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A histórica
contribuição
do ensino
privado no
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15 anos 15 anos
A
educação escolar no Brasil nasceu da iniciativa pri-
vada, quando, em 1533, os Franciscanos fundaram
na Bahia o primeiro estabelecimento de ensino em
terras de Santa Cruz. A atuação da iniciativa privada na
educação brasileira, em que pese a variedade de formatos
que assumiu ao longo dos últimos cinco séculos, deu-se de
forma ininterrupta na história do nosso país, consolidando
uma contribuição ímpar na formação e no desenvolvimen-
to da nacionalidade brasileira. Considerando o contexto do
Manoel Alves* Brasil Colônia, não é de se estranhar que a primazia do
ensino privado tenha recaído sobre a escola confessional.
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que, por vezes, contasse com o apoio financei-
O ensino ro do Estado.
privado no
Depois de ter criado, em 1532, as capitanias
hereditárias, com a intenção de ocupar, defen-
der e povoar as terras descobertas pouco an-
confessional
de promover a instrução. Confiou tal tarefa à
Igreja. Com o governador-geral Tomé de Souza,
chegam ao Brasil seis jesuítas, com a missão de
ensinar a língua portuguesa, a doutrina cristã, a
D
urante a maior parte do período colo- leitura e a escrita. Com as escolas dos jesuítas,
nial (1500-1759), as tarefas do ensino no nascia a obra educacional mais importante dos
Brasil ficariam sob encargo de ordens três primeiros séculos da história brasileira.
religiosas, sobretudo Franciscanos e Jesuítas,
mas também Oratorianos, Dominicanos, Bene- O cuidado com a aprendizagem profissional e
ditinos, Carmelitas e Capuchinhos. Como reli- agrícola revela, nesses princípios da coloniza-
giosos, eles tinham suas estruturas próprias, ção, a preocupação com uma educação adap-
desenvolvidas, eficazes e autônomas, consti- tada ao contexto local e às necessidades da
tuindo-se em regime de caráter privado, ainda Colônia. O plano foi seguido, e os jesuítas se
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puseram a serviço de uma educação para to- Apesar dos elementos que se poderiam con-
dos. Em 1586, os jesuítas estabeleceram suas siderar negativos na pedagogia dos jesuítas,
diretrizes educacionais, optando pelo ensino como, por exemplo, a sua subordinação à es-
secundário. Em 1599, a Sociedade de Jesus colástica, contrária à moderna filosofia carte-
aprovou a Ratio Studiorum, a ser seguida no siana e às novas ciências físico-naturais, a ação
mundo inteiro e em função da qual reestrutu- da Companhia de Jesus consolidou a resistência
rou suas instituições no Brasil, transformando- à hegemonia do Estado na educação por meio
as em colégios para o ensino das letras e das de uma organização escolar fora do seu con-
artes liberais. trole. A relação entre autonomia institucional
e ação educacional caracteriza bem a força da
Essa orientação encaminhou os jesuítas natu- resistência do ensino privado frente ao flerte
ralmente para educar, de preferência, os mem- estatizante desde os tempos do Brasil Colônia.
bros das famílias mais aquinhoadas financei-
ramente, ao ministrar-lhes um ensino do tipo Após a expulsão dos jesuítas do Brasil, a escola
clássico, humanístico, literário, acadêmico e pública estatal nasce pela alocação de recur-
abstrato, conforme o ideal da época. A hege- sos financeiros e de pessoal para este fim. A
monia política de uma minoria de funcionários intenção de Pombal era, por meio dos agentes
públicos, proprietários de terras e donos de educativos pagos e controlados pelo Estado,
engenhos de cana sobre a maioria de colonos formar os quadros administrativos e políticos a
brancos, nativos, mestiços e escravos negros seu restrito serviço. Ele procurava fortalecer o
definiu a direção da educação. Tais colégios, centralismo próprio do despotismo que visava a
mantidos no começo pela Corte, recebem sub- instalar, ranço que parece perdurar até nossos
sídios provenientes dos impostos da Colônia, dias.
que apenas começara a se organizar ao final do
século XVI.
