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O pássaro que

aprendeu a voar

Carlos Eduardo Nunes

1ª Edição

Câmara Brasileira de Jovens Escritores


Copyright©Carlos Eduardo Nunes

Câmara Brasileira de Jovens Escritores


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Rio de Janeiro - RJ
Tel.: (21) 3393-2163
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Maio de 2008

Primeira Edição

Coordenação editorial: Gláucia Helena


Editor: Georges Martins
Produção gráfica: Alexandre Campos
Imagem da capa e projeto gráfico:
Heytor Alberto Valente Moore
Revisão: do autor

Contato com o autor:


carlosenunes2003@hotmail.com

Página da internet (Blog):


http://www.carloseduardonunes.blogspot.com

É proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por


qualquer meio e para qualquer fim, sem a autorização
prévia, por escrito, do autor.
Obra protegida pela Lei de Direitos Autorais
Carlos Eduardo Nunes

O pássaro que
aprendeu a voar

Maio de 2008

Rio de Janeiro - Brasil


Carlos Eduardo Nunes

PROVA 02
CBJE 4
O pássaro que aprendeu a voar

Agradecimentos
A minha Mãe, Maria Clotildes Nunes – aquela que
foi inspiração para tudo o que há de mais nobre no persona-
gem da Mamãe Periquito – e por ter comprado dezenas de
histórias em quadrinhos e uma coleção de fábulas para mim
quando eu era criança.

Ao meu Amigo e Arquiteto e Urbanista Flávio Cu-


nha da Silva, pela paciência em nossas conversas e pelo em-
penho em me ajudar na composição de outros personagens
quando este livro era apenas um conto de literatura infantil.

Ao meu Amigo e Engenheiro Civil Carlos Alberto da


Silveira, pela leitura crítica dos originais deste livro, pelos
conselhos, correções e apoio, quando este era ainda apenas
um projeto dentro de uma gaveta.

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Carlos Eduardo Nunes

PROVA 02
CBJE 6
O pássaro que aprendeu a voar

Nota do autor
A história do pequeno Periquito Tuim surgiu há alguns
anos, sob a forma de um conto. Foi numa época em que eu
passei a escrever textos com início, meio e fim, logo depois
de passar pela poesia e de escrever centenas de textos neste
estilo. A prosa – ou o conto – me ajudou a desenvolver a
possibilidade de escrever textos maiores, que trouxessem um
melhor significado às pessoas. Depois de lançar, em Outubro
de 2003, um livro de poesias e contos intitulado “Palavras ao
Vento”, fiquei um longo período sem publicar, embora a pro-
dução literária tenha continuado.
Quando me interessei por Concursos Literários, pen-
sei em reescrever o conto “O pássaro que não voava” – já
publicado na internet e até então com seis páginas – e
transformá-lo numa história infantil. Considero que algumas
histórias infantis não são apenas para aqueles que são crianças
hoje. Há também histórias infantis para os adultos de hoje
que foram crianças um dia. E todos nós fomos.
Este livro é a história de um periquito em busca de
seus pais. Nesta jornada ele encontra outros animais que o
ensinam lições importantes para toda a sua vida na floresta.
Lições que muitos de nós, seres humanos, nos esquecemos,
porque estamos sempre muito preocupados com o emprego,
com o dinheiro, essas coisas que julgamos, a princípio, extre-
mamente importantes em nossas vidas, e que não são, nem de
longe, as mais importantes.

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Carlos Eduardo Nunes

PROVA 02
CBJE 8
O pássaro que aprendeu a voar

Um
O homem inventa por necessidade.
Há milhares de anos surgiram os primeiros instrumen-
tos formados por pedras, usados para quebrar alimentos.
Muito tempo depois, descobriram o fogo e conseguiram
dominá-lo. Há cerca de 10 mil anos atrás, com a agricultura e
a domesticação de plantas e animais, surge o primeiro grande
salto tecnológico da humanidade.
As primeiras grandes civilizações surgem na
Mesopotâmia, no Egito, na China e na Índia. Desenvolvem-se
técnicas para produção de tijolos cozidos, ladrilhos, vidraria,
metalurgia, do cobre e do bronze. O crescimento comercial
estimula as técnicas de navegação com a construção de bar-
cos. Mas estimula, também, as técnicas de guerra.
A escrita e a numeração são inventadas. O crescimento
das cidades coloca novos e crescentes desafios, como abastecê-
las de água e alimentos. Desenvolve-se a Engenharia, com siste-
mas de aquedutos e irrigação. Desenvolvem-se os transportes,
as técnicas de construção e pavimentação de estradas, constru-
ção de pontes, sistemas de abastecimento de águas e esgotos.
A produção tecnológica não pára de crescer. A
tecnologia vai adquirindo seu caráter moderno de ciência apli-
cada. Surge o avião. Surgem as bombas. Descobrem o petró-
leo. As descobertas e invenções encontram rapidamente apli-
cação prática na indústria ou no desenvolvimento da ciência.
Surge a Revolução Industrial. Surge a linha de montagem na
fabricação de equipamentos mecânicos.
O telégrafo é inventado, seguido pelo telefone, o rádio
e a televisão. São inventados, também, dezenas de aparelhos
domésticos. Os aviões e as bombas cedem lugar aos fo-
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Carlos Eduardo Nunes
guetes lançadores de satélites e às viagens espaciais. A Era
da eletricidade e do petróleo dá lugar à Era da eletrônica e
da energia nuclear. A biotecnologia revoluciona a produ-
ção de alimentos.
Surgem os primeiros computadores. Mas estes são aper-
feiçoados, dando origem aos computadores pessoais que uti-
lizamos hoje.
O mundo deu um salto tecnológico muito grande nos
últimos tempos. Foi estudando e lendo nos livros da escola
que eu aprendi o significado da palavra progresso. Mas o pre-
ço do progresso era muito alto, e poucas pessoas se davam
conta disso. A cada dia, o que se via, eram áreas verdes sendo
transformadas em áreas povoadas. Nas cidades grandes qua-
se não havia mais locais onde as áreas verdes eram preserva-
das, salvo alguns parques municipais e muitos animais esta-
vam em extinção. Havia também a poluição do ar, que estava
causando problemas respiratórios em pessoas de todas as ida-
des. Havia também a certeza de que, no futuro, teremos pro-
blemas em obter água limpa e pura. Em nome do progresso,
os homens iniciavam os desmatamentos.
Eu era apenas uma criança. Durante um bom tempo
morei ao lado de uma floresta. Às vezes via animais silvestres
como tucanos e araras, e hoje, percebo que muitos deles estão
prestes a deixar de existir.
Eu sempre acordava ouvindo o canto dos pássaros, o
barulho da água correndo no rio. Às vezes, no meio da noite,
ouvia o barulho do trem que passava bem próximo de minha
casa. Naquela época, eu pensava que os trens conduziam as
pessoas em direção aos seus sonhos, mas estava completa-
mente enganado.
Minha família se mudou para a cidade grande. Eu cres-
ci, estudei, me tornei um professor de história, e fiquei tentan-
PROVA 02
do compreender porque os homens destruíam o que tinham
CBJE 10
O pássaro que aprendeu a voar
de melhor na natureza. E sempre me respondiam que era em
nome do progresso.
A última lembrança que tenho de minha infância na flo-
resta foi o dia em que um periquito pousou em meu ombro.
No primeiro momento eu me assustei, e logo depois achei
aquilo o máximo. Quando tentei tocá-lo, ele voou. Mas ao
pousar num galho de árvore, caiu num alçapão que meu pai
havia preparado. Naquelas árvores, havia dezenas de alçapões.
Lá dentro, o periquito se debatia. Eu sabia que se o
soltasse poderia ter problemas com o meu pai, mas não pen-
sei duas vezes e quebrei duas varetas que formavam a grade
do alçapão.
Ele ainda demorou algum tempo para perceber a saí-
da, como se não estivesse acreditando ou como se aquilo fos-
se um milagre. Mas quando se acalmou e percebeu a saída, ele
voou. Para minha alegria, ele voou para bem longe dali e, creio
eu, de volta à sua família e amigos.
Agora que cresci, prestando um pouco mais de aten-
ção, percebo que o desmatamento está espantando os passa-
rinhos. O desrespeito pela natureza está atingido índices alar-
mantes. Além disso, ninguém mais pode ver um passarinho
cantando num galho de árvore, num fio de luz, que logo há
alguém apanhando uma pedra para atirá-la nele, ou então, pre-
parando um alçapão. A situação está tão grave que quase não
há mais passarinhos nas grandes cidades. E os que existem,
estão presos em gaiolas, ou sendo comercializados ilegalmen-
te em feiras livres.
Tudo isso estava acontecendo. Mas numa floresta não
muito distante de nós, neste exato momento, deve estar nas-
cendo um pequeno pássaro. E esse pássaro, e esse nascimen-
to, deve ser comemorado, porque esta deve ser nossa espe-
rança: de que a vida seja sempre celebrada.
Vamos celebrar a vida!
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Carlos Eduardo Nunes

