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Rovisco
10.09.2017 às 19h00 - EXPRESSO
RUI GUSTAVO
Protesto. Aceitou o troféu Garrett para o melhor dramaturgo, mas recusou os 300
contos do prémio. O protesto encenado no Teatro Nacional Dona Maria II seria o seu
único grande êxito
FOTO ARQUIVO GESCO
Numa das muitas cartas que trocou com Mário Viegas e que o
ator, também já desaparecido, publicou na “Auto-photo
Biografia (Não Autorizada)”, Rovisco avisa que “a carta lhe será
de leitura desagradável, como está a ser escrevê-la”. Critica a
encenação que transformou “uma farsa numa comédia” e pôs as
pessoas “a rirem em vez de pensarem” e conta a história de um
pintor que conseguiu que uma importante galeria “expusesse
um quadro no lugar mais importante” do espaço mas estragou
tudo quando “pendurou o quadro ao contrário”. Viegas resume
a zanga num comentário manuscrito que também publicou na
autobiografia: “O Rovisco não aguentou ver a sua peça em cena
e bebia, bebia todas as noites. Perdão, Nuno.” Ainda assim,
considerava “um crime não se publicar a sua obra” e confessava
que a morte do amigo foi “um dos maiores choques” que sofreu.
“Acho que o Rovisco estava apaixonado por mim, embora não
tenha a menor prova que fosse homossexual.”
“O ambiente que se criava à volta dele não era bom. Não sei se
era culpa dele ou dos outros, mas havia uma energia estranha.
Nunca percebi porquê”, conta Carmen Dolores. “Cobardias” é
entregue ao realizador veterano Herlânder Peyroteo, que faz as
alterações que julga necessárias. Rovisco discorda, discute e
desaparece de cena. “Apareceu no ensaio e nunca mais o
vimos”, conta Carmen Dolores. “Odiou tudo”, confirma a irmã.
ESCRITO NA ÁGUA
O que Miguel Rovisco deixou “não ficou escrito na pedra”, mas
sim “na água”. A metáfora é de José Mendes, jornalista do
Expresso que escreveu em fevereiro de 88 sobre a segunda vida
de Miguel Rovisco no palco do Dona Maria II. A encenação da
“Trilogia Portuguesa” seria entregue a Norberto Barroca,
convidado quando Rovisco ainda era vivo. “Já depois de ter
aceitado o convite do diretor do teatro e quando quis reunir com
o autor, soube pelo jornal que se suicidou”, escreveu o
encenador num diário que faz parte de uma tese de
doutoramento sobre Miguel Rovisco da professora da
universidade de São Paulo, Virgínia de Jesus.
JOSÉ CARIA
Família. Aos 5 anos com a irmã, Graça, e a mãe, Maria José. Miguel Rovisco viveu
sempre com a mãe numa casa nas Amoreiras. Quando se matou, deixou-lhe uma
carta a garantir que “partia tranquilo”. Escrevia tudo, cartas, peças e poemas numa
máquina Hermes Baby que ainda está na posse da família. Os oito volumes de
poesia que continuam por editar estiveram quase trinta anos à guarda da escritora
Yvette K. Centeno. Agora estão nas mãos do poeta António Carlos Cortez
LUÍS BARRA