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Pró-Reitoria Acadêmica
Escola de Direito
Curso de Direito
Trabalho de Conclusão de Curso
Brasília - DF
2015
JOSÉ ELYD’ANGELLYS GONÇALVES DE SOUZA
Brasília
2015
Espaço reservado no trabalho para a inserção da folha de aprovação assinada pela banca
examinadora.
Aos meus pais e a todos os meus familiares,
pessoas com quem posso contar.
Referencia: SOUZA, José Elyd' angellys Gonçalves. Legalización de Seguro de Salud y los
Desafíos de la vigencia del derecho a la salud. 43 paginas. 2015 Monografía (Derecha).
Universidad Católica de Brasilia, Brasilia/DF, 2015.
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 8
2. DO DIREITO À SAÚDE ................................................................................................ 11
2.1 A SAÚDE NO BRASIL COMO CATEGORIA DE DIREITOS FUNDAMENTAIS
E SOCIAIS ........................................................................................................................... 11
5. CONCLUSÃO ................................................................................................................. 38
6. BIBLIOGRAFIA ............................................................................................................. 40
8
1. INTRODUÇÃO
2. DO DIREITO À SAÚDE
É indiscutível que o direito à saúde relaciona-se de forma direta com o direito à vida.
Todavia não é nada fácil desenvolver um conceito jurídico do que venha a ser saúde. Segundo
Reissinger, citado por Bernardo Gonçalves Fernandes em sua obra de Direito Constitucional,
o principal conceito dá-se a partir do propósito do preâmbulo da Constituição da Organização
Mundial de Saúde: “estado completo de bem-estar físico, mental e social e não apenas a
ausência de doenças ou enfermidades.”1 A Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990 (Lei
Orgânica da Saúde), por outro lado, apresenta uma leitura que engloba no conceito de saúde
um conjunto de ações públicas que assegurem uma vida digna e autônoma dos sujeitos
beneficiários.2
A saúde é um conceito contraposto ao da doença conceito este que predominou até a
segunda metade do século XX.
Conforme salienta Fernando Aith foi entre 1960 e 1970 que a saúde passou a ser,
também, objeto de estudo das ciências sociais, de forma que tal definição foi ampliada,
afastando-se do restrito campo da biologia para abranger outros aspectos da vida social.3
Nas palavras de Fernando de Oliveira Domingues Ladeira,
O conceito de saúde passou a ser encarado como representações de saúde,
reconhecendo-se a existência de diferentes representações de saúde de acordo com a
realidade de cada povo, de modo que o Estado passa a se ocupar da saúde não
apenas em seu aspecto individual, mas também do aspecto social e coletivo,
notadamente das influências socioambientais para a manutenção da qualidade de
vida. 4
1
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional – Bernardo Gonçalves Fernandes. – 3ª.
ed. – Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 471
2
BRASIL. Lei nº. 8.080, de 19 de setembro de 1990. Lei Orgânica da Saúde. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8080.htm>acesso em 16 agosto 2015.
3
AITH apud LADEIRA, 2012. p. 72
4
FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional/Bernardo Gonçalves Fernandes. – 3ª.
ed. – Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 471
12
5
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Constituição. Nova Iorque: OMS, 1946.
6
PAES, Elisa Pino da Luz. Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro. Judicialização da
saúde, Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 135.
13
7
BRASIL. Lei nº. 8.080, de 19 de setembro de 1990. Lei Orgânica da Saúde. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8080.htm> . Acesso em 02 outubro 2015.
14
Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder
Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle,
devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por
pessoa física ou jurídica de direito privado.
8
LADEIRA, Fernando de Oliveira Domingues. Regulação Estatal e Assistência Privada à Saúde: Liberdade
de Iniciativa e Responsabilidade Social na Saúde Suplementar – Fernando de Oliveira Domingues Ladeira;
prefácio de Zélia Luiza Pierdoná. Belo Horizonte: Forum, 2012. p. 109
9
BRASIL. Lei nº 9.656, de 03 de junho de 1998. Dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à
saúde. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 04 de jun. 1998, Seção 1, p. 1.
