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SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM RURAL

ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DO ESTADO DE SÃO PAULO

Programa Empresário Rural

módulo 2

A Economia
e Políticas Econômicas

“O SENAR-AR/SP está permanentemente


empenhado no aprimoramento profissional e
na promoção social, destacando-se a saúde
do produtor e do trabalhador rural.”
Fábio Meirelles
Presidente do Sistema FAESP-SENAR-AR/SP
FEDERAÇÃO DA AGRICULTURA E PECUÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Gestão 2008-2012

Fábio de Salles Meirelles


Presidente

AMAURI ELIAS XAVIER JOSÉ EDUARDO COSCRATO LELIS


Vice-Presidente Diretor 2º Secretário

EDUARDO DE MESQUITA ARGEMIRO LEITE FILHO


Vice-Presidente Diretor 3º Secretário

JOSÉ CANDÊO LUIZ SUTTI


Vice-Presidente Diretor 1º Tesoureiro

MAURÍCIO LIMA VERDE GUIMARÃES IRINEU DE ANDRADE MONTEIRO


Vice-Presidente Diretor 2º Tesoureiro

LENY PEREIRA SANT’ANNA ANGELO MUNHOZ BENKO


Diretor 1º Secretário Diretor 3º Tesoureiro

SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM RURAL


Administração Regional do Estado de São Paulo
Conselho Administrativo

Fábio de Salles Meirelles


Presidente

DANIEL KLÜPPEL CARRARA EDUARDO DE MESQUITA


Representante da Administração Central Representante do Segmento das Classes Produtoras

BRAZ AGOSTINHO ALBERTINI AMAURI ELIAS XAVIER


Presidente da FETAESP Representante do Segmento das Classes Produtoras

Mário Antonio de Moraes Biral


Superintendente

Sérgio Perrone Ribeiro


Coordenador Geral Administrativo e Técnico
SERVIÇO NACIONAL DE APRENDIZAGEM RURAL
ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DO ESTADO DE SÃO PAULO

empresário rural

módulo 2

A Economia e
Políticas Econômicas

São Paulo - 2009


IDEALIZAÇÃO
Fábio de Salles Meirelles
Presidente do Sistema FAESP-SENAR-AR/SP

COORDENAÇÃO
Jair Kaczinski
Chefe da Divisão Técnica do SENAR-AR/SP

AUTOR
Geraldo Sant’Ana de Camargo Barros
Professor Titular e Coordenador do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) da
ESALQ/USP, gsbarro@esalq.usp.br

DIAGRAMAÇÃO
Thais Junqueira Franco
Diagramadora do SENAR-AR/SP

Direitos Autorais: é proibida a reprodução total ou


parcial desta cartilha, e por qualquer processo, sem a
expressa e prévia autorização do SENAR-AR/SP.
Material impresso no SENAR-AR/SP

 Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo


1. De onde viemos? Para onde vamos?

Nas raízes dos grandes problemas do Brasil está um grande desafio econômico. Temos estado
nas últimas décadas às voltas com as questões de crescer e, ao mesmo tempo, distribuir
os frutos de crescimento para toda a população. Na verdade, não temos nem crescido nem
cuidado satisfatoriamente de muitos brasileiros que continuam sobrevivendo em níveis não
aceitáveis de pobreza. Comecemos por entender que essas questões vinculam-se com o
processo político que influencia muito o desempenho do País em termos de desenvolvimento
econômico e social. Para isso vamos rever um pouco da história econômica recente do
País.

Com a passagem do regime militar para o democrático nos anos 1980, o País volta sua
atenção para a contenção do processo inflacionário, bem como a retomada do crescimento
econômico, que havia perdido seu fôlego. Como havíamos chegado a tal ponto?

A partir da era Vargas, começa-se a aplicar no Brasil uma estratégia de industrialização


através da substituição de importações, que se baseava em começar a produzir internamente
aquilo que estava sendo importado. Como primeiro passo, tratava-se de passar a produzir
no Brasil os bens de consumo duráveis (como refrigeradores e automóveis). A seguir viriam
os bens de capital (máquinas e equipamentos, veículos) e por fim os insumos intermediários
(petroquímica, siderurgia e energia). Esse processo culmina no final dos anos 1970.

Instrumentos de política setorial e macroeconômica foram acionados para alcançar os


objetivos pretendidos. Por um lado, controlavam-se os preços de uma cesta de alimentos e,
assim, indiretamente as pressões salariais dos trabalhadores urbanos sobre o setor industrial
que se criava. De outro, sobrevalorizava-se o câmbio para facilitar a importação daquilo que
se julgava necessário para a industrialização e usava-se a política comercial para proteger
da concorrência externa os bens que passavam a ser produzidos no País.

O mercado internacional de capitais, antes fundado essencialmente em outros países e


organizações oficiais internacionais, passou nos anos 1970 a basear-se no sistema financeiro
internacional privado. Ao contrário do anterior, este sistema caracterizava-se por ser de curto
prazo e taxas de juros flutuantes, as quais passariam a crescer na administração Reagan
nos EUA gerando recessão em escala mundial. Como o processo de industrialização se dava
sob a égide do Estado, as dívidas crescentes pesavam sobre esse setor. Ainda na década
de 1970 verificam-se as duas primeiras crises do petróleo, insumo importado do qual o Brasil
era altamente dependente. Com isso multiplicavam-se os problemas da dívida externa. Ao
final dos anos 1970, ficou clara a necessidade de conter o processo de crescimento para
reduzir as necessidades de importação e de capital externo. O País precisava delinear nova

 Durante essa fase do processo de industrialização brasileira, o Estado interferiu fortemente na economia agrícola.
Alguns setores contavam com organismos próprios que cuidavam de preços, estoques, financiamento, etc. Incluem-
se aí o Instituto Brasileiro do Café (IBC), o Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) e outros. Alimentos considerados
importantes tiveram preços tabelados por longos períodos. O preço do leite, por exemplo, só foi liberado no início
dos anos 1990, após mais de 40 anos de controle.
 Câmbio sobrevalorizado significa que a moeda estrangeira (dólar, por exemplo) está artificialmente barata pela
atuação do Banco Central. O dólar barato favorece a importação à custa de prejudicar a exportação, ou seja,
o exportador recebe menos reais por dólar do que deveria se o mercado estivesse funcionando livremente. Ao
mesmo tempo, o importador paga menos reais por dólar do que deveria ao realizar suas compras no exterior. É
como se houvesse um imposto pago pelos exportadores que era transferido aos importadores. Esse imposto recaiu
pesadamente sobre a agricultura, que predominava nas exportações brasileiras (café, por exemplo). Não é incorreto
dizer, assim, que a agricultura ajudou a financiar a industrialização brasileira através da política cambial e também
do controle de preços dos alimentos.

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agenda estratégica que permitisse reverter esse quadro desfavorável. Novos objetivos e
meios para alcançá-los precisavam ser definidos.

Os últimos 20 anos de nossa história contêm uma rica ilustração de como nossa sociedade
vem se debatendo em busca de objetivos que foram se consolidando ao longo do tempo,
atingindo atualmente níveis quase consensuais. Após os duros anos do regime de exceção
conduzido pelos militares, inicia-se, em meados dos anos 1980, um processo de mudanças
que vão se realizando numa seqüência aparentemente aleatória, nem sempre numa direção
clara e lógica, às vezes num padrão pendular, nem sempre consistente, que acabaram nos
levando até os dias atuais.

Não creio que tenhamos vivido um período sob o signo de Macunaíma, herói de Mário de
Andrade, cuja lógica era a falta de lógica, uma contradição em si mesmo, cujo caráter que
demonstra um dia desfaz-se no outro. Para perceber a consistência lógica desse período,
costumo ter em conta que vivemos um processo de mudanças caracterizado por quatro
objetivos principais. Um deles visava ao aperfeiçoamento da ordem democrática, precondição
essencial para que qualquer sociedade alcance a plenitude de seu desenvolvimento. O
outro buscava o controle da inflação, viabilizando a criação de uma moeda estável, pedra
fundamental para construção de um sistema econômico eficiente e justo socialmente falando.
O terceiro pretendia restaurar os padrões históricos de crescimento econômico (e, portanto,
da renda e do emprego). O quarto almejava romper com os nossos padrões históricos de
pobreza e concentração de renda.

