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A psicopatologia em geral e a psiquiatria forense em especial têm dedicado, há tempo, uma enorme
preocupação com o quadro conhecido por Psicopatia (ou Sociopatia, Transtorno Dissocial,
Transtorno Sociopático, etc).
Trata-se de um terreno difícil e cauteloso, este que engloba as pessoas que não se enquadram nas
doenças mentais já bem delineadas e com características bastante específicas, a despeito de se
situarem à margem da normalidade psico-emocional ou, no mínimo, comportamental. As
implicações forenses desses casos reivindicam da psiquiatria estudos exaustivos, notadamente
sobre o grupo de entidades entendidas comoTranstornos da Personalidade.
Lorenz e outros etólogos consideram a agressividade organizada uma aquisição evolutiva que
aparece na espécie humana há uns 40.000 anos. Em sentido social, a agressividade organizada
nasceu da necessidade de uma arma de sobrevivência mais eficaz. Nascia assim uma forma
especializada de agressão comunitária e organizada, um entusiasmo que agrega o grupo contra um
inimigo comum.
Uma de suas expressões seria a “paranóia de guerra”, que afeta e afetou populações inteiras.
Atualmente pode ser representada também por grupos étnicos, religiosos ou políticos que se unem
através de uma conduta agressiva em função de alguma ameaça comum a todos integrantes do
grupo (ameaça real ou acreditada).
Devido à falta de um consenso definitivo, esse assunto tem despertado um virulento combate de
opiniões entre os mais diversos autores ao longo do tempo. Igualmente variadas também são as
posturas diante desses casos que resvalam na ética e na psicopatologia simultaneamente. As
dificuldades vão desde a conceituação do problema, até as questões psicopatológicas de
diagnóstico e tratamento. Como seria de se esperar, também na área forense as discordâncias são
contundentes.
Historia do conceito
O conceito de Psicopata, Personalidade Psicopática e, mais recentemente, Sociopata é um tema
que vem preocupando a psiquiatria, a justiça, a antropologia, a sociologia e a filosofia desde a
antigüidade. Evidentemente essa preocupação contínua e perene existe porque sempre houve
personalidades anormais como parte da população geral.
Psicopatas são pessoas cujo tipo de conduta chama fortemente a atenção e que não se podem
qualificar de loucos nem de débeis; elas estão num campo intermediário. São indivíduos que se
separam do grosso da população em termos de comportamento, conduta moral e ética. Vejamos a
opinião dos vários autores sobre a Personalidade Psicopática ao longo da história.
Cardamo
Uma das primeiras descrições registradas pela medicina sobre algum comportamento que pudesse
se identificar à idéia de Personalidade Psicopática foi a de Girolano Cardamo(1501-1596), um
professor de medicina da Universidade de Pavia. O filho de Cardamo foi decapitado por ter
envenenado sua mulher (mãe do réu) com raízes venenosas. Neste relato, Cardamo fala em
"improbidade", quadro que não alcançava a insanidade total porque as pessoas que disso padeciam
mantinham a aptidão para dirigir sua vontade.
Pablo Zacchia (1584-1654), considerado por alguns como fundador da Psiquiatria Médico
Legal, descreve, em Questões Médico Legais, as mais notáveis concepções que logo dariam
significação às "psicopatias" e aos "transtornos de personalidade".
Pinel
Em 1801, Philippe Pinel publica seu Tratado médico filosófico sobre a alienação mental e fala de
pessoas que têm todas as características da mania, mas que carecem do delírio. Temos que
entender que Pinel chamava de mania aos estados de furor persistentes e comportamento florido,
distinto do conceito atual de mania (Berrios, 1993).
Dizia, no tratado, que se admirava de ver muitos loucos que, em nenhum momento, apresentavam
prejuízo algum do entendimento, e que estavam sempre dominados por uma espécie de furor
instintivo, como se o único dano fosse em suas faculdades instintivas. A falta de educação, uma
educação mal dirigida ou traços perversos e indômitos naturais, podem ser as causas desta espécie
de alteração (Pinel, 1988).
