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LINGUAGEM (gr. kóyoç; lat. Sermo; in. Lunguage, Speech; fr. Language; ai. Sprache, it.

Linguaggio). Em geral, o uso de signos intersubjetivos, que são os que possibilitam a


comunicação. Por uso entende-se: 1º possibilidade de escolha (instituição, mutação, correção)
dos signos; 2º possibilidade de combinação de tais signos de maneiras limitadas e repetíveis.
Este .segundo aspecto diz respeito às estruturas sintáticas da LINGUAGEM, enquanto o primeiro
se refere ao dicionário da LINGUAGEM. A moderna ciência da LINGUAGEM tem cada vez mais
insistido (como veremos) na importância das estruturas linguísticas, ou seja, das possibilidades
de combinações delimitadas pela LINGUAGEM. Elementos como "Sócrates", "homem", "é", "e",
"todos", "não", etc, são todos palavras, isto é, signos intersubjetivos, mas só podem fazer parte de
um discurso com uma função determinada: só podem combinar-se com os outros signos em
modos limitados e reconhecíveis.
A LINGUAGEM distingue-se da língua, que é um conjunto particular organizado de signos
intersubjetivos. A distinção entre LINGUAGEM e língua foi estabelecida por Ferdinand de
Saussure, que a definia da seguinte forma:
"A língua é um produto social da faculdade de LINGUAGEM e ao mesmo tempo um
conjunto de convenções necessárias adotadas pelo corpo social para permitir o
exercício dessa faculdade nos indivíduos. Tomada em conjunto, a LINGUAGEM é
multiforme e heteróclita; sobreposta a domínios diversos — físico, fisiológico e
psíquico — também pertence ao domínio individual e ao domínio social; não se
deixa classificar em categoria alguma de fatos humanos porque não se sabe como
determinar a unidade" (Cours de linguistíque générale, 1916, p, 15).
Do ponto de vista geral ou filosófico, o problema da LINGUAGEM é o problema da
intersubjetividade dos signos, do fundamento desta intersubjetividade. O problema da "origem" da
LINGUAGEM, discutido nos sécs. XVII a XIX, é uma de suas formas; as duas soluções típicas
são apenas dois modos de garantir a intersubjetividade dos signos linguísticos. Dizer que a
LINGUAGEM tem origem em convenções significa simplesmente que essa intersubjetividade é
fruto de um acordo, de um contrato entre homens, e dizer que a LINGUAGEM se origina da
natureza significa simplesmente que essa intersubjetividade é garantida pela relação entre o
signo linguístico e a coisa ou com o estado subjetivo a que ele se refere. É possível distinguir
quatro soluções fundamentais para o problema da intersubjetividade da LINGUAGEM e, portanto,
quatro interpretações de LINGUAGEM:
1ª LINGUAGEM como convenção;
2ª LINGUAGEM como natureza;
3ª LINGUAGEM como escolha;
4ª LINGUAGEM como acaso.
As três primeiras interpretações já haviam sido distinguidas e caracterizadas por Platão.
As primeiras duas têm em comum a afirmação do caráter necessário da relação entre o signo
linguístico e seu objeto (qualquer que seja). A tese convencionalista, ao afirmar a perfeita
arbitrariedade de todos os usos linguísticos, portanto a impossibilidade de confrontá-los e corrigi-
los, reconhece em todos a mesma validade. A tese do caráter natural da LINGUAGEM é levada,
por outro lado, a admitir as mesmas conclusões. Uma vez que todos os signos linguísticos são
tais por natureza e cada um é suscitado ou produzido pelo objeto que expressa, todos são
igualmente válidos, e é impossível confrontá-los, modificá-los ou corrigi-los. Ambas as teses
levam à consequência de que é impossível dizer o que não é, porque dizer o que não é significa
não dizer. Megáricos e cínicos, que, na filosofia grega dos tempos de Platão, representavam as
duas teses em questão, tinham em comum um pressuposto fundamental extraído (como relata
Aristóteles) do princípio segundo o qual "nada pode ser predicado de uma coisa salvo seu próprio
nome", princípio que não exprime a necessidade da relação entre o signo linguístico e seu objeto
(MeLinguagem, V, 29. 1024 b 33; para os megáricos, em particular Estílpon; cf. PLUTARCO, Ad
Colot., 23, 1120a). Será fácil mostrar que essas características das duas doutrinas necessaristas
da LINGUAGEM também são encontradas nas formas assumidas por tais doutrinas no mundo
moderno.
1ª A interpretação da LINGUAGEM como convenção teve origem com os eleatas. A inefabilidade
do Ser (como necessário e único) devia levá-los a ver nas palavras nada mais do que "etiquetas
das coisas ilusórias", como diz Parmênides (/•>.19, Diels). Esta concepção parece ser
compartilhada por Empédocles (Fr. 8-9, Diels), mas foi só Demócrito que a justificou com
argumentos empíricos. Demócrito de fato fundamenta a tese da convencionalidade em quatro
argumentos: homonímia, em virtude da qual coisas diferentes são designadas pelo mesmo nome;
diversidade de nomes para uma mesma coisa; possibilidade de mudar os nomes; e a falta de
analogias na derivação dos nomes (Fr. 26, Diels). Os sofistas, com Górgias, insistiam na
diversidade entre os nomes e as coisas e na consequente impossibilidade de se comunicar o
conhecimento das coisas através dos nomes. "A LINGUAGEM" — dizia Górgias — "não
manifesta as coisas existentes, da mesma forma que uma das coisas existentes não manifesta
sua natureza a outra" (Fr. 3, 153, Diels). Já dissemos que Estílpon afirmava a tese da
impossibilidade de uma coisa ser predicado de outra, o que expressa a necessidade de referência
do signo linguístico ao objeto. Platão aludia aos megáricos quando dizia: "Será que preferes a
maneira como Hermógenes e muitos outros falam quando dizem que os nomes são convenções
e que são claros para aqueles que os estipularam e conhecem as coisas às quais correspondem,
e que essa é a justeza dos nomes, de tal forma que não importa se a convenção é feita segundo
o que já se tenha estabelecido ou o contrário, como p. ex. chamar de grande o que hoje
chamamos de pequeno ou de pequeno o que hoje chamamos de grande?" (Crat, 433 c.)
