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UMA GRANDE
ESCOLA
Alternativas de apoio
à democratização da gestão e à
melhoria da educação pública
Texto básico
Elie Ghanem
'.
Revisão
Denise Dognini
Maria Adelina França
Apoio:
Fundação Ford
Unicef - Fundo das Nações Unidas para a Infância
Bibliografia................................................................................................. 155
Você não está só ........................................................................................ 157
Apresentação
Não vamos nos deter aqui na defesa da gestão escolar democrática. Muitas pesquisas,
manifestos e discursos já o fazem, além de a proposta estar consagrada na Constituição e em
outras leis. Este guia é destinado a quem já adota este tipo de orientação. A intenção de
democratizar é uma opção política por certos procedimentos e regras de ação. Quando a
associamos à escola pública, pretendemos que seja um caminho para a melhoria da qualidade
da educação, visando adequá-la às necessidades e aspirações de seus usuários.
O projeto Gestão Escolar Democrática não se limita a este texto. Ele inclui a oferta de
cursos e a prestação de assessoria local em escolas públicas. Trata-se do desdobramento de
atividades já realizadas, especialmente de uma pesquisa composta de três estudos de caso de
democratização da gestão escolar1 (Porto Alegre, Recife e Belo Horizonte). Esta pesquisa
identificou dificuldades e levantou indicações para a redefinição de políticas nesta área. A
maioria dos exemplos citados neste guia foi tomada daquela pesquisa e o texto, estruturado em
torno de suas indicações.
Um terço do atendimento em 1º grau do País se concentra na esfera municipal, e há
uma tendência à municipalização deste grau de ensino. Os órgãos administrativos das cidades
têm contato direto e freqüente com a população usuária dos serviços, entre outros motivos,
porque suas redes escolares são geralmente menores que as estaduais. Além disso, vários
governos municipais já desenvolvem propostas democratizadoras e, em alguns casos, criaram
equipes encarregadas de impulsionar e apoiar esses processos de gestão escolar. Assim, este
manual destina-se, principalmente, ao trabalho em escolas municipais, embora suas
orientações gerais possam ser úteis também em redes escolares estaduais.
1
GHANEM, Elie. Participação popular na gestão escolar: três casos de políticas de democratização. São Paulo,
Revista Brasileira de Educação, n. 3, set./dez.1996, p.31-63.
Potencializar qualificações dos servidores
Por não ser evidente de imediato, fique registrado que a pretensão deste trabalho não
vai além de oferecer um conjunto sistematizado de orientações. Boa parte delas requer a
multiplicação de contatos, negociações, apoio especializado, interação dos órgãos
administrativos das redes escolares com os de outros setores públicos, universidades e centros
de investigação. Outros guias têm finalidade diferente, especificando detalhadamente cada
passo a ser dado e em que momento. Recusamos esse tipo de enfoque pelo simples fato de que
sua rigidez é garantia de sua inutilidade. A visão que nos anima é a da necessidade de
indivíduos e grupos aumentarem sua capacidade de iniciativa e de autodeterminação.
Exatamente o contrário de seguir um "método infalível" e totalmente preconcebido.
DEMOCRATIZAR implica tomar decisões coletivamente para resolver problemas. E a
solução destes começa por um diagnóstico correto.
2
Segundo um autor muito citado, há centenas de "problemas locais (na escola) ou generalizados que contribuem
para atrapalhar o ensino. E tampouco faltam diagnósticos desses problemas." (Castro, 1994:31).
O que é Diagnóstico
Termo de origem grega, utilizado inicialmente pela
medicina. Compreende o conhecimento ou determinação
de uma doença ou problema pelos seus sintomas ou
exames diversos. Seu uso espalhou-se pelas diversas áreas
do conhecimento humano
Indicar genericamente que "os alunos são carentes" não ajuda a resolver problema algum.