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Tal Direção-Geral, responsável por todo o en- em 1808, introduziu o que era necessário para
sino público, levou mais de dez anos para criar o progresso da vida administrativa, cultural e
as estruturas básicas que permitiram pôr em educativa, e reduziu tais antagonismos. Na es-
andamento o sistema escolar. Entre as mudan- fera educacional, a iniciativa mais relevante
ças mais significativas da organização, citamos foi a instalação, por decretos reais, das ins-
os concursos de admissão ao ensino; a expedi- tituições de ensino superior. Foi dada ênfase
ção de licença para ensinar; a obrigatorieda- à formação superior para alguns ofícios técni-
de de autorização para abertura de escolas, cos, necessários para desenvolver a infraestru-
inclusive de iniciativa privada; a definição dos tura de uma cidade, que passou a ser sede do
livros escolares; a conversão do Curso de Hu- reino. Entretanto, para os ensinos primário e
manidades, criado pelos jesuítas, em Classes secundário, as iniciativas são pífias, de quase
Reais (cursos separados em várias disciplinas). abandono.
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de 1791, na criação de um Sistema Nacional dade de todo o Ensino Superior existente ou a
de Educação, propondo escolas primárias para ser criado.
todas as cidades, colégios e liceus em cada ca-
pital e Ensino Superior nas grandes cidades. A descentralização desarticula os dois sistemas
(o primário e o secundário). O Ensino Superior
No entanto, os recursos necessários para or- passa a “organizar” o ensino secundário como
ganizar a educação pública, mesmo no nível preparatório às faculdades. Todas as escolas do
primário, foram reduzidos pelas dificuldades Brasil criam seus currículos e organizam suas
econômicas, causadas pelo aumento do consu- estruturas em função dos exames de admissão
mo e, em consequência, da importação; pela estabelecidos pelas instituições de ensino su-
economia essencialmente agrária; pelo endivi- perior. Alguns grandes colégios foram criados
damento do país (começaram aí os emprésti- e concebidos pelo poder público como modelos
mos exteriores) e pelo nascimento do apare- para a educação nacional, capazes de habilitar
lho burocrático do Estado. A exceção foram os para os exames superiores. O mais célebre foi o
cursos superiores criados em função da neces- Colégio Dom Pedro II, do Rio de Janeiro.
sidade de se formarem novos quadros da ad-
ministração pública, a saber: as Faculdades de O Ato Adicional à Constituição teve uma segun-
Direito do Rio de Janeiro (1825), de São Paulo da consequência, também muito importante
e de Recife (1827). Essas faculdades tiveram para a educação no Brasil, sobretudo para o
grande desenvolvimento em relação aos outros desenvolvimento do ensino privado. A falta de
níveis de ensino. Nesses outros níveis, coube à recursos das províncias para organizar seu pró-
iniciativa privada expandir-se para responder à prio ensino, público e gratuito, especialmente
demanda emergente. Tal expansão perdura até em nível secundário, abriu espaço para que a
os dias de hoje. iniciativa privada assumisse tal tarefa. Nesse
contexto, ela pôde, pouco a pouco, conforme
as circunstâncias em cada província, ampliar
seu espaço. Consolida-se o ensino privado fi-
nanciado diretamente pelos pais dos alunos,
A consolidação
nos moldes como subsiste até hoje.
privado
e pago, mantido por famílias dotadas de recur-
sos, em função de seu acesso aos estabeleci-
mentos de ensino superior. Em ambos os casos,
N
o dia 7 de abril de 1831, Dom Pedro I ab- A partir desse momento, as escolas privadas
dica em favor de seu filho e vai para Por- secundárias proliferaram, na medida em que o
tugal. Durante a Regência, é decretado acesso ao Ensino Superior se ampliava. Setores
um Ato Adicional à Constituição (1834), o qual da sociedade buscavam ver seus filhos incorpo-
influenciará de maneira significativa a evolu- rados à classe dos homens “letrados”, habilita-
ção da educação no Brasil. A nova legislação dos a preencher determinadas funções sociais.