Este convencionalismo puro, que afirma a pura arbitrariedade da referência linguística,
desapareceu a partir de Aristóteles e só reaparece no pensamento contemporâneo. Aristóteles foi
o primeiro a inserir entre o nome e o seu designado a afeição da alma, a representação ou
conceito mental (ideia ou palavra interior ou qualquer outra denominação que venha a ter em
seguida) que cinde e articula a relação entre o nome e o seu designado. A inserção desse termo
permite reconhecer, ao mesmo tempo, o convencionalismo da LINGUAGEM e a necessidade dos
seus significados. Aristóteles de fato afirma que "um nome é um vocábulo semântico segundo
convenção", entendendo com "por convenção" que "nada é nome por natureza, mas apenas
depois de se tornar símbolo" (De interpr., 2, 16 a 18; 26-28). As palavras, como sons vocais ou
sinais escritos, não são as mesmas para todos; no entanto, referem-se às "afeições da alma que
são as mesmas para todos e constituem imagens de objetos que são os mesmos para todos"
(Ibid., I, 16 a.3-8). Tem-se portanto que: 1º os objetos são os mesmos para todos; 2º as afeições
da alma, como imagens dos objetos, são as mesmas para todos; 3º as palavras escritas ou
faladas não são as mesmas para todos. Desta forma a relação palavra-imagem mental é
convencional, ao passo que a relação imagem mental-coisa é natural. A primeira pode mudar
sem que mude a segunda, e é apenas a imutabilidade ou necessidade da segunda que determina
a estrutura geral da LINGUAGEM, que depende da "união e separação" dos signos, da forma
como eles se unem e se separam, e não do convencionalismo dos sinais. Segundo Aristóteles,
isso estabelece o caráter privilegiado da LINGUAGEM apofântica, em que têm lugar as
determinações de verdadeiro e falso, segundo a união ou a separação dos signos reproduza ou
não a união ou a separação das coisas. Aristóteles não nega que existam discursos não
apofânticos, como p. ex. a prece (Ibid., 4, 17 a 2), mas, privilegiando o discurso apofântico, faz
dele a verdadeira LINGUAGEM, pela qual as outras se moldam mais ou menos ou a partir da qual
devem ser julgadas. De fato, a poética e a retórica, que se ocupam da LINGUAGEM não
apofântica, são tratadas por Aristóteles em conexão com a analítica. Ora, a LINGUAGEM
apofântica nada mais tem de convencional: suas estruturas são naturais e necessárias porque
são as mesmas do ser, que ela revela.
Esse convencionalismo aparente ou coxo que se pode combinar com a tese do caráter apofântico
da LINGUAGEM é a forma assumida na Idade Média e na Idade Moderna. O nominalismo
medieval retoma exatamente nessa forma a tese convencionalista. Ockham, p. ex., distingue os
signos "instituídos arbitrariamente para significar várias coisas", ou seja, as palavras, dos signos
naturais, que são os conceitos (Summa log., I, 14), e essa posição só faz reproduzir
substancialmente a de Aristóteles. É idêntica a posição de Hobbes, que, ao mesmo tempo em
que insiste na arbitrariedade do signo linguístico, diz que ele é "uma nota com a qual se pode
revocar à alma um pensamento semelhante a um pensamento passado" (De corp., 2, 4). Essa
correspondência entre palavras e pensamentos é tomada por Locke como definição da função
signa da LINGUAGEM: "As palavras que, por natureza, se ajustavam a esse objetivo foram
empregadas pelos homens como signos de suas ideias: não por alguma conexão natural que
exista entre determinados sons articulados e certas ideias, pois nesse caso haveria uma só
LINGUAGEM entre os homens, mas por uma imposição voluntária, mediante a qual determinada
palavra é aceita arbitrariamente como marca de certa ideia" (Ensaio, III, 2, 1). A inserção do
"signo natural", "pensamento" ou "ideia" entre a palavra e seu designado descaracteriza a tese
convencionalista e, como vimos, aproxima-a da tese oposta, chegando a confundi-las. Essa tese
reduz-se de fato à afirmação da arbitrariedade do signo linguístico isolado, da palavra entendida
como som, mas não se estende ao uso propriamente dito das palavras (no qual consiste a
LINGUAGEM), portanto às regras desse uso. Equivale a dizer. p. ex., que no jogo de xadrez é
indiferente chamar a torre de peão ou peão de torre, mas que é necessário que certa peça (peão
ou torre) seja usada de uma forma e que outra peça (torre ou peão) seja usada de outra maneira.
A LINGUAGEM é o jogo de xadrez que, nesse caso, é declarado necessário: o convencionalismo
das palavras, ou seja, dos simples sons articulados, não diminui essa necessidade.
