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da Literatura Portuguesa –
Considerações
(e vários pensamentos)
Trabalho no âmbito da UC Língua 1.2 Português
“Quem tem a sorte de nascer personagem vivo, pode rir até da morte. Não morre mais...
Quem era Sancho Panza ? Quem era Dom Abbondio ? E, no entanto, vivem eternamente,
pois - vivos embriões - tiveram a sorte de encontrar uma matriz fecunda, uma fantasia que
soube criá-los e nutri-los, fazê-los viver para a eternidade!”
Luigi Pirandello
2
AS PERSONAGENS (POR AUTOR)
Portugal representado: o do início do século XVI (o qual tinha Lisboa como centro do
mundo conhecido pelos Europeus);
Traços e manias, características: A cobiça, a ambição desmedida e o interesse especulativo;
Legado: A palavra “anzoneiro”. No Norte de Portugal, sobretudo, utiliza-se a expressão
“anzoneiro” para caracterizar uma pessoa interesseira. O Dicionário “Priberam” da Língua
Portuguesa apresenta esta palavra como um sinónimo de “Onzeneiro”;
O equivalente moderno: O bancário/banqueiro (ou ainda o proprietário da casa de penhores
ou o agiota).
3
Inês Pereira (de “A Farsa de Inês Pereira”)
Inês Pereira é o protótipo da rapariga singela e solteira, mas de grande ambição, que procura
marido. Pretende casar com algum cortesão, que seja bem-falante, bem parecido e culto. A
mãe de Inês recorre aos préstimos de uma alcoviteira (Lianor Vaz) para que esta encontre
marido para Inês. O lavrador Pêro Marques é-lhe então apresentado, contudo, Inês Pereira
recusa-o, pois o lavrador abastado é tudo menos elegante (em todos os sentidos).
A Inês importa-lhe mais o “parecer” do que o “ser”, e foi assim que veio a conhecer, através
de uns casamenteiros judeus, Brás da Mata, o triunfo das aparências, o fidalgo falido que
pensa apenas no “dote” de uma futura noiva.
Inês depressa se arrependeu da sua sorte: Brás da Mata parte para África, para combater, e
deixa um criado a tomar conta da esposa, não a deixando sair à rua. Mas três meses após a
sua partida, Inês recebe a notícia de que ficou viúva. Lianor Vaz conta-lhe que o ingénuo
Pêro Marques continua disponível, e Inês, sem pensar muito, após um casamento que correu
mal (daí acabando a ilusão do “parecer bem”), aceita casar com o simplório, tendo na mente
os dividendos que poderia da situação retirar.
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Camões, Poeta
Esta figura cria um paralelismo entre o que é real (as dificuldades e os perigos do mar) e o
que é maravilhoso (a sua colossal e medonha figura), juntando-lhe características mundanas
(o Amor não-correspondido por Thétys) e a capacidade de profetizar.
O simbolismo do Adamastor remete para um Povo a lutar pelo seu destino (glorioso, que lhe
é devido), e, portanto, vencer o “obstáculo” simbolizará o incontestado domínio dos mares
pelos Portugueses; O Adamastor cede o seu lugar, ou o seu protagonismo, aos marinheiros
Portugueses, os verdadeiros merecedores de tributo; O amor desmedido e irracional (o que o
gigante confidencia) pode levar, irremediavelmente, à loucura e à destruição.
5
Velho do Restelo (de “Os Lusíadas”)
O Velho do Restelo é uma personagem criada pelo grande Poeta Renascentista que tem como
objectivo retratar as pessoas pessimistas, ou, modernamente, os “mensageiros da desgraça”.
No Canto IV, nas “Despedidas de Belém”, esta figura emerge, personificando a preocupação
e o receio face ao desconhecido, apontando o dedo àqueles homens, corajosos, sem dúvida,
mas que, segundo ele, se moviam pela cobiça.
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Camilo Castelo Branco, Romancista
O chorar e o rir de mãos dadas (da tragédia à comédia), ou a sã convivência. Esta é uma obra
na qual Camilo Castelo Branco procurar “troçar”as novas correntes literárias: o Realismo e o
Naturalismo.
Esta novela passa-se, à imagem de grande parte das novelas do famoso escritor, a norte, mais
concretamente na zona de Basto, na segunda década do século XIX.
O farmacêutico/boticário Eusébio Macário, viúvo, com dois filhos (José Fístula e Custódia),
vive entre a dicotomia “razão do dinheiro vs irracionalidade do desejo”.
A ação desta personagem vai ao encontro do espírito político/cultural dessa época, que, ao
contrário do Romantismo, dá primazia ao material (em vez de ao sentimento).
