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@PareBeloMonte: três processos judiciais, nenhuma consulta

Página 13

ISSN 0102-0625
Em defesa da causa indígena
Ano XXXV • N0 357 • Brasília-DF • Agosto 2013 – R$ 5,00

Conselho Aty Guasu:


Estado imposto,
Constituição não
cumprida  Página 5
Tekoha Ava-Guarani, oeste paranaenese. Foto: Renato Santana/Cimi — Liderança Guarani Kaiowá durante Conselho Aty Guasu, no Mato Grosso do Sul. Foto: Ruy Sposati/Cimi

Mobilizações de
junho/julho: o Abril
Indígena que não
acabou  Páginas 6, 7, 10 e 11

Avá-Guarani: o povo Depois de ouvirem da ministra da Casa Civil, Gleisi


Hoffmann, de que não existiam ou então eram paraguaios,

existe e luta pelas


povo Avá-Guarani, oeste do Paraná, resiste sobre os
tekoha e exige a demarcação das terras tradicionais,
além de melhorias em saúde e educação. Clima de

terras tradicionais hostilidade cresce no entorno das aldeias contra indígenas


e servidores da Funai            Páginas 8 e 9
Nota Pública
Porantinadas
Regulamentação da Convenção 169
Por que o Cimi não aceitou o convite da O mantra de Lula
Ao inaugurar a obra de um centro

Secretaria Geral da Presidência da República? de piscicultura em Rio Branco (AC), o


ex-presidente Lula ironizou “o pessoal

O
da ecologia” por campanhas como as
Conselho Indigenista Missioná- indígenas sem nenhuma consulta às no Pará, reforçam ainda mais a análise contrárias às Usinas de Santo Antônio e
rio (Cimi), assim como outras comunidades que nelas habitam. Não exposta. Jirau. “Porque tinha um peixinho, tinha
não sei das quantas... Foi um inferno”,
organizações indigenistas, de- é aceitável lançar regulamentação de Não é por falta de aviso e postura
disse o ex-presidente. Lula já reclamou
cidiu não participar da “Oficina tal importância na arena de selvagens política dos movimentos indígena e das “machadinhas indígenas” que pa-
com a Sociedade Civil sobre o processo contradições, estimulando a autofagia indigenista que chegamos a tal im- ravam obras e convidou os indígenas a
de regulamentação da Consulta Prévia jurídica. Infelizmente tratamos de passe. Reafirmamos como posição, aprenderem a pescar em tanques, no
- Convenção 169 da OIT”, promovida medidas e conteúdos inconciliáveis e o não obstante, trecho da carta final Pará, na região de impacto da UHE Belo
Monte. Lula fala como a elite, é o retrato
pela Secretaria Geral da Presidência da governo deverá, de uma vez por todas, do IX Acampamento Terra Livre dos do nosso mais atualizado e atrasado
República, em Brasília (DF), nesta quinta- fazer uma opção política. Povos Indígenas, ocorrido entre 15 e conservadorismo. O ex-presidente segue
-feira, 1º de agosto. Para completar, na última semana, 23 de julho de 2012, durante a Cúpula com o mantra do presidente.
A Convenção 169 da Organização nos deparamos com a notícia de que dos Povos, no Rio de Janeiro, sobre a
Internacional do Trabalho (OIT), no en- os ministros da Justiça, José Eduardo convenção. Grilagem de
tendimento do Cimi, é uma conquista Cardozo, e da AGU, Luiz Inácio Adams, “Exigimos a garantia do direito à
histórica e fruto das lutas travadas pe- orientaram a bancada ruralista a elabo- consulta e consentimento livre, prévio
números e dados
los povos originários e tradicionais em rar o PLP 227, que nada mais é do que e informado, de cada povo indígena, Parlamentares e organizações rura-
listas passaram a basear suas opiniões
defesa de suas terras. Desse modo, é a oficialização dos termos da Portaria em respeito à Convenção 169 da OIT – contra os povos indígenas e a demarca-
de fundamental importância assegurar 303 como marco regulador para defi- Organização Internacional do Trabalho, ção de terras tradicionais em números
a aplicação deste instrumento inter- nir, na Constituição, o que é exceção de acordo com a especificidade de cada inflacionados, megalômanos e sem
nacional, pois a Convenção 169 pode para o usufruto exclusivo das terras povo, seguindo rigorosamente os prin- fontes. Os dados surgem tal como os
latifúndios: sem explicação, mas não
significar uma nova forma de relação tradicionais. cípios da boa-fé e do caráter vinculante
do nada. Onde estão as fontes? Qual a
entre o Estado e estes povos. Cremos que tal caminho, ainda mais desta convenção. Precisamos que seja base de tais números e dados? Estamos
Justamente por essa razão a discus- acidentado pela decisão em alterar o respeitado e fortalecido o tecido insti- diante de uma verdadeira grilagem de
são deve ter um caráter que assegure procedimento de demarcação de terras tucional de cada um de nossos povos, informações, que gera distúrbios peri-
de fato a emergente possibilidade, e indígenas, ressaltado pela presidente para dispor de mecanismos próprios de gosos e ódio da sociedade envolvente,
sobretudo nas regiões, contra os indíge-
não tratada como mera formalidade Dilma Rousseff em encontro com deliberação e representação capazes nas e seus apoiadores. O pior: tais dados
na relação entre Estado e povos ori- lideranças no último dia 11 de julho, de participar do processo de consultas são assimilados pela grande imprensa,
ginários. Compartilhamos, porém, a não é razoável e tampouco garantirá o com a frente estatal”. governos e Justiça como verdadeiros,
análise do movimento indígena de cumprimento dos verdadeiros efeitos consolidando como fontes de boa-fé os
1º de agosto de 2013 pais da mentira e manipulação.
que o governo federal precisa sinalizar da Convenção 169. Experiências como
com o interesse de conduzir essa nova a construção de usinas hidrelétricas Cimi
relação entre Estado e povos. Por en- nos rios Xingu, Teles Pires e Tapajós, Conselho Indigenista Missionário Os povos indígenas
quanto, a opção governamental é pela sabem bem
formalidade, para a decepção de todos Durante a mesa de diálogo entre o
e todas envolvidos. MARIOSAN governo federal e os povos indígenas,
Infelizmente a maneira como a criada a partir do encontro de lideran-
regulamentação vem sendo conduzida ças com a presidente Dilma Rousseff,
o ministro da Secretaria Nacional da
apura a linguagem ideológica colonia-
Presidência da República, Gilberto
lista, aprofundando na democracia os Carvalho, disse que as comunidades
instrumentos de dominação racial. O mal sabem das pressões que eles, go-
Cimi acredita ser justo o posicionamen- verno, passam para atender pautas in-
to da Articulação dos Povos Indígenas dígenas. Tal como quando chamou os
Munduruku de bandidos, o ministro
Brasileiros (Apib) em não prosseguir erra: quem mais sofre pressões pelas
com o diálogo pela regulamentação pautas que defendem são os próprios
enquanto o governo não revogar a povos indígenas. São mortes, expul-
Portaria 303 da AGU. sões, suicídios, violências diversas. A
É de conhecimento público que tal distância da terra tradicional e décadas
e décadas de lutas que muitas vezes
portaria se contrapõe e ofende a Con- parecem não sair do lugar. O ministro
venção 169 quando permite a entrada segue errando com os povos indígenas.
de grandes empreendimentos em terras
ISSN 0102-0625

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Agosto–2013 2
Conjuntura

Ministros da Justiça e da AGU sugeriram


criação do PLP 227

Foto: Marcelo Cassal Júnior/ABr


Renato Santana, Eduardo Cardozo, e pelo Advogado
de Brasília (DF) Geral da União, Luiz Inácio Lucena
Adams, corroboram a urgência e o

O
s ministros da Justiça José Edu- mérito da matéria”, diz trecho da jus-
ardo Cardozo e da Advocacia- tificativa apresentada pelo deputado
-Geral da União Luiz Inácio Homero Pereira.
Adams sugeriram aos parla- O deputado Padre Ton (PT/RO),
mentares ruralistas a criação do PLP presidente da Frente Parlamentar dos
227/2012, que busca lei complementar Povos Indígenas, afirmou que em con-
ao artigo 231 da Constituição Federal – versa com o líder do governo Arlindo
“Dos Índios” – apontando as exceções Chinaglia ouviu que houve um acordo
ao direito de uso exclusivo dos indíge- para que ministros do governo não
nas das terras tradicionais. O projeto é fossem chamados ao Congresso, dando
rechaçado pelo movimento indígena. a liberdade aos ruralistas para tramitar
A sugestão, conforme o principal au- o PLP 227. Chinaglia disse ao deputa-
tor do projeto, deputado Homero Perei- do que estava cumprindo ordens que
ra (PSD/MT), foi feita pelos dois ministros vinham do Palácio do Planalto.
durante audiência pública na Câmara dos Tanto Cardozo
quanto
Deputados no dia 20 de novembro de
2012. “Durante os debates foi sugerida, Deputados são financiados por empresas beneficiadas pelo projeto Adams estão
envolvidos em
duas outras
pelos dois Ministros, a elaboração de

A
medidas
Projeto de Lei Complementar visando à o menos seis dos maiores gru- nas terras indígenas campo fértil e A holandesa Bunge, gigante mundial danosas
regulamentação do § 6º do Artigo 231 pos empresariais nacionais e promissor para a exploração de suas do agronegócio fundada no século ao direito
da Constituição Federal, como instru- estrangeiros da rede do agrone- áreas produtivas, atreladas massiva- XIX e que chegou ao Brasil na segunda dos povos
gócio, mineração e da indústria de ar- mente às commodities. Esses grupos década do século XX, depositou nos indígenas
mento de conciliação entre as partes de ocupação
mamentos investiram R$ 1 milhão 395 comerciais financiaram parte ou o deputados do setor R$ 360.000,00.
envolvidas”, diz trecho da justificativa. do território
mil nas campanhas eleitorais – 2010 total das campanhas políticas dos tradicional
Dias depois da audiência, os ruralistas - de nove dos 17 deputados federais parlamentares que propuseram o PLP Os reais interessados
apresentaram o projeto. que assinaram o PLP 227. Os dados 227. Os 17 deputados federais são Tornou-se comum, no Congresso
Conforme o PLP 227, tais exceções são do Tribunal Superior Eleitoral conhecidos opositores dos direitos Nacional, parlamentares ruralistas,
configuram a exploração dos territórios (TSE) - confira abaixo a lista completa indígenas em suas atividades parla- ligados às redes do agronegócio e
indígenas pela rede do agronegócio, de doadores das campanhas dos 17 mentares e profissionais. latifúndio, tomarem uso da palavra nas
empresas de mineração, além da cons- parlamentares autores do PLP 227. A multinacional estadunidense tribunas da Câmara e Senado federais
trução de empreendimentos ligados Outras dezenas de empresas e Cosan, produtora de biocombustíveis para atacar organizações indigenistas
aos interesses das esferas de governo multinacionais de grãos, agrotóxicos, e que mantinha usinas de cana em ter- e ONGs ambientais. As acusações são
– federal, estadual e municipal. frigoríficos, mineradoras e construto- ras indígenas no Mato Grosso do Sul, homogêneas e se concentram em
ras estão também figuradas entre as investiu R$ 150.000,00 nas campanhas supostos interesses escusos.
Tanto Cardozo quanto Adams estão
principais doadoras dos parlamen- eleitorais de Luiz Carlos Heinze (PP/ O último a vociferar tais acusa-
envolvidos em duas outras medidas ções foi o deputado federal Moreira
tares que assinaram o PLP 227. Em RS), franco opositor das demarcações
danosas ao direito dos povos indígenas tempos onde integrantes da Frente de terras indígenas, Giovanni Quei- Mendes (PSD/RO), beneficiado com
de ocupação do território tradicional. Parlamentar da Agropecuária denun- roz (PDT/PA), latifundiário paraense, recursos da indústria de armas,
A Portaria 303 da AGU, suspensa no ciam supostos interesses escusos de Roberto Balestra (PP/GO), grande pro- Cosan e JBS. O parlamentar se indig-
segundo semestre do ano passado, visa organizações indigenistas e ONG’s prietário de terras no centro-oeste, e nou com um dia de combate ao PLP
estender para todas as terras indígenas ambientais, sem nunca denominar Moreira Mendes (PSD/RO), relator do 227 nas redes sociais. Chamou os
do país as condicionantes propostas quais, as cifras demonstram na prática PLP 227 e também latifundiário com manifestantes de “agourentos” e se
pelo falecido ministro Menezes de quem tem que se explicar em matéria interesses econômicos voltados ao referiu a organizações indigenistas e
Direito à homologação da Terra Indí- de interesses. agronegócio. ONG’s como detentoras de interesses
gena Raposa Serra do Sol, ainda sequer O PLP 227, em tramitação e ges- Porém, essa é apenas a ponta do escusos. A senadora Kátia Abreu (PSD/
tado no ano passado, pretende criar iceberg. A multinacional JBS, maior fri- TO) também já adotou tal recurso de
votadas pelos ministros do Supremo
lei complementar ao artigo 231 da gorífico do mundo notificado em 2011 oratória.
Tribunal Federal (STF). Para os mais exaltados, é até mes-
Constituição Federal – “Dos Índios” – pelo Ministério Público Federal (MPF)
No Ministério da Justiça, Cardozo apontando exceções ao direito de uso por comercializar animais criados na mo o caso de uma Comissão Parlamen-
tem sido o principal porta-voz do grupo exclusivo dos indígenas das terras tra- Terra Indígena Marãiwatsédé, do povo tar de Inquérito (CPI) para investigar o
encastelado no governo federal que dicionais, em caso de relevante inte- Xavante, despejou nos cofres das que, ou quem, está por trás das demar-
pretende modificar o procedimento resse público da União. Dentre as tais campanhas eleitorais R$ 420.000,00. cações de terras indígenas. Vale tudo
de demarcação de terras indígenas exceções, conforme o PLP 227, está a A Gerdau, cujo proprietário, Jorge no jogo de interesses, muito longe de
no país. Em encontro com lideranças exploração dos territórios indígenas Gerdau, ganhou em 2011 um gabinete ser apenas das empresas financiadoras
indígenas, a presidente Dilma reiterou pela rede do agronegócio, empresas bem ao lado da sala da presidente das campanhas. Paulo César Quartiero
as declarações de Cardozo. de mineração, além da construção de Dilma Rousseff para aconselhar o go- (DEM/RR) era um dos rizicultores, os
empreendimentos ligados aos interes- verno, investiu R$ 160.000,00. chamados arrozeiros, que detinha
A opinião dos ministros serviu de
ses das esferas de governo – federal, Já a Seara, do grupo internacional área dentro da Terra Indígena Raposa
base até mesmo para a solicitação de
estadual e municipal. Marfrig, dos mais destacados na rede Serra do Sol. O parlamentar chegou a
urgência do PLP 227: “As sugestões A aprovação do PLP 227 interessa do agronegócio, R$ 75.000,00. A ser preso pela Polícia Federal acusado
apresentadas em audiência pública diretamente setores empresariais Associação Nacional da Indústria de de comandar um ataque a tiros contra
realizada nesta Casa, em 20 de novem- nacionais e internacionais, que vêem Armas e Munições doou 230.000,00. comunidade indígena. (R.S.)  n
bro de 2012, pelo Ministro da Justiça, 3 Agosto–2013
Violência