Portanto, o restabelecimento da tese clássica do convencionalismo só ocorre com a eliminação
de qualquer intermediário entre o sinal linguístico e seu designado; em outras palavras com a
declaração de arbitrariedade, não dos sons isolados, mas do uso dos sons, ou seja, das regras
que o limitam. Essa foi a posição de Wittgenstein, em sua segunda forma (Philosophische
Untersuchungen). Wittgenstein admitiu a arbitrariedade, portanto a equivalência, de todos os
"jogos linguísticos" em uso, admitindo que tais jogos podem ter caracteres e regras muito
diferentes, de tal modo que chamá-los em conjunto de "LINGUAGEM" significa apenas que eles
têm inter-relações diferentes (Philosopbical Investígations, I, 65). Desse ponto de vista, há um
retorno das teses clássicas do convencionalismo; em primeiro lugar, a impossibilidade de retificar
a LINGUAGEM, razão pela qual ela deve ser sempre declarada verdadeira e perfeita ou, como
Wittgenstein prefere, em ordem: "Está claro que todo enunciado da nossa LINGUAGEM está em
ordem assim como é. Isso quer dizer que não estamos perseguindo um ideal como se os nossos
enunciados ordinariamente vagos ainda não tivessem atingido um sentido irrepreensível e como
se uma LINGUAGEM perfeita ainda estivesse para ser construída. Por outro lado, parece claro
que onde há sentido deve haver ordem perfeita. Assim, deve haver ordem perfeita na mais vaga
das proposições" (Ibid:, 1, 98). Desse ponto de vista, o ideal linguístico, a língua perfeita é algo já
existente no uso. "O ideal" — diz Wittgenstein — "deve ser encontrado na realidade. Enquanto
não virmos como se encontra nela, não entenderemos a natureza desse deve. Achamos que
deve estar na realidade porque achamos que já o vimos" (Ibid., 101). Pode-se dizer que esse
ponto de vista coincide com o de Carnap. O "princípio de tolerância" ou "de convencionalidade",
estabelecido por Carnap, expressa a perfeita equivalência dos sistemas linguísticos. "Em lógica"
— afirma Carnap — "não existe moral. Cada um pode construir como quiser a sua lógica, isto é, a
sua forma de linguagem. Se quiser discutir conosco, deverá apenas indicar como quer fazê-lo e
apresentar regras sintáticas, em vez de argumentos filosóficos" (Lógica/ Syntax of Language, §
17). Desse ponto de vista, a construção de uma LINGUAGEM ideal ou perfeita é feita com base
naquilo que um certo tipo de LINGUAGEM é de fato. Carnap diz: "Os fatos não determinam se o
emprego de uma certa expressão está correto ou errado, mas apenas a frequência com que leva
ao efeito para o qual tende e coisas desse gênero. Uma questão sobre o que está certo ou errado
deve sempre referir-se a um sistema de regras. A rigor, as regras que relacionaremos não são as
regras da LINGUAGEM B, como ela é de fato, mas constituem antes um sistema linguístico em
correspondência com B, que denominaremos sistema semântico B-S. A LINGUAGEM B pertence
ao mundo dos fatos (...), mas o sistema linguístico B-S é algo construído por nós; tem todas as
propriedades que estabelecemos por meio de regras e somente elas. Todavia, não construímos
B-S arbitrariamente, mas levando em consideração os fatos de B. Portanto, podemos formular a
afirmação empírica de que a LINGUAGEM B está, em certa medida, em harmonia com o sistema
B-S" (Foundations of Logic and Matbematics. I, 4). Por isso, segundo Carnap, o sistema
semântico B-S tem as seguintes propriedades: 1ª constitui o critério com base no qual se pode
julgar sobre a correção ou não da LINGUAGEM; 2ª as regras de B-S não são convencionais
porque são escolhidas com base nos dados de fato fornecidos por B. Carnap, portanto, admite
simultaneamente a tese do convencionalismo das LINGUAGEM e a tese da naturalidade dos
sistemas semânticos, isto é, das LINGUAGEM perfeitas.
2ª A doutrina segundo a qual a LINGUAGEM existe "por natureza", e que a relação entre a
LINGUAGEM e o seu objeto (seja qual for) é estabelecida pela ação causal deste último, também
se caracteriza pelo reconhecimento da necessidade da relação semântica. Enquanto a doutrina
anterior afirmava que a relação semântica é sempre exata porque em qualquer caso é instituída
arbitrariamente, a doutrina em exame afirma que é sempre exata porque escapa ao arbítrio e é
instituída pela açào causai do objeto. Pode-se dizer que essa tese remonta a Heráclito (Fr. 23,
Diels; 114. Diels), mas forexposta explicitamente pelos cínicos, especialmente por Antístenes,
cujo ponto de vista é expresso por Crátilo no diálogo homônimo de Platão: "As coisas têm nomes
por natureza e artífice de nomes não é qualquer uni, mas só quem olha para o nome que por
natureza é próprio de cada coisa e que é capaz de expressar sua espécie em letras e sílabas"
(Crat., 390 d-e). Sabemos outrossim que Antístenes definira a LINGUAGEM dizendo ser ela
"aquilo que manifesta o que era ou é" (DIÓG. L, VI, 1, 3), e que extraía dessa doutrina as
mesmas conseqüências que os megáricos, com Estílpon, extraíam da tese do convencionalismo:
"é impossível contradizer ou mesmo dizer o falso" (AKLSTÓTKLKS, Met., V, 29, 1024 b 33). Esta
forma de Antístenes é apenas uma das formas que a doutrina em exame pode assumir e assumiu
ao longo de sua história. Essas formas são distinguíveis com base no tipo de objeto que se toma
como designado pela LINGUAGEM Todas as formas dessa doutrina asseveram que a
LINGUAGEM é apofântica, ou seja, que de certa forma revela seu objeto; diferem ao determinar o
tipo de objeto que a LINGUAGEM revelaria de forma primordial ou privilegiada. Assim, é possível
distinguir: a) a teoria da interjeiçãa, b) a teoria da onomatopéia; c) a teoria da metáfora; d) a teoria
da imagem lógica.
a) A teoria da interjeição, que Max Müller (Lectures on tbe Science of Language, 1861, cap. 9,
trad. it., p. 363) chamou de teoria do puh-piih, foi exposta pela primeira vez por Epicuro.- "As
palavras não são em princípio criadas por convenção, mas é a própria natureza humana que,
influenciada por determinadas emoções e visando a determinadas imagens, leva os homens a
emitir o ar da forma apropriada a cada emoção e imagem. As palavras são inicialmente diferentes
devido à diversidade dos povos e dos lugares, mas depois tornam-se comuns, para que seus
significados sejam menos ambíguos e mais rapidamente compreensíveis" (DIÓG.. L, X, 75-76).
