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This is an article I wrote about the spread of online misinformation and

hate speech targeting LGBTQ individuals. In which I also interview the


philosopher and professor of Gender Studies at UC-Berkeley, Judith
Butler, on how she faced the false stories about her work that went viral
in Brazil. (In Portuguese)

Quando ​fake news ​vira discurso de ódio


Dezembro de 2017 - Por Roberto Peixoto 1

“Nova legislação canadense permite governo retirar crianças de pais que não aceitarem
a identidade de gênero delas”; “Ontário aprova medida permitindo o governo afastar
filhos de pais que se oponham à ideologia de gênero”; “Ontário aprova lei ‘totalitária’
que permite o governo tirar crianças de lares cristãos”; “Lei permite que autoridades
tomem crianças de pais que se recusem a aceitar ideologia de gênero”. Essas são só
algumas das várias manchetes que estamparam sites conservadores dos Estados
Unidos e do Brasil após o governo da província de Ontário, no Canadá, aprovar a “Lei
89”, em junho de 2017.

Diversas manchetes falsas e tendenciosas circularam no Brasil e no mundo após aprovação da “Lei 89”.
Imagem: Colagem sobre foto de Ishmael Daro / BuzzFeed News

1
Reportagem produzida como projeto de conclusão da disciplina Gênero, Sexualidade e Redes Sociais,
oferecida pelo Departamento de Comunicação Social da UFPE.
A lei, também chamada de Decreto de Serviços para a Criança, Juventude e Família
(​​Child, Youth and Family Services Act, em tradução livre), na verdade, apenas
determina a modernização, respeitando os direitos humanos, das diretrizes legais da
província canadense que envolvem o zelo e o bem-estar de crianças e adolescentes.
Contudo, desde que o projeto de lei começou a tramitar na Assembleia Legislativa de
Ontário, em março deste ano, diversos sites de notícias passaram a publicar inverdades
a respeito da então proposta.

“A ‘Lei 89’ não confere ao governo o poder de arrancar crianças de famílias tendo como
justificativa casos de pais que não concordem com a identificação de gênero de seus
filhos. Qualquer alegação do tipo é falsa”, diz Alicia Ali, porta-voz do deputado Michael
Coteau, que elaborou o Decreto. “O que essa lei faz é fortalecer os direitos das crianças
e dos adolescentes para que suas perspectivas sejam respeitadas. Na verdade, as
atuais condições de proteção não mudaram. O abuso físico, sexual e emocional, a
negligência e o risco de maus-tratos, continuam sendo a força motriz de qualquer
decisão de remoção de uma criança de sua casa”.

Apesar dos esforços do governo de Ontário em combater a disseminação de boatos,


muito do que foi publicado online sobre o Decreto de Serviços para a Criança era ​fake​
news ​(notícias falsas)​​. ​Esse é um termo ​recente, cunhado após o agitado cenário
político internacional de 2016. Naquele ano, as eleições norte-americanas e a votação
popular para a saída do Reino Unido da União Europeia levaram a uma enxurrada de
notícias falsas na Internet. Estatísticas recém divulgadas sobre tal fenômeno revelam a
dimensão desse problema: nas últimas semanas, somente o Facebook reconheceu
que, entre janeiro de 2015 e agosto de 2017, cerca de 146 milhões de seus usuários
podem ter visto informações erradas em sua plataforma; já o Twitter admitiu que, entre
setembro de 2016 até 15 de novembro do mesmo ano, cerca de 1,4 milhão de ​tweets​,
que geraram 288 milhões de impressões, circularam informações falsas.

Aliado a essa propagação, está o fato de que identificar ​fake​ news ​não é uma tarefa
fácil para muita gente. É o que comprova um recente estudo da Universidade de
Stanford. Nele, pesquisadores desenvolveram avaliações com mais de 7 mil estudantes
norte-americanos, nas quais analisaram o chamado “raciocínio cívico online”, ou seja, a
capacidade desses alunos de pesquisar, avaliar e verificar informações sociais e
políticas no mundo digital. Com isso, os professores de Stanford obtiveram resultados
alarmantes: entre os alunos avaliados, 80% dos que cursam o Ensino Fundamental e
82% dos que estão no Ensino Médio não conseguiram distinguir uma reportagem de um
anúncio publicitário e outros 30% do alunos do Médio não conseguiram identificar como
falsa uma notícia no Facebook que simulava um veículo de comunicação de verdade.

