Documenti di Didattica
Documenti di Professioni
Documenti di Cultura
Várias publicações apontam o engenheiro americano John Gordon como o primeiro a olhar
para as areias das praias do sul da Bahia e perceber uma diferença de coloração com relação
a outros lugares do litoral.
Gordon, funcionário da empresa britânica de exportação de café Edward Johnston & Co.,
recolheu amostras da areia e as enviou para o professor francês Henrique Gorceix, fundador
e então diretor da conceituada Escola de Minas de Ouro Preto. Após análise, Gorceix
informou em relatório que as areias continham algum tipo de minério, mas desconhecia
qualquer uso industrial.
De posse do relatório, John Gordon foi a Europa procurar interessados em comprar o tal
mineral brasileiro e encontrou o austríaco Carl Auer von Welsbach, criador de um sistema
de lâmpadas incandescentes a gás que iluminou a Europa durante vários anos. Ele
descobriu que o óxido de tório era o melhor material para produzir uma luz forte e
duradoura, e encontrou em John Gordon o grande vendedor de areia.
Enquanto a iluminação elétrica ainda dava os primeiros passos na Europa, tanto a Auer
Light quanto diversas outras empresas europeias que fabricavam luminárias a gás passaram
a encomendar areia monazítica para a retirada do tório. Na época, a maior parte da areia era
extraída no balneário de Cumuruxatiba, na região de Prado, Sul da Bahia.
A reportagem do Gazeta Online encontrou registros de jornais brasileiros que relatam, entre
1880 e 1910, atos do Poder Executivo brasileiro concedendo a John Gordon inúmeras
porções de terra com areia monazítica. Há registros também de acusações contra o
americano por ter subornado governantes e tomado terras de outros homens, sobretudo no
Sul da Bahia. Para convencer o governo de que sua proposta era vantajosa, ele alegava que
as areias eram um bem infinito, com grande potencial de exploração e sem grandes
impactos à natureza. Seja por má-fé ou falta de conhecimento técnico, as autoridades
brasileiras acabaram aceitando as propostas de Gordon, que pagava menos pela posse das
terras do que os antigos donos. Ele também ficou milionário com a exploração.
AREIA CAPIXABA
A areia monazítica de Guarapari só foi descoberta em 1898 e, oito ano depois, foi instalada
a empresa franco-brasileira Société Minière Industrielle Franco-Brasilienne.
A “Minière”, que funcionava à beira do porto de Guarapari – onde hoje existe uma praça –
retirava areia monazítica da praia e do fundo do mar e separava, através de eletroímãs e
lavagem, a monazita (dourada), a ilmenita (preta), a zirconita (cinza) e a granada
(vermelha). O material era ensacado e carregado em navios com destino à França.
CONTRABANDO E “TESTAS-DE-FERRO”
Os navios Mercator e Fijord foram presença fiel no porto de Guarapari durante as várias
décadas de exploração da areia monazítica. O jornal carioca Última Hora, em reportagem
sobre a extração ilegal das areias em 1948, conversou com moradores de Guarapari que
confirmaram que as duas embarcações, a primeira de bandeira sueca e a segunda
norueguesa, aportavam regularmente no cais e eram carregados com sacos de areia
monazítica sem qualquer fiscalização.
Além disso, a areia que seguia para a Europa e Estados Unidos eram declaradas a preços
três vezes mais baixos do que o praticado pelo mercado internacional. No início do século
XX, o quilo do nitrato de tório era vendido a US$ 500 nos Estados Unidos. Com a areia
brasileira clandestina, o preço caiu drasticamente.
Passados 70 anos do fim da Segunda Guerra Mundial, não há documentos que comprovem
que a areia monazítica de Guarapari e de outras regiões brasileiras foi usada
especificamente nas bombas lançada sobre Hiroshima e Nagasaki. Pelo contrário: sobre
esse assunto restam mais provas contrárias, uma vez que o elemento base da bomba
batizada de Little Boy era o Urânio-235 (U-235), e não o U-233 gerado a partir do tório das
areias. Já a bomba que caiu sobre Nagasaki tinha como base o Plutônio.
