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Edição 26, volume 1, artigo nº 07, Julho/Setembro 2013

D.O.I: 10.6020/1679-9844/2607

EDUCAÇÃO E DESENHO: A IMPORTÂNCIA DA


COMPREENSÃO DA ICONOGRAFIA E DA
ICONOLOGIA NA ANÁLISE DO LIVRO DIDÁTICO

EDUCATION AND DESIGN: THE IMPORTANCE OF


UNDERSTANDING OF ICONOGRAPHY AND
ICONOLOGY IN THE ANALYSIS OF TEXTBOOK

Suely dos Santos Souza1, Gláucia Maria Costa Trinchão2

1
Universidade Estadual de Feira de Santana,Departamento de Letras e Artes, Feira de
Santana, BA, Brasil, mission.suely@hotmail.com
2
Universidade Estadual de Feira de Santana,Departamento de Letras e Artes, Feira de
Santana, BA, Brasil, gaulisy@gmail.com

Resumo – O texto ressalta a importância dos estudos realizados por Erwin


Panofisk, em 1955, sobre iconografia e Iconologia, aplicando seu método,
através de uma abordagem qualitativa, à análise de duas imagens de
manifestações populares, do período do Brasil Império, contidas no livro
didático História 5º ano, utilizado na rede municipal de Santo Estevão-BA.
Tem como objetivo identificar indicadores de concepções ideológicas que
denotem preconceito e discriminação racial. Acredita-se que uma postura
crítico-reflexiva sobre a imagem é relevante para as práticas pedagógicas,
pois esta trabalha o imaginário, a memória e a identificação de elementos
culturais e está carregada de conteúdos, códigos, signos e significados,
assim como constroem estereótipos e preconceitos de determinadas
visões de mundo. Conclui-se que o Livro Didático, ainda hoje, traz em suas
imagens abordagens que precisam ser desconstruídas para que se tenha
uma educação realmente contextualizada e democrática.
Palavras-chave: Análise de imagens. Iconografia. Iconologia. Concepções
ideológicas.

Abstract – The text highlights the importance of studies by Erwin Panofisk,


in 1955, on iconography and iconology, applying his method, using a
qualitative approach to the analysis of two images of popular
demonstrations from Brazil’s Empire period, contained in the textbook
História 5° Ano, used in the Santo Estevão - BA municipal teaching system.

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It aims to identify indicators of ideological concepts that denote racial
prejudice and discrimination. It is believed that a critical-reflexive posture
upon the images relevant to the pedagogical practice, since it works on the
imaginary, memory and the identification of cultural elements. It is also full
of contents, codes, signs and meanings, which lead to stereotypes and
certain prejudices. Conclude that the textbook, still brings in today’s images
approaches that need to be deconstructed in order to have a truly
contextualized and democratic education.
Keywords: Analysis of images. Iconography. Iconology. Ideological
conceptions.

1. Introdução

O texto ressalta a importância dos estudos realizados por Erwin Panofisk, em 1955,
que findou na elaboração do método iconográfico. Esse consiste em descrever,
classificar e analisar imagens – iconografia, e do estudo cultural, destacando os
valores simbólicos nelas contidos – Iconologia. A compreensão e aplicação desse
método torna-se relevante para estudos sobre a cultura imagética nos livros
didáticos, objetivo desta pesquisa que se iniciou no curso de Especialização em
Desenho e se amplia no Mestrado em Educação, com a finalidade de
desenvolvimento de dissertação, ambos na Universidade Estadual de Feira de
Santana-UEFS.
Destaca-se aqui, a análise de indicadores que suscitem concepções
ideológicas de cunho raciais presentes em imagens desse instrumento didático,
especificamente para o ensino de História em escolas públicas. O objeto de estudo
são duas imagens, selecionadas para este trabalho, dentre outras identificadas no
livro História – 5º ano, da Editora Moderna, Projeto Buriti, utilizado na rede municipal
de ensino de Santo Estevão - BA.
Acredita-se que a imagem é elemento visual importante para as práticas
pedagógicas e contribui para o trabalho com o imaginário, a memória e a
identificação de elementos culturais. Entende-se também que elas portam
conteúdos, códigos, signos e significados, mas ao mesmo tempo, constroem
estereótipos, e preconceitos de determinadas visões de mundo.
Nesse caminho, pretende-se, então, estabelecer níveis de compreensão e
entendimento, a partir de um diálogo entre os campos de conhecimento: Educação e

