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• Hipoxemia.

 Compreensivelmente, a baixa concentração de O2 no sangue (independentemente da causa) aumenta
tanto a probabilidade quanto a extensão de um infarto.

 Conceitos‑chave
Infarto
 Infarto são áreas de necrose isquêmica causadas principalmente pela oclusão arterial (tipicamente devido à
trombose ou embolia); a obstrução do efluxo venoso é uma causa menos frequente.
 Os infartos causados pela oclusão venosa ou que ocorrem nos tecidos esponjosos com dupla circulação e onde o
sangue pode se acumular são tipicamente hemorrágicos (vermelhos). Os que são causados pela oclusão arterial
nos tecidos densos geralmente são pálidos (brancos).
 A possibilidade de uma oclusão vascular provocar ou não um infarto é influenciada pela presença de circulação
colateral, pela velocidade de desenvolvimento da obstrução, pela suscetibilidade intrínseca do tecido à isquemia e
pela oxigenação do sangue.

Choque
O choque é um estado em que a diminuição do débito cardíaco ou a redução do volume sanguíneo circulante eficaz
prejudica  a  perfusão  tecidual,  levando  à  hipoxia  celular.  No  início,  a  lesão  celular  é  reversível;  contudo,  o  choque
prolongado  causa  lesão  tecidual  irreversível  e  é,  geralmente,  fatal.  O  choque  pode  complicar  hemorragias  graves,
traumas ou queimaduras extensas, infarto do miocárdio, embolia pulmonar e sepses microbianas. Suas causas podem
ser agrupadas em três categorias gerais (Tabela 4‑3):

Tabela 4­3
Os Três Principais Tipos de Choque

• Choque cardiogênico: resulta de um baixo débito cardíaco devido à falência da bomba miocárdica. A falência pode
decorrer de danos intrínsecos ao miocárdio (infarto), arritmias ventriculares, compressão extrínseca
(tamponamento cardíaco; Cap. 11), ou obstrução ao fluxo de saída (p. ex., embolia pulmonar).
• Choque hipovolêmico: resulta de um débito cardíaco baixo devido à perda do volume sanguíneo, tal como ocorre nas
hemorragias graves ou na perda de líquido decorrente de queimaduras graves.
• Choque associado à inflamação sistêmica: pode ser acionado por diferentes tipos de agressão, especialmente infecções
microbianas, queimaduras, trauma e pancreatite. A característica patogênica comum é a liberação de mediadores
inflamatórios das células da imunidade inata e adquirida que produzem vasodilatação arterial, perda de líquido
intravascular e represamento de sangue venoso. Essas anormalidades cardiovasculares resultam em hipoperfusão
tecidual, hipoxia celular e desarranjos metabólicos que levam à disfunção dos órgãos e, se graves e persistentes, à
falência de órgãos e morte. Deve‑se notar que as diferentes causas desse choque (de origem microbiana ou não)
associado à inflamação produzem um conjunto semelhante de achados clínicos, que compreendem a chamada
síndrome de resposta inflamatória sistêmica. A patogenia do choque causado pela infecção microbiana (choque séptico) é
discutida mais detalhadamente a seguir.
Com menor frequência, pode ocorrer choque em situações como um acidente anestésico, lesões da medula espinal
(choque neurogênico), ou uma reação de hipersensibilidade mediada por IgE (choque anafilático, Cap. 6). Em todas essas
formas de choque, a vasodilatação aguda leva à hipotensão e à hipoperfusão tecidual.
Patogenia do Choque Séptico
Com  uma  taxa  de  mortalidade  que  excede  20%,  o  choque  séptico  lidera  as  causas  de  mortalidade  nos  centros  de
tratamento intensivo e responde por mais de 200.000 óbitos anualmente nos Estados Unidos da América. Ironicamente,
essa incidência está crescendo devido às melhorias no suporte de vida para pacientes em estado crítico, como também
pela quantidade crescente de pacientes imunocomprometidos (em consequência de quimioterapia, imunossupressão,
idade avançada ou infecção pelo HIV) e, ainda, pelo aumento da prevalência de microrganismos com multirresistência
aos medicamentos no ambiente hospitalar. O choque séptico é, mais frequentemente, desencadeado por infecções por
bactérias  Gram‑positivas,  seguidas  pelas  bactérias  Gram‑negativas  e  fungos.  Portanto,  o  antigo  sinônimo  “choque
endotóxico” não é mais apropriado.
A  capacidade  que  vários  microrganismos  têm  de  causar  o  choque  séptico  é  consistente  com  a  ideia  de  que  vários
constituintes  microbianos  podem  desencadear  o  processo.  Conforme  você  se  lembra  do  Capítulo  3,  macrófagos,
neutrófilos,  células  dendríticas,  células  endoteliais  e  componentes  solúveis  do  sistema  imune  inato  (p.  ex.,
complemento)  reconhecem  e  são  ativados  por  várias  substâncias  derivadas  de  microrganismos.  Uma  vez  ativados,
essas  células  e  fatores  iniciam  várias  respostas  inflamatórias  que  interagem  de  modo  complexo,  ainda  não
completamente compreendido, para produzir choque séptico e disfunção de múltiplos órgãos (Fig. 4‑20).