O envio – clandestino ou oficial – perdurou fortemente por pelo menos mais 15 anos. O
fato é que o Urânio-233 ganhou destaque em um projeto de pesquisas em armas nucleares,
batizado de Operação Teapot. Ao todo, 14 bombas foram lançadas em pontos do deserto de
Nevada, nos EUA, sendo que algumas tinham como base o U-233, combinado com
Plutônio. Tudo documentado pelo exército, com fotos e vídeos. O total de bombas
desenvolvidas durante o projeto, porém, é desconhecido.
https://www.youtube.com/watch?v=xvfwv-LYl9k
Teste com bomba de U-233 durante a Operação Teapot, 1955.
Todas as fotos desta galeria pertencem ao Departamento de Estado norte-americano
Teste com bomba de U-233 durante a Operação Teapot, 1955
Observadores acompanham o lançamento de bomba no deserto de Nevada
Destroços analisados após queda de bomba-teste em Nevada, 1955
Teste com bomba de U-233 durante a Operação Teapot, 1955
Almirante Álvaro Alberto (ao centro), primeiro representante brasileiro na Comissão de
Energia Nuclear da ONU e fundador do CNPq, defendia o intercâmbio de conhecimento
atômico com outros países, ideia fortemente combatida pelo governo americano.
A questão nuclear brasileira começou no primeiro governo Vargas e refletiu durante muitos
anos o papel do Brasil como exportador de matérias primas em detrimento do
desenvolvimento de produtos e tecnologias.
Apesar do potencial nuclear das areias monazíticas de Guarapari ter sido descoberto por
volta de 1890 por empresas estrangeiras, foi apenas em 1940 que o governo brasileiro
começou a voltar a atenção para os recursos nucleares do país.
Neste ano foi firmado com os EUA um Programa de Cooperação para a Prospecção de
Recursos Minerais que possibilitou a identificação de depósitos de areias monazíticas
localizados entre São Francisco de Itabapoana (RJ) e Guarapari (ES).
Em 1945, foi assinado o primeiro acordo com os Estados Unidos, que previa um
fornecimento de 5.000 toneladas anuais de monazita e que poderia ser prorrogável por até
dez vezes. Três anos depois, o Conselho de Segurança Nacional denunciou o acordo
alegando que não havia nenhum retorno de benefício claro dos EUA em troca da monazita.
As exportações foram interrompidas demonstrando o primeiro ato de preocupação do
governo visando resguardar as matérias-primas nucleares existentes no solo brasileiro.
A Lei 1.310 de 1951, que criou o Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq), estabeleceu o
monopólio estatal dos principais minérios atômicos, proibindo a exportação de urânio e
tório, a não ser por autorização expressa do governo.
O CNPq, através do almirante Álvaro Alberto, propunha uma política nacional de energia
nuclear com planos de produção de urânio enriquecido, construção de reatores e busca de
apoio científico e tecnológico em outros países além dos Estados Unidos. Os detalhes do
acordo foram descritos pelo pesquisador Kurt Rudolf Mirow, no livro “Loucura nuclear: os
enganos do Acordo Nuclear Brasil Alemanha”.
Para o CNPq, o material radioativo só poderia ser exportado caso houvesse uma
compensação específica: o material seria trocado por conhecimento tecnológico para a
criação de reatores nucleares. No entanto, essa demanda ia contra a Lei McMahon dos
Estados Unidos, que protegia todos os conhecimentos associados à energia nuclear.
O almirante passou, então, a procurar e propor acordos com outros países que fossem mais
vantajosos para o Brasil. Ele defendia, notadamente, uma cooperação com a República
Federal da Alemanha, que estava pesquisando uma maneira alternativa de enriquecimento
de urânio.
Assim, foi feito um acordo secreto com a Alemanha para instalação de três equipamentos
de enriquecimento de urânio no Brasil, apesar da eficácia do método pesquisado pelos
alemães estar longe de ser comprovada.
A Constituição de 1988 havia proibido o país de usar a tecnologia nuclear para fins bélicos,
mas o “esforço paralelo” dos militares sobreviveu até 1990, segundo confirmou mais tarde
José Carlos Santana, ex-presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear no governo
Collor.