15
É nesse sentido que Scaff aponta a importância do setor de saúde suplementar, através
as operadoras de plano de saúde, afirmando surgirem:
(...) sobretudo, da constatação da incapacidade do Poder Público de manter um
sistema de atendimento à saúde que seja efetivamente universal, abrangente e
eficiente o bastante para tornar desnecessária a atuação de empresas particulares
nesse setor da vida social e econômica, de modo complementar ou mesmo
preferencial à atividade direta do Estado.11
10
SANTOS, Adriana Costa. Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro. Judicialização da
saúde, Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 14.
11
SCAFF, Fernando C. Direito à Saúde no Âmbito Privado: contratos de adesão, planos de saúde e seguro
saúde. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 46.
12
AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR. Informação em Saúde Suplementar. Disponível
em: <http://www.ans.gov.br/perfil-do-setor/dados-gerais>. Acesso em: 13 set. 2015.
16
Assim, em face das deficiências do sistema público de saúde, resta para aqueles que
possuem uma condição financeira um pouco melhor, a solução da contratação de um plano
privado.
Com a preocupação da necessidade de intervenção estatal sobre a atuação das
operadoras é que foi editada a nº Lei 9.656, de 03.06.1998, que dispõe sobre os planos e
seguros privados de assistência à saúde, e posteriormente, a criação de uma agência
reguladora, a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, para fiscalizar e regular o setor
privado de assistência à saúde.
partes não sabem de antemão quando o serviço será utilizado. São também de execução
continuada, se protraem no tempo, de trato sucessivo.13
Nas palavras de Camila Novaes Lopes14,
pode-se definir o plano de saúde como um contrato de direito privado deprestação de
serviços, ou cobertura de custos assistenciais, por prazo indeterminado e
carátercontinuado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência
a saúde por profissionais de uma rede credenciadaou referenciada ou, ainda, serviços
de saúde livremente escolhidos mediante pagamento direto ao prestador, por conta e
ordem do consumidor.
13
CARDOSO, Márcio Olmo. Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro. Judicialização da
saúde, Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 308.
14
LOPES, Camila Novaes. Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro. Judicialização da
saúde, Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 83
18
domiciliar; VII- medicamento com efetividade reprovada; VIII- prótese ou órtese não ligada
ao ato cirúrgico; IX- tratamentos reputados ilícitos; X- em caso de guerras e etc.
Outra característica importante dos contratos do plano de saúde é a abrangência
geográfica de cobertura. Significa dizer que o contrato deve estabelecer a
abrangênciageográfica do atendimento oferecido -municipal,regional, estadual ou nacional.
Divide-se, ainda, por segmentação do atendimento, podendo ser definido como ambulatorial,
hospitalar, coberturaobstétrica e odontológica. 15
Por fim, os contratos de plano de saúde no Brasil funcionam em regime de mutualismo;
organizados com base no principio da solidariedade, uma vez que todos os participantes
contribuem para que alguns ou o próprio contribuinte possa utilizar o serviços valores das
mensalidades, por sua vez, podem apresentar reajusteanual para reposição da variação dos custos
assistenciais e o reajuste por mudança de faixa etária.
Conforme evidenciado neste trabalho até o momento, pode-se concluir que apesar da
Constituição Federal ter permitido que a prestação de assistência à saúde possa ser efetivada,
de forma suplementar, por pessoas jurídicas de direito privado, ao Estado cabe o dever de
regulação, fiscalização e controle relativos ao segmento.Esta é a inteligência que se extrai do
art. 197 da Carta Constitucional. Neste cenário, a Lei nº 9656/98 (Lei dos Planos de Saúde)
assume papel de extrema importância, principalmente quando prevê a obrigatoriedade dos
operadores de plano de saúde se submeterem às regras estipuladas de uma agência reguladora,
qual seja: a ANS.
Nas palavras de Fernando de Oliveira Domingues Ladeira16:
15
LOPES, Camila Novaes. Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro. Judicialização da saúde,
Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 85
16
LADEIRA, 2012. p. 16.
20
17
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: Método, 2003. p. 350.
18
LADEIRA, 2012. p. 150.