Demarcar terras é fundamental para diminuir


a violência contra os povos indígenas
Patrícia Bonilha, escreveu uma carta afirmando que não
de Brasília deixaria sua terra ancestral. E, mais, que
resistiriam mesmo que, para isso, mor-

A
omissão em relação às demar- ressem lá, todos. Erroneamente, houve
cações das terras indígenas a interpretação de que estavam anun-
pelo atual governo federal foi ciando um suicídio coletivo. Não era o
apontada como uma das prin- caso, mas com uma ampla repercussão
cipais causas do aumento de diferentes na imprensa, a comoção foi enorme no
formas de violências contra os povos Brasil e no exterior. Naquele contexto,
indígenas em 2012, em relação ao ano muitas pessoas acrescentaram o nome
anterior. Lançado no dia 27 de junho, do povo “Guarani Kaiowá” em seus
o Relatório Violência Contra os Povos próprios nomes nas redes sociais.
A vida
Indígenas no Brasil, uma publicação Solano afirma que quase nada mudou
dos povos do Conselho Indigenista Missionário de lá pra cá, apesar de eles não pedirem
indígenas está (Cimi), aponta uma ampliação do nú- muito. “Só queremos o direito de viver
vinculada à
terra. É na sua mero total de casos e vítimas nas três com dignidade e sobrevivermos de nossas
terra ancestral categorias que aborda. próprias terras”, garante. No entanto,
que ‘o índio Verifica-se um crescimento de 237% a realidade é que a população de sua
é’. O governo
federal na categoria Violência contra a Pessoa, comunidade (50 homens, 50 mulheres e
tem que, que engloba ameaças de morte, ho- 70 crianças) estão confinados a viver em
urgentemente,
saldar
micídios, tentativas de assassinato, apenas um hectare de terra e sem qual-
esta dívida racismo, lesões corporal e violência quer assistência da Fundação Nacional
histórica com sexual. O número de assassinatos de do Índio (Funai) e da Secretaria de Saúde
os povos
indígenas. indígenas aumentou para 60 vítimas, Indígena (Sesai) porque o fazendeiro não
Este é o nove a mais que no ano anterior. Com permite o acesso ao local onde estão.
único modo 37 casos, o Mato Grosso do Sul continua Os deputados Chico Alencar (PSOL-
de propiciar
as condições sendo o estado com o maior número de -RJ), Domingos Dutra (PT-MA) e Janete
fundamentais ocorrências, seguido pelo Maranhão, Capiberibe (PSB-AP), além da coorde-
para a
com sete vítimas. Em comparação com Jeito diferente de ser nadora da 6a Câmara de Coordenação
sobrevivência
física e 2011, os casos de Violência contra o Segundo Maurício Mbyá Guarani, e Revisão do Ministério Público Federal,
cultural Patrimônio saltaram de 99 para 125, que vive na comunidade de Estiva, mu- Déborah Duprat, estiveram presentes
desses
povos”,
o que representa um aumento de 26%. terras indígenas no Brasil desde a aber- nicípio de Viamão, no Rio Grande do no lançamento do Relatório. Todos
afirmou Cleber Em relação à Violência por Omissão do tura democrática, em 1985. Sul, o aumento da violência contra os eles demonstraram consternação em
Buzatto, Poder Público, foram relatadas 106.801 “A vida dos povos indígenas está vin- indígenas é percebido a cada dia, nos relação à situação de violência a que
secretário
executivo do vítimas, o que significa um aumento de culada à terra. É na sua terra ancestral meios de comunicação ou nas ruas. Ele os povos indígenas estão submetidos
Cimi 72%, considerando que 61.988 vítimas que ‘o índio é’. O governo federal tem afirma que não entendiam o motivo de e expressaram apoio à demarcação dos
foram registradas em 2011. que, urgentemente, saldar esta dívida tanta preocupação e das difamações seus territórios tradicionais.
“Em vez de falarmos em diminuição, histórica com os povos indígenas. Este é contra os indígenas. “Mas agora en-
lamentamos dizer que as situações o único modo de propiciar as condições tendemos que é, justamente, porque Falta vontade política
se repetem e houve um aumento de fundamentais para a sobrevivência física temos direitos garantidos e os fazen- A baixa execução de recursos au-
diversas formas de violência contra e cultural desses povos”, afirmou Cleber deiros não querem devolver nossas torizados pelo governo federal para a
os povos indígenas no Brasil. O maior Buzatto, secretário executivo do Cimi. terras”, avalia. Ele se mostra indignado implementação de políticas públicas
problema é a falta de demarcação de A antropóloga Lúcia Helena Rangel, ao considerar que não é possível que o evidencia situações em que o que não
áreas indígenas. Não tomar providên- coordenadora de pesquisa do Relató- avanço econômico planejado pelos go- há, de fato, é disposição para solucionar
cia em relação à delimitação das áreas rio, destacou a violência imposta pela vernos custe a vida dos indígenas. “Nós severos problemas enfrentados pelos
indígenas significa escancarar as portas precariedade da saúde indígena, pelo temos o nosso jeito de viver, pensar, povos indígenas em praticamente todo
para qualquer tipo de invasão. Invasões fato de que muitas populações estão lidar e respeitar a terra. Tudo pra gente o território nacional. Do orçamento
que geram mortes”, enfatizou de modo confinadas em pequenas reservas, que é diferente, a relação com a própria vida de quase R$ 68 milhões previstos para
veemente Dom Erwin Kräutler, bispo da se constituem em espaços de intensos é outra. E isso tem que ser respeitado saneamento básico nas aldeias, apenas
Prelazia do Xingu e presidente do Cimi. conflitos, ou em acampamentos em pela sociedade e também por aqueles R$ 86 mil (0,13%) foram utilizados.
beiras de estradas, sem nenhuma in- que estão no poder”, concluiu. Para a estruturação de unidades de
Terra é vida fraestrutura. Ela também ressaltou o A fala do Líder Solano Lopes, do saúde, apenas R$ 26 mil (8,7%) dos
Os dados do Relatório indicam que aumento dos casos de atropelamentos Tekoha Pyelito Kue/Mbarakay, no Mato R$ 2,3 milhões foram liquidados. Dos
das 1.045 terras indígenas, 339 (32%) desses indígenas abandonados do lado Grosso do Sul, foi marcada pela dor de mais de R$ 15 milhões previstos para a
estão sem providência, enquanto 293 de fora da cerca e na margem das rodo- quem vive em condições desumanas demarcação e regularização de terras
(28%) estão em estudo. Destas, 44 estão vias. “É justamente a falta de terras que e, é importante lembrar, no estado indígenas, apenas R$ 5,9 milhões (37%)
engavetadas no Palácio do Planalto, gera inúmeros problemas. Chega um campeão em várias violações aos di- foram executados. E do R$ 1,5 milhão
aguardando apenas a assinatura da momento que eles se veem obrigados reitos indígenas. Solano é membro da previsto para apoio ao desenvolvimento
presidente da República. Com média a ir para as cidades e, além da perda comunidade que, em outubro de 2012, sustentável das comunidades, apenas
anual de cinco homologações, Dilma de vários direitos, perdem inclusive o após ser informada sobre a reintegração R$ 75 mil (5,06%) foram gastos em 2012.
Agosto–2013 4 é a presidente que menos homologou direito de serem indígenas”. de posse em favor de um fazendeiro, Só para dar alguns exemplos...   n
Aty Guasu
Guarani Kaiowá:
“Nós estamos demarcando a terra com nosso sangue”
Ruy Sposati,

Fotos: Ruy Sposati


de Dourados (MS)  

C
erca de 300 indígenas partici-
param da Aty Guasu, a grande
reunião Kaiowá e Guarani do
Mato Grosso do Sul, entre os
dias 22 e 27 de julho, na aldeia Jaguapiru,
município de Dourados. Intitulada “Ñan-
deru Mo Mbarete”, a assembleia marcou
o reencontro de quase uma centena de
rezadores e rezadoras indígenas, que há
mais de 10 anos não se reuniam. Ao lado
de caciques, mulheres, lideranças, profes-
sores e trabalhadores da saúde e jovens,
os indígenas mais uma vez reafirmaram
sua principal urgência: a demarcação de Acordos
Ouvidos cansados não depende só da Funai. Depende de São terras
seus territórios tradicionais. outros poderes - a começar pelo poder marcadas pela
A expectativa dos Guarani e Kaiowá é violência, mas,
São terras marcadas pela violência, “O ouvido de vocês está cansado. E público estadual, pelas pessoas que tem sobretudo,
mas, sobretudo, pelas possibilidades de a gente também está cansado de falar a fazendas aqui. [Elas] precisam se abrir de que o governo federal apresente uma pelas
vida traduzidas hoje em luta e reencontros mesma coisa”, desabafou a professora pra essa discussão - sem preconceito, proposta, até o dia 5 de agosto, que dê possibilidades
com fragmentos culturais longe da poeira Léia Aquino, de Ñanderu Marangatu. sem discriminação, sem achar que o cabo do conflito fundiário que tem levado de vida
traduzidas
dos museus ou livros de história. Os reza- “Anos e anos e anos passam e a gente não seu próprio direito, o direito dos fazen- milhares de indígenas à miséria no MS. “Nós
hoje em luta
dores explicam que não se chamam mais consegue ver resultado de nada”, disse - temos respeitado o acordo com o governo, e e reencontros
deiros, é o único direito que existe no
Ñanderu e Ñandesy - homem e mulher veja a pauta completa de reivindicações estamos aguardando um indicativo concreto com
mundo. Porque não é”, enfatizou. fragmentos
rezadores, respectivamente. “Redesco- do Aty Guasu Ñanderu Mo Mbarete de que o problema da demarcação de terras
Apesar de reconhecerem a boa von- culturais longe
brimos uma palavra antiga. Nosso nome Denúncias sobre falta de professo- realmente apareça até o dia 5 de agosto”, co-
tade da coordenação federal da Funai, da poeira
agora é Tekoa’ruvixa, porque nós damos a res, salas de aula, merendeiras, agentes menta a liderança indígena Otoniel Ricardo, dos museus
para a nação Guarani, nada de novo foi
vida”, conta Getúlio, patrono do Aty Guasu. de saúde, ambulâncias, combustível, do Conselho Continental da Nação Guarani. ou livros de
apresentado pelo órgão indigenista. história
A espiritualidade dos Guarani e medicamentos, verbas, dentistas, políti- Na última semana, o Conselho Nacional
“Mais um dia eu vejo o sol brilhar, e
Kaiowá, portanto, é calcada na realidade cas públicas para os jovens, e segurança; de Justiça (CNJ) apresentou um relatório,
mais um dia eu vejo as autoridades
em que vivem. Entre o reencontro com ataques de pistoleiros, impunidade nos que sugeriu seis possíveis soluções para o
a “palavra antiga”, a troca de cantigas casos de assassinato, discriminação presentes não trazendo resposta para conflito fundiário no estado. O professor
e de experiências, toda a discussão cir- e preconceito em escolas municipais, nós, sobre a nossa terra, dizendo: essa Anastácio Peralta, membro da comissão,
cundava a questão da demarcação das desmatamento e envenenamento por área foi identificada, essa área aqui já relata uma tentativa sorrateira de inclusão
terras indígenas - leia na íntegra a carta agrotóxicos, entre outros, foram rela- foi homologada. Ninguém trouxe papel de pautas contrárias à posição dos indíge-
dos rezadores e rezadoras do Aty Guasu tadas à Funai. “Todos esses problemas aqui”, respondeu Ládio Veron. nas no documento. “Tentaram colocar o
Ñanderu Mo Mbarete acontecem porque não temos a terra. A Para os indígenas, mais do que apoio ao Projeto de Lei Complementar 227
Aos caciques e lideranças coube terra é a nossa vida. É só com ela que va- sofrer com a não demarcar as terras, os no relatório. Não se sabe quem foi, mas foi
a tarefa de formatar a discussão dos mos começar a melhorar”, afirmou Léia. Guarani e Kaiowá estão perdendo terri- pelas nossas costas. Isso é absurdo”, afirmou.
Tekoa’ruvixa em pauta de reivindicações, Tudo, porém, permeia a falta de tório. “Perdemos para o branco antes, e “Nós estamos demarcando a terra com
apresentada à presidente da Fundação acesso ao território e a lentidão dos agora perdemos para a soja, cana, bra- nosso sangue”, disse Valdelice Veron à pre-
Nacional do Índio (Funai), Maria Augusta processos demarcatórios. A presidente quiara e boi”, compara o indígena Jorge sidência da Funai ao final do encontro. “Nós
Assirati. Presente no penúltimo dia do en- Maria Augusta concordou: “Nada de Gomes. “Eu não li a Constituição toda, não podemos esperar mais. Não aceitaremos
contro, acompanhada das coordenadorias bom pode acontecer se a gente de mas onde eu parei de ler, não achei es- mais outro prazo [além do dia 5]. Nós não
regionais do órgão no Mato Grosso do fato não der acesso à terra para cada crito que tem que tirar o índio das terras vamos recuar. E todo o derramamento de
Sul, Maria Augusta ouviu críticas severas uma das comunidades, que está aqui dele. É bem o contrário. Se tirar o índio sangue Guarani e Kaiowá e Terena no Mato
dos indígenas à morosidade na demarca- esperando ter a posse plena dessas das terras dele, o índio tem direito de Grosso do Sul, a Dilma será a maior culpada”,
ção das terras Guarani e Kaiowá. terras”, disse aos indígenas. “Só que isso retornar novamente pras terras dele”. concluiu.  n