Para Marcos Tadeu, físico e pesquisador das areias monazíticas de Guarapari, o tório
capixaba chegou a ser usado nesse esforço paralelo dos militares, mas se provou pouco
eficaz e foi abandonado alguns anos depois.
A suspeita de que o Brasil trabalhava secretamente em uma ogiva nuclear tornou-se mais
intensa na segunda metade da década de 1980. Uma série de reportagens da mídia nacional
revelou aspectos secretos do programa atômico. Isso só fez aumentar os rumores sobre um
possível teste nuclear brasileiro.
A maior comprovação do esforço para criação de uma ogiva nuclear, porém, só veio no
final dos anos 80. O jornal Folha de São Paulo expôs a construção de instalações
subterrâneas que “se prestam a testes nucleares diversos” na Serra do Cachimbo, no Sul do
Pará. A área era militar, delimitada por decreto durante o governo Geisel. Na época o
presidente José Sarney negou que o espaço fosse utilizado para esses fins.
Pouco depois, ele jogou uma simbólica pá de cal num poço de 320 m para testes nucleares e
ordenou sua destruição.
A Nuclemon continuou extraindo areia monazítica e beneficiando seus derivados por mais
de 20 anos, até a década de 80, quando uma nova campanha capitaneada pelo então prefeito
de Guarapari, Graciano Espíndula, propunha o fim definitivo da exploração da areia na
cidade e mais investimentos em turismo e infraestrutura, tornando o balneário atrativo para
tratamento de pessoas com diversas doenças, sobretudo reumáticas. “Se Cleveland (EUA) é
a referência mundial em cardiologia, Guarapari será referência em reumatologia”, declarou
o prefeito em maio de 1983, em entrevista ao jornal A Gazeta.
O prefeito de Guarapari, Graciano Espíndula, concede entrevista em 1983 ao jornal A
Gazeta, dando sua versão da briga judicial travada pelo fim da exploração de areia na
cidade. Entrevista à repórter Maura Fraga. Foto: Helô Santana
O próprio prefeito lembrou que uma história de infância o marcou profundamente e serviu
como estímulo para entrar na briga contra a exploração da areia na cidade. “Lembro-me
que vi um homem completamente paralítico descer de um barco e sendo transportado para
o outro lado da cidade, quando ainda não havia a ponte de Guarapari. Depois descobri que
se tratava do secretário de Estado de Minas Gerais, vítima de reumatismo crônico, em
busca da cura nas areias monazíticas. Ele estivera na Europa para tratamento, sem
resultado. Meses depois, vindo da escola, vi aquele homem descer de um bonde, aqui
mesmo em Vitória, sem a ajuda de ninguém, e seguir rua afora. Essa imagem ficou gravada
na minha memória”, declarou Graciano, que se julgava um profundo interessado nas
propriedades medicinais das areias da cidade e era, por muitos, taxado de sonhador.
Por outro lado, a continuação das atividades da Nuclemon deixava grandes buracos pela
cidade e incomodava autoridades e moradores. A areia extraída na cidade era enviada para
uma usina em São Paulo, de onde se retirava diversos elementos para fabricação industrial,
de eletrodos a fibras de vidro, indústria de lentes, de televisores, além do próprio tório, de
interesse da Comissão Nacional de Energia Nuclear.
NA JUSTIÇA
O caso foi parar na Justiça Federal após a denuncia da prefeitura de que a a Nuclemon
estava extraindo areia em terrenos ilegais e destruindo trechos da Rodovia do Sol e de
praias onde a exploração já havia sido embargada por leis do próprio município, como
Areia Preta, Praia dos Namorados e Praia do Morro.
Diante da batalha judicial, a Nuclebrás alegou que o trabalho em Guarapari era estratégico
para os interesses nacionais, uma vez que somente a cidade capixaba era responsável por
20% de toda a produção de minerais pesados do Brasil. A empresa conquistou o direito de
seguir explorando as areias de Guarapari por mais três anos, encerrando suas atividades de
uma vez por todas em 1986.