19
CARLINI, Angélica. Judicialização da saúde pública e privada / Angélica Carlini. - Porto Alegre: Livraria
do Advogado Editora, 2014. p. 123
20
Ladeira, 2012, p. 161
21
Na dicção do art. 10, Parágrafo Quarto, da Lei 9656/98: “A amplitude das coberturas,
inclusive de transplantes e de procedimentos de alta complexidade, será definida por normas
editadas pela ANS.” No mesmo sentido, a lei de criação da ANS, qual seja, a Lei nº 9.961, de
28 de Janeiro de 2000, em seu art. 4º, inciso III, atribuiu à ANS, dentre outras competências, a
de elaborar o rol de procedimentos e eventos em saúde, que constitui referência básica para os
fins do disposto na Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998, e suas excepcionalidades.
O mencionado rol de procedimentos e eventos em saúde estabelecidos pela ANS
listam os procedimentos e eventos de cobertura mínima obrigatória, respeitados a
segmentação contratada e as diretrizes de atenção à saúde. Tal lista é revisada a cada dois
anos, em função da evolução da prática médica.
A finalidade do rol de procedimentos tem como finalidade definir a cobertura mínima
obrigatória para os contratos regulamentados, ou seja, procedimentos e eventos indispensáveis
ao diagnóstico e tratamento de todas as doenças da Classificação Internacional de Doenças
(CID), publicada pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Deste modo, a ANS publicou a Resolução Normativa n 82, de 29 de setembro de
2004, resolução esta que instituiu o primeiro rol de coberturas da referida agência reguladora,
na forma do art. 10, inciso II da Lei 9.961-2000.Ocorre que, tal rol sofreu diversas
atualizações, e hoje o que se encontra vigente é o que consta da Resolução Normativa ANS nº
338, de 21 de outubro de 2013.
22
De tudo o que já se evidenciou até aqui, pode-se concluir que a saúde é direito de
todos e dever do Estado, que, contudo, pode ser efetivado por entidades de direito privado,
conforme permissão constitucional. Assim, nasce o setor de saúde suplementar, exercido por
operadoras de plano privado de assistência à saúde, como mecanismo complementar à atuação
do Estado na área. É que, não obstante a Constituição ter sido promissora em prever um
sistema de saúde que em tese atenderia os anseios da população, atingindo, assim, os preceitos
do Estado Democrático de Direito, infelizmente, nota-se falhas em sua concretização. Neste
sentindo, a falta de condições necessárias por parte do Poder Publico, a fim de cumprir o seu
dever constitucional, o obrigou admitir como legitima e necessária a participação das
empresas privadas na efetivação do direito a saúde.
Como dito em linhas anteriores, as operadoras definem a amplitude da cobertura do
plano de saúde pautando-se no rol de procedimentos e eventos em saúde estabelecido pela
21
BOTTESINI, Maury A.; MACHADO, Mauro C. Lei dos Planos e Seguros de Saúde: comentada por
artigo. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 92.
23
ANS, o qual lista os procedimentos e eventos de cobertura mínima obrigatória que deve ser
respeitado pelas empresas operadoras do plano de saúde.
Ocorre que, mesmo diante de uma apertada regulamentação, com imposição de limites
às operadoras de plano de saúde e garantia de direitos a consumidores, estes, pelos mais
diversos motivos, acabam se insurgindo em relação aos serviços contratados. O inconformismo,
na maioria das vezes, refere-se ao indeferimento de coberturas assistenciais, por falta de
previsão contratual, ou regulamentar, em especial quanto ao rol de procedimentos da ANS.
Por conta disso, há atualmente um grande número de ações judiciais visando uma
maior cobertura de procedimentos, bem como o fornecimento de medicamentos e materiais
não previstos nos contratos de plano de saúde. Este cenário apresenta, pois, o fenômeno
designado por “judicialização da saúde suplementar”, e decorre da principiologia a qual
estabelece que toda lesão ou ameaça de direito pode serapreciadapelo Poder Judiciário, ex
viprincípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, previsto no artigo 5.°, inciso XXXV
da Constituição Federal.