Prichard
Prichard, tanto quanto Pinel, lutavam contra a idéia do filósofo Locke, o qual dizia não poder existir
mania sem delírio, ou seja, mania sem prejuízo do intelecto. Portanto, nessa época, os juizes não
declaravam insanos nenhuma pessoa que não tivesse um comprometimento intelectual manifesto
(normalmente através do delírio). Pinel ePricharde tratavam de impor o conceito, segundo o qual,
existiam insanidades sem comprometimento intelectual, mas possivelmente com prejuízo afetivo e
volitivo (da vontade). Tal posição acabava por sugerir que essas três funções mentais, o intelecto,
afetividade, e a vontade, poderiam adoecer independentemente.
Foi em 1835 que James Cowles Prichard publica sua obra Treatise on insanity and other disorders
affecting the mind, a qual falava da Insanidade Moral. A partir dessa obra, o historiador G.
Berrios (1993) discute o conceito da Insanidade Moral como o equivalente ao nosso atual conceito
de psicopatia.
Morel
Morel, em 1857, parte do religioso para elaborar sua teoria da degeneração. O ser humano tinha
sido criado segundo um tipo primitivo perfeito e, todo desvio desse tipo perfeito, seria uma
degeneração. A essência do tipo primitivo e, portanto, da natureza humana, é a contínua
supremacia ou dominação do moral sobre o físico. Para Morel, o corpo não é mais que "o
instrumento da inteligência".
A doença mental inverteria esta hierarquia e converteria o humano “em besta”. Uma doença mental
não é mais que a expressão sintomática das relações anormais que se estabelecem entre a
inteligência e seu instrumento doente, o corpo.
- disposição psicopática,
- tara psíquica congênita e
- inferioridade psicopática.
Otto Gross, por sua vez, dizia que o retardo dos neurônios para estabilizarem-se depois da
descarga elétrica determinava diferenças no caráter. Assim em seu livroInferioridades
Psicopáticas, a recuperação neuronal rápida determinava indivíduos tranqüilos, e os de
estabilização neuronal mais lenta, ou seja, com maior duração da estimulação, seriam os excitáveis,
portadores dessa inferioridade.
Kraepelin
Kraepelin, quando faz a classificação das doenças mentais em 1904, usa o término Personalidade
Psicopática para referir-se, precisamente, a este tipo de pessoas que não são neuróticos nem
psicóticos, também não estão incluídas no esquema de mania-depressão, mas que se mantêm em
choque contundente com os parâmetros sociais vigentes. Incluem-se aqui os criminosos congênitos,
a homossexualidade, os estados obsessivos, a loucura impulsiva, os inconstantes, os embusteiros e
farsantes e os querelantes (Schneider, 1980).
Schneider
Em 1923, Schneider elabora uma conceituação e classificação do que é, para ele, aPersonalidade
Psicopática. Schneider (1980) descarta no conjunto classificatório da personalidade atributos tais
como, a inteligência, os instintos e sentimentos corporais e valoriza como elementos distintivos o
conjunto dos sentimentos e valores, das tendências e vontades.
Para Kurt Schneider as Personalidades Psicopáticas formam um subtipo daquilo que classificava
como Personalidades Anormais, de acordo com o critério estatístico e da particularidade de
sofrerem por sua anormalidade e/ou fazerem outros sofrer.
Entretanto, a classificação de Personalidade Psicopática não pode ser reconhecida ou aceita pelo
próprio paciente e, às vezes, nem mesmo por algum grupo social pois, a característica de fazer
sofrer os outros ou a sociedade é demasiadamente relativo e subjetivo: um revolucionário, por
exemplo, é um psicopata para alguns e um herói para outros.
Em conseqüência dessa relatividade de diagnóstico (devido à relatividade dos valores), não é lícito
ou válido realizar um diagnóstico do mesmo modo que fazemos com as outras doenças.