FIGURA 4­20  Principais vias patogênicas no choque séptico. Produtos microbianos (PAMPs, padrão
molecular associado a patógenos) ativam as células endoteliais e elementos humorais e celulares do
sistema imune inato, iniciando a cadeia de eventos que culmina com a falência de múltiplos órgãos na fase
final. Detalhes adicionais são dados no texto. CID, Coagulação intravascular disseminada; HMGB1,
proteína do grupo de alta mobilidade B1; NO, óxido nítrico; PAF, fator de ativação plaquetária; PAI­1, inibidor
do ativador do plasminogênio 1; TF, fator tecidual; TFPI, inibidor da via do fator tecidual.

Os  fatores  que,  possivelmente,  desempenham  os  papéis  principais  na  fisiopatologia  do  choque  séptico  são  os
seguintes:
• Respostas inflamatória e anti‑inflamatória. Na sepse, vários componentes da parede celular microbiana se acoplam aos
receptores nas células do sistema imune inato, desencadeando respostas pró‑inflamatórias. Provavelmente,
iniciadores de inflamações na sepse ativam vias de sinalização através dos receptores Toll‑like (TLRs, Cap. 3), que,
como você se lembra, reconhecem inúmeras substâncias derivadas de micróbios que contêm o chamado “padrão
molecular associado a patógenos” (PAMPs), além dos receptores acoplados à proteína G que detectam os peptídeos
bacterianos e as proteínas do domínio de oligomerização de nucleotídeos 1 e 2 (NOD 1, NOD 2). Uma vez ativadas,
as células imunes inatas produzem TNF, IL‑1, IFN‑γ, IL‑12, e IL‑18, além de outros mediadores inflamatórios, tais
como a proteína B1 do grupo de alta mobilidade (HMGB1). Espécies reativas de oxigênio e mediadores lipídicos
como prostaglandina e o fator de ativação plaquetário (PAF) também são produzidos. Essas moléculas efetoras
induzem células endoteliais (e outros tipos de células) a aumentarem a expressão de moléculas de adesão e a
estimularem a produção adicional de citocinas e quimiocinas. A cascata do complemento também é ativada pelos
componentes microbianos, diretamente e através da atividade proteolítica da plasmina (Cap. 3), resultando na
produção de anafilotoxinas (C3a, C5a), fragmentos quimiotáticos (C5a) e opsoninas (C3b), todos os quais
contribuem para o estado pró‑inflamatório. Além disso, os componentes microbianos podem ativar a coagulação
diretamente através do fator XII ou indiretamente através da alteração das funções do endotélio (discutido adiante).
A ativação disseminada da trombina que ocorre pode aumentar a inflamação, posteriormente, pela ativação dos
PARs nas células inflamatórias.
O  estado  hiperinflamatório  iniciado  pela  sepse  também  ativa  mecanismos  imunossupressores  contrarregulatórios,
que  envolvem  tanto  células  da  imunidade  inata  como  da  adquirida.  Como  resultado,  os  pacientes  sépticos  podem
oscilar entre estados hiperinflamatórios e imunossupressores durante a sua evolução clínica. Os mecanismos propostos
para  a  supressão  imune  incluem  o  desvio  da  produção  de  citocinas  pró‑inflamatórias  (TH1)  para  anti‑inflamatórias
(TH2) (Cap. 6), a produção de mediadores anti‑inflamatórios (p. ex., receptores TNF solúveis, antagonistas do receptor
de IL‑1, e IL‑10), apoptose de linfócitos, os efeitos imunossupressores das células apoptóticas e a indução de anergia
celular.
• Ativação e lesão endoteliais. O estado pró‑inflamatório e a ativação das células endoteliais associadas à sepse
provocam aumento de permeabilidade vascular e edema tecidual, que têm consequências deletérias tanto no aporte
de nutrientes como na remoção de escórias. Um efeito das citocinas inflamatórias é o afrouxamento das junções
oclusivas das células endoteliais, causando a saída de líquido dos vasos, o que resulta no acúmulo de edema rico
em proteína por todo o corpo. Essa alteração dificulta a perfusão do tecido e pode ser exacerbada pelo tratamento
do paciente com a utilização de fluidos intravenosos. A ativação do endotélio também aumenta a produção de
óxido nítrico (NO) e de outros mediadores inflamatórios vasoativos (p. ex., C3a, C5a e PAF), que podem contribuir
para o relaxamento dos músculos lisos vasculares e hipotensão sistêmica.
• Indução de um estado pró‑coagulante. Os desarranjos na coagulação são suficientes para produzir a terrível
complicação da coagulação intravascular disseminada em até metade dos pacientes sépticos. A sepse altera a
expressão de vários fatores que favorecem a coagulação. As citocinas pró‑inflamatórias aumentam a produção do