Eusébio Macário procura arranjar o melhor que pode, nunca deixando de ajudar os filhos,
solteiros. A chegada de um “brasileiro”, termo usado para catalogar aqueles que, de Portugal,
emigraram para o Brasil (em Fafe, por exemplo, é muito usual a utilização da expressão),
vem alterar a vida desta família. Bento Montalegre, assim se chama, irmão de Felícia, amante
do Padre da localidade, despoleta toda uma intriga: casa com Custódia e arranja forma de
juntar o irmão desta com a sua irmã (que abandona o Padre).
A grande algazarra parece, contudo, vestida de vazio. Há uma oposição do ideal da natureza
vs a previsibilidade da condição humana “filas cerradas de pinheiros lá em cima nas
cumeadas (...) esquadrões de gigantes, pasmados, a olharem para nós, burlescos pigmeus,
que andamos cá em baixo a esfervilhar como bichinhos revoltosos nas enormes podridões
verdoengas do planeta”.
7
Eça de Queiroz
A educação a que Eusebiozinho esteve sujeito em nada contribuiu para a formação de uma
personalidade vincada: A clausura em casa, sem nada fazer; fortemente protegido (pela Mãe
e pela Titi); sobre-encasacado; não deixam que tome banho com receio de que apanhe uma
constipação.
“Passava os dias nas saias da titi a decorar versos, páginas inteiras do "Catecismo de
Perseverança”(...)
8
Afonso da Maia (de “Os Maias”)
Afonso da Maia era, pela pena de Eça de Queiroz, “baixo, maciço, de ombros quadrados e
fortes. A sua cara larga, o nariz aquilino e a pele corada. O cabelo era branco, muito curto e
a barba branca e comprida.” Uma personagem histórica, no dizer de Carlos (da Maia).
Talvez seja, na obra, o personagem por quem quase todos nutrirão alguma espécie de
simpatia. É uma pessoa culta e elegante. Eça não lhe atribui defeitos. Liberal, parte para
Inglaterra, de onde volta quando o seu pai morre. Casa. Mais tarde, muito mais tarde, por
desgraça do filho, abraça a educação do neto Carlos.
Sofre com o atraso do País. É sensível e generoso. Ama a natureza, os animais (o Reverendo
Bonifácio é o seu grande companheiro), os amigos e aqueles que, por vicissitudes várias, são
mais frágeis. A sua moralidade e princípios são à prova de bala.
Afonso morre, vítima de apoplexia, ao descobrir o amor incestuoso do seu neto...com a sua
neta (irmã de Carlos). Afonso da Maia é o futuro que não se cumpriu.
9
Almeida Garrett, Escritor
Almeida Garrett tentou, com as personagens de “Viagens na Minha Terra”, passar uma visão
simbólica do País, procurando, através das mesmas, deslindar as causas da decadência de
Portugal. Como romântico, com o final do drama, que traz a morte de Joaninha e a partida de
Carlos para se tornar Barão, Garrett põe o dedo na ferida, apresentando a crise de valores em
que aqueles que se deixam enlear no excessivo apego ao materialismo.
Joaninha simboliza o Portugal idílico, porque ingénuo (no sentido de virtuoso), próprio do
Romantismo: um Portugal impraticável e desfasado da realidade.
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Romeiro (de “Frei Luís de Sousa”)
Esta personagem da peça “Frei Luís de Sousa” apresenta-se como peregrino, escondendo, na
verdade, a verdadeira identidade (a de Dom João de Portugal).
Os cerca de vinte anos de ausência (aprisionado) fizeram mossa, e a mulher, que já não o
esperava (e casara, entretanto) não o (re)conhece.
"Ninguém" é a palavra que concentra a carga mais emotiva de toda a trama: é o vazio de
quem foi dado como morto, que já não tem família; a mulher não o soube reconhecer e já
outro ocupava o seu lugar, na casa que fôra sua. A morte nem sempre é física.
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Alexandre Herculano, Historiador
A narração decorre no ano de 1128, dias antes da batalha de São Mamede, que colocou
frente-a-frente Dom Afonso Henriques, e seus apaniguados, e a sua Mãe, Dona Teresa, com
Peres Trava e restantes tropas afectas àquele partido.
Esta obra tem o condão de colocar as personagens históricas num plano mais reservado,
dando a oportunidade a Dom Bibas de “brilhar”. O próprio Herculano referiu-se ao Bobo
como alguém “que a História não conheceu”.
Assim, o Bobo exemplifica todos aqueles que faziam vida naquela e noutras Côrtes, mas
acaba também por representar figuras anónimas, “que a História não conheceu”, mas que
acabaram por fazer acontecer momentos e episódios inolvidáveis da História do mundo.