Lucrécio expressava mais sucintamente o mesmo conceito: "A natureza obrigou os homens a
emitir os vários sons da L, e a utilidade levou a dar a cada coisa o seu nome" (De rei: nat., V,
1027-28). Em tempos modernos essa doutrina foi retomada por Condillae (Sur lorigine des
connaissances humaines, 1746, 1, §§ 1 ss.) e exposta de forma mais brilhante por Rousseau: "A
primeira LINGUAGEM do homem, a LINGUAGEM mais universal e mais enérgica, a única da
qual ele necessitava antes que fosse preciso convencer homens reunidos, é o grito
naturaLinguagem Por ser arrancado por uma espécie de instinto nas ocasiões prementes, para
implorar socorro nos grandes perigos ou alívio nos males violentos, esse grito não tinha grande
utilidade na vida comum, em que reinam sentimentos mais moderados. Quando as idéias dos
homens começaram a estender-se e multiplicar- se, estabelecendo-se comunicação mais estreita
entre elas, quando foram buscados sinais mais numerosos e uma LINGUAGEM mais ampla,
multiplicaram-se as inflexões da voz e acrescentaramseos gestos, que, por natureza, são mais
expressivos e cujo sentido depende menos de determinações anteriores" (De Vinégalité parmi les
hommes, I; cf. também o ensaio "Sobre a origem das línguas", em CEiwres, 1877, voLinguagem
I). Mas o problema que se opõe a essa doutrina é o da passagem de uma língua constituída por
gritos simples ou interjeiçòes para uma língua objetiva, constituída por termos gerais ou abstratos.
Mesmo no mundo moderno não faltou quem visse na interjeiçào a origem dos sons que,
gradualmente purificados, se transformaram em verdadeira linguagem. Era o que pensava, p. ex.,
O. Jespersen (Language, Its Nature, Development and Origin, 1923, pp. 418 ss.); a mesma tese
foi apresentada com mais rigor por Grace de Laguna, que procurou definir melhor a passagem da
interjeiçào para a LINGUAGEM como um processo de objetivação, graças ao qual as expressões
emotivas vão sendo pouco a pouco substituídas por aspectos percebidos das situações efetivas
(Speech, its Functíon and Development, 1927, pp. 260 ss.). Mais difícil de compreender é
exatamente esse processo de objetivaçào e purificação dos gritos emotivos: mesmo porque até
as doutrinas que a eles recorrem evidenciaram e reconheceram explicitamente a diferença entre
as palavras e as interjeições (que não se distinguem dos gritos animais), além do fato de as
palavras se afirmarem em prejuízo das interjeições.
b) A teoria da onomatopéia, que Max Müller (Lectures cm the Science of Language, 1861, cap. 9)
denominou teoria do bau-bau, afirma serem as raízes lingüísticas imitações dos sons naturais.
Essa teoria era conhecida por Platão, que a critica observando que, "neste caso, aqueles que
imitam o balido das ovelhas, os cantos dos galos e as vozes dos demais animais dariam nome
aos animais cuja voz imitam" (Crat., 423 c). Essa teoria foi defendida por Herder, em Tratado
sobre a origem da linguagem (1772): ele considerou os sons naturais (p. ex., o balir de um
cordeiro) como os sinais que a alma utiliza para reconhecer o objeto em questão. "O balido,
notado como sinal distintivo, passa a ser o nome do cordeiro. O sinal compreendido, graças ao
qual a alma se reflete claramente numa idéia, é a palavra, li o que é a LINGUAGEM humana,
senão o conjunto de tais palavras?" (Werke, ed. Suphan, V, pp. 36-37). A principal objeção a essa
doutrina foi levantada pelos glossologistas: não é verdade que a origem de todas as raízes
lingüísticas seja onomatopaica. Nem na formação dos nomes dos animais, em que se poderia
presumir maior eficácia do princípio onomatopaico, ele tem realmente função dominante. Contra
ele encontramos ainda a objeção filosófica, oposta por Platão, de que uma coisa é a imitação de
um som e outra coisa é a imposição de um nome. Contudo, o princípio da onomatopéia foi muitas
vezes utilizado pelos glossologistas para explicar a formação das palavras originais nesta ou
naquela língua e sua distribuição em grupos distintos. O próprio Cassirer admite como primeira
fase da expressão lingüística uma etapa mimética, na qual "os sons parecem aproximar-se da
impressão sensorial e reproduzir sua diversidade com a maior fidelidade possível" (PhiLinguagem
der symbolischem Formen, 1923, 1, cap. 2, § 2).
c) A terceira forma da doutrina da naturalidade da LINGUAGEM considera-a como metáfora. As
teses características em que se expressa essa doutrina são as seguintes: 1- a LINGUAGEM não
é imitação, mas criação (o que distingue esta teoria da onomatopaica); 2a a criação lingüística
não leva a conceitos ou a termos gerais, mas a imagens, que são sempre individuais ou
particulares; 3a o que a criação lingüística expressa não é um fato objetivo ou racional, mas
subjetivo ou sentimental; e este é propriamente o objeto da linguagem. Com tais características,
essa teoria foi expressa pela primeira vez por Viço, para quem "o primeiro falar" não foi "um falar
segundo a natureza das coisas", mas "um falar fantástico para substâncias animadas, na maior
parte imaginadas divinas" (Scienza nuova, II, Da lógica poética). Os primeiros poetas, segundo
Viço, deram "os nomes às coisas a partir das idéias mais particulares e sensíveis, que são as
duas fontes, esta da metonímia e aquela da sinédoque" (Ibíd., Corolários acerca dos tropos, 2).