PROVA 02
CBJE 12
O pássaro que aprendeu a voar

Dois
Numa floresta não muito distante, num tempo em que
as árvores ainda eram muito verdes e o céu completamente
azul, existia um casal de periquitos que vivia num ninho acima
das árvores que, na verdade, era uma casa abandonada por
algum João-de-Barro. O que o casal de periquitos mais queria
neste momento era ter um filho. E quando finalmente a ma-
mãe periquito pôs um ovo, a alegria foi tão grande que eles
pensaram até mesmo em dar uma festa e convidar várias es-
pécies de pássaros. Deitaram-se felizes, ao lado do ninho, ad-
mirando o filhote que estava para nascer.
E assim, a noite foi passando tranqüila e o dia seguinte
prometia ser o mais feliz de suas vidas, pois finalmente, de-
pois de dezoito dias de incubação, aquele ovo dava sinais de
que seria rompido. Os periquitos Tuim, normalmente, bota-
vam cerca de dezoito ovos mas, estranhamente, a mamãe Pe-
riquito pôs apenas um ovo desta vez e comentava isto com
seu marido, mas este estava tão ansioso pelo nascimento que
não discutia o assunto.
Quando os primeiros raios de sol começaram a tocar
as folhas das árvores, de cima de uma delas o ovo se quebra-
ra, mas com o movimento do pássaro que começava a dura
batalha pela sobrevivência, o ovo virou e ficou muito próxi-
mo da borda do ninho. Com a força que fazia para romper a
casca, ao conseguir rompê-la, o pequeno Periquito Tuim foi
lançado contra um galho de árvore. Caiu, rolou sobre o galho
e sentiu dor, mas uma dor tão intensa, que chorou. Por sorte,
ficou preso nos galhos. Foram aquelas as primeiras lágrimas
do pequeno Periquito Tuim.
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Carlos Eduardo Nunes
Quando sua mãe chegou, com todo cuidado, voou e
recolheu seu filhote no bico, levando-o de volta ao ninho.
Foram dias difíceis aqueles dias em que ele passou tentando
recuperar-se. Seus pais temiam pelo pior, mas o pequeno pás-
saro tinha uma enorme vontade de viver e já demonstrava
isso nos primeiros dias de vida.
Durante vários dias Mamãe Periquito voava para bem
longe onde podia encontrar sementes e frutos de palmeiras e
imbaúbas, que serviriam de alimento para seu filhote. Arran-
cava um pequeno pedaço e voava por longas distâncias com
ele no bico. E no bico, lhe entregava. Mas o pequeno Periqui-
to Tuim tinha muita fome, e chorava. Por causa disso, sua mãe
fazia o mesmo trajeto várias vezes por dia, alimentando-o até
que ele estivesse saciado e não mais reclamasse.
O ninho ficava no topo da árvore, num ponto muito
alto. Certo dia, quando voava de volta para o ninho trazendo
mais alimentos, mamãe periquito viu seu filhote agarrar-se
desesperadamente na beira do ninho, tentando com todas as
suas forças segurar-se, e impedir assim sua queda, o que seria
fatalmente o seu fim.
Como era impossível alcançar a árvore antes que o fi-
lhote caísse, mamãe periquito desceu com velocidade abaixo
do seu filhote, e abriu suas asas para interromper sua queda.
Com o periquito Tuim agarrado a si, ela voou com segurança
de volta ao ninho.
Ela percebeu que o filhote queria sair do ninho e, para
isso, nem mesmo era capaz de medir as conseqüências.
“Ainda é muito jovem. – pensava ela. E os jovens são
assim mesmo”.
Após este acontecimento, mamãe periquito decidiu que
havia chegado o tempo – e sobre isto somente a natureza pode
explicar – em que o pequeno Periquito Tuim deveria seguir
PROVA
seu 02 rumo e, desta forma, ela lhe falou:
próprio
CBJE 14
O pássaro que aprendeu a voar
“De hoje em diante você deve buscar seu próprio
alimento. – dizia ela mesmo que um tanto quanto insegu-
ra. Deverás voar pelo mundo, descobrir novos lugares e
entender que você é livre para fazer o que deseja, mas
com responsabilidade”.
“Mas o que é ser livre?” – perguntou ele.
“Ser livre é não estar preso dentro de uma casca”. –
respondeu a mãe.
E usando este termo, o pequeno Periquito Tuim en-
tendeu perfeitamente, pois ainda se lembrava do dia de
seu nascimento.
“E o que é responsabilidade?” – insistiu ele.
“É a obrigação que você tem de responder pelos seus
próprios atos. – disse ela. – Quer dizer que você pode voar,
porque é livre, mas terá que conhecer as pessoas e os lugares
que você irá freqüentar, pois será responsável por tudo isso,
por cada bater de asas em seu caminho”.
“Liberdade e Responsabilidade”. – repetiu ele em alto
e bom som para que não se esquecesse destas duas palavras e
de seus significados.
Sendo assim, sua mãe voou, cortando o céu com suas
asas e quando o pequeno Periquito Tuim tentou bater as asas
para fazer o mesmo, sentiu dor, mas uma dor tão forte que fez
com que ele parasse. Olhou rapidamente para o céu e viu que
sua mãe se distanciava, perdendo-a de vista.
Ele chamou por ela, mas o vento soprava forte na
direção contrária e, por este motivo, ela não ouviu.

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Carlos Eduardo Nunes

PROVA 02
CBJE 16
O pássaro que aprendeu a voar

Três
E durante toda aquela manhã ele passou observando o
ninho de onde caíra. Iria esperar até que seus pais retornassem.
E foi nesse momento que ele ouviu um barulho muito intenso
que não deveria ser da natureza. Pôde perceber que outros
animais corriam assustados e escondeu-se na base da árvore
onde estava seu ninho.
A tarde já estava chegando ao fim, e seus pais ainda
não haviam retornado ao lar. O pequeno Periquito então cho-
rou, pois se sentiu extremamente sozinho. Ouvindo seu cho-
ro, um beija-flor se aproximou.
“Porque choras?” – foi sua pergunta.
E o Periquito Tuim, olhando para ele, respondeu:
“Choro porque não consegui voar e meus pais não
retornaram para o ninho ainda”.
“E onde moras?” – perguntava o beija-flor tentando
entender um pouco mais aquela situação.
“Moro no alto daquela árvore” – disse ele apontando
para o local.
E num piscar de olhos o Beija-flor foi até o ninho e
verificou que realmente não havia ninguém por lá.
“Mas quem é você?” – indagou o Periquito Tuim já
com as lágrimas contidas.
“Eu sou um Beija-Flor!” – respondeu orgulhoso.
“Que nome engraçado. Você anda por aí beijando
as flores?”
“Nós, os beija-flores, somos os menores pássaros do
mundo. Acho que este nome deve ser devido ao fato de que
nos alimentamos do néctar das flores através deste bico lon-
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Carlos Eduardo Nunes
go que possuímos. Podemos bater as asas tão rápido que pra-
ticamente paramos no ar, e assim, temos nosso contato com
as flores. Alguns humanos colocam bebedouros em seus jar-
dins para que a gente se aproxime e encante seus dias”.
O curioso Periquito Tuim não sabia ao certo o que eram
os humanos, mas, neste momento, não quis entrar em detalhe, pois
começava a escurecer e estava bastante preocupado. No futuro,
com toda certeza, iria querer saber mais sobre estes seres.
“É uma pena que eu não possa lhe ajudar – disse o
beija-flor – mas se por acaso eu encontrar com seus pais por
aí, direi que você está sentindo a falta deles”.
“Obrigado – disse o Periquito, e como queria saber
um pouco mais sobre os humanos, deixou no ar esta idéia – e
volte algum dia para a gente conversar melhor”.
E assim, o beija-flor bateu suas asas e se afastou em
uma velocidade incrível.

PROVA 02
CBJE 18
O pássaro que aprendeu a voar

Quatro
Quando o sol começou a se pôr e a sombra já cobria boa
parte da floresta, o Periquito Tuim ouviu um canto magnífico.
“Quem está cantando desta maneira tão bela?” – per-
guntou ele.
Mas não obteve resposta alguma e o canto continuava.
Somente quando parou de cantar foi que o pequeno pássaro
amarelado se aproximou.
“Boa tarde meu caro Amigo”.
“Boa tarde. – respondeu o Periquito Tuim. – Era você
quem cantava?”
“Sim”. – respondeu o pequeno pássaro.
“E qual o seu nome?”
“Eu sou um Canário” – respondeu ele.
“Ah, sim. Minha mãe me disse certo dia que os canári-
os são excelentes cantores”.
“Ah, muito obrigado! E onde está sua mãe?”
O pequeno Periquito Tuim fez um breve silêncio.
“Eu não sei. Ela estava tentando me ensinar a voar quan-
do senti uma dor em minhas asas. E, infelizmente, ela não olhou
para trás e me deixou aqui sozinho”.
“E você não tem medo de ficar sozinho?”
Foi então que o Periquito Tuim percebeu que deveria
se impor um pouco mais frente às dificuldades que surgiam.
“Eu já sou grande – disse ele – e já não tenho medo
de nada”.
“É uma pena – disse o Canário – pois desta forma
você pode ficar muito exposto ao ataque do Gavião”.
“Gavião?” – perguntou o Periquito.
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Carlos Eduardo Nunes
“Sim – respondeu o Canário – o pássaro mais temido
desta região. Normalmente ele fica no topo das árvores ob-
servando sua presa. Dizem que ele só teme os humanos”.
E novamente ele ouvia falar nos humanos, mas desta vez
não iria deixar escapar a oportunidade.
“O que são os humanos?” – perguntou finalmente.
O Canário fez um longo silêncio.
“Os humanos são animais muito perigosos e difíceis de
se entender”.
Mas aquela frase não havia feito sentido algum para o
Periquito Tuim.
“Explique melhor!” – exclamou ele.
“Os seres humanos são estranhos. Derrubam árvores
e caçam os animais. Quando não aprisionam, eles matam.
Muitas vezes, eles matam só para retirar uma parte do corpo
dos animais que eles consideram de valor.”
“Mas o quê neste mundo tem valor maior que a pró-
pria vida?” – perguntou o Periquito.
“Boa pergunta. – disse o Canário. Apesar de sua pou-
ca idade você já se mostra um animal admirável. Não há nada
mais precioso do que a vida. Mas vou lhe contar uma pequena
história e talvez assim você entenda um pouco da natureza
destes seres”.
E o Periquito Tuim sentou-se ao seu lado para ouvir a
história.