O marco inicial no sentido da busca pela democracia foi a campanha pelas eleições diretas
para presidente, que se frustrou, como sabemos. Não houve eleições diretas e Tancredo,
eleito indiretamente, faleceu às vésperas da sua posse. O Plano Cruzado e os demais dos
anos 1980, visando ao controle da inflação, falharam por falta de coerência econômica:
desindexação via controle de preços - a própria negação do mercado - e descontrole
fiscal.

Há que se ressaltar, porém, os importantes avanços havidos nessa época. Pois deles foram
a unificação orçamentária e a nítida separação das atribuições do Tesouro Nacional e do
Banco Central, representando as primeiras medidas para um efetivo controle dos recursos
públicos, condição essencial para combate a inflação. Faltava descobrir a fórmula brasileira
para a desindexação. Além disso, os sucessivos fracassos no combate à inflação não
permitiam avanços no sentido dos dois outros vetores: a inflação, por um lado, desestimulava
os investimentos impedindo o crescimento econômico e, por outro, concentrava - em vez de
distribuir - a renda por representar pesado imposto de natureza fortemente regressiva.

A eleição direta para presidente ocorre finalmente em 1989. Envolto em questões de


corrupção, todavia, o primeiro presidente eleito diretamente após o regime militar foi afastado
através de impeachment. Em que pese o custo social que acarretou, tratou-se de experiência
que contribuiu para o fortalecimento das instituições democráticas brasileiras. Fez-se, nessa
 Desindexação é a eliminação dos contratos em que os preços, salários, aluguéis, câmbio são reajustados
automaticamente por indicadores da taxa passada de inflação. São exemplos de indexação a vinculação de contratos
aos valores da ORTN (Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional, já extinta), ao IGP (Índice Geral de Preços),
ao dólar, etc.
 Até 1986, o Brasil possuía 2 orçamentos, nenhum dos quais representando a realidade das nossas finanças.
O Orçamento Fiscal não incluía uma gama de despesas que eram financiadas por emissão monetária que, em
parte, apareciam no Orçamento Monetário. O Banco do Brasil, agente arrecadador e pagador do governo federal,
mantinha uma conta-corrente com o Banco Central - a chamada “Conta Movimento” - que lhe transferia recursos
à medida das necessidades.
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época, nova investida contra a inflação, a qual se frustra novamente por, de novo, negligenciar
a importância do mercado e também por erros crassos de condução da política monetária
para controle da inflação.

É nessa época que o Brasil começa a entrar propriamente no processo de globalização,


que tantos debates tem motivado. Tem havido um amplo espectro de posturas em relação à
globalização, dos radicalmente contra aos radicalmente favoráveis. São posturas ideológicas
opostas e fortemente enraizadas. Como quase sempre, a atitude recomendável situa-se
entre os extremos. Os radicalmente contrários à globalização parecem ignorar que a mesma
se trata de fenômeno inexorável e potencialmente benéfico para todas as nações. São
posições conservadoras, ou reacionárias, que lembram o Velho do Restelo, personagem
de Camões, que, em “Os Lusíadas”, procurava demover os navegadores da aventura que
buscavam. Lá fora muitos eram os inimigos que poderiam ser encontrados e grandes seriam
os riscos de perdas materiais e humanas. Aqueles radicalmente favoráveis, por outro lado,
estão, na maioria dos casos, apegados também a posições ideológicas opostas. Conforme
demonstra Joseph Stiglitz, que recebeu o Prêmio Nobel de Economia em 2001, elas ignoram
as contribuições mais recentes da Teoria Econômica sobre falhas de mercado: ou seja, o
mercado, embora fundamental, não é infalível: pode não ser eficiente, pode prejudicar grande
parte da população, principalmente a mais pobre. A regulamentação é essencial nos casos
em que tais falhas ocorrem. A abertura econômica brasileira acabou sendo feita de forma
brusca, alguns dirão precipitada, outros a avaliarão como a única eficaz e outros ainda a
classificarão como lenta e tímida. De qualquer maneira, não se pode deixar de enfatizar o
papel fundamental desempenhado pela abertura econômica para sucesso do Plano Real
em 1994. A abertura econômica teve grande importância no Plano Real ao permitir que
se importasse qualquer produto ou insumo cuja oferta doméstica caísse. Um engenhoso
sistema de desindexação - criando antes a URV e depois o Real - dispensou a intervenção
nos mercados.

Além da abertura, o Plano Real contava, à falta de uma reforma fiscal consistente, com
fortíssimo controle monetário resultando em altíssimas taxas de juros. Os juros tão altos
rapidamente produziram imensa sobrevalorização da nova moeda. Moeda forte e economia
aberta e financeiramente rapidamente levaram a uma enxurrada de importações e déficits
externos gigantescos, sustentados pela entrada de capitais predominantemente para as
privatizações e aquisições de empresas ou de curto prazo, especulativos. O que viria adiante,
 O Plano Collor, ao seqüestrar os recursos financeiros da população, ignorou que o que causa a inflação é a
taxa de crescimento da moeda e não o tamanho de seu estoque. Este foi reduzido pelo seqüestro, mas passou a ser
aumentado rapidamente pouco tempo depois, contribuindo para o reaparecimento da inflação logo em seguida.
 A abertura econômica iniciada no governo Collor teve continuidade no governo Itamar e Fernando Henrique.
Com ela foram reduzidas ou eliminadas muitas tarifas e outras barreiras à importação e exportação. Com isso
aumentou a disponibilidade de produtos no país, ajudando a controlar a inflação no Plano Real.
 É praticamente consensual atualmente que o componente-chave do Plano Real foi a estratégia de desindexação
adotada, que prescindia do controle de preços, preservando, assim, as funções do mercado. A criação temporária
de uma moeda sem função de troca, a URV, calculada quase em tempo real, a que os vários setores iam-se atrelando
voluntariamente com o tempo, substituiu o tabelamento ou congelamento de preços dos outros Planos. O que se
tinha era uma nova moeda indexada (URV) a uma outra moeda ainda em uso (Cruzeiro). Quando grande parte dos
produtos e serviços passou a ser precificada em URV, havia-se alcançado o mais elevado grau de indexação possível
no sistema de preços cotados na antiga moeda e tornava-se possível dar à nova moeda - na qual os preços não
eram indexados inter-temporalmente - também a função de troca. Bastou, então, mudar o nome da URV para Real
e estava completado o processo de desindexação pretendido.
 Logo após o Plano Real, a taxa de câmbio foi deixada a flutuar por algum tempo, valorizando-se muito por causa
dos juros altos que atraiam capitais externos para o Brasil. Para suavizar a valorização, mudou-se o sistema cambial
já em 1995: o real passou a ser desvalorizado em relação ao dólar de acordo com a inflação, ou seja, voltava-se
a uma indexação, que perdurou até janeiro de 1999.
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porém, provaria que não eram de todo injustificadas algumas das preocupações como as
inspiradas pelo Velho do Restelo.