Conseqüentemente, os primeiros homens conceberam a idéia das coisas "por caracteres
fantásticos e mudos de substâncias animadas" e entenderam-se "com atos ou gestos que
tivessem relações naturais com as idéias (como, p. ex., ceifar três vezes ou mostrar três espigas
para significar três anos)". Segundo Viço, isso é facilmente observado na língua latina, "que
formou quase todas as palavras por transferências de naturezas, por propriedades naturais ou
por efeitos sensíveis", mas "geralmente a metáfora constitui o maior corpo das línguas em todas
as nações" (Ibíd., Corolários acerca dos tropos, 2). Essa teoria é expressa de modo bem mais
imaginosa por Hamann, para quem a L, que é ''o órgão e o critério da razão", não é uma simples
coleção de signos, mas "o símbolo e a revelação da própria vida divina" (Schriften, II, 19, 207,
216). No séc. XIX a teoria da metáfora, mesmo sem a postura metafísica ou teológica com que
aparece em Hamann, é a característica comum das doutrinas que foram chamadas do din-don,
pelo caráter ressonante da natureza humana. Assim, Max Müller afirmava que a LINGUAGEM é o
produto de uma "faculdade criativa que dá a cada impressão, na maneira como penetra pela
primeira vez no cérebro, uma expressão fonética", e que os fonemas assim criados sào depois
selecionados e combinados naturalmente através do processo histórico de formação da
LINGUAGEM (Lecture. cit., 9). O caráter metafórico da L, consistindo no recurso a termos
ambíguos ou equívocos, favorece (de acordo com esta teoria) a origem e a formação do mito.
Müller disse: "Na L humana é impossível exprimir idéias abstratas a não ser metaforicamente, e
não é exagero afirmar que todo o dicionário da religião antiga era composto por metáforas (...),
sendo pois uma fonte contínua cie equívocos, muitos dos quais consagrados na mitologia e na
religião do mundo antigo" (Contributions on the Science of Mythology, 1897, I, 68 ss.). Esti
conexão da LINGUAGEM com o mito já fora feita por Viço, que, ademais, não equiparam a
formação do mito a uma doença da LINGUAGEM As doutrinas modernas do mitoiv.) negam esta
equiparação, mas mantêm a conexão do mito com a L Fm sentido análogo, Croce estabeleceu a
conexão da LINGUAGEM com a arte em geraLinguagem Para ele, a LINGUAGEM tem natureza
fantástica ou metafórica, estando, pois, mais estreitamente ligada à poesia do que ã lógica. "O
homem" — afirma Croce — "fala a todo instante como o poeta, porque, assim como o poeta,
exprime suas impressões e seus sentimentos na forma que chamamos de conversação ou
familiar, e que não está separada por um abismo das outras formas que denominamos prosaicas,
prosaico-poéticas, narrativas, épicas, dialogadas, dramáticas, líricas, musicais, cantadas, e assim
por diante" (Breviario di estética, 1913, II). Contudo, há um abismo existente (e Croce afirma-o
mais tarde) entre a expressão poética, que aplaca e transfigura o sentimento (sendo por isso um
conhecer), e os outros tipos de expressão (sentimental ou prosaica), que, estreitamente
vinculados ao sentimento e á idéia, não realizam a transfiguração própria da expressão autêntica
e, portanto, nem podem chamar-se LINGUAGEM Para Croce, são apenas "sons articulados"
(Lapoesia, 1936, pp. 9 ss.). Essa conclusão, à qual Croce — não sem coerência — levou a teoria
em exame, mostra os limites dessa mesma teoria, que é incapaz de explicar a passagem da
LINGUAGEM metáfora para a LINGUAGEM conceituai, da LINGUAGEM que é grito, gesto ou
outro "caráter poético" (segundo a expressão de Viço) para a LINGUAGEM que é estrutura,
organização e regra.
d) A quarta forma é a da naturalidade da L, que a considera como expressão ou imagem da
essência ou do ser das coisas. Essa doutrina é bem antiga, pois sua primeira manifestação é a
teoria de Antístenes, segundo a qual "LINGUAGEM é aquilo que manifesta o que era ou é"
(DIÓG. L, VI, 1, 3). Os estóicos, por sua vez, afirmaram que "falar significa pronunciar um som
que significa o objeto pensado" (SKXTO EMPÍRICO, Adv. math., VIII, 80). A característica dessa
doutrina é que a atenção não se volta tanto para signos ou palavras, mas para suas conexões
sintáticas, para as regras de seu uso nas proposições e nos raciocínios, portanto para as
estruturas formais da LINGUAGEM A esta linha pertence propriamente a teoria que
denominamos de convencionalismo aparente ou coxo, segundo a qual os signos lingüísticos são
escolhidos arbitrariamente, mas seus modos de combinação não são arbitrários: são naturais e
necessários porque correspondem aos modos de combinação dos conceitos mentais, que, por
sua vez, correspondem aos modos de combinação das coisas. Essa teoria, desenvolvida por
Aristóteles, foi reproduzida várias vezes pelo empirismo moderno e contemporâneo (v. acima).
Nesta forma, caracteriza-se pela inserção, entre o signo lingüístico e a coisa, do conceito mental
através do qual o signo lingüístico, em seus modos de combinação, passa a participar da
necessidade objetiva das coisas. Fundamento análogo tem a afirmação da naturalidade da L,
feita por Fichte em Discursos à nação alemã (1808), em que se afirma que "existe uma lei
fundamental segundo a qual todo conceito assume um som através dos órgãos; um som que é
aquele e não outro" (IV, trad. it., Allason. p. 78), ou a afirmação de Hegel de que "a LINGUAGEM
confere ás sensações, intuições ou representações uma segunda existência superior à existência
imediata; uma existência universal, que tem vigor no domínio cia representação" (Ene, § 459).