“Era uma vez um lindo pássaro silvestre que ainda


muito pequeno foi capturado por um caçador em um alçapão
e retirado da floresta. Desde pequeno fora criado em uma
gaiola, sozinho, e alimentado para participar de concursos de
canto. Em sua fase de crescimento, ganhou muitas competi-
PROVA
ções 02
e prêmios, mas quando ficou velho seu potencial de can-
CBJE 20
O pássaro que aprendeu a voar
to diminuiu e acabou sendo trocado por outro, mais jovem e
mais bonito. Como já não era mais o preferido de seu dono, a
alimentação passou a não ser mais a mesma e ele chegou a
passar fome e sede, pois sua água também já não era trocada
todos os dias”.
O Canário olhou para o pequeno Periquito à sua frente
e viu que este prestava atenção às suas palavras.
“Um dia a gaiola caiu e a porta se abriu. Mesmo com o
sofrimento de ter sido trocado ele não queria fugir, pois se
acostumara demais com aquela vida. Foi quando avistou uma
canária passar e resolveu segui-la. Era necessário aprender
coisas novas e ele sabia que havia uma floresta em algum lu-
gar, da qual ele fora retirado um dia. E assim, ele voou para
trilhar seu próprio caminho. Talvez o humano que o criou não
tenha nem mesmo sentido sua falta, mas em contato com a
floresta sua voz soava melhor e agora cantava com mais vigor
e força”.
Quando terminou de falar ele ficou pensativo e foi o
Periquito Tuim quem falou:
“Quer dizer que os humanos usam os outros para obter
vantagem e quando não precisam mais se desfazem? Quer di-
zer que eles privam os outros de viverem em seu próprio lar e
depois agem assim? Os humanos devem ser terríveis”.
“E depois de algum tempo – continuou o Canário – o
pássaro entendeu que a razão de seu canto não estar mais como
há tempos atrás era porque se sentia só, e sempre que via ou-
tros pássaros sobrevoarem sua gaiola, sentia uma enorme
vontade de ser livre”.
“O que é uma gaiola?” – perguntou o Periquito.
“É o local onde os humanos prendem os pássaros
como nós. Os animais que não são pássaros eles prendem em
jaulas. Durante toda a sua vida, tenha cuidado para não cair
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Carlos Eduardo Nunes
em armadilhas. Para aprisionar pássaros pequenos como nós,
eles utilizam o alçapão, que é uma armadilha que nos atrai
pois eles colocam comida. Por isso, é muito fácil cairmos nes-
ta. Mas tenha cuidado, e sempre preste atenção onde pisa.”
“Ser livre é não estar preso dentro de uma casca ou de
uma gaiola”. – comentou o Periquito Tuim lembrando as pa-
lavras de sua mãe.
O Canário não falou mais nada e apenas se despediu.
Já havia sofrido demais nas mãos dos humanos.

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CBJE 22
O pássaro que aprendeu a voar

Cinco
Logo depois que o Canário se afastou, uma Cobra foi em
direção do Periquito Tuim. Ele sorriu ao vê-la rastejando, mas
logo depois teve medo, porque ela se aproximava rapidamente.
“Quem é você?” – perguntou ele.
“Sou uma Cobra. O que faz aqui sozinho?”
“Estou esperando meus pais. Me machuquei e não pos-
so voar. Você viu algum humano?”
“Humanos? Os homens? Eu creio que existem muitos,
mas conheço poucos, todos caçadores.”
“O que são os caçadores?”
“São homens. Mas podemos dizer que são animais que
caçam outros animais por profissão ou por esporte.”
“Profissão?”
“Sim. Todos eles, quando crescem, tem que trabalhar.
Para trabalhar, precisam de uma profissão. Uns são advoga-
dos, outros são médicos, outros são engenheiros...outros são
caçadores”
“E o que é esporte?
“Esporte é uma coisa boa. É quando os humanos pra-
ticam exercícios físicos. Isso é uma coisa muito importante
para eles.”
“Onde estão os homens?” – insistiu o Periquito.
“Vi-os faz um bom tempo. Mas não se pode nunca sa-
ber onde eles estão. O vento os leva. Eles não têm raízes. Eles
não gostam de raízes.”
A Cobra aproximou-se um pouco mais circulando ao
seu redor.

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Carlos Eduardo Nunes
“Que bichinho engraçado tu és. Tão fino...” – disse
o Periquito.
“Mas sou mais poderosa do que muitos animais. Até
mesmo o Leão, o Rei da Selva, tem medo de mim”
“Você não é tão poderosa assim, não tem nem patas,
nem asas, não pode sequer correr ou voar...”
“Mas eu posso te levar mais longe do que um simples
vôo. Aquele que eu toco, eu o devolvo ao lugar de onde veio.
Mas você é uma criança ainda e com toda certeza não entende...”
O Periquito Tuim não respondeu.
“Tenho pena de ti, tão fraco, tão indefeso nessa flores-
ta selvagem. Posso ajudar-te um dia, se tiveres muita saudade
de seus pais e não quiseres mais sofrer...”
“Eu te compreendo muito bem. – disse o Periquito.
Mas por que você fala sempre por enigmas?”
“Enigmas? Com um simples toque, eu resolvo todos
os enigmas. – disse a Cobra. Voltarei daqui a alguns dias para
te visitar novamente”.
E dizendo isso, a Cobra se afastou.

PROVA 02
CBJE 24
O pássaro que aprendeu a voar

Seis
Quando o dia amanheceu o Periquito Tuim já estava de
pé, mas mantinha-se escondido na base da árvore onde ficava
seu ninho. Seus pais ainda não haviam retornado e durante toda
a noite ele teve medo. Chegou a se irritar com o barulho que
uma coruja fazia, mas nada podia dizer, pois estava sozinho e
indefeso e não queria que mais ninguém soubesse.
Foi então que avistou um outro pássaro que recolhia
gravetos no chão e aquela já era a terceira vez que ele passava
por ali.
“Quem é você?” – perguntou o Periquito Tuim.
“Sou um João-de-Barro!” – foi sua resposta.
“João de quê?”
“João-de-Barro. – repetiu ele. Nós somos os maiores
construtores que a natureza possui”.
“Mas o que é um construtor?” – indagou o Periqui-
to Tuim.
“Como não sabes o que é um construtor? É aquele que
modifica uma paisagem e constrói aquilo que antes estavam
apenas em seus sonhos”.
“Está vendo aquele ninho, ali, em cima daquela árvo-
re?” – perguntou o João-de-Barro.
“Aquele é o meu ninho”. – disse o Periquito.
“Então você deve ser um Periquito Tuim e como sem-
pre acontece, vocês se aproveitam das casas que construímos
e que deixamos para trás”. – disse o João-de-Barro embora
soubesse que aquele que estava à sua frente era muito novo e
não tinha culpa nenhuma disso.

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Carlos Eduardo Nunes
O Periquito Tuim nada respondeu, pois não sabia quem
havia construído seu ninho.
“Mas escute, meu rapaz. Se eu fosse você, voltaria para
o seu ninho rapidamente. Ontem estive passando por aqui para
buscar alguns gravetos e um pouco de barro para construir
uma nova casa e vi que você chorava, e depois vi quando o
beija-flor e o canário estiveram por aqui. Acontece que pude
perceber que o Gavião desde ontem não sai da copa de uma
árvore próxima daqui e, pelo pouco que conheço, ele está à
espera de uma presa”.
O Periquito Tuim agradeceu a preocupação do João-
de-Barro, e contou-lhe sua história, dizendo que não poderia
voltar ao ninho sozinho.
“Então se proteja meu rapaz. Proteja-se”. – e dizendo
isso, voltou ao trabalho, e logo em seguida voou com um pe-
queno graveto no bico.