Resumindo, pode-se destacar neles certas características e propriedades que os caracterizam de
maneira nada comparável aos sintomas de outras doenças. O Psicopata é, simplesmente, uma
pessoa assim.
O psicopata não tem uma psicopatia, no sentido de quem tem uma tuberculose, ou algo transitório,
mas ele É um psicopata. Psicopata é uma maneira de ser no mundo, é uma maneira de ser estável.
Como em tantas outras tendências, também há um certo determinismo na concepção deSchneider.
Para ele os psicopatas são assim em toda situação vital e sob todo tipo de circunstâncias.
O psicopata é um indivíduo que não leva em conta as circunstâncias sociais, é uma personalidade
estranha, separada do seu meio. A psicopatia não é, portanto, exógena, sendo sua essência
constitucional e inata, no sentido de ser pré-existente e emancipada das vivências.
Mas a conduta do psicopata nem sempre é toda psicopática, existindo momentos, fases e
circunstâncias de condutas adaptadas, as quais permitem que ele passe desapercebido em muitas
áreas do desempenho social. Essa dissimulação garante sua sobrevivência social.
1) Hipertímicos,
2) Depressivos,
3) Inseguros,
4) Fanáticos,
5) Carentes de Atenção,
6) Emocionalmente Lábeis,
7) Explosivos,
8) Desalmados,
9) Abúlicos, e
10) Astênicos.
Evidentemente o que entendemos hoje por psicopata ou sociopata seriam, na classificação
de Schnneider, os Desalmados. Muito mais tarde Mira y López definiu aPersonalidade
Psicopática como "...aquela personalidade mal estruturada, predisposta à desarmonia
intrapsíquica, que tem menos capacidade que a maioria dos membros de sua idade, sexo e cultura
para adaptar-se às exigências da vida social". E considerava 11 tipos dessas personalidades
anormais muito semelhantes aos tipos de Schnneider. Eram eles:
1) Astênica,
2) Compulsiva,
3) Explosiva,
4) Instaável,
5) Histérica,
6) Ciclóide,
7) Sensitivo-paranóide,
8) Esquizóide,
9) Perversa,
10) Hipocondríaca, e
11) Homosexual.
Cleckley
Em 1941 Cleckley escreveu um livro chamado "A máscara da saúde", o qual se referia a este tipo de
pessoas. Em 1964 descreveu as características mais freqüentes do que hoje chamamos psicopatas.
Em 1961, Karpmam disse "dentro dos psicopatas há dois grandes grupos; os depredadores e os
parasitas" (fazendo uma analogia biológica). Os depredadores são aqueles que tomam as cosas
pela força e os parasitas tomam-nas através da astúcia e do engodo.
Cleckley, estabeleceu, em "A máscara da saúde", alguns critérios para o diagnóstico do psicopata,
em 1976, Hare, Hart e Harpur, completaram esses critérios. Somando-se as duas listas podemos
relacionar as seguintes características:
Henry Ey
Henry Ey, em seu "Tratado de Psiquiatria", inclui as Personalidades Psicopáticas dentro do
capítulo das doenças mentais crônicas, as quais considera como um desequilíbrio psíquico
resultante das anomalias caracteriológicas das pessoas. Cita as características básicas
das Personalidades Psicopáticas como sendo a anti-sociabilidade e impulsividade (Bruno, 1996).
A idéia dos Transtornos de Personalidade tal como sugerido pelo DSM começou em 1966
com Robins.
A primeira posição reflete uma tendência mais constitucionalista (intrínseca, orgânica), entendendo
que o psicopata se origina de uma constituição especial, geneticamente determinado e, em
conseqüência dessa organicidade, pouco se pode fazer.
Através da análise de dois sistemas educacionais para problemas comportamentais, como a escola
inglesa Lymam, com um sistema disciplinar rígido, autoritário, duro, e a escolaWiltwyck, americana,
onde a idéia era criar um ambiente cálido, afetuoso, propenso a amistosidade, uma "disciplina de
amor" segundo cita Cinta Mocha (Garrido, 1993), pode-se contra-argumentar a tendência extrínseca
da psicopatia. Os psicopatas constituíram o 35% da população em ambas escolas. A instituição
americana Wiltwyck teve um marcante êxito inicial, mas a taxa de reincidência em atitudes anti-
sociais, ao longo de alguns anos de acompanhamento, foi o mesmo.
