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QUALIDADE DE VIDA E VOZ PÓS-RADIOTERAPIA:


REPERCUSSÕES PARA A FONOAUDIOLOGIA

Quality of life and voice after radiotherapy:


Speech therapy repercussions
Renata Jacob Daniel Salomão de Campos (1), Isabel Cristina Gonçalves Leite (2)

RESUMO

Tema: o tratamento radioterápico do câncer de cabeça e pescoço tem mostrado resultados importan-
tes no controle da doença quando neoadjuvante ou mesmo concomitante à quimioterapia. Pesquisas
apontam um aumento da sobrevida após 5 anos de tratamento do câncer de laringe, o que torna
necessário e justifica os esforços realizados na reabilitação da comunicação dos pacientes, e des-
taca a presença do profissional de Fonoaudiologia na equipe de radioterapia. Objetivo: descrever as
seqüelas com repercussão fonoaudiológica, tais como alterações na qualidade vocal e na qualidade
de vida, associadas ao tratamento proposto para tumores de cabeça e pescoço, em especial aquelas
originadas após a radioterapia. Conclusão: Várias seqüelas, agudas e crônicas, como rouquidão,
odinofagia e afonia, que envolvem dificuldades na comunicação oral e/ou deglutição dos pacientes
após o tratamento radioterápico em cabeça e pescoço, interfere de maneira direta na comunicação,
deglutição e qualidade de vida dos pacientes. Os profissionais envolvidos no tratamento desse cân-
cer, dentre eles o fonoaudiólogo, através do conhecimento sobre o tratamento e as fragilidades tera-
pêuticas que comprometem a qualidade vocal e qualidade de vida desses pacientes, busca contribuir
no processo de recuperação minimizando os danos causados pela doença e melhorando a condição
de saúde do indivíduo.

DESCRITORES: Radioterapia; Epidemiologia; Voz; Neoplasias de Cabeça e Pescoço; Qualidade de


vida

„„ INTRODUÇÃO nas populações feminina e masculina com mais de


40 anos 2.
O câncer é resultante de um processo multifa- Particularmente no caso dos cânceres de
torial que consiste em diversos estágios, caracte- cabeça e pescoço, o tratamento proposto, habitu-
rizando uma doença que requer o mais alto nível almente, envolve cirurgia, radioterapia, quimiote-
técnico de tratamento realizado por diversos profis- rapia ou uma combinação dos mesmos. Portanto,
sionais da área da saúde. Neste contexto, a fonoau- cirurgiões, radioterapeutas e oncologistas devem
diologia se insere 1. participar dos tratamentos para contribuírem no
melhor controle loco-regional da doença, e simul-
A literatura internacional aponta as neoplasias taneamente otimizar a sobrevida após a cura por
como segunda causa mais importante de morte, meio da preservação da função de comunicação
apenas superada pelas doenças cardiovasculares do paciente. Entretanto, embora a cura possa se
alcançada em 60% dos casos, esta não significa
(1)
Fonoaudióloga Clínica do Instituto Oncológico de Juiz de necessariamente melhora da qualidade de vida dos
Fora; Especialista em Voz. Mestre em Educação; Mes- mesmos, permanecendo este como o grande desa-
tranda em Saúde Brasileira pela Universidade Federal de fio da oncologia, em especial as funções relativas
Juiz de Fora.
à reintegração social dos afetados, em especial a
(2)
Cirurgiã Dentista; Professora Adjunta da Universidade
fala3.
Federal de Juiz de Fora; Mestre e Doutora em Saúde
Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública-FIOCRUZ. A intervenção fonoaudiológica é comum e
Conflito de interesses: inexistente importante para os pacientes que foram submetidos

