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Ciência/Os Melhores Livros de 2017

Darwin no coração
das ciências humanas
José Eli da Veiga examina o debate sobre as possibilidades de
usar a teoria da evolução em outras esferas do conhecimento
Carlos Alberto Dória

José Eli da Veiga. Amor à ciência: ensaios O percurso do materialismo de Dar- adaptativas — cerne do materialismo cada pelo aparecimento de Evolução
sobre o materialismo darwiniano. win começa com o jovem atormen- darwiniano — não constitui uma con- em quatro dimensões, de Eva Jablonka,
Senac • 145 pp • R$ 59
tado pela ideia cristã da divindade jectura só aplicável ao reino orgâni- sobre as dimensões genética, epige-
criadora, até desembocar na perda co ou biológico”. Mas é só até aí que nética, comportamental e simbólica.
Não são poucas as vicissitudes do da fé, tornando-se, na segunda me- Veiga acompanha Patrick Tort, que o Jablonka propõe “uma visão muito di-
materialismo no mundo atual, e a tade da vida, “adepto integral do ce- surpreende “ao defender a existên- ferente do darwinismo quando se le-
história do darwinismo é um capítu- ticismo ou racionalismo”. Como o cia de uma consciência celular”; isto vam em conta esses quatro sistemas
lo dessa história. Na França, a pró- próprio Darwin dizia, ao discutir a é, ao dar uma solução inconvincen- de herança e as interações entre eles,
pria palavra tardou a conquistar o evolução do olho, se não fosse possí- te para “o desafio de entender a cons- pois mudanças induzidas e adquiri-
meio científico: referia-se à evolução vel demonstrar suas transformações, ciência. Afinal, essa também parece das também têm papéis na evolução.
como “transformismo” — termo que retornaríamos inevitavelmente ao ser a mais importante das questões As heranças epigenética, comporta-
remete diretamente a Lamarck, não “problema de Paley”, isto é, à teologia sobre as quais discordam os atuais mental e simbólica também fornecem
a Darwin. Na mesma onda de incom- natural de Willian Paley. Mas, num adeptos do materialismo darwiniano”. variações sobre as quais pode atuar a
preensão, também na França surgiu sentido oposto, o mundo estava há O segundo ensaio do livro Veiga de- seleção natural”, avalia Veiga.
o malfadado “darwinismo social” — um bom tempo esperando pelo ma- dica ao estudo da relação entre o dar- No penúltimo ensaio, o autor apos-
ideologia na qual falta exatamente o terialismo de Darwin, como sugerem winismo e as humanidades, na sua ta na rejeição da possibilidade de
pensamento de Darwin. palavras proféticas de Kant, em 1790, “pré-história” e especialmente sua his- uma “unificação ontológica das ciên-
E talvez essa “ausência de Darwin” ao observar que nos faltava um novo tória nos últimos quarenta anos. Tra- cias”, apesar da “notável aproxima-
tenha nos contaminado, por obra e Newton que explicasse o mecanismo ta-se de uma resenha difícil, se con- ção epistemológica entre algumas”,
graça da missão francesa que este- através do qual a natureza se trans- siderarmos que a simples busca da promovida pelo materialismo darwi-
ve na origem da Universidade de São formava sem qualquer finalidade. Ele palavra darwinism na internet retor- niano. Já no último (“Dialética, com-
Paulo: Darwin sempre foi, ali, uma surgiria quase oitenta anos depois. plexidade e emergência”), o autor se
ausência eloquente nas ciências so- A descoberta do mecanismo da sele- demora na análise dos usos da dialé-
ciais. Acrescente-se o eclipse progres- ção natural levou Darwin a explicar a tica de Hegel e Marx, sua complexi-
sivo que sofreu o ensino do marxismo, “economia da natureza” em termos da O livro tem o mérito dade e má sorte sob o regime stalinis-
de sorte que o materialismo pratica- “tendência de os organismos descen- ta, onde especialmente a genética foi
mente desapareceu do meio acadê- dentes de uma mesma origem diver- indiscutível de tirar os banida pela figura abjeta de Lyssenko.
mico. Em novo livro, o professor de girem em seu caráter, à medida que cientistas sociais da zona O que já era um mau entendimento
economia José Eli da Veiga traz, como se modificam”, sem que ele ainda co- de conforto em que se de Marx sobre Darwin tornou-se uma