A taxa de inflação baixou rapidamente e a moeda forte com certeza ajudou muito na eleição
e na reeleição do próximo presidente, ambas em primeiro turno. Segue-se um período de
relativa normalidade política, mas de intensas e seguidas turbulências externas. Nossa
economia continuava frágil, pois, devido à falta da reforma fiscal, a sustentabilidade de nossa
dívida pública ficava cada vez mais questionável. Caímos no círculo vicioso em que as altas
taxas de juros aumentam cada vez mais a dívida e a dívida alta só se financia com juros cada
vez mais elevados. Não havia, assim, a opção de adotar uma política monetária mais suave
para, através dela, reduzir os juros. Duas foram as principais implicações da queda nessa
armadilha. Por um lado, os juros altos afastavam do horizonte a possibilidade de crescimento
da economia. Por outro, a fragilidade da economia expunha o Brasil ao contágio das crises
financeiras que se sucediam: México, Ásia, Rússia, Argentina. Novamente juros altos eram
o único instrumento de defesa disponível para o País conter a fuga de divisas.

A crise que atingiu o Brasil em 1998 não deixou saída ao País que não fosse a mudança
no regime de câmbio administrado. O novo regime - de câmbio flexível - implantou-se com
forte desvalorização em 1999. Em 2002 nova desvalorização ocorre, agora sob a influência
do processo eleitoral. Após certo tempo de ajustamento, houve uma inversão nas nossas
contas internacionais, com expressivo crescimento das exportações, primeiro, puxadas pelo
agronegócio e, depois, se estendendo também ao setor industrial.

Dois aspectos dos eventos recentes chamam a atenção. Em primeiro lugar, destaca-se a
forma impressionantemente madura como a alternância de poder ocorreu. Embora a disputa
eleitoral tenha sido renhida - explicando em boa parte a enorme instabilidade econômica
que o País atravessou em 2002 e 2003 - as instituições foram preservadas e o processo
democrático ficou ainda mais fortalecido. Em segundo lugar, para surpresa de todos ou quase
todos, o novo governo adotou a responsabilidade fiscal e monetária como parte da rotina da
administração pública. O Brasil terá dado importante demonstração de amadurecimento se
tal responsabilidade for adotada com firmeza independentemente da ideologia das forças
que detenham o poder. Nesse aspecto - a seriedade no trato da coisa pública - parece
prevalecer uma convergência entre as tendências políticas mais relevantes. Evidentemente
ainda não é o caso de afastarmos as preocupações, pois credibilidade só se constrói com
o passar do tempo.

Reformas há tanto tempo necessárias - como a previdenciária e fiscal - que, ao melhorarem


as contas públicas, reduzam o crescimento da dívida pública, viabilizando a queda dos juros,
e abram o caminho para o crescimento da economia e do emprego que vem sendo adiado
há mais de 20 anos, ainda aguardam o dia em que serão realizadas com a intensidade
necessária

A administração do presidente Lula pretendia aprofundar os programas sociais ainda que


no curto prazo tenham caráter meramente assistencial. Não se observam ainda resultados
palpáveis do Programa Fome Zero e seus sucedâneos. As dificuldades de concepção e
de implementação de programas ambiciosos num país continental como o Brasil parecem
 O governo Lula tem procurado realizar a unificação dos diversos programas de transferência de renda à
população pobre. Os programas que visavam a grupos específicos - mas muitas vezes superpostos - ,como a criança
pré-escolar, alunos que recebem merenda escolar e/ou a bolsa-escola, as mães nutrizes, etc., deverão compor um
programa único, o Bolsa Família, que eliminaria, por intermédio de um cadastro nacional, as duplicidades e as
exclusões. Tal reorganização, porém, está se mostrando muito mais difícil do que o esperado, prejudicando o

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ter superado em muito as expectativas de seus criadores. No longo prazo, o aumento dos
investimentos em capital humano - educação e saúde - e em geração de tecnologia é que
poderão assegurar o desenvolvimento equilibrado do Brasil.

Para isso, vai ser preciso desenvolver o que se chama hoje de capital social, essa rede
de cooperação e confiança entre as pessoas que faz com que elas compreendam a
interdependência que existe entre o bem-estar de umas e outras. Haverá muito trabalho
para romper algumas marcas estruturais da sociedade brasileira. A propósito, bem típica
é a atitude de Brás Cubas, a personagem de Machado de Assis, que, após ter sua vida
salva por um humilde almocreve (que é como ele chama o condutor de bestas de carga),
decide recompensá-lo à altura. Primeiro, pensa remunerá-lo com três moedas de ouro; mas,
pensando melhor, conclui que o pobre diabo - que, na verdade, não passara de simples
instrumento da Providência Divina - poderia contentar-se com menos: duas moedas, ou menos
ainda: uma moeda de ouro. Acaba lhe dando apenas uma moeda - de prata. Brás Cubas
não se dá conta de que reduzindo a recompensa ao almocreve estava de fato diminuindo
o valor que atribuía a sua própria vida. Se quisermos, portanto, viver melhor é fundamental
que aqueles de quem nosso bem-estar depende sejam valorizados realmente à altura. Ou
seja, para melhorar a distribuição da riqueza nacional, não basta crescer economicamente;
é essencial que desenvolvamos nosso capital social ao invés de contarmos apenas com o
esforço do governo.

Em síntese, um inventário da evolução do Brasil nos últimos 20 anos em termos do processo


de mudanças indicado anteriormente indica alguns avanços significativos e alguns fracassos
igualmente importantes. Como fracasso aparece a falta de crescimento a taxas que permitam
melhorar significativamente o nível de vida do brasileiro médio: o que se houve foi uma
troca de inflação muito alta por juros muito altos, ambos dificultando, cada qual a sua
maneira, o crescimento econômico. Outro fracasso importante é a não consecução de uma
distribuição de renda, permanecendo um largo contingente de brasileiros vivendo na pobreza.
Como sucessos podem ser registrados, por um lado, o controle da inflação e o avanço na
consolidação do regime democrático baseado no fortalecimento e independência dos três
poderes da república. Acredito, porém, que estes dois sucessos poderão servir de base de
sustentação para as mudanças necessárias para a realização das duas outras metas ainda
não alcançadas.

2. A Gênese das Políticas

Desde a obra seminal de Adam Smith - A Riqueza das Nações - de 1776 ficou claro como
se dava o funcionamento dos mercados em situação de concorrência, isto é, em que nenhum
agente pudesse individualmente influenciar o preço que pagava pelos insumos que usasse
ou o preço pelo qual vendesse sua produção. Smith mostrou que, nessas condições, as
empresas em conjunto produziriam as quantidades desejadas pela sociedade, vendendo-as
a preços correspondentes aos custos incorridos na produção. Ou seja, não haveria lucro puro
na economia10. Essa performance maximizaria o bem-estar da sociedade. Nada justificaria a
intervenção do governo no direcionamento daquilo que as empresas ou indivíduos deveriam
funcionamento e o alcance das metas dos programas anteriores.
10 As empresas de certo setor ganham lucro puro quando a taxa de retorno sobre seu capital excede a taxa de retorno
médio que se pode obter nos demais setores da economia. Havendo concorrência, esse elevado retorno tende a cair
porque novas empresas entrarão no mercado, aumentando a produção, aumentando o custo e reduzindo o preço,
e, portanto, o lucro obtido. Ou seja, lucro puro só ocorreria por um curto período de tempo.

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fazer: cada indivíduo, ao agir de acordo com seus próprios interesses, estaria contribuindo
para que a sociedade atingisse seu máximo bem-estar.

Smith também chamou a atenção para situações em que não há concorrência, ou seja, uma
firma pode afetar o preço de compra ou venda. Nesses casos, prevalecem o monopólio (um
só empresa vendedora), monopsônio (uma só empresa compradora), oligopólio (poucas
grandes empresas vendedoras) e oligopsônio (poucas grandes empresas compradoras).
Nessas situações, é necessário impedir que exerçam o poder de mercado com prejuízo para
a sociedade: quando não há concorrência, a produção é menor e o preço é maior11. O controle
do poder desses grupos tem sido feita pela regulação pelo setor público através normas de
conduta quanto a preços, propaganda, e, em outros casos, forçando o desmembramento da
empresa em outras menores12. Em muitos casos, quem viabiliza a presença de empresas não
concorrenciais é o próprio governo, que concede direito exclusivos de exploração de certos
mercados, ou, como é comum, criam barreiras à competição com empresas estrangeiras de
quem o País poderia importar produtos mais baratos. Quotas e tarifas de importação criam
mercados cativos que podem ser explorados por empresas já instaladas no País. O que
levaria o governo a tomar medidas que podem prejudicar a sociedade que o elegeu?