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à cirurgia de cabeça e pescoço 4. O acompanha- „„ REVISÃO DA LITERATURA


mento é feito desde a fase pré-cirúrgica, fundamen-
tado na orientação sobre a reabilitação proposta Câncer de cabeça e pescoço: aspectos
após o procedimento cirúrgico. Neste momento, epidemiológicos
algumas medidas vocais e da deglutição são afe- Conforme apontam os estudos epidemiológi-
ridas para serem comparadas no pós-operatório, cos, o aumento da expectativa de vida associa-se
com objetivo de minimizar as alterações da comuni- à tendência de crescimento da incidência de câncer
cação presentes após o tratamento do câncer. de cabeça e pescoço em todo o mundo. Além dos
A literatura científica 4 refere-se à intervenção fatores genéticos, a exposição ao tabaco, especial-
fonoaudiológica no pré e pós-operatórios de cabeça mente associado ao álcool, exibe comportamento
e pescoço, contudo poucas referências descrevem de potente variável que aumenta as chances de
a importância deste profissional nas equipes de ocorrência deste tumor 5,6.
radioterapia e quimioterapia. A reabilitação oncoló- Os carcinomas de cabeça e pescoço represen-
gica se faz necessária também junto aos pacientes tam 18% de todos os tumores malignos aproxima-
damente. Cerca de 90% destas neoplasias são
que foram submetidos à radiação, pois são des-
manifestadas sob forma de carcinomas espino-
critas seqüelas presentes após estes tratamentos,
celulares, e em menor freqüência os de natureza
que envolvem dificuldades na comunicação oral e/
neuroendócrina, originados de glândulas salivares
ou deglutição desses pacientes.
menores, sarcomas e linfomas 4.
Nesse sentido o presente artigo propõe por meio O câncer de boca e orofaringe tem comporta-
de uma revisão da literatura descrever as seqüelas mento agressivo, sendo a incidência no Brasil uma
com repercussão fonoaudiológica, tais como alte- das mais altas no mundo. Segundo Instituto Nacio-
rações na qualidade vocal e de vida, associadas nal do Câncer e Ministério da Saúde 2, os registros
ao tratamento proposto para tumores de cabeça e hospitalares revelam que o câncer de cavidade
pescoço, em especial aquelas originadas após a oral está em oitavo lugar como o câncer mais fre-
radioterapia. qüente nos homens e nono lugar nas mulheres, por
cem mil habitantes, no estado de Minas Gerais. É
considerado o câncer mais comum da região da
„„ MÉTODOS
cabeça e pescoço, excluindo-se o câncer de pele
não-melanoma. A estimativa foi de 466.730 novos
Os trabalhos utilizados foram selecionados por casos de câncer no Brasil em 2008, sendo que o
meio de pesquisa bibliográfica dos textos indexados de cavidade oral deveria reunir um total de 14.160.
nas seguintes bases bibliográficas dados: Medline; Destes, 8.010 casos ocorreram na região sudeste
Scielo (Scientific Eletronic Library Online); Pubmed; brasileira.
Periódicos CAPES. Também foram utilizados livros Os tumores da faringe estão preferencialmente
da área, monografias, dissertações de mestrado e localizados na hipofaringe e apresentam o mesmo
teses de doutorados. padrão histopatológico e epidemiológico dos tumo-
res de cabeça e pescoço 4.
Esta revisão de literatura teve origem no projeto
de pesquisa desenvolvido pelos autores e que aten- O câncer de laringe é considerado um dos mais
comuns dentre os tumores da região da cabeça
deu aos requisitos da Declaração de Helsinque e
e pescoço, correspondendo a cerca de 25% dos
às recomendações da Resolução 196/96 do Con-
tumores malignos desta área e 2% de todas as
selho Nacional de Saúde, tendo sido aprovado pelo
doenças malignas. A literatura afirma que a preser-
Comitê de Ética em Pesquisas em Seres Humanos
vação da voz é um importante parâmetro na deci-
da Propesq/ UFJF sob parecer n. 236/2007. são do tipo de tratamento, surgindo os protocolos
Foram utilizadas palavras-chaves para a busca de preservação de órgãos nos quais se preconiza a
nos periódicos nas línguas portuguesa e inglesa, radioterapia e/ou quimioterapia4.
sendo estas: voz; desordens vocais; radioterapia;
qualidade vocal; qualidade de vida; alterações após Tratamento com preservação de órgãos:
radioterapia; fonoaudiologia e radioterapia. Estes radioterapia e/ou quimioterapia em cabeça e
dados foram selecionados inicialmente, separados pescoço
e posteriormente foram cruzados para melhor sele- Estudos mostram bons resultados no tratamento
ção dos artigos. Procurou-se destacar os estudos da doença pela preservação do órgão laríngeo atra-
mais recentes, ou seja, de 2000 a 2009 e alguns vés de tratamentos combinados de radioterapia e
artigos de referência da década de 1990 também quimioterapia, não comprometendo os resultados
contribuíram para a revisão. em termos de tempo de sobrevida 2. Porém, nem