descentralizou a direção da educação. O ensi-
no primário, bem como o secundário, estavam, Com a Lei da Liberdade de Ensino, aprovada
até aquele momento, sob a exclusiva responsa- pelo Imperador em 1854, a expansão do ensino
bilidade do governo de cada província. Ao go- privado prossegue, não somente pela má qua-
verno central cabia unicamente a responsabili- lidade da escola pública, mas, sobretudo, por
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um amplo entendimento da sociedade de que a
escola particular lhe oferecia perspectiva edu-
cacional culturalmente enriquecida, universa-
lizada e prenhe de valores liberais. Até então,
quase toda a população feminina era analfa-
beta. As poucas exceções haviam frequenta-
do somente a escola primária. Pouco a pou-
co, a iniciativa privada, sobretudo através da
educação feminina, oferecida por instituições
educacionais confessionais, em novos cursos
secundários para moças, inaugurou-lhes novas
possibilidades.
entendimento da sociedade de
que a escola particular lhe
oferecia perspectiva educacional
culturalmente enriquecida ...
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Com o advento da República, instaura-se um dia 30 de abril de 1931, decretou-se a volta do
período dos mais importantes para o ensino ensino religioso à escola pública. A nova Cons-
privado. Nesse período, houve relevantes mu- tituição de 1934 proclamava, entre outros, o
danças políticas na educação. Uma nova Cons- ensino religioso facultativo nas escolas públi-
tituição é promulgada em 1891, estabelecendo cas, a ajuda financeira às escolas privadas e
o regime presidencial de sistema federativo. confessionais e a liberdade de organização de
Como consequência natural desse sistema, um sindicato para a educação católica, origem
a descentralização concedida ao ensino, em do movimento sindical patronal no ensino pri-
1834, foi definitivamente adotada no sistema vado, tão pungente nos dias atuais. Finalmen-
educativo brasileiro. te, com a Constituição de 1937, consagra-se o
princípio de recursos públicos também para a
A forte influência positivista no movimento escola particular.
republicano se fez sentir na reforma do ensi-
no, decretada em 1890, sob a coordenação de Foi neste período que surgiu a Escola Nova,
Benjamim Constant, que tinha por finalidade com uma geração de educadores de caráter li-
sintonizar a educação nacional aos ideais re- beral – com destaque para Anísio Teixeira – que
publicanos. As proposições básicas eram a lai- se empenhavam na luta por um ensino público
cização, a gratuidade e a preponderância das de qualidade e laico, em oposição ao ensino
disciplinas científicas, rompendo com o mo- privado. Foi a época de grandes conflitos entre
delo humanista clássico. Numa palavra: uma privatistas e publicistas. Tal conflito colocava
escola estatal acessível a todos. A reforma foi em xeque a livre iniciativa na educação. O gol-
um fracasso. A maior parte virou letra morta. pe de Estado de 1945 depôs o ditador Vargas.
B enjamin Constant e sua equipe perderam de Há uma abertura democrática. Novas formas
vista as variáveis econômicas, como a falta de de organização social e política são adotadas.
recursos e de infraestrutura, assim como tam- A Constituição de 1946 manteve todos os di-
bém os obstáculos políticos, a falta de apoio reitos adquiridos anteriormente pelo ensino
das classes dirigentes e dos intelectuais que privado. Mas foi com o advento da Lei 4.024 –
não queriam prejudicar a formação de seus fi- Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
lhos no ensino privado. (LDB), de 1961 – que a escola particular passou
a usufruir da autonomia desejada. A renovação
As outras reformas que se seguiram nada con- impregna as ações dos estabelecimentos de en-
seguiram. Nenhuma das reformas empreen- sino privado.
