Cigncia Rural, Santa Maria, v.26, m1, p.97-102, 1996,
ISSN 0103-8478
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AVALIACAO DA FUNCAO RENAL ATRAVES DA DENSIDADE URINARIA
E DOSAGEM SERICA DE UREIA E CREATININA NA
AFLATOXICOSE EXPERIMENTAL EM CAES
EVALUATION OF RENAL PROFILE INDUCED BY AFLATOXICOSIS IN DOGS:
DETERMINATION OF PLASMA LEVELS OF UREA AND
CREATININE AND URINE DENSITY
Carla Rosane de Aguiar Hennemann' Carlos Mario Severo Cunha’ S6nia Terezinha dos Anjos Lopes?
Anne Santos do AmaraP Alexandre da Silva Polydoro?
RESUMO,
0 presente trabatho referee a determinagao da
ddensdade wrindriae dosagem sérica de uréa eereatinina em ces
submeridos a afaroxicose experimental. Foram ulilizados 14 cdes
(7 machas e 7 fémeas), som raca definida, adultos e peso médio de
6,7 1,96kg. Em um periodo pré-esperimento foram realizadas 3
colheitas de urina ¢ sangue de cada animal para avaliagdo da
fungdo renal e as médias das determinagdes foram utlizadas como
controle. Os edes receberam 67.a/kg/dia de aflatoxina via oral
durante 9 dias consecutivos. A parur do quinto dia foram reali
ddas 4 colheitas com intervalos de 5 dias. Os resultados obtidas
demonsiraram, através dos sinals elinicas e das lesdes macro e
Imicroscépicas, 0 desenvolvimento de aflatoxicose, sendo que no
hhouvealteragdo na fundo renal detecavel através dos pardmetros
estudados
Palavras-chave: funedo renal, aflatoxicose, ces
SUMMARY
The objective of the present work was to evaluate
plasma levels of urea and creatinine and urine density in dogs
using experimentally induced aflatxicosis. Fourteen adult mongrel
ddogs (7 males and 7 females), weighing 67+ 1.96kg were treated
‘with oral qfatoxin (67,4/Ap/day) during 9 days. Three control
blood and urine samples were collected before the begining of
experimental trial Then starting on the 5 day of treatment,
another 4 samples were collected with 5 day intervals, The results
showed that aflatoxin at the dosage used produced clinical signs of
intoxication, which later were confirmed by histopathology
However, no alteration in the renal profile could be detected by
standard clinical pathology:
Key words: renal function, aflatoxicoss, canine
INTRODUGAO,
As aflatoxinas so metabslitos secundérios
produzidos por fungos como Aspergillus flavus varie-
dade parasiticus, sobre varios substratos, dentre esses
incluem-se graos de vegetais oleaginosos como o mi:
Iho, amendoim e algodivo.
‘Medico Veterinrio, Alana do Curso de Pos-graduagdo em Medicina Veterinvi, Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Rua Pe.
‘Anchieta 129/404, 92010-030 - Canoas, RS. Autor para corespondencia
“Médico Veterinari, Press
, Departamento Clinica de Pequenos Animais, UFSM,
"Medico Veterindri, Aluno do Curso de Pos-araduasto em Medicina Veterndria, UFSM.
puicahe em 10995 pro98. Hennemann eta
A aflatoxina foi assim denominada pois
inicialmente os pesquisadores acreditavam que 0 As-
ergillus flavus fosse o inico fungo a produzir esta
toxina, ento denominaram de aflatoxina, "A" de As-
ergillus "fla" de flavus (SMITH & ROSS, 1991),
‘Asaaflatoxinas so compostos difuranocumarinicos dos
uais os principais componentes so denominados By,
B, G, G; (KELLY, 1993). A aflatoxina B, é uma
das micotoxinas mais importantes que contaminam a
ragio animal e o alimento humano (SMITH & ROSS,
1991). A literatura salienta sua hepatotoxicidade
(KELLY, 1993), hepatocarcinogenicidade (SMITH &
ROSS, 1991), nefrotoxicidade e imunossupressio em
animais (IARC, 1991).
‘A Organizago Mundial da Saiide em 1983,
utilizou aflatoxina B, em ratas demonstrando que esta
€ excretada de 70 a 80% num periodo de 24 horas, €
evidenciou uma importante via excretéria da toxina,
que foi a via biliar e intestinal, sendo estas responsi
veis por 60% da elimina da toxina. Aproximada-
mente 20% ¢ excretada via renal, e uma quantidade
insignificante pela via respirat6ria em forma de CO;.
SEIBOLD & BAILEY (1952), descreveram
uma doenga téxica em ces caracterizada por altera-
‘bes hepaticas a qual denominaram "hepatite X", Mais
tarde, Chaffe apud JERICO et al. (1985) produziram
cexperimentalmente sinais e lesdes semethantes, através
dda administragao de aflatoxina, 0 que veio a confirmar
definitivamente a relagdo existente entre a ingestdo
dessa micotoxina e 0 desenvolvimento de uma grave
hepatopatia.