PROVA 02
CBJE 26
O pássaro que aprendeu a voar

Sete
Pela primeira vez o Periquito Tuim resolveu sair e ca-
minhar pela floresta. Chegando próximo a um lago ele viu,
imóvel sobre uma pedra, um animal tão grande quanto a pró-
pria pedra. Espantado diante de uma criatura tão diferente,
ele aproximou-se devagar para ver melhor.
“Olá – disse o Periquito Tuim. Quem é você?”
“Olá. Sou uma tartaruga.”
“O que está fazendo?”
“Estou tomando banho de sol.” – respondeu a tartaruga.
“Pensei que você estivesse dormindo, de tão parada
que estava.”
“Já fui como você, minha criança, muito agitada, mas
aprendi que é perigoso viver assim. Em você, como em todos
os pássaros que conheço, tudo é esbanjamento: asas vibrando e
batendo ao sabor do vento, ir e vir sem destino, voar sem ces-
sar. Mas tudo isso faz mal. Muito mal. Quem se mexe muito,
morre logo. Minha filosofia é simples: nunca ficar de pé, quan-
do posso ficar deitada. Para simplificar, fico sempre deitada”.
“O que é filosofia?”
“É uma ciência, mas eu não sei lhe explicar o que
significa...”
“Como podes defender algo que não sabe o que significa?”
“Você jamais compreenderia, porque é apenas uma
criança e ainda não aprendeu a lição do peso. Para voar é pre-
ciso ser leve. Mas tudo o que é leve é frágil. As crianças gos-
tam de empinar pipas. Mas para subir no vento, elas têm de
ser feitas com varetas finas de bambu e papel de seda. Por
isso, acabam quase sempre enroscados em algum galho de
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Carlos Eduardo Nunes
árvore. Mas você nunca viu uma tartaruga enroscada num
galho de árvore.”
O Periquito Tuim sorriu com a possibilidade de ver uma
tartaruga grande como aquela pousar num galho de árvore.
“Nós, tartarugas, estamos fora destas situações desa-
gradáveis porque não nos metemos a voar, porque somos
muito pesadas e por isso ficamos sempre junto ao chão. So-
mos prudentes.”
“O que é ser prudente?” – perguntou o Periquito.
“Prudente é um animal que é calmo, refletido, mode-
rado e seguro em suas maneiras de agir.”
“Entendi. Seguro na maneira de agir.”
“Isso mesmo. Voar é perigoso, exige leveza e fragilida-
de. Isso é coisa que fascina as crianças, mas não os adultos. Os
adultos são graves. E grave é aquilo que respeita a lei da gravi-
dade e gosta de ir para baixo. Como as tartarugas, como eu.
Os adultos quando querem elogiar alguém dizem que ele é
uma pessoa de peso. Qual o contrário de peso?”
“Eu não sei.”
“Leveza. Quer um exemplo? Um balão solto no espa-
ço. Quando se diz que alguém é leviano, isso não é um elogio,
é uma ofensa. Leviano é quem não leva as coisas a sério, como
as crianças. Quanto mais adultos, mais os animais são pareci-
das comigo.”
O Periquito Tuim ia dizer que ser leve é coisa muito
gostosa, porque dá sempre uma enorme alegria, mas se calou,
com medo de ser acusado de leviano. A tartaruga, com toda
certeza, não entenderia.
“E há também, para cada ser vivo, a necessidade de
defesas – continuou a tartaruga. Veja o seu corpo, fino como
um graveto. O bico de qualquer pássaro pode cortá-lo ao meio.
PROVA
Um 02 lhe devoraria rapidamente. E suas asas? Lindas e
gavião
CBJE 28
O pássaro que aprendeu a voar
fracas. Veja agora a minha carapaça. Nem uma pedra conse-
gue quebrá-la. Você é mole, eu sou dura. Mole são as crianças,
os palhaços, os poetas, os artistas. Duros são os generais, os
banqueiros, os policiais. Quando as crianças deixam de ser
como periquitos, para se tornarem como as tartarugas, os
adultos dizem que elas ficaram maduras.”
“Maduras? Como os frutos?”
“Isso mesmo. Na verdade o que querem dizer é que
ficaram como armaduras. Coisa madura é coisa mole, gosto-
sa, boa de se comer; mas se descuidar, apodrece e acaba. Já a
armadura é coisa que vara os séculos. Como eu, impenetrá-
vel, constante, sempre a mesma. Digna de confiança. Serei
amanhã o que sou hoje. Quanto a você, não sei onde estará
daqui a alguns anos.”
“Estarei com meus pais. Estarei nesta floresta.”
“Quem lhe garante? Há boatos de que o fogo está con-
sumindo tudo. Ainda não percebeu a fumaça? Os homens es-
tão derrubando várias árvores para construir estradas. Antes
que me pergunte, estradas são caminhos largos por onde os
homens passam com máquinas enormes. Por isso que te digo:
as coisas leves passam e as duras permanecem. Claro que as
armaduras criam certos problemas. Fica difícil para correr,
brincar, pular e abraçar. Mas é o preço da sobrevivência.”
“Mas a senhora, dona tartaruga, não admira os pássa-
ros? Será que nunca quis ver como é o mundo lá de cima?
“Tolice! – respondeu a tartaruga rispidamente. Nosso
mundo sempre foi o mesmo e sempre será. Não há mais nada
a se conhecer, a se descobrir. Os humanos já modificaram tudo.
Nós, os animais, estamos morrendo”.
“Como a senhora pode afirmar que o mundo será sem-
pre o mesmo se acabou de me dizer que a floresta está pegan-
do fogo? Isso não muda tudo?”
A Tartaruga ficou pensativa.
29
Carlos Eduardo Nunes
“É, pode ser. Mas voltando à sua pergunta, eu já
quis voar, mas não posso, nunca poderei. Não vou ficar
me lamentando.”
“Isso te entristece?” – perguntou o Periquito Tuim.
“O quê?”
“O fato de não poder voar.”
“Já me entristeceu, quando eu era mais jovem. Mas há
certas coisas que não podemos mudar. Nasci para ser tartaru-
ga e terei que passar anos carregando este peso comigo.”
“Tens uma bela casa. – disse o Periquito. Veja o lado
bom: eu não posso carregar o meu ninho comigo.”
“Obrigado. Quer saber de uma coisa?”
“Sim!”
“Seu ninho é a sua casa, o seu lar. – disse a Tartaruga. E
nunca haverá lugar melhor no mundo do que sua própria casa.
Poderás viver grandes momentos em milhares de outros lu-
gares, mas você sempre vai querer retornar ao seu lar. E mes-
mo que em alguns momentos esteja distante, seu lar estará
sempre contigo, pois está em seu coração.”
“Meu lar está em meu coração...” – repetiu ele.
“Isso mesmo!”
O Periquito Tuim ficou alguns segundos olhando para
a Tartaruga. Sabia que aquela conversa havia sido importante.
Sabia que havia conseguido furar a armadura e penetrar no
coração da Tartaruga.
“Preciso ir. Preciso encontrar meus pais”.
“Eles devem ter orgulho de você! Foi ótima essa nossa
conversa.”
“Fique em paz.” – disse o Periquito.
“Eu ficarei. Sempre fico. – disse a tartaruga, mas o
Periquito Tuim já ia se afastando ao longe, caminhando de
PROVA
volta 02 árvore.
à sua
CBJE 30
O pássaro que aprendeu a voar

Oito
Mais um dia havia se passado e ele não conseguia en-
contrar seus pais. O sol já havia se posto por completo e a
noite que surgia revelava as estrelas no céu. Ele tentava dor-
mir, mas não conseguia. Ouvia ao longe o som emitido por
uma coruja. E este som, a cada momento, parecia se aproxi-
mar um pouco mais. Com medo, ele chorou.
De repente, ouviu o som ainda mais perto e pôde ver
quando uma enorme coruja aproximou-se dele.
“Porque choras?” – perguntou a Coruja.
“Tenho medo.” – disse ele.
“Tens amigos?”
“Sim, tenho.”
“E quem são?” – perguntou a Coruja.
“Um Canário, um Beija-Flor, uma Cobra e um João-
de-Barro. E hoje conheci uma Tartaruga que gostaria de ser
pássaro.”
“Na vida isso quase sempre acontece, nem todo mun-
do se torna o que queria ser. Mas tu tens muitos amigos. En-
tão não deverias chorar.”
“Porque não?”
“Porque quando temos com quem contar, a vida se
torna mais fácil.”
“Mas eles não sabem onde meus pais estão. Es-
tou sozinho.”
“Você nunca está sozinho. – disse a Coruja. Tem sem-
pre alguém que te observa, que está muito orgulhoso de você,
que pensa em você, que se importa contigo, que sente sauda-
31
Carlos Eduardo Nunes
des de você, que gostaria de estar a teu lado, que espera que
não esteja com problemas.”
“Você acha mesmo?”
“Tenho certeza disso. Nossas amizades são nosso mai-
or tesouro”.
“Mas o que significa amizade?” – perguntou o Periquito.
“Ah, amizade é um apego muito particular entre dois
seres. Tão belo quanto a amizade, só mesmo o Amor.”
“Amor? O que é o Amor?”
A Coruja ficou algum tempo pensativa, como se ten-
tasse buscar a resposta, mas não encontrou uma definição que
pudesse explicar ao jovem Periquito.
“Amor é um sentimento muito bonito. É algo que mexe
com a gente profundamente. Mas é difícil explicar com palavras.
Certas coisas neste mundo foram feitas para serem sentidas.”
“Você já amou alguma coisa?” – perguntou o Periquito.
“Já amei alguém. Mas isso foi há muito tempo, quando
eu era ainda muito jovem.”
“E como foi o seu Amor?”
“Foi a melhor época da minha vida. Quando se ama,
você deseja e procura a felicidade, deseja compartilhar com o
outro seus sonhos e ideais.”
“Como saberei quando estiver amando alguém? – per-
guntou o Periquito.
“Você saberá. Seu coração lhe dará um sinal e você sa-
berá reconhecê-lo. Sentirá vontade de estar sempre por perto.
E quando estiverem juntos, parecerá que nada mais importa. O
tempo passa a não ter mais importância quando duas pessoas
que se amam se encontram. Posso lhe dar um conselho?”
“O que é isso?” – perguntou o Periquito.
“Conselho são palavras sensatas dirigidas a alguém para
PROVAa02
ajudar conduzir seu modo de proceder.”
CBJE 32
O pássaro que aprendeu a voar
“Parece bom. Claro que pode me dar um conselho!”
“Ao longo de sua vida, dê mais às pessoas do que elas
esperam, e faça tudo, sempre com alegria. Ame profundamente
e com paixão. Você até pode se machucar às vezes, mas é a
única forma de viver a vida completamente. E quando você
disser eu te amo, seja verdadeiro.”
“Tudo bem, compreendi... fazer as coisas com alegria...
amar... ser verdadeiro ao dizer eu te amo...”
“E voltando às amizades, sempre precisamos dos ou-
tros. Nenhum de nós conseguiria viver sozinho, isolado do
mundo, porque tudo o que acontece em nossa floresta, de al-
guma forma, altera a vida em outras florestas e até mesmo em
outras cidades. Têm se espalhado a notícia de que a Terra, o
planeta em que vivemos, está aquecendo gradativamente. Isso
quer dizer que algo que está acontecendo muito longe daqui,
como o derretimento de camadas de gelo em outros conti-
nentes, pode afetar a todos nós.”
“Quem trouxe essa notícia?” – perguntou o Periquito.
“Existem aves que viajam entre os continentes e elas
sempre trazem essas notícias. É que durante milhares de anos
a natureza estava em harmonia, se renovando naturalmente.
Hoje, após anos de exploração do homem sem se preocupar
com essa renovação, sem mesmo se dar conta de que ela exis-
te, essa harmonia foi quebrada. Vou lhe contar uma pequena
história sobre a importância de vivermos em harmonia.”
O periquito Tuim, que adorava uma história, sentou-se
delicadamente para ouvir.

“Houve um ano em que o inverno prometia ser muito


frio. Os animais estavam sofrendo bastante. Alguns já apare-
ciam mortos depois de uma noite de temperatura muito bai-
xa. Morriam indefesos diante das baixas temperaturas e do
alto grau de umidade.
33
Carlos Eduardo Nunes
Foi aí que uma grande manada de porcos espinhos
decidiu fazer algo para garantir a sobrevivência. O mais sábio
entre eles sugeriu que se ficassem juntos e bem perto uns dos
outros, o calor dos seus corpos poderia aquecer uns aos ou-
tros de forma que todos ficariam aquecidos nessas noites fri-
as. E assim fizeram.
O inverno era mesmo rigoroso. Passou o tempo, e co-
meçaram as reclamações. Um reclamava daqui, outro dali, um
não queria ficar perto deste, preferia aquele e assim por dian-
te. A situação foi se agravando tanto que uns começaram a
falar mal dos outros. E quanto mais nervosos ficavam, tanto
mais seus espinhos ficavam ouriçados, até que com os espi-
nhos, começaram a ferir uns aos outros. Já não podiam mais
ficar juntos por causa daquela situação.
Feridos e magoados uns com os outros, resolveram se
separar. Não dava mais para continuar juntos. Por isso, foram
se afastando uns dos outros até a completa separação.
Mas o inverno continuava. As noites eram muito frias.
Alguns porcos-espinhos chegaram a morrer congelados. E a
cada noite a situação ficava mais difícil. Logo, resolveram reu-
nir-se outra vez para tratar do problema. Decidiram que para
viver juntos e sobreviver àquele inverno, precisariam tomar
algumas precauções. Viveriam unidos, mas conservariam o
respeito uns para com os outros. Comentários maldosos não
deveriam existir. Todos deveriam entender que ali uns preci-
savam dos outros.
Assim agindo, conseguiram sobreviver àquele ter-
rível inverno.”