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5 Agosto–2013
Levante indígena

Fotos: Ruy Sposati/Cimi


Resistência
ancestral e
diária
Patrícia Bonilha, Renato Santana e Ruy Sposati,
de Brasília (DF)

D
epois de ocuparem o principal cumento que entregariam ao ministro
canteiro de obras da Usina em mãos. Trata-se de uma carta em
Hidrelétrica Belo Monte, em que relatam ponto a ponto as áreas que
Vitória do Xingu, no Pará, por seriam afetadas caso o projeto hidrelé-
Após a duas vezes no mês de maio, totalizando trico nos rios Teles Pires e Tapajós fosse
reunião, em 17 dias de paralisação, 141 indígenas implementado.
entrevista
para das etnias Munduruku, Xikrin, Arara e Ainda pela manhã, os 141 indígenas
o Jornal Xipaya chegaram a Brasília no dia 4 de dos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires
Nacional, junho para uma reunião com o ministro ocuparam a sede da Fundação Nacional
Carvalho do Índio (Funai), em Brasília. Eles aguar-
Gilberto Carvalho, da Secretaria Geral da
ainda afirmou
que “ouvimos Presidência, e outros representantes do davam a presidente interina do órgão,
longamente a governo federal no Palácio do Planalto. Maria Augusta Assirati, para entregar um
fala, Sem nenhuma intenção de negociar a documento com reivindicações, solicitar
as críticas
[dos
construção de hidrelétricas com o go- hospedagem e uma confirmação da data
indígenas], verno, o grupo reivindicava a suspensão em que seriam levados de volta ao Pará.
mas fomos de estudos e das obras das barragens Porém, até o final da tarde, Maria Augus-
absolutamente nos rios Xingu, Tapajós e Teles Pires e ta não apareceu para falar com indígenas.
nosso documento, nos chamou de men- indígenas e os acusar de estarem envol-
claros com
eles, dizendo a garantia do direito da consulta prévia tirosos e disse que o governo não muda vidos com o garimpo ilegal. Em carta, ele afirmaram: “Enten-
que o governo com poder de veto. de opinião sobre as usinas. A gente não Os indígenas afirmam que Carvalho demos que o governo está dizendo:
não vai abrir No entanto, na reunião, o ministro gostou de sair do protesto depois de um fez “declarações caluniosas, difamatórias ‘nós vamos construir as hidrelétricas
mão de seus
Carvalho disse que as obras da UHE Belo acordo que prometia diálogo e ver que o e injuriosas contra o povo Munduruku”. nas terras de vocês, não importa o que
projetos”
Monte seguirão e que o governo não mais governo insiste em impor seus projetos”, Na interpelação, os indígenas pedem ao vocês digam. E mesmo que vocês sejam
admitirá ocupações aos canteiros e, para declarou Josias Munduruku. Os indígenas Judiciário que o ministro aponte o nome consultados, nós não vamos considerar
isso, a presença da Força Nacional nos avaliam que a consulta prévia não é mera da liderança acusada de manter balsas a opinião de vocês”.
sítios da obra deverá recrudescer. Ele pro- formalidade e defendem que ela deve ter de garimpo ilegal, bem como apresente No dia seguinte, parte do grupo ca-
pôs uma ida da equipe do governo, num o poder de vetar a construção de uma provas e ocorrência policial atestando minhou da sede da Funai até a Esplanada
prazo de 20 dias, à aldeia Sai Cinza, do futura usina que impacte os territórios o suposto crime. Eles pedem também dos Ministérios, em busca de interlocuto-
povo Munduruku, no município de Jaca- e comunidades indígenas. para o ministro indicar os assessores que res para suas angústias e reivindicações.
reacanga (PA) para apresentar resultados No dia seguinte à reunião, eles pro- participaram da elaboração da carta e No entanto, os indígenas perceberam
de ações interministeriais, sobretudo com tocolaram, no gabinete da presidência perguntam se a presidente Dilma Rousseff que os representantes do governo se
relação aos estragos causados pela Ope- do Senado e da Câmara, uma resposta estava ciente de sua publicação. Após no- mostram insensível às suas questões.
ração Eldorado, da Polícia Federal que, oficial ao governo, em que afirmaram tificado, Carvalho deverá dar explicações. Em frente ao Ministério de Minas e
em novembro de 2012, terminou com a “Nosso entendimento é de que somos “Será esse o diálogo que o governo quer? Energia (MME), seguranças impediram
morte de Adenilson Munduruku. Nessa senhores dos nossos destinos e que- Isso nos revoltou muito. O governo toma a entrada dos indígenas no prédio. Sim-
visita, segundo a proposta de Carvalho, remos respeito ao que está escrito na atitude racista e quer dizer quem é lide- bolizando a morte dos povos dos rios
também se iniciariam as tratativas para Constituição Federal de 1988. Diante rança ou não. Por que o ministro não vai Xingu, Tapajós e Teles Pires, os indígenas
a consulta prévia destinada a consultar disso, solicitamos uma manifestação perguntar na aldeia quem é liderança?”, deitaram em frente ao MME e, com spray
os indígenas sobre as hidrelétricas que oficial do governo brasileiro declarando questionou Valdenir Munduruku. branco, fizeram um ato simbólico, dese-
o governo pretende construir no Rio se será ou não respeitada a nossa decisão Na manhã do dia 10, ao não terem nhando o contorno de seus corpos no
Tapajós. Uma determinação judicial exige final, de forma vinculante e autônoma, respeitada a decisão de que o todo asfalto, como é feito nas cenas de crime.
que a consulta prévia seja feita para que sobre o processo de consulta proposto”. o grupo de indígenas participaria da Após passarem dez dias em Brasília,
o governo dê continuidade aos trabalhos. reunião agendada com Carvalho, e não tentando convencer o governo a in-
Após a reunião, em entrevista para
Interpelação contra apenas uma comissão de 10 indígenas, terromper todos os empreendimentos
o Jornal Nacional, Carvalho ainda afir- Carvalho: exigindo respeito a reunião não foi realizada. Ao invés do hidrelétricos em obras ou em estudo
mou que “ouvimos longamente a fala, No dia 8, as lideranças Munduruku ministro, os indígenas ficaram no meio na Amazônia, os indígenas regressaram
as críticas [dos indígenas], mas fomos protocolaram no Superior Tribunal de de um forte aparato de soldados do para o Pará no dia 13 de junho. Antes de
absolutamente claros com eles, dizendo Justiça (STJ) uma interpelação criminal Exército e assessores. Para as lideranças, partir, em entrevista coletiva, Valdenir
que o governo não vai abrir mão de seus contra o ministro da Secretaria Geral da os assessores de Carvalho disseram que Munduruku afirmou “Nossa luta apenas
projetos”. Presidência, Gilberto Carvalho, pelo fato os indígenas se atrasaram muito para a começou. Estamos retornando para
Profundamente insatisfeitos e sentin- de que, em nota publicada no dia 6 de reunião e que ele só poderia atendê-los nossa comunidade. Vamos nos fortalecer
do-se desrespeitados com o resultado da maio, na primeira ocupação ao canteiro até às 11h15. Em nota, a SGPR disse que e nos aliar com outros parentes para,
reunião, os indígenas resolveram perma- de Belo Monte, a SGPR colocou sob sus- as lideranças indígenas se negaram a se juntos, combatermos esse desrespeito
necer em Brasília e não voltar para o Pará peita as lideranças deste povo, chamando- reunir com Gilberto Carvalho. do governo federal com nossa cultura,
no dia seguinte, como estava previsto. -as de “autodenominadas” e “pretensas”, Mesmo sem serem recebidos, os nossa crença e nossos direitos. O que
Agosto–2013 6 “Ele (Gilberto Carvalho) não assinou além de questionar a honestidade dos indígenas protocolaram na SGPR o do- o governo quer, nós não queremos. Ele
Povo Apolima-
Arara retoma
área demarcada
em 2011 Renato Santana,
de Brasília (DF)

O povo Apolima-Arara retomou na noite


de 2 de junho, área da Terra Indígena
Arara do Alto Rio Juruá, no Acre, re-
conhecida pelos Apolima-Arara como aldeia
Quieto, e demarcada em 2011 com pouco
mais de 21 mil hectares. Desde então, o
governo federal não apresentou sequer um
plano para iniciar a retirada dos invasores.
Conforme Chiquinho Arara, os Apolima-
-Arara cansaram de esperar que os órgãos
quer construir hidrelétricas e nos dar os indígenas não permitiram a entrada Direito não se negocia governamentais cumprissem suas obrigações
algo em troca. Mas nós não queremos de pesquisadores no território. “Nós
Cerca de 100 indígenas Mundu- e decidiram eles mesmos fazerem a retoma-
nada em troca. Queremos nosso rio vamos liberar pacificamente este
ruku lotaram a Câmara Municipal de da. Eles acamparam na escola e iniciaram a
livre e nossa natureza viva”. grupo, mas alertamos que não tolera-
Vereadores de Jacareacanga no dia construção de moradias.
remos mais essa postura por parte do
Expulsão de pesquisadores governo federal e dos empreendedores seguinte (25) para protestar contra Nos últimos anos, a liderança esteve
e suspensão de estudos que querem construir barragens”, pon- os vereadores que são favoráveis ao algumas vezes em Brasília para demandar
projeto do governo de construir hi- direitos do seu povo. Durante a Cúpula dos
Cerca de 25 pesquisadores foram tua o documento, que também exige
drelétricas no Rio Tapajós. A fachada Povos, em junho de 2012, no Rio de Janeiro, a
retirados da Terra Indígena Munduruku a suspensão “de todos os estudos e
do prédio foi grafitada com frases de morosidade do governo em devolver as terras
pelos próprios indígenas, no dia 22 pesquisas relacionados às barragens
protesto como “Não queremos barra- tradicionais foi novamente denunciada.
de junho em Jacareacanga, extremo nos rios Tapajós e Teles Pires” por
gens”, “Viva o Tapajós”, “Respeitem O grupo é composto por 475 indígenas
oeste do Pará. Os técnicos coletavam parte do governo federal. “Sugerimos
amostras da fauna e flora da região nosso direito” e “Nossa palavra é que até esta retomada viviam em menos de
aos pesquisadores que não entrem nas
para os estudos ambientais e de via- que vale”. 10 mil hectares do total de 21 mil declarados
nossas terras. Estão todos avisados”,
bilidade das usinas hidrelétricas do “Nossa decisão é a decisão do como de ocupação tradicional. Os Apolima-
finaliza o documento.
Rio Tapajós, que afetarão o território coletivo, dos caciques, das lideranças. -Arara ocupavam apenas terras em uma das
Durante reunião em praça pública
Munduruku. Segundo os indígenas, no final da tarde do dia 23, a assessora E a decisão é de que somos contra as margens do Rio Amônia, afluente do Rio
os pesquisadores usavam uniformes da presidência da Funai, Lucia Alberg, barragens que afetam nosso territó- Juruá, e com a retomada passaram para o
da empresa Concremat, que presta anunciou a suspensão dos estudos, Os rio. Vocês não precisam vir falar de outro lado do rio.
serviços para o Consórcio Grupo de Es- pesquisadores que estavam em área compensações, vir falar que as hidre-
tudos Tapajós, liderado pelas empresas
Camargo Correia, GDF Suez, Eletrobras
indígena deixaram a cidade. “A Funai,
e o governo federal como um todo,
létricas vão trazer saúde e educação,
porque saúde e educação são direitos Povo Tupinambá da
e Eletronorte, entre outras.
Em nota pública, os Munduruku
está suspendendo qualquer pesquisa
que estiver sendo feita aqui na região
nossos que não vamos negociar a tro-
co de hidrelétricas”, explicou Valdenir Serra do Padeiro
afirmaram que o governo já sabia que de vocês”, afirmou ela. Munduruku aos parlamentares.
retoma dez fazendas
no sul da Bahia
Indígenas ocupam sede do PT e bloqueiam rodovias no Sul
D
ez fazendas incidentes em área