EM
VÁRIOS
CASOS, os
diagnósticos
produzidos nas
próprias
unidades
escolares, em
vez de retratar,
costumam justificar uma realidade. Primam pela generalidade da constatação de que os alunos
"são carentes" e fazem parte de uma "comunidade muito pobre". Por vezes relatam a
existência de "problemas com violência”, a "falta de assistência do governo", ou que a escola
"está localizada dentro de uma favela”. De fato, afirmações genéricas como estas contribuem
muito pouco para orientar propostas de ação.
Vale a pena ver o que diz a lei sobre os aspectos mais gerais da educação. Segundo a
Constituição da República (art. 208, parágrafo 3º), "compete ao poder público recensear os
educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou
responsáveis, pela freqüência à escola”. O texto se restringe ao recenseamento no ensino
fundamental (1º grau), mas esta é uma exigência mínima, pois o Estado também é obrigado a
oferecer atendimento a crianças de O a 6 anos em creches e pré-escolas, atendimento
especializado aos portadores de deficiências e atendimento de jovens e adultos que não
tiveram acesso ao ensino fundamental na idade própria.
A mesma Constituição (art. 205) diz ser a educação um direito de todos, dever do
Estado e da família e que será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade. As
informações de recenseamento, então, possibilitam uma noção de quanto o direito está sendo
atendido e quanto o dever está sendo cumprido.
O MEC (Ministério da Educação e do Desporto) passou a realizar o censo escolar
anual a partir de 1996, coletando dados por meio de formulários distribuídos às escolas. São
levantadas informações unicamente sobre quem já está matriculado e não de quem está fora
dos sistemas escolares. O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), por sua vez,
realizou uma operação censitária inovadora, a Contagem da População de 1996, incluindo
quesitos sobre educação que auxiliam na identificação das necessidades de quem não está
freqüentando escolas. Os dados da contagem mostram 2,7 milhões de pessoas entre 7 e 14
anos de idade fora da escola. Já é um bom começo para um diagnóstico geral, mas é um
trabalho que precisa ser detalhado em cada local para ter utilidade prática.
Precisamos de
tipos
diferentes de
diagnósticos
Exames da
realidade
devem orientar
orçamentos,
tipos de
treinamento,
materiais e
possíveis alterações no currículo.
3
Nos centros de pós-graduação das universidades brasileiras, entre 1981 e 1996, foram defendidas 801 teses e
6.134 dissertações sobre educação. Somente em 1996, foram publicados 490 artigos em revistas nacionais
especializadas em educação. A relação destas obras, com resumos, seleção por tema e outras indicações está
disponível no CD-ROM ANPEd, que pode ser adquirido em Ação Educativa.
Não são exigências descabidas. Os professores que estão. cotidianamente face a face
com os problemas de aprendizagem dos alunos das camadas populares precisam ter a mais
elevada qualificação profissional. Aqueles alunos fazem parte justamente dos grupos que
acumulam maiores desvantagens, devido à extraordinária desigualdade social que caracteriza
nosso País. Por questão de coerência, não se pode esperar dos professores que caminhem neste
sentido, sem exigir também dos técnicos uma capacidade profissional de altíssimo nível.
Se os dados e as pesquisas já realizados pelas universidades não forem suficientes para
efetuar os diagnósticos necessários, os órgãos administrativos podem e devem encomendar
pesquisas especiais. A própria Constituição (art. 213, parágrafo 2°) já sugere isso, pois admite
que "as atividades universitárias de pesquisa e extensão poderão receber apoio financeiro do
poder público". Uma das conclusões que se pode extrair deste dispositivo é de que há como
destinar recursos para que os centros universitários desenvolvam linhas de pesquisa sobre
problemas da educação pública em sistemas escolares específicos. Iniciativas de governos
estaduais e municipais nesse sentido precisam se multiplicar, estreitando relações entre centros
universitários e escolas básicas.
OS TÉCNICOS PODEM produzir diagnósticos mais ou menos rigorosos dos
problemas da educação escolar. Apesar de indispensável, isso não basta.