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Desenho, tornando-os comunicativos entre si e possibilitando aos indivíduos
envolvidos no processo de ensino-aprendizagem formas didáticas de ver, sentir e
perceber as múltiplas implicações do conhecimento em Desenho, linguagem que se
traduz aqui enquanto imagem, para a Educação e para a construção social dos
indivíduos.
Esse estudo, portanto, contribui para a compreensão das representações
visuais que compõem o livro didático, chamando a atenção de docentes para a
necessidade de trabalhar as imagens criticamente em suas práticas pedagógicas.
Pois, as mesmas exteriorizam conceitos e concepções que, se passarem
despercebidos pelo educador, podem difundir e reforçar indicadores discriminatórios.
Esses precisam ser desvendados e desconstruídos, pois reforçam preconceitos e
produzem representações que desvalorizam o outro.
Em suma, aborda-se a compreensão dos conceitos de iconografia e
iconologia aplicados a leitura de Desenhos-imagens na Educação, através da
análise de duas imagens destacadas do livro de História – 5° ano, que retratam
situações de festas no Brasil Império: 1 - Batuque em São Paulo, manifestação
popular dos negros escravos e libertos e 2 - Festa do Divino, da Igreja Católica, com
o objetivo maior de despertar a visão critica dos educadores sobre indicadores
ideológicos contidos em imagens no âmbito escolar.

2. Compreendendo os conceitos de iconografia e iconologia

Quando o assunto é análise de imagens, o simples ato da observação não é


suficiente para dar conta de todas as particularidades necessárias para o
entendimento do que as mesmas pretendem expressar ou transmitir de conceitos,
valores ou aspectos culturais, faz-se necessária uma análise cuidadosa que ajude a
compreender as ideias que se quer passar.
Vindo do grego, o termo iconografia, deriva de “eikon”, imagem e “graphia”,
escrita, a iconografia apresenta-se enquanto área de estudo que se encarrega de
descrever, classificar e analisar as mais variadas imagens, em sua composição
visual. Enquanto o termo iconologia vem de “eikon”, imagem e “logia”, de logos,

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palavra, estudo, pensamento, vindo a denotar o estudo cultural, dos valores
simbólicos contidos nas obras.
Segundo Peter Burke (2004), os termos iconografia e iconologia foram
relançados no mundo da História da Arte nas décadas de 1920 e 1930, sendo que
iconologia foi tema do livro renascentista intitulado com esse mesmo nome e
publicado por Cesare Rispa em 1593, e iconografia já estava em uso no início do
século XIX. Burke também relata que em Hamburgo havia um grupo de estudiosos
iconografistas, dentre os quais se destacava Erwin Panofsky (1892-1968), que
sintetizou um famoso ensaio sobre o tema, inicialmente publicado em 1939.
Tendo em vista a produção e importância desse autor, tomamos o mesmo
como base de nosso estudo acerca dos conceitos aqui apresentados. Nesse
aspecto, será utilizada como fonte base dessa análise a obra O Significado nas artes
visuais, de Erwin Panofzky, 1955.
Panofsky sistematiza seu método em três níveis básicos, em que aborda a
experiência prática, como também as questões de sensibilidade e simbolismos que
a imagem pode abarcar. Assim, o autor distingue os três níveis no seu tema ou
significado:
I- Tema primário ou natural, subdividido em factual e expressional. É
apreendido pelas formas puras, ou seja: certas configurações de linha e cor
(...) representativos de objetos naturais (...) pela identificação de suas
relações mútuas como acontecimentos (...) e pela percepção de algumas
qualidades expressionais (...) pode ser chamado de mundo dos motivos
artísticos; II- Tema secundário ou convencional: (...) ligamos os motivos
artísticos e as combinações de motivos artísticos com assuntos e conceitos;
III- Significado intrínseco ou conteúdo: é apreendido pela determinação
daqueles princípios subjacentes que revelam a atitude básica de uma
nação, de um período, classe social, crença religiosa ou filosófica-
qualificados por uma personalidade e condensados numa obra
(PANOFSKY, 1955, p. 50, 53).
A primeira etapa, chamada pelo autor de descrição pré-iconográfica de uma
obra de arte, implica em uma leitura simples do que se pode ver na obra, levando
em consideração o senso comum e a experiência prática de cada observador, ou
seja, aquilo que conseguimos reconhecer em nossa experiência visual. A segunda
etapa, análise iconográfica, já abrange uma análise mais cuidadosa, buscando
motivos, ideias, relações, uma ação que requer mais domínio de conceitos e
assuntos específicos do campo da História da Arte e do Desenho, nessa etapa,
relações são feitas acerca do que os detalhes representam e o que os mesmos
simbolizam. A terceira etapa, interpretação iconológica, então, aprofunda-se mais,
buscando chegar aos valores ideológicos, simbólicos, aos motivos intrínsecos,