George Stigler, em sua grande obra de 1971, Teoria da Regulação Econômica, propõe que
os políticos, quando no governo, tendem a maximizar o suporte político para a reeleição,
levando em conta tanto o benefício recebido por grupos de interesse resultante da tomada
de certas medidas e o custo que essas medidas acarretam para a sociedade como um todo.
É claro que o que conta é o peso que o governo dá a cada um desses itens: é perfeitamente
possível, como todos sabemos, que um real de benefício a um grupo de interesse valha mais
- para os políticos - que um real de custo para a sociedade como um todo.

Grossman e Helpman em 1994 propuseram uma análise mais ousada dessas questões num
artigo intitulado Vende-se Proteção13. Partem da seguinte observação: “Quando questionados
por quê o livre comércio é tão freqüentemente pregado e tão raramente praticado, os
economistas culpam a “política”. Nas democracias representativas, os governos desenham
as políticas em resposta não somente às preocupações do eleitorado em geral, mas às
pressões dos grupos de interesse”.

Essa argumentação vale tanto para as questões domésticas como nas negociações
internacionais. Por exemplo, o governo, em geral, socorre com relativa facilidade um
determinado setor que está em dificuldades garantindo preços e financiando investimentos,
mesmo que o consumidor venha a pagar um preço mais alto pelo bem ou serviço que
ele produz. Recentemente o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES) esteve envolvido na polêmica se deveria ou não desempenhar o papel de hospital
(emprestando recursos a taxas subsidiadas) de empresas que não estavam conseguindo
sobreviver às condições de mercado.

11 É interessante que Adam Smith, muitas vezes tomado como um pregador do livre mercado, sem considerar os
desvios desse sistema, nos lembra que “pessoas do mesmo ramo de negócio raramente se reúnem, nem mesmo
para se divertir, mas quando o fazem é para conspirar contra o público em geral”.
12 No Ministério da Justiça há a Secretaria de Direito Econômico (SAE) que elabora política para a concorrência
e a defesa do consumidor. Há também o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) que zela pela
concorrência e decide sobre ocorrência de infrações. No Ministério da Fazenda há a Secretaria de Acompanhamento
Econômico (SEAE) que procede às análises das operações de aquisições sob o ponto de vista das conseqüências da
concentração.
13 Grossman, G., E. Helpman. 1994. “Protection for Sale”, American Economic Review. 84(4):835-50.

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Num contexto internacional, basta olhar para as negociações comerciais entre países ou
blocos econômicos: os Estados Unidos pregam o livre comércio por onde passam, mas são
duríssimos quando se trata de reduzir as barreiras que impõem às importações. Lembra-
se facilmente dos casos do suco de laranja, do açúcar, do aço e tantos outros, que têm
dificultado a formação da Aliança de Livre Comércio das Américas (ALCA). Quando mantêm
tais barreiras comerciais, os países estão comprovando a tese desses autores: os benefícios
aos grupos de interesse que ganham mercado cativo e preços mais altos são considerados
mais importantes que os custos que os consumidores (os eleitores em geral) estão pagando
por essas medidas.

Grossman e Helpman ilustram suas análises considerando as contribuições para campanhas


como medidas dos interesses dos grupos organizados em conseguir que determinadas
medidas sejam tomadas para benefício próprio. Não é necessário seguir tal trilha de
considerações para reconhecer o papel fundamental que tais grupos desempenham durante
o processo eleitoral. É muito comum e considerada normal a Via Sacra dos candidatos a
prefeito, governador e presidente da república às instituições representativas dos muitos
grupos de interesse existentes. Deixemos à imaginação de cada um os acordos firmados
durante esses encontros.

Várias observações devem ser feitas a respeito do que foi dito até aqui sobre o processo
de geração das políticas. Em primeiro lugar, não adianta tentar “tapar o sol com a peneira”.
Grupos de interesse organizados existem e fazem parte do sistema democrático. O pior que
se faz é ignorar ou ocultar sua ação, ou seja, devemos institucionalizar o lobby - a prática de
atuar legalmente para convencer deputados e senadores, além de autoridades do executivo,
para aprovarem ou implementarem determinadas medidas - como acontece nos Estados
Unidos, por exemplo.

Em segundo lugar, devemos perceber que, se o governo tende a atender o interesse de


grupos organizados14, resta aos demais segmentos da sociedade organizar-se também
para formarem blocos com capacidade de arregimentar volume significativo de votos para
negociar com os políticos.

Em terceiro lugar, não é o caso de sermos tão pessimistas ao ponto de acreditarmos que
os políticos atendem somente aos interesses de grupos organizados. Lembra-se que eles
levam em consideração os interesses da sociedade, em geral com um peso menor do que
o eleitorado desejaria. E esse peso pode crescer ainda que em circunstâncias de extrema
gravidade. Nesse ponto, é agradável lembrar do progresso feito no Brasil no sentido de
combater a inflação ao custo de antipáticas taxas de juros e contra o interesse de muitos
sócios da inflação. A redução da inflação - e, o mais difícil, sua manutenção em níveis
baixos - beneficiou a grande maioria dos brasileiros pobres, que não tinham como proteger
seus baixos salários e escassas economias da corrosão provocada pela inflação. Quando,
no começo dos 1990, a economia foi aberta, derrubaram barreiras que protegiam grandes
e poderosos grupos de interesse. Quando aceitaram submeter-se aos ditames da Lei de
Responsabilidade Fiscal, os políticos estavam reduzindo tremendamente os instrumentos
com que contavam para atender a grupos de interesse na expectativa de poder reduzir os

14 Volta e meia, o governo toma a iniciativa de criar as chamadas câmaras setoriais. Existe controvérsia quanto
aos objetivos e à operacionalização dessas câmaras. Será que representam formas de se obter maior eficiência
de determinado setor ou serão mecanismos para que grupos de interesse obtenham privilégios do setor público?
Será que nelas estão representados todos os agentes do setor (trabalhadores, agricultores de vários tamanhos,
cooperativas, indústria, etc. e, mais importante, o consumidor)?

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juros e a exposição do Brasil ao contágio das crises internacionais. São medidas que foram
contra grupos organizados, tomadas quando não eram mais suportáveis - tal o clamor social
- os custos sociais da inflação e a insegurança de tantas crises e frustrações enfrentadas
pelo cidadão.

Em quarto lugar, é preciso reconhecer que mais recentemente vem crescendo no setor
empresarial o que se convencionou chamar de responsabilidade social. Trata-se daquilo que
foi ilustrado por Machado de Assis com seu personagem Brás Cubas. A tendência atual é as
empresas terem entre seus objetivos não somente o incremento contínuo de sua rentabilidade,
mas também de alguma forma contribuir para reduzir as mazelas sociais que em maior ou
menor grau acompanham tanto o processo de crescimento econômico, como a estagnação e
o subdesenvolvimento. E no Brasil é grande o grau em que essas mazelas ocorrem: a fome,
a desnutrição, o analfabetismo, a violência, a falta de infraestrutura sanitária, as doenças
crônicas, as agressões ambientais, as contaminações com produtos tóxicos, entre outros,
são problemas tão sérios que não podem ser deixados unicamente para a administração
pública e ao processo político. As empresas e a sociedade organizada, cada vez em maior
grau, arregaçam as mangas e chamam a si a responsabilidade para com o alívio desses
distúrbios. É comum, por isso, ver grupos empresariais, organizados ou não em torno de
instituições não-governamentais, apoiarem ou promoverem iniciativas de levado conteúdo
social. E, muitas vezes, valem-se de sua influência junto aos políticos para que se criem ou
sejam apressadas medidas necessárias para controlar as mazelas da sociedade.