De acordo com Luiz Roberto Barroso22:
Judicializaçãosignifica que algumas questões de larga repercussão política ou social
estão sendo decididas por órgãos do Poder Judiciário, e não pelas instâncias políticas
tradicionais: o Congresso Nacional e o Poder Executivo – em cujo âmbito se
encontram o Presidente da República, seus ministérios e a administração pública em
geral. Como intuitivo, a judicialização envolve uma transferência de poder para
juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no
modo de participação da sociedade.
22
BARROSO, Luís R. Judicialização, ativismo judicial e legitimidade democrática. Revista Synthesis, Rio
de Janeiro, vol. 5, n. 1, 2012, p. 24.
24
A operadora que foi obrigada a custear o exame perante o Estado-juiz não seria
sancionada em eventual denúncia ao beneficiário perante o Estado-regulador, já que
não consta o exame no Rol por ele ditado, desobrigando da cobertura os agentes
regulados.23
De tudo que já se viu até aqui, tem-se que a judicialização da saúde suplementar é uma
realidade no Brasil.
23
RIANI, Marlus Keller. Plano de Saúde: Aspectos legais e Contratuais. Belo Horizonte: Gráfica EME, 2011.
p. 136-137.
24
SOUZA, Henrique F. O. Aspectos jurídicos da incorporação da tecnologia em saúde. In: “CARNEIRO,
Luiz A. F. (Org.). Planos de Saúde: aspectos jurídicos e econômicos. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 149.
25
CHAVES, Luís Cláudio da Silva. in: A Judicialização da saúde suplementar, disponivel em
http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=623. Acesso em 17 setembro 2015.
25
Da leitura do inteiro teor do acordão correlato à ementa acima, verifica-se que se trata
de ação movida por beneficiário que teve o seu pedido de cobertura assistencial indeferido
pela operadora do seu plano de saúde, ante a falta de previsão do procedimento pleiteado no
rol de procedimentos fixado pela ANS.Segundo a seguradora, com esteionos termos dos
29
artigos 757 e 760 do Código Civil, a sua responsabilidade estaria limitada aos termos do que
foi acordado no contrato de seguro, o qual expressamente prevê a não cobertura dos
procedimentos que não encontram previsão na relação de procedimentos médicos da ANS.
No entanto, o juízo entendeu que não cabia à seguradora do plano de saúde fazer
qualquer ingerência a fim de recusar o tratamento apontado, tendo em vista o entendimento do
médico especialista de que o procedimento cirúrgico indicado era o mais adequado à saúde da
paciente, e o caráter não exaustivo do rol de procedimentos da ANS. Ademais, destacou que o
direito à saúde do indivíduo deve ser tratado como prioridade, já que está diretamente
relacionado à dignidade da pessoa humana e à vida, o maior bem de todos. Nestes termos,
manteve a sentença proferida pelo juízoa quo, para condenar a requerida ao custeamento da
internação etratamento da parte autora, conforme relatório médico, e o pagamento de
R$8.000,00 (oito mil) reais a título de indenização por danos morais.
Por fim, há de se consignar o entendimento exarado pelo Superior Tribunal de Justiça
no que toca às negativas de coberturas pautadas na ausência de previsão contratual e no rol de
procedimentos da ANS. O entendimento consolidado do STJ é no sentido de que as
operadoras de saúde não podem limitar ou excluir determinado procedimento, quando
indispensável ao tratamento de saúde do consumidor relativo a doença coberta pelo respectivo
plano. Ou seja, no entender do Egrégio Tribunal Superior, a limitação da cobertura deve se
atrelar à doença, e não ao seu tratamento. Noutras palavras, a mencionada corte possui
entendimento consolidado em relação à interpretação dos limites das coberturas assistenciais
devidas pelas operadoras de planos privados de assistência à saúde, no sentindo de que,
mesmo que não previsto no rol de procedimentos da ANS, o tratamento deve ser assegurado
ao beneficiário sempre que a doença que originar sua prescrição esteja coberta no contrato, na
regulamentação ou na lei.Os arestos a seguir corroboram essa afirmativa:
De tudo que já foi exposto, em que pese respeitáveis as decisões analisadas, há que se
avaliar quais impactos elas geram no setor da saúde suplementar, mormente se há ocorrência
de algum tipo de prejuízo à atuação das operadoras ou do sistema como um todo, tema esse o
qual será tratado no item seguinte.