“Entendeu a história? Entendeu o que eu quis dizer?”


– perguntou a Coruja.
PROVA“Entendi.”
02
CBJE 34
O pássaro que aprendeu a voar
“A partir dali, com o exemplo dos porcos-espinhos,
toda a floresta tentou viver em comunhão. Os dias se torna-
ram melhores mas, com o tempo, foram surgindo novas idéi-
as e situações. Os humanos entraram em nossas florestas, cap-
turaram alguns animais silvestres apenas para obter a pele
ou os dentes. Pouco a pouco, os animais foram diminuindo
em quantidade. Nos dias de hoje, muitos de nossos irmãos
já não existem.”
“Iremos morrer?”
“Todos um dia iremos morrer. O que importa é como
vivemos. Por isso insisto em lhe dizer que você deve ser sem-
pre bom, porque há muitos outros animais que precisam de
você.”
Os dois ficaram um longo tempo em silêncio. O Peri-
quito olhava para o alto, em direção ao ninho, na esperança de
ver seus pais.
“Fico feliz por você. – disse a Coruja. Está aprenden-
do rápido. Sua mãe lhe deu uma boa educação. Sua vontade
de aprender me deixa muito feliz. Espero que continue assim.
Sabe, meu amigo, cada ser carrega no seu coração o meio
ambiente em que vive. Aquele que nada encontrou de bom
nos lugares por onde passou, não poderá encontrar outra coi-
sa por aqui. Aquele que encontrou amigos ali, também os en-
contrará aqui. Todos nós, seres que vivemos sob a face da
Terra, somos viajantes no tempo, e o futuro de cada um de
nós, está escrito no passado. O que vivemos hoje é reflexo do
que fizemos ontem.”
O Periquito Tuim permanecia olhando para a Coruja.
“Cada um encontra na vida exatamente aquilo que traz
dentro de si mesmo. O ambiente, o presente e o futuro somos
nós que criamos e isso só depende de nós mesmos. Lhe digo
essas coisas, porque precisamos transformar a floresta num
35
Carlos Eduardo Nunes
bom lugar para se viver. E você ainda é uma criança, está na
época ideal para aprender.”
O pequeno Periquito Tuim olhou para a flores ao seu
redor. Ficou um longo tempo em silêncio. Pôde ouvir o ba-
rulho da floresta à noite. O canto dos grilos, o som de outras
corujas. Olhou para o céu e viu as estrelas brilhando. Queria
que as palavras da Coruja nunca mais saíssem de sua cabeça.
Se necessário fosse, não queria crescer.

PROVA 02
CBJE 36
O pássaro que aprendeu a voar

Nove
Um cachorro aproximou-se da base da árvore onde
estava o periquito Tuim e achou estranho que um pássaro es-
tivesse ali, afinal, o lugar dos pássaros é no céu, voando ao
sabor do vento.
“O que é você?” – perguntou o periquito estranhando
a existência de um animal como aquele.
“Eu sou um cachorro.” – respondeu.
“O que é isso no seu corpo?”
“Isso são pelos. Nunca viu um animal que não possuís-
se penas?”
“Já sim, uma tartaruga. Mas ela um dia quis voar, não con-
seguiu, e por isso eu achei que ela era um pouco amargurada.”
“Nem todo mundo é aquilo o que quis ser, meu amigo.
Esse é o grande mal da natureza.”
“De onde você vem?” – perguntou o periquito Tuim.
“Daqui de perto. Da cabana dos caçadores.” – respon-
deu o cachorro abaixando a cabeça como se estivesse com
vergonha.
“Caçadores?”
“Isso mesmo.”
“Foi um caçador que um dia prendeu um canário só pra
ouvir seu canto e quando não quis mais ouvi-lo, se desfez dele”.
O cachorro ficou em silêncio. Afinal, o caçador era seu
dono e ele, como um animal, tinha vergonha do que ele – e
muitos outros caçadores – fazia com seus amigos animais.
“O caçador é o meu dono. – disse o cachorro. E por
isso os outros animais da floresta me desprezam. Dizem que
eu sou como ele e todos tem medo de serem traídos por mim.
37
Carlos Eduardo Nunes
Acham que vou avisar a presença deles ao caçador, como um
cão de caça. E por isso eu não tenho amigos”.
“Amizade é um apego muito particular entre dois se-
res” – pensou o periquito Tuim lembrando-se das palavras da
coruja.
“Você quer ser meu amigo?” – perguntou o cachorro.
Ouvindo aquelas palavras, o periquito sorriu.

O periquito Tuim subiu nas costas do cachorro. Ele


iria levá-lo até sua casa, para conhecer os humanos, já que sua
curiosidade a respeito destes seres era muito grande.
“Os seres humanos podem ser homens e mulheres. –
disse o cachorro. Eles fazem uma contagem do tempo e divi-
dem sua vida de acordo com esses números. Na verdade, de-
pois que inventaram os números, os seres humanos passaram
a ser mais racionais, em todos os sentidos. Quando são pe-
quenos, são chamados de crianças. Depois passam a ser cha-
mados de adolescentes. Em seguida, de adultos. Lá em casa
tem adultos e crianças.”
“Como eu poderei reconhecer um adulto?” – pergun-
tou o periquito Tuim.
“Ah, isso não será difícil. Os adultos são pessoas gran-
des, normalmente pessoas mais sérias, falam alto, mas brin-
cam pouco. As crianças estão sempre brincando e sorrindo.
Será fácil identificar”.
A cada passo do cachorro o periquito Tuim ficava mais
ansioso.
“Todas as pessoas grandes um dia foram crianças.” –
disse o cachorro.
“Mas você disse que elas são diferentes!”
“E são. Os seres humanos se cansam de ser crianças,
PROVA
têm 02 em crescer, mas depois que crescem lamentam que
pressa
CBJE 38
O pássaro que aprendeu a voar

não podem ser pequenos novamente. As pessoas grandes são


complexas. Em seu mundo, tudo tem que ter uma explicação,
senão elas não compreendem, não se dão por satisfeitas. E
estão sempre buscando algo”.
“O que eles buscam?”
“Alguns dizem que buscam a paz e se preparam para a
guerra. Outros dizem que buscam o progresso da humanida-
de e destroem o que tem de mais importante.”
“E o que é mais importante?”
“O mais importante é o que vem do coração. São os
sentimentos. É o que reforça os laços entre os homens. Isso
acontece também entre nós, aqui na floresta”.
O periquito Tuim lembrou-se da história dos por-
cos espinhos e imaginou que entre eles deveria haver um
grande sentimento.

No caminho em direção à cabana do caçador, eles passa-


ram por um pequeno riacho onde uma raposa bebia água. No
alto de uma árvore, um tucano os observava. Naquela floresta
ainda era possível que os animais convivessem em paz, embora, a
cada dia, estivessem sendo ameaçados pelos caçadores.
No caminho passaram também por uma linha férrea
onde os trilhos seguiam retilíneos em direção ao norte, cor-
tando boa parte da floresta.
“O que é isso?” – perguntou o Periquito.
“São trilhos de trem.”
“O que é um trem?”
“É um dos meios de transporte que os homens utili-
zam para se locomover. Nos trens, eles vão de um lado para o
outro. Em algumas regiões eles transportam apenas passagei-
ros. Aqui, eles transportam materiais também.”

39
Carlos Eduardo Nunes
Neste momento, surgiu um trem com sua locomotiva
roncando como um trovão e eles puderam ver, através das
janelas, que havia pessoas lá dentro.
“Como é rápido o trem!” – disse o Periquito Tuim.
“Sim. Os homens estão sempre com muita pressa.”
“Mas o que eles estão procurando ao seguir de um lado
para o outro?”
“Muitas vezes nem eles mesmo sabem. – afirmou o
cachorro. O certo é que nunca estão contentes onde estão.”

Chegaram na cabana e os olhos do Periquito Tuim se


arregalaram ao ver um humano. Não foi difícil para ele com-
preender que era uma criança pois havia um sorriso estampa-
do no rosto. O menino andava em círculos com uma bicicleta
imitando um som parecido com o do trem.
O cachorro deixou o Periquito num lugar de onde ele
podia observar toda a movimentação da casa e ele viu quan-
do o menino correu para abraçar o cachorro. Logo em segui-
da, voltou para sua bicicleta imitando o mesmo som.
Logo depois chegou o caçador, reclamando do mal
desempenho na caçada daquele dia. Para descontar sua raiva,
mandou o menino parar de brincar, descer da bicicleta e ir
tomar banho. Como o menino insistia em brincar, o caçador
tomou-lhe a bicicleta, mandando-o entrar. Tanto o cachorro
quanto o Periquito viram que o menino chorava.
“Os adultos não compreendem o que é realmente im-
portante.” – pensou o Periquito.