A
proximadamente 30 indígenas Em Mangueirinha, município Além destas ações no Paraná, indí- demarcada foram retomadas pelo
da etnia Kaingang ocuparam distante cerca de 300 quilômetros de genas dos estados de Santa Catarina e povo Tupinambá da Serra do Padeiro,
por 8 horas o escritório sede Curitiba, pelo mesmo motivo, cerca Rio Grande do Sul aderiram ao protes- município de Buerarema, no sul da Bahia, a
do Partido dos Trabalhadores (PT), na de 150 manifestantes bloquearam a to. Na RS-480, aproximadamente 600 partir do dia 8 de junho. De acordo com as
manhã do dia 3 de junho, em Curitiba. BR-373, entre 9h e 15h. As duas mani- indígenas das etnias Kaingang e Guarani lideranças indígenas, e ao contrário do que a
A ação foi motivada pela solicitação festações só terminaram quando uma bloquearam a passagem de veículos. imprensa divulgou, não ocorreram conflitos.
de suspensão das demarcações de audiência dos indígenas com a minis- Também para demandar que as terras Elas informaram que, nas fazendas, estavam
terras indígenas no Paraná, feita pela tra Hoffmann e com representantes indígenas sejam demarcadas, como pre- apenas famílias de funcionários, que viviam
Ministra Chefe da Casa Civil, Gleisi do Ministério da Justiça foi agendada vê a Constituição Federal, cerca de 300 em condições degradantes.
Hoffmann, ao Ministério da Justiça. ainda para o mês de junho. indígenas ocuparam a rodovia RS-343. “Essas terras foram griladas e tínhamos a
programação de fazer a retomada delas, mas
decidimos antecipar para dar uma resposta
Contra a ofensiva dos ruralistas, Kayapó fecham estradas no Pará ao que estão fazendo com o povo Terena, do

C
erca de mil indígenas da etnia lação de todos os decretos, projetos terras, permitir a mineração, acabar Mato Grosso do Sul. A luta dos índios é uma
Kayapó paralisaram na manhã de leis, portarias e propostas de com a demarcação de terras ances- só”, declarou o cacique Babau Tupinambá.
do dia 12 de junho, as rodo- emenda constitucional (PECs) que trais, construir empreendimentos Conforme o cacique são fazendas que tota-
vias PA 287, BR 158 e BR 163, nas ameaçam e prejudicam os povos que acabam com nossa cultura, nossa lizam cerca de 500 hectares.
proximidades dos municípios de indígenas. vida. Nunca vamos aceitar que estas Babau enfoca que é vergonhoso, mas
Redenção e Novo Progresso, no sul Segundo a liderança indígena mudanças aconteçam. Nós queremos real o desmatamento nas matas ciliares das
do Pará. As manifestações expressa- Ireô Kayapó, as PECs 215 e 237, a que a Constituição Federal, que aju- fazendas, e que é imprescindível a preservação
ram a contrariedade dos indígenas Portaria 303 e o PL 1610, dentre damos a construir, permaneça como da fauna e flora: “Preservar para ter e poder
com a ofensiva dos ruralistas sobre outras ameaças, pretendem acabar está escrita desde 1988”, declarou comer sem devastar mantendo o equilíbrio.
os direitos indígenas que, segundo com os direitos indígenas e, em con- Ireô. Ele informou que mais de mil A área, entrecortada por serras, é vital para o
eles, conta com o apoio do governo. sequência, com os próprios povos indígenas participaram das ocupa- envolvimento social e cultural dos Tupinambá:
Nesse sentido, eles exigiram a anu- indígenas. “Querem reduzir nossas ções das rodovias. “Conhecemos cada pedaço dela, onde cada
serra vai dar”, conta Babau.  n 7 Agosto–2013
Resistência

Avá-Guarani do oeste Criança Avá-Guarani


observa efeitos de
uma pedreira dentro

paranaense: o povo que da terra indígena:


um imenso vale que

o governo diz não existir


agora deposita um
brejo inutilizável pelos
indígenas

Renato Santana, Nenhuma destas áreas - situadas entre


de Guaíra (PR) os municípios Guaíra, Terra Roxa, Santa

H
Helena, Diamante do Oeste e São Miguel
á um ano, caciques e lideranças do Iguaçu - tiveram a situação fundiária re-
Ava-Guarani do oeste parana- gularizada. Para piorar a ministra da Casa
ense se reuniram para tratar Civil Gleisi Hoffman pediu ao Ministério
dos problemas de suas comu- da Justiça, durante o último mês de maio,
nidades. Demarcação de terras, que recomende à Fundação Nacional do
saúde e educação estiveram no Índio (FUNAI) a suspensão das demarca-
centro das preocupações. No encontro, ções no estado. O fato, porém, é que tais
foram definidas diretrizes e reivindicações procedimentos já estavam paralisados.
encaminhadas ao Poder Público. Em 2009, atendendo a determinação
De lá para cá pouco ou nada mudou na judicial, o Ministério da Justiça publicou
vida dos Guarani; ao contrário, a situação portaria para a realização dos estudos
de vulnerabilidade às violências, insegu- preliminares na região. A antropóloga
rança alimentar e violações aos direitos responsável pelo estudo não entregou
indígenas se intensificaram. Sem acesso o material, mesmo depois de acionada
aos direitos mais básicos, como água judicialmente pela Funai. Os técnicos do
potável e saneamento, além da paralisa- órgão trabalhavam para acertar o procedi-
ção dos procedimentos de demarcação, mento quando foram surpreendidos pela
comunidades vivem em espaços reduzidos orientação da Casa Civil.
e chegam a passar fome. “Recebemos essa recomendação do
A conclusão foi apresentada pelos Ministério da Justiça para paralisar os
próprios caciques e lideranças que entre procedimentos. Acontece que isso não
os dias 26 e 28 de junho voltaram a se resolve o problema de nenhum dos lados
reunir, desta vez no tekoha – lugar onde [indígenas e fazendeiros]. A insegurança
se é - Itamarã, município de Diamante do jurídica permanece e quem acaba sofren-
d’Oeste, para avaliar se houve avanços do mais são os Guarani”, analisa Diogo
nas reivindicações definidas em junho de de Oliveira, indigenista especializado da
2012. No documento final do encontro Funai-Guaíra.
– leia na íntegra aqui – os Guarani exigem
a retomada imediata das demarcações de Miséria e ameaças
terras indígenas no estado.  As consequências da falta de demar-
“O ponto principal é a terra. Nada cação repercutem em todos os aspectos
caminhou e os estudos feitos nunca da vida dos Guarani do oeste paranaense.
foram apresentados. Nela está a água, Os governos municipais e estadual usam
cercada e poluída pelos fazendeiros, e o argumento da não regularização das
a possibilidade de plantarmos. Estamos, terras para se eximirem da responsabili-
na verdade, retornando paras as terras de dade na prestação de serviços públicos,
onde nossos pais e avós foram expulsos”, como transporte escolar, construção de
diz Teodoro Tupã Alves, um dos cerca de escolas nas aldeias, fornecimento de
50 participantes do encontro e liderança água e alimentação, além de garantias
Agosto–2013 8 de um dos 19 tekoha representados. de acesso aos hospitais e postos de
Fotos: Renato Santana/Cimi

O procurador
da República
em Guaíra,
Henrique
Oliveira
entrou com
45 processos
administrativos,
em dois
meses de
trabalho, junto
às diversas
instâncias do
Poder Público
pedindo
assistências
aos direitos
básicos dos
Há pouco mais de um ano um grupo Guarani
de 22 famílias, totalizando 68 Guarani, do oeste
sendo 33 crianças, retomaram uma paranaense
tripa de terra entre quatro fazendas
de soja e milho. Conforme vistoria do
Ministério Público Federal (MPF) de
Guaíra, os indígenas utilizam a água de
um rio contaminada por fertilizantes e
agrotóxicos

saúde. “As crianças precisam andar uma


hora para chegar ao local onde passa o
transporte escolar, que há duas semanas
não passa. A merenda, aliás, é quase a
única refeição que elas fazem no dia.
Sem ir para escola, quase não comem”,
afirma Adriano Benites, 29 anos, do
Tekoha Guarani.
Há pouco mais de um ano um grupo
de 22 famílias, totalizando 68 Guarani, as tentativas de atropelamento. Tentam Processos administrativos comer, água potável, saneamento, edu-
sendo 33 crianças, retomaram uma tripa atingir até as crianças. Agora fecharam O procurador da República em Guaíra, cação e saúde.
de terra entre quatro fazendas de soja e uma das estradas e a ambulância não pas- Henrique Oliveira, presente no encontro “Para o Tekoha Guarani, por exemplo,
milho. Conforme vistoria do Ministério sa mais”, aponta Adriano. No encontro, dos Guarani, entrou com 45 processos pedimos ao governo do estado que ga-
Público Federal (MPF) de Guaíra, os indíge- caciques e lideranças relataram situações administrativos, em dois meses de traba- ranta água potável em garrafas, além de
nas utilizam a água de um rio contamina- de desassistência na área da saúde e lho, junto às diversas instâncias do Poder água para cozinhar, lavar roupas e fazer a
da por fertilizantes e agrotóxicos. Muitos preconceito contra as crianças que vão Público pedindo assistências aos direitos higiene pessoal por meio de carros pipas
estão doentes, apresentando erupções estudar nas cidades. básicos dos Guarani do oeste paranaense. até que o fornecimento fixo seja garanti-
cutâneas, e parte das crianças apresenta “O transporte atrasa sempre ou não O procurador afirma que a situação do”, explica Oliveira.
sintomas de anemia e desnutrição. Para aparece e as crianças ficam ao redor da dos indígenas é “a mais precária. Não Desde janeiro, quatro jovens indíge-
completar o quadro, a comunidade é cons- escola. Elas nos contam que homens possuem acesso aos direitos mais básicos nas cometeram suicídio e nos municípios
tantemente acossada pelos fazendeiros as colocam para brigar entre si ou com da Constituição. Tais direitos independem do oeste paranaense a hostilidade contra
ou arrendatários das terras. crianças brancas. O vencedor recebe um da regularização fundiária ter acontecido os indígenas cresce em campanhas que
“Os fazendeiros dizem que estão pacote de bolacha. Não queremos nossos ou não”. Por conta disso, a atuação do afirmam que os Guarani querem tomar
trazendo pistoleiros do Paraguai, que vão filhos estudando na cidade. É um direito MPF acontece por etapas e a primeira é as cidades, inflacionando o tamanho das
nos matar. O mais grave até agora são termos escolas dentro das comunidades”, garantir que os Guarani tenham o que áreas reivindicadas.  n

Nota de apoio do Cimi-Sul aos Caciques e Povo Guarani


e aos funcionários da Funai da CTL de Guaíra, Paraná
O s missionários, missionárias, representantes dos po-
vos indígenas da Região Sul junto com o secretário
executivo do CIMI Nacional, Cleber Buzatto, manifestam
intento, impedir o direito dos Guarani habitar seus
territórios tradicionais.
Assumindo a responsabilidade evangélica de
garantia da permanência indígena em seus territórios
tradicionais.
Frente às agressões sofridas por Guarani e funcio-
seu apoio e solidariedade ao povo Guarani das aldeias proclamar a Boa Noticia da “vida plena para todos”, nários da Funai, nós, missionários e missionárias do
situadas nos municípios de Terra Roxa e Guaíra frente o Cimi assume o compromisso de denunciar toda e Cimi Regional Sul, nos comprometemos a defender o
às ações hostis promovidas contra eles por setores do qualquer ameaça à existência dos Pequenos do Rei- princípio constitucional que garante a todos a livre es-
agronegócio e políticos da região oeste do Paraná. no. Movidos pela solidariedade com o povo Guarani, colha da maneira de viver, cada um seguindo sua forma
O CIMI repudia toda e qualquer forma de violência, queremos somar forças para que o Direito e a Justiça cultural reconhecida pela Carta Magna.
preconceito e racismo levados a cabo, nesses últimos sejam restabelecidos, e conclamamos a sociedade dessa Laranjeiras do Sul, Paraná
meses, por algumas organizações que têm, como região a abraçar a causa em defesa do direito à vida e à 30 de Agosto de 2013 9 Agosto–2013
Mobilizações julinas