Por último, vale lembrar que nem sempre os interesses dos grupos organizados se
contrapõem aos interesses da sociedade como um todo. O caso típico é o do apoio buscado
continuamente pelos agricultores para que sejam providos recursos para pesquisa, tecnologia
e extensão, além de sustentação de preços e renda. A agricultura é um setor que funciona
muito próximo daquilo que Adam Smith vislumbrava como a concorrência pura. Nenhum
agricultor ou pecuarista consegue controlar os preços que recebem pelos seus produtos
ou que pagam pelos seus insumos. Em geral e em média, os produtores agrícolas não
ganham lucros puros, apenas a rentabilidade média da economia, mesmo assim de forma
extremamente instável: “anos bons” intercalam-se com “anos ruins”15. Além disso, num País
como o Brasil é fundamental que o suprimento de alimentos, fibras, biomassas em geral
cresça continuamente para dar mais acesso a população de baixa renda. Esse suprimento
precisa estar também em contínuo crescimento para gerar as divisas estrangeiras que o País
precisa para pagar sua dívida externa e importar bens e serviços de que necessita. Ou seja,
é preciso produzir para uso interno e externo e para isso é preciso ser competitivo: (a) ser
capaz de oferecer produtos de qualidade melhor ou tão boa quanto aos dos concorrentes
externos para o bem-estar dos consumidores brasileiros e estrangeiros, (b) ser capaz de
vender a preços menores ou comparáveis aos dos concorrentes estrangeiros. Para viabilizar
tais metas, os agricultores precisam valer-se das mais modernas tecnologias, que reduzam
custos, não agridam o ambiente e não prejudiquem a saúde dos trabalhadores rurais. Ou
seja, é necessário fazer investimentos contínuos em ciência e tecnologia. Mas os agricultores
não possuem os recursos nem para começar tais investimentos e, se os tivessem, não teriam

15 Na agricultura tende a persistir o que ficou conhecido em teoria econômica como o “Teorema da Teia de
Aranha”: num ano em que a safra de um produto é pequena os preços sobem e a renda dos que conseguiram
produzir aumenta bastante. Isso induz muitos produtores a aumentar a produção para o ano seguinte quando
- se não houver problemas climáticos - se verifica grande safra e baixos preços. Em geral a queda de preços é
percentualmente maior do que o aumento de produção e a renda dos produtores cai ao invés de aumentar. Daí a
necessidade de apoio do governo regulando a estocagem. Outra saída é liberar a exportação e importação dos
produtos.

12 Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo


como manter o fluxo ininterrupto de aplicações. A razão disso está em que os agricultores,
por operarem num mercado concorrencial, não controlam os preços (ao contrário dos
monopolistas e oligopolistas). Então, quando adotam nova tecnologia, que aumenta a
produtividade e reduz o custo, os preços de mercado caem e a renda dos produtores pode
até cair16. Na agricultura, a queda de custos leva a automática queda de preços e, assim, o
produtor não lucra com a adoção da nova tecnologia. Na verdade, a adoção da tecnologia é
questão de sobrevivência: um produtor que não a adote terá prejuízo, porque os preços terão
caído por força da maior produção daqueles que a adotaram. Nesse cenário, é essencial
que os investimentos em ciência e tecnologia agrícola sejam financiados pela sociedade
como um todo. Que retorno a sociedade receberá por esses investimentos? Produtos de
origem agrícola mais baratos e/ou mais divisas para o País. Bem ou mal, tais investimentos
têm sido feitos nas universidades e instituições de pesquisa e, por isso, o agronegócio tem
contemplado o Brasil, com renda, emprego, alimento barato e dólares, muitos dólares.

Tendo em conta essas considerações, parece claro que, quando os agricultores pleiteiam
apoio do governo para pesquisas e para estabilizar preços, não estão buscando favores
especiais, mas, sim, apontando para alternativas de investimentos altamente rentáveis social
e economicamente.

3. Políticas Macroeconômicas

Políticas macroeconômicas são aquelas que visam a objetivos amplos da economia como
um todo. Têm que ver com indicadores de bem-estar da sociedade ligados ao crescimento
econômico, ao desemprego, à inflação, ao balanço de pagamentos. Ao estabelecer as
metas para tais indicadores, o governo reage ao sentimento que percebe da sociedade e
aos grupos de interesse organizados na sociedade. Essas metas também dependem (bem
como os meios para alcançá-las) de componentes ideológicos das autoridades. Tomemos,
como exemplo, o caso da inflação.

Durante muito tempo no Brasil, as autoridades julgavam que a inflação não era um mal
que valesse o sacrifício necessário para domá-la. Aliás, a inflação foi muito usada como
forma cômoda de custear as despesas do governo17. Combater a inflação tiraria do governo
essa fonte de recurso e prejudicaria aqueles setores que com freqüência ganhavam com
a inflação: como não há remuneração nos depósitos à vista, os bancos obtêm de graça
recursos que emprestam a taxas positivas de juros. Foi o clamor da sociedade que levou
os governos a partir de 1985 a buscar soluções para reduzir a inflação, pois até então o que
as autoridades ofereciam eram formas de se conviver com a inflação, como a indexação
de contratos (correção monetária), que se aplicavam para os salários, prestações da casa
própria, depósitos a prazo, etc., etc. O coroamento do processo de reconhecimento da
16 Setores que têm poder de mercado têm condições de fazer pesquisa e gerar tecnologia por que podem evitar que
seus preços caiam levando a prejuízos. Para isso, contam com o instituto da patente que veda a outras empresas o
uso daquela tecnologia por um longo período de tempo, mantendo restrita a produção com a nova tecnologia.
17 A fonte primária de recursos para o governo são os impostos; a outra é emprestar dinheiro no mercado pela
colocação de títulos públicos - Letras do Tesouro Nacional (LTN), por exemplo. Porém, para acionar essas duas
fontes o governo precisa de autorização prévia do Congresso. A terceira fonte é obter dinheiro do Banco Central, é
a chamada emissão monetária. Para acioná-la, não é preciso autorização do Congresso. É claro que o custo desses
recursos recai sobre o cidadão na forma de maior inflação. Em geral, quanto mais pobre, mais prejudicado pela
inflação é o cidadão por não ter acesso às aplicações financeiras que paguem a correção monetária que evite a
desvalorização de seu dinheiro.

Serviço Nacional de Aprendizagem Rural Administração Regional do Estado de São Paulo 13


gravidade da inflação se deu quando ao Banco Central atribuiu-se a função precípua de
manter a inflação nos eixos através do Programa de Metas de Inflação18.

Consideremos a questão dos investimentos públicos. Desde a época de Getúlio Vargas,


pelo menos, predominou o ponto de vista de que o governo deveria encabeçar as iniciativas
de investimento, seja por razões ideológicas seja porque não havia outros investidores
brasileiros ou estrangeiros. Estes, por sinal, não queriam sequer manter seu capital investido
anteriormente, o que resultava ou gerava uma onda de estatizações, caso típico da Light,
na área de energia elétrica. Com isso, criaram-se no País muitas empresas estatais, das
quais a Petrobrás é a mais emblemática. Juscelino foi o presidente que abriu as portas
para o investimento estrangeiro, com a implantação da indústria automobilística no Brasil,
fortemente estimulada por incentivos fiscais e tarifas protetoras. Posteriormente, a disposição
dos estrangeiros em investir no Brasil caiu novamente o que, juntando-se ao viés nacionalista
dos militares, levou à nova onda de criação de empresas estatais nos anos 1970. Aqui
os recursos vinham de financiamentos externos obtidos pelo governo. Quando a dívida
externa - agravada pelas crises do petróleo - conduziu a moratórias e à falência prática do
setor público, essa estratégia foi forçosamente interrompida. Após as moratórias, o Brasil
passou a representar um risco excessivamente alto para os investidores estrangeiros. Como
conseqüência, não havia mais recursos de nenhuma natureza para manter os investimentos
em níveis necessários para o País crescer. Na verdade, passamos a década de 1990
desfazendo-nos das estatais criadas nas décadas passadas, muitas das quais foram às
mãos de grupos estrangeiros, não só para recuperar a capacidade de investimentos que
essas empresas demandavam, como para obter o caixa necessário para fazer face às dívidas
interna e externa do setor público e liberar recursos para aplicações em outros programas,
como saúde, educação, previdência, etc.