A terceira escola é a psicanalista, que só trata das perversões em relação com a sexualidade.
Quando o transtorno implica outras pulsões, Freud fala de libidinização da dita pulsão, a qual havia
sido "pervertida" pela sexualidade. A perversão adulta aparece como a persistência ou reaparição
de um componente parcial da sexualidade. A perversão seria uma regressão a uma fixação anterior
da libido. Recordemos que, para Freud, a passagem à plena organização genital supõe:
K. Eissler, no final da década de 40, considerava os psicopatas como indivíduos com ausência de
sentimentos de culpa e da ansiedade normal, superficialidade de objetivos de vida e extremo
egocentrismo. Os irmãos Mc Cord, em 1956, descrevem sua "síndrome psicopática" com as
seguintes características: escasso ou nenhum sentimento de culpa, capacidade de amar muito
prejudicada, graves alterações na conduta social, impulsividade e agressão.
Outros autores, resumindo, nas décadas sucessivas de 60 e 70, foram também definindo os traços
característicos da psicopatia com termos tais como; perturbações afetivas, perturbações do instinto,
deficiência superegoica, tendência a viver só o presente, baixa tolerância a frustrações. Alguns
classificam esse transtorno como anomalias do caráter e da personalidade, ressaltando sempre a
impulsividade e a propensão para condutas anti-sociais (Glover, Henri Ey, Kolb, Liberman).
Neurofisiologia da Agressão
É necessário entender um pouco mais sobre a fisiologia da agressão para inserir, depois, a noção
da sociopatia. Há nesse site um artigo sobre Cérebro e Violência que pode completar o que se vê
aqui agora.
Dessa forma, o cérebro humano resultaria da integração de “três cérebros” distintos, com diferentes
características estruturais, neurofisiológicas e, especialmente, com diferentes performances
comportamentais. Como herança de nossos antepassados, ou seja, dos répteis, dos mamíferos e
dos primeiros primatas, possuímos um conjunto de estruturas nervosas chamadas de Gânglios da
Base e o complexo Estriado. Essa é a parte mais primitiva do cérebro humano.
Juntamente com as estruturas neuronais acima, o ser humano possui também a medula espinhal, o
bulbo e a protuberância, formando parte do cérebro posterior e do cérebro médio, ou mesencéfalo.
Essas estruturas comportam os mecanismos básicos da reprodução e da autoconservação,
incluindo a regulação do ritmo cardíaco, da circulação sanguínea e da respiração. Nos peixes e
anfíbios essas estruturas formão quase o cérebro todo.
Essa introdução é importante porque mostra alguns elementos comuns ao ser humano e aos
répteis, provenientes de algumas estruturas cerebrais arcaicas. As atitudes favorecidas por essas
estruturas antigas seriam, por exemplo, a seleção do lugar, a territorialidade, o envolvimento na
caça, o acasalamento e, também, alguns mecanismos que intervêm na formação da hierarquia
social, como a seleção de líderes. Aqui que se daria também a participação nos comportamentos
ritualistas. São condutas que existem naturalmente nos animais inferiores e, devidamente
domesticadas, no ser humano.
Em torno das estruturas do cérebro antigo ou arque-cérebro, se encontra o Sistema Límbico. Esse
sistema, que é o maior responsável pela emoção, já aparece muito rudimentarmente nos répteis,
algo mais desenvolvido nos mamíferos e bem mais completo no ser humano.