Foto: Heloísa Eneida Cavalcanti/Cimi-NE

Foto: Cimi Regional Maranhão


Indígenas fazem
ocupações em
cinco estados
Patrícia Bonilha e Renato Santana, Apãniekra, Ramkokramekra e os Guaja-
de Brasília (DF) jara das terras Pindaré, Massaranduba,
Ruy Sposati, Barra do Corda, Grajaú, Canabrava, Karú
de Campo Grande (MS) e Rodeador para protestar contra o ser-
viço de saúde prestado pela instituição. 4 de julho, a Estrada de Ferro Carajás, órgão indigenista em protesto pelo não

N
os meses de junho e julho, Eles denunciam que há poucos médicos que liga as jazidas de minério de ferro cumprimento das reivindicações indíge-
órgãos governamentais de edu- e não há médicos indígenas para o aten- da Vale ao porto de São Luís, na capital nas por parte da Sesai.
cação e saúde, uma ferrovia da dimento, além de não haver transporte do estado. O trecho da ferrovia bloque-
Vale e uma das sedes da Fun- para deslocar os doentes, nem para fazer ado passa pela aldeia Massaranduba, A espera sem fim da
dação Nacional do Índio (Funai) foram o abastecimento dos medicamentos, o Terra Indígena Caru, dos Awá-Guajá, e demarcação
ocupados por diferentes povos indígenas que coloca a vida das pessoas em estado Tenetehara (Guajajara). “Os parentes de- No dia 23 de julho, cerca de 80
As ocupações nos estados do Maranhão, São Paulo, grave em risco. cidiram interditar a ferrovia para serem indígenas Kaingang ocuparam a sede
explicitaram Bahia, Rio Grande do Sul e Pernambu- Além da melhora no atendimento, ouvidos”, explica Lourenço Krikati, 44 regional da Funai em Passo Fundo, no
a indignação co, localizados nas regiões Nordeste, os indígenas requerem o afastamento anos, da Terra Indígena Krikati. Rio Grande do Sul. Após o acirramen-
dos povos
Sudeste e Sul do país. As ocupações de Licínio Carmona, gestor do distrito, Desde o dia 24 de junho até o dia to de conflitos na região, em que um
com o total
descaso explicitaram a indignação dos povos com e Antonio Izildo, chefe da equipe de di- da ocupação da ferrovia (4 de julho), as indígena foi baleado, (ver quadro nesta
do governo o total descaso do governo brasileiro visão técnica que, segundo eles, não dão comunidades contabilizaram seis mortes página), eles reivindicaram a demarcação
brasileiro em relação às políticas públicas voltadas a atenção necessária para a problemática em decorrência da falta de estrutura para de 1.950 hectares da Terra Indígena de
em relação
às políticas
para os indígenas. da saúde indígena na região. “A gente o atendimento da saúde. Passo Grande do Rio Forquilha ,localiza-
públicas quer que o governo coloque uma pessoa Também denunciando a neglicgência da entre os municípios de Cacique Doble
voltadas para Saúde moribunda que nos dê atenção para fazer a gestão e e o descaso no trato da saúde aos povos e Sananduva, área tradicionalmente ocu-
os indígenas Reivindicando melhorias imediatas o atendimento. Os funcionários ganham indígenas, lideranças Tupinambá e Gua- pada pelo povo Kaingang. O território
no atendimento à saúde indígena no para fazer um serviço que não realizam. rani Mbyá de seis aldeias ocuparam, no já foi reconhecido como indígena, mas
Maranhão, cerca de 500 indígenas Alguns tratam muito mal os indígenas, dia 15 de julho, o Pólo Base da Secretaria como o processo aguarda a publicação
ocuparam o Distrito Sanitário Especial principalmente os que vêm de terras Especial de Saúde Indígena (Sesai), em da portaria demarcatória pelo Ministério
Indígena(Dsei), em São Luís, na manhã mais distantes”, reclama José Carlos. Peruíbe, no litoral de São Paulo. Segundo da Justiça, os kaingang estão acampados
do dia 24 de junho. A precariedade do Após dez dias de ocupação da sede nota pública assinada pelas entidades há cinco anos nas margens da rodovia
atendimento à saúde indígena em todo o do Dsei, em que suas reivindicações não que fizeram a ocupação, cinco funcioná- ERS-343.
estado mobilizou os povos Gavião, Awá foram atendidas, cerca de 150 indígenas rios da Coordenação Regional da Funai No mesmo dia, indígenas Pataxó
Guajá, Kaapó, Kreniê, Kricati, Tenetehara interditaram, no início da tarde do dia foram impedidos de sair do prédio do ocuparam a sede da Diretoria Regional

MS: violência diária contra os indígenas


Patrícia Bonilha e Renato Santana, Gabriel Terena, morto em confronto com Esquecida reforma Ao invés de centrar esforços para a
de Brasília (DF) policiais federais e militares na tentativa realização de uma reforma agrária, como
agrária
Ruy Sposati, destes de cumprirem a reintegração era uma das prioridades do projeto origi-
de Campo Grande (MS) de posse da fazenda Buriti. A morte de Segundo reportagem da Folha de S. nal do atual governo, a proposta apresen-
Paulo veiculada no dia 5, “os indígenas

A
Oziel teve grande repercussão nacional. tada no mês de maio pela ministra-chefe
vida dos povos indígenas no As duas fazendas, Buriti e São Sebastião, de Mato Grosso do Sul dispõem de áreas da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, foi a de
Mato Grosso do Sul é diariamen- ficam dentro da Terra Indígena Buriti, bastante pequenas, superpovoadas e reformulação nos procedimentos de de-
te marcada por todos os tipos reconhecida em 2010 pelo Ministério da próximas dos centros urbanos”. Os dados marcação de territórios indígenas e na
de violência: física, institucional, Justiça como de posse permanente do da Fundação Nacional do Índio (Funai) suspensão dos mesmos, o que favorece
jurídica, emocional e muitas outras. São povo Terena. explicitam que enquanto os indígenas os setores vinculados ao agronegócio.
formas e tentativas cruéis de extinguir Segundo os indígenas, na tarde do não conseguem recuperar suas terras
aqueles que têm direitos constitucionais dia 4, um grupo de 60 indígenas, no pro- tradicionais, há uma grande concentração Indígenas como alvo
garantidos, mas totalmente desrespei- cesso de retomada da área originalmente de terras nas mãos de alguns latifundiá- de violência
tados. indígena, foi comunicado por um capataz rios na região. Em meio a este contexto trágico, o
No dia 4 de junho, o indígena Terena que eles poderiam entrar na fazenda São Com uma população de 28 mil indí- Ministério Público Federal afirmou em
Josiel Gabriel Alves, 34 anos, foi baleado Sebastião porque o fazendeiro já iria sair genas, os Terena ocupam cerca de 20 mil nota pública que “falta vontade política
nas costas na tentativa de retomada da com o gado. No entanto, quando eles en- hectares no estado. Duas terras indígenas para solucionar a questão indígena em
fazenda São Sebastião, em Sidrolândia traram, os indígenas foram surpreendidos na região de Sidrolândia, Buritizinho e Mato Grosso do Sul. São muitas as pro-
(MS). Transferido para a Santa Casa de pela descida de uma caminhonete em que Tereré, com população de 320 e 400 in- postas para minimizar a tensão fundiária,
Campo Grande, ele estava consciente, os seguranças chegaram atirando. Tentan- dígenas, respectivamente, têm a extensão mas a postura da União - de apenas
mas não sentia nem as pernas nem as do fugir do atentado, Josiel foi atingido de dez hectares cada. Só a fazenda Buriti, receber um lado do conflito e de ignorar
costas. Segundo o diagnóstico de um por trás, um pouco abaixo do pescoço. de propriedade do ex-deputado estadual que grande parte da situação decorre
dos médicos, o projétil cortou o nervo Após os primeiros atendimentos no hos- Ricardo Bacha, tem cerca de 6.300 hec- principalmente da titulação errônea de
cervical e ele tem mínimas chances de pital municipal de Sidrolândia, devido à tares e a fazenda Aquidauana, também terras, a cargo da administração pública
voltar a andar. O atentado aconteceu gravidade do quadro, ele foi transferido localizada na terra indígena tradicional, como um todo -, só tem agravado a si-
Agosto–2013 10 apenas um dia após o enterro de Oziel para ser operado em Campo Grande. tem 4.100 hectares. tuação, chegando ao ponto de batalhas
Indígena foi baleado após governo
Tarso Genro se omitir em conflito
entre os Kaingang e agricultores
De Brasília confronto, tiros foram disparados pelos
agricultores. Para conseguirem sair da

U
m indígena foi baleado em um área, os indígenas utilizaram pedras e
confronto ocorrido no dia 15 de paus. Dois indígenas e dois agricultores
julho, quando agricultores não se feriram, sendo que um indígena foi
cumpriram um acordo firmado baleado. A Polícia Militar apreendeu
para a desocupação pacífica de uma área uma arma de última geração com um
localizada na Terra Indígena Passo Grande agricultor que estava no conflito. Não
do Rio Forquilha, no município de Saran- houve atuação da Polícia Civil.
duva (RS), onde cerca de 200 indígenas Pode-se afirmar que a postura am-
Kaingang haviam retomado parte de sua bígua do governo Tarso Genro (PT-RS)
de Educação de Teixeira de Freitas (Di- no povo Tuxá os professores ensinam na terra tradicional no dia 8 de julho. – que diante dos setores do agronegócio
rec 9), na Bahia. Além de qualidade na casa de farinha da aldeia. A ocupação feita pelos Kaigang foi se coloca contrário às demarcações, e na
educação, eles reclamaram do atraso no “A mobilização é contra o descaso do realizada para denunciar a demora na frente dos indígenas diz que é favorável a
pagamento de salários dos professores e governo estadual, que não cumpriu com conclusão do processo demarcatório da ela - tem acirrado os conflitos na região.
funcionários das escolas indígenas na re- suas obrigações. Existem verbas para 15 sua terra indígena, cuja Portaria Declara- Foi justamente após um discurso seu, na
gião de Prado, no extremo sul do estado. escolas há seis anos e nenhuma delas foi tória foi feita em 2011. O processo está cidade de Erechim (a menos de 100 km
Segundo os indígenas, nas três erguida. Outras dezenas de escolas têm paralisado, dentre outros motivos, porque de Passo Fundo), em que ele afirmou
escolas estaduais trabalham em média apenas os professores e professoras e os agricultores impediram a entrada de que em seu governo nenhum agricultor
50 professores que estão sem receber nenhum funcionário administrativo”, órgãos governamentais, inclusive da pró- deixaria suas terras e assegurou “se tiver-
salário há mais de cinco meses. “Fica afirma a liderança Francisca Kambiwá. As pria Polícia Federal em março, nas terras mos uma decisão da justiça para tirar as
difícil trabalhar sem estarmos recebendo ocupações ocorreram de forma pacífica e para fazer a colocação dos marcos físicos, terras de vocês, irei para a cadeia e não
porque aqui todo mundo tem família os povos dançaram o Toré nas gerências. etapa anterior à demarcação da terra. cumprirei a determinação”, que - quase
também. Não só a gente, mas também as Em abril deste ano, o movimento Após os oito dias de ocupação foi imediatamente - os fazendeiros intensifi-
merendeiras, as faxineiras que também indígena do estado realizou o Abril feito um acordo entre os agricultores e caram a violência contra os indígenas na
estão na mesma situação que a nossa”, Indígena - Acampamento Terra Livre, os indígenas para a desocupação da área. TI Passo Grande do Rio Forquilha.
explicou o professor Jwathy Pataxó. em Recife (PE), puxado pela Comissão No entanto, quando os indígenas esta- Os Kaingang voltaram para o acam-
No dia 30 de julho foi o sertão de Professores Indígenas de Pernambuco vam se preparando para sair, perceberam pamento em que estavam antes da
pernambucano que amanheceu com o (Copipe). Os povos denunciaram o não a movimentação dos agricultores que, tentativa de retomada e, mediados pelo
candeeiro do movimento indígena aceso. cumprimento do Termo de Ajustamento com o apoio do prefeito e de políticos da Ministério Público Federal (MPF), ne-
Cerca de 600 integrantes de 12 povos do de Conduta (TAC) da Educação, vencido região, impediram que retornassem ao gociaram com a Fundação Nacional do
estado ocuparam as Gerências Regionais em 2010, firmado entre o Ministério acampamento, onde estavam vivendo an- Índio (Funai) e com o governo do estado
de Educação dos municípios de Arco- Público Federal (MPF) e a Secretaria tes de iniciar este processo de retomada. encaminhamentos para que o processo
verde e Floresta. As reivindicações são Estadual de Educação. As verbas para a Fortemente armados, os agricultores demarcatório de suas terras avance. Eles
antigas e a paciência das comunidades construção das escolas foram liberadas fecharam todas as entradas e saídas e im- também solicitaram que o ministro da
acabou. Mesmo com verbas liberadas há pelo Ministério da Educação, via Plano pediram os indígenas (dentre eles cerca Justiça, José Eduardo Cardoso faça uma
seis anos para a construção de escolas, de Ação Articulado (PAR), em 2007. n de 50 crianças) de sair pacificamente. No reunião com eles na área reivindicada. n

judiciais perdurarem durante anos e de de despejo, com autorização de uso de Segundo