fator tecidual por monócitos e, possivelmente, também por células endoteliais, e diminui a produção de fatores
anticoagulantes endoteliais, como o inibidor da via do fator tecidual, a trombomodulina e a proteína C (veja a Fig.
4‑6 e Fig. 4‑8). Elas também diminuem a fibrinólise aumentando a expressão do inibidor do ativador do
plasminogênio 1 (veja a Fig. 4‑6B e Fig. 4‑8). A saída de líquido intravascular e o edema tecidual diminuem o fluxo
sanguíneo nos pequenos vasos, produzindo estase e diminuindo a eliminação dos fatores de coagulação ativados.
Agindo em conjunto, esses efeitos levam à ativação sistêmica da trombina e ao depósito de trombos ricos em fibrina
nos pequenos vasos, geralmente por todo o corpo, consequentemente comprometendo a perfusão tecidual. Na
coagulação intravascular disseminada plenamente desenvolvida, o consumo dos fatores da coagulação e das
plaquetas é tão grande que ocorre a deficiência destes, levando a hemorragias concomitantes (Cap. 14).
• Anormalidades metabólicas. Os pacientes sépticos apresentam resistência à insulina e hiperglicemia. Citocinas, tais
como o TNF e a IL‑1, hormônios induzidos por estresse (como o glucagon, o hormônio do crescimento e
glicocorticoides) e as catecolaminas conduzem à gliconeogênese. Ao mesmo tempo, as citocinas pró‑inflamatórias
suprimem a liberação de insulina, enquanto, simultaneamente, promovem a resistência à insulina no fígado e em
outros tecidos, provavelmente pela deficiente expressão na membrana de GLUT‑4, um transportador de glicose. A
hiperglicemia diminui a função do neutrófilo (dessa forma, suprimindo sua atividade bactericida) e causa um
aumento na expressão de moléculas de adesão nas células endoteliais. Embora a sepse esteja associada inicialmente
a um surto agudo na produção de glicocorticoides, essa fase pode ser seguida pela insuficiência suprarrenal e por
um deficit funcional de glicocorticoides. Isto pode decorrer da redução da capacidade de síntese de uma glândula
suprarrenal intacta ou por necrose adrenal extensa devido à coagulação intravascular disseminada (síndrome de
Waterhouse‑Friderichsen, Cap. 25). Finalmente, a hipoxia celular e a diminuição da fosforilação oxidativa levam ao
aumento da produção de lactato e acidose lática.
• Disfunção orgânica. A hipotensão sistêmica, o edema intersticial e a trombose de pequenos vasos diminuem o
fornecimento de oxigênio e nutrientes para os tecidos, que deixam de utilizar adequadamente os nutrientes que são
fornecidos, devido à hipoxia celular. Os altos níveis de citocinas e mediadores secundários diminuem a
contratilidade miocárdica e o débito cardíaco, e o aumento da permeabilidade vascular e a lesão endotelial podem
levar à síndrome da angústia respiratória aguda (Cap. 15). Em última análise, esses fatores podem conspirar para
causar a falência de múltiplos órgãos, principalmente os rins, fígado, pulmões e coração, culminando com a morte.
A  gravidade  e  o  resultado  do  choque  séptico  são  provavelmente  dependentes  da  extensão  e  da  virulência  da
infecção,  do  estado  imunológico  do  hospedeiro,  da  presença  de  outras  comorbidades  e  dos  padrões  e  níveis  de
produção  dos  mediadores.  A  multiplicidade  de  fatores  e  a  complexidade  de  suas  interações,  que  fundamentam  a
sepse,  explicam  porque  a  maioria  das  tentativas  de  intervenção  terapêutica  com  antagonistas  de  mediadores
específicos  falhou  na  eficácia  e  pode  ter  provocado  efeitos  deletérios  em  alguns  casos.  O  modelo  de  cuidados
permanece  sendo  antibióticos  para  tratar  a  infecção  subjacente  e  os  fluidos  intravenosos,  fármacos  vasopressores  e
oxigênio suplementar para manter a pressão sanguínea e limitar a hipoxia tecidual. É suficiente dizer que, mesmo nos
melhores centros clínicos, o choque séptico permanece sendo um obstinado desafio clínico.
Vale  a  pena  mencionar  aqui  que  um  grupo  adicional  de  proteínas  bacterianas  secretadas,  denominadas
superantígenos, também pode causar uma síndrome semelhante ao choque séptico (p. ex., síndrome do choque tóxico). Os
superantígenos  são  ativadores  de  linfócitos  T  policlonais  que  promovem  a  liberação  de  altos  níveis  de  citocinas,
resultando  em  uma  variedade  de  manifestações  clínicas,  que  vão  desde  uma  erupção  cutânea  difusa  (rash)  até  a
vasodilatação, hipotensão, choque e morte.