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sempre a preservação da laringe se torna um trata- esta relatada pelos pacientes como dificuldade de
mento que resguarde realmente todas as funções. fonação e rouquidão.
Os pacientes possivelmente apresentam alterações
de ordem específicas na comunicação e deglutição. Avaliação fonoaudiológica vocal em pacientes
A terapia de radiação tem sido usada há mais oncológicos
de 100 anos. É um método comprovado para con- A fonoaudiologia tem parâmetros de medida
trolar malignidades, que possibilita o aumento da subjetiva e objetiva da qualidade vocal, tornando
sobrevida de indivíduos acometidos por câncer. É importante o acompanhamento fonoaudiológico
usada em mais da metade de todos os tratamen- durante a radioterapia. Sua intervenção visa facilitar
tos de câncer e, em alguns casos, é o tratamento a produção vocal e também poderá trazer resulta-
de eleição, prevalecendo sobre todas as escolhas dos importantes na qualidade de vida dos pacientes
terapêuticas. Em outros casos, é usada em combi- com tumores de cabeça e pescoço, visto a facili-
nação com quimioterapia e/ou cirurgia. Apesar dos dade de manterem a comunicação oral e convívio
benefícios desta terapia, apresenta efeitos colate- social.
rais como todos os tratamentos contra doenças 7. A avaliação subjetiva da voz é a avaliação clás-
O tratamento radioterápico no câncer de cabeça sica da qualidade vocal, ou seja, avaliação percep-
e pescoço tem o objetivo de liberar a dose ade- tiva-auditiva. E a avaliação objetiva é feita por um
quada para o controle do tumor, preservando teci- programa de voz computadorizado. Normalmente,
dos vizinhos sadios. A dosagem mínima é de 65Gy armazena um arquivo vocal contendo uma vogal
para controle local desta doença 4. Os tumores ini- sustentada (vogal /a/ ou /e/) e fala encadeada
ciais (T1 e T2) podem ser tratados com alto grau de seguida de fala espontânea, que serão analisadas
sucesso pela cirurgia e pela radioterapia, porém as por um especialista em voz. O profissional pro-
lesões superficiais e exofíticas são mais radiossen- cura delimitar e correlacionar os parâmetros vocais
síveis, enquanto as lesões infiltrativas, ulceradas e encontrados em normais ou alterados e em qual
hipóxicas respondem melhor à conduta cirúrgica. proporção isto acontece. A escala japonesa GRBAS
Segundo parâmetros estabelecidos pelo Insti- é usada internacionalmente, sendo um método sim-
tuto Nacional do Câncer e o Ministério da Saúde 8 ples de avaliar o grau global da disfonia (G), que é