O comportamento dos mamíferos, das classes mais inferiores até as mais desenvolvidas, incluindo
os humanos, difere dos répteis por conta da enorme variedade de comportamentos possíveis, sendo
os répteis bem mais limitados, e também porque nos mamíferos já aparece a emoção, tão mais
elaborada quanto mais desenvolvido for oSistema Límbico. São do Sistema Límbico as expressões
de fúria do gato, do cão, algo semelhantes às atitudes de fúria do ser humano. Nos répteis não
notamos nenhuma expressão dessa natureza.
Acrescenta-se que a quase totalidade dos psicofármacos atua no Sistema Límbico. Também os
sistemas neuroendócrino, neuroimune, neurovegetativo, os ritmos circadianos, são todos fortemente
influenciados pelas emoções, pelo Sistema Límbico.
Uma parte importantíssima dessa região límbica é a chamada Amígdala, que tem um papel
transcendente na agressividade. Também existem motivos para acreditar que a base do
comportamento altruísta se encontra no Sistema Límbico. O amor, assim como o comportamento
altruísta, parecem ser aquisições do Sistema Límbico humano. Em pesquisas, a destruição
experimental das Amígdalas (são duas, uma para cada um dos hemisférios cerebrais) faz com que o
animal se torne dócil, sexualmente indistinto, afetivamente descaracterizado e indiferente ás
situações de risco.
O estímulo elétrico agindo nas Amígdalas provoca crises de violenta agressividade. Em humanos, a
lesão da Amígdala faz, entre outras coisas, com que o indivíduo perca o sentido afetivo da
percepção de uma informação vinda de fora, como a visão de uma pessoa conhecida ou querida.
Ele sabe quem está vendo, mas não sabe se gosta ou desgosta da pessoa que vê.
Finalmente, na escala filogenética, aparece o neocórtex, a parte mais jovem do cérebro. Esse
neocórtex já existe em estado rudimentar nos mamíferos inferiores, e sofre um desenvolvimento
impressionante nos primatas. O processo evolutivo da neocórtex explode em velocidade na linha
dos ancestrais homínidos em comparação com outros animais, e essa evolução abrupta surpreende
também nos grandes mamíferos aquáticos.
Assim, até chegar ao estágio cerebral atual, o ser humano é fruto de uma evolução anatômica e
funcional.
Cérebro e Personalidade
A personalidade inclui, em meio a todos seus traços, a cognição e a percepção. Essas atividades
representam uma operação complexa baseada em redes neuronais intrincadas e perfeitamente
integradas, as quais Eduardo Mata chama de Módulos, portanto, a atividade cerebral seria do tipo
modular.
Todo esse procedimento adaptativo resultante das Assembléias Neuronais não se faz de maneira
linear, seu curso e seqüência não se pode prever. Na pessoa normal parece que não basta a
compreensão dos fenômenos químicos ou físicos para predizer como se dará a sucessão de
atitudes adaptativas, tais como o autocontrole, a iniciativa, a regulação do afeto, do juízo, a
destrutividade, o planejamento da fuga ou do ataque. De modo geral, há maior ou menor
probabilidade da pessoa reagir assim ou assado mas as atitudes serão sempre circunstanciais, sem
que tenhamos certeza da previsão.
Quando conseguimos prever a maneira como a pessoas reagirá, como atuará em determinadas
circunstâncias, em outras palavras, quando a pessoa reage sempre dessa ou daquela maneira
diante das circunstâncias, e quando essas atitudes fazem sofrer (ela ou os outros), provavelmente
estaremos diante de um Transtorno da Personalidade.
Uma observação interessante é a crescente habilidade das crianças e adolescentes para regular
sua conduta, à medida que o cérebro amadurece. Esse amadurecimento parece ser conseqüência
não só da experiência, senão também da mielinização das áreas pré-frontais com as conseqüentes
alterações nas redes neuronais. Trata-se de um processo que continua até o fim da vida (em
velocidade e quantidade decrescentes).
As pesquisas sobre a Personalidade Psicopática têm enfocado ora alguns aspectos sintomáticos,
ora outros. Alguns estudos enfocam essa alteração da personalidade em relação às condutas
delituosas, à violência, dificuldades no controle dos impulsos, sexualidade de risco e desordenada e
consumo abusivo de substâncias.