Assim que eleito, um novo governo trata de compor seu quadro administrativo, a começar
pelo Ministro da Fazenda, que cuidará das finanças públicas. Em conjunto com o Ministro
do Planejamento e o Presidente do Banco Central, procurará definir os meios necessários
para cumprir as visões, metas e objetivos traçados durante a campanha eleitoral. No curto
prazo estará a questão de cuidar que os gastos - custeio, investimento e serviços (principal
e juros) da dívida - caibam dentro das previsões de arrecadação e de colocação de novos
títulos da dívida pública. A realização dessa empreitada está condicionada às preocupações
gerais da sociedade com dois parâmetros básicos: a taxa de inflação e o nível de desemprego.
Em muitos casos os gastos e receitas precisam ser revistos à luz de possíveis avanços não
desejados sobre esses parâmetros: uma ameaça de alta na inflação ou no desemprego ou em
ambos. Trata-se de dois males, que a sociedade abomina e os governos procuram evitar para
que a avaliação de seu desempenho não fique prejudicada. Em geral, inflação e desemprego
atuam em campos opostos: menos inflação quase sempre leva a mais desemprego e vice-
versa. Como conseqüência, as autoridades econômicas dificilmente conseguem atender ao
duplo anseio da sociedade: menos inflação e menos desemprego. O que determina em que
direção a economia vai caminhar é a evolução do déficit público: em que medida o governo
gasta mais do que arrecada, ou, o que é mesma coisa, em que medida sua administração está
resultando em maior déficit público. Um déficit público maior tende a estimular a economia
- reduzindo o desemprego - porém tende a aumentar a inflação. O déficit tende a ser coberto
de duas maneiras: colocando mais títulos no mercado (aumentando a dívida pública) ou
18 Pelo Programa de Metas, o Banco Central passa a ser cobrado pela manutenção da inflação dentro de limites
predefinidos bem estreitos, ignorando em grande medida possíveis impactos negativos sobre o desemprego. Para
atingir a meta, o Banco altera a taxa de juros básica da economia, a chamada SELIC, sigla para o Serviço de
Liquidação e Custódia de títulos públicos.

14 Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo


emitindo mais dinheiro (aumentando a inflação) via Banco Central19.

Para que o PIB20 da economia não fique oscilando em demasia, o governo procura compensar
a atuação do setor privado. Pode aumentar seus gastos quando as famílias reduzem seu
consumo ou as empresas cortam seus investimentos. Resultado parecido é obtido pelo
controle da taxa de juros - quando os juros estão mais baixos, as famílias gastam mais e
as empresas ficam propensas a investir mais. Gastar mais ou reduzir os impostos, por um
lado, e reduzir os juros, por outro, são duas formas de estimular e economia e reduzir o
desemprego. No primeiro caso, tem-se a política fiscal; no segundo, a política monetária.

Através da política monetária, o Banco Central busca afetar a taxa de juros. Para isso compra
e vende títulos do Tesouro Nacional, como as Letras do Tesouro Nacional (LTN) ou as Letras
Financeiras do Tesouro (LFT). As LTN têm remuneração pré-fixada, enquanto as das LFT
são pós-fixadas, com base na SELIC21.

A taxa SELIC é definida como meta pelo Comitê de Política Monetária (COPOM) e é
aplicada no mercado interbancário - onde são tomadas e dadas em empréstimo (por um dia
- overnight) as reservas dos bancos - lastreado em LFT. O Banco Central supre a falta ou
retira o excesso de reservas do conjunto dos bancos de sorte a que a taxa permaneça, em
média, no nível desejado. Essa mesma taxa remunera as LFT em geral da dívida pública;
logo quando essa taxa é elevada os serviços da dívida aumentam - ou seja, o governo vai
gastar mais com juros.

Além da política monetária, as autoridades econômicas podem recorrer à política fiscal, que
tem como instrumentos os gastos e receitas (arrecadação de impostos) a cargo do Tesouro
Nacional. Quando aumenta os gastos, o governo estimula a economia e reduz o desemprego;
quando aumenta os impostos faz o contrário. Um aumento nos impostos diretos (sobre a
renda, por exemplo) diminui a renda disponível das famílias que, assim, passam a consumir
menos. Um aumento no outro tipo de imposto - o indireto - eleva os custos de produção e
os preços, inibindo, portanto, as vendas e o emprego. Entre os impostos indiretos estão o
Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o Imposto sobre Circulação de Mercadorias
e Serviços (ICMS), etc.

Essas duas políticas - monetária e fiscal - não são independentes entre si. Como já foi dito,
a política fiscal pode levar a um déficit fiscal, que implica na colocação de novos títulos
públicos. Esta, como regra, eleva os juros, o que pode forçar a atuação do Banco Central.
Isso decorre do Programa de Metas de Inflação, adotado no Brasil desde 1999. Conselho
Monetário Nacional estabelece uma certa taxa de inflação a ser alcançada em determinado
período de tempo. O COPOM então vai fixando taxas de juros que induzam o alcance dessa
meta. Assim quando o Tesouro coloca títulos e eleva os juros, o Banco Central recomprará
19 A emissão de moeda pelo Banco Central dá-se pela compra de títulos do governo nas mãos dos agentes de
mercado no processo de controle da taxa de juros. Em geral novas colocações de títulos tendem a elevar os juros,
forçando o Banco Central a recomprar parte dos títulos recém-colocados para que os juros voltem para dentro das
metas.
20 O Produto Interno Bruto é o valor de todos os bens e serviços produzidos num ano, por exemplo, e que se
destinam ao consumo, ao investimento ou às exportações.
21 As LTN possuem um valor de face (ex.: $1000) que será pago ao portador no vencimento, do título (ex.: após
um ano)e são compradas pelo mercado com deságio, a um preço menor (ex.: $900). Com isso fica conhecido, no
momento da compra, seu rendimento: (1000-900)/900 = 11,11% ao ano. As LFT terão rendimento que dependerá
dos valores da taxa SELIC (Sistema Especial de Liquidação e Custódia) a serem fixados mensalmente pelo Conselho
Monetário Nacional como metas para o Banco Central; nesse caso, o aplicador receberá o valor de face ($1000)
mais os rendimentos (r) devidos no período: 1000(1+r).

Serviço Nacional de Aprendizagem Rural Administração Regional do Estado de São Paulo 15


parte desses títulos a fim de trazer os juros para o nível estabelecido pelo COPOM. Desse
modo, o déficit acaba sendo coberto tanto com títulos novos como com dinheiro novo.

Toda vez, na verdade, que o COPOM baixa os juros, o Banco Central precisa injetar dinheiro
novo na economia. Como a taxa SELIC é reduzida, o Banco Central deve fazer retirada de
títulos no mercado interbancário, elevando as reservas monetárias. Isso só pode ser feito
se houver espaço para alguma elevação da taxa de inflação, que provavelmente vai ocorrer
por causa do estímulo que a economia vai experimentar com a queda dos juros.