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relacionando a obra e seus componentes às intenções dos sujeitos que a produzem,
ou encomendam.
Para Panofsky (1955, p. 53),
(...) A descoberta e interpretação desses valores “simbólicos” (que muitas
vezes, são desconhecidos pelo próprio artista e podem, até, diferir
enfaticamente do que ele conscientemente tentou expressar) é o objeto do
que se poderia designar por “iconologia” em oposição a “iconografia”.
Nessa reflexão, o autor, então, explica melhor a função da iconografia, o que
clareia um pouco mais o entendimento acerca de como a mesma necessita da
iconologia para que uma análise mais aprofundada e satisfatória seja realizada. Para
ele:
(...) a iconografia é de auxílio incalculável para o estabelecimento de datas,
origens e, às vezes, autenticidade; e fornece as bases necessárias para
quaisquer interpretações ulteriores. Entretanto, ela não tenta elaborar a
interpretação sozinha. Coleta e classifica a evidência, mas não se considera
obrigada ou capacitada a investigar a gênese e significação dessa
evidência: a interação entre os diversos “tipos”; a influência das ideias
filosóficas, teológicas e políticas; os propósitos e inclinações individuais dos
artistas e patronos; a correlação entre os conceitos inteligíveis e a forma
visível que assume em cada caso específico. Resumindo, a iconografia
considera apenas uma parte de todos esses elementos que constituem o
conteúdo intrínseco de uma obra de arte e que precisam tornar-se explícitos
se se quiser que a percepção desse conteúdo venha a ser articulada e
comunicável (PANOFSKY, 1955, p. 53, 54).
Nesse aspecto, a iconografia se limita aos elementos visíveis e comparáveis,
sendo de grande utilidade para que a análise das intenções possa acontecer, no
entanto, não se propõe a adentrar aos valores, concepções, preceitos, crenças e
ideologias. O que, então, fica relegado à responsabilidade da iconologia que precisa
dos elementos fornecidos por aquela para que possa realmente chegar a
interpretações satisfatórias.
Tendo isso em vista, na intenção de proceder à análise, torna-se necessário
conhecer o que faz parte dos contextos culturais. É importante também levar em
consideração que a imagem não capta todas as particularidades da época
expressada e dos indivíduos envolvidos. Paiva (2006, p. 19) diz que:
(...) é necessário ir além da dimensão mais visível ou mais explícita dela.
(...) lacunas, silêncios e códigos que precisam ser decifrados, identificados,
compreendidos. Nessa perspectiva, a imagem é uma espécie de ponte
entre a realidade retratada e outras realidades, e outros assuntos, seja no
passado, seja no presente.
Isso expressa o grau de dificuldade para se proceder tal ação. Segundo o
mesmo autor (ibidem, 2006, p. 20),
(...) as fontes nunca são completas, nem as versões historiográficas
definitivas. São, ao contrário sempre lidas diversamente em cada época, por
cada observador, de acordo com os valores, as preocupações, os conflitos,