Foto: Povo terena

casos de violência se tornarem frequentes força policial para a retirada dos cerca de reportagem
da Folha
no estado”. De acordo com a nota, além mil indígenas que estão no local desde o de S. Paulo
da omissão do Estado, o trato da questão dia 30 de maio. O terreno é parte da Terra veiculada
indígena pelo Judiciário também demons- Indígena Taunay-Ipegue, em processo de no dia 5, “os
tra despreparo na condução dos conflitos. demarcação. O proprietário da área en- indígenas
de Mato
Segundo o procurador da república, trou com pedido de reintegração de posse Grosso do Sul
Emerson Kalif Siqueira, não se deve tratar na Justiça, concedido no dia 14 de junho. dispõem de
a questão indígena como caso de polícia. Os estudos de identificação da ter- áreas bastante
“Se forem necessárias horas ou dias de ra indígena estavam prontos para ser pequenas,
superpovoadas
conversa e negociação, que se explique, publicados, mas uma liminar da Justiça e próximas
enfatize, converse, negocie. O que não se Federal do Mato Grosso do Sul, em nome dos centros
pode é deixar que a inapetência da polícia do proprietário de uma das fazendas urbanos”
- que não tem experiência em conflitos incidentes sobre a TI, travou o processo
rurais - transforme populações tradicio- de demarcação da terra toda. Na Taunay-
nais em alvo de violência”, declarou ele. De acordo com a proposta feita por ção que esperavam as lideranças para -Ipegue, atualmente cerca de 6 mil indí-
Novo fórum: solução ou enrolação? Cardozo e Carvalho, oficializada em os direitos dos Terena pela terra. Outras genas vivem em 6,4 mil hectares de terra,
Os ministros da Justiça, José Eduardo nota, o fórum seria instalado em 15 dias, iniciativas como esta naufragaram antes divididos em sete7 aldeias, reservados
Cardozo, e da Secretaria Geral da Presi- cm a ida de representantes do governo mesmo de mostrar quaisquer resultados. aos indígenas na primeira metade do
dência da República, Gilberto Carvalho, para o Mato Grosso do Sul para iniciar século vinte pelo Serviço de Proteção
propuseram a cerca de 50 lideranças os trabalhos. Farão parte do grupo o Reintegração suspensa ao Índio. Na área da fazenda retomada,
Terena, durante encontro em Brasília no Conselho Nacional do Ministério Público No dia 5 de julho, o Tribunal Regional a comunidade já construiu mais de 50
dia 6 de junho, a criação de um fórum (CNMP), Conselho Nacional de Justiça, da Terceira Região (TRF-3) acatou pedido casas, plantou ao menos em 10 hectares
para “discussão e pactuação em torno governos federal e estadual, fazendeiros dos indígenas e suspendeu a reintegração de terra, já possui escola em funciona-
das questões de demarcações de terras e indígenas. de posse da Fazenda Esperança, em Aqui- mento e também um posto de saúde à
indígenas”. O fórum está longe de ser a resolu- dauana (MS), que ameaçava a comunidade disposição da comunidade.  n 11 Agosto–2013
@PareBeloMonte
Índios afetados por

Foto: Ruy Sposati/Cimi


hidrelétricas: três processos
judiciais, nenhuma consulta
Ministério Público Federal - Pará que julgou os casos de Belo Monte e
Teles Pires, lembraram que esse tipo

O
s indígenas impactados de ma- de suspensão surgiu na lei processual
neira definitiva pelos projetos brasileira em 1964, durante o regime meio de uma decisão monocrática do De acordo com a Convenção 169,
de usinas hidrelétricas na Ama- de exceção. presidente do Superior Tribunal de a consulta é necessária em qualquer
zônia nunca foram consultados Justiça, Félix Fischer. projeto ou decisão de governo que vá
previamente, na forma definida pela Conflitos O primeiro caso do MPF sobre a afetar, modificar, de forma permanente
Constituição brasileira e pela Conven- Nos três rios que são objeto das consulta, iniciado em 2006, diz respeito e irreversível, a vida de povos indígenas,
ção 169 da Organização Internacional ações do MPF pela consulta, o governo aos indígenas do Xingu, impactados tribais e tradicionais. Para o MPF, deve ser
Em todos os do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é brasileiro tem projetos de pelo menos pela usina hidrelétrica de Belo Monte. aplicada a várias populações amazônicas,
processos que No começo do processo, os advogados
move sobre signatário. Por esse motivo, o governo 11 hidrelétricas em estágios variados não apenas indígenas. E deve ser feita an-
a consulta, o brasileiro responde a três processos ju- de construção e licenciamento. Belo do governo alegavam que as consultas tes de qualquer decisão sobre o projeto.
MPF obteve diciais, movidos pelo Ministério Público Monte, o caso mais emblemático, já poderiam se dar em qualquer etapa Atualmente, o governo tenta con-
vitórias em Federal (MPF) no Pará e no Mato Grosso. acumula mais de 17 processos na Justiça do licenciamento ambiental, que os vencer os indígenas do Tapajós e o
favor dos estudos poderiam prosseguir, que as
indígenas, Nas ações, o MPF defende o direito Federal e incontáveis conflitos com ín- judiciário que a consulta pode ser feita
mas o governo de consulta dos povos indígenas Arara, dios e trabalhadores. Foi palco de várias licenças poderiam ser concedidas e depois dos Estudos de Impacto Ambien-
recorreu Juruna, Munduruku e também para os ocupações por indígenas, as últimas depois a consulta seria feita. tal. Em argumentações nos processos
e toca os ribeirinhos dos rios Xingu, Tapajós e reivindicando claramente o direito da No meio do processo, o governo judiciais, a AGU contraditoriamente
projetos com federal mudou sua argumentação e
base em Teles Pires. Uma quarta ação está em consulta prévia. afirma que quer fazer a consulta, bati-
liminares e estudo, em defesa do direito dos Kayabi, A maior parte dos indígenas que passou a dizer que os indígenas do zada de Diálogo Tapajós, mas que não
suspensões de afetados pela usina de São Manoel e ocuparam Belo Monte por 17 dias so- Xingu nem precisariam ser consultados pode deixar de cumprir o cronograma
segurança
nunca consultados. O licenciamento da mente no último mês de maio vivem porque a hidrelétrica não alagará terras de implantação da usina – do qual os
usina está em andamento, mas chegou no Rio Tapajós, afetados pelas usinas indígenas. O TRF1 desconsiderou o ar- estudos de impacto são etapa inicial.
a ser paralisado por não prever sequer de São Luiz do Tapajós, São Manoel e gumento, já que a obrigação prevista na Para a AGU, para ser prévia, basta que
estudos de impacto ambiental sobre os Teles Pires. São Luiz do Tapajós é um Convenção 169 é para consultar povos a consulta seja feita antes da Licença
indígenas. dos grandes focos de conflito, mas não afetados e que terão seus modos de Prévia concedida, pelo Ibama.
Os índios que ocupavam um dos é o único. A usina Teles Pires, já em vida modificados, não necessariamente Para o MPF, isso equivale a tornar a
canteiros de obras da usina de Belo estágio de construção, explodiu cacho- alagados. No caso do Xingu, o rio será consulta inválida, porque a decisão de
Monte estão em Brasília hoje [4 de junho] eiras consideradas território sagrado desviado para abastecer a usina: em vez construir a usina foi tomada muito antes
debatendo a reivindicação da consulta para os índios Munduruku. Eles nunca de alagar, as terras indígenas vão secar. do Ibama entrar no processo, quando
em uma reunião com o governo federal. foram consultados e, por isso, o TRF1, A decisão favorável aos indígenas foi concluído o inventário da bacia
A vice-procuradora-geral da República, em Brasília, ordenou a paralisação da no caso de Belo Monte, que paralisou a hidrográfica e definidos os pontos para
Deborah Duprat, acompanha a reunião, obra em agosto do ano passado. Mas a usina por dez dias em agosto de 2012, construção de hidrelétricas. “Se a obra
assim como a presidente da Associação decisão dos três desembargadores que também foi suspensa por uma decisão já tem até cronograma, como falar em
Brasileira de Antropologia, Carmen Rial. analisaram o processo foi suspensa por monocrática, do então presidente do consulta?”, questiona o procurador da
uma decisão monocrática do presiden- Supremo Tribunal Federal, Carlos Ayres República Felício Pontes Jr, que acom-
Suspensões de te do Tribunal, Mário César Ribeiro. O Britto. Até agora, o plenário do STF não panha os processos sobre o assunto.
segurança processo continua tramitando. analisou a questão. Após o inventário da bacia hidrográ-
Em todos os processos que move No caso de São Luiz do Tapajós, fica, existem dois momentos em que o
sobre a consulta, o MPF obteve vitórias todas as instâncias judiciais reconhece-
O momento da
governo, em conjunto com empresários
em favor dos indígenas, mas o governo ram o direito à Consulta não só para os consulta da construção civil e do setor elétrico,
recorreu e toca os projetos com base em índios, como para os ribeirinhos, que Entre as suspensões de segurança decidem realmente pela construção da
liminares e suspensões de segurança. A no Rio Tapajós são conhecidos como concedidas ao governo federal por usina, sem a participação dos povos
suspensão de segurança não analisa os beiradeiros. Em vez de fazer as con- Félix Fischer, Ayres Britto e Mário Cé- afetados. São as resoluções do Conselho
argumentos debatidos na ação, apenas se sultas, no entanto, o governo recorreu sar Ribeiro existe uma coincidência: Nacional de Política Energética (CNPE)
uma determinada decisão judicial afeta a na Justiça e montou uma operação da nenhuma delas afirma que a consulta e da Agência Nacional de Energia Elé-
ordem, a saúde, a segurança e a econo- Força Nacional para garantir os estu- não é necessária ou não precisa ser feita, trica (Aneel) que definem que a obra
mia públicas, deixando o debate sobre os dos de impacto dentro dos territórios apenas permitem que o governo siga será realizada. “Esses momentos têm
motivos do processo para depois. indígenas, o que é um dos principais com estudos, cronogramas e obras até que ser precedidos de consulta aos
Sobre o histórico de suspensões de motivos para a revolta dos Munduruku. que chegue a hora de se julgar o direito povos afetados, ou então o Brasil estará
decisões nos processos de usinas, os de- Novamente, a Advocacia Geral da União da consulta. Para o MPF, o momento da violando o compromisso assumido na
sembargadores da 5ª Turma do Tribunal (AGU) conseguiu suspender as decisões consulta afeta decisivamente a efetivi- Convenção 169”, explica o procurador
Regional Federal da 1a Região (TRF1), favoráveis aos índios, dessa vez por dade desse direito. Ubiratan Cazetta.  n

Ouça o Potyrõ Também estamos on line pelo portal www.a12.com

Todos os sábados e domingos, às 12h35,


dentro do Programa Caminhos da Fé, na rádio Aparecida.