Uma terceira política macroeconômica interage com as duas até aqui mencionadas. É a
política cambial. A taxa de câmbio é o valor pelo qual a moeda nacional (o real) é trocada
pelas moedas estrangeiras. Por exemplo, num determinado momento, um dólar vale R$2,50
e um euro, R$2,80. Se o dólar passar a R$2,30, então o real ter-se-à se valorizado ou o
dólar desvalorizado. Chama-se mercado cambial àquele em que participam exportadores
e investidores estrangeiros (como ofertantes de moeda estrangeira) e importadores e
investidores brasileiros no exterior (como compradores). Como se estabelece a taxa de
câmbio? Há dois regimes cambiais básicos: o fixo (ou administrado) e o flexível (ou flutuante).
No primeiro, o Banco Central controla o mercado, vendendo dólar quando há escassez dessa
moeda e comprando quando há excesso. Com isso, uma taxa preestabelecida é mantida.
No regime flexível, que predomina no mundo atual - e no Brasil foi instituído em 1999 - , o
Banco Central quase não atua no mercado cambial. Oferta e demanda determinam a taxa
de equilíbrio.

Se o país começa a exportar muito (mais do que importa), há ingresso de moeda estrangeira,
e sua taxa de câmbio tende a se valorizar se o câmbio for flexível, como hoje no Brasil.
Com isso, aos poucos as exportações começam a ficar mais caras do ponto de vista dos
compradores em outros países. Por isso, as exportações passarão a cair depois de algum
tempo. E a moeda deixará de se valorizar. É difícil que um país mantenha um saldo comercial
(exportações menos importações) elevado por muito tempo. Isso porque sua moeda começa
a se valorizar, com o que as exportações ficam mais caras e as importações mais baratas.
Por essa razão alguns países - como a China - não adotam o câmbio flexível, pois almejam
continuar crescendo por longo tempo através das exportações. Trata-se de estratégia que leva
ao crescimento com grande sacrifício da sociedade: grande parcela do que é produzido vai
para o exterior e os bens ficam caros para a população nacional. Além disso, como a moeda
está muito desvalorizada, os produtos importados também ficam caros. Não é, portanto,
indutora de desenvolvimento, que implica melhoria do bem estar da população.

A taxa de câmbio também sofre os efeitos das taxas de juros domésticas e de outros países.
No mercado internacional de capitais, os agentes procuram países para investir considerando
os juros que estão pagando e o grau de risco que representam. Países que têm história de
maus pagadores são vistos como mais arriscados e, para receberem investimentos externos,
têm de oferecer maiores taxa de juros do que outros. O Brasil já teve problemas para
manter-se em dia com credores externos e, por isso, é visto com ressalvas no mercado de
capitais. De qualquer forma, sempre que eleva os juros, o Brasil passa a atrair mais capital
estrangeiro do que antes. A maior entrada desses capitais atua no sentido de valorizar o real.
Esta valorização tende a prejudicar as exportações e a favorecer as importações. Percebe-
se, pois, que o efeito da política monetária sobre a atividade econômica fica potencializado
sob câmbio flexível: um aumento nos juros não só inibe o consumo e o investimento como
inibe também as exportações. Este último efeito não ocorre com câmbio administrado.

16 Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo


Hoje se sabe que os governos devem conduzir as três políticas macroeconômicas com
harmonia. Se as contas fiscais forem mantidas em relativo equilíbrio, o déficit é mantido sob
controle e os juros não se alteram com freqüência. Logo, não há perturbações importantes
no mercado cambial.

4. Políticas Agrícolas

O agronegócio tem colaborado de forma significativa para a contenção da inflação, o


crescimento econômico, a distribuição da renda nacional a favor dos mais pobres e a geração
de divisas para financiar importações de outros setores e pagamento da dívida externa.
Isso tem sido possível graças ao uso de tecnologia e de práticas gerenciais modernas
que resultaram em reduções substanciais nos custos, melhorando o acesso da população
a alimentos e incrementando a competitividade da nossa agropecuária nos mercados
internacionais.

Porém, duas linhas de preocupação em relação ao agronegócio brasileiro acham-se


na ordem do dia. Como usufruir plenamente das nossas potencialidades no comércio
internacional em que os países mais ricos lançam mão de toda sorte de expedientes para
proteger sua agricultura às expensas de nossa agricultura? O que fazer com os milhões
de produtores que deixaram a agricultura nos últimos 20 anos, excluídos que foram do
processo de modernização, e como evitar que esse processo continue? São duas questões
de naturezas diferentes, embora interligadas, e que ilustram bem a atual dicotomia do setor
agrícola brasileiro. Aliás, esse tipo de dicotomia não é peculiaridade do setor agrícola, mas
da economia brasileira como um todo.

Os rumos da política agrícola brasileira tiveram de ser reajustados tendo em conta muito mais
as imposições e restrições decorrentes da abertura econômica e da crise fiscal, dois vetores
característicos da década de 90, do que as pretensões de grupos de interesse vinculados
ao setor ou estratégias preestabelecidas por políticos no exercício do poder. A falência
(financeira e operacional) do Estado e a onda de globalização decretaram o esgotamento da
estratégia anterior de crédito farto e preços baixos. Com isso, a manutenção do crescimento
da agricultura passou a ser concebida com base num novo tripé: (a) racionalização dos gastos
públicos com dispêndio seletivo voltado para a produtividade e bem-estar do homem do
campo, (b) liberalização comercial interna e externamente e (c ) maior realismo cambial.

A abertura mostrou-se compatível com redução na atuação do Estado em certas políticas


- como de sustentação de preços e financiamento - e acentuou a necessidade de outras
voltadas para o crescimento contínuo da produtividade e, portanto, da competitividade22. Já
a crise fiscal demandou contenção de despesas, o que precisou ser feito de forma seletiva,
procurando harmonizar os efeitos daqueles dois vetores. Como conseqüência, os policy
makers brasileiros têm enfrentado o difícil desafio de manter o agronegócio operando com
muito menos recursos públicos do que há poucas décadas. Foi preciso poupar recursos e ao
mesmo tempo realocar as menores disponibilidades em direção aos investimentos geradores
de incrementos de produtividade. A estratégia escolhida para economizar recursos tem sido
dar ao mercado, e ao setor privado de forma mais ampla, maior responsabilidade no processo
22 Com a abertura, os apoios a qualquer setor econômico passam a ser questionados por outros países. Além disso,
em certos casos, o apoio fica impraticável. Se o Brasil fixar um preço alto para o arroz, por exemplo, será forçado a
não apenas comprar os excedentes dos brasileiros, mas também dos argentinos e outros produtores estrangeiros.

Serviço Nacional de Aprendizagem Rural Administração Regional do Estado de São Paulo 17


de formação de preços e demais atividades de comercialização, incluindo aí tanto os grãos
normalmente amparados pelo programa de preços mínimos, como também produtos que
contavam com programas específicos, como o café, a borracha, o trigo, o açúcar e álcool.
Os investimentos em produtividade vêm sendo contemplados com certa regularidade, ora
mantendo-se estagnados, ora sofrendo alguns cortes.

A globalização, entendida como a extrema aceleração da freqüência das transações


comerciais e financeiras em escala mundial, constituiu-se, sob muitos aspectos, na principal
característica do final do século XX. No Brasil, um dos seus mais marcantes reflexos se deu
sobre a economia agrícola, acelerando em anos recentes a verdadeira revolução no seu
arranjo espacial, que vinha se dando de forma mais moderada já nas últimas duas décadas.
Os negócios agropecuários vêm experimentando mudanças de extrema importância à medida
que vão ocupando áreas de fronteira, como o Norte e Centro-Oeste, além de vastas áreas do
Nordeste, em geral através de atividades que incorporam moderna tecnologia de produção.
Paralelamente, atividades de apoio, a montante e a jusante da produção agropecuária, estão
se movimentando para essas mesmas áreas. Fornecedores de insumos, armazenadores
e indústrias de processamento vão se aglomerando ao redor das zonas de produção,
atendendo aos princípios da racionalidade econômica, tendo em vista otimizar os arranjos das
atividades no tocante a custos de produção, processamento, armazenamento e transportes.
A motivação fundamental para a busca dessa otimização é a necessidade de incrementar a
competitividade dos produtos nacionais face à concorrência externa resultante da abertura
econômica. Tanto é necessário reduzir custos para poder exportar como também para não
criar espaços para os produtos importados.