Mas a tese da naturalidade da LINGUAGEM só foi retomada em sua forma rigorosa e, portanto,
em seus princípios clássicos, pela lógica matemática contemporânea. Esta de fato reafirmou o
princípio da correspondência termo a termo entre os signos lingüísticos e as coisas, princípio que
os cínicos expressaram dizendo que a LINGUAGEM é aquilo que manifesta o que uma coisa era
ou é. Este princípio, que faz da LINGUAGEM a reprodução pietórica da realidade ou, em geral, do
ser, foi inicialmente defendido por Russell, mas sua formulação mais rigorosa está em Tractalus
logico-philosophicus (1922) de Wittgenstein. O princípio era exposto por Russell da seguinte
forma: "Em toda proposição que podemos apreender (ou seja, não só aquelas cuja verdade ou
falsidade podemos julgar, mas todas as que pudermos imaginar), todos os constituintes são
realmente entidades das quais temos conhecimento direto" ("On Denoting", 1905, agora em Logic
and Knouiedge, 1956, p. 56; cf. Mysticism and Logic, 1918, pp. 219, 221; The Problema of
Philosophy, 1912, p. 91). Isso significa que a cada termo empregado nas proposições deve
corresponder um termo ou entidade objetiva da qual se tenha conhecimento direto
(acquaintance), ou que deve existir uma correspondência termo a termo entre os elementos que
entram na composição das proposições e as entidades de que se tem conhecimento direto.
Russell observa a propósito que "devemos atribuir um significado às palavras que usamos se
desejamos falar com algum significado e não por simples tagarelice, e o significado que
atribuímos às palavras deve ser algo do qual já tenhamos conhecimento" (Problems o/Pbii. p. 9D.
Esta é simplesmente a reexposição da tese de Antístenes. segundo a qual falar significa dizer
algo, mais precisamente algo que é. de tal forma que não é possível dizer o que não é;
acrescenta-se a isso que o que é, ou seja, as entidades correspondentes aos termos da L, deve
ser "diretamente conhecido". Russell baseava sua teoria da denotação nesse princípio: segundo
ela, "quando existe alguma coisa de que não temos conhecimento imediato, mas apenas uma
definição com frases denotantes. as proposições nas quais essa coisa é introduzida por meio de
uma frase denotante não contêm realmente a coisa como constituinte, mas os constituintes
expressos pelas diversas palavras da frase denotante" ("On Denoting", Ibid., pp. 55-6). Assim, p.
ex., como não temos experiência direta do espírito dos outros, se A 6 um desses espíritos, não
sabemos que "A possui esta e aquela propriedade", mas sabemos apenas que "Fulano de Tal
tem um espírito com esta ou aquela propriedade". Todavia, se pudesse haver uma LINGUAGEM
ideal, ela deveria conter unicamente elementos constitutivos últimos, de tal forma que nela "só
haveria uma palavra, e não mais de uma, para cada objeto simples, e as coisas que não fossem
simples seriam expressas por uma combinação de palavras, cada uma das quais ali representaria
uma coisa simples" ("The PhiLinguagem of Logical Atomism", Logic and Knowledge, pp. 197-98).
Segundo Russell, a LINGUAGEM de Principia mathematica visa a ser a LINGUAGEM dessa
espécie: nela só existe sintaxe, sem vocabulário (Ibid., p. 198). E isso a equipara à linguagem
proposta pelos doutos da Academia de Lagado, de que fala Swift em Viagens de Gulliver. a
proposta era abolir as palavras porque, "desde que as palavras são apenas nomes para as
coisas, seria mais cômodo as pessoas levarem consigo as coisas necessárias para expressar os
diversos assuntos sobre os quais pretendessem conversar". Por isso, aqueles sábios carregavam
sacos repletos de objetos e conversavam mostrando-se os objetos (Gullivefs Traveis, III. cap. 5).
O mesmo ideal foi expresso por Wittgenstein (primeira maneira) com fórmulas simples e precisas.
Eis algumas: "O nome significa o objeto: o objeto é o seu significado" ( Tractatus, 3.203). "A
configuração dos signos simples na proposição corresponde a configuração dos objetos na
situação" (Ibid., 3.21). "O nome 6 o representante do objeto na proposição" (Ibid.. 3.22).
Wittgenstein expressou com toda a clareza desejável o conceito de linguagem (que outro não é
senão "a totalidade das proposições". Ibid., 4.001) como representação pictórica do mundo. "A
primeira vista" — diz ele — "não parece que a proposição, assim como está, p. ex., impressa no
papel, seja uma imagem da realidade de que trata. Mas a notação musical, à primeira vista,
tampouco parece uma imagem da música, assim como nossa escritura fonética (em letras) não
parece uma imagem da nossa LINGUAGEM falada. No entanto, esses símbolos demonstram ser
— inclusive no sentido comum do termo — imagens daquilo que representam" (Ibid., 4.001). Boa
parte do empirismo lógico e. em geral, da filosofia contemporânea compartilha ou compartilhou
dessa doutrina da LINGUAGEM como imagem lógica do mundo. A objeção fundamental a ela foi
bem expressa por Max Black: "Não há motivo para a LINGUAGEM 'corresponder' ou 'assemelhar-
se' ao mundo', assim como não há motivo para assemelhar-se ao mundo o telescópio com que o
astrônomo o estuda" (Language and Philosophy, V, 4; trad. it., p. 173).