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os medos, os projetos e os gostos. Fontes e versões carregam em si
temporalidades distintas, porque são construídas e reconstruídas em cada
época.
Ou seja, “tudo vai depender da recepção que eles [códigos, símbolos e
representações] terão em cada época, no seio de cada grupo social e, também, das
variadas maneiras pelas quais serão apropriadas historicamente”. (PAIVA, 2006, p.
26, grifo nosso).
Nesse entendimento, surge a importância da análise de imagens utilizadas na
educação, compreendendo que estas possuem propósitos específicos, relacionados
aos sujeitos que as selecionam, pois os mesmos são agentes de uma época
historicamente marcada por conceitos e valores discriminatórios e opressores; e
ainda para quem as selecionam, com objetivos definidos que precisam ser
descortinados e explícitos, para que se possa ter uma compreensão das intenções
por detrás das ações, que mesmo portando conceitos nocivos a uma parte da
sociedade, querem passar por justas e democráticas.

3. A importância da leitura e análise de imagens na educação

A imagem está presente nas várias sociedades desde os primórdios da humanidade,


sendo um artifício pelo qual os homens exteriorizam suas intenções, seus
sentimentos e representações. Por ser esta um componente da cultura, nesse caso,
a cultura visual, a mesma é determinada pelos agentes sociais e está impregnada
dos valores e princípios ideológicos que lhes são concernentes.
Enquanto componente cultural, então, a imagem se expressa como uma
forma de linguagem, nesse aspecto, depois da linguagem oral e escrita, uma das
melhores formas de comunicação, é o registro de imagens, que tem em si um
potencial inquestionável para a transmissão de mensagens, devido à capacidade
criativa do ser humano em reproduzir projeções mentais daquilo que pensa ou
sente. Por sua vez, esse potencial também vai além da transmissão, se estendendo
à recepção dessas mensagens, trazendo uma compreensão específica e
oferecendo, segundo Casasús (1979, p. 71), “a qualquer homem a possibilidade de
escapar às dimensões contingentes de espaço e tempo em que vive”.

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Assim, a imagem revela a expressão de concepções, conceitos e valores que
o homem possui em sua mente de acordo com sua história e constituição social.
Marcondes Filho (1985, pg. 64), abordando a fotografia e a pintura, afirma que:
A arte é alguma coisa a mais; ela inclui necessariamente uma mensagem
que vai além da pura manifestação de técnicas e, ao incluir a mensagem,
ela reproduz necessariamente o mundo e a visão de mundo daquele que
está pintando. Assim, quando se faz a Arte de fato, expressa-se ideologia,
pois à medida que eu coloco alguns temas em meus quadros, estou lhes
dando um destaque, uma projeção, eu os estou valorizando, estou tomando
um tipo de partido, de uma forma ou de outra.
Nesse sentido, a imagem, como arte, possui em si significados e
propriedades comunicativas que vão além do texto verbal e nessa relação, como
texto não-verbal, é de grande eficácia, pois, por sua produção de sentidos que nos
afeta a partir da percepção visual, insere-se na mais profunda capacidade de
visualização de nosso cérebro, produz efeitos diversificados em nossa memória e
em nossas concepções.
A esse respeito, e em concordância, vários estudiosos falam sobre os
significados intrínsecos das mesmas e sua potencialidade em portar conteúdos
determinados por valores e princípios sociais ideológicos.
Arnheim (2002) ao falar sobre o simbolismo na arte preconiza que em uma
produção artística, o assunto e seu arranjo são planejados e pensados para
corporificar uma ideia, dessa maneira, o conjunto de fatos visuais serve para
objetivos definidos e, assim, tais componentes visuais não são nem arbitrários e
nem um mero jogo de forma e cores, mas servem para dar corpo a um universo
invisível.
Confirmando esse pressuposto, Leite (1998, p. 44) diz ainda que “ao que é
impossível descrever, torna-se indiscutível a prioridade da imagem visual, por sua
capacidade de reproduzir e sugerir, por meios expressivos e artísticos, sentimentos,
crenças e valores”.
Sardelich (2006, p. 206) ao falar sobre leitura de imagem diz que ela “passa a
ser compreendida como signo que incorpora diversos códigos e sua leitura demanda
conhecimentos e compreensão desses códigos”. A mesma ao falar sobre cultura
visual se refere a “um lugar onde se criam e se discutem significados” (ibidem, p,
212). E nesse aspecto, Erenildo João Carlos (2010, p. 13) diz que “a imagem precisa
ser lida porque ela tem sempre algo a dizer”.