O cachorro ajudou o Periquito a subir na janela e os


dois ficaram observando através dos vidros o movimento
dentro da casa. O cachorro lhe explicou que era a hora do
PROVAum
jantar, 02 momento sagrado em que toda a família se reúne –
CBJE 40
O pássaro que aprendeu a voar
ou deveria se reunir – para fazer as refeições. O Periquito Tuim
percebeu que apenas a mulher e a criança estavam sentados à
mesa, enquanto o caçador estava sentado no sofá, de frente
para uma caixa luminosa.
“O que é aquilo?” – perguntou o Periquito.
“É a televisão. – disse o cachorro. Acho que os ho-
mens a inventaram para tornar seus dias mais alegres. Eles
passam horas olhando para ela. Às vezes choram, outras sor-
riem, mas sempre permanecem ali.”
“Eu não compreendo. – disse o Periquito. Eles passam
horas olhando para uma caixa, passam horas ouvindo o som
desta caixa, mas não dedicam um pouco deste tempo para
olhar e ouvir as pessoas ao redor. Para as pessoas grandes a
televisão é o mais importante?”
“Não é isso. É que eles cresceram e esqueceram o va-
lor de uma boa conversa. O caçador, por exemplo, dedica
todo seu tempo em busca do sustento de sua família. Está
sempre trabalhando, em busca de dinheiro.”
“O que é dinheiro?”
“O dinheiro é outra coisa que os homens inventaram.
É uma folha de papel que eles utilizam para comprar coisas.
O papel é extraído das árvores. Este é um dos muitos moti-
vos dos homens virem para a floresta. No mundo das pessoas
grandes, todas as coisas materiais possuem um valor para ser
comprado ou vendido. Quem tem a maior quantidade de di-
nheiro é o mais rico.”
“Mas você, sendo o cachorro do caçador, se tivesse
um pouco deste dinheiro, poderia comprar um amigo e aca-
bar para sempre com sua solidão?”
“É claro que não. O dinheiro serve apenas para com-
prar coisas materiais. Ele serve para comprar a televisão, mas
não serve para comprar o sorriso da criança que agora há
pouco estava chorando.”
41
Carlos Eduardo Nunes
“Eu não compreendo. Quer dizer que eles passam toda
a vida trabalhando, buscando ganhar mais dinheiro e quando
precisam de algo realmente importante, este dinheiro – aqui-
lo pelo qual eles trabalharam toda a vida – não pode lhes aju-
dar a conquistar um amigo?”
“É isso mesmo.” – respondeu o cachorro.
“Os homens são realmente muito estranhos! – disse o
Periquito. Só as crianças parecem saber o que procuram. Per-
dem seu tempo com uma bicicleta e a bicicleta se torna muito
importante, e choram quando ela lhes é tomada...”
“Elas são felizes...” – disse o cachorro.

Quando já se afastavam da cabana do caçador, eles


ouviram um barulho quase ensurdecedor. O cachorro lhe ex-
plicou que era produzido por um equipamento conhecido
como serra elétrica. O Periquito Tuim quis saber o que era, e
quando avistaram árvores jogadas ao chão, o Cachorro lhe
explicou. Disse também que os homens cortavam algumas
árvores para transformar em móveis, outras para produzir
papel. Tudo era vendido para virar dinheiro.
Passaram novamente pelo riacho onde anteriormente
havia uma Raposa bebendo água tranqüilamente. A Raposa já
não estava mais ali e o que eles podiam ver eram árvores joga-
das ao chão.
O barulho continuava, agora um pouco mais distante.
Os dois resolveram seguir em frente pois, onde estavam, seri-
am alvos fáceis de serem abatidos.

O dois retornaram até a base da árvore onde ficava o


ninho do periquito Tuim. Ambos olharam para cima, mas seus
pais ainda não haviam chegado.
PROVA“Eu02 queria te agradecer.” – disse o cachorro.
CBJE 42
O pássaro que aprendeu a voar
“Me agradecer?”
“Sim. Por ser meu amigo. Eu estava precisando de al-
guém para conversar”.
“Eu que lhe agradeço. – disse o periquito. Você me ensi-
nou coisas importantes e me mostrou os humanos. E eu apren-
di que eles são boas pessoas. Embora dentro de cada um exista
um ser cheio de responsabilidades e problemas, há também uma
criança que às vezes é ouvida e revelada. Pena que eles nem
sempre possam revelar esta criança, não é mesmo?”
“Tem razão. Mas eles vão aprender, tenho esperança”.
“O que é esperança?”
“Podemos dizer que esperança é a espera de algo cuja
realização se deseja do fundo do coração”.
“Entendi – respondeu o periquito. Então também te-
nho esperança. Tenho esperança de que, um dia, todos os ani-
mais vão viver em harmonia em nossa floresta e que não mais
veremos a serra elétrica cortando árvores como vimos hoje”.
“Todos nós, animais da floresta, precisamos nos unir.
– disse o cachorro. Afinal, temos um bom motivo: nosso lar
está sendo destruído e se não lutarmos, também seremos. Nós
temos uma boa oportunidade de mudar nosso futuro saben-
do que o motivo pelo qual realizamos uma tarefa é que vai
determinar sua qualidade final. Sobre isso, vou lhe contar uma
pequena história.”

Certa tarde, um cachorro, que um dia fora um cão de


caça, espantou um coelho para fora de sua toca. Depois de
uma longa perseguição, com o cachorro sempre atrás do coe-
lho, ora mais perto e ora mais distante, ele parou a caçada,
vendo que o coelho se afastava rapidamente.
Uma raposa, vendo o cachorro desistir da persegui-
ção, ridicularizou-o dizendo:
43
Carlos Eduardo Nunes
“Você perdeu. Aquele pequeno animal é melhor cor-
redor do que você.”
O cachorro, olhando para a Raposa, respondeu:
“Minha amiga raposa, você não vê a diferença entre eu
e este coelho?”
A Raposa ficou pensativa.
“Diferença, que diferença?”
“Nessa nossa disputa que travamos agora, eu estava
correndo apenas por um jantar, mas ele, por sua Vida.”

Eles se despediram. O periquito Tuim percebeu que os


olhos do cachorro estavam marejados de lágrimas. Pensou
em perguntar se ele estava triste, mas desistiu. Um dia, no
futuro, ele iria compreender que lágrimas também podem ser
derramadas por emoção.
O cachorro seguiu seu caminho, de volta para casa.
Quando já estava um pouco distante, ele gritou o nome do
periquito, que olhou em sua direção.
“Tuim, meu amigo, esqueci de lhe dizer uma coisa:
muitos animais entram e saem da nossa vida, mas só os ami-
gos verdadeiros permanecem, porque fazem parte das coisas
importantes que conquistamos. E a distância entre dois ami-
gos deixa vazios em nossos corações. Por isso você um dia irá
sentir que é sempre bom rever um amigo, mesmo que tenham
se passado anos sem se encontrarem. Você vai ver...”

PROVA 02
CBJE 44
O pássaro que aprendeu a voar

Dez
O Periquito Tuim resolveu não se arriscar demais e
voltou para a base da árvore onde estava seu ninho. Qualquer
barulho que ouvia vindo do topo da árvore ele olhava para
ver se eram seus pais. Mas seus pais ainda não haviam retornado
e seu medo aumentava a cada instante. Havia também a sau-
dade, algo que ele não sabia definir o que era, mas que sentia
profundamente.
Foi então que pôde ver um pássaro negro, bem maior
do que o Beija-flor, o Canário ou o João-de-barro pousar bem
próximo a ele.
“Quem é você?” – perguntou o Periquito Tuim.
“Sou um pássaro negro. – respondeu ele. O que faz
aqui sozinho?”
E o pequeno Periquito Tuim contou mais uma vez sua
história. Falou também sobre as visitas anteriores que tivera,
falou sobre o que aprendera sobre os humanos e comentou
sobre o que falaram a respeito do Gavião.
“Eles disseram isso?” – perguntou o pássaro negro.
“Sim. E pediram que eu tivesse cuidado”.
“Os pássaros menores, que se alimentam basicamente
de sementes e frutos temem os gaviões porque são fracos. –
disse o pássaro negro. E se estamos na floresta, o que vale é a
lei da selva”.
“O que é a lei da selva?” – perguntou curioso o Peri-
quito Tuim.
“É a lei que diz que os mais fortes dominam os mais
fracos”.
“Mas isto não é justo” – esbravejou ele.
45
Carlos Eduardo Nunes
“Não é questão de justiça, mas sim de sobrevivência.
Eu, e todos os outros Gaviões, somos mais fortes, e temos
todo o direito de atacar outros animais. Até mesmo os huma-
nos gostam de nós, pois matamos cobras venenosas. Muitos
caçadores nos levam no ombro em suas caçadas porque po-
demos reconhecer uma presa à distância”.
E quando ele disse isso, o Periquito Tuim tentou não
demonstrar o medo que sentia, mas afastou-se bem devagar e
entrou na base da árvore onde ficava seu ninho.
“Venha cá que eu ainda não terminei”. – esbravejou
o Gavião.
“Você é mal. Ataca animais indefesos conforme me
disseram meus amigos”.
“Mal, eu? Só porque não quero passar o resto de meus
dias procurando por sementes e frutos? Vou lhe dizer uma coi-
sa Periquito, quando passares fome saberás o que digo. Todos
os animais existentes neste planeta – no ar, na água, na terra, e
nisto também se inclui os humanos – quando estão acuados
eles atacam. Então, se tenho fome, vou atacar aqueles que esti-
verem mais próximos ou aqueles que forem mais fracos”.
E o Periquito Tuim mantinha-se escondido na base
da árvore.
“Você é bravo porque não tem amigos e nem mesmo
ninguém para amar. Tenho certeza que adoraria poder ter al-
guém para conversar, alguém que se importasse com você.”
“O que você está dizendo?”
“Suas atitudes tão rudes demonstram que você não se
importa com a vida dos outros. Mas quer saber de uma coisa?
Eu me importo com você. E quer um conselho? Cuide deste
ferimento em sua pata, porque ele pode piorar.”
O Gavião ficou um instante em silêncio, olhando para o
PROVA 02 em sua pata causado por uma briga com uma Águia.
machucado
CBJE 46
O pássaro que aprendeu a voar
“Como podes dizer essas coisas para mim? Você não
me conhece, não sabe de onde venho, as situações pelas quais
passei. Por hora vou deixar-lhe em paz. Mas tenha cuidado
porque, sem asas, não irá muito longe. Se não puder voar, não
terá como se alimentar e somente assim descobrirá o signifi-
cado das palavras que lhe falei”.
E falando isso, o Gavião voou para longe e logo de-
pois pousou em um galho de uma árvore seca e pôs-se a ob-
servar as redondezas com sua fisionomia severa e a postura
de dono dos céus.