devem ser aplicados 6.600 cGy em lesões iniciais composto por 4 fatores independentes: rugosidade
de cabeça e pescoço (T1ou T2). Nas lesões avan- (R), soprosidade (S), astenia (A) e tensão (T), con-
çadas (T3 e T4), aplica-se 7.000cGy em lesão pri- siderados fatores importantes na definição de uma
mária. O esvaziamento cervical radical ou radical voz disfônica. Vale ressaltar que os parâmetros
modificado é indicado, dependendo do estádio da de astenia e tensão são excludentes, por motivos
doença cervical, bem como em casos de metástase óbvios. Recentemente foi proposto acrescentar o
cervical residual ou de recidiva cervical. fator instabilidade (I) tornando escala GRBASI 1.
A avaliação objetiva refere à avaliação acús-
Seqüelas identificadas nos pacientes após tica do sinal sonoro, que é medido através de uma
radioterapia em cabeça e pescoço amostra vocal, geralmente vogal sustentada, por
O tratamento radioterápico para pacientes aco- um microfone acoplado ao computador que conte-
metidos de tumores malignos de cabeça e pes- nha o laboratório de voz. Esta amostra será ana-
coço exibe complicações orais importantes, dentre lisada pelo software do clinico e será realizada a
elas mucosite, xerostomia, cáries, perda do pala- medida da freqüência fundamental. É importante
dar, infecções secundárias, osteorradionecrose e ressaltar que a normatização do uso do laboratório
trismo 9. Estes efeitos colaterais podem ser classi- de voz requer formação específica e experiência do
ficados em formas agudas, por exemplo: eritema, fonoaudiólogo para análise dos dados encontrados
mucosite, edema laríngeo moderado e rouquidão no programa de voz 1.
temporária, ou crônicas, tais como necrose do Na Figura 1 são apresentadas medidas subjeti-
tecido, função da saliva prejudicada, edemas e dis- vas e objetivas da qualidade vocal utilizadas na prá-
fonia severa 4,6. Estas manifestações crônicas foram tica clínica do fonoaudiólogo especializado.
descritas como complicações tardias da radiotera-
pia, acrescentando-se outras manifestações fono- Reabilitação oncológica
audiológicas como fibrose laríngea e imobilidade Em um estudo sobre os resultados funcionais
bilateral das pregas vocais 10. do tratamento para câncer de laringe avançado, no
Alterações no tecido laríngeo e/ou em torno do qual foram avaliadas funções relativas à comunica-
arcabouço laríngeo restringem o movimento neces- ção e deglutição, foram obtidos resultados claros
sário das cartilagens e músculos, sendo modificado que os pacientes com este tumor não desenvolvem
o fechamento glótico para a produção vocal, causa bem a comunicação espontânea quando há remo-