Em primeiro lugar, é preciso divulgar amplamente estas informações, o que exige
estratégias e recursos específicos. Além disso, os problemas identificados pelos técnicos nem
sempre são percebidos nas escolas, ou o são de maneiras diferentes pelos corpos docentes,
pelos diretores, pela população usuária e mesmo por grupos ou indivíduos de cada uma destas
categorias.
O que é considerado problema para uns não o é necessariamente para outros. Até a
maneira de entender o problema varia muito. Assim, sem que se consiga gerar consensos em
torno da definição do que é problema, haverá pequena chance de enfrentá-los contando com o
envolvimento de um número grande de pessoas. Assim, não será possível também apontar
coletivamente os problemas prioritários e se reduzirá a possibilidade de resolvê-los.
O que diz "a comunidade"?
Somente num sentido muito amplo, a área escolar poderia ser considerada uma
comunidade.
Há alunos que simplesmente não vêem qualquer sentido nas atividades e condutas que são
obrigados a seguir.
AS PESSOAS QUE convivem na área escolar dificilmente têm uma visão de conjunto
sobre o que pensa cada grupo que a compõe. Alguns professores, por exemplo, ao verem os
alunos dispersas e desatentos, acreditam ser necessário tornar as aulas mais atraentes. Outros,
pensam tratar-se de uma "falta de interesse" decorrente da omissão da família em estimular os
alunos a realizar as tarefas escolares.
Há alunos que simplesmente não vêem qualquer sentido nas atividades e condutas a
que são obrigados, mas se conformam em segui-las. Outros reagem e questionam,
principalmente fazendo bagunça, que é sempre uma atividade mais divertida. Geralmente os
mais velhos, eventualmente participantes de grêmios estudantis, começam a elaborar um
discurso para explicar estes fatos, a partir do qual atacam certos professores ou procuram um
diálogo.
As mães de alunos se dividem quanto a apoiar incondicionalmente os professores.
Algumas manifestam a vontade de que se mantenha rigidamente certo padrão de disciplina.
Outras concordam com a idéia, mas não têm tempo nem oportunidade de expressar seu ponto
de vista. Outras ainda não têm a mínima noção do que se passa, tanto por não terem sido
informadas, quanto por considerarem a vida escolar como pertencente a um mundo totalmente
separado, sobre o qual não lhes cabe influir, devendo restringir-se às responsabilidades
próprias da educação no âmbito doméstico.
O detalhamento evita a generalização vazia
É preciso evitar análises superficiais como as que dizem: “os alunos vão mal na escola
porque a comunidade é carente".
4
Uma demonstração do reconhecimento de que faltam informações sobre as expectativas da população quanto à
escola foi a realização da pesquisa Educação, trabalho e pobreza em Pernambuco, que procurou ouvir tanto os
familiares dos alunos quanto os servidores das escolas, bem como indivíduos que participam de outras
organizações e líderes comunitários (ver Pereira et al, 1996).
Qualquer que seja a resposta àquela pergunta, ela estará relacionada com os juízos que
as famílias fazem da escola. Estes também variam. Para algumas famílias, as professoras "é
que mandam" na unidade escolar, ou a diretora "é dona da escola" e faz "o que bem entende",
cabendo aos pais e alunos simplesmente acatar suas decisões. Há as que julgam que os pais
não se importam com a vida escolar dos filhos, ou que apenas cobram os resultados finais
(notas). Estas suposições sobre o que pensam os pais têm algum fundamento, mas são fruto de
uma observação aleatória e não controlada, que não supera o nível da mera opinião. Ou do
palpite.
Mesmo os resultados da maior parte das pesquisas ainda estão baseados em estudos de
casos específicos, não podendo levar a conclusões definitivas em relação a realidades mais
abrangentes que aqueles casos estudados. Tais trabalhos sugerem, de modo ainda pouco
seguro, que muitos pais se interessam pelo desempenho escolar dos filhos, sendo que um
número maior se interessa pelos resultados finais e uma menor quantidade se dispõe a
envolver-se na gestão da escola.
Quem é quem na escola?
