFECHO TEÓRICO-FICCIONAL
um suposto logos universalista, essa co-
nexão específica de O Uraguay com a ilus- Quando o general grego Alcibíades, tra-
tração portuguesa foi ignorada, atenuada, zido ao século XIX num famoso conto
considerada irrelevante e, mais recente- machadiano, foi informado de que os eternos
mente, distorcida. Diria, também, que em deuses de seu tempo tinham morrido, mos-
função disso o poema passou a ser exclu- trou-se muito insatisfeito, mas resistiu ao
sivamente valorizado por sua dimensão impacto da notícia. Todavia, não resistiu e
indianista e naturista, entendida como fa- morreu de espanto, ao perceber que o século
tor de brasilidade e estímulo para o nacio- XIX substituíra o padrão grego de beleza pelo
nalismo ou como pretexto de denúncia mau gosto das casacas, das botas e dos cha-
contra os conquistadores europeus. Da péus da Rua do Ouvidor. Em outro texto,
mesma forma, poder-se-ia admitir também Machado de Assis faz uma personagem es-
que, fecundos em diversos sentidos, esses tranhar que os joalheiros não admitissem que
pontos de vista, por outro lado, formula- os botocudos furassem os beiços para enfeitá-
ram o insustentável pressuposto crítico de los com um pedaço de pau. Sabe-se o que
que a adesão do poema ao ideário político James Joyce pensava de Homero, sem o qual
lusitano representaria mau gosto poético, talvez não pudesse conceber o romance que,
não só em Basílio, mas em todos os escri- ainda hoje, é considerado uma das maiores
tores da América Portuguesa. manifestações da literatura de todos os tem-
Orientados pela hermenêutica teleoló- pos. À maneira de Machado, seria interes-
gica de Denis e Garrett, continuaria a leitu- sante imaginar uma revolução cronológica e
ra, os críticos românticos iniciaram um indagar se Homero concordaria com essa
processo de desconsideração sistemática de opinião e, se ao menos, acharia alguma graça
obras inteiras, tal como ocorreu, por exem- no Ulysses joyciano. É bastante provável que
plo, com o excelente poema herói-cômico Homero viesse a odiar o livro com o qual o
O Desertor, de Silva Alvarenga. Esse poe- século XX tanto se identificou. E qual seria a
ma, contendo uma riquíssima alegoria cul- impressão de Dante se ele pudesse ler, diga-
tural, decorre do propósito histórico de mos, “The Waste Land”? Certamente, o hor-
celebrar a reforma da Universidade de ror seria ainda maior. Não obstante, Eliot
Coimbra (1772). Mal lido pela crítica ro- amava a Divina Comédia. Assim como hoje
mântica, seria depois sistematicamente ninguém se aborrece com a circunstância de
acusado de limitação temática. A leitura um filme durar em média duas horas, os letra-
afirmaria, então, que a crítica do século XX dos do século XVIII ainda liam Os Lusíadas 11 Um estudo recente sobre O
sequer pensou na hipótese de que Silva numa sentada só, conforme conhecido depoi- Uraguay, depois de insistir na
idéia de “encômio” como
Alvarenga, escrevendo para o seu tempo, mento de Jerônimo Soares Barbosa. Arrema- “bajulação”, classifica a inclu-
são de Sebastião José de Car-
atualizava o princípio horaciano segundo o tando essa seqüência de presumíveis impre- valho e Melo no movimento
qual a arte deveria integrar-se à dinâmica vistos decorrentes de variantes culturais que europeu do despotismo escla-
recido simplesmente como “a
do discurso social do momento de elocução. poderiam funcionar como argumento irôni- ditadura pombalina”.
Assim, não podendo satisfazer aos anseios co contra a insistência da concepção 12 Paulo Giovani esboçou um
das abstrações universalizantes dos temas teleológica da história ou da sistematização passo importante para a
reconsideração histórica de O
românticos e neo-românticos, O Desertor do passado em grandes unidades estabelecidas Desertor, em Poesia e Estado:
o Louvor às Reformas Educacio-
seria praticamente apagado da história lite- por critérios exclusivos do presente de nais Pombalinas Encenado na
rária (12). Pelas mesmas razões, O Uraguay enunciação crítica, poder-se-ia perguntar: que Obra de Manuel Inácio da Sil-
va Alvarenga, dissertação de
seria submetido a um verdadeiro processo peça de Shakespeare teria sido mais amada mestrado defendida no Depar-
tamento de Letras Clássicas e
de mutilação para se enquadrar no sistema pelos freqüentadores de teatro na época Vernáculas, Área de Literatura
de valorização dos elementos brasílicos da elizabetana? Romeu e Julieta? Macbeth? Brasileira, na Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências
produção anterior à independência brasi- Hamlet? Nenhuma dessas, senão Titus Humanas da Universidade de
leira (Teixeira, 1999, pp. 47-60, pp. 486- Andronicus, a única tragédia shakespeariana São Paulo, em agosto de
2002, sob orientação de João
94, pp. 520-31). que teve três edições em vida do autor. Ape- Adolfo Hansen.

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sar disso, T. S. Eliot a considerou uma das O poema põe em cena a negação con-
mais estúpidas e menos inspiradas peças ja- ceitual da essência ou de uma “natureza
mais escritas na história do teatro (Bate, 2002, humana”. Insinua que a hipótese de uma
p. 34). filosofia moral totalizante é sonho de idea-
Todas essas hipotéticas manifestações lista (que não raro se converte em ideolo-
da falta de identidade do homem com a gia). Sugere também que verdades éticas
humanidade (a falácia dos grandes siste- muito abrangentes desconsideram as con-
mas unitários, como diria Foucault) acham- formidades específicas de lugar e de tem-
13 Os leitores, com razão, encon- se artisticamente condensadas no poema po, categorias fundamentais a quem deseja
trarão falhas no presente en-
saio. Uma delas, com certeza, “Anedota Búlgara”, de Carlos Drummond ver a história por uma ótica das particula-
dever-se-á à ausência – por moti-
vos circunstanciais – de comen-
de Andrade (1969, p. 21): ridades tangíveis e resistentes ao escrutí-
tários específicos sobre A Má- nio da razão e da sensibilidade. Sem des-
quina de Gêneros, de Alcir
Pécora (São Paulo, Edusp, “Era uma vez um czar naturalista prezar o humor, o poema de Drummond
2001). Embora contenha uma que caçava homens. relativiza o absoluto, insinuando, com
espécie de manifesto sistemáti-
co em favor da crítica retórico- Quando lhe disseram que também se Machado, que a paisagem depende do pon-
poética, esse livro deve ser en-
tendido como uma das mais [caçam borboletas e andorinhas, to de vista. Enfim, a história cria suas ver-
eficazes contribuições aos estu- ficou muito espantado dades, assim como as verdades possuem
dos literários em geral dos últi-
mos 10 ou 15 anos no Brasil. e achou uma barbaridade”. sua história (13).

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