Agosto–2013 12
A transmissão é para todo o Brasil. 820 kHz
Resistentes

Levanta o povo Charrua – Parte I


Elaine Tavares 

Foto: Arquivo Cimi


Jornalista

E
ra uma fria manhã de 1834 na
bela Lyon. Enquanto a cidade
Assembleia
amanhecia, com seus odores
indígena
de pão fresco e gentes mal- ocorrida nas
cheirosas, um homem jovem andava ruínas das
ligeiro pela rua ainda vazia. Carregava Missões
nos braços um bebê. Vestia-se pobre- Jesuíticas,
na década
mente e volta e meia olhava para trás,
de 1970:
esperando ver soldados. Os poucos organização
transeuntes não sabiam, mas ali ia do
um valente cacique charrua, chamado movimento
Tacuabé. Carregava a filha da também contribuiu
para
charrua Guyunusa que, como ele, fora resistência
aprisionada na região da Banda Orien- Charrua
tal (hoje Uruguai), e remetida a Paris,
como um bicho raro. Eram quatro os
índios levados para a França: Tacuabé,
de 23 anos, Vaimava, um velho cacique,
Senaqué, um conhecido pajé charrua e
Guyunusa. Obrigados a se apresentarem Já em 1526, o espanhol Diego sar das lutas esporádicas, os originários povo livre e essa forme de viver iria, três Os Charrua
viviam como
em circos pelos arredores de Paris, Mogger relata em suas cartas sobre eram ignorados. “Sem alma”, diziam os séculos mais tarde, encantar o jovem grupos
sofrendo maus tratos e saudosos de esses indígenas que eram vistos de padres. Assim, para os europeus, Joãos Artigas, que seria um dos libertadores seminômades,
sua terra, os charrua foram morrendo em
longe, observando e sendo observados e Marias ninguém. nas guerras de independência.
acampamentos
um a um. O primeiro foi Senaqué, que bem na entrada do Rio da Prata. Os Só que, na verdade, esses povos A vida dos charrua começaria a estáveis, ora
definhou de tristeza, depois o velho espanhóis descreviam os charrua como já tinham desenvolvido uma cultura. mudar radicalmente a partir de 1607 aqui, ora ali,
seguindo o
Vaimaca. Guyunusa, com pouco mais uma gente moreno-oliva, de estatura Tinham uma organização comunitária quando os espanhóis introduzem o ritmo das
de 20 anos, tomada pela tuberculose, média, pomo de adão saliente, dentes e eram regidos por um conselho da gado bovino e equino na região e, como estações.
morreu em Lyon, deixando um bebê bons, rosto largo, boca grande e lábios aldeia. As tarefas eram definidas, os as pradarias não tinham fim, os animais Caçavam e
plantavam
que se acredita fosse filha de Vaimaca. grossos. Os homens usavam cabelo homens caçavam e as mulheres cui- se espalhavam chegando a gerar imen- coletivamente
Obteve de Tacuabé a promessa de que bem comprido, muito lisos, e tinham davam dos toldos que lhe serviam de sos rebanhos selvagens chamados de num território
a garota haveria de ser livre. E assim, por costume amputar um dedo da mão. abrigos. Desenvolveram tecnologias “cimarrón”. Tão logo conheceram o que, depois
da invasão,
tão logo ela fecha para sempre os olhos, Já os minuano eram um pouco mais eficazes para a caça como é o caso da cavalo, os charrua se encantaram com a ficou durante
o jovem charrua decida escapulir do baixos, de fala baixa, melancólicos e boleadeiras, instrumento usado para beleza, a velocidade e a docilidade dos mais de dois
circo, levando com ele a menina. Os séculos como
igualmente acobreados. Durante todo derrubar os ñandus e bichos maiores. mesmos. Trataram de aprender a lidar fronteira não
historiadores nunca acharam o rastro o processo de ocupação do território Já cozinhavam a carne e produziam com eles e em pouco tempo era exímios demarcada
do cacique e da menina charrua, mas, do que hoje é o sul da América Latina vasos de barro escuro, os quais serviam cavaleiros, imbatíveis no lombo nu dos entre Espanha
e Portugal
se sobreviveram é possível que hoje eles se mantiveram à distância, porque para uso doméstico. Reverenciavam as velozes cimarrón. Nas batalhas, eles
o sangue charrua também corra em seu espaço era o interior e tantos os forças da natureza e acreditavam na se agarravam às crinas e permaneciam
alguma família aparentemente francesa. espanhóis quanto os portugueses pre- ressureição, uma vez que seus mortos deitados de um lado, praticamente in-
Porque se ser charrua é ser valente, não feriam se radicar nas margens do mar eram enterrados com todos os seus ob- visíveis aos inimigos. Por algum motivo
há dúvidas de que Tacuabé conseguiu ou dos grandes rios. Mesmo assim, jetos pessoais, para uso na outra vida. não sabido, charrua e cavalo passaram a
garantir a vida, dele e da menina, na- desde a chegadas dos invasores muitas No verão andavam nus, no inverno se ser quase como uma só criatura.
queles longínquos e tristes dias. foram as escaramuças, principalmente ungiam com gordura de peixe e usavam Por outro lado, foi justamente o
com os charrua. Desde o ano de 1573 peles de animais. As mulheres usavam crescimento exponencial do gado bovi-
Quem eram os charrua já é possível encontrar relatos de lutas uma espécie de fralda de algodão, hoje no o responsável pelo fim da mal arran-
Corria o ano de 1513 quando Juan com os espanhóis. conhecida como xiripá, chamado por jada paz no território charrua. Como a
de Solis chegou ao Rio da Prata e isso Eles viviam como grupos seminô- eles de cayapi. Os homens usavam uma carne e o couro eram artigos disputados
marcaria para sempre a vida dos povos mades, em acampamentos estáveis, vincha (faixa de pano) na testa. Toda a pelo comércio da época, a região que
que ali viviam desde há séculos. O povo ora aqui, ora ali, seguindo o ritmo das organização girava em torno do núcleo antes era dominada pelos indígenas
charrua era uma gente aguerrida que estações. Caçavam e plantavam cole- familiar. Um homem quando queria se passa a receber levas de faeneiros (a
habitava as pradarias do que hoje é o tivamente num território que, depois casar fazia o pedido ao pai da moça e mando dos espanhóis) e changueadores
Uruguai, a pampa argentina e parte do da invasão, ficou durante mais de dois já montava sua tenda. A comunidade (aventureiros) que buscavam arrebanhar
Rio Grande do Sul. Chamado de vale séculos como fronteira não demarcada não tinha hierarquia, tampouco chefe, o gado selvagem para a venda aos ingle-
do rio Uruguai essa era uma região de entre Espanha e Portugal. Era visto pe- tudo era decidido no conselho. Presos ses. Essa mistura com a gente europeia
coxilhas e muitas pradarias, espaço de los invasores como “terra de ninguém”. de guerra não eram escravizados, vi- e criolla vai enfraquecendo o já frágil
ventos intensos tanto no verão como Mas, ao contrário do que poderiam crer ravam família e se integravam na vida domínio que os charrua tinham sobre
no inverno. Além da gente charrua e os que chegavam da Europa, aquele da comunidade. Todo grupo tinha uma o território da campanha. Também é
do povo minuano, dividiam o espaço era um espaço já há centenas de anos mulher velha que cuidava da saúde. O nessa época que ficam mais acirradas
as capivaras, ratos do banhado, pecaris, ocupado não só pelos Charrua mas grupo tinha por costume se reunir no as relações com a gente branca que
veados, jaguatiricas e o mítico ñandu também pelos povos Minuano, Tapes, cair da noite para planejar o dia se- começava a adentrar para o interior,
(a ema). Chaná e até Guarani. Ainda assim, ape- guinte, mas nada era imposto. Era um cercando terras e fazendo-as suas.  n 13 Agosto–2013
País
Assembleia Xukuru 2013
Afora
Valorizando a Terra dos Ancestrais
A
13ª Assembleia Indígena Xuku-

Fotos: Renato Santana/Cimi


ru (PE) congregou um momento
de retorno à memória de luta
pela terra e fortalecimento
da identidade do povo. Com o tema
Limolaigo Toipe (Terra dos Ancestrais),
os Xukuru realizaram o evento, de 17
a 20 de maio, na aldeia Pedra D’água.
Foi um momento de confraternização
e reafirmação do compromisso do gru-
po em buscar melhores condições de
vida, definindo um projeto solidário e
participativo entre todas as aldeias e
seus aliados, indígenas e não indígenas.
O encontro contou com a presença
de 400 pessoas, entre homens, mulhe-
res e crianças que acamparam na pri-
meira aldeia retomada pelo povo, em
1990. Um espaço que representa não Após 90 dias de muita tensão o
só um marco político, como também povo conseguiu construir suas primei-
O encontro um espaço ritual fundamental, onde ras moradias e edificaram a casa onde
contou com a
presença de estão a Pedra do Rei (área sagrada das Xicão passaria o restante de sua vida,
400 pessoas, mais importantes no alto da serra) e marco da solidariedade e união do
entre homens, povo, como explicou o vice-cacique Zé
mulheres e
o primeiro terreiro de toré da comu-
crianças que nidade. de Santa. Ele lembrou que a moradia foi
acamparam A assembleia teve início com uma erguida em 15 dias, enquanto Xicão via-
na primeira
aldeia revisão dos principais desafios enfrenta- java. “Quando ele chegou nós dissemos:
retomada dos pelo povo na criação de uma gestão pronto Xicão, é sua casa!”, concluiu.
pelo povo, consciente e solidária em seu território.
em 1990. Um
Uma proposta que passa internamente Indígenas americanos
espaço que
representa pela conscientização da comunidade elogiam organização Xukuru
não só
pelo respeito à natureza. As discussões Durante a Assembleia Xukuru
um marco
político, como giraram em prol do uso sustentável e chamava a atenção a presença de dois
também um consciente da terra a partir da dimi- indígenas dos Estados Unidos que, com
espaço ritual
fundamental
nuição de queimadas, do abandono olhar atento e carisma, tentavam driblar
progressivo no uso de agrotóxicos e do a dificuldade de não entenderem portu-
descarte correto do lixo. culturais, com apresentações do grupo local onde o cacique Xicão, o Mandaru, guês, necessitando permanentemente
Outro ponto relevante foi a rea- de teatro e Côco de Roda, sob o coman- foi assassinado em 20 de maio de 1999. de uma intérprete. Os dois vieram por
tivação de terreiros como o de Pedra do de mestre Pirrila. convite da professora Márcia Mikulak,
D’água, o primeiro a ser ocupado pelo Para além dos Xukuru, a assembleia Aldeia Pedra D’água marca da University of North Dakota, que está
povo e que hoje não tem mais a perio- contou com a participação de indígenas história da luta pesquisando os Xukuru. Junto aos três
dicidade semanal do toré. O ponto da dos povos Tabajara e Potiguara (ambos A escolha do local para a 13ª As- estava como tradutora a antropóloga
espiritualidade foi tratada com muito da Paraíba) e dos Truká, Kapinawá e Pi- sembleia Xukuru foi especial esse ano, Lívia Froes.
respeito e atenção pelos presentes, pipã, todos de Pernambuco. Houve ain- segundo Zenilda Araújo, liderança Os dois indígenas do estado de
que em diversos momentos tiveram da a visita de dois indígenas dos Estados Xukuru. O local tem o mais importante Dakota do Norte eram Allan Demaray
a presença de seus Encantados dando Unidos, Allan Demaray e BJ Rainbow, marco ritual do povo, a Pedra do Rei, (representando os povos Awatee, Hidat-
conselhos ao povo e possibilitando que vieram conhecer a organização para onde iam os índios de ciência, sa e Arikara) e BJ Rainbow (povos Spirit
um estado de boas energias a todo o política Xukuru. Também estiveram pre- mesmo quando era proibida a realiza- Lake, Standing Rock e Turtle Mountain).
evento. sentes aliados representando o CIMI, ção de pajelanças no local, sob ameaça Eles acompanharam as discussões, pro-
A organização social do povo tam- Universidade Federal da Paraíba (que de prisão pela polícia. curaram conhecer a história do povo e
bém foi discutida, sendo apontada trouxe estudantes de graduação, em Foi nessa aldeia onde os Xukuru sua trajetória de luta pela terra.
a necessidade de um trabalho mais parte indígenas Potiguara e Tabajara), realizaram sua primeira retomada, em Allan explicou que foi um grande
aproximado entre o Conselho de Pro- Universidade Federal de Pernambuco 5 de novembro de 1990, ocupando aprendizado a vinda à Assembleia. Ele
fessores Indígenas Xukuru (Copixo) e o e Ministério Público Federal. uma clareira na mata onde ficaram afirmou que os Xukuru estão bem mais
Conselho Indígena de Saúde Xukuru do O evento foi encerrado no dia 20 de acampados por 90 dias e que depois avançados na organização política que
Ororubá (CISXO) , a fim de estimular a maio com a missa no espaço onde foi foi transformada no primeiro terreiro, os indígenas da região onde ele reside
saúde preventiva. Também foi elogiada sepultado (ou, como preferem os Xuku- para realização do Toré e da Pajelan- e que iria levar muitas propostas para
a atuação da Equipe Jupago, que traba- ru, plantado) o cacique Xicão e outros ça. Um espaço ritual que garantiu o seu povo. “Viemos com um copo vazio
lha o apoio agrotécnico com pessoas do guerreiros Xukuru. Em seguida todos início de uma nova tradição no grupo, e os Xukuru encheram de conhecimen-
próprio povo. foram em caminhada até Pesqueira, em que era a vinda semanal de índios to”, explicou Allan, que junto com BJ
O evento teve como marcante a cerca de 8 quilômetros marcados por que moravam próximos ao terreiro realizaram um belo ritual de agrade-
presença de jovens, que trabalharam uma marcha forte, movida pelo toré e para participarem do toré, todos os cimento aos Xukuru no último dia da
no registro em vídeo da assembleia e culminando em um ato público reafir- domingos, fortalecendo a identidade Assembleia, com música, cânticos e
Agosto–2013 14 também contribuíram nos momentos mando a força de união do povo, no religiosa do grupo. distribuição de presentes.  n
Mais um Guarani Kaiowá é Povo Guarani Mbya
retoma Terra Indígena País
assassinado no MS Afora
Renato Santana,
de Brasília (DF)
os estudos e os resultados devem ser publicados
no 2º semestre deste ano.
Irapuá, território
imemorial
D

Fotos: Renato Santana/Cimi


e acordo com informações do cacique
Cinco indígenas são
Nicolau Guarani Kaiowá, da aldeia Para- presos em Dourados
guassú, Terra Indígena Takwarity/Ivykwa- No mesmo dia 12, à tarde, a Polícia Civil de Patrícia Bonilha,
rusu, município de Paranhos, Celso Rodrigues, Dourados prendeu cinco indígenas do acampa- de Brasília

R
42, indígena da comunidade, foi morto a tiros mento Ita’y Ka’agurussu, Terra Indígena Lagoa