5
Sugestivos a este respeito são os dados do Censo Demográfico de 1991, segundo os quais, os chefes de família
sem instrução ou com até três anos de estudo somam 15.089.027 pessoas, ou seja, 43,4% dos 34.734.715 chefes
de família do País.
6
Relatório de abrangência nacional elaborado pelo MEC mostra que de cada 100 alunos que ingressam no ensino
de 1º grau só 33 concluem a 8ª série e que para cada concluinte foi necessário investir 18,7 anos-matrícula,
quando o esperado seriam 8 (MEC, 1995:158).
As tentativas de implementação de políticas democratizadoras da gestão escolar, por
parte do poder público, não chegaram a completar 15 anos. Como ocorre com políticas
públicas em geral, e especialmente as educacionais, estas experiências sofreram interrupções
com as mudanças dos grupos governantes. Essas práticas não se tornaram padrões de Estado
para a estruturação dos serviços educacionais, mantendo-se apenas como orientações de
governos.
Muitas daquelas tentativas democratizadoras não foram acompanhadas por
procedimentos de avaliação, de modo que não há elementos disponíveis para obter conclusões
definitivas sobre seus processos e resultados. Algumas delas foram objeto de pesquisas que
procuraram abordar o terna da participação na escola 7. Mas estes estudos se concentraram
quase exclusivamente nos problemas enfrentados para realizá-la ou na denúncia de que as
propostas participacionistas dos governos não são mais que retóricas enganadoras. Quanto aos
resultados, geralmente são descritos de maneira muito vaga, o que é compreensível dada a
grande dificuldade metodológica de isolarem-se os processos de gestão dentre os múltiplos
fatores que influem nos serviços escolares.
7
Pode-se ter uma idéia da produção intelectual sobre este tema, entre 1982 e 1995, consultando: GHANEM, Elie
(org). Participação popular na gestão escolar: bibliografia. São Paulo: Ação Educativa, 1995, 143 p.
A população começou a se expressar
A maior virtude das políticas democratizadoras foi abrir as unidades escolares às demandas
de sua população usuária.
"O Conselho Escolar será composto paritariamente por representantes de todo segmento da
escola".
A lei de Recife é inovadora por permitir que sejam eleitos conselheiros representantes "da
comunidade", sejam pais de alunos ou não.
A EXPERIÊNCIA democratizadora nas escolas estaduais de Minas Gerais foi uma das
mais difundidas. Lá o conselho é conhecido como colegiado escolar e também tem caráter
deliberativo. Em sua composição, 50% são representantes de servidores (incluindo o diretor) e
50% representantes de pais e alunos. A data da eleição, fixada no primeiro mês letivo do ano,
cria dificuldades para os que acabam de chegar. Mas um dispositivo obriga que a eleição seja
precedida de assembléia geral, na qual os candidatos se apresentam e onde são aprovadas as
normas eleitorais.
Leis sobre a escolha do diretor
Processo combinando concurso com eleição garante capacidade profissional do diretor com
uma legitimidade mais ampla.
A falta de verbas tornou comuns as práticas de arrecadação de recursos para despesas que
deveriam ser cobertas pelo poder público.
A escola é composta de pessoas diferentes, que têm opiniões diferentes e até opostas.
Uma generalização típica é se falar em “a comunidade”, definindo-a como daquilo que não
é a escola".
É preciso encontrar formas de incluir a unidade escolar nas decisões sobre o repasse de
recursos.
A
DESCENTRA
LIZAÇÃO
financeira
permite que
sejam feitas
sugestões de
investimentos e
solicitações de
verbas para as
necessidades
específicas da
unidade
escolar, como o
cumprimento
do calendário
escolar, o
treinamento de
professores, a
compra de materiais ou a contratação de serviços. A maior autonomia da escola e o
aperfeiçoamento da atuação do conselho devem reforçar-se mutuamente. Desta forma, pode-se
superar planos puramente formais, que - mesmo quando diagnosticam e hierarquizam
problemas adequadamente, propondo ações para enfrentá-los - não incluem o orçamento, parte
indispensável de qualquer plano exeqüível.