A partir daí, o município consolidou seu lema de “Cidade-Saúde” e passou a receber cada
vez mais turistas interessados nas areias medicinais. As praias se urbanizaram e a estrutura
hoteleira melhorou. A cidade incrementou sua vocação turística e hoje chega a receber mais
de um milhão de visitantes durante o verão. Talvez parte de um sonho idealizado pelo
médico Antônio da Silva Mello a partir de 1930, de que aquela antiga vila de pescadores
guardava um tesouro para a medicina e para a cura de milhões de pessoas por meio de suas
areias radioativas.
Nos arquivos público franceses, mais de 210 documentos entre cartas, pedidos de material e
recibos ligam a Société Minière Industrielle Franco- Brésilienne, precursora da Mibra, em
Guarapari, a diversos laboratórios franceses e alemães.
A maioria dos contatos são de compra, venda e aluguel de tubos de Tório entre a empresa e
o Institut du Radium, laboratório presidido pela ganhadora do prêmio Nobel de Química,
Marie Curie. Ela e o marido, Pierre, foram responsáveis pela descoberta da radioatividade e
por ter dedicado a vida às pesquisas sobre o uso terapêutico dos materiais radioativos.
Segundo o estudo “Marie Curie and the Radium industry” do pesquisador Xavier Roqué, a
partir de 1903 o uso na medicina de materiais radioativos foi popularizado na França, o que
fez aparecer um mercado de extração de materiais radioativos pelo mundo. O material era
usado em centros de tratamento de câncer tanto em Paris quanto em outras cidades. Na
capital Francesa, a Société Minière et Industrielle Franco-Brésilienne mantinha um
escritório no número 20 do boulevard Montmartre, e uma usina de tratamento de tório e
outos materiais radioativos na cidade de Clichy. Por questões de segurança, nos anos 80, a
usina foi demolida e enterrada pelo governo francês.
Marie Curie visitou o Brasil em 1926, atraída pela fama das águas radioativas do Termas de
Lindóia, em São Paulo. Na época, o local já era conhecido como terapêutico. Curie visitou
o local durante um dia.
A visita às terras brasileiras, no total, durou mais de 40 dias. Madame Curie esteve em São
Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, onde visitou o primeiro hospital brasileiro
especializado em tratamento de câncer com uso de radiação. Marie Curie faleceu em 1934,
depois de muitos problemas de saúde, provavelmente em razão da contínua exposição à
radiação.
Afinal, o que teria acontecido com as toneladas e mais toneladas de tório exportados para
os Estados Unidos principalmente durante a Guerra Fria? No final das contas, o que restou
delas agora é encarado como problema de segurança nacional e opinião pública.
A iniciativa, com custo estimado de 500 milhões de dólares, mobiliza a opinião pública
nacional e sobretudo da população de Nevada, sendo alvo constante de protestos de
ativistas. No entanto, testes para o transporte foram iniciados em maio de 2015, e o envio
pode acontecer a qualquer momento. O urânio-233 armazenado é considerado de “baixo
nível de risco” pelas autoridades americanas.
Algumas correntes chegam a especular sobre o perigo desse material radioativo nas mãos
de nações ou grupos com interesses bélicos. Outros cientistas defendem a teoria de que
reatores de tório podem ser soluções viáveis para a geração de energia elétrica atualmente.
De qualquer modo, a constatação de que toneladas e mais toneladas de areia exportada
durante décadas acabam por se tornar um problema envolvendo latinhas de lixo radioativo
é, no mínimo, curiosa.
EM CHICAGO, AREIA FOI USADA EM ATERRAMENTOS
Vista da região de Streeterville, a oeste de Chicago, onde boa parte do bairro foi aterrado
com areia monazítica ao longo do século XX. Foto; Matt Howry / Flickr / creative
commons
Sede da Lindsay Light & Co, a maior compradora norte-americana da areia monazítica
capixaba, a cidade de Chicago também vive hoje um impasse em relação ao que sobrou da
matéria prima usada pela empresa, que utilizou o tório primeiramente para fabricação de
lâmpadas e, mais tarde, foi a principal fornecedora do material para os projetos secretos de
construção de bombas atômicas.