Estágios do Choque
O  choque  é  um  distúrbio  progressivo  que,  se  não  corrigido,  leva  à  morte.  O  exato  mecanismo  (ou  mecanismos)  de
morte pela sepse é ainda incerto; exceto por um aumento da apoptose de linfócitos e enterócitos, ocorre pouca morte
de  células  e  os  pacientes  raramente  apresentam  uma  hipotensão  refratária,  sugerindo  que  a  falência  dos  órgãos,
secundária ao edema e à hipoxia tecidual concomitante, tem um papel central. No caso dos choques hipovolêmico e
cardiogênico, contudo, os mecanismos da morte são razoavelmente bem compreendidos. A menos que a agressão seja
grave  e  rapidamente  fatal  (p.  ex.,  hemorragia  maciça  por  rotura  de  um  aneurisma  da  aorta),  o  choque  nas  diversas
situações tende a evoluir (se bem que um tanto artificial) através de três fases genéricas:
• Uma fase não progressiva inicial durante a qual os mecanismos compensatórios reflexos são ativados e a perfusão de
órgãos vitais é mantida.
• Uma fase progressiva, caracterizada por hipoperfusão tecidual e início do agravamento do desequilíbrio circulatório e
metabólico, incluindo a acidose lática.
• Uma fase irreversível que se estabelece após o organismo ter sofrido lesão celular e tecidual tão intensas que, mesmo
se os defeitos hemodinâmicos fossem corrigidos, a sobrevivência não seria possível.
No  início  da  fase  não  progressiva  do  choque,  diversos  mecanismos  neuro‑humorais  contribuem  para  manter  o
débito  cardíaco  e  a  pressão  sanguínea.  Estes  incluem  os  reflexos  barorreceptores,  a  liberação  de  catecolaminas,  a
ativação  do  eixo  renina‑angiotensina,  a  liberação  de  ADH  e  a  estimulação  simpática  generalizada.  O  efeito  final  é  a
taquicardia, a vasoconstrição periférica e a conservação de líquido pelos rins. A vasoconstrição cutânea, por exemplo, é
responsável pelo resfriamento e palidez característicos da pele no choque bem desenvolvido (embora o choque séptico
possa,  inicialmente,  causar  uma  vasodilatação  cutânea  e,  assim,  exibir  uma  pele  quente  e  corada).  Os  vasos
coronarianos  e  cerebrais  são  menos  sensíveis  à  resposta  simpática  e,  assim,  mantêm  o  calibre,  o  fluxo  sanguíneo  e  o
fornecimento de oxigênio relativamente normais.
Se as causas subjacentes não forem corrigidas, o choque passa imperceptivelmente para a fase progressiva, durante a
qual há hipoxia tecidual generalizada. Nesse cenário de persistência do deficit de oxigênio, a respiração aeróbica celular
é substituída pela glicólise anaeróbica com produção excessiva de ácido lático. A acidose lática resultante diminui o pH
tecidual  e  enfraquece  a  resposta  vasomotora;  as  arteríolas  se  dilatam  e  o  sangue  começa  a  acumular‑se  na
microcirculação. O acúmulo periférico não apenas piora o débito cardíaco, mas também coloca as células endoteliais
sob risco de desenvolver lesão anóxica com subsequente coagulação intravascular disseminada. Com a hipoxia tecidual
generalizada, os órgãos vitais são afetados e entram em falência.
Nos casos graves, o processo entra, por fim, em um estágio irreversível. A lesão celular generalizada é refletida pela
liberação de enzimas lisossômicas, agravando ainda mais o estado do choque. Se o intestino isquêmico permitir que a
flora intestinal penetre na circulação, o choque séptico bacteriano pode se sobrepor. Nesse momento, o paciente pode
desenvolver anúria como resultado de uma necrose tubular aguda e insuficiência renal (Cap. 20), e, apesar de medidas
heroicas, uma espiral clínica descendente quase inevitavelmente culmina com a morte.