Durante longo tempo, os meios criados para a participação consistiram em
instrumentos de colaboração financeira ou material e em medidas de assistência a alunos
carentes. A principal forma jurídica adotada foi a APM (Associação de Pais e Mestres). A
anterior Lei de Diretrizes e Bases para o Ensino de 1° e 2° Graus (Lei n° 5.692/71, art. 62)
chegou a tornar obrigatória essa forma de associação, congregando "professores e pais de
alunos com o objetivo de colaborar para o eficiente funcionamento" das escolas por meio de
serviços de assistência educacional que compreendem "auxílios para aquisição de material
escolar, transporte, vestuário, alimentação, tratamento médico e dentário e outras formas de
assistência familiar". Pesquisas indicaram que, frente ao caráter de fonte arrecadadora de
recursos e trabalho, os pais reagiram à APM com a simples ausência.
Contratação e gestão de pessoal
A população costuma formar uma idéia da qualidade da escola apenas por seus aspectos
mais aparentes.
É preciso questionar por que se ensinam certas coisas, de determinadas maneiras e não
outras.
A escolha de diretores por eleição favorece a prática destes realizarem consultas antes de
tomarem decisões.
EXISTE TENSÃO na gestão escolar por ela não ser urna relação entre iguais, ou seja,
pelo fato de os servidores exercerem poder sobre os usuários. A democratização da gestão na
unidade escolar significa basicamente conferir poder a quem não o tem: os níveis inferiores da
hierarquia da escola (alunos e funcionários de apoio) e os que estão fora da hierarquia (pais e
outros moradores da área escolar). Em outras palavras, tem poder quem decide. A gestão
será democrática se criar condições para que mais pessoas decidam.
Como já foi dito, decisões muito importantes não são tornadas no âmbito da unidade
escolar, corno aquelas sobre gestão financeira e de pessoal. Mas também há decisões muito
importantes que são tornadas nas escolas, quase sempre por diretores e professores, sem
envolver alunos e pais.
Entre elas estão a composição das turmas; as atividades em sala de aula; os
instrumentos de avaliação de aprendizagem (provas, redações ou pesquisas) e as formas de
manter a disciplina dos alunos. Decisões sobre o calendário e o uso do tempo (horários) são
também importantes, pois há professores de algumas turmas que dão urna aula de 45 minutos
por semana e praticamente não convivem com seus alunos, sequer os conhecem pelos nomes e
dificilmente podem realizar um trabalho educativo satisfatório.
Divers
os estudos
sobre gestão
escolar
observaram
que servidores
com alguma
formação
pedagógica
(diretores,
supervisares,
coordenadores
ou
orientadores
pedagógicos e
professores)
assumem
posições
aparentemente
contraditórias
frente às famílias dos alunos. Reivindicam, ao mesmo tempo, que os pais assumam maior
responsabilidade na tarefa de educar e que não interfiram no ensino, terreno que preservam
como domínio exclusivo de sua competência.
Junto a essas duas reivindicações, alguns assinalam que os pais dos alunos são pobres e
ignorantes, apresentando um "baixo nível cultural". Em um caso, o argumento é manifestado
como queixa e, no outro, usado como justificativa. Contudo, tais reivindicações também já
foram observadas em escolas onde o nível socioeconômico e de instrução dos pais é
notadamente elevado.
Divisão de funções
O senso comum diz que caberia aos pais preparar os filhos para a escola e ponto.
OS DIREITOS QUE ESTÃO em jogo para os alunos são seus direitos individuais,
sejam passivos ("receber" uma educação, ser tratados com respeito, não ser objeto de castigos
físicos etc.) ou ativos (expressar-se livremente, tomar parte nas decisões que afetam sua vida
presente e futura, escolher sua educação a partir de um certo momento etc.). Os direitos dos
pais estão ligados à sua posição de autoridade no núcleo familiar (escolher a educação dos
filhos, zelar por seu bem-estar etc.) e à proteção social (receber, ou que seus filhos recebam, o
que eles pagam com impostos). Para os professores, estão em jogo direitos trabalhistas
(horários, carga de trabalho etc.) e profissionais (autonomia em seu processo de trabalho,
controle do acesso à profissão, auto-suficiência na avaliação de seu rendimento etc.).