mensagem, a possibilidade de restau- nhecesse o que viria a ser a genética. impossibilidade de desenvolvimento
rar o materialismo via Darwin. Essa ideia tão impactante — afinal, ex- colocaram ao jogar o científico. Substituiu-a, na visão de
Ele lança um pequeno livro — Amor pulsara Deus do coração da natureza materialismo na lata de lixo Veiga, a teoria da complexidade, tra-
à ciência — baseado em extensa bi- — foi extrapolada para o caso da hu- zendo fenômenos naturais “para o
bliografia e voltado a quebrar essa manidade, especialmente por evolu- contexto das propriedades altamen-
tradição, ao se concentrar no mate- cionistas como Herbert Spencer. te genéricas de sistemas que se mo-
rialismo darwiniano e seus desdo- na com 830 mil resultados e darwin’s dificam com o tempo”, como as teo-
bramentos nas ciências humanas, Segunda revolução theory, com quase 1 milhão! rias da catástrofe e do caos e a noção
procurando situá-lo como raiz de Seguindo o epistemólogo Patrick Para a “pré-história”, Veiga segue de emergência. Nessa última, vê o au-
todo materialismo moderno. E o faz Tort, o autor expõe como a “segun- autores clássicos, como Ernst Mayr, e tor a chance de um caminho de vol-
atualizando o debate sobre o modo da revolução” darwiniana parte de talvez falhe ao não se deter na acusa- ta a Marx, quando este se aprofunda
como se deu na França dos anos 80 outro pressuposto: a seleção natu- ção de outros historiadores da biologia, nos estudos sobre o funcionamen-
em diante, a partir do novo enten- ral não transforma o homem da mes- como Peter Bowler, segundo os quais to da economia capitalista e identifi-
dimento da contribuição de Darwin ma maneira que aos outros animais; Mayr traça uma história do darwinis- ca ao menos três tipos de oposição na
nos termos de duas revoluções teó- uma vez “pronto” fisicamente, sele- mo que converge para ele mesmo e origem de processos: revolucionários,
ricas: uma, relativa à descoberta do ciona os instintos sociais que favore- seus companheiros de geração. No que ondulatórios e embrionários.
mecanismo da seleção natural; outra, cem as práticas solidárias, originando se refere aos últimos quarenta anos, Livro complexo de divulgação do
que decorre da “antropologia de Dar- a civilização. Ao selecionar esses ins- Veiga contempla movimentos parale- materialismo darwiniano, Amor à
win” contida em A descendência do ho- tintos, institui um mecanismo reverso los e independentes que surgem após ciência tem o mérito indiscutível de
mem (1871). Este segundo aspecto é que controla a seleção natural (e, por- a consolidação da “síntese moderna”, tirar os cientistas sociais da zona de
bastante relevante: afinal de contas, tanto, a eliminação dos menos aptos) isto é, a convergência entre genética conforto em que se colocaram ao jo-
o mundo acadêmico brasileiro ainda para dar lugar a práticas solidaristas e evolução, conforme pioneiramente gar o materialismo — darwiniano e
não acordou para essa antropologia. (que respondem pela medicina como fez Theodosius Dobzhansky, em 1937. marxista — na lata de lixo da histó-
São quatro ensaios, nos quais Vei- forma de preservar a vida humana Interessa-o a sociobiologia humana, a ria das ideias. Para o autor, “o amor à
ga apresenta rapidamente o que en- em risco). “A nova vantagem adap- psicologia evolucionista, a antropolo- ciência também levou Darwin a lan-
tende por materialismo para, em se- tativa deixa de ser de ordem biológi- gia e o estudo de populações, a memé- çar princípios para uma antropologia
guida, demorar-se um pouco mais no ca, pois se torna social”, resume Veiga. tica, a economia e o mercado etc. básica de qualquer materialismo his-
materialismo darwiniano e avançar Assim, estamos diante do fato de Veiga termina esse passeio históri- tórico. Daí decorre que “não poderá
por temas que se desdobram a partir que “a ideia geral sobre variações se- co detendo-se em controvérsias pos- haver materialismo científico que não
dele. Não é um livro de leitura fácil. lecionadas devido a suas vantagens teriores a 2005. Uma delas, provo- seja, antes de tudo, darwiniano”.

24 Quatro cinco um dezembro 2017

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