É interessante constatar que no outro extremo da filosofia contemporânea, o metafísico ou
ultrametafísico, tem-se conceito análogo da linguagem. Heiclegger certamente não admite a
correspondência termo a termo entre os elementos da LINGUAGEM e os elementos do ser, mas
afirma com a mesma veemência de Wittgenstein o caráter apofântico da LINGUAGEM em
relação à totalidade do ser. Nesse sentido, denominou a LINGUAGEM de "casa do ser". E
acrescentou: "Falar em casa do ser não significa absolutamente transferir a imagem da casa para
o ser; um dia, partindo de um pensamento adequado da essência do ser, será possível chegar a
compreender o que significam casa e habitar ("Brief über den Humanismus", em Platos Lehre von
der Wahrheit, 1947, p. 112). Em outros termos, a LINGUAGEM é a revelação imediata do ser, e o
homem tem acesso ao ser através da LINGUAGEM
3a A terceira doutrina fundamental da LINGUAGEM interpreta-a como um instrumento, como
produto de escolhas repetidas e repetíveis. Essa doutrina foi exposta pela primeira vez por
Platão. Diante das duas teses opostas — convencionalidade e naturalidade da LINGUAGEM —,
Platão evita decidir-se em favor de uma das duas. Em Crãtilo afirma: ''Gostaria que, na medida do
possível, os nomes fossem semelhantes às coisas, mas temo que — como diz Hermógenes —
essa atração da semelhança nos leve para um terreno escorregadio e, assim, seja necessário
lançar mão também de um meio mais grosseiro, que é a convenção, para certificar-nos da
exatidão dos nomes" (Crat, 435 c). Para Platão, os nomes dos números, p. ex., dificilmente
poderiam ser considerados naturais no sentido de serem semelhantes ao que indicam. Mas se
nem a convenção nem a natureza, ou seja, se nem a dessemelhança nem a semelhança entre a
palavra e a coisa constituem o significado, o que é então que o constitui? O uso. Platão diz: "Se o
uso não é uma convenção, seria melhor dizer que não é a semelhança a maneira como as
palavras significam, mas antes o uso: este, ao que parece, pode significar tanto por meio da
semelhança quando da dessemelhança" (Crat., 435 a-b). Platão expressou aqui uma tese
fundamental da lingüística moderna: é somente o emprego que estabelece, ou melhor, constitui o
significado das palavras. Mas essa tese pressupõe outra, do caráter instrumental da L, que Platão
expressou ao dizer que a LINGUAGEM é um instrumento e que, como todo instaimento, deve
ajustar-se ao seu objetivo (Crat, 387 a). Desse ponto de vista, o uso é a escolha repetida ou
convalidada que levou a forjar determinado instrumento lingüístico; e, assim como todos os outros
instrumentos, os lingüísticos também podem resultar mais ou menos perfeitos e adequados à sua
finalidade. Justifica-se assim aquilo que, para Platão, é a tese filosófica fundamental acerca da L:
a falibilidade da L, a possibilidade de dizer o que não é (Sof., 261 b). A característica comum das
duas doutrinas precedentes, como vimos, é a negação dessa tese. A tese do convencionalismo
nega que a LINGUAGEM possa incluir o erro porque uma convenção só pode ter o mesmo valor
de uma outra. A tese da naturalidade nega que a L possa incluir o erro porque deve reconhecer
que a LINGUAGEM representa, de qualquer forma, aquilo que é, estando portanto sempre no
campo da verdade. Ambas as teses excluem que a LINGUAGEM possa ser julgada ou que o
juízo sobre a correção tenha sentido. Ao contrário, a tese da LINGUAGEM como operação, uso,
escolha, inclui essa possibilidade, pois que vê nela o produto de operações destinadas a
constituir um instrumento eficaz e não considera infalível o sucesso dessas operações. O
fundamento objetivo dessa possibilidade é que "o discurso nasce da união recíproca das
espécies" (Sof, 259 d), e que as espécies não estão todas unidas nem todas desunidas, mas
algumas podem juntar-se e outras não. As possibilidades da L, portanto, são limitadas pelas
possibilidades de combinação das espécies ou formas do ser (Sof., 262 c).
Essa posição de Platão foi reproduzida por Leibniz: ''Sei que se costuma dizer nas escolas e em
todo lugar que os significados das palavras são arbitrários (ex instituto), e é verdade que não são
determinados por uma necessidade natural, mas são por força de razões naturais, nas quais o
acaso desempenha algum papel, e às vezes por razões morais, nas quais se inclui a escolha"
(Nouv. ess., III, 2, 1). Herder partia da mesma consideração preliminar e definia como abstração a
escolha que se faz de uma qualidade do objeto com a finalidade de darlhe um nome. "O homem
põe em ação a reflexão não só quando percebe vivida e claramente todas as qualidades de um
objeto, mas também quando pode reconhecer uma ou mais delas como qualidades distintivas.
(...) E com que meios efetua tal reconhecimento? Através da sua capacidade de abstração"
(Werke, ed. Suphan, V, p. 35). Foi a partir dessa tradição que Humboldt formulou a doutrina que
depois exerceria tanta influência sobre a moderna ciência da LINGUAGEM Desse ponto de vista,
a formação dos instrumentos lingüísticos é a formação de conexões, de symploké (como dizia
Platão); portanto, a LINGUAGEM não é um complexo atomístico de palavras, mas é discurso
organizado. Humboldt expressava claramente este conceito: 'Não podemos conceber que a
LINGUAGEM tenha início na designação dos objetos por meio de palavras e que proceda, num
segundo momento, à organização dessas palavras. Na realidade, o discurso não é composto por
palavras que o precedem, mas, ao contrário, as palavras se originam do discurso" ("Eínleítung
zum Kawi-Werk", Werke, VII, 1, pp. 72 ss.). Portanto, a comunicação não se realiza a partir da
palavra, mas das frases, e só estas são os instrumentos particulares que formam a LINGUAGEM
(Ibid., pp. 169 ss.). Essas idéias dominaram e continuam dominando a ciência da LINGUAGEM
Encontram-se incorporadas nos conceitos utilizados por essa ciência, como p. ex. o de fonema.