É que para os brasileiros, cada decisão judicial representa a extensão do que é possível
conseguir em juízo no que toca à efetividade do direito social à saúde. Por isso, não raro
decisões judiciais ter grande repercussão, e incentivam novos processos judiciais para
obtenção de medicamentos, tratamentos, órteses, próteses e outras formas corriqueiras ou
excepcionais de tratamento de saúde.26
26
CARLINI, Angélica. Judicialização da saúde pública e privada / Angélica Carlini. - Porto Alegre: Livraria
do Advogado Editora, 2014. p. 153.
31
esteio nas diretrizes da Lei de Planos de Saúde, bem como, na lei que criou e traçou os limites
de sua atuação.
Ainda é possível concluir pela tendência de o Poder Judiciário desconsiderar os
limites previstos no contrato entabulado entre as partes, e no rol de cobertura expedido pela
ANS, pois conforme exposto neste trabalho, alguns Tribunais de Justiça julgam-no
meramente exemplificativo.
Diante desse panorama, é de se questionar qual é o limite de vinculação do plano de
saúde com o cuidado da saúde de seu beneficiário, e se o Poder Judiciário reconhece o
necessário equilíbrio atuarial das entidades privadas, limitadas a receita proveniente de seus
beneficiários.
Nas palavras do colunista Luís Cláudio da Silva Chaves, o aumento de processos na
Justiça contra os planos de saúde traz impactos negativos para todos os envolvidos. Senão,
vejamos:
Primeiramente, às operadoras de planos e seguros de saúde, que sofrem com a
oneração do processo e a insegurança dos contratos celebrados, gerando distorções
nos custos e nos preços dos produtos; já o Judiciário sofre com sobrecarga de novos
processos; a ANS, pela dificuldade em realizar a regulação do mercado; os
consumidores, porque contratam um plano, são iludidos e recebem poucas
explicações e só conseguem seus direitos na justiça; e os próprios beneficiários dos
planos de saúde, que acabam por suportar o ônus financeiro das concessões e
deferimentos feitos pelo Judiciário.27
de que ele não consta do rol, há de se questionar se o Poder Judiciário estaria criticando ou
corrigindo a forma de atuação das Agência Nacional de Saúde Suplementar.
A afirmação justifica-se porque em seu portal a ANS informa aos usuários do plano de
saúde o seguinte:
Consultas, exames e tratamentos
A ANS define uma lista de consultas, exames e tratamentos, denominada Rol de
Procedimentos e Eventos em Saúde, que os planos de saúde são obrigados a
oferecer, conforme cada tipo de plano de saúde - ambulatorial, hospitalar com ou
sem obstetrícia, referência ou odontológico. Essa lista é válida para os planos
contratados a partir de 02 de janeiro de 1999, os chamados planos novos. É válida
também para os planos contratados antes dessa data, mas somente para aqueles que
foram adaptados à Lei dos Planos de Saúde. Antes de verificar se você tem direito a
um procedimento, não deixe de checar qual o tipo de plano de saúde você tem. 28
É possível concluir a partir do texto acima que a operadora está obrigada a fornecer os
procedimentos e medicamentos elencados no rol, e não estão obrigada a oferecer outros.
Curiosamente, a orientação da ANS para os usuários dos planos de saúde está em
descompasso com decisões judiciais que tratam do assunto.