Os professores contam com o poder de decidir o que e como os alunos devem aprender
e, sobretudo, avaliar seu rendimento, com as conseqüências para seu futuro escolar,
profissional e social. É um poder direto sobre os alunos e indireto sobre os pais (quando estes
fazem seus os interesses dos filhos), Os pais contam com o poder doméstico sobre os alunos,
que é inofensivo para os professores. Os filhos carecem de qualquer poder. Além disto, a
coesão dos pais inexiste, Estão dispersas, alheios à escola e preocupados individualmente com
seus filhos, formando mais um agregado que um grupo.
Presença enfraquecida
O desejo dos professores seria que os pais tivessem um papel totalmente passivo.
Sendo um serviço público, o papel dos professores seria de colocar seu saber a serviço de
objetivos fixados pela sociedade.
O APOIO DOS TÉCNICOS para evitar distorções significa que estes devem procurar
garantir que os conselheiros escolares, como representantes de seus segmentos, julguem os
balanços financeiros em lugar de fazer a contabilidade. Escolham materiais e serviços em vez
de terem o trabalho de levantar preços, fazer compras e contratações. Julguem os padrões de
limpeza da escola em vez de varrer ou recolher o lixo. Apontem necessidades de verbas no
lugar de fornecê-las diretamente, pois já se pagam impostos (e muitos impostos) e as festas e
outras iniciativas extra-curriculares não podem deixar de ser oportunidades de relacionamento
agradavelmente descontraído, de integração pela simpatia e amizade, para tornarem-se
prioritariamente meios de obter dinheiro.
Uma coisa é decidir sobre as maneiras como devem ser tratados os alunos, outra é
cuidar deles nos horários de entrada e saída, supervisioná-los no pátio durante os intervalos
das aulas, assumir o encargo da distribuição da merenda etc.
Gerir democraticamente a escola é participar de decisões, emitir orientações.
Executar o trabalho cabe apenas aos servidores da escola. Portanto, para que a população
usuária aprecie certos assuntos e decida sobre eles, como o trabalho de instrução (aulas e
tarefas pertinentes), cabe perguntar quais informações e meios de informação os técnicos
põem à sua disposição. Os pais são convidados a assistir às aulas? Sabem o que se
planejou e programou? Sabem com que finalidades? Sabem o que se atingiu com o que
foi planejado? Que oportunidades eles têm para opinar, elogiar ou rejeitar? Que
recursos têm para publicar suas opiniões em boletins ou murais impressos, ou usar os
serviços postais? Fique claro que esta participação não pretende "ensinar o pai-nosso ao
vigário", substituir os profissionais, mas fornecer as orientações para que seu trabalho
responda a necessidades e expectativas.
Justificativas claras
PELO
QUE FOI DITO
anteriormente, é
preciso que, na
unidade escolar,
sejam tomados
certos tipos de
decisões que têm
sido
prerrogativas dos
órgãos centrais. Mas também estas decisões necessitam de justificativas claras para que sejam
asseguradas por estes órgãos (no papel de garantidores dos direitos estabelecidos nas leis), e
serem facilmente conhecidas pela população usuária, de forma que ela possa avaliar se os
órgãos centrais cumprem suas funções e a unidade escolar também.
Decisões sobre recursos financeiros estão ligadas a decisões sobre gestão de pessoal.
Para tomá-las, é preciso combinar critérios técnicos com outros que podem ser chamados
Critérios de legitimidade. Se há necessidade de selecionar, recrutar, avaliar e estimular
pessoal, o conselho escolar precisa de elementos para fazer isto e decidir. Como avaliar
professores? Muitas medidas podem e devem ser articuladas. A observação direta de seu
trabalho em sala de aula, vários tipos de informação da equipe diretiva, a leitura das propostas
de trabalho, a análise do material didático adotado e das tarefas realizadas por alunos, a
conversa ou entrevista com alunos e seus pais, a verificação da pontualidade e assiduidade dos
professores são algumas das diversas iniciativas possíveis.