Fonema é "a unidade mínima dotada de características sonoras distintivas"; é, portanto, uma
unidade de significado, não de som (BLOOMFIELD, Language, 1933, 5. 4). Cada língua escolhe
seus fonemas, mas essa escolha não pode ser qualificada de "casual" ou "arbitrária", nem de
"natural" ou "necessária", porque uma escolha condiciona ou limita as outras, e cada grupo ou
série delas é condicionada pela exigência de eficácia comunicativa da LINGUAGEM Portanto, os
fonemas podem ser reduzidos a tipos, que a ciência da LINGUAGEM se propõe determinar. A
determinação desses tipos fornece o fundamento das escolhas que constituem as estruturas
fundamentais da LINGUAGEM e assim explica, até certo ponto, essas estruturas, sem justificar
sua perfeição ou sua infalibilidade. Na linguística contemporânea, a concepção de LINGUAGEM
como instRimento é defendida principalmente pelos funcionalistas, que consideram a
LINGUAGEM como "instrumento de comunicação", através do qual a experiência humana se
analisa em monemas que têm um conteúdo semântico ou uma forma fônica: "esta, por sua vez,
articula-se em unidades distintas e sucessivas, os fonemas, cuja natureza e cujas relações
variam de uma língua para outra" (MARTINET, A Functional Vieiv of Language, 1962, cap. I).
4- A quarta concepção da L, que denominamos de acaso, na realidade é uma especificação da
terceira, ou melhor, é uma perspectiva de estudo aberta pela terceira concepção. Essa
perspectiva é constituída pelo estudo estatístico da LINGUAGEM Sabe-se que as ações
individualmente mutáveis e imprevisíveis apresentam uniformidade e constância se consideradas
em grande número. Certamente não se pode prever se certa pessoa vai casar-se o ano que vem,
mas é possível prever com suficiente aproximação o número de pessoas que se casarão no
próximo ano, em determinada comunidade, com base em estatísticas dos últimos anos. Da
mesma forma, podem ser estudadas as freqüências estatísticas com que determinadas
expressões ocorrem numa comunidade suficientemente ampla para que possam ser fixadas
certas constantes estatísticas da LINGUAGEM e tomá-las como base para o estudo das
estruturas lingüísticas. Com certeza tal pesquisa estatística não é indispensável para o estudo
global da LINGUAGEM Também há outro método, de observação sociológica, no qual o
observador lingüístico, participando da vida de uma comunidade, pode descrever os usos
lingüísticos. Esse, aliás, é o método até agora mais adotado pelos glossologistas, que em raras
ocasiões, quase exclusivamente ao tratarem com obras literárias, recorreram ao método
estatístico. A propósito, pode-se lembrar a obra de Lutoslawski sobre o estilo de Platão (The
Origin and Groivth ofPlato's Logic, 1897), que conseguiu pôr em bases novas e mais seguras a
cronologia dos textos do filósofo. Mas hoje não faltam propostas para o uso sistemático do
método estatístico com vistas à solução de todos os problemas da lingüística estruturaLinguagem
G. Herdan diz a propósito: "Se considerarmos a língua como a soma dos signos lingüísticos mais
a probabilidade de que eles se repitam no discurso individual, portanto nos vários modos como o
evento sígnico pode ocorrer em conjunto com as relativas freqüências dos diferentes signos no
uso efetivo, a concepção corresponderá a todas as exigências daquilo que se chama população
estatística de tais eventos, ou seu universo estatístico. Cada enunciado individual (parole, na
terminologia de Saussure) serve de amostra dessa população" (Language as Choice and
Change, 1956, 1.3). Desse ponto de vista, se examinarmos textos diferentes de uma mesma
língua, descobriremos, por exemplo, que as freqüências relativas com que determinado fonema
foi empregado pelos escritores são mais ou menos as mesmas. Isso autoriza a considerá-las
como flutuações da probabilidade constante desse fonema naquela LINGUAGEM Isso significa
que o falante ou escritor obedece a leis aleatórias, e que só quando se consideram grandes
massas de formas lingüísticas é que se tem a impressão de determinação causai em seu uso. Em
outros termos, aqui estaria ocorrendo o que acontece na física, para a qual o determinismo
macroscópico é apenas o efeito de uma consideração em massa dos eventos microscópicos.
Para os defensores dessa concepção de L, portanto, aquilo que, do ponto de vista intuitivo,
aparece na LINGUAGEM como relação de causa e efeito (a determinação das escolhas
lingüísticas), do ponto de vista quantitativo é apenas acaso. Assim, segundo essa teoria, as
diferenças entre os textos não são explicadas pela intenção dos falantes ou pelo determinismo
causai, mas pelas leis estatísticas aleatórias (HERDAN, op. cit., 1.4; C. E. SHANNON e W.
WEAVKR, lhe Mathematical Iheory ofCommunication, Urbana, 1949).
Esse ponto cie vista, por um lado, possibilitou as pesquisas da gramática gerativa. que é "um
sistema cie regras que, de modo explícito e bem definido, atribuam descrições estruturais aos
enunciados" (CHOMSKY, Aspects of Theory ofSyntax, 1965, p. 8). Por outro lado, possibilitou o
uso de modelos (v. MODELO) que algumas vezes são considerados constituintes da própria
realidade sistemática cia LINGUAGEM (SAPIR, Language, 1921) e outras vezes constntctos, ou
seja, estruturas hipotéticas oportunamente construídas (RKVZIN, Models of Language. 1966, § 2).
V.
ESTRl i'1'l iKAS; ESTRl "TI IRAL1SMO.

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