Aaflatoxicose desencadeia doencas graves
no homem e excepcionalmente em animais, que vivem
agrupados, como bovinos, suinos ¢ aves (EDDS, 1973;
PIER, 1973), ocorrendo com menor freqdéncia entre
0s carnivoros domésticos, apesar destes serem extre-
mamente sensiveis aos efeitos da toxina (NEWBER-
NE et al., 1966; NEWBERNE, 1973).
‘Alguns fatores influenciam na gravidade do
quadro clinico de aflatoxicose: a dose ingerida e 0
tempo de exposigdo a toxina estio entre eles (JERICO
etal. 1985; KELLERMAN et al. 1990). NEWBERNE
(1973) e KELLERMAN et al. (1990) estudaram a sus-
ceptibilidade a aflatoxina e relataram que os animais
Jovens so mais sensiveis, enquanto bovinos e ovinos
sifo relativamente mais resistentes que cdes e suinos.
Machos e fémeas também diferem em relagao a sensi-
bilidade, sendo as fémeas menos susceptiveis que os
machos (TERAO & OHTSUBO, 1991).
s sinais clinicos da intoxicago incluem
depressto, anorexia, vomito, ictericia intensa da pele,
mucosas oral € conjuntival (SEIBOL & BAILEY,
1952; NEWBERNE, 1973; KETTERER, 1975;
JERICO et al., 1985; BASTIANELLO et al., 1987),
diarréia (JERICO et al., 1985), ascite e edema
periférico (NEWBERNE, 1973; JERICO et al., 1985;
BASTIANELLO et al, 1987), convulsdes (SEIBOLD
& BAILEY, 1952) polidpsia em alguns animais
(KETTERER, 1975; TORELLY, —_ 1994)
BASTIANELLO et al. (1987) observou ainda hema-
témese, melena, epistaxe, petéquias na mucosa oral ¢
ane
SEIBOLD & BAILEY (1952), observaram
celevagdio significativa nos valores da uréia em 1 de 6
des intoxicados com aflatoxina. JERICO et al. (1985),
relataram niveis de uréia e creatinina elevados em 2
dos 9 ces que sofreram intoxicagao natural por
aflatoxina. Estudos experimentais em ces revelaram
que 0 prejuizo a capacidade de concentrar e diluir a
uurina causada por dano renal primério nao foi
detectado até que 2/3 dos néfrons em ambos os rins
fossem cirurgicamente extirpados. E a azotemia de
causa priméria renal ndo € reconhecida até que 70 a
75% dos néfrons estejam afetados (OSBORNE &
POLZIN, 1983). Portanto, a capacidade de
concentragao de urina, em muitas doengas renais, ja
deve estar afetada no momento que a azotemia de
desenvolve (BROBST, 1989).
‘A densidade urindria € definida como a taxa
de concentragio. da soluglo comparada. com a
cconcentragao de igual volume de agua (OSBORNE &
POLZIN, 1983; MEYER et al., 1992). Esta determi
‘ago é utilizada para estimar o nimero de particulas
por unidade de solvente (FINCO, 1989) e monitorar a
capacidade de concentrar e diluir a urina e, portanto,
€ medida de fungao renal (BROBST, 1989). Este teste
€ clinicamente usado porque a baixa habilidade de
concentrar urina é um dos primeiros sinais de doenca
tubular renal (BROBST, 1989). Segundo WILLARD
et al., (1994) existem varios significados para a
densidade urindria alterada no c&o, dentre estes: a)
densidade < 1007 (principalmente < 1004) indica que
rim & capaz de diluiro filtrado glomerular, sugerindo
que nao existe insuficiéncia renal; porém alguns
animais com insuficiéncia renal so capazes de
‘excretar urina hipostentirica; b) densidade entre 1008
1012 ¢ considerada isosteniiria, indicando que o rim
nao alterou a concentracao do filtrado glomerular; c)
entre 1013 a 1029 indica que esta urina tem sido
concentrada, mas nao suficiente para considerar uma
adequada funcdo tubular renal; d) densidade acima de
1030 demonstra uma habilidade de concentragao de
urina adequada para manutengao a homeostase; e)
densidade > 1050 pode refletir um quadro de
desidratacao,
A uréia € um produto nitrogenado nao
protéico, sintetizado no figado, por meio do ciclo da
‘omitina, usando a aménia derivada do catabolismo dos
Cigneia Rural, v. 26, n. 1, 1996Avaliagdo da functo renal através da densidade urindria, 99,
aminodcidos que resultam do catabolismo de proteinas
exégenas (dieta) e endégenas. A excregio renal da
uréia é conseguida pela filtragao glomerular, e suas
concentragbes sto inversamente proporcionais a taxa
de filtragao glomerular (CHEW & Di BARTOLA,
1992). Segundo COLES (1984) e WILLARD et al.
(1994), a concentragio sérica da uréia encontra-se
elevada quando ocorre uma diminuigao da filtracao
‘glomerular por perfusdo renal diminuida, catabolismo
tissular ampliado e dieta rica em proteinas. Por outro
Jado, a diminuigao esta relacionada com a inibigao da
produgdo (dieta pobre em proteinas e insuficiéncia
hepatica) ou por aumento de excrecdo (hiper-
hidratagdo), sendo a causa mais comum de severa
diminuigdo da uréia (