Reportagens de diversos jornais de Chicago nos últimos anos relatam que, após feita a
separação do tório, a areia que sobrava era vendida para utilização em aterros. Assim, a
região de Streeterville, fortemente industrializada na época, recebeu toneladas de aterro
radioativo para construção de novos prédios e fábricas. Ninguém sabe exatamente quando a
venda da sobre de areia foi encerrada pela Lindsay Light, mas o bairro passa atualmente por
uma modernização e a construção de novos edifícios residenciais, hotéis e condomínios de
luxo levanta o risco à saúde ao se revirar a areia radioativa.
Local onde foram depositadas toneladas de areia pela Lindsay Light Co, a maior
compradora da areia brasileira. Foto: Illinois Emergency Management Agency
Em uma década, uma ação para retirar a areia contaminada retirou 13.500 toneladas do
material de diversos terrenos de Chicago. A areia é enviada para um aterro licenciado a
trabalhar com resíduos radioativos, em Utah. As multinacionais que assumiram o controle
da Lindsay Light fizeram acordos com a Justiça e se comprometeram a injetar recursos para
auxiliar na limpeza desses terrenos. O custo para retirada de toda a areia é estimado em
US$ 121 milhões. A estimativa de governantes é de que quase 150 mil toneladas dessa
areia foram despejados em terrenos a oeste de Chicago. Não é difícil presumir que grande
parte do polêmico material enterrado em Chicago tenha sido retirado de Guarapari. Em seu
depoimento à CPI da Energia Atômica, Boris Davidovitch havia declarado que o principal
cliente da Mibra era justamente a Lindsay Light, da qual o próprio Boris possuía
participação acionária.
Mais de 600 casas cujo solo foi aterrado com restos industriais de monazita e tório tiveram
de ser limpas ao longo da década passada. Algumas foram desocupadas para a retirada do
solo contaminado. A limpeza residencial já foi concluída em Chicago, de acordo com o
governo local. Foto: Illinois Emergency Management Agency
Pelo menos seis regiões de Chicago, inclusive residenciais, receberam a areia para aterro.
Uma área utilizada pela Lindsay Light ficou conhecida como “montanha de tório” pela
grande quantidade de material concentrado. Apesar de boa parte da limpeza já ter sido
efetuada, o impasse agora fica por conta do destino do lixo industrial, e não apenas em
Chicago: assim como a Lindsay Light, estima-se que pelo menos outras 15 indústrias
atuaram na produção de mantas de tório para lâmpadas em diversos Estados americanos, e
tenham comprado, em quantidades desconhecidas, areia monazítica no período entre 1900 e
1930.
O grande volume de areia aterrada em Chicago também sugere que a quantidade exportada
pelo Brasil é realmente maior do que as 100 mil toneladas declaradas oficialmente. Em
1950, reportagem do jornal Chicago Tribune detalhava a preocupação do setor industrial
norte-americano com a possibilidade de uma lei brasileira proibir a exportação de monazita
a partir do ano seguinte. Ouvido pela reportagem, Charles Lindsay, proprietário da Lindsay
Light, detalhou que havia uma grande corrida pela monazita por conta dos projetos
atômicos americanos. Ele alegou que o governo brasileiro estaria fazendo pressão para que
Lindsay instalasse uma fábrica no Brasil para tratamento do tório. Ele também declarou ao
jornal que “mantinha um grande estoque de areia monazítica nos Estados Unidos”, sem
citar, porém, a quantidade.
1. Foi na época de bastante movimento no porto de Guarapari que foram criados os
hotéis Torium, Radium e Monazita. O Radium foi um casino muito frequentado na
década de XX, e símbolo de ostentação da classe mais abastada do Espírito Santo.
Hoje está desativado.