A
por pistoleiros enquanto caminhava para o tra- Rica/Panambi, município de Douradina. Entre os sensação térmica era de
balho, na manhã do dia 12 de junho. A Polícia presos está a cacique Isigeninha Hirto, grávida, alguns graus abaixo de
Civil esteve no local para perícia, o delegado além dos Guarani Kaiowá Samuel Gonçalves, zero na madrugada de
Rinaldo Gomes Moreira pediu abertura de Sérgio da Silva, Elaine Hilton e João Isnarde. 25 de julho na beira da
inquérito e o corpo de Celso foi encaminhado As prisões têm relação com um fato ocorrido BR 290, quando cerca de quinze
ao Instituto Médico Legal (IML) de Ponta Porã. no dia 13 de abril, no próprio acampamento, famílias Guarani Mbyá retomaram
A região de Paranhos, sul do estado, é foco quando Arnaldo Alves Ferreira, policial militar a área de 222 hectares da terra caraí (caciques), pajés e guerreiros
de conflitos entre indígenas e fazendeiros que reformado, invadiu a cavalo a aldeia efetuando indígena Irapuá, delimitada pela considerados muito importantes
mantêm terras em áreas de ocupação tradicional seis disparos contra os indígenas, acertando na Fundação Nacional do Índio (Funai) na história dos Guarani Mbyá. Além
Guarani. No mês de agosto de 2012, os Guarani orelha o Guarani Kaiowá João da Silva. em janeiro de 2011. As ofensivas disso, é na terra que os Guarani
Kaiowá retomaram parte do tekoha – lugar onde Durante o ataque, integrantes da comu- da bancada ruralista no Congresso podem exercer o nhande reko (o
se é – Arroio Korá, em Paranhos. Homologada nidade indígena conseguiram desarmar o mi- Nacional sobre os direitos indígenas modo de ser e viver dos Guarani).
desde 21 de dezembro de 2009, a terra se man- litar reformado, defendendo-se dos disparos. adquiridos, a proposta do governo “Não há condições de viver como
tinha nas mãos de fazendeiros. Durante visita Arnaldo foi mantido seguro pela comunidade, federal de dificultar o processo de Guarani em uma beira de asfalto,
de equipe do Ministério Público Federal (MPF), que informou a ocorrência à polícia local. O demarcação, a postura ambígua do sem natureza, sem pássaros, sem
pistoleiros atiraram contra a comunidade. PM e o indígena ferido foram encaminhados ao governo Tarso Genro (PT-RS) – que rio, sem terra”, afirmou Matias
Um mês depois, em setembro, 500 indígenas Hospital da Vida, em Dourados. Arnaldo morreu diante dos setores do agronegócio Benno Rempel, do Grupo de Apoio
Guarani Nhandeva retomaram parte dos 4.025 ainda na ambulância. O Kaiowá ferido foi preso se coloca contrário às demarca- aos Povos Indígenas (Gapin).
hectares do tekoha Potrero Guasu, a 10 km de pela polícia, acusado de homicídio em flagrante. ções, e na frente dos indígenas diz Desse modo, os indígenas es-
Paranhos, declarado como indígena desde 13 Ao atenderem o pedido de apresentação do que é favorável a elas - e a longa tavam determinados a permanecer Localizada
de abril de 2000. Uma criança morreu durante delegado Marcelo Damaceno, que preside o entre os
demora na conclusão do processo na área retomada. “Não sairemos municípios
fuga da comunidade em invasão de pistoleiros. inquérito, os cinco indígenas receberam voz de demarcação da TI Irapuá (que daqui. A ocupação é permanente. de Caçapava
Em outras duas ocasiões, os Guarani Kaiowá de prisão e foram recolhidos na Cadeia Pública já completou 18 anos) foram os A terra é nossa. Nossos ancestrais do Sul e
da Paraguassú foram ameaçados por pistoleiros. de Dourados. “Os Guarani Kaiowá chegaram de motivos que levaram os indígenas viveram aqui e aqui vamos voltar a Cachoeira
No tekoha vivem 127 famílias num espaço de boa-fé para depor e foram presos, mas não há do Sul, a
a ocupar novamente, após 30 anos, morar, plantar e comer como fazí-
2.700 hectares homologados. Os indígenas circunstâncias para fundamentar estas prisões”, cerca de 260
o vale do Rio Irapuá, uma das áreas amos antes, nos nossos costumes. quilômetros de
pediram a revisão da demarcação. Técnicos da critica o advogado Natanael Santiago Dave, que mais antigas de tradição dos Gua- Vamos fazer isso de novo e isso Porto Alegre
Fundação Nacional do Índio (Funai) realizaram defenderá os indígenas.  n rani no país. vai mudar nossas vidas”, anunciou (RS), a área é
À tarde, o procurador da Repúbli- Albino Gimenes, de 38 anos e há 10 considerada

Liderança Atikum da Aldeia


um território
ca se reuniu com os indígenas na área anos vivendo na beira da BR 290. sagrado
ocupada e manifestou total apoio às A importância de proporcionar essencial para

Ororubá é assassinada
famílias. Ele afirmou que a ocupação para as 30 crianças da comunidade os indígenas
da área já declarada como sendo indígena o nhande reko é outro pelo fato
de que ali
indígena é justa e se comprometeu a estímulo para a retomada da vida

N
moraram
o último ano, inúmeras idas e vindas culminou em uma anunciada tragédia na aldeia enviar um ofício para o Ministério da tradicional dos Guarani. Acam- inúmeros caraí
foram feitas por lideranças Atikum entre Ororubá. O indígena Atikum Wilson Ambrósio Justiça para que seja imediatamente pados na beira da BR, eles vivem (caciques),
a Funai, o Incra, a Polícia Federal e o da Silva, de 43 anos, foi encontrado morto publicada a portaria declaratória da sem nenhuma infraestrutura, sem pajés e
Ministério Público Federal (MPF), em Marabá, pelos membros do seu grupo por volta das terra indígena Irapuá, já que ela não condições dignas de moradia, saúde guerreiros
cobrando providências e agilidade no processo 16h, com dois tiros, um na cabeça e outro no se enquadra dentro das áreas que o e educação. “O rigoroso inverno,
de retirada dos invasores da área ocupada por tórax, dentro da reserva ocupada pelas famílias governo tem objeção em demarcar com intensas geadas, piorou muito
suas famílias na região Itupiranga, no Pará. Do- indígenas. por causa dos conflitos com peque- a já desumana e brutal condição em
cumentos foram entregues aos representantes Segundo os membros da comunidade, a nos agricultores. que estão vivendo as 15 famílias. As
da Procuradoria Geral da República, durante a liderança indígena havia saído pela manhã para Localizada entre os municípios lonas, nos tetos dos barracos, têm
realização de uma audiência pública na sede do a serra (área disputada pelos invasores e os de Caçapava do Sul e Cachoeira buracos de até um metro entre uma
órgão, denunciando toda a situação vivenciada indígenas) para olhar o gado da comunidade do Sul, a cerca de 260 quilôme- e outra estaca. Não há lenha nas
pela comunidade e pedindo ajuda urgente, que estava pastando naquele local e não voltou tros de Porto Alegre (RS), a área é proximidades. O frio está sendo tão
pois o clima entre indígenas e invasores, já se mais. Os indígenas suspeitam que o crime tenha considerada um território sagrado intenso que estava sendo impossível
encontrava tenso. sido praticado por invasores da área, que vivem essencial para os indígenas pelo dormir e as crianças choravam a
No entanto, como nenhuma medida efetiva em um Projeto de Assentamento para Reforma fato de que ali moraram inúmeros noite toda ali”, informou Rempel.  n
foi tomada de fato, no dia 9 de julho o conflito Agrária, do Incra.  n

Ameaça de morte no Amazonas


O
coordenador secretário do Conselho luta pela demarcação das terras indígenas nos
Indígena Mura (CIM), José Cláudio municípios de Autazes e Careiro. Claudinho é o
Pereira dos Santos, 31 anos, recebeu quinto indígena ameaçado de morte na região.
ameaças de morte por telefone de número As ameaças decorrem da luta pela demarcação
não identificado nos meses de junho e julho. das terras indígenas. Este ano, em atenção a
Ele registrou queixa no dia 17 de julho na pedidos feitos pelo Ministério Público Fede-
delegacia da cidade de Autazes (AM), a 108 ral no Amazonas (MPF/AM), a Justiça Federal
quilômetros de Manaus, e informou a Funda- determinou, em caráter liminar, à Funai e à
ção Nacional do Índio (Funai) daquela cidade. União que concluam o processo demarcatório
Ele é filho de Cláudio Mura, um dos líderes das terras indígenas Murutinga e Ponciano,
do povo Mura, que desde a década de 1990 habitadas tradicionalmente pelos Mura.  n 15 Agosto–2013
VUITIR, O MONGO VÉIO PURI
Benedito Prezia na fundação do aldeamento de São João de Queluz, Desiludido com tal situação, optou em retornar
Historiador na Província de São Paulo, em 1800. Vuitir mostrava para o mato, sendo acompanhado de seu grupo

S
grande ascendência sobre seu povo, além de bom familiar. Com o tempo, as famílias Puri foram
e a memória do brasileiro em relação aos relacionamento com os brasileiros. Por isso conse- morrendo, vítimas de doenças ou se integraram à
povos indígenas é pequena, mais ainda guiu levar 80 famílias para serem aldeadas, desde população local. Abandonada, a missão de Queluz
em se tratando dos povos coletores, que que o governo se comprometesse em dar bom tornou-se vila portuguesa, com escravos, pelouri-
viviam em perambulação. tratamento, não escravizá-los e dar um padre para nho e forca.
Este é o caso do povo Puri, que no ensinar-lhes a doutrina cristã e para defendê-los. De Vuitir, nunca mais se teve notícias, tornando-
século XVI vivia no Vale do rio Paraíba, Como bom andarilho, logo que pôde, Vuitir par- -se um personagem mítico para os escravos, que o
que atravessa os atuais estados de São Paulo e tiu para outras localidades, percorrendo a região. invocavam nos seus cantos, ao serem ameaçados
Rio de Janeiro. Organizados em pequenos grupos, Ao voltar para o aldeamento, para sua surpresa, pelo feitor:
instalavam-se em acampamentos provisórios, des- encontrou escravos africanos trazidos pelo diretor Foge feitô, Mongo véio vai vortá!
locando-se constantemente em busca de alimentos, de índios, Januário Nunes da Silva. Esses trabalha- Foge feitô, tarumã, tarumá!
como pinhão, sapucaia, mel e caça. Era um povo vam nas roças do diretor de índios, sendo vítimas Sua figura persistiu ainda por muito tempo e
pacífico, embora arredio e acanhado. de constantes castigos. Por isso o Puri queixou-se em meados de 1940 o escritor J. B. Mello de Souza,
Quando o vale começou a ser ocupado pelos ao capelão: “Tire ferro cabeça homem negro, deixe numa festa do 13 de maio em Jataí, ouviu um jongo
luso-brasileiros no século XVII, os Puri se desloca- negro vortá! Mande embora feitô mau!” que recordava o “véio” Puri:
ram para o interior, cruzando a serra da Mantiquei- Logo percebeu que pouca autoridade tinha so- Passei córgo, passei rio, subi morro e passei
ra, espalhando-se pelo Sudeste de Minas Gerais. Lá bre aquela situação, já que a escravidão era aceita mato,
tiveram que enfrentar outros povos indígenas que por todos. Entretanto sua postura fez com que vi a cruz de Passa Quatro, vi cabôco frechadô.
lhe eram hostis, como os Coroados e os Botocudos, os negros o vissem de outra forma e passaram a Andei perdido no sertão, lá do Embaú,
além dos portugueses, que buscavam escravos para chamá-lo de Mongo, que em banto significa “deus, fui mordido de urutu... Mongo véio não vortô!...
os garimpos. protetor”.
Diante dessas pressões, parte do grupo retor-
nou a seu território tradicional, no médio Paraíba,
indo viver no Minhocal, próximo a um dos
afluentes do rio Preto, a cerca de 30
quilômetros do rio Paraíba, já no
estado do Rio de Janeiro.
Em 1780, devido à escassez
de alimentos, começaram a
invadir fazendas. Como havia
constantes reclamações dos
moradores o vice-rei autorizou a
formação de uma milícia, constituída
por pessoas da região e alguns solda-
dos, comandada pelo sargento-mor
Joaquim Xavier Curado. Os ataques
ocorreram seja em confrontos dire-
tos, seja com emboscadas.
Uma novidade desse conflito
foi a utilização de “armas bacte-
riológica”, quando foram deixadas
no acampamento indígena roupas
contaminados de varíola. As mor-
tes foram tantas, que no dizer de
Joaquim Norberto Souza e Silva,
“as torrentes caudalosas [do rio
Paraíba] arrastavam cotidiana-
mente os hediondos cadáveres das
míseras vítimas [Puri]”.
Anos depois, o governo decidiu
APOIADORES mudar de estratégia: ao invés de
guerra de extermínio, procurou criar
alguns aldeamentos com indígenas
“pacificados”. Assim a Puri Mariquita será
a intermediária na fundação do aldeamen-
to São Luís Beltrão, em 1785, na antiga
aldeia do Minhocal, na Província do
Agosto–2013 16 Rio de Janeiro, e o líder Vuitir ajudará

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