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Sobre essas reflexões, podemos afirmar, então, no contexto específico dessa
pesquisa, que o livro didático História - 5º ano, nesse aspecto, possui imagens que
estão longe de serem artifícios neutros, pois estas acolhem significados diversos,
que permitem interpretações também diversas, na medida em que o receptor passa
a decodificá-los de acordo com sua capacidade cognitiva consciente ou
inconscientemente.
Sabe-se que as imagens não são o foco central da pedagogia, mas tendo
esse entendimento, torna-se necessário levar em consideração as possíveis
relações estabelecidas em algum momento na prática educativa, no instante em que
as mesmas se encontram com a educação e tornam-se instrumentos pedagógicos e
de influência considerável para o entendimento de conteúdos pelos sujeitos, como
no caso do livro didático. Isto porque quando a imagem se incorpora como elemento
integrante do processo educativo, ela passa a ser importante instrumento
pedagógico e metodológico de compreensão de conhecimentos e da própria
sociedade.
Nesse aspecto,
descrever a imagem dessa maneira pressupõe que ela exerce uma função
mediadora e constituinte do pensar e do fazer educativo, voltado para a
criação e organização dos lugares sociais de aprendizagem e para a
constituição dos sujeitos, socialmente desejados. Isso nos remete a uma
questão eminentemente pedagógica (CARLOS, 2010, p. 16).
A educação, então, é a responsável por manter um diálogo com esse
conhecimento, descortinando as diversas facetas de interpretação do mesmo para
que as ideias implícitas nas diversas imagens, e aqui especificamente naquelas
inseridas no livro didático, não sejam ignoradas ou inconscientemente apreendidas,
se por acaso forem nocivas às noções democráticas de sociedade. Ela deve garantir
que os indivíduos desenvolvam uma criticidade, saindo do estado de consciência
ingênua ao serem conduzidos por uma prática dialógica e reflexiva.
Sobre isso Carlos (2010, p. 18) também diz:
(...) é preciso preparar sujeitos que assumam a posição de leitores críticos
de imagens, uma vez que, situados num mundo capitalista, cujo centro é o
mercado globalizado, como indivíduos concretos, vêem-se interpelados,
surpreendidos e seduzidos, através de uma avalanche de informações
imagéticas que lhes chegam ao olhar.
Dessa compreensão, entende-se a importância do diálogo entre a Educação
e o Desenho, na análise de imagens, numa interdisciplinaridade na aquisição do
saber. Dessa forma, os conhecimentos relacionados a essas duas áreas não podem

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ser fragmentados e dissociados como se não existisse relação entre eles na vida
prática do homem e na sociedade, mas estão interligados, e interlaçados entre si.
Nessa pesquisa então, busca-se essa relação ao se aplicar esses
conhecimentos na análise de duas imagens do livro didático História – 5º ano, que
enquanto instrumento didático representa um dos mais importantes instrumentos na
metodologia utilizada nas escolas públicas de Educação Básica.

4. Analisando as concepções ideológicas em imagens do livro


didático

Destacam-se dois exemplos de imagens que, relacionadas, permitem interpretações


e concepções diversas acerca da figura do povo negro brasileiro. Como foi proposto
nessa investigação, de acordo com o método de interpretação de Panofsky (1955),
procura-se, através da análise iconográfica e iconológica, examinar os elementos
sociais, no livro História – 5º ano, identificando concepções ideológicas, e a quem
elas servem.
O livro História – 5º ano é um manual de história do Brasil. É um exemplar de
manual do professor e produzido para ser utilizado nas escolas públicas. Foi
desenvolvido e produzido pela editora Moderna. O presente exemplar é composto
de 224 páginas, das quais 136 apresentam conteúdos para serem trabalhados com
o aluno e 88 páginas contêm Orientações e Subsídios ao Professor.
As imagens selecionadas expressam cenas do período do Império. Retratam
o momento da história em que acontecia a escravidão dos negros africanos pelos
brancos europeus, período este marcado pelo tráfico negreiro em que pessoas da
raça negra foram tratadas como animais e obrigadas a se submeter aos desmandos
dos colonizadores cujo interesse era unicamente o enriquecimento. Os negros foram
espalhados pelo território brasileiro e contribuíram para aumentar a riqueza de seus
senhores. Essa época foi também de grande resistência e sofrimento.
Tornaram-se, então, essenciais para o desenvolvimento econômico da época,
mas eram também as maiores vítimas da injustiça social, passando a ser alvos de
preconceitos, e discriminação, pela sua cor e raça, advindos da situação histórica
desse povo.