É preciso que os representantes representem bem
É raro que lideranças comunitárias façam da educação objeto de luta coletiva, salvo
quando se reivindica abertura de vagas, cursos noturnos, segurança e outras melhorias
materiais.
8
GHANEM, Elie. Lutas populares, gestão e qualidade da escola pública (1992).
Alguns indícios levam a crer que, onde há organização e mobilização prévia na área
escolar, o conselho se viabiliza mais rapidamente. Mas nem sempre é assim. Em Recife, uma
conselheira, eleita pelo "segmento comunidade", apoiada pela associação de moradores, diz o
seguinte: "A associação entra com a função de indicar o candidato e não de dar palpite. Depois
que o candidato é eleito, a associação não tem mais nada a ver com a escola".
Os técnicos têm de criar modos de viabilizar a informação para cada segmento, a fim
de aperfeiçoar a elaboração das pautas das reuniões do conselho escolar e subsidiar as
discussões. No mesmo sentido, é preciso produzir oportunidades de discussão das pautas e
subsídios em cada segmento, de maneira que os representantes estejam munidos de dados e
argumentos, reelaborados a partir da visão do setor que representam. Reuniões por segmento,
ou de conselheiros por segmento, separadamente, podem ser necessárias para que haja
desenvoltura e não se retraiam quando os pais estiverem reunidos com professores e alunos.
Distribuir materiais impressos para associações locais e fazer reuniões amplas para
discuti-los, recorrendo à divulgação por meios de maior alcance como o rádio e a televisão,
são providências tão importantes quanto esquecidas.
Todos precisam conhecer os custos
Quanto uma escola gasta com energia elétrica e água? Quanto custam os salários dos seus
servidores? A merenda? Os materiais didáticos?
“Não convivendo ali com a escola, você a imagina de um jeito, a tendência é só tacar o pau.
À medida que você vai se entrosando, você já vê a escola de outra maneira”.
Faltam dados precisos aos conselheiros sobre as condições de vida, trabalho e expectativas
das famílias sobre as funções da escola.
RECIFE
ELABORAÇÃO DO REGIMENTO INTERNO DO CONSELHO ESCOLAR
PROPOSTA
(...)
I - DENOMINAÇÃO
II - COMPETÊNCIAS
Enumerar as competências decorrentes das atribuições definidas pela lei,
explicitando-as melhor ou acrescentando outras em função da realidade escolar, sem
ultrapassar os poderes atribuídos.
III - COMPOSIÇÃO
Estrutura organizacional, atribuições dos coordenadores, secretárias. Composição,
forma de indicação dos membros das comissões, duração do mandato. Possibilidade de
escolha de uma Comissão Diretora para acompanhar mais de perto o dia-a-dia da escola.
IV - ORGANIZAÇÃO
Freqüência e local das sessões. Prazo e forma de convocação das sessões
extraordinárias. Forma e prazo para justificar ausência. Convocação do suplente. Registro
das presenças em livros. Registro de deliberações em ata e forma de divulgação.
Critérios para participantes suplentes, convidados ou requerentes nas sessões. Direito
à voz. Papel dos coordenadores. Quem coordena a sessão? Voto de Minerva em caso de
empate nas votações. No caso de existir Comissão Diretora, em que casos pode deliberar ad
referendum do pleno Conselho. Possibilidade de recursos das decisões do Conselho Escolar
apresentados ao Conselho Municipal.
V-DlREITOS E DEVERES DOS CONSELHEIROS
DEVERES
a) Comparecer às reuniões.
b) Justificar com antecedência o não comparecimento, para que se possa convocar o
conselheiro suplente.
c) Divulgar as decisões do conselho.
d) Assumir todas as decisões das assembléias mesmo que seu voto tenha sido vencido.
e) Fazer articulação com seu segmento.