Algumas linhas de pesquisa têm dedicado considerável atenção aos aspectos anti-sociais e
criminais desse transtorno, enquanto outros começam a se preocupar com a falta de empatia e
loqüacidade comum aos psicopatas. Ressaltam-se ainda as pesquisas em relação ao encanto
superficial dos psicopatas, à falta de arrependimentos, à incapacidade para amar e à gritante
irresponsabilidade. São escassas ainda as pesquisas sobre aPersonalidade Psicopática e as
condutas terroristas.
Atualmente o estudo da Personalidade Psicopática permite fazer a distinção entre duas estruturas.
A primeira delas (Fator 1), agrupa os sintomas de eloqüência, falta de sentimentos de
arrependimento ou culpa, afetos superficiais, falta de empatia, e extrema dificuldade em aceitar
responsabilidades. Esta variante não caracteriza necessariamente a pessoa anti-social, antes disso,
parece caracterizar uma grande puerilidade ou defeito na maturidade plena da personalidade.
A segunda estrutura (Fator 2) consiste nos verdadeiros traços anti-sociais, ou seja, na agresividade
e na falta de controle dos impulsos. O Fator 1 não está necessariamente associado ao Fator 2, mas
este sim, para que seja dado diagnóstico de Psicopatia, deve obrigatoriamente ter como pré-
requisito o Fator 1.
Lewis cita, entre outros, as tipologias de Blackburn. Esse autor refere que, enquanto a psiquiatria
norteamericana define a conduta anti-social em termos comportamentais, outras definções têm se
preocupado com as alterações emocionais.
Existem dois grupos em relação a esse aspecto. Um deles formado por pessoas com escassos ou
nenhum sentimento de arrependimento ou culpa referentes à sua conduta anormal e têm pouca ou
nenhuma empatia para com seus pares embora se façam simpáticos e agradáveis (Fator 1, de
Hare). Parece que o critério de observação é ético por excelência.
O outro grupo é formado por pessoas com tendências neuróticas: apesar da conduta anormal
apresentam emotividade excesiva e queixas de conflito interno em relação à culpa, ansiedade,
depressão, arrependimento, paranóia, e outros sintomas neuróticos. Aqui os critérios de observação
são psicodinâmicos, psicopatológicos. No primeiro caso é a chamada Psicopatia
Primária (verdadeira), e a segunda Psicopatia Secundária.
Segundo idéias de Zuckermam (1, 2), uma das características do psicopata seria um marcante traço
da personalidade caracterizado por psicoticismo, impulsividade, busca de sensações e atitudes não
socializadas, porém, esse supertraço sociopático não estaria presente só na Personalida
Psicopática, mas também na Personalidade Borderline.
Fowles ressalta a “falta de medo” dos psicopatas, mas só na Psicopatia Primária, ou seja,
naqueles que não sentem ansiedade. Horvath e Zuckerman afirmam que, na busca de sensações e
experiências intensas, os psicopatas assumem diversos tipos de riscos, como por exemplo,
trabalhos ou esportes perigosos, inprudência ao dirigir, exposição a situações ilegais, uso abusivo
de drogas, sexo inseguro. Na vida militar costumam aceitar voluntariamente missões voluntárias de
risco.
Principais Sintomas
Tem havido bastante controvérsia em relação ao conceito de Personalidade Psicopáticaou Anti-
social. Há autores que diferenciam psicopata de anti-social, mas, em nosso caso, essa distinção é
dispensável em benefício do melhor entendimento do conceito. Howardsugere que os conceitos de
psicopatia podem agrupar-se em três tipos:
Isso não implica que cada um desses três tipos seja mutuamente excludente; a sociopatia é vista
como um conceito amplo que engloba tanto a psicopatia primária como a secundária, assim como
uma alta proporção de criminosos comuns.
Otto Kemberg classifica a sociopatia de moso diferente. Para ele é extremamente difícil fazer o
diagnóstico da psicopatia, quando a situação clínica não está claramente definida.