 Morfologia
As  alterações  celulares  e  teciduais  induzidas  pelo  choque  cardiogênico  ou  hipovolêmico  são  essencialmente
aquelas  da  lesão  hipóxica  (Cap.  2);  as  alterações  podem  manifestar‑se  em  qualquer  tecido,  embora  sejam
particularmente  evidentes  no  cérebro,  coração,  pulmões,  rins,  glândulas  suprarrenais  e  trato  gastrointestinal.  As
alterações  suprarrenais  no  choque  são  aquelas  observadas  em  todas  as  formas  de  estresse;  essencialmente  há
depleção  de  lipídios  nas  células  corticais.  Isto  não  reflete  exaustão  suprarrenal,  mas,  sim,  conversão  das  células
vacuoladas relativamente inativas para células metabolicamente ativas que utilizam os seus lipídios armazenados
para  a  síntese  de  esteroides.  Os  rins  tipicamente  exibem  necrose  tubular  aguda  (Cap.  20).  Os  pulmões  são
raramente  afetados  no  choque  hipovolêmico  puro,  pois  eles  são  relativamente  resistentes  à  lesão  hipóxica.  No
entanto,  quando  o  choque  é  causado  por  sepse  ou  trauma,  pode  desenvolver‑se  lesão  alveolar  difusa  (Cap.  15),
sendo aí chamado pulmão de choque. No choque séptico, o surgimento de coagulação intravascular disseminada
leva à deposição generalizada de microtrombos ricos em fibrina, principalmente no cérebro, coração, pulmões, rins,
glândulas  suprarrenais  e  no  trato  gastrointestinal.  O  consumo  de  plaquetas  e  de  fatores  da  coagulação,
frequentemente, provoca o aparecimento de hemorragias petequiais nas superfícies serosas e na pele.
Com exceção da morte de neurônios e de miócitos pela isquemia, praticamente todos os demais tecidos podem
voltar à normalidade caso o paciente sobreviva. Infelizmente, a maioria dos pacientes com alterações irreversíveis
devidas ao choque grave morre antes que os tecidos possam se recuperar.