Como, em muitos casos, a necessidade do procedimento médico é iminente, em face
do risco de saúde, o magistrado, ao receber a petição inicial, na maioria das vezes, não possui
elementos suficientes para aferir se a recusa do plano e razoável ou não, decidindo sempre em
favor do consumidor. Neste sentido:
Sob o prisma dos juízes, as situações apresentam-se, quase sempre,sob forma de
dilema, principalmente quando se trata de tutela de urgência. As petições são
apresentadas com a narrativa de um caso grave, com a negativa aparentemente
injustificável da operadora em garantir acobertura. E sempre necessário verificar o
que e mera alegação sem fundamento, o que tem plausibilidade, qual o verdadeiro
grau de urgência,dentre outros aspectos.”29
27
CHAVES, Luís Cláudio da Silva.A Judicialização da saúde suplementar, disponívelem
<http://www.domtotal.com/colunas/detalhes.php?artId=623>. Acesso em: 17 out. 2015.
28
ANS. O que o seu Plano de Saúde deve cobrir? Disponível em http://www.ans.gov.br/planos-de-saude-e-
operadoras/espaco-do-consumidor/o-que-o-seu-plano-de-saude-deve-cobrir#sthash.fMJa9Fmv.dpuf. Acesso em
18 out. 2015.
29
SILVA, Fernando Antonio de Souza e.Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro.
Judicialização da saúde, Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 50.
30
CARLINI, Angélica. Judicialização da saúde pública e privada / Angélica Carlini. - Porto Alegre: Livraria
do Advogado Editora, 2014. p. 170.
33
Salvo os casos em que esse procedimento administrativo possa fazer a diferença entre
a vida e morte do paciente, ou seja, nas urgências e emergências, nos demais é possível
acreditar que agindo conforme as recomendações do CNJ, o magistrado estará ancorado em
argumentos técnicos que poderão demonstrar a possibilidade do procedimento ou
medicamento pleiteado, contrariar ou não as experiências realizadas nos melhores centros de
pesquisa, as diretrizes clínicas ou a avaliação de tecnologias realizadas pelo Ministério da
Saúde. Ou ainda, poderão demonstrar, se o procedimento/medicamento mostra-seadequado ou
inadequado face as pretensões dos laboratórios ou dos fornecedores de órteses e próteses e as
reais necessidades do paciente.
Além disso, com base nesses dados que é possível inferir a necessidade de que as
instâncias sociais anteriores sejam pensadas para evitar que o acesso à saúde no Brasil seja
decidido preferencialrmente no Judiciário, é que quando o pleito individual chega nesse
âmbito é para ser decidido, e na maioria dos casos, contrariar o parecer técnico do médico é
inviável para os magistrados seja pela complexidade do conhecimento, seja pela
exclusividamente que se atribui ao médico para prescrever procedimentos e tratar de assuntos
afetos à saúde e sua manutenção.
35
Neste sentido, buscando garantir aos juizes dados técnicos fidedignos, proporcionando
condições para uma decisão judicial mais próxima da ideal, por ser um momento
reconhecidamente dificil para o julgador, é que houveimportante inovação do Tribunal de
Justica do Estado do Rio de Janeiro, ao criar órgãos de assessoria técnica especializada
conforme informa Fernando Antonio de Souzae Silva, Juiz de Direito da 3ª Vara de Família
de Duque de Caxias.31
Acredita-se que especialização de Varas de Saúde Pública poderá garantir decisões
mais adequadas e tecnicamente precisas. Neste sentido, é o posicionamento de Carlini:
É evidente que a existência de Câmaras ou Núcleos de Assessoria Técnica que
contem com profissionais especializados em medicina baseada em evidências, com
auditores de saúde capacitados para a avaliação de novas tecnologias e novos
medicamentos, sempre com fundamento em diretrizes clínicas e avaliação de
tecnologias, contribuirá de maneira expressiva para que as demandas judiciais na
área da saúde não constituam apenas uma corrida por recursos, mas uma busca por
tratamentos e medicamentos cuja eficácia seja cientificamente comprovada ou, com
índice de comprovação científica suficiente para conseguir o deferimento requerido.