Autores psicanalíticos consideram a Psicopatia como uma grave patologia do Superego como sendo
uma síndrome de Narcisismo Maligno, cujas características seriam a conduta anti-social, agressão
ego-sintônica dirigida contra outros em forma de sadismo, ou dirigida contra se mesmo em forma de
tendências automutiladoras ou suicidas sem depressão e conduta paranóide.
Portanto, dentro das relações de objeto (com os outros), seria intensa a rivalidade e inveja,
consciente e/ou inconscientemente, refletidos na contínua tendência para exploração do outro,
incapacidade de depender de outros, falta de empatia com para com outros, falta de compromisso
interno em outras relações.
Narcisismo Maligno
Muitas vezes é extremamente difícil fazer o diagnóstico da psicopatia, quando a situação clínica não
está claramente definida. Por isso Otto Kernberg faz um diagnóstico diferencial entre três tipos de
ocorrências anti-sociais:
Principais Sintomas
1. - Encanto superficial e manipulação
Nem todos psicopatas são encantadores, mas é expressivo o grupo deles que utilizam o encanto
pessoal e, conseqüentemente capacidade de manipulação de pessoas, como meio de sobrevivência
social.
Através do encanto superficial o psicopata acaba coisificando as pessoas, ele as usa e quando não
o servem mais, descarta-as, tal como uma coisa ou uma ferramenta usada. Talvez seja esse
processo de coisificação a chave para compreendermos a absoluta falta de sentimentos do
psicopata para com seus semelhantes ou para com os sentimentos de seu semelhante.
Transformando seu semelhante numa coisa, ela deixa de ser seu semelhante.
Normalmente o psicopata diz o que convém e o que se espera para aquela circunstância. Ele pode
mentir com a palavra ou com o corpo, quando simula e teatraliza situações vantajosas para ele,
podendo fazer-se arrependido, ofendido, magoado, simulando tentativas de suicídio, etc.
É comum que o psicopata priorize algumas fantasias sobre circunstâncias reais. Isso porque sua
personalidade é narcisística, quer ser admirado, quer ser o mais rico, mais bonito, melhor vestido.
Assim, ele tenta adaptar a realidade à sua imaginação, à seu personagem do momento, de acordo
com a circunstância e com sua personalidade é narcisística. Esse indivíduo pode converter-se no
personagem que sua imaginação cria como adequada para atuar no meio com sucesso, propondo a
todos a sensação de que estão, de fato, em frente a um personagem verdadeiro.
Os laços sentimentais habituais entre familiares não existem nos psicopatas. Além disso, eles têm
grande dificuldade para entender os sentimentos dos outros mas, havendo interesse próprio, podem
dissimular esses sentimentos socialmente desejáveis. Na realidade são pessoas extremamente
frias, do ponto de vista emocional.
4. - Amoralidade
Os psicopatas são portadores de grande insensibilidade moral, faltando-lhes totalmente juízo e
consciência morais, bem como noção de ética.
5. - Impulsividade
Também por debilidade do Superego e por insensibilidade moral, o psicopata não tem freios
eficientes à sua impulsividade. A ausência de sentimentos éticos e altruístas, unidos à falta de
sentimentos morais, impulsiona o psicopata a cometer brutalidades, crueldades e crimes.
6. - Incorregibilidade
Dificilmente ou nunca o psicopata aceita os benefícios da reeducação, da advertência e da correção.
Podem dissimular, como dissemos, durante algum tempo seu caráter torpe e anti-social, entretanto,
na primeira oportunidade voltam à tona com as falcatruas de praxe.
Mesmo no meio familiar o psicopata tem dificuldades de adaptação. Durante o período escolar
tornam-se detestáveis tanto pelos professores quanto pelos colegas, embora possam dissimular seu
caráter sociopático durante algum tempo. Nos empregos a inconstância é a característica principal.
Personalidade Psicopática, Sociopata, Personalidade Anti-social ou Dissocial ?