DIREITOS
a) Pedir informações gerais sobre a escola.
b) Requerer assessoria para esclarecimento sobre temas a respeito dos quais tenham
de decidir.
c) Fazer a fiscalização do cumprimento do que foi decidido nas reuniões do conselho.
d) Acompanhar e avaliar o rendimento pedagógico da escola.
VI - PENALIDADES
Cada conselho deve, segundo a sua vivência, definir as penalidades para seus
conselheiros, bem como para docentes, discentes e pessoal de apoio, de acordo com: Estatuto
do Funcionalismo, Regimento da escola, Estatuto da Criança e do Adolescente e as
constituições.
(...)
VII - RELATÓRIOS ANUAIS DA ESCOLA
Acesso aos relatórios setoriais. Registro das estatísticas. Cobrança das prestações de
contas. Períodos. Metodologia. Prazos. Simplificação dos dados para ampla divulgação. (...)
Assegurar a estabilidade das equipes docentes
Quantas pessoas de cada categoria votam nas eleições dos conselheiros ou dos diretores e
em que consistem as plataformas eleitorais?
O projeto Constituinte Escolar, em Porto Alegre, permitiu uma mobilização ampla para
debater publicamente a reorientação da escola municipal.
Plano decenal de Novo Hamburgo tem como princípios básicos a garantia da manutenção
da qualidade dos serviços e a expansão da rede escolar.
“Eu só venho na escola para trazer meu filho. Um dia, falaram: `Você vai ter de vir
amanhã para votar´. Não liguei. Para mim, tanto faz, votei para quem estava mais do meu
conhecimento”.
Nesse
processo,
novas relações
são criadas e,
portanto, os
papéis dos
usuários e dos
servidores são redefinidos. Um grande risco é confundi-los, substituindo as funções de uns
pelas dos outros. Não se propõe que alunos e seus familiares assumam as funções dos
professores e especialistas em educação, mas que estes desenvolvam crescentemente a sua
capacidade profissional.
Profissionais melhores
AS
CHAMADAS
reuniões
pedagógicas,
rotineiramente
incluídas nos
calendários
escolares,
poderiam ser
importantes
momentos de
formação em
serviço. Elas
costumam ser tão raras quanto pouco proveitosas. Dificilmente levam à produção de propostas
comuns pactuadas entre os professores e, quando isso se consegue, não são criados meios de
mantê-los informados sobre o andamento do trabalho dos colegas. A elaboração do plano de
cada escola pode contemplar essas dificuldades, dentre outras maneiras, prevendo a
organização de grupos periódicos de estudos entre professores.
Tratar desses problemas significa fazer diagnósticos e investimentos. Os técnicos
poderiam questionar o percentual da folha de pagamento gasto com capacitação ou
aperfeiçoamento de pessoal. Obtida a informação, ela precisa ser difundida e discutida,
democraticamente.
Há alternativas viáveis
Em Carazinho (RS), concede-se, por lei, um auxílio financeiro para os professores que
queiram fazer cursos de complementação.
Este guia procurou chamar a atenção para pontos fundamentais a serem observados na
implementação de políticas democratizadoras. Cada um deles constitui um desafio à
sagacidade e à dedicação das equipes técnicas dos sistemas escolares públicos.
ESTE GUIA ESTÁ sendo distribuído para que chegue a diversos departamentos ou
secretarias de Educação, municipais e estaduais. Foi elaborado para ser utilizado pelas equipes
técnicas desses órgãos públicos. Ação Educativa gostaria de saber como você o utilizou, para
que outros também saibam e possam aprender com a sua experiência.
Por isso, é muito importante que você e os outros leitores nos enviem respondidas, até
31/ 5/ 98, as perguntas abaixo (o endereço para correspondência está na pág. 159). Vamos
resumir as respostas e preparar um informe, que também será distribuído aos diversos órgãos
públicos que receberam o guia.
1. Nome
3. Cargo/função
11. Que partes deste guia você e/ou sua equipe consideram mais úteis? Por quê?
12. Que partes deste guia você e/ou sua equipe consideram menos úteis? Por quê?
Gestão escolar democrática