Outro ponto de extrema importância que não pode deixar de ser pontuado é que, no
sistema de saúde suplementar, o financiamento é baseado no mutualismo e no regime
financeiro de repartição simples, que assim funciona: as receitas oriundas das mensalidades
do plano de saúde de um grupo de pessoas são utilizadas para financiar o pagamento de toda a
assistência de saúde que ocorreu nesse mesmo período. 32
Noutras palavras, as prestações pagas pelo beneficiário, para direito ao plano de saúde,
são calculadas com base nos riscos assumidos pela empresa prestadora. Deparando-se como
uma decisão judicial que defere determinado procedimento médico não previsto no contrato,
que por sua vez está amparado no rol da ANS, há a necessidade de compensar o prejuízo
anterio rpara manter o equilíbrio econômico financeiro do operador. Por essa razão, quanto
maior a cobertura, mais elevadas serão as prestações a serem pagas pelo usuário.
Isso tudo retrata a realidade e a necessidade para que os juízes alarguem o campo de
conhecimento, para abranger assuntos específicos de outros campos do saber humano, pelo
que as decisões influenciam diversas atividades, para além da esfera meramente jurídica.
Acabam por tornar mais caro e muitas vezes inacessível esse modelo de oferta deserviços
médicos, especialmente para aqueles cuja faixa etária é mais idosa.
31
SILVA, Fernando Antônio de Souza e. Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro. Judicialização
da saúde, Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 150.
32
NIGRI, Bianca Ferreira do Amaral Machado. Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro.
Judicialização da saúde, Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 83.
36
33
CAMPOS, Eduarda Monteiro de Castro Souza. Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro.
Judicialização da saúde, Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 119.
34
CARUGGI, Marcos Borba.Curso de direito em saúde suplementar, 2011, Rio de Janeiro. Judicialização da
saúde, Parte I: saúde suplementar no direito brasileiro. Rio de Janeiro: EMERJ, 2011. p. 333.
35
CARLINI, Angélica. Judicialização da saúde pública e privada / Angélica Carlini. - Porto Alegre: Livraria
do Advogado Editora, 2014. p. 139.
37
juiz analisa o caso individualmente, que ao final se a decisão for de procedênciaem favor do
consumidor, implicará em determinado valor econômico . Tal valor, pode não ser considerado
exorbitante para o ente privado. De qualquer sorte, segundo a autora acima mencionada, a
decisão gera dois problemas de imediato: cria o precedente para que outros demandem para a
obtenção do mesmo benefício; e, substitui o debate político sobre a concessão do benefício no
âmbito da relação custoversus benefício para toda a mutualidade.
Portanto, para que haja diminuição de casos a serem resolvidos no Poder Judiciário, a
ANS deve verificar a necessidade de incorporar à sua regulamentação aquilo que já está
pacificado na justiça, ou seja, aquilo que transitou em julgado e virou jurisprudência,
aplicando a Constituição Federal e o Código de Defesa do Consumidor na interpretação da
Lei de Planos de Saúde e no suprimento de suas lacunas, inclusive no exercício fiscalizatório
e punitivo. Tal medida é necessária, pois todos têm direito de acesso a meios que possam
garantir ou preservar sua saúde; e, todos têm o dever de garantir que direitos fundamentais
sejam disponibilizados em igualdade de condições para toda a sociedade, e não apenas para
aqueles que tiverem a chance de ir ao Poder Judiciário e obter uma decisão favorável.
Com a adequação da regulamentação, obviamente os contratos deverão ajustar-se às
novas regras, e o preço repactuado de acordo com a nova realidade.
Por fim, conclui-se que se o aumento da judicialização é uma perspectiva concreta,
sendo necessário refletir sobre alternativas que possam diminuir a incidência do fenômeno e,
ao mesmo tempo, despertar a sociedade brasileira contemporânea para a busca de soluções
mais rápidas que as decisões judiciais, levando em consideração a dimensão política e social
do problema da saúde, que exige, na maioria das vezes, soluções coletivas.
38
5. CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
BRASIL. Lei nº 9.656, de 03 de junho de 1998. Dispõe sobre os planos e seguros privados
de assistência à saúde. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 04 de jun. 1998, Seção 1, p. 1.
Cunha, Paulo Cesar Melo Da. Regulação Jurídica da Saúde Suplementar no Brasil.
LUMEN JURIS.
PAES, Elisa Pino da Luz. CURSO DE DIREITO EM SAÚDE SUPLEMENTAR, 2011, Rio
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