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O conteúdo eurocêntrico estereotipado se mostra determinante no que se
refere a esse assunto. Enquanto o personagem negro é visto como figura destituída
de beleza, inteligência e cuja cultura não merecia respeito e consideração, através
de imagens negativas e inferiorizadas, o branco e sua cultura sempre ganharam
predominância nas representações contidas nesse material, sempre apresentados
em posições de destaque, nas melhores profissões e ilustrados como exemplos de
beleza e domínio, exteriorizando a concepção de superioridade da raça branca
sobre a negra, reflexo da construção social histórica. Nesse aspecto:
(...) esses livros veiculam a relação opressor-oprimido, o branco é o
representante da espécie com atributos tidos como universais (...)
evidenciou-se pelo desempenho das atividades profissionais mais
diversificadas. O negro foi associado a personagens maus, à sujeira, à
tragédia, à maldade. O branco representou os santos, os ricos e os heróis
(SILVA, 2004, p. 29).
É constatado, então, que o preconceito e a discriminação que a sociedade
possuía e ainda possui, de forma mascarada, por esse povo também se expressa no
livro didático e, os mesmos refletem as concepções antagônicas entre o branco e o
negro.
A imagem selecionada é utilizada no livro História – 5º ano para abordar o
assunto das festas populares no tempo do Império. Temos então, uma imagem
ilustrando a festa do povo negro e outra ilustrando uma festa católica, a festa do
divino.

Figura 1 - Batuque em São Paulo

Fonte:
http://www.iar.unicamp.br/disciplinas/am540_2003/edu/produto/escravidao/resistencia2.htm

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Figura 02 - Festa do Divino

Fonte: Livro de História. 1ª ed. São Paulo: Editora Moderna,2007, p. 56.

Comparando as festas populares na época do Império, o texto verbal se


refere às mesmas explicando a Festa do Divino como uma manifestação católica e
explica sua dinâmica religiosa, já quando fala da festa dos negros refere-se a ela
como “outra festa que reunia pessoas era o batuque dos pretos” (COSTA JUNIOR,
2007, p. 56). Em sua referencia o autor destaca em negrito a frase que tem cunho
discriminatório sobre a raça negra, dizendo que no dia de Santa Ana os escravos e
homens livres cantavam e dançavam.
Enquanto na figura da Festa do Divino, os personagens aparecem de maneira
austera, elegante e ordeira, passando uma postura de serenidade e superioridade
cultural, a imagem do Batuque em São Paulo reflete claramente a concepção de
degradação física e moral que se tinha dos negros. As pessoas são ilustradas
descalças, o que era “um dos símbolos de subalternização que marcam a
escravidão na iconografia do séc. XIX” (JOVINO, 2007, apud. OLIVEIRA; AGUIAR;
SILVA, et. al. 2007, p. 30) e de maneira deformada, com aparência animalesca.
As mulheres que dançam estão vestidas vulgar e desleixadamente, com
roupas que deixam à mostra seus seios enquanto dançam. Vemos ao fundo que um
homem branco, um guarda, observa a cena com os braços cruzados e uma postura
de desprezo. Como figura de autoridade, o mesmo está ali para garantir e certificar
que a ordem não será perturbada, o que não acontece na festa católica.
A exposição dessas cenas e o silêncio em relação a posteriores
esclarecimentos deixam explícita a concepção estereotipada acerca da cultura
negra, confirmando que:

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A discriminação estendia-se também ao campo cultural: as festas e os
bailes frequentados pelos escravos e pelos pretos pobres eram condenados
pela burguesia comerciante e vistos como manifestações obscenas e
primitivas; os cultos afro-brasileiros eram taxados de superstições grotescas
(FERRETTI, 2007, p. 03).
Fica claro que não há intenção alguma nesse livro de desconstruir
preconceitos e estereótipos em relação ao povo negro e sua cultura, o mesmo
contribui para a continuação da visão simplificada da cultura negra, dando
continuidade à visão negativa do negro e da sua cultura, como um grupo racial
étnico de menor ou nenhuma importância para a nação brasileira, contrapondo-se
até à LDB e à Lei 10.639/2003 sobre o ensino e valorização da cultura negra.
Nesse aspecto o ambiente escolar e os instrumentos pedagógicos precisam
se adequar às novas realidades, às novas visões e novos conceitos que estão
sendo construídos mediante lutas e reflexões sobre conceitos, valores e concepções
sobre a cultura afrodescendente e o povo negro brasileiro.
Entende-se que as imagens selecionadas retratam uma época e são usadas
para ilustrar a realidade do referido período, no entanto, o que se constata aqui é a
descontextualização da mesma, não fazendo referência acerca das discussões que
se fazem hoje e a visão moderna de tais personagens.
O livro estudado certamente teria a possibilidade de trabalhar melhor, mais
contextualizada e democraticamente esse conteúdo, preocupando-se em analisar e
refletir sobre a presença desse personagem, bem como sua cultura no país,
buscando desconstruir as concepções estereotipadas e preconceituosas que foram
estabelecidas no ideário da sociedade brasileira acerca desse povo.

5. Considerações finais

Diante da análise apresentada, fica evidente que a compreensão dos conceitos de


iconografia e iconologia é de grande relevância para a leitura e análise de imagens
educacionais, ressalta-se a importância do diálogo entre a Educação e o Desenho
em uma troca que venha enriquecer as esferas dos conhecimentos já produzidos
pelas mesmas.
Nessa pesquisa, que selecionou o livro História - 5º ano como objeto de
estudo, conclui-se que ainda há muito a mudar nos instrumentos educacionais

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direcionados à escola pública. Nenhuma característica construtiva é trabalhada no
mesmo que associe o povo negro e sua cultura à constituição social, biológica,
econômica e política da nação brasileira, mesmo sendo um livro atual e largamente
utilizado nas escolas públicas de Educação Básica.
Sabe-se que não é do interesse dos que dominam social, econômica e
politicamente que sejam descortinadas as intenções ideológicas por detrás de ações
democráticas, como é o caso do uso de livros didáticos nas escolas. No entanto,
para que uma educação igualitária realmente se concretize, ações de análises por
parte dos sujeitos envolvidos na escolha e na utilização dos livros didáticos nas
escolas se tornam imprescindíveis. Muito mais se ainda esta análise for baseada em
conceitos cientificamente estabelecidos e aceitos como eficazes, como é o caso da
análise iconográfica e iconológica de imagens.
Nesse sentido, uma ação dessa natureza realmente expressaria uma educação
realmente contextualizada e democrática, que valoriza a todos os sujeitos sociais
indiscriminadamente.

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Acessado em: 07 de Março de 2012;

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Sobre os autores

Suely dos Santos Souza – Mestranda em Educação pela Universidade Estadual de


Feira de Santana e Especialista em Desenho, com ênfase em Memória e Registro.
Graduada em Licenciatura Plena em Pedagogia, pela Universidade Estadual de
Feira de Santana (2010).

Gláucia Maria Costa Trinchão - Doutora em Educação pela Universidade do Vale


do Rio dos Sinos - UNISINOS, em 2008, no Rio Grande do Sul. Mestra em
Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Bahia - Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo -, desde 1999. Graduada em Licenciatura em Desenho e

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Plástica pela Universidade Federal da Bahia - Escola de Belas Artes –, em 1984.
Atualmente é professora adjunta na Universidade Estadual de Feira de Santana -
UEFS e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Desenho: Mestrado em
Desenho, Cultura e Interatividade. Lidera o grupo de pesquisa Estudos
Interdisciplinares em Desenho, vinculado ao CNPq.

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