47
Carlos Eduardo Nunes

PROVA 02
CBJE 48
O pássaro que aprendeu a voar

Onze
Mais um dia havia se passado e o Periquito Tuim sentia
falta de seus pais. Às vezes ele olhava para o alto da árvore na
esperança de que eles tivessem retornado, mas isso ainda não
havia acontecido. Sua asa estava menos dolorida e ele já pen-
sava na possibilidade de se recuperar e voar à procura deles.
“Mas por onde começar a procurar?” – ele pensava, já
que agora havia o perigo real da presença do Gavião.
Nesse momento, a Cobra surgiu rastejando em sua
direção.
“Como vai, minha criança?” – disse ela.
“Estou triste. – respondeu o Periquito. Será que meus
pais se esqueceram de mim?”
“Não, eles nunca se esquecem, só devem estar muito
ocupados. E quando estão ocupados, muitos pais não dão a
devida atenção aos seus filhos.”
“Os meus pais não são assim!”
“Será que não? Vejo que está sofrendo. Se quiser posso
te ajudar...”
“Me ajudar? Como poderia?”
“Posso me aproximar de ti e aliviar sua dor.”
“Você poderia aliviar a dor de minha asa para que eu
pudesse voar e procurar meus pais?”
“Sem dúvida, basta que eu me aproxime um pouco mais.”
E terminando de falar, a Cobra armou o bote. Assus-
tado, o Periquito Tuim tentou correr.
“Afaste-se de mim. – disse ele. Não quero que me aju-
de agora.”
49
Carlos Eduardo Nunes
Vendo que não seria possível fugir da Cobra, ele fe-
chou os olhos, com medo.
E o que aconteceu depois, ele não viu. Apenas pôde
ouvir o bater de asas de um pássaro aproximando-se, e os
gemidos da Cobra que logo cessaram. O gavião havia surgi-
do exatamente no momento em que a Cobra iria atacar o Pe-
riquito Tuim e, com o bico, o grande pássaro negro a partiu
em dois.

Após duas longas viagens carregando a Cobra no bico,


o Gavião retornou para o local onde estava o Periquito.
“Obrigado!” – disse o Periquito.
“Eu que lhe agradeço. – respondeu o Gavião. Você foi
o primeiro animal que se importou comigo, mesmo quando eu
estava para lhe atacar. Sabe, esse é o instinto natural dos Gavi-
ões. Mas como você disse, eu sinto falta por não ter amigos. Os
outros animais tem medo de mim e não deixam que eu me apro-
xime. Dizem que eu sou diferente e aqui na floresta excluem os
diferentes. O mundo não é tão justo quanto parece...”
“O mundo não é tão justo quanto parece.” – repetiu o
Periquito. E o ferimento em sua pata, como está?”
“Vai melhorar. Todas as dores que temos, sejam físicas
ou emocionais, se curam com o tempo. E você, está cuidando
de sua asa?”
“Ela já está bem menos dolorida. Em breve já pode-
rei voar.”
“Que bom. Espero te ver um dia batendo suas asas e
cortando os céus em seu vôo.”
“Eu adoraria voar!”
“Tenha calma. Eu sei que é difícil esperar já que ainda é
muito jovem e os jovens são sempre um pouco impacientes,
PROVA
mas 02 calma. Tudo vai se resolver. Eu tive um filho, sa-
tenha
CBJE 50
O pássaro que aprendeu a voar
bia? E enquanto eu estava voando, após ter conversado com
você, eu me lembrei dele. Ele era tão gentil, tão carinhoso.”
“E onde ele está?”
“Partiu. Agora está voando em outros ares. Ele tinha
tantos amigos, e eu também. Agora...”
“Posso ser seu amigo!” – disse o Periquito.
“Eu adoraria. Mas como somos diferentes, não pode-
remos voar juntos. Imagine um Gavião voando junto com um
bando de Periquitos...”
“É mesmo, seria engraçado.”
“Os outros animais iriam pensar que eu estaria perse-
guindo vocês e minha reputação seria de um pássaro ainda pior.”
E os dois sorriram ao imaginar a cena.
“Para mim – disse o Gavião – basta saber que em al-
gum lugar eu tenho um amigo, alguém com o qual eu possa
contar e, para mim, isso basta. Mesmo que demoremos um
bom tempo para nos encontrarmos, quando estivermos jun-
tos, será um belo reencontro. Tu serás para mim um amigo
que não vejo há tempos, e isso alegrará a nós dois.”
“Tem razão.” – disse o Periquito.
Antes que o Gavião fosse embora o Periquito Tuim
caminhou em sua direção e se escondeu entre suas asas. De-
pois de muito tempo os dois tinham novamente contato com
o calor do corpo de um outro animal, como pai e filho.

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Carlos Eduardo Nunes

PROVA 02
CBJE 52
O pássaro que aprendeu a voar

Doze
A sombra começava a tomar conta da floresta quando
o Periquito Tuim ouviu um som que vinha do alto da árvore.
Seus pais o saudaram e ele sentiu-se extremamente feliz em
vê-los novamente. Eles pousaram ao seu lado e os três abra-
çaram-se durante um longo período.
“Onde estiveram?” – perguntou ele.
Mas os dois permaneciam em silêncio. Seu pai voou
em busca de alimento e foi sua mãe quem falou:
“Naquele dia, no que seria seu primeiro vôo, eu perce-
bi que você teve problemas. Conversei com seu pai e acha-
mos melhor deixá-lo um pouco sozinho. Eu e seu pai estive-
mos todo este tempo observando seus passos. Partiu meu
coração vê-lo chorar, vê-lo olhar para o alto do ninho na es-
perança de que nós retornássemos. Nós te amamos e jamais
iríamos lhe abandonar.”
O Periquito Tuim abraçou novamente sua mãe.
“Vimos quando o Beija-flor, o Canário, o João-de-bar-
ro, a Coruja e o Cachorro se aproximaram. Tivemos um gran-
de medo enquanto a Cobra e o Gavião conversavam com você,
mas queríamos ver como você se sairia frente às dificuldades”.
“E como eu me saí?” – perguntou ele sem entender
direito aquela situação.
“Maravilhosamente. – foi sua resposta. – Apesar de
tudo o que temos passado aqui na floresta, eu me emocionei
ao ver que ainda existem muitos animais bons. Eu e seu pai
pudemos ver que ainda existem amigos neste mundo e que há
animais que consideram a amizade importante. Agora consi-
dero que você já está preparado para seguir sua própria vida.”
53
Carlos Eduardo Nunes
Houve um breve instante de silêncio, como se o Peri-
quito Tuim estivesse tentando entender tudo aquilo.
“Ver que você se relacionou bem com os outros ani-
mais na floresta me causa um sentimento bom, de que você
será um grande pássaro. Grande nos sentimentos, já que so-
mos periquitos e fisicamente não crescemos muito. Mas po-
demos ser grandes na alma, ter sentimentos nobres, ter um
coração bom, como os seus amigos lhe ensinaram. Estes dias
foram muito importantes para todos nós. E isso me conforta.
Me conforta porque fica a esperança de que o mundo em que
você vai viver será mais agradável para todos”.
O Periquito Tuim permanecia em silêncio e olhava para
sua mãe com admiração.
“Você tem um mundo à sua frente. Você faz parte do
equilíbrio da natureza. Já está preparado para seguir sua pró-
pria vida e alçar seus próprios vôos”.
“Mas minha asa ainda está dolorida”. – disse ele com
um tom de voz bem baixo.
“Vai passar. Como tudo em nossa vida passa. Em bre-
ve estaremos voando juntos, partilhando do mesmo bando.
Há dezenas de periquitos Tuim à nossa espera”.
E assim a mamãe periquito pegou seu filho pelo bico e
o levou até o ninho. De lá de cima, pela primeira vez, ele pres-
tou atenção no sol que estava se pondo. Contou a ela a histó-
ria de um pássaro que se tornara um grande cantor e falou
tudo o que aprendeu sobre os humanos.

Assim, em seu lar, num ambiente de paz e harmonia,


os dias seguintes foram de repouso, até que o Pequeno Peri-
quito Tuim conseguiu bater suas asas e voar seguindo um ban-
do de outros periquitos. A partir de seu primeiro vôo ele pôde
PROVA
ver toda02a grandiosidade da floresta que se erguia majestosa.
CBJE 54
O pássaro que aprendeu a voar
Viu também o João-de-Barro que estava terminando sua casa
no topo de uma árvore bem alta e acenou para ele.
Confirmando o que seus amigos lhe disseram, ele pôde
ver, numa área um pouco mais distante, sinais de fumaça que
indicavam fogo. Havia também grandes áreas com as árvores
derrubadas, formando enormes clareiras na floresta. De lá de
cima, ele podia avistar, nestas clareiras, animais correndo, na
certa, tentando evitar que os caçadores lhes apanhassem.
“Mãe, o que é aquela linha reta lá na frente? – pergun-
tou o Periquito Tuim.
“É o horizonte”.
“Estranho.” – comentou ele.
“O que lhe parece estranho?”
“Ao longo destes dias aprendi com meus amigos muitas
coisas interessantes e percebi que cada coisa tem sua razão de ser,
mas no meu ponto de vista o horizonte não serve para nada.”
“Claro que serve!” – disse a mamãe Periquito.
“Para que serve o horizonte? – insistiu ele. Se eu vôo
em direção ao horizonte, ele se afasta de mim. Se dou cem
batidas de asas em sua direção, ele parece se afastar cem bati-
das de asas de mim. Se voamos quilômetros em direção ao
horizonte, ele se afasta os mesmos quilômetros de nós. Isso
parece não ter sentido. O horizonte não serve para nada.”
Sua mãe olhou para o filhote ao seu lado, sorriu e disse:
“É justamente para isso que serve o horizonte. – disse
ela. Para fazer a gente seguir em frente.”
“Para fazer a gente seguir em frente.” – repetiu ele para
não esquecer.