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PARÂMETROS NORMAL ALTERADO


MEDIDAS
G = 1; 2 ou 3
R; B; S; I =
SUBJETIVAS G=0
1 – Discreto; 2 – Moderado;
3 – Severo
Homem = 113Hz Homem # 113Hz
OBJETIVAS Mulher - 295Hz Mulher # 295Hz
Criança=236Hz Criança # 236Hz
G = grau global de disfonia; R = rouquidão; B = soprosidade A = astenia;
S = tensão; I = irregularidade.
Fonte: Behlau, 2005

Figura 1 – Medidas subjetivas e objetivas da qualidade vocal

ção total do órgão laríngeo. No mesmo trabalho, os radioterápico, seis fizeram laringectomia parcial,
autores focalizaram os resultados da reabilitação seis foram submetidos a laringectomia total e cinco
de pacientes laringectomizados totais, concluindo eram indivíduos laríngeos normais. O estudo con-
que somente porcentagens relativamente peque- cluiu que todos os pacientes desenvolveram ou
nas de pacientes (6%) desenvolveram a voz eso- mantiveram uma fonte fonatória após o tratamento
fágica. Este achado ressaltou a importância de um e puderam usar o discurso funcionalmente, sendo
tratamento que preserve o órgão com o objetivo de que o grupo que foi submetido à radiação obteve
ser obter uma melhor reabilitação 11. as vozes mais próximas do grupo controle, sendo
Dentre as alterações vocais após radioterapia, o achado oposto verdadeiro para os grupos cirúr-
os músculos expostos ao tratamento podem desen- gicos, especialmente para os laringectomizados
volver fibrose e edema, contudo os efeitos gerados totais 3.
na qualidade vocal não são bem compreendidos. Em outro estudo, no qual foi mensurada a alte-
Estes achados evidenciam a necessidade de pes- ração vocal, foi concluído que, dos 15 pacientes
quisa na área e atendimentos fonoaudiológicos a submetidos ao tratamento de radioterapia e quimio-
estes pacientes, protocolando resultados obtidos, terapia para câncer de laringe, 33% (cinco pacien-
sejam por avaliação objetiva ou subjetiva. tes) apresentaram qualidade vocal adequada ou
Os pacientes que tiveram tumores localizados disfonia discreta, 40% (seis pacientes) apresenta-
na região laríngea exibiram mais alterações vocais ram disfonia moderada e 27% (quatro pacientes)
que os pacientes que apresentavam tumores em apresentaram disfonia severa. As medidas vocais
outras regiões da cabeça e pescoço. obtidas foram a análise perceptiva-auditiva e acús-
Em estudo prospectivo, 80% dos pacientes que tica da voz 4.
foram avaliados apresentaram alteração na qua- Sobre qualidade vocal após tratamento radiote-
lidade vocal após 1 ano do tratamento de radio­ rápico para tratamento do tumor glótico inicial, os
terapia 12. resultados do estudo evidenciaram que 11% dos
A inteligibilidade da fala após o tratamento radio- casos tinham vozes normais, 44% tinham disfonias
terápico em cabeça e pescoço é pouco descrita 11, discretas, 27 a 28% disfonia moderada e de 16 a
porém há relato de autores que os resultados após 17% tinham disfonia severa. A forma de avaliação
esta modalidade de tratamento são relativamente foi subjetiva, através da análise auditiva, e a avalia-
bons, ou seja, a inteligibilidade de parte dos pacien- ção objetiva, através da análise acústica da quali-
tes não é alterada 13. dade vocal 12.
Um estudo avaliou as características da voz e Em estudo sobre avaliação vocal e acústica de
do discurso dos pacientes que se submeteram a carcinoma epidermoide de seio piriforme após tera-
diferentes tratamentos para o câncer de laringe pêutica com quimioterapia e radioterapia em que
comparando com indivíduos laríngeos normais. o método foi a aplicação da avaliação vocal, que
Foram avaliados 22 pacientes do sexo masculino, consistiu em uma gravação vocal (vogal susten-
sendo que destes, cinco receberam tratamento tada e texto), análise acústica objetiva (parâmetros