Consequências Clínicas
As manifestações clínicas do choque dependem da causa desencadeante. Nos choques hipovolêmico e cardiogênico, o
paciente apresenta‑se com hipotensão, um pulso fraco e rápido, taquipneia e pele cianótica, fria e pegajosa. No choque
séptico, a pele pode estar inicialmente corada e quente devido à vasodilatação periférica. A ameaça à vida, no início,
deriva  da  catástrofe  de  base  que  precipitou  o  choque  (p.  ex.,  infarto  do  miocárdio,  hemorragia  grave  ou  sepse).  No
entanto,  o  choque  rapidamente  produz  disfunções  cardíacas,  cerebrais  e  pulmonares,  e,  eventualmente,  distúrbios
eletrolíticos e acidose metabólica que exacerbam o estado calamitoso do paciente, posteriormente. Os indivíduos que
sobrevivem às complicações iniciais podem entrar em uma segunda fase dominada pela insuficiência renal e marcada
por uma redução progressiva do débito urinário, assim como por desequilíbrio hidroeletrolítico grave. A coagulopatia
frequentemente  complica  o  choque,  particularmente  quando  a  causa  é  sepse  ou  trauma,  e  pode  ter  consequências
graves ou até mesmo fatais, especialmente nos pacientes com coagulação intravascular disseminada.
O prognóstico varia de acordo com a origem do choque e sua duração. Assim, mais de 90% dos pacientes jovens e,
no  geral,  saudáveis,  com  choque  hipovolêmico,  sobrevivem  com  tratamento  adequado;  por  outro  lado,  o  choque
séptico  ou  o  choque  cardiogênico  associado  a  infarto  do  miocárdio  extenso  apresentam  taxas  de  mortalidade
substancialmente maiores, mesmo recebendo um atendimento de excelência.

 Conceitos‑chave
Choque
• Choque é definido como um estado de hipoperfusão tecidual sistêmica devido à redução do débito cardíaco e/ou
à redução do volume sanguíneo circulante eficaz.
• Os tipos de choque mais importantes são: o cardiogênico (p. ex., infarto do miocárdio), o hipovolêmico (p. ex.,
perda sanguínea), e choques associados com respostas inflamatórias sistêmicas (p. ex., em infecções graves); as
lesões cerebrais ou medulares agudas e as reações de hipersensibilidade graves também podem causar choques
neurogênico e anafilático, respectivamente.
• O choque de qualquer tipo pode levar a lesão tecidual hipóxica, se não for tratado.
• O choque séptico é causado pela resposta do hospedeiro às infecções bacterianas, virais ou fúngicas, e é uma
condição inflamatória sistêmica caracterizada pela ativação da célula endotelial, edema tecidual, coagulação
intravascular disseminada e desarranjos metabólicos que geralmente levam à falência dos órgãos e morte.

Leituras sugeridas
Dinâmica dos Fluidos
Chen, H., Schrier, R. Pathophysiology of volume overload in acute heart failure syndromes. Am J Med. 2006; 119:S11. [Antigo, mas ainda útil
na avaliação de insuficiência cardíaca e sobrecarga de líquidos.]

Hemostasia e Sangramento
Crawley, J., Zanardelli, S., Chion, C. K., Lane, D. A. The central role of thrombin in hemostasis. J Thromb Haemost. 2007; 5(Suppl
1):95. [Análise sobre as vias impactadas pela ativação da trombina.]
Crawley, J., Lane, D. The haemostatic role of tissue factor pathway inhibitor. Arterioscler Thromb Vasc Biol. 2008; 28:233. [Síntese dos papéis
fisiológicos do inibidor da via do fator tecidual.]

De Candia, E. Mechanisms of platelet activation by thrombin: a short history. Thromb Res. 2012; 129:250–256. [Análise com foco na ativação
plaquetária por PARs via trombina, mas também abrange outros pontos emergentes de possível interferência.]

Kwaan, H. C., Samama, M. M. The significance of endothelial heterogeneity in thrombosis and hemostasis. Semin Thromb Hemost.
2010; 36:286. [Análise com foco na influência do endotélio na hemostasia e na trombose.]
Mackman, N., Tilley, R. E., Key, N. S. Role of the extrinsic pathway of blood coagulation in hemostasis and thrombosis. Arterioscler
Thromb Vasc Biol. 2007; 27:1687. [Visão‑geral das principais vias na coagulação.]
Renne, T., Schmaier, A. H., Nickel, K. F., et al. In vivo roles of factor XII. Blood. 2012; 120:4296–4303. [Análise que resume os novos insights sobre a ainda
incerta função in vivo do fator XII na trombose e na biologia vascular.]

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