Dias depois, já sabendo dominar completamente seu


vôo e compreendendo a importância do horizonte, ele resol-
veu procurar pela Coruja. Chegando até a árvore onde ela
55
Carlos Eduardo Nunes
estava, percebeu que sua amiga tinha companhia. Uma Arara
acabara de pousar e estava conversando com a Coruja quan-
do o Periquito Tuim se aproximou.
“Como vai, Dona Coruja? Eu venho de uma floresta
tropical que fica muito longe daqui. Que tipo de animais vive
neste lugar?” – perguntou a Arara.
“Que tipo de animais vive no lugar de onde você vem?
– perguntou por sua vez a Coruja.
“Ah! Um grupo de animais egoístas e um bando de
homens malvados – comentou a Arara. Estou satisfeita por
ter saído de lá.”
“A mesma coisa você haverá de encontrar por aqui.” –
respondeu a Coruja.
“Você tem certeza?” – perguntou a Arara.
“Certeza absoluta! Os animais daqui são egoístas tam-
bém e os homens, quase todos são caçadores...”
“Este mundo está perdido mesmo”. – comentou
a Arara.
A Arara ficou pensativa, olhou ao seu redor, despe-
diu-se e logo em seguida voou para bem longe. O Periquito
Tuim apenas observava.
“Como vai, meu Amigo? – perguntou a Coruja. Vejo
que encontrou seus pais e que suas asas melhoraram.”
“Estou bem. Reencontrei meus pais. Aprendi a voar.”
Ele se aproximou e lhe deu um forte abraço.
“Porque você disse essas coisas a Arara?” – perguntou ele.
“Eu já lhe disse. – respondeu a Coruja. Cada um en-
contra na vida exatamente aquilo que traz dentro de si mes-
mo. O ambiente, o presente e o futuro somos nós que cria-
mos e isso só depende de nós. Não é apenas mudando de
lugar que teremos melhores respostas. Precisamos, também,
mudar nossas atitudes e repensar a maneira como encaramos
oPROVA
mundo.”02
CBJE 56
O pássaro que aprendeu a voar
“Mudar nossas atitudes... repensar a maneira como
encaramos o mundo...” – repetiu ele, pensativo.
“Estamos mudando constantemente. – disse ela. E fico
feliz porque vejo que não esqueceu seus amigos. Posso lhe di-
zer uma coisa?”
“Claro que pode”.
“Os animais se esquecerão facilmente do que você dis-
se. Os animais esquecerão facilmente o que você fez, mas eles
nunca esquecerão do que você os fez sentir. E estou feliz por-
que agora você me fez sentir muito bem, porque me procu-
rou, porque se importou comigo. Você é um bom amigo, e os
bons amigos são como estrelas que você nem sempre as vê,
mas sabe que elas estão lá. Em algum lugar, você tem um amigo,
e ele estará sempre contigo.”
E ouvindo estas palavras, ele resolveu procurar pelo
Cachorro.

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Carlos Eduardo Nunes

PROVA 02
CBJE 58
O pássaro que aprendeu a voar

Treze
O Periquito Tuim resolveu procurar pelo Cachorro e
voltou à cabana do Caçador. Chegando lá, ele procurou em
todos os cantos, mas não o encontrou. Também não havia
sinais de presença do Caçador, mas a criança estava lá, no
quintal, brincando com uma bola de futebol.
O Periquito Tuim voou ao seu redor, como se quisesse
lhe perguntar onde estava o Cachorro e pousou em seu om-
bro. Como pássaros não entendem linguagem de homem e
homens não entendem linguagem de pássaros, ele não obteve
nenhuma resposta.
O menino, encantado com a presença do Periquito, ten-
tou tocá-lo mas, arisco que era, ele voou, procurando nova-
mente pelo Cachorro. Quando resolveu pousar num galho de
árvore, percebeu que havia algumas sementes logo ali à sua
frente. Como estava com fome, se aproximou das sementes e
sentiu, que ao seu redor, algo se fechava. Quando percebeu,
estava dentro de um alçapão. Lembrou-se imediatamente das
palavras do Canário. Por descuido, ele havia sido preso por
uma armadilha do Caçador.
O menino, que agora andava de bicicleta, percebeu que,
no alçapão, um pássaro se debatia. Ele se aproximou e pôde
perceber o desespero do Periquito que acabara de perder sua
liberdade. Olhou ao seu redor e pôde ver um viveiro cheio de
pássaros silvestres que seriam vendidos em feiras na cidade gran-
de para alegrar algumas dezenas de pessoas que iriam comprá-
los, sem perceber o mal que faziam aos pássaros e à natureza.
O menino pegou o alçapão na mão e tentou tocar o
corpo do Periquito, mas este se debatia com muita intensida-
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Carlos Eduardo Nunes
de. Foi então que o menino quebrou duas varetas que forma-
vam a grade do alçapão, deixando um espaço para que o Peri-
quito pudesse voar.
Ainda levou algum tempo até que o pequeno Periquito
Tuim percebesse a abertura. E quando percebeu, ele voou,
batendo suas asas, sem olhar para trás. E assim, ele nem mes-
mo pôde ver o sorriso no rosto do menino, que se alegrou
com aquele vôo.
Naquele momento, os dois aprenderam o significado
da palavra liberdade.

Depois do susto, ele agora estava de volta ao seu ban-


do. Uma nova vida começava para o Periquito Tuim, e muitos
vôos ainda viriam pela frente. A cada dia, iria crescer. Utiliza-
ria ao máximo sua liberdade e viveria feliz, sabendo de sua
responsabilidade na floresta, como um ser único, capaz de
ajudar a todos na floresta no sentido de reencontrar a harmo-
nia que estavam precisando. Iria sempre que possível visitar
seus amigos, mostrar-lhes o quanto são importantes para ele.
Em pouco tempo, conheceria o Amor e teria filhotes. Iria
ensiná-los tudo o que aprendeu nestes dias.
Sua luta agora era para não ser capturado pelos huma-
nos e ser preso em gaiolas. Deveria ser forte, também, para
não ser uma presa muito fácil para os gaviões. Teria que lutar
contra a lei da selva, os fracos contra os mais fortes, tentando
sobreviver. Teria que aprender a cuidar de seu lar, de sua flo-
resta e dos seus amigos.
Foi isso o que seus pais quiseram lhe ensinar.
Foi isso o que ele aprendeu.

PROVA 02
CBJE 60
O pássaro que aprendeu a voar

Qatorze
Mesmo com toda a degradação promovida pelo Ho-
mem, a cada dia, a natureza dava sinais de que poderia se re-
cuperar. Com o tempo, os homens teriam consciência de que
deveriam cuidar mais de seus rios e lagos. Deveriam dar mais
atenção ao meio-ambiente. Assim, os homens resolveram en-
sinar isso a seus filhos para que, em dez ou vinte anos, a natu-
reza conseguisse dar sinais de recuperação.
Na floresta onde nasceu o Periquito Tuim também ha-
via muitos problemas, mas a vida prevalece. Precisamos acre-
ditar que o dia de manhã será melhor, e isso se chama espe-
rança. Talvez ainda esteja um pouco distante o tempo em que
os homens viverão em paz e harmonia. Talvez esteja distante
o tempo em que os homens respeitarão totalmente a nature-
za. Mas uma coisa é certa: se cada um de nós fizer alguma
coisa, um pouco que seja, conseguiremos grandes resultados.
O menino em que o Periquito Tuim pousou no ombro
foi morar na cidade, mas nunca se esqueceu da floresta. Quan-
do cresceu, sempre tentava mostrar às pessoas que, em nome
do progresso, a natureza estava sendo destruída. Para
conscientizar as novas gerações, começou a escrever peque-
nas histórias infantis, onde as crianças pudessem aprender li-
ções sobre a vida, tentando tornar a sociedade do futuro um
lugar melhor para se viver.
Essa era a contribuição do menino ao se tornar um
homem. Ele estava fazendo a sua parte. Mas o resultado, ele
talvez nunca viesse a saber qual foi, porque muitas vezes, uma
mudança leva tempo para ser notada. Mas isso não era o mais
importante. O importante era que a semente já estava sendo
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Carlos Eduardo Nunes
espalhada, ficando à disposição para ser plantada. E ele tinha
certeza de que se caísse em solos férteis, as lições de suas his-
tórias poderiam contribuir para uma mudança radical no com-
portamento das pessoas. E, para isso, era necessário encantar
as crianças; era necessário tocar o coração delas.
Faça você também a sua parte.

Pense em uma idéia para transformar o mundo e colo-


que-a em prática!

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CBJE 62
O pássaro que aprendeu a voar

Sobre o autor
CARLOS EDUARDO NUNES nasceu na cidade do
Rio de Janeiro no ano de 1980. É formado em Engenharia Civil
e pós-graduado em Engenharia de Segurança do Trabalho pela
Fundação Técnico Educacional Souza Marques. Começou a
escrever poesias por volta dos 16 anos. Em seguida, passou a
escrever contos com início, meio e fim, sendo este o primeiro
passo para iniciar a escrever seus primeiros romances.
Participou da 2ª e 7ª Antologia de Poetas Brasileiros Con-
temporâneos da CBJE (Câmara Brasileira de Jovens Escritores),
com os poemas “O Fim do Mundo” e “Um tempo que não volta”,
respectivamente.
Em Outubro de 2003 lançou, pela Editora CBJE, o
livro “Palavras ao Vento”, com poesias e contos de sua autoria.
Em Dezembro de 2005, obteve “Menção Honrosa” no
Concurso Literário de Contos do Elos Clube de Santos com
o texto “Um conto de Natal”.
Aproveitando a internet enquanto importante veículo
de comunicação, passou a publicar seus contos, crônicas, pen-
samentos e poesias em seu blog “Fragmentos Poéticos -
www.fragmentospoeticos.weblogger.terra.com.br”, passando,
depois, a publicar seus textos num blog que leva o seu nome
“www.carloseduardonunes.blogspot.com”.

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Carlos Eduardo Nunes

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CBJE 64
O pássaro que aprendeu a voar

Do mesmo autor de:


PALAVRAS AO VENTO
CBJE – Outubro 2003

Obras do autor ainda não publicadas:


Tempo de Rasgar, tempo de costurar (Teatro)
Uma comédia em família (Teatro)
Tocando Sonhos (Contos)
Jardins de Pedras (Romance)
O Valor da Vida (Romance)
A Vida e a Obra de Afonso Arinos
de Melo Franco (Ensaio)

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Livro produzido pela
Câmara Brasileira de Jovens Escritores
Rio de Janeiro - RJ - Brasil
http://www.camarabrasileira.com
E-mail: cbje@globo.com

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