Em função desses desenvolvimentos, uma parte substancial do território nacional vem se


agregando para compor junto às regiões mais tradicionais um real mercado nacional, com
um grau considerável de abertura para o exterior. Neste mercado, evidentemente, a exemplo
do que passa no contexto internacional, tendem a se acelerar as operações comerciais e
financeiras, que também tendem a se tornar mais complexas e sofisticadas, entre as quais
salientam-se as transações a termo e a futuro23.

Impressiona a muitos como tais avanços se deram exatamente quando o governo pareceu
se afastar do setor. Esse aspecto fica particularmente acentuado considerando-se os cortes
havidos na política de sustentação de preços e no crédito à agricultura: em apenas 2 anos (de
1987 a 1989) realizou-se um corte de US$8,2 bilhões para US$1,8 bilhão na política de preços
e estoques reguladores de grãos, inclusive trigo, café e açúcar. Entre esses mesmos 2 anos,
o volume de crédito total à agricultura caiu de US$31,8 bilhões para US$20,5 bilhões - uma
queda de 35,5% - e para US$9,54 bilhões em 199624. Acrescentando-se a forma desastrosa
como se deram os ajustes (às trocas de moeda) nos débitos da agricultura durante o Plano
Collor e Real, fica fácil entender porque o setor agrícola ficou inadimplente até meados da
23 Mercado a termo envolve transações para entrega futura do produto. Mercado futuro caracteriza-se por transações
de contratos padronizados representativos de quantidades predeterminadas de produto com vencimento no futuro.
As transações desses contratos se dão em bolsas especializadas, sendo que excepcionalmente ocorre entrega do
produto, posto que os contratos de comprados são revendidos e os vendidos recomprados antes do vencimento. A
finalidade da operação é fixar um determinado preço para o produto a ser comprado ou vendido no futuro.
24 Note-se ainda as quedas vertiginosas nos recursos provenientes do Tesouro Nacional, das Exigibilidades
(depósitos à vista nos bancos comerciais) e da Caderneta de Poupança: essas três fontes, que respondiam por cerca
de US$30 bilhões em 1987, já em 1996 contribuíram com apenas US$1,8 bilhão. Atualmente, o total de crédito
anda na casa dos US$12,5 bilhões, vindo 50% das exigibilidades e poupança, 10% do BNDES para investimentos
e 20% são recursos a juros de mercado. Do total, cerca de 13% são recursos para o Programa de Agricultura
Familiar (PRONAF). Deve-se salientar que o papel do Tesouro passou a ser, nos últimos anos, o de cobrir apenas os
diferenciais para equalização entre as taxas dos agentes financeiros e aquelas fixadas para o crédito rural.

18 Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo


década de 1990. Só com a securitização25 da dívida agrícola que se deu após longo e penoso
processo de renegociação é que o agronegócio retomou seu crescimento, surpreendendo a
todos que, naquela ocasião, rotularam os produtores rurais com a pecha de “caloteiros”.

Face à clara insuficiência de recursos para a agricultura, os segmentos mais avançados


comercial e tecnologicamente falando têm-se valido de financiamento proporcionado pelos
seus compradores (agroindústria e trading companies) de produtos e vendedores de insumos.
Quase sempre o financiamento se dá na forma de adiantamento de certo percentual do valor
da produção que é adquirido antecipadamente (anteriormente à colheita). As CPR (Cédula
de Produto Rural) são documentos utilizados nessas operações. Os segmentos de menor
escala têm sido atendidos pelo chamado PRONAF.

Quanto à política de preços do governo federal, praticamente desativada e substituída por


outros programas, nunca é demais lembrar que quase sempre se caracterizou por baixa
eficácia e eficiência. Não fez tanta falta quando foram em grande parte desativadas. Barros
sintetizou suas análises sobre essa política da seguinte forma: (a) ou o preço mínimo
era relativamente alto, mas o governo não efetuava as aquisições em tempo oportuno,
não viabilizando os recursos necessários, denotando falta de agilidade operacional e
planejamento; (b) ou o preço mínimo era relativamente baixo, mas a presença potencial
do governo no mercado afastava o setor privado da comercialização. Por essa razão, o
governo era forçado a atuar de forma muito mais intensa (e, ainda assim, sem êxito) do que
o necessário em condições normais de credibilidade nas regras de sua atuação26.

A partir de meados dos anos 1990, o governo criou alternativas de sustentação de preços e de
gerenciamento de riscos agrícolas que se enquadrassem dentro dos apertados orçamentos
e que implicassem, ao mesmo tempo, num menor envolvimento operacional de sua parte,
como o Programa de Prêmio de Escoamento de Produto - PEP os Contratos de Opções de
Venda. O primeiro visa movimentar a produção que se ache estancada em alguma região
produtora. O governo faz leilões para identificar o comprador que compre a produção local por
preço mais próximo ao mínimo oficial. A diferença, conhecida como prêmio, é reembolsada
pelo governo ao comprador. Os contratos de opções são leiloados junto a produtores que, na
verdade, adquirem o direito de vender sua produção ao governo caso o preço de mercado
após a safra esteja abaixo do preço de exercício estabelecido pelo governo.

Os preços agrícolas têm caído em termos reais (descontada a inflação) desde meados dos
anos 1980. Mesmo assim, após a renegociação da dívida, o agronegócio vem crescendo
de forma sustentada, graças ao aumento da produtividade ligado ao uso de tecnologia e ao
aumento da eficiência administrativa dos produtores rurais, que possuem mais escolaridade
e um considerável espírito empreendedor, que os faz se disporem a enfrentar tantas
condições adversas e arriscadas para progredir na vida, fazendo, assim, o próprio país se
desenvolver.

25 A securitização envolveu a garantia da dívida dada pelo governo aos bancos credores na forma de títulos
públicos, bem como a prorrogação do prazo de pagamento pelos produtores.
26 O fato de o governo possuir estoques em mãos gerava inseguranças nos agentes do mercado. Muitas vezes,
face a um recrudescimento da inflação, o governo desovava seus estoques, causando sérios prejuízos a quem tinha
comprado produtos na safra a preços regulados pelo preço mínimo oficial. Conclusão: na região centro-oeste era
comum o governo ser o maior, quando não o único, comprador.

Serviço Nacional de Aprendizagem Rural Administração Regional do Estado de São Paulo 19


Conclusões

O Brasil passou por muitas transformações nas últimas décadas. Democratizou-se,


reorganizou o setor público, controlou a inflação. Todos os partidos políticos mais expressivos
tiveram ou estão tendo a oportunidade de governar, colocar em prática suas concepções
ou mudá-las face à experiência de passar de “estilingue para vidraça”. Acredito que seja
um rico processo, com o qual o País vem ganhando muito. A democracia é sem dúvida o
regime preferido pelos brasileiros e aquele mais adequado para que o Brasil prospere. O uso
mais equilibrado dos recursos públicos só ocorrerá sob este regime. Embora as mudanças
desejadas sejam demoradas, elas vêm ocorrendo. Muitos países promoveram mudanças
geradoras de eficiência sob regimes autoritários. A grande novidade do Brasil é que elas
vêm ocorrendo sob democracia, com a aquiescência do cidadão comum.

Falta ao País finalmente atingir a ritmo de crescimento que todos esperam. Para isso são
necessárias reformas, que vão acontecendo lentamente. Deve-se lembrar, porém, antes de
desanimar, que há algumas décadas era inimaginável que tais reformas fossem simplesmente
pensadas pelos nossos políticos.

O agronegócio tem se mostrado setor de alta relevância para o País. Seus interesses quase
sempre coincidem com os da maioria da população, que precisa ser informada para que
apóiem as medidas que facilitem a continuidade dessa trajetória.

20 Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo


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