Alguns autores não vêem como sinônimo, a Personalidade Psicopática e aPersonalidade Anti-
social. A Personalidade Anti-social, segundo os autores que a diferenciam da psicopática, se
constitui num caso mais franco, declarado e aberto de anomalias no relacionamento, ou seja, menos
dissimulado e teatral que a psicopática. Essas pessoas costumam ser mais impetuosas, contestam
com mais franqueza as normas sociais, criam mais transtornos e animosidades com os demais e,
por fim, estão mais associados aos fatores de criminalidade que os psicopatas.
De acordo com essa visão, os psicopatas costumam ser até mais perigosos que os sociopatas,
tendo em vista sua maneira dissimulada de ocultar a índole contraventora. Os sociopatas atentam
contra as normas sociais mais abertamente que os psicopatas.
Para nós, e creio que academicamente também, será benéfico tomar o sociopata e o psicopata
como a mesma ocorrência. O DSM.IV chama esses casos de Personalidades Anti-sociais e a
CID.10 de Personalidades Dissociais, ambos afastando-se da denominação Psicopata. Isso se
deve, exclusivamente, à natureza etimológica da palavra. Por uma questão de coerência, assim
como a cardiopatia significa qualquer patologia que acontece sobre o coração, o termo psicopatia
deveria referir-se a qualquer patologia psíquica. Portanto não é correto, etimologicamente, chamar
de psicopatas apenas os sociopatas. (Veja esses transtornos no DSM.IV e
na CID.10 como Personalidade Dissocial).
F Eloqüência 2 1 0
1 Encanto e simpatia superficiais
1 Sensação de grandiosidade
1 Mentiras patológicas
1 Autoridade e mando
1 Manipulação
1 Falta de arrependimento e culpa
1 Afetos superficiais
1 Instabilidade emocional
1 Falta de empatia para com os outros
1 Não aceita responsabilidade por suas ações
2 Necessidade de estimulação continuada
2 Tendência ao Aborrecimento
2 Estilo de vida parasita
2 Poiuco controle da conduta
2 Problemas de conduta precoce
2 Falta de metas realistas
2 Impulsividade
2 Irrsponsabilidade Delinqüência juvenil
TOTAL
Pontuação:
Os traços são separados em duas categorias; F1 e F2, sendo:
F1= Traços centrais da psicopatia.
F2= Traços de instabilidade.
Valoração:
- 2 Pontos: quando a conduta do sujeito é consistente e se ajusta à intenção do item.
- 1 Ponto: a conduta do sujeito se ajusta em certa medida mas não no grau suficiente para pontuar
2. Existem dúvidas, conflitos na informação que não podem resolver-se a favor da pontuação 2, nem
tampouco em 0.
- 0 Ponto: o item não se aplica. O sujeito não mostra o traço ou a conduta na questão que propõe o
item.
Conclusão:
0-20: normal.
21-30: grupo médio.
31 o mais: psicopata.
Referência especial:
Acad. Prof. Dr. Hugo Marietán, Alcmeon, número 27, 1998. Veja emhttp://www.alcmeon.com.ar/8/31/Marietan.htm
Referências
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2. Berrios G - Puntos de vista europeos em os transtornos da personalidad, Comprehensive Psychiatry, Nº 1, 1993.
3. Bruno A, Tórtora G - Las psicopatías, Psicologia forense, Sexologia e praxis, año 3, vol. 2, Nº 4, año 1996.
4. Garrido GV – Psicópata, Editorial Tirant Lo Blanch; Valência; 1993.
5. Hare RD, Forth AE - Psychopathy and lateral preference. Journal of Abnormal Psychology, 94(4): 541-546, 1985
6. Howard RC - Psychopathy: A Psychobiological perspective. Pers. Indiv. Diff. 7 (6): 795-806; 1986
7. Kernberg O - Diagnóstico Diferêncial da Conducta Antisocial, Revista de Psiquiatría, 1988,volúmem 5, página 101 a 111,
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