2. Boris Davidovitch é nome de rua na Praia do Morro, em Guarapari, exatamente a
mesma onde funcionava a antiga Inaremo. Não é possível precisar a data exata da
criação da lei, na Câmara dos Vereadores da cidade, que dá à rua o nome do
empresário russo
3. Augusto Frederido Schmidt, além de proprietário da Orquima, que explorava areia
no Norte do Espírito Santo, foi um grande empresário paulista, criador de uma rede
de supermercado e firmas industriais. Ele também é criador do famoso slogan “50
anos em 5”, usado na campanha de Juscelino Kubitschek para a construção de
Brasília. No entanto, o fato mais curioso é que Schmidt é um dos poetas mais
conhecidos da segunda geração do Modernismo brasileiro, com três livros
publicados. Assim como Boris Davidovitch, morreu após um infarto fulminante.
4. O problema da exploração ilegal de areia monazítica também foi denunciado pela
imprensa da Índia, sobretudo por volta de 1990. Reportagens de diversos jornais
relatavam que empresas escondiam o volume de areia retirado, exportava sem
autorização e causava impacto a comunidades em volta das áreas com maior volume
de areia monazítica.
5. A Índia, aliás, que desde o fim da Segunda Guerra Mundial havia proibido a
exportação de terras raras, trabalha atualmente em um reator de tório para geração
de energia. A tecnologia também é visada por países como China e Irã. A previsão é
de que o reator indiano entre em operação a partir de 2018.
6. Em 2013, o Brasil negociou a venda de 16 mil toneladas de Torta II, resíduo
radioativo proveniente do tratamento químico da areia monazítica. O comprador foi
uma empresa de Taiwan chamada Global Green, que domina técnicas para extrair
terras raras desse tipo de resíduo. A alegação na época é de que o Brasil não possui
tecnologia para fazer essa extração. O estoque ficava situado na cidade mineira de
Caldas. De acordo com as Indústrias Nucleares do Brasil (INB), o material é
estocado desde 1940.
Robert Alvarez (2013): Managing the Uranium-233 Stockpile of the United States,
Science & Global Security: The Technical Basis for Arms Control, Disarmament,
and Nonproliferation Initiatives, 21:1, 53-69; disponível online
Depoimento de Boris Davidovitch à CPI da Energia Atômica de 1956, Diário do
Congresso Nacional, 30 de outubro de 1956, disponível online
Uranium Substitute Is No Longer Needed, but Its Disposal May Pose Security Risk,
New York Times, 23 de setembro de 2012, disponível online
U-233 Disposition Project Update, Departamento de Segurança dos Estados Unidos,
2011, slides disponíveis clicando aqui
A Física Atômica no Brasil: da questão das areias monazíticas à CPI de 1956. Mário
Fabrício Fleury
Especial Município A Gazeta -Guarapari – 26 set 1994
A bomba atômica dos militares – Revista Aventuras na História, publicado em
17/8/2011
Instrumentation Between Science, State and Industry – edited by Bernward Joerges,
Terry Shinn, 2001
Guarapari, muito mais que um sonho lindo. Beatriz Bueno, 2012
“Testes são possíveis há dois anos”, Folha de S.Paulo, São Paulo, 10 de agosto de
1986
“A bomba atômica no porão”, Veja, São Paulo, n. 792, abril de 1987
“Na cerimônia e nas ruas, átomos de discórdia”, Folha de S.Paulo, São Paulo, 9 de
abril 1988
Mineração: Guerra pelas terras raras, Unesp, 09/04/2012
A política nuclear brasileira entre 1945-1964. Fabiano Farias de Souza (UERJ)
“Serra do Cachimbo pode ser local de provas nucleares”, 08/Agosto/1986, Folha de
São Paulo
Especial “A Nuclebrás em Guarapari”, Maura Fraga, Jornal A Gazeta, 15/05/1983
“Nuclebrás fica em Guarapari por mais três anos”, Jornal A Gazeta, 7/05/1983
Reportagens publicadas pelos jornais Tribuna da Imprensa (RJ), Revista da Semana
(RJ), Diário de Notícias (RJ), Folha Capixaba (ES), Diário da Noite (RJ)
Chicago Tribune, “Brazil acts to bar export of minerals”, 3 de abril de
1950.Disponível online
Fluvial Monazite Deposits in the Southeastern United States. Department of
Interior, EUA, 1968. Disponível online
The geologic Occurrence of Monazite, Department of the Interior. USA,
1967.Disponível online