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José Saramago, Romancista
"... olhos como estes nunca se viram, claros de cinzento, ou verde, ou azul, que com a luz de
fora variam ou o pensamento de dentro, e às vezes tornam-se negros nocturnos ou brancos
brilhantes como lascado carvão de pedra..." .
Blimunda perde a virgindade no dia em que conhece Baltasar, ou seja, na sequência do seu
encontro após o auto-de-fé. É muito jovem e é marcada pelos poderes que possui: é, como a
mãe, vidente. Possui a faculdade de, quando em jejum, "ver por dentro" das coisas e das
pessoas. A isso junta o poder de “recolher vontades”.
Blimunda consegue ver além das aparências: ela vê dentro e através das pessoas e das coisas.
O único ser que ela se recusa a ver é Baltasar, o “seu homem”.
É uma personagem fora-do-comum, quer hereditariamente (é filha de uma feiticeira), quer
pelo valor simbólico do seu nome ("Sete-Luas") e pela faculdade de vidência ("ver por
dentro").
O seu amor por Baltasar (uno, porque formam um só) é verdadeiro, forte e sincero. Por ele,
está disposta a todos os sacrifícios. Para ele remete toda a sua afeição, que é verdadeira,
espontânea e duradoura. Adicionalmente, o amor por ele é também um símbolo de aceitação
e renúncia, uma vez que nunca o olha por dentro.
Blimunda apenas vê Baltasar por dentro no derradeiro momento da vida deste, no auto-de-fé
onde é queimado, em Lisboa, e percebe que ele, tal como esperava, é puro, “e seu”.
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Sobre Blimunda, escreveu a mesma Isabel da Nóbrega:
Está bom de ver em quem Saramago se inspirou para criar a personagem de Blimunda...
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Vergílio Ferreira, Escritor
Alberto chega a Évora como novo professor do Liceu local. É um homem descrente, a tentar
ultrapassar a morte do pai, que chega a uma cidade tradicional (logo à partida, percebe que a
relação não será fácil).
Alberto, quando jovem, cresceu num ambiente marcado pela ruralidade, preso a uma moral
tradicional e católica, e era, por isso, por influência familiar e social, crente.
A morte do pai teve como consequência o adensar das dúvidas. Mais tarde, Alberto, num
passo digno de Nietzsche, que no início do século XX anunciara a morte de Deus, crê ter
descoberto que o homem se constrói e afirma com a negação de/a Deus.
Estas constantes inquirições fazem-no viver relações um tanto ou quanto problemáticas (com
mulheres e com conhecidos), sendo a que mantém com Sofia a mais notória.
Tornar-se-á, com o tempo e com as circunstâncias (as várias mortes de pessoas que o
rodeiam: Sofia, Cristina, Carolino...) um ser angustiado, truncado entre a descoberta do ser
metafísico e profundo e a procura afectiva (algo que, no fundo, já ansiava).
Já reformado, e de regresso à aldeia onde tudo começara, (re)lembra o passado. Pensa no ser
agoniado e torturado que outrora foi, desejoso por deslindar o limite das coisas.
Por fim, sentado numa sala vazia, parece ter encontrado a paz pela qual suspirou.
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Conclusão
Em verdade, este trabalho procurava referir-se a quinze personagens, em vez das doze aqui
elencadas, mas por razões de unidade e de coerência, decidiu-se pela não inclusão de três das
inicialmente pensadas. A razão para essa decisão partiu da reavaliação do caso “Bernardo
Soares” (Livro do Desassossego), por ser duvidoso que o semi-heterónimo de Pessoa possa
caber no epíteto “personagem”. Depois, Quina, de “A Sibila”, remetia, de certa forma, ainda
que distintamente, para Blimunda, de “Memorial do Convento”. Por fim, os Mau-Tempo,
família “herói colectivo” de “Levantado do Chão”, tem mais a ver com uma questão de
princípios: não fazer menção à referida obra é um exercício de respeito devido a João
Domingos Serra, verdadeiro autor da mesma (sob outro nome, “Uma família do Alentejo”),
que não merecia a desonesta apropriação de que foi vítima (por parte de Saramago).
Ainda assim, foi possível traçar um quadro minimamente completo de algumas personagens,
relembrando, de uma ou outra forma, o porquê de o “Velho do Restelo” ou o “Adamastor”
ainda serem usados como referências ou, até, alcunhas depreciativas.
Portugal será tão mais rico na medida em que conseguir potenciar os traços identitários da
sua singular (e rica) cultura.
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