Teresa Ortega, uma das coautoras do estudo, acredita que, embora as empresas de
tecnologia devam ser responsabilizadas pela promoção de desinformações em suas
plataformas, não devemos depositar total responsabilidade nelas. “As redes sociais e os
motores de buscas são essencialmente agências de publicidade”, alerta ela. “O
principal compromisso dessas empresas é maximizar seus lucros; não é assegurar o
intercâmbio de informações precisas. Não vamos confiar nelas para determinar o que é
e o que não é verossímil”. Contudo, Ortega faz uma sugestão: “Precisamos cultivar um
compromisso com a precisão para que possamos tomar decisões bem informadas que
estejam em nosso melhor interesse. Dito isto, acho que essas empresas fariam bem em
investir em esforços de divulgação pública para garantir que as pessoas estejam
preparadas para avaliar com sucesso o conteúdo que elas encontram em suas
plataformas”.

Judith​ ​Butler

Ao longo de sua recente visita ao Brasil, a filósofa americana Judith Butler, uma das
convidadas do seminário Os Fins da Democracia, realizado no Sesc Pompeia, em São
Paulo, sofreu uma série de protestos e manifestações de discurso de ódio, que
culminaram também em ataques à Wendy Brown, esposa de Butler. Enquanto ambas
embarcavam de volta para os EUA, manifestantes perseguiram as duas no saguão do
Aeroporto de Congonhas, gritando ofensas e acusando Brown (confundida pelos
presentes por Butler) de pedófila. Em entrevista por e-mail a reportagem, Butler relata o
episódio: “Fiquei chocada porque as pessoas que se opuseram à minha presença no
Brasil estavam gritando sobre pedofilia. Qual seria a possível ligação? Estas são
pessoas que não leram, mas que confiam nas informações obtidas de fontes de notícias
de Direita”.

A intelectual critica as diversas notícias falsas espalhadas em sites conservadores do


Brasil, como uma que associa suas ideias e pensamentos à uma suposta ação em que
professoras forçam um menino a aplicar batom, que foi gravada e disseminada pela
internet com mais de dois milhões de visualizações e cerca de 80 mil
compartilhamentos (tal vídeo é falso e não tem qualquer associação com filósofa,
segundo checagem da Agência Lupa2, uma das principais agências de fact-checking do
Brasil): “Pode-se esperar que alguns conservadores também se oponham à circulação
desse tipo de inverdades e que muitos cristãos não aceitem as inverdades que os estão
sendo apresentadas. Mas, em última análise, precisamos de uma prática jornalística
progressiva e de organizações de mídia vigilantes e cautelosas que podem contestar
essas caricaturas inflamatórias e ofensivas no campo dos estudos de gênero”.

A filósofa estadunidense, Judith Butler, numa palestra na Universidade de Hamburgo, em Abril de 2007.
Imagem: Jreberlein / Domínio público via Wikimedia Commons

Em uma petição online, no site CitzenGo, pedindo o cancelamento da palestra da


filósofa no Sesc Pompeia, Butler foi acusada de promover a “ideologia de gênero”,
termo que vem ganhando destaque não somente nas manchetes ​fake news do começo
desta reportagem, como também em discursos contrários à defesa dos direitos da
comunidade LGBTQ. Sobre tal assunto a filósofa argumenta: “Muito do que é dito sobre
a ‘ideologia de gênero’ é notoriamente falso, e é fabricado para estimular o medo. O
ensino de gênero nas escolas é uma maneira de ensinar aos alunos a refletir sobre os
papéis sociais que os meninos e meninas são impostos a aceitar, é mostrar-lhes que os
papéis podem mudar e é refletir sobre questões que eles encontram na sociedade,
como desigualdade e violência. Ele não prescreve novos papéis, e certamente não

2
http://piaui.folha.uol.com.br/lupa/2017/11/01/video-professoras-menino-batom/
ensina ninguém a viver de acordo com novas ou antigas normas de gênero, e
certamente nunca instruiu ninguém em práticas sexuais”.

No último mês de agosto o Facebook divulgou um comunicado acerca de sua mais


nova política: se uma página da rede social for descoberta compartilhando diversas
notícias falsas, ela seria impossibilitada de promover anúncios na plataforma de Mark
Zuckerb. Já o Twitter, após rever suas diretrizes de uso, recentemente estabeleceu que
irá retirar o selo de conta “verificada” de perfis que violarem essas novas regras.
Contudo, ainda não se sabe ao certo quais usuários poderão ser afetados por essa
política do microblog.

Questionada se essas atuais iniciativas para combater a desinformação e o discurso de


ódio nas redes sociais são eficazes, Judith Butler conclui: “Eu não acho que esses
esforços são suficientes, mas acho que eles estabeleceram um importante precedente.
Seria uma grande vantagem as democracias em todo o mundo terem um jornalismo
investigativo forte que sabe entender as novas tecnologias midiáticas e as redes
sociais, visto que ela gera inverdades que amedrontam algumas pessoas e prejudicam
outras. Eu acho que precisamos reviver o jornalismo investigativo, que é explicitamente
‘crítico’. Por crítico, quero dizer querendo ver como o conhecimento é formado, em que
critérios que ele se baseia, se alegações são apoiadas por evidências e se declarações
podem se tornar alegações alucinantes”.

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