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temporal e de freqüência vocal) e uma avaliação maior o prejuízo nas medidas referidas do índice de
perceptiva auditiva da qualidade da voz por meio desvantagem vocal 19.
da escala de GRBAS 13, os autores identificaram A terapia vocal é um método efetivo para os
que os parâmetros acústicos de instabilidade da pacientes que tinham problemas de voz após o tra-
freqüência fundamental e o tempo máximo de fona- tamento para carcinoma glótico inicial 19 A melhoria
ção eram diferentes quando comparados com indi- foi significativa quando analisados os resultados do
víduos normais. questionário de índice de desvantagem vocal e foi
também confirmada através dos parâmetros vocais
Qualidade de vida em pacientes submetidos a objetivos avaliados.
tratamento oncológico em cabeça e pescoço Pacientes portadores de tumores laríngeos
A importância da qualidade de vida dos pacien- mostraram uma deterioração da qualidade vocal
correlacionado com o IDV expressivamente menor
tes pós-tratamento de câncer de cabeça e pescoço
em estudo recente que analisou medidas objetivas
tem sido um assunto pesquisado por fonoaudiólo-
produzidas pela escala GRBAS associando com a
gos, visto a forte ligação da comunicação e a inte-
avaliação da qualidade de vida por meio do índice
gração social, esta última, às vezes, ausente nestes
de desvantagem vocal (IDV) 13. Com estes acha-
pacientes, em virtude da desfiguração facial. Pes-
dos, os autores concluíram que são interessantes
quisas trazem resultados importantes de alteração
as avaliações da função vocal e da qualidade de
da qualidade de vida de pacientes submetidos a
vida após tratamento de radioterapia e quimiotera-
tratamentos diversos em cabeça e pescoço quando
pia, com objetivo de permitir a análise da conserva-
comparados com a população normal 14.
ção da função vocal e, eventualmente, propor um
A criação e validação do Vocal Handicap Index – acompanhamento fonoterápico.
(VHI) – Índice de Desvantagem Vocal – (IDV)
Em estudo comparativo sobre problemas de
ocorreu em 1997 nos Estados Unidos da América,
voz e qualidade de vida através do índice de des-
traduzido por Behlau et al no Brasil. 15 Este instru-
vantagem vocal (IDV) após radioterapia, cirurgia
mento visa detectar através do questionário quais
endoscópica e laser para carcinoma glótico ini-
são as conseqüências psico-sociais geradas pela
cial, conclui-se que uma porcentagem elevada dos
alteração da qualidade vocal 16 pacientes relatou problemas da voz na vida diária,
O índice de desvantagem vocal é sugerido para sendo que 58% dos pacientes submetidos à radio-
aplicação em pacientes com a finalidade de detec- terapia obtiveram contagens anormais no IDV 20 . A
tar a percepção em relação a sua disfonia, podendo partir destes achados, os autores concluíram que o
ser um instrumento valioso para acompanhamento tratamento para o câncer glótico inicial freqüente-
no tratamento por parte do paciente17. Houve a mente resulta em problemas da voz na vida diária,
tradução para o português deste questionário que influenciando negativamente atividades sociais dos
tem sido usado desde então em alguns serviços pacientes.
no país 16. Em estudo sobre qualidade de vida após o trata-
Em uma instituição no Brasil foi avaliada a qua- mento de carcinoma laríngeo 21, os autores conclu-
lidade de vida a longo prazo de pacientes tratados íram que há piora significativa na qualidade de vida
por câncer de cabeça e pescoço 18. Foi aplicado o dos pacientes tanto entre aqueles que submetem
protocolo da Universidade de Washington devida- ao tratamento cirúrgico, quanto naqueles com indi-
mente traduzido e o prejuízo foi maior na fala dos cação para tratamento radioterapêutico; sendo que
pacientes submetidos a tratamento de tumores de os que foram tratados com radioterapia parecem ter
hipofaringe e laringe. Concluíram que este ques- um maior impacto negativo na qualidade de vida,
tionário é uma ferramenta efetiva para avaliar a quando comparados com os pacientes que fizeram
qualidade de vida após o tratamento do câncer de cirurgia.
cabeça e pescoço. Este estudo valida a importân- A metodologia de avaliação de qualidade de
cia da aplicação dos protocolos de qualidade de vida de pacientes submetidos a tratamento para
vida, visando verificar o índice de prejuízo em que o o câncer de cabeça e pescoço tem amadurecido
paciente se encontra, o encaminhando, assim, para muito nos últimos dez anos e que essa avaliação
a reabilitação vocal adequada. deve ser feita em pacientes tratados a curto e longo
As alterações vocais após o tratamento de radio- prazo. Os pacientes tratados após 18 meses ten-
terapia em 25 pacientes foram estudadas, sendo dem a estabilizarem nas respostas do protocolo de
10 localizados na laringe e 15 em outros sítios qualidade de vida 22.
da cabeça e pescoço. Constatou-se que todas as A necessidade do serviço de Fonoaudiolo-
medidas estavam mais comprometidas no grupo gia é reforçada ao verificar estudo que mensurou
de tumores não laríngeos, bem como foi também através de uma escala de ansiedade e depressão