didas pelo Estado, apesar de suas nuances às
vezes contraditórias, modificou de maneira sig- Em função do crescimento demográfico da
nificativa o sistema escolar. A despeito de seus classe média, a partir dos anos 1950 e 1960,
méritos, essas reformas sempre ignoraram os e da incapacidade da escola confessional em
conflitos sociais, econômicos, políticos e ideo acompanhar o crescimento da demanda, os es-
lógicos. No contexto da falta de recursos hu- tabelecimentos escolares mantidos por educa-
manos e materiais do Estado para a educação, dores e empresários da educação se veem em
o ensino privado vai rapidamente ocupar os es- vertiginoso crescimento a partir dos anos 1970.
paços vazios, sobretudo no ensino secundário. O desenvolvimento econômico do país, a pre-
cária qualidade do ensino público e a crescen-
O descontentamento provocado pela Repúbli- te qualidade do serviço educacional prestado
ca Velha (1889-1930) fez eclodir um movimento pela escola particular propiciam o crescimento
militar que culminou na queda do presidente do setor privado, tendo à frente empresários
Washington Luiz. Foi o cardeal Leme que, a e dirigentes extremamente competentes e or-
pedido de Getúlio Vargas, conseguiu conven- ganizados na gestão educacional. É o boom do
cer Washington Luiz a renunciar. Isso contri- ensino privado, em um primeiro momento na
buiu para restituir à Igreja influência política Educação Básica, e a partir dos anos 1990, tam-
no Estado Novo. Entre as novas decisões, no bém no Ensino Superior.
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se segmentando em função das características de
conclusão:
Formas de financiamento estatal podem pressupor
contrapartidas que irão certamente em direção a
uma maior intervenção do Estado, mormente na
público é
necessário ter consciência de que conquistar certos
direitos (ou distinções) pode ter um preço, que cos-
tuma ser pago com a autonomia. Seria, pois, opor-
intervenção?
mento histórico da sua trajetória no país, a fim de
defender a liberdade de ensino plena e sem reser-
vas, em um mercado livre e sem controles estatais,
com completa autonomia financeira e gerencial. Tal
E
ntre tantos, assinalo aqui um instigante organização deve mobilizar a totalidade do ensino
tema, recorrente no debate sobre o ensi- privado, sem exceções.
no privado: as variadas formas, diretas e/
ou indiretas, de financiamento estatal para o en- O debate acerca das relações entre Estado, socieda-
sino privado, especialmente aquelas sob forma de de e ensino privado é amplo e multifacetado, mor-
imunidade/isenção fiscal e tributária. As posições mente se considerarmos que a escola particular não
entre os diversos segmentos do ensino privado (as é uma realidade monolítica. Em meio a tal pluralida-
escolas com e sem fins econômicos, as confes- de, as diversas formas de organização e atuação do
sionais e as não confessionais) devem ser claras, ensino privado podem e devem repensar seu locus
responsáveis e coerentes. Ainda que não sejam específico e diferenciado no cenário da educação
posições antagônicas, inconciliáveis e excluden- nacional e do mercado educacional, sem compro-
tes, é preciso clareza na opção por parte de cada meter e/ou enfraquecer as lutas comuns a todo o
segmento, sem tergiversar quanto ao repúdio a ensino privado.
qualquer intervenção estatal na livre iniciativa em
educação. Assim, o ensino privado no Brasil estará O aprendizado e a articulação de uma nova organiza-
ção nacional do setor social e econômico em que se
constitui o ensino privado, em que pesem as diferen-
ças existentes, são essenciais para a salvaguarda de
seus direitos e prerrogativas legais, particularmente
a liberdade de ensino. Assim, veríamos superados
o excessivo fracionamento e atomização em que a
organização do setor se encontra. Com este intui-
to, devemos prosseguir e aprofundar o debate, na
defesa dos inalienáveis direitos do ensino privado.
© Alexander Ivanov / Photoxpress
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