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aplicada a cônjuges e pacientes tratados para cân- o tratamento e as fragilidades terapêuticas que
cer de cabeça e pescoço 23. Seus resultados indi- comprometem a qualidade vocal e de vida desses
cam um percentual de 20% dos parceiros e de 27% pacientes, devem direcionar esforços que visem
dos pacientes com respostas positivas à escala de contribuir no processo de recuperação minimizando
ansiedade e depressão. A porcentagem de respos- os danos causados pela doença e melhorando a
tas desfavoráveis dos pacientes foi relacionada à condição de saúde do indivíduo.
presença da sonda para alimentação, fala não bem O acompanhamento fonoaudiológico dos
expressiva, contatos sociais menores e um estilo pacientes submetidos ao tratamento, inclusive radio
passivo de lidar com atividades diárias e com as e/ou quimioterápico, é um procedimento importante
emoções. Este mesmo padrão de respostas entre e que deve ter como objetivo minimizar as seqüelas
os cônjuges foi relacionada à presença da sonda presentes que interferem na comunicação oral. As
nasogástrica para alimentação de seus parceiros, avaliações subjetiva e objetiva podem subsidiar o
um estilo de vitalidade menor e mais passivo e tratamento e também o feedback para o paciente
pouca interação às atividades da vida diária. de seu desempenho vocal.
A atuação fonoaudiológica é de suma importân-
São necessários novos estudos que comparem
cia, visto que tanto o tumor de cabeça e pescoço,
a qualidade de vida e voz dos pacientes submetidos
quanto o tratamento afetam aspectos da vida diá-
ao tratamento fonoaudiológico e grupos controles,
ria que resultam na piora da qualidade de vida. O
bem como construção/avaliação de protocolos de
acompanhamento fonoaudiológico na fase pré ou
encaminhamento, intervenção e proservação dos
pós-radioterapia visa à preservação ou readaptação
casos provenientes dos ambulatórios de radio e
das funções comunicativas do indivíduo, o que traz
quimioterapia.
claro impacto na qualidade de vida dos mesmos.

„„ CONCLUSÃO „„ AGRADECIMENTOS

A presente revisão evidenciou várias seqüe- Aos Diretores do Instituto Oncológico de Juiz
las, agudas e crônicas, como rouquidão, odinofa- de Fora, Dr. Narciso Francisco Pazzinato, Dra.
gia e afonia, que envolvem dificuldades na comu- Tereza Cristina Esteve e Dr. Olamir Rossini Júnior.
nicação oral e/ou deglutição dos pacientes após À radioterapeuta Luciana Vignoli e às colegas Cris-
o tratamento radioterápico em cabeça e pescoço. tina Maciel Tostes Vieira, Dra. Elisabete Carrara-de
Essas condições interferem de maneira direta na Angelis e Dra. Sandra Pela. À coordenadora de
qualidade de vida dos pacientes. Os profissionais ensino do Programa de Pós-graduação em Saúde
envolvidos no tratamento desse câncer, dentre eles Brasileira da Universidade Federal de Juiz de Fora,
o fonoaudiólogo, por meio do conhecimento sobre Dra. Darcília Maria Nagen da Costa.

ABSTRACT

Background: radiotherapy for head and neck cancer has been important for disease control, both
as neo-adjuvant and concomitant to chemotherapy. 5-year survival rates after larynx cancer have
increased, justifying the efforts towards rehabilitation of patients` communication and highlighting
the importance of the speech-language pathologist in the radiotherapy team. New scientific and
therapeutic breakthroughs have turned organ preservation into a strong ally in head and neck
cancer treatment. Purpose: to show the speech-language-related sequelae, such as changes in
vocal and life quality, related to treatment for head and neck tumors, especially those arising after
radiotherapy. Conclusion: many acute and chronic sequelae, such as hoarseness, odinophagy and
aphony, involving difficulties in oral communication and/or swallowing in patients after neck and head
radiotherapy treatment, interfering with communication, swallowing, and life quality of patients in a
direct manner. The professionals involved with the treatment of this cancer, with the speech-language
pathologist among them, through the knowledge on the treatment and its therapeutic weaknesses that
jeopardize the vocal quality and life quality of those patients, seek to contribute in the recovery process
in order to minimize damages caused by the disease and improving the individual’s health condition.

Keywords: Radiotherapy; Epidemiology; Voice; Head and Neck Neoplasms; Quality of life

Rev. CEFAC. 2010 Jul-Ago; 12(4):671-677


Qualidade de vida e voz pós-radioterapia  677
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